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ESTUDO A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E A PRIMOÇÃO DA VIDA INDEPENDENTE TIONAL

ESTUDO A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E A PRIMOÇÃO DA VIDA … · 2020. 6. 2. · 1.2 Estatuto socioprofissional, meio de vida e inserção no mercado de trabalho ... Crescer, alargar

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ESTUDO A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E A PRIMOÇÃO DA VIDA INDEPENDENTE

TIONAL

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AUTORES

PAULO PEDROSO (COORD.)

TATIANA ALVES

JOÃO ELYSEU

CÁTIA JOÃO

Lisboa 2012

Estudo realizado pela PPLL Consult para a Associação de Cegos e Amblíopes de Portugal (ACAPO) no âmbito do Projecto nº 000357402011 e realizado com o apoio do Programa Operacional de Assistência Técnica (POAT), cofinanciado pelo Fundo Social Europeu (FSE) e o Governo de Portugal.

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Agradecimentos

Os autores agradecem à Direcção da ACAPO e a toda a estrutura técnica

da associação que esteve envolvida no projecto o apoio e confiança na

realização do estudo, bem como a disponibilidade para partilhar ideias e

reflexões.

Um agradecimento é igualmente devido ao Professor Doutor Luís Capucha

e à Dra. Ana Salvado, do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia da

ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa por terem aceite discutir as ideias

centrais do trabalho a partir de um apuramento preliminar de resultados.

Este trabalho não teria sido possível sem o empenhamento e apoio

contínuo das técnicas da ACAPO, Anabela Miranda, Cláudia Candeias e

Sónia Anjos, que acompanharam a sua realização, na direcção nacional e

a quem agradecemos a cooperação, disponibilidade e paciência, nem sem

os técnicos e técnicas que aplicaram os questionários e ajudaram a

seleccionar os participantes nos focus-groups. A todas e todos

agradecemos encarecidamente.

Mas, sobretudo, este estudo não teria sido possível sem a activa

cooperação e o tempo disponibilizado pelos cidadãos portadores de

deficiência visual que se prontificaram a partilhar connosco as suas

experiências, opiniões e informações sobre as várias dimensões da sua

vida, de um modo que ficou inscrito nas memórias de todos os que com

eles contactaram. Muito obrigado a todas e todos.

O resultado a que chegámos, se beneficia do contributo de todos, apenas

responsabiliza os autores. As ideias nele expressas não vinculam a

ACAPO nem a sua direcção e as eventuais falhas, erros ou omissões são da

exclusiva responsabilidade dos autores.

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ÍNDICE

Índice de Tabelas ........................................................................................................................... 6

Introdução ..................................................................................................................................... 9

I. Qualidade de vida e vida independente – a situação social dos deficientes visuais ............ 12

1.1 Modelo relacional de deficiência, qualidade de vida e vida independente ........................ 12

1.2 Estatuto socioprofissional, meio de vida e inserção no mercado de trabalho .................... 15

1.3 Pertenças e trajectórias sociais .......................................................................................... 18

1.4 Participação no mercado de trabalho................................................................................. 22

1.4.1 Desigualdade de oportunidades de acesso .................................................................. 22

1.4.2 Apoios ao emprego .................................................................................................... 38

1.5 Afectos, família e sociabilidades ....................................................................................... 40

1.5.1 Constituir família e coabitar ....................................................................................... 40

1.5.2 Integração em redes sociais informais ........................................................................ 43

1.5.3 Vida social quotidiana, sociabilidades e lazer ............................................................ 45

1.6. Escolarização, autonomia e participação social e política ................................................ 49

1.6.1 Sucessos e dificuldades na escola inclusiva ............................................................... 50

1.6.2 Domínio do braille, uma vantagem educativa ............................................................ 55

1.6.3 Participação associativa, sindical e política ................................................................ 57

1.7. Uma tipologia de situações sociais e qualidade de vida de cidadãos com deficiência

visual em Portugal ................................................................................................................... 60

1.7.1 dimensões diferenciadoras da qualidade de vida ........................................................ 60

1.7.2. Tipos sociais de qualidade de vida ............................................................................ 64

II. Os serviços prestados pela ACAPO e as transformações na vida dos utentes – aproximação

à associação e avaliação dos serviços recebidos .......................................................................... 70

2.1 A Aproximação à associação ............................................................................................ 70

2.2 Denominador comum – ter beneficiado de serviços ......................................................... 75

2.3 Classificação dos serviços por disponibilidade e utilidade ............................................... 80

2.4. O serviço mais importante de que beneficiou .................................................................. 85

2.5 Lacunas e desigualdade de respostas ................................................................................. 92

2.6 Uma tipologia da satisfação com os serviços e dos impactos na vida dos utentes ............ 93

III. Crescer, alargar o campo de acção, adequar a estrutura aos novos desafios – Uma

proposta de estratégia para a ACAPO ....................................................................................... 101

3.1 A ACAPO na visão de sócios e utentes .......................................................................... 101

3.1.1 Identidade: uma associação representativa e prestadora de serviços ........................ 101

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3.1.2 Envolvimento e participação: aspecto a reforçar ..................................................... 104

3.2. Proposta de estratégia de médio prazo ........................................................................... 108

3.2.1 Situação actual e objectivos de mudança ................................................................. 108

3.2.2 Foco de acção ........................................................................................................... 113

3.2.3 Prioridades ............................................................................................................... 117

Conclusão .................................................................................................................................. 120

Bibliografia ............................................................................................................................... 134

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ÍNDICE DE TABELAS

Tabela 1. Inquiridos e população que não consegue ver, segundo o sexo ................................... 16

Tabela 2. Inquiridos, segundo a idade de aquisição da deficiência visual ................................... 16

Tabela 3. Inquiridos, segundo a causa da deficiência visual ....................................................... 17

Tabela 4. Inquiridos, segundo a tipologia de alterações nas funções .......................................... 17

Tabela 5. Inquiridos e população residente maior de 15 anos, segundo a categoria

socioprofissional e índice de sobre-(sub)representação .............................................................. 18

Tabela 6. Inquiridos, segundo a classificação socioprofissional do agregado doméstico de

origem, a idade de aquisição da deficiência e a trajectória social intergeracional ....................... 19

Tabela 7. Inquiridos em idade activa, segundo o meio de vida principal .................................... 20

Tabela 8. Inquiridos, segundo a importância de ter emprego e de não depender economicamente

de outros ...................................................................................................................................... 21

Tabela 9. Inquiridos, segundo a condição actual perante o trabalho ........................................... 22

Tabela 10. Gaps de actividade e de emprego .............................................................................. 23

Tabela 11. Inquiridos, segundo a condição perante o trabalho e propriedades sociais ................ 25

Tabela 12. Preditores de emprego dos inquiridos - Regressão logística binária .......................... 27

Tabela 13. Inquiridos, segundo os problemas sentidos no actual ou no último emprego e a idade

de aquisição da deficiência visual ............................................................................................... 36

Tabela 14. Inquiridos, segundo o benefício de apoios à criação de emprego para cidadãos em

idade activa e a idade de aquisição da deficiência ....................................................................... 39

Tabela 15. Inquiridos, segundo a importância atribuída aos afectos, à autonomia familiar e ao

convívio social............................................................................................................................. 40

Tabela 16. Inquiridos e população residente com mais de 16 anos, segundo o estado civil e

índice de sobre(sub)representação ............................................................................................... 41

Tabela 17. Inquiridos com idade superior a 30 anos, segundo o estado civil e a idade de

aquisição da deficiência .............................................................................................................. 42

Tabela 18. Inquiridos, segundo a intensidade de contactos face-a-face com pessoas com quem

não coabitam ............................................................................................................................... 43

Tabela 19. Inquiridos segundo a possibilidade de ter conversas íntimas ou sair para lazer com

alguém além do cônjuge .............................................................................................................. 44

Tabela 20. Inquiridos, segundo a possibilidade de ter conversas íntimas com alguém além do

cônjuge e idade ............................................................................................................................ 44

Tabela 21. Inquiridos, segundo a possibilidade de sair com alguém para lazer além do cônjuge e

idade ............................................................................................................................................ 45

Tabela 22. Inquiridos, segundo o Índice de vida social quotidiana e a idade de aquisição da

deficiência ................................................................................................................................... 46

Tabela 23. Inquiridos, segundo a frequência de Sociabilidades intra-domiciliares e práticas

culturais domésticas ou de saída ................................................................................................. 47

Tabela 24. Inquiridos que adquiriam a deficiência visual antes dos 15 anos, e população

residente, segundo o nível de escolaridade .................................................................................. 51

Tabela 25. Inquiridos que adquiriam a deficiência antes dos 15 anos, segundo as causas de

abandono escolar, idade de aquisição e tipo de deficiência visual .............................................. 54

Tabela 26. Inquiridos que dominam o braille, segundo a idade e idade de aquisição da

deficiência ................................................................................................................................... 55

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Tabela 27. Inquiridos que adquiriram a deficiência visual antes dos 15 anos, segundo o nível de

escolaridade e o domínio do braille ............................................................................................. 56

Tabela 28. Inquiridos empregados e população empregada em Portugal, segundo o nível de

sindicalização .............................................................................................................................. 58

Tabela 29. Inquiridos maiores de 18 anos, segundo o nível de interesse por política e o nível de

escolaridade ................................................................................................................................. 59

Tabela 30. Necessidades humanas e indicadores analisados na tipologia de qualidade de vida . 62

Tabela 31.Tipos sociais de qualidade de vida dos deficientes visuais ......................................... 66

Tabela 32. Inquiridos, segundo a forma como tomaram conhecimento da ACAPO ................... 70

Tabela 33. Inquiridos, segundo o primeiro contacto com a ACAPO .......................................... 71

Tabela 34. Inquiridos, segundo o tempo decorrido entre aquisição da deficiência e primeiro

contacto ....................................................................................................................................... 72

Tabela 35. Inquiridos, segundo o objectivo do primeiro contacto e os anos de contacto com a

ACAPO ....................................................................................................................................... 73

Tabela 36. Inquiridos, segundo a entrevista com os técnicos e os anos de contacto com a

ACAPO ....................................................................................................................................... 74

Tabela 37. Inquiridos, segundo o tipo de participação no plano de prestação de serviços e os

anos de contacto com a ACAPO ................................................................................................. 74

Tabela 38. População inquirida por frequência de contacto com técnicos no último ano, por

relação com a ACAPO ................................................................................................................ 75

Tabela 39. Inquiridos, segundo a relação com a ACAPO, usufruto de serviços, tempo de

usufruto dos serviços e/ou apoios ................................................................................................ 75

Tabela 40. Inquiridos, segundo as razões de não usufruto dos serviços (resposta múltipla)

...................................................................................................................................................................................

.76

Tabela 41. Inquiridos, segundo a existência de dificuldades no acesso ao apoio/serviço da

ACAPO ....................................................................................................................................... 77

Tabela 42. Inquiridos, segundo as dificuldades no acesso ao apoio/serviço da ACAPO (resposta

múltipla) ...................................................................................................................................... 78

Tabela 43. Inquiridos, segundo o tipo de serviços e apoios de que usufruíram/usufruem

(resposta múltipla) ....................................................................................................................... 79

Tabela 44. Inquiridos, segundo os serviços e apoios de que usufruíram/usufruem e o grau de

satisfação com os serviços ........................................................................................................... 80

Tabela 45. Inquiridos, segundo os serviços que trouxeram mais ganhos de conhecimentos ou

competências ............................................................................................................................... 83

Tabela 46. Inquiridos, segundo as médias da importância das mudanças de vida resultantes do

apoio/serviço ............................................................................................................................... 84

Tabela 47. Inquiridos, segundo o respeito dos técnicos pelas suas escolhas, opiniões e

preferências ................................................................................................................................. 85

Tabela 48. Inquiridos, segundo o respeito pelas suas escolhas, a prestação da informação e os

anos de contacto com a ACAPO ................................................................................................. 86

Tabela 49. Inquiridos, segundo as dimensões incluídas no conjunto de informações facultadas

sobre os direitos e responsabilidades ........................................................................................... 87

Tabela 50. Inquiridos, segundo as lacunas dos técnicos .............................................................. 87

Tabela 51. Inquiridos, segundo a identificação de lacunas dos técnicos e o tempo de recepção do

último serviço .............................................................................................................................. 88

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Tabela 52. Inquiridos, segundo a avaliação do serviço mais importante e das condições físicas

do espaço onde recebe ................................................................................................................. 89

Tabela 53. Tipos sociais de qualidade de vida, segundo a acessibilidade de transportes para a

delegação e tipos sociais de qualidade de vida dos deficientes visuais ....................................... 90

Tabela 54. Inquiridos, segundo os aspectos a melhorar no serviço mais importante .................. 91

Tabela 55. Inquiridos, segundo os principais apoios/serviços necessários que a ACAPO não

disponibiliza (resposta múltipla) ................................................................................................. 93

Tabela 56. Grupos de satisfação global dos serviços (%) ........................................................... 94

Tabela 57. Grupos de satisfação global dos serviços, segundo a satisfação global com os

serviços (médias) ......................................................................................................................... 95

Tabela 58. Inquiridos, segundo a opinião sobre quem deve escolher os técnicos de apoio

(resposta múltipla) ....................................................................................................................... 96

Tabela 59. Tipologia de efeitos dos serviços ............................................................................... 97

Tabela 60. Grupos de satisfação global dos serviços, segundo a média de Impactos por

dimensão ..................................................................................................................................... 98

Tabela 61. Grupos de satisfação global dos serviços, segundo o tipo de serviços usufruídos

...................................................................................................................................................................................

.99

Tabela 62. Grupos de satisfação global dos serviços segundo variáveis-chave ........................ 100

Tabela 63. Inquiridos, segundo o que consideram ser a identidade actual e desejável da ACAPO

................................................................................................................................................... 102

Tabela 64. Inquiridos que consideram importante reforçar a acção da ACAPO, segundo os

aspectos a reforçar ..................................................................................................................... 103

Tabela 65. Tipos sociais de qualidade de vida, segundo a sua relação com a ACAPO ............. 105

Tabela 66. Utentes, segundo a razão para não se tornarem sócios ............................................ 106

Tabela 67. Sócios que costumam votar nos processos eleitorais da ACAPO ........................... 107

Tabela 68. Inquiridos que são sócios da ACAPO, segundo o tipo e frequência de envolvimento

na associação ............................................................................................................................. 107

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INTRODUÇÃO

As políticas de reabilitação têm evoluído no sentido da promoção da

qualidade de vida dos cidadãos com deficiências e incapacidades pelo

aumento do seu nível de autonomia (vida independente) e da capacidade

de se representar a si próprio (auto-representação/ self advocacy). A

aplicação destes dois conceitos tem sustentado prioridades de política,

influenciado o desenho de programas e medidas e constituído referenciais

na organização, monitorização e avaliação das intervenções.

É neste quadro de mudança paradigmática que a ACAPO desenvolveu, em

parceria com a empresa de consultadoria e estudos de mercado PPLL

Consult, o estudo “A Prestação de Serviços e a Promoção da Vida

Independente” (PSPVI), realizado com o apoio do Programa Operacional de

Assistência Técnica (POAT), cofinanciado pelo Fundo Social Europeu (FSE)

e o Governo de Portugal.

O Estudo tem como objectivo a definição de um modelo sustentado de

prestação de serviços, numa lógica integrada e holística, orientado para a

procura e para as reais necessidades dos clientes e que privilegie a

racionalização e optimização dos recursos a envolver, focalizado na

promoção da autonomia, da vida independente e da qualidade de vida.

A concretização deste objectivo implica que o serviço prestado

corresponde à necessidade do cidadão servido e, por isso, que a

concepção, planeamento, prestação e avaliação deve estar centrada nele,

nas suas necessidades, na sua liberdade de escolha, na realização do seu

potencial e na sua satisfação.

Para o efeito operacionalizou-se o conceito de vida independente na

aproximação aos serviços de que os utentes da ACAPO beneficiam, de que

carecem e como os avaliam, visando o diagnóstico da relação das pessoas

com deficiência visual com as respostas sociais, numa perspectiva de

melhoria contínua da qualidade dos serviços prestados e

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do desenvolvimento de serviços e apoios ancorados nas necessidades e

nos contextos de quem os utiliza, orientados por princípios de

racionalidade e sustentabilidade.

Adoptou-se, para o desenvolvimento do trabalho, um dispositivo de

pesquisa empírica multimétodo: recorreu-se à análise documental e

exploração de informação estatística (dados dos Censos 2011, base de

dados dos associados da ACAPO); foi aplicado um inquérito por

questionário junto dos sócios e utentes da ACAPO e realizou-se um

conjunto de focus-groups.

O inquérito a sócios e utentes da ACAPO foi realizado junto dos que têm

mais de 16 anos pelos técnicos da ACAPO, que foram formados para o

efeito, tendo-se utilizado a técnica de amostragem snowball. A aplicação

do inquérito arrancou no dia 12 de Março e terminou no final do mês de

Maio de 2012.

A estrutura dos questionários foi desenhada para permitir apurar

resultados não só ao nível da eficácia e qualidade dos serviços, de forma a

fundamentar a tomada de decisão relacionada com o planeamento dos

mesmos, mas também em torno de indicadores capazes de produzir um

retrato social das pessoas com deficiência visual, da sua qualidade de vida

e autonomia.

Foram validados 1325 inquéritos, posteriormente inseridos no SPSS -

Statistical Package for the Social Sciences, programa a partir do qual foram

analisados os dados.

Foram realizadas 4 sessões de focus-group, envolvendo um total de 27

indivíduos, com o intuito de trabalhar em profundidade as conclusões do

estudo quantitativo e obter informação relevante no que concerne a

necessidades reais e, consequentemente, formular recomendações para a

(re)orientação da estratégia da ACAPO enquanto prestadora de serviços.

As sessões de focus-group tiveram a seguinte estruturação: duas sessões

reuniram utentes de zonas com fácil acesso aos serviços e duas outras

dedicaram-se aos utentes de zonas com difícil acesso; os grupos

homogéneos foram constituídos, um por pessoas com deficiência

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congénita ou manifestada em idade precoce e outro por pessoas com

deficiência adquirida na vida adulta.

A partir da análise dos dados dos estudos quantitativo e qualitativo

desenhou-se uma proposta de estratégia de acção, que foi validada com

representantes da ACAPO.

Assim, os resultados deste estudo são aqui apresentados em três capítulos.

O primeiro capítulo, naturalmente o mais longo, reporta-se à qualidade

de vida e ao acesso à vida independente e analisa a situação social dos

inquiridos e participantes nos focus-group. A análise é focalizada em

algumas dimensões fulcrais em que se joga a identidade pessoal e social

deste grupo, incluindo o seu estatuto socioprofissional e relação com o

mercado de trabalho, a sua vida familiar e participação em redes sociais

informais, o nível de escolaridade atingido e os obstáculos encontrados na

escolarização, o acesso a recursos comunicacionais e informacionais,

incluindo o domínio do braille e a participação na vida cívica, sindical e

política. Este capítulo termina com uma tipologia da situação social dos

inquiridos.

O segundo capítulo incide sobre a relação com os serviços prestados pela

ACAPO e os seus impactos na vida das pessoas que deles beneficiam. Nele

se analisa o modo de aproximação a esses serviços, a relação estabelecida

com a ACAPO e se estuda a avaliação pelos cidadãos servidos do tipo de

serviços recebidos, da orientação subjacente à sua prestação ao impacto

nas suas vidas.

O terceiro capítulo inclui as reflexões da equipa do estudo e uma proposta

de estratégia de acção da ACAPO, partindo da sua identidade, tal como

definida pelos inquiridos e propondo um foco estratégico, prioridades e

objectivos para a sua acção a médio prazo.

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I. QUALIDADE DE VIDA E VIDA INDEPENDENTE –

A SITUAÇÃO SOCIAL DOS DEFICIENTES

VISUAIS

Neste estudo entende-se a deficiência como um fenómeno social que se

caracteriza pela interacção entre propriedades individuais (alteração de

estruturas e funções do corpo) e as dinâmicas sociais (participação na vida

em sociedade) e que gera uma categoria social apenas e só na medida em

que quem partilhe as referidas alterações de estruturas e funções do corpo

tenha, com origem na referida interacção, probabilidades diferentes de

participação social das que se abrem a quem não tem essas alterações.

O modelo que assim entende a deficiência, canonicamente designado

“bio-psico-social” (Engel, 1977) foca-se no carácter relacional da

deficiência (Bickenbach,1993:36), noção que Luís Capucha retomou para

designar esta abordagem de “modelo relacional”, melhorando a

focalização da designação para efeitos de teoria sociológica.

1.1 MODELO RELACIONAL DE DEFICIÊNCIA, QUALIDADE DE VIDA

E VIDA INDEPENDENTE

O modelo relacional entende a deficiência “como uma diferença específica

característica de cidadãos que são iguais a quaisquer outros em direitos e

deveres, diferença essa que gera discriminação produtora de

desigualdades nas diferentes esferas da vida social.” (Capucha, 2010:

38).

Nesta perspectiva, não se trata de reduzir a alteração de estruturas e

funções do corpo a diferenças sociais (como em versões radicais do

modelo social da deficiência1), mas de questionar que haja

1 Uma apresentação crítica dos modelos médico, social e bio-psico-social da deficiência pode ser encontrada em Sousa et al, 2007, capítulo 3.

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determinantes “naturais” da diferença social que se construiu a seu

propósito. Na ausência de tais determinantes, são questionadas as

relações sociais (ao nível micro e macrosocial) que se estabeleceram sob

influência do modelo médico nas nossas sociedades e tenderam a reduzir

o deficiente à condição de “paciente” e a estimular a sua

dependência. Por isso, o modelo relacional da deficiência pode ser

accionado para entender o movimento da auto-representação (self

advocacy) de cidadãos com deficiência e a promoção da sua autonomia

pessoal, tal como proposto pelo movimento da vida independente.

Na definição de Adolf Ratzka, a vida independente “é uma filosofia e um

movimento de pessoas com deficiências que trabalha para a auto-

determinação, a igualdade de oportunidades e o respeito por si mesmo”

(Ratzka, 2007). Nomeadamente, centrando-se no controlo sobre a própria

vida e na integração na comunidade. Prossegue Ratzka, “a vida

independente significa que queremos ter as mesmas escolhas e o mesmo

controlo das nossas vidas quotidianas que os nossos irmãos e irmãs,

vizinhos e amigos e amigas não deficientes dão por adquiridos. Queremos

crescer nas nossas famílias, ir à escola da vizinhança, usar os mesmos

autocarros que os nossos vizinhos, trabalhar em empregos adequados à

nossa educação e interesses e constituir as nossas próprias famílias”

(Ratzka, 2007).

É da vida independente como objectivo e desenvolvimento de serviços

para a sua promoção que se tratará neste estudo. O que se fará partindo

do conceito de qualidade de vida. Este conceito tem capacidade heurística

para nos dar uma visão abrangente da situação social das pessoas com

deficiência e, no caso deste estudo, das pessoas com deficiência visual,

uma vez que parte das necessidades humanas e aborda os diferentes

domínios em que se joga o bem-estar.

Existem múltiplas formulações do conceito de qualidade de vida. Neste

estudo utilizamos especialmente os contributos de Robert L. Schalock

(1996, 1997, 2007), que aplicaram o conceito à situação das pessoas com

deficiências de desenvolvimento, do Programa de Saúde Mental da

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Organização Mundial de Saúde (WHOQOL, 1997) e da equipa

multidisciplinar da Universidade de Vermont (Constanza et al, 2006),

retomando a perspectiva adoptada na proposta de estratégia de acção para

as pessoas com deficiências e incapacidades em Portugal (Sousa et al,

2007).

Na perspectiva aqui desenvolvida, a qualidade de vida resulta da

satisfação de diferentes necessidades humanas, pela disponibilização de

oportunidades dessa satisfação e geração associada de níveis mais

elevados de bem-estar.

As necessidades humanas sistematizadas pela equipa da Universidade de

Vermont como necessidades de subsistência, reprodução, segurança,

afecto, compreensão, participação, lazer, espiritualidade, criatividade,

identidade e liberdade foram agrupadas neste estudo por referência à

categorização proposta por Erik Allardt (1993), que as agrupa em três

dimensões, a saber having (ter), loving (ligações) e being (ser).

A dimensão ter das necessidades humanas remete para os aspectos

materiais e analisaremos, a este respeito, as pertenças e trajectórias

sociais, a origem dos rendimentos, a participação no mercado de trabalho.

A dimensão das ligações diz respeito ao contacto social próximo, bem

como à possibilidade de ter uma vida dotada de sentido junto com outrem,

pelo estabelecimento de laços afectivos e a construção de uma identidade

pessoal através da participação na vida social. Nesta dimensão focamo-

nos na vida familiar, na integração em redes sociais, na intensidade da

vida social quotidiana fora do espaço doméstico e nas

práticas de lazer.

A dimensão do ser refere-se ao controlo sobre a própria vida, no que

incorpora a importância da vida independente (Ratzka, 2007), a

necessidade de integração na sociedade e de viver com a natureza

(participação em decisões e actividades que influenciam a sua própria

vida, actividades políticas, oportunidades de descanso e lazer, uma vida

que tenha sentido para si mesmo, poder disfrutar da natureza).

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O presente capítulo encontra-se estruturado em função das dimensões

apresentadas, numa interpretação da equipa do estudo que por vezes

transgride as fronteiras originalmente definidas na especificação das

dimensões do conceito e procedendo à análise dos indicadores de cada

dimensão recolhidos no questionário e nos focus-group.

1.2 ESTATUTO SOCIOPROFISSIONAL, MEIO DE VIDA E INSERÇÃO NO

MERCADO DE TRABALHO

Os associados e utentes da ACAPO inquiridos no estudo (doravante

designado por PSPVI) apresentam um perfil demográfico algo distinto da

população portuguesa com deficiência visual. Os deficientes visuais

inquiridos são maioritariamente homens (56%), verificando-se uma taxa

de masculinização superior à da população portuguesa com deficiência

visual, uma vez que, de acordo com os censos de 2011, os homens

representam 43% das pessoas que não conseguem ver2 e as mulheres 57%.

2 Os dados dos Censos 2011 utilizados ao longo deste estudo referem-se exclusivamente às pessoas que não conseguem ver. Tomou-se esta opção uma vez que o tratamento da temática da incapacidade foi abordado pela primeira vez nas operações censitárias, isto é, a avaliação baseada em diagnósticos de deficiências, foi substituída pela primeira vez por uma auto-avaliação que privilegia a funcionalidade e a incapacidade como o resultado de uma interacção dinâmica entre a pessoa e os factores contextuais. O número muito elevado de pessoas que declararam ter muita dificuldade em ver resulta de uma incapacidade do Censos para captar a diferença entre quem tem baixa visão ou apenas dificuldades de visão, inutilizando, na nossa opinião, a possibilidade de usar as respostas como aproximação à prevalência da baixa visão.

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Tabela 1. Inquiridos e população que não consegue ver, segundo o sexo

Fontes: Inquérito PSPVI; Censos 2011

No que diz respeito à distribuição etária constata-se que estamos perante

uma população mais nova que a população que não consegue ver. A

população portuguesa que não consegue ver tem maioritariamente mais

de 65 anos (61%) e no seio dos deficientes visuais inquiridos a

percentagem de pessoas cegas com 65 ou mais anos é apenas de 20%.

Tabela 2. Inquiridos, segundo a idade de aquisição da deficiência visual

Idade de aquisição da deficiência PSPVI

(%)

Até 5 anos 42,0

6 a 14 anos 15,1

15 a 24 anos 12,3

25 a 49 anos 20,7

Mais de 50 anos 9,9

Total 100,0

N 1320

Fonte: Inquérito PSPVI

A aquisição da deficiência numa etapa precoce da vida, devido a doença

ou hereditariedade (Tabela 3) constitui de igual modo elemento

característico desta população. Cerca de 40% dos deficientes visuais

inquiridos, adquiriram a deficiência visual até aos cinco anos de idade,

sendo que 35% a adquiriu até ao primeiro ano de idade.

PSPVI

(%)

População residente maior de 15 anos que

não consegue ver (Censos 2011) (%)

Masculino 55,7 43,0

Sexo Feminino 44,3 57,0 Total 100,0 100,0 16-29 anos 12,5 5,9

Idade 30-64 anos 68,0 32,9 Mais de 65 anos 19,5 61,2 Total 100,0 100,0

N 1325 27015

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Tabela 3. Inquiridos, segundo a causa da deficiência visual

Fonte: Inquérito PSPVI

Para além da deficiência visual, registam-se casos de coexistência de

alterações ao nível de outras funções3.

Tabela 4. Inquiridos, segundo a tipologia de alterações nas funções

Alterações nas funções PSPVI

(%)

Sensoriais e da Fala e Deficiência visual 4,0

Multifunções Físicas e Deficiência visual 34,3

Multifunções Mentais e Deficiência Visual ,8

Multifunções Físicas e Sensoriais e da Fala 10,4

Multifunções Mentais e Sensoriais e da Fala ,3

Multifunções Físicas, Mentais e Deficiência Visual 2,3

Multifunções Físicas e Sensoriais e da Fala e Mentais 1,4

Deficiência Visual 46,4

Total 100,0

N 1325

Fonte: Inquérito PSPVI

Cerca de 34% dos deficientes visuais inquiridos tem igualmente alterações

nas multifunções físicas e cerca de 10% tem alterações nas multifunções

físicas e ainda alterações noutras funções sensoriais para além da visão. O

quadro de coexistência de alterações nas funções é

3 Utilizando a CIF como referencial teórico, foram incluídas questões no inquérito sobre alterações nas dezasseis funções do corpo (classificação de segundo nível, na qual são identificados os “subtipos” das funções do corpo), excluindo a função visual. Tendo em conta o elevado número de categorias optou-se por desenvolver uma tipologia agregada das alterações ao nível das funções. Assim, as Funções Sensoriais e da Fala correspondem à agregação das alterações ao nível das funções da Audição, da Fala e funções sensoriais adicionais; as Multifunções Físicas englobam as alterações ao nível das Funções do aparelho cardiovascular, do Sistema hematológico e imunológico, do Aparelho respiratório e digestivo, Sistemas metabólico e endócrino, Funções geniturinárias e reprodutivas, Funções das articulações e dos ossos, Funções musculares, Funções relacionadas com o movimento e Funções da pele e estruturas relacionadas. Por fim, as Multifunções Mentais englobam a Função intelectual e a Função mental.

