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4 FDC esteticamente bastante interessante em que a imagem do sobrescrito, o carimbo e os selos surgem como complementa- res. O facto do carimbo comemorativo de primeiro dia ser da Gafanha da Nazaré faz todo o sentido, associando o motivo dos selos ao local do carimbo. Infelizmente, tal como se apresenta, nunca poderia circular porque não haveria local para escrever o nome e endereço do destinatário. No dia em que se escrevem estas linhas continua disponível para venda o FDC desta série, embora não seja possível escolher o local do carimbo. Sobrescritos do Primeiro Dia dos EUA em que os sobrescritos são pintados à mão por artistas. Podemos considerar que estamos perante exemplos do que muitos designam por “arte postal”. Retirados de um dos sites indicados na bibliografia FDC – OS MALDITOS Amigus Philatelicus Os sobrescritos do primeiro dia são, como todos sabemos, peças filatélicas que comportam um selo e um carimbo, sendo essencial que a data deste corresponda ao primeiro dia de circulação do selo. Porque a data é fundamentalíssima, e a generalização dos FDCs (First day covers como têm sido consagrado pela generalização da terminologia inglesa) está associada à correspondente vul- garização das emissões de selos comemorativos. Nestes a data aparece muitas vezes associada ao acontecimento comemorado e pode ser determinada com rigor. Selo e carimbo datador, muitas vezes um carimbo conce- bido exclusivamente para a data de lançamento, com data do primeiro dia de circulação, eis os elementos constitutivos do FDC. Esta classificação genérica engloba uma multiplicidade de situações. Em primeiro lugar, quanto ao suporte. Embora a designa- ção se refira a sobrescritos, caso estejamos perante um cartão que comporta os referidos selos e carimbo ou pe- rante um inteiro postal com carimbo de data do primeiro dia de circulação podemos considerar estar perante a mes- ma realidade. Em segundo lugar, quanto à origem. A sua criação tanto pode resultar da iniciativa do coleccionador, de comerci- antes, da administração postal ou de qualquer outra insti- tuição. Em terceiro lugar, quanto à forma. Ora se opta por um sobrescrito ou cartão branco onde se coloca o selo e o carimbo datador, ora se produz um material de suporte que pelas suas imagens acrescenta nova informação sobre o evento comemorado. Ora essa informação adicional é produzida em série ora estamos perante um trabalho de artesanato, quiçá artístico, único. Também o carimbo uti- lizado pode ser comemorativo (devendo corresponder ao evento) ou não. Em quarto lugar, quanto à circulação. Há FDC que nunca circularam, há FDC que talvez tenham circulado não sen- do possível afirmá-lo categoricamente, há FDC que apre- sentam provas bastantes de circulação, nomeadamente porque houve registo. E a circulação efectiva dessas car- tas, cartões ou inteiros postais, pode ter sido feita com os valores oficialmente exigidos para o percurso ou com va- lores superiores, para o que não há qualquer impedimen- to, ou inferiores.

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FDC esteticamente bastante interessante em que a imagem dosobrescrito, o carimbo e os selos surgem como complementa-res. O facto do carimbo comemorativo de primeiro dia ser daGafanha da Nazaré faz todo o sentido, associando o motivodos selos ao local do carimbo.Infelizmente, tal como se apresenta, nunca poderia circularporque não haveria local para escrever o nome e endereço dodestinatário. No dia em que se escrevem estas linhas continuadisponível para venda o FDC desta série, embora não sejapossível escolher o local do carimbo.

