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Narrativas de uma estudante estagiária:
experiências e ilações para o ser professor
Relatório de Estágio Profissional
Relatório de Estágio apresentado com vista à obtenção do
2º ciclo em Educação Física nos Ensinos Básico e
Secundário, da Faculdade de Desporto da Universidade do
Porto, ao abrigo do Decreto-Lei nº 74/2006, de 24 de
março, na redação dada pelo Decreto-Lei nº 65/2018 de 16
de agosto.
Orientadora: Professora Doutora Paula Maria Fazendeiro Batista
Beatriz de Noronha Ferreira
Porto, setembro de 2019
Ficha de catalogação
Ferreira, B. (2019). Narrativas de uma estudante estagiária: experiências e ilações
para o ser professor. Relatório de Estágio Profissional. Porto: B. Ferreira. Relatório de
Estágio Profissional para a obtenção do grau de Mestre em Ensino de Educação
Física nos Ensinos Básico e Secundário, apresentado à Faculdade de Desporto da
Universidade do Porto
III
Agradecimentos
Aos meus pais, pelo apoio incondicional e por contribuírem para aquilo
que sou hoje (o bom e o mau). Por me amarem desde sempre e para sempre.
Aos meus avós, por sempre me incentivarem a ser uma melhor pessoa,
por todos os mimos e recortes de papel.
À minha família, por nunca terem duvidado de mim.
Ao João, por ser a pessoa fantástica que é, e por me fazer ambicionar
ser melhor. Pelos telefonemas de madrugada, as lágrimas e dúvidas
desvanecidas. Por ser a minha ancora.
Aos meus amigos da licenciatura, pelos momentos incríveis que
passamos e pelos momentos menos bons que nos levantámos juntos. Por tudo
aquilo que passámos, sempre.
Aos meus amigos de mestrado, por não me terem deixado sozinha,
terem feito deste percurso, um percurso mais feliz, recheado de histórias para
lembrar.
Ao meu grupo de amigos “de fora”, por me ter acompanhado sempre.
Pela amizade, pelo carinho, conselhos e palavras.
À professora Paula Batista, pela paciência, disponibilidade, abertura e
pela confiança que demonstrou.
À professora cooperante, Catarina Cachapuz, pela amizade,
amabilidade, força e constantes palavras de conforto, mesmo nos momentos
em que duvidada de mim.
A todos os professores e auxiliares da escola cooperante, por terem sido
prestáveis, dedicados, preocupados e por me terem mostrado o que era uma
escola de excelência. Pelos ensinamentos, “conversas ao café”, por todo o
apoio, sem esperarem nada em troca.
Em especial, à minha turma, aos meus meninos, por terem feito de mim
uma professora cheia de orgulho. Pela forma como me receberam, e por terem
IV
duvidado de mim. Porque essa dúvida, fez com que quisesse crescer, quisesse
vos mostrar que era capaz. Pela confiança mais tarde que demonstraram, e
pela saudade que deixaram.
A todos vós, Muito Obrigada!
V
Índice Agradecimentos ......................................................................................................... III
Índice de Tabelas ...................................................................................................... VII
Índice de Gráficos .................................................................................................... VIII
Índice de Quadros ...................................................................................................... X
Índice de Figuras ...................................................................................................... XII
Índice de Anexos .................................................................................................... XIV
Resumo ................................................................................................................... XVI
Abstract ................................................................................................................... XIX
Introdução ................................................................................................................... 1
1.Enquadramento Pessoal ......................................................................................... 5
1.1. Me, Myself and I ................................................................................................ 7
1.2. “Expect the Unexpected” ............................................................................... 11
2. Enquadramento Profissional ............................................................................... 15
2.1. O que é o Estágio Profissional? .................................................................... 17
2.2. Acerca da legitimação da Educação Física .................................................. 18
2.3. Acerca de uma conceção de Educação Física ............................................. 22
2.4. Aprender em Educação Física....................................................................... 24
2.5. A escola como instituição ............................................................................. 26
2.6. Desafios da Escola no séc. XXI ..................................................................... 28
2.7. Desafios do Professor no Séc. XXI ............................................................... 30
2.8. Contexto escolar ............................................................................................ 33
2.8.1. A minha escola ......................................................................................... 33
2.8.2. O Departamento de Expressões ............................................................. 37
2.8.3. O Grupo de Educação Física .................................................................. 38
2.8.4. O núcleo de estágio ................................................................................. 39
2.8.5. O meu 7ºano: um verdadeiro desafio ................................................... 41
2.8.6. O 10º ano de escolaridade: um osso duro de roer ................................ 44
2.8.7. O 6º ano de escolaridade: motivar, motivar e motivar .......................... 45
2.8.8. O 2º ano de escolaridade: os pequeninos irrequietos .......................... 47
3. A prática de ensino ........................................................................................ 51
3.1. Os medos iniciais ........................................................................................... 53
3.2. Palavra de ordem: planear ............................................................................. 53
3.3. Antes de começar (a sério) um olhar sobre… .............................................. 54
3.3.1. … o Programa de Educação Física ......................................................... 54
3.3.2. … as Aprendizagens Essenciais (AE) e Perfil do Aluno à Saída da
Escolaridade Obrigatória (PA) .......................................................................... 56
3.3.3. … o planeamento anual ........................................................................... 58
VI
3.4. O ensino das diferentes modalidades .......................................................... 60
3.4.1. O jogo de Andebol: a segurança e a motivação .................................... 60
3.4.2. A Ginástica Rítmica: o trabalho em projeto ........................................... 64
3.4.3. O Atletismo: o verdadeiro trabalho por estações .................................. 67
3.4.4. Ginástica de Aparelhos e Ténis de mesa: a simbiose entre 2 mundos 69
3.4.5. Orientação: encontra-me se puderes ..................................................... 72
4.Ser professor para além das aulas ....................................................................... 75
4.1. Direção de turma ........................................................................................... 77
4.1.1. Reunião com os pais ................................................................................... 77
4.1.2. Reuniões do conselho de turma ................................................................ 78
4.1.3. Desporto Escolar – “a minha força” .......................................................... 79
4.1.4. Atividades desportivas promotoras de exercício físico ........................... 82
5. Desenvolvimento Profissional ............................................................................. 87
5.1. Formação pessoal .......................................................................................... 89
6. Estudo de Investigação ........................................................................................ 93
6.1. Introdução ....................................................................................................... 95
6.2. Enquadramento teórico ................................................................................. 96
6.3. Objetivos ....................................................................................................... 101
6.4. Metodologia .................................................................................................. 102
7. Um até já… .......................................................................................................... 115
8. Referências Bibliográficas ................................................................................. 119
9. Anexos ................................................................................................................. 125
VII
Índice de Tabelas
Tabela 1 - Resultados da Prova 1 - Equilíbrio ................................................................... 105
Tabela 2 - Resultados da Prova 2 - Salto para um plano superior ................................. 106
Tabela 3 - Resultados da Prova 3 - Rolar o arco .............................................................. 106
Tabela 4 - Resultados da Prova 4 – Saltar à corda .......................................................... 107
Tabela 5 - Resultados da Prova 5 - Rolamento à frente .................................................. 107
Tabela 6 - Resultados da Prova 7 – Toques de sustentação com raquete .................. 108
Tabela 7 - Resultados da Prova 9 – Condução de bola................................................... 108
Tabela 8 - Resultados da Prova 10 – Passe e receção da bola ..................................... 109
Tabela 9 - Resultados da Prova 11 – Jogo das “Tocas” .................................................. 109
Tabela 10 - Resultados M ABC-2 ........................................................................................ 110
Tabela 11 - Correlação entre Resultado Padrão Total e as Provas de Aferição ......... 111
Tabela 12 - Correlação entre RPT Destreza Manual e Provas de Aferição ................. 111
Tabela 13 - Correlação entre RPT Atirar e Agarrar e Provas de Aferição .................... 112
Tabela 14 - Correlação entre RPT Equilíbrio e Provas de Aferição ............................... 112
IX
Índice de Gráficos
Gráfico 1 - Modalidades que os alunos praticam regularmente .................................. 43 Gráfico 2 – Modalidades que os alunos gostariam de experimentar …………………. 43 Gráfico 3 - Fase sensível de desenvolvimento……….…………………..………….....…99
XI
Índice de Quadros
Quadro 1 - Planeamento anual das atividades físicas ....................................................... 58
XIII
Índice de Figuras
Figura 1 - Características estruturais do ME…………………...……………………….…63 Figura 2 - Ficha de avaliação diagnóstica de Ginástica Rítmica.................................. 65 Figura 3 - Ficha de Avaliação de Atletismo.................................................................. 68 Figura 4 - Ficha de tarefa de Trave...............................................................................70 Figura 5 – Atividades realizadas pelo Grupo de EF…………………..………….……….82 Figura 6 - Atividades do Desporto Escolar................................................................... 83 Figura 7 - Abordagem multidesportiva..........................................................................98
XV
Índice de Anexos
Anexo 1 - Bateria de Testes M ABC-2: banda de idade 2 ............................................... 127
Anexo 2 - Bateria de Testes M ABC-2: banda de idade 2 (cont.) ................................... 128
Anexo 3 - Tarefa 1 e 2 das provas de aferição .................................................................. 129
Anexo 4 - Tarefa 3 e 4 das provas de aferição .................................................................. 130
Anexo 5 - Tarefa 5 e 6 das provas de aferição .............................................................. 13131
Anexo 6 - Tarefa 7 e 8 das provas de aferição .................................................................. 132
Anexo 7 - Tarefa 9 e 10 das provas de aferição ............................................................... 133
Anexo 8 -Tarefa 11 das provas de aferição ....................................................................... 134
XVII
Resumo
O estágio profissional é o momento culminante da formação inicial do
professor, representando o choque entre a teoria (o que foi aprendido nos anos
de formação) e a prática (o contexto real). Este choque inicial retrata a
dificuldade de se ser professor e a imprevisibilidade que o estudante-estagiário
enfrenta na imersão dos contornos da profissão, nos mais diversos domínios. O
presente documento espelha a vivência do estágio de uma jovem cujo sonho é
ser professora. As vicissitudes, as alegrias, as frustrações, os ensinamentos,
as lágrimas e as promessas feitas durante um ano intenso de exercício da
profissão docente, materializam o experienciado pela estudante estagiária.
Este foi um ano rico em aprendizagem, em que a comunicação, a partilha e a
união assumiram um papel central. O estágio foi realizado numa escola, da
região do grande Porto, num núcleo de estágio constituído por três estudantes-
estagiários, sob a orientação da professora cooperante, que nos incentivou a
ser criativos e fazer as coisas de forma diferente, centralizando, sempre que
possível, o processo de ensino-aprendizagem no aluno. Os trabalhos
multidisciplinares, as autoavaliações diagnósticas, os trabalhos em projeto e o
processo de autorregulação da aprendizagem por parte dos alunos, foram os
marcos do processo de preparação e realização do ensino. As experiências
com outras turmas, o desporto escolar e diversas atividades desportivas,
também são reportadas. É ainda apresentado um estudo de investigação no
contexto do 1º ciclo do ensino básico que visou analisar a literacia motora dos
alunos.
PALAVRAS-CHAVE: EDUCAÇÃO FÍSICA, ESTÁGIO PROFISSIONAL,
PROFESSOR, ALUNO, SER DIFERENTE
XIX
Abstract
The school placement is the crowning moment of the initial teacher education,
representing the clash between theory (what was learned in the formative
years) and practice (the real context). This initial shock portrays the difficulty of
being a teacher and the unpredictability that the preservice teacher face in the
immersion of the profession's contours, in several domains. This document
reflects the practicum experience of a young woman whose dream is to be a
teacher. The difficulties, the joys, the frustrations, the teachings, the tears and
the promises made during an intense year of teaching profession practice,
materialize the experience lived by the preservice teacher. This was a year rich
in learning, in which communication; sharing and unity took the center stage.
The school placement was carried out at a school in Porto region, within a
group of three preservice teachers, under the guidance of the cooperating
teacher, who encouraged us to be creative and to do things differently,
centralizing, whenever possible, the teaching-learning process in the students.
Multidisciplinary work, self-diagnostic assessments, project work and the
learning self-regulation process by the students were the milestones of the
teaching preparation and realization process. Experiences with other classes,
school sports and the participation in sports activities are also reported. It is also
presented a research study in the context of the 1st cycle of basic education
that aimed to analyze the motor literacy of the students.
KEY-WORDS: PHYSICAL EDUCATION, PRACTICUM TRAINNING,
TEACHER, STUDENT, BE DIFFERENT
XXI
Lista de abreviaturas
A_A – Atirar e agarrar
AE – Aprendizagens Essenciais
CONFAP – Confederação Nacional das Associações de Pais
DE – Desporto Escolar
DM – Destreza Manual
DP – Desvio-padrão
DT – Diretor de Turma
EE – Estudante-estagiário
EEFM – Expressão e Educação Física e Motora
EF – Educação Física
EP - Estágio Profissional
Eq - Equilíbrio
EVT – Educação Visual e Tecnológica
FADEUP – Faculdade de Desporto da Universidade do Porto
FIFA – Federação Internacional de Futebol
M ABC-2 – Movement Assessment Battery for Children (second edition)
MED – Modelo de Educação Desportiva
MID – Modelo de Instrução Direta
NE – Núcleo de Estágio
PA - Perfil do Aluno à saída da escolaridade obrigatória
PNEF – Programa Nacional de Educação Física
PTT – Professor Titular da Turma
RPT – Resultado padrão total
SPSS – Statistical Package for the Social Sciences
UEFA - Union of European Football Associations
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura
3
Este documento foi elaborado no âmbito da unidade curricular: Estágio
Profissional, pertence ao 2º ciclo de estudos em Ensino de Educação Física
nos Ensinos Básico e Secundário, na Faculdade de Desporto da Universidade
do Porto (FADEUP).
Este documento espelha a minha jornada enquanto professora neste
ano letivo, jornada essa rica e recheada de verdadeiros momentos de
aprendizagem, quer a nível pessoal, social e profissional. Momentos que me
fizeram duvidar se seria capaz de combater a minha “sensibilidade aguda -
sensibilite”, momentos que me fizeram questionar sobre o porquê de estar ali,
se seria o local certo para mim, momentos que me fizeram refletir sobre as
minhas conceções e pensamentos.
Em relação à organização do relatório, optou-se por acrescentar algo.
Há segredos e segredos… há aqueles que são só nossos… que não devem
ser sabidos por outrem… tentamos afastar logo o pensamento porque alguém
pode saber, perceber, adivinhar… porém também há aqueles que é impossível
não partilhar… que queremos contar a toda a gente… e são esses que quero
partilhar… quero que me conheçam… quero que saibam o que é para mim ser
(professor) … ou pelo menos como eu quero ser… quero que percebam o que
retirei de cada capítulo. O segredo ou o ensinamento que cada capítulo deu
para me tornar melhor professora, para construir uma identidade profissional.
Todavia espero que não me considerem arrogante… porque cada um tem os
seus métodos, o seu estilo, a sua forma de ver e encarar as situações… na
realidade, cada um tem… os seus segredos… por isso acompanhem-me nesta
viagem.
O documento está estruturado em 6 capítulos: o primeiro denominado de
“Enquadramento Pessoal, retrata uma autoscopia relativa às minhas vivências
pessoais e desportivas e o que esperava do estágio. O segundo capítulo
“Enquadramento Profissional” apresenta alguns temas contemporâneos à
escola e mostra um pouco do contexto escolar onde estive inserida, abordando
as várias experiências com as turmas. O terceiro “A prática de ensino” narra
todo o processo de ensino-aprendizagem desde a planificação até à avaliação
focado nas diferentes modalidades. O quarto capítulo “Ser professora para
além das aulas” expressa as atividades de participação com a comunidade
4
educativa, como as reuniões, as visitas de estudo, as atividades desportivas e
o desporto escolar. O capítulo cinco: “Desenvolvimento Profissional” manifesta
a importância de alterar algumas práticas de ensino. Inclui ainda, o estudo de
investigação que foi realizado no âmbito das aulas com o segundo ano. Por
último, o capítulo seis “Um até já…” espelha as promessas que faço aos meus
passados e futuros alunos.
7
1.1. Me, Myself and I
O meu nome é Beatriz de Noronha Ferreira e tenho 23 anos. Nasci no
dia 16 de janeiro de 1996, na cidade do Porto. A minha ligação ao desporto
começou com apenas 3 anos, quando fui para o ballet. Era o que as minhas
amigas praticavam e eu fui por “arrasto”. E ali fiquei… 16 anos. Ao mesmo
tempo, fui ter aulas de natação, porque “todos os meninos devem saber
nadar!”. Eu gostava da água, mas verdade seja dita não era pelas aulas, era
por ser diferente. Abandonei a natação quando a missão de “saber nadar”
estava cumprida.
No decurso do 3º ano foi crescendo um carinho especial pelo futebol.
Hoje em dia, “culpo” os meus pais e o meu padrinho. Mas ainda bem que
geraram em mim este “bichinho”, pois o carinho, foi tornando-se curiosidade,
que passou para gosto e hoje em dia, é uma paixão. Cheguei a praticar futebol
num clube, porém foi uma brevíssima passagem, pois na altura tinha muitas
atividades (conservatório de música, ballet e catequese) ao mesmo tempo.
Assim, o futebol acabou por ficar para trás.
Até entrar para a faculdade apenas andei em duas instituições de
ensino: o Externato Despertar até ao 4º ano e mais tarde, o Colégio Nossa
Senhora da Paz do 5º ao 12º ano. Acredito que esta estabilidade e que os bons
profissionais de Educação Física me ajudaram a encontrar o meu caminho no
desporto. Nas aulas e recreios, “jogar com os rapazes” era uma opção, bem
como a participação assídua nos torneios de ténis de mesa e matraquilhos e
adorava (mesmo não ganhando)! Comparando com outros miúdos, a verdade é
que não tive muitas experiências desportivas (algo que hoje em dia, defendo
bastante). Admito isso, e acho que foi um erro da minha parte. A verdade é que
tinha outros interesses como a música e a catequese e, por isso, andei 3 anos
no Conservatório, (na realidade são 18 anos envolvida com a música: piano e
coro) e 16 anos na catequese.
Sou pessoa de resmungar, de me queixar, de desanimar, e precisar de
incentivo, mas não sou pessoa de desistir. Ao longo do percurso, a música era,
e ainda é, o meu refúgio (“desaparecer por momentos”, todos precisamos, por
8
vezes, de um modo de fugir, torna-nos mais sãos), ensinando-me a ter a calma
necessária para enfrentar algumas situações e, de certo modo, a saber lidar
com o fracasso. Não obstante esta aprendizagem, o último ano no
conservatório foi um ano bastante complicado porque já não tinha prazer em
tocar piano, e essa desmotivação fez com que duvidasse mais de mim.
Já o ballet ajudou-me na construção de relações de amizade e no
conhecimento dos meus limites - até onde conseguia ir e até onde queria ir.
Dezasseis anos são muitos anos e vi muitas colegas a desistirem, outras a
entrar… e este vai e vem fez-me querer avançar sempre um pouco mais, lutar
por algo mais, tentar chegar mais longe.
Noutro polo, a catequese ajudou-me a compreender um pouco mais o
mundo, as pessoas, as verdades e as mentiras. Acreditar em algo, seja o que
for, fez-me uma pessoa mais paciente, mais afetiva e até mais compreensiva.
No 9ºano realizámos os Testes Vocacionais para aferir qual seria a
melhor área para seguir no futuro. Vou ser franca: não tinha ideia nenhuma do
que queria seguir. Estava um bocado cética, mas também ansiosa com o que
poderia sair dali. Os testes mostraram duas opções com resultados
destacáveis: a Música e o Desporto. Hmm… Música… Desporto… Os
resultados “acenderam” qualquer coisa cá dentro. Mediante todo o meu
percurso até àquele momento, a decisão a tomar não estava clara. Estava
muito dividida entre as duas opções pois ambas as áreas eram do meu
interesse. O que mais me afligia era tomar uma decisão que mais tarde me
viesse a arrepender. Só queria que alguém me ajudasse, afinal somos
influenciados pelas opiniões dos outros…
O ser humano e a sociedade interrelacionam-se e de alguma forma
condicionam-se comportamentalmente. Esse condicionamento provoca
alterações e transformações nos dois sistemas vivos (Milheiro, 2012). Não é
possível assumir os dois como entidades que (sobre)vivem separadas, na
medida em que fazem parte um do outro, pois não podem viver um sem o
outro. De acordo com Morin (1991), o imprinting cultural é uma marca imposta
ao humano por uma determinada cultura e cada um apresenta um imprinting
diferente pois resulta das vivências pessoais. Assim, pode-se assumir que cada
9
um de nós se apresenta com especificidades únicas e intransmissíveis, na
medida em que duas pessoas numa mesma cultura, podem ser diferentes
entre si. Desta noção surge uma outra: socialização latente ou socialização
antecipatória. Segundo Merton e Maillet (1970), este tipo de socialização
assume-se como a adoção de atitudes e valores de um grupo ao qual não se
pertence, tendo como objetivos facilitar a entrada nesse mesmo grupo e
apressar o processo de ajustamento depois de se tornar membro. Outros
autores defendem que é uma socialização que prepara o indivíduo para uma
vida profissional ativa. No entanto, esta socialização latente desenvolve-se
através de um continuum existencial, ou seja, ainda em idades muito precoces,
através da família e mais tarde amigos e professores, até à entrada na vida
profissional.
Esta socialização permitiu-me tomar esta decisão tão importante. A
influência dos meus pais (até certo ponto como positiva), a ida para o ballet
porque as amiguinhas também iam e o “empurrar” para a natação porque
respeitava as normas da sociedade foram fazendo crescer qualquer coisa em
mim. Mas nem toda a socialização é positiva. O ceticismo da minha mãe em
apostar numa via como a educação, ainda por cima em educação física.
Educação, uma via tão descreditada por todos, educação física nem “contava
para nota”, a falta de empregabilidade e a constante mudança de lugar eram
fortes razões para pensar duas, três e quatro vezes. O tentar mudar de ideias,
a imposição de dúvidas fizeram-me hesitar muitas vezes. Seria a opção certa
para mim, seria eu capaz de aguentar?
Todavia, tomada a decisão de entrar, tive que ir treinar, e o último ano
de secundário foi um ano de treino intenso. Tinha que mostrar que era mesmo
aquilo que queria. Voltei às aulas de Natação, treinei para Atletismo e participei
nas aulas de preparação de ginástica dinamizadas por alunos da Faculdade de
Desporto da Universidade do Porto (FADEUP). O tempo passou, a decisão não
mudou (penso que a minha mãe tinha esperança que por algum motivo a
minha decisão se alterasse, porém não teve muita sorte!) e o dia chegou!
ENTREI! Parecia que tinha conquistado o mundo! Que sensação!
Quando entrei na faculdade de desporto a minha ideia era ser
professora. Eu sabia que queria trabalhar com crianças. Já tinha tido
10
experiências e tinha adorado. Participei em campos de férias como monitora e
foi incrível. Estagiei com idosos e doentes oncológicos no 3º ano da
licenciatura e foi das melhores experiências da minha vida. Por isso, era
mesmo o trabalho com o outro que queria, pelo que a escolha do mestrado em
ensino era inevitável.