Causa da deficiência visual PSPVI

(%)

Hereditariedade 34,4

Gravidez e Parto 7,1

Doença 45,3

Acidentes 11,2

Outra 2,0

Total 100,0

N 1186

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mais comum nos inquiridos mais velhos, sendo que cerca de 40% dos

inquiridos com alterações físicas e sensoriais tem mais de 65 anos.

1.3 PERTENÇAS E TRAJECTÓRIAS SOCIAIS

A pertença social dos inquiridos foi determinada com recurso à sua

categoria socioprofissional4, bem como da sua família de origem, que

representam indicadores fundamentais da classe social.

As três situações mais frequentes na posição social são a de empregado

executante (36%), operário industrial (17%) e profissional técnico e de

enquadramento (15%), o que situa os inquiridos predominantemente na

classe média e nas classes populares. Mas não deve esquecer-se que há um

grupo significativo (19%) que não tem pertença social própria, dado nunca

ter participado no mercado de trabalho, correspondendo a uma situação

de desclassificação socioprofissional, como acontece a todos os que nunca

foram activos ao longo das suas vidas.

Tabela 5. Inquiridos e população residente maior de 15 anos, segundo a categoria

socioprofissional e índice de sobre-(sub)representação

População

Índice de sobre- (sub)representa

ção (1)/(2)

PSPVI PSPVI com residente maior (%) CSP (%) de 15 anos com

(1) CSP (%) (2)

Empresários, Dirigentes e Profissionais Liberais 6,1 7,5 14,7 0,5 Profissionais Técnicos e de Enquadramento 15,0 18,5 22,5 0,8 Trabalhadores Independentes 3,9 4,8 5,0 1,0 Agricultores Independentes 1,5 1,9 0,9 2,1

Empregados Executantes 35,8 44,2 32,4 1,4

Operários Industriais 17,1 21,1 22,7 0,9

Assalariados Agrícolas 1,7 2,1 1,8 1,2 Não tem categoria socioprofissional 18,9 - - -

Total 100,0 100,0 100,0 1,0

N 1323 1073 4328697 -

Fontes: Inquérito PSPVI; Censos 2011

4 Para a determinação desta categoria, usa-se a “tipologia ACM” que cruza profissão e situação na profissão (ver Almeida, Costa e Machado, 1994).

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A comparação da categoria socioprofissional dos inquiridos com a

população portuguesa mostra o confinamento dos deficientes visuais às

classes médias e populares. A proporção de empresários, dirigentes e

profissões liberais entre os inquiridos é apenas metade da que têm na

população em geral e a proporção de empregados executantes atinge o

dobro do que ocorre na população em geral.

A trajectória intergeracional dos inquiridos mostra uma dinâmica social

descendente.

Tabela 6. Inquiridos, segundo a classificação socioprofissional do agregado doméstico de origem,

a idade de aquisição da deficiência e a trajectória social intergeracional

CSP do

agregado

doméstico

de origem

Idade de

aquisição da

deficiência

Trajectória social intergeracional (%)

Ascendente Estável Descendente Exclusão Total N

Empresários, Dirigentes e

Profissionais

Liberais

Total - 12,7 68,7 18,7 100 150

> 30 anos - 11,7 64,8 23,4 100 111

Profissionais

Técnicos e de

Enquadramento

Total 7,5 29 45,7 17,8 100 107

> 30 anos 8,6 27,1 41,9 22,2 100 81

Trabalhadores

Independentes Total 7,9 23,7 52,5 15,8 100 101

> 30 anos 2,6 27,7 48,7 21,1 100 76

Trabalhadores

Independentes

Pluriactivos

Total 8,8 19,3 47,4 24,6 100 57

> 30 anos 7 13,9 48,9 30,2 100 43

Agricultores

Independentes

Assalariados Agrícolas

Total 5,2 27,4 52,4 15 100 193

> 30 anos 1,6 25,4 55,7 17,2 100 122

Agricultores

Independentes

Pluriactivos

Total 3,7 7,4 59,2 29,6 100 27

> 30 anos 0 10 55 35 100 20

Empregados

Executantes Total 24,7 56,2 - 19,2 100 146

> 30 anos 22,2 53,7 - 24,1 100 108

Operários

Industriais

Total 14 61,6 - 24,4 100 258

> 30 anos 11,1 61,6 - 27,2 100 206

Assalariados Agrícolas

Total 20,7 67,5 - 11,7 100 111

> 30 anos 21,7 63,5 - 14,9 100 74

Assalariados Executantes Pluriactivos

Total 21,6 61,6 - 16,8 100 125

> 30 anos 19,2 62,5 - 18,3 100 104

Total Total 11,4 36,6 32,6 19,4 100 1275

> 30 anos 9,4 35,7 31,5 23,4 100 945

Fonte: Inquérito PSPVI

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A tendência predominante é para uma trajectória socioprofissional

descendente para os grupos sociais mais elevados (empresários,

dirigentes e profissões liberais, profissões técnicas e de enquadramento,

trabalhadores independentes e agricultores independentes) e de

estabilização dentro dos grupos menos favorecidos (empregados

executantes, operários industriais e assalariados agrícolas).

A segunda trajectória mais frequente é da exclusão do mercado de

trabalho. Esta trajectória descendente ou de exclusão associa-se à

dependência de prestações sociais. Perto de metade dos inquiridos em

idade activa tinham como principal meio de vida no momento da

inquirição uma prestação social e apenas cerca de um terço vivia de

rendimentos do trabalho ou da propriedade.

Tabela 7. Inquiridos em idade activa, segundo o meio de vida principal

Meio de vida principal PSPVI

(%)

Depende da família 15,6

Vive de rendimentos do trabalho ou da propriedade 31,5

Vive de pensão de reforma ou outra prestação da segurança social 49,2

Outro meio de vida 3,8

Total 100,0

N 1066

Fonte: Inquérito PSPVI

Pode argumentar-se com a importância da protecção social na definição

das condições de vida do grupo como contra-argumento em relação à

exclusão do estatuto socioprofissional. Mas nas sociedades salariais

(Castel, 1995), em que a protecção contra os riscos sociais está

predominantemente dependente do estatuto ocupacional, a

marginalização do emprego reflecte-se na perda de estatuto social e em

trajectórias de mobilidade social descendente.

Não ignoramos que, como já foi demonstrado, o sistema de protecção

social na deficiência em Portugal é um dos que consome mais recursos na

zona da OCDE (Pimenta e Salvado, 2010), embora as prestações que

produz sejam de montantes baixos (Fontes, 2009). Mas a protecção social,

se vista como alternativa à obtenção de um estatuto

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socioprofissional, procede a um fechamento de oportunidades, e é uma

estratégia que marginaliza, por naturalizar o lugar simbólico das pessoas

com deficiência como sendo fora do mercado de trabalho e a cargo de

benefícios públicos e solidariedades privadas (Capucha et al, 2004: 10),

mesmo que garantisse – e não o consegue - recursos necessários.

Essa exclusão do mercado de trabalho é imposta aos inquiridos e não o

resultado de uma interiorização dessa exclusão como associada à sua

identidade. Para cerca de 95% dos inquiridos em idade activa, ter emprego

é importante ou muito importante e para 99% é importante ou muito

importante não depender economicamente de outros.

Tabela 8. Inquiridos, segundo a importância de ter emprego e de não depender economicamente

de outros

Importância Importância de ter emprego em

que possa exercitar as suas competências (%)

Importância de não depender economicamente de outros (%)

Nada importante 2,6 0,3

Pouco importante 2,6 0,8

Importante 18,0 18,4

Muito importante 76,8 80,5

Total 100,0 100,0

N 960 1307

Fonte: Inquérito PSPVI

Os inquiridos têm também a percepção de que a aquisição da deficiência

piorou a sua situação financeira, o que é coerente com as trajectórias

sociais identificadas.

Os inquiridos que adquiriram deficiência visual depois dos 15 anos

manifestaram que a sua situação financeira piorou (42%) ou piorou muito

(37%) desde a aquisição da deficiência. Apenas 18% consideram que

melhorou e 3% que melhorou muito.

A informação analisada liga a deficiência visual a uma trajectória social

predominantemente descendente ou de exclusão e à percepção da

vivência da deficiência como perda de segurança material.

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1.4 PARTICIPAÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO

A participação no mercado de trabalho tem grande centralidade nas

sociedades contemporâneas, em diversas dimensões da construção da

identidade social, pelo que importa aprofundar o conhecimento sobre os

factores que influenciam negativa ou positivamente a possibilidade de

acesso a esse mercado por parte dos inquiridos em idade activa.

1.4.1 DESIGUALDADE DE OPORTUNIDADES DE ACESSO

Globalmente, a proporção de inquiridos em idade activa que participavam

no mercado de trabalho no momento em que se realizou o inquérito, seja

como empregados ou desempregados era baixa.

Tabela 9. Inquiridos, segundo a condição actual perante o trabalho

Condição perante o trabalho PSPVI

(%)

Exerce uma profissão ou trabalha (está empregado) 32,9

Desempregado ou está à procura do primeiro emprego 13,1

Reformado/a ou está em pré-reforma 39,4

Estudante 6,2

Em formação ou medida de política activa de emprego 6,0

Doméstico/a 1,9

Noutra situação ,6

Total 100,0

N 1067

Fonte: Inquérito PSPVI

A comparação da condição actual perante o trabalho dos inquiridos com

a da população activa no mesmo período temporal (tabela 10) evidencia a

existência de um gap de participação no emprego (gap da taxa de

emprego) e de inclusão no mercado de trabalho (gap da taxa de

actividade).

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Tabela 10. Gaps de actividade e de emprego

Fontes: Inquérito PSPVI; Censos 2011; Eurostat

A taxa de actividade da população de 15-64 anos medida pelo Eurostat era

de 73,8% no 1º trimestre de 2012 e a dos deficientes visuais inquiridos

entre Março e Maio de 2012 era de 46%. A diferença poderia

eventualmente dever-se a enviesamentos da amostra, uma vez ela tratar

de pessoas que se organizaram em torno de uma associação. Mas usando

como controlo as pessoas que não conseguem ver, verifica-se

que a diferença dos indicadores é de uma ordem de grandeza comparável.

O gap de actividade entre os inquiridos e a população total é de 38% e o

das pessoas que não vêem de 42%, enquanto o gap de emprego é

respectivamente de 48% e 42% num e noutro grupo.

Em estudos anteriores, argumentámos que os efeitos próprios das

desigualdades sociais podem ser medidos no mercado de trabalho pela

análise de gaps de participação de certos grupos em relação a outros e que

esses gaps são o resultado de estereótipos e preconceitos, normas jurídicas

discriminatórias, relações sociais rotinizadas, não adaptação a limitações

individuais e dos efeitos cumulativos de todas estas dimensões no acesso

às competências, e, articuladamente, às oportunidades no mercado de

trabalho (Pedroso et al, 2005, Pedroso,

2010). Assim, os deficientes visuais configuram um grupo social com

desvantagem no acesso ao mercado de trabalho, sabendo-se que não

aceder ao mercado de trabalho é, como sublinhou Richard Jenkins, o

primeiro indicador da marginalização social global da população

deficiente (Jenkins, 1991:42).

Inquiridos em idade

activa com deficiência

visual (Inquérito

PSPVI) (1)

População residente em Portugal com

15 anos ou mais que não consegue ver (Censos 2011)

(2)

População em idade activa

Total em Portugal

Continental (Eurostat 1º trimestre de

2012) (3)

Gap dos

inquiridos

((3)-(1))/(3)

Gap das pessoas que não

vêem ((3)-

(2))/(3)

Taxa de Actividade

46% 42,5% 73,8% 37,7% 42,4%

Taxa de Emprego 32,9% 36,4% 62,9% 47,7% 42,1%

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A análise descritiva da relação entre indicadores de propriedades sociais

e condição actual perante o trabalho (tabela 11)5 evidenciou um conjunto

de correlações significativas, bem como a variação da classe modal da

condição perante o trabalho em função das propriedades sociais dos

inquiridos.

Nas variáveis analisadas que estão fortemente correlacionadas com a

condição perante o trabalho, as modalidades em que a situação de

empregado é a classe modal são as seguintes:

Ter 30 a 49 anos (44%);

Ter ensino superior ou médio (67%) ou secundário (46%);

Ser Profissional Técnico e de Enquadramento (59%); Empregado

Executante (49%) ou Empresário, Dirigente ou Profissionais

Liberal (47%);

Ter adquirido a deficiência visual antes dos 5 anos (44%);

Não acumular outra deficiência com a deficiência visual (46%);

Ser autónomo no quotidiano, o que inclui a realização de tarefas do

dia-a-dia, tratar da higiene pessoal, entre outras actividades (42%);

Ser autónomo na mobilidade, o que implica subir e descer escadas

e andar em locais não familiares (47%);

Dominar o braille (43%);

Utilizar computador (47%);

Usar a internet (51%).

5 Desta análise são excluídos os estudantes, uma vez que se pretende analisar os factores que promovem ou dificultam a inserção no mercado de trabalho e estes não terem sido excluídos desse mercado mas estarem numa fase de investimento, seja ela prévia ou intercalar, para o ingresso nele.

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Tabela 11. Inquiridos, segundo a condição perante o trabalho e propriedades sociais

Nota: ***= p ≤ 0.001; ** = p ≤ 0.01; * = p ≤ 0.05 Fonte: Inquérito PSPVI

Variável Categorias Empregados

(%) Desempregados

(%) Inactivos

(%) Total (%)

Sexo Feminino 31,5 15,5 53,0 100,0 Masculino 38,0 12,7 49,3 100,0

16-29 anos 22,6 36,8 40,6 100,0 Escalão etário*** 30-49 anos 43,9 16,8 39,4 100,0

Mais de 50 anos 26,7 3,9 69,4 100,0 1º ciclo ou menos 5,3 6,3 88,4 100,0

Escolaridade*** 2º e 3º ciclo 27,1 16,2 56,8 100,0 Ensino Secundário 46,4 18,3 35,4 100,0

Ensino Médio e Superior 67,2 11,8 21,0 100,0 Empresários, Dirigentes e

Profissionais Liberais 47,4 12,3 40,4 100,0

Categoria socioprofissional ***

Profissionais Técnicos e de Enquadramento

59,4 11,2 29,4 100,0

Trabalhadores Independentes 19,4 9,7 71,0 100,0 Agricultores Independentes ,0 10,0 90,0 100,0

Empregados Executantes 48,9 13,0 38,2 100,0 Operários Industriais 12,4 15,7 71,9 100,0 Assalariados Agrícolas 7,7 ,0 92,3 100,0

Empresários, Dirigentes e Profissionais Liberais

40,0 12,4 47,6 100,0

Profissionais Técnicos e de Enquadramento

33,3 18,4 48,3 100,0

Trabalhadores Independentes 39,4 15,5 45,1 100,0

Categoria socioprofissional do agregado doméstico de origem

Trabalhadores Independentes Pluriactivos

39,0 7,3 53,7 100,0

Agricultores Independentes 36,4 6,2 57,4 100,0

Agricultores Independentes Pluriactivos

15,0 10,0 75,0 100,0

Empregados Executantes 35,6 18,6 45,8 100,0 Operários Industriais 32,2 14,7 53,1 100,0 Assalariados Agrícolas 32,9 11,8 55,3 100,0

Assalariados Executantes Pluriactivos

41,0 18,1 41,0 100,0

Não sabe/Não responde 21,1 15,8 63,2 100,0 1º ciclo ou menos 33,4 11,1 55,5 100,0

Escolaridade mais elevada dos pais***

2º e 3º ciclo 38,2 20,6 41,2 100,0 Ensino Secundário 42,3 30,8 26,9 100,0 Ensino Médio e Superior 37,9 25,9 36,2 100,0

Escolaridade dos pais desconhecida

45,5 9,1 45,5 100,0

Agregado doméstico***

Sozinho ou com família própria

40,5 10,0 49,4 100,0

Agregado de origem 22,7 23,4 53,8 100,0

Deficiência visual *

Baixa visão 34,1 17,6 48,2 100,0 Cegueira 35,8 11,0 53,2 100,0

Outra deficiência***

Sim 24,3 12,5 63,2 100,0 Não 46,1 15,6 38,4 100,0

Idade de aquisição da deficiência visual ***

0-5 anos 44,4 19,6 35,9 100,0 6-15 anos 34,6 14,8 50,6 100,0 16-29 anos 35,4 9,0 55,6 100,0 Mais de 30 anos 15,6 5,2 79,1 100,0

Autonomia no quotidiano***

Sim 41,5 15,3 43,2 100,0 Não 14,6 9,6 75,8 100,0

Autonomia na comunicação***

Sim 38,1 15,6 46,3 100,0 Não 23,3 7,6 69,0 100,0

Autonomia na mobilidade***

Sim 47,0 17,4 35,6 100,0 Não 25,6 11,1 63,3 100,0

Braille*** Sim 43,3 15,3 41,4 100,0 Não 22,3 11,9 65,7 100,0

Utilização de computador***

Sim 47,7 17,2 35,2 100,0 Não 14,3 8,7 77,0 100,0

Internet*** Sim 50,6 16,4 33,1 100,0 Não 16,6 11,2 72,2 100,0

Rede social*** Sim 38,9 15,0 46,1 100,0 Não 23,1 10,9 66,0 100,0

Vida social** Sim 41,8 14,7 43,5 100,0

Não 31,4 13,7 55,0 100,0

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Nas mesmas variáveis, as modalidades em que a situação de inactivo é

a classe modal são as seguintes:

Ter 50 anos ou mais (69%) ou menos de 30 anos (41%);

Ter o 1º ciclo ou menos (69%) ou o 2º ou o 3º ciclo do ensino

básico (88%);

Ser Assalariado Agrícola (92%); Agricultor Independente (90%);

Operário Industrial (72%) ou Trabalhador Independente (71%);

Ter adquirido a deficiência visual com mais de 30 anos (79%);

entre os 16 e os 29 anos (56%) ou entre os 6 e os 15 anos (51%);

Acumular outra deficiência com a deficiência visual (63%);

Não ser autónomo no quotidiano, o que inclui a realização de

tarefas do dia-a-dia, tratar da higiene pessoal, entre outras

actividades (76%);

Não ser autónomo na mobilidade, o que implica subir e descer

escadas e andar em locais não familiares (63%);

Não dominar o braille (66%);

Não utilizar computador (77%);

Não usar a internet (72%).

A análise descritiva identifica um conjunto de propriedades sociais

correlacionadas com a exclusão do emprego dos deficientes visuais, em

que avultam variáveis que são também discriminatórias no universo da

população em geral (como a escolaridade, a idade, a situação

socioprofissional e a info-exclusão) a par de outras que estão associadas à

natureza da deficiência ou à adaptação às limitações estruturais

provocadas por ela (como a autonomia no quotidiano ou na mobilidade e

o domínio do braille). Registe-se que nesta análise não são visíveis nem o

efeito de género nem da categoria socioprofissional da família de origem.

As variedades de propriedades sociais foram consideradas de forma

integrada num modelo estatístico, pretendendo prever que efeito terá

cada uma delas nas oportunidades de um deficiente visual em idade activa

que não seja estudante se encontrar empregado (ver tabela 12). A variável

dependente é dicotómica, pelo que é apropriado utilizar a regressão

logística binária, tomando como variáveis independentes as variáveis

referentes às propriedades sociais.

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Tabela 12. Preditores de emprego dos inquiridos - Regressão logística binária

Variável Categorias B S.E. Wald Sig. Exp(B)

Deficiência visual

Cego 0,137 0,218 0,392 0,531 1,146

Quotidiano

comunicação

mobilidade

próprio*

socioprofissional

e Profissionais Liberais

de Enquadramento

Independentes

Independentes

e Profissionais Liberais

de Enquadramento

Independentes

do agregado de Independentes

Executantes

Nota: ***= p ≤ 0.001; ** = p ≤ 0.01; * = p ≤ 0.05 Fonte: Inquérito PSPVI

Tem outra deficiência** -0,545 0,195 7,862 0,005 0,58 Sexo masculino*** 0,676 0,198 11,666 0,001 1,965 Ter com quem sair 0,378 0,234 2,613 0,106 1,459

Autonomia no -0,368

0,294 1,563 0,211 0,692

Autonomia na -0,265

0,272 0,945 0,331 0,767 27

Autonomia na 0,255

0,201 1,61 0,204 1,291

Agregado doméstico 0,57

0,236 5,838 0,016 1,768

Domina Braille 0,428 0,232 3,411 0,065 1,534

Utiliza computador 0,375 0,382 0,965 0,326 1,456

Utiliza a Internet 0,487 0,352 1,916 0,166 1,628

2º/3º ciclo*** 1,421 0,388 13,446 0 4,141

Escolaridade Ensino Secundário*** 1,95 0,414 22,211 0 7,029

Ensino superior*** 3,166 0,503 39,683 0 23,706

Escalão etário 16-29 anos -0,568 0,375 2,291 0,13 0,567

Mais de 50 anos -0,337 0,225 2,237 0,135 0,714

Idade de 6 – 15 anos -0,168 0,272 0,383 0,536 0,845

aquisição da

deficiência 16 – 29 anos -0,408 0,251 2,631 0,105 0,665 visual

Mais de 30anos*** -1,202 0,28 18,408 0 0,301

Empresários, Dirigentes -0,579

0,398 2,115 0,146 0,561

Profissionais Técnicos e -0,601

0,329 3,344 0,067 0,548

Categoria Trabalhadores -0,793

0,532 2,22 0,136 0,453

do próprio Agricultores -21,372

10642,24 0 0,998 -

Operários Industriais*** -1,436 0,303 22,449 0 0,238

Assalariados Agrícolas -0,834 1,112 0,562 0,454 0,435

Não tem -21,105 2841,004 0 0,994 -

Empresários, Dirigentes -0,152

0,345 0,193 0,661 0,859

Profissionais Técnicos e -0,512

0,388 1,74 0,187 0,599

Trabalhadores 0,039

0,395 0,01 0,922 1,04

Trabalhadores Independentes -0,018

0,484

0,001

0,97

0,982

Categoria Pluriactivos

socioprofissional Agricultores 0,437

0,341 1,643 0,2 1,548

origem Agricultores Independentes -0,676

0,803

0,709

0,4

0,509

Pluriactivos

Empregados -0,104

0,334 0,097 0,755 0,901

Assalariados Agrícolas 0,264 Assalariados Executantes 0,282 Pluriactivos

0,399

0,333

0,437

0,717

0,508

0,397

1,302

1,326

Escolaridade 2º/3º ciclo* -0,498 0,259 3,715 0,054 0,607

mais alta do Ensino Secundário 0,409 0,658 0,385 0,535 1,505

agregado de Ensino superior -0,464 0,425 1,191 0,275 0,629

origem Desconhecida 0,842 0,499 2,85 0,091 2,32

Constant -2,444 0,56 19,059 0 0,087

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Este modelo estatístico permite verificar que variáveis actuam como

preditores significativos das oportunidades de estar empregado,

eliminando efeitos de ocultação que resultam da interacção com outras

variáveis. Caso não haja relação estatística significativa, aceita-se a

hipótese nula de que a variável referente àquela propriedade social e a

variável “estar empregado” são independentes. Caso haja relação

estatisticamente significativa, rejeita-se a hipótese nula, o que implica

aceitar que a variável em causa é preditora da situação da pessoa perante

o emprego e estuda-se o rácio de probabilidade (“odds ratio”) que nos

indica em quanto varia a probabilidade de estar empregado com a

variação da variável independente em causa.

Se o rácio de probabilidade é inferior a 1, tal significa que a

probabilidade é menor que na categoria de referência. Se é superior a 1,

tal significa que a probabilidade é maior que na categoria de referência.

A categoria de referência, por sua vez, é aquela que foi identificada

como 0 na definição da variável, quando a variável independente é

dicotómica (a propriedade que aquele inquirido não tem) ou que foi

“omitida” quando a variável tem mais que 2 modalidades. Tomemos

como exemplo quanto às variáveis dicotómicas a variável “ter outra

deficiência”. Neste caso o valor 1 significa “tem” e o valor 0 significa

“não tem”. O rácio de probabilidade obtido (0,58) indica que a

probabilidade de estar empregado entre quem tem multideficiência é

58% da probabilidade de estar empregado no conjunto da população

inquirida. Logo, há uma desigualdade interna de oportunidades de

emprego entre cidadãos com deficiência visual em desfavor dos

multideficientes. Vejamos como ler o rácio de probabilidade numa

variável não dicotómica. Na variável escolaridade, a modalidade

“omitida” é a de ter como habilitação o 1º ciclo do ensino básico ou

menos. O rácio de probabilidade obtido por comparação com esta

situação de referência é de 4,1 (ter o 2º ou 3º ciclo), 7 (ter o ensino

secundário) e 23,7 (ter o ensino superior), o que nos diz que, quando

comparamos os deficientes visuais com habilitações escolares

superiores ao 1º ciclo do ensino básico com os que têm estas

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habilitações, a probabilidade de estar empregado dos que têm o 2º ou 3º

ciclo é 4 vezes superior à dos que têm o 1º ciclo, a dos que têm o ensino

secundário é 7 vezes superior à desse grupo de referência e a dos que têm

ensino superior é-lhe 24 vezes superior.

O modelo de propriedades sociais utilizado tem um desempenho elevado.

O chi-quadrado é significativo (X2=515,871; p=0,000), o que nos permite

rejeitar a hipótese nula de que estar ou não empregado é independente

das propriedades sociais estudadas no modelo. O modelo explica mais de

40% da variância (Cox & Snell R2=0,409) e em 81% dos casos prevê

correctamente a situação da pessoa inquirida perante o emprego. Há 9

situações quanto à relação entre propriedades sociais e emprego em que

se pode afastar a hipótese nula (teste de Wald com significância ≤ 0.05).

Encontrou-se, pois, uma relação entre propriedades sociais de cidadãos

com deficiência visual e oportunidades desiguais de acesso ao emprego

entre eles, ou seja, encontraram-se variáveis que reforçam ou atenuam a

exclusão do emprego dos deficientes visuais.

A propriedade social cuja variação tem efeitos mais potentes no

aumento da participação no emprego é a escolaridade. A progressão da

probabilidade de estar empregado consoante os níveis escolares é

exponencial. Como referimos no parágrafo acima, atingindo a

disparidade de 27 para 1 entre um diplomado do ensino superior ou

médio e quem apenas detém o 1º ciclo do ensino básico.

O género tem também um efeito significativo no mercado de trabalho. A

probabilidade de um homem estar empregado praticamente duplica em

relação a uma mulher em iguais circunstâncias (rácio de probabilidade de

1,965 entre homens e mulheres). Tendo presente que a diferença entre

géneros perante o emprego não surgia na análise bivariada, este dado

revela também a importância do modelo na explicação das desigualdades

perante o mercado de trabalho, ao isolar os efeitos próprios da variável.

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As probabilidades de estar empregado são igualmente dependentes da

estrutura familiar do inquirido. Aqueles que saíram da família de origem,

constituindo família própria ou vivendo sozinhos, têm uma probabilidade

de estar empregados 1,7 vezes superior à dos que permanecem na família

de origem.

Há diferenças de probabilidades de estar empregado segundo a classe

social do inquirido. Tomámos como referência, a categoria

socioprofissional mais frequente na população inquirida (os empregados

executantes). Quando comparadas com ela, todas as categorias

socioprofissionais têm um valor negativo, mas que é estatisticamente

significativo apenas entre os operários industriais, o que configura duas

situações opostas no espectro socioprofissional quanto à probabilidade de

estar empregado: a probabilidade relativamente mais elevada de acesso

ao emprego dos empregados executantes e a probabilidade

significativamente mais baixa dos operários industriais, inferior no último

grupo a um quarto do grupo anterior.

A natureza da deficiência e a relação com as limitações estruturais que ela

provoca constitui uma propriedade social ela própria indutora de

desigualdades, em duas das três dimensões estudadas dessa relação

(idade de aquisição da deficiência, tipo de deficiência, autonomia).

Para a idade de aquisição da deficiência tomámos como situação de

referência a aquisição antes dos 5 anos. Quando comparados com este

grupo, todos os outros têm probabilidades de emprego menores, mas que

são estatisticamente significativas apenas para quem adquire a deficiência

depois dos 30 anos. A probabilidade de estar empregado, neste grupo, é

de 30% dos que adquiriram a deficiência à nascença ou na primeira

infância.

A ocorrência de multideficiência é, por sua vez, um factor de aumento da

exclusão do emprego. Como referimos acima, a probabilidade de quem

tem mais que uma deficiência estar empregado é pouco superior a

metade de quem tem apenas deficiência visual.

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A origem social praticamente não exerce qualquer influência

estatisticamente significativa nas probabilidades de estar empregado dos

deficientes visuais inquiridos. Apenas nos recursos escolares dos pais,

medidos pelo nível de escolaridade mais elevado atingido por um dos

progenitores, se encontra uma associação estatisticamente significativa,

ainda que ténue (Wald, p = 0.05).

A inserção em redes sociais – físicas ou virtuais – e a autonomia na deficiência

também não são preditores de diferenças significativas de situação perante o

emprego.

