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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS 3ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE CALDAS NOVAS EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE CALDAS NOVAS – GOIÁS, O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por seu representante que esta subscreve, no uso de suas atribuições legais nesta Comarca, vem, mui respeitosamente, com fulcro nos artigos 37, caput e § 4º, e 129, inciso III, da Constituição Federal, nos arts. 92, caput e § 4º, e 117, inciso III, da Constituição Estadual, no art. 25, inciso IV, alínea “b”, da Lei nº 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), e nas Leis de nº 7.347/85(Ação Civil Pública) e 8.429/92(Lei de Improbidade Administrativa), e com base nos documentos anexos, propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, em desfavor de: 1- MAGDA MOFATTO HON - bra- sileira, viúva, empresária, podendo ser localizada na Avenida ‘E’, Qua- dra 90, Lote 20, Setor Itanhangá I, em Caldas Novas(GO), atualmente exercendo o mandato de vereadora em Caldas Novas(GO);

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE CALDAS NOVAS – GOIÁS,

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por seu representante que esta subscreve, no uso de suas atribuições legais nesta Comarca, vem, mui respeitosamente, com fulcro nos artigos 37, caput e § 4º, e 129, inciso III, da Constituição Federal, nos arts. 92, caput e § 4º, e 117, inciso III, da Constituição Estadual, no art. 25, inciso IV, alínea “b”, da Lei nº 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), e nas Leis de nº 7.347/85(Ação Civil Pública) e 8.429/92(Lei de Improbidade Administrativa), e com base nos documentos anexos, propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, em desfavor de:

1- MAGDA MOFATTO HON - bra-sileira, viúva, empresária, podendo ser localizada na Avenida ‘E’, Qua-dra 90, Lote 20, Setor Itanhangá I, em Caldas Novas(GO), atualmente exercendo o mandato de vereadora em Caldas Novas(GO);

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2- MARCOS PEREIRA ROCHA - brasileiro, casado, advogado, ins-crito na OAB-DF., sob o nº. 10.320 e no CPF n◦ 102.403.651-00, po-dendo ser encontrado no endereço localizado na SHIN QI 01, conjunto 03, Casa 21, Brasília(DF);

3- MARISA ISAIAS ROCHA, bra-sileira, casada, arquiteta, portadora da C.I. n◦ 009.528 SSP/DF e CPF n◦ 146.085.961-87, podendo ser en-contrada no endereço localizado na SHIN QI 01, conjunto 03, Casa 21, Brasília(DF).

I- DOS FATOS:

A Municipalidade da cidade de Caldas Novas(GO), via da ex-prefeita Magda Mofatto Hon(primeira requerida, firmou um contrato denominado de “CONTRATO ADMINISTRATIVO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO N◦ ___ RECUPERAÇÃO TRIBUTÁRIA DE CONTRIBUIÇÕES FEDERAIS” com a empresa Marcos Pimenta Advocacia S/C, cujos sócios figuram o Dr. Marcos Pereira Rocha(segundo requerido) e a Sra. Marisa Isaias Rocha(terceira requerida), para prestação de serviços jurídicos ao Município, consistente em efetuar o “levantamento e recuperação de créditos decorrentes da imunidade recíproca do Poder Público estabelecido no artigo 150, VI, da Constituição Federal e da recuperação das contribuições pertinentes ao INSS, tais como pró labore sobre autônomos, contribuição previdenciária para agentes políticos, INSS EMPRESA, retenção do FPM e

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imunidade recíproca do ICMS, bem como outros que ventura venham ser identificados”. Em 24 de abril de 2007, foi firmado aditivo ao contrato em questão, dispondo que o “único objeto contratual que passa a vigorar sob a denominação de RECUPERAÇÃO DE CRÉDITO PREVIDENCIÁRIO SOBRE AUTÔNOMOS, AVULSOS E ADMINISTRADORES, conforme Resolução do Senado Federal n◦ 14/1997, bem como a vedação do bloqueio da rubrica INSS/EMPRESA, contribuição corrente no FPM, constantes no contrato original”.

O contrato original foi firmado para ter validade pelo período de 24(vinte e quatro) meses, a partir de 12 de janeiro de 2006, sendo que pelos serviços prestados, o Município de Caldas Novas(GO) se comprometeu a pagar “honorários de 20%(vinte por cento) calculados sobre as economias ficais apuradas, atualizadas e apropriadas por decisão administrativa ou judicial. Valores a serem compensados ou utilizados mensalmente pela CONTRATANTE1, de acordo e na medida em que efetivar os procedimentos administrativos legais com os créditos tributários objeto deste contrato. É devido os honorários pactuados sobre o êxito e benefícios proporcionados por decisão administrativa ou judicial, decorrente de transito em julgado na forma do § 2◦ do Artigo 102 da Constituição Federal, de suspensão dos pagamentos das contribuições e impostos considerados inconstitucionais cuja recuperação e pagamentos deverão ser realizados dentro dos próximos 24(vinte e quatro) meses(LC n◦ 101/2000) seguintes ao efetivo gozo do benefício alcançado sobre a recuperação do Tributos ocorrida”.

O contrato e seu aditivo, entretanto, como será demonstrado na seqüência desta petição, foram

1 Município de Caldas Novas

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firmados em total desobediência à previsão legal, notadamente, à lei nº 8.666 de 21.03.93, porque dispensada a licitação pública.