Gosto do ideal de que uma pessoa pode mudar o mundo! Dirão que é
inocente e ingénuo da minha parte. E se calhar… é mesmo! Mas essa hipótese
fascina-me! Julgo que devemos pensar assim! Uma pessoa pode fazer a
diferença. E eu quero ajudar a construir essa diferença. Não quero ser a
diferença, quero ajudar a que outros possam criar diferença. O professor é a
base. Todos tivemos professores bons, maus, que criavam, outros
reproduziam, que fascinavam, que irritavam… Porque todos fomos alunos. E
fomos influenciados de uma maneira ou de outra. E o desporto é capaz de nos
dar tanto: o sacrifício, a superação, a cooperação, o fair-play, a humildade, a
comunicação, nunca desistir são palavras de ordem no mundo do desporto. E,
provavelmente, esta transmissão de valores é a melhor contribuição da
educação física/desporto para a formação de crianças e jovens (e até mesmo
adultos).
Todavia, eu sei que o mundo não é todo cor-de-rosa. E ainda não sei
muito bem como transmitir isto tudo. E por isso, o primeiro passo que realizei
no início do estágio foi fazer uma introspeção, para procurar perceber do que
era capaz e o que ainda tinha que aprender. Primeiro, considero-me uma
pessoa de relação. Gosto de me relacionar com as pessoas, de criar ligações.
E com os meus alunos não poderia ser diferente. Não queria que fosse
diferente. Porque a relação é capaz de aproximar as pessoas, de as motivar,
de as encorajar, de fazer mudar. Quando demos aulas na escola no primeiro
ano de mestrado, uma das minhas maiores desilusões foi o facto de não ter
conseguido estabelecer uma relação/ligação com os miúdos e isso deixou-me
frustrada (as aulas foram poucas e os alunos faltavam). O processo de ensino-
aprendizagem não flui, parece que não existe evolução. A minha pouca
“experiência” diz-me que ter essa relação melhora a aprendizagem. Todas as
aulas que dei, quer a grandes ou pequenos, foi assim que atuei. E os
resultados foram positivos!
11
No início do ano e através de um processo autorreflexivo, destaquei os 3
principais óbices que poderiam pôr em causa a minha competência enquanto
professora. Primeiro, e se calhar o mais incapacitante, era o medo de errar.
Faz-me parecer fraca. Como se tivesse falhado, perdido. E não suporto perder.
Contudo o erro faz parte. E queria aprender a errar e a saber lidar com isso.
Queria saber lidar com a frustração, com este pensamento de fraqueza.
Outras das minhas dificuldades é ser sensível. Sou um “coração mole”.
E isso por vezes, pode-me fazer ser/parecer injusta. Porque ser sensível é o
que permite o contacto humano, as emoções, os sentimentos, os choros, a
interação, a relação. E isso eu não queria perder, mas também sabia que tinha
que me saber controlar nesse aspeto. Teria que, em algumas situações, ser
mais fria, menos “íntima”, esconder um pouco mais de mim.
Por último, tinha a necessidade de me “fazer entender” perante os
alunos, ou seja, não era um problema de falta de comunicação, mas sim
conseguir focá-los nos aspetos que eu queria. Fazer com que me ouvissem
desde o início ao fim. Mas mais do que isso, (e isso talvez se desenvolva com
a experiência) era saber quando dar feedbacks, qual seria o momento oportuno
ou até antever alguns comportamentos desviantes dos alunos.
1.2. “Expect the Unexpected”
O primeiro ano de mestrado alicerçou-me de algumas competências no
campo da docência e da pedagogia que certamente seriam úteis durante a
prática em contexto real. Essas competências estão dispersas por áreas
diferentes: o saber trabalhar em equipa e a capacidade de adaptação e de
resolução de problemas. Estas habilidades estão mais relacionadas com a
prática, mas não nos podemos esquecer das capacidades antes da própria
prática e por isso aptidões no planeamento, organização e criatividade dos
exercícios, assim como o saber teórico e tecnológico fazem sempre parte do
quotidiano do professor.
Esperava que o estágio me trouxesse muito. O estágio é uma ponte para
a vida de professor. É o fim e o início. É o fim da formação inicial e o início da
12
vida como professor. É um estado constante de exaltação e depressão (não
quero que seja de outra forma). É o primeiro contacto com uma turma. Uma
turma que eu posso dizer: “É minha!”. Uma turma que me vai tratar por “stôra”.
E vou gostar de ouvir isso! Porque é diferente. Porque sentimos um sentimento
de presença, e principalmente, de pertença. Ter que conhecer os miúdos, ir a
reuniões, relacionar com outros professores, partilhar conhecimentos, interagir
com os encarregados de educação.
Desta forma, a minha expectativa inicial baseava-se na possibilidade de
vivenciar diferentes experiências. Porque todos são diferentes, os métodos
diferentes, as práticas diferentes, os contextos diferentes. Porque dar é
receber! E quanto mais der de mim à escola, à comunidade escolar, ao
professor cooperante, aos alunos, mais todos os agentes de socialização
poderão retribuir. E assim o mundo evoluiu, o mundo (escolar) muda…
Esperava também que houvesse oportunidades para tentar suprimir ou
ultrapassar as dificuldades supramencionadas, principalmente o medo de errar.
A professora cooperante disse num dos primeiros dias “O erro é a alavanca do
conhecimento”. A frase ficou-me na memória. Fazia sentido e queria abraçar a
ideia, pois acreditava que me tornava melhor. Face a esta ideia, esperava
aprender com os erros. Porém, não podíamos cair no erro de pensar que “errar
é humano” como uma desculpa para erros sucessivos e frequentes, pois
“corrigir também o é”. O que importa é que através da reflexão possamos
corrigir e, eventualmente, aprender. Um professor reflexivo é um professor que
admite os pontos fortes, assume os pontos fracos e altera a sua forma de
pensar (quando confrontado com o erro ou diferentes pontos de vista).
Esperava poder compreender um pouco mais o universo de ser
professora (principalmente por se tratar de um contexto real, com alunos reais),
nos aspetos do trabalho em equipa com diferentes pessoas (com diferentes
vivências pessoais e profissionais), da adequação da comunicação a uma
situação específica e na capacidade de cativar um aluno (ou professor) para
algo.
Em relação ao núcleo de estágio, esperava poder contar com eles para
o que fosse preciso. Partilhar experiências e conceções, trabalho de grupo,
13
companheirismo, desabafos e confissões. Todos temos percursos diferentes e
áreas diferentes e isso será (sempre) uma mais valia.
Relativamente à professora cooperante, julgava que teria certamente um
papel preponderante. Esperava que me criticasse, corrigisse, que mê desse o
máximo de feedback possível. Que partilhasse as suas experiências, dê-se
conselhos, que fosse um membro ativo durante o nosso processo de
aprendizagem. Que servisse de exemplo, nas suas práticas, e conquistas. No
que diz respeito à professora orientadora, esperava um feedback das aulas
assistidas assim como de todos os trabalhos pedidos ao longo do ano, de
modo a poder ir melhorando.
Em suma, e utilizando a superstição utilizada nos casamentos “novo,
velho, emprestado e azul”, se virmos bem, não deixa de ser o início de uma
nova fase, pelo que desejava que fosse um confronto entre o novo (alterar o
que não se faz bem) e o velho (reaproveitar o que se faz bem), juntamente com
o empréstimo (partilha) de algumas ideias e experiências. O azul assumiremos
sempre como a felicidade e assim desejava que fosse algo prazeroso para
todos (estudantes estagiários, professora cooperante e orientadora,
professores da escola cooperante e os alunos).
ENSINAMENTO
“Somos o que fazemos, mas somos sobretudo o que fazemos para
mudarmos o que somos”
Eduardo Galeano
Esta frase espelha a importância do “fazer para mudar”. Para se
reinventar. Para se transformar. Somos claramente, produto de um passado,
mas também de um presente e de um futuro. De um futuro, onde deve haver
espaço para mudar. O professor deve repensar as suas práticas. As suas
formas de ver, para poder melhorar enquanto pessoa e profissional.
17
2.1. O que é o Estágio Profissional?
O estágio em contexto real de ensino é considerado na literatura como
uma das componentes mais importantes nos processos de formação inicial de
professores (Chepyator-Thomson & Liu, 2003; Fan Tang*, 2004; Hill & Brodin,
2004; O’Sullivan, 2003).
O estágio profissional é a última etapa da formação inicial de qualquer
professor. É a ponte para o mundo real. É um momento de intensa formação,
de constante (re)construção, de saber liderar e organizar o processo de ensino-
aprendizagem e de permanente contacto com o contexto real. É neste
momento que a teoria aprendida se vai aliar à prática e ao contexto e dotar o
professor de competências. Este procedimento é visto como um “choque com a
realidade” (Veenman, 1984). É o culminar de um processo longo e cheio de
pequenas experiências.
Stones e Straker (2006) referem que graças à simbiose entre o ambiente
profissional e a partilha com profissionais experientes, as aprendizagens
profissionais são adquiridas mais facilmente. A relação com os profissionais
experientes deve ser aproveitar por ambas as partes: os mais novos para
poderem perceber melhor o funcionamento burocrático de uma escola,
acompanharem diferentes métodos de ensino, beberem um pouco daquilo que
é o contexto real, enquanto os mais experientes devem tentar conhecer novos
modelos, renovar até algumas práticas e aprender renovadas correntes de
pensamento. Esta ligação entre estudantes-estagiários (EE) e professores
experientes deve ter por base a partilha e a comunicação.
O EE não se deve preocupar apenas com a aquisição de conhecimentos
e competências pessoais, pois o estágio é o momento certo para refletir
criticamente sobre alguns assuntos - “Como motivar? Que modelo usar? Ser
mais diretiva ou amiga? Como encontrar esse equilíbrio? Como proceder em
situações de bullying?” - estando num estado de permanente questionamento.
Wittrock e Association (1986) defendem que o ensino não é apenas da
responsabilidade do professor, mas também deve envolver o formando num
processo ativo de saber. Essa aprendizagem tem que ser um processo de
18
construção, desconstrução e reconstrução de novos conhecimentos e práticas
(Batista, 2011).
O estágio é também um instrumento capacitador e dotador de
ferramentas que auxiliem a desenvolver a experiência refletida e com
significado, sempre com vista ao futuro do professor (Batista & Queirós, 2015).
O estágio profissional permite que cada professor crie uma imagem
representativa do que é a escola, e mais significativo do que isso, do que deve
ser a escola, pois a realidade de cada um é pessoal, subjetiva e singular. Esta
imagem pode (e deve) ser alterada ao longo do tempo de carreira profissional
pois as variáveis envolventes também se alteram. O contexto escolar, os
colegas docentes, os alunos, as práticas, as mentalidades, os saberes, as
aprendizagens, as exigências da sociedade, tudo isto é mutável… e a imagem
deve acompanhar sempre essa instabilidade.
Com a aproximação ao contexto real, apreende-se a “trilogia do saber”:
a aquisição de um saber, de um saber fazer e de um saber refletir sobre os
erros das ações pedagógicas no quotidiano profissional (Barros, 2012).
Braga (2001) acredita que uma formação adequada dos professores é
responsável pelo sucesso das novas gerações, sendo necessário que seja uma
experiência prazerosa e não traumatizante. Sendo assim, nós professores,
somos responsáveis por moldar e desenvolver as gerações de amanhã. Mudar,
portanto, o mundo. Fazer com que sejam tudo aquilo que foram, são e podem
vir a ser.
2.2. Acerca da legitimação da Educação Física
É incrível pensar como a Educação Física (EF) tem que “exibir”
constantemente o seu valor educativo e justificar o seu lugar no currículo. Esse
mesmo currículo que tem a Educação Física como uma das duas únicas
disciplinas que acompanham os alunos desde o princípio até ao fim do seu
percurso escolar obrigatório (1º até ao 12ºano). Era, portanto, razoável julgar,
que a Educação Física estando tão presente, não estivesse tão afastada dos
alunos. Na realidade, não é só nos alunos que se identifica essa distância,
19
também está presente no corpo docente, na escola, nos encarregados de
educação e nos órgãos de gestão. A designação de áreas “fortes” ou “sérias”
em detrimento das “fracas”, provoca logo à partida uma separação que foi feita
por “alguém”. A Educação Física tem resistido enquanto, de alguma forma, for
uma “moleta” para as outras disciplinas, no que concerne ao ensino e
aprendizagem (Renson, 2006). Basicamente, enquanto for conveniente para
as outras disciplinas, como bom português diria: “até dar jeito”. Mas… porquê?
Não é de todo complicado chegar à conclusão que as disciplinas ditas “mais
fracas” são aquelas que estão mais relacionadas com o corpo como a
Educação Física, com as artes como a Educação Visual e Tecnológica (EVT) e
até mesmo com a cultura como a Música. Então, a primeira pergunta a colocar
é: E porquê? Sim, porquê? O que está a Educação Física, o EVT e a Música a
fazer mal? Todavia, se são precisas razões para legitimar a Educação Física
no currículo, então a Educação Física é bem capaz de se defender.
Primeiro, é a única disciplina no currículo que visa a corporalidade de
uma forma muito própria, isto é, que cria nos miúdos a noção de imagem e
esquema corporal, a noção do seu próprio corpo, a noção de
consciencialização do eu. Numa sociedade, cada vez mais orientada para o
preconceito e a discriminação, para o bonito e o feio, para o magro e o gordo,
para o branco e o preto (digamos que são tudo características que podem ser
julgadas a “olho nu”, ou seja, sem qualquer tipo de necessidade de interação
ou relação pessoal), é importante os alunos terem a noção de quem realmente
são (perceberem por eles próprios e não por aquilo que os outros pensam ou
dizem que é), aceitarem-se e trabalharam para atingirem o melhor de si, com
tudo aquilo que têm (o bom e menos bom), pois faz parte de quem são. E
existe melhor disciplina que não a Educação Física para proporcionar isso? Por
favor, digam-me!
É preciso, (na realidade deveria ser quase uma obrigação) que as
disciplinas acompanhem um pouco a evolução da sociedade. Pois, é nesta
sociedade que os alunos vivem, interagem, comunicam, “se fazem”. E com
esta ideia, surge o segundo argumento de legitimação: o combate à obesidade
infantil e o sedentarismo (em função da questão da saúde). Contudo, temos
que ser realistas na análise que se faz dos números e a responsabilidade que
20
colocamos nos “ombros” da Educação Física. Não é com apenas 150 minutos
por semana (na maior parte das vezes, até menos) que será possível que os
valores exorbitantes que são apresentados hoje em dia, sejam “combatidos”.
Sejamos realistas: não é possível! Se querem resultados, tem que haver mais
tempo de prática. Se virmos bem, o principal objetivo da Educação Física é
criar o gosto pela atividade física ou por uma modalidade específica, é dar-lhes
oportunidades para experimentar: novas modalidades, padrões motores
diferentes, aparelhos distintos. E a partir daqui fazer com que pratiquem
regularmente alguma “modalidade”, pois somente nas aulas isso é
completamente impossível. Por isso, por favor, não culpem (totalmente) a
Educação Física.
Em terceiro lugar surge um argumento de bastante relevância: o
desenvolvimento das capacidades cognitivas e a aquisição das capacidades
comportamentais. Mas vamos por partes: as capacidades cognitivas são
habilidades que são aprendidas em diferentes graus e que se desenvolvem ao
longo do crescimento do indivíduo. Com a atividade física, capacidades como a
atenção, a coordenação, a perceção, a linguagem e a memória (a curto prazo,
contextual, visual…) são “ampliadas”. Mas também o raciocínio, a lógica, a
tomada de decisão e resolução de problemas vão sendo aprimoradas. Por sua
vez, as capacidades comportamentais, designadas por soft skills são
conquistadas a partir do autoconhecimento, que leva a uma compreensão e
domínio sobre as suas capacidades e oportunidades de melhoria. Com um jogo
de futebol (e num simples recreio) qualquer um é confrontado com habilidades
como a liderança, a cooperação, o saber trabalhar em equipa, a comunicação
efetiva, a capacidade de negociação e a relação interpessoal e isso é
trabalhado em Educação Física.
O quarto argumento e talvez seja aquele que é menos “valorizado” é a
cultura desportiva. Isto é, o desporto como fonte de valores, quer sejam
desportivos quer sejam sociais. A verdade é que a sociedade atravessa uma
forte crise de valores e por isso é fundamental desenvolver valores na escola.
Valores como a ambição, a aventura, a paixão, a persistência, a entreajuda, o
fair-play, a competição (na sua abordagem mais positiva, relacionada com a
superação) fazem todos parte do dicionário desportivo, quer seja em
21
competição, reabilitação ou recreação. O respeito pelo outro, a tolerância,
saber lidar com a vitória e a derrota são de tal forma contemporâneos no
desporto que existem várias campanhas de combate ao racismo e
discriminação no mundo do desporto e por parte de várias organizações
desportivas, como a UEFA, a FIFA e outras.
Como quinto argumento surge uma antítese. O stress que a EF provoca
nos meninos vs o rendimento escolar. Por um lado, e “Nas palavras do
Presidente da CONFAP, esta é uma medida (EF deixar de contar para a média
de acesso para o Ensino Secundário) extremamente positiva, porquanto vai
retirar stress desnecessário aos meninos!” (Batista, 2012). Por outro lado,
estudos mostram que alunos que praticam exercício físico apresentam melhor
rendimento escolar. Vamos ver se entendi, se querem que se alivie o stress
aos meninos, então penso que “os meninos” iriam preferir que não existissem
exames, era provavelmente uma medida mais eficaz para reduzir o stress.
Portanto, em que ficamos? Assim estamos a adotar “um processo em que os
meninos não tenham que enfrentar stress, não tenham que se esforçar, se
superar, se empenhar, se deparar com o insucesso.” (Batista, 2012). Estamos
a criar futuros médicos, engenheiros, arquitetos, polícias, professores que não
serão capazes de lidar com nada. O desporto também é isso. É saber lidar com
as adversidades, saber lidar com a frustração, saber lidar com a derrota (aqui
estão representados novamente os valores).
A escola deve ser por isso um local de dualidade: onde a superação, a
confiança, o esforço, o trabalho em equipa, a vitória, o respeito, a tolerância, a
experiência e prática, a ética e moral devem reinar, mas também a frustração,
a derrota, o insucesso, o stress (até porque ele vai aparecer no futuro) devem
estar presentes, pois só assim conseguimos preparar as crianças e jovens para
o presente e para o futuro.
22
2.3. Acerca de uma conceção de Educação Física
A Educação Física tem muitos poderes. Existem várias conceções
acerca do que é ou deve ser a EF. De entre as veiculadas pela literatura, realço
quatro: (1) A Psicomotora, que acredita que a EF tem poder para formar
integralmente o aluno, nos processos cognitivos, afetivos e psicomotores (Le
Boulch, 1987; Soares, 1996); (2) A Construtivista, que defende a construção do
conhecimento a partir das interações da pessoa com o mundo. Esta proposta
tem em consideração o passado conhecedor da criança (Freire, 2002); (3) A
Crítica, que questiona as atitudes fora do contexto da EF na escola, e quer
propiciar a inserção da transformação nesse contexto (Bracht, 1992; Soares et
al., 1992); e (4) A Desenvolvimentista, que alega que a habilidade motora é um
meio de excelência para que as pessoas se adaptem. Assim, o foco deve estar
nas condições para atingir um certo grau de comportamento motor (Manoel et
al., 1988).
No âmbito das Unidades Curriculares de Desenvolvimento Curricular e
Profissionalidade Pedagógica foram pedidos alguns trabalhos para desconstruir
os dogmas que trazíamos do tempo de aluno e apercebi-me que a situação
está melhor do que na altura em que saí da escola. Já admite ter paridade com
as outras disciplinas, pois já conta para a média de secundário e tem provas de
aferição, contudo não quer dizer que não seja ainda negligenciada por alguns.
Se nós negligenciamos, porque não o farão os alunos e encarregados de
educação? Que argumentos temos nós para pedir, exigir, o que quer que seja?
Nem nós acreditamos no nosso trabalho. Nem nós lutamos por ele, e ele é
nosso. Porque fariam os outros isso?
Capel e Whitehead (2012) defendem que a EF é vista como
divertimento, não existindo um verdadeiro significado na educação. Os outros
professores tendem a acreditar que a Educação Física é um espaço de lazer
para os alunos, é um “intervalo sério da educação (das áreas disciplinares
cognitivas) (Batista & Queirós, 2015).
Atualmente, com quase um ano “nas costas”, depois de aulas,
reuniões, leitura de documentos, atividades… admito que as minhas
crenças foram “alteradas”, no sentido que agora tenho uma visão mais “real
23
e profunda” do que é a Educação Física na escola. Estando presente em
todos os ciclos de ensino, a EF é um meio de transformação social e de
sensibilização para algumas questões sobre o mundo. Envolver os alunos
em projetos ou através de alguma modalidade fazem com que a EF seja
uma fonte de cultura humanística. Também percebi que a EF é um meio
para reforço de outras aprendizagens (em orientação falamos de escalas,
rosa dos ventos…), porque sendo multidisciplinar, a associação a outras
disciplinas, torna-se bastante benéfico para o aluno. Com a introdução das
Aprendizagens Essenciais e do “Perfil do aluno à saída da escolaridade
obrigatória”, ficou inevitavelmente visível que a Educação Física tem um
potencial enorme. No entanto, para mim, após a primeira reunião intercalar foi
gritante o que deve ser a Educação Física. Deve ser focada no aluno. Deve
servir para o ajudar. Deve ser apoio. Um espaço em que o indivíduo se sinta
bem. Um lugar onde se possa superar e conseguir alcançar sucesso. Não tem
que ser o mesmo para todos. Enquanto professora de EF acredito que
devemos conseguir ajudar os nossos alunos. É ingénuo da minha parte achar
que vou conseguir provocar alguma coisa em todos os alunos ou ajudá-los em
tudo o que está mal, mas acredito que devemos ter um papel ativo na “vida”
deles. Devemos estar especialmente atentos e procurar soluções que possam
ajudar e não complicar.
Crum (1993) defende que a Educação Física deve estar alicerçada em 3
princípios fundamentais: a aquisição de condição física, a corporalidade
consciente e a formação pessoal, cultural e social. Tudo isto faz sentido se
considerarmos o desporto como um fenómeno cultural social e biologicamente
intrínseco a cada um de nós. É preciso viver o desporto de forma a se sentir.
Uma outra conceção foi “construída” durante as aulas de
Profissionalidade Pedagógica. A professora pedia para escrevermos pequenos
textos e após a revisão desses pequenos momentos de devaneio, posso
afirmar que aquele em que não alterava nada foi o que redigi no dia 4 de
outubro de 2017, em que o tema foi “Que razões me levaram a escolher ser
professor?
“É uma pergunta pertinente, pois com certeza não será pelas mesmas
razões que a maioria escolhe qualquer profissão. Um salário baixo, a
24
estabilidade inexistente e o reconhecimento (social) que desapareceu
são a realidade da nossa profissão… por isso… realmente que razões
me levaram a escolher ser professora? Sempre gostei de estar com
crianças, tomar conta delas e brincar com elas. Algo muito importante
para mim é o contacto humano, algo que se está a perder cada vez
mais. De seguida, julgo que o professor é alguém que pode e deve
mudar mentalidades, alguém capaz de incutir valores (numa sociedade
que atravessa uma grave crise de valores), mudar pensamentos, moldar
pessoas, mudar o mundo um bocadinho de cada vez, pois ser um
exemplo, ser um líder é algo fascinante.”
Esta é a conceção que não mudou. O professor de Educação Física tem
a capacidade de poder ser muito mais.
2.4. Aprender em Educação Física
A escola deve-se preocupar fundamentalmente com o aqui e o agora ou
com o futuro? O que realmente importa na aprendizagem dos alunos? O que
deve fazer a escola? A Educação Física e o desporto em si (intra e
interescolar) devem dar experiências que tenham significado, que sejam
alegres e prazerosas para os alunos (Crum, 2017). Para podermos construir
um futuro mais rico, temos que formar crianças para o futuro e não para o
passado. Aprender para o futuro, através do presente, não esquecendo o
passado. De facto, como enunciam Fullan & Hargreaves (2001, p. 28) “existe
um sentimento crescente da necessidade de uma mudança fundamental no
ensino, no currículo e na liderança educacional, em todos os níveis do sistema
educativo.”