Este modelo mostra-nos que as propriedades sociais relativas à deficiência

e à trajectória de vida se sobrepõem às de origem social na redefinição das

oportunidades no mercado de trabalho, o que significa que na condição

social actual dos deficientes visuais em Portugal, ao menos perante o

emprego, a intervenção das dinâmicas sociais de inclusão e das políticas

públicas, onde são fortes ou onde são fracas, têm efeitos.

A deficiência não produz de per si uma posição social, mas apenas na

medida em que faz parte da estruturação das oportunidades sociais do

indivíduo deficiente. A alteração de estruturas e funções do seu corpo

produz limitações na medida em que não seja compensada por acções

positivas no contexto envolvente que neutralizem a potencial

desvantagem que gera. Entre essas acções positivas estão a intervenção

clínica, contendo ou minorando aspectos em que a medicina pode actuar

sobre as alterações em causa, mas também a intervenção de tecnologias

assistivas e a prestação de serviços como a educação ou a reabilitação, ou

a acção sobre os contextos sociais, de prevenção e eliminação de

comportamentos discriminatórios e outras barreiras. Mas, na medida

em que essa acção positiva - a activação das

instituições sociais - não é eficaz, produzem-se gaps como o que neste

trabalho se identificou no acesso ao emprego. Esses gaps podem ser

reduzidos pela activação das instituições sociais.

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Recorde-se que na diferenciação de posicionamento no emprego dos

deficientes visuais inquiridos as variáveis de origem social têm pouca ou

nula importância. A categoria socioprofissional da família de origem não

tem efeito estatisticamente significativo na possibilidade de estar

empregado e encontra-se apenas uma correlação ténue desta com a

escolaridade de origem dos pais, significativa somente para um escalão de

escolaridade. Não se verificou, neste caso, uma das clássicas explicações

sociológicas da desigualdade, a da reprodução do estatuto social de

origem.

Encontrou-se o eco das relações sociais de sexo existentes na sociedade

em geral (Ferreira, 2004, André, 1999), implicando aqui uma dupla

discriminação das mulheres deficientes visuais no acesso ao mercado de

trabalho, enquanto mulheres e enquanto deficientes, igualmente

encontrado em outros estudos (Jones, Latreille e Sloane, 2003; Clements,

Douglas e Pavey, 2011). Importa, a este respeito, sublinhar a importância

heurística de termos recorrido à regressão logística binária. Na análise

bivariada a discriminação de género estava ocultada pelo efeito de

interferência de outras variáveis e apenas se tornou visível por efeito do

modelo estatístico que mostra que, neutralizadas outras variáveis, a

probabilidade de um homem deficiente visual inquirido estar empregado

é praticamente o dobro de uma mulher.

A propriedade social que mais intensamente faz variar a probabilidade de

estar empregado é a escolarização. Esta conclusão não é especificamente

portuguesa. O mesmo se concluiu, por exemplo, para o Canadá (Gold e

Simson, 2005) e o Reino Unido (Clements, Douglas e Pavey, 2011). Esta

conclusão remete-nos para a importância da educação no combate ao

fechamento de oportunidades.

O debate sobre a política pública de educação e o seu papel na activação

das instituições para a promoção de igualdade entre deficientes e não

deficientes (Capucha, 2010) é, assim, central. Com a informação

analisada, pode falar-se com propriedade de sucesso na integração no

mercado de trabalho conseguido pela educação inclusiva,

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orientada pelo modelo relacional, na educação de cegos (Capucha, 2010)

ainda que se conheçam os problemas de funcionamento que têm vindo a

ser observados (Sena Martins, 2005) e que, sobretudo, se deva valorizar o

caminho ainda a percorrer para garantir melhores níveis de sucesso

educativo. Os inquiridos “sobreviventes” na escola revelaram-se

“vencedores” da barreira de acesso ao mercado de trabalho; importa

melhorar os índices de sobrevivência escolar da população com

deficiência visual.

A fase do ciclo de vida em que se adquire a deficiência gera uma

desigualdade de oportunidades de acesso ao emprego mediatizada por

factores de identidade social. Quem nasce deficiente ou adquire a

deficiência numa fase inicial do ciclo de vida estabelece o seu padrão de

interacção social a partir dessa condição, ao passo que quem se torna

deficiente na idade adulta passa por uma mudança na sua percepção de

si e no modo como é visto pelos outros (Jenkins, 1991). Perante esta

mudança, o sistema de reabilitação profissional assume potencialmente

um papel-chave, mas o aumento forte da probabilidade de estar fora do

emprego entre quem adquire a deficiência na vida adulta por comparação

com quem a adquire na infância ou à nascença sugere que o sistema de

reabilitação em Portugal não é eficaz na recondução ao emprego de quem

adquire uma deficiência.

O sistema de reabilitação profissional pode mesmo não ser coerente com

as necessidades deste grupo, já que a investigação conhecida aponta para

que não o atinja significativamente. O estudo sobre os impactos do Fundo

Social Europeu na reabilitação profissional apurou que numa altura em

que se estimava a população com deficiências sensoriais como sendo 22%

da população deficiente, ela era apenas 10% da população que tinha

passado ou estava a frequentar um processo de reabilitação (Capucha et

al, 2004: 24). O mesmo estudo referia que apenas 7% dos utentes do

sistema com deficiência visual tinham uma deficiência adquirida depois

dos 30 anos (Capucha et al, 2004: 48), revelando assim um duplo

enviesamento em desfavor dos

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deficientes visuais e, entre estes, dos que têm uma deficiência adquirida

na idade adulta.

Em Portugal, hoje, a escolarização é a via mais eficaz de superação da

dificuldade de ingresso de pessoas com deficiência visual no mercado de

trabalho e a reabilitação profissional de quem adquire deficiência visual

na idade adulta é incapaz de combater a propensão para que adquirir uma

deficiência seja um forte factor de saída do emprego. Estas duas

conclusões constituem outros tantos desafios às políticas públicas para

que consolidem o rumo num caso e se repensem, no outro.

Em Portugal, há efeitos sociais acumulados de desvantagem que

prejudicam as oportunidades de emprego de mulheres, operários e de

quem acumula mais do que uma deficiência. Também estas conclusões

são desafios, mas às dinâmicas sociais e às políticas de solidariedade, no

sentido de que se promovam mudanças de atitudes, superem estereótipos

e as instituições sociais se activem para combater efeitos cumulativos de

dinâmicas sociais de desfavorecimento.

Para além das dificuldades de integração no mercado de trabalho, estudos

anteriores apontaram também para uma inserção da população deficiente

focada sobretudo nas modalidades a que se associam menores recursos

da estrutura socioprofissional (Capucha, 2004; Sousa et al, 2007). Neste

estudo verifica-se antes um fechamento do espectro de alternativas

profissionais com um polo nas profissões menos qualificadas e outro nas

mais qualificadas. Predominam entre os empregados as pessoas

enquadradas no pessoal administrativo (25%), seguido dos especialistas

das actividades intelectuais e científicas (18%). De salientar que 13% dos

deficientes visuais inquiridos são telefonistas e que a profissão mais

representativa a seguir a esta é a de professor com 8%.

O peso destas categorias é maior se considerarmos a idade de aquisição da

deficiência. No conjunto dos inquiridos que adquiriram a deficiência até

aos 30 anos, portanto ainda numa fase relativamente precoce de inserção

no mercado de trabalho e de definição de uma vocação

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profissional, 32% está enquadrada no pessoal administrativo e 21% nos

especialistas das actividades intelectuais e científicas e a inserção no mercado

de trabalho é concentrada em duas profissões: no caso dos licenciados, os

professores – 42% dos inquiridos – e no caso dos não licenciados, os

telefonistas – 26%.

O Estado é um agente muito importante no emprego das pessoas com

deficiência visual inquiridas, constatando-se que a percentagem de

inquiridos que exerceram ou exercem uma profissão e que trabalham ou

trabalhavam no sector Estado é muito superior à média nacional (37%),

sendo ainda mais alta junto dos inquiridos que adquiriram a deficiência

antes dos 15 anos (43%).

Tal não impede que seja o sector privado o maior empregador (de 58% dos

inquiridos e de 50% dos que adquiriram a deficiência antes dos 15 anos),

enquanto o terceiro sector gera 4% do emprego dos inquiridos (7% entre

os que adquiriram a deficiência antes dos 15 anos).

O peso geral do Estado no emprego de deficientes e a menor abertura do

sector privado a quem adquiriu a deficiência antes da idade activa desafia

as políticas activas de emprego.

Acresce que na percepção subjectiva dos próprios deficientes inquiridos,

os que acedem ao emprego sentem algumas dificuldades na adequação de

equipamentos e espaços e na relação com colegas e superiores.

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Tabela 13. Inquiridos, segundo os problemas sentidos no actual ou no último emprego e a idade

de aquisição da deficiência visual

Nota: ***= p ≤ 0.001; ** = p ≤ 0.01; * = p ≤ 0.05 Fonte: Inquérito PSPVI

Não há nenhuma dificuldade que seja sentida maioritariamente pelos

inquiridos que têm ou tiveram um emprego. Mas cerca de 30% aponta a

falta de adequação de equipamentos e 20% a falta de capacidade de

entendimento da sua deficiência por colegas e superiores.

A persistência de obstáculos que resultam da adaptação dos postos de

trabalho ou das relações no local de trabalho é também um desafio para

as políticas públicas, na medida em que o apoio à redução dos gaps de

emprego de deficientes passam pela ultrapassagem de preconceitos e o

apoio à adaptação de postos de trabalho.

Os dados aqui apresentados mostram uma situação de, por um lado,

exclusão das pessoas com deficiência visual do mercado de trabalho,

constatável pela diferença entre as taxas de actividade para a população

portuguesa e dos deficientes visuais inquiridos e, por outro lado, para os

que conseguem entrar no mercado, principalmente os que adquirem a

deficiência visual numa fase precoce, existe um confinamento a

determinadas profissões e uma produção de condições desfavoráveis,

evidente pelas trajectórias de classe e pelas diferenças entre as taxas de

Problemas sentidos

Idade de aquisição da deficiência visual (% de inquiridos que sentiu o problema)

Até 5 anos

6 a 14 anos

15 a 24 anos

25 a 49 anos

Mais de 50 anos

Total N

Falta de adequação de equipamentos e materiais de trabalho***

35,9

34,5

30,8

19,7

12,0

29,4

974

Falta de capacidade dos colegas ou superiores para entender a natureza da sua deficiência***

22,5

29,5

20,8

14,2

9,6

20,3

974

Falta de adequação dos espaços físicos**

21,4 20,1 25,6 14,2 8,4 19,1 971

Os colegas ou os superiores não acreditarem no seu potencial*

19,1

23,7

17,7

14,7

8,4

17,7

974

Discriminação por parte de colegas ou superiores*

19,3 19,4 15,4 11,1 10,8 16,3 972

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desemprego da população portuguesa e das pessoas com deficiência

visual inquiridas.

Encontro-me desempregado quase crónico. Desde 2003 estou sem

qualquer actividade profissional. (Focus Group Leiria)

Acho que um cego que esteja empregado, principalmente hoje em dia,

e fique desempregado, dificilmente terá outra vez emprego. Há uma

falta de informação dos empregadores. Nós temos mais capacidades

do que as pessoas pensam que temos. Há vários sectores onde nós

invisuais podemos trabalhar sem ser só como telefonista. (Focus

Group Leiria)

Não obstante, e apesar desta exclusão, para os inquiridos com deficiência

visual, ter um emprego no qual possa exercitar as suas competências e não

depender economicamente de outros é muito importante, como vimos.

Os testemunhos obtidos nos focus group realizados permitem aferir a

discrepância entre a importância atribuída a esta dimensão e a realidade

na qual os inquiridos vivem face ao mercado de trabalho.

Quanto a experiência profissional, a única que tenho é, se lhe podemos

chamar isso, é uma experiência de 6 meses em que estive a contrato e

de resto, tenho vários estágios no meu currículo (…) quanto aos

meios para sobreviver, eu não os tenho, e não por falta de tentativas

pois já são pelo menos uns seis ou sete estágios no meu currículo, mas

por razões alheias à minha vontade, as portas do mercado de trabalho

não se abriram como eu realmente tinha expectativas. (Focus Group

Porto)

Portanto a maior dificuldade é a mobilidade, e a situação económico-

financeira e a nível profissional estou completamente

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desmotivado, porque me sinto perfeitamente capaz de trabalhar em

diversas áreas e não tenho oportunidade e claro que isto a nível

psicológico destrói uma pessoa. (Focus Group Porto)

A descoincidência entre as oportunidades no mercado de trabalho e a

percepção da importância de ter emprego evidencia uma das dimensões

da vivência da deficiência como estigma no sentido goffmaniano (Goffman,

1988 [1963]), uma exclusão imposta, não pretendida e da qual o indivíduo

não pode libertar-se.

1.4.2 APOIOS AO EMPREGO

O número de inquiridos que beneficiou ou beneficia de algum tipo de

apoio à criação de emprego para cidadãos com deficiência é reduzido, o

que questiona o papel do Estado enquanto promotor de políticas activas

de emprego para cidadãos com deficiência.

A Isenção e/ou redução das contribuições para a segurança social e o

Apoio do IEFP à colocação são as medidas mais indicadas, embora

quedando-se em ter alcançado 7 e 6% dos inquiridos, respectivamente,

seguindo-se a adaptação do posto de trabalho e eliminação de barreiras

arquitectónicas e o estágio de inserção para pessoas com deficiências e

incapacidades, ambas com 5%.

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Tabela 14. Inquiridos, segundo o benefício de apoios à criação de emprego para cidadãos em

idade activa e a idade de aquisição da deficiência

Nota: *=p ≤ 0.001; ** = p ≤ 0.01; *** = p ≤ 0.05 Fonte: Inquérito PSPVI

É o universo dos inquiridos que adquiriram a deficiência precocemente,

principalmente até aos 15 anos, que se encontra mais coberto pelas

medidas activas, constatando-se que o grupo dos inquiridos que adquiriu

a deficiência depois dos trinta anos, praticamente não beneficiou delas, o

que indica a ineficácia da política activa de emprego na reabilitação de

quem adquire deficiência visual na idade adulta.

O Estado assume, pois, um papel muito importante no nível material de

vida dos inquiridos, em primeiro lugar através da função de

redistribuição, como fonte de rendimentos pela atribuição de pensões e

prestações e em segundo lugar como empregador. Mas as políticas activas

de emprego apenas tocam marginalmente os inquiridos, sobretudo os que

adquiriram a deficiência em idade adulta.

A centralidade do Estado na definição da condição social dos deficientes

visuais, quer como prestador de apoios sociais, quer como empregador,

quer ainda, agora pela negativa, pelos impactos da reabilitação e das

políticas activas na obtenção de emprego, obrigam a antecipar as

Medida Idade de aquisição da deficiência (%)

0-15 16-29 30-64 Total

Isenção e/ou Redução das contribuições para a segurança social*

% 9,5 4,9 2,3 7,0

N 527 163 215 905

Apoio do IEFP à colocação** % 7,7 4,3 1,9 5,7

N 530 163 214 907

Adaptação do posto de trabalho e eliminação de barreiras arquitectónicas

% 6,8 4,3 1,4 5,2

N 532 163 216 911

Estágio de inserção para pessoas com deficiências e incapacidades*

% 6,3 7,3 ,9 5,0

N 527 164 215 906

Acompanhamento do IEFP pós-colocação** % 4,5 1,8 ,5 3,1

N 530 164 215 909

Contrato de emprego-inserção para pessoas com deficiências e incapacidades***

% 3,6 1,8 ,5 2,5

N 528 163 215 906

Quota de emprego de pessoas com deficiência na administração pública

% 3,0 1,2 0,9 2,3

N 529 165 215 909

Emprego apoiado** % 3,0 2,4 ,5 2,2

N 529 164 216 909

Quota de emprego de pessoas com deficiência em empresas

% 1,9 1,2 1,4 1,7

N 529 164 216 909

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consequências potencialmente negativas de uma eventual retracção do

papel do Estado no futuro próximo.

1.5 AFECTOS, FAMÍLIA E SOCIABILIDADES

A natureza e intensidade das ligações sociais estabelecidas e desejadas pelos

inquiridos aproxima-nos do modo como se relacionam com o seu contexto

imediato de interacção – a família – bem de como se estrutura o seu

quotidiano, em que redes sociais informais participam, qual a intensidade da

sua vida quotidiana fora do espaço doméstico e as suas práticas de lazer.

1.5.1 CONSTITUIR FAMÍLIA E COABITAR

A expressão dos afectos, na dimensão que lhe deu Marta Nussbaum (cit.

em Constanza et al, 2006), de capacidade de ligar-se a algo e alguém fora

de si próprio, é uma dimensão importante para os inquiridos (ver tabela

15).

Tabela 15. Inquiridos, segundo a importância atribuída aos afectos, à autonomia familiar e ao

convívio social

Importância Afectos

Ter alguém

que goste de si (%)

Gostar de

alguém (%)

Constituir a sua própria

família (%)

Viver na sua

própria casa (%)

Conviver com parentes com regularidade

(%)

Encontrar -se com vizinhos

(%)

Encontrar -se com amigos

(%)

Nada/Pouco Importante

0,5 0,5 4,1 2,8 6,0 22,9 4,1

Importante/ Muito importante

99,5

99,5

95,9

97,2

94,0

70,1

95,9

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

N 1309 1312 1292 1306 1310 1303 1306

Fonte: Inquérito PSPVI

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Praticamente todos os inquiridos dão importância a gostar de alguém e

ter alguém que goste de si, isto é, aos vínculos afectivos.

Os inquiridos dão importância à possibilidade de conduzirem uma vida

independente por relação à família de origem, constituindo família

própria e vivendo na sua própria casa.

É também elevada a importância atribuída ao convívio, em particular com

amigos e parentes.

O acesso à nupcialidade enfrenta dificuldades acrescidas entre os

inquiridos, quando comparados com a população portuguesa adulta. A

probabilidade de um deficiente visual inquirido ser solteiro é 20% mais

alta que a da população em geral e a probabilidade de ter ocorrido uma

ruptura familiar na sua trajectória, expressa pela situação de ser separado

ou divorciado é 50% mais alta.

Tabela 16. Inquiridos e população residente com mais de 16 anos, segundo o estado civil e índice

de sobre(sub)representação

Estado civil

PSPVI

(1)

População portuguesa com mais de 16 anos (Censos 2011)

(2)

Índice de sobre(sub)

representação (1)/(2)

Solteiro/a 36,2 29,2 1,2

Casado/a / União de facto

49,1 55,5 0,9

Separado/a / Divorciado/a

10,0 6,7 1,5

Viúvo/a 4,8 8,7 0,6

Total 100,0 100,0 -

N 1325 8879922 -

Fontes: Inquérito PSPVI; Censos 2011

O impacto da deficiência na nupcialidade, a existir, deve manifestar-se em

quem adquire a deficiência nas fases iniciais do ciclo de vida e ser visível

entre quem já passou a idade típica do primeiro casamento. Para nos

aproximarmos do fenómeno, estudámos o estado civil segundo a idade de

aquisição da deficiência dos deficientes com mais de 30 anos.

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Tabela 17. Inquiridos com idade superior a 30 anos, segundo o estado civil e a idade de aquisição

da deficiência

(x2 (12)=90,362; p ≤ 0.0001) Fonte: Inquérito PSPVI

Há uma propensão maior ao celibato por parte dos inquiridos que

adquiriram a deficiência na fase inicial do ciclo de vida. Entre os

inquiridos com mais de 30 anos, são solteiros 39% dos que adquiriram a

deficiência antes dos 5 anos, 27% dos que a adquiriram entre os 6 e os

14 anos, 30% dos que a adquiriram entre os 15 e os 24 anos, 23% dos

que a adquiriram entre os 25 e os 49 anos e apenas 6% dos que a

adquiriram depois dos 50 anos.

Quem adquire a deficiência visual na primeira infância tem maior

probabilidade de não conjugalidade, o que configura uma situação de

discriminação deste grupo no acesso à vida independente.

Não são conhecidos estudos portugueses sobre os factores que explicam

esta observação, mas é de admitir que os estereótipos e preconceitos

tenham importância. Essa foi, aliás, a conclusão a que chegou uma equipa

de psicólogos americanos, que mostrou a existência de dificuldades no

namoro entre jovens não-cegos e cegos, que incluíam reacções negativas

e desconforto e consideração da reacção dos amigos a essa relação

(Fichten et al, 1991).

Estado Civil

Idade de aquisição da deficiência (%)

Até 5 anos

6 a 14 anos

15 a 24 anos

25 a 49 anos

Mais de 50 anos

Total

Solteiro/a 39,3 26,9 29,5 23,2 6,1 28,7

Casado/a / União de facto

46,8 58,1 56,4 59,0 63,4 54,4

Separado/a / Divorciado/a

11,2 10,8 9,4 12,2 13,7 11,4

Viúvo/a 2,7 4,2 4,7 5,5 16,8 5,4

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

N 438 167 149 271 131 1156

42

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1.5.2 INTEGRAÇÃO EM REDES SOCIAIS INFORMAIS

A existência de contactos sociais fora do círculo de coabitação aproxima-

nos da intensidade da vida social da pessoa ou, por contraponto, da

consideração do seu isolamento social.

A maioria dos inquiridos insere-se numa rede de parentesco, vizinhança

ou amizade, com a qual tem alguma intensidade de contacto: 79% com

vizinhos, 78% com um amigo de referência, 72% com irmãos e com outros

parentes além dos pais ou dos filhos; 65% com os pais; 50% com os filhos.

Tabela 18. Inquiridos, segundo a intensidade de contactos face-a-face com pessoas com quem

não coabitam

Intensidade de contactos face-a- face

Filhos (%)

Irmãos (%)

Parentes (%)

Melhor amigo

(%)

Vizinhos (%)

Pais (%)

Não tem 46,9 10,3 3,1 13,4 2,5 29,9

Raramente/Nunca 3,6 18,1 24,9 8,7 18,9 5,3

Com alguma frequência

27,0 54,6 60,9 49,4 30,1 39,5

Todos os dias ou quase

22,5 17,0 11,1 28,5 48,6 25,2

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

N 905 1202 1307 1272 1303 865

Fonte: Inquérito PSPVI

Cerca de ¼ dos inquiridos vê todos os dias ou quase os seus familiares mais

próximos com os quais não coabitam – filhos e pais – bem como o seu

melhor amigo.

A rede de contacto quotidiano mais frequente é a de vizinhança. Quem

tem filhos ou pais, contacta intensamente também esta rede

intergeracional (42% dos inquiridos que têm filhos e 36% dos que têm pais

contactam com eles quotidianamente). A rede de parentesco alargada,

incluindo a fratria, é maioritariamente accionada de modo regular mas

não quotidiano.

A maior parte dos inquiridos tem com quem estabelecer uma conversa

íntima (78%) ou sair para lazer (75%).

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Tabela 19. Inquiridos segundo a possibilidade de ter conversas íntimas ou sair para lazer com

alguém além do cônjuge

Fonte: Inquérito PSPVI

Estes dois tipos de contactos, importantes para o estabelecimento de

ligações com outrem, revelam a importância de que se reveste para os

inquiridos o contacto social informal através das redes de amizade. A

possibilidade de estabelecer contactos sociais através destas redes

informais varia, contudo, com fase do ciclo de vida.

Tabela 20. Inquiridos, segundo a possibilidade de ter conversas íntimas com alguém além do

cônjuge e idade

Ter com quem ter conversas íntimas

Idade (%)

16-29 anos

30-64 anos

Mais de 65 anos

Total

Sim, um familiar 31,9 25,1 30,2 27,0

Sim, uma pessoa amiga

56,6 48,1 32,6 46,1

Sim, outra pessoa 4,3 5,1 5,8 5,2

Não 7,2 21,7 31,4 21,7

Total 100,0 100,0 100,0 100,0

N 166 896 258 1320

(x2 (8)=50,859; p ≤ 0.001) Fonte: Inquérito PSPVI

O risco de isolamento social progride com a idade e é mais de 4 vezes

superior nos idosos que nos adultos jovens (31% dos maiores de 65 anos

não tem com quem ter conversas íntimas contra apenas 7% dos mentores

de 30 anos).

Os inquiridos estabelecem relações de confiança privilegiadamente entre

pares, com amigos, sendo, em todas as idades, estes os seus confidentes

privilegiados.

Contactos Conversas

íntimas (%)

Sair lazer (%)

Sim, um familiar 27,0 26,6

Sim, uma pessoa amiga 46,1 45,7

Sim, um/a técnico/a 2,9 ,5

Sim, outra pessoa 2,3 2,0

Não 21,7 25,3

Total 100,0 100,0

N 1320 1322

44

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O padrão identificado em relação às relações de confiança repete-se na

definição dos parceiros de lazer.

Tabela 21. Inquiridos, segundo a possibilidade de sair com alguém para lazer além do cônjuge e

idade

(x2 (8)=64,428; p≤ 0.001) Fonte: Inquérito PSPVI

O isolamento em termos de lazer cresce com a idade, atingindo 4,5 vezes

mais os idosos que os jovens e as pessoas amigas são os parceiros

privilegiados, excepto para os inquiridos na terceira idade.

1.5.3 VIDA SOCIAL QUOTIDIANA, SOCIABILIDADES E LAZER

A vida social quotidiana é um vector importante de combate ao

confinamento ao espaço doméstico.

Para a observar, construímos um índice de vida social quotidiana6 que

incorpora actividades diárias que implicam interacção fora do espaço

doméstico: ir ao banco, aos correios, ao hospital, ao centro de saúde, ao

café, ao restaurante, à mercearia, às feiras ou mercados, ao centro

comercial, passear ou frequentar lugar de culto religioso.

6 O índice de vida social foi construído através do somatório das respostas dos inquiridos sobre um conjunto de actividades diárias (ir ao banco, aos correios, ao hospital, ao centro de saúde, ao café, ao restaurante, à mercearia, às feiras ou mercados, ao centro comercial, passear ou frequentar lugar de culto religioso), que variavam entre 1- “Nunca” e 6 – “Todos os dias”, e sua posterior recodificação nos seguintes intervalos: Sem vida social (até 16,5); Com pouca vida social (de 16,6 a 27,5); Com alguma vida social (27,6 a 38,5); e Com muita vida social (mais de 38,6).

Ter com quem sair para lazer

Idade (%)

16-29 anos

30-64 anos

Mais de 65 anos

Total

Sim, um familiar 27,1 24,8 32,2 26,6

Sim, uma pessoa amiga

61,4 47,1 30,6 45,7

Sim, outra pessoa 4,2 1,5 4,7 2,5

Não 7,2 26,5 32,6 25,3

N 166 898 258 1322

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O índice de vida social quotidiana revelou que 32% dos inquiridos têm

uma vida social intensa fora de casa e 16,5% estão praticamente

confinados ao espaço doméstico, dos quais 3% estão totalmente cortados

da vida social quotidiana.

Tabela 22. Inquiridos, segundo o Índice de vida social quotidiana e a idade de aquisição da

deficiência

Índice de vida social quotidiana

Idade de aquisição da deficiência (%)

Até 5 anos

6 a 14 anos

15 a 24 anos

25 a 49 anos

Mais de 50 anos

Total

Sem vida social ,9 1,0 1,9 4,1 8,4 2,5

Com pouca vida social

10,5 12,4 10,5 19,3 24,4 14,0

Com alguma vida social

52,9 57,7 54,3 48,9 47,3 52,4

Com muita vida social

35,7 28,9 33,3 27,8 19,8 31,1

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

N 544 194 162 270 131 1301

(x2 (12)=63,841; p ≤ 0.001) Fonte: Inquérito PSPVI

Os que têm uma vida social quotidiana mais intensa são os inquiridos que

adquiriram a deficiência visual numa etapa precoce da sua vida (36% dos

que adquiriram até aos 5 anos, 29% dos que adquiram entre os 6 e os 14

anos e 33% dos que adquiriram entre os 15 e os 24 anos). A aquisição

da deficiência na vida adulta associa-se a níveis de intensidade de vida

social menores. Os que têm pouca ou nenhuma vida social e que

adquiriram a deficiência visual entre os 25 e 49 anos, representam perto

de um quarto da população (23%). Este valor sobe para um terço (33%)

entre os que adquiriram a deficiência depois dos 50 anos de idade.

A aquisição da deficiência visual na idade adulta é um factor de redução

da vida social quotidiana, questão que deve ser investigada no contexto

dos desafios à reabilitação das pessoas que adquirem deficiência visual.

Na ausência de um trabalho eficaz, as pessoas que adquirem a deficiência

podem deixar-se confinar ao espaço doméstico e os contextos sociais

podem mobilizar-se para estimular a redução dos

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contactos sociais. Esse comportamento de “excesso de protecção” foi

assinalado pelos participantes nos focus-groups como sendo frequente na

fase inicial de aquisição da deficiência.

“Voltei a viver em casa dos meus pais, mas para conseguir por

exemplo colocar a mesa antes de uma refeição, tinha de ser às

escondidas meia hora antes porque não me deixavam. Para além disso,

estive quase dois anos a fazer praticamente isto: iam-me pôr ao

trabalho, trabalhava, iam-me buscar e ficava o resto do tempo a olhar

para as paredes em casa.…” (Focus Group Leiria)

A activação da sociedade para combater a diminuição da vida social dos

cidadãos com deficiência visual, em particular dos que adquirem a

deficiência em fase tardia do ciclo de vida exige atenção.

A vida social tem também uma dimensão recreacional, de consumo

cultural e de lazer quotidiano, para além das formas mais estruturadas

como as férias.

A forma de consumo cultural e lazer quotidiano mais frequente nos

inquiridos são as práticas culturais domésticas audiovisuais, que incluem

o consumo de televisão e rádio7.

