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ESTUDO DO ATENDIMENTO DE ENFERMAGEM INSTITUCIONAL A CRIANÇAS DE 0 A 5 ANOS Nelice Ferreira Moura * MOURA, N.F. Estudo do atendimento de enfermagem institucional a crianças de 0 a 5 anos. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 15:371-8, 1981. RESUMO: Foi realizada avaliação operacional sobre a implantação do atendimento de enfermagem institucional à criança de 0 a 5 anos realizado de outubro de 1977 a outubro de 1978 no Centro de Saúde Experimental da Escola Paulista de Medicina, São Paulo (Brasil). Focaliza-se não só o pro- blema gerado desde a implantação desta atividade (a maioria dos atendi- mentos de enfermagem são encaminhados para consulta médica), mas tam- bém procura conhecer a opinião da clientela sobre esta nova modalidade de assistência de saúde à comunidade. UNITERMOS: Centros de Saúde. Crianças, assistência. Enfermagem, assistência. Avaliação. * Da Unidade de Enfermagem do Centro de Saúde Experimental da Escola Paulista de Medicina (CSEPM) — Rua Pedro de Toledo, 840 — 04039 — São Paulo, SP — Brasil. ** Conjunto de ações prestadas por pessoal auxiliar a pessoas sadias de forma sistemática e completa, especificamente relacionadas com o controle do crescimento e desenvolvimento da criança sadia que não requer atenção imediata do médico ou da enfermeira. INTRODUÇÃO O Programa de Assistência à Criança da Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo foi implantado em 1977, com a finalidade de, entre outras atividades, prever o atendi- mento de enfermagem institucional **. Este atendimento deveria ser realizado por pessoal auxiliar, à crianças sadias com a finalidade de se acompanhar o crescimento e desenvolvimento da criança. Conforme preconizava a Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo, foi implan- tada a programação no Centro de Saúde da Escola Paulista de Medicina (CSEPM), em outubro de 1977. Nessa ocasião, o Centro de Saúde encontrava-se em déficit de re- cursos humanos, não sendo possível realizar um programa de treinamento adequado. Visto que esse tipo de atendimento carac- terizava-se como de suma importância, no contexto de assistência de saúde simplifica- da no campo da saúde pública, procurou-se levantar dados que servissem de subsídios para a adequada sistematização da atividade. A disciplina de Enfermagem de Saúde Pública da Faculdade de Saúde Pública da USP 2 sugere dentro da assistência de en- fermagem : prestar especial atenção de enfermagem materno-infantil, oferecendo consulta de enfermagem a gestantes e crianças sa- dias, de acordo com padrões e normas estabelecidos. Oferecer atendimento de enfermagem institucional e domiciliário prestado

ESTUDO DO ATENDIMENTO DE ENFERMAGEM … · MOURA, N.F. Estudo do atendimento de enfermagem institucional a crianças de 0 a 5 anos. Rev. Saúde públ., ... na condição de médico,

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ESTUDO DO ATENDIMENTO DE ENFERMAGEMINSTITUCIONAL A CRIANÇAS DE 0 A 5 ANOS

Nelice Ferreira Moura *

MOURA, N.F. Estudo do atendimento de enfermagem institucional a crianças de 0 a5 anos. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 15:371-8, 1981.

RESUMO: Foi realizada avaliação operacional sobre a implantação doatendimento de enfermagem institucional à criança de 0 a 5 anos realizadode outubro de 1977 a outubro de 1978 no Centro de Saúde Experimental daEscola Paulista de Medicina, São Paulo (Brasil). Focaliza-se não só o pro-blema gerado desde a implantação desta atividade (a maioria dos atendi-mentos de enfermagem são encaminhados para consulta médica), mas tam-bém procura conhecer a opinião da clientela sobre esta nova modalidade deassistência de saúde à comunidade.

UNITERMOS: Centros de Saúde. Crianças, assistência. Enfermagem,assistência. Avaliação.

* Da Unidade de Enfermagem do Centro de Saúde Experimental da Escola Paulista de Medicina(CSEPM) — Rua Pedro de Toledo, 840 — 04039 — São Paulo, SP — Brasil.

** Conjunto de ações prestadas por pessoal auxiliar a pessoas sadias de forma sistemática ecompleta, especificamente relacionadas com o controle do crescimento e desenvolvimento dacriança sadia que não requer atenção imediata do médico ou da enfermeira.

INTRODUÇÃO

O Programa de Assistência à Criança daSecretaria da Saúde do Estado de São Paulofoi implantado em 1977, com a finalidadede, entre outras atividades, prever o atendi-mento de enfermagem institucional **.

