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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA MM. VARA CÍVEL FEDERAL DE BRASÍLIA/DF. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS PEQUENAS E MÉDIAS COOPERATIVAS E EMPRESAS DE LATICÍNIOS – G100 e ABLV- ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE LEITE LONGA VIDA, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o nº 06.724.655/0001-99, com endereço em SAUS Quadra 05, bloco K, Ed. Ok Office Tower, sala 711, CEP 70.070-050, Brasília, DF, e a ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA DE LEITE LONGA VIDA, Rua Flórida, 1758 - 10º andar - cj 102 - Brooklin Novo, CEP 04565-001, São Paulo – SP, CNPJ: 00 035 186/0001-14, por seu representante legal, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, ajuizar a presente AÇÃO INIBITÓRIA PARA O ADEQUADO CUMPRIMENTO DA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº69/2006 DO MAPA com PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA contra a UNIÃO FEDERAL, pessoa jurídica de direito público federal interno, representante legal de seu órgão da administração direta Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e de suas secretarias internas, pelos fatos e fundamentos que passa a expor:

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA MM. … · processo de aquecimento e resfriamento do leite a elevadas temperaturas faz com que este, ao final da cadeia de produção,

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA MM. VARA CÍVEL

FEDERAL DE BRASÍLIA/DF.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS PEQUENAS E MÉDIAS

COOPERATIVAS E EMPRESAS DE LATICÍNIOS – G100 e

ABLV- ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE LEITE LONGA

VIDA, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ

sob o nº 06.724.655/0001-99, com endereço em SAUS

Quadra 05, bloco K, Ed. Ok Office Tower, sala 711, CEP

70.070-050, Brasília, DF, e a ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA

DA INDÚSTRIA DE LEITE LONGA VIDA, Rua Flórida, 1758

- 10º andar - cj 102 - Brooklin Novo, CEP 04565-001, São

Paulo – SP, CNPJ: 00 035 186/0001-14, por seu

representante legal, vem, respeitosamente, à presença de

Vossa Excelência, ajuizar a presente

AÇÃO INIBITÓRIA

PARA O ADEQUADO CUMPRIMENTO DA INSTRUÇÃO

NORMATIVA Nº69/2006 DO MAPA

com PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

contra a UNIÃO FEDERAL, pessoa jurídica de direito público

federal interno, representante legal de seu órgão da

administração direta Ministério da Agricultura, Pecuária e

Abastecimento e de suas secretarias internas, pelos fatos e

fundamentos que passa a expor:

Título I

QUESTÕES PRELIMINARMENTE

CAPÍTULO I

RESUMO DA PRESENTE DEMANDA

A presente demanda pretende impedir que a demandada, através do seu

órgão do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento venha a realizar a

verificação do índice CMP em leites já processados, ditos leite “UHT” (Ultra Alta

Temperatura), uma vez que tal procedimento fere o previsto na Instrução

Normativa nº. 69, da Secretaria de Defesa agropecuária (SDA), do

Ministério da Agricultura (MAPA), expedida em 13 de dezembro de 2006,

vindo a causar prejuízos aos laticínios, visto que a norma se dirige aos produtores

de leite in natura tão somente, como será exposto.

É que o referido índice de CMP tem como principal objetivo denunciar

“possíveis” fraudes no leite, com a inclusão de soro em sua fórmula (o que seria um

dos casos em que resultaria o aumento dos índices de CMP), fazendo aumentar o

seu volume, “rendendo” o leite, assim se caracterizando como uma fraude

econômica visto que o consumidor não estaria adquirindo leite, mas soro de leite

em boa parte, cujo valor de mercado é menor que o do leite.

Ressalta-se que a CMP é a parte hidrossolúvel da cadeia de aminoácido da

proteína láctea k-caseína, inerente à produção de leite quando neste liberado por

hidrólise de k-caseína por proteases de microrganismos psicotróficos, havendo

apenas a medição do mesmo para fins de constatação, ou não, de fraude no leite.

Ocorre que, para fazer a medição da CMP para fins de constatação de

fraude, foram eleitos os índices aceitáveis desta “proteína” através da Instrução

Normativa nº 69/2006 do MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e

Abastecimento), que determinou que no leite “in natura”, ou no leite concentrado

ou em pó reconstituídos (conforme citado em seu artigo primeiro), portanto, antes

de ser processado, o índice CMP deveria ser inferior a 30 mg/l (miligramas por

litro), ou seja, antes de chegar ao laticínio, no caso do leite “in natura”.

A mesma instrução normativa referida determinou o procedimento para que

fosse feita a medição do índice CMP no leite in natura, sendo importante frisar a

necessidade desta análise no leite in natura, portanto, aquele que ainda não passou

por processos de industrialização.

Entretanto, a correta aplicação da instrução normativa referida (IN

SDA/MAPA nº 69, de 13.12.2006) não vem ocorrendo, sendo que a fiscalização

pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), através de seus

órgãos nos mais diversos Estados da Federação, a aplica também ao leite UHT,

portanto já processado.

O grande problema é que, nos leites “processados” (UHT), o próprio

processo de aquecimento e resfriamento do leite a elevadas temperaturas faz com

que este, ao final da cadeia de produção, possa vir a ter um índice CMP mais

elevado, natural do seu processamento, não havendo que se falar neste caso, de

fraude pela adição de soro, mas sim no aumento do índice de CMP como resultado

NATURAL do processamento do leite e do próprio tempo para que este ocorra,

já que as proteases bacterianas são termoestáveis, resistindo ao

tratamento térmico UHT. Para que haja a correta medição, é necessário que o

material colhido para análise seja o leite cru, ou seja, aquele antes do

processamento.

Entretanto, os produtores de leite UHT estão sendo fiscalizados com base

em índices de CMP constante na IN 69/2006 SDA/MAPA, isto é, no final da cadeia

produtiva, e sendo autuados por suposta fraude (e possivelmente responderão por

crime contra o consumidor) quando na verdade o índice mais elevado de CMP no

leite UHT é o resultado natural do seu processamento, não havendo forma de

reduzir dito índice, senão melhorando a qualidade do leite cru, quando for o caso.

Até mesmo em razão disto, a verificação do índice, de acordo com a IN

SDA/MAPA nº 69, de 13.12.2006, deve ser feita no “leite cru”, ou seja, antes do

seu processamento, o que não vem sendo aplicado pelos órgãos fiscalizadores.

Em razão das diversas ocorrências de autuação dos produtores de leite UHT,

a Autora ajuíza a presente ação inibitória representando seus associados para que,

de acordo com a IN SDA/MAPA nº 69, de 13.12.2006, que regulamenta a

análise da CMP do leite, todo e qualquer teste para tais fins sejam

realizados no “leite cru”, antes de seu processamento, EMITINDO-SE ORDEM

IMPEDITIVA DE REALIZAR TAIS VERIFICAÇÕES, pois inúteis para a sua finalidade

EM LEITES JÁ PROCESSADOS (UHT), sendo requerido, pela delicadeza, importância

e urgência do pedido desta ação, o deferimento de antecipação de tutela para que,

desde já o procedimento correto de verificação da CMP (tendo como amostra o leite

“cru”), venha a ser adotado.

CAPÍTULO II

Do Instrumento Processual Utilizado

Primeiramente, temos que a presente ação versa sobre a obrigação do

agente público em proceder na correta aplicação da Instrução Normativa

SDA/MAPA Nº 69/2006, que tratam da análise dos índices de CMP (Caseino-

Macropeptideos) no leite in natura, concentrado e em pó, reconstituídos, conforme

consta no seu artigo 1º.

É que, conforme será exposto, dita Instrução Normativa determina que a

inspeção e análise para a verificação da existência ou não de fraude no leite por

adição de soro, onde é medido o nível do índice de CMP no mesmo, deve ser

procedida no leite “cru”, realidade esta que não vem sendo respeitada pelos órgãos

fiscalizadores, que procedem as medidas no leite já processado.