Então, como aprendem? E o que aprendem os alunos? Futebol,
Basquetebol, Atletismo, Ginástica? E o resto? Existem algumas teorias de
aprendizagem como a construtivista, a ecológica, behaviorista, a situada e a
sociocultural. Vamo-nos focar nas duas últimas, pois penso que são aquelas
que melhor transmitem o que devemos esperar da Educação Física.
25
A teoria da aprendizagem situada remete para que os alunos se
envolvam na sua própria aprendizagem, de forma a terem uma participação
ativa (Kirk et al., 2000; MacPhail et al., 2008). Estes autores defendem que
existem três patamares de situacionalidade: a interativa, a social e a cultural.
Nestas três dimensões, as palavras de ordem são relação e aluno. A dimensão
interativa mostra uma relação entre o ambiente e o aluno. A social releva as
relações entre os todos os atores da escola: alunos, professores,
funcionários… e a cultural evidencia os recursos culturais que cada aluno traz
para o contexto em que está inserido.
Uma teoria mais recente, mas baseada na teoria anterior é a teoria de
aprendizagem sociocultural (Quennerstedt et al., 2014). Esta teoria caracteriza-
se por 3 elementos principais: individual, social e institucional. Estes três atores
têm uma relação contínua entre os professores, alunos e a cultura da
instituição.
Estas duas teorias mostram-nos duas conclusões vitais. Primeira, a
aprendizagem deve-se alicerçar na compreensão, comunicação e interação.
Segundo, o sentimento de pertença e envolvimento são cruciais para a
aprendizagem (Lave & Wenger, 1991), pois é situada num contexto social e
cultural. Por isso, quantos mais os alunos participarem, quanto mais derem a
sua opinião e quanto mais essa opinião for tida em conta, mais eles vão querer
aprender. Assim, o professor deve servir de ponte entre o aluno e o seu
autoconhecimento. Dar-lhes “liberdade” para descobrir coisas novas, para
procurar coisas novas, para fazer coisas novas. Porque isso também é
Educação Física.
As primeiras referem-se a todo o comportamento motor do movimento,
ou seja, habilidade para saltar, dançar, fazer uma finta, ultrapassar um
adversário. A segunda tem haver com os valores que o desporto deve incutir,
sejam individuais ou coletivos, como aceitar a derrota e a vitória, a superação,
a tolerância, o respeito. O conhecimento prático advém de colocar tudo aquilo
que aprenderam na prática, seja uma situação desportiva, seja uma situação
do quotidiano. Tudo é conhecimento prático. A capacidade reflexiva pode
também ser utilizada no dia-a-dia: pensar, repensar e voltar a repensar.
Melhorar os comportamentos, pensamentos, formas de agir e ações. Faz-nos
crescer a todos um pouco mais. Por fim, as competências afetivas desportivas
26
e sociais são importantes. No caso das habilidades desportivas é significativo,
os alunos terem laços afetivos positivos com o desporto. Em relação às sociais,
estas interações tornam-nos mais humanos. E esta humanidade faz falta hoje
em dia. Todavia, todas estas diferentes competências não são inatas, não
surgem naturalmente (Crum, 2017). Para se apre(e)nder é necessário uma
aprendizagem estruturada. E os professores têm que perceber que a sua
prioridade deve ser ajudar os alunos aprender (Locke et al., 1984).
2.5. A escola como instituição
Ao longo dos anos, a escola tem vindo a alterar as suas técnicas de
ensino, metodologias práticas, materiais, visão dos professores e alunos.
Acompanhando esta mudança (da sociedade), o seu papel, a sua ideologia e a
sua missão também têm sofrido alterações.
E que escola é esta que temos hoje? Ramos (2012) defende a ideia de
que a escola é um lugar de aprendizagem, onde se adquire o saber
especializado, a ciência. O mesmo autor acredita que é através da escola que
o saber espontâneo passa a ser reconhecido como saber especializado.
As instituições escolares têm um papel ativo no desenvolvimento do
indivíduo. A escola deve assumir esta preocupação na formação de cada
aluno, pois é aqui que se estabelecem relações sociais e de afeto, é aqui que
se adquire conhecimento, é aqui que se aprende a ser cultura. Esta ideia
permite associar o que Oliveira et al. (2013) defendem que tudo aquilo que o
aluno vivencia, “promove mudanças na sua perceção do mundo, a ponto de
criar nele a consciência da necessidade de transformar no seu entorno”.
A escola tem que ambicionar ser mais. É no dar e receber que a escola
deve se basear. Para receber dos alunos, as suas experiências, interesses,
motivações e relações deve também dar um pouco de si. E para isso, procurar
um sistema que permita incluir todos os alunos, ou seja, um ensino
personalizado que se preocupe com cada aluno, aluno esse capaz de reagir
em situações reais, um ensino que acompanha as mudanças sociais e culturais
(Almeida, 2017).
Gairín (1999) defende que a instituição escolar é um lugar de relações
27
pessoais e interpessoais, influenciada interna e externamente, consoante os
membros que a integram, o meio onde está inserida e a sua cultura interna.
A UNESCO apresentou um relatório denominado por “Educação para o
Século XXI (Delors et al., 1996). Nele reforça-se a ideia de que a escola deve
ser um cumpridor ativo dos “4 pilares do conhecimento” – aprender a conhecer,
aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser. A educação não
pode ser vista como um processo com apenas 12 anos (escolaridade
obrigatória), mas sim como uma vivência global, que se prolonga num
continuum durante toda a vida. Esta experiência influencia o sujeito a nível
cognitivo e prático, enquanto indivíduo apenas e membro de uma sociedade.
Segundo Berger & Luckmann (1974, p. 87), “A sociedade é um produto
humano. O homem é um produto social”. A escola, no seu processo educativo,
deve colaborar na conscientização do indivíduo como pessoa e membro de
uma sociedade (Gelati, 2009). A educação é hoje unanimemente considerada
um dos principais veículos de socialização e de promoção do desenvolvimento
individual. Azevedo (2010) destaca o papel que a escola tem dentro de uma
sociedade, pois ao desenvolver o homem na sua individualidade, também o faz
pensando num coletivo. Este pensamento promove mudanças desejáveis e
estáveis nos indivíduos; mudanças que favoreçam o desenvolvimento integral
do Homem e da própria sociedade (Carvalho, 2006).
Cada escola tem a sua própria cultura, que distingue cada organização
das restantes e agrega os seus membros em torno de uma identidade
partilhada, facilitando a adesão aos objetivos da mesma (Bilhim, 2004). Esta
cultura perpetua-se e reproduz-se através da socialização.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos é uma carta de princípios
que estabelece os direitos humanos básicos. O artigo 26º defende que
educação é um direito (para todos). E isso deve ser visto em todas as
sociedades. Assegurar a formação das nossas crianças, adolescentes, jovens
deve ser uma prioridade dos governos. Essa formação tendo em vista as
dificuldades de cada aluno permite aprendizagens completas e enriquecedoras
que potenciem as virtudes de cada um. Para desempenhar o papel de
“elevador social” a escola deve (re)pensar as suas práticas de forma a permitir
28
que todos os alunos tenham as mesmas oportunidades de aprender e alcançar
o sucesso.
2.6. Desafios da Escola no séc. XXI
A escola do séc. XXI enfrenta desafios que há 20, 30 ou 40 anos nem
imaginava que teria que combater. O aluno é o cerne da escola, a sua maior
preocupação. E tudo o que é feito deve ser em favor do aluno (e não só). Desta
forma, hoje em dia, os professores só conhecem dois tipos de alunos: o aluno-
problema e o aluno diferente (Aquino, 2007) Estes “dois alunos” caracterizam-
se pela indisciplina e pelo baixo rendimento escolar que em conjunto com a
não-mudança de práticas e a falta de cumprimento do professor fazem com
que o aluno se desinteresse pela escola.
Nóvoa (2009) alerta para uma das principais críticas que, atualmente, se
coloca à escola: a incapacidade de promover o valor da aprendizagem e fazer
com que todos os alunos tenham, realmente, sucesso. De facto, um dos
desafios que a escola enfrenta é o insucesso escolar e conseguinte abandono
precoce (Quaresma, 2011). Este abandono não acontece nos mesmos moldes
de antigamente devido à escolaridade obrigatória até ao 12º ano, que promove
uma sociedade mais culta. Contudo, quando o insucesso escolar é grande
existem alternativas ao ensino comum, como os cursos profissionais. Estas
alternativas criam um problema consequente que é a segmentação social na
escola através dessas escolhas (Leite, 2011).
Outro desafio deve-se à interculturalidade presente nas escolas, pois
opiniões, motivações, vivências fazem com que cada um de nós tenha a sua
própria cultura. Apesar de cada um “ser”, a relação com o próximo pode
moldar-nos. A nossa identidade caracteriza-se pela sua plasticidade,
mutabilidade, algo que lhe é inerente. Essa identidade está presente todos os
dias, no modo como falamos, vestimos, andamos, no que ouvimos, como
vemos o mundo, basicamente, no modo como somos. Todavia, este desafio
tem duas perspetivas. Por um lado, esta diversidade cultural pode ser algo
bastante positivo porque o contacto com outras culturas permite-nos aprender,
29
conhecer, abrir os nossos horizontes, experienciar costumes e hábitos
distintos. Por outro lado, esta diferença nem sempre é bem aceite. Um
entreposto cultural é um posto dinâmico entre culturas que constantemente se
confrontam no mesmo espaço e tempo (Torres, 2008). A escola é esse
entreposto cultural, culturas diferentes no mesmo espaço e tempo, que têm que
confraternizar (ou não). E quando “o não” impera, aí temos um problema. Cada
vez mais é regular notícias de situações em que a discriminação e o
preconceito estiveram presentes, não só na escola, mas na sociedade em si,
no desporto até. E é na escola que se deve atuar em primeira instância. E
como o podemos fazer? Não é uma receita, é um conselho. Devemos incutir
nas crianças, a ideia de consciência para a cidadania, ou seja, perceber que
existe um eu e um outro e que através dos afetos e da solidariedade (Gómez,
2008), esses dois “estranhos” podem coabitar o mesmo espaço sem conflitos.
Quando abordamos a “Educação Inclusiva”, referimo-nos a uma escola
para todos, mesmo todos. Segundo Leite (2011), esse percurso escolar deve
refletir verdadeiramente um desenvolvimento académico e pessoal, pois não
podemos ficar apenas pelo papel. A escola enquanto local de preparação para
o futuro deve fornecer ferramentas para os alunos atuarem em situações reais.
Sejam alunos “normais” ou portadores de alguma deficiência, brancos ou
pretos, pobres ou ricos, altos ou baixos. Se o objetivo é uma escola em que
todos estão frequentemente em contacto, então todos devem ter acesso a
oportunidades, vivências e instrumentos que os permitam e ajudem a alcançar
algo mais. Sejam eles quem forem.
Os últimos dois desafios estão relacionados na medida em que se
influenciam um ao outro. É preciso melhorar a imagem da escola pública (Leite,
2011) e é necessário estimular, (vamos apelidar) o “combate aos vintes”. A
escola pública é vista como local de insegurança e rebeldia, com falta de
apoios financeiros e carência de oportunidades. Com esta visão tão denegrida,
a escola pública necessita de condições para não ser uma escolha apenas
devido aos recursos económicos dos encarregados de educação. Num país
livre (e ideal), cada um deveria poder escolher o que considera ser melhor para
si. Assim, entre a escola pública e a privada o discurso para caracterizar as
duas não pode ser tão díspar. Há que mostrar que na escola pública também
30
existem boas práticas e profissionais competentes e preocupados que farão o
seu trabalho em prol dos seus alunos. O caso do “combate aos vintes” é algo
mais difícil de enfrentar, pois abrange mais setores: encarregados de
educação, alunos, pais, professores, direção, governos. O facto de “o menino
ser aluno de 20 no secundário”, não é garantia de que terá uma vida facilitada
no futuro. E todos devem perceber isso. Não é apenas o resultado que conta, o
processo e as aprendizagens devem ser valorizadas desde o início do percurso
escolar. As escolas vivem para os rankings, os alunos vivem para as notas e os
pais só querem um 20. Esta obsessão provoca nos alunos stress, descontrolo
emocional e, muitas vezes desinteresse total devido ao fracasso dos
resultados. É preciso combater esta overdose de pressão a que os alunos
estão sujeitos.
2.7. Desafios do Professor no Séc. XXI
Se antes a escola era apenas um lugar de aprendizagem, hoje em dia é
muito mais que isso. E se antes o professor era um mero transmissor de
informação, atualmente, o professor é psicólogo, educador, orientador,
supervisor, intermediador, líder, gerente de emoções, entre outras.
Compartilhar conhecimento já não é função única. O professor tem que se
preocupar com o desenvolvimento do aluno nas suas diferentes formas,
estimular a criação de relações saudáveis com o outro, gerir e ajudar a superar
frustrações e fracassos. Com todas estas “novas” funções, o professor do
século XXI tem o trabalho mais dificultado. Novos desafios e problemas é
preciso enfrentar pois “O mundo não é, o mundo está sendo… (Freire, 1996) e
a escola deve acompanhar essas mudanças.
Um dos desafios é o processo de desvalorização que a profissão
enfrenta (Hagemeyer, 2004). Desconsiderado por governantes, encarregados
de educação e alunos, “ser professor” enfrenta uma crise sem precedentes,
nestas últimas décadas. Esta desvalorização não afeta só os professores, mas
também os alunos. Como? Porque os professores sentem que não é
reconhecida a sua importância e podem acabar por desistir. Então, o que fazer
para valorizar a docência? O ano passado realizou-se em Edimburgo a 7ª
31
Cimeira Internacional da Profissão Docente. Foi apresentado o relatório
Internacional da Educação que de forma breve considera que “os professores
necessitam de um efetivo apoio dos governos ao seu trabalho, do
reconhecimento da sua importância social e da satisfação de condições que
confiram mais qualidade ao exercício da sua profissão.” Aqui está a receita!
Agora é só seguir! Falar é fácil! Mas efetivamente a valorização deve começar
nos cargos mais altos. O apoio dos governos faz com que haja uma forma
diferente de ver a docência por parte dos governados. Auxílio não tem que ser
necessariamente dinheiro. Apoio pode ser os outros dois aspetos mencionados
acima: reconhecimento social e condições de trabalho. Reduzir o número de
alunos por grupo, aumentar o número de docentes, e redução de precariedade
e de oscilações no desenvolvimento profissional, formações apoiadas
diversificadas, melhorar a ajuda aos professores que trabalham em contextos
problemáticos e de isolamento. Os professores também têm que lidar com
baixa autoestima, instabilidade emocional e sentimento de fracasso. E todas
estas medidas dão melhores condições à profissão e ao professor, todas elas
são uma forma de reconhecer a importância deste ator social numa sociedade
tão “desgastada”.
A relação entre professor-aluno é algo que deve ser cultivado desde o
início. E porquê? Somos seres relacionais. John Donne (séc. XVII) escreveu
“Nenhum homem é uma ilha”, ou seja, precisamos uns dos outros para sobreviver
individual e coletivamente, e por isso a ajuda mútua é essencial para a vida.
Existimos em constante relação com o mundo, com as pessoas que nos
envolvem e a forma como nos relacionamos afeta proporcionalmente a
qualidade da nossa vida, não só para o bem como para o mal. Desta forma,
esta relação deve ser construída todas as aulas, pois uma relação saudável
contribuiu positivamente no processo de ensino-aprendizagem. Esta ligação,
pode até, às vezes, contribuir para combater a falta de afeto e de preocupação
que alguns alunos sentem e assim resolver alguns problemas de atitude,
porque por vezes, esses comportamentos desviantes são apenas uma forma
de chamar atenção. Mas mais do que se relacionar com o professor é
relacionar-se com o outro. O trabalho em rede é fundamental em qualquer lado,
é uma das competências básicas para qualquer trabalho. Fomentar a
32
cooperação e a sinergia de recursos permite que se aproveite o melhor que
cada um tem para dar.
Desafio um pouco controverso. Ensinar vs educar! Será o professor, um
educador? Compete ao professor educar os alunos? Conseguirá fazê-lo com
apenas 3/4 horas semanais? Antigamente, a escola era apenas um lugar de
ensinamentos, pois a família educava. E agora? A primeira escola deveria ser a
família, transmitindo valores morais, afetivos e sociais. A família deixou de
cumprir a sua função de educadora. No quotidiano, é cada vez mais frequente
confundir ensinar de educar. E por isso estes dois termos são inseparáveis
(Brostolin & de Oliveira, 2015), pois torna-se uma necessidade cada vez mais
presente: educar ensinando e ensinar educando. Educar através do
conhecimento de uma fonte de valores deve ser uma das preocupações dos
professores. A sociedade atravessa uma grave crise de valores e a escola
deve ser um ativista inato nesta matéria. Os alunos passam tanto tempo na
escola, que porque não, aproveitar o tempo para expandir um pouco os
horizontes dos alunos, de forma a poderem atingir uma formação mais
completa e abrangente. Não é tarefa fácil, ninguém o disse, porém é preciso
que o professor se comprometa e cumpra as suas funções.
Outro desafio passa por “ser quem é”. O professor deve respeitar a
individualidade de cada um, incentivar que os alunos tenham curiosidade, que
procurem mais sobre os assuntos que gostam, “pois somos seres éticos e
inacabados” (Pereira, 2014). Não é papel do professor ridicularizar, humilhar e
minimizar os gostos do aluno e as suas virtudes, porque só vai aumentar a
insegurança e o receio de fracassar ou dizer algo de errado do aluno e isso, é
um verdadeiro erro. Um professor assim pode afetar bastante um aluno,
influenciar a personalidade do mesmo. Iniciar a “transformação” é o que todos
nós procuramos. Procurar um mundo melhor, com mudanças que possam ser
benéficas para o convívio entre todos.
Desafio a desafio ficamos a compreender que a vida de professor é
complicada nos dias que correm. É necessário pensar nas metodologias,
modelos, estilos de ensino que se usam hoje. Segundo Pereira (2014), o
professor não deve ser um transmissor de conhecimentos, mas sim um
33
“(re)construtor do saber ensinado”. Através de modelos e metodologias focados
neles, sentem que são parte integrante do processo de ensino, acabam por
aprender melhor. Prensky (2007) refere que os professores perspicazes estão
a aperceber-se de que aprender vem da paixão, não da disciplina. Este
conhecimento, que não é apenas algo debitado, apresenta razões para ser
aprendido, pois o sentimento de pertença está presente.
Criatividade! Ser diferente! Não ter medo de ousar! São expressões
ouvidas várias vezes e em situações diferentes. Não são apenas os alunos que
são diferentes entre si, os professores também o são e devem mostrar de facto
que o são. Um professor deve procurar ser diferente, colocando os alunos em
situações que os deixem desconfortáveis, para num futuro não ser tão
desconfortável. Levar os alunos a debater e a refletir é algo importantíssimo
para a formação dos mesmos. Saber falar sem engasgar é fundamental. Saber
argumentar sem fraquejar é essencial. Saber lidar com o nervosismo, o
fracasso a pressão é vital. Saber respirar e acalmar é capital. Tudo isto se pode
trabalhar numa sala de aula, através de pequenas tarefas. Procurar ser
diferente, é levar os alunos a serem também diferentes.
Cabe assim ao professor, não desistir nas situações mais complicadas e
atuar para um futuro melhor para que estas crianças não caiam no
esquecimento.
2.8. Contexto escolar
2.8.1. A minha escola
O Agrupamento de Escolas foi criado a 4 de julho de 2012. É constituído
por um conjunto de 5 estabelecimentos educativos que contemplam vários
níveis de ensino: Jardim de Infância, Ensino Básico e Ensino Secundário. A
escola cooperante situa-se na freguesia de Bonfim e a Junta de Freguesia tem
sido um parceiro importante para o agrupamento através da promoção de
atividades, mostrando o interesse e preocupação pelas gerações futuras. A
escola foi remodelada, através do Programa do Parque Escola, no ano letivo
34
de 2008/2009.
O Agrupamento tem a sorte de ter nas proximidades diversas
instalações desportivas diferentes, que permitem a exploração por parte dos
alunos de várias modalidades assim como atividades diversificadas. Outra
vantagem da localização do agrupamento é a rede de transportes públicos,
quer sejam autocarros ou metro, que possibilita uma maior facilidade em
promover “Aulas fora de portas” (aulas noutros espaços fora da escola, como
clubes ou parques).
O Agrupamento rege-se por um conjunto de valores e princípios
presentes no seu projeto educativo. “O agrupamento entende ser a sua missão
fundamental consolidar-se como entidade promotora de Educação para a
Cidadania, inspirada em valores humanistas e no conceito de Escola
Integradora”1.
Com esta visão para o futuro, o agrupamento evidencia o conhecimento
como aspeto fundamental e acredita que a qualidade, a exigência e o rigor
colocados nas aprendizagens educativas são pontos estruturadores do
desenvolvimento de uma consciência cívica, essencial a uma cultura da
cidadania democrática. Assim, o agrupamento rege-se pelo (a):
• Fomento da responsabilidade perante os deveres escolares;
• Fomento da responsabilidade cívica ao serviço de uma cultura de
zelo pelo património comum;
• Interiorização dos conceitos de solidariedade e de tolerância
(respeito pelo outro);
• Construção da autonomia conducente ao sucesso e às boas
práticas;
• Desenvolvimento de uma cultura de avaliação transversal a todos os
espaços e planos da vida escolar;
• Promoção da liberdade no espaço escolar.1
1 In Projeto Educativo do Agrupamento, 2018-2021.
35
Em relação à oferta formativa, ao nível do secundário dispõe de quatro
cursos Científico-Humanísticos: Ciências e Tecnologias, Ciências Socio-
Económicas, Línguas e Humanidades e Artes Visuais e um Curso Profissional
de Técnico de Turismo.
No que diz respeito à Educação Especial, existem duas unidades de
multideficiência em escolas diferentes acompanhados por profissionais de
várias áreas.
Ao nível da oferta de desporto escolar, o agrupamento tem uma panóplia
de modalidades para todos os gostos. Para quem prefere desportos coletivos
está à disposição o voleibol e o basquetebol. No caso dos desportos individuais
o ténis de mesa, a escalada e o xadrez. E ainda o desporto adaptado para os
alunos da multideficiência, que promove capacidades motoras e sociais.
O agrupamento está envolvido em vários projetos de diversas áreas,
através dos quais tem parcerias com empresas ou outros estabelecimentos de
ensino como a Fundação Calouste Gulbenkian e a Faculdade de Engenharia
da Universidade do Porto. Promover a curiosidade, o pensamento crítico, a
criatividade e o empreendorismo são algumas das ideias principais dos
projetos desenvolvidos.
Com a remodelação da escola cooperante, vários foram os espaços que
sofreram alterações, desde logo os espaços desportivos foram reabilitados,
novos balneários e um campo de jogos foram construídos e os espaços
exteriores redesenhados. Assim, a escola secundária tem 5 espaços
diferentes, alguns no exterior outros no interior. No exterior, encontra-se um
polidesportivo semicoberto e um campo exterior. No polidesportivo é possível
praticar modalidades como futebol (futsal), andebol tendo duas balizas e os
campos marcados de algumas modalidades como as mencionadas acima. No
campo exterior, existem 2 campos de basquetebol e cestos, no entanto é
possível aproveitar o espaço para outras modalidades como andebol e até
mesmo atletismo. Existem também duas demarcações de pistas de atletismo
com aproximadamente 50 metros. Entrando no interior existem 3 espaços que
podem ser utilizados: o ginásio, a sala de dança e a sala teórica. No ginásio
com as marcações dos campos de basquetebol, voleibol e com 2 cestos
36
disponíveis, as modalidades lecionadas estão mais viradas para a ginástica
(acrobática, solo, rítmica ou aparelhos), os desportos de raquete (badminton e
o ténis de mesa), lutas e as modalidades coletivas acima mencionadas.
