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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DE FAZENDA DE BELÉM/PA, A QUE
COUBER POR DISTRIBUIÇÃO.
PRIORIDADE DE TRAMITAÇÃO
(art. 1º, VIII, do Provimento 12/2008 –
CMB/TJPA)
“O promotor de justiça não deve continuar omisso diante da impunidade dos
criminosos ricos, que prendem ou mandam prender os criminosos pobres, nem
da dos que, à sombra do Poder, arrombam o erário e se apoderam de seu
dinheiro. Deve sair de seu comodismo burocrático e ouvir a voz do
inconformismo que parte da sociedade, que lhe cumpre defender, sem temer
os agentes da violência oficial e da corrupção e a prepotência dos poderosos,
que estão decompondo o organismo social e político da Nação.” (Francisco
Vani Benfica)
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ, por meio do Promotor de
Justiça que atua na 1º Promotor de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e da
Moralidade Administrativa, DANIEL HENRIQUE QUEIROZ DE AZEVEDO, com estribo legal
no art. 37, caput e inc. XXI, 127, caput, 129, inc. II e III, todos da CF, nas Leis federais
8.666/93, 7.347/85 e Lei 8.625/93, vem propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA,
COM MEDIDA LIMINAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS.
Em desfavor de:
1- WALTER WANDERLEY DE PAULA PENA, brasileiro, nascido em 04/08/1965,
portador do CPF nº 189.743.092-20, residente na Rodovia Augusto
Montenegro, Condomínio Cidade Jardim, nº 5595, Rua Dalia, casa 48,
bairro Castanheira, Belém - PA, CEP 66811-000 e Tel (91) 81353563;
2- AGOSTINHO QUEIROZ SOARES, brasileiro, nascido em 23/03/1962,
portador do CPF nº 128.702.262-68, residente na Rodovia Mario Covas,
Conjunto Residencial ADÉLIA HACHEM, nº 4901, BLOCO 4, APTO 304,
Bairro Coqueiro, BELEM – PA, CEP 66670-902, tel (91) 41027548;
3- PATRICIA REGINA LEOTTY DA CUNHA (Pregoeira e Presidente da
Comissão de Licitação), servidora pública estadual comissionada,
portadora do RG nº. 2745097, inscrita no CPF sob o nº. 595.593.812-53,
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residente no Conjunto Maguary, Alameda 11, casa 10, Coqueiro,
Belém/PA, CEP 66823-073;
4- ANTONIO VILLAR PANTOJA JUNIOR, brasileiro, procurador autárquico,
inscrito na OAB/PA sob o nº. 1.049, com endereço na Rua dos
Tupinambás 131, nº. 4582, Batista Campos, CEP 66.025-610, Belém/PA e
endereço funcional no DETRAN/PA, sito à Rodovia Augusto
Montenegro, Km 03, s/n, Mangueirão, CEP 66.640-000, Belém/PA;
5- SERVI-SAN VIGILÂNCIA E TRANSPORTE DE VALORES LTDA., inscrita no
CNPJ sob o nº. 12.066.015/0006-46 (FILIAL), com endereço na Travessa
Angustura, nº 1921, Bairro Pedreira, Belém-Pa, CEP 66087-710,
representada pelo gerente geral e procurador JOSÉ CLOVES
RODRIGUES, portador do CPF nº 302.378.903-72 e RG nº 472.871-82,
residente na Avenida Augusto Montenegro, nº 5000, Bairro Parque
Verde, Belém Pará. Porém, tal empresa é parte integrante da MATRIZ
com mesmo nome e CNPJ: 12.066.015/0001-31, localizada na Av.
Miguel Rosa, nº 3680, bairro Centro, Teresina-Pi, CEP: 64.001-490, cujo
sócio administrador é FRANCISCO DE ASSIS VERAS FORTES, brasileiro,
portador do RG nº 38.163-PI e CPF nº 001.546.523-34, residente na
AVENIDA LINDOLFO MONTEIRO, nº 1752, bairro Fátima, TERESINA – PI,
CEP 64049440;
pelos fundamentos fáticos e jurídicos a seguir:
I – SÍNTESE DOS ACONTECIMENTOS.
A Coordenação das Promotorias de Defesa do Patrimônio Público e da
Moralidade Administrativa apontou possíveis irregularidades nas dispensas de licitação
nº 2/2013 e nº 15/2013, fundamentadas no art. 24, IV, da Lei Federal 8.666/93, no valor
de R$ 7.116.178,80 (sete milhões, cento e dezesseis mil, cento e setenta e oito reais e
oitenta centavos) e R$ 7.129.585,44 (sete milhões, cento e vinte e nove mil, quinhentos
e oitenta e cinco reais e quarenta e quatro centavos), respectivamente, ambas para
Prestação de Serviços de Guarda e Vigilância Armada dos Prédios e Áreas de
Propriedade do Estado do Pará, sob utilização do DETRAN/PA.
Na época da dispensa de licitação nº 2/2013, o cargo de Diretor Geral
do DETRAN/Pa era ocupado por Walter Wanderley de Paula Pena, que foi nomeado
em 01 de junho de 2012 e exonerado em 11 de junho de 2013, conforme publicações
no Diário Oficial do Estado do Pará (fls. 5763/5764), de modo que ele foi o agente
público diretamente responsável, neste caso. Por sua vez, no período em que ocorreu
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a dispensa nº 15/2013, o cargo de Diretor Geral do DETRAN/Pa já era exercido por
Agostinho Queiroz Soares, o qual assumiu tal função em 11 de julho de 2013 e ali
permaneceu até 04 de junho de 2014, quando foi exonerado, conforme Diários oficiais
colacionados as fls. 5764/5765, deste procedimento apuratório.
Apurou-se que as referidas dispensas de licitação foram realizadas para
dar continuidade à prestação do serviço, anteriormente desenvolvido pela Empresa
Pará Segurança LTDA, a qual havia celebrado o contrato administrativo nº 13/2008 (fl.
4740/4749 do IC nº 000177-116/2013, em anexo) com o Departamento de Trânsito do
Estado do Pará – DETRAN/PA, decorrente da concorrência nº 02/2007, iniciado em
06/03/2008, com vigência de 12 meses e possibilidade de prorrogação em até 60
meses, com fulcro no art. 57, II, da Lei 8.666/93.
Vale observar que, inicialmente, apenas a apuração da dispensa nº
2/2013, datada de 05/03/2013 – que resultou no contrato emergencial nº 17/2013 –
coube ao 1ª Promotor do Patrimônio e Moralidade Administrativa, o qual instaurou o
inquérito civil nº 000177-116/2013, para esta finalidade. Por sua vez, a dispensa n°
15/2013, datada de 03/09/2013, da qual decorreu o contrato emergencial nº 64/2013,
começou a ser apurada pelo promotor vinculado à 4ª Promotoria do Patrimônio e
Moralidade Administrativa, por meio do inquérito civil 002132-116/2013, porque não se
verificou, de pronto, que ambos tratavam do mesmo objeto e que a segunda
dispensa era continuidade da primeira, ocorrida seis meses após.
De fato, ao ser verificada a correlação entre as duas referidas dispensas,
a 4ª Promotoria do Patrimônio e Moralidade Administrativa encaminhou o inquérito
civil de nº 002132-116/2013, para ser apensado ao procedimento de I.C. nº 000177-
151/2013, o qual já tramitava na 1ª Promotoria do Patrimônio e Moralidade
Administrativa, conforme despacho de fl. 221, devidamente cumprido, de acordo
com a certidão de fl. 4415 dos autos que instruem essa exordial.
Neste contexto, foi determinada a reunião dos referidos procedimentos,
que já estavam instruídos com diversos documentos, de modo que o 1ª Promotor do
Patrimônio e Moralidade Administrativa – o qual passou a atuar com exclusividade no
caso – resolveu encaminhar os autos para a análise da assessoria técnica do Ministério
Público, especializada em licitações (despacho de fl. 5731), cujo objetivo era
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identificar se houve condutas de agentes públicos do DETRAN, que tivessem dado
causa à possíveis contratações emergenciais ilegais.
Na análise detalhada, minuciosa e brilhante, feita pela Assessoria
Técnica Especializada do Ministério Público, por meio da Nota Técnica nº 03-
2018/PJDC/DPP/MA – ASS ESP (fls. 5733/5761), restou constatado que nenhuma das
referidas contratações emergenciais foram “fruto” de dispensas justificadas e
legalmente fundamentadas, pois decorreram de “urgências fabricadas”, por atos dos
administradores do DETRAN/PA, à época, com auxílio de servidores da procuradoria
jurídica e da comissão de licitação, daquele órgão público.
Ademais, foram aprofundadas as investigações sobre a forma como o
DETRAN/PA deu continuidade à contratação dos serviços de guarda e vigilância
armada, após o término da vigência dos contratos decorrentes das dispensas de
licitação nº 2/2013 e nº 15/2013, momento em que se constatou, absurdamente, que
entre os períodos de 11/03/2014 a 21/09/2014 a Empresa SERVI-SAN prestou tal serviço
e recebeu valores do erário estadual, sem a formalização de qualquer contrato
administrativo, ou seja, sem que existisse algum instrumento jurídico que disciplinasse a
situação e, inclusive, com burla a obrigatoriedade de prévio procedimento licitatório.
Os vultuosos valores pagos pelo DETRAN e recebidos pela Empresa SERVI-
SAN VIGILÂNCIA E TRANSPORTE DE VALORES LTDA, sem qualquer contrato formal, foram
apurados a partir de pesquisas no sistema SIAFEM do Estado – conforme documentos
colacionados as fls. 5768/5776 do procedimento em anexo – e demonstraram um
prejuízo de R$ 6.565.046,48 ao erário, de acordo com o detalhamento a seguir:
SIAFEM2014-EXEFIN,CONSULTAS,LISOB ( LISTA ORDEM BANCARIA ) ________________
CONSULTA EM 22/03/2018 AS 15:25 USUARIO: LAIDE RAIOL
FAVORECIDO : 12066015000646 - SERVI-SAN VIG. E TRANSPORTE DE VALORES LTDA.
OP DATA UG GESTAO DOCUMENTO V A L O R BCO CONTA SIT
3 16/abr 660201 66000 2014OB02067 687.604,58 37 UNICA EV
4 09/mai 660201 66000 2014OB02729 1.031.130,22 37 UNICA EV
5 03/jun 660201 66000 2014OB03497 1.031.130,22 37 UNICA EV
6 04/jul 660201 66000 2014OB04149 1.031.130,22 37 UNICA EV
7 11/ago 660201 66000 2014OB05424 1.031.130,22 37 UNICA EV
8 17/set 660201 66000 2014OB06971 1.031.130,22 37 UNICA EV
9 10/nov 660201 66000 2014OB08839 721.790,80 37 UNICA EV
TOTAL ........... 6.565.046,48
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OBSERVAÇÕES:
1 - Pagamentos efetuados pelo Departamento de Trânsito do Estado do Pará - DETRAN-,
[UNIDADES GESTORA - UG: 660201], à Empresa SERVI-SAN VIGILÂNCIA E TRANSPORTE DE VALORES LTDA.
2 - Período de 15ABRIL A 31DEZEMBRO/2014.
3 - FONTES DE RECURSOS: Recursos Próprios Diretamente Arrecadados pela Administração Indireta
CÓDIGO EXERCÍCIO ANTERIOR: 0661 (*); CÓDIGO NO EXERCÍCIO: 0261
Nota: (*) Fonte utilizada quando incorporada o valor do superávit no Orçamento em vigor Fontes de Informações: SIAFEM (Sistema Integrado de Administração Financeira para Estados e Municípios)
Releva notar, que tal descoberta é impensável e quase inacreditável,
considerando a importância e visibilidade do órgão público onde as ilegalidades
ocorreram, ao que se soma o fato de que isso foi praticado após mais de 20 anos da
criação e difusão da Lei 8.666/93, bem como da norma constitucional que exige que
qualquer contratação pública seja precedida de procedimento licitatório, como
regra, ou, no mínimo, dispensas e inexigibilidades devidamente fundamentadas,
porém, jamais, por meio de contratos verbais ou sem qualquer formalidade, pois isso
não se coaduna com uma forma aceitável e transparente de gastar o dinheiro
público, correspondendo a fonte de claras imoralidades e corrupção.
