Farmácia - Imunologia 04 - Fagocitose

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CAPTULO 4

MECANISMOS DE FAGOCITOSE

A CHEGADA DAS CLULAS NOS TECIDOS Quando ocorre uma infeco tecidual, o processo inflamatrio local induz um aumento na migrao de clulas do sangue para o tecido afetado (Captulo 3). No tecido, estas clulas migram at o local da infeco seguindo um gradiente de concentrao de fatores qumicos denominados fatores quimiotticos. Este movimento das clulas, em direo ao fator qumico, dissociado nos tecidos, denomina-se quimiotaxia. Um outro tipo de movimento celular a haptotaxia, que ocorre em direo fatores aderidos numa clula, como o caso da IL-8 ou do MCP-1, associados s membranas das clulas do endotlio vascular (Captulo 3). Os principais fatores quimiotticos, liberados durante um processo inflamatrio, podem ser peptdeos de baixo peso molecular (Formil-Met-Leu-Phe), liberados por bactrias, como tambm peptdeos de fibrina e colgeno teciduais, oriundos da degradao por enzimas bacterianas ou celulares. Outros fatores quimiotticos so produzidos a partir de cidos graxos (cido aracdnico), presentes nos fosfolipdeos de membrana das clulas ativadas no processo inflamatrio, tais como o Tromboxano A2 (TBxA2) e o Leucotrieno B4 (LTB4). Outras molculas que atuam como fator quimiottico so os peptdeos oriundos do sistema complemento tais como as molculas denominadas C5a e C5bC6C7. (Como ser estudado no Captulo 10, o sistema complemento um conjunto de protenas ativadas em cascata de forma semelhante ativao do sistema da coagulao. Estas protenas, denominadas C1, C2, C3 ... C9 (C=Complemento),

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so clivadas, durante uma resposta imune, em dois fragmentos denominados a e b, por exemplo: C5a e C5b, com diferentes atividades fisiolgicas). Recentemente, foram descobertas citocinas de baixo peso molecular com atividade quimiottica; que so as chamadas quimiocinas. A IL-8 e a MCP-1, j estudadas no captulo 3, so quimiocinas com atividade quimiottica sobre neutrfilos e moncitos/macrfagos, respectivamente. A partir do momento em que os neutrfilos e os moncitos chegam no local onde esto os microorganismos infectantes, estas clulas iniciam o processo de ingesto destas partculas atravs de um mecanismo conhecido como fagocitose. BREVE HISTRICO SOBRE A FAGOCITOSE A primeira descrio da fagocitose foi realizada, em 1882, por um cientista russo chamado Metchnikoff (1845-1916), que a partir desta observao, defendeu a hiptese de que a resposta imune mediada exclusivamente por clulas. Na poca, outros cientistas, tais como Koch e Pasteur, defendiam a idia de que a resposta imune humoral, ou seja, mediada por fatores solveis presentes nos humores (lquidos do corpo). Hoje, como se sabe, tantos os defensores da teoria celular quanto da humoral, tinham razo e d-se o nome de imunidade celular, aos mecanismos mediados por Linfcitos T e de imunidade humoral aos mediados por Linfcitos B. Quando estas denominaes foram dadas, no se sabia que os linfcitos T tambm produzem molculas solveis, as quais so denominadas linfocinas; na poca, acreditava-se que apenas os linfcitos B produziam este tipo de molcula, no caso as Imunoglobulinas (ou Anticorpos). FAGOCITOSE A fagocitose consiste de vrias etapas: adeso, endocitose ou engolfamento, morte intracelular, digesto e no caso dos macrfagos, apresentao de peptdeos (oriundos da digesto da partcula estranha) na membrana.

