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FACULDADE CEARENSE FAC CURSO DE DIREITO VANQUES ANTÔNIO GOMES DE MELO NULIDADE POR AUSÊNCIA DO EXAME DE CORPO DE DELITO NOS CRIMES NÃO TRANSEUNTES FORTALEZA 2013

FACULDADE CEARENSE FAC CURSO DE DIREITO · 2014. 7. 22. · O Instituto das nulidades está previsto nos Arts. 563 a 573 do Código de Processo Penal e tem amparo no princípio constitucional

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FACULDADE CEARENSE – FAC

CURSO DE DIREITO

VANQUES ANTÔNIO GOMES DE MELO

NULIDADE POR AUSÊNCIA DO EXAME DE CORPO DE DELITO NOS

CRIMES NÃO TRANSEUNTES

FORTALEZA

2013

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VANQUES ANTÔNIO GOMES DE MELO

NULIDADE POR AUSÊNCIA DO EXAME DE CORPO DE

DELITO NOS CRIMES NÃO TRANSEUNTES

Monografia apresentada ao Curso de

Direito das Faculdades Cearenses - FAC,

como requisito parcial para obtenção de

grau de bacharel em Direito, sob

orientação da Profª. Teresa Cristina Pinto

Moreira./

FORTALEZA

2013

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Bibliotecário Marksuel Mariz de Lima CRB-3/1274

M528n Melo, Vanques Antônio Gomes de

Nulidade por ausência do exame de corpo de delito nos crimes

não transeuntes / Vanques Antônio Gomes de Melo. Fortaleza –

2013.

65f.

Orientador: Profª. Teresa Cristina Pinto Moreira.

Trabalho de Conclusão de curso (graduação) – Faculdade

Cearense, Curso de Direito, 2013.

1. Nulidade. 2. Exame de corpo de delito. 3. Infrações -

vestígios. I. Título

CDU 343

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VANQUES ANTÔNIO GOMES DE MELO

NULIDADE POR AUSÊNCIA DO EXAME DE CORPO DE

DELITO NOS CRIMES NÃO TRANSEUNTES

Monografia apresentada ao Curso de

Direito da Faculdade Cearense - FAC,

como requisito parcial para obtenção

de grau de bacharel em Direito, sob

orientação da Profª. Teresa Cristina

Pinto Moreira.///

Fortaleza (CE) ______ de fevereiro de 2014

Teresa Cristina Pinto Moreira//

Profª. Orientadora da Faculdade Cearense

Ms. José Hugo de Alencar Linard Filho

Prof. Examinador da Faculdade Cearense

Ms. Prof. José Péricles Chaves

Prof. Examinador da Faculdade Cearense

José Júlio da Ponte Neto

Coordenador do Curso de Direito

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De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto

ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer

a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os

poderes nas mãos dos maus, o homem chega a

desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a

ter vergonha de ser honesto.

RUI BARBOSA

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Ao Deus todo poderoso, que direciona os meus passos;

Aos meus pais, Antônio e Marinete, que me conceberam;

Ao meu avô Din, fonte de onde colhi algumas sementes de honestidade, ética e moral;

À minha sábia e ajudadora amada esposa Márcia;

Aos meus queridos e amados filhos Vanderson, Vladerson, Vandebergue, Wanques Emanoel e

Samuel, bênçãos recebidas de Deus; e

Ao meu irmão e amigo Zé.

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AGRADECIMENTO

A profª Tereza Cristina e o Prof. Hugo, pela dedicação em todas as etapas deste

trabalho.

À minha família, pela confiança e motivação.

Aos professores e colegas de Curso de Direito da FAC, pois juntos trilhamos uma etapa

importante de nossas vidas.

A todos que, de algum modo, colaboraram para a realização e finalização deste trabalho.

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RESUMO

O objetivo deste trabalho é analisar as hipóteses de ocorrência de nulidade por ausência do exame

de corpo de delitos nos crimes não transeuntes conforme as disposições do ordenamento jurídico

brasileiro.

O Código de Processo Penal brasileiro determina que nas infrações que deixam vestígio, ou seja,

crimes não transeuntes, será indispensável a realização do exame de corpo de delito (art. 158),

podendo ocorrer nulidade (Art. 564, III, ―b‖) caso referido exame não seja realizado ou nas

hipóteses de haverem desaparecido os vestígios, e a prova testemunhal não for capaz de supri-lo

(art. 167).

Palavras-chave: Nulidade. Exame de corpo de delito. Infrações que deixam vestígios.

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ABSTRACT

The objective of this work is to analyze the chances of occurrence of invalidity for lack of

examining body offenses in non passers crimes under the provisions of Brazilian law.

The Brazilian Code of Criminal Procedure provides that the offenses that leave traces, ie no passers

crimes, will be essential to the examination of corpus delicti (art. 158), invalidity may occur (Art.

564, III, "b" ) if examination is not performed or the assumptions they had traces gone, and

witnesses are not able to supply him (art. 167).

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 15

CAPÍTULO 1 - NULIDADE ........................................................................................................... 17

1.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS ..................................................................................................... 17

1.2 CONCEITO DE NULIDADE .................... ................................................................................ 17

1.3 SISTEMAS DE LEGALIDADE DAS NULIDADES ................................................................. 18

1.4 PRINCÍPIOS APLICÁVEIS ÀS NULIDADES ......................................................................... 19

1.4.1 - Princípio do Prejuízo ou ―pas de nullité sans grief‖ .......................................................... 19

1.4.2 - Princípio da Instrumentalidade das Formas ....................................................................... 20

1.4.3 - Princípio da convalidação ................. ................................................................................ 21

1.4.4 - Princípio do livre convencimento motivado do juiz ou ―da persuasão racional‖ .............. 21

1.4.5 - Princípio da causalidade ou da sequencialidade ................................................................ 22

1.4.6 - Princípio da conservação .................. ................................................................................ 22

1.4.7 - Princípio do interesse ........................ ................................................................................ 23

1.4.8 - Princípio da reformatio in pejus ........ ................................................................................ 23

1.5 EXTENSÃO DAS NULIDADES ................................................................................................ 24

1.6. ESPÉCIES DE NULIDADES .................................................................................................... 25

1.6.1 - Nulidade absoluta ............................................................................................................... 25

1.6.2 - Nulidade relativa ................................................................................................................ 26

1.6.2.1 Características das nulidades relativas ..................................................................... 27

a) Necessidade de demonstração do prejuízo ............................................................... 27

b) Momento de arguição .............. ................................................................................ 27

1.6.3 – Diferenças entre nulidade absoluta de nulidade relativa ................................................... 28

1.7. NULIDADES SANÁVEIS ........................................................................................................ 29

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1.8 ATOS DEFEITUOSOS ............................................................................................................... 31

1.9 CONVALIDAÇÃO DAS NULIDADES..................................................................................... 32

1.10 DECLARAÇÃO DE NULIDADES PELO JUIZ ...................................................................... 32

1.11 NULIDADES EM FACE DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ................................... 33

1.12 O INQUÉRITO POLICIAL ....................................................................................................... 34

1.13 NULIDADES EM ESPÉCIEIS ................................................................................................. 36

CAPÍTULO 2 - EXAME DE CORPO DE DELITO

2.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS ..................................................................................................... 38

2.2 CONCEITO DO EXAME DE CORPO DE DELITO ................................................................. 38

2.3 OBJETIVO DO EXAME DE CORPO DE DELITO .................................................................. 39

2.3 A FORMAÇÃO DO CORPO DE DELITO ................................................................................ 40

2.4 PREVISÃO LEGAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO.................................. 40

2.5 NECESSIDADE DE PERITO OFICIAL ... ................................................................................ 41

2.6 MOMENTO PARA A REALIZAÇÃO DO EXAME DE CORPO DE DELITO ...................... 42

2.7 AS PROVAS INADMISSÍVEIS NO EXAME DE CORPO DE DELITO ................................. 43

CAPÍTULO 3 - NULIDADE POR AUSÊNCIA DO EXAME DE CORPO DE DELITO NOS

CRIMES QUE DEIXAM VESTÍGIOS

3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS.................................................................................................... 45

3.2 CONCEITO DE VESTÍGIO ........................................................................................................ 45

3.3 CRIMES QUE DEIXAM VESTÍGIOS ...................................................................................... 46

3.3.1 Crimes materiais e formais ................................................................................................... 47

3.2.1.1 Crime de homicídio ...................................................................................................... 47

3.2.1.2 Crimes contra a propriedade imaterial .......................................................................... 48

3.2.1.3 Crimes de falsidade documental ................................................................................... 49

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3.2.1.4 Crimes de lesão corporal .............................................................................................. 50

3.2.1.5 Crimes contra a liberdade sexual .................................................................................. 50

3.2.1.6 Crimes de violência doméstica – Lei Maria da Penha .................................................. 51

3.2.1.7 Crimes de Trânsito........................................................................................................ 52

3.3 A OBRIGATORIEDADE DO EXAME DE CORPO DE DELITO ........................................... 53

3.4 DA NULIDADE POR FALTA DE FÓRMULAS ...................................................................... 56

3.5 AUSÊNCIA DO EXAME DE CORPO DE DELITO ................................................................. 56

CONCLUSÃO ................................................................................................................................... 61

REFERÊNCIAS ................................................................................................................................. 63

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INTRODUÇÃO

O homem, na sua incansável busca pela sobrevivência, quando diante de uma

adversidade, usa de todos os meios necessários e disponíveis para sagrar-se vencedor. Algumas

vezes, para contra-atacar; outras, para defender-se. Na sua ação, ou mesmo omissão, os meios

utilizados muitas vezes ultrapassam aos limites permitidos, ocasionando um resultado danoso ao

seu oponente, à sociedade e, como sujeito constante, ao próprio Estado.

Quando tal resultado é contrário ao direito, ou seja, ilícito, por exemplo, morte, aborto,

lesão corporal etc., surge para o Estado o jus puniendi.

Ocorre que, mesmo sendo o Estado um ente soberano, a prerrogativa de punir que lhe é

conferida alcança certas limitações que esbarram na ideia de Estado Democrático de Direito. Logo,

para exercer o seu ―direito de castigar‖, o Estado deve dispor de elementos suficientes que

demonstrem de forma contundente a materialidade do delito praticado pelo agente. É aí que surge o

instituto das ―provas‖, que devem seguir obrigatoriamente o procedimento determinado pelo

ordenamento jurídico.

Como em regra, o resultado ocasionado pelo infrator deixa vestígio, há a necessidade de

se fazer uma análise mais minuciosa do fato delituoso. Nessa hipótese, o ordenamento jurídico

brasileiro prevê a obrigatoriedade de se fazer o exame de corpo de delito (art. 158 do CPP), quando

não for possível por meio de outra prova ser demonstrada a materialidade do fato (art. 167 do CPP).

Logo, se não for feita a perícia, ou essa seja feita de forma que infrinja alguma norma legal para sua

realização, estaremos diante de uma possível nulidade.

A justificativa para este trabalho é que pretendemos com este estudo levantar

questionamentos sobre o tema.

Em relação aos aspectos metodológicos, esta proposta de pesquisa monográfica tem por

objetivo geral analisar o atual posicionamento da legislação, da doutrina e da jurisprudência.

Quanto aos objetivos específicos, busca-se analisar e compreender algumas situações

mais importantes possíveis de nulidades.

Nesta proposta de trabalho monográfico, adotaremos o método científico, o que implica

a procura das possíveis causas de um acontecimento e a busca da compreensão ou explicação da

realidade, apresentando os fatores que determinam a existência de um evento.

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Em relação aos aspectos metodológicos, as hipóteses foram realizadas mediante uma

análise descritivo-analítica, desenvolvida com base na pesquisa bibliográfica, por meio de livros,

publicações especializadas, artigos e dados publicados na Internet.

Quanto à utilização dos resultados será pura, pois terá como único fim a ampliação dos

conhecimentos; já quanto à abordagem será qualitativa, à medida que se aprofundará na

compreensão dos assuntos, nas relações, condições e frequências de determinadas situações

jurídicas.

Por fim, quanto aos objetivos será descritiva, pois buscará descrever, explicar,

esclarecer e interpretar o fenômeno observado; e exploratória, pois objetiva aprimorar as ideias por

meio de informações sobre o tema em foco.

No primeiro capítulo, apresenta-se um contexto geral sobre o instituto das Nulidades,

exposto por meio de conceitos doutrinários, que são imprescindíveis para o conhecimento do tema.