Tabela 23. Inquiridos, segundo a frequência de Sociabilidades intra-domiciliares e práticas

culturais domésticas ou de saída

Frequência

Práticas culturais domésticas

audiovisuais (%)

Sociabilidades intra-domiciliares

(%)

Práticas culturais de saída

(%)

Nunca ou raramente

1,6 79,9 87,7

Com alguma frequência

22,7 18,2 12,3

Todos os dias 75,7 1,9 -

Total 100,0 100,0 100,0

N 1324 1320 1319

Fonte: Inquérito PSPVI

7 Retoma-se a definição entre práticas culturais domésticas e de saída adoptada por INE (2003). Acrescenta-se o qualificativo “audiovisuais” às práticas culturais domésticas porque não se incluiu perguntas sobre leitura no questionário.

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As sociabilidades intra-domiciliares8, que englobam actividades como

jogar computador, jogar jogos de tabuleiro, conversa em chats online e

redes sociais são minoritárias entre os inquiridos, tal como as práticas

culturais de saída (INE, 2003), que integram actividades realizadas fora

do domicílio, como visitar museus, assistir a peças de teatro, ir ao cinema,

assistir a concertos, ir a biblioteca/mediateca, assistir a eventos

desportivos e praticar desporto.

As actividades de lazer desenvolvidas pelos inquiridos estão circunscritas

ao domicílio e às práticas compatíveis com o isolamento em relação a

redes de proximidade.

O lazer quotidiano não é, entre os inquiridos, uma forma de vinculação

privilegiada ao espaço público.

As férias fora de casa, outro momento de contacto social pela via do lazer,

são também um hábito minoritário, partilhado apenas por 43% dos

inquiridos, apesar de 79% considerar importante ou muito importante

passar férias fora, o que configura um confronto entre o desejável e o

realizado, marcado pela privação.

A aquisição da deficiência à nascença, na infância ou na juventude implica

a diminuição da probabilidade de acesso ao casamento e de constituição

de família própria, configurando um risco acrescido de discriminação dos

deficientes visuais, baseado no encontro de preconceitos e em dinâmicas

macro e microsociais que não são eficazmente combatidas.

A possibilidade de estabelecer laços sociais é uma dimensão da vida

independente que pode ser potenciada no trabalho entre e com deficientes

visuais e com os contextos sociais envolventes, por forma a minorar

sofrimentos e discriminações. Assim como pode desenvolver-se,

8 Esta designação inspira-se em Gomes (2001), mas modificou-se a sua designação de práticas inter-domiciliares para práticas intra-domiciliares, porque nesse estudo se incluía nestas práticas visitar e ser visitado, enquanto aqui se perguntou apenas sobre práticas que não pressupõem a relação de visita.

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nessa perspectiva, práticas culturais e de lazer que combatam o risco de

confinamento ao espaço doméstico.

O isolamento dos idosos com deficiência visual deve merecer a atenção

das políticas públicas e dos movimentos sociais, na medida em que

combina o triplo risco que deriva da tendência para o isolamento social de

idosos, da associação entre deficiência visual e envelhecimento e da

existência de um grupo importante de pessoas que adquirem a deficiência

visual numa fase tardia do ciclo de vida. Em relação a estas últimas, a

investigação estabeleceu que a perda de visão está associada à duplicação

do risco de depressão e perturbações emocionais e à solidão (Burmedi,

Becker, Heyl, Wahl e Himmelsbach, 2002). Embora se não conheça os

efeitos do envelhecimento nas pessoas que adquiriram deficiência visual

em faces anteriores do ciclo de vida, o risco de isolamento social detectado

deve implicar a activação social contra a exclusão.

1.6. ESCOLARIZAÇÃO, AUTONOMIA E PARTICIPAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA

A possibilidade de plena realização individual e acesso a uma vida

independente está ligada à possibilidade de controlo sobre as escolhas da

própria vida e ao acesso aos recursos imateriais - de cultura, de educação,

de informação, de acesso ao conhecimento - que permitam opções

informadas e decisões sobre a vida própria e da colectividade. Vimos, a

propósito das condições materiais de vida dos inquiridos, que o acesso a

esses recursos e em particular à educação é um factor importante de

melhoria das suas possibilidades de integração no mercado de trabalho.

Importa agora analisar o estado global de acesso aos recursos imateriais,

bem como os níveis de autonomia individual e de participação social dos

inquiridos.

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1.6.1 SUCESSOS E DIFICULDADES NA ESCOLA INCLUSIVA

A educação é um dos terrenos fundamentais de batalha da perspectiva da

promoção da vida independente. Sob a predominância do modelo médico,

ela não lhes era negada, mas fornecida de forma segregada desde o início

das suas vidas, incluindo o acesso à educação em instituições

especialmente vocacionadas para o efeito.

Em Portugal, cedo se começou a pensar a educação de deficientes – em

particular de deficientes visuais e auditivos – na perspectiva da educação

segregada, assim como se leva já mais de meio século de educação inclusiva

de deficientes visuais. A história desta experiência começou já a ser feita, em

particular por Maria Helena Mesquita (2001), Ana Maria Bénard da Costa

(1994) e Rogério Fernandes (1989), a quem devemos a possibilidade de

identificar como segue as grandes fases do seu desenvolvimento.

A criação do ensino especializado remonta ao início do século XIX. Em

1822 foi criada primeira instituição de ensino especializado e a passagem

do século XIX para o século XX viu florescer um conjunto de iniciativas

da sociedade civil nesse sentido e a ideia da existência de escolas públicas

especializadas que começaram a garantir o acesso das crianças com

deficiência visual à educação segregada.

A educação inclusiva de deficientes visuais já leva meio século de

experiência. Nos anos sessenta do século XX criaram-se os “serviços de

educação de deficientes” na Direcção-Geral da Assistência e iniciou-se o

movimento de educação inclusiva dos deficientes visuais, em particular a

partir da experiência do Centro Infantil Hellen Keller, que começou a

educação conjunta de crianças cegas, amblíopes e com visão normal em

1965 e, em 1968, com a colocação pela primeira vez de professores

especializados do Instituto de Assistência a Menores em escolas regulares,

criando “salas de apoio”, movimento a partir do qual o programa se

estendeu pelo país. A partir de 1973, o Ministério da Educação assumiu a

responsabilidade pela educação de crianças

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deficientes. Mas é apenas na sequência da Lei de Bases do Sistema

Educativo de 1986 que, na passagem do século XX para o século XXI a

experiência da educação inclusiva se generaliza a todas as deficiências, se

criam os instrumentos para essa generalização (Rodrigues e Nogueira,

2011) e discute-se ainda na sociedade portuguesa a questão da educação

inclusiva vs. educação segregada (Capucha, 2010).

A comparação entre os níveis escolares da população portuguesa adulta e

dos inquiridos neste estudo que adquiriram deficiência visual na fase

inicial das suas vidas, portanto sujeitos a uma escolarização total ou

parcialmente na condição de deficientes visuais, dá indicações positivas

do desempenho da escola inclusiva.

Tabela 24. Inquiridos que adquiriam a deficiência visual antes dos 15 anos, e população residente,

segundo o nível de escolaridade

Níveis de Escolaridade

Idade de aquisição da deficiência*

(%)

Tipo de deficiência visual**

(%)

População portuguesa com mais de 15 anos

(%) -Censos 2011 (5)

Índice de sobre(sub) representação

Até aos 5 anos

(1)

6 a 14 anos

(2)

Baixa visão

(3)

Cegueira (4)

Até aos 5 anos

(1)/(5)

6 a 14 anos

(2)/(5)

Baixa visão (3)/(5)

Cegueira (4)/(5)

Ensino superior e médio

21,4

17,3

18,9

21,5

14,8

1,45

1,17

1,28

1,45

Ensino secundário

29,4 21,3 27,8 26,8 15,7 1,87 1,36 1,77 1,71

2º e 3º ciclo 31,0 29,4 38,8 23,9 31,9 0,97 0,92 1,22 0,75

Até ao 1º ciclo 18,1 32,0 14,5 27,8 37,6 0,48 0,85 0,39 0,74

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 - - - -

N 551 197 338 410 8989849 - - - -

*(x2 (3)=17,568; p≤ 0.001); **(x2 (3)=29,059; p≤ 0,0001)

Fontes: Inquérito PSPVI; Censos 2011

Os inquiridos9 que adquiriram deficiência visual antes dos 15 anos têm

uma estrutura de habilitações mais favorável que a população adulta em

geral, em particular pelo efeito de ter uma percentagem muito

9 Impõe-se que se analise esta constatação com prudência, na medida em que a amostra foi colhida junto de associados e utentes da ACAPO que podem ser um grupo mais escolarizado que o da população que adquiriu a deficiência com essa idade mas não se aproximou da associação.

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inferior de pessoas que não concluíram o 1º ciclo e muito superior de

pessoas que concluíram o secundário.

Os inquiridos que adquiriram deficiência em idade escolar têm uma

estrutura de habilitações menos favorável que a dos que adquiriram a

deficiência na primeira infância, mas ainda assim superior à média

nacional.

A estrutura de habilitações mais favorável entre os inquiridos na condição

referida e a população adulta repete-se quando se faz a análise segundo o

tipo de deficiência visual, com algumas variações significativas.

Os inquiridos com baixa visão são mais atingidos pelo insucesso escolar.

Têm uma proporção baixa de detentores apenas de 1º ciclo ou menos, mas

uma alta proporção de detentores de 2º e 3º ciclo do básico e de ensino

secundário, estando de novo subrepresentados entre os que têm o ensino

médio ou superior.

Os inquiridos cegos têm melhores carreiras escolares. Estão, nesta

amostra, subrepresentados nos escalões de escolaridade básica e

sobrerepresentados entre quem conclui o ensino médio e superior e,

sobretudo, o ensino secundário.

Os dados recolhidos indiciam, pois, um bom desempenho do sistema

educativo na escolarização em particular de quem adquiriu a deficiência

na primeira infância e de quem é cego, o que levanta, por outro lado,

questões quanto à capacidade das escolas acompanharem quem adquire

a deficiência em idade escolar e quanto a reconhecer e integrar

adequadamente as pessoas que têm baixa visão e para as quais,

porventura, as pedagogias diferenciadas não estão tão ajustadas.

As dificuldades sentidas por quem adquire a deficiência em idade escolar

são desafiantes para o processo de acompanhamento integral da criança e

do jovem que a escola deve procurar nestas situações.

O menor sucesso relativo da escola inclusiva com a baixa visão pode prender-

se – é uma questão a merecer investigação ulterior - com a

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inadequação da transposição de conhecimentos adquiridos em relação a

pessoas cegas para pessoas com baixa visão, dados os problemas

específicos destas, nomeadamente a sua falta de identificação como

pessoas com deficiência visual específica e as características afectivo-

emocionais desta forma de deficiência (Amiralian, 2004).

Na análise dos resultados obtidos pela educação inclusiva deve ter-se em

conta que a proporção de inquiridos que adquiriram deficiência visual

antes dos 14 anos e concluíram a escolaridade “que queriam” ou seja, têm

a percepção de ter concluído os estudos adequados é inferior a um terço

dos inquiridos (32%).

O problema do abandono escolar precoce em Portugal não se limita às

pessoas com deficiência visual. É, antes, um fenómeno enraizado10 e a sua

incidência nos inquiridos é reflexo do problema geral. Mas a motivação

para o abandono, tal como interiorizada pelos inquiridos, apresenta

especificidades relativas à condição social de deficiente visual.

Se entre as causas mais referidas para o abandono dos estudos surge o

problema dos recursos das famílias, típico do abandono escolar

socioeconómico, entre os inquiridos em análise ela surge rodeada de

dificuldades ligadas a problemas de funcionamento do sistema e a falta de

motivação e apoios.

10 Em estudo anterior assinalámos, aliás, que à velocidade a que prosseguiram os índices de conclusão do ensino secundário entre 2006 e 2010, Portugal demorará 13 anos a atingir a média europeia, no que diz respeito a quem tem 18 a 24 anos e 46 anos a atingi-la para o conjunto da população activa (Pedroso, Elyseu e Magalhães, 2012).

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Tabela 25. Inquiridos que adquiriam a deficiência antes dos 15 anos, segundo as causas de

abandono escolar, idade de aquisição e tipo de deficiência visual

Nota: *=p ≤ 0.001; ** = p ≤ 0.05 Fonte: Inquérito PSPVI

A falta de apoios especializados é a causa de abandono escolar mais

referida pelos inquiridos que adquiriram deficiência visual antes dos 15

anos e as dificuldades pedagógicas dos professores são a terceira causa

mais referida. As dificuldades das escolas e dos professores, já assinaladas

(Sena Martins, 2006; Matos, 1999), constituem um problema a

ultrapassar para melhorar as oportunidades das pessoas com deficiência

visual.

O terceiro grupo de causas de abandono assinaladas remete para o efeito

educativo de naturalização das dificuldades escolares pela interiorização

de desinteresse ou auto-culpabilização por falta de capacidade de

integração ou ainda por culpabilização da família por falta de apoio.

Causas de abandono escolar

Idade de aquisição da deficiência (%)

Tipo de deficiência visual (%)

Até aos 5 anos

6 a 14 anos

Baixa visão

Cegueira

Não haver apoios especializados para a minha deficiência

30,1

31,5

34,4**

27,4**

Não ter dinheiro 29,1 27,6 31,6 26,3

Os professores não saberem ensinar pessoas com a minha deficiência

20,7

22,1

23,5

19,2

Não me interessar pela escola

16,1** 9,9** 15,0 14,0

Ter dificuldades de me integrar na escola 15,1 14,9 16,0 14,2

Os meus pais não me terem apoiado o suficiente

14,6

16,0

17,0

13,4

Ter problemas de saúde 14,2* 26,5* 20,1 15,6

Ter tido maus resultados escolares 13,0* 4,4* 11,9 9,6

Ter sido alvo de discriminação por colegas ou professores

9,0

8,3

9,9

7,9

Não haver transportes 6,3 9,9 7,1 7,4

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Neste padrão há algumas variações dignas de nota. Os inquiridos que

adquiriram a deficiência entre os 6 e os 14 anos referem com maior

insistência que os que a adquiriram até aos 5 anos as razões de saúde para

abandonar a escola. Há que estudar a possibilidade de a ocorrência da

deficiência em idade escolar, associada à manifestação de doença não

estar a ser seguida de modo suficientemente integrado entre instituições

de saúde, famílias e escolas por forma a minorar os efeitos prejudiciais de

ruptura de trajectórias escolares. Há ainda que ter em conta que são os

inquiridos com baixa visão que mais identificam a falta de apoios

especializados como causa de abandono escolar, o que nos remete para a

necessidade de abordar os problemas específicos da baixa visão em meio

educativo, acima referidos.

1.6.2 DOMÍNIO DO BRAILLE, UMA VANTAGEM EDUCATIVA

O domínio do braille varia segundo a fase do ciclo de vida em que se

adquiriu a deficiência. É dominado por quem adquire deficiência visual na

infância ou na juventude: 67% dos que adquiriram a deficiência antes dos

15 anos ou entre os 15 e os 29 anos. A proporção do domínio de braille

entre quem adquire a deficiência na idade adulta é significativamente

menor: 30% entre quem adquiriu a deficiência entre os 30 e os 64 anos e

apenas 13% entre quem a adquiriu depois dos 65 anos.

Tabela 26. Inquiridos que dominam o braille, segundo a idade e idade de aquisição da deficiência

Idade

Idade de aquisição da deficiência (%)

0-15 16-29 30-64 Mais de 65

anos Total

16-29 anos 68,7 71,4 - - 68,9

30-64 anos 67,0 65,7 36,8 - 59,6

Mais de 65 anos

60,6 68,6 13,2 12,5 38,9

Total 66,5 66,5 29,7 12,5 56,7

Fonte: Inquérito PSPVI

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O estudo da informação recolhida revela ainda uma tendência para a

progressão da aprendizagem do braille entre gerações. A percentagem de

inquiridos que adquiriram a deficiência entre os 0 e os 15 anos, e que

tinham no momento da inquirição mais de 65 anos e dominavam o braille

era de 60,6%, mas entre os que adquiriram a deficiência no mesmo grupo

etário, e que têm hoje menos de 30 anos, essa percentagem sobe para

68,7%.

O domínio do braille, sendo maioritário entre quem adquire a deficiência

visual antes dos 30 anos, independentemente da geração a que pertence,

e tendo progredido nas últimas gerações, não é universal.

Nesta amostra verificou-se a associação do domínio do braille ao nível

escolar obtido. O domínio do braille entre os inquiridos que adquiriram a

deficiência na fase inicial do ciclo de vida (antes dos 15 anos) foi um factor

de sucesso escolar, como se verifica pela estrutura de habilitações de

quem domina e não domina o braille.

Tabela 27. Inquiridos que adquiriram a deficiência visual antes dos 15 anos, segundo o nível de

escolaridade e o domínio do braille

Nível de escolaridade

Domínio do Braille (%)

Não sabe Braille

Sabe Braille

Total

Ensino Médio e Superior

15,3 22,8 21,8

Ensino Secundário 16,9 32,5 30,6

2º e 3º ciclo 32,5 29,7 27,3

Menos que o 1º ciclo 35,3 15,0 20,3

Total 100,0 100,0 100,0

N 249 499 748

x2 (3)=51,415; p≤0,0001)

Fonte: Inquérito PSPVI

Dentro desse grupo, a probabilidade de quem não sabe braille ter apenas

o 1º ciclo do ensino básico é superior ao dobro da de quem sabe e a

probabilidade de quem não sabe braille ter o ensino médio ou superior é

cerca de dois terços de quem sabe braille.

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1.6.3 PARTICIPAÇÃO ASSOCIATIVA, SINDICAL E POLÍTICA

O tipo de vinculação dos indivíduos à vida colectiva expressa-se na sua

relação com os instrumentos de participação social e política. Para

conhecermos esta dimensão da vida social dos inquiridos, estudámos a

sua participação associativa, sindical e política.

A respeito da participação associativa a amostra recolhida é, por definição,

enviesada na medida em que incide sobre pessoas que, na sua maioria,

têm pelo menos uma pertença associativa, à ACAPO. Acresce que Portugal

é um país com baixos índices de participação associativa. Em 2008, a

proporção de portugueses que participavam em pelo menos uma

associação cívica era de 21% (Viegas e Santos, 2009), pelo que a existência

igualmente de 21% dos inquiridos que participam na ACAPO e em outra

associação é um sinal de que estamos perante uma amostra recolhida

junto de um segmento socialmente mais activo que a população em geral.

Os níveis de participação em outras associações são mais elevados nos

homens que nas mulheres (34% e 23% respectivamente), nos mais

escolarizados (39% entre os que têm ensino médio e superior e 25% nos

que têm o 1º ciclo ou menos) e nos mais velhos (34% entre os maiores de

55 anos; 28% entre os 35 e os 54 anos e 22% entre os 16 e os 34 anos).

A maior propensão ao associativismo por parte dos inquiridos está ligada

a algum nível de activismo na questão da deficiência, na medida em que a

sua pertença a outras associações é a seguinte: 10% em associações ligadas

à deficiência ou doença crónica 7% em associações recreativas, 5% em

associações cívicas ou de solidariedade social, 2% em associações

desportivas e menos de 1% em associações de grupos de interesse ou de

defesa de direitos.

A participação sindical é afectada pelo elevado nível de inquiridos que são

pensionistas, mesmo entre os que estão em idade activa. No conjunto dos

inquiridos, 11% são membros de um sindicato, 18% já

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foram e 71% nunca foram sindicalizados. Mas, se tivermos em

consideração os índices de sindicalização dos que se encontravam a

trabalhar no momento da inquirição verificamos que, entre estes, os

índices de sindicalização são mais elevados que no conjunto de

trabalhadores por conta de outrem em Portugal.

Tabela 28. Inquiridos empregados e população empregada em Portugal, segundo o nível de

sindicalização

Nível de sindicalização PSPVI

(%)

International Social Survey Programme (2006)

(Dornelas, 2009: 50)

É membro de um sindicato 26,1 18,4

Não é, mas já foi membro de um sindicato

14,2 13,0

Não é nem nunca foi membro de um sindicato

59,8 68,5

Total 100,0 100,0

N 354 966

Fonte: Inquérito PSPVI; Dornelas (2009: 50)

A sindicalização dos trabalhadores com deficiência visual inquiridos é

cerca de 1,5 vezes superior à do conjunto dos trabalhadores em Portugal.

No respeitante ao interesse pela política, é de assinalar que mais de dois

terços dos deficientes visuais inquiridos com mais de 18 anos, revelam

interesse pelas questões políticas e votam quando há eleições (70%). Uma

vez mais, se verifica que a amostra analisada tem índices de participação

superiores à média nacional, sabendo-se que, nas eleições legislativas de

2011, a participação eleitoral foi de 58%11.

Os invisuais mais jovens são os que relevam menor interesse pelas

questões políticas comparativamente aos sócios e utentes da ACAPO mais

adultos. Começando a analisar os mais jovens, entre os 16 e 34 anos cerca

de 26% não revela interesse pela política nem vota quando há eleições.

Quanto os indivíduos que votam habitualmente, novamente destacam-se

as faixas etárias adultas que revelam um maior interesse pela política,

visto que dois terços dos inquiridos com idades

11 http://www.legislativas2009.mj.pt/legislativas2011/#none

58

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compreendidas entre 35 e os 54 anos votam habitualmente (73%).

A consideração do interesse por política segundo o nível de escolaridade

revela que os inquiridos mais escolarizados, são os que mais votam e

maior interesse demonstram pelas questões políticas. No extremo oposto

estão os associados com níveis de instrução mais baixos, nomeadamente

aqueles que têm o 1º ciclo de escolaridade ou menos (26% não se interesse

pelas questões política nem normalmente vota quando há eleições). O

mesmo acontece com os inquiridos que completaram o 2 e 3º ciclo, pois

cerca de 20% não revela interesse pela política nem vota com

regularidade.

Tabela 29. Inquiridos maiores de 18 anos, segundo o nível de interesse por política e o nível

de escolaridade

Nível de interesse por política

Nível de escolaridade (%)

1º ciclo ou menos

2º e 3º ciclo

Ensino Secundário

Ensino Médio e Superior

Total

Não se interessa por estas questões nem vota

26,3

20,3

16,0

6,1

18,4

Interessa-se por política mas não vota normalmente

10,0

12,2

11,5

11,7

11,3

Costuma votar quando há eleições

63,7

67,5

72,5

82,3

70,3

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

N 369 385 313 231 1298

(x2 (1)=41,774; p ≤ 0.001) Fonte: Inquérito PSPVI

Neste estudo encontrámos um conjunto de cidadãos com deficiência

visual que tem, na sua grande maioria e pela pertença à ACAPO, alguma

forma de participação social. Como se verificou, essa participação é

concomitante de níveis comparadamente elevados de participação social,

quando confrontados com os da sociedade portuguesa, nos três domínios

analisados, da participação associativa, sindical e política.

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1.7. UMA TIPOLOGIA DE SITUAÇÕES SOCIAIS E QUALIDADE DE VIDA DE

CIDADÃOS COM DEFICIÊNCIA VISUAL EM PORTUGAL

A aproximação à qualidade de vida que se realizou neste estudo partiu do

cruzamento das perspectivas de Erik Allardt (1993) sobre os tipos de

necessidades humanas com o trabalho da equipa interdisciplinar da

Universidade de Vermont sobre a relação entre necessidades humanas e

qualidade de vida (Constanza et al, 2006).

No ponto 1.1 apresentou-se genericamente a abordagem que

efectuamos e nos pontos 1.2 a 1.6 fez-se uma análise, dimensão a

dimensão, de aspectos determinantes para a percepção da situação

social dos cidadãos com deficiência em Portugal, incluindo a situação

socioprofissional, relação com o mercado de trabalho, expressão de

afectos, relações familiares e sociabilidades, escolarização, autonomia e

participação.

Agora regressaremos ao modelo conceptual inicial para uma análise de

como o conjunto de dimensões estudadas se manifestam (homogénea ou

heterogeneamente) entre os inquiridos, construindo grupos homogéneos

de qualidade de vida. Para o efeito, a informação recolhida foi sujeita a

uma análise de correspondências múltiplas e as variáveis, retidas no

modelo após essa análise, foram submetidas a uma análise

hierárquica de clusters, que determinou os grupos homogéneos obtidos.

1.7.1 DIMENSÕES DIFERENCIADORAS DA QUALIDADE DE VIDA

As variáveis constantes do inquérito e retidas para a análise da qualidade

de vida referiam-se à situação e à percepção pelas pessoas da sua situação

em relação à satisfação de um conjunto de necessidades humanas, a saber

as necessidades de subsistência, segurança, afectos,

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participação, compreensão, identidade, liberdade e lazer e criatividade,

agrupadas nas dimensões de ter, das ligações e de ser (ver tabela 30).

O modelo de qualidade de vida construído revelou-se estatisticamente

robusto, porquanto, o Teste Alpha de Cronbach tem um valor de 0,883 e

se considera normalmente aceitável um modelo quando o valor deste teste

é superior a 0,7. O modelo explica 43,3% da variância total das variáveis

(inércia) em três dimensões de análise.

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Tabela 30. Necessidades humanas e indicadores analisados na tipologia de qualidade de vida

Dimensão Tipo de necessidades Indicadores de situação Indicadores de percepção

Ter Subsistência Condição perante o trabalho Principal meio de vida Acesso a prestações sociais e apoios ao emprego Índice de autonomia no quotidiano

Satisfação com a situação material e financeira Percepção da evolução do nível de vida Importância atribuída, para se sentir bem na vida (a) a não depender economicamente de outros; (b) a ter acesso aos cuidados de saúde necessários

Ligações Segurança Importância atribuída, para se sentir bem na vida, a (a) sentir-se seguro contra furtos roubos ou outras formas de violência; (b) ter quem ajude quando está doente ou precisa de companhia

Afectos Integração em redes sociais:

Intensidade de contactos face-a- face com pessoas com quem não coabita

Ter (além do cônjuge) com quem (a) possa ter conversas íntimas e pessoais) (b) sair para lazer

Poder estar com familiares (além do cônjuge) quando quer

Importância atribuída, para se sentir bem na vida, a (a) gostar de alguém (b) ter alguém que goste de si; (c) poder conviver com parentes com regularidade; (d) encontrar-se com vizinhos; (e) encontrar-se com amigos,

Ser Participação Profissão Estatuto no mercado de trabalho Classe social Tipo de participação na ACAPO Tipo de participação em outras associações ou colectividades Tipo de participação sindical Tipo de participação política

Importância atribuída, para se sentir bem na vida, a (a) ter emprego em que possa exercitar as competências; (b) contribuir para que o Mundo à sua volta melhore (c) contribuir para que a vida das pessoas cegas e com baixa visão seja melhor (d) escolher o que nos governam Interesse pelas questões políticas

Identidade Razões para o abandono escolar Problemas no emprego

Importância atribuída, para se sentir bem na vida, a ser respeitado pelos outros

Compreensão Domínio do braille Nível de escolaridade Índice de autonomia no acesso à informação e comunicação Tipo e frequência de utilização de computador e da internet

Importância atribuída, para se sentir bem na vida, a saber o que se passa em Portugal e no Mundo

Liberdade Situação familiar (estado civil; pessoas com quem reside) Índice de autonomia na mobilidade Índice de vida social quotidiana Frequência de utilização de transportes públicos,

Importância atribuída, para se sentir bem na vida, a: (a) poder constituir a sua própria família e ser feliz com ela; (b) poder viver na sua própria casa; (c) poder ir onde quiser, sem ter que pedir ajuda; (d) poder circular na via pública sem ter medo de ser atropelado ou chocar com objectos inesperados Avaliação da acessibilidade física e de informação de locais a que se desloca Avaliação de acessibilidade e apoio nos transportes públicos

Lazer Frequência das sociabilidades intra-domiciliares, Frequência das práticas culturais de saída Ocorrência de férias fora de casa

Importância atribuída, para se sentir bem na vida, a (a) ir ao cinema, ao teatro ou a um concerto; (b) ter férias fora de casa

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A primeira dimensão de análise – que designámos de polarização

dependência/autonomia pessoal - explica 24% da variação observada e opõe

as pessoas que se debatem com uma situação de extrema dependência

quotidiana às pessoas com elevada autonomia e participação social e no

mercado de emprego.

As modalidades das variáveis cujas coordenadas dos centroides mais se

afastam da origem, no sentido da dependência são, por ordem decrescente

de distância em relação ao centroide: “ter muita dificuldade em realizar

actividades básicas diárias como comer”, “não conseguir gerir o seu dia-

a-dia” “não conseguir utilizar equipamentos de comunicação como o

telefone”, “não conseguir gerir a sua medicação” e “não conseguir subir e

descer escadas”. No sentido oposto da dimensão de análise retida

encontramos, por ordem decrescente de distância da origem: “é membro

dos corpos dirigentes/de gestão de uma associação”; “participa num

grupo de defesa dos direitos de consumidores ou outros grupos de

interesse”; “participa numa associação ou clube desportivo”; “exerce uma

profissão ou trabalha”; “vive dos rendimentos do trabalho ou da

propriedade”.

A segunda dimensão de análise – que designámos de polarização

centramento na fruição individual/centramento na vida social – explica 12%

da variação observada e opõe as pessoas com um estilo de vida orientado para

a realização individual e o lazer às pessoas com estilo de vida orientado para

a participação cívica.

As modalidades das variáveis cujas coordenadas dos centroides se afastam

mais da origem no sentido da fruição individual são: “ser estudante”,

”assistir frequentemente a peças de teatro”, “conversar em chats/estar em

redes sociais (facebook/messenger) frequentemente”, “utilizar transportes

públicos todos os dias” e “visitar museus com alguma frequência”. As

modalidades das variáveis cujas coordenadas

dos centroides se afastam mais da origem no sentido da participação

cívica são: “participa numa associação cívica (ONG, etc.) ”; “participa

numa associação recreativa ou cultural”; “participa num grupo de

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defesa dos direitos de consumidores ou outros grupos de interesse”;

“participa numa associação ou colectividade”, “participa noutro tipo de

associação”.