Ademais a mais, por uma simples visualização dos valores dos contratos em discurso, vemos, que a entabulação feita entre os protagonistas, ultrapassam o padrão de razoabilidade quanto à remuneração dos contratados, pois que, a Sra. Magda Mofatto Hon comprometeu o Município de Caldas Novas a efetuar o pagamento de honorários de 20%(vinte por cento) calculados sobre as economias ficais apuradas, atualizadas e apropriadas por decisão administrativa ou judicial, expressão esta, que ultrapassa os valores usualmente cobrados pelos profissionais da área2, conforme reconhecido pelo Tribunal de Contas dos Municípios, e que na prática representava uma cifra superior aos vencimentos do chefe do executivo Municipal, que por Lei, deveria ser a maior remuneração dentro da circunscrição autônoma.

Outro fato a merecer questionamento, refere-se ao pagamento dos valores aos particulares contratados, contrariando o disposto no negócio jurídico firmado entre os réus.

No instrumento trazia que o pagamento seria feito após o trânsito em julgado da decisão administrativa ou judicial e, inobstante isso, a administração pública entregou aos particulares/co-réus o valor equivalente a R$ 127.540,37(cento e vinte e sete mil, quinhentos e quarenta reais e trinta e sete centavos) sem qualquer comprovação da condição estabelecida contratualmente.

2 10%(dez por cento).

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E mais, sem qualquer indicação de crédito orçamentário que autorizava a realização da despesa em questão, e mesmo diante da ausência de comprovação do serviço prestado, conforme dito linhas volvidas.

Insta salientar, que o contrato foi firmado com a empresa Pimenta Advocacia Tributária S/C, que possui como sócia uma arquiteta, apesar de prestar serviços de advocacia.

Por fim, restou constatado que o objeto contratual original3 sofreu redução expressa por intermédio de termo aditivo firmado em 24 de abril de 2007, que limitou drasticamente o serviço inicialmente estabelecido4, e, apesar disso, não ocorreu a proporcional diminuição do valor do ajuste.

Apesar da irregularidade societária, a empresa pertencente aos réus Marcos Pereira Rocha e a Sra. Marisa Isaias Rocha firmou pacto com a municipalidade sem a prévia e necessária licitação, com fixação de pagamento de valores superfaturados, quitados antecipadamente e sem prova da realização do serviço contratado. E mais, conseguiu-se a redução do objeto do contrato sem a diminuição dos valores ajustados. É claro e evidente o prejuízo para o erário municipal.

II- DO DIREITO

II.1 DA OBRIGATORIEDADE DE REALIZAÇÃO DA LICITAÇÃO PARA

3 “levantamento e recuperação de créditos decorrentes da imunidade recíproca do Poder Público estabelecido no artigo 150, VI, da Constituição Federal e da recuperação das contribuições pertinentes ao INSS, tais como pró labore sobre autônomos, contribuição previdenciária para agentes políticos, INSS EMPRESA, retenção do FPM e imunidade recíproca do ICMS, bem como outros que ventura venham ser identificados”

4 “único objeto contratual que passa a vigorar sob a denominação de RECUPERAÇÃO DE CRÉDITO PREVIDENCIÁRIO SOBRE AUTÔNOMOS, AVULSOS E ADMINISTRADORES, conforme Resolução do Senado Federal n◦ 14/1997, bem como a vedação do bloqueio da rubrica INSS/EMPRESA, contribuição corrente no FPM, constantes no contrato original”

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CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE ASSESSORIA JURÍDICA.

No contrato de assessoria jurídica celebrado para os anos de 2006 e 2007, entre o Município de Caldas Novas, representado pela ré/ex-prefeita Magda Mofatto Hon, e os réus/particulares Marcos Pereira Rocha e Marisa Isaias Rocha, foi dispensado o procedimento licitatório, afrontando literalmente, como será demonstrado a seguir, à lei de licitação pública. E, ao contrário do que fizeram constar as partes beneficiárias, a licitação pública não é dispensável para a contratação de tais serviços.

Os casos de inexigibilidade de licitação estão enumerados no art. 25 da Lei nº 8.666/93:

“Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:...II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no artigo 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;...§ 1º. Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações,

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organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato.

§ 2º. Na hipótese deste artigo e em qualquer dos casos de dispensa, se comprovado superfaturamento, respondem solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o fornecedor ou o prestador de serviços e o agente público responsável, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis”.

Denota-se, portanto, conforme a redação do caput do art. 25 da Lei nº 8.666/93, será inexigível a licitação somente nos casos de “inviabilidade de competição”. E primeiramente vem a pergunta, no caso de serviços de assessoria jurídica a órgãos públicos é inviável a possibilidade de competição para a contratação do mencionado serviço? Obviamente que não, razão pela qual a licitação é obrigatória.

A referida lei de licitação, no seu artigo 13, inciso III, parágrafo lº, prevê expressamente o que são serviços técnicos especializados, mencionando as assessorias técnicas, e nos casos de inexigibilidade de licitação, afirma a previsão legal que deverão, preferencialmente, ser celebrados mediante concurso. Vejamos, pois, a redação do dispositivo.

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“Art. 13. Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos profissionais especializados os trabalhos relativos a:...III - assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias;...§ 1º. Ressalvados os casos de inexigibilidade de licitação, os contratos para a prestação de serviços técnicos profissionais especializados deverão, preferencialmente, ser celebrados mediante a realização de concurso, com estipulação prévia de prêmio ou remuneração”.

Claro, portanto, que a prestação de serviços de assessoria jurídica se encaixa no conceito legal de “serviços técnicos profissionais especializados”. Entretanto, esse fato, por si só, não torna inexigível a licitação. Pelo contrário, o § 1º do art. 13 da Lei nº 8.666/93 exige que seja realizado o processo licitatório, nesse caso, na modalidade de concurso, e com estipulação prévia da remuneração.

É importante ressaltar, mais uma vez, que os casos de inexigibilidade de licitação são apenas aqueles previstos no art. 25 da Lei nº 8.666/93, mesmo assim somente quando houver inviabilidade de competição, segundo o caput daquele mesmo dispositivo.

