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evolução da teoria financeira
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. . . , - 131
Evoluo da teoria financeira e abolsa de valores no Brasil
*
Resumo O trabalho faz uma apresentao no dogmtica de alguns pontos das novas teorias daintermediao financeira, oriundas da escola neoclssica e na qual foram posteriormente acrescentados
elementos da escola keynesiana, para sustentar a importncia econmica do mercado de capitais. Utilizando-
se destes elementos, apresentamos o mercado de capitais brasileiro, em especial a Bolsa de Valores de So
Paulo, no perodo ps-Plano Real, analisando os problemas enfrentados para seu desenvolvimento e a
importncia de sua ampliao para o incremento do sistema financeiro e da economia como um todo.
Palavras-chave sistema financeiro, mercado de capitais, desenvolvimento.
Title Evolution of Financial Theory and the Stock Exchange in BrazilAbstract This paper makes a non-dogmatic presentation of a few points of the new theories of financialintermediation, born from the neo-classical school, to which elements from the Keynesian school were
later added, in order to support the economic importance of the stock market. With these elements, we
present the Brazilian Stock Market, particularly the So Paulo stock exchange after Plano Real, with an
analysis of the problems faced by its development and the importance of its enlargement in order to
increase the financial system and the economy as a whole.
Keywords financial system, stock market, development.
Data de recebimento: 24/08/2004.Data de aceitao: 02/03/2006.* Graduado em Cincias Econmicas (UniversidadeMackenzie), ps-graduado em Administrao Financeira(USJT), mestrando em Economia Poltica (PUC-SP) eprofessor das Faculdades Europan.E-mail: [email protected].
.
A Amrica Latina e, em especial para ns, o Brasil
pareciam ter perdido o rumo e a conexo com o
desenvolvimento aps a crise da dvida externa no
incio dos anos 1980. O perodo de afastamento
trouxe reflexos para a regio, que s voltou a fre-
qentar as praas centrais do sistema financeiro
internacional no incio dos anos 1990, com este j
totalmente modificado.
A conduo macroeconmica nessa nova eta-
pa foi norteada tambm por objetivos distintos
dos anteriores, contudo, os mercados financeiros
tornaram-se em tempos recentes mocinhos e, ao
mesmo tempo, viles da economia. Percebemos
claramente um aumento da importncia dada pela
grande imprensa aos acontecimentos dos mer-
cados financeiros.
As sucessivas crises apresentadas na dcada de
1990 na Inglaterra, nos chamados Tigres Asiti-
cos, na Rssia e no Brasil, originadas de fatores
distintos, no s chamaram a ateno para a im-
portncia do sistema financeiro, como para a
importncia da regulao e desenvolvimento do
sistema. O seu potencial de propagar crises e a
necessidade de controles tampouco figuram como
novidades no debate econmico.
Dentro do sistema financeiro internacional e
nacional o mercado de capitais vem, no bojo das
transformaes e crises, ocupando papel de desta-
que, principalmente por seu dinamismo, e nas
ltimas duas dcadas tem ampliado seu espao no
debate. No Brasil, este debate ao mesmo tempo
antigo e pequeno. Preso a tradies, nosso mercado
de capitais ainda no ocupa a posio que poderia
ocupar diante de uma economia dinmica como
a brasileira.
Assim, o presente trabalho prope-se a fazer
algumas reflexes sobre o mercado de capitaisbrasileiro, procurando demonstrar que as duas
linhas principais de pensamento econmico
132 Teoria financeira e a bolsa de valores
apiam a importncia do desenvolvimento do
sistema financeiro e do mercado de capitais.
Sendo utilizados os preceitos keynesianos na
avaliao da conjuntura brasileira, sero, no entan-
to, evitadas as questes dogmticas na elaborao
da resposta, respeitando as diferentes correntes.
Os vrios grupos existentes sero reduzidos a dois
grandes grupos, conforme apresentados em Bresser-
Pereira (2003), sendo tratados pela diviso funcio-
nal e terica da poupana.