Inicia-se com a explanação acerca do objetivo das nulidades, apresentando-se, em seguida, o

conceito, o sistema de legalidade, os princípios aplicáveis, as espécies, as nulidade que podem ser

sanadas, as nulidades em face da Constituição Federal e, por fim, apontam-se as nulidades em

espécies previstas no Código de Processo Penal brasileiro.

No segundo capítulo, analisa-se a questão do exame de corpo de delito, buscando-se,

primeiramente, apresentar a importância da realização do exame e, em seguida, a definição do

instituto, sua formação, espécies, previsão legal, necessidade da perícia, momento da realização do

exame e as provas admissíveis, destacando-se, para isso, os principais fundamentos que alguns

doutrinadores levantam para consolidar o assunto.

No terceiro capítulo, buscou-se analisar as hipóteses de nulidade por ausência do exame

de corpo de delito nos crimes não transeuntes, mencionando o conceito de vestígio, bem como quais

crimes deixam vestígios, a obrigatoriedade da realização e a repercussão da ausência do exame de

corpo de delito, dando ênfase, sobretudo ao atual posicionamento adotado pelo Supremo Tribunal

Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça.

O ponto principal deste trabalho é, portanto, analisar as hipóteses de ocorrência de

nulidade por ausência do exame de corpo de delitos nos delitos que deixam vestígios.

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CAPÍTULO 1

1 NULIDADES NO PROCESSO PENAL

1.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS

Inicialmente, antes de adentrar ao assunto do nosso tema, é importante fazermos

algumas considerações sobre o instituto das nulidades previstas no ordenamento Processual Penal

brasileiro, por se tratar de entendimento necessário à compreensão do assunto a ser abordado neste

trabalho.

O Direito Processual Penal em seu caráter objetivo tem como finalidade a busca pela

verdade real, e tal meta se alcança por intermédio das provas que se produzem e se valoram em

conformidade com as normas prescritas em lei, e cuja finalidade é formar a convicção do Juiz sobre

os elementos necessários à solução da causa, sem muito formalismo, mas observando as exigências

legais.

Ocorre, porém, que se tais exigências não forem observadas no momento da realização

de determinado ato processual, estaremos diante de uma possível nulidade processual.

O Instituto das nulidades está previsto nos Arts. 563 a 573 do Código de Processo Penal

e tem amparo no princípio constitucional do ―devido processo legal‖ (Art. 5º, LIV, da Constituição

Federal).

1.2 CONCEITO DE NULIDADE

Feitoza Pacheco (2005, p.265) conceitua nulidade como

“o defeito do ato processual ou do processo, que pode ter como sanção a ineficácia.

Portanto, nulidade é característica, qualidade, do ato processual ou do processo, enquanto

a ineficácia é a sanção aplicada pela inobservância da forma prescrita em lei”.

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Segundo Frederico Marques (2005, p.265), “A nulidade é uma sanção que, no processo

penal, atinge a instância ou o ato processual que não estejam de acordo com as condições de

validade impostas pelo Direito objetivo”.

Conforme se depreende dos conceitos apresentados, podemos definir nulidade como

uma sanção imposta em decorrência da inobservância de um vício do ato processual que foge aos

ditames legais, podendo ocasionar a invalidade do ato ou mesmo a nulidade de todo o processo.

Observa Nassif (///online) que ―o legislador adota a expressão „sanção‟ como a medida

tomada para eliminar o vício do contexto processual, expungindo ou renovando o ato viciado”.

1.3 SISTEMAS DE LEGALIDADE DAS NULIDADES

Nestor Távora e Rosmar Alencar (2010, p.942) apresentam uma classificação histórico-

evolutiva dos sistemas de nulidades em três critérios, quais sejam:

1) Sistema Privatista: as partes devem reclamar a invalidade do ato, que só será

declarado nulo se resultar prejuízo.

2) Sistema Legalista ou Formalista: o juiz fica subordinado à lei, tendo em vista que

essa traça os elementos essenciais a serem observados;

3) Sistema Judicial ou Instrumental: tal sistema permite que o juiz valore a

essencialidade do requisito não observado do ato processual.

Borges (2003, online), citando Nestor Távora e Rosmar Alencar (Apud), expõe que “o

Brasil adotou um sistema eclético que contempla tanto o „sistema legal e judicial‟ quanto o

„sistema instrumental‟”.

Tal argumento se justifica porque o Art. 564 do Código de Processo Penal traz um rol

exemplificativo de hipóteses que podem acarretar nulidades.

Lima (2013, p.1579) entende que

“no estudo da teoria das nulidades, o que deve ser evitado é o excessivo formalismo,

exigindo-se dos sujeitos do processo a observância de formas inúteis que nada contribuem

para a solução da demanda, nem tampouco para a existência de um processo penal justo,

sob pena de desvirtuamento da própria finalidade do processo, que é a de servir como

instrumento para a aplicação do direito penal objetivo.”

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Afirma Paulo Rangel (2009, p.785) que o sistema adotado foi o da instrumentalidade

das formas com resquícios do sistema legalista.

Para Mirabete (2010, p.615) ―o Código de Processo Penal ficou em um meio-termo

entre os sistemas formalista (legalista) e da instrumentalidade das normas, procurando ser

restritivo em matéria de nulidades ao afastar um formalismo excessivo‖.

Portanto, em matéria de nulidades, conforme BADARÓ (2008, p.177), busca-se evitar o

formalismo excessivo já que ―o legislador processual adotou o princípio da legalidade dos atos

processuais‖.

1.4 PRINCÍPIOS APLICÁVEIS ÀS NULIDADES

Assim como todo e qualquer instituto jurídico, as nulidades também são regidas por

princípios que explicam suas regras e seu funcionamento. Logo, não se pode falar em nulidades sem

analisar seus princípios.

Dentre os princípios processuais penais relativos às nulidades destacam-se os seguintes:

1.4.1 - Princípio do prejuízo ou “pas de nullité sans grief”

Este princípio é um dos primeiros que devem ser observados, pois se o ato não causa

prejuízo, não há que se falar em nulidade. É o que reza o Art. 563 do Código de Processo Penal, In

verbis:

―Art. 563 Nenhum ato processual será declarado nulo, se da nulidade não tiver resultado

prejuízo para uma das partes.”

O CPP determina que o ato irregular inofensivo que não influiu para apuração dos fatos

ou da decisão da causa, isto é, não afetou o convencimento do juiz, não deve ser declarado nulo. É o

que reza o Art. 566, se não vejamos:

Art. 566. Não será declarada a nulidade de ato processual que não houver influído na

apuração da verdade substancial ou na decisão da causa.

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A aplicação de tal princípio está previsto também na Súmula 523 do STF:

"No processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o

anulará se houver prova de prejuízo para o réu".

Esse princípio aplica-se à nulidade relativa, devendo ser demonstrado o prejuízo.

1.4.2 - Princípio da instrumentalidade das formas

Não se declara a nulidade se o ato, embora eivado de defeito acidental, se não houver

interferido na apuração da verdade substancial, atingido os fins a que foi proposto, devendo, assim

ser sanada a nulidade. É o que prevê os Arts. 566 e 572, II do CPP.

Art. 566. Não será declarada a nulidade de ato processual que não houver influído na

apuração da verdade substancial ou na decisão da causa.

Art. 572. As nulidades previstas no Art. 564, Ill, „d‟ e „e‟, segunda parte, „g‟ e „h‟, e IV,

considerar-se-ão sanadas:

(...)

II - se, praticado por outra forma, o ato tiver atingido o seu fim...

Deste modo, tem-se que, se o ato tiver atingido o seu fim, mesmo que praticado de outra

forma, as nulidades previstas no Art. 564, II, ―d‖ e ―e‖ (2ª parte), ―g‖ e ―h‖, e IV são consideradas

sanadas. Vejamos os dispositivos citados:

“Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:

II - por ilegitimidade de parte;

d) a intervenção do Ministério Público em todos os termos da ação por ele intentada e nos

da intentada pela parte ofendida, quando se tratar de crime de ação pública;

e) a citação do réu para ver-se processar, o seu interrogatório, quando presente, e os

prazos concedidos à acusação e à defesa;

g) a intimação do réu para a sessão de julgamento, pelo Tribunal do Júri, quando a lei não

permitir o julgamento à revelia;

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h) a intimação das testemunhas arroladas no libelo e na contrariedade, nos termos

estabelecidos pela lei;

IV - por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato.”

1.4.3 - Princípio da convalidação

O princípio da convalidação dos atos processuais está elencado em vários dispositivos

do CPP (p. ex. Arts. 568, 569, 570, 571) e tem como finalidade sanear o vício constante no ato (Art.

572 do CPP). Está ligado aos princípios da economia processual, da razoável duração do processo

e da conservação dos atos processuais (Távora, 2010, p.959)

O Art. 571 do diploma processual estabelece o momento em que as nulidades relativas

devam ser alegadas, sob pena de convalidação do ato viciado, conforme veremos mais adiante.

Entretanto, tratando-se de denúncia ou queixa, o Art. 569 dispõe que "as omissões da

denúncia ou da queixa poderão ser supridas a todo tempo, antes da sentença final".

1.4.4 - Princípio do livre convencimento motivado do juiz ou “da persuasão racional”

Ao juiz é livre formar sua convicção pessoal, desde que de forma motivada (Art. 93, IX

da CF), podendo fundamentar suas decisões com base nas provas existentes nos autos, sem se

sobrepor ao formalismo excessivo da norma.

Aponta Portanova (1999, p. 245) que ―... o juiz é livre para basear seu convencimento

tanto naquilo que as partes fazem (ativamente) no processo, como no que elas deixam de fazer”.

Destaca-se que o juiz, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, tem a

faculdade para apreciar livremente a prova, ainda que não alegados pelas partes, entretanto deverá

indicar na sentença os motivos que lhe formaram o convencimento (Art. 130 do CPC).

Vejamos a redação do Art. 130 do CPP:

“Art. 130. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas

necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente

protelatórias.”

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1.4.5 - Princípio da causalidade ou da sequencialidade

Qualquer ato processual tem como finalidade uma sentença. Assim, há uma conexão

entre eles.

Se outros atos foram gerados em razão de um ato viciado, aqueles também estarão

contaminados pelo vício deste. Logo, ocorrendo nulidade de um, os demais que dele dependam

também serão nulos.

É, portanto, dever do juiz declarar expressamente quais são os atos contaminados. É o

que prevê o Art. 573 do CPP:

“Art. 573. Os atos, cuja nulidade não tiver sido sanada, na forma dos artigos anteriores,

serão renovados ou retificados.

§ 1º A nulidade de um ato, uma vez declarada, causará a dos atos que dele diretamente

dependam ou sejam consequência.”

§ 2º O juiz que pronunciar a nulidade declarará os atos a que ela se estende.

Portanto, pelo princípio da causalidade, a nulidade de um ato ocasionará a nulidade de

todos os demais que dele forem decorrentes ou consequentes.

1.4.6 - Princípio da conservação

Quando a nulidade é aplicada, ela deve alcançar somente o ato viciado, devendo

permanecer os atos que forem íntegros, conforme prevê o Art. 573, § 1º.

Art. 573.

(...)

§ 1º A nulidade de um ato, uma vez declarada, causará a dos atos que dele diretamente

dependam ou sejam consequência.

Alguns doutrinadores entendem que o princípio da conservação é um corolário do

princípio da causalidade. Assim, mesmo que reconhecida a nulidade de determinado ato

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irregularmente praticado, os demais atos que guardam relação de dependência ou continuação

deveram ser aproveitados, como é o caso dos atos praticados por juiz incompetente (art. 5671).

1.4.7 - Princípio do interesse

Tal princípio está previsto no Art. 5652 do CPP. Segundo dispõe o referido artigo,

somente pode arguir nulidade à parte prejudicada. A parte que deu causa não poderá alegá-la, pois

assim estaria agindo de má-fé.

Este princípio só aplica às nulidades relativas; pois, como já sabemos, sendo a nulidade

absoluta, o juiz pode declará-la de ofício.

1.4.8 - Princípio da reformatio in pejus

A reformatio in pejus consiste no agravamento da situação jurídica do réu em face de

recurso que interpôs.

O Art. 6173 do CPP veda a agravação da pena quando apenas o réu apelar da sentença

condenatória.