Em meio a todas essas gravíssimas ilegalidades, ao norte narradas, foi
designada a Sra. Glaura Iolanda Brito Pires, para assumir a função de Diretora Geral
do DETRAN/Pa, em 04 de julho de 2014 (D.O.E, de fls. 5765), a qual, certamente, tomou
conhecimento da situação e já no dia 11 de setembro de 2014, exarou a Portaria nº
2770, (conf. fls. 5758 dos autos), a seguir transcrita, in verbis:
“PORTARIA N° 2.770/2014 Número de Publicação: 742498
CONSIDERANDO que o atual cenário evidencia a necessidade de uma solução imediata e legal,
caracterizado pelo iminente risco à segurança das pessoas, equipamentos e outros bens públicos
particulares, situação perfeitamente configurada na imprescindibilidade imediata da contratação
dos serviços contínuos de vigilância armada,
CONSIDERANDO que a descontinuidade dos serviços prestados vai gerar os graves e sérios prejuízos
ao patrimônio e servidores desta Entidade,
CONSIDERANDO que o valor da coleta de preços anexada evidencia a realidade atual de
mercado,
CONSIDERANDO ainda, o dever de apurar a responsabilidade a quem deu causa a ilegalidade
praticada.
RESOLVE
Art. 1° Determinar a imediata contratação por emergência da empresa C&S VIGILÂNCIA
PATRIMONIAL LTDA., por ter oferecido a melhor vantagem de preço à Administração
Pública, pelo prazo máximo e improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias, nos termos do
art. 24, IV da Lei n° 8.666/93, com necessária inclusão de cláusula resolutiva, em
conformidade com o princípio da economicidade, resguardando o interesse público e as
finanças públicas.
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Art. 2° Determinar a imediata elaboração de termo de referência com as especificações
técnicas necessárias para atender as demandas do DETRAN/Pa, no prazo máximo de 45
(quarenta e cinco) dias, para o competente processo licitatório, o qual deverá ser
autorizado pela Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social, após
exposição à mesma da gravidade da situação.
Art. 3° Fica determinada a criação de comissão de sindicância, cujos nomes serão
definidos em ato próprio, tendo como objetivo apurar as responsabilidades a quem deu
causa a ilegalidade dos procedimentos de contratação por indenização. Art. 4° Esta
portaria entra em vigor na data de sua publicação. Registre-se, publica-se e cumpra-se.
Belém, 10 de setembro de 2014.
GLAURA IOLANDA BRITO PIRES Diretora Geral DOE 32.678”
Destarte, essa conduta da Sra. Glaura Iolanda Brito Pires, de exarar a
referida Portaria nº 2770, demonstrou sua aparente boa-fé, pois mesmo celebrando um
novo contrato emergencial, sob o nº 61/2014 – possivelmente para obstar a
mencionada prestação de serviço pela SERVI-SAN, sem contrato formal – já no dia 17
de dezembro de 2014, ela ASSISNOU um outro instrumento contratual, agora
decorrente de licitação pública devidamente finalizada (concorrência 05/2014),
conforme D.O.E, colacionado a fl. 5761 dos presentes autos.
Na administração da Sra. Glaura Iolanda Brito Pires, portanto, o contrato
emergencial nº 61/2014, foi substituído apenas três meses após sua celebração, o que
demonstrou que era possível ser iniciada e concluída licitação para contratação de
serviço prestação de serviços de guarda e vigilância armada, desenvolvido
ilegalmente pela SERVI-SAN, no prazo total de menos de QUATRO MESES,
corroborando a negligência e má-fé com que agiram os antecedentes Diretores do
DETRAN, Walter Wanderley de Paula Pena e Agostinho Queiroz Soares, responsáveis
diretos pelas improbidades aqui já delineadas.
Em resumo, no final das presentes apurações sobre as contratações
posteriores ao contrato administrativo nº 13/2008, para Prestação de Serviços de
Guarda e Vigilância Armada dos Prédios e Áreas de Propriedade do Estado do Pará
sob utilização do DETRAN/PA, restou constatado, em síntese*, o seguinte:
CONTRATAÇÃO Empresa Contratada Período 1º Contratação emergencial: Contrato emergencial nº 17/2013, SEM justificativa para dispensa.
SERVI-SAN
06/03/2013 a 02/09/2013
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2º Contratação emergência Contrato emergencial nº 64/2013, SEM justificativa para dispensa
SERVI-SAN
11/09/2013 a 10/03/2014
3º “Contratação” emergencial SEM formalização de contrato
SERVI-SAN
11/03/2014 a 21/09/2014
4º Contratação emergencial Contrato emergencial nº 61/2014, com justificativa para dispensa
C&S Vigilância
30/09/2014 a 29/03/2015
5ª Contratação: COM prévio procedimento licitatório
C&S Vigilância
17/12/2014
*Percebe-se que entre a primeira e a segunda contratação emergencial houve uma lacuna 8 dias para a formalização de um novo contrato e entre a terceira e quarta mais uma lacuna de 9 dias.
Posto isto, cabem serem feitas análises individualizadas e cronológica dos
acontecimentos que comprovam as improbidades aqui apuradas. Senão vejamos:
II - DO DETALHAMENTO DAS APURAÇÕES
II.1 – DA ANÁLISE SOBRE A DISPENSA DE Nº 02/2013. Aflora, prima facie, que nas folhas 4941, do I. C. nº 000177-116/2013,
consta o memorando nº 151/2012, datado de 27/08/2012, no qual o fiscal do contrato
administrativo nº 13/2008 – relativo a Prestação de Serviços de Guarda e Vigilância
Armada – informou ao Núcleo de Segurança Orgânica do DETRAN, que faltavam
apenas seis meses para o término de vigência de tal ajuste, o que fez com que fosse
dado início ao obrigatório processo licitatório, de nº 2012/411257, para subsidiar uma
nova contratação, a qual precisaria ser concluída, impreterivelmente, até o dia
05/03/2013.
Os primeiros atos do procedimento licitatório nº 2012/411257 seguiram seu
trâmite natural, até que no dia 06/12/2012, o feito foi encaminhado à Procuradoria
Jurídica, para análise da minuta do edital. Daí, no dia 18/12/2012 (fl. 5107, do I. C. nº
000177-116/2013) a advogada do do Departamento Jurídico do DETRAN exarou
parecer afirmando que sua análise sobre o edital do certame estava prejudicada, pois
a modalidade adotada pela CPL estava equivocada, considerando que a
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contratação de “serviços comuns” deve ser realizada por “pregão eletrônico”, e não
por meio de “concorrência”, tal como estava sendo feito.
O processo foi devolvido no dia 20/12/2012 para CPL, presidida por
Patrícia Leotty, que, por sua vez, tornou a enviar para o Departamento Jurídico, no dia
14/01/2013, (fl. 5126, do I. C. nº 000177-116/2013), anexando um parecer do ano de
2007, que apontava a modalidade Concorrência para o serviço em questão.
Absurdamente, contudo, esse processo nº 2012/411257 só voltou para a CPL em
21/06/2013, aproximadamente cinco meses depois, indicando novamente que a
modalidade licitatória a ser seguida, deveria ser o “pregão”, o que foi feito por meio
de um despacho de apenas duas linhas, sem qualquer fundamentação, conforme
consta na fl. 5126, do I. C. nº 000177-116/2013, que instrui essa exordial.
Esse retardo injustificado de dar tramitação adequada ao processo nº
2012/411257, praticado pelo procurador chefe do DETRAN, de nome Antônio Villar P.
Júnior – que propositadamente passou a atuar diretamente no feito – por si só, já
provocou a perda do prazo para realização de novo contrato administrativo pelo
DETRAN, o qual findava em 05/03/2013, conforme já dito.
Tramitação Inicial do Processo 2012/411257, resumida:
Setor Data de Recebimento
Data de Tramitação
Tempo aproximado de Permanência no setor1
Diretoria Geral/ Chefia de Gabinete
27/09/2012 05/09/2012 7 dias (fl. 4942)
Diretoria Administrativa Financeira
05/09/2012 10/10/2012 35 dias (fl. 4944)
Núcleo de Segurança Orgânica
10/10/2012 11/10/2012 1 dia (fl. 4951)
Diretoria Administrativa Financeira
11/10/2012 15/10/2012 4 dias (fl. 4951)
Gerência de Compras 15/10/2012 30/10/2012 15 dias (fl. 4951 verso) Diretoria Administrativa Financeira
30/10/2012 01/11/2012 2 dias (fls. 4951 verso e 4969)
GCOF 01/11/2012 01/11/2012 0 dia (fl. 4969) GCC 01/11/2012 05/11/2012 4 dias (fl. 4969) Comissão Permanente de Licitação
05/11/2012 05/11/2012 0 dia (fl. 4970)
Gerência Orçamentária 05/11/2012 07/11/2012 2 dias (fl. 4970)
1 As folhas indicadas são referentes ao procedimento apensado nº 002132-116/2013
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Comissão Permanente de Licitação
07/11/2012 06/12/2012 29 dias (fl. 5106)
Procuradoria Jurídica 06/12/2012 20/12/2012 14 dias (fls. 5107/5108) Comissão Permanente de Licitação
20/12/2012 14/01/2013 24 dias (fl. 5126)
Procuradoria Jurídica 14/01/2013 21/06/2013 156 dias (fl. 5126)
Na análise da documentação encaminhada ao Ministério Público,
constatou-se, inclusive, que o Gerente de um setor cuja sigla é “GCC” chegou a
solicitar, no dia 29/01/2013, através do memorando 027/2013 – GCC (fl. 4735), a
prorrogação do contrato administrativo nº 13/2008, por mais 180 dias, com base no art.
57, §4º, da Lei 8.666/93 – que trata de uma excepcionalidade ao prazo máximo de 60
meses, previsto no art. 57, II, da Lei 8.666/93 – no entanto, a empresa Pará Segurança
LTDA não aceitou (fl. 4886)), o que afastou a última possibilidade dos agentes públicos
responsáveis camuflarem a sua inércia e negligências.
Desta feita, essa injustificada perda do prazo para conclusão do
procedimento licitatório devido, fez com que fosse realizada a DISPENSA DE Nº
02/2013, baseada, portanto em “urgência fabricada”, a qual resultou no contrato
emergencial nº 17/2013, firmado com a empresa SERVI-SAN, cuja vigência seria de
06/03/2013 a 02/09/2013.
II.2 – DA ANÁLISE SOBRE A DISPENSA DE Nº 15/2013. A realização do contrato emergencial nº 17/2013, ao norte referido,
deveria ter tornado a conclusão do processo licitatório nº 2012/411257 uma questão
de óbvia prioridade, para que fossem evitadas novas contratações sem licitação, por
parte do DETRAN/PA.
Ocorre que na análise da documentação que instrui esse feito, verificou-
se que essa não foi a postura adotada pelos agentes públicos responsáveis, os quais,
absurdamente, foram ainda mais lentos nas práticas dos atos que lhes cabiam, bem
como adotaram medidas que transpareceram clara intenção de obstar a finalização
oportuna do certame.
De fato, mesmo o procedimento licitatório nº 2012/411257 tendo
retornado às mãos da Comissão de Licitação, no dia 21/06/3013, após uma
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paralização de 156 dias no setor jurídico, conforme já dito, isso não fez com que fosse
atribuída qualquer prioridade em sua tramitação, considerando que somente na data
de 29/07/2013, sofreu nova movimentação.
Portanto, apenas no dia 29/07/2013, a presidente da CPL, Patrícia Leotty,
remeteu o edital do certame para análise jurídica, que novamente devolveu o feito
com lentidão, juntando o seu parecer no dia 19/08/2013, o que, finalmente, permitiu
com que o edital de pregão eletrônico, sob o nº 21/2013, fosse publicado dia
21/08/2013, ou seja, quase ao final do prazo máximo para a renovação da necessária
contratação.
Ocorre que mesmo sendo uma das principais causadoras da lenta
tramitação do pregão eletrônico nº 21/2013 (procedimento licitatório nº 2012/411257),
a representante da CPL, Patrícia Leotty (pregoeira), exarou despacho, colacionado à
fl. 4425 do I. C. nº 000177-116/2013, no qual atestou que até o término do contrato
emergencial nº 17/2013 – mais uma vez – não concluiria o certame licitatório, de modo
que solicitou autorização ao Diretor Geral Agostinho Queiroz Soares para cotar preços
com intuito de firmar um novo contrato emergencial, com dispensa de licitação!!!!.
Enquanto isso, o pregão nº 21/2013, que teve seu edital publicado e
deveria ocorrer em dia 04/09/2013, acabou por receber pedidos de esclarecimentos e
impugnações, os quais resultaram em sua suspensão pela pregoeira Patrícia Leotty (fl.