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1. Fase de adeso entre a clula fagoctica e o microorganismo Uma clula fagoctica pode ingerir vrios tipos de partculas inertes tais como gar, gelatina, carvo, eritrcitos danificados ou estranhos, carbono ou prata coloidal e partculas de xido de ferro. A maioria destas partculas ingerida de forma inespecfica sem a necessidade da associao com receptores de membrana nas clulas fagocticas. No entanto, no caso de bactrias, que so extremamente mveis, a etapa inicial de adeso entre as clulas fagocticas e as bactrias mediada por receptores de membrana. Alguns destes receptores reconhecem acares comuns, presentes na membrana das bactrias, tais como a manose e a fucose enquanto que outros reconhecem molculas de lipopolissacardeo (LPS), presentes em bactrias gramnegativas (Figura 1). O receptor de LPS em macrfagos denominado CD14 [CD = classe de diferenciao - esta sigla utilizada para nomear uma srie de molculas, com diferentes funes, tais como receptores (CD14, CD16), molculas de adeso (CD31) e molculas co-estimulatrias (CD3)]. Para que a adeso entre os receptores das clulas (rMan/Fuc receptor de Manose/Fucose, rLPS receptor de LPS) e as molculas de membrana das bactrias (Man/Fuc, LPS) ocorra, a clula fagoctica tem que entrar em contato com o microorganismo em superfcies teciduais e por isso raramente a fagocitose ocorre em meios fluidos. A fagocitose pode ocorrer tambm, com maior facilidade, quando a partcula estranha est presente num cogulo de fibrina, na superfcie de um vaso ou tecido.

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Figura 1 Fagocitose mediada por receptores de Manose/Fucose (ou LPS)

Bactrias Pseudpode

rMan/Fu

MHC + peptdeo

Fagossomo

Fagolisossom Lisossomos

Retculo endoplasmtico

Macrfago

Corpsculo residual

2. Fase de endocitose ou engolfamento Aps a adeso membrana da clula fagoctica, a partcula estranha endocitada por expanses citoplasmticas do fagcito denominadas pseudpodes (Figura 1). Os pseudpodes formam uma vescula intracelular denominada fagossomo, que consiste na prpria membrana celular evertida. O fagossomo funde-se com os lisossomos celulares formando um fagolisossomo, no qual ocorre a liberao de enzimas lisossmicas. Antgenos no viveis so rapidamente digeridos nos fagolisossomos.

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3. Mecanismos de morte intracelular Quando o microorganismo fagocitado ainda encontra-se vivel, antes da digesto por enzimas lisossmicas, mecanismos de morte intracelular so desencadeados. Os mecanismos de morte intracelular, induzidos nos neutrfilos e macrfagos, podem ser de dois tipos: Mecanismos de Morte Intracelular Independentes de Oxignio. Estes mecanismos ocorrem pelo efeito citotxico de molculas, produzidas pelas clulas fagocticas, geralmente em ambientes anaerbicos. Estes mecanismos levam o microorganismo morte pelo acmulo de cido lctico, proveniente do metabolismo anaerbio da glicose. O acmulo de cido lctico leva diminuio do pH intracelular (entre 4 e 5), criando um ambiente bactericida ou bacteriosttico, dependendo da bactria em questo. Este mecanismo ocorre em todos os fagcitos em repouso, exceto nos macrfagos alveolares, que esto presentes em ambiente rico em oxignio. Outro fator atuante neste tipo de mecanismo a lisozima, que pode hidrolisar a parede de bactrias gramnegativas. Protenas catinicas tambm podem interagir com bactrias com cargas eltricas negativas interferindo no transporte inico e na sua sobrevivncia. A produo de lactoferrina tambm contribui para que, com a retirada de ferro extracelular, a capacidade proliferativa das bactrias diminua (Captulo 1). Mecanismos de Morte Intracelular Dependentes de Oxignio. A endocitose de microorganismos, aumenta nas clulas fagocticas, o consumo de oxignio, o que desencadea o chamado desvio da hexose monofosfato (a exploso respiratria) e a formao de Intermedirios Reativos de Oxignio (ROI). A ativao destes mecanismos envolve a participao de duas enzimas principais: 1. A NADP oxidase (Nicotinamida-Adenina Dinucleotdeo Fosfato oxidase), que remove um hidrognio do NADPH para formar NADP+, convertendo simultaneamente o O2 em radical superxido (O2 ). O radical superxido, pela presena de um eltron no partilhado, torna-se extremamente reativo e txico para vrias espcies bacterianas.-

