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1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Goioerê/PR 1 EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE GOIOERÊ/PR. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, presentado pelo órgão de execução que esta subscreve, no uso de suas atribuições previstas no art. artigo 25, inciso IV, alínea “b”, da Lei federal 8.625/93, e com fundamento nos artigos 37, § 4º e inciso XXI, 127, “caput”, e 129, inciso III, da Constituição Federal, nos artigos 1º, inciso IV, e 5º, da Lei nº 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), e demais disposições da Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), em defesa da moralidade e legalidade administrativas e do patrimônio público, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, para propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA 1 em face de REINALDO KRACHINSKI (Prefeito Municipal de Quarto Centenário/PR), brasileiro, nascido aos 06.04.1955, brasileiro, casado, nascido em 06/04/1955, filho de Aparecida Ferreira Lisboa, inscrito no CPF sob nº 329.708.119-87, com endereço na Avenida Raposo Tavares, nº 594, Centro (Prefeitura Municipal), Quarto Centenário/PR, pelos fatos e fundamentos a seguir aduzidos. 1 Lastreada nos autos de Procedimento Preparatório nº MPPR-0055.13.000121-1, incluso (dois volumes, contendo 209 folhas)

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1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Goioerê/PR

1

EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA VARA CÍVEL

DA COMARCA DE GOIOERÊ/PR.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, presentado

pelo órgão de execução que esta subscreve, no uso de suas atribuições previstas

no art. artigo 25, inciso IV, alínea “b”, da Lei federal 8.625/93, e com fundamento

nos artigos 37, § 4º e inciso XXI, 127, “caput”, e 129, inciso III, da Constituição

Federal, nos artigos 1º, inciso IV, e 5º, da Lei nº 7.347/85 (Lei da Ação Civil

Pública), e demais disposições da Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade

Administrativa), em defesa da moralidade e legalidade administrativas e do

patrimônio público, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, para propor

a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA1

em face de REINALDO KRACHINSKI (Prefeito Municipal de

Quarto Centenário/PR), brasileiro, nascido aos 06.04.1955, brasileiro, casado,

nascido em 06/04/1955, filho de Aparecida Ferreira Lisboa, inscrito no CPF sob nº

329.708.119-87, com endereço na Avenida Raposo Tavares, nº 594, Centro

(Prefeitura Municipal), Quarto Centenário/PR, pelos fatos e fundamentos a seguir

aduzidos.

1 Lastreada nos autos de Procedimento Preparatório nº MPPR-0055.13.000121-1, incluso (dois

volumes, contendo 209 folhas)

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1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Goioerê/PR

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I – BREVE SÍNTESE DOS FATOS

Servem de base à presente as peças informativas que encartam o

procedimento preparatório nº MPPR-0055.13.000121-1, instaurado aos

22.04.2013 por essa 1ª Promotoria de Justiça de Goioerê/PR, a partir de

informações oriundas dos autos de representação eleitoral nº 493/2008, dando

conta de que o Sr. Reinaldo Krachinski, ex-Prefeito Municipal de Quarto

Centenário (gestão 2005/2008), e Prefeito na atual gestão (2013/2016), teria

custeado com verba pública do ente político a feitura de propaganda eleitoral

impressa para utilização em sua candidatura à reeleição durante a campanha

eleitoral relativa ao pleito majoritário de 2008.

Ainda, dos informativos impressos constavam timbres da

administração pública municipal com os slogans “Quarto Centenário –

Construindo o futuro – Veja o que já foi feito por você – Administração:

Gestão 2005/2008” e “Terra que produz – Administração: Gestão 2005/2008”,

o que caracteriza flagrante desrespeito ao princípio da impessoalidade, uma vez

que aludidos informativos vinculavam a imagem e a gestão exercida pelo

requerido à frente do Município de Quarto Centenário.

Segundo se apurou dos autos, o ora requerido REINALDO

KRACHINSKI, utilizou-se indevidamente de verba pública daquela urbe para

custear a confecção de propaganda eleitoral (fls. 18/33).

Tais fatos, inclusive, porque representavam à época abuso de

poder político capaz de alterar a regularidade do processo eleitoral, ensejaram a

propositura de representação eleitoral sob nº 493/2008 junto ao Juízo da 92ª Zona

Eleitoral de Goioerê (fls. 08/203).

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Nos autos de representação eleitoral adrede mencionados, o

requerido alegou que os informativos eleitorais distribuídos no Município de Quarto

Centenário teriam sido por ele custeados, apresentando o recibo de pagamento

acostado à fl. 47, datado de 20.06.2008, em valor de R$ 3.250,00 (três mil

duzentos e cinquenta reais), emitido em seu favor pela Gráfica Ilustrada,

localizada na cidade de Umuarama/PR.

Contudo, após requisição do Juízo Eleitoral desta Comarca à

Gráfica Ilustrada para que fosse apresentada a respectiva nota fiscal, foi fornecido

o documento de fl. 83, qual seja, a nota fiscal nº 104738, datada de 03.07.2008,

dela constando valor idêntico ao apresentado no recibo fornecido pelo requerido,

em nome da Prefeitura Municipal de Quarto Centenário, inclusive constando

do documento o CNPJ da Administração.

Outrossim, constatou-se que referidas despesas havidas pelo

requerido com a Gráfica Ilustrada não foram declaradas pelo Requerido nos autos

de prestação de contas sob nº 666/2008 (cópia às fls. 104/146). Também, em que

pese a nota fiscal de fl. 83 descrever o serviço prestado ao Município de Quarto

Centenário como “Informativo Municipal”, verificou-se a inexistência do respectivo

empenho pago pela municipalidade.

Ainda, instado o representante da Gráfica Ilustrada a esclarecer se

os serviços descritos no recibo de fl. 47 e na nota fiscal de fl. 83 se referiam ao

mesmo objeto, sobreveio resposta por meio do expediente acostado à fl. 152 onde

o gerente da sobredita sociedade empresária, Sr. Mário Lago, afirmou que eram

referentes aos mesmos serviços.

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Veja-se que o requerido era Prefeito à época dos fatos e, ainda,

candidato à reeleição, o que, inarredavelmente, criava certa facilidade para

concretização dos citados ato ímprobos.

Considerando tais condutas, o requerido praticou atos de

improbidade administrativa previstos na Lei nº 8.429/92, conforme será visto a

seguir.

II – DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL e

DO CABIMENTO DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA DEDUZIR DEMANDA POR

ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

O Ministério Público é instituição constitucionalmente incumbida da

defesa do patrimônio público e dos interesses difusos, dentre os quais se poderia

arrolar a probidade administrativa e os princípios que devem reger a administração

pública (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência), tudo

conforme artigo 127, caput, 129, inciso III e 37, caput, § 4º, todos da Carta Maior.