Este atendimento deveria ser realizado porpessoal auxiliar, à crianças sadias com afinalidade de se acompanhar o crescimentoe desenvolvimento da criança.

Conforme preconizava a Secretaria daSaúde do Estado de São Paulo, foi implan-tada a programação no Centro de Saúde daEscola Paulista de Medicina (CSEPM), emoutubro de 1977. Nessa ocasião, o Centrode Saúde encontrava-se em déficit de re-cursos humanos, não sendo possível realizarum programa de treinamento adequado.

Visto que esse tipo de atendimento carac-terizava-se como de suma importância, nocontexto de assistência de saúde simplifica-da no campo da saúde pública, procurou-selevantar dados que servissem de subsídiospara a adequada sistematização da atividade.

A disciplina de Enfermagem de SaúdePública da Faculdade de Saúde Pública daUSP 2 sugere dentro da assistência de en-fermagem :

— prestar especial atenção de enfermagemmaterno-infantil, oferecendo consulta deenfermagem a gestantes e crianças sa-dias, de acordo com padrões e normasestabelecidos.

— Oferecer atendimento de enfermageminstitucional e domiciliário prestado

pelo pessoal auxiliar de enfermagem, sobsupervisão da enfermeira, aos clientesda área que não requeiram atençãoimediata do médico ou da enfermeira.

— Desenvolver programas de educação emserviço para o pessoal de enfermagemsob responsabilidade da enfermeira.

— Prever 10 atendimentos de enfermagemà criança sadia, para controle do cresci-mento e desenvolvimento, na seguinteconcentração:

3 atendimentos de enfermagem no 1o anode vida exclusive;

7 atendimentos de enfermagem no períodode um a 5 anos exclusive.

— Oferecer consultas de enfermagem eatendimentos de enfermagem para o con-trole do crescimento e desenvolvimentoà criança menor de 5 anos que tenharecebido assistência médica inicial.

— Encaminhar para consulta médica, sempreque indicado, toda criança com problemade saúde.

Para Adami1 (1976) as ações maissignificativas prestadas no período pré-patogênico e patogênico são a consulta de

enfermagem e o atendimento de enfermageminstitucional. Atualmente estas atividadesencontram-se integradas nos programas desaúde materna e da criança, desenvolvidasem vários estabelecimentos de saúde dealguns Estados da Federação como partetécnica preventiva aplicada ao grupo ma-terno-infantil. Entretanto, observa-se a ten-dência de se generalizar no país esta moda-lidade assistencial, com o propósito deampliar os serviços de saúde oferecidos aesses grupos vulneráveis da população.

Yunes3 (1975), na V Conferência Na-cional de Saúde declara que "nos serviçosde atendimento materno-infantil, a educa-ção para a saúde é essencial e deve serdesenvolvida intensamente nas diferentesfases do programa. É necessário que asatividades educativas estejam perfeitamente

integradas às demais. Todo o pessoal desaúde, no exercício de sua profissão, deverealizar suas tarefas como educadores, sejana condição de médico, enfermeiro, dentista,nutricionista ou pessoal auxiliar. Entretanto,impõe-se o treinamento desse pessoal paraas tarefas propostas, a fim de que possarealmente assumir as responsabilidadeseducativas que lhe compete", Esse autorrecomenda ainda que "para a implantaçãodo programa torna-se imperativa a formaçãoe treinamento contínuo de pessoal, quantita-tiva e qualitativamente adequado, para pro-duzir as ações nele especificadas".

Levantada a opinião de vários autoressobre o atendimento de enfermagem insti-tucional, conhecida a opinião das funcio-nárias responsáveis pela execução da ativi-dade e baseando-se que na grande maioriadas vezes os atendimentos de enfermagemeram encaminhados para a consulta médica,levando com isso à duplicidade de atendi-mento médico-enfermagem, foi programadojunto com a equipe técnica do CSEPM umtreinamento e um roteiro específico para aadequada execução da atividade (Anexo).

2. METODOLOGIA

Foi realizado levantamento de atendi-mentos de enfermagem nos prontuários daclientela matriculada no Programa de Assis-tência à Criança do CSEPM no período deoutubro de 1977 a outubro de 1978, coma f inal idade de obter dados sobre:

— proporção de encaminhamentos à consultamédica

— proporção de casos em que se confirmoua necessidade da consulta médica.