Subindo as escadas, encontramos a sala de dança, maioritariamente utilizada
nos dias de chuva como espaço alternativo, visto ser um espaço relativamente
pequeno para as turmas ditas normais de hoje em dia. Por fim, ao lado da sala
de dança, uma sala normal, utilizada muito raramente para aulas teóricas ou de
recurso ao espaço alternativo de dança. Os balneários feminino e masculino
têm uma série de chuveiros que reúnem as condições para que os alunos
cumpram as normas de higiene antes e depois das aulas (assunto reforçado
durante as mesmas). Os valores de cada turma são deixados nos cacifos que
se encontram à beira dos balneários, com o olhar atento de um funcionário.
O material utilizado nas aulas está armazenado em duas arrecadações
situadas em lugares estratégicos: uma no interior, no espaço adjacente ao
ginásio e outra perto do polidesportivo que fornece esse mesmo espaço e os
campos exteriores. O material disponível não é exuberante e algum dele
encontra-se em mau estado, no entanto o professor também tem que saber
lidar com isto e por isso, por vezes, é necessário adaptar material a novos
contextos.
Cada turma está durante o período nos 3 espaços principais:
polidesportivo, campos exteriores e ginásio, idealmente durante o mesmo
tempo em cada espaço. Essa distribuição é feita no início do ano através de
um roulement de espaços. Esse documento é entregue aos professores para
que cada um consiga planear da melhor forma o ano de cada turma, mediante
o lugar e o tempo que possuiu em cada espaço. O roulement pode estar
dividido em 3 ou 4 rotações dependendo do número de turmas (3 ou 4
respetivamente) que se encontram a ter aula de Educação Física naquele
momento. Sendo assim, no polidesportivo podem estar 2 turmas ao mesmo
tempo, no caso de existirem 4 turmas na rotação e a sala de dança não for
adequada à modalidade a ser lecionada. No caso das condições climatéricas
serem desfavoráveis, o professor tem que conseguir adaptar o planeamento de
modo a gerir o espaço e material disponível.
37
Por fim, de ressalvar que no átrio da escola, podemos ler um poema
inspirador de Ricardo Reis:
“Põe quanto És no Mínimo que Fazes
Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive”
2.8.2. O Departamento de Expressões
Segundo o artigo 41º da Subsecção I do Regulamento Interno 2017-
2021 do Agrupamento, o departamento curricular é responsável por algumas
tarefas, destacando “planificar e adequar à realidade da escola a aplicação dos
planos de estudo estabelecidos ao nível nacional; assegurar a adoção de
metodologias específicas destinadas ao desenvolvimento quer dos planos de
estudo quer das componentes de âmbito local do currículo; elaborar propostas
curriculares diversificadas, em função da especificidade de grupos de alunos”.
A Educação Física está integrada no departamento de Expressões que
engloba as disciplinas de Educação Musical, a Educação Visual e Tecnológica
e Artes Visuais. É constituído por 25 professores, com diferentes idades, ciclos
de ensino a lecionar, conceções e vivências profissionais e pessoais. Existe
pré-definido um calendário de reuniões para dar conta e resolver algumas
situações que possam aparecer ao longo do ano como falta de material ou
distribuição de tarefas.
Todavia, para que serve um departamento? Qual a função do
departamento? Evitar que se tenha um coordenador para cada disciplina e
assim reduzir nos custos ou trabalho colaborativo? Transmitir informações para
um leque mais alargado de pessoas ou partilhar informações e tentar resolver
os problemas? Criar conflitos uns com os outros ou comunicar em prol de
todos?
38
Mediante a reunião em que estive presente, foi percetível o que não
deve ser um departamento. Não me interpretem mal, faz sentido existir um
departamento em vez de um coordenador por disciplina ou um coordenador do
departamento, pois esse mesmo teria o controlo máximo e a responsabilidade
e tomada de decisão passaria sempre pela mesma pessoa. A questão aqui
colocada, não é essa. O problema é o modo como funciona. Até que ponto
serve o departamento para ajudar? Até que ponto estamos a trabalhar em
conjunto a favor de todos: alunos, professores, escola? Um local onde reside a
mesquinhez e onde falam mais alto os egos, não é claramente o objetivo do
departamento, ou então se é, é melhor repensar o que estamos a fazer na
escola.
Entreajuda, partilha e comunicação devem ser as regras de conduta
para que o departamento funcione de modo a poder resolver os problemas e
dificuldades, potenciando sempre as suas qualidades e particularidades de
cada disciplina.
2.8.3. O Grupo de Educação Física
O grupo de EF reúne-se esporadicamente cumprindo o calendário de
reuniões de forma a resolver situações que sejam apenas referentes à
disciplina em questão, como organização das matérias a lecionar, os
conteúdos e as formas de avaliação, ou seja, a planificação anual por ano de
escolaridade. No entanto, ao longo do ano, existem vários momentos informais
para a preparação de atividades e visitas de estudo.
O grupo tem professores de duas escolas do agrupamento, perfazendo
um total de 12 professores. Apesar das escolas serem do mesmo
agrupamento, são bastante diferentes ao nível dos alunos e das condições
materiais e espaciais e por isso a partilha de informação e conhecimentos é
muito rica na medida em que fica a conhecer-se duas realidades bem distintas,
a poucos metros de distância.
Posso afirmar que o grupo de estágio foi bastante bem acolhido no
grupo e sempre nos incentivaram a participar ativamente nas reuniões, sem
39
medo, nem preconceitos. Tendo todos diferentes conceções e aptidões, cada
professor deu o seu contributo para uma formação mais completa. Nas aulas
que observamos vimos métodos de divisão de grupo, estratégias de gestão de
aulas, organização de exercícios bem diferentes e interessantes. Através
dessas aulas foi possível enquadrar algumas das conceções abordadas
anteriormente com as práticas dos professores. A conceção
Desenvolvimentista que invoca a habilidade motora como um meio de
adaptabilidade ao mundo, é mais visível em professores que estão ligados ao
ramo do desporto de competição. Por sua vez, pessoas mais ligadas a
trabalhar com crianças noutros contextos, a forma como trabalhavam quer nas
aulas, constantemente a incentivar os alunos, quer fora das mesmas, sempre a
tentar encontrar estratégias que motivassem os mesmo enquadravam-se nas
conceções Psicomotora e Construtivista, que colocam o aluno no centro do
processo de ensino-aprendizagem.
Saber estar e trabalhar, criando um espírito alegre, descontraído e
cooperativo é fundamental para o grupo evoluir e isso penso que foi um grande
ensinamento. O modo como todos a trabalhar para o mesmo conseguem
organizar atividades curiosas, divertidas e cativantes, foi impressionante.
2.8.4. O núcleo de estágio
As listas de entrada nas escolas saíram e … primeira questão a ver:
onde? E depois: com quem? Carlos Tribuzi e João Pinto. “Ok… sou a única
rapariga… conheço-os relativamente bem (em termos de convívio), mas não
sei como trabalham”. Tinha tudo para correr bem!
De acordo com Lave & Wenger (1991), a aprendizagem é um episódio
que acontece devido à relação com o outro, e por isso a (re)criação de
individualidade ocorre no contexto real de ensino. Desta forma, o núcleo de
estágio (NE) formado pelos estudantes estagiários, a professora cooperante e
a professora orientadora deve trabalhar como uma pequena comunidade
(Batista & Queirós, 2013) onde a relação, a ajuda e a solidariedade podem
combater as inseguranças e os medos iniciais (Queirós, 2014). Assim,
compreende-se o impacto que o contexto envolvente e os agentes da prática
40
podem ter na formação da identidade do professor, quer nos aspetos positivos
quer nos negativos. E pelo poder que isso pode ter … o núcleo tinha que
funcionar bem (esperávamos nós) …
Cada um com os seus objetivos, as suas vivências, as suas conceções,
contudo todos a lutar para o mesmo: (aprender a) ser professor. Como cada
um tinha diferentes valências, permitiu que a evolução do grupo fosse maior,
pois era possível ajudarmo-nos em momentos díspares. O ambiente entre
todos era fantástico: relação, cooperação, união e partilha foram a tónica do
nosso percurso enquanto núcleo o ano inteiro. Penso que podemos definir
cada um dos estudantes estagiários numa palavra, algo que tenha contribuído
para o melhor funcionamento do grupo. O João era o organizado. Tudo
apontado. Se eu não sabia onde estava o documento ou se não sabia que
reflexão faltava fazer, o João tinha a resposta. O Carlos era o falante. Cheio de
ideias, com uma correção inigualável. Digamos que é um pensador nato. Um
verdadeiro filósofo. Já eu, era o “próximo”. Aquele que dá apoio, ajuda quando
necessário, a dedicação em pessoa. Como cada um tinha diferentes valências,
permitiu que a evolução do grupo fosse maior, pois era possível entreajudarmo-
nos em momentos díspares. E a professora cooperante era a cola que nos
ligava a todos.
A professora cooperante logo no primeiro dia mostrou ser uma pessoa
energética, simpática e alegre. Confesso, que me assustou, mas ao mesmo
tempo me acalmou. Assustou, porque se via que era uma pessoa que se
envolvia, com grande afinco, em muitos projetos, em muitas atividades.
Todavia, acalmou, porque seria uma experiência bastante rica e diversificada.
A preocupação, o cuidado e a amabilidade da professora cooperante foram
sem dúvida, uma grande influência ao longo de todo o ano letivo. Os
bocadinhos de conversa depois das aulas, as questões no “whatsapp” e a força
constante contribuíram para a minha evolução enquanto professora. A
confiança nas minhas capacidades, a demonstração das minhas falhas e o
sublinhar dos meus melhores momentos fizeram com que apurasse o meu
sentido crítico e deram-me mais esperança e certeza para continuar. Foi um
exemplo de dedicação, empenho, inovação e profissionalismo ao longo do ano.
Estando um pouco mais distante, a professora orientadora foi um agente
41
influenciador durante o processo. O estabelecimento de objetivos por etapas
assim como de tarefas a realizar, permitiu uma organização mais eficiente.
Deste modo, saliento como momentos determinantes de crescimento, as visitas
da professora à escola para observação de aulas assim como a transcrição de
uma das aulas. Esse desafio foi um despertar de consciência para os aspetos a
melhorar na minha ação pedagógica. A professora orientadora sempre se
mostrou disponível para tirar as dúvidas e resolver qualquer problema com que
nos fomos deparando.
2.8.5. O meu 7ºano: um verdadeiro desafio
O processo de ensino-aprendizagem rege-se por um “ator principal”: o
aluno. Assim, as aulas devem ser direcionadas para ele, e não para o
professor. A dificuldade está no aspeto de que não temos apenas um aluno,
mas sim vários. E cada um deles está envolvido num determinado meio. A
aprendizagem assenta na relação entre o professor, o aluno e também toda
uma sociedade/cultura. O aluno quando chega à escola já tem uma bagagem
de saberes adquirida dentro da família, com os amigos e até com o meio em
que está inserido.
É então vital conhecer os nossos alunos. Um estudo de Woods et al.
(2000) refere a importância de recolher informações sobre os alunos, de modo
a aprender sobre o ensino e ser capaz de mudar alguns paradigmas que se
vão construindo sobre os mesmos.
A minha turma… ainda sinto um arrepio por dizer: “a minha turma”, mas
eles foram a minha turma, o meu 7ºA. Para tentar cativar os alunos a
preencher o questionário, o NE optou por fazer o questionário através do
google, sendo também assim facilitador no tratamento dos dados. O
questionário era online, com algumas perguntas de cariz pessoal, familiar e
também relacionados com a vida desportiva do aluno. O mesmo foi enviado
para o email de cada aluno, e os que não tinham tido oportunidade para
responder em casa, fizeram-no durante uma aula, com a ajuda dos outros
estudantes-estagiários.
42
A turma era então constituída por 25 alunos, dos quais 14 do sexo
masculino e 11 do sexo feminino. A faixa etária dos alunos está compreendida
entre os 11 e os 15 anos, sendo a média de 12,12 anos.
Visto ser responsável por estes alunos, e tendo que pensar em
exercícios e aulas que sejam apropriados para eles, considero ser importante
saber se os alunos têm alguma condição que os impeça de realizar a aula na
integra ou de forma condicionada. De acordo com as respostas obtidas,
apenas uma aluna referiu ter asma, no entanto nunca se mostrou um obstáculo
para a prática.
Em relação aos interesses na escola, Educação Física lidera as
preferências dos alunos da turma, seguindo-se Físico-Química, História e
Inglês.
De seguida, os alunos foram questionados sobre a importância que a
Educação Física tinha na vida deles e qual a motivação para as aulas. Os
resultados obtidos mostram que na primeira questão, 13 alunos consideram
que a Educação Física tem importância máxima para eles e o valor repete-se
para a motivação máxima durante as aulas. Apesar destes resultados tão
otimistas, houve respostas que mostraram fracos níveis de motivação. Este
desinteresse foi um ponto importante para as aulas, pois era necessário criar
estratégias que os motivassem para a prática, quer seja nas aulas ou fora das
mesmas. Escolher um exercício de aquecimento, uma tarefa com maior
responsabilidade e uma relação mais próxima com os alunos foram algumas
estratégias utilizadas. Uma das alunas que tinha assumido uma motivação
baixa, acabou por participar num torneio de futebol feminino cativando até
algumas das colegas de turma, no final do ano.
Em relação ao mundo desportivo, começamos por tentar perceber se
praticavam algum tipo de atividade física regular (2 a 3 vezes por semana). 19
alunos afirmaram que sim e apenas 6 indicaram que não. É um bom indício de
uma turma que se interessa e pratica desporto. Mas então o que praticavam?
Sem dúvida, e sem surpresa o futebol é o desporto rei seguido da natação.
Contudo, fiquei surpresa pela variedade de desportos praticados pelos alunos.
Uma turma assim tão diversificada é bom, pois existem experiências diferentes
43
e padrões de movimento bastantes dispersos, sendo sempre útil para os
desportos a lecionar (gráfico 1).
Por fim, e tentando diversificar as aulas de acordo com as
“necessidades” dos alunos, questionámos que modalidades gostariam de
experimentar na aula. Houve escolhas bastante interessantes e diferentes
como o parkour, a equitação, as caminhadas ao ar livre, a patinagem, o
paintball e a escalada (gráfico 2).
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
NÚ
MER
O D
E A
ULU
NO
S
Gráfico 2 – Modalidades que os alunos gostariam de experimentar
0
1
2
3
4
5
6
Desporto que praticam regularmente
Gráfico 1 - Modalidades que os alunos praticam regularmente
44
A turma era homogénea ao nível do desempenho motor, existindo
alguns casos flagrantes de dificuldades motoras e de entendimento da
dinâmica de alguma das modalidades. Como já foi referido, existia um grupo
bastante predisposto para a prática, mas ao mesmo tempo casos pontuais de
desinteresse. Durante as aulas, balançar estas duas partes foi um desafio
constante na seleção das tarefas de aprendizagem pois era essencial garantir
que os alunos com mais dificuldades conseguiam ter sucesso e
simultaneamente satisfazer as necessidades de alunos com maior habilidade.
Todas as turmas têm os seus aspetos negativos e positivos, que podem
ser importantes para a formação contínua do professor. E aqui não foi
diferente, cada aspeto contribuiu para a minha primeira experiência. A turma
era homogénea ao nível das capacidades motoras, contudo dentro dessa
homogeneidade o nível das habilidades era relativamente baixo. Os alunos
eram trabalhadores e empenhados, mas ao mesmo tempo traquinas (como
seria de esperar, pois estão no 7º ano). Contudo, existiram alguns momentos
em que os ânimos se exaltaram entre eles. Essas ocorrências puseram-me à
prova: saber lidar com estes choques, por vezes, assumem uma importância
redobrada dentro da sala de aula, pois é necessário ser firme e adoptar uma
atitude assertiva. Embora estas situações pontuais, a turma era disciplinada,
competitiva e calma. Fizeram de mim também, uma pessoa mais calma. Foram
capazes de criar um ambiente agradável de aprendizagem para todos, sendo a
relação a palavra de ordem.
Em suma, é com um orgulho incalculável que fui professora destes
alunos. Apesar dos defeitos e valores da turma, é até com vaidade que digo
que fui professora deste 7º. São e serão sempre: os meus meninos.
2.8.6. O 10º ano de escolaridade: um osso duro de roer
O 10º ano era a turma partilhada. Uma turma do Curso de
Humanidades, constituída por 23 alunos, sendo 13 rapazes e 10 raparigas. A
média de idades era de 16 anos. Como era a turma partilhada, tínhamos ido
observar uma aula da turma logo no início do 1º período. Devo dizer se já
estava assustada por ir dar aulas a um 10º ano, depois daquela aula, o “medo”
45
aumentou. Muito barulhentos e pouco cumpridores, foi essa a ideia com que
fiquei logo à partida. Aquela aula, serviu para tirar logo ideias e saber quais os
alunos que iriam precisar de mais “controlo”.
A turma tinha alguns problemas de pontualidade e até assiduidade. A
falta de motivação e interesse era clara. Mas o meu maior medo, era o controlo
e conseguir reforçar a minha presença como professora. Lembro-me de ver na
aula observada que existia um fosso muito grande em relação às habilidades
motoras entre rapazes e raparigas. Elas até pediram à professora cooperante
para não jogarem com eles. Sendo a modalidade a lecionar Ginástica
Acrobática, esse desnível não estava tão presente, por isso a turma era
bastante homogénea. De forma a tentar cativá-los tentei logo no início
estabelecer uma relação próxima com os alunos. Os alunos nunca me faltaram
ao respeito, porém não sei se todos eles me viam como uma “verdadeira”
professora. Talvez por termos idades próximas ou até parecer mais nova do
que sou. Com esta turma correu bem, e por isso não critico a abordagem, no
entanto julgo que não iria funcionar tão bem com outras turmas. Pois apesar da
malandrice e do desinteresse, eram todos meninos respeitadores e bem-
educados.
Por fim, de referir que foi uma experiência riquíssima para mim, permitiu-
me acreditar que era capaz. Possibilitou um crescimento pessoal e profissional
incrível pois como lidar com os grandes era um dos meus grandes dilemas em
relação à prática em si.
2.8.7. O 6º ano de escolaridade: motivar, motivar e motivar
A turma do 6º ano era constituída por 28 alunos, 17 rapazes e 11
raparigas. A média de idade rondava os 11 anos. Em conversa com o João (já
tinha dado aulas à turma no 1º período), a turma tinha alguns problemas de
indisciplina e alguns alunos já tinham adquirido a rotina de pedir dispensa das
aulas. No meu caso e sendo a modalidade que era: dança, o filme não foi
diferente, foi com certeza pior. Já sabia que ia ser bastante complicado motivar
os alunos para a prática.
46
“A Dança na escola é uma das modalidades mais negligenciadas
do programa. Nos meus 12 anos como aluna de Educação Física
posso garantir que nunca tive dança nas aulas, e esta realidade
ainda hoje é vivida pelos alunos. As razões podem variar. Ou por
ser diferente, ou por os professores não se sentirem confortáveis
em lecionar a mesma, ou por os alunos não se sentirem
motivados então acaba por ser deixada de fora pelos professores.
No entanto, não a podemos colocar de parte porque através da
dança podemos trabalhar aspetos bastante importantes como a
consciencialização do corpo e a sensibilização estética e criativa,
de uma forma tão própria que não é possível noutra modalidade.
Então como podemos modificar esta relação negativa que a
dança transporta? Como conseguir incentivar os colegas
professores a lecionar? E a motivar os alunos? Talvez a solução
passa por modificar a metodologia de ensino.“ (Reflexão
Expectativas Inicias, experiência com o 6º ano)
Para colocar em prática esta noção de “modificar a metodologia de
ensino”, falei com a professora cooperante e revi os apontamentos da unidade
curricular de dança que tivemos no 1º ano de mestrado para tentar criar algo
diferente. Algo que pudesse ser mais motivador para os alunos do que eu a
criar coreografias para eles e apenas copiarem os meus passos. Queríamos
puxar por eles, pela criatividade deles, pela sua imaginação até. E por isso
mediante os conteúdos que tinha para dar, pensámos em exercícios mais
lúdicos que os pudessem ajudar a atingir o que pretendíamos. Como não
existia um tipo de dança fixo para dar, era apenas deixar-nos levar pelo ritmo
(com tudo planeado, claro). Exercícios individuais, a pares, ou em grupos,
lúdico ou competição, com música ou sem música. A ideia era trabalhar os
conteúdos e no final de cada aula através de uma pequena coreografia, colocar
em prática o que foi aprendido. Como estávamos um pouco limitados em
relação do número de aulas (devido às rotações de espaços, tínhamos aula
uma vez por semana durante duas semanas e depois sem aula na semana
seguinte). Apesar dos esforços, para que os alunos desmotivados, se
interessassem mais, estava complicado. Consegui que apenas 3 dos 6 se
47
envolvessem com mais afinco. Sei que pode ser um pouco arrogante da minha
parte, pois “não dá para chegar a todos”, mas gostaria de ter chegado mais
longe.
Após os conteúdos lecionados passámos para a fase de construção da
coreografia final. O tema estava escolhido: Filmes da Disney. Em conversa
com a professora da turma julgámos melhor dar liberdade para escolherem os
grupos, os filmes, as músicas, os passos. Tinham liberdade total para trazerem
e fazerem o que quisessem (sempre com supervisão). Cada grupo escolheu
um filme, recebeu um resumo do mesmo e a partir daí foi criar.
Pensava eu que tínhamos dado todos os ingredientes para uma dança.
A realidade é que a maioria dos grupos acabou por teatralizar o filme, mais do
que dançá-lo. E não era isso que se pretendia. Desta forma, é necessário
talvez introduzir no início alguns passos ou dinâmicas para os alunos
entenderem melhor o que se quer. Nem tudo é mau, pois os alunos foram
criativos e utilizaram adereços e alguns elementos gímnicos, no entanto o
resultado final ficou um pouco aquém do que estava expectado. Pode ter
resultado de vários fatores como o número limitado de aulas e a falha de
comunicação entre mim e os alunos.
Em suma, fiquei extremamente contente por poder trabalhar com a
turma, pois mostrou, uma realidade diferente àquela que estava habituada.
Assim, como mensagem final deixo que a abordagem da dança na escola deve
ser repensada, principalmente com alunos mais novos, sendo que o principal
foco deve ser “motivar para a criatividade”.
2.8.8. O 2º ano de escolaridade: os pequeninos irrequietos
Estava entusiasmadíssima para dar aulas ao 2º ano. Trabalhar com
meninos mais pequenos é a minha grande paixão. As crianças são
transparentes e a sua energia é cativante. São realmente verdadeiros, brutais
na sua forma de ser e de falar (brutal na medida em que são um diamante em
48
bruto, impetuosos e desinibidos). Não têm filtros. E poder intervir no processo
de formação destes pequenos jovens, é para mim mais carismático.
A turma era composta por 27 alunos (14 do sexo masculino e 13 do sexo
feminino), com uma média de idades de 8 anos. A lecionação de aulas nesta
turma começou no 2º período e foi até ao final do ano letivo.