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2. A Superxido dismutase (SOD), que atua sobre o radical superxido e o converte em perxido de hidrognio (H2O2) e O2 simples, segundo a reao: O2 + O2 + 2H+ H2O2 + 1O2 O H2O2, produzido pela superxido dismutase, degradado pela mieloperoxidase, na presena de Cl e I para produzir hipoclorito (OCl ) ou hipoiodeto (OI ), tambm txicos para espcies bacterianas. H2O2 + CL H2O + OCl H2O2 + I H2O + OI-

O perxido de hidrognio pode reagir com o radical superxido, na presena de ferro, produzindo oxignio, ons hidroxila e radical hidroxila. O2 + H2O2 O2 + OH + OH O radical hidroxila um produto de reduo do eltron do H2O2 e o mais potente agente oxidante produzido em sistemas biolgicos. Esta molcula tambm contribui para a morte intracelular. Mais recentemente, foi descoberta uma via de morte intracelular dependente de oxignio que leva produo de Intermedirios Reativos de Nitrognio (RNI). A principal molcula produzida por esta via o xido ntrico (NO), que txico para bactrias, protozorios e clulas tumorais. Para que esta via seja induzida, os macrfagos precisam ser previamente ativados pelo TNF- e pelo IFN-/ (Interferon alfa/beta) ou IFN- (Interferon-gama). 4. Digesto e apresentao de antgenos Aps a morte intracelular, alguns microorganismos tornam-se susceptveis s enzimas lisossmicas. Estas enzimas degradam as partculas mortas atuando sobre acares, protenas, lipdeos e cidos nucleicos; dentre elas, esto a acetilglucosamina hidrolase, a fosfatase cida, a ribonuclease cida, a desoxirribonuclease cida, a arilsulfatase, a colagenase, as catepsinas, a citocromo C redutase, a -glucuronidase, a hialuronidase, a elastase, a esterase, a -galactosidase, a lipase, a lisozima, a neuraminidase e a -manosidase.-

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O processo digestivo que ocorre no macrfago ainda pouco compreendido. Caso o material fagocitado seja intensamente digerido este excretado por corpsculos residuais (Figura 1). No entanto, quando o material fagocitado digerido em peptdeos contendo de 8 a 30 aminocidos, os macrfagos podem apresent-los associados a protenas presentes na sua membrana (Figura 1). Estas molculas apresentadoras de peptdeos so denominadas molculas de classe I e classe II do Complexo Principal de Histocompatibilidade (MHC - Major Histocompatibility Complex Captulo 7). Estes peptdeos so apresentados aos linfcitos T, que expressam receptores especficos para estas estruturas, ou seja molculas do MHC associadas aos peptdeos (Captulo 9). OUTROS MECANISMOS FAGOCTICOS Quando estudamos a natureza de qualquer fenmeno biolgico temos que ter uma viso dos aspectos da evoluo dos seus mecanismos ao longo da tempo. Esta viso inclui no s o conhecimento de todos os fatores ambientais atuantes no momento, como tambm aqueles anteriores, relativos ao tempo e espao, que o levaram ao padro atual. Ou seja, qualquer fenmeno natural fruto das alteraes ocorridas num determinado espao fsico, ao longo de um tempo, num processo que denominamos evoluo. Outro aspecto que temos que ter em mente que a natureza no tendenciosa; ela no escolhe uma espcie para sobreviver e outra para ser extinta; ela propicia ao longo do tempo mecanismos adaptativos e as espcies de acordo com seu sucesso de relao com o ambiente sobrevivem ou perecem. Neste sentido, a fagocitose propiciou ao longo do tempo um mecanismo efetivo para que espcies de invertebrados e vertebrados impedissem a infeco por microorganismos de seu meio-ambiente. No entanto, estes mesmos microorganismos sofreram modificaes que permitiram o escape frente morte intracelular durante o processo de fagocitose. Alguns exemplos destes mecanismos: As micobactrias inibem a fuso dos lisossomos aos fagossomos, interferindo com o movimento dos lisossomos. O glicolipdeo fenlico de Mycobacterium leprae neutraliza as espcies reativas de oxignio.