A terceira dimensão de análise – que designámos de polarização dependência

da família de origem/autonomia familiar e material – explica 7% da

variação observada e opõe ser estudante, depender de e viver com família

de origem a viver do trabalho e constituir família.

As modalidades das variáveis cujas coordenadas dos centroides se afastam

mais da origem no sentido da ligação à família de origem são: “ser

estudante”; “viver da pensão de reforma ou outra prestação da segurança

social”; “depender da família”; “residir com familiares” e “ter muita

dificuldade em tratar da sua higiene pessoal”, utilizar transportes públicos

todos os dias” e “visitar museus com alguma frequência”. As modalidades

das variáveis cujas coordenadas dos centroides se afastam mais da origem

no sentido da autonomia familiar são: “participa num grupo de defesa dos

direitos de consumidores ou outros grupos de interesse”, “vai ao

restaurante todos os dias”; “tem uma profissão do grupo dos especialistas

das actividades intelectuais e científicas”, “vive com

companheiro/cônjuge e/ou filhos” e “exerce uma profissão ou trabalha”.

A conjugação destas três polarizações permite identificar os factores

diferenciadores da qualidade de vida dos inquiridos em torno da

problemática da dependência/autonomia; da polarização em si/na vida

colectiva e da família de origem/família constituída.

1.7.2. TIPOS SOCIAIS DE QUALIDADE DE VIDA

As variáveis constantes do modelo de qualidade de vida foram

estandardizadas e submetidas a uma análise hierárquica de clusters pelo

método de agregação ward, tendo sido retidos cinco grupos que

correspondem aos principais tipos sociais detectados no estudo.

64

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A relação desses grupos com as dimensões encontradas na análise das

correlações múltiplas, leva-nos a identificar um grupo em torno da

polarização autonomia-família própria-orientação pela participação

social, que corresponde a 19% dos inquiridos. Esse grupo, que designámos

de grupo das pessoas autónomas, inseridas no mercado de trabalho, com

actividade social e participação cívica tem as seguintes características-

tipo: são pessoas que têm autonomia total nas tarefas quotidianas, no

acesso à informação e comunicação e na mobilidade; os que estão em

idade activa trabalham e vivem principalmente do seu trabalho; usam

computadores, têm uma vida social frequente fora de casa, saem com

amigos, participam em associações e vivem com cônjuge e/ou filhos. A

média de idades das pessoas deste grupo é de 45 anos, em média a idade

de aquisição da deficiência visual é os 13 anos, pelo que tendencialmente

fizeram a sua inserção na vida adulta já com deficiência visual; sabem

braille, concluíram pelo menos o ensino secundário e desempenham ou

desempenharam uma profissão na área das actividades intelectuais e

científicas.

65

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Tabela 31.Tipos sociais de qualidade de vida dos deficientes visuais

Fonte: Inquérito PSPVI

Pessoas autónomas, inseridas no mercado de

trabalho, com actividade

social e participação

cívica

Pessoas autónomas, em risco de exclusão do mercado de

trabalho, com actividade

social e sem participação

cívica

Pessoas autónomas,

em transição ou em risco de marginalização do mercado de trabalho com

actividade social e sem participação

cívica

Pessoas com alguma

autonomia, excluídas do mercado de

trabalho, com

actividade social e

participação cívica

Pessoas

dependentes e em

situação de isolamento

social

Dimensão do grupo (% dos inquiridos)

19% 39% 9% 10% 23%

Idade (média) 45 anos 47 anos 27 anos 64 anos 58 anos

Idade de aquisição da deficiência (média)

13 anos 12 anos 6 anos 25 anos 29 anos

Principal meio de vida

47 % vive de rendimentos do trabalho ou da

propriedade

51% vive da reforma ou de uma prestação da segurança

social

65% depende da família

92 % vive da reforma ou

de uma prestação da

segurança social

92 % vive da reforma ou

de uma prestação da

segurança social

Tem ou teve profissão (moda)

32 % especialistas

das actividades intelectuais e

científicas

33 % pessoal

administrativo

44 % pessoal

administrativo

28 % trabalhador qualificado da indústria

26 % trabalhador qualificado da indústria

Condição perante o trabalho (moda dos que têm menos de 65 anos)

49% exerce

uma profissão

42% exerce

uma profissão

40% é

estudante

90% é reformado

ou pré- reformado

90% é reformado ou

pré- reformado

Coabitação

47% vive com cônjuge e/ou

filhos

64% vive com cônjuge e/ou

filhos

94% vive com familiares

73 % vive com cônjuge e/ou filhos

62% vive com cônjuge e/ou

filhos

Habilitações escolares

66% tem ensino médio

ou superior ou ensino

secundário

50 % tem o 2º/3º ciclo ou

menos

69% tem ensino médio

ou superior ou ensino

secundário

55 % têm o 1º ciclo ou

menos

71 % têm o 1º ciclo ou

menos

% que domina o braille

73% 48% 72% 45% 21%

Autonomia no quotidiano

89 % é autónomo

93 % é autónomo

85 % é autónomo

54 % é autónomo

22% é autónomo

Autonomia na mobilidade

54 % é autónomo

54 % é autónomo

54 % é autónomo

27 % é autónomo

7 % é autónomo

Autonomia na informação e comunicação

88 % é autónomo

89 % é autónomo

90 % é autónomo

68 % é autónomo

42 % é autónomo

Uso de computador 87 % usa 71% usa 92 % usa 23% usa 8% usa

Tem amigos ou familiares com quem sair

85% tem

75% tem

87% tem

69% tem

39% tem

Vida social quotidiana fora de casa

98% intensa ou muito intensa

97% regular ou intensa

91% regular ou intensa

78% regular ou intensa

82% escassa ou regular

Participação em outra associação (moda)

100% 0% 0% 100% 0%

66

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Um segundo grupo reúne as pessoas em torno da polarização- autonomia,

mas com uma pertença social menos favorecida que o anterior e sem

mobilização para a participação cívica. Demos-lhe a designação de ser

constituído por pessoas autónomas, em risco de exclusão do mercado de

trabalho, com actividade social e sem participação cívica. Este grupo

reúne 39% dos inquiridos e o seu retrato-tipo é o seguinte: têm autonomia

total nas tarefas quotidianas, no acesso à informação e comunicação e na

mobilidade; saíram do mercado de trabalho ou estão desempregados;

vivem de uma pensão ou de uma prestação da segurança social; usam

computadores, têm uma vida social frequente fora de casa, saem com

amigos; não participam em associações e vivem com cônjuge e/ou filhos.

A média de idades das pessoas deste grupo é de 47 anos, em média a idade

de aquisição da deficiência visual é os 12 anos, pelo que tendencialmente

fizeram a sua inserção na vida adulta já com deficiência visual; sabem

braille, concluíram pelo menos o ensino secundário e desempenham ou

desempenharam uma profissão na área do pessoal administrativo.

Um terceiro grupo diferencia-se dos anteriores por se polarizar em torno

da autonomia, mas tender à dependência familiar e à orientação pela

fruição individual. São pessoas autónomas, em transição ou em risco de

marginalização do mercado de trabalho com actividade social e sem

participação cívica. Este grupo reúne 9% dos inquiridos e o seu retrato-

tipo (feito a partir das categorias modais) é o seguinte: têm autonomia

total nas tarefas quotidianas, no acesso à informação e comunicação e na

mobilidade; os jovens são estudantes, os menos jovens estão

desempregados; dependem da família; usam computadores, têm uma

vida social fora de casa frequente, saem com amigos. A média de idades

das pessoas deste grupo é de 27 anos, em média a idade de aquisição da

deficiência visual é os 6 anos, pelo que tendencialmente fizeram o seu

percurso na educação e a sua inserção na vida adulta já com deficiência

visual; sabem braille, concluíram pelo menos o ensino secundário e

desempenham ou desempenharam uma profissão como administrativos.

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Um quarto grupo reúne pessoas com menor autonomia que os anteriores,

partilhando com o primeiro e o terceiro a orientação pela família própria

e com o primeiro um maior empenhamento e participação cívica. São

pessoas que adquiriram a deficiência tendencialmente na fase adulta e

estão excluídas do mercado de trabalho. Designámo-lo de pessoas com

alguma autonomia, excluídas do mercado de trabalho, com actividade

social e participação cívica. Este grupo reúne 10% dos inquiridos e o seu

retrato-tipo é o seguinte: têm autonomia nas tarefas quotidianas e no

acesso à informação e comunicação, mas têm dificuldades de mobilidade;

saíram do mercado de trabalho; vivem de uma pensão ou de uma

prestação da segurança social; não usam computadores, têm vida social

fora de casa, embora menos frequente que os grupos anteriores, saem com

amigos; participam em associações e vivem com cônjuge e/ou filhos. A

média de idades das pessoas deste grupo é de 64 anos, em média a idade

de aquisição da deficiência visual é os 25 anos, pelo que tendencialmente

tiveram uma inserção profissional anterior à aquisição da deficiência

visual; não sabem braille, concluíram o 1º ciclo do ensino básico e

desempenharam uma profissão de trabalhador qualificado na indústria e

construção.

Finalmente temos um grupo de perto de um quarto dos inquiridos que

configura um risco de problema social, marcado pela sobreposição de

dependência e isolamento. São – assim designámos ao grupo - pessoas

dependentes e em situação de isolamento social. Este grupo reúne 23% dos

inquiridos e o seu retrato-tipo (feito a partir das categorias modais) é o

seguinte: não são autónomos nem nas tarefas quotidianas, nem no acesso à

informação e comunicação, nem na mobilidade; nunca entraram ou já

saíram do mercado de trabalho; vivem de uma pensão ou de uma

prestação da segurança social; não usam computadores, têm um nível

restrito de vida social fora de casa, não têm com quem sair e não

participam em associações; vivem com cônjuge e/ou filhos. A média de idades

das pessoas deste grupo é de 58 anos, em média a idade de aquisição da

deficiência visual é os 29 anos, pelo que

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tendencialmente tiveram uma inserção profissional anterior à aquisição

da deficiência visual; não sabem braille, concluíram o 1º ciclo do ensino

básico e desempenharam uma profissão de trabalhador qualificado na

indústria e construção.

Os grupos encontrados demonstram a diferenciação de situações que deve

ser tida em conta na estruturação de um modelo de prestação de serviços

orientado para a qualidade de vida e a promoção da vida independente,

fornecendo pistas para uma segmentação eventual de públicos desses

serviços.

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II. OS SERVIÇOS PRESTADOS PELA ACAPO E

AS TRANSFORMAÇÕES NA VIDA DOS

UTENTES –

APROXIMAÇÃO À ASSOCIAÇÃO E AVALIAÇÃO

DOS SERVIÇOS RECEBIDOS

A orientação da ACAPO como prestadora de serviços pela vida

independente implica que se analise esses serviços não apenas a partir dos

efeitos conseguidos ou não, mas tendo em conta igualmente o modo de

aproximação à associação, o diagnóstico de necessidades de serviços e o

nível de participação dos utentes na definição das suas necessidades, isto

é, o tipo de relação entre utente e prestador.

2.1 A APROXIMAÇÃO À ASSOCIAÇÃO

Os deficientes visuais inquiridos conheceram a ACAPO essencialmente

por meios informais como familiares, amigos, colegas e vizinhos (46%),

ou por recomendação de uma instituição, seja a segurança social, a saúde

ou instituição na área da deficiência (20%).

Tabela 32. Inquiridos, segundo a forma como tomaram conhecimento da ACAPO

Forma como tomaram conhecimento da ACAPO PSPVI

(%)

Através de familiares, amigos, colegas, vizinhos 46,3

Sugestão / recomendação de uma instituição (Segurança Social, saúde ou instituição que trabalha na área da deficiência)

20

Foi contactado pela ACAPO 7,5

Fusão/unificação ACAPO 6,8

Informação obtida através de organismos da administração pública (local/regional/central)

5,5

Através da comunicação social 5,4

Informação obtida através de uma pesquisa pessoal sobre a sua deficiência 3,3

Escola/professor 3,1

Através do site da ACAPO 1,3

Outro ,8

Total 100,0

N 1307

Fonte: Inquérito PSPVI

70

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Cerca de 50% dos inquiridos (sócios e utentes) tiveram o primeiro

contacto com a ACAPO há mais de 10 anos, sendo que apenas uma

categoria residual dos inquiridos (4%) conheceu a ACAPO há menos de

1 ano.

A maioria dos sócios (58%) contactou com a ACAPO pela primeira vez há

mais de 10 anos, destes, quase metade desde a sua fundação. No que diz

respeito aos utentes, a maior parte (38%) dos primeiros contactos com a

instituição aconteceu entre 3 e 5 anos atrás. A figura do utente somente

apareceu na instituição a partir do ano 2000, pelo que cerca de um terço

dos utentes fez o primeiro contacto há seis anos ou mais.

Os dados permitem pois dizer que o tecido associativo da ACAPO tem

sido pouco renovado, uma vez que a percentagem de novos associados

há menos de 1 ano é de 2% e, em contrapartida, 58% dos sócios

contactaram a ACAPO há mais de dez anos.

Tabela 33. Inquiridos, segundo o primeiro contacto com a ACAPO

Primeiro contacto com a ACAPO

PSPVI (%)

Total Sócios Utentes

Há menos de 1 ano 3,6 2,2 9,7

Entre 1 e 2 anos 8,6 6,3 19,0

Entre 3 e 5 anos 17,3 12,7 37,6

Entre 6 e 10 anos 21,3 20,4 25,3

Há mais de 10 anos 49,2 58,4 8,4

Total 100,0 100,0 100,0

N 1290 1053 237

(x2 (4)=236,334; p≤ 0.001)

Fonte: Inquérito PSPVI

A maior parte dos inquiridos menciona ter contactado a ACAPO muito

tempo depois de ter tido conhecimento da sua deficiência visual (58%).

Apesar de uma significativa parte desta informação poder ser explicada

pelo facto de a maior parte destes inquiridos ter adquirido a deficiência

antes da constituição da ACAPO, não deixa de ser evidente que, mesmo

para os utentes, o contacto com a ACAPO é efectuado muito tempo depois

de terem tido conhecimento da sua deficiência visual.

71

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A aceitação da deficiência visual e simultaneamente a associação da

ACAPO à deficiência visual, principalmente aos cegos, foi apontada

enquanto um factor explicativo da não procura da ACAPO pelos elementos

que participaram nos focus group.

Tive muita dificuldade em contactar a ACAPO pois sempre a associei

a cegos. E de facto, e peço imensa desculpa, apesar da ACAPO ser a

associação de cegos e amblíopes, efectivamente o percurso da ACAPO

visa sempre ou lembra sempre muito mais as pessoas cegas do que as

pessoas com baixa visão. E portanto, como tinha baixa visão e ia-me

desenrascando, e não queria identificar- me como cega e não queria

pedir ajuda a ACAPO. Mas depois a visão começou a piorar e

precisava de adaptar o meu posto de trabalho, dei entrada de todo o

meu processo de apoio. Também foi neste ponto, eu já começava a

bater em todo o lado, porque o problema das pessoas com baixa visão

é que batem nos obstáculos e nem sequer temos tempo de pedir

desculpa e comecei a ser insultada na rua, e como nos percursos que

conhecia estava a ser cada vez mais difícil, então decidi, vou-me render

e vou pedir ajuda. (Focus Group Faro)

O objectivo do primeiro contacto é obter quer informação, quer

serviços/ apoios (54%).

Tabela 34. Inquiridos, segundo o tempo decorrido entre aquisição da deficiência e primeiro

contacto

Tempo decorrido PSPVI

(%)

Imediatamente após 11,1

Algum tempo depois 30,6

Muito tempo depois 58,3

Total 100,0

N 1283

Fonte: Inquérito PSPVI

Os inquiridos que pretenderam apenas ter informação no primeiro

contacto são maioritariamente aqueles que conhecem a ACAPO há mais

72

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tempo, numa altura em que a prestação de serviços era escassa e

circunscrita a determinados serviços como o apoio social e o

desenvolvimento e estimulação sensorial. Só a partir de 2000, com a

assinatura do 1º Acordo de Cooperação com os CDSS é que a ACAPO

começou a desenvolver e disponibilizar os serviços, como o apoio

psicológico, a orientação e mobilidade, braille, etc., variando de delegação

para delegação.

Tabela 35. Inquiridos, segundo o objectivo do primeiro contacto e os anos de contacto com a

ACAPO

Objectivo do primeiro contacto

Anos de contacto (%)

Há menos de 10 anos

Há mais de 10 anos

Total

Apoios/serviços 16,7 23,5 19,8

Informação 19,9 29,4 24,1

Ambos 63,4 47,1 56,1

Total 100,0 100,0 100,0

N 642 520 1162

(x2 (2)=30,991; p≤ 0.001) Fonte: Inquérito PSPVI

A grande maioria dos inquiridos teve uma entrevista com os técnicos

(66%), sendo que os valores sobem para cerca dos 90% junto dos

inquiridos que tiveram o primeiro contacto até há dez anos atrás.

Apenas junto dos inquiridos que conhecem a ACAPO há mais de dez anos

é que a percentagem de inexistência de entrevista sobe para os 55%, o que

se deve não só ao processo de unificação/fusão das várias associações, mas

também à modernização da ACAPO e dos seus serviços.

Desta forma, e dado que os utentes são os inquiridos que contactaram com

a ACAPO há menor tempo – 42% dos sócios e 92% dos utentes entraram em

contacto com a ACAPO há menos de 2 anos - justifica-se que seja junto

deste grupo que a ocorrência de entrevista é superior (88% dos utentes

tiveram entrevista).

73

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Tabela 36. Inquiridos, segundo a entrevista com os técnicos e os anos de contacto com a

ACAPO

(x2 (1)=216,357; p≤ 0.001) Fonte: Inquérito PSPVI

O mesmo se aplica à realização e discussão do Plano de Intervenção (PI).

Junto dos inquiridos que contactaram a ACAPO há menos de dez anos,

cerca de 70% discutiu o PI com os técnicos e menciona que os objectivos

a atingir foram estipulados em conjunto com o técnico. No entanto, junto

dos que contactaram há mais de dez anos apenas cerca de 30% menciona

ter discutido o PI e 36% diz ter participado na definição dos objectivos a

atingir.

Tabela 37. Inquiridos, segundo o tipo de participação no plano de prestação de serviços e os

anos de contacto com a ACAPO

Participação no plano de prestação de serviços

Anos de contacto (%)

Há menos

de 10 anos

Há mais de

10 anos

Total

Realização e discussão do Plano % 67,9 31,0 51,1

de Intervenção* N 598 500 1098

Discussão e definição dos % 72,9 36,4 56,2

objectivos** N 576 484 1060

*(x2 (1)= 148,328; , p≤ 0.001) **(x2 (1)= 142,776; , p ≤ 0.001) Fonte: Inquérito PSPVI

No último ano, os contactos com técnicos da ACAPO foram pontuais ou

com pouca regularidade para cerca de três quartos dos sócios da

instituição e quase metade dos utentes. Os utentes (40%) são quem mais

contacta com técnicos da instituição com regularidade, estabelecendo

contactos ou uma vez por semana ou pelo menos duas ou três vezes por

mês.

Entrevista com os técnicos

Anos de contacto (%)

Há menos de 10 anos

Há mais de 10 anos

Total

Sim 85,0 45,2 66,3

Não 15,0 54,8 33,7

Total 100,0 100,0 100,0

N 652 577 1229

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Tabela 38. População inquirida por frequência de contacto com técnicos no último ano, por

relação com a ACAPO

(x2 (4)=33,877; p≤ 0.00)

Fonte: Inquérito PSPVI

2.2 DENOMINADOR COMUM – TER BENEFICIADO DE SERVIÇOS

Os serviços e apoios providenciados pela ACAPO são uma importante

parte da relação que as pessoas têm com a instituição, pelo que quase 80%

dos sócios e mais de dois terços dos utentes usufruem ou já usufruíram

desses serviços e/ou apoios.

Tabela 39. Inquiridos, segundo a relação com a ACAPO, usufruto de serviços, tempo de

usufruto dos serviços e/ou apoios

Relação ACAPO

Usufruto de serviços /

apoios (%)

Usufruto de serviços / apoios

actualmente (%)

Há quanto tempo não usufrui de serviços / apoios (%)

Menos de 3

meses

3 – 6 meses

6 meses – 1 ano

Mais de 1 ano

Sócios 78,1 38,4 8,2 9,2 12,1 70,6

Utentes 70,0 16,2 3,6 8,6 21,4 66,4

Fonte: Inquérito PSPVI

Contudo, pouco mais de um terço dos sócios e 16% dos utentes é que se

encontra actualmente a usufruir de serviços e/ou apoios prestados pela

instituição. Dos que não recebem actualmente apoios ou serviços,

Frequência de contacto com técnicos

PSPVI (%)

Sócios Utentes

Uma vez por semana ou mais 28,1 10,7

Duas ou três vezes por mês 12,0 6,8

Uma vez por mês 13,9 8,7

Uma vez em cada três meses 14,7 14,6

Uma ou duas vezes por ano 31,2 59,2

Total 100,0 100,0

N 590 103

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dois terços dos sócios e dos utentes, já não usufruem há mais de um ano.

Entre os que nunca receberam serviços da ACAPO, procurou-se perceber

quem são e porque razões nunca chegaram a usufruir de serviços da

ACAPO.

Em primeiro lugar há que salientar que entre os inquiridos que nunca

receberam serviços, cerca de 60% conhece a ACAPO há mais de dez anos,

e menciona que não usufruiu dos serviços porque nunca solicitou (43%)

e/ou não sentiu necessidade (39%).

Não obstante, cerca de 13% dos inquiridos que nunca receberam serviços,

mencionam dificuldades de deslocação e constatou-se que 63% destes

inquiridos mora em meio rural, 40% não tem autonomia na mobilidade e

34% tem mais de 65 anos.

Tabela 40. Inquiridos, segundo as razões de não usufruto dos serviços (resposta múltipla)

Razões de não usufruto dos serviços PSPVI (%)

% N

Nunca solicitou 43,3 1015

Não sentiu necessidade 39,3 1015

Dificuldades de deslocação 12,8 1015

Solicitou e não tinham o serviço em questão 6,4 1015

Recebe de outro prestador de serviços 5,0 1015

Os serviços não são adequados 2,7 1015

Custos do serviço ,7 1015

Fonte: Inquérito PSPVI

Desta forma, dentro dos inquiridos que nunca usufruíram de serviços da

ACAPO são visíveis dois grupos: um, que corresponde à maioria, que se

trata dos inquiridos com autonomia, que adquiriram a deficiência até aos

cinco anos de idade, que contactaram a instituição há mais de dez anos, e

que terão tido outro tipo de apoios, não sentindo necessidade de recorrer

à mesma. Por outro lado, temos um conjunto minoritário de inquiridos

que não usufruiu ou usufrui dos serviços por problemas de acessibilidade,

ou seja de falta de autonomia na mobilidade e distância dos serviços.

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Cruzando o usufruto dos serviços com os tipos sociais de qualidade de vida,

é possível distinguir o peso destes dois grupos – sendo que entre os que

não usufruíram dos serviços encontra-se 27% de inquiridos no grupo das

Pessoas Dependentes e em Situação de Isolamento Social e

40% no grupo das Pessoas Autónomas em Risco de Exclusão do Mercado

de Trabalho com Actividade Social e sem Participação Cívica.

Entre os que receberam serviços, a grande maioria (92%) considera que o

acesso é fácil, não tendo tido qualquer dificuldade em aceder ao mesmo.

Tabela 41. Inquiridos, segundo a existência de dificuldades no acesso ao apoio/serviço da

ACAPO

Existência de dificuldades no acesso PSPVI

(%)

Teve muitas dificuldades 2,1

Teve algumas dificuldades 6,1

Não teve dificuldades 91,8

Total 100,0

N 998

Fonte: Inquérito PSPVI

Para os inquiridos que manifestaram ter tido dificuldades em aceder ao

serviço, a acessibilidade/distância dos serviços e a má sinalização da

delegação foram as principais dificuldades sentidas, indicadas por 23% e

17% respectivamente. No que diz respeito ao serviço em si, destaca-se a

ausência do tipo de resposta/serviço pretendido, indicado por 12% dos

inquiridos e o tempo de espera/vaga para acederem ao serviço (7%). O

atendimento/disponibilidade dos técnicos surge como a 4ª dificuldade

mais apontada.

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Tabela 42. Inquiridos, segundo as dificuldades no acesso ao apoio/serviço da ACAPO (resposta

múltipla)

Fonte: Inquérito PSPVI

É difícil ter onde vivo, acesso à formação em mobilidade. Eu tenho

família, e não ia para Coimbra às seis da manhã. E então só existe,

Coimbra, Lisboa e Porto. Penso que Leiria não tem aulas de

mobilidade. Fazemos aquele percurso e nada mais, ora eu preciso de

aulas de mobilidade na área onde resido, até porque nas grandes

cidades as ruas têm passeios, é mais fácil, temos pontos de referência,

é mais fácil. Enquanto nós nas pequenas cidades, nas vilas, aldeias,

não temos passeios, é meramente impossível andarmos sem bengala,

senão temos de andar sempre com alguém. (Focus Group Leiria)

Do conjunto de serviços disponibilizados pela ACAPO, e que variam de

delegação para delegação em função dos Acordos celebrados, os serviços

mais beneficiados são o apoio social, seguido das actividades lúdicas e

culturais e do treino em orientação e mobilidade. Pelo contrário, o

desenvolvimento e estimulação sensorial, o apoio jurídico, as actividades

ocupacionais e o acompanhamento em actividades do dia-a-dia, são os

serviços menos beneficiados.

Dificuldades no acesso PSPVI (%)

Acessibilidade/Distância 23,2

Má sinalização 17,1

Ausência de resposta/serviço 12,2

Atendimento/Disponibilidade dos técnicos 9,8

Tempo de espera/vaga 7,3

Falta de informação/Divulgação dos serviços da ACAPO 7,3

Adequação da resposta 4,9

Burocracia 3,7

Falta de equipamentos 1,2

Horários 1,2

Outros 12,2

Total 100,0

N 82

78

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Tabela 43. Inquiridos, segundo o tipo de serviços e apoios de que usufruíram/usufruem (resposta

múltipla)

Fonte: Inquérito PSPVI

De salientar que esta diferença do peso dos serviços é influenciada pela

disparidade do tipo de serviços facultado pelas delegações. Enquanto o

apoio social e as actividades lúdicas e culturais são disponibilizados em

todas as delegações da ACAPO, a formação profissional e o apoio ao

emprego são facultados apenas nas delegações de Lisboa, Coimbra, Porto

e Braga e a habilitação/reabilitação AVD em Lisboa, Coimbra e Viseu. Por

outro lado, também há que considerar as diferentes datas de criação

destes serviços. A título de exemplo, o apoio social é disponibilizado desde

a fundação da ACAPO e, consequentemente, desde 1989 em Lisboa e no

Porto e a partir de 1992 em Coimbra. Nas restantes delegações, o serviço

começa a ser facultado à medida que as mesmas são criadas. Por exemplo,

a delegação de Braga é criada em 1999 e a delegação do Algarve em 2002.

Já a formação profissional e o

Serviços PSPVI

(%)

Apoio social 36,6

Actividades culturais 35,3

Treino em orientação e mobilidade

25,2

Atendimento/aconselhamento 24,0

Apoio psicológico 22,2

Formação profissional 21,7

Braille 19,4

Habilitações em novas tecnologias

19,0

Acesso a ajudas técnicas 18,6

Actividades desportivas 12,9

Apoio ao Emprego 10,3

Habilitação/reabilitação AVD 6,3

Acompanhamento em actividade do dia-a-dia

5,7

Actividades ocupacionais 5,1

Apoio jurídico 2,9

Desenvolvimento e estimulação sensorial

1,4

N 1015

79

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apoio ao emprego são facultados desde 1989 em Lisboa, em Coimbra e no

Porto desde 1993, e em Braga, delegação que foi criada em 1999, este

serviço só é criado em 2005.

2.3 CLASSIFICAÇÃO DOS SERVIÇOS POR DISPONIBILIDADE E UTILIDADE

Para cada um dos serviços usufruídos, foi solicitado aos inquiridos que

indicassem qual o seu grau de satisfação com o mesmo, se teve ganhos de

conhecimentos ou competências e se o serviço trouxe mudanças na sua

vida.

Tabela 44. Inquiridos, segundo os serviços e apoios de que usufruíram/usufruem e o grau de

satisfação com os serviços

Serviços

Satisfação com os serviços (%)

N Muito

satisfeito Satisfeito Insatisfeito

Muito insatisfeito

Total

Acompanhamento em actividade do dia-a-dia

71 60,6 36,6 1,4 1,4 100,0

Actividades ocupacionais 66 54,5 42,4 1,5 1,5 100,0

Treino em orientação e mobilidade

329 54,1 41,6 1,2 3,0 100,0

Apoio psicológico 291 54 43,3 2,7 0,0 100,0

Habilitação/reabilitação AVD 84 51,2 46,4 2,4 0,0 100,0

Acesso a ajudas técnicas 240 50,8 45,0 3,8 ,4 100,0

Apoio social 482 50 46,5 2,7 ,8 100,0

Actividades culturais 462 48,3 48,7 1,5 1,5 100,0

Atendimento/aconselhamento 310 47,1 48,1 2,9 1,9 100,0

Actividades desportivas 170 45,9 48,2 4,7 1,2 100,0

Habilitações em novas tecnologias

251 44,2 42,2 11,2 2,4 100,0

Braille 196 39,8 50,5 7,1 2,6 100,0

Apoio ao Emprego 136 36,8 54,4 4,4 4,4 100,0

Desenvolvimento e estimulação sensorial

19 36,8 63,2 - - 100,0

Formação profissional 284 34,9 52,1 9,9 3,2 100,0

Apoio jurídico 37 21,6 62,2 16,2 - 100,0

Fonte: Inquérito PSPVI

80

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Quanto à satisfação com o serviço, salienta-se que os serviços com os quais

os inquiridos se manifestaram mais satisfeitos foram: o acompanhamento

em actividades do dia-a-dia, seguido das actividades ocupacionais, do

treino em orientação e mobilidade e do apoio psicológico.