Os meninos com estas idades estão dispostos a trabalhar e não se
“queixam” como os mais velhos de que “não gostam do exercício” ou “que
seca, outra vez … “. Eles querem é jogar, fazer uns rolamentos, querem-se
divertir. Simples.
A professora titular da turma tinha estabelecido algumas regras de saída
da sala de aula, no entanto a partir do momento em que chegavam ao recreio,
essas normas desapareciam. Desta forma, tive um trabalho redobrado em
tentar enraizar rotinas para que não se perdesse muito tempo durante o início e
na transição de exercícios. Como crianças que são, existem sempre
comportamentos desviantes, que foram sendo controlados através de uma
atenção mais focada nos alunos mais agitados.
Uma pequena observação (pois foi algo que me inquietou, durante a
experiência): a professora titular tinha uma metodologia com os alunos de
supervisão entre eles que me provocou desconforto. A turma tinha um
delegado de turma e um subdelegado, e os dois ficavam responsáveis por
quando chegassem à sala, contassem à professora quem se tinha portado mal.
Este método de ensino não me parece o mais benéfico para as crianças, por
um lado, atribui muito poder a uma criança para “acusar” o colega de algo, e
isso afeta (com certeza) a dinâmica da turma. Por outro lado, senti que
acabava por me retirar alguma autoridade, pois parecia que o professor titular
não confiava na minha capacidade de liderança. Pode parecer mesquinho, mas
acredito realmente que não é uma estratégia que se deva usar, pois pode criar
práticas que mais tarde podem ser difíceis de contornar, por exemplo a
dificuldade em trabalhar em grupo.
49
ENSINAMENTO
“Não existem bons ventos para um barco que não sabe o seu rumo”
Máxima grega
Esta máxima grega ilustra a noção do estágio como uma viagem: com
um princípio, meio e fim. Normalmente, as viagens requerem um planeamento
prévio. O estágio também. Um planeamento consciente e realista que facilita o
processo de ensino-aprendizagem. Não é a garantia de que vai tudo correr
bem, mas possibilita a chegada do “barco a bom porto”. Durante o ano, houve
inúmeras ocasiões em que fomos testados, em que tivemos que readaptar o
plano devido a razões que não eram passíveis de ser controladas, mas foi
possível contornar os “Gigantes Adamastores” e continuar a viagem até ao fim.
53
3.1. Os medos iniciais
No primeiro ano do mestrado fomos tendo algum contacto com os
alunos, devido às aulas lecionadas no âmbito de basquetebol e andebol na
Escola EB2/3 Eugénio de Andrade. Essas aulas permitiram conhecer um pouco
melhor a realidade nacional nas escolas e desta forma, propiciou um ambiente
de reflexão e mudança de paradigma em relação a alguns assuntos como a
inclusão de alunos com deficiência no ensino regular, estratégias para motivar
alunos desinteressados e algumas formas de lidar com comportamentos
desviantes.
Apesar destes momentos, faltava algo… não me julgava preparada para
assumir uma turma. Com o passar do tempo e setembro aproximar-se, as
dúvidas e receios foram aumentando: “Gostariam eles de mim? Como lidar
com o secundário? E como será o professor cooperante? E o núcleo de
estágio funcionaria?” A reunião no auditório da FADEUP permitiu-me perceber
algumas coisas fundamentais: primeiro “o ano vai ser longo”, segundo “só tens
que ter calma” e terceiro “que energia da professora cooperante”.
3.2. Palavra de ordem: planear
Segundo Bento (2003, p. 8), planear exprime “uma reflexão
pormenorizada acerca da direção e do controlo do processo de ensino numa
determinada disciplina”, uma reflexão sobre o binómio teoria-prática. O mesmo
autor define como principal objetivo do planeamento a constante e progressiva
descoberta de cenários inerentes ao processo.
Sendo o planeamento um fio condutor de todo o processo, evita que o
professor caia numa “rotina inconsciente” de reprodução e indiferença. Mas
atenção: não é possível planear na sua plenitude, o “inesperado” faz parte (e
até acrescenta sempre algo, põe o professor “à prova”). Contudo, este alerta
não deve servir de desculpa para uma planificação negligente, banal e
descuidada. Bento (2003) defende uma ideia bastante interessante e artística:
o ato de idealizar cria uma segurança na ação do professor, permitindo que o
54
mesmo não tenha preocupações e possa viver a aula como um verdadeiro ato
criativo.
A planificação faz-se a partir das normas dos programas nacionais e da
realização prática dos mesmos. Para atingir isso, o planeamento une a
formação constante do professor ao processo de ensino, na esperança de que
isso crie melhores resultados académicos, efeito do choque frequente entre a
teoria e a prática (Bento, 2003).
De acordo com o mesmo autor, o ato de idealizar é “extremamente
complexo, pluridimensional e multiforme”, pois depende de várias condições.
Para uma planificação objetiva e realista é necessário ter em conta dois níveis
de indicações:
• Indicações gerais
• Indicações locais e específicas mediante cada contexto
O planeamento é um ato flexível, é preciso ter a capacidade de planear
e de saber alterar o planeamento em função dos feedbacks da prática, senão é
apenas um “escrever de sumários”. O planeamento é feito para uma turma
específica. Se a turma não acompanha o planeado, é necessário alterar e
ajustar. Planear, realizar e controlar são conceitos em permanente junção.
3.3. Antes de começar (a sério) um olhar sobre…
3.3.1. … o Programa de Educação Física
O programa curricular é um documento que permite garantir a coerência
dos conteúdos entre as diferentes turmas, escolas e anos de escolaridade,
organizado verticalmente do 1º ano ao 12ºano. Desta forma, os programas são
um método de orientação, apresentando as competências e conhecimentos a
adquirir em cada ano. Com este “mapa”, o professor pode optar pelos métodos,
estratégias, exercícios, estilos de ensino que melhor se adequam à turma.
Assim, concedendo esta liberdade e responsabilidade ao professor pelo
processo de ensino-aprendizagem, pretende-se apresentar um ensino flexível e
55
que seja capaz de propiciar o desenvolvimento das potencialidades de cada
aluno, superando as suas dificuldades.
O programa está desenhado com base em quatro pilares fundamentais:
garantia de exercício físico ativo, não esquecendo a aprendizagem, aliada à
saúde; ambiente propício à autonomia; resolução de problemas na organização
de atividades e valorização da cooperação entre alunos.
Assumindo o programa como um mapa de orientação para o ano letivo,
a primeira tarefa a cumprir era “estudar” o Programa Nacional de Educação
Física (PNEF) do 3º ciclo. Nele está presente uma lista de objetivos definidos a
dois níveis: gerais e específicos. Os primeiros referem-se a objetivos passíveis
de concretização a médio e longo prazo, pois são as habilidades,
conhecimentos, atitudes e valores transversais a todos as áreas. Já os
objetivos específicos dizem respeito às competências a desenvolver em cada
ano e em cada matéria, tendo um plano de concretização mais curto (Quina,
2009).
O programa nacional está dividido em duas partes no que às matérias
diz respeito: uma primeira parte considerada nuclear e que é igual para todas
as escolas, assegurando a homogeneidade do currículo. E a segunda parte
alternativa, dando o poder de escolha a cada escola de acordo com a
preferência dos alunos, condições específicas (recursos espaciais, materiais e
humanos) da instituição de ensino ou até de acordo com a cultura desportiva
local. Este tipo de organização possibilita que os alunos “tenham uma palavra a
dizer”. Esta medida é significativa, principalmente no secundário, pois o
sentimento de pertença, atribui um maior valor à aprendizagem. Permite
também que se promova o desporto da localidade, podendo-se até aproveitar
alguns recursos, envolvendo e fazendo crescer a comunidade mais próxima.
Numa visão pessoal, um programa curricular de multiatividades favorece
um ensino baseado em experiências. Essas “experiências” permitem que o
aluno conheça várias modalidades e a partir daí tenha informação “fomentada”
para poder escolher o que praticar fora do horário escolar. A Educação Física
na escola não se deve focar tanto na técnica, mas sim no sucesso que os
alunos possam alcançar, para que se sintam bem na “pele” de desportistas.
56
3.3.2. … as Aprendizagens Essenciais (AE) e Perfil do Aluno à Saída da
Escolaridade Obrigatória (PA)
No início do ano letivo transato, a professora cooperante pediu-nos
(estudantes-estagiários) para analisar alguns documentos formais, de acordo
com a turma residente de cada um. Para além do já mencionado PNEF,
tínhamos também as Aprendizagens Essenciais (AE) e o Perfil do Aluno à
Saída da Escolaridade Obrigatória (PA). Não sabia o que era isso, não
tínhamos analisado nenhum desses documentos no ano anterior. Assim,
algumas perguntas insurgiram: “O que é isto? Há aprendizagens mais
essenciais que outras? O que é isto de perfil do aluno? Uma listagem de
características ou competências que o aluno deve possuir quando acabar o
12ºano? Fará isto algum sentido?” Após pesquisa e leitura dos documentos
apercebi-me que as minhas questões iniciais não eram assim tão descabidas,
não fugiam assim tanto da realidade.
Estes dois documentos surgiram devido à implementação do Projeto de
Autonomia e Flexibilidade Curricular dos ensinos básico e secundário, no ano
escolar de 2017-2018, em regime de experiência pedagógica. Este projeto
aponta para a promoção de aprendizagens de desenvolvimento de
competências de nível superior, tendo as escolas, os alunos e professores um
papel preponderante. Para alcançar a autonomia em educação é necessário a
gestão do currículo de forma flexível e contextualizada.2
As AE são mais um método de “orientação curricular base na
planificação, realização e avaliação do ensino e da aprendizagem, e visam
promover o desenvolvimento das áreas de competências inscritas no PA.”3
Este delineamento foi construído a partir dos documentos curriculares
existentes e é o denominador curricular comum, ao nível da aprendizagem de
todos os alunos. A organização tem em conta o ciclo, o ano e a disciplina e
procura assegurar a continuidade e articulação vertical, ao longo da
escolaridade obrigatória.
2 Para consulta em https://www.dge.mec.pt/autonomia-e-flexibilidade-curricular 3 Para consulta em http://www.dge.mec.pt/aprendizagens-essenciais-0
57
Está estruturada de forma a apresentar um trio de elementos de aprendizagem,
explicitando:
A) Conhecimentos - o que os alunos devem aprender;
B) Capacidades - os processos cognitivos a ativar para adquirir esse
conhecimento;
C) Atitudes - o saber fazer a ele associado numa dada disciplina e na
articulação entre outras disciplinas.
O Perfil do Aluno é um documento que vai “beber” muito daquilo que são
as AE e pretende ser uma matriz que orienta a tomada de decisão dos atores
educativos de forma a promover o desenvolvimento curricular, de acordo com
os nossos jovens de hoje em dia. Com a possibilidade desta “flexibilidade
curricular”, figura um maior compromisso que é necessário assumir por parte
não só da escola (órgãos de gestão, professores, auxiliares, alunos), mas
também dos pais e encarregados de educação (também eles devem ter um
papel ativo na comunidade escolar e na educação do seu educando). O PA
tem como objetivo fomentar o jovem adulto de ferramentas (valores e
competências) que o permitam utilizar o livre-arbítrio de forma cívica, ativa,
consciente e responsável. Desta forma, as áreas de competência assumiram
um papel significativo na planificação de cada modalidade lecionada, tendo
sido feito um esforço para tentar incluir o maior número de áreas de
competência e que pelo menos cada uma delas fosse abordada uma vez. As
áreas de competência são as que se apresentam de seguida:
i. Linguagens e textos
ii. Informação e Comunicação
iii. Raciocínio e resolução de problemas
iv. Pensamento crítico e criativo
v. Relacionamento interpessoal
vi. Desenvolvimento pessoal e autonomia
vii. Bem-estar, saúde e ambiente
viii. Sensibilidade estética e artística
ix. Saber científico, técnico e tecnológico
58
x. Consciência e domínio corporal
3.3.3. … o planeamento anual
De acordo com Bento (2003), o plano anual é a primeira etapa das fases
do planeamento. Assume um entendimento universal que permite relacionar o
programa de ensino no contexto particular em questão. O mesmo autor
defende que é “um plano sem pormenores da atuação”, no entanto é
necessário um trabalho prévio metódico de análise assim como reflexões de
controlo e avaliação. Desta forma, temos mais um documento que serve de
meio orientador para nos ajudar a organizar, estruturar e calendarizar as
matérias ao longo do ano.
Neste nível de planeamento, as variáveis a ter em conta foram as
modalidades a lecionar (previamente escolhidas), o roulement de instalações, o
número de aulas e o nível de cada matéria. Devido ao sistema de trabalho por
rotações e visto estarmos reféns das condições meteorológicas, a capacidade
de mudança deve ser maior.
De acordo com o PNEF, o 3º ciclo está dividido em três áreas diferentes:
atividades físicas, aptidão física e conhecimentos. No caso da primeira área, o
objetivo é desenvolver as competências essenciais em 5 matérias de nível
introdução, em diferentes subáreas, apresentadas no quadro 1.
Quadro 1 - Planeamento anual das atividades físicas
Período Modalidades Nº de aulas Nível Espaço a utilizar
1º
Ginástica Rítmica (corda, bolas e arcos)
10
Introdução
Ginásio
Andebol 16
Polidesportivo e Exterior
2º
10 (14)
Ginástica de Aparelhos (trampolim, minitrampolim e trave)
8 (5) Ginásio
Ténis de Mesa 7 (4) Ginásio
Atletismo (estafetas, lançamentos, velocidade, barreiras e salto em altura)
5 Polidesportivo, Exterior,
Pista e Ginásio
3º
10
Orientação 5 Polidesportivo e espaço
escolar
59
As modalidades a lecionar foram escolhidas pelo grupo de Educação
Física. A escolha baseou-se na continuidade do currículo, ou seja, nas
matérias a serem lecionadas nos outros anos e ciclos de ensino, de modo a
não se repetirem modalidades em anos consecutivos (exceto nas opções de
escolha pelos alunos).
No âmbito da aptidão física, o grupo de EF decidiu utilizar o programa
FITescola em todas as turmas. O programa traduz-se na avaliação da aptidão
física e atividade física de crianças e adolescentes através de uma bateria de
testes projetada pela Faculdade de Motricidade Humana e a Direção Geral de
Educação. Desta forma, têm uma plataforma online onde promovem estilos de
vida saudável e onde permite o acesso a alunos e professores. Assim, em cada
período seriam disponibilizadas 3 aulas de 50 minutos para efetuar os testes
selecionados. Após conversa com a professora cooperante, julgamos ser
necessário “aproveitar” os testes, não só para a avaliação, mas também para
tentar criar algum impacto ou significado para os alunos. Porque a realidade é
só uma: os alunos estão cansados de repetir o mesmo todos os anos, sem que
aquilo tenha algum significado prático. Mas como produzir significado para
eles? Depois de um silêncio profundo, alguém propõe utilizarmos as
funcionalidades da plataforma com os alunos: entregar os relatórios aos alunos
e fazer uma espécie de análise guiada numa primeira fase e depois fazer um
trabalho mais profundo nos períodos seguintes.
“No final da aula foram entregues os relatórios FITescola relativos
à avaliação intermédia. Relativamente a este projeto considera-se
que mais do que os alunos se situarem individualmente numa
tabela de valores de referência que em função dos resultados
obtidos determina uma zona não saudável, uma zona saudável e
um perfil atlético, importa que cada um interprete o percurso que
faz ao longo das 3 aplicações (inicial, intermédia e final) e
sobretudo que perceba o que deve alterar nos seus hábitos de
vida para melhorar os valores alcançados. Neste sentido, a
análise do relatório com os alunos e a entrega do mesmo para
conhecimento do encarregado de educação permite um maior
envolvimento e significado de aprendizagem deslocando a
60
atenção dos meros aspetos avaliativos.” (Reflexão – “reflexão nº
69 e 70” – 24 de Abril)
Na componente dos conhecimentos para se atingir os objetivos de
identificar os benefícios do exercício com a saúde e interpretar a dimensão
sociocultural dos jogos olímpicos e paralímpicos, optamos por duas
metodologias. A primeira atividade planeada foi realizar um diário de
desportista, como se fosse um portefólio onde iam recebendo alguns
questionários sobre os mais diversos temas como perfil do aluno, curiosidades
sobre a família, desporto, relatórios de aptidão física do FITescola, nutrição e
alimentação e personalizando da maneira como queriam, usando também a
criatividade e as artes plásticas. A segunda mais relacionada com os Jogos
Olímpicos seria utilizando a TAÇA CNID (projeto do Desporto Escolar) realizar
um desfile como de apresentação dos Jogos utilizando alguns dos elementos
dos mesmos como as bandeiras, os juramentos, a tocha e o hino.
3.4. O ensino das diferentes modalidades
3.4.1. O jogo de Andebol: a segurança e a motivação
A primeira modalidade que lecionei foi o Andebol. O meu primeiro
pensamento foi… “E agora? Como vou fazer isto?”. Pensei com os meus
botões e no tempo em que era aluna: sempre gostei mais de ver andebol do
que jogar (talvez por não ter muito jeito), por isso sabia que seria desafiante
tentar cativar os alunos para a prática da modalidade. No entanto, como era o
primeiro contacto com os alunos, tinha que conseguir “fazer-me ouvir (e ver)”.
Tinha que conseguir “impor” alguma autoridade, tinha que me sentir segura.
Inicialmente, antes de se passar para a prática é necessário uma fase
diagnóstica de habilidades. Assim sendo, em reunião de grupo dos professores
de educação física do 7ºano ficou decidido que a avaliação diagnóstica seria
feita através de situação de jogo 4x4. Deste modo, foi elaborada uma grelha de
avaliação com alguns elementos táticos que considerámos fundamentais para
o jogo. Mais que a técnica perfeita, queríamos avaliar o jogador em situação de
61
jogo, ou seja, as suas movimentações, enquadramento com as jogadas e a
tomada de decisão em ação.
Como esta modalidade foi abordada nos 1º e 2º períodos, e tendo em
conta as preocupações anteriormente mencionadas, optou-se por no 1º
período utilizar o Modelo de Instrução Direta (MID) (centrado no professor) e
depois introduzir o Modelo de Educação Desportiva (MED) (centrado no aluno,
elemento motivador).
Porquê o MID? Neste modelo privilegia-se estratégias instrucionais
formais, sendo o controlo das atividades feito pelo professor (Silva et al., 2017).
Este modelo procura preparar os alunos para tarefas complexas, incluindo
situações de rigor e de encadeamento com outros (como jogo coletivo que é,
essa interligação tem que ser trabalhada). Desta forma, este modelo assenta
em 2 objetivos principais: aprendizagem de conhecimento factual estruturado
(ensinado de forma gradual) e a aquisição de competências para tarefas
simples ou complexas (Arends, 2008).
O professor seleciona, dirige e controla todo o processo de ensino-
aprendizagem. Através das expectativas de aprendizagem dos alunos
(conseguidas através da avaliação diagnóstica), define os objetivos e tenta
alcançá-los (Lopes, 2012).
Este modelo considera 5 fases fundamentais (Arends, 2008; Gaspar et
al., 2008):
1. O professor tem como função motivar os alunos para as tarefas;
2. É exposta a matéria ou demonstrada, garantindo que todos
perceberam o que se pretende;
3. Prática orientada e estruturada, apresentando as tarefas,
procedimentos e soluções;
4. Prática individual, porém, supervisionada pelo professor
5. Prática autónoma e independente para consolidar aprendizagens.
O professor deve valorizar os momentos de feedback pedagógico e de
reforço, pois são situações de aprendizagem fundamentais para os alunos.
62
Mediante as particularidades do modelo é de fácil perceção que através
deste o professor consegue afirmar-se com mais desenvoltura perante a sua
turma, principalmente num primeiro contacto. Não conhecia os alunos, era a
minha 1ª experiência, e o MID permitiu-me maior conforto e segurança.
Contudo, este modelo colide com a minha visão de ensino, nomeadamente
porque tende a proporcionar um clima de aprendizagem que desvaloriza os
afetos por considerar que afeta a mesma (Gaspar et al., 2008). Se nas
primeiras aulas, este ambiente mais calculista é aconselhado, nas aulas
seguintes torna-se impessoal, e aos poucos criar uma relação com cada um
deles é fundamental.
Ao contrário do anterior, o MED centra-se na componente social, afetiva
e relacional, enquadrando-se num paradigma interpessoal. Siedentop (1994)
criou o modelo de modo a tornar os alunos desportivamente competentes,
cultos e entusiastas (Lopes, 2012). Competentes na medida em que dominam
as habilidades técnicas e táticas. Cultos refere-se a saber as regras e rituais de
cada modalidade, assim como saber ter uma visão crítica sobre o desporto. E
por fim, entusiastas quando participam ativamente e com satisfação na
atividade.
Como o aluno é o verdadeiro ator no processo ensino-aprendizagem,
este consegue criar a sua construção de significados da prática, pois o próprio
está envolvido no processo. Assim, a aprendizagem torna-se muito mais rica e
valorativa a médio e longo prazo (Silva et al., 2017).
De acordo com as características estruturais do MED (Figura 1), este
permite que a aprendizagem ocorra num ambiente de vivência desportiva
autêntico. O autor do modelo argumenta que a forma como o processo vai
sendo avaliado é a mais genuína pois a autenticidade da educação desportiva
passa por realizar uma tarefa até ao fim com sucesso em contexto significativo
e real (Lopes, 2012).
63
Uma das grandes preocupações do modelo é a inclusão de todos os
alunos nas várias tarefas que os jogadores podem assumir como capitão,
treinador, estatístico, jornalista, preparador físico, entre outros. O compromisso
que cada um tem que assumir permite que se desenvolva o sentimento de
responsabilidade, autonomia, liderança e confiança (Siedentop & Van der Mars,
2004). Assim, proporciona a equidade na participação, contudo é da
responsabilidade do professor exigir um nível de trabalho semelhante em todas
as tarefas.
Em suma, o modelo possibilita uma atitude cooperativa dos alunos e por
conseguinte uma maior tolerância e aceitação da diferença e melhores
relações, para além de melhores resultados académicos por parte de todos.
Em relação às aulas, penso que há dois aspetos que merecem um
cuidado superior numa próxima vez. Nos anos de escolaridade mais baixos, é
pouco provável que os alunos tenham tido contacto com o modelo, pelo que
não podemos partir do princípio de que já o experienciaram e, sinceramente,
nem me passou essa questão pela cabeça. Por isso, a apresentação do
modelo foi um bocado “apressada” e por essa razão acho que os alunos
começaram um pouco perdidos. Embora tenhamos tido várias aulas, o início foi
um pouco aos solavancos. O segundo ponto a melhorar considero que logo
desde o início devem ser estabelecidas regras e rotinas “de responsabilidade”,
por exemplo: apesar do material a ser utilizado para a aula seguinte, ser
enviado por email, a maior parte dos grupos quando chegava à aula não tinha
Ambiente desportivo
Épocas
Filiação
Competição formal
Registos estatísticos
Festividade
Evento Culminante
Figura 1 - Características estruturais do MED
64
preparado a mesma. A rotina de ir ver o email e ter que enviar a escolha ou
trazer para a aula facilitaria o tempo de prática dos alunos. Todavia, o Evento
Culminante deu para observar nitidamente a componente social e de inclusão
de todos os meninos. Um aluno que era “gozado” e desrespeitado pelos outros,
naquele dia foi elogiado e parabenizado pelo bom trabalho que tinha feito na
construção dos materiais. De referir, que a partir daquele dia, o gozo passou a
ser incentivo e ajuda durante as aulas até ao final do ano.
