Falo Somente Com o Que Falo

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  • 8/17/2019 Falo Somente Com o Que Falo

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    Falo somente com o que falo:

    com as mesmas vinte palavras

    girando ao redor do sol

    que as limpa do que não é faca:

    de toda uma crosta viscosa,

    resto de janta abaianada,

    que fica na lâmina e cega

    seu gosto da cicatriz clara.

    Falo somente do que falo:

    do seco e de suas paisagens,

    Nordestes, debaixo de um sol

    ali do mais quente vinagre:

    que reduz tudo ao espinhaço,cresta o simplesmente folhagem,

    folha prolixa, folharada,

    onde possa esconder-se na fraude.

    Falo somente por quem falo:

    por quem existe nesses climas

    condicionados pelo sol,

    pelo gavião e outras rapinas:

    e onde estão os solos inertes

    de tantas condições caatinga

    em que só cabe cultivar

    o que é sinônimo da míngua.

    Falo somente para quem falo:

    quem padece sono de morto

    e precisa um despertador

    acre, como o sol sobre o olho:

    que é quando o sol é estridente,

    a contrapelo, imperioso,

    e bate nas pálpebras como

    se bate numa porta a socos.

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    Além disso, é preciso que ela seja instrumento de tomada de consciência,de transformação, de superação dessa realidade desigual e injusta. Aliás,são esses dois aspectos que fazem com que uma boa literatura possa serreconhecida como tal. A riqueza integral da obra de Graciliano amos s!

    pode ser entre"ista na medida em que "eri#camos a sua $ntima relação como panorama social da época. %...& ' quadro brasileiro denunciado é aquele

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    que "inha se delineando desde os primeiros dias da ep(blica e acabouresponsá"el pelos con)itos armados do tenentismo, retaguarda dare"olução de *+. -ourão, ++*, p. /012

    3ssa mesma obra, por sua "ez, surpreende ao adentrando por caminhosmenos referenciais, menos "oltados 4s contradiç5es hist!ricas docapitalismo num 6rasil também ele contradit!rio. 7esse modo, Gracilianoamos escre"e sua literatura, com um olhar para dentro e outro para fora.

    As suas hist!rias se passam em um tempo remoto, em um espaço distantedas máquinas e do progresso. 8egundo ui -ourão, a 9percepção que nocaso se procura passar é de um :ordeste ainda en"olto em atmosfera pré;capitalista, anterior ao rádio e a tele"isão, no qual contingentes dapopulação humilde e analfabeta, na aceitação complacente do seu pr!priodestino, transita"am de fazenda em fazenda, transmitindo de boca em bocaa saga de uma região de mistério e encantamento literatura tem de pautar;se pela "erossimilhança,re)etir o real, Graciliano adianta"a, aos "inte e um anos, sua posição dianteda pr!pria criação literária, com a publicação do romance ?aetés, "inte anosdepois. @ara o escritor, a eperiência "i"ida, a realidade que o cerca, asocialização do homem em seu conteto hist!rico;geográ#co, o :ordesteserão sempre a matéria;prima da sua obra. ?aetés é a reconstrução literáriade @almeira dos Bndios, assim como 8. 6ernardo o é de -aniçoba, ou do s$tiode seu @aulo Con!rio conforme diz em DnfEncia. Ang(stia reconstr!i

    fragmentos de -acei!. Fidas secas e Dnsnia são )ashes, lembranças arecuperar "i"ências em passado remoto ou pr!imo. Há nas crnicas;artigosde Iinhas tortas, há /* tetos datados de /J/K e escritos para o peri!dico@ara$ba do 8ul. :eles, a in)uência e o clima cultural da capital da rep(blicade princ$pios do século LL estão e"idenciados. -alard, ++0, p. +/2.