Art. 617. O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts.

383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando

somente o réu houver apelado da sentença.

Em se tratando de sentença penal condenatória anulada em decorrência de recurso

exclusivo da defesa, está vedado aplicar pena mais grave (reformatio in pejus indireta) que a da

decisão anulada, devendo o processo ser declarado nulo caso seja aplicada penal mais gravosa.

1 Art. 567. A incompetência do juízo anula somente os atos decisórios, devendo o processo, quando for declarada a

nulidade, ser remetido ao juiz competente.

2 Art. 565. Nenhuma das partes poderá arguir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou

referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse.

3 Art. 617. O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for

aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença.

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A título de esclarecimento, ressalta-se que, em caso do tribunal agravar a situação da

defesa quando só esta recorreu da decisão, deve-se recorrer dessa decisão por meio do Recurso

Ordinário, quando tal decisão fere lei federal.

1.5 EXTENSÃO DAS NULIDADES

Tovo (2008, p.13) esclarece que a nulidade pode ser do processo, do procedimento, de

ato processual ou de parte deste.

No primeiro caso, o vício atinge toda a atividade processual desde o início, como no

caso de suspeição ou suborno do juiz ou nas hipóteses do inciso III, do Art. 564 do CPP, In verbis:

Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:

(...)

III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:

a) a denúncia ou a queixa e a representação e, nos processos de contravenções penais, a

portaria ou o auto de prisão em flagrante;

b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto no

Art. 167;

c) a nomeação de defensor ao réu presente, que o não tiver, ou ao ausente, e de curador

ao menor de 21 anos;

d) a intervenção do Ministério Público em todos os termos da ação por ele intentada e nos

da intentada pela parte ofendida, quando se tratar de crime de ação pública;

e) a citação do réu para ver-se processar, o seu interrogatório, quando presente, e os

prazos concedidos à acusação e à defesa;

f) a sentença de pronúncia, o libelo e a entrega da respectiva cópia, com o rol de

testemunhas, nos processos perante o Tribunal do Júri;

g) a intimação do réu para a sessão de julgamento, pelo Tribunal do Júri, quando a lei

não permitir o julgamento à revelia;

h) a intimação das testemunhas arroladas no libelo e na contrariedade, nos termos

estabelecidos pela lei;

i) a presença pelo menos de 15 jurados para a constituição do júri;

j) o sorteio dos jurados do conselho de sentença em número legal e sua

incomunicabilidade;

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k) os quesitos e as respectivas respostas;

l) a acusação e a defesa, na sessão de julgamento;

m) a sentença;

n) o recurso de oficio, nos casos em que a lei o tenha estabelecido;

o) a intimação, nas condições estabelecidas pela lei, para ciência de sentenças e

despachos de que caiba recurso;

p) no Supremo Tribunal Federal e nos Tribunais de Apelação, o quórum legal para o

julgamento;

IV - por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato.

Já no caso de nulidade do procedimento, tal ocorre quando o vício atinge apenas a parte

da atividade processual.

Quanto à nulidade de ato ou de parte deste, ocorre a nulidade quando o vício não

contamina os demais atos.

1.6. TIPOS DE NULIDADES

As nulidades são divididas pela doutrina em absolutas e relativas.

1.6.1 - Nulidade absoluta

Neste tipo de nulidade temos um dano evidente, cujo vício atinge o próprio interesse

público, não havendo, portanto, necessidade de demonstração do prejuízo, devendo ser declarada de

ofício pelo juiz.

Por se tratar de nulidade absoluta, o ato não poderá ser sanado, não sendo possível sua

convalidação, devendo ser renovado por inteiro.

Tais nulidades estão previstas no Art. 564, I, II e III, ‗a‘, ‗b‘, ‗c‘, 'e' (1ª parte), e ‗f‘, as

quais são as seguintes:

Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:

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I - por incompetência, suspeição ou suborno do juiz;

II - por ilegitimidade de parte;

III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:

a) a denúncia ou a queixa e a representação e, nos processos de contravenções penais, a

portaria ou o auto de prisão em flagrante;

b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto no

Art. 167;

c) a nomeação de defensor ao réu presente, que o não tiver, ou ao ausente, e de curador

ao menor de 21 anos;

(...)

e) a citação do réu para ver-se processar, o seu interrogatório, quando presente, e os

prazos concedidos à acusação e à defesa;

f) a sentença de pronúncia, o libelo e a entrega da respectiva cópia, com o rol de

testemunhas, nos processos perante o Tribunal do Júri;

1.6.2 - Nulidade relativa

Trata-se da espécie de nulidade que confronta com o texto de norma infraconstitucional,

devendo as partes demonstrar o prejuízo (Art. 563). Por não ser reconhecida de ofício, admite

convalescimento. Tais hipóteses estão previstas nos Arts. 572 e 568, 569 e 570 do CPP, In verbis:

Art. 568. A nulidade por ilegitimidade do representante da parte poderá ser a todo tempo

sanada, mediante ratificação dos atos processuais.

Art. 569. As omissões da denúncia ou da queixa, da representação, ou, nos processos das

contravenções penais, da portaria ou do auto de prisão em flagrante, poderão ser supridas

a todo o tempo, antes da sentença final.

Art. 570. A falta ou a nulidade da citação, da intimação ou notificação estará sanada,

desde que o interessado compareça, antes de o ato consumar-se, embora declare que o faz

para o único fim de argui-la. O juiz ordenará, todavia, a suspensão ou o adiamento do

ato, quando reconhecer que a irregularidade poderá prejudicar direito da parte.

Art. 572. As nulidades previstas no art. 564, Ill, „d‟ e „e‟, segunda parte, „g‟ e „h‟, e IV,

considerar-se-ão sanadas:

I - se não forem arguidas, em tempo oportuno, de acordo com o disposto no artigo

anterior;

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II - se, praticado por outra forma, o ato tiver atingido o seu fim;

III - se a parte, ainda que tacitamente, tiver aceito os seus efeitos.

Nos termos do Art. 565 do CPP, temos os seguintes tipos de nulidades relativas:

a) a falta de intervenção do Ministério Público em todos os termos da ação por ele

intentada e nas ações intentadas pela parte ofendida, quando se tratar de crime de

ação pública (Art. 564, III, d);

b) a não concessão dos prazos legais à acusação ou à defesa, para manifestação ou

produção de algum ato (Art. 564, III, alínea ‗e‘, 2ª parte);

c) a falta de intimação do réu para a sessão de julgamento pelo Tribunal do Júri, quando

a lei não permitir o julgamento à revelia (Art. 564, III, g).

d) a ausência de intimação das testemunhas arroladas na fase do Art. 422 (Art. 564, III,

h).

e) a omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato (Art. 564, IV).

1.6.2.1 Características das nulidades relativas

As nulidades relativas apresentam duas características fundamentais:

a) Necessidade de demonstração do prejuízo

Diferentemente da nulidade absoluta em que o prejuízo é presumido, para que seja

reconhecida a nulidade relativa o prejuízo exige sua demonstração.

O Art. 563 do Códex Processual determina que ―nenhum ato será declarado nulo, se da

nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa‖.

Logo, se o ato não causa prejuízo, este será plenamente válido. Todavia, havendo

prejuízo, a parte deve demonstrá-lo.

b) Momento de arguição

A nulidade relativa deve ser arguida no momento oportuno, sob pena de preclusão.

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Nos termos do art. 571 do CPP, as nulidades devem ser arguidas nos seguintes

momentos:

Art. 571. ...

I - as da instrução criminal dos processos da competência do júri, nos prazos a que se

refere o art. 406;

II - as da instrução criminal dos processos de competência do juiz singular e dos processos

especiais, salvo os dos Capítulos V e Vll do Título II do Livro II, nos prazos a que se refere

o art. 500;

III - as do processo sumário, no prazo a que se refere o art. 537, ou, se verificadas depois

desse prazo, logo depois de aberta a audiência e apregoadas as partes;

IV - as do processo regulado no Capítulo VII do Título II do Livro II, logo depois de aberta

a audiência;

V - as ocorridas posteriormente à pronúncia, logo depois de anunciado o julgamento e

apregoadas as partes (art. 447);

VI - as de instrução criminal dos processos de competência do Supremo Tribunal Federal e

dos Tribunais de Apelação, nos prazos a que se refere o art. 500;

VII - se verificadas após a decisão da primeira instância, nas razões de recurso ou logo

depois de anunciado o julgamento do recurso e apregoadas as partes;

VIII - as do julgamento em plenário, em audiência ou em sessão do tribunal, logo depois de

ocorrerem.

1.6.3 – Diferenças entre nulidade absoluta de nulidade relativa

Paulo Rangel (2009, p. 794), ao apresentar a diferencia nulidade absoluta de nulidade

relativa, expõe:

“a) Nulidade absoluta. Pode ser decretada de ofício, independente de manifestação das

partes. Não convalesce. Para a doutrina majoritária, não necessita demonstrar prejuízo

(discordamos). Não se aplicam a ela os princípios do interesse e do prejuízo. Pode ser

invocada em qualquer tempo e grau de jurisdição. Se houver sentença condenatória, não é

acobertada pela coisa julgada, pois pode ser objeto de revisão criminal ou de habeas

corpus. Entretanto, se houver sentença absolutória e não for alegada em grau de recurso,

ficará acobertada pela coisa julgada, pois não há revisão pro societate.

b) Nulidade relativa. A parte a quem interessa a nulidade pode abrir mão da formalidade

estabelecida em lei. Somente se decreta a nulidade se houver prejuízo. Não arguida no

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momento oportuno, haverá a preclusão, portanto, há prazo para ser declarada. Se houver

sentença (condenatória ou absolutória) e a nulidade não houver sido alegada pela parte

interessada, ficará acobertada pela coisa julgada. Há convalescimento (art. 572). O

princípio do interesse somente se aplica à nulidade relativa.”

De maneira sintética, pode-se dizer que na nulidade absoluta há violação do interesse

público; que o prejuízo é presumido por lei; que pode ser reconhecida a qualquer tempo, inclusive

de ofício e não se convalida.

Já na nulidade relativa há violação de interesse das partes, exigindo-se a demonstração

do prejuízo; se não alegada no momento oportuno, é convalidada automaticamente e somente pode

ser reconhecida mediante provocação das partes.

1.7 NULIDADES SANÁVEIS E NÃO SANÁVEIS

Nulidades não sanáveis são as previstas no Art. 564, I, II e III, a, b, c, e (1ª parte), f, i, j,

k, l, m, n, o e p. Nesse tipo de nulidade não há preclusão e podem ser arguidas a qualquer tempo,

mesmo havendo sentença transitada em julgado, obedecidas as regras dos Art. 565 a 569, que

tratam de casos especiais.

Vejamos os dispositivos citados:

Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a

acusação ou para a defesa.

Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:

I - por incompetência, suspeição ou suborno do juiz;

II - por ilegitimidade de parte;

III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:

a) a denúncia ou a queixa e a representação e, nos processos de contravenções penais, a

portaria ou o auto de prisão em flagrante;

b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto no

Art. 167;

c) a nomeação de defensor ao réu presente, que o não tiver, ou ao ausente, e de curador

ao menor de 21 anos;

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e) a citação do réu para ver-se processar, o seu interrogatório, quando presente, e os

prazos concedidos à acusação e à defesa;

f) a sentença de pronúncia, o libelo e a entrega da respectiva cópia, com o rol de

testemunhas, nos processos perante o Tribunal do Júri;

i) a presença pelo menos de 15 jurados para a constituição do júri;

j) o sorteio dos jurados do conselho de sentença em número legal e sua

incomunicabilidade;

k) os quesitos e as respectivas respostas;

l) a acusação e a defesa, na sessão de julgamento;

m) a sentença;

n) o recurso de oficio, nos casos em que a lei o tenha estabelecido;

o) a intimação, nas condições estabelecidas pela lei, para ciência de sentenças e

despachos de que caiba recurso;

p) no Supremo Tribunal Federal e nos Tribunais de Apelação, o quórum legal para o

julgamento;

Art. 565. Nenhuma das partes poderá arguir nulidade a que haja dado causa, ou para que

tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária

interesse.

Art. 566. Não será declarada a nulidade de ato processual que não houver influído na

apuração da verdade substancial ou na decisão da causa.

Art. 567. A incompetência do juízo anula somente os atos decisórios, devendo o processo,

quando for declarada a nulidade, ser remetido ao juiz competente.