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Sobre esse tema, é importante invocar os ensinamentos doutrinários, para maiores esclarecimentos sobre a matéria, de Adilson Abreu Dallari, na obra, Aspectos jurídicos da Licitação, Editora Saraiva, 4ª edião, l997, à pág. 45 :

“Por força da idéia de república, do princípio da isonomia e do princípio da impessoalidade, é forçoso extrair da Constituição um ‘princípio da licitação’. Em regra, todos os contratos celebrados pela Administração Pública devem ser precedidos de licitação, porque a Administração Pública não pode nem privilegiar, nem prejudicar quem quer que seja, mas deve oferecer iguais oportunidades a todos de contratar com ela. Essa é a regra geral.É um princípio fundamental de hermenêutica que as exceções devem ser tratadas de maneira restrita. Quando houver alguma dúvida quanto à exigibilidade ou dispensa de licitação, é preciso não esquecer de que a regra geral é a exigibilidade, e de que a exceção é a dispensa. A legislação vigente cuida em artigos separados da dispensa e da inexigibilidade. Os casos de inexigibilidade são aqueles em que, logicamente, não existe possibilidade de licitação. Os

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casos de dispensa são aqueles em que, havendo possibilidade de licitação, uma circunstância relevante autoriza uma discriminação. É preciso, porém, deixar uma coisa bastante clara: não é dado ao legislador, arbitrariamente, criar hipótese de dispensa de licitação, porque a licitação é uma exigência constitucional. Se o elemento tomado em consideração para que seja feita essa dispensa não for pertinente, não for razoável ou compatível com o princípio da igualdade, a lei será inconstitucional. A dispensa indevidamente dada pela lei não pode valer perante a Constituição. Portanto, não é dado ao legislador dispensar licitação ao seu talante, à sua vontade, se esse fator de discrímen, se o elemento tomado em consideração não for relevante e não tiver abrigo constitucional, se não for razoável, pelo menos, à luz da Constituição.O estágio atualmente atingido, distinguindo-se a inexigibilidade da dispensa de licitação, é resultante de uma longa evolução, iniciada pela constatação de que a exigência da realização de licitações é a

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regra geral no Estado democrático de direito.Para nós, assim como a exigibilidade da licitação decorre de princípios gerais e ela mesma tem um procedimento informado por princípios específicos, também a dispensa de licitação, em sentido amplo, entendida como direito de não licitar, pode decorrer diretamente de princípios jurídicos, independentemente de disposições legais expressas. Há, sem dúvida, uma graduação entre esses princípios, cuja conseqüência prática é a seguinte: a exigibilidade da licitação deve ser interpretada extensivamente, ao passo que a dispensa exige interpretação restritiva. O norte a orientar o exegeta ou o aplicador da lei e os agentes públicos em geral será sempre o interesse público em sua acepção mais ampla, que não se confunde com o simples interesse da Administração....Dada sua extrema importância, cabe aqui uma palavra adicional sobre a contratação de serviços técnicos especializados, para esclarecer que, nesse caso, a realização do certame licitatório deve ser a regra e a sua dispensa

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a exceção. Isto é, não basta que um serviço seja técnico e especializado para que, automaticamente, ocorra a impossibilidade material de licitar.Nem todo serviço técnico especializado enseja a pura e simples dispensa de licitação. Existem serviços que, não obstante requeiram acentuada habilitação técnica, podem ser realizados por pluralidade de profissionais ou empresas especializadas, indistintamente. A dispensa de licitação somente pode ocorrer quando um serviço técnico se tornar singular, ou seja, quando o fator determinante da contratação for o seu executante, isto é, quando não for indiferente ou irrelevante a pessoa, o grupo de pessoas ou a empresa executante.A singularidade do serviço foi enfocada por Celso Antônio Bandeira de Mello da seguinte forma: ‘De modo geral são singulares todas as produções intelectuais, realizadas isolada ou conjuntamente - por equipe - sempre que o trabalho a ser produzido se defina como marca pessoal (ou coletiva) expressa em características científicas, técnicas ou artísticas

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importantes para o preenchimento da necessidade administrativa a ser suprida. Neste quadro, cabem os mais variados serviços: uma monografia escrita por experiente jurista, uma intervenção cirúrgica realizada por qualificado cirurgião, uma pesquisa sociológica empreendida por uma equipe de planejamento urbano, um ciclo de conferências efetuado por professores, uma exibição de orquestra sinfônica, uma perícia técnica sobre o estado de coisas ou das causas que o geraram.Todos esses serviços se singularizam por um estilo ou por uma orientação pessoal. Note-se que a singularidade mencionada não significa que outros não possam realizar o mesmo serviço. Isto é, são singulares, embora não sejam necessariamente únicos.

O mesmo autor, em obra monográfica sobre o tema ‘licitação’, ao discorrer sobre a dispensa de licitação, em face da singularidade do objeto, refere-se à notória especialização, restringindo ainda mais a dispensa de licitação para contratação de serviços técnicos especializados: ‘Com efeito, segundo nos parece, o caso da notória especialização diz respeito a trabalho marcado por características individualizadoras. Daí a referência a profissional ou firma de notória especialização. A situação

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ocorre quando o serviço pretendido se caracteriza, como se passa com as produções intelectuais, com as produções artísticas, por um estilo, por uma marca pessoal ou coletiva que, de todo modo singulariza o serviço, pois nele se estampa um cunho próprio de seu autor. Segue-se que não bastará tratar-se de pessoas ou firma especializada e com prestígio no ramo, se o trabalho pretendido for de natureza banal, corriqueiro, ou que demande atividade predominantemente material, para as quais, então, seriam despiciendas as características especializadas do autor’.