O trabalho est composto por trs sees: a
primeira aborda novidades dentro da teoria neo-clssica sobre o sistema financeiro; a segunda,
igualmente questes tericas, mas da escola Keyne-
siana, e na ltima parte abordaremos o mercado
de capitais brasileiro, apresentando propostas para
seu fortalecimento e sua importncia para o desen-
volvimento econmico do pas.
.
O debate sobre sistema financeiro no era consi-
derado relevante no bojo do pensamento neocls-
sico de fundos emprestveis, nos quais poupana
igual a investimento.
Dentro deste princpio, perdia-se a relevncia do
estudo da intermediao financeira, e os esforos
concentravam-se no controle e no estudo estrito
da moeda. Partindo das tradies e dos postulados
neoclssicos, Gurley e Shaw (1955) rompem com a
indiferena no tratamento do sistema financeiro,
principalmente dos bancos, transpondo o para-
digma vigente. Estes autores apontaram e apro-
ximaram a teoria do observado na sociedade,
demonstrando que as instituies financeiras
proviam liquidez aos projetos de investimentos,
propiciando prazos condizentes com as neces-
sidades de maturao dos projetos.
Os autores apontam os bancos como capazes
de gerenciar suas posies, administrando ativos
e passivos de prazos diferentes, agregando, com
esta funo, eficincia ao sistema. Assim, mesmo
dentro da estrutura formal do pensamento neocls-
sico, a predisposio em financiar os investimen-tos e a forma de reter ativos financeiros passaram a
ter importncia para a igualdade entre poupana
e investimento. Neste novo formato, os mercados
financeiros e suas bases institucionais crescem em
importncia.
O aprofundamento do sistema financeiro, as
transformaes ps-Bretton Woods, a internacio-
nalizao e a globalizao financeira acabaram
por indicar novos caminhos s instituies. E
estes novos caminhos, sobretudo aps o declnio
do euromercado e com a crise da Amrica Latina
dos anos 1980, levaram a debates sobre a perda de
espao das instituies bancrias e a erupo de
uma nova realidade para o sistema financeirointernacional.
Essa nova ordem institucional, com a amplia-
o do espao dos investidores institucionais1,
levou a um debate sobre a desintermediao
financeira. Para Carneiro (1999), ampliou-se
enormemente a importncia dos ttulos negoci-
veis, os chamados securities; das bolsas de valores
e dos produtos derivativos, em detrimento do
sistema bancrio. A desintermediao financei-
ra, ou a reduo de agentes intermedirios, para
Ferreira e Freitas (1990), foi proporcionada pelo
avano tecnolgico, que permite transaes mais
rpidas e seguras.
Essa nova ordem institucional, para Allen e
Santomero (1998; idem, 2001), no leva a um en-
fraquecimento do sistema bancrio. Os autores
destacam trs pontos por eles observados j na
dcada de 90: i) os bancos no esto cedendo
participao no PIB; ii) os bancos tm ampliado
sua forma de gerenciar o risco, portanto, no
esto fora da nova realidade (securities); e iii) as
instituies bancrias tm apresentado grande
capacidade de se adaptar. Mesmo perdendo mer-
cados tradicionais, vm ganhando com opera-
es mais estruturadas e obtendo novas fontes de
receita.
A literatura predominante parece acompanhar
Allen e Santomero, a ampliao das operaes
estruturadas e a busca ativa de gesto dos riscos
com os securities e derivativos tm levado o siste-
ma a uma interao entre os diferentes mercados.
Neste cenrio, o processo de regulao do mercado
vem ganhando enorme espao nos estudos dessarea, mesmo entre os mais liberais. Concomitan-
temente apregoa-se a necessidade de liberalizar
. . . , - 133
os mercados domsticos para transaes interna-
cionais, visto que isto amplia as possibilidades de
gesto de riscos, proporcionando aumento da
eficincia dos mercados.
As crises apresentadas ao longo da ltima
dcada do sculo XX no parecem sepultadas no
passado. Assim, Magalhes (2002) apresenta uma
srie de estudos de autores alinhados escola
neoclssica, trabalhos tericos e empricos, con-
frontando-os. A concluso do autor que no
parece existir consenso sobre a hiptese de a
liberalizao financeira levar a crescimentos sus-tentveis; em contrapartida, as outras concluses
apontam para maior instabilidade no sistema,
sobretudo dos pases em desenvolvimento, o que
explicaria a ecloso de sucessivas crises em dife-
rentes mercados.