Art. 568. A nulidade por ilegitimidade do representante da parte poderá ser a todo tempo

sanada, mediante ratificação dos atos processuais.

Art. 569. As omissões da denúncia ou da queixa, da representação, ou, nos processos das

contravenções penais, da portaria ou do auto de prisão em flagrante, poderão ser supridas

a todo o tempo, antes da sentença final.

Já o art. 572 do CPP apresenta as espécies de nulidades que podem ser sanadas, ou seja,

serão consideradas relativas. Vejamos então:

Art. 572. As nulidades previstas no art. 564, Ill, d e e, segunda parte, g e h, e IV,

considerar-se-ão sanadas:

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I - se não forem arguidas, em tempo oportuno, de acordo com o disposto no artigo

anterior;

II - se, praticado por outra forma, o ato tiver atingido o seu fim;

III - se a parte, ainda que tacitamente, tiver aceito os seus efeitos.

Assim, são sanáveis as nulidades 1) previstas nos Art. 564, III, e (1ª parte), d e e (2ª

parte), g, h e as do inciso IV conforme prevê o Art. 570 do CPP; 2) a prevista no Art. 568; 3) as

previstas no Art. 569 do CPP.

Tomemos como exemplo o Art. 570, que preceitua que se a parte ainda não foi intimada

da sentença, mas de alguma forma tiver ciência do fato e apresenta recurso, estará sanada a falha.

Deste modo, só será declarada a nulidade se o ato não puder ser aproveitado.

1.8 ATOS DEFEITUOSOS

Para se evitar que todo um processo possa ser declarado nulo, o Código de Processo

Penal, no Art. 5734, § 1º, previu que ―a nulidade de um ato, uma vez declarada, causará a nulidade

dos atos subsequentes que daquele tiveram dependência”, ou seja, se um ato inicial está eivado de

vícios, os atos subsequentes também estarão contaminados, isso porque todos os atos processuais

são entrelaçados entre si. Logo, se um ato é nulo, os demais que dele dependam também o serão.

Trata-se do principio da contaminação como já foi exposto. Caso o ato não seja refeito, o processo

dever ser declarado nulo.

Acerca do assunto, a lição de ARES (online)///:

“Ocorrendo a nulidade absoluta ou a nulidade relativa que não veio a ser sanada, índice

em “error in procedendo” e, por conseguinte, o magistrado estará impedido de julgar o

mérito da causa, determinando, outrossim, que ato seja novamente praticado ou corrigido,

conforme determina o artigo 573 do Código de Processo Penal.”5

4 Art. 573. Os atos, cuja nulidade não tiver sido sanada, na forma dos artigos anteriores, serão renovados ou retificados.

§ 1º A nulidade de um ato, uma vez declarada, causará a dos atos que dele diretamente dependam ou sejam

consequência.

§ 2º O juiz que pronunciar a nulidade declarará os atos a que ela se estende. 5 ARES, Regis Cardoso. A nulidade absoluta no processo penal. http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=1084

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Entende MIRABETE (2009, p. 628) que o aperfeiçoamento do ato viciado pode ser por

renovação, sendo realizado novamente; ou por retificação, sendo alterado, ou completado de acordo

com os preceitos legais violados.

1.9 CONVALIDAÇÃO DAS NULIDADES

Convalidação significa admitir que o ato defeituoso seja integrado aos atos não

viciados, tornando-o, assim, válido como os demais.

Nucci (2013, p. 844) entende que a existência de vício que cause uma nulidade relativa,

havendo a possibilidade do vício ser sanado ou superado pela falta de pedido da parte interessada, a

nulidade se convalida.

1.10 DECLARAÇÃO DE NULIDADES PELO JUIZ

Nos termos do Art. 251 do CPP, o magistrado tem o dever de resguardar a regularidade

do processo, podendo dispor de todos os meio possíveis para que este atinja seu fim. Isto significa

dizer que o juiz pode proclamar a nulidade de um ato a qualquer tempo.

Vejamos a redação do dispositivo supracitado:

Art. 251. Ao juiz incumbirá prover à regularidade do processo e manter a ordem no

curso dos respectivos atos, podendo, para tal fim, requisitar a força pública.

A esse respeito, Tourinho Filho (2009, p.369), com maestria que lhe é peculiar, leciona

que:

“O Juiz, a qualquer momento, pode proclamar a nulidade, mesmo porque, nos termos do

art. 251 do CPP, cabe-lhe prover à regularização do processo. Quanto à defesa, é preciso

fazer-se uma distinção: em se tratando de nulidade absoluta, nada impede possa ser ela

arguida mesmo após o trânsito em julgado da sentença, se condenatória for, seja através

de revisão, seja por meio de habeas corpus. Tratando-se de nulidade atinente a ato não

essencial, deverá ser ela arguida na primeira oportunidade a que se refere o art. 571.

Respeitante à acusação, as nulidades devem ser arguidas na mesma oportunidade. Após o

trânsito em julgado de sentença absolutória, não, mesmo porque estaria havendo, por via

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oblíqua, revisão pro societate, o que não se admite. Mesmo após a fase do art. 571, se a

parte arguir a nulidade, nada impede que o Juiz a acolha, nos termos do art. 251. É como

se ele próprio houvesse detectado”.

Frisa-se que na hipótese da nulidade a ser arguida pela defesa, tratando-se de nulidade

absoluta, essa pode ser arguida até mesmo após a sentença condenatória transitada em julgado, por

meio de revisão criminal ou habeas corpus.

Todavia, se a nulidade for relativa, deve ser arguida tanto pela defesa como pela a

acusação, conforme previsão legal do Art. 571 do CPP, como bem já explanou o Tourinho

Filho(2009, p.369).

Sobre o assunto, o STF se manifestou nos seguintes termos:

No processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o

anulará se houver prova de prejuízo para o réu" (Súmula 523 do STF). AUTO DE EXAME

DE CONJUNÇÃO CARNAL. LAUDO SUBSCRITO POR UM PERITO. PERÍCIA

REALIZADA POR OCASIÃO DA COMUNICAÇÃO AO JUIZ DA PRISÃO EM

FLAGRANTE. REMESSA POSTERIOR DO RESPECTIVO AUTO, ACOMPANHADO DO

LAUDO ASSINADO POR DOIS EXPERTOS. PROVA VÁLIDA. Não há ilegalidade no fato

do laudo resultante do exame de conjunção carnal ter sido subscrito por apenas um perito

na oportunidade da comunicação ao juiz da prisão em flagrante se, posteriormente, o

respectivo auto se fizer acompanhar do assinado por dois expertos. REVISÃO CRIMINAL.

ESTUPRO. DECISÃO CONTRÁRIA À EVIDÊNCIA DOS AUTOS. REEXAME DA PROVA.

INVIABILIDADE. SENTENÇA CONDENATÓRIA ALICERÇADA NAS PROVAS DO

PROCESSO. PEDIDO INDEFERIDO. "O juízo revisional não comporta nova avaliação

da prova, devendo o tribunal limitar-se a verificar se a condenação tem base em algum dos

elementos probatórios ou se é divorciado de todos eles" (RT 624/348-9).

1.11 NULIDADES EM FACE DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

Além das hipóteses de nulidades prevista no art. 564 do CPP, outros podem ocorrer

caso sejam violadas normas ou princípios constitucionais. Assim, se um ato praticado violar

dispositivos da Constituição, tal ato deve ser imediatamente declarado nulo em decorrência de sua

inconstitucionalidade.

Machado (2013, p.564) apresenta como exemplos de atos processuais contrários à

Constituição Federal a falta de fundamentação da sentença (art. 93, IX); a falta de publicidade dos

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atos processuais (art. 5º, LX); o processo perante o juiz ou tribunal de exceção (art. 5º, XXXVII); a

ausência de contraditório e ampla defesa no processo penal (art. 5º , LV); e a utilização de provas

ilícitas (art. 5º, LVI).

1.12 O INQUÉRITO POLICIAL

Por possuir conteúdo apenas informativo, o inquérito policial não é peça obrigatória

para que o Ministério Público possa se valer para o oferecimento de denúncia ou queixa, desde que

demonstrada a verossimilhança da acusação ele(inquérito) pode ser dispensado.

Neste sentido é o entendimento do STF, que enuncia:

"O inquérito policial não é imprescindível ao oferecimento de denúncia ou queixa, desde

que a peça acusatória tenha fundamento em dados de informação suficiente à

caracterização da materialidade e autoria da infração penal (STF, RTF 76/741; TRF 3ª

Reg., HC 98.03.010696, 1ª Turma, Rel. des. Fed. Roberto Haddad, RT 768/719)". (p. 08).

A corte maior do país (STF) tem entendido não ser possível o trancamento da ação

penal pelo fato do inquérito policial está eivado de vícios. Vejamos seu entendimento:

"PENAL. HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. CONDUÇÃO SOB A

INFLUÊNCIA DE ÁLCOOL (ART. 306, CBT). PROVA MATERIAL.

PRESCINDIBILIDADE DE TESTE OU EXAME PERICIAL. ART. 158 DO CPP.

DISCUSSÃO SOBRE A NATUREZA DA INFRAÇÃO. EXAME DE PROVA.

IMPOSSIBILIDADE. INDEPENDÊNCIAS DAS INSTÂNCIAS ADMINISTRATIVA E

PENAL.

I - Afigura-se insuscetível de análise na célere via do writ a alegação de nulidade de prova

relativa ao teste de dosagem alcoólica (teste do bafômetro), haja vista que a mesma

reclama o revolvimento de questões fático-probatórias não demonstradas, de plano, na

impetração.

II - Havendo outros elementos probatórios, de regra, lícitos, legítimos e adequados para

demonstrar a verdade judicialmente válida dos fatos, não há razão para desconsiderá-los

sob o pretexto de que o art. 158 do CPP admite, para fins de comprovação da conduta

delitiva, apenas e tão-somente, o respectivo exame pericial.

III - Existindo nos autos elementos que evidenciem, a princípio, a perpetração da

infração delineada no art. 306 do CPP, não há como trancar a ação penal, sob a

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argumentação de atipicidade do delito, sem o necessário cotejo analítico do material

cognitivo.

IV - A propositura de ação penal não se vincula, na espécie, à decisão proferida na esfera

administrativa, haja vista a independência das instâncias.

Writ denegado. " (STJ, RHC 13.215/SC, 5.ª Turma, Rel. Min. FELIX FISCHER, DJ de

26/05/2003.) (Destaque nosso)

No mesmo sentido é o que já tem decido o STJ:

PROCESSUAL PENAL. HABEAS-CORPUS. CRIME DE LESÕES CORPORAIS.

TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. IMPRESTABILIDADE DO RECONHECIMENTO

FEITO EM SEDE INQUISITORIAL. INVOCADA NULIDADE QUE NÃO ALCANÇA A

FASE JUDICIAL.

É entendimento dominante neste Superior Tribunal de Justiça que eventual nulidade do

inquérito policial não contamina a ação penal superveniente, vez que aquele é mera peça

informativa, produzida sem o crivo do contraditório.

Inviável o trancamento da ação penal sob a alegação de que o reconhecimento feito pela

Autoridade Policial, na fase do inquérito policial, estaria eivado de vício a ponto de

nulificar o processo ab initio, de vez que tal providência ensejaria dilação probatória,

incompatível na via estreita do writ. - Recurso ordinário desprovido. (STJ, RHC 13691 SP

2002/0156195-6, 6ª turma, Rel. Ministro Vicente Leal, DJ 17.03.2003 p. 288)

Assim, caso ocorra algum vício na fase de inquérito, a ação penal não estará

contaminada.

Corroborando com esse entendimento, CAPEZ (2011, p.71) argumenta que

"Não sendo o inquérito policial ato de manifestação do Poder Jurisdicional, mas mero

procedimento informativo destinado à formação da “opinio delicti” do titular da ação

penal, os vícios por acaso existentes nessa fase não acarretam nulidades processuais, isto

é, não tingem a fase seguinte da persecução penal: a da ação penal. A irregularidade

poderá, entretanto, gerar a invalidade e a ineficácia do ato inquinado, v.g., do auto de

prisão em flagrante como peça coercitiva; do reconhecimento pessoal, da busca e

apreensão etc". (grifo nosso)

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NAGIMA (online), ao explanar sobre o assunto, tem o seguinte entendimento:

“Note-se, ainda que qualquer vício existente no procedimento administrativo policial não

conduzirá em viciado o processo criminal existente, pois, ao contrário da teoria dos frutos

da árvore envenenada, o inquérito policial é meramente peça informativa, que dá ao

"parquet" notícias sobre os indícios de materialidade e de autoria, para que, então, possa

promover a respectiva ação penal”.