A dispensa depende da somatória das peculiaridades do objeto e do executante. É preciso demonstrar a necessidade de se contratar um profissional notoriamente especializado, cuja notoriedade também deve ser evidenciada. Ou seja, além de um executor especializado, é preciso haver real necessidade dessa especialização e comprovação efetiva da capacidade especial do contratado.

Certamente um dos autores que mais se dedicou ao tema da dispensa de licitação e especificamente da notória especialização é Lúcia Valle Figueiredo, que foi aprofundando o estudo dessa questão em cada um de seus sucessivos trabalhos.

Em obra escrita em parceria com o renomado mestre Sérgio Ferraz, já acolhendo a distinção feita pelo legislador entre dispensa e inexigibilidade, os autores enfocam um aspecto extremamente relevante, qual seja, o fato de que um trabalho técnico profissional especializado pode ser contratado sem licitação mesmo que haja ‘uma pluralidade de notórios especializados’, exatamente porque o trabalho produzido se torna singular em razão da singularidade subjetiva do executante.

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Essa singularidade resultante das características pessoais do executante é que torna inviável a comparação, ou a competição, tornando inexigível a licitação, conforme dispõe a legislação vigente.

O trabalho pode ser considerado singular quando depender das características do executante. Haverá singularidade quando diferentes executantes notoriamente especializados produzirem diferentes trabalhos. Não haverá singularidade quando diferentes executantes puderem realizar a mesma coisa, produzir o mesmo resultado.

Por exemplo: diferentes profissionais especializados incumbidos de elaborar um projeto arquitetônico certamente produzirão projetos distintos, peculiares, singulares; mas diferentes profissionais especializados poderão executar um determinado projeto que lhes for apresentado, chegando a um mesmo resultado, que nada terá de peculiar ou singular.

Isso está a indicar que não se pode invocar a notória especialização para a contratação de um serviço usual, corriqueiro, comum, que efetivamente não exija uma habilitação especial.

Em trabalho mais recente sobre o tema, Lúcia Valle Figueiredo renovou a lição anterior, colocando-a de maneira sintética: ‘De conseguinte, dois são os fatores que devem, obrigatoriamente, estar presentes: 1) a existência de especialização notória, em síntese, capacidade notória; 2) necessidade dessa especialização notória, por parte da Administração’. Ou seja, ‘a par de se reunirem no profissional ou firma contratada as características que conotem a notória especialização,

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deverá também estar presente a necessidade técnica da administração de contratá-los, tendo em vista a natureza do objeto pretendido’.

...Qual o critério que permite qualificar

uma empresa ou uma pessoa como dotada de notoriedade? Sobre essa questão assim se manifestou Hely Lopes Meirelles: ‘Não há padrões objetivos para se identificar a notória especialização a que se refere a lei. Por isso mesmo, há que ser reconhecida por critérios subjetivos do conceito geral de que goza o profissional ou a empresa no campo de sua especialidade. Esse conceito se forma pelo bom desempenho do especialista ou da firma especializada em serviços anteriores, aliado aos estudos, experiências e publicações técnicas ou científicas sobre a matéria, atestando a capacidade e a idoneidade profissionais. Notoriedade é, em última análise, para fins de dispensa de licitação, a fama consagradora do profissional no campo de sua especialidade’.

... É isso que ensina Eros Roberto Grau:

‘Ora, daí poderemos adotar, como proposição a iluminar a busca de significado da expressão reconhecidamente capaz, a assertiva de que é titular de tal qualificação o profissional ou ‘firma’, cuja competência técnica é sabida e inquestionável no universo dentro do qual os serviços do tipo por ele desenvolvido são habitualmente prestados. Reconhecidamente capaz é o profissional ou ‘firma’ que obteve o reconhecimento naquele universo na reiteração do desempenho de serviços bem sucedidos’.

Como se pode notar, a doutrina se preocupava em esclarecer ou tornar mais preciso o entendimento da dispensa de licitação para a contratação de serviço técnico com profissional notoriamente

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especializado, que, pela imprecisão, tinha-se transformado numa panacéia ensejadora de insuportáveis abusos.

Isso fica bem visível quando se examina a doutrina ‘oficial’, ou seja, os trabalhos produzidos por renomados juristas, no exercício de funções governamentais.

Em parecer datado de 10 de maio de 1973 (publicado na RDA, 114:373), apreciando um caso de dispensa de licitação para a contratação de serviços de processamento de dados, assim se manifestou o então Procurador da República junto ao Tribunal de Contas da União, Luiz Octávio Gallotti: ‘Mas isso não significa que se possa dar à norma permissiva da adjudicação direta do serviço a profissionais ou firmas de notória especialização uma latitude capaz de subverter a regra geral inscrita no art. 126 do Decreto-lei 200, segundo o qual as compras, obras ou serviços efetuar-se-ão com estrita observância do princípio da licitação.

Realmente, se bastasse a conceituação de uma empresa como de notória especialização para dispensar-se o pregão, tornar-se-ia este uma exceção e regra seria a dispensa, em favor, v.g., de companhias especializadas em construções e outras atividades que comprometem o grosso das despesas públicas em serviços, como acentuado no item 6 do já aludido parecer da Assessoria Jurídica.

Assim, o verdadeiro sentido do dispositivo deve ser buscado não só na qualificação do prestador, mas na índole do contrato que, para demandar notória especialização em seu desempenho, deve ser necessariamente inédito ou incomum, o que não nos parece ocorrer, na espécie dos autos .

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Não se incluiu, no permissivo, a tarefa, mesmo especializada, que se tenha generalizado pelo uso, como sucede na hipótese vertente. Restringe-se à faculdade do administrador ao tipo de serviço capaz de exigir, na seleção do executor de confiança, em grau de subjetividade que se não possa medir pelos critérios objetivos de qualificação, inerentes ao processo de licitação’.