A combinação entre o eixo dos serviços mais usufruídos e o eixo da

satisfação com os mesmos permite-nos identificar 4 grupos distintos de

serviços (Gráfico 1).

Gráfico 1. Relação entre o usufruto dos serviços e grau de satisfação

% dos Muito satisfeitos

70

Serv. acomp

Actividades Ocupacionais

Hab AVD

60

Act5iv0idades Desportivas

Treino Orient.

Mobilidade

Apoio Psicológico Ajudas técnicas

Apoio social

Actividades culturais

0 5 10 15

Des. estim. sensorial

40

Apoio ao e

30

Apoio jurídico 20

10

0

Fonte: Inquérito PSPVI

Temos um primeiro grupo de serviços, que engloba o treino em orientação

e mobilidade, o apoio psicológico, o apoio social, as actividades culturais

e lúdicas e o apoio às ajudas técnicas, e que correspondem aos mais

usufruídos com um nível de satisfação acima da média. Estes serviços

são, pois, um núcleo a preservar, na perspectiva dos inquiridos.

81

40 35 30 20 Hab N T2e5c

% q

ue

usu

fru

iu d

o s

erviç

o

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Um segundo grupo de serviços corresponde aos mais usufruídos, mas com

um nível de satisfação inferior à média: a formação profissional, o braille

e a habilitação em novas tecnologias. Trata-se de serviços nos quais é

necessário, de acordo com a perspectiva dos inquiridos, investir na

adequação/restruturação das suas respostas.

Um terceiro grupo reúne os serviços menos usufruídos mas com um grau

de satisfação elevado. Os serviços de acompanhamento em actividades do

dia-a-dia, as actividades ocupacionais e a habilitação em actividades da

vida diária, encontram-se neste conjunto de serviços que a ACAPO poderá

desenvolver, quer porque apresentam níveis de satisfação elevados, quer

porque contribuirão para a autonomia do público-alvo e para atenuar os

efeitos do isolamento social.

Falta de acompanhamento para se deslocar a hospital, ao médico, ir

ao cinema, ir a praia, ver um concerto. Não pode ser sempre de táxi

ou de transportes. (…) sugestão à ACAPO como resposta, seria o

voluntariado e acompanhamento que respondesse as necessidades de

acompanhamento para as limitações físicas etc.

Por fim, existe o grupo de serviços pouco facultados e que têm um grau de

satisfação inferior à média. Neste grupo encontram-se os serviços de

desenvolvimento e estimulação sensorial, o apoio ao emprego e jurídico.

É um núcleo de serviços que tem que ser repensado para corrigir os

disfuncionamentos de que sejam alvo e para equacionar o seu nível de uso

pelos utentes e/ou de disponibilização pela ACAPO aos utentes.

Entre os serviços com grau de satisfação inferior à média, dois - o apoio

ao emprego e a formação profissional - correspondem a serviços que ora

trouxeram ganhos de competências ou conhecimentos ora implicaram

mudanças significativas na vida dos inquiridos, pelo que importa

dinamizar os mesmos, uma vez que o emprego corresponde à principal

82

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necessidade identificada e respostas adequadas destes serviços produzem

impactos significativos na vida dos sujeitos.

Tabela 45. Inquiridos, segundo os serviços que trouxeram mais ganhos de conhecimentos ou

competências

Fonte: Inquérito PSPVI

A formação profissional surge como o terceiro serviço que maiores ganhos

de competências ou conhecimentos trouxeram, precedido pela

habilitação/ reabilitação em actividades da vida diária e pelo treino em

orientação e mobilidade. Para além dos ganhos de competências é

também ao nível destes serviços, a par do acesso a ajudas técnicas, que se

assiste a impactos mais significativos na vida dos inquiridos.

Em contrapartida, o braille e o apoio jurídico são os serviços que

implicaram mudanças na vida com médias de importância menores.

Importa sublinhar que há dois serviços particularmente sensíveis, entre

os que são prestados, dado serem simultaneamente vistos como

produtores de conhecimentos e de mudanças importantes na vida dos

beneficiários: o treino em orientação e mobilidade (classificado nos

serviços a preservar) e a formação profissional (um serviço a melhorar).

Serviços

Ganhos de conhecimentos ou

competências

N %

Habilitação/reabilitação AVD 83 98,8

Treino em orientação e mobilidade 331 97,0

Formação profissional 287 92,7

Habilitações em novas tecnologias 251 90,0

Desenvolvimento e estimulação sensorial 19 89,5

Apoio psicológico 289 89,3

Acesso a ajudas técnicas 242 88,8

Actividades desportivas 168 88,7

83

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Tabela 46. Inquiridos, segundo as médias da importância das mudanças de vida resultantes do

apoio/serviço

(escala de 1 a 3) Fonte: Inquérito PSPVI

Na perspectiva dos ganhos em conhecimento, há ainda dois serviços

sensíveis: a habilitação para as actividades da vida diária (a expandir) e a

habilitação em novas tecnologias (a melhorar).

Na perspectiva das mudanças de vida, saliente-se ainda o acesso a ajudas

técnicas (a preservar) e as actividades ocupacionais (a expandir).

Por exemplo, gostava de ser eu a ler as minhas cartas, não ter que estar

dependente dos outros, mas não tenho possibilidades para comprar

equipamento de leitura. São estas as barreiras que encontro. Nós

poderíamos ser muito mais independentes se tivéssemos mais ajudas

técnicas porque temos inúmeras coisas,

Serviços

Mudanças de vida

resultantes do

apoio/serviço

N Médias

Treino em orientação e mobilidade 328 2,80

Acesso a ajudas técnicas 242 2,72

Habilitação/reabilitação AVD 82 2,71

Formação profissional 282 2,62

Apoio psicológico 287 2,62

Actividades ocupacionais 64 2,59

Apoio ao emprego 134 2,57

Acompanhamento em actividade do dia-a-dia 70 2,57

Habilitações em novas tecnologias 250 2,57

Actividades culturais 453 2,42

Actividades desportivas 168 2,42

Apoio social 476 2,39

Desenvolvimento e estimulação sensorial 18 2,39

Atendimento/aconselhamento 304 2,38

Braille 194 2,27

Apoio jurídico 38 1,97

84

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muito material bom, mas como não há dinheiro e o material é muito

caro (consenso dos outros participantes). Pelo valor com que é

comercializado fica inacessível. (Focus Group Porto)

2.4. O SERVIÇO MAIS IMPORTANTE DE QUE BENEFICIOU

Aos inquiridos foi-lhe igualmente solicitado que indicassem, dos serviços

usufruídos, qual o serviço mais importante que receberam.

Os serviços considerados mais importantes foram o treino em orientação

e mobilidade (16%), a formação profissional (15%), o apoio social (13%),

as actividades culturais e lúdicas (11%) e o apoio psicológico (11%).

Sobre o serviço mais importante foi efectuado um conjunto de questões

para aferir até que ponto é respeitado e promovido o empowerment e a auto-

determinação das pessoas com deficiência visual.

É indiscutível o respeito dos técnicos pelas escolhas e opiniões dos

inquiridos (90% dos inquiridos considera que os técnicos respeitaram, as

suas escolhas e opiniões), bem como a prestação das informações sobre o

serviço (88%) e sobre os direitos e responsabilidades dos utentes (75%).

Tabela 47. Inquiridos, segundo o respeito dos técnicos pelas suas escolhas, opiniões e

preferências

Respeito dos

técnicos

PSPVI

(%)

Sim, sempre 90,4

Às vezes 8,2

Não 1,4

Total 100,0

N 977

Fonte: Inquérito PSPVI

85

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O respeito pelas escolhas e a prestação da informação é superior junto dos

inquiridos que entraram em contacto com a ACAPO mais recentemente e,

consequentemente junto dos utentes, uma vez que a relação com a instituição

é ela também mais recente – 89% dos sócios e 98% dos utentes afirmam que

os responsáveis e técnicos respeitaram sempre as suas escolhas.

Tabela 48. Inquiridos, segundo o respeito pelas suas escolhas, a prestação da informação e os

anos de contacto com a ACAPO

Respeito pelas suas escolhas e

prestação da informação

Anos de contacto com a ACAPO (%)

Há menos

de 10 anos

Há mais de

10 anos Total

Respeito pelas escolhas, % 93,6 86,2 90,3

opiniões e preferências sempre* N 496 376 872

Informação sobre o que esperar % 90,1 85,0 87,8

do serviço** N 474 375 849

Informação sobre os direitos e % 76,4 73,2 75,0

responsabilidades N 402 320 722

*(x2 (2)=14,994; p≤ 0.001)

**(x2 (1)=5,778; p≤ 0.05)

Fonte: Inquérito PSPVI

Curiosamente, ao nível da prestação de informações sobre os direitos e

responsabilidades constata-se que são os sócios os que mais receberam

esta informação e não os utentes.

Do conjunto de informações facultadas sobre os direitos e

responsabilidades dos clientes dos serviços, sobressaem a informação

sobre a missão, objectivos e grupo-alvo do apoio/serviço, o tipo de

apoio/serviço a ser fornecido e informação sobre as condições gerais de

acesso e cancelamento do apoio/serviço.

Existe no entanto espaço para melhorar a prestação de informações sobre

as taxas e preços aplicáveis aos apoios/serviços e sobre os procedimentos

para efectuar queixas e reclamações, uma vez que apenas 60% dos

inquiridos menciona ter recebido esta informação.

86

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Tabela 49. Inquiridos, segundo as dimensões incluídas no conjunto de informações facultadas

sobre os direitos e responsabilidades

Fonte: Inquérito PSPVI

A esmagadora maioria dos inquiridos compreendeu toda a informação

facultada (97%) e não sentiu lacunas em relação às competências dos

técnicos que lhe deram apoio (92%).

Para os inquiridos que consideram que os técnicos têm lacunas (8%), as

competências pedagógicas dos formadores e os conhecimentos na área de

formação são as principais áreas onde é necessário melhorar, a par da

necessidade de os técnicos terem formação ou estarem sensibilizados para

trabalhar com pessoas com deficiência visual.

Tabela 50. Inquiridos, segundo as lacunas dos técnicos

Lacunas técnicos PSPVI

(%)

Competências pedagógicas 32,5

Conhecimentos na área/formação

15,6

Sensibilização/Formação para trabalhar c/ pessoas com DV

14,3

Organização do serviço 11,7

Clareza de informação 6,5

Formação desajustada 6,5

Falta de continuidade do apoio/pós-acompanhamento

5,2

Falta de acompanhamento 3,9

Pontualidade/Acessibilidade 3,9

Total 100,0

N 77

Fonte: Inquérito PSPVI

Informações facultadas sobre os direitos e responsabilidades

PSPVI (%)

Missão

Tipo de

apoio

Condições

gerais

Taxas e

preços

Queixas e

reclamações

Incluía 93,4 96,3 85,7 69,1 60,1

Não incluía 6,6 3,7 14,3 30,9 39,9

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

N 641 667 630 554 572

87

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A proximidade dos clientes, espacial e temporal, surge como um factor

determinante na avaliação dos serviços e dos técnicos.

As lacunas dos técnicos são apontadas principalmente pelos inquiridos

que residem em zonas onde não existe uma delegação da ACAPO (por

exemplo, mais de 20% os inquiridos residentes em Portalegre, Beja e

Guarda indicam lacunas nos técnicos) e pelos que não beneficiam de

serviços há mais de 1 ano e entraram em contacto com a ACAPO há

mais de 10 anos.

Tabela 51. Inquiridos, segundo a identificação de lacunas dos técnicos e o tempo de recepção do

último serviço

Lacunas

Técnicos

Tempo de recepção do último serviço (%)

Recebe

actualmente

serviços

Não recebe

há menos

de 1 ano

Não recebe

há mais de

1 ano

menos de

10 anos

Há mais

de 10

anos

Sim 3,7 7,9 10,5 4,9 11,5

Não 96,3 92,1 89,5 95,1 88,5

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

N 348 190 429 535 444

(x2 (2)=12,598; p≤ 0.01)

Fonte: Inquérito PSPVI

O mesmo se aplica em relação a determinados atributos dos

apoios/serviços. Se não existe relação estatisticamente significativa entre

o horário de funcionamento e os custos dos serviços, no caso da

acessibilidade e da distância, bem como no que diz respeito à adequação

do apoio/serviço à deficiência, constata-se que o distrito de residência e o

meio onde vive são variáveis determinantes na análise da satisfação. De

igual modo, o tempo que medeia entre o 1º contacto com a ACAPO e a

actualidade, e a data do último serviço de que beneficiou, são variáveis

determinantes na análise da adequação do serviço e do horário do serviço,

sendo que quanto mais recentes os contactos com a ACAPO e o usufruto

do apoio/serviço maior o grau de satisfação com o mesmo.

88

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Tabela 52. Inquiridos, segundo a avaliação do serviço mais importante e das condições físicas do

espaço onde recebe

(escala de 1 a 4) Fonte: Inquérito PSPVI

Os vários atributos do apoio/serviço mais importante são avaliados de

forma positiva, não existindo nenhum indicador que seja avaliado de

forma negativa. Os inquiridos encontram-se satisfeitos principalmente

com o horário de funcionamento do apoio/serviço e com os custos do

mesmo, e apontam a acessibilidade e distância como os aspectos que,

embora não sejam avaliados de forma negativa, podem ser melhorados.

De salientar que a acessibilidade e distância são de igual modo os factores

elencados pelos inquiridos que não beneficiaram de serviços da ACAPO, e

que no grupo destes inquiridos se encontram os sujeitos com menor

autonomia e em situação de isolamento social. Também no grupo dos

inquiridos que avaliam de forma menos positiva a acessibilidade e

distância se encontra uma percentagem significativa das pessoas

dependentes e em situação de isolamento social e das

pessoas com alguma autonomia, excluídas do mercado de trabalho.

Indicadores

Avaliação do serviço

N Média

Horário de funcionamento 927 3,62

Custos do apoio/serviço 586 3,58

Limpeza e higiene 800 3,55

Adequação do apoio/serviço à deficiência

932 3,53

Tempos de espera de acesso ao apoio/serviço

894 3,48

Regularidade do apoio/serviço 880 3,44

Procedimentos e burocracia 838 3,44

Privacidade 794 3,38

Conforto/comodidade 809 3,35

Acessibilidade de transportes 811 3,11

Facilidade (distância) 867 3,1

89

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90

Tabela 53. Tipos sociais de qualidade de vida, segundo a acessibilidade de transportes para a

delegação e tipos sociais de qualidade de vida dos deficientes visuais

Acessibilidade de transportes

Tipos sociais de qualidade de vida dos deficientes visuais (%)

Pessoas

dependentes

e em situação

de isolamento

social

Pessoas

autónomas

em transição

ou risco de

marginalizaçã

o do mercado

trabalho

Pessoas

autónomas

inseridas no

mercado de

trabalho

Pessoas

autónomas

em risco de

exclusão do

mercado de

trabalho

Pessoas com

alguma

autonomia,

excluídos do

mercado de

trabalho

Má/Insatisfatória 37,2 15,9 19,2 17,8 34,2

Satisfatória/Boa 62,8 84,1 80,8 82,2 65,8

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

N 137 88 166 338 82

(x2 (12)=41,287; p≤ 0.001)

Fonte: Inquérito PSPVI

Apesar das avaliações do serviço mais importante serem em média

bastante satisfatórias, e de 75% dos inquiridos afirmarem que não existe

necessidade de melhorar o serviço em causa, 25% dos deficientes visuais

inquiridos identificam aspectos a melhorar no serviço, e destes, 31%

salienta que é necessário melhorar as condições físicas do espaço em

termos de conforto e limpeza, mas também a nível da privacidade (5%) e

acessibilidade dentro do próprio edifício. A acessibilidade/distância e

carência de transportes para a instituição e da instituição correspondem

ao 2º aspecto a melhorar em termos físicos, sendo de salientar ainda, em

termos de acessibilidade, a necessidade de melhorar o sistema de

informação e divulgação dos serviços da ACAPO.

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Tabela 54. Inquiridos, segundo os aspectos a melhorar no serviço mais importante

Fonte: Inquérito PSPVI

No que diz respeito às respostas fornecidas, é reclamada uma maior

adequação dos conteúdos da formação (8,1%) a par da necessidade de as

formações serem ministradas por técnicos sensibilizados ou formados na

temática da deficiência visual.

Novas respostas/valências dos serviços em causa são solicitadas,

nomeadamente, a aposta na continuidade dos apoios e num pós-

acompanhamento (4,5%) e, na área do apoio ao emprego, a criação de

protocolos específicos junto de tecido empresarial (1,6%).

Aspectos a melhorar PSPVI

(%)

Condições físicas de espaço/conforto e limpeza 30,5

Acessibilidade/Transportes 9,3

Adequação do conteúdo da formação 8,1

Formadores e técnicos sensibilizados ou c/ formação na temática de deficiência visual

8,1

Actualização dos equipamentos/novas tecnologias

5,3

Privacidade 4,5

Aposta na continuidade dos apoios prestados e acompanhamento pós serviço

4,5

Dinamização de serviços existentes noutras delegações

4,5

Melhorar a acessibilidade dentro do edifício 4,1

Outros 3,7

Maior dinamismo para interacção mais cedo e atempada

3,7

Melhorar o serviço de informação e divulgação 3,3

Mais recursos humanos 3,3

Investir na Formação profissional 2,8

Melhorar o apoio na obtenção e utilização de ajudas técnicas

1,6

Apoio ao emprego - criação de protocolos específicos junto de tecido empresarial

1,6

Adequação dos horários de atendimento 1,2

Total 100,0

N 246

91

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Tem que haver alguém no terreno a promover o emprego. Sensibilizar

os empresários, mostrar a nossa capacidade, mostrar que temos valor.

Eu não quero fazer o meu trabalho porque o estado paga, quero fazer

o meu trabalho pelo meu valor. A adaptação do posto de trabalho, acho

que sim, mas agora pagar para nos receber não é por aí. Deve ser

pelas nossas capacidades reais. Eu trabalhei como cortador de

matérias e não há um, e os meus colegas podem dizer isso, que tivesse

o meu rendimento. Não é que eu fosse mais interessado ou empenhado,

não. É porque os olhos de quem vê, distraem, nós não. Nós

conhecemos a máquina. (Focus Group Porto)

2.5 LACUNAS E DESIGUALDADE DE RESPOSTAS

A desigualdade de respostas disponibilizadas nas várias delegações

existentes leva a que muitos dos inquiridos, que apontam lacunas

existentes nas valências disponibilizadas pela ACAPO (33%), solicitem

serviços que já são desenvolvidos noutras delegações, nomeadamente a

Formação Profissional, a Habilitação/Reabilitação em Actividades da

Vida Diária e Serviços de Acompanhamento e Apoio Domiciliário.

92

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Tabela 55. Inquiridos, segundo os principais apoios/serviços necessários que a ACAPO não

disponibiliza (resposta múltipla)

Fonte: Inquérito PSPVI

2.6 UMA TIPOLOGIA DA SATISFAÇÃO COM OS SERVIÇOS E DOS IMPACTOS

NA VIDA DOS UTENTES

Com o objectivo de analisar a satisfação global com os serviços, foi de igual

modo efectuada uma análise de clusters com os mesmos parâmetros

metodológicos que a análise efectuada para a qualidade de

Apoios/serviços necessários não disponibilizados

PSPVI (%)

Formação/cursos (Inglês, TIC, entre outros)

13,5

Habilitação/reabilitação AVD 10,5

Serviço de acompanhamento/Apoio ao domicílio

8,2

Transporte para a ACAPO/acessibilidades

7,9

Apoio ao emprego 7,4

Actividades de Lazer 6,6

Venda de produtos de apoio em condições mais favoráveis

6,4

Delegação/Apoios/Serviços mais próximos da área de residência

5,4

Melhorar os serviços de informação e divulgação (interno e externo)

5,4

Apoio financeiro 2,8

Orientação e Mobilidade 2,6

Implementar novos serviços/apoios indiferenciados

2,6

N 392

93

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vida12, e onde se incluíram todas as variáveis relacionadas com a satisfação

global com os serviços, os impactos dos serviços na vida pessoal e no bem-

estar físico, tendo-se obtido 3 grupos distintos de inquiridos.

Tabela 56. Grupos de satisfação global dos serviços (%)

Grupos de satisfação

PSPVI (%)

Muito satisfeitos 26,1

Satisfeitos 68,2

Pouco satisfeitos 5,7

Total 100,0

N 1015

Fonte: Inquérito PSPVI

O grupo maioritário, que reúne cerca de 70% dos inquiridos, corresponde

aos sujeitos que apresentam um grau de satisfação intermédio com os

serviços. Segue-se o grupo dos inquiridos que se encontra bastante

satisfeito com os serviços, que corresponde a cerca de ¼ dos inquiridos,

e o grupo das pessoas pouco satisfeitas com os serviços, que são 6% da

nossa população.

De um modo geral, os inquiridos encontram-se satisfeitos com os vários

indicadores dos serviços analisados. A simpatia dos profissionais, a

relação com o pessoal da ACAPO são os indicadores que reúnem um maior

grau de satisfação, seguido das competências dos profissionais e do

respeito dos profissionais pelos direitos das pessoas inquiridas.

12 Incluídas todas as variáveis que se afastam mais de 0,2 do centroide de cada dimensão (2 dimensões retidas); Teste Alpha de Chronbach= 0,959 (aceitável a partir de 0,7)

94

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Tabela 57. Grupos de satisfação global dos serviços, segundo a satisfação global com os serviços

(médias)

Indicadores de satisfação

Satisfação global com os serviços (médias)

Muito satisfeitos

Satisfeitos Pouco

satisfeitos Total

Simpatia dos profissionais 3,8 3,4 3,3 3,5

A sua relação com o pessoal da ACAPO 3,8 3,4 3,4 95

3,5

Competências e conhecimentos dos profissionais técnicos

3,7 3,3 3,1 3,4

O respeito pelos seus direitos (privacidade, dignidade)

3,8 3,2 3,1 3,4

Relacionamento com os outros utentes 3,6 3,2 2,9 3,3

A eficácia do apoio/serviço 3,7 3,1 2,8 3,3

As escolhas que pode tomar 3,6 3,1 2,8 3,2

Respostas dos apoios às necessidades pessoais 3,6 3,1 2,8 3,2

Apoio à participação e integração na comunidade 3,6 3,0 2,5 3,1

Resolução de queixas e reclamações 3,5 2,9 2,2 3,0

Fonte: Inquérito PSPVI

A linha que separa os grupos divide os indicadores em duas dimensões:

uma dimensão mais relacional e uma outra de impactos dos serviços.

Um menor grau de satisfação é apresentado em relação à eficácia do

serviço, muito associada, de igual modo às respostas dos apoios às

necessidades pessoais e às escolhas que o sócio/utente pode tomar, bem

como ao apoio à participação e integração na comunidade.

Apesar das escolhas que o cliente pode tomar ser um dos indicadores ao

qual é conferido menor grau de satisfação, é interessante constatar que,

quando inquiridos sobre quem deve escolher os técnicos de apoio, apenas

37% refere que o técnico deveria ser escolhido por decisão do próprio e

71% considera que devia ser o próprio técnico que presta o serviço.

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Tabela 58. Inquiridos, segundo a opinião sobre quem deve escolher os técnicos de apoio

(resposta múltipla)

Fonte: Inquérito PSPVI

Não obstante, parece existir um espaço de melhoria dos serviços no que diz

respeito à adaptação/adequação ao indivíduo e às suas necessidades –

uma maior personalização dos serviços, bem como a necessidade de serviços

direccionados para apoiar a integração na comunidade.

A resolução de queixas e reclamações é o indicador que reúne o maior grau

de insatisfação, sendo de mencionar que também é a este nível que os

inquiridos manifestaram uma maior ausência de informação.

Ainda no que diz respeito à análise global dos serviços, procurou-se saber

até que ponto os apoios/serviços usufruídos contribuíram para melhorar

vários aspectos da vida pessoal dos inquiridos. Os vários indicadores

analisados encontram-se agrupados em 4 tipos de efeitos/respostas dos

serviços: a nível da intermediação, da rede social, do autoconceito e da

autonomia.

Escolha dos técnicos

PSPVI (%)

N %

Decisão dos dirigentes da ACAPO 844 66,2

Decisão do técnico que presta o serviço 820 70,9

Por decisão do próprio 843 36,7

Por decisão da entidade que financia os serviços

819 32,2

96

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Tabela 59. Tipologia de efeitos dos serviços

Da análise das médias dos impactos agregadas por dimensão é possível

constatar que os grupos são diferenciados em função do nível de

concordância com os impactos dos serviços na sua vida.

Intermediação

Ajudou-me a ter acesso a apoios que antes não conhecia

Abriu-me portas para novas oportunidades na minha vida

Ajudou-me a adaptar-me melhor às exigências do mundo do trabalho

Ajudou-me a encontrar uma oportunidade de trabalho ou um estágio

Ajudou-me a aumentar o número de pessoas com quem tenho contacto regular

Rede social Ajudou-me a progredir na forma como sou capaz de comunicar com os outros

Ajudou-me a melhorar as relações com as pessoas que me são mais próximas

Contribuiu para que, em geral, me sinta satisfeito comigo próprio

Ajudou-me a ser capaz de lidar melhor com os meus problemas de saúde física e emocional

Passei a aceitar melhor a minha deficiência

Tornou-me mais apto a conhecer e defender melhor os meus direitos individuais e de grupo

Passei a sentir-me uma pessoa mais segura de mim mesma

Autoconceito Contribuiu para que eu seja uma pessoa mais capaz de resolver problemas

Passei a ocupar melhor os meus tempos livres

Contribuiu para que eu tenha hoje maior capacidade para tomar decisões

Contribuiu para que me tornasse uma pessoa mais responsável

Sinto que estou em melhores condições para desenvolver actividades físicas

Ajudou-me a ser mais autónomo no meu dia-a-dia

Permitiu-me investir na minha educação e aprender coisas novas

Ajudou-me a ter maior capacidade para contornar obstáculos e superar dificuldades

Melhorei a minha capacidade de me deslocar

Autonomia Ajudou-me a traçar melhor planos e objectivos para a minha vida

Tornei-me mais capaz de desempenhar as tarefas do meu dia-a- dia

Sou hoje mais capaz de cuidar de mim próprio

Melhorei a minha capacidade para tomar conta da minha casa sem pôr em causa a minha segurança

97

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Os inquiridos muito satisfeitos com os serviços são os que mais

concordam que os serviços tiveram efeitos sobre a sua vida,

principalmente ao nível da sua vida social, mas também sobre a imagem

que tem sobre si próprio. Por outro lado, os pouco satisfeitos são os que

menos consideram que os serviços tiveram impacto na sua vida, e que, a

terem, foram sobre a sua vida social e na função de intermediação. Por

fim, o grupo dos satisfeitos considera de igual modo que os impactos se

sentem mais ao nível da rede social e da intermediação, contudo com um

maior grau de concordância do que o grupo dos pouco satisfeitos.

Tabela 60. Grupos de satisfação global dos serviços, segundo a média de Impactos por dimensão

Dimenões

Impactos (Médias)

Muito Satisfeitos

Satisfeitos Pouco

Satisfeitos Total

Rede Social 3,41 2,65 1,84 2,80

Intermediação 3,16 2,57 1,78 2,67

Autoconceito 3,29 2,55 1,74 2,70

Autonomia 3,22 2,52 1,74 2,65

(escala de 1 a 4)

Fonte: Inquérito PSPVI

Concluindo, a distinção destes três grupos foi efectuada essencialmente

pelos impactos dos serviços e não pelo grau de satisfação com os

serviços em si, nem tão pouco com o tipo de serviços que usufruíram,

embora, obviamente a avaliação global dos serviços seja influenciada

pela percepção dos impactos. Quando solicitados a avaliar de 1 a 10 a

ACAPO enquanto prestadora de serviços, o grupo dos muito satisfeitos

avaliam a ACAPO com um 8,7, os satisfeitos com um 7 e os pouco

satisfeitos com um 6,3, sendo a média global de 7.

Também não se verificam diferenças ao nível do perfil sociodemográfico

dos inquiridos dos três grupos identificados, apesar do grupo dos pouco

satisfeitos ser ligeiramente mais velho (a idade média do grupo dos muito

satisfeitos e dos satisfeitos é de 48 anos, e do grupo dos pouco satisfeitos

é de 51). Desta forma, quais as razões para esta diferenciação?

98

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Mais ¾ dos inquiridos que se encontram muito satisfeitos com os serviços

beneficiaram de pelo menos dois tipos de serviços, ao passo que cerca de

metade dos inquiridos insatisfeitos beneficiou apenas de um tipo de

serviços.