Portando, em sede inquisitória eventual vício do inquérito policial não contamina a ação

e consequentemente não gera nulidade.

1.13 NULIDADES EM ESPÉCIEIS

As hipóteses de nulidades estão previstas no ordenamento jurídico brasileiro nos artigos

563 a 573 do Código de Processo. Sendo que o Art. 564 apresenta um rol exemplificativo de

nulidade absolutas e relativas, podendo ocorrer outras por inobservância de princípios gerais do

direito ou de normas e princípios constitucionais, como bem frisa Machado (2013, p.554).

Dispõe o art. 564 do CPP:

“A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:

I - por incompetência, suspeição ou suborno do juiz;

II - por ilegitimidade de parte;

III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:

a) a denúncia ou a queixa e a representação e, nos processos de contravenções penais, a

portaria ou o auto de prisão em flagrante;

b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto no

Art. 167;

c) a nomeação de defensor ao réu presente, que o não tiver, ou ao ausente, e de curador ao

menor de 21 anos;

d) a intervenção do Ministério Público em todos os termos da ação por ele intentada e nos

da intentada pela parte ofendida, quando se tratar de crime de ação pública;

e) a citação do réu para ver-se processar, o seu interrogatório, quando presente, e os

prazos concedidos à acusação e à defesa;

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f) a sentença de pronúncia, o libelo e a entrega da respectiva cópia, com o rol de

testemunhas, nos processos perante o Tribunal do Júri;

g) a intimação do réu para a sessão de julgamento, pelo Tribunal do Júri, quando a lei não

permitir o julgamento à revelia;

h) a intimação das testemunhas arroladas no libelo e na contrariedade, nos termos

estabelecidos pela lei;

i) a presença pelo menos de 15 jurados para a constituição do júri;

j) o sorteio dos jurados do conselho de sentença em número legal e sua

incomunicabilidade;

k) os quesitos e as respectivas respostas;

l) a acusação e a defesa, na sessão de julgamento;

m) a sentença;

n) o recurso de oficio, nos casos em que a lei o tenha estabelecido;

o) a intimação, nas condições estabelecidas pela lei, para ciência de sentenças e despachos

de que caiba recurso;

p) no Supremo Tribunal Federal e nos Tribunais de Apelação, o quorum legal para o

julgamento;

IV - por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato.

Parágrafo único. Ocorrerá ainda a nulidade, por deficiência dos quesitos ou das suas

respostas, e contradição entre estas. (Grifamos)

Neste trabalho restringirmo-nos a analisar apenas o inciso III, letra ―b‖ do citado Art.

564 do CPP. É o que será abordado no próximo capítulo.

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CAPÍTULO 2

2 EXAME DE CORPO DE DELITO

2.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS

Feitas as considerações preliminares sobre o instituto das nulidades, com o fito de

lançar o alicerce da presente monografia, também é mister que se analise o instituto do ―exame de

corpo de delito‖, que será o ponto de partida para a delimitação do nosso tema.

A prova pericial tem fundamental importância para análise e construção dos fatos que

constituem o processo. O exame de corpo de delito, como uma das modalidades de provas previsto

no Título VII do Código de Processo Penal, tem uma importância significativa, pois se trata de meio

de prova indispensável nas infrações que deixam vestígios, conforme prevê o Art. 158 do CPP:

“Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de

delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.”

Na impossibilidade da realização da perícia de forma direta, por haverem desaparecido

os vestígios, o CPP possibilitou que essa possa ser feita de forma indireta ou substituída pela prova

testemunhal, conforme o Art. 167 do CPP:

“Art. 167. Não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os

vestígios, a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta.”

Entretanto, pode ocorrer que nenhuma testemunha tenha presenciado o fato e os

vestígios desaparecidos. Assim, obrigatoriamente há de ser realizada a perícia, sob pena de nulidade

do processo ou mesmo absolvição do acusado por falta de provas, como veremos mais adiante.

Como a regra é que seja realizado o exame de corpo de delito, se por algum motivo não

for possível sua realização e também não houve prova testemunhal, caso a infração praticada não

seja crime contra a dignidade sexual – já que nestes crimes a palavra da vítima é suficiente – a

defesa deverá requerer a absolvição do acusado por falta de provas nos temos do Art. 386, II ou VII,

do CPP.

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2.2 CONCEITO DO EXAME DE CORPO DE DELITO

Antes de apresentarmos o conceito de exame de corpo de delito, frisa-se que corpo de

delito não se referente ao corpo da vítima, mas ao conjunto de todos os vestígios materiais

diretamente relacionados com o fato criminoso, como, por exemplo, o próprio corpo da vítima, as

lesões, a arma do crime, projéteis, marcas de sangue, pegadas, objetos diversos etc.

Já o exame no corpo de delito é uma espécie de perícia que incorre sobre os objetos

ligados ao delito ou ao local em que esse ocorreu.

Lima (2013, p.627) explanando sobre o assunto leciona

“A palavra corpo não significa necessariamente o corpo de uma pessoa. Significa sim o

conjunto de vestígios sensíveis que o delito deixa para trás, estando seu conceito ligado à

própria materialidade do crime. Exemplificado, suponha-se que haja um delito de

latrocínio no interior de um apartamento. Nessa hipótese, o corpo de delito não se resume

ao cadáver, abrangendo também todos os vestígios perceptíveis pelos sentidos humanos,

tais como eventuais marcas de sangue deixadas no chão, a arma de fogo utilizada para a

prática do delito, eventuais sinais de arrombamento da porta do apartamento etc.”

(grifamos)

Ainda sobre o assunto, de suma importância mencionar MIRABETE (2007, p.265),

“Corpo de delito é um conjunto de vestígios materiais deixados pela infração penal, a

materialidade do crime, aquilo que se vê, apalpa, sente, em suma, pode ser examinado

através dos sentidos. Há infrações que deixam vestígios materiais (delicta facti

pemanentis), como os crimes de homicídio, lesões corporais, falsificação, estupro etc. Há

outros, porém, que não os deixam (delicta facti transeuntis), como os de calúnia,

difamação, injúria e ameaças orais, violação de domicílio, desacato etc.”

2.3 OBJETIVO DO EXAME DE CORPO DE DELITO

O objetivo do corpo de delito é delimitar fatores como autoria, temporalidade, extensão

de danos etc., que são alcançados por meio da prova pericial.

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Para Mirabete (2009, p///323) “o exame destina-se à comprovação, por perícia, dos

elementos objetivos do tipo, que diz respeito, principalmente, ao evento produzido pela conduta

delituosa, ou seja, do resultado, de que depende a existência do crime”.

Portanto, a finalidade do exame de corpo de delito é comprovar a existência dos

elementos que produzem o fato criminoso.

2.3 A FORMAÇÃO DO CORPO DE DELITO

Barbosa (2011, online), citando Almeida Júnior, esclarece que a questão da prova está

diretamente ligada à formação do corpo de delito.

O autor citado ainda explana que a formação do corpo de delito seria a observação e a

recomposição dos vestígios ou elementos percebidos pelos sentidos que, dispostos e conjuntos,

constituem o fato criminoso e o dano causado.

Conforme previsão do Art. 6º, VII, do CPP, a formação do corpo de delito é tarefa da

autoridade policial, que o deve realizá-lo de forma imediata, objetivando lograr, ao menos por

indícios veementes, a autoria da infração. Vejamos, pois, a redação do citado artigo:

Art. 6º Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial

deverá:

VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer

outras perícias;

2.4 PREVISÃO LEGAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

O exame de corpo de delito está previsto no ordenamento jurídico brasileiro no capítulo

II, do Título VII, do Código de Processo Penal Brasileiro, mais precisamente nos artigos 158 a 184.

Estabeleceu o legislador no Art. 158 do CPP que ―Quando a infração deixar vestígios,

será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão

do acusado.”

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Posto que a regra nas provas seja a busca da verdade real, o legislador estabeleceu uma

exceção ao princípio da liberdade probatória e do livre convencimento do juiz ao exigir a

obrigatoriedade da realização do exame de corpo de delito nas infrações não transeuntes.

Embora a confissão do acusado (Art. 158 do CPP) não possa suprir a ausência do exame

pericial, por terem desaparecido os vestígios, previu ainda o legislador no Art. 167 do CPP que

“Não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova

testemunhal poderá suprir-lhe a falta.”

A ideia do legislador ao admitir a prova testemunhal para suprir o exame de corpo de

delito, quando desaparecidos os vestígios, não foi desprezar a prova pericial, mas possibilitar a

produção de outros meios de provas quando não for mais possível a realização do exame pericial.

O STF tem entendido em suas decisões que nos delitos materiais de conduta e resultado,

desde que desaparecidos os vestígios, a prova testemunhal pode suprir o exame de corpo de delito

direto. Nesse sentido é o HC 69.302:

"PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. ART. 334, CAPUT, C/C O

ART. 29 E ART. 318 DO CÓDIGO PENAL. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. VIOLAÇÃO

AO ARTS. 158 E 564, B DO CPP. VIOLAÇÃO AO ART. 334 DO CÓDIGO PENAL.

ILEGITIMIDADE DO PARQUET PARA PROCEDER INVESTIGAÇÕES.

IMPOSSIBILIDADE DO MEMBRO DO PARQUET QUE ACOMPANHOU AS

INVESTIGAÇÕES OFERECER A DENÚNCIA. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 252 E 258 DO

CPP. VIOLAÇÃO AO ART. 319 DO CP.

...

III - O exame de corpo de delito direto pode ser suprido, quando desaparecidos os

vestígios sensíveis da infração penal, por outros elementos de caráter probatório existentes

nos autos, notadamente os de natureza testemunhal ou documental. (Precedentes desta

Corte e do Pretório Excelso).

(ECrim 85.089, DJU 19.11.76, p. 10033; HC 69.302, RTJ 143/921 e HC 72.283 , RTJ

160/938).

Entretanto, na eventual possibilidade da prova testemunhal vir a substituir a prova

pericial, a testemunha deve ter presenciado o crime ou ao menos percebido o vestígio deixado.

Contudo, observa-se que só será aplicado o disposto no Art. 167 do CPP nos casos em

que não for possível a realização da perícia ao tempo do descobrimento do crime; isso porque, após

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certo período de tempo, os vestígios desaparecem e, neste caso, o único meio de se provar a

materialidade da infração será através de depoimento testemunhal.

2.5 NECESSIDADE DE PERITO OFICIAL

O laudo pericial é prova de significativa importância para formação da convicção do

juiz; o exame, por isso, deverá ser realizado por perito oficial conforme prevê o Caput do Art. 159

do CPP: “exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito oficial, portador

de diploma de curso superior”.

Na impossibilidade da realização de referido exame por perito oficial, o legislador

condicionou que o mesmo possa ser realizado por dois profissionais com formação superior, de

preferência na área específica, conforme § 1º do art. 159, que dispõe:

“na falta de perito oficial, o exame será realizado por 2 (duas) pessoas idôneas,

portadoras de diploma de curso superior preferencialmente na área específica, dentre as

que tiverem habilitação técnica relacionada com a natureza do exame”.

No que se refere à hipótese do § 1º do art. 159, TOURINHO FILHO (2010, p.564) cita

como exemplo o ―Município ou Comarca onde não há peritos oficiais‖. Neste caso, a realização da

perícia deve ocorrer nos termos do citado parágrafo, sob pena de nulidade do processo.

2.6 MOMENTO PARA A REALIZAÇÃO DO EXAME DE CORPO DE DELITO

Sempre que haja obrigatoriedade da realização do exame, ele deverá ser realizado em

qualquer dia, a qualquer hora e em qualquer local, ou seja, pode ser realizado em domingos ou

feriados e durante o dia ou à noite. É o que comanda o CPP, em seu Art. 161:

Art. 161. O exame de corpo de delito poderá ser feito em qualquer dia e a qualquer hora.

Deste modo, havendo obrigatoriedade da realização da perícia, ela deverá ser feita

imediatamente, independentemente do horário, dia ou local onde ocorreu a infração.