Sobrescritos do Primeiro Dia dos EUA em que os sobrescritossão pintados à mão por artistas. Podemos considerar queestamos perante exemplos do que muitos designam por “artepostal”. Retirados de um dos sites indicados na bibliografia

FDC – OS MALDITOS

Amigus Philatelicus

Os sobrescritos do primeiro dia são, como todos sabemos,peças filatélicas que comportam um selo e um carimbo,sendo essencial que a data deste corresponda ao primeirodia de circulação do selo. Porque a data éfundamentalíssima, e a generalização dos FDCs (First daycovers como têm sido consagrado pela generalização daterminologia inglesa) está associada à correspondente vul-garização das emissões de selos comemorativos. Nestes adata aparece muitas vezes associada ao acontecimentocomemorado e pode ser determinada com rigor.Selo e carimbo datador, muitas vezes um carimbo conce-bido exclusivamente para a data de lançamento, com datado primeiro dia de circulação, eis os elementosconstitutivos do FDC.Esta classificação genérica engloba uma multiplicidade desituações.Em primeiro lugar, quanto ao suporte. Embora a designa-ção se refira a sobrescritos, caso estejamos perante umcartão que comporta os referidos selos e carimbo ou pe-rante um inteiro postal com carimbo de data do primeirodia de circulação podemos considerar estar perante a mes-ma realidade.Em segundo lugar, quanto à origem. A sua criação tantopode resultar da iniciativa do coleccionador, de comerci-antes, da administração postal ou de qualquer outra insti-tuição.

Em terceiro lugar, quanto à forma. Ora se opta por umsobrescrito ou cartão branco onde se coloca o selo e ocarimbo datador, ora se produz um material de suporteque pelas suas imagens acrescenta nova informação sobreo evento comemorado. Ora essa informação adicional éproduzida em série ora estamos perante um trabalho deartesanato, quiçá artístico, único. Também o carimbo uti-lizado pode ser comemorativo (devendo corresponder aoevento) ou não.Em quarto lugar, quanto à circulação. Há FDC que nuncacircularam, há FDC que talvez tenham circulado não sen-do possível afirmá-lo categoricamente, há FDC que apre-sentam provas bastantes de circulação, nomeadamenteporque houve registo. E a circulação efectiva dessas car-tas, cartões ou inteiros postais, pode ter sido feita com osvalores oficialmente exigidos para o percurso ou com va-lores superiores, para o que não há qualquer impedimen-to, ou inferiores.

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Estas imagens foram retiradas de (VRIES, 2002, 784). Oprimeiro pretende mostrar que Daves Bennett, autor dosdesenhos e cartonista de profissão, tem um estilo muitopróprio. No segundo pretende mostrar, junto com outros FDCque os desenhos do sobrescrito pode ter «variedades». Note-seque no segundo há selos dos EUA e de França, aplicando-se aambos um carimbo americano. Parece-nos estar-se no campoda fantasia, certamente muito legítima desde que não se queraque seja filatelia.

Sobrescrito do Primeiro Dia com o bloco dos 500 anos dadescoberta do Brasil. Se os selos e os selos do bloco são iguaisnada justifica esta edição. Seguindo a tradição dos correiosnos últimos ano o FDC com o bloco foi emitido com carimbosde Lisboa, Porto, Coimbra, Évora, Faro, Funchal e PontaDelgada, assim como o FDC com os selos.Observe que o bloco não deixa qualquer espaço para escrevero nome do destinatário, a não ser que se escreva no própriobloco. É um absurdo.

Poderíamos ainda classificá-los pela intencionalidade: “Hácasos (...) de selos clássicos, inclusive o primeiro do mun-do, o célebre «Penny Black», que é conhecido sobre car-tas de 1º dia, ou seja o 6 de Maio de 1840, Há outrosmenos raros, mas mesmo assim difíceis de conseguir. Cons-tituem jóias das colecções clássicas de alto nível. Por ou-tro lado, são os FDCs mais autênticos, nascidos da neces-sidade real de enviar uma missiva e livre de qualquer sus-peita de serem preparados para fins filatélicos” (Jaschke,2002, 15)Falamos em selo mas podemos falar igualmente de bloco,carteira ou selos de máquina, vulgarmente designados deetiquetas.O primeiro FDC referenciado no catálogo de selos portu-gueses data de 20 de Dezembro de 1949, acompanhandoa série comemorativa do 16º Congresso Internacional deHistória da Arte.