5438, do I. C. nº 000177-116/2013), a qual, no dia 17/09/2013, que encaminhou –
novamente – os autos para outra manifestação da Procuradoria Jurídica sobre tema
já exaustivamente tratado, em duas oportunidades anteriores do certame, qual seja, a
modalidade licitatória adequada.
Ora, tão somente em decorrência do fato da impugnação interposta
pelo Sindicato das Empresas de Vigilância, Transporte de Valores, Curso de Formação
e Segurança Privada do Estado do Pará - SINDESP/PA, ter alegado que a modalidade
compatível para a contratação era a concorrência, isso foi a justificativa usada pela
referida pregoeira para mais um atraso na tramitação do certame, pois ela reenviou
os autos para análise do setor jurídico, o qual, reitere-se, por duas vezes anteriores, já
tinha sedimentado o lógico entendimento de que deveria ser adotado o Pregão
Eletrônico, como adequado ao caso.
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
11
Desta feita, como se já não bastasse essa incompreensível atitude da
pregoeira Patrícia Leotty, o Procurador Chefe do Departamento Jurídico Antônio Villar
P. Júnior avocou o procedimento para si, e emitiu um parecer sem data (fls. 5571 a
5575, do I. C. nº 000177-116/2013), manifestando-se – em dissonância com tudo aquilo
que defendeu anteriormente – pois, agora, concluiu pela necessidade de revogação
do Pregão Eletrônico nº 21/2013, SOB O FUNDAMENTO DA NECESSIDADE DE
SANEAMENTO DE QUESTÕES TÉCNICAS E POR RAZÕES DE CONVENIÊNCIA E
OPORTUNIDADE, sem maiores esclarecimentos, o que foi seguido pelo Diretor Geraldo
DETRAN, no dia 06/12/2013 (fl. 5577, do I. C. nº 000177-116/2013).
Tramitação Final do Processo 2012/411257 (pregão nº 21/2013) resumida Setor Data de
Recebimento Data de Tramitação
Tempo aproximado de Permanência no setor2
Comissão Permanente de Licitação
21/06/2013 29/07/2013 38 dias (fl. 5310)
Diretoria Geral 29/07/2013 14/08/2013 16 dias (fl. 5312) Comissão Permanente de Licitação
14/08/2013 14/08/2013 0 dia (fl. 5310)
Procuradoria Jurídica 14/08/2013 19/08/2013 5 dias (fl. 5323) Publicado aviso do Pregão Eletrônico 21/2013
21/08/2013 -------------------
Suspensão do Pregão Eletrônico 21/2013
27/08/2013 -------------------
Revogação do Processo Licitatório
06/12/2013 -------------------
Por fim, ante o cancelamento injustificado e inoportuno do certame
licitatório, ao norte mencionado, foi realizado novo procedimento de dispensa de
licitação, sob o nº 15/2013, pelo DETRAN, que resultou em outro contrato emergencial,
agora de nº 64/2013, novamente com a empresa SERVI-SAN VIGILÂNCIA E
TRANSPORTE DE VALORES LTDA, cuja vigência se iniciou no dia 11/09/2013 e deveria
perdurar até 10/03/2014.
2 As folhas indicadas são referentes ao procedimento apensado nº 002132-116/2013
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
12
II.3 – DA CONTINUIDADE DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO AO DETRAN, COM O
RECEBIMENTO DE VALORES EM CONTRAPARTIDA, SEM A EXISTÊNCIA DE QUALQUER
CONTRATO FORMAL OU LICITAÇÃO PRÉVIA.
O objeto de investigação do Ministério Público nos inquéritos civis que
subsidiaram essa exordial, incialmente, cingiu-se as contratações decorrentes das duas
dispensas de licitação, nº 2/2013 e nº 15/2013, fundamentadas no art. 24, IV, da Lei
Federal 8.666/93, ao norte já detalhadas.
Ocorre que, ao serem aprofundadas as investigações restou
comprovada a maior de todas as ilegalidades, que apenas corrobora a má-fé com a
qual os agentes públicos responsáveis vinham agindo no caso. De fato, ficou provado
que a prestação de serviço de vigilância armada, oferecido pela empresa SERVI-SAN
VIGILÂNCIA E TRANSPORTE DE VALORES LTDA, continuou mesmo após o encerramento
do contrato nº 64/2013, decorrente da dispensa nº 15/2013.
Em outras palavras, mesmo depois de finalizado o referido contrato
emergencial, no dia 10/03/2014, a mencionada empresa continuou a desempenhar
seus serviços ao DETRAN/PA, pelo período de 11/03/2014 a 21/09/2014 (MAIS DE SEIS
MESES), sem formalização de qualquer novo contrato administrativo ou procedimento
licitatório prévio ou mesmo sem novas dispensas licitatórias, conforme comprovam os
documentos denominados “declaração de prestação de serviço” (fl. 4184 e 4391),
emitidos pelo senhor Afonso Palma da Paixão e Silva, bem como os despachos
exarados pelo Controle Interno do DETRAN/PA (fls, 4186/4189 e 4393/4397), todos
insertos nas cópias dos processos de pagamento, encaminhadas pelo próprio DETRAN
ao Ministério Público.
Ora tal absurda situação contraria, em especial, os arts. 603 e 624 da Lei
8.666/93, bem como inúmeras manifestações do TCU, que são no sentido de que “não
3 Art. 60. Os contratos e seus aditamentos serão lavrados nas repartições interessadas, as quais
manterão arquivo cronológico dos seus autógrafos e registro sistemático do seu extrato, salvo
os relativos a direitos reais sobre imóveis, que se formalizam por instrumento lavrado em cartório
de notas, de tudo juntando-se cópia no processo que lhe deu origem.
Parágrafo único. É nulo e de nenhum efeito o contrato verbal com a Administração, salvo o de
pequenas compras de pronto pagamento, assim entendidas aquelas de valor não superior a
5% (cinco por cento) do limite estabelecido no art. 23, inciso II, alínea "a" desta Lei, feitas em
regime de adiantamento. 4 Art. 62. O instrumento de contrato é obrigatório nos casos de concorrência e de tomada de
preços, bem como nas dispensas e inexigibilidades cujos preços estejam compreendidos nos
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
13
se aceita prorrogação tácita na administração pública uma vez que isso implica em
contrato verbal, que pela legislação que rege os contratos administrativo é nulo”5.
Reitere-se que os documentos denominados “declaração de prestação
de serviço”, bem como os despachos exarados pelo Controle Interno do DETRAN,
fazem parte dos processos de PAGAMENTO para empresa SERVI-SAN VIGILÂNCIA E
TRANSPORTE DE VALORES LTDA e foram encaminhados ao Ministério Público através do
ofício 1115/2017-PROJUR/DETRAN/PA, ou seja, além de prestar serviços sem contrato
ou licitação prévia, a referida empresa ainda recebeu vultuosas quantias do erário por
isso, porém, sem que fosse possível adequada fiscalização pelos órgãos de controle,
por não existir instrumento que delimitasse as exatas obrigações e prazos que
deveriam ser cumpridos, em contrapartida aos pagamentos efetuados.
Sobre o tema, merecem transcrição as palavras da melhor doutrina:
“Na seara administrativa, os contratos, por regra, devem ser escritos, em
obséquio ao princípio da indisponibilidade do interesse público, em vista
do qual os agentes administrativos, por não disporem da coisa pública,
não podem proceder em relação a ela tal qual procedem em relação
aos seus assuntos particulares. Por isso, em tributo ao aludido princípio,
impõe-se aos agentes administrativos uma série de formalidades para o
gerenciamento da coisa pública, a fim de evitar distorções e
deturpações, a fim de protegê-la.6
Posto isto, não restam dúvidas de que a manutenção de prestadora de
serviço, sem qualquer contrato administrativo firmado, corresponde a ilegalidade de
extrema gravidade, que deve ser atribuída ao Diretor Geral do DETRAN, Agostinho
Queiroz Soares, o qual autorizou os pagamentos e se quedou inerte, diante de tal
absurda situação.
II.4 – DA ANÁLISE SOBRE A DISPENSA DE Nº 11/2014.
Depois de todas as absurdas situações aqui já delineadas, uma nova
Diretora Geral do DETRAN/PA, Sra. Glaura Iolanda Brito Pires, foi empossada e logo
limites destas duas modalidades de licitação, e facultativo nos demais em que a Administração
puder substituí-lo por outros instrumentos hábeis, tais como carta-contrato, nota de empenho
de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço. 5 TCU - Decisão nº 344/1995 - Plenário 6 NIEBUHR. Joel de Menezes. Licitação pública e contrato administrativo. Belo Horizonte: 4ª ed.
Fórum, 2015 p.833.
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
14
teve que realizar mais uma dispensa de licitação, sob o nº 11/2014, baseada, também,
no art. 24, IV, da Lei Federal 8.666/93, que resultou no contrato emergencial nº 61/2014,
agora com a Empresa C&S Vigilância, assinado em 30/09/2014, conforme publicação
no D.O. E, acostada a fl. 5759, do Inquérito civil que instrui essa exordial.
Tal dispensa de licitação ocorreu menos de 03 meses depois que a Sra.
Glaura Iolanda Brito Pires Pires assumiu o cargo de Diretora Geral do DETRAN/Pa,
quando já havia sido estabelecida pelo seu antecessor a absurda situação da
empresa SERVI-SAN estar recebendo dinheiro público para realizar serviços de guarda
e vigilância armada dos prédios e áreas do DETRAN/PA, sem qualquer procedimento
licitatório prévio ou, pior, sem contrato administrativo firmado. Assim, é certo que essa
prestação de serviço essencial, sem contrato formal, se tratava de uma situação que
precisava de solução jurídica imediata, ainda que precária, o que justificou, portanto,
a realização de nova dispensa e contrato emergencial, tal como foi acima descrito.
Vale observar que a Sra. Glaura Iolanda Brito Pires não se utilizou dessa
forma de contratação excepcional para prosseguir nas ilegalidades iniciadas pelos
seus antecessores, pois, ao invés disso, adotou medidas para sanear, em definitivo, a
situação, exarando a Portaria 277/2014, publicada no D. O. E. em 11/09/2014 (fl. 5758),
na qual ela determinou a criação de comissão de sindicância para apurar as
responsabilidades de quem de direito, bem como ordenou o início do trâmite de um
novo e urgente procedimento licitatório, sem prejuízo da imediata substituição da
Empresa prestadora de serviço SERVI-SAN, que vinha obtendo benefícios a mais de UM
ANO E MEIO, com base nas contratações ilícitas aqui delineadas.
Por fim, em 23/12/2014, foi publicado no D. O. E. (fl. 5761), o extrato do
contrato nº 104/2014, decorrente da Concorrência nº 05/2014, em que foram
contratados serviços de guarda e vigilância armada pelo DETRAN/PA, sendo a
vencedora do certame a empresa C&S Vigilância e Segurança Patrimonial LTDA, o
que pôs fim à sequência de graves ilegalidades aqui descritas, não obstante a
modalidade ideal para o caso fosse a realização de pregão eletrônico, tal como
determina o Decreto Estadual nº 0199/20037.
7 Art. 2º Os contratos celebrados pelo Estado, para a aquisição de bens e serviços comuns,
serão precedidos, prioritariamente, de licitação na modalidade de pregão, que se destina a
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
15
III – DO DIREITO
III.1) DA ILEGALIDADE DAS DISPENSAS DE LICITAÇÃO AQUI APURADAS: “EMERGÊNCIAS
FABRICADAS”.
A licitação tem um perfil constitucional e, como instituto jurídico, os seus
traços e contornos estão fixados na Lei Maior. Desse modo, o traço mais importante da
licitação, à luz da Constituição, é o de representar um DEVER, conforme disposto no
inc. XXI, do art. 37, da Carta Magna.
Como forma de regular, especificamente, o instituto da licitação, adveio
a Lei 8.666/93, a qual estabeleceu que a Administração Pública, inclusive na esfera
estadual, deve observar o regime licitatório para a contratação de serviços.
Ressalte-se, contudo, que a teor do artigo 2º da Lei 8.666/93, é possível
que, somente nos casos excepcionais, por ela especificados, poderia o poder público
efetuar contratações diretamente, sem que realizasse o procedimento licitatório, por
meio de dispensas e inexigibilidades.
Dentre as causas de dispensa do procedimento licitatório, vale ser posta
em relevo, aquela que se fundamenta em situações de emergência, descrita no inc.