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Na impossibilidade de sua realização por algum motivo, por exemplo, obstrução, o

perito deverá imediatamente comunicar à autoridade policial para que adote as medidas cabíveis.

2.7 AS PROVAS INADMISSÍVEIS NO EXAME DE CORPO DE DELITO

Estabelece o Art. 5º, LVI, da Constituição Federal, que ―são inadmissíveis, no processo,

as provas obtidas por meios ilícitos‖, devendo ser desentranhadas do processo as obtidas em

violação a normas constitucionais ou legais conforme dispõe o Art. 157 do CPP:

Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas,

assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. (Redação

dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

§ 1º São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não

evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem

ser obtidas por uma fonte independente das primeiras. (Incluído pela Lei nº 11.690, de

2008)

Neste sentido é o entendimento do STJ:

O corpo de delito, na clássica definição de João Mendes, é o conjunto de elementos

sensíveis do fato criminoso. (...) A Constituição da República resguarda serem admitidas

as provas que não forem proibidas por lei. Restou, assim, afetada a cláusula final do art.

158 do CPP, ou seja, a confissão não ser idônea para concorrer para o exame de corpo de

delito. No processo moderno, não há hierarquia de provas, nem provas específicas para

determinado caso. Tudo que lícito for, idôneo será para projetar a verdade real.6

Portanto, em sede constitucional, apenas as provas ilícitas devem ser desprezadas,

restando certo que toda prova produzida licitamente pode influenciar para formar o convencimento

do Juiz.

6 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, habeas corpus nº 1.394/RN, 6a Turma, Relator: Ministro Luiz Vicente

Cernicchiaro, julgamento em 08/02/1993. Disponível na internet, no sítio www.stj.gov.br, Art. 158. Quando a

infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a

confissão do acusado. Acessado em 23/07/3013.

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Assim, caso o processo tenha se originado em provas ilícitas, estará caracterizada a

contaminação de todo o ato processual, surgindo o que a doutrina denomina de teoria da arvore do

fruto contaminado, devendo o processo ser declarado nulo ―ab initio‖.

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CAPÍTULO 3

3 NULIDADE POR AUSÊNCIA DO EXAME DE CORPO DE DELITO NOS

CRIMES QUE DEIXAM VESTÍGIOS

3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Já vimos que no direito processual penal ocorrendo um delito não transeunte, ou seja,

que deixa vestígio, há necessariamente a obrigatoriedade da realização da perícia, caso não seja

suprida pela prova testemunhal (Art. 167 do CPP), sob pena de nulidade do ato ou mesmo de todo o

processo (Art. 654 do CPP).

Vimos também que a perícia, para ser realizada, deve obedecer aos parâmetros legais

estabelecidos pelo ordenamento jurídico.

Ocorre que há certas situações em que não mais é possível a realização da perícia, ou

por terem desaparecidos os vestígios, ou mesmo não haver prova testemunhal. Ocorrendo tais

hipóteses haverá nulidade, que deverá ser arguida pela defesa.

Mas antes de adentrarmos no contexto de nosso tema, vamos entender o que é vestígio e

quais delitos deixam vestígios.

3.2 CONCEITO DE VESTÍGIO

Já apresentamos o conceito de ―exame no corpo de delito‖, expondo que se trata de uma

espécie de perícia que incorre sobre os objetos ligados ao delito ou ao local em que esse ocorreu.

Assim, como também explanamos que ―corpo de delito‖ difere de ―exame de corpo de delito‖, pois

aquele ―não se refere ao corpo da vítima, mas ao conjunto de todos os vestígios materiais

diretamente relacionados com o fato criminoso‖.

Mas o que é vestígio?

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Horcaia (Apud Novo Dicionário da Língua Portuguesa), define vestígio como ―Sinal

que homem ou animal deixa no lugar onde passa; rastro, pista; no sentido figurado, indício, pista,

sinal, (...).”

Mallmith (online///) define vestígio como todo e qualquer tipo de objeto, marcas ou sinais

sensíveis que possam, de alguma forma, ter relação com o fato investigado.

Menciona Barbosa (Apud Mendes de Almeida, 1973, p.35) que “tudo o quanto se pode

ver, ouvir, tocar, sentir em geral, atribuível ao delito, antes, na durante ou depois de sua execução,

é o seu corpo, o corpo de delito”.

3.3 CRIMES QUE DEIXAM VESTÍGIOS

Crimes que deixam vestígios são classificados pela doutrina como delitos não

transeunte ou ainda, delicta factis permanentis, como, por exemplo, o homicídio, lesão corporal,

furto qualificado pelo arrombamento etc.

O Código de Processo Penal dispõe em seu Art. 158 que ―quando a infração deixar

vestígios será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a

confissão do acusado.”

Da leitura do dispositivo acima se extrai uma indagação: existe crime que não deixa

vestígio? A resposta é ―não!‖ Em regra, conforme PEREIRA (online///), todo delito deixa vestígio,

seja vestígio material, seja imaterial.

O que vai confirmar se ficou vestígio ou não é a realização da perícia. Isto porque,

conforme frisa o autor, ―crime sem vestígio é crime inexistente‖.

Aduz ainda o citado autor que

“alguns crimes deixam vestígios obrigatoriamente aferíveis por peritos e outros deixam

vestígios em que não é necessária a aferição por peritos. Alguns deles, em face de sua

complexidade e para que não se percam, necessitam da atuação de experts. Outros são

examinados diretamente pelo juiz por outros meios de prova”.

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Conforme Santos (online), “todos os crimes materiais deixam vestígios, pois nestes

delitos existem a necessidade de um resultado externo à ação, sendo relevante o resultado material

para que os mesmos existam”.

Diferentemente de Santos, Tourinho Filho (2010, p.564) sustenta que ―há crimes que

deixam vestígios e outros que não os deixam.‖ Para este autor, os crimes que deixam vestígios são

denominados de delicta factis permanentis, sendo obrigatório o exame de corpo de deleito em tais

crimes, sem demora, pois muitas vezes os vestígios desaparecem sem que os peritos possam

examiná-los a tempo.

A obrigatoriedade da realização do exame de corpo de delito, conforme prevê o Art. 158

do CPP — o que será analisado mais adiante — deve ocorrer nos crimes materiais e, em algumas

situações, nos formais, pois tais crimes também podem deixar vestígios, sendo necessária a

realização do exame de corpo de delito. É o que ocorre, por exemplo, no homicídio, nas lesões

corporais, na falsificação de moeda e na extorsão mediante sequestro, no estupro, entre outros.

3.2.1 Crimes materiais e formais

Noronha (2009, P.107) define crimes materiais como aqueles em cujo tipo se

descrevem a ação e o resultado. Já os crimes formais, também conhecidos como de mera conduta

ou sem resultado, são, segundo o renomado jurista, ―os que não exigem a produção de um resultado

estranho ou externo à própria ação do delinquente.‖

Mirabete (2011) nos ensina que

“No crime material há a necessidade de um resultado externo à ação, descrito na lei, e

que se destaca lógica e cronologicamente da conduta. No crime formal não há necessidade

de realização daquilo que é pretendido pelo agente, e o resultado jurídico previsto no tipo

ocorre ao mesmo tempo em que se desenrola a conduta, havendo separação lógica e não

cronológica entre conduta e resultado...”.(Grifo nosso)

3.2.1.1 Crime de homicídio

Por ser um crime material, o homicídio (Art. 121 do Código Penal) exige

necessariamente um resultado externo à ação descrita na norma legal, ou seja, ―matar alguém‖.

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A conduta do crime de homicídio para que possa ser atribuída a alguém, exige-se a

confecção do indispensável exame de corpo de delito, não podendo a confissão do acusado suprir a

prova pericial, uma vez que o suspeito pode ser coagido a confessar um crime que não cometeu.

Entretanto, a prova testemunhal pode suprir a ausência do exame de corpo de delito.

Nesse sentido tem decidido o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

Senão vejamos:

"APELAÇÃO CRIME. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO CONTRA

DESCENDENTE, OCULTAÇÃO DE CADÁVER E ABANDONO DE MENOR. A

materialidade, na falta do corpo de delito, pode ser comprovada pela prova

testemunhal. Inteligência do art. 167 do Código de Processo Penal. [...]" (Apelação

Crime Nº 70013588066, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator:

Manuel José Martinez Lucas, Julgado em 29/03/2006) (grifamos)

Desse modo, se há nos autos elementos probatório que convençam o magistrado da

existência do crime, mesmo que seja prova testemunhal, cabível a decisão de pronúncia, a qual

levará o acusado a julgamento pelo Tribunal do Júri.

3.2.1.2 Crimes contra a propriedade imaterial

Quanto aos crimes contra a propriedade imaterial que deixam vestígios, como, por

exemplo, a violação de direito autoral (Art. 184 do Código Penal), o Código de Processo Penal

prevê a necessidade de realização de exame pericial dos objetos que constituam o corpo de delito,

ressaltando-se que o respectivo laudo deverá instruir a ação penal (RHC 27964/RS). Tais delitos

acarretam a reprodução do bem jurídico protegido (música, filme, texto, etc), sendo, portanto,

indispensável a realização da perícia para comprovar a contrafação.

O CPP, no art. 524 determina que “No caso de haver o crime deixado vestígio, a queixa

ou a denúncia não será recebida se não for instruída com o exame pericial dos objetos que

constituam o corpo de delito.”

Conforme leciona Mossin (2005, p.990), a denúncia ou queixa é condição específica de

procedibilidade, não podendo haver sem ela persecutio criminis in indicium.

A regra é que se o crime deixa vestígio, obrigatoriamente há de feita a perícia.

Entretanto, se o delito não deixa vestígio, o exame é dispensável (BADARÓ, 2008).

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Por conseguinte, o Art. 530-A do citado diploma processual, com redação dada pela

Lei 10.596/2003, dispõe que “O disposto nos arts. 524 a 530 será aplicável aos crimes em que se

proceda mediante queixa.” Logo, a referência à denúncia, como explica Badaró, não mais tem

aplicação.

Quanto ao prazo para oferecimento da queixa, o CPP estabeleceu o seguinte:

Art. 529. Nos crimes de ação privativa do ofendido, não será admitida queixa com

fundamento em apreensão e em perícia, se decorrido o prazo de 30 dias, após a

homologação do laudo.

Mirabete(1995, p. 546), citado por Romano (Online), entende que o prazo envolve um

instituto inominado no processo penal pátrio em que decorrido o prazo fixado na lei, deixa de existir

uma condição para o exercício de queixa.

3.2.1.3 Crimes de falsidade documental

A falsidade documental (Art. 296 a 311 do CP), desde que a adulteração ―seja idônea

‗em si mesma‟ para iludir indeterminado número de pessoas‖ (Cattani, 2012, online) também deixa

vestígios, sendo, portanto, indispensável o exame de corpo delito de forma direta, sendo obrigatória

a apresentação do documento falsificado.

Cumpre aqui fazer uma distinção entre o falso material e o falso ideológico.

No falso material a própria forma do documento é que é adulterada, sendo o aspecto

externo forjado.

Já no falso ideológico, o documento é formalmente correto, verdadeiro; porém a ideia

nele expressa o conteúdo é falso. Portanto, dispensa o exame de corpo de delito.

Exemplo de alguns crimes de falso:

Falsificação e Documento Público (Art. 297, CP)

Falsificação de Documento Particular (Art. 298, CP)

Falsidade Ideológica (Art. 299, CP)

Uso de Documento Falso (Art. 304, CP)

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3.2.1.4 Crimes de lesão corporal

O delito de lesão corporal previsto no Art. 129 do Código Penal também é um crime

material que exige exame de corpo de delito.