Será que o FDC acrescenta informação significativa emrelação ao selo?Inevitável, mais que não seja porque o carimbo tem umadata que informa do lançamento do selo. Se estamos pe-rante um carimbo comemorativo a sua imagem dá umavisão complementar do objecto da comemoração e se o

suporte contem qualquer tipo de impressão é de admitirque tem uma relação de algum tipo com aquela. Em mui-tos casos há simultaneamente concordância entre selo,carimbo e suporte, uma concordância decomplementaridade.Nesta perspectiva, podemos considerar que existem algu-mas similitudes entre os FDCs e os Postais-Máximos: “Paraterminar, e antes e continuar a pormenorizar os regula-mentos oficiais, referiremos outros aspectos filatélicos quetêm bastante similitudes com os Postais-Máximos e quesão os Sobrescritos de 1º Dia. (...) Perguntando a Juan ACasas sobre esta questão ele respondeu-nos: «ocoleccionismo de Sobrescritos de 1º Dia entrariam dentrodo que a Marcofilia, que na actualidade não tem regrasdefinidas, pelo que os coleccionadores estão bastante de-siludidos. A Maximofilia tem o seu regulamento e nadatem a ver com aqueles, a não ser que os sobrescritos e ospostais levam um selo e um carimbo. (...) Os melhoressobrescritos são os que têm selos e carimbo com relação.Por outro lado a vinheta dos sobrescritos, que tão apreci-ada é pelos coleccionadores, não têm qualquer interessepara os jurados temáticos, que preferem o sobrescrito semvinheta, isto é, em branco e circulado.” (Rodríguez, 1998)Existem algumas similitudes mas também algumas dife-renças, para além das resultantes dos materiais de suporte.Nos FDCs há uma concordância de data muito maisrestritiva: não basta que o carimbo corresponda à data devigência da circulação do selo, é necessário que seja doprimeiro dia de circulação. Simultaneamente há uma totalpermissividade em relação ao local. Qualquer serve, em-bora muitos coleccionadores prefiram que haja uma rela-

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Este FDC do Canada é interessante pela complementaridadeque apresenta entre os três elementos. O simbolismo do selodo Ano Internacional da Criança é artisticamente representadona imagem em tecido que é colocada no lado esquerdo dosobrescrito. Canadá foi dos poucos países que não colocou o«emblema» do Ano Internacional da Criança no próprio selo,pelo que o carimbo traz uma informação adicional. É um FDCde iniciativa privada. O oficial tem uma imagem diferente.

FDC do 4º Centenário da Fundação da Universidade de Évora,circulado, em sobrescrito normal. O carimbo do Estoril, noverso, com a data de 19.07.1960 confirma a circulação,embora esta se tenha feito com um valor nominal superior aonecessário.

ção entre o local do carimbo e o acontecimento comemo-rado: “2. O que é o Primeiro Dia de Emissão? O PrimeiroDia de Emissão é o primeiro dia que um determinado seloé posto à venda. Esta data pode ter um significado especi-al no assunto retratado no selo. 3. O que é a Cidade deEmissão? Cidade do Primeiro Dia? A Cidade de Emissãoé a cidade e o estado actual em que o selo é emitido eposto à venda para o público. Frequentemente esta cidadetem um significado especial no assunto reflectido no selo”(AFDCS).Recordemos, no entanto, a questão colocada: “Será que oFDC acrescenta informação significativa em relação aoselo?” Significa isto que estamos a tomar como referênciapara análise dos FDCs o selo. Se estamos a falar de filate-lia não podemos centrar a nossa atenção senão no docu-mento que prova um pagamento para circulação. Tomarcomo referência fundamental os desenhos colocados so-bre os sobrescritos já pouco tem a ver com filatelia. Pode-rá ser arte postal, poderá ser qualquer outra coisa cujadesignação ainda está por inventar, mas não será o que atéagora se tem entendido por filatelia.