3.4.2. A Ginástica Rítmica: o trabalho em projeto
Ginástica Rítmica era um buraco sem fundo. Não sabia muito bem como
abordar a modalidade, porque tinha apenas 10 aulas, e os alunos tinham que
apresentar uma pequena coreografia em grupo. Verdade seja dita, o meu maior
receio era a demonstração, pois sabia que não tinha domínio do conteúdo em
alguns elementos. Após a análise dos conteúdos a abordar, o “sossego” foi-se
instalando, pois eram elementos mais simples do que estava à espera. No
entanto, o como lecionar a modalidade continuava a ser uma inquietação.
A professora cooperante também nunca tinha lecionado esta matéria,
logo, sugeriu que utilizássemos o mesmo método de ensino que usa para
ginástica acrobática. Batizámos a metodologia de “trabalho em projeto”. Apesar
do nome já existir relativamente a outro tipo de trabalho, a metodologia e
colocação em prática é bastante díspar. A avaliação diagnóstica, os materiais
utilizados, a disposição dos grupos, a intervenção do professor, a dinâmica da
aula é diferente. Todavia, converge em relação a alguns detalhes ao trabalho
com o MED, como por exemplo, o desenvolvimento da autonomia,
responsabilidade e das relações interpessoais e o facto de se dividir a turma
em grupos, mais ou menos equilibrados, em que cada um tem o seu espaço e
material à disposição.
Com esta modalidade, não era necessário um modelo de ensino tão
focado no controlo como o MID e, por isso, mediante a dinâmica da turma,
julgámos ser essencial trabalhar as relações entre os alunos, isto porque
tinham sido observados momentos de conflito e de desrespeito. E, por isso, o
65
trabalho em grupo podia ser a resposta certa para tentar “suavizar” alguns
desentendimentos. Mas comecemos pelo início.
Ponto de partida: nenhum dos alunos partilhava passado com a
modalidade. Logo, até que ponto faria sentido estar a realizar uma avaliação
diagnóstica comum? Sabíamos à partida, que o nível de habilidade não seria
muito elevado, pois a única prática que poderiam ter tido seria por lazer, por
divertimento, algo que não partia de uma prática regular. Face a este quadro,
porque não experimentar uma avaliação diferente? Na realidade, seria uma
autoavaliação. Ou “um levantamento de características individuais” (para
afastar o carácter avaliativo da situação). Como não queríamos uma avaliação
formal, parecia mais adequado optar por um método em que os alunos fariam
parte da mesma. O objetivo era que os alunos se tornassem conscientes das
suas próprias capacidades e do que teriam que fazer para poder ultrapassar as
dificuldades. Não queríamos que fosse apenas uma avaliação que fornecesse
dados para nós, mas sim um documento orientador para os alunos, permitindo-
lhes o desenvolvimento da consciência pessoal do domínio corporal. Assim,
optamos por dividir os alunos em grupos e através das fichas de trabalho,
elaboradas pelo núcleo de estágio, cada grupo preencheu a sua ficha de
avaliação diagnóstica (Figura 2).
Figura 2 - Ficha de avaliação diagnóstica de Ginástica Rítmica
66
Após a avaliação inicial, os alunos, ao longo das aulas, foram recebendo
um conjunto de documentos que foram idealizados e produzidos pelo núcleo de
estágio. Primeiramente, a calendarização do projeto para que todos
soubessem o que estava previsto fazer em cada aula. As fichas de trabalho
com imagens sequenciais dos vários exercícios passíveis de utilização para
cada aparelho para poder ajudar na construção da coreografia. Um documento
que ajudava no desenvolvimento do tema da coreografia, com um poema de
Sofia de Mello Breyner Andresen. Com vista ao tema, foi feito um trabalho em
parceria com a disciplina de Tecnologias da Informação e Comunicação sobre
os “Plasticus Maritimus” – livro de Ana Pêgo e Isabel Minhós Martins. O
trabalho consistia na seleção de imagem sobre as ilhas de plástico e na criação
de um slogan que promovesse a redução da utilização do plástico, com
exposição na escola. E por fim, as fichas de avaliação final, com o
procedimento da mesma e com os elementos obrigatórios da coreografia. A
avaliação final também foi feita de maneira diferente, ou seja, os alunos tiveram
oportunidade para avaliar a coreografia dos colegas à luz de alguns aspetos
que foram definidos pelo núcleo de estágio como o ritmo, o trabalho em equipa
e a coordenação na coreografia e ainda avaliar o seu trabalho e do seu grupo
ao longo das aulas. Mais uma vez, o objetivo foi integrar os alunos no processo
e na avaliação, para que se tornassem mais conscientes e, assim, tornar a
aprendizagem mais significativa.
Este tipo de trabalho pode ser uma boa ferramenta para modalidades
como ginástica rítmica, ginástica acrobática e dança, pois envolve trabalho de
grupo e permite uma liberdade controlada. Onde os alunos podem dar asas à
imaginação. Não havendo dados concretos de melhores resultados
académicos (mas acreditando sinceramente que houve), este modelo permitiu
desenvolver as relações interpessoais, a comunicação, a autonomia, a
interpretação de textos, a sensibilidade estética e artística e a consciência
corporal através de apenas uma modalidade.
67
3.4.3. O Atletismo: o verdadeiro trabalho por estações
A modalidade de atletismo foi lecionada nos 2º e no 3ºperíodos. Como
eram muitas disciplinas diferentes, com objetivos e gestos técnicos diferentes,
optamos por trabalhar em estações. O trabalho por estações consiste na
realização de vários exercícios encadeados, sem pausa ou com um pequeno
intervalo entre eles. Este tipo de trabalho permite, num espaço reduzido (pois é
possível organizar de várias formas), a participação simultânea de um grande
número de pessoas e, assim, o exercício pode ser feito individualmente, em
pares ou em grupos. Geralmente utilizam-se exercícios simples, pois facilitam a
aprendizagem. É um excelente meio de interação social, e ao mesmo tempo de
motivação, pois é rápido e mais dinâmico. No mesmo espaço, podem estar
contempladas tarefas das diferentes disciplinas, e estarem direcionadas para o
objetivo central da aula, contudo, as estações não devem depender umas das
outras. Desta forma, no entendimento de Scholich & Cases (1993), os autores
assumem este tipo de trabalho como método de excelência para utilizar no
caso de exercícios com conteúdo e identidade discrepante, a lecionar na
mesma aula.
No 2º período, não fizemos avaliação final formal por 2 motivos centrais.
Primeiramente, porque a modalidade ia continuar a ser abordada no 3º
período. Segundo, já existiam elementos suficientes para realizar a avaliação
do período (andebol, ténis de mesa, trave, aptidão física e conhecimentos). E
por essa razão, não se sentiu necessidade de sobrecarregar os alunos com
mais um elemento avaliativo. É preciso ser sensível e ter consciência que a
avaliação é um processo contínuo e não precisa de ter datas rígidas.
Na lecionação desta matéria, recorreu-se a algumas características do
MED, como a manutenção das equipas anteriores para que a experiência
pudesse continuar durante mais aulas (é aconselhado uma experiência com
pelo menos 20 aulas) (Lopes, 2012), e ainda o evento culminante no final, ao
qual designámos por “Meeting de Atletismo”. Este evento tinha 2 objetivos: (1)
a autorregulação dos alunos, através de um sistema de smiles em que os
alunos se avaliam em relação aos critérios que estão na coluna “Consegue” e
(2) a competição com as outras equipas, mediante os tempos e marcas obtidos
68
em equipa. Outro ponto essencial deste método de avaliação é a última coluna
“A minha prestação foi…” em que se pretende que o aluno faça um balanço
das aulas em relação à sua participação e competências alcançadas. O
sistema de smiles pressupunha uma avaliação em conjunto, ou seja, os alunos
conferenciavam entre si para chegarem a um consenso que smile - “nota”
deveriam atribuir a cada um (figura 3).
Na fase final de comparação entre os registos de avaliação dos alunos e
os nossos, percebemos que a discrepância das notas era muito reduzida. Os
alunos conseguiram perceber e avaliar(-se) o desempenho de forma justa e
integra. Este tipo de avaliações são uma mais valia para o crescimento global
dos jovens, pois fomenta o espírito crítico, promove a tomada de decisão,
desenvolve a consciencialização das (suas) capacidades e favorece a
interação com o outro, valorizando o respeito, a comunicação e a tolerância.
Figura 3 - Ficha de Avaliação de Atletismo
69
3.4.4. Ginástica de Aparelhos e Ténis de mesa: a simbiose entre 2
mundos
Devido ao roulement dos espaços e às características das modalidades,
ginástica de aparelhos e ténis de mesa, estas teriam de ser dadas no ginásio e
ao mesmo tempo. O material era pouco para as duas modalidades e desta
forma “era o melhor dos dois mundos”. Conseguir organizar o espaço em
função de 2 boques, 1 minitrampolim, 2 traves e 3 mesas de ténis de mesa, foi
um desafio constante.
Por termos um número tão reduzido de aulas e porque poucos alunos
tinham tido experiências passadas em ambas as modalidades, consideramos
que não se justificava realizar a avaliação diagnóstica.
O espaço estava dividido entre ginástica e ténis de mesa, exceto na aula
de ténis de mesa observada pela orientadora da faculdade e uma de ginástica,
em que concordamos que seria fundamental trabalhar com os alunos a
chamada nos saltos para o minitrampolim e boque. Sem aprenderem a
chamada, seria muito complicado terem sucesso nas tarefas seguintes.
Contudo, esta distribuição torna-se difícil de gerir, pois a turma está num
espaço pequeno, e com tanta coisa acontecer ao mesmo tempo. No entanto,
foram estabelecidas regras de modo a manter “alguma segurança” tais como: a
equipa que estivesse na mesa era responsável pelo material que usava e se
observassem alguma situação de perigo deveriam avisar. Correu tudo bem.
A questão fundamental que se colocava era como avaliar as duas
modalidades? Respeitando a ideia de que os alunos não são meros
espectadores da sua própria aprendizagem, arranjamos uma forma de eles
participarem na avaliação (mais uma vez). A professora Catarina teve de
intervir (claro que com duas professoras é mais simples), pois o tempo estava a
esgotar-se e não teria a avaliação de todos, mas … enquanto uns estão a fazer
jogo 2x2, (pois uma delas teria que ser uma avaliação mais “prática” e era o
que tinha ficado decidido pelo grupo de EF), os outros estão a fazer a avaliação
de trave. Por grupos, iam rodando pelas duas avaliações (2 traves e 3 mesas
de ténis de mesa). Na avaliação de ténis de mesa, a professora avaliava
mediante uma escala de 1 a 5, enquanto que na trave, a avaliação foi
70
qualitativa: Insuficiente a Muito Bom. E era conversada em pequeno grupo com
os alunos. Conversar para também eles “ganharem” consciência da razão de
terem tido aquela nota. A maior parte das vezes (eu falo por mim, na escola e
até mesmo na faculdade), não sabia a razão de ter tido certa nota. Em que
critérios se basearam? O que estão a avaliar? Assim, a ficha de tarefa (Figura
4) era entregue aos alunos, para poderem analisar e experimentar os
exercícios, para depois fazerem e serem avaliados. Todavia, havia algo que
não fazia sentido. E só me apercebi, já era tarde demais.
Agora, em retrospetiva, penso que teria sido muito mais proveitoso, ter
entregue a ficha de tarefa logo no início, pois na mesma aula, analisar,
experimentar e avaliar, não pressupõe uma prática frequente antes da
avaliação. Todavia, os resultados foram bastante positivos, quer no ténis de
mesa, quer na trave.
5 aulas era o máximo de aulas que tínhamos. É surreal achar que vamos
conseguir ensinar algo em 5 aulas. Ou ainda mais surreal achar que os alunos
vão aprender muito. A realidade é que esta frustração entre o ensinar e o
aprender foi sentida mais tarde, em atletismo…
“Ensinar é aprender?”. De acordo com o Dicionário da Língua
Portuguesa, ensinar significa “transmitir conhecimentos e
competências a; instruir sobre” e aprender designa-se por
“adquirir conhecimento ou domínio (de assunto, matérias, etc.)”.
Ora, logo aqui é feita a distinção entre a transmissão e aquisição,
Figura 4 - Ficha de tarefa de Trave
71
pois não são sinónimos. Isto é, lá porque os professores
transmitem conhecimento, não quer dizer que os alunos adquiram
esse mesmo conhecimento. Logo ensinar não é aprender. As
aulas são (ou devem ser) um momento de aprendizagem em que
todos devem colaborar, mas a responsabilidade máxima por essa
aprendizagem recai sob o professor. É ele, no final de contas, o
responsável pela aprendizagem dos alunos (em condições
normais). Com esta afirmação, não estamos a descartar a
responsabilidade dos alunos, porque eles também devem fazer
por aprender. Estar concentrados e atentos, mostrar interesse,
fazer os trabalhos de casa são algumas das formas que os alunos
demonstram a vontade de aprender. Contudo, o professor é a
“fonte de conhecimento” dentro da sala de aula (está entre aspas,
porque não é a única fonte, mas é a principal). Assim, no final da
unidade, o que importa é a aprendizagem que os alunos
adquiriram. E este aspeto deve ser o foco de todos os
professores. Quando vamos avaliar os alunos, para que serve
essa avaliação? É apenas para escalonar os alunos por níveis?
Ou importa mais perceber se os alunos efetivamente aprenderam
o que nós ensinamos? Se calhar irão dizer que serve como
descargo de consciência, porque “eu ensinei”. Todavia, ensinar
não é aprender. E senão aprenderam hoje, tentamos que
aprendam amanhã ou depois. Porque os alunos têm que
aprender. Afinal de contas, é para isso que andam na escola.
(Reflexão nº72, 03/05/2019).
Esta oportunidade para experienciarem modalidades distintas das usuais
são um ponto fundamental para os alunos, nem que seja para superarem
alguns medos...
“Partiu-me o coração, ver um aluno tão “sabichão” nas outras
modalidades, tão menino de “narizinho empinado”, aproximar-se
de mim e dizer: - Professora, eu não consigo. Fiquei sem reação,
por breves segundos. Tu?! E ele volta a repetir: Não consigo
72
professora. Mandei que fosse tentar, devagarinho, com calma.
Uma coisa de cada vez. À primeira, não deu. À segunda também
não. Mas a terceira, a quarta e a quinta foram brilhantes. A sexta
ainda melhor. E o sorriso estampado na cara no final foi uma
experiência surreal. Vê-lo assim, daquela forma fez com que se
tornasse um “menino como os outros”, como se tivesse descido
do pedestal e tivesse que pedir ajuda. Tornou-o o mais humano. E
serviu de lição para o futuro. Pois esse pedido de ajuda fez com
que melhorasse as suas capacidades”. (Reflexão nº 64 e 65,
27/03/2019).
3.4.5. Orientação: encontra-me se puderes
Orientação. Tinha apenas “algumas luzes”, pois tinha tido na
Metodologia do Desporto II – Exercício e Saúde, uma breve abordagem teórica,
pelo que foi necessário um estudo mais aprofundado. Precisávamos de
“aprender para dar”. Desta forma, revi os apontamentos e tivemos algumas
reuniões com a professora cooperante e com outra professora da escola (que é
especialista em orientação), para podermos alinhavar e aprender como lecionar
alguns pormenores de simbologia. As reuniões de preparação ajudaram-nos
imenso a perceber que metodologias as professoras utilizavam e o que
podíamos fazer diferente. Esta foi uma partilha de conhecimento bastante
positiva para todos. Em termos estratégicos, num primeiro momento,
explorámos a escola para percebermos como poderíamos organizar as
sessões para os alunos. De seguida analisamos o material, que era muito e
diversificado, que o grupo de EF tinha para a lecionação da modalidade.
Depois de selecionarmos o material que iriamos utilizar, revemos a capa que
continha plantas da escola, plantas com percursos delineados, jogos de rimas
e contas, entre outros, que necessitavam de ser atualizados e organizados.
Paralelamente, procedemos à marcação dos jogos e percursos. Finalmente
estávamos prontos para começar com as aulas de orientação
73
Visto ser a última modalidade a ser abordada, acreditávamos que os
alunos da turma já eram autónomos e responsáveis, fruto das metodologias de
ensino utilizadas durante o ano. Logo, fizemos duas aulas em que, na primeira
era solicitado aos alunos que desenhassem o polidesportivo à escala
(interdisciplinaridade com Geografia e Matemática), colocando todas as linhas
e objetos que estavam espalhados pelo espaço no desenho. Já na segunda,
aula, todos juntos, percorremos o caminho para que os alunos aprendessem a
orientar o mapa e a ver algumas questões básicas. Nessa aula, deu para
perceber que os alunos não tinham noções nenhumas de orientação, sendo,
por isso, preciso um momento específico e controlado de aprendizagem para
que depois pudessem fazer o resto sozinhos. Assim, nas restantes aulas (que
foram 4), os alunos fizeram muito trabalho de pares e trios materializado na
exploração de percursos e jogos, existindo sempre uma componente de
competição.
É mais complicado controlar a turma nesta dinâmica de aula, em que os
alunos têm liberdade (acredito que algumas vezes, simplesmente, pararam
para conversar). Contudo, acredito que também precisem de ter momentos em
que possam ter essa independência para poderem crescer. Mais momentos
destes devem ser permitidos e incentivados. Não podemos tratá-los sempre
como bebés. Têm que saber lidar com a liberdade e têm que saber gerir a
autonomia.
ENSINAMENTO
“O ensino é criado duas vezes: no planeamento e na realização. (…) como
projeto comum, de professor e alunos, para a formação de personalidades.”
Bento, 2003
Há cada vez mais correntes pedagógicas que acreditam que é
fundamental dar uma “voz ativa aos estudantes”. Eles também têm uma
palavra a dizer. O grau de liberdade que cada professor estipula depende da
confiança que o professor possa ter na turma. No entanto, esta ideia de os
74
alunos serem um agente autorregulador na aprendizagem beneficia o
processo. Beneficia a relação entre professor/aluno, pelo menos foi essa a
experiência que tive na minha turma e também no 10ºano, pois promove um
maior diálogo e entreajuda entre as duas partes. E por isso, é algo que deve
ser visto mais vezes nas metodologias de ensino.
77
4.1. Direção de turma
A professora cooperante considerou que seria importante para os
estudantes estagiários, vivenciar um pouco o trabalho que o diretor de turma
realiza durante o ano. De acordo com Boavista & Sousa (2013), o diretor de
turma (DT) é um elemento essencial na gestão de conflitos, não só na escola,
mas também por toda a comunidade educativa. Desta forma, o diretor de turma
é um verdadeiro agente social pois, argumentam os autores, que estabelece
relações com os alunos, os encarregados de educação e com os demais
professores. Todo o trabalho cooperativo de gestão e organização levado a
cabo pelo DT, é em prol do crescimento intelectual e pessoal dos alunos.
A diretora de turma era uma pessoa bastante compreensiva, sociável e
acolhedora. Mostrou-me todas as formas de organização que utiliza (capas,
separadores, email, pastas e arquivos). Tratamos de alguns assuntos da turma:
situações mais delicadas e acontecimentos burocráticos. Explorou comigo o
programa “INOVAR” utilizado na escola. E perto do fim do ano, lançou-me um
desafio: “E se viesses a uma reunião de pais?”
4.1.1. Reunião com os pais
“Pânico!” foi o meu primeiro pensamento. Estava consciente que
reuniões (de pais) são uma tarefa inerente à docência, logo o melhor sítio para
vivenciar a primeira seria com a DT presente. Para não sofrer um choque na
primeira reunião, num ambiente desconhecido seria preferível ir a esta, até
porque seria da minha turma.
Os pais a chegarem… o nervosismo a aumentar. Quando a DT me
apresentou aos pais como a “professora-estagiária de Educação Física dos
vossos filhos”, e os olhares viraram-se automaticamente para mim, o corpo
ficou imóvel. O foco regressou à DT e a ansiedade desvaneceu. Foi conferido e
divulgado as atividades restantes do ano letivo e discutiu-se alguns assuntos
que preocupavam os pais, nomeadamente a preocupação com a professora de
matemática.
78
A verdade é que esta experiência permitiu-me perceber outra faceta da
DT, pois a gestão de conflitos e o agente social mencionados anteriormente
foram bem visíveis nesta reunião. Como lidar com os pais e como falar com
eles é primordial, porque motiva um ambiente aberto à comunicação e à troca
de pareceres. Desconhecendo o ambiente de uma reunião de pais, foi
percetível que conseguir dar uma resposta a todos de forma serena e com a
maior transparência possível permite que o DT se torne numa figura importante
na visão dos pais para o sucesso dos alunos.
4.1.2. Reuniões do conselho de turma
Antes da reunião com os pais, já tínhamos participado nas reuniões de
conselho de turma (inicias, intercalares e finais de período). Nas primeiras
reuniões, a nossa intervenção não se fez sentir, pois não nos sentíamos à
vontade para falar. Não conhecíamos os outros professores e por isso optamos
por absorver o máximo de informação impossível. Programas. Papéis.
Atividades. Alunos. Problemas.
A primeira reunião intercalar foi um marco importante na minha
experiência profissional. Porque fiquei bastante desiludida com a nossa
postura, enquanto professora. Com a nossa capacidade “de empurrar” para o
outro, a facilidade com que culpamos o aluno, mesmo podendo haver algum
passado. A facilidade com que acusamos, sem procurar soluções.
“Em relação a esta segunda parte fiquei muito desiludida
connosco, professores. Ser professor é ajudar os alunos, é
resolver problemas, é criar soluções viáveis e oportunas, que
realmente sirvam para os auxiliar. Porque nós temos uma
responsabilidade perante os alunos. “Chutar para canto” porque
outro vai resolver o problema, não é solução! Uma reunião em
que se passou metade do tempo a dizer mal dos alunos, a criticar
a postura dos mesmos, a identificar os problemas durante a aula
não é solução. Onde estão as discussões e propostas de medidas
que ajudem e permitam a evolução dos alunos? Não querendo
ser petulante, nem achar que vou mudar o mundo, considero
79
apenas, que deveria ser revista a forma como estamos a lecionar.
Cada um refletir, sobre o porquê de ser professor. Porque dizer só
os problemas, não nos vai permitir evoluir e formar a próxima
geração, na plenitude do seu ser.” (Reflexão – 1ª reunião
intercalar)
Estas reuniões deviam ser a oportunidade para juntar diferentes
conceções e experiências de modo a conceber soluções que possam ajudar os
alunos. Utilizem-nas para isso. Ajudar os alunos.
4.1.3. Desporto Escolar – “a minha força”
O Programa do Desporto Escolar expressa como missão “estimular a
prática da atividade física e da formação desportiva como meio de promoção
do sucesso dos alunos, de estilos de vida saudáveis, de valores e princípios
associados a uma cidadania ativa”. Pretende colaborar no desenvolvimento
global dos jovens, promovendo competências sociais e valores morais como a
responsabilidade, o espírito de equipa, o humanismo, a tolerância, a
perseverança e a coragem.
No início da experiência com o Desporto Adaptado escrevi uma reflexão
sobre as expectativas iniciais.