Esse levantamento foi realizado em 113prontuários antes de ser ministrado às visi-tadoras, encarregadas do atendimento, umtreinamento específico para essa atividade.Posteriormente, esse levantamento foi repe-tido, em 312 casos, após o referido treina-mento.

Os resultados de cada fase do levanta-mento foram analisados estatisticamentepela técnica do x2.

Concomitantemente e após o treinamentofoi feito um estudo da duração média doatendimento, tendo sido cronometrados, paratanto, 168 atendimentos.

Aplicando-se o teste de associação peloQui quadrado, chegou-se ao seguinte resul-tado:

x2obs = 1,03 e x2

c r i t (0,05) = 3,84.Como x2 crítico ao nível de 5% é de 3,84,conclui-se que não há associação (não houvealteração da proporção de necessidade nãoconfirmada com o treinamento).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Tabela 1 mostra nos prontuários levan-tados antes (113) e depois (312) do treina-mento, apenas nos casos em que as criançasforam encaminhadas ao médico, a confir-mação ou não da necessidade desse enca-minhamento.

Os atendimentos de enfermagem encami-nhados ao médico representaram 41,9% dototal levantado e, destes, 68,5% foram con-firmados. Estes atendimentos confirmadosantes do treinamento representaram 62,9%,e após o treinamento 71,5%.

Conforme normas do Programa Materno-Infantil e Subprograma de Atendimento

Médico e de Enfermagem — Área Infantilda Secretaria de Saúde do Estado de SãoPaulo, adaptado para o CSEPM, onde éprevista a duração de 15 min por atendi-mento de enfermagem, verifica-se uma defa-sagem de 8,8 min das normas padronizadasna programação e do tempo real deexecução do atendimento, cronometrado du-rante a atividade.

Na Tabela 3 o número de entrevistadasfora da área perfaz o total de 23, e dentroda área, 27.

A população da área é um pouco maisheterogênea com relação à escolaridade efreqüenta o CSEPM há mais tempo.

Os demais resultados se equivalem, mo-tivo pelo qual não foram realizados outroscruzamentos.

Com respeito à aceitação do atendimentode enfermagem, 81,2% de 48 entrevistadas(duas clientes não responderam) gostaramque a criança fosse atendida pela visitadorasanitária, quando não apresentasse proble-mas de saúde.

Como podemos notar na Tabela 4 algumasopiniões das visitadoras sanitárias após otreinamento modificaram-se.

Segundo qualidade da execução do atendi-mento de enfermagem (boa), de zero antesdo treinamento, foi para 2 após o treina-mento.

Quanto à capacidade em realizar o atendi-mento de enfermagem, houve 2 respostasafirmativas antes do treinamento e 4 apóso treinamento.

Quanto às sugestões para melhoria doatendimento, 4 visitadoras sanitárias de-monstraram resistência à continuação doatendimento antes do treinamento: apenasuma opôs resistência após o treinamento.

Pode-se verificar, pois, que as opiniõesforam modificadas de maneira positiva arespeito do atendimento de enfermagemlevando-nos a supor que esses resultadosforam, em parte, devido à execução de umprograma de treinamento.

4. CONCLUSÕES

De acordo com os resultados dos dadosanalisados, podemos tirar as seguintes con-clusões:4 . 1 . Não assimilação, por parte das visita-

doras sanitárias, dos objetivos eimportância do atendimento de enfer-magem por:

— medo de tomar decisões que poderiamimplicar em riscos à saúde de criança,

— falta de treinamento no início do pro-grama que demonstrasse o objetivo e osmétodos de execução do atendimento deenfermagem,

— falta de incentivo, por parte da equipepara a execução do atendimento de enfer-magem,

— falta de motivação por parte das visita-doras sanitárias para a execução doatendimento de enfermagem devido aostrês primeiros itens.

4 .2 . As visitadoras sanitárias se sentemmais seguras e com maior conheci-mento para realizarem o atendimentode enfermagem após o treinamento,o roteiro padronizado e a existência

de retaguarda médica e de enferma-gem.

4.3. Apesar das visitadoras sanitáriasapresentarem opiniões a respeito danão aceitação pelo público sobre oatendimento de enfermagem pudemosverificar, através das entrevistas rea-lizadas, que a maioria das mães, ouseja 81,2%, aceitam e gostam doatendimento apesar de não teremsido bem orientadas a respeito daatividade.