IV, do art. 24 da Lei 8.666/93, a seguir transcrito:
“Art. 24. É dispensável a licitação:
[…]
IV – nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando
caracterizada urgência de atendimento de situação que possa
ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança das pessoas, obras,
serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente
para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou
calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser
concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e
ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade,
vedada a prorrogação dos respectivos contratos” (grifei).
A lei estabeleceu, dessa forma, que para o Administrador dispensar a
licitação, com fundamento no inciso IV do Artigo 24, da Lei 8.666/93, deve o mesmo
obedecer todos os seus requisitos, quais sejam: a) a existência de uma situação de
garantir, por meio de disputa justa entre os interessados, a compra mais econômica, segura e
eficiente.
SERVIÇOS COMUNS
30. Serviços de Vigilância e Segurança Ostensiva
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16
emergência; b) observância do prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias e; c)
improrrogabilidade do respectivo contrato.
Trata-se, portanto, de uma hipótese legal que deve ser interpretada de
forma prudente, pois vários administradores utilizam da mesma, como meio de fraudar
a obrigatoriedade de licitação, tal como ocorreu no caso das dispensas nº 2/2013 e nº
15/2013. É o que nos ensina a doutrina mais autorizada:
“A hipótese merece interpretação cautelosa. A contratação
administrativa pressupõe atendimento às necessidades coletivas e supra-
individuais. Isso significa que a ausência da contratação representaria
um prejuízo para o bem público. Se inexistisse um interesse em risco, nem
caberia intervenção do Estado. A atividade pública não pode ser
suprimida ou diferida para o futuro. Afinal, essa são características
inerentes à Administração Pública. Na generalidade dos casos em que o
Estado dispõe-se a contratar, é motivado a atuar para evitar dano
potencial. Toda e qualquer contratação administrativa retrata a
necessidade e a conveniência de uma atuação conjugada entre o
Estado e terceiros. Uma interpretação ampla do inc. IV acarretaria, por
isso, a dispensa de licitação como regra geral. O argumento da urgência
sempre poderia ser utilizado. Ora, a ausência de licitação não constitui a
regra, mas a exceção. O inc. IV deve ser interpretado à luz desse
princípio.”8
Assim, percebe-se que a situação de emergência, que autoriza a
contratação direta é aquela excepcional, que realmente necessite de pronto
atendimento, pois a demora poderia por em risco valores relevantes tutelados pelo
ordenamento, tais como, a vida, a segurança ou integridade física das pessoas.
Todavia, não se confunde com situação de emergência, aqueles casos
em que a própria incúria do Administrador gera o risco de sacrifício aos bens jurídicos
ou quando se trata problema pertencente a realidade ordinária, inerente a qualquer
administração, ou seja, incapaz de justificar, à luz da razoabilidade, a inobservância
da regra geral, correspondente ao dever de licitar.
Sobre o assunto bem anota o administrativista e procurador do Ministério
Público de Contas, Lucas Rocha Furtado9:
8 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos. 11ª edição. Dialética. São
Paulo: 2005. p.238. 9 FURTADO, Lucas Rocha. Curso de licitações e contratos administrativos, 4ª ed. atual. Belo
Horizonte, Editora Fórum, 2012.
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
17
“É preciso que a situação de urgência ou de emergência seja
imprevisível. Seria absolutamente descabido que o administrador,
sabendo que determinada situação iria ocorrer, e que sua ocorrência
obrigaria a celebração do devido contrato, não adotasse as medidas
necessárias à realização do procedimento licitatório. Jamais a inércia do
administrador poderá justificar a adoção de contratos emergenciais,
conforme já observamos.”
Outra lição que não pode passar ao largo, é a de Marçal Justen Filho10:
“(...) a urgência deve ser concreta e efetiva. Não se trata de urgência
simplesmente teórica. Deve ser evidenciada a situação concreta
existente, indicando-se os dados que evidenciam a urgência. Suponha-
se, por exemplo, uma aquisição de medicamentos a ser efetivada pela
Administração Pública. Colocada a questão em termos gerais, nunca
caberia a licitação. Sempre seria possível argumentar que a demora na
aquisição de medicamentos traria prejuízos à saúde pública. Como
decorrência, a aquisição de medicamentos nunca se sujeitaria a prévia
licitação. A solução é claramente equivocada, eis que o fundamental
reside na relação entre a necessidade a ser atendida e a solução
concreta adequada. Em muitos casos, a Administração dispõe de tempo
suficiente para realizar a licitação e promover o contrato que atenderá à
necessidade. O problema reside na impossibilidade de aguardar o
tempo necessário à licitação para adquirir os remédios. A demonstração
da necessidade concreta significa que a Administração deve indicar as
quantidades necessárias de medicamentos para atender aos doentes e
as quantidades de que dispõe em estoque.”
Dos escólios acima transcritos se extraem conclusões que se entrelaçam,
quais sejam: a dispensa emergencial terá vez quando o prazo para o atendimento do
interesse público não for compatível com o tempo de dar cabo a um procedimento
licitatório, devendo a situação de urgência ter a nota da imprevisibilidade, bem como
se configurar como urgência concreta e efetiva, devidamente comprovada nos
autos.
No caso em lume, contudo, conforme já descrito minuciosamente nos
tópicos acima, os serviços de guarda e vigilância armada dos prédios e áreas de
propriedade do Estado do Pará, sob utilização e administração do DETRAN/PA, eram
prestados de maneira continuada e sem interrupções, no mínimo, desde a celebração
do contrato administrativo nº 13/2008, oriundo de licitação prévia, o qual, inclusive,
10 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, 12ª ed., São
Paulo, Editora Dialética, 2008.
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
18
teve o final de sua vigência prorrogado múltiplas vezes, de modo que isso dava toda a
condição de ser realizada licitação em tempo hábil, desde que os agentes públicos e
servidores responsáveis não tivessem agido com incúria ou com o objetivo de
privilegiar a empresa SERVI-SAN VIGILÂNCIA E TRANSPORTE DE VALORES LTDA, para que
continuasse a se beneficiar com dinheiro público.
Com efeito, as dispensas nº 2/2013 e nº 15/2013 e os contratos
emergenciais daí decorrentes, não foram resultados de situações imprevisíveis e
emergenciais, pois o que se percebe com a evolução do processo licitatório nº
2012/411257 – incialmente instaurado para subsidiar a contratação posterior ao
contrato administrativo nº 13/2008 – é que não houve o mínimo cuidado para tratá-lo
com a celeridade devida, ficando parado em alguns setores por mais de 30 dias, para
um mero despacho, o que ocorreu, principalmente, quando estava sob os cuidados
da CPL, com a Pregoeira Patrícia Regina Leotty da Cunha, ou no setor jurídico do
DETRAN, com o seu procurador chefe Antônio Villar P. Júnior.
De fato, o Requerido Antônio Villar P. Júnior foi, inclusive, o responsável
direto pela mantença do processo licitatório nº 2012/411257, por 156 dias na
Procuradoria Jurídica, apenas para ratificar que a modalidade a ser adotada era o
Pregão (fl. 5126, do I. C. nº 000177-116/2013 – Vol. 16), dando ensejo a considerável
diminuição do tempo hábil para conclusão deste feito.
Nesse ponto, vale frisar, que o fiscal do contrato nº 13/2008, conforme
esclarecido em tópicos acima, informou sobre o término do contrato administrativo nº
13/2008, COM SEIS MESES DE ANTECEDÊNCIA, o que seria prazo razoável para que
houvesse a licitação, conforme demonstrado, inclusive, pela velocidade com que a
Diretora Geral do DETRAN, Glaura Iolanda Brito Peres, conseguiu regularizar a situação
das múltiplas dispensas já delineadas nesta exordial, pois finalizou certame licitatório
em menos de quatro meses, a partir do início da sua fase interna. A situação em
comento é, portanto, bem típica e enquadrável em uma “urgência fabricada”.
Corroborando tudo quanto exposto, merece transcrição a seguinte
doutrina sobre o tema:
“Mais tarde, vai distinguir a emergência ‘real’, resultante do
imprevisível, daquela resultante da incúria ou inércia administrativa, ou
seja, ‘a emergência fabricada’. A ambas a Lei dá idêntico tratamento,
no que se refere à possibilidade de contratação direta. Porém, não
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
19
exime o responsável pela falha administrativa de sofrer as sanções
disciplinares compatíveis, nos casos de ‘emergência fabricada’ ou
produzidas por negligência. Em nosso entender, somente dessa forma
ficaria satisfeito o princípio da moralidade administrativa: isto é, se
realmente, responsabilizado for o funcionário que deu causa à
situação surgida.11”
Outrossim, mesmo levado em consideração o fato de que os certames
para serviço de vigilância são tumultuados por conta do alto valor envolvido e da
forte pressão do sindicato que representa as empresas, isso não configura surpresa de
nenhuma espécie, de modo que são comuns e previsíveis os pedidos de
esclarecimentos e impugnações, o que deixa inconteste o fato de que faltou um
mínimo de planejamento e priorização nas contratações que aqui foram objeto de
apuração. Corroborando o exposto, merece ser destacado o seguinte:
“Como se sabe, a realização de qualquer atividade pela
Administração Pública, bem como as despesas dela decorrentes,
devem ostentar planejamento prévio, não sendo dado ao
administrador de verbas públicas aguardar período próximo à
realização de evento para justificar eventual dispensa de licitação em
face da urgência da contratação, acaso não tenha procedido com as
cautelas para que essa urgência não ocorresse.
Veja-se que tal situação, de “urgência provocada”, não se confunde
com a ocorrência de uma intempérie natural ou mesmo uma
catástrofe provocada pela atividade humana, sendo estas
justificativas, sim, plausíveis para a dispensa do procedimento
licitatório em razão da urgência.”12
No mais, causa estranheza o imbróglio que girou em torno da
modalidade de licitação a ser escolhida, já que desde no ano de 2003, por força do
Decreto Estadual nº 0199/200313, a prioridade é que os órgãos do Estado do Pará
utilizassem a modalidade pregão para aquisição de bens e serviços comuns, sendo o
11 FIGUEIREDO, Lúcia Valle; FERRAZ, Sérgio, IN: NIEBUHR. Joel Menezes. Dispensa e Inexigibilidade
de Licitação Pública. Belo Horizonte: 4ª ed. Fórum, 2015, p.264. 12 BRASIL. Tribunal de Justiça do Espírito Santo. Apelação cível nº 0001536-49.2009.8.08.0061.
Apelante: Renato Afonso Zucollotto e Elieser Rabello. Apelado: Ministério Público Estadual.
Relator: Desembargador Substituto Lyrio Regis De Souza Lyrio. 2 de setembro de 2014. 13 Art. 2º Os contratos celebrados pelo Estado, para a aquisição de bens e serviços comuns,
serão precedidos, prioritariamente, de licitação na modalidade de pregão, que se destina a
garantir, por meio de disputa justa entre os interessados, a compra mais econômica, segura e
eficiente.
SERVIÇOS COMUNS
30. Serviços de Vigilância e Segurança Ostensiva
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
20
serviço de vigilância e segurança ostensiva, taxado como comum no item “30” do
mencionado Decreto. Ainda em 2008, o Decreto Estadual 967/200814, tornou o Pregão
Eletrônico obrigatório para aquisição de bens e serviços comuns, não havendo,
portanto, no ano de 2012/2014, motivo para tanto questionamento por parte do setor
de licitação quanto a modalidade a ser adotada15.
Aqui, vale transcrever a mensagem de veto nº 638 de 17 de julho de
2002, alterando a legislação que pretendia excluir serviço de vigilância da seara de
“bens e serviços comuns”:
“Senhor Presidente do Senado Federal,
Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do §1º do art. 66 da
Constituição Federal, decidi vetar parcialmente o Projeto de Lei de
Conversão no 19, de 2002 (MP no 2.182-18/01), que “Institui, no âmbito
da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, nos termos do art. 37,
inciso XXI, da Constituição Federal, modalidade de licitação
denominada pregão, para aquisição de bens e serviços comuns, e dá
outras providências”. O Ministério do Planejamento, Orçamento e
Gestão propõe veto ao seguinte dispositivo: Caput do art. 2 “Art. 2º
Pregão é a modalidade de licitação para aquisição de bens e serviços
comuns pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, conforme
disposto em regulamento, qualquer que seja o valor estimado da
contratação, na qual a disputa pelo fornecimento é feita por meio de
propostas e lances em sessão pública, vedada sua utilização na
contratação de serviços de transporte de valores e de segurança
privada e bancária. ..........................................................”