“Quando fomos convidados a escolher um grupo-escola do desporto
escolar, não sabia muito bem que decisão tomar. Ou melhor… saber
sabia, mas não aceitava muito bem a escolha porque julgava não ter
capacidade para avançar. Mas começando pelo princípio. No início do
ano foram-nos apresentados os vários grupos de Desporto Escolar (DE)
existentes no agrupamento de escolas. O voleibol, a escalada, o
desporto adaptado, o basquetebol, o xadrez e o ténis de mesa eram as
possibilidades. Na altura apenas uma das opções me suscitava
verdadeiro interesse. Mas na altura, ainda era muito cedo para escolher
o que quer que fosse pois não íamos começar já com o DE. O objetivo
era iniciar quando já estivéssemos mais envolvidos em todas as
questões iniciais das turmas, reuniões, atividades e escola. Por isso,
80
ficou decidido que começaríamos apenas no 2º período. A altura para
escolher chegou e a minha decisão estava a pender para um lado,
contudo a dúvida era enorme. Questões atormentavam-me o
pensamento. Seria capaz? Seria o local certo para mim? Não seria eu
demasiado sensível para ir? Aguentaria? Mas não me via em mais lado
nenhum. Na primária tive na minha turma, duas meninas com deficiência
intelectual. A turma aceitava bem as meninas e incluía-as nas
brincadeiras. Não querendo parecer petulante, estava habituada a dar-
me com meninos com alguma incapacidade. No entanto, à medida que
fui crescendo, (e soando ridícula) sentia que esse “convívio” me tornava
mais sensível, mais predisposta a situações de fragilidade emocional. E
por isso de certo modo, fui-me afastando ou fechando no meu mundo,
para que essa debilidade não aparecesse. Digamos que considerava
isso como sendo uma fraqueza. Por isso, quando na panóplia de
oportunidades para escolher outras modalidades, o que me despertou
mais interesse foi o Desporto Adaptado foi um momento de grande
surpresa para mim. Pois, não acreditava ser capaz de assumir este
compromisso. Assumido o compromisso… e não podendo voltar atrás
(julgo que não o conseguiria fazer) espero que esta experiência seja
positiva a vários níveis. Primeiro, como o professor responsável é a
Professora Catarina, não posso esperar outra coisa senão um apoio
incondicional e uma energia contagiante. Segundo, que seja benéfico
para os miúdos, pois durante a aula é sempre mais produtivo haver mais
um professor que os possa ajudar, permitindo um acompanhamento
mais personalizado. Em terceiro, que seja produtivo para mim a nível
profissional (saber lidar, saber trabalhar, saber aprender), pois hoje em
dia, com a “Escola Inclusiva” é habitual existirem situações de alunos
com deficiência e os professores têm que saber trabalhar com eles. Algo
que devia ser abordado de forma mais consistente na formação de
professores. Saber como lidar com um menino com autismo ou com um
menino surdo é diferente, e penso que os professores não estão
preparados para este tipo de situações (pelo menos eu não estava). Por
último, que seja um momento de consciencialização e crescimento
81
pessoal. Isto é, que eu possa aprender um pouco mais sobre mim.”
(Reflexão Expetativas Iniciais – Desporto Escolar).
O primeiro contacto com os meninos foi intenso. O modo como me
acolheram foi surreal. Nunca pensei. Fez me sentir mesmo parte do grupo, logo
no primeiro dia. Fui criando uma ligação bastante forte com os meninos. Não
consigo explicar. Houve momentos menos bons e momentos incríveis.
Momentos que me puseram a refletir e momentos em que agradeço ter tido a
coragem para assumir o compromisso.
Tivemos inclusive uma atividade: “Experiências e Brincadeiras” no Acro
Clube da Maia com várias escolas e professores. Foi impressionante. O
contacto com os outros meninos e professores mostrou como funcionam outras
escolas. Eram mesmo muitos meninos. Meninos de várias idades com
diferentes necessidades e cuidados. Foi um momento de entusiasmo e alegria
para eles, pois estavam a experimentar aparelhos e objetos que à partida não
teriam acesso e a conviver com outras pessoas.
No fim de contas, como desafios e aprendizagens destaco, a valorização
do desporto adaptado nas escolas. Os professores fazem realmente um
trabalho admirável com estes alunos, propiciando um momento de atividade
que provavelmente não terão oportunidade de o fazer noutro lugar. Outro
desafio considero que foi manter-me “emocionalmente afastada” durante as
aulas. Não pensar como seriam as suas vidas fora dali, como seria depois de
saírem da aula. Aproveitar todos os momentos com eles e permitir que todos
os momentos fossem prazerosos para eles. Por fim, como aprendizagem
saliento a força, coragem e resiliência dos meninos e da equipa que trabalha
diariamente com eles que também a mim me transmitiram esses sentimentos,
afastando por vezes, o egocentrismo. Fizeram-me sentir orgulho e honra por
poder fazer parte do grupo e me mostrarem que é possível não desistir.
82
4.1.4. Atividades desportivas promotoras de exercício físico
Foram várias as atividades desportivas que realizamos e participamos
ao longo do ano. Vamos dividir as atividades em duas categorias: do Grupo de
Educação Física e do Programa do Desporto Escolar.
As atividades abaixo mencionadas (Figura 5) foram concebidas,
idealizadas e realizadas pelo grupo de EF. Cada atividade teve o seu contributo
para o nosso desenvolvimento enquanto docentes. Nestas atividades a nossa
participação foi mais ativa, desde o planeamento até à sua conclusão. Em
todas elas cada um teve o seu papel.
Não dizendo que tive uma atividade favorita, pois todas foram
importantes, aquelas que mais tiveram significado para mim, foram as “Aulas
fora de portas”. É uma iniciativa brilhante poder aproveitar os espaços perto da
escola para poder proporcionar aos alunos aulas diferentes, quer estejam
relacionados com a modalidade a lecionar, quer seja algo completamente
diferente e seja uma experiência nova. A verdade é que a aula de Padel no
Clube de Ténis do Porto e a aula no Parque de S.Roque, foram momentos
bastante bons entre a turma. Porventura, por estarmos no fim do ano e todos
estarem mais relaxados, via-se uma turma unida e empenhada, algo que não o
Gru
po
de
EF
Semana Europeia do DE
Programa de Educação Olímpica
Lanche de Natal 7º e 10º
Mexe-te por Valores
Caminhada Gerês - 10º
Foz do Sousa - 7º
Formação de 1os socorros
Aulas fora de Portas (Padel e Parque de S.Roque)
Figura 5 - Atividades realizadas pelo Grupo de EF
83
eram no início do ano. E isso deixou-me orgulhosa. Eram finalmente, uma
turma.
Por sua vez, as atividades do Desporto Escolar (Figura 6) estão
subdivididas pois dizem respeito a projetos diferentes em relação à sua
duração. Isto é, os projetos de continuidade submetem para a noção de
longevidade e é exatamente isso, tendo 3 fases cada uma das atividades:
escola – regional – nacional. Já os do Grupo-equipa Desporto Adaptado são
atividades de um dia (ou horas) exclusivamente para os meninos do Desporto
Adaptado.
Os projetos de continuidade são aqueles que envolvem mais
participantes (alunos) e mais “atenção” aos pormenores. Como são
competições que envolvem um organizador externo, os detalhes fazem a
diferença, sendo a primeira fase feita na escola, esta é da responsabilidade da
mesma (existindo diretrizes por parte da organização). São momentos de muito
trabalho e dedicação, integrando um grande número de professores na
organização da mesma. O Corta-mato foi da responsabilidade do NE. Aí
percebemos como é demorado e necessariamente criterioso um trabalho
organizativo e colaborativo de todos. Atribuir dorsais, construir dorsais e
pulseiras, ir às escolas entregar documentos, ir à Associação Ann Sullivan
fazer o convite para participarem, delinear percurso, participar em reuniões,
comprar material, montar percurso, entregar dorsais e inscrever os últimos,
Desporto Escolar
Projetos de continuidade
Corta-mato Mega-sprinterTaça CNID
(7ºano)
Grupo equipa de Desp.
Adaptado
"Experiências e
Brincadeiras"Surf
Figura 6 - Atividades do Desporto Escolar
84
aquecimento dos participantes, introduzir as classificações e retirar os dorsais.
No entanto, o produto final foi bastante positivo e encheu-nos de orgulho.
Fomos parabenizados pelos outros professores do grupo e tudo.
Retomando a ideia de não querer escolher uma prova favorita, distingo a
prova do Mega-Sprinter, pelo facto de ter sido a minha turma a representar o
agrupamento. Uma turma dita “com menos capacidades ao nível motor”
conseguiu alcançar um 2º lugar a nível regional, foi impressionante. Uma
capacidade de superação e persistência que não sabia que tinham. E após a
competição, as conversas, os jogos de cartas (não se pode ir para uma visita
sem pelo menos um baralho de cartas e protetor solar) reuniram toda a gente
de várias turmas diferentes do agrupamento.
Em relação ao Grupo-equipa de Desporto Adaptado, compreendi que o
meu conhecimento do que se passa na escola, era realmente reduzido. Apesar
de tudo o que funciona mal nas escolas nacionais, também se fazem muitas
coisas bem feitas e que ajudam de facto os alunos, no seu desenvolvimento
global. A questão é saber aproveitá-las. O Surf foi uma atividade bastante
engraçada, primeiro por ser num ambiente completamente diferente do que
estamos habituados a dar uma aula, segundo pela dinâmica da aula e terceiro
pela alegria estampada na cara das crianças. É importante que existem estas
iniciativas e que se criem oportunidades para experimentarem desportos
novos. Quem sabe senão estamos a criar a paixão por algo?
Em suma, a nossa capacidade de organização, planeamento e foco nos
detalhes foi evoluindo e crescendo ao longo do ano, mediante tantas atividades
desportivas.
ENSINAMENTO
“Esta socialização constante permite a construção de uma identidade
profissional”
Dubar, 1997
Para ser professor, não chega cumprir horários. Não chega ir dar aulas.
Não basta ensinar os alunos. Não basta sem compreensivo e estar bem-
humorado. É preciso muito mais que isso. É preciso ir a reuniões. É preciso
85
preparar atividades. É preciso relacionar-se com os outros. É preciso assumir
um compromisso com a escola e com a comunidade educativa. É preciso saber
honrar esse compromisso. Envolver-se na escola e na comunidade faz parte da
profissão de docência. E também, torna a profissão mais rica e significativa.
Pois a socialização, forma-nos enquanto professores.
89
Segundo as normas orientadoras do EP, a Área 3 “engloba atividades e
vivências importantes na construção da competência profissional, numa
perspetiva do seu desenvolvimento ao longo da vida profissional, promovendo
o sentido de pertença e identidade profissionais, a colaboração e a abertura à
inovação”.4
Ao longo do ano para além do estágio profissional, existiam duas
unidades curriculares de Tópicos I e II que abordaram vários temas pertinentes
para a nossa ação pedagógica e educativa. O bloco de 1os socorros, de
comportamento motor e ainda a aula de construção de materiais foram tópicos
bastante interessantes e práticos que se podem utilizar nas aulas. Os 1os
socorros fazem parte do programa nacional de Educação Física de 10º ano,
daí a pertinência da formação completa e de acordo com os programas. O
bloco do comportamento motor foi importante na medida em que nos alertou
para ver e observar alguns “tiques motores” que os alunos possam ter que na
realidade são algum problema. E por fim, a construção dos materiais permitiu
perceber que “com qualquer coisa, algo se pode fazer”, podendo até envolver
outras disciplinas e professores.
O subtópico apresentado de seguida, contribuiu também para a minha
formação, mas ocorreu devido ao estágio prático.
5.1. Formação pessoal
Um número ilimitado de acontecimentos, experiências, pessoas,
ambientes, circunstâncias da vida contribuíram para a minha formação.
Formação nos mais diversos setores: profissional, social, afetivo e pessoal.
Somos feitos do que nos rodeia.
Algo que contribuiu verdadeiramente foi o estágio. Não se enganem, a
faculdade também, claro, mas nada substitui o contexto real. Senti um choque
muito significativo entre a prática e a teoria, ou seja, aquilo que efetivamente se
passa na escola e aquilo que a faculdade nos transmite.
4 Normas orientadoras do Estágio Profissional. Ano letivo 2018/2019. Porto: FADEUP
90
Sentia-me um peixe fora de água. Mas, não sei se esse choque é algo negativo
ou positivo. Talvez negativo, pois não prepara o EE para o contexto real, no
entanto essa falta de preparação pode ser uma boa forma de o professor ser
testado na sua capacidade de inovação, criatividade, mudança e adaptação.
A professora cooperante sempre nos motivou a sermos diferentes,
criativos e arrojados. A pensar mais além… A ambicionar ser algo mais…
Também queremos que os nossos alunos o sejam. Que desejem algo mais.
Que deixem uma pegada no mundo, e para isso temos que os fazer crescer.
Arranjar formas originais para os fazer evoluir, é difícil. Mas é preciso
arranjar estratégias para os cativar para ir à escola. Professores melhores,
exercícios interessantes, metodologias atrativas. Eu tinha conhecimento da
falta de interesse por parte de alguns alunos, porém, foi impressionante a
quantidade de alunos que não têm qualquer tipo de interesse na escola.
Apenas 1 disciplina os fazia “levantar da cama”. Surreal. Pensar que estão 12
anos na escola, e que para alguns, é uma “tortura”. A quantidade de alunos
que para eles a escola não significa nada, a não ser “uma seca”. Que nada é
capaz de os fazer acreditar em algo. De querer ser algo.
Temos, todos, enquanto professores, encarregados de educação,
auxiliares de educação, sociedade até, promover um ambiente de partilha,
comunicação e ambição em torno da escola. Não têm que gostar de tudo (eu
também não gostava), mas existiam disciplinas que “puxavam por mim”. É isto
que queremos da escola. É isto que temos que pretender que a escola nos dê.
Uma escola que os faça pensar, investigar, ter curiosidade, ambicionar, ser
singulares. Que os faça engrandecer cada um deles.
Todas as experiências que fizemos, as formas de avaliação diferentes
ao longo do ano, em que colocamos os alunos a autorregularem as
aprendizagens, a serem os atores do ato criativo que é uma aula. Mas não, não
fomos perfeitos ao longo do ano (longe disso), mas demos a oportunidade para
que os alunos pensassem, tentassem e errassem, porque “o erro é a alavanca
do conhecimento” – foi a primeira mensagem que a professora cooperante nos
transmitiu.
Têm que experimentar coisas novas. Têm que ser humildes
(intelectualmente). Têm que respeitar os outros e a si mesmos. Têm que
91
trabalhar para alcançar o que querem. Todavia, antes de tudo: têm que querer
alcançar algo.
ENSINAMENTO
“Os homens se sabem inacabados. Têm a consciência da sua inconclusão (…)
Daí que seja a educação um que-fazer permanente”
Paulo Freire, 1987
O professor sabe que a sua formação não acaba aqui. Este é só um fim
de uma etapa, e o início de outra. A formação profissional requere um estado
de constante mutação. É aberto a novas ideias, a diferentes conceções, a
diversos horizontes. Não se acaba nunca o processo de formação, pois é volátil
e contínuo. E todos os dias se aprende algo, na socialização dentro e fora do
contexto escolar.
95
A literacia motora de uma turma de 2º ano de escolaridade:
análise por recurso à bateria M ABC-2 e provas de aferição
6.1. Introdução
O desenvolvimento motor das crianças, de forma equilibrada e
harmónica, é central ao seu desenvolvimento integral, pelo que a escola,
enquanto instituição formadora, tem que incorporar esta componente nas suas
preocupações. Em Portugal, esta preocupação encontra eco nos currículos dos
vários Ciclos de Ensino, a começar no pré-escolar, com a incorporação da
Expressão Motora, a que se segue a Expressão e Educação Físico Motora
(EEFM) no 1º ciclo e Educação Física nos restantes ciclos de ensino.
No caso do 1º Ciclo do Ensino Básico, o programa está dividido por
blocos que têm como principal propósito permitir a continuidade do crescimento
(motor) da criança. Crescimento esse, que é suposto que tenha começado a
ocorrer no contexto escolar, ainda no ensino pré-escolar. Desta forma, os
conteúdos passam por desenvolver as perícias e manipulações,
deslocamentos e equilíbrios, as habilidades gímnicas básicas e a participação
em jogos que trabalhem habilidades motoras e ações técnico-táticas básicas.
Também para este ciclo de ensino estão definidas Aprendizagens Essenciais
(AE) para os diferentes blocos de matéria. Para o 1º ciclo, as AE pretendem
assegurar a evolução das capacidades psicomotoras, impostas pelos
diferentes períodos de desenvolvimento motor, cognitivo, social e afetivo deste
nível etário. Seja através de atividades lúdicas e expressivas, ou por meio de
práticas sociais e relacionais, o principal objetivo é que as crianças aprendam e
aperfeiçoem as habilidades fundamentais, de forma a não colocar em causa as
aprendizagens futuras. Não obstante a importância que se reconhece à área,
tanto a EEFM como a EF não tem sido bem tratada no contexto do
desenvolvimento curricular. Mencione-se o facto das Atividades de
Enriquecimento Curricular no 1º ciclo terem, em muitas escolas, vindo
‘substituir’ a EEFM, bem como a fase (2012 a 2018) de desvalorização da EF
(ensino secundário), cuja classificação deixou de ser considerada para cálculo
96
da média do ensino secundário e de acesso ao ensino superior. No entanto, e
com a crescente força conquistada, a EF tem dado passos em frente,
designadamente pelo regresso da contabilização para o cálculo da média do
secundário e de acesso ao ensino superior e a instituição, à semelhança das
outras áreas disciplinares, das provas de aferição nos 2º, 5º e 8º anos.
Mas retomemos a questão do desenvolvimento motor das crianças,
agora à luz da configuração atual das sociedades, em que parece que ser
doente é moda, e na qual, facilmente, se rotulam as crianças com doenças.
Todos conhecemos alguém com transtorno de défice de atenção e
hiperatividade, intolerâncias, distúrbios de humor, vícios, alergias, ... E em
relação às habilidades motoras? Porque não catalogar o menino,
metaforicamente, de “disléxico motor”?
O que é um disléxico motor? Este conceito advém da noção de dislexia
como uma disfunção neurológica, que se manifesta ao nível da dificuldade de
aprendizagem da leitura, em pessoas com inteligência normal ou acima da
média e da palavra “motor” como adjetivo que “transmite movimento”. Sendo
assim teríamos um aluno com dificuldades de aprendizagem ao nível motor, ao
nível do movimento, que podermos considerar com défice de literacia motora.
Face a este quadro, coloca-se uma questão central: Por que razão o
currículo de EF tende a não ser cumprido em muitas escolas? Isto é, ficando ao
livre arbítrio do centro escolar o cumprimento do programa.
Nos pontos subsequentes procura-se, assim, dar corpo às razões da
importância da área motora para o desenvolvimento integral das crianças.
6.2. Enquadramento teórico
Habilidades Motoras vs Capacidades Motoras
No campo nacional do desenvolvimento motor, importa clarificar e
distinguir o que são habilidades motoras de capacidades motoras. Magill (2008)
defende que habilidades motoras são potenciais subjacentes ao desempenho
numa dada tarefa. São mutáveis com a prática, com a experiência e com
fatores situacionais e ambientais. São ilimitadas em número e consistem numa
97
conjugação e articulação de capacidades motoras e habilidades motoras
fundamentais. Ainda segundo o mesmo autor, capacidades motoras são
pressupostos determinantes do potencial individual de aprendizagem e do
rendimento em atividades da vida diária. Manifestam-se sempre de forma
complexa e não isoladamente. O seu desenvolvimento depende sobretudo de
traços hereditários e por isso são estáveis e duráveis. Dessa forma são
limitadas em número e são a base das habilidades. Todos os indivíduos
possuem diferentes capacidades, no entanto, difere a intensidade com que
cada capacidade se manifesta. Em relação à classificação das capacidades
motoras, a controvérsia instala-se. No que diz respeito às capacidades
condicionais, de âmbito quantitativo (força, flexibilidade, resistência e
velocidade), a maioria dos autores concorda com a classificação (Carvalho,
1987; Grosser, 1983), no entanto ao nível das capacidades coordenativas,
torna-se mais complicado chegar a um consenso, não só na nomenclatura
como na classificação em si mesma. Os mesmos autores referem que as
capacidades coordenativas são do âmbito qualitativo (apesar da lista infindável,
algumas das capacidades coordenativas: equilíbrio, orientação, destreza, ritmo,
reação). Grosser (1983) menciona que nas capacidades coordenativas
predominam os processos de condução do sistema nervoso central. Garganta
& Santos (2015) defendem que para se realizar as tarefas do quotidiano não é
necessário mais do que Força e Coordenação, pois estes dois fatores são a
base de produção do movimento. Todavia, existem alguns movimentos que o
grau de exigência motora é superior a nível motor e por isso são condicionados
pela mobilidade e estabilidade das articulações.
As capacidades motoras são conteúdos contemplados no programa de
expressão e educação físico motora do ensino básico e, portanto, após o
esclarecimento de conceitos é vital colocar uma pergunta: Qual a importância
de desenvolver as capacidades motoras em idades precoces? Em que medida
é benéfico treinar essas capacidades?
A escola e a EF em especial, são um meio de excelência para as
crianças poderem experimentarem, gostarem e praticarem. E essa filosofia não
deve ser alterada apenas porque os alunos são mais novos. O movimento é
uma forma de expressão e a sua praxis permite que a criança compreenda o
98
que consegue fazer e assim pode adaptar as habilidades a atividades dentro e
fora da escola. Assim, a escola é um ambiente que deve oferecer a
oportunidade de uma vivência motora eclética e rica, pois esta será
determinante no processo de desenvolvimento da criança (Canfield, 2000).
Uma abordagem multidesportiva (Figura 7) na escola concorre para a inclusão
de uma variedade de estímulos muito diferenciada, através de uma panóplia de
movimentos e habilidades, que se traduz no desenvolvimento da capacidade
de resposta (habilidade importante no desporto e no quotidiano).
A promoção das capacidades presentes no currículo em idades
precoces é significativa tanto para o desenvolvimento social como na melhoria
da qualidade de vida no futuro. Um treino regular estruturado e programado
produz um crescimento ideal. Portanto, cada capacidade motora deve ser
treinada de acordo com a fase de desenvolvimento mais sensível (altura em
que a capacidade de treino é particularmente mais elevada). Estas
caracterizam-se por um período ótimo para a aquisição de certas habilidades,
ou seja, diferentes capacidades possuem diferentes fases sensíveis de
desenvolvimento, pois o desenvolvimento das mesmas não é linear.
Desenvolver uma capacidade fora do seu momento ótimo, quer seja antes ou
depois resulta em pouca aprendizagem ou até impede a mesma (Manoel et al.,
1988).
Autores como Avelar-Rosa (2010) e Way (2005) concordam que cada
capacidade motora tem a sua fase sensível específica e que se devem
começar a desenvolver as capacidades em idades mais novas, no entanto
Capacidade de resposta
Capacidade de aprendizagem
Variedade de experiências
Leque de movimentos e habilidades
Variedade de estímulos
Figura 7 - Abordagem multidesportiva
99
quando cada um atribui a fase sensível a uma capacidade motora, existe
alguma discórdia (Gráfico 3). Conforme se pode observar no gráfico 3 é
percetível que a fase sensível de desenvolvimento é entre os 7 e os 16 anos,
pois todos os pressupostos anatómico-fisiológicos, motores, psicológicos e
sociais estão presentes.
A Educação Física no 1ºciclo
Santin (1992) acredita que a EF ainda não encontrou a sua própria
identidade e no 1º ciclo isso ainda é mais gritante. Rodrigues & Neves (2017, p.