A Legitimidade do órgão Ministerial para o ajuizamento de ação em

que se pretende a aplicação de punição pela prática de improbidade administrativa

encontra-se amparada tanto na Constituição da Republica como em leis

infraconstitucionais:

Art. 129 da CF. São funções institucionais do Ministério Público: (...) II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia; III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;

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Art. 17 da Lei 8.429/92. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar. Art. 68 da LC 85/99 PR. São atribuições do Promotor de Justiça: (...) VI - em matéria de Patrimônio Público: 1. instaurar inquérito civil e promover ação civil pública para a proteção do patrimônio público; 2. requerer as medidas judiciais, ou requisitar as administrativas de interesse da Promotoria; 3. ajuizar as ações cautelares em defesa do patrimônio público; 4. promover ações indenizatórias quando houver dano ao patrimônio público;

Na mesma esteira, é perfeitamente possível a aplicação da

sistemática da ação civil pública à ação em que se busca a punição pelo ato de

improbidade praticado, bem como o ressarcimento ao erário.

Conforme mencionado, o artigo 129, inciso III, da Constituição

Federal, e o artigo 25, IV, “b”, da Lei Federal nº 8.625/93, cometem ao Ministério

Público a promoção da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e

social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

A seu turno, a Lei nº 7.347/85, com a nova redação que lhe deu a

Lei nº 8.078/90, disciplina a ação civil pública, que também se destina à proteção

do patrimônio público, dentre outros interesses difusos e coletivos.

Se o Ministério Público detém a legitimidade para a propositura da

ação civil pública objetivando a proteção do patrimônio público, pode, para tanto,

nela formular qualquer tipo de pedido capaz de propiciar sua adequada e efetiva

tutela, com arrimo no artigo 21 da Lei nº 7.347/85, introduzido pelo artigo 117 da

Lei nº 8.078/90.

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Comentando a hipótese específica do cometimento de improbidade

administrativa, ensinam Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery na obra

“CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E LEGISLAÇÃO PROCESSUAL

EXTRAVAGANTE EM VIGOR”, Ed. RT, 1996, p. 1.406:

“Todo aquele que exerce cargo, emprego, função ou mandato, seja por

eleição, nomeação, contratação, designação ou por qualquer outra forma

de investidura, ainda que sem remuneração, em qualquer entidade ou

pessoa jurídica da administração direta, indireta ou fundacional, bem

como nas entidades mencionadas na LIA (Lei de Improbidade

Administrativa) – artigo 1º, caput, e § 1º - está sujeito à ACP para

reparação do dano, sequestro ou perdimento de bens havidos por

enriquecimento ilícito. A legitimação ativa para o ajuizamento da ACP em

face do agente político ou agente público, servidor ou não, é conferida ao

Ministério Público (CF, art. 129, III; LIA, arts. 16 a 18)”.

Indiscutível, portanto, a legitimidade do Ministério Público para a

defesa do patrimônio público e da probidade administrativa, utilizando-se da via

prescrita na Lei 7.347/85, o que vem sendo reconhecido pelos tribunais pátrios.

“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ART. 129, III, DA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL. EX-PREFEITO. ATO DE IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA.

1. O Ministério Público está legitimado à propositura da ação civil

pública em defesa de qualquer interesse difuso ou coletivo,

abarcando nessa previsão o resguardo do patrimônio público, com

supedâneo no art. 1.º, inciso IV, da Lei n.º 7.347/85, máxime diante do

comando do art. 129, inciso III, da Carta Maior, que prevê a ação civil

pública, agora de forma categórica, como instrumento de proteção do

patrimônio público e social (Precedentes: REsp n.º 861566, Relator Min.

Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 23/04/2008; REsp n.º 686.993/SP, Rel. Min.

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Eliana Calmon, DJU de 25/05/2006; REsp n.º 815.332/MG, Rel. Min.

Francisco Falcão, DJU de 08/05/2006; e REsp n.º 631.408/GO, Rel. Min.

Teori Albino Zavascki, DJU de 30/05/2005).

2. Legitimatio ad causam do Ministério Público à luz da dicção final

do disposto no art. 127 da CF, que o habilita a demandar em prol de

interesses indisponíveis, na forma da súmula nº 329, aprovada pela

Corte Especial em 02.08.2006, cujo verbete assim sintetiza a tese: "O

Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública

em defesa do patrimônio público".

3. Recurso especial provido para determinar o retorno dos autos ao

Tribunal de origem, a fim de que aprecie o recurso de apelação.” (STJ.

REsp 1086147/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado

em 02/04/2009, DJe 06/05/2009)

“EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

OPOSTOS DE DECISÃO DO RELATOR: CONVERSÃO EM AGRAVO

REGIMENTAL. CONSTITUCIONAL. MINISTÉRIO PÚBLICO. AÇÃO

CIVIL PÚBLICA PARA PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO PÚBLICO.

LEGITIMIDADE. CF, art. 129, III.

I. - Embargos de declaração opostos à decisão singular do Relator.

Conversão dos embargos em agravo regimental.

II. - Somente a ofensa direta à Constituição autoriza a admissão do

recurso extraordinário. No caso, o acórdão limita-se a interpretar normas

infraconstitucionais.

III. - O entendimento da Corte é no sentido de que o Ministério

Público está legitimado à propositura de ação civil pública em

defesa do patrimônio público. Precedentes.

IV. - Embargos de declaração convertidos em agravo regimental. Não

provimento desse.” (STF. AI 497618 ED, Relator(a): Min. CARLOS

VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 17/05/2005, DJ 17-06-2005 PP-

00072 EMENT VOL-02196-12 PP-02491)

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III - DA LEGITIMIDADE PASSIVA

De outro lado, a Lei 8.429/92 dispõe que será punido qualquer

agente público, servidor ou não (artigo 1º, caput), que pratique ato de improbidade

administrativa, considerando-se para efeitos da referida norma como agente

público, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração,

por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de

investidura ou vínculo, mandado, cargo, emprego ou função (artigo 2º) nas

entidades públicas.

Entre os agentes públicos sujeitos à Lei de combate a Improbidade

Administrativa, está, por certo, o Prefeito Municipal, sendo que, como

representantes do povo nessa esfera municipal, devem (ou deveriam) ser os

primeiros a zelarem, de forma intransigente, pela observância da Constituição

Federal e das leis brasileiras.