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A hemolisina da Listeria monocytogenes inibe a morte intracelular, podendo inibir a apresentao de antgenos pelo macrfago. O Toxopasma gondii inibe a fuso do fagossomo aos lisossomos. O Trypanosoma cruzi lisa a membrana do fagossomo, antes da sua fuso aos lisossomos, e entra no citoplasma onde prolifera. A Leishmania inibe a sntese de xido ntrico (NO), em macrfagos no ativados, tornando-os refratrios a posteriores estmulos. OPSONIZAO Como pde ser observado, vrios microorganismos que so fagocitados evoluiram mecanismos de escape da morte intracelular e sobrevivem dentro da clula fagoctica. No entanto, algumas bactrias desenvolveram um mecanismo mais sofisticado que impede a aproximao das clulas fagocticas: apresentam uma cpsula rica em polissacardeos, que pela sua carga negativa, repele as clulas fagocticas, que quando ativadas tambm apresentam um potencial negativo de membrana. Ao longo do tempo, no entanto, a natureza proporcionou que novos mecanismos de fagocitose surgissem e propiciassem a ingesto deste tipo de bactria. Os cientistas hipotetizam que, provavelmente, neste perodo da evoluo surgiu o mecanismo de opsonizao. Como as clulas fagocticas no conseguem aderir estas bactrias, molculas que permitem este tipo de associao precisam estar presentes para que a ingesto da partcula ocorra. As molculas que permitem a ingesto destes microorganismos so as opsoninas (Figura 2). As opsoninas podem ser molculas de imunoglobulinas (anticorpos das classes IgG1 e IgG3, nos seres humanos), molculas do sistema complemento (C3b, C4b) e protenas de fase aguda liberadas durante o processo inflamatrio por clulas hepticas (a Protena C-reativa uma delas). Para que a opsonizao ocorra, as opsoninas devem revestir a superfcie do patgeno e aderir a receptores especficos na membrana das clulas fagocticas. A Protena C-Reativa (PCR), uma das protenas de fase aguda, atua nas fases iniciais da resposta inflamatria, antes que mecanismos mediados por linfcitos (neste caso, produo de Igs) tenham sido ativados. A produo desta protena induzida por citocinas pr-inflamatrias tais como o

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TNF-, as IL-1e IL-6 (Captulo 3). Quando a PCR associa-se superfcie bacteriana, ocorre a ativao do sistema complemento pelas vias alternativa e clssica e por intermdio dos receptores para C3b/C4b, ocorre a opsonizao (Figura 2). Nas fases mais tardias da resposta imune (ver abaixo respostas primria e secundria), a ativao dos linfcitos leva produo de Imunoglobulinas que atuam como opsoninas, em associao com as molculas do sistema complemento, ativadas pela via clssica (Captulo 10). Aps a fase de adeso da partcula superfcie da clula fagoctica, o processo de endocitose continua de forma semelhante fagocitose normal.Figura 2 Opsonizao mediada pela Protena C-reativa (PCR) e molculas do Complemento

PCR

rPCR

Macrfago

RC3b/C4b

C3b/C4b

RESPOSTA IMUNE PRIMRIA Quando um microorganismo entra, pela primeira vez, no corpo do hospedeiro, vai desencadear um tipo de resposta denominada resposta imune primria. Nesta resposta, a produo de anticorpos relativamente demorada, levando de 7 a 14 dias para ocorrer. Esta demora ocorre porque uma srie de interaes entre macrfagos, Linfcitos Tauxiliares e Linfcitos B so necessrias para que os