Em síntese, para o eminente ministro, o serviço cuja contratação dispensaria a licitação haveria de ser excepcional, incomum, até mesmo inédito, pois mesmo um serviço técnico que, ao surgir, exigia conhecimentos elevados, com o correr do tempo vai-se tornando comum, corriqueiro.

A questão do ‘ineditismo’ foi muito criticada pela doutrina, posteriormente, mas é preciso entendê-la em seu contexto: serviço inédito não é apenas aquele nunca realizado anteriormente, mas sim aquele pouco difundido, dominado por poucos especialistas, cuja execução exige o domínio de técnicas novas, modernas, mas que, com o correr do tempo, passam a ser absorvidas pela generalidade dos profissionais.

Ainda na mesma linha de raciocínio, é importante citar também a opinião do eminente Hely Lopes Meirelles:

“Serviços técnicos profissionais são todos aqueles que exigem habilitação legal para a sua execução. Essa habilitação varia desde o simples registro do profissional ou firma na

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repartição administrativa competente até o diploma de curso superior oficialmente reconhecido. O que caracteriza o serviço técnico é a privatividade de sua execução por profissional habilitado, seja ele um mero artífice, um técnico de grau médio ou um diplomado em escola superior. É o serviço que requer capacitação profissional e habilitação legal para seu desempenho dentro das normas técnicas adequadas, como ocorre com os trabalhos de engenharia, eletricidade, hidráulica, comunicações, transportes e outros que exigem conhecimentos científicos para sua realização.

Os serviços técnicos profissionais podem ser generalizados ou especializados, como veremos a seguir.

Serviços técnicos profissionais generalizados - São os que não demandam maiores conhecimentos, teóricos ou práticos, além dos ministrados nos cursos normais de formação profissional. Estes serviços, por sua generalização entre os que a eles se dedicam profissionalmente, exigem licitação, por haver sempre a

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possibilidade de competição entre os interessados, nivelados pelo mesmo título de habilitação. Nesta categoria enquadram-se tanto os serviços técnicos de grau médio quanto os de grau superior, visto que aqueles e estes são trabalhos de prática conhecida e corrente de seus profissionais.

Serviços técnicos profissionais especializados - São aqueles que, além da habilitação técnica e profissional normal, são realizados por quem se aprofundou nos estudos, no exercício da profissão, na pesquisa científica, ou através de cursos de pós-graduação ou de estágios de aperfeiçoamento. São serviços de alta especialização e de conhecimentos pouco difundidos entre os demais técnicos da mesma profissão. Esses conhecimentos podem ser científicos ou tecnológicos, vale dizer, de ciência pura ou de ciência aplicada ao desenvolvimento das atividades humanas e às exigências do progresso social e econômico em todos os seus aspectos.

A Lei 8.666/93, na esteira dessa orientação, especificou os

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serviços técnicos profissionais especializados, para os quais a licitação é inexigível, em face da manifesta inviabilidade de competição entre profissionais ou empresas de notória especialização” (Licitação e Contrato Administrativo, Malheiros Editores, 11ª edição, 1997, págs. 50/51).

A assessoria jurídica ao município pode ser prestada por uma infinidade de profissionais altamente capazes, existentes no mercado de trabalho, e não somente por este ou aquele profissional, escolhido a dedo pelo chefe do executivo municipal.

Além disso, o art. 26, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93, exige, nos casos de dispensa ou inexigibilidade de licitação, que o processo seja instruído com a razão da escolha do fornecedor ou executante (prestador de serviços), além da justificativa do preço. Vejamos pois a redação do dispositivo.

“Art. 26. ...Parágrafo único. O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:...II - razão da escolha do fornecedor ou executante;III - justificativa do preço”.

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E observa que nem mesmo constou do contrato, a simples justificativas da dispensa do processo licitatório, não se mencionando quer a razão da escolha da empresa contratada e nem mesmo se justificou o preço estipulado, principalmente, quanto aos valores absurdos previstos no ajuste.

Por tudo isso, podemos concluir:

1. Os serviços de assessoria jurídica, apesar da necessidade de ser prestado por técnico capacitado para o bem da administração, não possui qualquer singularidade capaz de dispensar o processo licitatótio na modalidade de concurso, podendo ser realizada a contento por inúmeros profissionais da área do direito, não havendo, portanto, necessidade de notória especialização de quem a executa;

2. Para a contratação de serviços de assessoria jurídica por parte da administração pública, a licitação, na modalidade de concurso, é obrigatória, nos termos do art. 13, § 1º, da Lei nº 8.666/93;

3. No caso em análise, o interesse da administração pública, e os princípios constitucionais da legalidade, da impessoalidade e da moralidade (art. 37, caput, da Constituição Federal) exigem a realização de processo licitatório;

5. A não realização do processo licitatório não trouxe nenhum benefício à administração pública. Pelo contrário, veio a causar prejuízos ao erário e enriquecimento ilícito dos requeridos Marcos Pereira Rocha e Maria Isaias Rocha, que perceberam uma quantia ilegal, tendo como parâmetro contratos de assessoria firmados por outros profissionais da área.

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II.1.1 – DOS DEMAIS VÍCIOS NA CONTRATAÇÃO:

É evidente que o município poderia gastar muito menos com a contratação dos serviços de assessoria jurídica, realizando processo licitatório, com a participação de muitos interessados e com capacidade a contento, para o serviço ajustado.

A fixação dos honorários de 20%(vinte

por cento) calculados sobre as economias ficais apuradas, atualizadas e apropriadas por decisão administrativa ou judicial, expressão esta, que pode considerada em muito superior aos valores normalmente praticados, conforme dito alhures.