Sem querer traçar maiores discussões sobre os termos leite “cru” e “in

natura”, ambos os conceitos são utilizados frequentemente pelo DIPOA/MAPA,

como termos equivalentes, temos que é certo que dito exame não pode ser

realizado no leite “processado”, ou seja, aquele que sofreu a ação de “processos”

para que venha a ser transformado, como o leite UHT que passa por constantes

procedimentos de aquecimento e resfriamento.

É que, como será dito de forma mais detalhada na fundamentação, este

processo pelo qual passa o leite UHT faz com que este possa vir a ter um

percentual de CMP acima do “normal”, o que não significa que tenha ocorrido a

adulteração ou adição de soro, estando perfeitamente apto ao consumo.

Tal fato vem causando graves problemas e constrangimentos aos que

processam o leite UHT, uma vez que a fiscalização, por adotar uma amostra

indevida para realizar seus exames, possui resultados equivocados e acaba

indicando um leite UHT que é perfeito como sendo fraudado, causando prejuízos ao

produtor por ter declarado impróprio um leite próprio ao consumo, e o consumidor,

que recebe uma fiscalização inadequada e ineficiente das autoridades sanitárias.

Não se busca de forma alguma anular ou tornar inválida a Instrução

Normativa IN 69/2006- SDA/MAPA já referida. O que se busca é justamente fazer

com que a autoridade sanitária execute APENAS o que está previsto nas referida

norma.

Como a ação é movida pela entidade G-100 E ABLV, que congrega 100

produtores de pequeno e médio porte de leite e laticínios, não se está discutindo

aqui um caso em concreto no qual teria havido autuação em razão do equívoco no

procedimento de fiscalização do leite (utilizando-se como amostra leite processado

e não leite cru), mas sim temos uma ação da entidade que busca defender casos

generalizados havidos contra seus associados e que estão causando prejuízos

incomensuráveis a estes e aos consumidores destes produtos.

Nesta situação, não é cabível o mandado de segurança contra tais atos, uma

vez que este remédio processual teria cabimento acaso houvesse uma autuação em

concreto contra uma cooperativa ou indústria e esta, após esgotar os recursos

administrativos competentes, buscasse defender seu direito líquido e certo.

Para que se cumpra a Instrução Normativa nº 69/2006, também não é

possível o ajuizamento de uma ação de obrigação de fazer, pois os produtores não

pretendem “obrigar” a administração pública a “fazer” a fiscalização, pois esta é

atribuição do Estado como um todo, apenas o que se busca é que, “ao realizar” a

fiscalização, esta não venha a tomar como amostra leite já processado, mas sim o

leite “cru”, como previsto na IN 69 que aqui esta em foco.

Nesta situação, justifica-se o ajuizamento de ação inibitória, no sentido de

proibir o ente público de realizar testes para aferição de fraude em leite pela adição

de soro, como base na IN nº 69/2006, em leite já processado, utilizando-se, para

tal, o leite “cru”, aquele antes de ser processado, como referido na dita Instrução

Normativa referida.

CAPÍTULO III

APRESENTAÇÃO DAS PARTES AUTORAS

A Autora é Associação que busca defender e congregar os interesses das

pequenas e médias cooperativas e empresas de laticínios no Brasil, inclusive com

objetivo de lutar pela adoção de normas e procedimentos oficiais para o setor de

laticínios sanitários, fiscais e outros que incidam sobre a atividade.

O G-100 congrega hoje tanto laticínios, cooperativas e indústrias de leite do

Brasil, pequenas e médias cooperativas, respondendo por significativa participação

no mercado de leite e laticínios, conforme quadro abaixo:

Recepção Leite (Litros/Dia)

Nº de produtores Empresas/Marcas

2004 % 2004 % G-100 (*) 18.000.000 60,2% 101.000 30,9% DPA (**) 4.134.430 13,8% 6.112 7,6% PARMALAT (**) 2.272.602 7,6% 6.063 7,5% ITAMBÉ (**) 1.966.320 6,6% 21.402 26,4% CCL (**) 927.224 3,1% 4.461 5,5% CENTROLEITE (**) 715.339 2,4% 6.872 8,5% BATÁVIA (**) 692.334 2,3% 2.178 2,7% SUDCOOP (**) 627.767 2,1% 4.920 6,1% DANONE (**) 575.049 1,9% 3.907 4,8% Total 29.911.068 100.00% 80.915 100.00% Fonte: (*) Banco de Dados G-100 Atualizado em out./2007; (**) Site Leite Brasil (Valores adaptados para média diária).

Ainda, os 100 associados do G-100 atuam em todos os estados produtores

de leite e na maioria dos diversos segmentos do leite e laticínios, conforme

demonstra a Tabela abaixo:

PRODUTO N. Associados

PRODUTO N. Associados

Queijos 56 Leite Tipo C 7 Manteiga 31 Leite em Pó 4 Leite Longa Vida 28 Soro de Leite 4 Requeijão 24 Leite Condensado 3 Creme de Leite 19 Leite Desnatado 2 Bebida Láctea 19 Vitaminas 2

Achocolatado 10 Mistura Láctea em Pó

2

Iogurte 9 Leite Tipo B 1 Doce de Leite 9 Margarina / MIX 1

Nesse contexto, pela sua grande representatividade no mercado de

laticínios, o G-100 possui poderes, como enumera o item XIII do artigo 3º de seu

Estatuto, que segue em anexo, de representar seus associados na busca pelos

interesses da classe, sempre resguardando a indústria dos laticínios e a produção

correta e legal dos produtos do gênero.

Por outro lado, a ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA DE LEITE

LONGA VIDA, é entidade constituída em 1994, a Associação Brasileira da Indústria

de Leite Longa Vida congrega 38 associados que, juntos, totalizam 75% da

produção de leite longa vida no país, o que representa 4,3 bilhões de litros anuais.

Na sua totalidade, o segmento de leite longa vida está presente em 89% dos lares

brasileiros, comercializa 5,7 bilhões de litros anuais e apresenta um valor de

negócios superior a 10 bilhões de reais. O setor é responsável pela captação de

26% da produção brasileira de leite inspecionado e possui indústria em todas

regiões produtoras de leite do país.

Título II

DOS FATOS

A Autora, sendo Associação que representa os interesses de pequenas e

médias cooperativas e empresas do ramo de laticínios, analisa e debate as normas

de fiscalização e de qualificação dos produtos e da produção de seus associados,

possuindo grande interesse em manter o mais rígido controle sobre a produção

bem como zelar pelas normas de qualidade dos produtos de seus associados.

Nesta situação, resguarda a demandante os direitos de seus associados no

que se refere à fiscalização efetuada em seus estabelecimentos, bem como os

critérios utilizados pela Administração Pública a fim de garantir a qualidade dos

produtos e a segurança de consumidores quanto aos laticínios produzidos pelos

seus sócios.

Nesse contexto, a demandante acompanha de perto as indústrias

produtoras de Leite UHT (leite processado), os quais adquirem matéria prima in

natura e realizam o “processamento” do produto para consumo final da população,

transformando o leite “cru” em leite “processado”.

Dessa forma, justamente ao analisar e vivenciar autuações de associados do

ramo acima especificado é que a Autora deparou-se com problemas de legalidade,

proporcionalidade e efetividade de método de fiscalização utilizado pelo

Departamento Nacional de Inspeção de Produtos de Origem Animal – DIPOA, órgão

este vinculado à Secretaria de Defesa Agropecuária, quanto aos índices de CMP

(Caseíno-Macropeptídeo) no leite UHT (processado).

Como já exposto, o referido índice CMP tem como principal objetivo

denunciar “possíveis” fraudes no leite, com a inclusão de soro em sua fórmula (o

que seria um dos fatores de aumento dos índices de aumento de CMP), fazendo

aumentar a presença de soro no leite,“rendendo” o leite, do ponto de vista

economico.

Nesta situação em que há a adição de soro ao leite, há fraude econômica ao

consumidor, porém não há qualquer risco à saúde do mesmo. Sendo assim, o fato

desta conduta não causar problemas de saúde exigirá um tipo de tratamento

diverso daquele concedido aos problemas sanitários. Cabe notar, que não trata o

presente argumento uma forma de legitimar fraudes ao consumidor, mas tão

somente designar os métodos, procedimentos fiscalizatórios e sanções adequadas

para cada conduta.