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anticorpos sejam produzidos nos linfonodos, que drenam o local da infeco. Os anticorpos so produzidos por linfcitos B ativados, que se tornam clulas secretoras de anticorpos, os plasmcitos. Na resposta imune primria, h uma produo predominante de anticorpos da classe IgM em relao de outras Imunoglobulinas, tais como a IgG, a IgA e a IgE. Quando a IgM comea a ser produzida, ela associa-se superfcie dos microorganismos e propicia a ativao das molculas do sistema Complemento pela via clssica (Captulo 10). Como os macrfagos e neutrfilos no possuem receptores de membrana para a IgM no possvel a ocorrncia da opsonizao, ativada por esta Imunoglobulina. No entanto, como o sistema complemento ativado, existem duas possibilidades: O microorganismo sofre lise pela ativao do sistema complemento, pela via clssica (Captulo 10). A lise pelo complemento ocorre porque com a ativao destas molculas ocorre a formao de poros na membrana do microorganismo, levando a um desequilbrio osmtico. Na circulao sangunea pela dificuldade de ocorrerem mecanismos de ingesto de partculas (fagocitose, opsonizao), o principal mecanismo de morte a ativao do sistema complemento. O microorganismo fica revestido das molculas do sistema complemento (C3b ou C4b e C5a), que passam a ser reconhecidas pelos macrfagos, que tm receptores (CR1 e rC5a) para estas molculas (Figura 3). Quando o microorganismo est revestido de IgM e as molculas de C3b/C4b associam-se aos receptores especficos, na ausncia de C5a, a opsonizao inibida. No entanto, na presena de C5a, que se associa a receptores especficos (rC5a), a interao entre C3bC4b e seus receptores, induz a opsonizao.

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Figura 3 Mecanismo de opsonizao mediado por receptores do sistema Complemento

Receptor para C5a C5a + Macrfago IgMRC3b/C4b

-

C3b/C4b

RESPOSTA IMUNE SECUNDRIA Durante a resposta imune primria, os plasmcitos (secretores de anticorpos) e muitos linfcitos T morrem aps 2 ou 3 dias da sua ativao inicial. No entanto, durante esta resposta alm das clulas efetoras (as que foram participativas na resposta) so formados linfcitos de memria, que no so ativados e so reservados para contatos posteriores com o mesmo mesmo tipo de partcula estranha (ou antgeno). Estes linfcitos de memria (LT e LB), num segundo contato com o mesmo antgeno, propiciam uma resposta mais rpida, com a produo de anticorpos em 2 a 3 dias. Esta resposta denominada resposta imune secundria. Na resposta secundria, geralmente produzida uma maior concentrao de IgG (ou de IgA ou de IgE) e uma menor de IgM. A produo de IgG altera a forma com que o microorganismo pode ser destrudo, porque enquanto que a molcula de IgM altamente eficiente na ativao do sistema complemento, o mesmo no ocorre com a IgG. Isto evidenciado pelo fato de uma nica molcula de IgM poder causar um orifcio na membrana celular pela ativao do sistema complemento, enquanto que este mesmo efeito produzido por 2000 a 3000 molculas de IgG.

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Apesar da IgG no ser to eficiente na ativao do sistema Complemento, esta Ig importante no mecanismo de opsonizao por dois principais motivos: as clulas fagocticas expressam receptores para IgG. a IgG tambm ativa o sistema complemento e as clulas fagocticas expressam receptores para C3b e C4b. Desta forma a opsonizao pode ocorrer pelo reconhecimento de molculas de IgG e do sistema complemento ligadas membrana do microorganismo (Figura 4).Figura 4 Opsonizao mediada por molculas de IgG e do sistema Complemento.

IgG

rFcIgGrC3b/C4b

+Macrfago

C3b/C4b

Para compreendermos como as Igs reconhecem os antgenos e associam-se a receptores de membrana da clula fagoctica temos que conhecer a estrutura destas molculas (Figura 5). ESTRUTURA DAS IMUNOGLOBULINAS A estrutura das Imunoglobulinas ser abordada de forma mais detalhada no captulo 7; aqui sero feitas algumas consideraes para que seja compreendido como estas molculas exercem a dupla funo de reconhecimento do antgeno e de associao a receptores na membrana das clulas.