Sobre o assunto a Turma Recursal do TJMG se manifestou nos seguintes termos:

Lesão corporal - Crime material - Exame de corpo delito - Prova. Lesão corporal - Crime

de natureza material - Ausência de exame de corpo de delito, boletim médico ou prova

equivalente - Materialidade não demonstrada - Reforma da sentença com a absolvição do

acusado com base no artigo 386, III, do Código de Processo Penal. O crime de lesão

corporal é de natureza material e, portanto, exige para a sua comprovação prova do

exame de corpo delito. O exame de corpo delito, realmente, pode ser dispensado, nos

termos do artigo 7º, § 1º, da Lei nº 9.099/1995, mas desde que haja um boletim médico ou

prova equivalente, vale dizer, continua sendo indispensável que haja pronunciamento de

um técnico, o médico e, quando isto não for possível, pelo menos que as lesões sejam

demonstradas de forma insofismável, por meio de outras provas permitidas no direito. Não

havendo prova da materialidade do delito, impõe-se a absolvição do acusado com base no

artigo 386, III, do Código de Processo Penal. (1ª Turma Recursal de Divinópolis - Rec. nº

223.05.159166-5 - Rel. Juiz José Maria dos Reis). Boletim nº94. (Destaque nosso)

3.2.1.5 Crimes contra a liberdade sexual

Quanto aos crimes contra a liberdade sexual, necessariamente não se exige a

obrigatoriamente do exame de corpo de delito direto. Isso porque, quando praticados com violência

moral ou com violência ficta, tais delitos nem sempre deixam vestígios materiais.

É entendimento majoritário da doutrina e da jurisprudência que a palavra da vítima e a

testemunhal idônea e/ou em outros meios de prova consistentes se revelem legítimos.

O STJ, no HC 85955 RJ de 2008, adotou o seguinte entendimento:

DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. NULIDADE DA

SENTENÇA. PROVA PERICIAL. PERÍCIA INDIRETA. CRIMES CONTRA OS

COSTUMES. DENEGAÇÃO.

1. A questão de direito arguida neste habeas corpus corresponde à possível nulidade da

perícia realizada na pretensa vítima dos crimes previstos nos arts. 213 e 214, ambos

do Código Penal, a contaminar a sentença e o acórdão que concluíram no sentido da

condenação do paciente.

2. Nos crimes contra a liberdade sexual cometidos mediante grave ameaça ou com

violência presumida, não se exige, obrigatoriamente, o exame de corpo de delito direto,

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porque tais infrações penais, quando praticadas nessas circunstâncias (com violência

moral ou com violência ficta), nem sempre deixam vestígios materiais.

3. O exame de corpo de delito indireto, fundado em prova testemunhal idônea e/ou em

outros meios de prova consistentes (CPP, art. 167) revela-se legítimo, desde que, por não

mais subsistirem vestígios sensíveis do fato delituoso, não se viabilize a realização do

exame direto.

4. A despeito da perícia inicial haver sido realizada apenas por um profissional nomeado

ad hoc pela autoridade policial, atentou-se para a realização da perícia com base no

art. 167, do Código de Processo Penal, ou seja, a realização do exame de corpo de delito

indireto.

5. O juiz de direito não está adstrito às conclusões do laudo pericial, especialmente em se

referindo a juízo de constatação de fatos.

6. Os impetrantes pretendem, na realidade, que haja reavaliação dos elementos

probatórios que foram produzidos durante a instrução criminal, o que se revela

inadmissível em sede de habeas corpus, notadamente na ação de competência originária

do Supremo Tribunal Federal, eis que a ação constitucional não pode servir para

mascarar conhecimento e julgamento de pretensão que na realidade somente poderia ser

deduzida via recurso extraordinário.

7. Habeas corpus denegado.

Entretanto, nos casos em que for possível a realização da pericia, a sua falta implicará

na nulidade de todas as provas produzidas em sua substituição, embora a jurisprudência do STJ e

STF entenda que se existe outros elementos de prova, não considera imprescindível a perícia,

conforme esclarece Rodrigues (online).

3.2.1.6 Crimes de violência doméstica – Lei Maria da Penha

Indubitável que a regra expressa no ordenamento jurídico brasileiro é que, se a infração

penal deixa vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não

podendo supri-lo nem mesmo a confissão do acusado (artigo 158 do CPP).

Ocorre que nos crimes de violência doméstica, o legislador tipificou no § 3º do art. 12

da Lei 11.340/2006 a possibilidade de se admitir provas por meio de prontuários médicos

fornecidos pelos hospitais e postos de saúde.

Art. 12. (...)

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(...)

§ 3º Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos

por hospitais e postos de saúde.

Entretanto deve-se usar de cautelar quando da interpretação do dispositivo da citada lei.

Explica Amaral (online) que

“os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde revestem-se

como prova hábil unicamente para o juízo acautelatório cível no que diz respeito ao pedido

da ofendida de medidas protetivas de urgência, para a formação do fumus boni iuris.

Devendo quanto à denúncia ser observada a regra da necessidade do exame de corpo de

delito, direto ou indireto, para as infrações penais que deixam vestígios”.

Assim, para que se possa embasar a ação penal, prevalece a regra da necessidade do

exame de corpo de delito, direto ou indireto, já que laudos ou prontuários médicos fornecidos por

hospitais e postos de saúde revestem-se como prova hábil unicamente para o juízo cível.

3.2.1.7 Crimes de Trânsito

Os crimes ocorridos na direção de veículo automotor também devem ser periciado, sob

pena de nulidade do processo.

O Código de Trânsito Brasileiro, em seu art. 277 dispõe que:

Art. 277. O condutor de veículo automotor envolvido em acidente de trânsito ou que for

alvo de fiscalização de trânsito poderá ser submetido a teste, exame clínico, perícia ou

outro procedimento que, por meios técnicos ou científicos, na forma disciplinada pelo

Contran, permita certificar influência de álcool ou outra substância psicoativa que

determine dependência. (Redação dada pela Lei nº 12.760, de 2012). (grifamos)

A perícia em acidentes de trânsito tem por finalidade reconstituir o acidente, bem como

atribuir sua causa.

O CTB possibilitou a aplicação subsidiária tanto do CPP, do CP, bem como da Lei

9.099/1995, dispondo que:

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Art. 291. Aos crimes cometidos na direção de veículos automotores, previstos neste

Código, aplicam-se as normas gerais do Código Penal e do Código de Processo Penal, se

este Capítulo não dispuser de modo diverso, bem como a Lei nº 9.099, de 26 de setembro

de 1995, no que couber.

Assim, as normas relativas às nulidades prevista nos diplomas citados, no caso de

omissão do CTB, devem ser aplicadas aos crimes de trânsitos.

No que diz respeito à ausência do auto de exame de corpo de delito nos ditos delitos, o

TJ-RS, no Recurso Crime RC 71001593466 RS (TJ-RS), assim se manifestou:

APELAÇÃO CRIME. LESÃO CORPORAL CULPOSA NA DIREÇÃO DE VEÍCULO

AUTOMOTOR. ART. 303 DA LEI Nº 9.503 /97. AUSÊNCIA DO AUTO DE EXAME DE

CORPO DE DELITO. PROVA ORAL INCONCLUSIVA. Examinada a prova dos autos, não

emerge de forma clara como a colisão ocorreu, não havendo demonstração conclusiva da

culpa do apelante para o evento, o que, aliada a ausência do auto de exame de corpo de

delito conduz ao provimento da apelação, com absolvição do recorrente. Atestado médico

ambulatorial que não atende aos requisitos exigidos pelo artigo 159 , do Código Penal,

sendo suficiente apenas para o oferecimento da denúncia (art. 77 , § 1º , da Lei nº 9.099

/95). APELAÇÃO PROVIDA. (Recurso Crime Nº 71001593466, Turma Recursal Criminal,

Turmas Recursais, Relator: Ângela Maria Silveira, Julgado em 31/03/2008)

3.3 A OBRIGATORIEDADE DO EXAME DE CORPO DE DELITO

Já se frisou que nas hipóteses da infração deixar vestígios é indispensável que se faça

uma comprovação dos vestígios materiais por ela deixados, ou seja, que se realize o exame do corpo

de delito.

Entende Barbosa(online) que ―tal indispensabilidade se trata, como se percebe, de uma

reminiscência inaceitável do superado sistema da certeza moral do legislador que se afastou, sem

sombra de dúvida, do sistema da livre convicção motivada”.

No ordenamento jurídico brasileiro, mais precisamente no Art. 158 do CPP, está

expresso que “quando a infração penal deixar vestígios será indispensável o exame de corpo de

delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo nem mesmo a confissão do acusado”.

Conforme se desprende da leitura do artigo 158, deixando a infração vestígios, é

obrigatória a realização da perícia, pois seu laudo constitui prova da materialidade do delito. Sendo

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que nas demais perícias há uma faculdade da autoridade judicial ou das partes para a sua realização,

conforme art. 184 do CPP In verbis:

Art. 184. Salvo o caso de exame de corpo de delito, o juiz ou a autoridade policial negará a

perícia requerida pelas partes, quando não for necessária ao esclarecimento da verdade.

Fernando Capez (2011, p.234) entende que

"A regra do art. 158 do CPP, tornando obrigatória a realização do exame de corpo de

delito quando a infração deixar vestígios, excepciona o princípio da livre apreciação da

prova pelo juiz (CPP, art. 157), bem como o da verdade real. Trata-se de adoção

excepcional do sistema da prova legal, não podendo o julgador buscar a verdade por

nenhum outro meio de prova, seja pela confissão do acusado, robusta documentação ou

depoimentos testemunhais idôneos, pois a lei se apega ao formalismo de exigir a prova

pericial como único meio de comprovar a materialidade delitiva. Assim, quando possível a

realização da perícia, a sua falta implica a nulidade de qualquer prova produzida em sua

substituição (CPP, art. 564, III, b) e, por conseguinte, a absolvição do imputado com

fundamento no art. 386, VI, do CPP.”

Somente na ausência completa de possibilidade de realização do exame de corpo de

delito, seja ele direto ou indireto, é que a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta, nos termos

preconizados pelo Art. 167 do CPP.

Comunga do mesmo entendimento Freitas (online)

“quando o crime deixa vestígios, isto é, deixa sinais visíveis, físicos, sensíveis de sua

efetiva ocorrência, o juiz não pode dispensar o exame sobre o corpo de delito, seja tal

exame direto (quando se reúnem os elementos objetivos apreciados na realização do

exame) ou indireto (quando, por qualquer outro meio, se demonstra a materialidade do

fato, sem, contudo, apresentar os elementos sensíveis resultantes da conduta). A norma do

art. 158 é tão incisiva que impede o juiz de, nas hipóteses aventadas, substituir o exame de

corpo de delito pela confissão do acusado.” 7

Esclarece Pacelli (2013) que

“deixando vestígios a infração, a materialidade do delito e/ou a extensão de suas

consequências deverão ser objeto de prova pericial, a ser realizada diretamente sobre o

objeto material do crime, o corpo de delito, ou, não mais podendo sê-lo, pelo

7 A indispensabilidade do exame de corpo, http://jusvi.com/artigos/1014 > Acessado em 26/06/2013.

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desaparecimento inevitável do vestígio, de modo indireto. O exame indireto será feito

também por meio de peritos, só que a partir de informações prestadas por testemunhas ou

pelo exame de documentos relativos aos fatos cuja existência se quiser provar, quando

então se exercerá e se obterá apenas um conhecimento técnico por dedução”.

Conforme entendimento do STF, na hipótese do magistrado deixar de observar a

obrigatoriedade de realização de perícia direta, estará caracterizado a nulidade prevista no art. 564,

III, ‗b‘ do CPP:

“HÁBEAS CORPUS. ESTELIONATO. Ausência de exame de corpo de delito nos

documentos falsificados para obtenção da vantagem indevida. Nulidade.

Indispensabilidade da diligência nos crimes que deixam vestígios, enquanto esses existirem

(art. 158 do CPP). Princípio da verdade real. Ordem concedida para anular as decisões da

justiça estadual, devendo ser proferida nova sentença após a realização do exame

pericial”(RT 672/388).

Deste modo, conclui-se que, nos "delitos de fato permanentes" como também são

conhecidas as infrações que deixam vestígios, a prova pericial é essencial e obrigatória. Frisando-se

que sua ausência implica a absolvição do acusado por falta de prova nos termos do Art. 386, II, do

CPP, In verbis:

Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que

reconheça:

(...)

II - não haver prova da existência do fato;

Por se tratar de infrações que deixam vestígios, importante salientar que a confissão do

acusado não supre a ausência do exame de corpo de delito, conforme preceitua o Art. 158 do CPP,

gerando, portanto a nulidade do processo nos termos do art. 564, III, ―b‖ do citado diploma

processual, como veremos a seguir.

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3.4 DA NULIDADE POR FALTA DE FÓRMULAS

Dispõe o CPP:

Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:

III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:

b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto

no Art. 167; (grifamos).