IV – DOS ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

A probidade administrativa é uma forma de moralidade

administrativa que consiste no dever do “funcionário servir à Administração com

honestidade, procedendo no exercício de suas funções, sem aproveitar os

poderes ou facilidades deles decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a

quem queira favorecer” (MARCELO CAETANO, apud JOSÉ AFONSO DA SILVA,

“Curso de Direito Constitucional Positivo”, ed. Malheiros, 9ª edição, 4ª tiragem, p.

571).

Segundo JOSÉ AFONSO DA SILVA, a improbidade administrativa

consiste “no dever do funcionário servir à Administração com honestidade,

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procedendo no exercício de suas funções, sem aproveitar os poderes ou

facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira

favorecer. Cuida-se de uma imoralidade administrativa qualificada. A improbidade

administrativa é uma imoralidade qualificada pelo dano ao erário e correspondente

vantagem ao ímprobo ou a outrem” (Direito Constitucional Positivo, 6ª edição, Ed.

RT, p. 563).

A todo servidor público é exigido certo padrão de conduta no

serviço ou mesmo fora dele, sob pena de sofrer determinada sanção.

O dever jurídico dos agentes públicos de observar os princípios

regentes da atividade estatal, é expresso no artigo 4º, da Lei nº 8.429/92, que

dispõe o seguinte:

Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a

velar pela estrita observância dos princípios de legalidade,

impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe

são afetos.

Tem-se assim, que os agentes públicos devem primar pela estrita

observância dos princípios constitucionais previstos no art. 37, caput, da

Constituição da República.

Os princípios, que são os alicerces da ciência jurídica, as bases

para toda a construção do Direito, já foram tidos como meros instrumentos de

interpretação e integração das regras legais. Era a estreiteza da visão positivista

que atribuía ao direito posto caráter preponderante em nossa ciência.

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Hoje, contudo, vivemos um período pós-positivista, sendo certo que

os princípios deixaram de ser vistos como mero complemento da regras e

passaram a ser também considerados normas cogentes (fazendo-se mister a

distinção entre normas princípios e normas disposições), impondo-se, sem dúvida,

sua estrita observância.

Ao interpretar a Constituição de 1891, RUI BARBOSA afirmou que

as cláusulas constitucionais são regras imperativas e não meros conselhos,

avisos ou lições.2

Ensina a doutrina que:

"Os princípios, a exemplo das regras, carregam consigo acentuado grau

de imperatividade, exigindo a necessária conformação de qualquer

conduta aos seus ditames, o que denota o seu caráter normativo (dever

ser). Sendo cogente a observância dos princípios, qualquer ato que deles

destoe será inválido, conseqüência esta que representa a sanção pra

inobservância de um padrão normativo cuja relevância é obrigatória."

(Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves, Improbidade

Administrativa, 2ª ed. 2004, Lumem Juris, p.43)

Os princípios constitucionais – conjunto de normas que alicerçam

um sistema e lhe garantem a validade – são a síntese dos valores precípuos da

ordem jurídica, posto que consubstanciam suas premissas básicas e indicam o

ponto de partida e os caminhos que devem ser percorridos.

2 apud RAUL MACHO HORTA, “Estrutura, Natureza e expansividade das Normas Constitucionais”, Revista

Trimestral de Direito Público, 4/1993, Ed. RT, p. 41.

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Nessa linha, conforme foi possível observar do caso concreto, o

agente público abandonou a observâncias do ordenamento jurídico, permitindo ou

praticando irregularidades que acabaram por gerar prejuízos ao erário.

a) DO DANO AO ERÁRIO

No caso que ora se apresenta à Justiça, é facilmente possível a

verificação do uso de verbas do erário municipal em proveito próprio por parte do

requerido, uma vez que, na qualidade de Prefeito Municipal à época, custeou com

tais verbas a impressão de propaganda eleitoral para sua candidatura à reeleição.

No curso da campanha eleitoral de 2008, sendo candidato à

reeleição do cargo de Prefeito do Município de Quarto Centenário, o ora requerido

providenciou e distribuiu na cidade um “informe municipal” (f. 18/32) com tentativa

clara de utilizá-la como forma de propaganda eleitoral.

Demonstração disso foi o fato de que o “informe” traz o que o

Prefeito e candidato fez e o que iria fazer. Conforme se observa da f. 23, 27 e da

última folha do “informe” (f 32) as informações e propostas são as mesmas

daquelas como “promessas” de campanha, conforme panfleto de campanha

juntado à f. 33/34, tornando evidente que o “informe municipal” seria um “santinho”

de propaganda.

Ademais, tanto é verdade que na representação eleitoral o ora

requerido, em sua defesa, limitou-se a dizer que não houve prova de que o

“informe” teria sido pago com verba pública e sim de que as “revistas” teriam sido

custeadas pelo então candidato. Em nenhum momento negou-se a intenção

eleitoreira do “informe” distribuído.

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Passado esse ponto e restando evidente que o “informe” ou a

“revista” na verdade teria proposta de campanha eleitoral, portanto, com fins

particulares, a irregularidade se mostra com o custeio do mesmo com o erário

municipal.

Conforme se observa dos autos de representação eleitoral, o

requerido alegou que os informativos eleitorais distribuídos no Município de Quarto

Centenário teriam sido por ele custeados, apresentando o recibo de pagamento

acostado à fl. 47, datado de 20.06.2008, em valor de R$ 3.250,00 (três mil

duzentos e cinquenta reais), emitido em seu favor pela Gráfica Ilustrada,

localizada na cidade de Umuarama/PR.

Contudo, após requisição do Juízo Eleitoral desta Comarca à

Gráfica Ilustrada para que fosse apresentada a respectiva nota fiscal, foi fornecido

o documento de fl. 83, qual seja, a nota fiscal nº 104738, datada de 03.07.2008,

dela constando valor idêntico ao apresentado no recibo fornecido pelo requerido,

em nome da Prefeitura Municipal de Quarto Centenário, inclusive constando

do documento o CNPJ da Administração.

Dessa forma, o recibo apresentado pelo requerido na

representação eleitoral, que já não serviria como prova pela sua informalidade,

acaba sendo rechaçada com a apresentação pela empresa da nota fiscal

contendo as verdadeiras informações do pagamento e da origem da verba.

Outrossim, constatou-se que referidas despesas havidas pelo

requerido com a Gráfica Ilustrada não foram declaradas pelo Requerido nos autos

de prestação de contas sob nº 666/2008 (cópia às fls. 104/146). Tal constatação

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evidencia, ainda mais, a utilização de verba pública em gastos particulares de

campanha eleitoral para reeleição do requerido.