O desatino maior, porém, foi o pagamento prévio dos valores a empresa contratada, contrariando o disposto no negócio jurídico firmado entre os réus.

No instrumento trazia que o pagamento seria feito após o trânsito em julgado da decisão administrativa ou judicial e, inobstante isso, a administração pública entregou aos particulares/co-réus o valor equivalente a R$ 127.540,37(cento e vinte e sete mil, quinhentos e quarenta reais e trinta e sete centavos) sem qualquer comprovação da condição estabelecida contratualmente.

Não foi, ainda, indicado o crédito orçamentário que autorizava a realização da alta despesa, e

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mesmo diante da ausência de comprovação do serviço prestado, o pagamento foi feito.

Insta salientar, que o contrato foi firmado com a empresa Pimenta Advocacia Tributária S/C, que possui como sócia uma arquiteta, apesar de prestar serviços de advocacia, em clara ofensa à Lei5.

Por fim, restou constatado que o objeto contratual original sofreu redução expressa por intermédio de termo aditivo firmado em 24 de abril de 2007, que limitou drasticamente o serviço inicialmente estabelecido, e, apesar disso, não ocorreu a proporcional diminuição do valor do ajuste.

Apesar de tudo isso, a empresa pertencente aos réus Marcos Pereira Rocha e a Sra. Marisa Isaias Rocha firmou pacto com a municipalidade sem a prévia e necessária licitação, com fixação de pagamento de valores superfaturados, quitados antecipadamente e sem prova da realização do serviço contratado. E mais, consegui-se a redução do objeto do contrato sem a diminuição dos valores ajustados, e claro e evidente prejuízo para o erário municipal.

A situação é esdrúxula, contraria princípios basilares da administração pública, da moralidade administrativa, moralidade para com os atos e negócios públicos, da impessoalidade, da legalidade.

II.2- DOS PRINCIPIOS CONSTITUCIONAIS PARA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - DAS REGRAS GERAIS E DOS ATOS DE IMPROBIDADES DE CONFORMIDADE COM A LEI 8.429/92.

5 art. 1◦, inc. II c/c art. 16, ambos da Lei n◦ 8.906/94.

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A Constituição Federal, em seu art. 37, caput, e § 4º, dispõe que:

“Art. 37. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade eficiência e, também, ao seguinte:...§ 4º. Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.

No mesmo sentido, a Constituição Estadual, em seu art. 92, caput, e § 4º, prevê o seguinte:

“Art. 92. A Administração Pública direta, autárquica e fundacional e a indireta do Estado e dos Municípios obedecerão aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e:...

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§ 4º. Os atos de improbidade administrativa importarão perda da função pública, indisponibilidade dos bens e ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.

Disciplinando a matéria, adveio a lei nº 8.429/92, que trata da improbidade administrativa, com as seguintes regras.

“Art. 1º. Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei.”

“Art. 2º Reputa-se agente pública, efeitos desta Lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição,

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nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.”

“Art. 3º. As disposições desta Lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta”.

No artigo 4º da referida lei, o legislador estabelece a OBRIGAÇÃO DO AGENTE PUBLICO, de velar pelos PRINCÍPIOS DE LEGALIDADE, IMPESSOALIDADE, MORALIDADE E PUBLICIDADE, nos seguintes termos.

“Art. 4º. Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos.”

No caso dos autos, três destes princípios estão sendo flagrantemente violados, quais sejam, o da legalidade, da moralidade e da impessoalidade.

No artigo 5º, estabeleceu que, havendo lesão ao patrimônio público, tanto por ação ou omissão, por

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dolo e até mesmo por culpa, dar-se-á integral ressarcimento do dano, que tem a seguinte redação.

“Art. 5º. Ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa, do agente ou de terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano”.

“Art. 6º. No caso de enriquecimento ilícito, perderá o agente público ou terceiro beneficiário os bens ou valores acrescidos ao seu patrimônio”.

E ainda, nos termos do art. 6º da mesma lei, tanto o agente público quanto o terceiro beneficiário perderão os bens ou valores acrescidos ao seu patrimônio, em caso de enriquecimento ilícito. O enriquecimento aventado pela lei, é auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício do cargo, função ou emprego das entidades mencionadas no art. lº da lei 8.429/92, conforme redação do artigo 9º. No do contrato, que foi superfaturado, a devolução do dinheiro aos cofres públicos, de responsabilidade dos requeridos Magda Mofatto Hon, Marcos Pereira Rocha e Marisa Isaias Rocha.

O capitulo II da Lei 8.429/92 trata dos atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao erário, da seguinte forma:

“Art. l◦. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário, qualquer ação ou omissão, dolosa ou

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culposa, que enseja perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. lº desta Lei, e notadamente:.........V- permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço superior ao de mercado;..........VIII- frustar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;

........XII- permitir, facilitar e concor-rer par que terceiro se enriqueça ilicitamente;

Do caput do artigo l◦ mencionado acima, verifica-se que os requeridos, ao firmarem contrato de serviços jurídicos para os anos de 2006/2007, no valor de R$ 127.540,37 (cento e vinte e sete mil, quinhentos e quarenta reais e trinta e sete centavos), praticaram ato de improbidade administrativa, que causou lesão ao erário, posto que, o pagamento pelo Município do contrato naqueles valores, obviamente ensejou perda patrimonial para os cofres da municipalidade.

E no inciso V, do mencionado artigo, verifica-se o encaixe perfeito do ato praticado, a contratação de serviços por preço bem superior ao de mercado, fato este, constatado pelo contraste do valor dos contratos com a realidade onde há realização de processo licitatótio.

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No inciso VIII citado acima, observa que a requerida ex-prefeita Magda Mofatto Hon dispensou indevidamente o necessário e indispensável processo licitatório para a contratação daqueles serviços.