As ações danosas ao consumidor devem ser combatidas pelo poder público e

sua fiscalização, contudo, com os meios adequados e apropriados à ação, que são

bem diferentes e muito específicos no caso da proteção sanitária.

No caso dos autos, temos que o Poder Público está atuando em

desconformidade com os procedimentos legais instituídos pela Instrução Normativa

nº 69/2006, uma vez que esta, para verificação da existência de fraude no leite de

qualquer natureza (desnatado, semidesnatado, integral, em pó , pasteurizado ou

UHT), determina que a análise seja feita no leite “cru”, antes do seu

processamento, conforme seu artigo 1º.

Ocorre que este não tem sido o procedimento, pois as análises laboratoriais

realizadas estão sendo feitas em amostras de leite já processado, que, por sua

natureza, pode possuir um índice CMP mais elevado, o que não significa que houve

fraude pela adição de soro ou que exista algum dano ao consumidor, uma vez que,

repita-se, no leite UHT é normal a existência de um índice CMP mais elevado.

A utilização inadequada de procedimentos e sanções administrativas para

proteger bens jurídicos significa a ofensa ao princípio da proporcionalidade, que

exige que exista adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito

nas ações administrativas.

Ocorre que, como será amplamente demonstrado no presente feito, o

método utilizado pela fiscalização, o qual vem ocasionando diversas autuações

arbitrárias e ilegais de associados da demandante, é método ineficaz para a

constatação de fraude no laticínio, mas tão somente o leite no produtor, produzindo

resultados equivocados, desproporcionais e, portanto, prejudiciais à indústria , pois

leva em consideração “apenas” o aumento do índice do CMP, que é uma fração de

proteína natural do leite e é aumentada pelo processamento do leite, então

transformado em leite UHT, não este o método mais adequado para verificar a

existência de fraude no laticínio.

Veja que, ao ser processado, transformando-se o leite in natura em leite

UHT (processado), existe uma série de procedimentos de aquecimento e

resfriamento do leite, que pode levar ao aumento dos índices da CMP, não havendo

em se falar, neste caso, de fraude pela adição de soro.

O método utilizado hoje, o qual é aprovado e está enumerado na IN

DAS/MAPA nº 69/2006, que está em vigor, deve ser aplicado ao leite in natura,

leite concentrado e em pó, reconstituídos. Mas sua aplicação no leite já processado

pode levar a falsos e impróprios resultados, realidade que vem ocorrendo no ramo

de laticínios, destacando-se o de produção de leite UHT.

Em virtude disso, faz-se necessário o ajuizamento da presente demanda,

buscando-se adequação da análise do leite para aferição do índice CMP de acordo

com a Instrução Normativa nº 69/2006, que determina que esta deva ser feita em

leite “in natura”, e não junto ao leite já processado, evitando-se, assim, danos

irreversíveis aos produtores (que têm declarada adulterada a produção de leite que

na verdade é “processado”) e aos consumidores (que não recebem a correta

fiscalização para o controle de adulteração e fraudes cometidas eventualmente

sobre os produtos lácteos).

Título III

DO DIREITO

CAPÍTULO I

DAS CONSIDERAÇÕES GERAIS

DO DIREITO APLICÁVEL

Trata-se o presente questionamento sobre a inaplicabilidade da INSTRUÇÃO

NORMATIVA Nº 69, DE 25 DE DEZEMBRO DE 2006 ao setor de laticínios ou leite

processados, pelas razões que serão expostas a seguir. Dispõe a IN n. 69/2006:

O SECRETÁRIO DE DEFESA AGROPECUÁRIA, DO MINISTÉRIO DA

AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO, no uso da atribuição que lhe

confere o art. 9º combinado com o art. 42, do Anexo I, do Decreto nº 5.351,

de 21 de janeiro de 2005, tendo em vista o disposto no Regulamento da

Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal, aprovado

pelo Decreto nº 30.691, de 29 de março de 1952, e o que consta do

Processo nº 21000.012951/2006-03, resolve:

Art. 1º Instituir critério de avaliação da qualidade do leite in natura,

concentrado e em pó, reconstituídos, com base no método analítico

oficial físico-químico denominado “Índice CMP”, de que trata a Instrução

Normativa nº 68, de 12 de dezembro de 2006.Art. 2º Somente quando o

índice de CMP for de até 30 mg/l (trinta miligramas por litro), o leite de que

trata o art. 1º desta Instrução Normativa poderá ser destinado ao

abastecimento direto.

§ 1º Quando o índice de CMP do leite estiver entre 30mg/l (trinta miligramas

por litro) e 75mg/l (setenta e cinco miligramas por litro), este poderá ser

destinado à produção de derivados lácteos.

§ 2º Os derivados lácteos de que trata o § 1º serão avaliados tecnicamente,

caso a caso, pelo Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal

- DIPOA.

§ 3º Quando o índice de CMP do leite estiver acima de 75 mg/l (setenta e

cinco miligramas por litro), este poderá ser destinado à alimentação animal,

à indústria química em geral ou a outro destino a ser avaliado tecnicamente,

caso a caso, pelo DIPOA.

Art. 3º Esta Instrução Normativa entra em vigor na data de sua publicação.

GABRIEL ALVES MACIEL (GRIFOU-SE)

A IN 69/2006 aplica-se, pois, ao leite in natura, ou seja, aquele que ainda

não passou por qualquer processo industrial, para a aplicação do método de

fiscalização para análise dos índices de CMP e não no leite processado ou UHT,

como vem ocorrendo junto aos produtores de leite UHT.

DO SISTEMA SANITÁRIO NO BRASIL

O direito à saúde é direito fundamental garantido pela Constituição Federal

Brasileira. Dentro do Estado Democrático-Social em que se vive nos dias atuais, o

Estado, a fim de perpetuação do direito à saúde aos cidadãos residentes no Brasil,

preocupa-se, de um lado, com a disponibilização de serviços de saúde

principalmente através do Sistema Único de Saúde, e, de outro, com a fiscalização

dos agentes privados que possam trazer riscos à Saúde Pública (Dec. nº

7.127/2010, Portaria nº 428/2010, Lei nº 9.784/1999 – legislação aplicável a tal

propósito).

Nesse contexto, ao analisar a pirâmide Sociedade-Estado-Saúde, percebe-se

no artigo 15 da Lei nº 8.080/90 (Lei que criou o Sistema Único de Saúde) que

União, Estados e Municípios têm poderes para definir as instâncias, os mecanismos,

assim como a fiscalização das ações e serviços de saúde, incluindo a fiscalização

através do poder de polícia sanitária.

No entanto, ainda no ano de 1974, foi criado, através do Decreto-Lei nº

73.747/74, o Departamento Nacional de Inspeção de produtos de Origem Animal, a

fim de que fosse resguardada a segurança e saúde pública na fabricação de

produtos de origem animal, como, no caso em foco, onde tratamos da produção de

leite.

Toda a produção de leite e de seus derivados é normatizada e fiscalizada até

a sua industrialização pela DILEI/DIPOA/SDA/MAPA e leite e seus derivados

QUANDO SE ENCONTRAREM NO MERCADO A DISPOSIÇÃO DOS CONSUMIDORES

podem a qualquer momento ser fiscalizados pela ANVISA. Desse modo, cabe

ressaltar a repartição de competências administrativas estabelecida no atual

sistema nacional entre a fiscalização até o momento da industrialização, de

competência da DILEI/DIPOA/SDA/MAPA e quando das operações dirigidas ao

consumidor, que serão objeto de fiscalização da ANVISA.

No presente caso iremos tratar tão somente dos casos de competência

DILEI/ DIPOA/SDA/MAPA.

Dentro do já mencionado Estado Democrático-Social de Direito vivido

no Brasil, no qual há misto de um Estado Liberal com um Estado Intervencionista, a

intervenção na iniciativa privada, deve ocorrer dentro dos ditames da Lei, assim

como respeitando os princípios norteadores da Administração Pública. Compete à

SDA/MAPA, por meio de seu departamento especifico de fiscalização, no caso, o

DILEI/DIPOA da fiscalização do setor produtivo do leite e de seus derivados, nos

termos da competência atribuída aos departamentos da Secretaria Nacional

Agropecuária do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA.