Por outro lado, Stiglitz e Weiss (1981), que apa-
recem como precursores da vertente da assimetria
da informao, criticando as idias de mercados
eficientes que servem de alicerce para as prticas
liberalizantes, defendidas pelo Consenso de Wa-
shington e pelo FMI, criaram uma fissura adicio-
nal no sistema, ao menos do ponto de vista terico,
dada a afinidade e divergncias com as duas cor-
rentes centrais do debate econmico2.
A assimetria de informao causa impacto no
comportamento dos agentes, de forma bastante
particular, nas decises de investimentos nos
bancos e nos mercados de capitais; sendo bancos
e mercados de aes os grandes responsveis por
exacerbar as flutuaes em uma economia mone-
tria. As novas tcnicas, os novos produtos e a
abertura no tornariam os mercados, instituies
e os agentes de modo geral mais protegidos.
Em outro trabalho, Scholtens e Wensveen (2000)
acabam por considerar que independentemente
do fato de existirem ou no informaes assim-
tricas, ou seja, os mercados sendo ou no eficien-
tes, as consideraes apontadas por Gurley e Shaw
so consistentes; as instituies financeiras agre-
gam eficincia economia. Suas concluses desta-
cam dois pontos: i) a evoluo dos sistemas de
informao e da tecnologia, de modo geral, redu-
ziram, substancialmente, os custos de transaes eii) a globalizao e os novos produtos financeiros,
em conjunto com a queda nos custos de transaes,
ampliaram a caracterstica bsica do sistema ban-
crio de gerenciador de risco.
Assim, a escola neoclssica, tradicional ou no,
reivindica a liberalizao financeira, sem que isto
represente a ausncia de regulamentao, como
sugerem alguns crticos. Esta liberalizao propi-
ciaria um aprofundamento do mercado financeiro
internacional, contemplando, neste aprofunda-
mento, o mercado bancrio, o mercado de dvida
pblica e privada, o mercado de derivativos e as
bolsas de valores.
As barreiras entre os tipos de mercado e entre ospases so os alvos do movimento pr-libera-
lizao. A sua diminuio ou extino associa-se
necessariamente, para os defensores dessas medi-
das, ao tradicional conceito de eficincia, e assim
a importncia da eliminao das barreiras tam-
bm, para eles, o pilar do desenvolvimento dos
mercados.
.
O ponto central para nosso trabalho estudar o
que h de diferente no olhar keynesiano sobre a
poupana, graas qual ele a trata como resul-
tado do investimento, e no como seu pr-requi-
sito. Em uma economia monetria, a deciso de
investir depende das possibilidades de ganho e de
financiamento. Em um cenrio que oferea pos-
sibilidades de resultados positivos, os empresrios
estaro dispostos a fazer investimentos captando
emprstimos, sendo o sistema financeiro e particu-
larmente o bancrio capaz de prover os meios de
compra (pagamento) necessrios para a aquisio.
Este processo tem no pleno emprego seu limite.
A teoria financeira elaborada por Keynes
complexa, conforme apresentada em Carvalho et
al. (2001), contemplando conceitos de circulao
industrial e circulao financeira, e diferenciando
ativos pelo conceito de liquidez e retorno propor-
cionados, sendo a moeda um ativo peculiar.
A evoluo do sistema financeiro, os efeitos de
suas crises e as formas de desenvolvimento integram
a preocupao dos keynesianos, em especial no que
diz respeito ao impacto causado sobre o forne-cimento de funding, com a interrupo do inves-
timento, e, conseqentemente, do crescimento
134 Teoria financeira e a bolsa de valores
econmico. Funding, entendido no sentido de for-
necimento de recursos com prazos alongados,
deve ser compatvel com a maturao dos inves-
timentos. Na ausncia de recursos com tais carac-
tersticas, os investimentos ficam impossibilitados
de ser realizados.