Tabela 61. Grupos de satisfação global dos serviços, segundo o tipo de serviços usufruídos13

Tipo de serviços

Grupos de satisfação global dos serviços (%)

Muito Satisfeitos

Satisfeitos Pouco

Satisfeitos Total

Apenas 1 serviço 23,0 35,4 48,3 32,9

Dois tipos de serviço

31,3 32,9 29,3 32,3

Três tipos de serviço

35,1 23,1 17,2 25,9

Todos 10,6 8,5 5,2 8,9

Total 100,0 100,0 100,0 100,0

N 265 692 58 1015

(x2 (6)=27,910; p≤ 0.001)

Fonte: Inquérito PSPVI

Os muito satisfeitos são os que tiveram mais recentemente contacto com

a ACAPO, bem como aquele que mais cedo contactou a instituição após

ter tido conhecimento da sua deficiência visual e são os que mais se

encontram a receber os serviços actualmente. Consequentemente são os

que mais tiveram entrevista com os técnicos, os que mais receberam

informação sobre o serviço e sobre os seus direitos e responsabilidades.

13 Serviços da vida social – actividades culturais e actividades desportivas; Serviços de acompanhamento – apoio social,

apoio psicológico, apoio jurídico, acesso a ajudas técnicas, serviço de acompanhamento e atendimento e

aconselhamento; reabilitação – Treino OM, Braille, Habilitação AVD, Habilitação Novas Tecnologias,

Desenvolvimento e estimulação sensorial e actividades ocupacionais.

99

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Tabela 62. Grupos de satisfação global dos serviços segundo variáveis-chave

Fonte: Inquérito PSPVI

Quer isto dizer que ou as respostas actuais estão mais adequadas ou o

efeito de distanciamento provocado pela passagem do tempo, após o

contacto com a realidade, leva os inquiridos a aperceberem-se que os

serviços não produziram os impactos antecipados.

Variáveis-chave

Grupos de satisfação global dos serviços (%)

Muito Satisfeitos

Satisfeitos Pouco

Satisfeitos

1º Contacto com a ACAPO há menos de 10 anos

64 50 45

Contacto com os técnicos regular (pelo menos 1 vez por mês)

61 46 43

Recebem serviços actualmente 50 31 22

Ocorrência de Entrevista 86 72 68

Respeito pelas escolhas (sempre) 96 89 78

Informação sobre o serviço 92 87 73

Informação sobre direitos e responsabilidades

82 74 54

Dificuldades em aceder ao serviço 7 9 11

Sem Autonomia na Mobilidade 17 15 22

100

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III. CRESCER, ALARGAR O CAMPO DE ACÇÃO,

ADEQUAR A ESTRUTURA AOS NOVOS DESAFIOS –

UMA PROPOSTA DE ESTRATÉGIA PARA A ACAPO

A ACAPO presta serviços mas, simultaneamente, tem como missão a

defesa dos direitos e interesses dos deficientes visuais tendo em vista a sua

plena integração socioprofissional e, para a cumprir, leva a cabo a

actividade de representação e de defesa dos direitos e interesses das

pessoas com deficiência visual em Portugal, actuando nas diferentes

esferas de influência: político-institucional, social, económica, entre

outras.

Na origem, a associação prestava serviços exclusivamente aos seus sócios,

que também representava, mas, desde 2000, fruto de acordos de

cooperação com os Centros Distritais da Segurança Social, foi criada a

figura de utente, para que a Associação possa dar acesso aos serviços à

população com deficiência visual em geral, para além dos associados da

instituição.

A associação é, hoje, uma instituição representativa, nessa função, sendo

uma instituição assente na democraticidade e dirigida por corpos

dirigentes eleitos pelos sócios e uma instituição que presta serviços de

modo aberto, não apenas aos seus sócios, mas à comunidade em geral.

3.1 A ACAPO NA VISÃO DE SÓCIOS E UTENTES

3.1.1 IDENTIDADE: UMA ASSOCIAÇÃO REPRESENTATIVA E PRESTADORA DE SERVIÇOS

A identidade mista da ACAPO como entidade representativa e prestadora

de serviços é simultaneamente identificada e valorizada pelos sócios e

utentes inquiridos.

101

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Tabela 63. Inquiridos, segundo o que consideram ser a identidade actual e desejável da ACAPO

Fonte: Inquérito PSPVI

Mais de 70% identificam a associação como entidade de representação e

prestação de serviços e 86% consideram que a identidade futura deve ser

essa, expressando a vontade de reforço da identidade da associação. Não

há, pois, hesitações por parte dos inquiridos quanto a que a identidade da

ACAPO deve ser mantida como entidade mista.

A actuação da ACAPO enquanto entidade que representa a população com

deficiência visual em Portugal é reconhecida de forma positiva pela larga

maioria dos sócios (84%) e dos utentes (93%), que consideram que a

instituição defende os interesses das pessoas que representa.

O desempenho da associação é visto pelos inquiridos como globalmente

positivo e para isso contribuem equilibradamente as duas funções da

associação. Numa escala de 1 a 10 em que 1 significa estar muito

insatisfeito e 10 significa estar muito satisfeito, os inquiridos atribuem à

associação uma nota de 7,3 enquanto entidade prestadora de serviços e

de 7,1 enquanto entidade representativa.

Os níveis de concordância com a identidade da associação são também

expressos pela baixa proporção de inquiridos descontentes com o trabalho

da instituição – apenas 3% dos inquiridos, dos quais 98% são sócios. As

críticas deste pequeno grupo incidem sobre a qualidade do trabalho (não faz

bem nem a representação nem os serviços, não

Identidade A ACAPO

actualmente é (%)

A ACAPO deve ser

(%)

Uma associação de representação e prestação de serviços

72,4 86,0

Uma associação de representação 8,8 6,4

Uma associação prestadora de serviços 7,0 2,3

Nem uma coisa nem outra/Não sabe/Não responde

11,8 5,2

Total 100,0 100,0

N 1325 1325

102

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defende direitos, está estagnada e tem estratégia incoerente ou

desarticulada, não atende necessidades), sobre desequilíbrios (defende

apenas os interesses de alguns, está muito centrada em Lisboa e Porto, há

delegações que não prestam serviços) ou sobre funcionamento (devia ter

normovisuais nas direcções).

Existe um consenso generalizado relativamente à opinião de sócios e

utentes no que diz respeito a iniciativas consideradas importantes para

promoção ou reforço de actuação da ACAPO.

Tabela 64. Inquiridos que consideram importante reforçar a acção da ACAPO, segundo os

aspectos a reforçar

Aspectos a reforçar

PSPVI

% N

Sensibilização da comunidade 97,8 1045

Consultoria a entidades 97,1 1037

Representação junto de organismos internacionais

95,1 1016

Participar em eventos locais 94,3 1007

Participar em medidas e políticas nacionais 93,4 998

Descontos e condições favoráveis 93,1 994

Organizar grandes eventos a nível nacional 84,2 899

Fonte: Inquérito PSPVI

Os inquiridos demonstraram grande adesão às ideias que lhes foram

sugeridas sobre possíveis áreas de reforço da actuação da ACAPO, quer no

sentido de aumentar a consciência da comunidade, quer no sentido de

participar em desenvolvimento de medidas e políticas, quer no sentido de

diversificar serviços prestados.

103

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3.1.2 ENVOLVIMENTO E PARTICIPAÇÃO: ASPECTO A REFORÇAR

Os sócios da ACAPO são na sua maioria homens (57%), com maior

concentração na faixa etária entre os 35 e os 54 anos (44%) e média de

idade de 48 anos. Um quarto dos associados tem menos que o primeiro

ciclo do ensino básico e mais de metade (56%) obtiveram níveis de

escolaridade entre o 2º ciclo do ensino básico e o ensino secundário

completos. O seu meio de vida é maioritariamente (55%) dependente de

pensões de reforma ou de prestações da Segurança Social ou, por outro

lado, de rendimentos do trabalho ou da propriedade (29%).

Por sua vez, os utentes são maioritariamente do sexo masculino (53%) em

que quase metade (49%) encontra-se na faixa etária com 55 ou mais anos

e uma média de idade de 53 anos. Cerca de 75% completaram no máximo

o 9º ano de escolaridade, correspondendo ao 3º ciclo do ensino básico,

sendo que quase metade (45%) completou no máximo o 1º ciclo. Este

grupo é muito dependente de pensões de reforma e/ou prestações da

Segurança Social, pois 72% afirmaram ser este o seu meio de vida

principal.

Em comparação e em síntese, assinala-se o grupo dos utentes como sendo

mais idoso, menos escolarizado e mais dependente de apoios do Estado

do que os associados da ACAPO.

Relativamente à deficiência visual, os sócios são na sua maioria pessoas

cegas (62%) e que, em geral, adquiriram a cegueira ou a baixa visão

durante a infância ou juventude. Por outro lado, os utentes são

maioritariamente indivíduos com baixa visão (56%), que em média

ficaram cegos ou amblíopes numa fase mais adiantada da vida, isto é,

depois dos 30 anos. Mas, o conjunto dos inquiridos tem uma estrutura

quanto à idade de aquisição da deficiência que se afasta da população com

deficiência visual no país: um terço dos inquiridos é deficiente visual de

nascença, metade adquiriu a deficiência visual antes dos 10 anos e três

quartos adquiriram-na antes dos 30 anos. Há, pois, uma grande

subrepresentação das pessoas que adquirem a deficiência na

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idade adulta e em particular em relação com o processo de

envelhecimento.

Esta subrepresentação é natural numa associação que parte da definição

de deficiência para a sua actuação. Uma parte substancial das pessoas que

adquirem deficiência visual na idade adulta e em particular

articuladamente ao processo de envelhecimento não se auto-imagina

como deficiente, mas como doente e acaba por não procurar instituições

que intervêm numa área que não sentem como sua.

Uma aproximação quanto à diferença entre o perfil das pessoas com

deficiência que se envolvem na associação e aquelas que esta poderia

servir mas tem dificuldades em encontrar, pode ser-nos dada pela

consideração da diferença de estrutura em relação aos tipos sociais de

qualidade de vida de associados e utentes da ACAPO.

Tabela 65. Tipos sociais de qualidade de vida, segundo a sua relação com a ACAPO

Tipos sociais de qualidade de vida PSPVI (%)

Sócio (N=1068)

Utente (N=247)

Pessoas em isolamento social e dependentes 17,70 47

Pessoas autónomas em transição ou risco de marginalização, com actividade social e sem particpação cívica

9,20 9,30

Pessoas autónomas, inseridas no mercado de trabalho com actividade social e com participação cívica

20,80 9,30

Pessoas autónomas em risco de exclusão do mercado de trabalho, com actividade social e sem participação cívica

42,60 21,10

Pessoas com alguma autonomia, excluídas no mercado de trabalho com actividade social e com participação cívica

9,70 13,40

(x2 (4)=114,956; p≤ 0.00)

Fonte: Inquérito PSPVI

No caso dos sócios, quase metade (43%) encontra-se no grupo das pessoas

autónomas, em risco de exclusão do mercado de trabalho, com actividade

social e sem participação cívica e 21% são pessoas autónomas, com

inserção profissional e actividade social e cívica activas.

No caso dos utentes, quase metade (47%) são pessoas em isolamento

social e dependentes e 21% são pessoas em risco de exclusão do

105

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mercado de trabalho, sem participação cívica, embora com actividade

social.

É notório que a aproximação da ACAPO às pessoas com deficiência visual

em situação de maior fragilidade social se faz pelo tipo de serviços que

presta, uma vez que estas são tocadas essencialmente como utentes.

Quando se interroga os utentes porque não se tornaram sócios, 80% deles

elencam, sobretudo, a não identificação de vantagens, o pagamento de

quotas e a falta de conhecimento ou de proposta dessa possibilidade,

como razões para não se tornarem sócios da instituição.

Tabela 66. Utentes, segundo a razão para não se tornarem sócios

Razões para não ser sócio Utentes

(%)

Não identifica vantagens 38,4

Pagamento de quotas 24,1

Não foi proposto/não tinha conhecimento 17,6

Contacto recente com a ACAPO 7,4

Falta reunir documentação necessária (multiusos)

4,6

Pretende tornar-se sócio 2,8

Distância 1,9

Outra 1,9

N 216

Fonte: Inquérito PSPVI

Para além das principais razões apontadas, alguns utentes (7%) justificam

que o contacto com a instituição ainda é muito recente para darem esse

passo e apenas, 7% dos utentes afirma estar ou no processo de se tornarem

sócios ou com intenções de o vir ser.

A ACAPO, para envolver melhor este grupo com um perfil social diferente

dos seus sócios, terá que conseguir captá-los para a sua função de

representação.

O envolvimento dos sócios, por sua vez, suscita alguma reflexão. A

capacidade de influenciar os rumos da associação pela via da participação

eleitoral é usada com moderação.

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Tabela 67. Sócios que costumam votar nos processos eleitorais da ACAPO

Fonte: Inquérito PSPVI

A participação eleitoral dos associados é fraca pois cerca de dois terços dos

sócios ou nunca votam – quase metade do total de associados – ou votam

apenas esporadicamente.

A mobilização dos sócios para actividades relacionadas com a ACAPO é

pouco frequente.

Tabela 68. Inquiridos que são sócios da ACAPO, segundo o tipo e frequência de envolvimento

na associação

Sócios Frequentemente Às

vezes Nunca Total N

Lê revista/boletim ACAPO 32,3 24,6 43,1 100,0 1065

Participa nos eventos comemorativos da ACAPO

15,1 29,8 55 100,0 1063

Participa em actividades recreativas (convívios, actividades desportivas, etc.) organizadas pela associação

14,6

33,1

52,3

100,0

1063

Participa em actividades artísticas e culturais (vistas de estudo, teatro, fotografia, etc.) organizadas pela associação

9,8

27

63,2

100,0

1063

Listas de discussão, chats ou fóruns relacionados com a temática da deficiência

7,2

11,5

81,4

100,0

1062

Frequenta colónias de férias organizadas pela associação

4,5 12,4 83,2 100,0 1027

Escreve textos de tomada de posição 3,6 13,4 83 100,0 1066

Costuma enviar sugestões/recomendações

2,8 15 82,2 100,0 1063

Fonte: Inquérito PSPVI

A revista/boletim da ACAPO é o mais forte elo de ligação entre a

associação e os seus membros, já que 32% dos sócios segue o boletim com

frequência e 25% ocasionalmente.

Sócios que costumam votar nos processos eleitorais da ACAPO

(%)

Frequentemente 33,7

Às vezes 19,8

Nunca 46,5

Total 100,0

N 1068

107

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O segundo elo mais intenso dos sócios à associação é a organização de

eventos comemorativos e actividades recreativas.

3.2. PROPOSTA DE ESTRATÉGIA DE MÉDIO PRAZO

3.2.1 SITUAÇÃO ACTUAL E OBJECTIVOS DE MUDANÇA

A ACAPO é uma associação de auto-representação de pessoas com

deficiência visual, enquanto tal integrada no conceito geral das

instituições que visam fazer com que as pessoas com deficiências sejam

vistas como pessoas que têm algo a oferecer e competências a partilhar e

não apenas como pessoas com dficuldades e limitações” (Balcazar, Keys,

Bertram e Rizzo, cit. in Lan, 2007).

A auto-representação cruza-se com o conceito de vida independente

porquanto a actividade de auto-representação busca dar voz própria aos

cidadãos deficientes, reivindicando os seus direitos, incluindo o direito a

fazer escolhas e ser independente e o direito a assumir responsabilidades

na sociedade a par com os outros cidadãos. Se o movimento da vida

independente procura criar as condições para que cada pessoa ao nível

individual possa exercer esses direitos, o movimento de auto-

representação criou entidades colectivas visando garanti-lo para o

universo dos representados.

Na fase da contestação ao modelo médico de deficiência, o movimento de

auto-representação ganhou grande proeminência, dada a proximidade

entre a percepção da situação dos deficientes pelo modelo social e a

centralidade de desenvolvimento de movimentos reivindicativos de

direitos. Estudando a situação internacional do movimento, foi observado

que ele começou por ser muito politizado, para se ter institucionalizado na

última década do século passado e

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estar a passar por uma faze de marginalização no início do século XXI

(McColl e Boyce, 2003).

Em Portugal não é difícil encontrar a mesma sucessão de fases, porventura

com uma década de desfasamento. Há que, sublinhar, para compreender

a situação actual da ACAPO, a importância dos acordos com a segurança

social na sua consolidação institucional. Daí que, tal como os sócios e

utentes inquiridos, nos pareça ser fundamental, mais que não fosse por

realismo, preservar a identidade mista da ACAPO enquanto entidade

representativa e prestadora de serviços.

O carácter misto da associação permite-lhe distinguir-se de uma actuação

exclusivamente “para-sindical” confinada à reivindicação de direitos e de

uma actuação puramente enquanto instituição “para- prestadora de

cuidados” centrada na intervenção junto de indivíduos com necessidades

de serviços.

O carácter misto permite-lhe ainda, como se verificou neste estudo,

aproximar-se de novos públicos, que pretende representar, mas têm

características diferentes dos que espontaneamente dela se aproximaram.

Nesse sentido, a prestação de serviços e a representação estabelecem uma

relação sinérgica, potenciando-se mutuamente.

A prestação de serviços por uma associação de auto-representação não

tem necessariamente que circunscrever-se à área da reabilitação.

Aprendendo com a experiência do movimento sindical, o movimento de

auto-representação de deficientes, pode potenciar serviços aos seus sócios

que visam promover a sua qualidade de vida, defendendo os valores da

associação e estimulando o envolvimento nela. Este é já o caso, na ACAPO,

da organização de eventos e convívios, que se revelaram ser um dos

elementos da sua actuação que geram maiores níveis de envolvimento dos

sócios.

Uma entidade de auto-representação não pode menosprezar a questão da

representatividade. De novo em paralelo com o movimento sindical, a sua

força deriva da capacidade de ter consigo as pessoas que visa representar

e de ter no seu seio as condições para ser “a voz” dos

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problemas dessas pessoas. A este respeito, a ACAPO é hoje uma

instituição com duas fragilidades a corrigir. Por um lado, tem um número

de associados ainda insuficiente face ao conjunto da população com

deficiência visual. Por outro, os seus associados têm um enorme

enviesamento em favor dos deficientes visuais de nascença ou que

adquiriram a deficiência na fase inicial da vida.

Em síntese, nos aspectos fundamentais para a definição de uma estratégia

de acção, a situação actual da ACAPO define-se por:

– Ser uma organização “mista”, de serviços e representação;

– Servir enquanto utentes uma população-alvo com uma estrutura

social diferente dos sócios;

– Ter o seu foco em sócios que adquiriram precocemente deficiência

visual;

– Estar focada nos serviços “de cuidado” e de reabilitação mas ter

iniciado a diversificação, nomeadamente em direcção ao

empowerment de sócios e utentes incluindo serviços de carácter

social e de lazer.

Com base neste diagnóstico definiram-se alguns objectivos essenciais de

mudança para a associação.

Não se propõe que a identidade da associação mude, dado o carácter

sinérgico da relação entre serviços e representação, o bom desempenho

percebido por sócios e utentes nas duas dimensões e o efeito específico de

diversificação de públicos servidos que a prestação de serviços permitiu à

associação.

Propõe-se que a associação adopte uma estratégia centrada no

crescimento e diversificação. Tendo como inspiração a experiência por

que passa internacionalmente o movimento sindical, depois de

confrontado por mutações sociais profundas e actuando num contexto

que se lhe tornou adverso (Heery, 2005), propõe-se que a estratégia de

crescimento e diversificação assuma dois desafios transformadores:

organizar os não organizados; alargar o campo de acção. A este deve

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juntar-se um outro, de reforço, ou seja envolvendo o que se prende com

melhorar a actividade que se desenvolve.

O objectivo de organizar os não organizados pode expressar-se numa

simples meta de crescimento quantitativo, para a qual deve considerar- se

o esforço de inscrição de actuais e futuros utentes e uma intervenção mais

activa na promoção da participação na associação. Atingir a 5 anos a

meta de 5000 sócios parece um objectivo realista para a actual fase da vida

da associação.

O objectivo de alargamento do campo de acção implica uma adaptação do

foco de acção da ACAPO, de modo a que se adapte a transformações

ocorridas na própria definição de deficiência visual, na situação social das

pessoas com deficiência visual e nos objectivos da representação da

globalidade das pessoas com esta deficiência.

A adopção da Classificação Internacional de Funcionalidades teve

múltiplas consequências na percepção da deficiência. O que define um

deficiente visual não é o momento da vida em que adquire a deficiência ou

a sua causa, mas o facto de ter uma dificuldade de visão extrema ou uma

incapacidade total de visão. Ora, em todo o mundo o movimento de

representação de pessoas com deficiência visual está historicamente

ligado à deficiência visual adquirida na infância ou precocemente.

Acresce que a evolução da medicina levou a que a estrutura da população

com deficiência visual se alterasse. Há hoje muito mais pessoas que têm

deficiência visual em relação com lesões provocadas por patologias que

passaram a ter sobrevidas muito mais extensas que no passado. O

envelhecimento leva a que mais pessoas sejam atingidas por doenças

degenerativas e vivam com essa condição por mais anos.

Como vimos neste estudo, as pessoas que adquirem deficiência visual na

idade adulta e as pessoas idosas com deficiência visual estão fortemente

subrepresentadas entre o grupo tocado pela ACAPO por relação ao seu

peso na sociedade portuguesa e corrigir este desequilíbrio melhoraria a

representatividade real da associação.

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O alargamento do campo implica também a consideração da mudança da

situação social das pessoas com deficiência visual, quer no que diz respeito à

sua situação objectiva quer quanto às suas aspirações. Como se viu neste

estudo, o sistema de reabilitação é frágil no que diz respeito ao trabalho

com adultos, à promoção da qualificação e inserção no emprego e à

prevenção e mitigação de dinâmicas que reforçam as situações de

dependência. Como também se viu neste estudo, para além da

dependência, que a reabilitação já cuida – independentemente do sucesso

que tenha – de diminuir, há fenómenos sociais de isolamento, em

particular de deficientes visuais idosos, que continuam a não ser

suficientemente considerados.

O alargamento de campo tem duas dimensões. No que diz respeito às

pessoas, visa estender a associação a novos públicos, em que se destaca

a necessidade de actuar mais eficazmente junto de idosos, de acidentados

e de pessoas que adquirem a deficiência visual na sequência de patologias

que não são comummente associadas à condição de deficiente. No que diz

respeito aos serviços, tem como fulcro o reexame dos serviços prestados

tendo em vista cobrir novas necessidades, em que se destacam a

reabilitação funcional e profissional de adultos, a activação da sociedade

para a geração de oportunidades de emprego e vida autónoma de pessoas

com deficiência visual, o apoio psico-social a idosos, a interacção entre o

trabalho na área da deficiência e a intervenção no âmbito das doenças

crónicas. Ainda no que diz respeito aos serviços, este alargamento de

âmbito implica a maior integração entre diferentes serviços, tendo em

vista a realização do contínuo de serviços e a materialização do princípio

da vida independente de que o cidadão deficiente é o maior perito nas

suas necessidades.

O objectivo de reforço prende-se com a melhoria contínua da intervenção

da associação, incorporando as conclusões da avaliação sobre os serviços

prestados e reforçando a actividade de representação e

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a capacidade de envolvimento – desde logo de contacto – dos sócios na vida

regular da associação.

3.2.2 FOCO DE ACÇÃO

A ACAPO define-se por ser uma instituição com uma causa que age por meios

diversos para a conseguir. Essa causa - promover a vida independente das

pessoas cegas e com baixa visão eliminando barreiras à participação na

economia e na sociedade – deve ser o fio condutor da definição das

prioridades de acção, dos objectivos estratégicos e do modelo de

organização.

Assumir que se pretende promover a vida independente implica agir para

que aumente a liberdade de escolha e a capacidade de controlo da própria

vida por parte dos representados e tem uma consequência na definição do

foco a adoptar pela instituição. As acções a promover, seja enquanto

entidade representativa, seja enquanto prestadora de serviços, devem

convergir para a realização da prioridade de eliminação de barreiras à

participação económica e social das pessoas com deficiência visual.

Essa eliminação de barreiras começa na mudança de percepção social do

cidadão com deficiência, que não deve ser objecto mas sujeito das medidas

e intervenções que lhe dizem respeito. A operacionalização do princípio

de que o deficiente é o maior perito nas suas necessidades implica dar-lhe

mais poder no modo de satisfação dessas necessidades e para a

associação lutar pelo reforço desse poder. Nesta dimensão, a ACAPO é

uma instituição defensora dos direitos civis, políticos e sociais dos

cidadãos com deficiência visual.

Para a eliminação da barreira que se prende com a percepção social do

deficiente, a acção de representação implica uma intervenção jurídica,

política e económica da associação. Ela representa os seus associados

junto do Estado enquanto garante de direitos, junto dos empregadores e

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junto de produtores e distribuidores de bens e prestadores de serviços.

Perante os primeiros é uma associação de defesa de direitos cívicos,

políticos e sociais, perante os segundos uma associação de defesa de

direitos sociais e perante os terceiros uma associação de defesa de direitos

dos consumidores.

A intervenção como associação representativa implicará escolhas sobre o

perfil de acção que é cedo para antecipar plenamente. Enquanto

prestadora de serviços, uma associação pode ser tendencialmente neutra.

Mas representar implica politizar. O estudo de congéneres da ACAPO no

plano internacional (McColl e Boyce, 2003) mostrou sempre que acabam

por optar por um pendor de acção em que predomina ou a cultura da

colaboração ou a do confronto. Com o crescimento e a diversificação da

actuação, a tensão entre estas duas tácticas é inevitável.

A eliminação de barreiras continua no empowerment dos cidadãos com

deficiência visual. A transição da cultura da dependência para a afirmação

de direitos é efectuada sempre sob a forma da construção do

conhecimento dos seus direitos e da capacidade para a agir para que eles

sejam reconhecidos.

Os resultados dos processos de empowerment são diferenciados quando

vistos ao nível dos indivíduos ou das organizações (Perkins e Zimmerman,

1995). Quanto aos primeiros, implicam o aumento das competências de

controle sobre as próprias vidas e da capacidade de utilizar recursos em

função dos próprios objectivos. Quanto às segundas, implicam o

crescimento, o desenvolvimento de redes e de relevância institucional e

política.

A ACAPO, no âmbito da actividade de auto-representação deve, em

consequência, assumir a seguinte identidade:

– Assumir-se como um grupo de interesse que reúne pessoas com

problemas comuns e procurar mudanças em seu favor – escolher

prioridades de acção que mudem a situação social dos seus

representados;

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– Ser parceiro na tomada de decisão sobre assuntos de interesse dos

membros - aconselhar, fazer parcerias, contactos, etc. (alternativa,

ser um actor que escolhe uma agenda de confronto);

– Actuar para o aumento da consciência pública – prioridade a

actividades de “visibilidade correcta” da deficiência, combatendo

estereótipos;

– Ser um actor de empowerment dos cidadãos com deficiência

visual.

A maior falha, porventura, do sistema português de resposta às

necessidades dos cidadãos com deficiência é a falta de uma abordagem a

que, por paralelo com a educação ao longo da vida, chamamos de

reabilitação ao longo da vida.

Nesta perspectiva, a intervenção centrada no momento da ocorrência da

deficiência e o processo de habilitação/reabilitação que deve originar,

deve ser complementada por uma perspectiva de acompanhamento

permanente das pessoas, assistindo-as nas suas escolhas sobre a

satisfação das suas necessidades para superação das limitações

estruturais colocadas pela sua deficiência e nomeadamente tendo em

conta que, como acontece com todos os seres humanos, com a evolução

dos padrões de vida e da ciência e da técnica, há permanentemente novas

necessidades a satisfazer, novas tecnologias associativas a disponibilizar e

mesmo novos serviços a prestar.

A perspectiva da reabilitação ao longo da vida implica, para a prestação de

serviços, a adopção do objectivo central de promoção da autonomia, nas

suas diferentes dimensões e nas diferentes fases da vida.

O estudo realizado permitiu identificar que as três dimensões de

autonomia (na vida quotidiana, na mobilidade e no acesso à informação e

comunicação) têm níveis diferenciados de realização, mesmo entre os

inquiridos.

O apoio na infância e juventude, nestas três dimensões, deve estar

centrado na acção em rede para a promoção da educação e posteriormente

da formação profissional, uma vez que, como

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verificámos, também entre os cidadãos com deficiência, a educação é o

melhor garante da inserção no mercado de trabalho e o sistema de

produção de qualificações está a contribuir para um afunilamento das

saídas profissionais dos deficientes visuais.

Na transição para a vida adulta, o foco transfere-se para o triângulo

formação profissional-emprego-autonomia pessoal e familiar. O sistema

português continua a ser indutor da protecção social e não da participação

no mercado de trabalho e os deficientes visuais enfrentam dificuldades

acrescidas no processo de constituição de família própria que implicam

intervenções junto das pessoas com deficiência e da colectividade para

remover preconceitos, estereótipos, mecanismos estigmatizantes que

impossibilitam a plena realização pessoal.

No caminho para o apoio ao envelhecimento, o foco de acção deve

transferir-se para o binómio autonomia pessoal e familiar-vida social,

dado ter-se verificado a existência de fenómenos de confinamento

doméstico concomitantes de baixos índices de autonomia individual, e de

risco elevado de isolamento social, a que se associa a

multidimensionalidade do envelhecimento, um desafio completamente

novo para a actividade da ACAPO.

A ACAPO deve, assim, assumir a seguinte identidade, em relação à

prestação de serviços:

– Ser uma mediadora entre cidadãos com deficiência visual e

prestadores de serviços, procurando articulá-los e cooperar com

eles na produção de resultados;

– Ser promotora de maiores níveis de controlo dos cidadãos sobre os

serviços que recebem e da adopção da perspectiva do contínuo de

serviços;

– Ser prestadora de serviços na perspectiva da reabilitação ao longo

da vida, respondendo a necessidades diferenciadas em diferentes

fases do ciclo de vida, por forma a promover a autonomia e a

inclusão social dos seus beneficiários.