Nesse contexto, passa-se à análise dos princípios que norteiam o

trabalho desempenhado pelo DILEI/DIPOA/SDA/MAPA, assim como de todos os

órgãos atrelados ao MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) e à

proteção da saúde pública.

PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO ADMINISTRATIVO E DE DIREITO SANITÁRIO

A Secretaria de Defesa Agropecuária, secretaria esta do Ministério da

Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA - e suas divisões, tais como

DILEI/DIPOA, na condição de órgãos da administração direta da União Federal

devem respeitar em sua atividade os princípios basilares da administração pública

em geral, assim como os princípios próprios do direito sanitário, os quais, em

grande parte, são os mesmos.

Estudando-se os princípios do direito sanitário, encontra-se a primeira

semelhança com os princípios de direito administrativo: a segurança jurídica. As

entidades privadas que exercem atividades que despertem o interesse da “Saúde

Pública” devem estar cientes e seguras das regras impostas pelas legislações que

normatizam a atividade produtiva do leite e seus derivados a fim de adequar seus

produtos e serviços ao interesse da coletividade, realidade esta conhecida pelos

associados da Autora.

A segurança jurídica não passa somente pela ideia de que as regras devem

ser previamente estabelecidas e publicadas, mas também que tais regras estejam

corretamente dispostas e possam efetivamente assegurar à sociedade a idoneidade

dos produtos e serviços prestados. É preciso que haja prévio conhecimento, no

presente caso, pelos associados G-100 E ABLV, principalmente pelos laticínios que

processam leite tipo UHT.

Ocorre que a proteção à saúde pública não pode servir como cláusula geral

que admita exageros por parte do Estado, devendo o mesmo interpretar a máxima

de forma sistemática, ou seja, também analisando os demais princípios invocados e

aplicáveis ao direito sanitário e suas funções, sob pena de causar grave dano aos

seus cidadãos.

É com base nestes princípios que esta demanda demonstrará que os

métodos de avaliação do leite UHT utilizados pela administração pública,

especialmente, a utilização do índice de CMP – Caseíno-Macropeptídeo - e sua

utilização para punição de empresas processadoras de produtos lácteos, sob a

alegação de que os produtos destas as empresas apresentam indícios de fraudes

por adição de soro ao leite e nos produtos processados, encontram-se equivocados

e em desacordo com a Instrução Normativa nº 69/2006.

É que, como já exposto, a autoridade pública está realizando inspeções nos

produtores de leite UHT quando o produto in natura já foi industrialmente

processado, ao passo que a Instrução Normativa que regulamenta o procedimento

técnico determina que esta análise deva ser feita em leite “in natura”, ou seja,

antes do seu processamento, onde é transformado em leite UHT.

Esses questionamentos, os quais recebem resposta analítica negativa

quando analisados em relação aos métodos utilizados para a análise do leite

industrializado (quais sejam os da Eletroforese Capilar e da Espectroscopia

de Massas, aprovados pela Instrução Normativa MAPA nº 07/2010) e de

eventual fraude do leite com a adição de soro em sua fórmula, demonstram

claramente a impropriedade no seguimento da Instrução Normativa exarada (IN

SDA/MAPA nº 69, de 13.12.2006), o que justifica o ajuizamento da presente

demanda inibitória.

DEPARTAMENTO DE INSPEÇÃO DE PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL

Conforme já referido, o DIPOA/SDA/MAPA é um órgão competente no MAPA

no que se refere à inspeção de produtos de origem animal (no caso dos presentes

autos dando-se destaque ao leite processado UHT), fazendo parte da administração

pública direta.

Suas atribuições, mencionadas no seu regimento interno, que segue ora

anexado, são de inspeção industrial e sanitária de carne e derivados, inspeção

industrial e sanitária de leite e derivados, dentre outros ramos, assim como a

padronização e classificação de produtos e realização de análises de exames

laboratoriais para fins de registro e controle de sanidade e qualidade de produtos,

destacando, no presente caso, a fiscalização e classificação de laticínios.

Na formação interna do DIPOA, há a divisão específica destinada ao leite,

chamada Divisão de Inspeção de Leite e Derivados – DILEI. Dentro de cada divisão,

há a prerrogativa de baixar normas e instruções a fim de adequar a produção

advinda de origem animal aos interesses de saúde da população consumidora.

A colheita do material diretamente nas indústrias é feita, via de regra, pela

DILEI/DIPOA, sendo o material enviado para ser analisado pela CGAL/SDA/MAPA,

divisão da SDA, que coordena a rede de LABORATÓRIOS OFICIAIS DO MAPA,

sendo, dependendo do resultado, aplicadas multas ou, ainda mais grave, inutilizado

o produto supostamente inadequado quanto aos padrões sanitários estabelecidos,

isto tudo sem prejuízo de possíveis sanções criminais por possível crime de

consumo.

Tais penalidades vêm sendo aplicadas irrestritivamente, ilegalmente e

indevidamente a associados da demandante em razão da não observância, pelo

órgão fiscalizador, do método adequado de análise da CMP do leite que, ao invés de

ser analisado em seu estado “in natura” (como é determinado pela Instrução

Normativa nº 69/2006), está sendo analisado após o seu processamento e

transformação em leite UHT, quando o percentual de CMP pode ficar mais elevado,

o que, no caso em tela, não significa a existência de fraude.

A colheita de produtos no mercado é de responsabilidade da ANVISA, que

remete ao DIPOA os resultados obtidos de suas análises para que, posteriormente,

providências cabíveis sejam tomadas, como por exemplo, a autuação ou mesmo a

apreensão de mercadorias que supostamente seriam objeto de fraude.

A forma como a fiscalização vem ocorrendo, com a coleta de material para

análise após o seu processamento (ao invés de leite cru, a amostra que segue para

análise é de leite processado), contrariando o disposto na IN nº 69/2006, vem

trazendo prejuízos de grande monta a produtores de leite UHT, prejuízos estes

tanto de ordem material quanto de ordem moral, frente à acusação de fraudadores,

quando, na realidade, as análises estão sendo feitas em leite já processado que,

naturalmente, pode possuir elevado percentual de CMP, o que não significa, de

forma alguma, que há adulteração do produto.

Assim, o exercício de fiscalização ou polícia sanitária é atividade típica do

DILEI/DIPOA/SDA/MAPA, adentrando no direito administrativo sancionador, ao

impor multas e outras espécies de penalidades, sendo que deve seguir a legalidade

e propriedade de métodos de fiscalização, o que não vêm fazendo os órgãos,

desrespeitando ditame da IN 69/2006, em pleno vigor.

Ao fiscalizar o processo de produção, inclusive ao estabelecer normas e

padrões sobre limites de contaminantes, resíduos tóxicos, dentre outros (níveis de

CMP nos produtos processados, sobretudo no leite UHT), nos produtos, caso haja

irregularidades, pode levar à aplicação de multas e, inclusive, reter os produtos e

retirá-los do mercado, como já referido.

DO PODER ADMINISTRATIVO SANCIONADOR

Conforme ilustra Fábio Medina Osório:

“Consiste a sanção administrativa, portanto, em um mal ou castigo, porque

tem efeitos aflitivos, com alcance geral e potencialmente pro futuro, imposto

pela Administração Pública, materialmente considerada, pelo Judiciário ou

por corporações de direito público, a um administrado, jurisdicionado,

agente público, pessoa física ou jurídica, sujeitos ou não a especiais relações

de sujeição com o Estado, como consequência de uma conduta ilegal,

tipificada em norma proibitiva, com finalidade repressora ou disciplinar, no

âmbito de aplicação formal e material do Direito Administrativo.”1

Fazendo análise do texto acima e da atuação do DILEI/DIPOA/SDA/MAPA,

1 Direito administrativo Sancionador, pg. 104.

principalmente no que diz respeito à fiscalização imposta aos processadores de leite

e seus derivados, sobretudo de Leite UHT quanto ao índice de CMP, para que possa

ser imposta uma sanção administrativa, seja de qual natureza forma, é necessário

que haja autoridade competente, além de conduta ilegal por parte do agente.