Razões do veto “A redação adotada implicará na proibição da
contratação de serviços de vigilância por meio do pregão, com
impacto indesejável sobre os custos e a agilidade de procedimentos
que estão atualmente em plena disseminação. Com efeito, a
utilização do pregão na contratação desses serviços é praticada com
sucesso desde sua criação, por Medida Provisória, em agosto de 2000.
Ressalte-se que os serviços de vigilância são item de expressiva
importância nas despesas de custeio da Administração Federal, o que
impõe a busca de procedimentos que intensifiquem a competição e
possibilitem a redução de custos. No âmbito da administração direta,
autárquica e fundacional, avultam a R$295,95 milhões anualmente,
conforme dados de 2001. Não existe impedimento de ordem técnica
14 Art. 4° Na aquisição de bens e serviços comuns no âmbito da Administração Direta e Indireta,
deverá ser utilizada obrigatoriamente a modalidade licitatória de pregão eletrônico. 15 Alguns pregões presenciais: nº 11/2008/Defensoria Pública, 07/2008/SECTET – Secretaria de
Estado de Ciência, Tecnologia e Educação Técnica e Tecnológica, 05/2008/ EGPA – Escola de
Governança Pública do Estado do Pará. Pregões Eletrônicos: nº 06/2009/COHAB – Companhia
de Habitação, nº 6/2009/SEMA – Secretaria de Meio Ambiente, nº 8/2009/SEAD – Secretaria de
Administração.
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
21
à aplicação do pregão, uma vez que há larga experiência de
normatização e fixação de padrões de especificação do serviço e de
acompanhamento do seu desempenho. A Administração Federal tem
regulamentação específica a respeito, por meio da Instrução
Normativa MARE no 18/97, que orienta as licitações de serviços de
vigilância. O Decreto nº 3.555/00, que regulamentou o pregão, incluiu
no rol dos bens e serviços comuns, os serviços de vigilância ostensiva.
Dessa forma, o pregão tem sido opção adotada cada vez mais pelos
gestores de compras. Já foram realizados 103 pregões para
contratação de serviços de vigilância em 30 órgãos, representando
valores de R$37,86 milhões. Mesmo a forma mais avançada do pregão
eletrônico, que pressupõe o encaminhamento de planilhas e de
documentação por meio eletrônico, já tem sido adotada para a
contratação de vigilância, registrando-se até esta data a realização
de 4 certames, pela Advocacia-Geral da União – AGU, Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, Ministério dos Transportes e
Instituto Nacional do Seguro Social – INSS. Estes dados são consistente
evidência da conveniência e viabilidade de aplicação da nova
modalidade de licitação aos serviços de vigilância.” Estas, Senhor
Presidente, as razões que me levaram a vetar o dispositivo acima
mencionado do projeto em causa, as quais ora submeto à elevada
apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.”
Nesse contexto, é perceptível que mais do que negligência dos
Requeridos – sejam os Diretores Gerais do DETRAN, ora processados, ou os servidores
que diretamente deram causa ao retardo injustificado, também responsabilizados
neste processo – existem fortes elementos de convicção que indicam verdadeiro dolo
no cometimento das ilegalidades aqui constatadas. Essa percepção de que havia
uma intenção de beneficiar a empresa SERVI-SAN, com a prática de todas essas
ilegalidades foi corroborada pela absurda admissão pelo Diretor Geral do DETRAN
Agostinho Queiroz Soares de que tal empresa prestasse serviço, sem ter celebrado
qualquer contrato administrativo.
Releva observar, que é predominante o entendimento doutrinário,
jurisprudencial e do TCU de que o contrato, ainda que para uma situação
emergencial, tem que ser sempre realizado, pois causaria um prejuízo muito maior
para a sociedade não o fazer, de modo que não restam dúvidas de que o gestor
deve ser responsabilizado por ter dado causa à situação.
“Havendo risco de lesão a interesses, a contratação deve ser
realizada, punindo-se o agente que não adotou as cautelas
necessárias. A questão apresenta relevância especialmente no
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
22
tocante à comumente denominada “emergência fabricada”, em que
a Administração deixa de tomar tempestivamente as providências
necessárias à realização da licitação previsível.16
A dispensa de licitação também se mostra possível quando a situação
de emergência decorrer da falta de planejamento, da desídia
administrativa ou da má gestão dos recursos púbicos, pois a inércia do
gestor, culposa ou dolosa, não pode vir em prejuízo de interesse
público maior tutelado pela Administração. Nessas situações, contudo,
o reconhecimento da situação de emergência não implica convalidar
ou dar respaldo jurídico à conduta omissiva do administrador, a quem
cabe a responsabilidade pela não realização da licitação em
momento oportuno.17
A jurisprudência, outrora admitindo amplamente a caracterização da
emergência, vem restringindo a sua amplitude de tal modo que, na
atualidade, o balizamento sobre a sua utilização está bastante
definido. Mais recentemente, na última década firmou-se a tese de
que é necessário apurar responsabilidade quando a emergência tem
causa na negligência ou má gestão.18
Por último, não é demais mencionar que no Inquérito Civil nº 002132-
116/2013, o ofício nº 53/2017 – DBM/MPC/PA, de fl. 1316, expedido pelo Ministério
Público de Contas do Estado do Pará, encaminhando, através de CD-ROM, o Parecer
MPC – DBM nº 135/2017, Relatório de Fiscalização referente a auditoria programada
realizada no DETRAN (pasta 6, volume II) e outros documentos, há afirmação expressa
de que as dispensas de licitação emergenciais nº 02/2013 e 15/2013 foram realizadas
em decorrência da falta de planejamento e indicando a responsabilização dos
gestores.
III.2) DA POSSIBILIDADE DE SER RESPONSABILIZADO CONSULTOR JURÍDICO QUE ATUA EM
DISPENSAS INDEVIDAS de LICITAÇÃO.
Inicialmente, deve ser esclarecido e sedimentado, que é plenamente
possível a responsabilização do Procurador-Chefe do DETRAN, ANTONIO VILLAR
PANTOJA JUNIOR, em decorrência de suas decisivas condutas, que resultaram nas
contratações irregulares aqui descritas. De fato, além de procrastinar
16 JUSTEN FILHO. Op. Cit. pag. 479 17 Acórdão 2240/2015 - 1ª Câmara - TCU 18 JACOBY FERNANDES. Jorge Ulisses. Contratação direta sem licitação. Belo Horizonte: 10ª ed.
Fórum, 2016 p.261.
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
23
consideravelmente os atos que lhe cabiam, chegando a ficar absurdos 156 (cento e
cinquenta e seis) dias para emitir simples parecer sobre questão já avaliada (fl. 5126) –
anteriormente e no mesmo processo – pelo departamento jurídico do DETRAN, ele
também acabou produzindo pareceres sem adequada fundamentação, que foram
favoráveis à realização das ilegais dispensas de licitação nº 2/2013 e nº 15/2013.
Some-se a isso, inclusive, que tal consultou jurídico ainda exarou parecer
no sentido de que fosse anulado o procedimento licitatório nº 2012/411257, porém,
sem justificativas mínimas para tanto (fls. 5571/5575), o que, ressalte-se, foi situação de
fundamental importância para a “fabricação de urgências”, aqui já delineadas,
usadas para embasar as ilegalidades cometidas pelos demais envolvidos.
Não se olvida, também, que os pareceres técnicos emitidos pelos
consultores jurídicos, no âmbito dos procedimentos administrativos, via de regra, têm
apenas caráter opinativo, exceto, contudo, quando tal manifestação for de existência
obrigatória, pois, nesse caso, sua ausência pode, inclusive, dar ensejo à nulidade do
ato final. Essa foi, portanto, exatamente a situação em comento, pois em
procedimentos de dispensa de licitação, é essencial a expedição de parecer
jurídico, ex vi do disposto no art. 38, VI, da Lei nº 8.666/93.
O artigo 50 da Lei 9.784/99, que regula procedimento administrativos,
traz, inclusive, uma lista de atos em que a motivação é obrigatória, prevendo
expressamente, em seu inciso IV, os atos que declarem a dispensa de processo
licitatório. Ademais, no parágrafo primeiro do referido dispositivo, consta, inclusive,
que: “a motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em
declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações,
decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato”.
Não há como desconsiderar, portanto, que no caso de dispensas de
licitação, o parecer técnico embasa a decisão do Gestor Público, de modo que é ato
de enorme relevância, além de ser obrigatório.
Nesse contexto, é oportuno destacar que a Suprema Corte, no âmbito
do Mandado de Segurança nº 24.584/DF, de relatoria do Ministro Marco Aurélio,
reconheceu a responsabilidade do advogado, no tocante à prestação de
esclarecimentos perante o Tribunal de Contas, nas hipóteses do parágrafo único do
art. 38 da Lei de Licitações (Art. 38. [...] Parágrafo único. As minutas de editais de
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
24
licitação, bem como as dos contratos, acordos, convênios ou ajustes devem
ser previamente examinadas e aprovadas por assessoria jurídica da
Administração.), in verbis:
EMENTA: ADVOGADO PÚBLICO - RESPONSABILIDADE - ARTIGO 38 DA
LEI Nº 8.666/93 - TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO -
ESCLARECIMENTOS.Prevendo o artigo 38 da Lei nº 8.666/93 que a
manifestação da assessoria jurídica quanto a editais de licitação,
contratos, acordos, convênios e ajustes não se limita a simples opinião,
alcançando a aprovação, ou não, descabe a recusa à convocação do
Tribunal de Contas da União para serem prestados esclarecimentos. (STF,
MS 24.584/DF, Pleno, Rel. para acórdão Min. Ricardo Lewandoski, j.
09/08/2007, DJ 20/06/2008).
Nessa oportunidade, os Ministros da Corte Suprema enveredaram pela
discussão acerca da responsabilidade do parecerista, ressaltando, na ocasião, que os
advogados não haviam proferido “simples peça opinativa”, mas sim, peça de
“aprovação [...] de convênios e aditivos”, aplicando-se à situação o disposto no art.
38, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93. O Ministro Joaquim Barbosa, em seu voto,
cuidou de extremar as situações. Vejamos:
“[...] no atual momento da jurisprudência do STF, eu acredito que seja
possível formular as seguintes premissas para o exame de questões como
a presente:
a) Nos casos de omissão legislativa, o exercício de função
consultiva técnico-jurídica meramente opinativa não gera
responsabilidade do parecerista. [...]
b) Nos casos de definição, pela lei, de vinculação do ato
administrativo à manifestação favorável no parecer técnico-
jurídico, a lei estabelece efetivo compartilhamento do poder
administrativo de decisão, e assim, em princípio, o parecerista
pode vir a ter que responder conjuntamente com o administrador,
pois ele é também administrador nesse caso.”
O Professor Marçal Justen Filho19, por sua vez, assim comenta a finalidade
da exigência do parágrafo único do art. 38:
[...] O parecer jurídico é um ato de controle de legalidade e
conveniência da atividade administrativa licitatória e contratual.
Portanto, a exigência da manifestação prévia da assessoria jurídica tem
duas finalidades jurídicas.
Em primeiro lugar, trata-se de impedir que uma atuação defeituosa seja
consumada. O asssessor jurídico tem o dever de identificar os defeitos de
19 JUSTEN FILHO, 2014, op cit, p. 689.
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
25
legaldiade, avaliar o cumprimento das exigências formais e outras
questões, que serão adiante mais bem expostas. Desse modo, o parecer
confirmará a presença dos requisitos de validade ou identificará a sua
ausência, permitindo que a autoridade competente adote a decisão
mais conforme a ordem jurídica.
Por outro lado, a necessidade de manifestação da assessoria jurídica
desincentivará a prática de atos irregulares, precipitados, não
satisfatórios. Tal se passará porque os demais integrantes da esfera
administrativa terão consciência de que a assessoria jurídica reprovará
práticas defeituosas.
[...]
Assim, admite-se a inclusão do parecerista como demandado na ação
de improbidade, quando este tem o dever de controlar previamente a
legalidade dos atos a ele submetidos para análise. Incumbe ao Consultor
Jurídico o dever de identificar a ilegalidade e MANTER-SE FIRME EM SEU
POSICIONAMENTO, pois do contrário subsidiará o ato administrativo
ímprobo.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça caminha no sentido da
possibilidade de responsabilização do advogado público pelos pareceres jurídicos que
elabora (REsp 1183504/DF).
O parecer jurídico obrigatório pela legislação responsabiliza o causídico,
o procurador; e, sem dúvida nenhuma, esta repercussão ante a Lei resguarda a
probidade administrativa, aliás, alerta e compromete o exercício do procuratório
jurídico, no âmbito dos entes públicos.