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3.2.3 PRIORIDADES

Para o cumprimento dos objectivos de mudança e a refocalização da

acção da ACAPO propomos a adopção de três prioridades estratégicas:

– Organizar mais pessoas com deficiência visual e alargar o campo

de acção da associação;

– Prescrever e prestar serviços mais adequados e de melhor

qualidade;

– Renovar a estrutura da associação ao serviço da identidade mista

de entidade representativa e prestadora de serviços.

A organização de mais pessoas implica um esforço sustentado de

crescimento da organização e a adopção de uma frente de trabalho

centrada na correcção dos desequilíbrios de representação. Foram

identificados em particular dois tipos de desequilíbrio neste domínio, que

devem ser corrigidos:

– Assimetrias de cobertura da associação, nomeadamente entre

regiões e entre populações urbanas e rurais;

– Escolha de novas frentes de trabalho prioritárias;

– Existência de segmentos sociais perante os quais haverá que

diversificar o campo de acção: famílias com crianças com

deficiência visual; pessoas com baixa visão; pessoas que adquirem

a deficiência visual na idade adulta e em consequência de patologias

ligadas ao envelhecimento; pessoas idosas.

A associação pode, de modo realista, fazer crescer o número de membros

até aos 5000 em 5 anos, corrigindo os desequilíbrios e prosseguindo o

trabalho de alargamento do seu campo de acção.

Os objectivos de crescimento ligam-se com a redefinição do foco de acção

da ACAPO. A par da preservação das suas frentes de trabalho actuais e na

sequência do que o estudo mostrou sobre necessidades a descoberto e

novos segmentos de público a ser tocados por uma diversificação da acção

da associação, impõe-se a adopção de novas

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frentes de trabalho prioritárias. Reflectindo sobre a informação

recolhida, propõe-se a consideração das seguintes:

– Apoio às famílias com crianças deficientes visuais;

– Função de orientação e acompanhamento na transição

profissional (na formação, pré-colocação e pós-colocação);

– Apoio entre pares a adultos que adquirem deficiência visual;

– Serviço domiciliário a pessoas sozinhas ou casais com deficiência

visual;

– Reabilitação “ao domicílio”: pessoas dependentes (em casa ou

institucionalizadas);

– Intervir sobre os contextos que dificultam a autonomia:

estabelecimento de parcerias para o “design inclusivo” e a remoção

de barreiras físicas; criação de uma “linha de denúncia” de barreiras

e de uma unidade de gestão do follow-up de situações denunciadas.

A ACAPO deve continuar a ser uma entidade importante na prescrição e

prestação de serviços, que deve permanentemente procurar que tenham

maior adequação e melhor qualidade. No âmbito deste objectivo

estratégico, propomos a atenção prioritária a:

– Melhorar o acesso e aumentar os níveis de uso pelas pessoas aos

serviços existentes (mais informação, mais prescrição, mais

prestação), em particular por rurais, idosos, crianças e pessoas com

deficiências múltiplas;

– Renovar as modalidades de cooperação com as instituições e os

profissionais de saúde: melhorar a orientação para a reabilitação

“inicial” e “contínua”; adopção de uma actuação coordenada;

– Reforçar a cooperação com as escolas básicas e secundárias como

representante das famílias, nomeadamente pressionando (e

colaborando) para que os apoios educativos a crianças e jovens

sejam mais efectivos.

A ACAPO só pode exercer a sua função com qualidade e sucesso se estiver

dotada de uma estrutura adequada à missão que assume. Hoje,

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a associação necessita de preparar-se para novos desafios e adequar a sua

estrutura aos princípios organizadores do foco de acção adoptado. Para

isso, propõe-se que sejam adoptadas as seguintes prioridades:

– Reforçar as estruturas dirigentes nacional e local (plano de

formação de dirigentes, intercâmbios com instituições congéneres,

etc.);

– Criar nos serviços centrais duas novas funções de apoio ao

cumprimento dos objectivos de crescimento e diversificação:

financiamento; filiação e organização;

– Separar na estrutura ACAPO a gestão da representação da gestão

de centros de recursos/serviços prestados, entregando a função de

representação a estruturas eleitas, baseadas na capacidade

associativa e a direcção dos serviços a uma estrutura técnica

designada por critérios de competência profissional;

– Organizar a função de prestação de serviços como uma rede de

centros de recursos para a reabilitação contínua.

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CONCLUSÃO

A afirmação do modelo relacional da deficiência implicou passar a

entendê-la como um fenómeno social que se caracteriza pela interacção

entre propriedades individuais (alteração de estruturas e funções do

corpo) e dinâmicas sociais (participação na vida em sociedade) e

questionar as relações sociais (ao nível micro e macrosocial) que se

estabeleceram sob influência do modelo médico e tenderam a reduzir o

deficiente à condição de “paciente” e a estimular a sua dependência. Por

isso, o modelo relacional da deficiência pode ser accionado para

entender o movimento da auto-representação (self advocacy) de

cidadãos com deficiência e a promoção da sua autonomia pessoal, tal

como proposto pelo movimento da vida independente.

É da vida independente como objectivo e da promoção de serviços para a

sua promoção que trata este estudo, partindo do conceito de qualidade

de vida. Na perspectiva nele desenvolvida, a qualidade de vida resulta da

satisfação de diferentes necessidades humanas, pela disponibilização de

oportunidades dessa satisfação e geração associada de níveis mais

elevados de bem-estar.

O universo do estudo são os associados e utentes da ACAPO, um grupo

maioritariamente masculino, cego, tendo adquirido a deficiência numa

etapa precoce e mais novo do que a população residente em Portugal que

não consegue ver.

As pessoas inquiridas neste estudo revelaram a persistência de

discriminação e vulnerabilidade social dos deficientes visuais em

Portugal.

Os deficientes visuais têm grandes dificuldades de acesso ao mercado

de trabalho e uma parte significativa deles, mesmo em idade activa,

depende de prestações sociais, embora estas tenham valores reduzidos.

Os que acedem ao mercado de trabalho estão tendencialmente

confinados a um leque restrito de profissões – em que sobressaem os

professores e telefonistas – e o efeito social específico da deficiência é

visível quer nas trajectórias sociais descendentes, quer na degradação

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de condições de vida após a aquisição da deficiência, quer nas trajectórias

de exclusão do mercado de trabalho.

Dentro da condição comum de vulnerabilidade no mercado de trabalho,

há factores que mitigam e factores que agravam essa dificuldade.

Em Portugal, hoje, a escolarização é a via mais eficaz de superação da

dificuldade de ingresso de pessoas com deficiência visual no mercado de

trabalho.

A reabilitação profissional de quem adquire deficiência visual na idade

adulta é incapaz de combater a propensão para que adquirir uma

deficiência seja um forte factor de saída do emprego.

Estas duas conclusões constituem outros tantos desafios às políticas

públicas para que consolidem o rumo num caso e se repensem, no outro.

Actualmente, em Portugal, há efeitos sociais acumulados de desvantagem

que prejudicam as oportunidades de emprego de mulheres, operários e

de quem acumula mais do que uma deficiência.

Também esta conclusão é um desafio, mas às dinâmicas sociais e às

políticas de solidariedade, no sentido de que se promovam mudanças de

atitudes, superem estereótipos e as instituições sociais se activem para

combater efeitos cumulativos de dinâmicas sociais de desfavorecimento.

O Estado assume um papel muito importante no nível material de vida

dos inquiridos, em primeiro lugar através da função de redistribuição,

como fonte de rendimentos pela atribuição de pensões e prestações e em

segundo lugar como empregador. Mas as políticas activas de emprego

apenas tocam marginalmente os inquiridos, sobretudo os que adquiriram

a deficiência em idade adulta.

Aliás, a fragilidade dos apoios ao emprego, quer no plano material, quer

no plano das relações entre cidadãos com e sem deficiência revelam-se

ainda no testemunho pelos inquiridos empregados de que há falta de

adequação de equipamentos e falta de capacidade de entendimento da sua

deficiência por parte dos colegas e superiores.

Os problemas de adaptação ao posto de trabalho por parte dos deficientes

visuais comprova que existem desafios a concretizar no que

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diz respeito ao apoio na redução dos gaps de emprego de deficientes,

ultrapassagem de preconceitos, combate à discriminação e mais apoio na

adaptação de postos de trabalho para os deficientes visuais.

A centralidade do Estado na definição da condição social dos deficientes

visuais, quer como prestador de apoios sociais, quer como empregador,

quer ainda, agora pela negativa, pelos impactos da reabilitação e das

políticas activas na obtenção de emprego, obrigam a antecipar as

consequências potencialmente negativas de uma eventual retracção do

papel do Estado no futuro próximo e desafiam as instituições

representativas dos cidadãos com deficiência a reforçar a sua atenção e

capacidade de pressão para que Estado não consume tal retracção, sob

pena de agravamento das condições sociais da população com deficiência.

No plano da expressão emocional e das ligações aos outros, as pessoas

com deficiência visual inquiridas dão muita importância aos laços

afectivos e à possibilidade de conduzirem uma vida independente por

relação à família de origem, constituindo família própria e vivendo na sua

própria casa, mas quem adquire a deficiência visual na infância ou na

juventude tem maior probabilidade de não conjugalidade, o que configura

uma situação de discriminação no acesso à vida independente. Não são

conhecidos estudos portugueses sobre os factores que explicam esta

observação, mas é de admitir que os estereótipos e preconceitos tenham

importância.

A aquisição da deficiência visual na idade adulta é um factor de redução

da vida social quotidiana, questão que deve ser investigada no contexto

dos desafios à reabilitação das pessoas que adquirem deficiência visual.

Na ausência de um trabalho eficaz de reabilitação, as pessoas que

adquirem a deficiência podem deixar-se confinar ao espaço doméstico e

os contextos sociais podem mobilizar-se para estimular a redução dos

contactos sociais.

A activação da sociedade para combater a diminuição da vida social dos

cidadãos com deficiência visual, em particular dos que adquirem a

deficiência em fase tardia do ciclo de vida exige atenção.

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A possibilidade de plena realização individual e acesso a uma vida

independente está ligada à possibilidade de controlo sobre as escolhas da

própria vida e ao acesso aos recursos imateriais - de cultura, de educação,

de informação, de acesso ao conhecimento - que permitam opções

informadas e decisões sobre a vida própria e da colectividade.

A análise do nível de escolarização dos inquiridos em comparação com os

níveis escolares da população portuguesa que adquiriram deficiência

visual na fase inicial das suas vidas, deu indicações positivas do

desempenho da escola inclusiva, em particular em relação a quem

adquiriu a deficiência na primeira infância e a quem é cego, o que levanta,

por outro lado, questões quanto à capacidade das escolas acompanharem

quem adquire a deficiência em idade escolar e quanto a reconhecer e

integrar adequadamente as pessoas que têm baixa visão e para as quais,

porventura, as pedagogias diferenciadas correntemente utilizadas não

estão tão ajustadas.

As dificuldades sentidas por quem adquire a deficiência em idade escolar

são desafiantes para o processo de acompanhamento integral da criança e

do jovem que a escola deve procurar nestas situações.

O menor sucesso relativo da escola inclusiva com a baixa visão pode prender-

se – é uma questão a merecer investigação ulterior - com a inadequação da

transposição de conhecimentos adquiridos em relação a pessoas cegas para

pessoas com baixa visão, dados os problemas específicos destas,

nomeadamente a sua falta de identificação como pessoas com deficiência

visual específica e as características afectivo- emocionais desta forma de

deficiência, hipótese que carece de ser comprovada por investigação

posterior.

Por outro lado, a maioria dos inquiridos não sente ter feito a escola toda

que gostaria. As causas referidas pelos inquiridos para o abandono escolar

estão relacionadas com a deficiência visual e incluem a falta de apoios

especializados e as dificuldades pedagógicas dos professores durante o

ensino, o que se revela um obstáculo à aprendizagem, à progressão e ao

sucesso escolar dos deficientes visuais.

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O combate ao abandono escolar precoce de crianças e jovens com

deficiência visual deve ser um desafio em consideração no domínio das

políticas de educação, tendo como objectivo quebrar o panorama actual

de fechamento de oportunidades de forma a melhorar os índices de

sucesso educativo.

Quanto mais cedo os inquiridos adquirem a deficiência visual maior a

probabilidade de aprenderem braille.

A promoção da vida independente implica o estímulo à autonomia

individual dos cidadãos com deficiência (e a existência de assistentes

pessoais requeridos por estes, quando tal se torne impossível). Em relação

aos deficientes visuais, o processo de reabilitação, o recurso às tecnologias

assistivas e o domínio de recursos específicos (como o braille), permitem

elevados níveis de autonomia individual.

A mobilidade é o obstáculo mais disseminado à autonomia dos inquiridos

e – porventura pelo efeito das tecnologias assistivas – o acesso à

comunicação e informação é o domínio em que se atingiu melhores níveis de

autonomia.

Há que estar atento particularmente a três manifestações intensas de

dificuldades de autonomia: as dificuldades de autonomia na mobilidade

do conjunto dos inquiridos; a reduzida autonomia, em geral, das pessoas

idosas e, dentro destas, especialmente a de quem adquiriu a deficiência na

idade adulta e a promoção da info-inclusão como promoção da autonomia

na comunicação.

O tipo de vinculação dos indivíduos à vida colectiva expressa-se na sua

relação com os instrumentos de participação social e política. Neste

estudo encontrámos um conjunto de cidadãos com deficiência visual que

têm, na sua grande maioria e pela pertença à ACAPO, alguma forma de

participação social. Essa participação é concomitante de níveis

comparadamente elevados de participação social, quando confrontados

com os da sociedade portuguesa, nos três domínios analisados, da

participação associativa, sindical e política.

Encontraram-se 5 grupos numa tipificação social da qualidade de vida. Os

grupos encontrados demonstram a diferenciação de situações que

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deve ser tida em conta na estruturação de um modelo de prestação de

serviços orientado para a qualidade de vida e a promoção da vida

independente, fornecendo pistas para uma segmentação eventual de

públicos desses serviços.

Um dos grupos, que designámos de grupo das pessoas autónomas,

inseridas no mercado de trabalho, com actividade social e participação cívica tem

as seguintes características-tipo: são pessoas que têm autonomia total nas

tarefas quotidianas, no acesso à informação e comunicação e na

mobilidade; os que estão em idade activa trabalham e vivem

principalmente do seu trabalho; usam computadores, têm uma

vida social frequente fora de casa, saem com amigos, participam em

associações e vivem com cônjuge e/ou filhos. A média de idades das

pessoas deste grupo é de 45 anos, em média a idade de aquisição da

deficiência visual é os 13 anos, pelo que tendencialmente fizeram a sua

inserção na vida adulta já com deficiência visual; sabem braille,

concluíram pelo menos o ensino secundário e desempenham ou

desempenharam uma profissão na área das actividades intelectuais e

científicas.

Um segundo grupo é constituído por pessoas autónomas, em risco de

exclusão do mercado de trabalho, com actividade social e sem participação cívica.

Este grupo reúne 39% dos inquiridos e o seu retrato-tipo é o seguinte: têm

autonomia total nas tarefas quotidianas, no acesso à informação e

comunicação e na mobilidade; saíram do

mercado de trabalho ou estão desempregados; vivem de uma pensão ou

de uma prestação da segurança social; usam computadores, têm uma vida

social frequente fora de casa, saem com amigos; não participam em

associações e vivem com cônjuge e/ou filhos. A média de idades das

pessoas deste grupo é de 47 anos, em média a idade de aquisição da

deficiência visual é os 12 anos, pelo que tendencialmente fizeram a sua

inserção na vida adulta já com deficiência visual; sabem braille,

concluíram pelo menos o ensino secundário e desempenham ou

desempenharam uma profissão na área do pessoal administrativo.

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Um terceiro grupo é constituído por pessoas autónomas, em transição ou em risco

de marginalização do mercado de trabalho com actividade social e sem participação

cívica. Este grupo reúne 9% dos inquiridos e o

seu retrato-tipo (feito a partir das categorias modais) é o seguinte: têm

autonomia total nas tarefas quotidianas, no acesso à informação e

comunicação e na mobilidade; os jovens são estudantes, os menos jovens

estão desempregados; dependem da família; usam computadores, têm

uma vida social fora de casa frequente, saem com amigos. A média de

idades das pessoas deste grupo é de 27 anos, em média a idade de

aquisição da deficiência visual é os 6 anos, pelo que tendencialmente

fizeram o seu percurso na educação e a sua inserção na vida adulta já com

deficiência visual; sabem braille, concluíram pelo menos o ensino

secundário e desempenham ou desempenharam uma profissão como

administrativos.

Um quarto grupo reúne pessoas com menor autonomia que os anteriores,

partilhando com o primeiro e o terceiro a orientação pela família própria

e com o primeiro um maior empenhamento e participação cívica. São

pessoas que adquiriram a deficiência tendencialmente na fase adulta

e estão excluídas do mercado de

trabalho. Designámo-lo de pessoas com alguma autonomia, excluídas do

mercado de trabalho, com actividade social e participação cívica. Este grupo

reúne 10% dos inquiridos e o seu retrato-tipo é o seguinte: têm autonomia

nas tarefas quotidianas e no acesso à informação e comunicação, mas têm

dificuldades de mobilidade; saíram do mercado

de trabalho; vivem de uma pensão ou de uma prestação da segurança

social; não usam computadores, têm vida social fora de casa, embora

menos frequente que os grupos anteriores, saem com amigos; participam

em associações e vivem com cônjuge e/ou filhos. A média de idades das

pessoas deste grupo é de 64 anos, em média a idade de aquisição da

deficiência visual é os 25 anos, pelo que tendencialmente tiveram uma

inserção profissional anterior à aquisição da deficiência visual; não

sabem braille, concluíram o 1º ciclo do ensino básico e

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desempenharam uma profissão de trabalhador qualificado na indústria e

construção.

Finalmente temos um grupo de perto de um quarto dos inquiridos que

configura um risco de problema social, marcado pela sobreposição de

dependência e isolamento. São – assim designámos ao grupo - pessoas

dependentes e em situação de isolamento social. Este grupo reúne 23%

dos inquiridos e o seu retrato-tipo (feito a partir das categorias modais) é

o seguinte: não são autónomos nem nas tarefas quotidianas, nem no

acesso à informação e comunicação, nem na mobilidade; nunca entraram

ou já saíram do mercado de trabalho; vivem de uma pensão ou de uma

prestação da segurança social; não usam computadores, têm um nível

restrito de vida social fora de casa, não têm com quem sair e não

participam em associações; vivem com cônjuge e/ou filhos. A média de

idades das pessoas deste grupo é de 58 anos, em média a idade de

aquisição da deficiência visual é os 29 anos, pelo que tendencialmente

tiveram uma inserção profissional anterior à aquisição da deficiência

visual; não sabem braille, concluíram o 1º ciclo do ensino básico e

desempenharam uma profissão de trabalhador qualificado na indústria e

construção.

A ACAPO é uma entidade prestadora de serviços a cidadãos com

deficiência visual que conheceram a associação principalmente por meios

informais e cujo primeiro contacto com a associação ocorreu na maior

parte das situações muito tempo depois da aquisição da deficiência. O

processo de modernização da ACAPO e dos seus serviços tem produzido

efeitos sobre a qualidade dos mesmos, melhorando as respostas no

sentido da auscultação e envolvimento dos beneficiários no desenho dos

serviços a serem prestados, nomeadamente com a realização e discussão

do Plano de Intervenção.

A combinação entre os serviços mais utilizados, o grau de satisfação com

os mesmos e os impactos que produziram na vida dos inquiridos,

permitiram concluir que existe um conjunto de serviços que importa

preservar e que engloba o treino em orientação e mobilidade, o apoio

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psicológico, o apoio social, as actividades culturais e lúdicas e o apoio às

ajudas técnicas.

Simultaneamente existe um conjunto de serviços que devem ser

melhorados, investindo na adequação/restruturação das respostas, dado

que apresentam um menor grau de satisfação mas produzem mudanças

significativas na vida dos inquiridos, implicando ganhos de

conhecimentos ou competências e respondendo às principais

necessidades dos inquiridos. São eles o apoio ao emprego, a formação

profissional e a habilitação em novas tecnologias.

Por fim, existe um conjunto de serviços que produzem impactos na vida

dos inquiridos e que são avaliados de forma bastante positiva, mas que são

pouco dinamizados no conjunto das várias delegações da ACAPO, pelo

que se torna necessário expandir esta oferta. Os serviços de

acompanhamento em actividades do dia-a-dia, as actividades

ocupacionais e a habilitação em actividades da vida diária, encontram- se

neste conjunto de serviços que a ACAPO poderá desenvolver, que

contribuirão para a autonomia do público-alvo e para atenuar os efeitos

do isolamento social.

A proximidade dos clientes, espacial e temporal, surge como um factor

determinante na avaliação dos serviços e dos técnicos. O tempo que

medeia entre o primeiro contacto com a ACAPO e a actualidade, e a data

do último serviço de que beneficiou, são variáveis determinantes na

análise da adequação e satisfação com o serviço e das lacunas dos técnicos,

sendo que quanto mais recentes os contactos com a ACAPO e o usufruto

do apoio/serviço maior o grau de satisfação com o mesmo. Por outro lado,

a avaliação global dos serviços permitiu evidenciar que é ao nível dos

impactos e eficácia dos serviços que se denota um menor grau de

satisfação, muito associado, de igual modo às respostas dos apoios às

necessidades pessoais e às escolhas que o sócio/utente pode tomar, bem

como ao apoio à participação e integração na comunidade.

Os inquiridos muito satisfeitos com os serviços são os que mais

concordam que os serviços tiveram efeitos sobre a sua vida,

principalmente ao nível da sua vida social, mas também sobre a

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imagem que têm sobre si próprio. Por outro lado, os pouco satisfeitos são

os que menos consideram que os serviços tiveram impacto na sua vida, e

que a terem, foram sobre a sua vida social e na função de intermediação.

Do cruzamento destas duas constatações – satisfação associada a maior

proximidade espacial e produção de impactos vs insatisfação associada a

distância espacial e desadequação das respostas às necessidades pessoais e

à participação e integração na comunidade - resultou uma última questão

que o estudo não conseguiu aferir e que se prende com o saber até que

ponto será o facto de as respostas actuais estarem mais adequadas que

contribui para a produção de impactos positivos ou uma avaliação a frio, após

o contacto com a realidade, leva os inquiridos a aperceberem-se que os

serviços não produzem os impactos necessários/indicados.

A ACAPO presta serviços mas, simultaneamente, tem como missão a

defesa dos direitos e interesses dos deficientes visuais tendo em vista a sua

plena integração socioprofissional missão e, para a cumprir, leva a cabo

actividade de representação e de defesa dos direitos e interesses das

pessoas com deficiência visual em Portugal, actuando nas diferentes

esferas de influência.

Os denominadores comuns, em termos de perfil dominante, caracterizam

sócios e utentes como grupos maioritariamente do sexo masculino, com a

média de idades a rondar os 50 anos, baixos níveis de escolaridade, em

que mais de metade completou no máximo o 9º ano, e grande

dependência de pensões de reforma e/ou de prestações da Segurança

Social. Os utentes são mais idosos que os sócios, têm níveis de

escolaridade mais baixos e são mais dependentes dos apoios do Estado.

Mais de dois terços dos sócios e utentes já usufruíram de serviços e/ou

apoios providenciados pela instituição.

A actuação da ACAPO enquanto entidade que representa a população com

deficiência visual em Portugal é reconhecida de forma positiva pela larga

maioria dos sócios e dos utentes, que consideram que a instituição

defende os interesses das pessoas que representa.

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O desempenho da associação é visto pelos inquiridos como globalmente

positivo e para isso contribuem equilibradamente as duas funções da

associação.

O envolvimento dos sócios, por sua vez, suscita alguma reflexão. A

participação eleitoral dos associados é fraca e a mobilização dos sócios

para actividades é pouco frequente.

A revista/boletim da ACAPO é o mais forte elo de ligação entre a

associação e os seus membros e o segundo elo mais intenso dos sócios à

associação é a organização de eventos comemorativos e actividades

recreativas.

A ACAPO é uma associação de auto-representação de pessoas com

deficiência visual. A auto-representação cruza-se com o conceito de vida

independente porquanto a actividade de auto-representação busca dar

voz própria aos cidadãos deficientes, reivindicando os seus direitos,

incluindo o direito a fazer escolhas e ser independente e o direito a

assumir responsabilidades na sociedade a par com os outros cidadãos. Se

o movimento da vida independente procura criar as condições para que

cada pessoa ao nível individual possa exercer esses direitos, o movimento

de auto-representação criou entidades colectivas visando garanti-lo para

o universo dos representados.

O carácter misto da associação permite-lhe distinguir-se de uma actuação

exclusivamente “para-sindical” confinada à reivindicação de direitos e de

uma actuação puramente enquanto instituição “para- prestadora de

cuidados” centrada na intervenção junto de indivíduos com necessidades

de serviços.

O carácter misto permite-lhe ainda, como se verificou neste estudo,

aproximar-se de novos públicos, que pretende representar, mas têm

características diferentes dos que espontaneamente dela se aproximaram.

Nesse sentido, a prestação de serviços e a representação estabelecem uma

relação sinérgica, potenciando-se mutuamente.

A prestação de serviços por uma associação de auto-representação não

tem necessariamente que circunscrever-se à área da reabilitação.

Aprendendo com a experiência do movimento sindical, o movimento de

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auto-representação de deficientes, pode potenciar serviços aos seus sócios

que visam promover a sua qualidade de vida, defendendo os valores da

associação e estimulando o envolvimento nela. Este é já o caso, na ACAPO,

da organização de eventos e convívios, que se revelaram ser um dos

elementos da sua actuação que geram maiores níveis de envolvimento dos

sócios.

Uma entidade de auto-representação não pode menosprezar a questão da

representatividade. De novo em paralelo com o movimento sindical, a sua

força deriva da capacidade de ter consigo as pessoas que visa representar

e de ter no seu seio as condições para ser “a voz” dos problemas dessas

pessoas. A este respeito, a ACAPO é hoje uma instituição com duas

fragilidades a corrigir. Por um lado, tem um número de associados ainda

insuficiente face ao conjunto da população com deficiência visual. Por

outro, os seus associados têm um enorme enviesamento em favor dos

deficientes visuais de nascença ou que adquiriram a deficiência na fase

inicial da vida.

Em síntese, nos aspectos fundamentais para a definição de uma estratégia

de acção, a situação actual da ACAPO define-se por:

– Ser uma organização “mista”, de serviços e representação;

– Servir enquanto utentes uma população-alvo com uma estrutura

social diferente dos sócios;

– Ter o seu foco em sócios que adquiriram precocemente deficiência

visual;

– Estar focada nos serviços “de cuidado” e de reabilitação mas ter

iniciado a diversificação, nomeadamente em direcção ao

empowerment de sócios e utentes incluindo serviços de carácter

social e de lazer.

A ACAPO define-se por ser uma instituição com uma causa que age por meios

diversos para a conseguir. Essa causa - promover a vida independente das

pessoas cegas e com baixa visão eliminando barreiras à participação na

economia e na sociedade – deve ser o fio condutor da

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definição das prioridades de acção, dos objectivos estratégicos e do

modelo de organização.

A ACAPO, no âmbito da actividade de auto-representação deve, em

consequência, assumir a seguinte identidade:

– Assumir-se como um grupo de interesse que reúne pessoas com

problemas comuns e procurar mudanças em seu favor – escolher

prioridades de acção que mudem a situação social dos seus

representados;

– Ser parceiro na tomada de decisão sobre assuntos de interesse dos

membros - aconselhar, fazer parcerias, contactos, etc. (alternativa,

ser um actor que escolhe uma agenda de confronto)

– Actuar para o aumento da consciência pública – prioridade a

actividades de “visibilidade correcta” da deficiência, combatendo

estereótipos;

– Ser um actor de empowerment dos cidadãos com deficiência

visual.

Para o cumprimento dos objectivos de mudança e a refocalização da

acção da ACAPO propomos a adopção de três prioridades estratégicas:

– Organizar mais pessoas com deficiência visual e alargar o campo

de acção da associação;

– Prescrever e prestar serviços mais adequados e de melhor

qualidade;

– Renovar a estrutura da associação ao serviço da identidade mista

de entidade representativa e prestadora de serviços.

O reforço da solidez da estratégia da ACAPO está associado ao bom

conhecimento dos problemas da população que representa e serve. Com

este estudo procurámos contribuir para esse conhecimento. Mas, para

terminar, gostaríamos de sublinhar que ele levantou novas questões que

carecem de ulteriores aprofundamentos, por forma a que um

conhecimento mais sólido permita uma acção mais eficaz.

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O presente estudo centrou-se, por opção de partida, nos cidadãos adultos

com deficiência visual, deixando de fora crianças e adolescentes.

Contudo, o que se aprendeu sobre o impacto da educação nas

oportunidades de vida recomenda que se estude em profundidade este

grupo-alvo, por forma a fundamentar estratégias de promoção do seu

sucesso educativo. Para além de toda a problemática do funcionamento

da educação inclusiva, há, em particular, dois fenómenos que apareceram

no estudo e que merecem ser melhor compreendidos - o da dificuldade de

acompanhar as crianças que adquirem deficiência visual em idade escolar

e a adequação das estratégias educativas às crianças com baixa visão.

O estudo mostrou, por outro lado, que há enormes lacunas em Portugal

na reabilitação de quem adquire a deficiência na idade adulta, pelo que as

boas práticas internacionais deveriam ser conhecidas, valorizadas e

estudada a condição da sua transferibilidade.

Este estudo mostrou a importância da emergência de um novo fenómeno,

o da deficiência visual adquirida na terceira idade, de momento altamente

incapacitante e geradora de dependência, numa população já vulnerável e

em risco de isolamento.

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