Ora, no momento em que os métodos utilizados pelo

DILEI/DIPOA/SDA/MAPA para a fiscalização de certo produto notadamente não

atendem aos procedimentos previstos em sua própria Instrução Normativa, mais

especificamente a IN SDA/MAPA nº 69/2006, inviabilizando a constatação de fraude

ou alteração no leite, uma vez que este já foi processado, já estaria excluída a

sanção frente à impossibilidade de afirmação categórica da existência de conduta

ilegal.

O órgão fiscalizador, ao utilizar método de análise próprio para exame de

matéria in natura em matéria já processada industrialmente (no caso o leite UHT),

foge da legalidade e da própria eficiência, características típicas do administrador

público, adentrando na malha da ilegalidade e abusividade, o que faz desaparecer

seu poder sancionador.

Finda essa análise inicial dos aspectos jurídicos e atribuições da

Administração, passa-se à análise do caso da fiscalização das empresas de

processamento de leite e produtos lácteos, sobretudo de Leite UHT no que se refere

aos índices de Caseíno-Macropeptídeo (CMP).

CAPÍTULO II

Da Produção de Leite UHT

Importante iniciar o teor técnico da presente demanda esclarecendo o que é

o leite processado, sobretudo leite UHT, por ter sido até o momento o produto

escolhido mais comumente para ser analisado sob a ótica da IN/SDA/MAPA nº

69/2006, instrução normativa cujo método de análise vem sendo utilizado de forma

indevida pelos órgãos de fiscalização, situação que se busca corrigir com a presente

demanda.

O Leite UHT é leite industrialmente processado. Para sua produção, passa

por um complexo e RELATIVAMENTE LONGO período de tempo até seu consumo,

compreendendo as seguintes etapas:

• Procedimento de ordenha;

• Refrigeração do leite cru na propriedade rural (em tanques individuais

ou em tanques coletivos), por no máximo 3:00 horas;

• Estocagem preliminar, na fonte de produção ou em estabelecimento

intermediário em média por 48:00 horas;

• Coleta a granel percurso diário do caminhão graneleiro entre as

diversas propriedades rurais: média de 15:00 horas;

• Transporte do leite cru refrigerado na propriedade rural ou em postos

de resfriamento até o seu destino (período de tempo incluído no

tempo registrado no item imediatamente superior);

• (Possível) Transferência do leite cru refrigerado para distantes

regiões do país;

o Estocagens sucessivas em carros-tanques e silos de estocagem;

• Descarregamento no destino (manutenção em estocagem até o

momento propício para seu processamento: média de 6:00

horas, podendo exceder as 24:00 h);

• Processamento UHT (Ultra High Temperature) – processo de

ampliação e diminuição de temperatura;

• Manutenção do leite UHT em quarentena (média: até 07 dias);

• Distribuição pelo mercado nacional (processo de distribuição pode

levar até 07 dias, dependendo da região geográfica a alcançar

e as condições de trânsito rodoviário);

• Colocação à disposição do consumidor (no ponto final de venda, o

produto pode levar meses em estocagem, até ser

comercializado).

Portanto, o leite UHT passa por complexo processo industrial, em nada

podendo ser comparado com o leite in natura, ou seja, aquele que ainda não sofreu

qualquer interferência industrial (que é o objeto da IN nº 69/2006).

Estudos recentes, realizados na Universidade Federal de Goiás, mostram

significativo aumento no teor de CMP em amostras de leite UHT, imediatamente

após esse tratamento térmico, em relação aos valores obtidos imediatamente antes

do referido processo industrial. As causas desse súbito aumento de CMP (em torno

de 6% ou ligeiramente superiores, no atual estágio das investigações científicas)

ainda não foram inteiramente estudadas nessa pesquisa.

Entretanto, pode-se concluir desse estudo, preliminarmente, que o simples

processamento UHT do leite poderia ser suficiente para retirar uma matéria-prima

da condição de apta ao processamento UHT do leite da condição de apta ao

processamento para abastecimento público (<30 mg CMP/L), destinando-o à

produção de derivados lácteos (>30 mg _< 75 mg CMP/L), ou, pior, dessa última

classificação para a total inadequação do leite UHT como alimento humano (>75

mg CMP/L). Essa condenação, aliás, é despropositada e desprovida de base

científica. Não há absolutamente nada no leite QUE APRESENTA ÍNDICE de CMP

com mais de 75,0 mg/L que o torne impróprio para consumo humano. Qualquer

produto lácteo fermentado (como queijos e iogurtes) apresenta um nível de

proteína hidrolisada (= “quebrada”) por enzimas bacterianas ou de outras fontes,

muitas vezes superior ao do leite com esse teor de CMP.

Destaquemos:

• A Instrução Normativa n° 69, de 13 de dezembro de 2006, utilizada pelo

Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) não contempla análise

de leite UHT. Em seu artigo 1° é clara: “Instituir critério de avaliação da qualidade

do leite in natura,...”. (grifou-se)

• O Índice de CMP deveria ser medido exclusivamente em amostras colhidas

na fábrica por fiscais do MAPA antes do processamento UHT.

• A amostra deve ser coletada em volume adequado (ou seja, cerca de 100 ml

de amostra) ao seu rápido congelamento e à realização do teste.

• O procedimento fiscal adotado para a coleta de amostras de leite UHT,

colocando suas embalagens cartonadas de 1 litro em caixa(s) de isopor contendo

algumas pedras de gelo comum, onde aí permanecem (às vezes por dias) até o

retorno do fiscal a sua base ou sede, além de ser ilegal, como já dito, é

extremamente falho em termos técnicos. Tal procedimento seguramente acarreta

aumento do CMP depois da amostra ter sido oficialmente coletada. Nesse

procedimento, a única possibilidade de prejuízo cabe à industria de onde foi colhida

a amostra, que terá sua produção retida, ao tempo em que a amostra colhida pode

estar sendo alvo de ação proteolítica por um período de tempo não controlado

(enquanto não estiver completamente congelada) e ao sabor das conveniências ou

da programação de trabalho do agente responsável pela coleta.

• A freqüente falta de correlação entre valores de CMP, obtidos nas análises

de contraprova comparativamente aos dados da análise fiscal, pode ser

parcialmente debitada a falhas técnicas observadas na coleta das amostras, tanto

para sua análise fiscal quanto para perícias de contraprova da indústria ou da

fiscalização.

• De acordo com declarações de técnicos ou peritos contratados por indústrias

para acompanhar perícias de contraprova, alguns laboratórios oficiais analisam o

teor de CMP através de “otimização da curva de calibração”, procedimento usado

para economizar o caro e cada vez mais raro padrão analítico de CMP. Não se tem

registro da validação técnica e da divulgação oficial desse procedimento; portanto,

constitui modificação ilegal do método analítico oficialmente adotado. Outros

laboratórios, trabalhando ou não com a “otimização” acima descrita, somente

analisam contraprova em poder do fabricante. Se esta apresentar problema técnico

(como coagulação) ao sofrer descongelamento, a fiscalização imediatamente

suspende a perícia em andamento, registrando, no relatório, que prevalecerão

como oficialmente válidos apenas os resultados da análise fiscal inicial.

Ou seja, a própria fiscalização desconsidera a necessidade de dar integral

atendimento ao que estabelecem o Decreto – Lei n° 986, de 21.10.1969 e a Lei n°

6.437, de 20.8.1977, ao claramente prescrever a realização, no curso de um único

procedimento fiscal, de nova perícia com a 2ª amostra de contraprova

rotineiramente colhida, assegurando-se, dessa forma, pleno direito de defesa à

interessada.

Ora, percebe-se, portanto, que muitas incongruências vêm ocorrendo quando

da aplicação da IN nº 69/2006 pelos órgãos fiscalizadores, que utilizam os métodos

nessa norma estabelecidos em leite processado, quando deveria ocorrer somente

em leite in natura, assim como a forma de coleta e armazenagem também fere os

princípios da legalidade e eficiência, o que é combatido no presente feito.