Zysman (1983) apresenta um estudo sobre as
formas de prover funding em diferentes economi-
as, dividindo-as em trs grupos: i) anglo-saxo
baseado no mercado de capitais e liderado pelo
mercado; ii) modelo japons-francs sua base
consiste em crdito (bancrio) garantido pelogoverno e iii) alemo baseia-se em crdito (ban-
crio) conduzido pelo mercado. O autor acabou
considerando, naquele momento, o modelo ale-
mo como o mais consistente com a dupla funo
de prover funding, liquidez, e de manter a funcio-
nalidade.
Modelos dirigidos pelo governo, como o japo-
ns e de outros pases asiticos, tm sido alvos de
crticas muito duras nos ltimos anos, princi-
palmente aps as dificuldades apresentadas pela
economia japonesa em seu esforo para sair da
estagnao com deflao que j dura mais de uma
dcada; para muitos, esta uma crise tpica do
sistema bancrio, que se avolumou aps a crise
asitica de 1997.
Conforme Ferreira (1995), os sistemas lidera-
dos por bancos ficaram mais vulnerveis aps a
crise do euromercado, no entanto, o desenvolvi-
mento do mercado de derivativos ajudou o setor
bancrio, principalmente o norte-americano, a se
restabelecer aps a crise dos anos 1980. O Acordo
de Basilia voltou a impor dificuldades ao setor
bancrio, dificultando estratgias e operaes
para suprir as necessidades de capital mnimo,
provises e outros limitadores.
O modelo anglo-saxo posteriormente acabou
por se mostrar mais dinmico. Encontramos res-
paldo para confirmar as melhores condies
apontadas para o sistema liderado pelo mercado
de capitais na anlise dos estgios proposta por
Chick (1994), em que os dois ltimos estgios o
5 e o 6 claramente possibilitam uma integrao
e uma complementao entre o setor bancrio e omercado de capitais, facilitando a transformao
de meios de pagamentos em emprstimos mais
longos, e assim flexibilizando as possibilidades de
operaes.
Os estgios dessa autora abrangem as evolu-
es nos sistemas internacionais, contudo, no
temos a uma evoluo cronolgica, compatvel
com os estgios, sendo possvel evoluir sem passar
por determinado estgio, ou mesmo chegar ao
desenvolvimento de dois estgios simultaneamen-
te. Este movimento ajuda a explicar a tendncia
de haver conglomerados financeiros, em detri-
mento de instituies especializadas, e presso pela
liberalizao, que marcou a dcada de 1990, tendoem vista os ganhos e sinergias que tal possibilidade
implicaria.
A integrao e mecanismos desenvolvidos nos
dois ltimos estgios do ao sistema financeiro a
capacidade de administrar seus riscos ativamente,
utilizando-se de securities, derivativos, swaps e
ttulos pblicos para gerenciar seus ativos e pas-
sivos. Neste ponto, observamos a clara impor-
tncia de um sistema financeiro desenvolvido na
plenitude oferecendo recursos aos investidores
que possuam projetos de investimentos apon-
tando para riscos e retornos compatveis com o
aceitvel em determinado momento.
O desenvolvimento do sistema financeiro
evitaria as disfunes do sistema bancrio, apon-
tadas por Carvalho (s.d.), que, dada sua prefern-
cia pela liquidez, faz com que se retenham os meios
de pagamentos ou se ofeream os recursos a taxas
de juros excessivamente elevadas ou com prazos
inviveis para os tomadores.
Outra questo que o desenvolvimento do
sistema ajudaria a solucionar a caracterstica
pr-cclica do sistema bancrio, que faz com que
em momentos de crise ou estresse seu comporta-
mento tenda seleo adversa, favorecendo o
maior risco, o que tende a intensificar os ciclos
econmicos, levando a booms e depresses. A
justificativa para este comportamento, segundo
Hermann (2000), fundamenta-se na lgica de que
qualquer firma busca o mximo lucro possvel
dentro das circunstncias. O desenvolvimento e a
integrao com outros mercados e os mecanis-
mos de gesto podem amenizar, mas no socapazes de eliminar essa caracterstica intrnseca
da firma bancria.
. . . , - 135
Para os keynesianos, desde a concepo, Keynes
imaginava que o mercado de capitais seria o
provedor de recursos para prazos mais longos,
lembrando que seus trabalhos foram desenvol-
vidos observando a economia inglesa e a norte-
americana. Estes mercados teriam um papel
fundamental no processo de transformar os meios
de pagamentos criados no sistema bancrio em
ativos e passivos de prazos mais alongados.