Com base nessas circunstâncias, em primeiro grau de julgamento

da representação eleitoral mencionada, foi declarada a inelegibilidade do

investigado pelo prazo de 03 (três) anos. Diante disso, a Juíza Eleitoral

determinou a extração de cópias, ante a existência de indícios da prática do crime

do art. 1º, II do Decreto-Lei 201/67, com remessa ao Ministério Público. Na

sequência o órgão de execução encaminhou os autos à autoridade policial

requisitando a instauração de inquérito policial.

Ao que se verifica, em sede de julgamento de recurso eleitoral pelo

TRE/PR, houve modificação da sentença de primeiro grau, de forma que se

entendeu por ausente a potencialidade lesiva já que o candidato, então Prefeito,

teria perdido às eleições que disputou. Dessa forma, afastou-se a sanção de

inelegibilidade.

Contudo, o fato de ter havido a reforma da sentença do Juízo

Eleitoral não legitima a conduta do investigado. Nesse sentido, impõe-se destacar

o trecho do voto do Desembargador Relator do Recurso Eleitoral em questão:

“Nos autos não resta dúvida de que o custeio pelo informe

publicitário para divulgação de obras realizadas pelo ora

recorrente em sua gestão de 2005/2008 foi realizado pela

prefeitura, vez que a NF 4738, datada de 3 de julho de 2008, no

valor de R$3.250,00 (fls. 69) foi emitida em favor da prefeitura de

Quarto Centenário.”

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Na verdade, houve modificação da sentença apenas em razão da

falta de “potencialidade lesiva”.

Dessa forma, por parte deste órgão de execução foi extraída cópia

dos autos para providências à luz da Lei 8.429/92, dando ensejo ao procedimento

preparatório que lastreia a presente ação.

Havendo tal desvirtuamento de verbas do erário municipal

incorreria o requerido nos atos de improbidade descritos no art. 9º, caput e inciso

XII, da Lei nº 8.429/92, em razão do uso indevido de tais verbas em proveito

próprio.

Art. 9° Constitui ato de improbidade administrativa importando

enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial

indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou

atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente:

(...)

XII - usar, em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores

integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1°

desta lei.

Sem prejuízo, além do uso de verbas públicas em proveito próprio,

em se tratando de valores que cabiam ao Município, a ocorrência do dano também

configura ato de improbidade administrativa, trazidos na Lei 8.429/92.

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao

erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda

patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos

bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e

notadamente:

(...)

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IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei

ou regulamento;

(...)

XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas

pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular;

De fato, com a confecção das publicidades apontadas como

ilícitas, o requerido ordenou a realização de despesas não só não autorizadas em

lei ou regulamento, como ordenou a realização de despesas expressamente

proibidas pela Constituição Federal, causando, assim, prejuízo ao erário, ficando

evidente o ato de improbidade administrativa praticado pelo ordenador das

despesas com as publicidades relativas à sua candidatura no pleito majoritário de

2008, o que importou em perda patrimonial para o Município de Quarto Centenário

no montante de R$ 3.250,00 (três mil duzentos e cinquenta reais).

Por tais motivos, poderá responder por seus atos, incidindo-se as

penalidades trazidas no art. 12 do mesmo diploma legal, sem prejuízo do

ressarcimento, conforme bem ressalvado no art. 37, §4º da Constituição da

República.

Nesse aspecto, impõe-se a obrigação do ressarcimento dos

valores desviados do erário municipal e utilizados indevidamente pelo requerido

em proveito próprio.

b) DO DESRESPEITO AO ARTIGO 37, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO

FEDERAL – (tese subsidiária)

Acaso não seja entendimento de que o requerido se utilizou de

verba pública para custeio de propaganda eleitoral de cunha particular, e julgando

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por “legal” o “informe publicitário”, de forma que as promessas de obras e serviços

não seriam as mesmas da sua propaganda eleitoral à reeleição, também estaria

incorrendo o requerido em improbidade administrativa.

Infelizmente, não é novidade a utilização da propaganda estatal

com o fim de promover pessoalmente os governantes. Tal prática imoral e

causadora de prejuízo à Administração Pública é facilmente verificada em nosso

país, provocando desvirtuamento na utilização do dinheiro público e indignação

social.

Sensível a este abuso o legislador constituinte, além de prescrever

a obrigação de obediência aos princípios estabelecidos no artigo 37, caput, da

Carta Magna, resolveu ir mais longe, deixando clara a proibição de qualquer

publicidade com cunho de promover autoridades e servidores públicos, dispondo

no artigo 37, § 1º, da Constituição Federal que:

A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos

órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de

orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou

imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou

servidores públicos. (grifamos)

Este dispositivo visa, sobretudo, evidenciar o princípio da

impessoalidade em matéria de publicidade estatal, como explica o saudoso HELY

LOPES MEIRELLES:

“O princípio da impessoalidade referido na Constituição de 1988 (art. 37,

caput) nada mais é do que o clássico princípio da finalidade, o qual impõe

ao administrador público que só pratique o ato para o seu fim legal. E o

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fim legal é unicamente aquele que a norma de direito indica expressa ou

virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal.

Esse princípio também deve ser entendido para excluir a promoção

pessoal de autoridades ou servidores públicos sobre suas realizações

administrativas (CF, art. 37, § 1º).” 3

Sobre o princípio impessoalidade, com maestria, leciona JOSÉ

AFONSO DA SILVA que:

"O princípio ou regra da impessoalidade da Administração Pública

significa que os atos e provimentos administrativos são imputáveis não

ao funcionário que os pratica mas ao órgão ou entidade administrativa

em nome do qual age o funcionário. Este é um mero agente da

Administração Pública, de sorte que não é ele o autor institucional do ato.

Ele é apenas o órgão que formalmente manifesta a vontade estatal.

(...) Logo, as realizações administrativo-governamentais não são do

funcionário ou autoridade, mas da entidade pública em nome de quem as

produzira. A própria Constituição dá uma conseqüência expressa a essa

regra, quando, no § 1º do art. 37, proíbe que conste nomes, símbolos ou

imagens, que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou

servidores públicos em publicidades de atos, programas, obras, serviços

e campanhas dos órgãos públicos." 4

Portanto, nota-se que a intenção do constituinte é que os atos,

programas, obras, serviços ou campanhas do Estado, não sejam vistos pela

população em geral como realizações pessoais de determinados agentes

públicos, mas sim como realizações do próprio Estado. E é por esta razão que o

Texto Constitucional veda que nas publicidades conste identificação de qualquer

pessoa que não o próprio ente estatal.