Conforme se observa no Art. 564, III, b, do CPP, haverá nulidade se não for feito o

exame de corpo de delito nos crimes que deixam vestígios. Portanto, conclui-se que a perícia nas

infrações que deixam vestígio é obrigatória (Art. 158 do CPP), gerando nulidade a sua ausência.

Salienta-se que a denúncia ou a queixa não deve nem sequer ser recebida, pois lhe falta

pressuposto, caso não seja instruída com o exame pericial, conforme prevê o Art. 525 do CPP: “No

caso de haver o crime deixado vestígio, a queixa ou a denúncia não será recebida se não for

instruída com o exame pericial dos objetos que constituam o corpo de delito.”

Santos (online), ao dissertar sobre o assunto expôs que:

“O que se pretende demonstrar é o seguinte: caso a falta de realização do exame

direto seja levada a efeito por omissão do Estado investigador, se do ato resultar

prejuízo para a defesa, esvaziando a acusação, o procedimento de nulidade acima

colocado deve ser observado. O prejuízo à defesa parece evidente, quando o

Estado deixa de produzir a prova que seria útil ao processo. Certamente, a defesa

estará prejudicada, se o delito não foi praticado pelo réu denunciado e o órgão

técnico do Estado deixou de agir para demonstrar a realidade dos fatos

ocorridos”.8

3.5 AUSÊNCIA DO EXAME DE CORPO DE DELITO

Em determinados delitos, o legislador possibilitou que a prova testemunhal fosse

suficiente para a comprovação da materialidade. Citam-se como exemplo os crimes contra a

8

SANTOS, Pedro Luiz Mello Lobato dos. Nulidade absoluta pela não realização de prova pericial em delitos que

deixam vestígios. http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/6207/Nulidade-absoluta-pela-nao-realizacao-de-prova-

pericial-em-delitos-que-deixam-vestigios. > Acessado em 27/06/2013

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liberdade sexual cometidos mediante grave ameaça ou com violência presumida. Em tais delitos

não se exige a obrigatoriedade do exame de corpo de delito direto, isso porque, quando praticado

com violência moral ou com violência ficta, nem sempre eles deixam vestígios materiais.

Entretanto, há outros tipos de crime cuja prova testemunhal não é suficiente para que se

comprove a materialidade da infração, são os denominados crimes que deixam vestígios. Nesse tipo

de delito, quando não for possível ser suprida pela prova testemunhal, existe a obrigatoriedade da

realização da perícia, acarretando sua ausência nulidade insanável.

Sobre o assunto, o STJ tem assim decido:

HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO.

ESCALADA. AUSÊNCIA DE EXAME DE CORPO DE DELITO. INCIDÊNCIA DE

QUALIFICADORA. CONFISSÃO DO RÉU. DEPOIMENTO DA VÍTIMA.

IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE LAUDO PERICIAL. PRECEDENTES.

1. O exame de corpo de delito é indispensável para comprovar a materialidade do crime,

sendo que sua realização de forma indireta somente é possível quando os vestígios tiverem

desaparecido por completo ou o lugar se tenha tomado impróprio para a constatação dos

peritos.

2. Sendo possível realizar a perícia de local, a prova testemunhal ou a confissão do

acusado – essa por expressa determinação legal – não se prestam a suprir o exame de

corpo de delito. Precedentes.

3. Impõe-se afastar a incidência das qualificadoras porque, na ausência de laudo pericial,

não existe prova concreta que comprove inequivocamente a materialidade do

arrombamento ou da escalada.

4. Ordem concedida para, reformando a sentença condenatória e o acórdão impugnado,

afastar da condenação do Paciente as qualificadoras do art. 155, § 4º, incisos I e II, do

Código Penal. (HC 85.901/MS, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em

27/09/2007, DJ 29/10/2007 p. 294)

HABEAS CORPUS PROCESSUAL PENAL. CRIMES DE LATROCÍNIO E

OCULTAÇÃO DE CADÁVER. ALEGAÇÃO DE DEMORA PELO TRIBUNAL A QUO

NO PROCESSAMENTO DO RECURSO ESPECIAL. INOCORRÊNCIA. PLEITO DE

ABSOLVIÇÃO COM FUNDAMENTO NA AUSÊNCIA DE EXAME DE CORPO

DELITO.

O recurso especial interposto na origem está sendo regularmente processado pelo Tribunal

a quo, aguardando, tão-somente, a apresentação das contra-razões ministeriais.

Acrescente-se, ademais, que eventual demora não prejudica o cumprimento de mandado de

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prisão ou a execução provisória da pena, pois o apelo extremo é desprovido de efeito

suspensivo.

2. A simples ausência de laudo de exame de corpo de delito da vítima não tem o condão de

conduzir à conclusão de inexistência de provas da materialidade do crime, se nos autos

existem outros meios de prova capazes de convencer o julgador quanto à efetiva

ocorrência do delito, como se verifica na hipótese vertente.

3. Ordem denegada. (HABEAS CORPUS Nº 51.364 – PE - 2005/0210078-9)

Em igual sentido também já decidiu o TJ/RS no Acórdão nº 70025336975 da 2ª Câmara

Criminal, 21.01.2010:

APELAÇÃO-CRIME. CRIME CONTRA A PESSOA. ART. 129, §9º, DO CÓDIGO PENAL.

MATERIALIDADE. AUSÊNCIA. ABSOLVIÇÃO DECRETADA. A ausência de exame de

corpo delito não pode ser suprida pela prova testemunhal quando a vítima, por sua livre

discricionariedade, deixa de comparecer ao órgão estatal competente para a realização do

procedimento, pois o desaparecimento dos vestígios da infração penal se deu por desídia

da ofendida, a obstaculizar a flexibilização do preceito contido no art. 158 do CPP em

razão da incidência do art. 167 do referido diploma legal no caso concreto.

Apelo defensivo provido, à unanimidade. (Apelação Crime Nº 70025336975, Segunda

Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marlene Landvoigt, Julgado em

21/01/2010)

Conforme Art. 564, III, ―b‖, do CPP, a falta do exame de corpo de delito caracteriza

nulidade absoluta.

Entretanto, havendo inobservância de formalidade, ou mesmo no caso de omissão,

poderá a autoridade judiciária determinar que essa formalidade seja suprida ou complementada. É o

que prevê o Art. 181 do CPP:

Art. 181. No caso de inobservância de formalidade ou no caso de omissões, obscuridade ou

contradições, a autoridade judiciária mandará suprir a formalidade ou complementar ou

esclarecer o laudo.

Parágrafo único - A autoridade poderá também ordenar que se proceda a novo exame, por

outros peritos, se julgar conveniente.

Porém, o juiz não fica adstrito ao laudo pericial, consoante disposição expressa do Art.

182 do diploma processual.

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Art. 182. O Juiz não ficará adstrito ao laudo, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou

em parte.

Embora o laudo pericial tenha significativa importância no processo penal, o juiz não

está obrigado a vincular seu convencimento à conclusão pericial, pois se assim o fizer estará

violando o princípio do livre convencimento do magistrado, conforme entendimento da doutrina e

jurisprudência.

Nesses termos já decidiu a 1ª Câmara Criminal do TJ de Mato Grosso: assim se

manifestou:

RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL – ACIDENTE DE TRÂNSITO – HOMICÍDIO

CULPOSO – RECURSO DA ACUSAÇÃO OBJETIVANDO A CONDENAÇÃO –

DESCONSIDERAÇÃO PELO MAGISTRADO A QUO DO LAUDO EM SENTIDO

INCRIMINADOR – POSSIBILIDADE – PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO

MOTIVADO – REUNIÃO DE OUTROS ELEMENTOS DE CONVICÇÃO QUE

CONTRARIAM A PROVA PERICIAL – CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA –

ABSOLVIÇÃO MANTIDA – RECURSO IMPROVIDO.

Tendo o conjunto probatório revelado, em sentido oposto à conclusão do perito, que o

acidente ocorreu por culpa exclusiva da vítima, que se autocolocou perigosamente na

frente do veículo do apelado, poderá o magistrado, fundamentadamente, desconsiderar o

laudo técnico, sob a égide do Princípio do Livre Convencimento Motivado, permitindo seja

mantido o édito absolutório.(Apelação Nº 30075/2010)

Nesse mesmo sentido é a posição do STJ:

PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE RESPONSABILIDADE. PREFEITO. DL

201/67. EXAME PERICIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 158 DO CPP. INOCORRÊNCIA.

DEVIDO PROCESSO LEGAL. PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. SUBSTITUIÇÃO DE

PENA. ART. 44, § 2º DO CP. PERDA DO CARGO. EXECUÇÃO. TRÂNSITO EM

JULGADO DA CONDENAÇÃO.

I - Havendo outros elementos probatórios, de regra, lícitos, legítimos e adequados para

demonstrar a verdade judicialmente válida dos fatos, não há razão para desconsiderá-los

sob o pretexto de que o art. 158 do CPP admite, para fins de comprovação da

materialidade da conduta delitiva, apenas e tão-somente, o respectivo exame pericial. (...)

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Todavia, uma vez apresentado o laudo pericial, esse deve ser considerado. É a posição

do STJ.

“Não se deve recusar a perícia pela simples alegação de sua desnecessidade. Como prova

de grande capacidade de convencimento, deve ser realizada sempre que a defesa a

considere indispensável para a demonstração da verdade real. Ordem concedida.” (STJ,

HC 1.323, Min. José Candido. DJU 5.4.1993, p. 5.858)

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61

CONCLUSÃO

A presente monografia foi desenvolvida com o intuito de realizar um breve estudo

acerca da nulidade pela ausência do exame de corpo de delito nas infrações não transeuntes.

Buscou-se traçar algumas considerações conforme as regras estabelecidas no Diploma Processual

Penal brasileiro e na jurisprudência atual

Examinando-se o trabalho apresentado, infere-se que o mesmo foi dividido em três

partes: a primeira parte versa sobre ―nulidades no processo penal‖, a segunda parte trata do ―exame

de corpo de delito‖ e a terceira (e última) parte buscou-se traçar algumas considerações importantes

sobre ―nulidade por ausência do exame de corpo de delito nos crimes que deixam vestígios ou não

transeuntes‖.

Das análises trazidas sobre os assuntos, constatou-se que:

O exame de corpo de delito tem uma importância significativa, pois se trata de meio de

prova indispensável nas infrações que deixam vestígios;

Embora o princípio do livre convencimento motivado do juiz permita ao juiz formar sua

convicção pessoal (Art. 130 do CPC), desde que devidamente fundamentada sua decisão (Art. 93,

IX da CF), tratando-se de infrações que deixam vestígios, a decisão não pode ser exclusivamente

nos elementos informativos colhidos na investigação (Art. 155 do CPP), devendo, necessariamente,

ser realizada a perícia (Art. 158 do CPP).

O Art. 158 do CPP que determina que ―quando a infração penal deixar vestígios será

indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo nem mesmo a

confissão do acusado‖, é a regra no ordenamento jurídico brasileiro.

Embora a regra seja a realização do exame de corpo de delito, em algumas situações a

prova testemunhal supre sua ausência (Art. 168 do CPP), sob pena de nulidade do processo;

Por ser de significativa importância, o exame de corpo de delito deve ser realizado por

perito oficial, portador de diploma de curso superior (Art. 159 CPP);

As nulidades previstas no CPP consubstanciam rol exemplificativo, já ocorrendo

inobservância de princípios gerais do direito e princípios constitucionais, haverá também nulidade.

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Tratando-se de nulidades relativas, as partes devem demonstrar o prejuízo, hipótese em

que, caso não arguidas, podem ser convalidadas;

Quanto às nulidades absolutas, tendo em vista que o vício atinge o próprio interesse

público, não há necessidade de demonstração do prejuízo, devendo ser declarada de ofício pelo juiz;

As provas obtidas por meios ilícitos não são inadmissíveis no exame corpo de delito;

Conclusão final: o exame corpo de delito é indispensável nos crimes que deixam

vestígios, e sua ausência gera nulidade absoluta do processo, devendo a parte requer a nulidade

deste o ato viciado, podendo, no entanto, a perícia ser suprida pela prova testemunhal idônea

quando esta tenha presenciado o fato e não mais seja possível a realização da perícia.

― É me l h o r f i c a r e m i mp u n e s mu i t o s c u l p a d o s d o q u e

s e r c o n d e n a d o u m ú n i c o i n o c e n t e . ‖

B e r r i e r

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