Observa-se que no caso em lume, o procurador chefe do DETRAN, ora
demandado, foi conivente com seus superiores, facilitando a burla ao princípio da
obrigatoriedade da licitação, ou, no mínimo, suas manifestações caracterizaram o
chamado erro crasso, que faz incidir ao menos a culpa na situação, a qual encontra,
do mesmo modo, enquadramento no art. 10 da Lei n. 8.429/92, conforme será melhor
delineado nos tópicos seguintes dessa peça processual.
O advogado e professor Fábio Medina Osório, em esplêndida obra
resultante de sua tese de doutorado, analisa a repercussão dos chamados atos de
opinião, no âmbito da matéria objeto da Lei n. 8.429/92, nestes termos:
“Com relação aos atos de opinião, cabe dizer que não só os atos de
decisão podem produzir improbidade administrativa, mas também os
atos que, transbordando os limites razoáveis do engano funcional
possível, penetram no campo da ilegalidade com o presumível propósito
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
26
ilícito de dar base indevida a uma decisão desonesta, distorcida ou
intoleravelmente incompetente.
Não é possível descartar a responsabilidade dos pareceres na produção
da improbidade administrativa. Pelo contrário, em uma Administração
Pública crescentemente especializada, com assessoria técnica de toda
índole, é necessário ampliar o leque de potenciais responsáveis, sob
pena de que se construam barreiras de imunidade, partindo de
roupagens oferecidas por uma assessoria viciada e irresponsável, para
dizer o mínimo, quando não coautora e cúmplice dos ilícitos perpetrados.
Negar a responsabilidade dos pareceristas, especialmente quando forem
funcionários públicos, insertos, pois, na estrutura da chamada advocacia
pública, equivaleria a consagrar imunidade ilegal e inconstitucional aos
gestores públicos, reforçando nichos de impunidade.
Não se vê nenhum fundamento normativo, nos textos ou na
jurisprudência, para excluir, a priori, toda e qualquer possibilidade de
responsabilidade dos pareceristas, na prática de atos ímprobos em
concurso de pessoas. O princípio constitucional da responsabilidade,
ínsito à República e à isonomia dos cidadãos perante o ordenamento
jurídico, não exclui determinadas transgressões tão somente em razão de
suas roupagens formais. Sabe-se que um parecer, num contexto real de
funcionamento da Administração Pública, pode ser equivalente a uma
decisão. Basta notar a plausibilidade das razões jurídicas invocadas na
peça redigida pelo parecerista. Como se pode reparar há um conjunto
de fatores que merece análise, não se podendo descartar de plano a
responsabilidade desses atores funcionais tão relevantes.
A relação causal admite, pois, perfeitamente, o encaixe dos atos
opinativos, desde que assumam relevância tal que justifique esse
enquadramento. É claro que, diferentemente dos atos decisórios, os
pareceres exigem uma valoração mais aprofundada sobre seu
significado e impacto na produção do resultado injusto. Quer dizer que
os atos decisórios também ensejam tal processo valorativo, porém seu
encaixe na LGIA é mais direto, em face da própria natureza do ato, ao
passo que os pareceres demandam uma análise mais sofisticada e
onerosa do ponto de vista argumentativo. Pode-se dizer que a relação
causal, nessa última hipótese, se dá num plano mais indireto, assumindo
importância a dimensão do parecer no contexto geral da ilicitude,
inclusive no bojo de uma coautoria ou participação de terceiros20.
O Professor Marçal Justen Filho21 comentando a responsabilidade da
assessoria jurídica assim se pronuncia:
[...] Ao examinar e aprovar os atos da licitatção, a assessoria jurídica
assume responsabilidade pessoal solidária pelo que vier a ser praticado,
20 OSÓRIO, Fábio Medina. Teoria da Improbidade Administrativa – Má gestão pública,
Corrupção, Ineficiência, 3ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, pgs. 253/254. 21 JUSTEN FILHO, op cit, pp. 691/692.
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
27
nos limites do desempenho das funções técnico-jurídicas. Como todo e
qualquer profissional, o advogado responde pela correção técnica dos
seus atos. Não existe situação de irresponsabilidade profissional para o
assessor jurídico. Isso não significa, no entanto, que o assessor possa ser
responsabilizado por defeitos ou falhas a ele não imputáveis.
[...] Em face do caso concreto, o parecerista deve examinar a
orientação prevalente da doutrina e da jurisprudência. Cabe-lhe o dever
de informação e de atualidade, de modo a conhecer, de modo
completo e exaustivo, as diversas alternativas admitidas como aceitáveis
pelos órgãos de pacificação do direito.
[...] O assessor jurídico tem o dever de conhecer tecnicamente o direito,
de dominar as variáveis existentes e de prever as decorrências das
alterantivas disponíveis.
[...] Não existirá atuação satisfatória se o assessor jurídico afirmar a
validade de uma solução que, em face da doutrina e da jurisprudência,
é reputada como defeituosa.
E, continua, citando a jurisprudência do Tribunal de Contas da União,
destacando-se os seguintes arestos:
Ao completo arrepio das exigências legais, sem que restasse
caracterizada a urgente necessidade de realização das obras para a
salvaguarda da segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos ou
outros bens, os pareceristas jurídicos manifestaram concordância com a
contratação emergencial por dispensa. Ademais, relatórios técnicos
anteriores à manifestação dos responsáveis davam conta de que o
escopo contratual não estaria restrito às obras de reforma nos elementos
estruturais do estádio.
De fato, diferente seria o cenário se os serviços contratados por dispensa
a título de emergência fossem aqueles efetivamente adstritos ao controle
e à prevenção de eventual colapso estrutural, como os serviços de
escoramento. Contudo, o objeto do contrato emergencial não deixa
dúvidas de que a abrangência das intervenções ultrapassa aquela
atinente à situação emergencial indicada pelos responsáveis. Juízo de
baixo teor técnico, que não poderia fugir aos pareceristas.
É relevante ainda para caracterizar a culpabilidade dos responsáveis, o
fato de que as patologias verificadas no estádio foram fruto da ausência
de manutenção ao longo dos anos, situação essa constatada por laudos
técnicos registrados no processo de contratação.
Considero, nesse cenário, que as manifestações aduzidas pelos
pareceristas foram determinantes para a consumação da irregular
dispensa licitatória. Devem, portanto, ser apenados com a multa prevista
no artigo 58 da Lei 8.443/92 [...] (TCU, Acórdão nº. 513/2013, Plenário, rel.
Min. Ana Arraes, 13/03/2013).
[...] Muito embora esse mesmo parecer alerte para a necessidade de
observância dos requisitos estabelecidos no mencionado artigo 26,
parágrafo único, da Lei de Licitações, ao final concluiu pela inexistência
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
28
de óbices na contratação direta em questão, conquanto inexistissem nos
autos as referidas justificativas exigidas em lei, conforme alertado pelo
Núcleo Setorial de Controle Interno (...) Assim, entendo caracterizada a
responsabilidade do recorrente (...) o ato do queixante contribuiu para
consumação da irregularidade praticada pelo gestor (TCU, Acórdão
1.964/20010, 1ª Câmara, rel. Min. Augusto Nardes, 20/04/2010).
Na mesma esteira, o CPC/2015 passou a dispor expressamente a respeito
da responsabilidade do advogado público:
Art. 182. Incumbe à Advocacia Pública, na forma da lei, defender e
promover os interesses públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios, por meio da representação judicial, em todos os
âmbitos federativos, das pessoas jurídicas de direito público que
integram a administração direta e indireta.
(...)
Art. 184. O membro da Advocacia Pública será civil e regressivamente
responsável quando agir com dolo ou fraude no exercício de suas
funções
No mesmo sentido, a Instrução Normativa Conjunta AGE/SEFA n°.
002/2013, de 06 de dezembro de 2013, “dispõe sobre a definição de procedimentos
adicionais a serem observados pelos Órgãos/Entidades integrantes do Poder Executivo
Estadual por ocasião da Prestação de Contas de Gestão de Recursos Públicos
Estaduais Anual junto ao Tribunal de Contas do Estado – TCE”, e informa do rol de
responsáveis, para sua apreciação e deliberação final:
CAPÍTULO I - ROL DE RESPONSÁVEIS (Art. 4º do RITCEPA)
Art. 2º. Serão considerados responsáveis pela gestão de recursos
públicos estaduais os titulares e seus substitutos que desempenharem,
durante o período a que se referirem as contas, as funções inerentes a, se
houver:
I. Dirigente máximo da Unidade Gestora;
II. Ocupante de cargo de direção no nível de hierarquia
imediatamente inferior e sucessivo ao do Dirigente de que trata o
inciso anterior;
III. Ordenador(es) de despesa designado(s);
IV. Responsável(is) pela Consultoria, Procuradoria ou Assessoria
Jurídica;
V. Gestor financeiro, tesoureiro ou equivalente;
VI. Contador responsável pela gestão contábil do respectivo
Órgão/Entidade;
VII. Responsável pela Unidade de Controle Interno;
VIII. Agentes Públicos de Controle – APC’s;
IX. Contador Responsável;
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
29
X. Responsáveis pela conformidade de registro de gestão;
XI. Responsável pelo setor de patrimônio;
XII. Responsável pelo setor de almoxarifado;
XIII. Responsável pelo setor de arrecadação, quando a UG for
detentora de receita;
XIV. Gestor responsável pela “alimentação” do Sistema SISPAT;
XV. Gestor responsável pela “alimentação” do Sistema GPPARÁ;
Parágrafo único. O rol de responsáveis acima não é exaustivo e
deverá ser elaborado com base na estrutura de cargos da Unidade
Gestora, e a ela deverá ser adaptado.
Por todas as razões acima expostas, não há dúvida sobre a possibilidade
de responsabilização do Procurador-Chefe do DETRAN, ANTONIO VILLAR PANTOJA
JUNIOR, que participou diretamente das dispensas licitatórias ora analisada.
III.3) DO ENQUADRAMENTO DAS CONDUTAS APURADAS, COMO IMPROBIDADES
ADMINISTRATIVAS.
III. 3.1) – Improbidade por violação de Princípios Constitucionais.
A Constituição Federal estabelece que os agentes públicos, responsáveis
por gerir o erário e os bens públicos, deverão obedecer aos princípios da legalidade,
moralidade e eficiência, dentre outros (Artigo 37, caput CF/88).
O mestre Celso Antônio Bandeira de Mello ensina que:
“Violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma. A
desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico
mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais
grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão
do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o
sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível
a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.” (Curso de
Direito Administrativo, Malheiros Editores, pag. 136).
Nesse sentido, a Constituição Federal, no artigo 37, dispõe que:
“Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte...”
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
30
Só o fato dos Gestores Walter Wanderley de Paula Pena e Agostinho
Queiroz Soares, ora Requeridos, realizarem reiteradas contratações diretas, fora da
hipótese de situação emergencial, e justificá-las em indevidas dispensas de licitação,
baseadas em “urgências fabricadas”, o que foi feito com o auxílio de Patrícia Regina
Leotty da Cunha e Antônio Villar P. Júnior, servidores de setores estratégicos do
DETRAN, isso já configura uma clara improbidade, notadamente, por ter ocorrido por
02 (duas) vezes seguidas, em um curto espaço de tempo. Aliás, pior que isso e,
portanto, bem mais grave – enquanto elemento definidor da ilegalidade – foi a
prestação de serviços, sem qualquer contrato formal, com o recebimento de vultuosos
valores, o que fere frontalmente as disposições da Lei 8.666/93 e o art. 37, inc. XXI, da
Constituição Federal.
Claro está, portanto, que estas contratações diretas foram, no mínimo,
uma forma de atender negociatas imorais, já que foram feitas fora das exceções
legais e de maneira constante, de modo que os Requeridos, talvez, acreditassem na
falta de fiscalização dos órgãos competentes ou na impunidade, que alimenta esse
tipo de conduta, em todas as esferas públicas.
Neste contexto, as contratações diretas ou sem contrato formal, que
foram minuciosamente descritas e analisadas nesta exordial, configuram-se em atos
de improbidade, pela violação de princípios administrativos, nos termos do art. 11, inc.
I, da Lei 8.429/92, conforme a seguir transcrito:
“Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra
os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que
viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade
às instituições, e notadamente:
I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou
diverso daquele previsto na regra de competência”
Dentre os princípios violados pelos Requeridos, podemos citar os
princípios da LEGALIDADE, da MORALIDADE, da ISONOMIA e da EFICIÊNCIA.