3 MEIRELLES, Hely Lopes. “Direito Administrativo Brasileiro”. 20. ed. Malheiros: São Paulo, 1995. p. 85.

4 SILVA, José Afonso da. “Curso de Direito Constitucional Positivo”. 9. ed. Malheiros: São Paulo, 1993. p.

570.

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18

Essa identificação não precisa ser direta, constar o nome do

agente ou um símbolo extremamente conhecido, basta qualquer forma de

descaracterizar a propaganda como ato da Administração Pública, para que a

publicidade perca seu caráter impessoal e ofenda os princípios constitucionais,

como bem observou WALLACE PAIVA MARTINS JÚNIOR descrevendo com rara

felicidade e exatidão que:

“Na atualidade tal se afigura pelo sutil expediente consistente no uso de

símbolos que, via de regra, identificam certo e determinado administrador

manipulador e titular destes, assim como frases e expressões, que, por

essa razão, afastam-se da impessoalidade e da moralidade inerentes à

administração pública, ferindo o princípio proibitivo de personalização da

publicidade de caráter oficial. A isso é cabível denominar personalização

oblíqua que configura transgressão ao art. 37, § 1º, da Constituição da

República.

Com efeito, o uso de símbolos e expressões umbilicalmente ligados pelo

marketing político-administrativo à pessoa do administrador público, e

que não constituem o símbolo oficial (como o brasão) de uma pessoa

jurídica de direito público e dos entes da administração pública indireta é

também expressamente proibido pelos preceitos constitucionais da

impessoalidade e da moralidade aplicados à publicidade dos atos

administrativos.

De fato, a cada alteração de governo (federal, estadual ou municipal),

assiste-se pelos meios de comunicação, pelas placas de obras, pelos

documentos oficiais, enfim, por todos os modos hábeis de veiculação de

idéias, a correspondente alteração dos símbolos da administração

pública. Símbolos esses, todavia, que não constituem, a marca oficial

da administração pública, e, consistem na marca transitória de cada

governante.

Tais símbolos ou frases tem o escopo de personalizar a obra, o ato,

o serviço, as realizações da administração pública, bem como a

própria publicidade governamental, atrelando-a a pessoa de certa e

determinada autoridade pública que o emprega criando o efeito na

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massa popular receptora da informação, da associação de idéias e

pessoas, vinculando como resultado a obra pública ao administrador e

não a administração pública.”5 (grifamos)

Todo símbolo que não é oficial não representa a própria

Administração Pública, mas alguma outra coisa ou outra pessoa.

Portanto, a conclusão correta é que o uso de qualquer símbolo

não oficial caracteriza promoção pessoal e é vedado pela Constituição Federal.

Este entendimento é corroborado por WALLACE PAIVA MARTINS

JÚNIOR:

“É impossível ignorar, por exemplo, que a foice e o martelo são símbolos

do comunismo, que a cruz suástica é símbolo do nazismo, etc. O cidadão

que lê uma determinada placa de obra pública, que tem pretexto

informativo, associa-lhe à pessoa daquela autoridade pública que

manipulava no seu governo, tal símbolo, mesmo que conste daquela

placa informativa o nome da autoridade em questão. Tal conduta

configura-se violadora dos princípios constitucionais aqui destacados,

bem como aquela que inova com expressões ou símbolos de cunho

pessoal ou personalizante, as vezes oriunda de campanha político-

partidária, que são evidentemente, estranhas à administração pública.

Exemplos dos mais variados são colecionados com as expressões

‘governo do povo’, ‘governo democrático’ e frases análogas.

(...)

É preciso, desta maneira, que apenas os símbolos oficiais da

administração pública (aprovados pela forma correta e pelo poder

competente) como o brasão, a bandeira, as armas, o sêlo oficial,

sejam utilizados na publicidade de atos, obras, serviços, programas e

5 MARTINS JÚNIOR. Wallace Paiva. “Publicidade Oficial: Moralidade e Impessoalidade”. Publicado na

Revista dos Tribunais nº 705. p. 86.

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campanhas de caráter informativo, educativo ou de orientação social, da

administração pública direta, indireta ou fundacional, para o devido

respeito aos princípios constitucionais da impessoalidade e da

moralidade - de eficácia plena - mostrando que o executor da realização

não é a autoridade que representa, mas, é a própria administração

pública, perene, indissolúvel, impessoal, e com o interesse público em

meta.”6 (grifamos)

Como já mencionado no item I desta peça vestibular, o requerido,

utilizando-se do cargo de Prefeito Municipal, veiculou, através de boletim

informativo, de forma ostensiva, o nome e a logomarca do Município de Quarto

Centenário, as obras, em tese, por ele realizadas, bem como as que

eventualmente realizaria caso fosse reeleito, vinculando assim a imagem do ente

federado a uma determinada administração ou uma determinada pessoa, no caso

o requerido e a administração municipal por ele exercida na gestão 2005/2008 à

frente do Município de Quarto Centenário.

Como visto, só a aposição de símbolos e expressões não oficiais,

mesmo que tais símbolos não fossem anteriormente conhecidos, já basta para

descaracterizar a publicidade como impessoal, infringindo o artigo 37, § 1º, da

Constituição Federal. É que mesmo que estes símbolos não fossem anteriormente

ligados à pessoa do agente manipulador, com o seu uso, certamente, passaram a

ser identificados com o requerido, não com o Município de Quarto Centenário.

Porém, no caso em tela, a promoção pessoal é ainda mais

evidente, na medida em que os símbolos e expressões estão umbilicalmente

ligados à pessoa do requerido, constando ainda dos aludidos informativos os

slogans Quarto Centenário – Construindo o futuro – Veja o que já foi feito por

6 op. cit., p. 86, depois 88.

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você – Administração: Gestão 2005/2008” e “Terra que produz –

Administração: Gestão 2005/2008”.

Da análise dos documentos citados fica cristalina a intenção do

requerido em deixar a sua marca pessoal.

Vale ressaltar que a jurisprudência pátria já vem entendendo como

inconstitucional este tipo de publicidade. A propósito, veja-se o Acórdão proferido

pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, na apelação cível nº 160.666-

1/0, onde o relator, Desembargador MELO JÚNIOR, com muita propriedade

salientou:

“Também não se justifica, e caracteriza violação da lei e da Constituição,

a inserção nas publicidades das expressões: ‘Governo da Comunidade’,

‘Prefeitura de Portas Abertas’, que também eram utilizadas, como mostra

claramente Abertas, o documento de fls. 13, na campanha eleitoral, e que

estão, por isso mesmo, ligadas ao nome do candidato citado.