Da Fiscalização Atual acerca de Fraude do Leite

A DILEI/ DIPOA/SDA/MAPA, atualmente, tem aplicado sanções e multas às

indústrias processadoras de leite e derivados, sobretudo as produtoras de leite

UHT, sob a alegação de que estariam os mesmos “fraudando” o produto, sendo tal

“fraude” constatada pela presença do chamado soro, medida pela aferição do índice

de CMP, índice este já referido.

A prática fraudulenta de produção de laticínios deve ser combatida, uma vez

que a colocação de produtos nocivos à saúde ou mesmo sem um padrão de

qualidade adequado deve ser incansavelmente reprimida, sendo que a demandante

concorda e cobra a fiscalização por parte do poder público.

Ocorre que, primeiramente, a presença de soro não se mostra

comprovadamente nociva à saúde. Além disso, mesmo não sendo nocivo à saúde

do consumidor, visto que o soro por si só não é prejudicial, deve haver a

fiscalização da presença de soro (fraude por métodos adequados, o que não vem

sendo aplicado pelos órgãos de fiscalização hoje em dia).

Atualmente, para a verificação da chamada “fraude do leite”, que possui a

natureza de “fraude econômica”, os servidores do DILEI/DIPOA usam a Instrução

Normativa SDA MAPA nº 69/2006, que instituíu o índice de CMP (Caseíno-

Macropeptídeo), classificando o leite em três faixas, que permite, ou não, o

consumo do produto pelos consumidores, quais sejam:

• Até 30 miligramas (mg) / Litro de leite (L);

• De >30mg a 75,0 mg / L e

• Acima de 75,0 mg / L.

A grande preocupação da ora demandante é quanto à forma como essa

fiscalização vem sendo operada pelos servidores do DILEI/DIPOA, os quais utilizam

e aplicam a IN SDA/MAPA nº 69/2006 de forma equivocada e atécnica, o que traz

enormes prejuízos para as associadas da Autora. Para demonstrar a impropriedade

da utilização do método exposto na IN nº 69/2006 ao leite processado (enquanto a

aplicação deve ser dar no leite “in natura”) vejamos como se procede no Direito

comparado.

Novamente, cabe ressaltar que entendemos que todas as ações danosas ao

consumidor devem ser combatidas pelo poder público e sua fiscalização, contudo,

com os meios adequados e apropriados à ação, que são bem diferentes e muito

específicos no caso da proteção sanitária. Deve-se respeitar o princípio da

proporcionalidade que exige a utilização adequada de procedimentos e sanções

administrativas para proteger bens jurídicos.

HISTÓRICO DA METODOLOGIA UTILIZADA ATUALMENTE PELO DIPOA NO BRASIL

Por volta da 2ª metade da década de 1980, a comunidade acadêmica e o

setor laticinista já se preocupavam, no Brasil, com a fraude do leite pela adição de

soro lácteo.

O método analítico cromatográfico (por HPLC) foi estudado, adaptado e

divulgado por pesquisador da Universidade Federal de Viçosa (Prof. Dr. S. C. C.

BRANDÃO, X° Congresso Nacional de Laticínios, 1988) às condições operacionais de

laboratórios universitários e oficiais brasileiros (HPLC com filtração em gel), uma

vez que, originalmente, o método se baseava no emprego de HPLC com fase

reversa, (uma sofisticação tecnológica praticamente indisponível no Brasil, na

época).

O Brasil adotou essa “variante”, oficialmente, em 1991 (Portaria Ministerial n°

124, de 23.9.91, republicada no D.O.U. em 20.11.91), juntamente com o método

qualitativo do ácido siálico. Essa Portaria Ministerial foi revogada em 2007, em

razão da instituição do Índice de CMP, no ano anterior.

Desde que o método cromatográfico foi oficializado no Brasil, alguns

pesquisadores vêm advertindo que resultados falsamente positivos podem ser

obtidos, como decorrência de “CMP” produzido por bactérias psicrotróficas, entre

outras fontes, o que foge absolutamente da idéia de fraude ou adulteração do leite.

Essas bactérias psicrotróficas são causadoras de deterioração e podem contaminar

o leite em consequência das más práticas de produção desse produto. Essas más

práticas de produção respondem por significativa parcela da produção de leite em

todo o país.

Apesar das advertências, sanções vêm sendo aplicadas aos produtores de leite

UHT baseadas única e exclusivamente pela análise do índice de CMP, análise e

fiscalização esta objeto da instrução normativa DAS nº 69/2006, cuja forma de

aplicação pela fiscalização é absolutamente equivocada. Tal método não faz a

distinção entre CMP obtido com renina (ou seja, oriundo de soro de queijo obtido

por coagulação enzimática adicionado ao leite - FRAUDE) e CMP de origem

proteolítica bacteriana ou de outras origens (plasmina e outras), o que não

configura fraude.

Resumidamente, o que se demonstra pelos estudos técnicos da matéria é que

o método utilizado não consegue discernir a presença de fraude no leite (colocação

dolosa e inadequada de soro na composição do leite processado) ou se houve

aumento de enzimas em virtude do próprio processamento do leite, que se dá pela

mudança de temperaturas. Por motivo de argumentação poder-se-ia até aceitar o

uso de um método que privilegiasse a precaução na proteção da saúde pública,

mas tão somente na ausência de métodos mais adequados, no presente caso é

possível e viável apresentar um método mais adequado e necessário ao presente

propósito.

Por esse motivo, mostra-se absolutamente desmedida a forma de fiscalização

preconizada pela IN SDA/MAPA nº 69/2006 no que se refere ao Leite UHT, uma vez

que o método foi criado e estabelecido na norma referida para exame de leite in

natura, jamais o leite que passou por processo industrial.

DA IMPROPRIEDADE DO MÉTODO ANALÍTICO PARA AVERIGUAÇÃO DE FRAUDE NO LEITE

PROCESSADO

No método analítico para pesquisa de CMP, substitui-se o soro (usado para

“calibrar” ou dar uma “referência” os resultados analíticos) por massas crescentes

de CASEÍNO-MACROPEPTÍDEO (CMP), que, uma vez obtido de soro lácteo

produzido em laboratório, é purificado, desidratado e, em seguida, comercializado.

Após muitos estudos realizados a partir da adoção pelo Brasil do método

analítico, diversas dúvidas surgiram no meio acadêmico e industrial sobre a REAL

capacidade, do método analítico oficial de HPLC, em identificar apenas o leite

fraudado com soro, separando as interferências naturais do processo de

industrialização do leite.

Afinal, a pesquisa de fraude do leite por soro, pelo método HPLC consistia

na separação de um fragmento de proteína, detentor de determinadas

características físicas.

No entanto, no leite existem ou podem existir inúmeros outros fragmentos

protéicos, produzidos por enzimas proteolíticas (ou seja, que provocam a “quebra”

de proteínas) as mais diversas:

• Enzimas naturais do leite cru;

• Enzimas produzidas por células somáticas;

• Enzimas produzidas por processo inflamatório do úbere das vacas em

lactação;

• Enzimas produzidas por bactérias contaminantes do leite e chamadas de

PSICROTRÓFICAS (por se desenvolverem em baixas temperaturas), entre

outras fontes.

A ação dessas enzimas, particularmente das bactérias psicrotróficas, que

será tanto mais intensa quando se trabalha com leite cru de má qualidade sanitária,

causa interferência no resultado analítico obtido pelo método oficial de HPLC.

Portanto, mesmo sem haver qualquer fraude, há o resultado aumentado de

enzimas psicrotróficas no leite.

Essas interferências podem produzir um resultado FALSO POSITIVO para

soro, já que também produzem fragmentos de proteína praticamente iguais aos

fragmentos produzidos pela ação da renina sobre o leite.

Essas evidências acabaram por levar o MAPA a instituir o Índice de CMP,

através da Instrução Normativa (IN) SDA MAPA nº 69/2006.

Sem querer almejar tautologia, novamente descreve-se o Índice classifica

o leite em 03 (três) faixas de CMP:

• Até 30 miligramas (mg) / Litro de leite (L);

• De >30mg a 75,0 mg / L e

• Acima de 75,0 mg / L.

Com o Índice de CMP, buscou-se evitar que problemas de contaminação do

leite, decorrentes de más práticas de produção, pudessem ser confundidos com

fraude do leite.