11) referem que a EF “enfrenta muitas dificuldades para se afirmar como área
regular e sustentável”. De facto, apesar da EF estar presente no currículo
escolar deste o 1º ano de escolaridade até ao 12º ano de escolaridade,
evidenciando o reconhecimento da disciplina pelo sistema educativo para o
desenvolvimento dos alunos, a realidade não espelha este quadro. Monteiro
(2017, p. 55) afirma mesmo que a EF no Iº Ciclo seria uma utopia e farsa,
porque “década após década, apesar de as crianças continuarem a sonhar
com ela, permanece sem lugar próprio para existir, para estar, para ser (…) É
imaginária, falamos dela, acreditamos nela (ou não), mas não se vê”. Hoje em
dia, para muitas crianças, a EF na escola é a única oportunidade de prática
regular e sistemática de atividades desportivas (Marques & Gaya, 1999; Neto,
Gráfico 3 - Fase sensível de desenvolvimento
Fontes: Rosa, B. (2010). Treino de Jovens: Princípios Orientadores. Centro de Formação da Confederação do Desporto de Portugal Balyi and Way (2005). The Sensitive Periods of Accelerated Adaptation to Training
100
2005; Trudeau & Shephard, 2005). Negar estas experiências às crianças,
deixando-as apenas para o 2.º ciclo do ensino básico pode ser tardio para o
desenvolvimento de competências, perceções e motivação para adquirir o
hábito de prática ao longo da vida (Kirk, 2005).
No caso do 1º ciclo, a problemática é mais complicada de resolver.
Primeiro, porque há professores de EF que atuam numa perspetiva, quase
exclusiva, de divertimento, isto é, não existe a preocupação de um programa
estruturado e planeado que permita o desenvolvimento motor. Segundo, a
disciplina não é obrigatoriamente dada por um professor especialista em EF, ou
seja, fica ao critério do professor titular (regime de monodocência) a
coordenação e gestão global do currículo, assim como a frequência das aulas.
Ora com este modelo de monodocência, o professor da turma apresenta três
condicionantes para a não prática da EF. Primeiro, a falta de conhecimentos
pois os cursos de formação não contemplam um conhecimento mais profundo
da área e assim causa opressões para uma prática regular e de qualidade
(Capel & Blair, 2008; Carreiro da Costa, 2005; Hardman, 2008; Kirk, 2005; Kirk,
2012; Petrie, 2016). Segundo, as prioridades curriculares que sobrevalorizam
outras áreas em detrimento das áreas de expressão, seja as expressões
artísticas ou a expressões físico-motoras (Pacheco, 2000). E por fim, a falta de
material e espaços mínimos para uma ação regular e prazerosa (Carruma,
2017).
Mediante estas condicionantes é necessário pensar no futuro. Se o nível
de habilidade que os indivíduos conseguem alcançar depende não só das
capacidades que trazem consigo (fatores hereditários), mas também da
quantidade e qualidade das suas experiências práticas, os alunos precisam,
mesmo, de ter aulas de forma regular, planeadas e cuidadas, e não apenas de
aulas que sirvam de recreio.
Neste quadro, alguns autores têm veiculado que é necessário resolver a
questão da monodocência no 1ºciclo, com modelos que melhorem a qualidade
de ensino. Rodrigues & Neves (2017) enumeraram quatro modelos que visam
essa melhoria nas atuais escolas portuguesas:
i. Turma ao cargo exclusivamente de professores especialistas em EF;
101
ii. Professor de turma coadjuvado por professor especialista em EF;
iii. Treinador desportivo;
iv. Empresas com responsabilização total do currículo e/ou com o apoio ao
professor titular da turma (PTT).
Não obstante o elevado número de estudos sobre a temática, ainda não
se chegou a uma resposta idónea e conclusiva. Alguns autores defendem que
a responsabilidade da EF deveria estar ao cargo de professores especialistas
da mesma, pois possuem mais capacidades ao nível do planeamento,
instrução e ação pedagógica, de modo a proporcionar mais oportunidades para
elevar os níveis de AF (Faucette et al., 2002; Le Masurier & Corbin, 2006). No
entanto, tentando abraçar uma abordagem holística do ensino, Wright
(2002)argumenta que o professor da turma deve ser o docente responsável,
pois possuiu um conhecimento mais aprofundado sobre os alunos, ao nível das
suas necessidades e habilidades individuais. Porém, uma visão colaborativa
também é “vista com bons olhos”, pois o PTT pode aprender e motivar para um
aumento de aprendizagens interdisciplinares (Sloan, 2010). No caso dos
treinadores desportivos, põe-se em causa a ação e qualidade pedagógica dos
mesmos, pois o foco é o desporto em si e não a aprendizagem do PTT e/ou
dos alunos (Petrie, 2016). Em suma, os dois autores mencionados
anteriormente defendem que, face ao facto de ainda não se ter encontrado um
modelo de docência que permita a sustentabilidade da EF no 1º ciclo. explorar
outros modelos de docência, nomeadamente os colaborativos, para que não se
restrinja a compreensão, a prática e a confiança dos docentes generalistas em
ensinar EF é um caminho a explorar.
6.3. Objetivos
O objetivo geral deste estudo foi analisar a literacia motora de alunos de
uma turma do 2º ano de escolaridade, especificamente visou-se:
I. Analisar o nível motor dos alunos recorrendo à bateria de testes M
ABC-2 (componente relativa ao contexto de sala de aula)
102
II. Analisar os resultados obtidos nas diferentes provas de aferição
realizadas pelos alunos da turma.
III. Explorar a relação entre os resultados obtidos na bateria de testes
M ABC-2 (Resultado Padrão Total) e os resultados obtidos nas provas
de aferição.
6.4. Metodologia
Contexto do estudo
A escola onde decorreu a intervenção faz parte do agrupamento de
escolas da escola cooperante, que engloba 5 estabelecimentos educativos que
contemplam os diferentes ciclos de ensino. Situa-se na freguesia do Bonfim e a
Junta de Freguesia tem sido um parceiro importante para o agrupamento
através da promoção de atividades, mostrando o interesse e preocupação
pelas gerações futuras. A escola tem uma unidade de multideficiência ajudando
meninos de diferentes idades através do apoio de profissionais de várias áreas
distintas.
Para a prática da Expressão e Educação Físico Motora (EEFM), a
escola tem bastante material como cones, bolas, colchões, bancos, barreiras,
cordas, fitas, malha, entre outros e estão com um estado de conservação
bastante razoável. No entanto, os espaços físicos para a prática são bastante
limitados: 1 exterior e outro interior. O espaço exterior é espaçoso e tem 2
cestos de basquetebol e 2 balizas, com as marcações no solo para os dois
desportos. O espaço interior foi adaptado para a prática de desporto, pois é
muito pequeno para uma turma. Em dias em que as condições atmosféricas
não eram as mais favoráveis era complicado conseguir organizar o espaço
para os 28 alunos. As aulas decorriam às terças-feiras, das 14h às 15h.
Participantes
Neste estudo esteve envolvida uma turma do 2ºano pertencente a uma
das escolas do Ensino Básico que pertencem ao agrupamento da escola
cooperante. Participaram no programa 24 alunos (13 do sexo masculino e 11
do sexo feminino). Ao longo do ano houve lugar à entrada e saída de alunos,
103
por isso houve alunos que não participaram logo no início do projeto e alunos
que não acabaram o programa de intervenção. Desta forma, o número de
alunos que efetivamente realizaram as duas provas é de 18, sendo 10 meninos
e 8 meninas. A média de idade da turma é de 8 anos. A turma apresenta um
nível homogéneo em relação às capacidades dos alunos, existindo apenas 2
alunos com um nível motor baixo (dificuldades em acompanhar os colegas nas
aulas).
Instrumentos
Neste estudo, para a avaliação motora foi utilizada a bateria de testes
“Movement Assessment Battery for Children” (Henderson, Sugden & Barnett,
2007), que incorpora duas componentes: uma de caráter quantitativa, que
reflete a prestação da criança num conjunto específico de tarefas motoras e a
outra de caráter qualitativo, sobre o modo como a criança reage e desenvolve
atividades do quotidiano. De referir que para o presente estudo apenas foram
considerados os dados da componente quantitativa. Foram respeitadas as
instruções gerais e específicas de aplicação dos testes. O teste foi validado
para a Língua Portuguesa por Bárbara Vasconcelos, Paula Rodrigues, Ana
Carita e Olga Vasconcelos (2018).
O conjunto de testes tem como finalidade fornecer informações
pertinentes à prescrição e estruturação de programas de treino, auxiliar na
identificação de crianças com transtornos na coordenação motora e apoiar o
diagnóstico, bem como monitorizar mudanças ao longo do tempo. A bateria de
testes está desenvolvida para crianças dos 3 aos 16 anos, estando secionada
em 3 faixas etárias: dos 3 aos 6, dos 7 aos 10 e por fim dos 11 aos 16 anos de
idade, sendo que os testes e as perguntas estão adequadas a cada secção.
Neste estudo, face à faixa etária dos alunos foi utilizada a banda 2: dos 7 aos
10 anos. As habilidades que foram avaliadas nesta parte são destreza manual,
destreza com bola, equilíbrio estático e dinâmico, perfazendo um conjunto de 8
testes (Anexo I).
Por sua vez, as provas de aferição têm como propósito fundamental
fornecer informações à comunidade educativa sobre o desempenho dos
alunos, de forma a poder haver uma ação atempada, isto é, uma intervenção
104
pedagógica tendo em conta as dificuldades específicas de cada aluno. As
provas incluíam a avaliação do equilíbrio, saltos, deslocamentos, habilidades
gímnicas básicas, coordenação e a componente lúdica (Anexo II). Em relação
aos critérios de avaliação, as provas eram avaliadas através de códigos que
correspondem a níveis diferenciados de desempenho. Mediante os descritores
de desempenho de cada prova, o professor classificador atribuía o código
correspondente. O código 99 corresponde à não realização da tarefa por parte
do aluno. 00 no caso de o aluno executar sem respeitar as instruções. No caso
dos outros códigos (10, 20 e 30) os descritores dependiam dos exercícios.
Procedimentos de aplicação
A bateria de testes foi realizada nos dias 2 de abril e 5 de abril com a
colaboração da professora cooperante, dos estudantes-estagiários e da
professora titular da turma. Foi utilizado o espaço interior da escola, mesas e
cadeiras e o material para os testes foi cedido pela FADEUP.
As provas de aferição foram realizadas no dia 7 de maio, no espaço
exterior e interior da escola. Os resultados obtidos pelos alunos foram cedidos
pela professora cooperante. De referir, que não foram concretizadas as provas
6 e 8 devido ao facto de não existir material apropriado na escola para a
realização das mesmas.
Procedimentos de análise
Para o tratamento estatístico dos resultados deste estudo recorreu-se ao
programa estatístico Statistical Package for the Social Sciences (IBM SPSS
Statistics 26).
Na análise dos resultados das provas de aferição foi realizada estatística
descritiva, especificamente medidas de tendência central (média, moda e
mediana) e de dispersão (desvio padrão - DP), bem como frequências
absolutas e relativas. Para a bateria de testes M ABC -2 foi igualmente
utilizada estatística descritiva (média, moda, DP, intervalo de variação, mínimo,
máximo, frequência absoluta). Na análise geral foi considerada uma escala de
105
4 valores, tendo por base a média e o desvio padrão, resultando em 4 valores
de corte:
• < (Méd - DP): baixo
• Méd - DP < x < Média: média inferior
• Média < x < Méd + DP: média superior
• > Méd + DP: elevado
Por fim, para analisar a relação entre os resultados das provas de
aferição e os da bateria de testes utilizou-se o índice de correlação de
Spearman. O nível de significância considerado foi p≤0.05.
6.5. Resultados e interpretação
Tendo como base os objetivos do estudo, os resultados estão
organizados em 3 secções, a primeira corresponde às provas de aferição, a 2ª
aos testes da bateria M ABC-2 e a última às correlações entre as duas
variáveis.
Provas de Aferição
A tabela 1 apresenta os valores obtidos pelos alunos na prova 1 -
Equilíbrio.
Os dados da prova de equilíbrio revelam que apenas 2 alunos não
tiveram sucesso. De destacar, o valor da moda (20), que nesta prova
corresponde à classificação máxima. Desta forma, é de salientar que a maioria
Tabela 1 - Resultados da Prova 1 - Equilíbrio
106
dos alunos se encontra acima da média. Possivelmente, deve-se ao facto de
nas aulas se ter exercitado vários exercícios relacionados com o equilíbrio.
Na tabela 2 podem ser observados os valores obtidos pelos alunos na
prova 2 – Salto para um plano superior.
Os dados obtidos pelos alunos no salto para um plano superior revelam
que a maioria dos alunos (16) obteve classificações positivas, embora metade
tenha obtido apenas o valor de 10. Já os alunos que não tiveram êxito na tarefa
(0) foram 7. De referir ainda, que não obstante o valor da moda ser 10 (8
alunos obtiveram este resultado), em termos absolutos houve o mesmo número
de alunos com o resultado 20 (8 alunos). Este exercício exige um maior nível
de coordenação visual e motora, nível esse que não se enquadravam todos os
alunos.
A tabela 3 exibe os valores obtidos na prova 3 – Rolar o arco.
A prova 3 fica marcada pelo sucesso dos alunos (16), embora a média
dos resultados seja inferior a 10 valores. De destacar também que 7 alunos
não tiveram êxito na tarefa. A razão para tal pode estar no facto de não ter
havido atividades similares com arco, ao longo do ano nas aulas de EEFM.
Tabela 2 - Resultados da Prova 2 - Salto para um plano superior
Tabela 3 - Resultados da Prova 3 - Rolar o arco
107
A tabela 4 mostra os valores obtidos na prova 4 – Saltar à corda.
Os valores apresentados revelam que dois alunos não realizaram a
tarefa, e 12 tiveram insucesso, pelo que apenas 9 alunos conseguiram ter
sucesso. Apesar desta tarefa ter sido trabalhada bastantes vezes nas aulas, é
um exercício que não é de fácil compreensão por parte do aluno. Para além de
requerer uma boa capacidade coordenativa, este exercício também solicita
uma noção de ritmo e cadência que como é demonstrado no resultado do
teste, alguns ainda não possuem.
A tabela 5 expõe os resultados obtidos pelos alunos na prova 5 –
Rolamento à frente.
Os dados relativos a esta habilidade, apesar da moda ser 10, a média é
baixa (7,39), pois 9 alunos não tiveram êxito na sua realização. O facto de o
rolamento ser uma habilidade complexa, que envolve um trabalho específico
faz com que muitos não consigam executar a tarefa. Nas aulas, foi possível
observar que apesar de executarem o rolamento à frente, não se conseguiam
levantar no final, e esse era um dos critérios eliminatórios para obter
Tabela 5 - Resultados da Prova 5 - Rolamento à frente
Tabela 4 - Resultados da Prova 4 – Saltar à corda
108
classificação negativa (0). Assim, esta é uma provável razão para uma média
tão baixa.
A tabela 6 apresenta os resultados da prova 7 – Toques de sustentação
com raquete.
Os resultados obtidos evidenciam que esta foi a prova em que os alunos
apresentaram a pior média geral (4,78), com um valor modal de 0, e sucesso
em apenas 6 dos 23 alunos. Os processos de coordenação óculo-manual
pedidos por esta tarefa são bastante complexos e devido à falta de material
não foi possível treinar este tipo de exercício durante as aulas. Como tal, é
natural que a taxa de insucesso seja maior.
A tabela 7 mostra os resultados obtidos pelos alunos na prova 9 –
Condução de bola.
A tabela evidencia uma média elevada (10,43), a segunda melhor entre
as provas, com uma moda de 10. No entanto, 6 alunos obtiverem insucesso na
prova. Este resultado talvez encontre explicação no facto de a maioria dos
alunos ser do sexo masculino e usualmente jogarem ‘à bola’ nos recreios.
Tabela 6 - Resultados da Prova 7 – Toques de sustentação com raquete
Tabela 7 - Resultados da Prova 9 – Condução de bola
109
A tabela 8 apresenta os resultados da prova 10 – Passe e receção da
bola.
Os resultados evidenciam uma média baixa (5,65), com um valor modal
de 0, e com elevadíssimo nível de insucesso - apenas 7 alunos em 23
realizaram a prova com êxito. Contrariamente ao expectável, de a preensão
manual ser uma habilidade que não envolve grandes dificuldades, as meninas
revelaram muitos deficits de coordenação óculo-manual associados às
dificuldades de preensão durante as aulas.
A tabela 9 representa os resultados da Prova 11 – Jogo das “Tocas”.
Em termos gerais, esta foi a prova em que os valores da média foram os
mais elevados (27,83, num máximo de 30). Não houve nenhum aluno abaixo
de 10, sendo que em 23 apenas 1 alcançou 10. O valor da moda é de 30, a
classificação máxima possível. Estes valores podem ser explicados, pelo facto
dos alunos terem experimentado o jogo na aula anterior.
Tabela 8 - Resultados da Prova 10 – Passe e receção da bola
Tabela 9 - Resultados da Prova 11 – Jogo das “Tocas”
110
M ABC – 2
Os resultados da bateria de testes M ABC–2 estão apresentados na
Tabela 10, designadamente o valor mínimo e máximo, a média e o desvio
padrão. Também são referenciados os 4 valores de corte e desta forma o
número de alunos em cada corte por prova.
Os resultados dos testes (tabela 10) revelam que as médias variam
entre 7 e 12, evidenciando que, no geral, os alunos se encontram no resultado
médio de cada prova. Quando se analisam os resultados em função dos
valores de corte, constata-se que existem testes em que ninguém atingiu o
nível elevado (DM3), nem os níveis médios inferior e superior (Eq2). Assim, no
Equilíbrio 2 (Eq2) não aparecem valores intermédios, ou seja, ou os alunos
apresentam valores baixos ou valores elevados na avaliação motora. No caso
do teste de Equilíbrio 3 (Eq3) não há valor médio inferior.
Em relação aos 3 testes de DM, a maioria dos alunos alcançou o
patamar médio superior, demonstrando em termos gerais o bom desempenho
dos alunos, nesta categoria. No que concerne ao A_A a maioria está no nível
médio inferior, mostrando que as dificuldades de preensão são visíveis nos
dados dos dois testes. Por último, nos testes de equilíbrio, não existe um nível
Tabela 10 - Resultados M ABC-2
Legenda:
DM – Destreza Manual A_A – Atirar e Agarrar Eq - Equilíbrio
111
que se possa destacar claramente, pois de teste para teste existe uma elevada
taxa de variação.
Correlação
No que concerne à relação dos resultados obtidos pelos alunos na
bateria de testes, especificamente Resultado Padrão Total (RPT), e nas provas
de aferição (tabela 11), os dados evidenciam que apenas na prova 5 -
rolamento à frente - os valores de correlação são de ligeira a substancial
magnitude (0,564), e estatisticamente significativos (p<0.05).
Em relação às outras provas, de salientar a Prova 9 – Condução de bola
- que apesar do resultado não ser estatisticamente significativo, apresenta uma
relação negativa de elevada magnitude (-0,78).
Para uma exploração pormenorizada, por componentes dos testes, ou
seja, o RPT das 3 provas de Destreza Manual correlacionado com as provas
de aferição (Tabela 12). Os dados evidenciam que na prova 2 (salto para o
plano superior), 3 (rolar o arco) e 4 (saltar à corda), os valores de correlação
são de ligeira a substancial magnitude (0,507; 0,47 e 0,474, respetivamente), e
estatisticamente significativos (p<0.05).
Tabela 11 - Correlação entre Resultado Padrão Total e as Provas de Aferição
Tabela 12 - Correlação entre RPT Destreza Manual e Provas de Aferição
112
No caso da componente de Atirar e Agarrar (Tabela 13), apenas os
resultados de duas provas, a 2 (salto de um plano inferior) e a 4 (saltar à
corda), evidenciam resultados estatisticamente significativos (p<0.05), com
uma correlação ligeira a substancial.
Por fim, em relação à componente de Equilíbrio (Tabela 14), nenhum
teste apresenta resultados estatisticamente significativos, apresentando até na
sua maioria correlações negativas.
6.6. Conclusão
Em relação às provas de aferição, os alunos obtiveram resultados razoáveis.
Na prova 1 (Equilíbrio) e na 11 (Jogo das Tocas), a prestação dos alunos foi
excelente. Já no “Salto de um plano inferior”, “Rolar o arco” e “Condução da bola”, os
resultados rondam a média. No entanto, nas restantes provas (4, 5, 7, 10) os
resultados foram abaixo da média.
No caso da bateria de testes M ABC-2, os melhores resultados são ao nível da
destreza motora (DM), em que os alunos se encontram no patamar médio superior. Na
componente: Atirar e agarrar (A_A), os níveis de desempenho baixam ligeiramente
Tabela 13 - Correlação entre RPT Atirar e Agarrar e Provas de Aferição
Tabela 14 - Correlação entre RPT Equilíbrio e Provas de Aferição
113
para o nível médio inferior. E no Equilíbrio (Eq), os resultados são dispersos, variando
de teste para teste.
Em termos correlacionais, ao comparar os resultados da bateria de testes com
os dados das provas de aferição, apenas foi obtido uma prova com resultados
estatisticamente significativos (Prova 5 – rolamento à frente). Como tal, utilizaram-se
outros resultados padrões da bateria: destreza manual, agarrar e apanhar e equilíbrio,
comparando-os numa segunda fase com os valores das provas de aferição. Com este
procedimento obtiveram-se mais resultados estatisticamente significativos, como já
foram referidos anteriormente.
Face aos resultados obtidos na bateria de testes e nas provas de aferição,
pode inferir-se que o nível de literacia motora dos alunos é médio, pois existe uma
disparidade nos resultados. Existem provas em que os alunos revelam ter uma
prestação motora excelente, enquanto que noutras os resultados são fracos. Contudo,
acredito que com uma prática sistemática e organizada (com aulas ao longo de todo o
ano letivo e em todos os anos de escolaridade), os valores poderiam ser
substancialmente melhores.
Para investigações futuras, penso que seria importante estender este tipo de
estudo a uma amostra mais alargada e utilizar um grupo de controlo que não tivesse
aulas regulares de EEFM.
117
Este capítulo mostra o fim de um ano. O fim de uma experiência
enriquecedora. O fim de um ano de crescimento a nível pessoal e profissional,
acredito que para mim, para os meus alunos e para todos os envolvidos neste
EP. Um ano de alegrias, dúvidas, sucessos e fracassos. É o fim, mas também
o início de uma nova etapa. E o sentimento que está a “flor da pele” é a
saudade. Faria outro ano de estágio (alterando algumas práticas, claro), mas
faria. Voltaria a passar pela primeira aula, o primeiro sentar na sala dos
professores (e todos aqueles olhos a olhar para mim e a pensar: “O que faz
aqui esta aluna?”), a primeira ida à reprografia e a senhora esconder os testes
e proibir a entrada (“Eu sou professora estagiária de EF” – dizia eu), pela
primeira reunião de professores. Todavia, passaria também pelo primeiro “mais
cinco” com um aluno orgulhoso do que conseguiu, pelo primeiro: “Olá Doutora”,
da senhora da cantina, pelo primeiro: “Vamos ter saudades suas, stôra”.
Em suma, e depois do vivido neste ano, quero deixar algumas
promessas aos meus alunos (passados e futuros):
Prometo…
Que vamos melhorar a qualidade de
ensino
E ensinar-vos o pino
Estar com o olhar mais atento
E alguns dias, rabugento
Tentar inovar as práticas dia após dia
Desde que não me provoquem
taquicardia
Centrar mais as aulas em vós
E menos em nós
Porque só vós me chamam stôr
Apesar da palavra ser professor
Compreensão vai ser palavra de ordem
Desde que não tenha que gritar:
“Acordem!”
Ser mais exigente convosco
Mas também connosco
Aulas que vos deem prazer
E que vos façam crescer
Verdade, bondade e curiosidade
Amizade, vontade e muita saudade
Não somos perfeitos
Mas somos “Os Eleitos”
Todos faremos um esforço
Mas cuidado com o pescoço
Paciência vão ter que ter
E vai ter que ser a valer
Porque a mudança custa
É preciso ser justa
Com um até já me despeço
Ansiosa por um novo recomeço…
121
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