O logotipo e a expressão ‘Comunidade’ e outras que foram usadas na

campanha eleitoral, são símbolos que identificam o Administrador

Requerido, e não podem ser utilizadas nas campanhas publicitárias do

Governo Municipal, por afrontarem o que dispõe claramente o parágrafo

1º, do artigo 37 da Constituição Federal, que dispõe, em norma auto-

aplicável, que ‘a publicidade dos atos, programas...”

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22

Neste mesmo sentido:

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO POPULAR. PRELIMINAR DE EXTINÇÃO DO

PROCESSO POR ABANDONO DA CAUSA AFASTA SUBSTITUIÇÃO

PROCESSUAL. ASSUNÇÃO DO POLO ATIVO PELO MINISTÉRIO

PÚBLICO. ARTIGO 9º. DA LEI N.º 4.717/65. AUSÊNCIA DA

PUBLICAÇÃO DOS EDITAIS. IRRELEVÂNCIA. PREJUÍZO

INOCORRENTE. OFENSA À AMPLA DEFESA. REJEIÇÃO.

FALECIMENTO DE TESTEMUNHAS. EVENTO NATURAL QUE NÃO

OCASIONA CERCEAMENTO DE DEFESA. PRESCRIÇÃO

INTERCORRENTE NÃO CONFIGURADA. PARALISAÇÃO DO

PROCESSO. CULPA EXCLUSIVA DO MECANISMO JUDICIÁRIO.

MÉRITO. PUBLICIDADE IRREGULAR. PROMOÇÃO PESSOAL DO

GOVERNANTE. LOGOTIPO UTILIZADO DE FORMA OSTENSIVA SEM

CARÁTER EDUCATIVO, INFORMATIVO OU DE ORIENTAÇÃO

SOCIAL. BORDÃO UTILIZADO NO PERÍODO DE CAMPANHA

ELEITORAL. OFENSA AO ARTIGO 37, § 1º. DA CONSTITUIÇÃO

FEDERAL. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE.

O artigo 37, § 1º. da Carta Magna impõe que a publicidade do ente

público tenha caráter educativo, informativo ou de orientação social,

afastando, desta forma, o uso de bordões, símbolos ou imagens que

caracterizem promoção pessoal do Chefe do Poder Executivo.

SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.” (TJPR - AC:

6720772 PR 0672077-2, Relator: Abraham Lincoln Calixto, Data de

Julgamento: 07/12/2010, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 546)

(grifamos)

Assim, fica evidenciado que o requerido infringiu o artigo 37, § 1º,

da Carta Magna, ofendendo o princípio da impessoalidade, na medida em que se

transmite à população a idéia de que as realizações administrativas passam a ser

identificadas como realizações pessoais do requerido e não como realizações do

Município de Quarto Centenário.

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23

Registre-se que, como dito inicialmente, para adotar a prática do

ato de improbidade administrativa por pessoalização da administração pública,

necessário que não haja reconhecimento do ato de improbidade de utilização de

verba pública para uso em informe de campanha eleitoral (uso particular).

Destarte, fica escancarada a inconstitucionalidade das publicidades

promovidas pelo requerido, por serem instrumentos de promoção pessoal,

atentando contra o quanto previsto no art. 11, inciso I, da Lei nº 8.429/92, estando

sujeito às sanções previstas no art. 12 do mesmo texto normativo.

V – DA CONFIGURAÇÃO DO ELEMENTO SUBJETIVO NA

CONDUTA DO RÉU

No que tange ao requerido REINALDO KRACHINSKI não há

dúvidas de seu conhecimento sobre o desvio de verbas do erário Municipal para a

confecção de material de campanha para sua candidatura à reeleição nas eleições

para Prefeito Municipal no ano de 2008.

Cumpre ressaltar que mesmo que o requerido alegue ignorância, o

dano provocado ao erário pode ser punido a título culposo, conforme art. 10 da Lei

8.429/82:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao

erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda

patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos

bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e

notadamente:

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Contudo, na hipótese vertente, há que se reconhecer que houve

dolo direto do requerido em suas condutas, à medida que ensejou em

enriquecimento ilícito (art. 9º da Lei 8.429/92)

Isto porque, em que pese ter o requerido afirmado que as

despesas com a propaganda eleitoral veiculada foram pagas às suas próprias

custas, tendo apresentado o recibo de pagamento no valor de R$ 3.250,00 (três

mil duzentos e cinquenta reais) (fl. 47), emitido em seu favor pela Gráfica

Ilustrada, localizada na cidade de Umuarama/PR, o Juízo Eleitoral desta Comarca

oficiou à referida gráfica para que apresentasse a respectiva nota fiscal, sendo

fornecida a nota fiscal nº 104738 (fl. 83), onde constava valor idêntico ao

apresentado no recibo fornecido pelo requerido, só que desta feita em nome

da Prefeitura Municipal de Quarto Centenário, inclusive constando do

documento o CNPJ da Administração.

Ademais, conforme discorrido quando da exposição dos fatos

apurados neste compêndio, o requerido deixou de declarar tal despesa nos autos

de prestação de contas relativos à sua campanha (autos nº 666/2008 – cópia às

fls. 104/146).

Corroborando com tal fato, o representante da Gráfica Ilustrada, Sr.

Mário Lago, através do expediente de fl. 152, afirmou que o recibo apresentado

pelo requerido e a nota fiscal apresentada pela gráfica eram referentes à

prestação dos mesmos serviços.

Portanto, no que concerne ao dano ao erário, resta sobejamente

comprovado o dolo do requerido, vez que não se vislumbra outro motivo que não o

de ocultar a irregular despesa em tal omissão, pois, se efetivamente o serviço

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25

descrito na nota fiscal de fl. 83 se tratasse de “Informativo Municipal”, deveria

haver o respectivo empenho e pagamento feito pela municipalidade em favor da

Gráfica Ilustrada, o que não é o caso dos autos.

De outro norte, quando à tese subsidiária de violação ao disposto

no art. 37, § 1º, da Carta Magna, diversa não é a sorte do requerido, porquanto a

propaganda impressa fora por ele “custeada” e veiculada, de forma que tinha

ciência dos slogans e imagens constantes nos informativos, e que vinculavam sua

imagem e a gestão administrativa por ele exercida ao Município de Quarto

Centenário.

Assim resta claro que o requerido REINALDO KRACHINSKI

incorreu em ato de improbidade administrativa nas modalidades de

enriquecimento ilícito (art. 9º) porquanto, ao que se demonstrou, tinha

conhecimento e se favoreceu de verbas do erário municipal para a confecção de

material de campanha para sua candidatura à reeleição, de onde constavam

imagens e slogans que o vinculavam ao Município de Quarto Centenário, em

franca violação ao princípio da impessoalidade.