Partindo do nosso ponto de vista de que todas as formas econteúdos filatélicos são válidos desde que tal contribuapara o bem-estar de quem os usa, de que a filatelia visaessencialmente servir os homem no seu prazer, na sua cul-tura e no seu relacionamento mútuo, nada há a objectar aocoleccionismo de FDC, seja de forma autónoma, seja in-tegrando-os nas mais diversas colecções.Muitos coleccionadores têm dedicado atenção aos Sobres-critos do Primeiro Dia, quer integrando-os nas suas diver-sas colecções, quer dedicando-lhes uma atenção muitoespecial, como o demonstram os clubes especificamentedirigidos ao seu coleccionismo.No entanto não tem sido esse o entendimento das organi-

zações filatélicas, não é isso que consta dos regulamentosdas exposições. Na História Postal nada têm a dizer por-que não são peças circuladas dentro da normalidade. NaFilatelia Clássica colocam-se as mesmas reticências. NaFilatelia Temática são malvistos: “É certo que a ilustração(não filatélica por definição) que figura nestes documen-tos é mais incómoda que útil numa colecção temática; paraa colocação da obliteração é preferível utilizar um sobres-crito normal. Se não for possível evitar esta ilustração épelo menos possível dissimulá-la na montagem”(MIGOUX, 1995, 91)E, no entanto, apesar desta rejeição oficial dos FDC vai-se agora ventilando a ideia de que poderá haver nas expo-sições uma classe dedicada aos Sobrescritos do PrimeiroDia. Afinal poderão a curto prazo vingarem-se do despre-zo a que foram devotados e obterem lugar nas vaidadesdas elites.

Como se compreende esta eventual mudança de postura,caso se venha a verificar?Será possível admitir que resulta do reconhecimento dumerro anteriormente assumido. Mas não parece ser essa arazão. Se assim fosse muitas alterações teriam que ser fei-tas: por exemplos, como se justifica que a Marcofilia nãotenha autonomia expositiva? como se explica que haja oreconhecimento da Aerofilatelia e Astrofilatelia e não ohaja do correio marítimo? Se assim fosse estaríamos pe-rante um dinamismo da Federação Internacional de Fila-telia (FIP) que em mais nada se nota.É fácil de encontrarmos a justificação se olharmos para ocomportamento das administrações postais: durante anossucessivos emitiram toneladas de FDCs, desacreditandoestes. Tirando raras excepções fabricam peças de 1º Diadurante meses ou anos. Tirando raras excepções a locali-dade do carimbo nada tem a ver com o acontecimento

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comemorado, inventando-se sempre novas cidades parapermanentemente se produzirem FDCs. Muitas vezes osFDCs têm formatos que torna inadequada a sua normalcirculação.E porque assim se comportaram e comportam, as admi-nistrações postais e os comerciantes, estão a abarrotar deFDCs. Basta ir a uma feira, a uma loja, a um leilão naInternet para se constatar isso mesmo. A oferta é muitíssi-mo maior que a procura, até porque esta exige qualidade eaquela só olha para os cifrões. Os estoques não se esco-am, nem quase dados. Logo a FIP, solicita a tais proble-mas, vem tentar criar artificialmente um novo estímulo àprocura.

Sejamos bem claros.Nada temos contra os Sobrescritos do Primeiro Dia. Mui-tos deles estão nas nossas colecções.O que não podemos concordar é que os desvarios da ofer-ta sejam mais uma vez pagos pelos coleccionadores, pro-vavelmente pelos mais incautos.

BIBLIOGRAFIAAFDCS, American First Day Cover Society, http://www.afdcs.org/, http://www.hpfdc.com/AUROUSSEAU, Henri (1997), “...” Timbroscopie (nº 149,Set. 1997)JASCHKE, Karl Lothar, “Os envelopes de Primeiro Dia”,Sociedade Philatelica Paulista, Junho 2002MAGALHÃES, Miguel Rodrigues de (2002), “F.D.C.’sFirst day covers = Envelopes de 1º dia”, SociedadePhilatelica Paulista, Junho 2002MIGOUX, Robert, La Philatélie Thématique, 1995, Édi-tions GIPPIMENTA, Carlos, A Filatelia em Portugal, http://www.caleida.pt/filatelia, “Glossário”RODRÍGUEZ, José R. (1998), “Maximofilia”, El Eco (Nº1050, Fev. 1998)VRIES, Lloyd de, “First day covers: Collecting ByCachetmaker”, American Philatelist Vol. 116, nº 8, Se-tembro 2002