    Ao a#rmar que a poesia > literatura tem de pautar;se pela "erossimilhança,re)etir o real, Graciliano adianta"a, aos "inte e um anos, sua posição dianteda pr!pria criação literária, com a publicação do romance ?aetés, "inte anosdepois. @ara o escritor, a eperiência "i"ida, a realidade que o cerca, asocialização do homem em seu conteto hist!rico;geográ#co, o :ordeste

    serão sempre a matéria;prima da sua obra. ?aetés é a reconstrução literáriade @almeira dos Bndios, assim como 8. 6ernardo o é de -aniçoba, ou do s$tiode seu @aulo Con!rio conforme diz em DnfEncia. Ang(stia reconstr!ifragmentos de -acei!. Fidas secas e Dnsnia são )ashes, lembranças arecuperar "i"ências em passado remoto ou pr!imo. Há nas crnicas;artigosde Iinhas tortas, há /* tetos datados de /J/K e escritos para o peri!dico@ara$ba do 8ul. :eles, a in)uência e o clima cultural da capital da rep(blicade princ$pios do século LL estão e"idenciados. -alard, ++0, p. +/2.

    :o entanto, mesmo que tenhamos a presença de listas como a citadaacima, a grande maioria das leituras da obra de Graciliano amos procuradistanciá;lo dos recursos estil$sticos "astamente empregados na literatura

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    regionalista de /J*+. 3sse distanciamento se de"e principalmente ao fatode o autor ser 9pouco afeito ao pitoresco e ao descriti"o< ?andido, /JJ, p./*2, ou seja, 4 sua escrita econmica, declaradamente anti;ret!rica, decombate 4 paisagem, en#m, ao seu estilo seco.M

    9Graciliano amos troue a #cção nordestina para o c$rculo eato em que semo"e o romance moderno. :ão será dif$cil entrosar os seus li"ros %...& aocompleo painel que, partindo do localismo para o uni"ersal, empreende asondagem da alma humana atra"és da auscultação de uma determinadazona geográ#ca.< Nilho, /JJM, p. /012. 3sse uni"ersalismo retirado do maistradicional, condição imprescind$"el para o escritor que faz parte de umatradição descentralizada, fora dos antigos e grandes centros letrados, foiinterpretado por icardo @iglia a partir de uma imagem que nos faz lembrarAleandreO la mirada estrabica. 8egundo @iglia, o escritor latino;americanono caso espec$#co, argentino2 está sempre 4s "oltas com a obrigação de

    resgatar uma tradição perdida, de trabalhar com a consciência de umahist!ria rasurada. @or isso o escritor 9haP que tener un ojo puesto en lainteligencia europea P el otro puesto en las entraQas de la patria

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    é de aul Iima e aponta o memorialismo e a autobiogra#a em Gracilianoamos.

    Cabe importância e interesse especial “a suprema expressividade da linguagem”,

     pois Verdi (1989), em estudo de grande análise e aproundamento cr!tico das obras e da

    cr!tica sobre "raciliano #amos, desvenda uma preocupa$%o da cr!tica em considerar a

    linguagem o leitmotiv na obra iccional deste escritor, podendo nos revelar um universo

    rico em tens&es e mensagens'

    ara tanto, Verdi (1989) cita bdala *+nior, ue escreve uma cr!tica direcionada -

    metalinguagem utili.ada por #amos, como um de seus procedimentos ling/!sticos mais

    importantes e Cintra, ue a. um estudo relacionando a obra iccional de #amos -s

    un$&es da linguagem de *a0obson'

    bdala *+nior (apud V#23, op.cit ', p'114) mostra nos, ainda, como a

    metalinguagem, em #amos, 5  Fator de eficácia na comunicação estética, porque

    estabelece uma adequação entre os códigos do escritor e do leitor.  2ierente da

    abordagem de bdala *+nior 5 a critica de Cintra (apud V#23, op.cit ', p'116) ue

    constata outros ângulos da uest%o7

     A obra do romancista alagoano é uma forma aguda de refletir sobre o

    mundo através de uma reflexão anterior sobre a própria linguagem da

    literatura e da sociedade. (... a linguagem é o leitmotiv na obra ficcional de

    !raciliano "amos enquanto ob#eto de refer$ncia constantes nos seus vários

    romances e em diferentes n%veis.

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     A crítica confrma-nos a preocupação de Ramos em buscar uma

    linguagem que abrangesse várias dimensões ao mesmo tempo e searticulassem em seus vários romances, em dierentes níveis e com

    várias uncionalidades.

    A principal caracter$stica do regionalismo tradicional, segundo Iucia CelenaFianna, era o 9apego nostálgico a um passado rural cuja perda se lamenta ecujos aspectos são descritos minuciosamente, para recompor o antigomundo do campo que se quer contrapor 4 perda das tradiç5es da "ida nacidade.