VI – DA NECESSÁRIA IMPOSIÇÃO DE SANÇÕES AO RÉU E

SUA POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO

O legislador constituinte, visando evidentemente tutelar toda a

sociedade dos administradores desonestos, dispôs que os atos de improbidade

administrativa deverão ser rigidamente punidos, inclusive com suspensão dos

direitos políticos e perda da função pública.

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26

Prevê o § 4º, do artigo 37, da Constituição Federal que:

4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos

direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens

e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem

prejuízo da ação penal cabível.

No plano infraconstitucional, a Lei Federal nº 8.429/92,

regulamentando a Lei Maior, estabeleceu que a punição dos atos de improbidade

administrativa deverá ocorrer de acordo com as sanções previstas no artigo 12, o

qual prevê que cada modalidade de ato de desonestidade tem espécies e

gradação de sanções diferentes.

Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas,

previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de

improbidade sujeito às seguintes cominações:

I - na hipótese do art. 9°, perda dos bens ou valores acrescidos

ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando

houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de oito

a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do

acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou

receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou

indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja

sócio majoritário, pelo prazo de dez anos;

II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos

bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta

circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos

de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor

do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber

benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente,

ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio

majoritário, pelo prazo de cinco anos;

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III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver,

perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco

anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração

percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou

receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou

indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja

sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em

conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial

obtido pelo agente.

Assim, em face da expressa e clara disposição de lei, constatada a

improbidade administrativa por flagrante ilegalidade NA UTILIZAÇÃO DE VERBAS

PÚBLICAS EM PROVEITO PRÓPRIO e, subsidiariamente, NO FLAGRANTE

DESRESPEITO À REGRA INSCULPIDA NO ART. 37, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO

FEDERAL, é de rigor a imposição das citadas sanções ao requerido.

Importante trazer que referidas sanções são passíveis de serem

aplicadas ao ora requerido, não havendo que se falar em prescrição. Os fatos

improbos tiveram ocorreram nos segundo semestre de 2008, quando requerido

era Prefeito do Município de Quarto Centenário.

Ainda, há de se consignar que o requerido restou recentemente

eleito ao cargo de alcaide do ente federado mencionado linhas acima, ocupando

atualmente a aludida posição (cf. certidão e documentos de fls. 204/209).

VII - DA MEDIDA CAUTELAR EM CARÁTER LIMINAR DE

INDISPONIBILIDADE DOS BENS

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1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Goioerê/PR

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Tendo em vista as irregularidades sobejamente demonstradas,

visando a restabelecer a moralidade administrativa e garantir o ressarcimento dos

prejuízos causados ao patrimônio público, bem como para assegurar o pagamento

das multas eventualmente cominadas ao final como sanção pela prática de atos

de improbidade administrativa, pleiteia-se a necessária concessão de medida

liminar no caso presente.

Sendo assim, requer seja decretada a indisponibilidade dos bens

do réu no limite do valor atualizado a ser ressarcido, o que se pleiteia com fulcro

no artigo 7º, parágrafo único, da Lei nº 8.429/92 e também no poder geral de

cautela do juiz.

Em verdade, tal providência caracteriza-se como medida que visa

assegurar o resultado do processo. Por ser uma “garantia da garantia”,

caracteriza-se a mesma como pedido de natureza cautelar, aplicando-se a

sistemática do art. 796 e seguintes do CPC.

Contudo, é de se registrar que a doutrina e jurisprudência moderna

permitem que o pedido possa ser feito no bojo da ação principal, à luz do art. 273,

§7º do CPC:

Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. § 1o Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões do seu convencimento. § 2o Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado. § 3o A execução da tutela antecipada observará, no que couber, o disposto nos incisos II e III do art. 588

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§ 3o A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4o e 5o, e 461-A § 4o A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada. § 5o Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento. § 6o A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso. § 7o Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado.

Assim agindo, atende-se ao atual entendimento para fins de

sincretismo processual.

Com efeito, a Lei n. 10.444, de 07/05/2002, introduziu o parágrafo 7º, no art. 273, do Código de Processo Civil, criou a regra de fungibilidade processual recíproca entre medidas cautelares e tutelas antecipatórias, de modo a permitir ao juiz a conversão do pedido de tutela antecipada em medida cautelar, com o processamento desta em autos apartados. Com esta nova disposição, tem o demandante ora agravado a faculdade de optar pelo pedido de tutela antecipada ou pelo ajuizamento de cautelar, pois a Lei antes mencionada não visou impedir o ajuizamento de cautelares. Embora a existência de corrente jurisprudencial entendendo que a partir da incorporação do instituto da antecipação de tutela por nossa legislação processual, não mais se justificaria o ajuizamento de cautelar, quando o provimento da liminar pode ser obtido na própria ação de conhecimento, mediante antecipação da tutela, tenho que compete à parte autora decidir qual a melhor forma de obter o provimento judicial que objetiva conseguir." (www.tj.rs.gov.br. Agravo de Instrumento n°70007523038. Relator - Nereu José Giacomolli - nona câmara cível) PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ASSEMBLÉIA. PEDIDO DE INTERVENÇÃO. ARTIGO 273, § 7º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.I - Consoante precedentes jurisprudenciais desta Corte, a regra do artigo 542, § 3º, do Código de Processo Civil, que determina a retenção do recurso especial, admite temperamentos, sob pena de se tornar inócua a ulterior apreciação da questão pelo Superior Tribunal de Justiça. II - Apesar de se ter deferido, em caráter liminar, a intervenção na pessoa jurídica, cujo pedido foi formulado em autos de processo de conhecimento onde se postulou a nulidade de assembléia, já à época em que proferida a decisão, doutrina e jurisprudência vinham admitindo a

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fungibilidade das medidas urgentes, tendência que culminou com a inserção do § 7º no artigo 273 do Código de Processo Civil pela Lei nº 10.444/02. III - Tal providência se justifica em atendimento ao princípio da economia processual, haja vista que nem sempre é fácil distinguir se o que o autor pretende é tutela antecipada ou medida cautelar, conceitos que não podem ser tratados como sendo absolutamente distintos. Trata-se, diversamente, de duas categorias pertencentes a um só gênero, o das medidas urgentes. (RESP 202740 / PB ; RECURSO ESPECIAL 1999/0008245-1. Ministro CASTRO FILHO. TERCEIRA TURMA. DJ 07.06.2004 p.00215).