Violado está o princípio da legalidade, na medida que os Requeridos
deixaram de realizar ou contribuíram decisivamente para não realização de
procedimento licitatório, quando era sua obrigação atuar de forma diversa (feriu-se,
também, o princípio da OBRIGATORIEDADE DA LICITAÇÃO, previsto no Artigo 37, inciso
XXI da Constituição da República).
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
31
Igualmente, ferida a legalidade, quando o Requerido Agostinho Queiroz
Soares violou o disposto nos arts. 6022 e 6223 da Lei 8.666/93, não formalizando contratos
administrativo e autorizando pagamentos para empresa que prestou serviços ao
DETRAN, sem qualquer vinculação formal com o órgão.
A moralidade administrativa, por sua vez, também foi transgredida de
forma abrupta pelos Requeridos, enquanto Diretores e servidores do DETRAN, pois a
eles cabia, além de cumprir a letra da Lei, atender ao espírito de conduta ética que
deve nortear seu comportamento funcional. No entanto, de forma contrária à boa-fé
efetuaram contratos diretos, ferindo o postulado básico da necessidade de buscar
sempre o bem comum, o que foi feito, certamente, para beneficiar a empresa SERVI-
SAN.
A ofensa ao princípio da isonomia não oferece dúvidas. Ao agirem no
sentido de inviabilizarem à realização de um processo licitatório, para, ao final,
efetuarem contratações diretas ou até sem contrato formal, os Requeridos deixaram
de dar reais oportunidades à todos os administrados que poderiam ter interesse em
prestar os serviços, notadamente por envolverem vultuosas quantias. De fato, isto é
tratar de forma desigual quem se encontra em uma mesma situação!. Se as licitações
tivessem ocorrido da forma que manda a lei, a todos seria dada a oportunidade de
participar dos certames e celebrar os contratos respectivos com o DETRAN. Todavia,
assim não foi feito e, consequentemente, não foi possível serem realizados os
contratos, que decorressem das propostas que melhor atendessem aos interesses
públicos.
22 Art. 60. Os contratos e seus aditamentos serão lavrados nas repartições interessadas, as quais
manterão arquivo cronológico dos seus autógrafos e registro sistemático do seu extrato, salvo
os relativos a direitos reais sobre imóveis, que se formalizam por instrumento lavrado em cartório
de notas, de tudo juntando-se cópia no processo que lhe deu origem.
Parágrafo único. É nulo e de nenhum efeito o contrato verbal com a Administração, salvo o de
pequenas compras de pronto pagamento, assim entendidas aquelas de valor não superior a
5% (cinco por cento) do limite estabelecido no art. 23, inciso II, alínea "a" desta Lei, feitas em
regime de adiantamento. 23 Art. 62. O instrumento de contrato é obrigatório nos casos de concorrência e de tomada de
preços, bem como nas dispensas e inexigibilidades cujos preços estejam compreendidos nos
limites destas duas modalidades de licitação, e facultativo nos demais em que a Administração
puder substituí-lo por outros instrumentos hábeis, tais como carta-contrato, nota de empenho
de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço.
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
32
Ora, quando se realiza uma licitação afastam-se arbitrariedades na
seleção do contratante, pois se emprega tratamento igualitário às situações uniformes.
É objetivo da licitação assegurar a observância ao princípio da isonomia e, como nos
casos que aqui delineados não houve a licitação obrigatória, prejudicado está tal
princípio.
Não restou também cumprido o princípio constitucional que exige
eficiência do administrador em suas ações. O núcleo do princípio da eficiência se
resume na produtividade com economicidade. É evitar o desperdício do dinheiro
público, o que, não se coaduna com condutas como realizar procedimento licitatório,
durante vários meses, para, ao final, simplesmente anulá-lo, por razões de
oportunidade e conveniência, tampouco se adequa ao comportamento de realizar
contratações, sem procedimento licitatório, o qual permitiria ampla concorrência
entre os interessados e, por óbvio, a obtenção de melhores propostas. Some-se a isso,
que também viola a eficiência, a conduta de manter procedimentos por dezenas de
dias, para serem efetuados simples despachos, notadamente, em situações de
urgências, devidamente informadas, e nas quais a gravidade “salta aos olhos”.
Não restam dúvidas, portanto, que os atos dos Requeridos violaram
diversos princípios administrativos, o que por si só, já permite com que sejam
caracterizados como improbidades administrativas, conforme se manifesta a mais
abalizada jurisprudência sobre o tema:
“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA – CONTRATO VERBAL – URGÊNCIA – DISPENSA DE
LICITAÇÃO – NÃO COMPROVAÇÃO – ATO DE IMPROBIDADE
CONFIGURADO – EXPRESSA PREVISÃO LEGAL – ART. 10, VIII, LEI N. 8.429/92
– VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – ISONOMIA –
LIVRE CONCORRÊNCIA – LEGALIDADE – EFICIÊNCIA – MORALIDADE – ART.
11, LEI N. 8. 429/92 – ATO DE IMPROBIDADE CONFIGURADO – RECURSO
IMPROVIDO Configura ato de improbidade a realização de contrato
verbal, sem obediência às regras de licitação. Os atos de improbidade
administrativa descritos no artigo 11, da Lei nº 8429/92, dependem da
presença do dolo genérico, mas dispensam a demonstração da
ocorrência de dano para a Administração Pública ou enriquecimento
ilícito do agente. (TJ-MS - APL: 08014494620118120007 MS 0801449-
46.2011.8.12.0007, Relator: Des. Marcelo Câmara Rasslan, Data de
Julgamento: 01/12/2015, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação:
02/12/2015)
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
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“Ementa: AÇÃO CIVIL PÚBLICA Improbidade administrativa – Prefeito
Municipal - Lei 8.429/92 - Aplicabilidade: - O prefeito municipal responde
por atos de improbidade na forma da Lei 8429/92 – AÇÃO CIVIL PÚBLICA
- Improbidade administrativa - Dispensa de licitação - Lesão ao erário -
Legalidade - Moralidade - Impessoalidade - Possibilidade: - Houve dano
material ao erário, no caso presente, a justificar a condenação com
fundamento no ari 10. VIII. da Lei de Improbidade - Mesmo quando
ausente lesão ao erário na dispensa de licitação, ficando provada a
ofensa aos princípios da legalidade, da moralidade e da
impessoalidade, a condenação se justifica com fundamento no art. 11
da mesma lei” grifei (TJ SP. Processo Apelação Com Revisão 6595315200.
Relatora: Teresa Ramos Marques. 10ª Câmara de Direito Público.
Julgamento: 10/08/2009).
Por sua vez, a má-fé dos Requeridos e o seu dolo de proceder com
violação de princípios, já foram delineados minuciosamente nos tópicos anteriores,
notadamente quando se observa a quantidade de dispensas ilegais realizadas e, ao
final, a prestação de serviços sem contrato, celebrado com empresa SERVI-SAN
VIGILÂNCIA E TRANSPORTE DE VALORES LTDA, que foi beneficiária direta dessas
ilegalidades e, portanto, totalmente envolvida nas improbidades aqui tratadas, pois
sabedora que realizava serviços sem ter assinado qualquer contrato administrativo e
sem jamais ter participado de licitação.
II.2.2.) – IMPROBIDADE PELA EXISTÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO.
Estabelece o Artigo 10, inciso VIII da Lei nº 8.429/92:
“Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao
erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda
patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos
bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e
notadamente:
[…]
VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo
seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins
lucrativos, ou dispensá-los indevidamente;” (grifei).
Assim, na hipótese do agente frustrar a licitude de um processo licitatório
ou dispensá-lo indevidamente, tal como no caso em lume, será possível a aplicação
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das sanções decorrentes da prática do ato ímprobo, ainda que não pudesse ser feita
a exata quantificação da lesão ao erário.
De fato, o Superior Tribunal de Justiça entende, atualmente, que há dano
ao erário pela ausência do devido processo licitatório, na medida em que o Poder
Público deixa de, por condutas de administradores, contratar a melhor proposta.
Senão vejamos:
STJ: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL.
IMPROBIDADE. FRAUDE À LICITAÇÃO. VIOLAÇÃO DO ART.5º DA LEI
8.429/92. NÃO OCORRÊNCIA. ALEGADA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO
CONTRATADO. PERÍCIA. AUSÊNCIA DE CONSTATAÇÃO. DANO IN RE IPSA.
RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. POSSIBILIDADE. 1. No que tange à
possibilidade de imposição de ressarcimento ao erário, nos casos em
que o dano decorrer da contratação irregular proveniente de fraude a
processo licitatório, como ocorreu na hipótese, a jurisprudência desta
Corte de Justiça tem evoluído no sentido de considerar que o dano,
em tais circunstâncias, é in re ipsa, na medida em que o Poder Público
deixa de, por condutas de administradores, contratar a melhor
proposta. Precedentes: REsp 1.280.321/MG, Rel. Ministro Mauro
Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 9/3/2012. AgRg nos EDcl no
AREsp 419.769/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma,
julgado em 18/10/2016, DJe 25/10/2016. REsp 1.376.524/RJ, Rel.
Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 2/9/2014, DJe
9/9/2014.
2. O entendimento externado pelo Tribunal de origem alinha-se ao que
vem sendo perfilhado nesta Corte de Justiça sobre o tema.
3. Mesmo que assim não fosse, verifica-se dos autos que, em
cumprimento à diligência requerida, a perícia apontou irregularidade na
prestação de serviço de contabilidade, que foi executado de forma
indireta pelo Sr. Hélio Rubens Tavares Martinez, e não pela empresa
licitante. Ademais, apesar de o serviço ter sido iniciado e entregue no
prazo contratual, não havia atestado de recebimento emitido pelo
servidor responsável por conferir os serviços, conforme determina os arts.
62 e 63 da Lei Federal n. 4.320/1964, ficando, por isso, comprometida a
regular liquidação. Constata-se, dessa forma, que a prestação do serviço
não esteve imune a irregularidades.
4. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp 728.341/SP, Rel.
Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/03/2017, DJe
20/03/2017)
STJ: ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92. FRACIONAMENTO INDEVIDO DE
LICITAÇÃO. FRUSTRAÇÃO DE COMPETITIVIDADE. DANO AO ERÁRIO E
PRÁTICA DE ATO DE IMPROBIDADE. OCORRÊNCIA. MEMBRO DA
COMISSÃO DE LICITAÇÃO MUNICIPAL. RECURSO ESPECIAL PROVIDO
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PARA, EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL, RESTABELECER A
SENTENÇA DE PRIMEIRO GRAU, QUE RECONHECEU A PRÁTICA DE ATO
ÍMPROBO E A SITUAÇÃO IRREGULAR DO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO.
1. Pretende a União restabelecer a condenação de Paulo Eduardo
Martins por ato de improbidade administrativa, com a consequente
condenação de ressarcimento ao erário.
2. Em vez de realizar a licitação na modalidade Tomada de Preços,
compatível com os valores do convênio, a Comissão Licitante do
Município de São José da Laje fracionou o objeto da licitação, de modo
a tornar possível a adoção da modalidade convite, em dois
procedimentos apartados - convite nº 016/2002, para aquisição do
veículo tipo Van, e o convite nº 17/2002, para aquisição dos
equipamentos odontológicos para a ambulância, permitindo, assim, a
escolha das empresas participantes dos certames. Após realização de
auditoria, constataram-se diversas irregularidades no procedimento
licitatório.
3. Da análise dos autos, observam-se presentes elementos concretos
aptos a infirmar as conclusões adotadas no acórdão recorrido, através
de simples valoração da prova produzida nos autos, o que afasta a
incidência da Súmula 7/STJ.
4. Os autos reforçam a irregularidade apontada. Isso porque, quando
levado em consideração o fato de que a empresa DIVEPEL - Distribuidora
de Veículos e peças Ltda. participou de ambos os procedimentos
licitatórios (convite 016/2002 e convite 017/2002), sendo convidada
pela comissão licitante, evidencia-se a possibilidade de
procedimento licitatório único, a fim de garantir o melhor preço. A
situação denota não só a existência de empresa que forneça ambos os
objetos, como também o expresso conhecimento do fato por parte da
Comissão Licitante.
5. Tudo isso leva à conclusão inafastável da ocorrência de ato ímprobo,
uma vez que a Comissão Licitante, a fim de frustrar a competitividade
da licitação e os princípios que regem o tema, fracionou o
procedimento, ensejando dano ao erário.