.
A anlise do mercado de capitais no Brasil consi-
dera dois aspectos em sua conduo: primeiro,
seu desenvolvimento importante para o desen-
volvimento econmico; segundo, mesmo que em
propores menores que as observadas nos pases
centrais, os investidores institucionais, sobretudo
fundos de penso, assumiram no Brasil papel rele-
vante na ltima dcada, demandando produtos
financeiros diferenciados.
Uma outra varivel de destaque o investimen-
to, especialmente em um pas como o Brasil, que
apresentou baixas taxas de crescimento econ-
mico nas ltimas duas dcadas3.
Contador e Mello (2004) demonstraram que
os problemas enfrentados pelo sistema bancrio
para conceder crdito ao setor privado afetaram
os investimentos.
Os problemas estruturais ligados aos marcos
regulatrios que buscaram harmonizar o merca-
do domstico ao internacional acabaram deslo-
cando o crdito para o setor pblico, alm da
ocorrncia do problema conjuntural represen-
tado pela reduo do fluxo de capitais para a
Amrica Latina.
Carvalho (s.d.) formula uma questo adicio-
nal: muitos criticam o sistema bancrio brasileiro
como deficiente. O autor observa, no entanto, que,
como instituio privada, os bancos respondem
a estmulos, buscando maximizar seus retornos.
Dado o cenrio em que no se apresenta o tradeoff
entre risco e retorno, as instituies no tm incen-
tivos para diversificar suas carteiras, apresentan-do elevada concentrao em financiamentos ao
setor pblico.
Essa disfuno do sistema bancrio, que leva
o crdito a escassear, representa uma barreira ao
investimento e concorrncia na economia,
conforme Kupfer e Hasenclever (2002). Mas o
mercado de capitais tem condies de assumir o
papel de fonte de recursos, conforme o pensamen-
to keynesiano.
Medeiros (1977) faz uma lucubrao sobre a
possibilidade de o desenvolvimento do mercado
de capitais anteceder ao desenvolvimento econ-
mico. Existe um certo consenso no Brasil de que
os setores, entre eles, o financeiro, tm de apre-sentar seu desenvolvimento concomitante com o
do todo, possibilitando um ciclo virtuoso.
Lopes e Rossetti (1998) consideram que o desen-
volvimento econmico aumentar a demanda
por produtos financeiros, concluso que refora
a proposta de estgios apresentada por Chick
(1994). Sendo possvel transpor estgios, a inte-
grao presente nos ltimos estgios possibili-
tar a transformao dos meios circulantes em
recursos de longo prazo. Isto possibilitaria no
s a correo da disfuno do sistema bancrio,
mas melhoraria o funcionamento de todo o siste-
ma, possibilitando uma melhor integrao com
mercados estrangeiros.
A integrao do Brasil com o mercado interna-
cional, sobretudo no perodo ps-estabilizao,
propiciou o crescimento do volume negociado na
Bovespa. Descontando o efeito da estabilizao,
no entanto, o crescimento parece pequeno diante
do potencial de nosso mercado. O volume em dlar
cresce apenas 16,5% entre 1995 e 2003, tendo apre-
sentado seu pice no binio 1997-8 certamente
sob efeito das privatizaes, principalmente do
Sistema Telebrs4.
Na Tabela 1, na comparao entre os anos de
1990 e 2003 a Bolsa brasileira apresenta cresci-
mento similar ao da Nasdaq, que foi o grande
destaque na dcada de 1990 no mercado de capi-
tais, mas envolvendo volumes modestos, aproxi-
madamente 1% do volume da Nasdaq.
Nos dados da World Federation of Exchanges5,
que estabelecem comparao com o PIB, os nme-
ros brasileiros confirmam a necessidade de amplia-o do volume, tendo representado, no ano de
2002, 31,2% do PIB, o que est distante de pases
136 Teoria financeira e a bolsa de valores
com maior tradio no mercado de capitais, como
os EUA, com volume de 105,0% do PIB em 2002,
ou mesmo de pases em desenvolvimento, como
o Chile, que em 2002 apresentou volume cor-
respondente a 77,7% do PIB.