Quanto ao inciso XII, citado acima, verifica-se que a requerida em questão permitiu, facilitou ou concorreu para o enriquecimento ilícito de terceiros, eis que, como chefe daquela administração, contratou os serviços de assessoria jurídica, advogado de sua confiança particular.

E também, não é demais mencionar que a conduta dos requeridos infringiu o art. 11, caput, da Lei nº 8.429/92, que tem a seguinte redação.

“Art.11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:”

É importante ressaltar que o legislador procura ser exaustivo, mas não é, razão pela qual usa as expressões “qualquer” e “notadamente” no caput do artigo, deixando claro que qualquer outra conduta, ainda que não elencada em algum dos incisos, mas que cause lesão ao erário, configura ato de improbidade administrativa.

E, no caso em análise, não há dúvida de que os atos praticados pela ex-prefeita, dos quais se

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beneficiaram os outros requeridos, infringiram os princípios que regem a administração pública, da legalidade, da moralidade, da impessoalidade e da honestidade.

Marcelo Figueiredo, na sua obra, Probidade Administrativa, Editora Malheiros, 2ª edição, l997, comenta, trechos citados a seguir, o princípio da legalidade na administração pública, com as seguintes colocações.

“O princípio da legalidade é, sem dúvida, um dos pilares do Estado Democrático de Direito. Ao lado dele convive o princípio da supremacia do interesse público ou princípio da finalidade pública. De fato, a administração pública, ao cumprir seus deveres constitucionais e legais, busca incessantemente o interesse público, verdadeira síntese dos poderes a ela atribuídos pelo sistema jurídico positivo, desequilibrando forçosamente a relação administração-administrado... A administração atua, age, como instrumento de realização do ideário constitucional, norma jurídica superior do sistema jurídico brasileiro.

Assim, o agente público deve atender aos interesses públicos, ao bem-estar da comunidade. Sob o rótulo ‘desvio de poder’,

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‘desvio de finalidade’, ‘ausência de motivos’, revelam-se todas as formas de condutas contrárias ao Direito, prejudiciais ao administrado e violadoras, às vezes, da própria Constituição. Há, em síntese, comportamento ilegal ou ilegítimo.

Alias, o STJ deixou assentado que ‘o desvio de poder pode ser aferido pela ilegalidade explícita (frontal ofensa ao texto da lei) ou por censurável comportamento do agente, valendo-se de competência própria para atingir finalidade alheia àquela abonada pelo interesse público, em seu maior grau de compreensão e amplitude. Análise da motivação do ato administrativo, revelando um mau uso da competência e finalidade despojada de superior interesse público, defluindo o vício constitutivo, o ato aflige a moralidade administrativa, merecendo inafastável desfazimento’ (REsp 21.156-0-SP, reg. 92.0009144-0, rel. Min. Milton Luiz Pereira, j. 19.9.94).

A norma em foco autoriza a pesquisa do ato administrativo a fim de revelar se o mesmo está

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íntegro ou, ao contrário, apenas aparentemente atende à lei, se os motivos e seu objeto têm relação com o interesse público, se houve algum uso ou abuso do administrador, se a finalidade foi atendida de acordo com o sistema jurídico; e assim por diante” (págs. 61/62).

Ora, como agente público, que era a primeira requerida, ao exercer o mandato, o cargo que ocupava na administração, deveria agir, tendo em vista os princípios da legalidade, honestidade, moralidade e lealdade. As condutas acima descritas, no entanto, são um verdadeiro atentado ao patrimônio público e aos princípios que regem a administração pública.

II-3. INDISPONIBILIDADE DE BENS

A indisponibilidade de bens dos ímprobos tem por escopo a garantia do futuro ressarcimento do dano ou pagamento de multas civis ao patrimônio público, seja municipal, estadual ou federal. É uma medida acautelatória de suma importância nos casos onde se verifica a prática de ato de improbidade administrativa com lesão ao erário, consoante condutas infracionais descritas nos artigos 09 e 10 da Lei n.º 8.429/92. Pode e deve ser decretada liminarmente sob pena de perda total de sua eficácia.

Ora, seria uma ingenuidade descabida acreditar que um agente público em improbidades, ou aqueles particulares envolvidos neste tipo de conduta,

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resguardarão seu patrimônio para posterior recomposição dos danos à riqueza da coletividade.

Havendo elementos suficientes que apontam para a conduta infracional dos agentes, a medida se impõe justificada até pelo bom senso, já que autorizada pela lei e pela Constituição, e sua interpretação deve ser feita no contexto social e de modo vinculado ao sistema jurídico como um todo.

Não se mostra crível aguardar que o agente público e terceiros envolvidos em improbidades comecem a dilapidar o seu patrimônio para, só então, promover o ajuizamento da medida de bloqueio de bens. Tal perspectiva traduziria concreta impunidade e esvaziamento do sentido rigoroso da legislação.

A propósito os julgados abaixo reproduzidos:

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADE - INDISPONIBILIDADE DE BENS - Cautelar incidental de indisponibilidade de bens decretada liminarmente. Possibilidade. Despacho sucintamente fundamentado. Pressuposto do art. 165 do CPC satisfeito. Recurso desprovido. Para a higidez das decisões basta sucinta fundamentação. Não há incompatibilidade entre Ação Civil Pública e medidas preconizadas pela Lei que dispõe sobre sanções nos casos

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de enriquecimento por ato de improbidade. Medida cautelar incidental não se confunde com Ação Civil Pública” (Ag. de Inst. n.º 7.564 - TJSC - Comarca de Palhoça - 3ª Câm. Cível - Rel. Des. Amaral e Silva).