O método analítico hoje usado para determinação do índice de CMP não faz

distinção entre CMP obtido com renina e CMP de origem proteolítica bacteriana, ou

seja, não faz a distinção entre o leite fraudado e o leite que sofreu modificações em

razão de enzimas que se desenvolveram em razão do método UHT.

Ademais, convém destacar que a Administração, ao oficializar a IN SDA nº

69/2006, sabiamente inseriu, no seu Art. 1º: “Instituir critério de avaliação da

qualidade do leite in natura, concentrado e em pó, reconstituídos...”.

Ora, pela própria análise da produção do leite UHT feita acima, percebe-se

que este não pode ser considerado ou confundido com leite in natura, uma vez que,

da ordenha até a comercialização, longo período e diversos processos são

efetuados, o que permite a formação e desenvolvimento de proteases bacterianas

que podem adulterar o resultado do índice de CMP.

Sendo termorresistentes, as referidas proteases terão suportado e vencido a

ação desnaturante do tratamento térmico UHT a que forem expostas, continuando

com sua atividade proteolítica.

Certamente por essa razão, a IN ora questionada, ao dirigir o foco de sua

atenção para o leite in natura, tenha sinalizado claramente para o objetivo a ser

perseguido pela fiscalização: sanar o problema onde ele deve ser sanado: na

origem, jamais nos produtores de leite UHT. Aplicar o método analítico ao leite

UHT, primeiramente é procedimento ilegal, pois fere dispositivo claro da IN SDA nº

69/2006, segundo porque não é método eficiente para constatação de “fraude no

leite”.

Uma vez que resta amplamente comprovado pela doutrina especializada que o

processo UHT pode ser indiferente ao desenvolvimento, à estabilidade

química e à capacidade funcional de proteases bacterianas, mesmo apesar das

altas temperaturas aplicadas, o que certamente elevará os índices de CMP2, resta

evidente que o método utilizado não se presta para a averiguação de fraude no

leite. Ademais, não resta exagerado reiterar que a própria Instrução Normativa

2 “Proteases produzidas por bactérias psicrotróficas agem sobre a caseína de forma semelhante à

quimosina, liberando o caseinomacropeptideo – CMP, porém apresentam menor especificidade” (DATTA, N.; DEETH, H.C. Age gelation of UHT Milk.- A review. Institution Chemical of Engineers, v. 79, p.197-210. 2001). “No leite tratado pelo sistema UHT, o problema com enzimas torna-se mais comum. O leite apenas pasteurizado parece ser mais resistente à proteólise do que o leite UHT. O uso de altas temperaturas durante o processamento (UHT) pode expor novos sítios moleculares das proteínas à ação das proteases” (McKELLAR, R.C. Development of off-flavours in ultra high temperature and pasteurizad milk as a function of proteolysis. J. of Dairy Sci., v.64, n° 11, p.2138-2145. 1981)”. “Segundo ARAÚJO (1995), (citado na dissertação de mestrado de LORENZETTI, D. K. “Influência do

tempo e da temperatura no desenvolvimento de microrganismos psicrotróficos no leite cru de dois

Estados do sul do Brasil, UFPR, 2006), “a desnaturação das proteínas causada pela temperatura elevada utilizada durante o processo UHT, altera várias propriedades importantes das proteínas, do ponto de vista da tecnologia de alimentos. A proteína desnaturada é, geralmente, menos solúvel ou até mesmo insolúvel, promovendo aumento na viscosidade do alimento e tem a reatividade de seus grupos laterais intensificada. ARAÚJO (1995, op. cit.) cita ainda que a proteína desnaturada é mais sensível à hidrólise por enzimas proteolíticas produzidas por psicrotróficos”.

(69/2006) enumera claramente que o objeto de exame é o leite in natura ou cru,

jamais o leite processado como tem ocorrido na realidade da fiscalização sanitária

no Brasil.

Dessa forma, pode-se concluir dos estudos realizados, preliminarmente, que o

simples processamento UHT do leite poderia ser suficiente para retirar uma

matéria-prima da condição de apta ao processamento para abastecimento público

(<30 mg CMP/L), destinando-o à produção de derivados lácteos (>30 mg ≤ 75 mg

CMP/L), ou, pior, dessa última classificação para a total inutilização do leite UHT

como alimento humano (>75 mg CMP/L).3

A condenação de inutilização de leite UHT com elevado índice de CMP não

detém qualquer base científica. Não há comprovação de que o leite com teor de

CMP com mais de 75,0 mg/L seja impróprio para consumo humano. Qualquer

produto lácteo fermentado (por exemplo, queijos) apresenta um nível de proteína

hidrolisada por enzimas bacterianas ou de outras fontes, muitas vezes superior ao

do leite com esse teor de CMP, sendo mesmo assim um produto de comercialização

permitida. Onde fica o princípio da impessoalidade?

Portanto, absolutamente ineficiente o método utilizado para averiguação de

fraude no leite, ou mesmo da habilitação do produto para consumo humano, o que

denota a necessidade da correta aplicação da Instrução Normativa SDA nº

69/2006, que aplica o método analítico de exame ao leite in natura, jamais ao leite

processado industrialmente.

Necessária se faz, dessa forma, o ajuizamento da presente demanda, para a

correta aplicação da IN SDA nº 69/2006 pelos órgãos fiscalizadores.

CAPÍTULO III

DOS PREJUÍZOS AOS ASSOCIADOS DA DEMANDANTE: PRODUTORES DE LEITE UHT

Diversos têm sido os prejuízos impostos aos produtores de Leite UHT,

conforme se irá demonstrar abaixo.

IMPOSSIBILIDADE DE INVESTIMENTOS

Atualmente no mercado brasileiro há cerca de 80 fabricantes de leite UHT,

3 Parecer elaborado pelo Dr. José de Moura, Tecnólogo me Laticínios.

os quais representam cerca de 80% ou mais do disponibilizado do produto aos

consumidores.

O investimento destes produtores em equipamentos pelo método HPLC que

façam a medição de CMP do leite in natura, além de muito alto, poderia ser

ineficaz, inadequado e desnecessário, ofendendo ao princípio da proporcionalidade,

pois é de conhecimento público, inclusive já oficial frente à publicação no Diário

Oficial da União de 03 de março de 2010, através da IN nº 07 do Ministério da

Agricultura, pecuária e Abastecimento, que outros métodos de avaliação, como a

Eletrofrese Capilar e a Espectometria de Massas do Leite são, em tese, métodos

eficientes para fiscalização do leite processado.

É curioso, cabe destacar, que tanto a SDA/MAPA, assim como o seu

departamento, o DIPOA, têm absoluta ciência de que o método hoje utilizado não

serve para averiguar fraude ou não no leite processado (UHT em destaque), que

vem investindo em pesquisas para encontrar um método efetivamente seguro para

análise do leite processado (lembre-se que o método analítico da IN SDA nº

69/2006 deve ser aplicado ao leite “in natura”).

DA IMPROPRIEDADE DA FISCALIZAÇÃO EFETUADA

Conforme amplamente demonstrado, usar a IN SDA/MAPA nº 69, de

13.12.2006 fazer a análise do índice de CMP no leite processado, sobretudo no leite

UHT, ou seja, o leite já industrializado e que passou por diversas etapas de

oscilação de temperatura, é forma absolutamente equivocada de buscar o

aprimoramento de qualidade do leite in natura.

Ao contrário do que vem ocorrendo hoje, nas indústrias, sobretudo de leite

UHT, a amostra deve ser retirada antes do processamento via oscilação de

temperatura, a fim de que seja possibilitada a avaliação do leite ainda não

processado. O método enumerado pela IN SDA nº 69/2006, como bem colocado

em seu artigo 01º, é método de análise do leite “in natura”, não do leite já

processado.

Ademais, houve, posteriormente, através de um ofício do Diretor do DIPOA a

criação do regime especial de fiscalização (“REF”) para a fábrica de leite UHT com

valor de CMP superior a 75 mg/L, simultaneamente à divulgação do nome da

indústria como produtora de produtos com “indícios de fraude por adição de

soro”, e portanto da empresa como suspeita de praticar a fraude por adição de

soro, por sítio eletrônico do CQUALI4.