A evoluo demonstra que o mercado acio-
nrio brasileiro necessita de outros elementos que
transcendam a simples abertura iniciada no prin-
cpio da dcada de 1990 para seu crescimento na
participao do mercado global. Segundo estudo
da consultoria Tendncias (2000), o mercado de
capitais requer trs itens bsicos para seu desen-
volvimento: liquidez, transparncia e facilidade
de acesso.
A liquidez no deve ser associada ao estoquede poupana, j que nossa liquidez afetada por
fatores como o custo de transao elevado e o
grande volume de poupana forada concentrado
nas mos do Estado, como o proporcionado pelo
FGTS e pela Previdncia pblica. A crescente inte-
grao com o mercado internacional amplia
nosso volume, mas no condio suficiente para
a resoluo dessas distores.
O desenvolvimento do mercado secundrio
ponto central a ser perseguido para reforar o
caminho rumo ao mercado consolidado e inte-
grado.
Podemos ressaltar a importncia de transpor as
dificuldades, acrescentando os efeitos destacados
por Ferreira (1995), segundo o qual a ampliao
do mercado de capitais traria para a economia
brasileira: i) melhora na gesto empresarial e osganhos microeconmicos que esta melhora acar-
retaria; ii) diversificao financeira compatvel
Fonte: World Federation of Exchanges
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Tabela 1Valor total negociado Bolsas selecionadas
. . . , - 137
com as necessidades dos investidores institucionais
e iii) integrao do setor produtivo e bancrio.
Assim, o mercado mais pujante incentivaria
prticas mais transparentes, como no caso da
Bovespa, que vem buscando ampliar os nveis de
disclosure junto s empresas listadas, com a intro-
duo de nveis diferencidos: Nvel 1, Nvel 2 e
Novo Mercado, aos quais as empresas aderiram
espontaneamente6. O fortalecimento do rgo
regulador, a Comisso de Valores Mobilirios
(CVM), afeta a transparncia e deve ser persegui-
do continuamente.As dificuldades com relao transparncia
so mutantes. Superado o problema da inflao,
enfrentou-se o problema da crise das empresas
do setor de tecnologia, e, mais recentemente, pas-
samos a enfrentar problemas derivados dos escn-
dalos nos mercados centrais fraudes contbeis.
A legislao tem se apresentado no ncleo do
debate brasileiro, com a nova Lei das Sociedades
Annimas e a Lei de Falncias.
Existe adicionalmente a necessidade de um
trabalho de divulgao e fortalecimento institu-
cional que transcenda o corpo jurdico, dadas a
tradio e a imagem do sistema financeiro perante
a populao. A Bovespa busca atrair o pblico
com campanhas e divulgao em universidades,
shoppings e eventos em geral. Com relao faci-
lidade de acesso, podemos observar a importante
participao das pessoas fsicas no volume nego-
ciado na Bovespa, representando aproximada-
mente 24% do volume mdio de 2003.
Deve-se, contudo, levar em considerao ques-
tes mais amplas da realidade brasileira, como o
baixo nvel de renda e escolaridade na elabora-
o de planos de ampliao para o mercado de
ttulos brasileiros.
A participao de pessoas fsicas o grande
destaque na Bovespa entre 1994 e 2003, saindo
de 10,68% do volume mdio negociado em 1994
para 24,17% em 2003, com um aumento de 126,3%
em 10 anos.
Alm do esforo realizado, contriburam para
isso os novos meios de transao que visam a
reduzir o custo, e certamente a estabilizao da
inflao, que facilita a precificao dos ativos.Conforme apresentado por Pinheiro (2000), o
processo de privatizao produziu grande preocu-
pao, devido a sua correlao com o programa de
estabilizao. As mudanas de bases importantes
de nossa economia impostas por este processo,
como a forma de insero do Estado na economia
e a conseqente transferncia para o setor privado
da responsabilidade de investimentos antes a
cargo do Estado, certamente aumentam a impor-
tncia da busca por viabilizar fontes no mercado
domstico para essa nova demanda por financia-
mentos.