Ainda :

“Ação Cível Pública. Improbidade administrativa. Liminar de indis-ponibilidade de bens. Legalidade e legitimidade. Confirmação. O decreto liminar de indisponibili-dade de bens, visando à garantia do efeito útil do processo, na hi-pótese de condenação dos indica-dos responsáveis por ressarci-mento ao erário, demandados por atos de improbidade admi-nistrativa, constitui ato legal e le-gítimo, a merecer confirmação. Agravo de instrumento conheci-do e desprovido.” AI n.º 11.295-9, de Goiânia. Relator: des. Jalles Ferreira da Costa. 2ª Câm. Cív. (Agte.: Ozório Leão Santa Cruz; Agdo.: MP). Acórdão de 22.4.97.

Por fim, sabendo que a indisponibilida-de deve abranger bens suficientes para o ressarcimento dos prejuízos e pagamentos das multas civis nos termos do ar-tigo 37, § 4º, da Carta Cidadã, temos que a multa a ser atri-buída a cada agente envolvido, nos termos do artigo 12, I, da Lei 8.429/92 é de 03(três vezes) o valor do dano.

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Nestes termos, exige-se que o montante visando a garantia do efeito útil do processo soma-se, ini-cialmente, o montante de R$ 127.540,37(cento e vinte e sete mil, quinhentos e quarenta reais e trinta e sete centavos) em danos, mais R$ 382.621,11(trezen-tos e oitenta e dois reais, seiscentos e vinte e um reais e onze centavos) para cada um dos ímprobos6, de multas Civis, totalizando a cifra de R$ 1.147.863,33 (um milhão, cento e quarenta e sete mil, oitocentos e sessenta e três reais e trinta e três centavos), sendo que somado ao valor do prejuízo(R$127.540,37) chega-se ao valor total de R$ 1.275.403,70 (um milhão, duzen-tos e setenta e cinco mil, quatorcentos e três reais e setenta centavos) devendo este valor ser corrigido mo-netariamente, apontando como termo inicial a data de cada pagamento e como termo final a data de publicação da sentença condenatória a ser lançada na presente ação civil pública.

Senão vejamos:

“Evidentemente que a indisponibilidade de bens prevista em norma constitucional possui natureza cautelar e prevê o ressarcimento do erário, pois não haveria sentido no impor sanção genérica de indisponibilidade patrimonial, na medida que tal gravame tem por único objetivo assegurar efetiva

6 “Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato:

I - na hipótese do art. 9°, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos”(g.n.);

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perspectiva de pagamento dos valores relativos ao quantum de multa e ressarcimento de prejuízos pelo réu aos cofres públicos’(In improbidade administrativa – Ed. Síntese, -1998 – pág. 237). Grifei”

III- PEDIDOS

Assim sendo, o Ministério Público requer:

1- Seja a presente ação recebida, autuada e processada na forma e no rito preconizado no art. 17 da Lei n.º 8.429/92, atentando-se às disposições do seu parágrafo 7º no sentido da notificação prévia dos requeridos, para oferecerem manifestações por escrito, que poderá ser instruída com documentos e justificações, dentro do prazo de 15 (quinze) dias;

2- Seja o Município de Caldas Novas(GO), por seu Prefeito, cientificado da presente ação, devendo ser a diligência cumprida no centro administrativo municipal, localizado na Av. Orcalino Santos, n◦ 283, Cen-tro, nesta Cidade, e, caso queira, integre o pólo ativo da de-manda, devendo sua citação preceder a dos réus.

3- Seja liminarmente decretada a indisponibilidade dos bens dos réus (imóveis, veículos, linha telefônica, etc.), até o limite do pagamento dos prejuízos e pagamentos das multas civis, isto em torno do montante de R$ 1.275.403,70 (um milhão, duzentos e setenta e cinco mil, quatrocentos e três reais e setenta centavos), com as comunicações de praxe, nos termos e conforme autorizado pelo art. 7º da Lei n.º

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8.429/92, pois visa tal medida o ressarcimento dos danos e pagamentos das multas civis a serem fixadas na sentença condenatória, como explanado a necessidade em tópico próprio;

4- Ultrapassada a fase do juízo de preli-bação, sejam os réus citados pessoalmente, via mandado e/ou carta precatória, para responderem aos termos desta ação no prazo legal, sob pena de serem-lhes decretadas as revelias, permitindo-se ao oficial de justiça utilizar-se da exceção prevista no art. 172, § 2º, do Código de Processo Ci-vil;

5- Seja o pedido julgado procedente em todos os seus aspectos para reconhecer a prática, pelos réus, de atos de improbidade administrativa previstos no art. 9º, art. 10 e art. 11, todos da Lei 8.429/92, e, por consequência, condená-los nas sanções do artigo 12, inciso I, II e III, a saber:

5.1. na hipótese do art. 9º, perda dos bens e valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, perda da função pública aos que a exerçam, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos;

5.2. Na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do

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dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;

5.3. Na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos;

5.4. O reconhecimento do item anterior (mais grave) prejudicará o reconhecimento do posterior (menos grave);

5.5. Considera-se para perda dos valores acrescidos ilegalmente e ressarcimento integral do dano o montante a ser apurado em sede de liquidação de sentença, da mesma forma quanto à vantagem patrimonial indevida, em relação ao dano ao patrimônio público, acrescidos de juros e correções.

6) Sejam os réus condenados ao pagamento das custas e despesas processuais, que se constituam em ônus da sucumbência;

7) Protesta provar o alegado por qualquer meio de prova admitido em direito.

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Dá-se à causa o valor de R$ 1.275.403,70 (um milhão, duzentos e setenta e cinco mil, quatrocentos e três reais e setenta centavos) para efeitos legais.

Em Caldas Novas, 26 de maio de 2010.

Publius Lentulus Alves da RochaPromotor de Justiça

3ª Promotoria de Justiça de Caldas Novas