Essa prática não tem provimento legal. O chamado REF não está previsto

na legislação sanitária federal, nem mesmo em qualquer outra legislação. Sua

implantação está sendo conduzida através da divulgação de um Ofício circular,

baseado em legislações amplas, genéricas, difusas, divulgado pelo DIPOA/SDA/

MAPA, o que fere amplamente os princípios da legalidade e publicidade, ambos

impostos tanto ao direito administrativo como ao direito sanitário.

Pelo próprio princípio da legalidade (basilar no direito administrativo,

principalmente quando da aplicação do poder de polícia), adotar o método de

analogia para a interpretação e aplicação de sanções é inviável. O REF deveria ser

medida cautelar (de emergência), porém atualmente, mais de três anos depois de

sua adoção, permanece sendo indevidamente utilizado e defendido pela

Administração Pública, não podendo o G-100 E ABLV corroborar com tal

entendimento. Não se está tratando de violação a direito adquirido ou ato jurídico

perfeito, mas sim no princípio da legalidade que rege o direito administrativo.

O poder de decisão do Diretor do DIPOA, referido no Art. 951 do Dec. nº

30.691/1952 não dá poderes ao senhor Diretor de editar normas e formas de

fiscalização, como vem ocorrendo quando da fiscalização do leite UHT pelo REF,

realizada com base em oficios.

Além da impropriedade jurídica quanto à adoção do Regime Especial de

Fiscalização, os métodos utilizados, ao contrário do aduzido, são ineficientes e

desprovidos de base científica, como amplamente aventado na presente ação.

O uso de sanções e regimes especiais exige norma específica e não admite o

uso de cláusulas gerais, conceitos indeterminados, normas sancionatórias em

branco, analogia ou mesmo interpretação extensiva contra o cidadão.

Por mais essa razão, mostra-se absolutamente equivocada a IN combatida e

a forma como os órgãos de fiscalização vêm adotando suas especificações.

DA FALTA DE INCENTIVOS AOS PRODUTORES DE LEITE

4 www.cquali.gov.br

Com a IN nº 69/2006, a Administração Pública tenta repassar ao industrial

do leite atribuição que lhe cabe: dar condições ao produtor rural de leite produzir

um produto de qualidade dentro das normas de higiene e saúde estabelecidas.

Em muito, atualmente, restam ineficazes os incentivos do Governo ao

pequeno produtor, que não recebe auxílio técnico ou mesmo financeiro para

adequar sua produção de leite ao padrão exigido pela IN MAPA nº 51/2002, que em

31 de janeiro de 2011 teve sua entrada em vigor e seu teor normativo alterado

pela IN 62/2011/MAPA para dar tempo ao setor produtivo primário se adequar aos

seus parâmetros revisados de forma mais condizente com a realidade do produtor e

com a oferta de infraestruturas de estradas, de energia e educação técnica,

disponibilizadas pelos poderes públicos municipal, estadual e federal em por todo o

território nacional.

Resta claro que há problemas quanto aos investimentos do Estado com o

desenvolvimento da fase rural da produção do leite. Estradas vicinais, eletrificação

rural compatível com os equipamentos necessário para refrigeração do leite, essas

sim são medidas que podem ser determinantes na qualidade do leite no Brasil,

medidas estas que parecem estar esquecidas.

Título IV

DOS PEDIDOS DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

Capítulo I

DA CESSAÇÃO DOS EFEITOS DA EXIGÊNCIA DE APLICAÇÃO DO MÉTODO

CMP, PREVISTO IN Nº 69/2006

A parte Autora busca como antecipação de tutela seja, desde já, suspensa a

utilização do método CMP, previsto in nº 69/2006, pelos órgãos de fiscalização do

leite UHT em virtude da incongruência e inexatidão dos métodos aplicados para a

fiscalização.

Muitas empresas do ramo de leite processado vêm sofrendo autuações

equivocadas, sendo taxadas de fraudadoras quando, na realidade, as enzimas

encontradas no leite derivam do método de processamento, inexistindo qualquer

ato culposo ou doloso pelos laticínios. Cargas têm sido apreendidas e multas a

plicadas, todas essas medidas baseadas em métodos de fiscalização tecnicamente

incompatíveis com o exame efetuado.

No caso, encontram-se presentes os pressupostos para a

concessão da liminar:

I. HÁ FUNDADO RECEIO DE DANO IRREPARÁVEL,

pois o só fato de taxar os produtores de leite UHT,

associados da demandante, como fraudadores de leite já

demonstra a gravidade de existir Instrução Normativa que

adote método cientificamente ineficaz para fiscalização do

leite. Cada vez que há autuação, ou notícia por parte dos

órgãos públicos de que houve fraude (colocação de soro) no

leite por um produtor, a imagem do segmento e do produtor

ficam maculadas, além da oferta de leite ficar reduzida, o

que vem a trazer prejuízos de grande monta á população em

geral;

II. HÁ PROVA INEQUÍVOCA E VEROSSIMILHANÇA,

uma vez que a longa narrativa demonstra que há clara

inexatidão do método de fiscalização em leite processado

UHT adotado pela IN DAS nº 69/2006 objeto da presente

demanda, sendo ineficaz para a aferição da existência ou não

de fraude no leite UHT pela inserção de soro.

Muitas já foram as decisões liminares no sentido de

suspender efeitos de autuações baseadas nos índices de CMP no leite UHT através

do método analítico, conforme documentos em anexo.

Assim, demonstrada a prova inequívoca e a verossimilhança

e do perigo de eventual demora na efetivação do pleito antecipatório de urgência,

impõe-se a concessão da tutela antecipada, na forma do artigo 273, inciso II, do

CPC, para que sejam suspensos os efeitos da IN SDA/MAPA nº 69/2006 até o

julgamento da presente demanda, o que requer desde já por ser medida de Direito

e Justiça.

Título III

DOS PEDIDOS E REQUERIMENTOS

Ante o exposto, REQUER:

EM ANTECIPAÇÃO DE TUTELA:

a) Sejam oficiados os órgãos de fiscalização, a fim de que

suspendam a utilização do método enumerado na IN

SDA/MAPA nº 69/2006, art. 1º, com base para fiscalização

do Leite UHT, no que se refere à ocorrência de fraude, até

que haja o julgamento definitivo da presente demanda;

COMO PEDIDOS DE MÉRITO:

1) A citação do requerido para que, querendo, conteste a

presente ação sob a pena de revelia;

2) Seja julgada a presente Ação TOTALMENTE PROCEDENTE,

sendo DECLARADO Impedida a demandada, através do seu

órgão do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

de realizar a verificação do índice CMP em leites já

processados, ditos leite “UHT” (Ultra Alta Temperatura) pelo

método analítico disposto na IN SDA nº 69/2006, uma vez

que tal procedimento vem causando prejuízos aos laticínios,

visto que a norma se dirige aos produtores de leite in natura

tão somente, afastando a sua exigência dos associados do G-

100 e da ABLV.

3) Condene o Réu ao pagamento dos honorários do perito

judicial, assistente, custas processuais e honorários

advocatícios, na forma da lei;

4) Protesta provar o alegado por todos os meios em direito

admitidos, em especial a documental e pericial.

5) Requer seja deferido o prazo de 15 dias para juntada de

procuração e demais documentos necessários ao feito.

DOCUMENTOS EM ANEXO

1. INSTRUMENTOS DE PROCURAÇÃO

2. ESTATUTO DO G-100 E ABLV

3. ATA DE ELEIÇÃO DA DIRETORIA DO

G-100 E ABLV

4. REQUERIMENTOS AO MAPA

5. RESPOSTA DO MAPA AOS

REQUERIMENTOS

6. LAUDO TÉCNICO

Atribui-se à presente causa o valor de R$ 1000,00.

Termos em que,

Pede Deferimento.

Brasília, 19 de janeiro de 2012.

Paulo Caliendo

OAB/RS 33.940

Rafael Fernandes Estevez

OAB/RS 45.863

Wesley Rocha

OAB/DF 31.271