6. O STJ possui o entendimento de que, em casos como o ora analisado,
o prejuízo ao erário, na espécie (fracionamento de objeto licitado, com
ilegalidade do procedimento licitatório), que geraria a lesividade apta a
ensejar a nulidade e o ressarcimento ao erário, é in re ipsa, na medida
em que o Poder Público deixa de, por condutas de administradores,
contratar a melhor proposta. Precedente: REsp 1.280.321/MG, Rel. Ministro
Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 9.3.2012.
7. Recurso Especial provido para, em consonância com o parecer
ministerial, restabelecer a sentença proferida em primeiro grau, que
reconheceu a prática de ato ímprobo e a situação irregular do
procedimento licitatório. (REsp 1622290/AL, Rel. Ministro HERMAN
BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2016, DJe 19/12/2016)
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Assim, por meio de simples interpretação gramatical, pode-se afirmar
que toda ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio,
apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres dos entes
descritos no art. 1º da Lei de Improbidade Administrativa, constituirá ato de
improbidade administrativa que causa lesão ao erário, conforme expresso,
literalmente, no art. 10 da Lei n.º 8429/92.
No caso em lume, contudo, além de comprovadas as indevidas
dispensas de procedimento licitatório, conforme já delineado em tópicos anteriores,
também foram minuciosamente destacados os danos ao erário decorrente da
prestação de serviços ao DETRAN, sem qualquer contrato, ou seja, sem que pudesse
ser feita qualquer fiscalização sobre o cumprimento dos serviços acordados, pela fata
de instrumento formal.
Ora, como se paga por serviços de correntes de contrato inexistente!.
Todos os pagamentos à título de “indenizações” para SERVI-SAN VIGILÂNCIA E
TRANSPORTE DE VALORES LTDA, em decorrência de seus supostos serviços prestados,
foram feitos ilegalmente e, portanto, teriam que retornar aos cofres do DETRAN. Não se
trata, aqui de enriquecimento da administração pública, pois isso ao remunerar
serviços ilegalmente realizados, o DETRAN prejudicou duplamente os cofres públicos,
considerando que além de não contratar com aquele que daria a melhor proposta,
também pagou por algo que nem mesmo tinha como fiscalizar, já que não haviam
parâmetros contratualmente estabelecidos.
É esclarecedora a lição de Sérgio Ferraz e Lúcia Figueiredo, a seguir
transcrita:
“quem gastar em desacordo com a Lei, há de fazê-lo por sua conta,
risco e perigo. Pois, impugnada a despesa, a quantia gasta
irregularmente terá de retornar ao erário público. Não caberá a
invocação, assaz de vezes realizada, de enriquecimento da
Administração. Ter-se-ia, consoante essa linha de argumentação,
beneficiado com a obra, serviço e fornecimento, e, ainda mais, com o
recolhimento dos responsável ou responsáveis pela despesa
considerada ilegal”.24
24 Citado na Apelação Cível n. 570605 5/2-00, Comarca de Itaporanga, julgada no dia 28 de
abril de 2008, relator Desembargador Pires de Araújo.
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Releva frisar, também, que para incidência do art. 10, da Lei de
improbidade, nem mesmo se debate sobre o elemento subjetivo da conduta dos
agentes envolvidos, ou seja, se agiram por negligência ou intencionalmente, com
base em interesse escuso.
Assim, não se admite que aqueles que ocupantes de cargos e funções
públicas não assumam suas responsabilidades, face omissões, negligência ou desídia,
que causem danos ao erário. Assim entende o Superior Tribunal de Justiça: “Diante das
Leis de Improbidade e de Responsabilidade Fiscal, inexiste espaço para o
administrador "desorganizado" e "despreparado", não se podendo conceber que um
Prefeito assuma a administração de um Município sem a observância das mais
comezinhas regras de direito público. Ainda que se cogite não tenha o réu agido com
má-fé, os fatos abstraídos configuram-se atos de improbidade e não meras
irregularidades, por inobservância do princípio da legalidade” (REsp 708170/MG, Rel.
Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2005, DJ 19/12).
Ad argumentandum tantum, no mínimo, houve aqui, clara culpa dos
envolvidos nos danos ao erário decorrentes das contratações nulas de prestadora de
serviço beneficiária (empresa SERVI-SAN) por vultuosas quantias, pois é certo que os
gestores Walter Wanderley de Paula Pena e Agostinho Queiroz Soares, com o claro
auxílio e convivência de Patrícia Regina Leotty da Cunha e Antônio Villar Pantoja
Júnior, ora Requeridos, foram negligentes e desidiosos em não dar a celeridade
devida a procedimento licitatórios, gerando dispensas ilegais, bem como autorizando
o pagamento de serviços, se nem mesmo a realização de contrato formal.
Com efeito, conforme já exaustivamente descrito nas análises feitas em
tópicos anteriores, sobre as dispensas licitatórias e contratações sem instrumento
algum, celebradas com a empresa SERVI-SAN, o que se observou é que cada um dos
Requeridos atuou decisivamente e diretamente para concretização de tais
ilegalidades, seja autorizando expressamente com que fossem cometidas, ou
procrastinando absurdamente os atos que lhe cabiam, ainda que fossem simples
despachos, e até executando condutas desnecessárias e repetitivas, quanto a
questões já dirimidas (modalidade licitatória cabível, por exemplo), de modo que
jamais se concluísse algum procedimento licitatório e, com isso, continuasse a se
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perpetuar o beneficiamento indevido de empresa privada, com o recebimento de
vultuosas quantias.
Desta feita, sob qualquer prisma que se olhe, não restam dúvidas de que
os Requeridos devem responder, judicialmente, com base nos fatos e provas colhidas
e aqui historiadas, havendo, inclusive, elementos de convicção, já delineados, de que
agiam com dolo e má-fé durante as ilegalidades, porém, no mínimo, com clara culpa,
decorrente de suas absurdas negligências.
Posto isto, caracterizada está a incidência da lei de improbidade
também nessa situação, diante do efetivo prejuízo ao erário, decorrente das dispensas
indevidas de licitação e contratação sem instrumento formal, todas oriundas de atos e
omissões dos Requeridos, sendo que esse montante do prejuízo foi de R$ 20.810.810,7
(vinte milhões, oitocentos e dez mil, oitocentos e dez reais e sete centavos),
correspondente aos valores pagos pelo DETRAN em razão dos ilegais contratos
emergenciais nº 61/2014 e nº 17/2013, ao que se somaram, ainda, outras vultuosas
quantias pagas sem contrato, que foram devidamente quantificadas, conforme
lançamentos extraídos do sistema SIAFEM do ESTADO do PARÁ, descritos em tópico
anterior.
III – DO PEDIDO LIMINARES DE INDISPONIBLIDADE DE BENS
A medida liminar de Indisponibilidade de Bens está em consonância com
o art. 37, § 4°, da Constituição Federal, e veio regulada expressamente pela Lei
8.429/92, in verbis:
Artigo 7°. Quando o ato de improbidade causar lesão aopatrimônio
público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade
administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério
Público, para aindisponibilidade dos bens do indiciado.
Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere ocaput deste
artigo recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento
do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do
enriquecimento ilícito.
(...)
Artigo 16. Havendo fundados indícios deresponsabilidade, a comissão
representará ao Ministério Público ou à procuradoria do órgão para que
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requeira ao juízo competente a decretação do sequestro dos bens do
agente ou terceiro que tenha enriquecido ilicitamente ou causado dano
ao patrimônio público.
Os fundados indícios de responsabilidade do ato de improbidade
administrativa, representativos do fumus boni iuris da medida, encontram-se
devidamente comprovados no caso em lume, por meio dos documentos acostados
aos autos.
Quanto ao periculum in mora, a melhor doutrina entende seja ele
presumido, tratando-se de responsabilização por atos de improbidade. Nessa linha,
impende destacar o magistério do eminente Wallace Paiva Martins Júnior, in verbis:
A indisponibilidade de bens exige os pressupostos gerais da medida de
cautela (fumus boni juris epericulum in mora), considerando que o
periculum in mora é presumido porque o § 4° do artigo 37 da Constituição
Federal, ao determinar de modo expresso que 'os atos de improbidade
administrativa importarão... a indisponibilidade dos bens e o
ressarcimento ao erário...' (sublinha-se), e sendo a primeira figura
nitidamente acautelatória – diversamente da segunda -, evidentemente
manda presumir, em relação a ela, o requisito do 'periculum in mora'. O
dispositivo constitucional demonstra claramente a imprescindibilidade da
providência quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio
público. Daí a razão do artigo 7° da Lei n° 8.429/92 não esclarecer quais
os requisitos exigíveis para a sua concessão, diferentemente de outras
medidas acautelatórias.
Realmente, a indisponibilidade de bens dos Requeridos, em quantos
forem necessários ao ressarcimento integral do dano, no valor total de R$ 20.810.810,7
(vinte milhões, oitocentos e dez mil, oitocentos e dez reais e sete centavos), até o
julgamento definitivo do mérito da causa, nos termos admitidos pelo art. 18, da Lei
Federal 8.429/92, é medida imprescindível para evitar que haja ocultação de
patrimônio após iniciada essa demanda, ou até a produção de insolvência, para se
furtar à responsabilidade, impedindo que, ao final, o patrimônio seja recomposto.
Para execução da medida, requer, em consequência, a expedição de
ofícios à Secretaria da Receita Federal, ao Banco Central do Brasil, à Junta Comercial
do Pará, ao DETRAN-Pa e ao Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Belém,
com o fim de bloquear os valores ou bens patrimoniais que correspondam ao
montante do dano ao erário.
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IV- D O S P E D I D O F I N A I S
Face ao exposto, vem requerer se digne Vossa Excelência a:
1 – Deferir, inaudita altera pars, o pedido liminar apresentado em
epígrafe, em todos os seus termos, de modo a ser efetivada a
indisponibilidade dos bens dos Requeridos: WALTER WANDERLEY DE
PAULA PENA; AGOSTINHO QUEIROZ SOARES; PATRÍCIA REGINA
LEOTTY DA CUNHA; ANTÔNIO VILLAR PANTOJA JÚNIOR; e da
Empresa SERVI-SAN VIGILÂNCIA E TRANSPORTE DE VALORES LTDA
(filial), de CNPJ sob o nº. 12.066.015/0006-46, em quantidade e
valor suficientes para garantir o ressarcimento integral do dano
causado aos cofres públicos, aqui quantificado em R$ 20.810.810,7
(vinte milhões, oitocentos e dez mil, oitocentos e dez reais e sete
centavos);
2 – Julgar procedente a presente ação civil pública, com a imposição
cumulativa de todas as sanções previstas para o art. 10, VIII e 11, II,
delineadas no art. 12, inciso II e III, da Lei Federal 8.429/92, ante a
ocorrência de agressões aos princípios constitucionais e dano ao
erário, causados pelas condutas dos Requeridos, especialmente:
2.1 – Condenar WALTER WANDERLEY DE PAULA PENA, AGOSTINHO
QUEIROZ SOARES, PATRÍCIA REGINA LEOTTY DA CUNHA, e ANTÔNIO
VILLAR PANTOJA JÚNIOR a perda da função pública, a suspensão
dos direitos políticos de 05 (cinco) a 08 (oito) anos e ao
pagamento de multa civil, de até 02 (duas) vezes o valor do dano;
2.2 – Condenar WALTER WANDERLEY DE PAULA PENA, AGOSTINHO
QUEIROZ SOARES, PATRÍCIA REGINA LEOTTY DA CUNHA, e ANTÔNIO
VILLAR PANTOJA JÚNIOR e a Empresa SERVI-SAN VIGILÂNCIA E
TRANSPORTE DE VALORES LTDA (filial) ao ressarcimento integral do
dano, cujo montante correspondente a R$ 20.810.810,7 (vinte
milhões, oitocentos e dez mil, oitocentos e dez reais e sete
centavos), quantia essa, que deverá ser atualizada
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monetariamente pelos índices oficiais e acrescida dos juros legais,
desde o dia em que foi indevidamente gasta;
3 – A citação dos Requeridos para, querendo, contestarem a presente
ação, dentro do prazo legal, sob pena de revelia;
4 – A intimação pessoal do Ministério Público de todos os atos e termos
processuais, nos termos do art. 270, § único, do novo Código de
Processo Civil;
5 – A produção de todas as provas em Direito admitidas, a serem
requeridas oportunamente.
Dá-se a causa o valor de R$ 20.810.810,7 (vinte milhões, oitocentos e
dez mil, oitocentos e dez reais e sete centavos);
São os termos em que pede deferimento.
Belém, 06 de abril de 2018.
DANIEL HENRIQUE QUEIROZ DE AZEVEDO 1º Promotor de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e Moralidade Administrativa