A real lição contida neste preceito é de que, no contexto do

processo civil de resultado, deve ser admitido um sincretismo jurídico, a fim de se

garantir a efetividade do processo. Atualmente, não pode ser perdido tempo

discutindo a separação entre os processos ou formalismos inócuos, mas, pelo

contrário, impera-se a busca pela realização material da justiça.

Essa medida mostra-se indispensável, considerando o significativo

valor do prejuízo, havendo, portanto, a real possibilidade de ineficácia do

provimento jurisdicional principal, caso não sejam tornados indisponíveis os bens

dos requeridos.

Consigne-se, ainda, que o direito material acha-se suficientemente

demonstrado nos documentos que instruem esta inicial (fumus boni juris), o

mesmo ocorrendo com a possibilidade do perigo que poderá representar a demora

da prestação jurisdicional final (periculum in mora).

Fica, assim, claramente evidenciada a necessidade de amparo

judicial urgente para afastar de pronto os riscos de perecimento dos bens que

representam a garantia de eficácia da sentença de mérito postulada nesta ação.

Requer que esta medida seja concedida inaudita altera pars, ante

ao fundado receio de que a ciência prévia da mesma possa levar o réu a dilapidar

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seus bens, tornando inútil a cautela e, por consequência, irreparável o prejuízo

que causaram ao Município.

Nesse contexto, a jurisprudência Superior recente não deixa

margens para o indeferimento da medida liminar pleiteada:

O periculum in mora para decretar a indisponibilidade de bens decorrente do

ato de improbidade administrativa (art. 37, § 4º, da CF) é presumido, nos

termos do art. 7º da Lei n. 8.429/1992. Precedentes citados: REsp 1.315.092-

RJ, DJe 14/6/2012; REsp 1.203.133-MT, DJe 28/10/2010; REsp 1.135.548-PR,

DJe 22/6/2010; REsp 1.115.452-MA, DJe 20/4/2010, e REsp 1.319.515-ES.

(STJ. AgRg no AREsp 188.986-MG, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em

28/8/2012) – informativo de jurisprudência nº 503.

De forma a limitar a indisponibilidade, não a tornando

onerosamente excessiva ao requerido, apresenta-se, neste momento, o valor a

que se pretende ver ressarcido ao erário municipal atualizado (correção

monetária) pelo INPC e com incidência de juros legais de 1% ao mês, ambos

desde a data do fato (03.07.2008):

Atualização

Valor atualizado = valor * fator = R$3.250,00 * 1,3015 Valor atualizado (VA) = R$4.229,80

Juros

Juros percentuais (JP) = 56,00000 % Valor dos juros (VJ) = VA * JP = 2.368,6892 Valor total com juros = VA + VJ = R$6.598,49 Observações sobre os juros: Fórmula dos juros simples: Juros = (taxa / 100) * períodos períodos = 56 (de Agosto-2008 a Março-2013) Juros = (1 / 100) * 56 = 56,00000 %

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VIII - DOS PEDIDOS

Por todo o exposto, requer-se de Vossa Excelência:

a) LIMINARMENTE, presentes os requisitos necessários, seja

concedida a medida liminar, determinando cautelarmente a indisponibilidade dos

bens do réu até o limite do valor a ser ressarcido (R$6.598,49 – seis mil,

quinhentos e noventa e oito reais e quarenta e nove centavos).

b) Seja autuada a presente ação e determinada a notificação do

Requerido para, querendo, oferecer manifestação por escrito, no prazo de 15

(quinze) dias, nos termos do art. 17, § 7º, da Lei nº 8.429/92 (com redação dada

pelo art. 3º da Medida Provisória nº 2.088 de 23.02.2001);

c) Seja, após oferecida a resposta referida no item anterior ou

escoado in albis o prazo para sua respectiva apresentação, a presente recebida,

autuada e processada na forma e no rito ordinário, conforme preconizado no art.

17, caput, da Lei nº 8.429/92;

d) Em seguida ao recebimento da presente ação, seja realizada

a citação do Requerido, já qualificados na exordial, para, querendo, contestar o

presente pedido, no prazo de lei, nos termos do art. 17, § 9º (com redação dada

pelo art. 3º da Medida Provisória nº 2.088 de 23.02.2001), sob pena de confissão

e revelia, permitindo-se ao Oficial de Justiça utilizar-se da exceção prevista no art.

17, § 2º, do Código de Processo Civil;

e) Seja notificado o Município de Quarto Centenário, para,

querendo, integrar a lide (artigo 17, § 3º, da Lei nº 8.429/92);

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f) Seja julgada procedente a presente demanda para,

reconhecendo os atos de improbidade descritos nos art. 9º, caput e inciso

XII; ou subsidiariamente o art. 11, inciso I, todos da Lei nº 8.429/92 em

relação a REINALDO KRACHINSKI, condenar o requerido nas sanções civis

listadas no artigo 12 da mesma Lei, bem como, condená-lo ao ressarcimento

dos prejuízos causados ao erário, no montante de R$ 3.250,00 (três mil

duzentos e cinquenta reais), valor este atualizável quando do efetivo

pagamento, com incidência dos juros legais e correção monetária desde a

data do fato (03.07.2008);

g) Seja o autor dispensado do pagamento de custas,

emolumentos e de outros encargos, à vista do disposto no art. 18 da Lei nº

7.347/85;

h) Sejam as intimações do autor feitas pessoalmente, dado o

disposto no artigo 236, § 2º, do CPC e no artigo 153, IV da LC nº 85/99 PR;

i) Seja deferida a juntada dos documentos que acompanham a

presente inicial e outros que se fizerem mister à completa elucidação e

demonstração cabal dos fatos articulados na presente inicial, bem como a

produção de provas pericial, testemunhal e depoimento pessoal dos requeridos;

j) Seja o Requerido condenado ao pagamento das custas e

demais despesas processuais;

k) Oportunamente, em caso de decisão favorável ao pedido

inicial e após o seu trânsito em julgado, sejam expedidos ofícios ao Cartório

Eleitoral de Goioerê, ao Tribunal Regional Eleitoral e ao Tribunal Superior

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Eleitoral, para o fim previsto no artigo 20 da Lei nº 8.429/92, bem como à Mesa da

Câmara Municipal de Quarto Centenário/PR para as providências cabíveis, e,

ainda, ao Conselho Nacional de Justiça para fins de inscrição do condenado junto

ao Cadastro Nacional de Condenados por ato de Improbidade Administrativa –

CNCIA (Resolução CNJ nº 44/2007)

Dá-se à causa o valor de R$ R$6.598,49 (seis mil, quinhentos e

noventa e oito reais e quarenta e nove centavos).

Goioerê/PR, 08 de maio de 2013.

WAGNER ZOUAIN VARGAS

Promotor de Justiça