4.4. Antes e após o treinamento, os en-caminhamentos para consulta médicacontinuaram a acontecer com a mesmafreqüência, fato este que podemosexplicar pelos seguintes motivos:

— falta de padronização do serviço e faltade segurança do elemento responsávelpara orientar casos de problemas querequeiram condutas puramente sintomá-ticas,

— falta de discernimento para definir inter-corrências,

— falta de confiança da população no aten-dimento de enfermagem, motivado talvezpela falta de orientação adequada outalvez pela insegurança sentida peloelemento responsável pela atividade,muitas vezes transmitida no momentodo atendimento.

5. RECOMENDAÇÕES

As conclusões acima referidas nos suge-rem pontos importantes a serem salientadostais como:— Toda atividade a ser implantada em

nível de atenção primária à Saúde deveser precedida de treinamento aos funcio-nários que a executarão, e contínuasupervisão, avaliação e reformulação.

— Deve haver uma padronização de con-dutas face aos problemas que rotineira-mente possam surgir.

— Deve haver suficiente informação e di-vulgação à comunidade sobre a novamodalidade de atendimento.

MOURA, N.F. [Institutional nursing attendance of children zero to five years of age].Rev. Saúde públ., S. Paulo, 15:371-8, 1981.

ABSTRACT: Operational evaluation of institutional nursing attendancegiven children 0-5 years of age was carried out from October, 1977 to October,1978, in the Experimental Health Center of the "Escola Paulista de Medicina",S. Paulo (Brazil). It tells of problems that have arisen since the implantingof the Center and recounts clientes' opinions about this new vehicle ofcommunity health care.

UNITERMS: Health Centers. Child care. Nursing care. Evaluation.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. ADAMI, N.P. A enfermagem de saúde pú-blica na assistência progressiva ao pa-ciente. Enferm. novas Dimens., 2(1): 17-231976.

2. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Fa-culdade de Saúde Pública. Disciplina deEnfermagem em Saúde Pública. Pro-grama de assistência de saúde. SãoPaulo, s.d. [postila].

3. YUNES, J. Programa nacional de saúde

materno-infantil. In: Conferência Na-

cional de Saúde, 5a, 1975. Anais. Brasília,

Ministério da Saúde, 1975. p. 45-134.

Recebido para publicação em 05/09/1980

Aprovado para publicação em 11/03/1981

ANEXO

ROTEIRO PARA EXECUÇÃO DO ATENDIMENTO DE ENFERMAGEM INSTITUCIONAL

— Sinais vitais (medir e registrar).— Verificar peso e estatura comparando

com o anterior. Caso não haja aumentodesses valores pesquisar possíveis causas.

— Indagar da mãe o estado atual de saúdeda criança:1 — Alimentação

2 — Imunização3 — Eliminação4 — Hábitos de Saúde5 — Crescimento e Desenvolvimento

— Ouvir e registrar possíveis queixas sobresaúde da criança.

1 — Alimentação

— Verif icar a alimentação, sem induzirnenhum alimento, recordando o que acriança comeu nas últimas 24 horas.

— Diluição do leite (quantidade de água,no de medidas do leite, açúcar e/oumamadeiras).

— Quantidade de leite/dia— Refeição de sal— Fruta

— Verificar, apenas perguntando, se acriança toma alguma "vitamina" (vit. Ae D e sulfato ferroso). No pensamentopopular o ferro também é vitamina.

— quantidade— época de início.

— Orientar alimentação seguindo esquemasimplificado.

— Orientar a suplementação de vitamina eferro seguindo a rotina.

— Registrar na pasta o encaminhamento desuplemento alimentar (leite em pó).

2 — Vacinação

— Verificar carteira de vacinação detec-tando as doses a serem aplicadas.

— Orientação à paciente sobre significado,importância, cuidados e reações das va-cinas a serem aplicadas.

— Encaminhamento à sala de vacinação.Obs.: Orientar a paciente para que traga

a carteira de vacinação sempre quevier à Unidade.

3 — Eliminações

— Fezesno de vezes— consistência— odor— cor

— Urina— odor— cor— quantidade

— Regurgitação— existência e características

Obs.: Orientar caso haja qualquer alteração.

4 — Hábitos de Saúde

— Banho de sol— Sono— Higiene— Passeios— Brinquedos

5 — Crescimento de Desenvolvimento

— Verificar desenvolvimento na escala deDesenvolvimento Motor de Shirley ecrescimento através da Tabela deGomes.

— Orientar e registrar erros de conduta.— Requisitar a presença da enfermeira para

dissipar dúvidas para posterior conduta.

Obs.: Somente a enfermeira encaminharáao médico, se necessário.

Registrar em vermelho o atendimento deenfermagem.