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As Imunoglobulinas so protenas constitudas de 4 cadeias polipeptdicas sendo que duas delas apresentam peso molecular alto (PM = 55 a 70 kilodaltons [kD]) e as outras duas, peso molecular menor (PM = 24 kD). As cadeias de alto e baixo PM so denominadas, respectivamente, cadeias pesadas e leves (Figura 5). Ambas cadeias possuem regies em que as sequncias de aminocidos so constantes (em tons de verde, na figura 5) e regies em que as sequncias so variveis (em vermelho plido, na figura 5). As regies variveis das cadeias leves e pesadas so as responsveis pelo reconhecimento de sequncias de aminocidos presentes na superfcie de um microorganismo ou outro tipo de antgeno. As regies constantes das cadeias pesadas so as responsveis pela associao receptores presentes em clulas, tais como os receptores para Igs em macrfagos, que permitem a ocorrncia da opsonizao. Quando as Igs so submetidas digesto enzimtica, estas se dissociam em trs fragmentos: dois Fab (Fragment antigen binding - fragmento que se associa ao antgeno) e um Fc (Fragmento que se cristaliza). Cada Fab formado pela cadeia leve e por um pedao de cadeia pesada e o Fc formado por um fragmento de cadeia pesada (Figura 5). Desta forma, durante a opsonizao, o Fab associa-se superfcie do antgeno, enquanto que o Fc, aos receptores para Fc presentes na clula. As Igs possuem diferenas nas regies Fc (Captulo 7) e por isso existem receptores especficos para a IgG (e suas subclasses IgG1,IgG2, IgG3 e IgG4), a IgA e as outras Igs. No incio deste captulo, foi mencionado que as IgG1 e IgG3 humana so opsoninas; elas tm esta funo porque os macrfagos apresentam receptores somente para estas duas subclasses de Igs. Em sntese, foi visto que: quando um microorganismo est envolvido por anticorpos do tipo IgM, ele pode ser eliminado por lise pelo sistema complemento ou por opsonizao via receptores para C3b/C4b (CR1) e C5a (rC5a), oriundos da ativao do sistema complemento e que este mecanismo mais comum nas respostas do tipo primrio.

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Quando um microorganismo est revestido por anticorpos do tipo IgG, ele pode ser eliminado por lise pelo sistema complemento ou por opsonizao via receptores para IgG1 e IgG3 e receptores para molculas C3b/C4b do complemento.Figura 5 Estrutura das Imunoglobulinas

Cadeia Pesada

Fab

Cadeia Leve

Regio varivel

Regio varivel

Regio constante

Regio constante

Fc

CITOTOXICIDADE CELULAR DEPENDENTE DE ANTICORPOS (ADCC) Quando o antgeno uma clula tumoral ou um verme helminto, e estes esto revestidos de anticorpos, no existe possibilidade fsica de ingesto destas partculas, pelo macrfago, porque estas so do mesmo tamanho da clula fagoctica. O mecanismo pelo qual clulas do sistema imune destrem ou lesionam estes antgenos, por extravasamento de produtos txicos, d-se o nome de Citotoxicidade Celular Dependente de Anticorpos (ADCC). Neste tipo de mecanismo, uma clula mata outra, na dependncia da presena de anticorpos. A ADCC ocorre quando uma clula tumoral est revestida de IgG1 e/ou IgG3 e macrfagos e/ou clulas NK, que possuem receptores para estas Igs, acoplam-se a ela (Figura 6). As clulas tumorais so mortas pelo macrfago pela secreo dos mesmos produtos que internamente matam bactrias, ou seja,

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produtos txicos oriundos do oxignio (perxido de hidrognio, nion superxido), produtos oriundos do nitrognio (NO) e enzimas lisossmicas. A morte mediada pelas clulas NK mediada pela liberao de perforina e granzima. O mesmo ocorre quando vermes helmintos esto revestidos de IgE e eosinfilos acoplam-se s IgEs atravs de seus receptores para a poro Fc desta Ig (Figura 7). Os vermes so lesionados pela ao de uma protena de alto peso molecular presente no centro dos grnulos dos eosinfilos - a Protena Bsica Principal (Captulo 2).

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Figura 6 Mecanismo de ADCC mediado por macrfagos e clulas NK

rFcIgG1 RFcIgG3

TNF- M

NK

Granzima, Lisozima

ROI NO enz.lisoss. Cl. tumoral

Figura 7 - Mecanismo de ADCC mediado por eosinfilos

rFcIgE

Eosinfilo

Protena Bsica Principal Helminto

IgE