Indiscutivelmente perdemos uma enorme chance
de estimular o mercado secundrio de aes no
Brasil, ao contrrio da Espanha e da Frana, em
que parte das privatizaes foi posta em prtica
parcialmente de forma pulverizada. Este proces-
so, se tivesse sido efetivado no Brasil, certamente
auxiliaria no aumento da liquidez e prepararia o
mercado para uma nova realidade.
Mesmo com todas as nossas dificuldades,
poderamos ter melhorado a performance atual,
Figura 1: Participao percentual na Bovespa por tipo de investidor. Fonte: Bovespa
138 Teoria financeira e a bolsa de valores
na qual a carteira representada pelas 50 aes mais
negociadas (IBrX50) responde por aproximada-
mente 75% do volume financeiro dirio da Bovespa,
o que indica pouca liquidez para o restante dos
papis negociados, e isto acaba traduzindo-se em
incentivos ao fechamento de capital por parte de
algumas empresas nos ltimos anos.
Superada a etapa e a discusso sobre a estabi-
lizao, o pas necessita de investimentos em
setores-chave para seu desenvolvimento: habita-
o, agricultura e infra-estrutura, muitos deles
recm-incorporados iniciativa privada peloprocesso de privatizao e concesso pblica,
alguns sem histrico de relacionamento com base
em financiamento junto a nosso mercado. Estes
setores, contudo, captam internacionalmente
recursos via funding do mercado de capitais, o
que certamente aumenta a importncia e o desa-
fio de ampliar e fortalecer as bases desse mercado
no Brasil, para que possa assumir o papel que lhe
cabe no desenvolvimento econmico do pas.
.
As bases tericas da escola neoclssica, e princi-
palmente da keynesiana, apontam para a impor-
tncia do desenvolvimento do mercado de capitais;
os caminhos sinuosos que levam a este resultado
podem e devem ser aprofundados no debate. No
entanto, a concluso de que o desenvolvimento
do mercado de capitais importante para o desen-
volvimento econmico irrefutvel.
A evoluo da Bovespa nos ltimos quinze anos
indica claramente que facilitar o acesso estran-
geiro e cessar com o processo inflacionrio no
suficiente para transformar o mercado de capi-
tais em elemento vigoroso para o crescimento do
investimento e da economia brasileira, ainda que
inquestionavelmente seja condio necessria
para tanto.
A dimenso das dificuldades e as possibilidades
de crescimento so muito grandes. Para a concre-
tizao desse processo, as mudanas institucionais
e legais so importantes, necessrio fortalecer a
integrao com o sistema bancrio e todo o setorprodutivo de forma que este seja dinamizado e os
custos transacionais sejam reduzidos.
O aumento da liquidez dos ativos parece ser a
barreira mais difcil de transpor neste momento, e
no devemos ficar presos ao velho conceito de que
h escassez de poupana, na hora de buscar alter-
nativas. A procura contnua da integrao com
outros mercados e a melhoria das condies de
acesso e transparncia proporcionaro o aumen-
to da liquidez, desencadeando uma reduo nos
custos transacionais e nos de emisso, atraindo
novos agentes, aplicadores e tomadores de recur-
sos; at mesmo as empresas menores, hoje exclu-
das completamente do mercado.
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Notas
1 Para observaes sobre investidores institucionais,
consultar Amaral et al. (2004).
2 A contribuio de Stiglitz no se alinha escola
neoclssica, todavia apresenta diferenas da escola oriunda
de Keynes, possibilitando sua apresentao em qualquer das
duas sees iniciais; para leitura sobre a heurstica de sua
obra, consultar Canuto e Ferreira Jr. (1999).
3 Conforme dados do Ipea, a mdia entre 1980 e 2003 foi
de 2,3% (disponvel em http://www.ipeadata.com.br).
4 O critrio de mensurao do volume no respeita a
paridade do poder de compra. Se considerada a forte
desvalorizao de nossa moeda em 1999, certamente temos
uma distoro na mensurao.
5 Relatrios anuais disponveis no site
http://www.world-exchanges.org.
6 As diferenas esto disponveis no site da Bovespa
(http://www.bovespa.com.br).
140 Teoria financeira e a bolsa de valores