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POLÍCIA MILITAR DO DISTRITO FEDERAL DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO E CULTURA DIRETORIA DE APERFEIÇOAMENTO E EXTENSÃO CENTRO DE APERFEIÇOAMENTO E EXTENSÃO CURSO DE APERFEIÇOAMENTO DE OFICIAIS FENOMENOLOGIA DA VIOLÊNCIA E DO CRIME PORTE ILEGAL DE ARMAS E HOMICÍDIOS Professor: Msc. NELSON GONÇALVES DE SOUZA – CEL PM RR Oficiais Alunos: CAP JOSÉ DO NASCIMENTO RÊGO MARTINS, Mat. 50.560/9 CAP ROBERTO MENDES C. DE SOUSA, Mat. 50.644/3

Fenomenologia da Violência e do Crime

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Estudo do fenômeno relacionado ao decréscimo dos Índices de Homicídios no Brasil a partir de 2003, correlacionado ao decréscimo do Porte Ilegal de Armas, sob a ótica da Criminologia.

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POLÍCIA MILITAR DO DISTRITO FEDERAL

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO E CULTURA

DIRETORIA DE APERFEIÇOAMENTO E EXTENSÃO

CENTRO DE APERFEIÇOAMENTO E EXTENSÃO

CURSO DE APERFEIÇOAMENTO DE OFICIAIS

FENOMENOLOGIA DA VIOLÊNCIA E DO CRIME

PORTE ILEGAL DE ARMAS E HOMICÍDIOS

Professor: Msc. NELSON GONÇALVES DE SOUZA – CEL PM RR

Oficiais Alunos:CAP JOSÉ DO NASCIMENTO RÊGO MARTINS, Mat. 50.560/9

CAP ROBERTO MENDES C. DE SOUSA, Mat. 50.644/3

CAP EMÍLIO CASTELLAR, Mat. 50.624/9

CAP ANTONIO GOMES SILVA SOBRINHO, Mat. 50.610/9

CAP QOPM LEANDRO FRANKLIN DE OLIVEIRA, Mat. 50.619/2

Brasília-DF, 16 de julho de 2010

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CENTRO DE APERFEIÇOAMENTO E EXTENSÃO

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CAP JOSÉ DO NASCIMENTO RÊGO MARTINS, Mat. 50.560/9

CAP ROBERTO MENDES C. DE SOUSA, Mat. 50.644/3

CAP EMÍLIO CASTELLAR, Mat. 50.624/9

CAP ANTONIO GOMES SILVA SOBRINHO, Mat. 50.610/9

CAP QOPM LEANDRO FRANKLIN DE OLIVEIRA, Mat. 50.619/2

Brasília, 2010

Relatório de Trabalho em Grupo como requisito da Disciplina Fenomenologia da Violência e do Crime ministrada para o Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais da Polícia Militar do Distrito Federal – ano 2010 pelo Prof.: Msc. Nelson Gonçalves de Souza - Cel PM RR

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1- Introdução O porte ilegal de arma é um crime que tem a peculiaridade de ter sido considerado durante

décadas apenas uma contravenção penal prevista no Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941. Contudo a partir do ano de 1997 passou a ser considerado crime nos termos do artigo 10 da Lei nº 9.437/97 com pena de detenção de 01 (um) a 02 (dois) anos e multa. Posteriormente, a Lei nº 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento) aumentou a pena do porte ilegal de arma para de 02 (dois) a 04 (quatro) anos de reclusão e multa, para armas de uso permitido e de 03 (três) a 06 (seis) anos e multa para armas de uso proibido, passando o infrator a não contar mais com os benefícios da Lei nº 9.099/95, pois deixou de ser concebido como crime de menor potencial ofensivo.

2 - Caracterização do Fenômeno Segundo estudo publicado na 1º Conferência Nacional de Segurança Pública – CONSEG,

2009, a dinâmica de exacerbação progressiva da pena referente a essa tipificação, aliada ao maior rigor para o cidadão adquirir uma arma de fogo, bem como maiores exigências para a obtenção da autorização para o porte, a partir do Estatuto do Desarmamento, passaram a provocar uma redução da quantidade de armas em circulação. Essas medidas impactaram também o mercado ilegal, já que as armas tornaram-se mais raras e, por isso, mais caras.(MJ, 2009)

Entre os requisitos mais restritivos do citado estatuto está a proibição do porte de armas para civis, autorizando a aquisição de 01 (uma) arma por pessoa apenas para posse desde que o solicitante seja maior de 25 anos, sem antecedentes criminais, comprove aptidão psicológica e técnica, além da real necessidade. Essas medidas, que passaram a vigorar imediatamente após a sanção da nova lei, reduziram drasticamente o número de estabelecimentos comerciais de venda de armamentos de 2400 em 2002 para 280 em 2008, reduzindo também o número de portes concedidos.(MJ, 2009).

Além dessas medidas, campanha de entrega voluntária de armas e campanha de recadastramento voluntário que previam a anistia, o anonimato e a indenização foram realizadas, o que resultou no recolhimento de 459.000 armas entre 2004 e 2005 e recadastramento de mais 600.000 armas que, ao saírem da ilegalidade, agora podem ser rastreadas. Estima-se que ainda haja oito milhões de armas ilegais no Brasil.(MJ, 2009)

Para se analisar uma tendência é necessária uma série histórica. Nesse contexto, levantamento sobre homicídios no Brasil, realizado pelo United Nations Office on Drugs and Crime (UNODC), mostra uma série histórica de 1980 a 2007, a partir de dados públicos oficiais de mortalidade do DATASUS/Ministério da Saúde, cruzadas com dados oficiais demográficos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no Brasil, por região e por Unidade Federativa (UF). Os dados do DF são apresentados no gráfico I e se referem apenas a mortes por agressão. Nele, verifica-se um declínio da taxa de homicídios em geral e os praticados por arma de fogo em particular, no Distrito Federal (DF) a partir do ano de 2003, ano de publicação do Estatuto do Desarmamento. A média das capitais brasileiras foi inserida para servir como base de comparação. (UNODC, 2007)

Segundo o Ministério da Saúde (2007), a edição do Estatuto do Desarmamento em 2003 é apontada como principal responsável pela redução de 12% entre 2003 e 2006, na taxa nacional de homicídios do país após 13 anos consecutivos de crescimento.(MS, 2007)

Segundo Cerqueira (2010), em uma pesquisa do Instituto de Pesquisa Aplicada (IPEA), em São Paulo houve uma queda de 61% nos índices de crimes como homicídio e latrocínio entre 2001 e 2007, com aceleração após o Estatuto. Foram também registradas quedas nos índices de suicídio e de acidentes domésticos com armas de fogo. O estudo estimou que a cada 18 armas apreendidas, uma vida foi salva. De 2001 a 2007, foram apreendidas naquele estado 228.813 armas. (CERQUEIRA, 2010)

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Taxa de homicídios no DF x homicídios no DF com uso de arma de fogo - Número a cada 100.000 habitantes

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1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006

Distrito FederalMédia nas Capitais brasileirasNo DF com uso de arma de fogo

Gráfico I. Série histórica de Taxas de Homicídio no Brasil e no DF. Fonte: (UNODC, 2007)

Segundo o Ministério da Justiça (2009), essa redução pôde ser verificada em 16 estados brasileiros, porém maior correlação entre o grande índice de recolhimento de armas e redução de risco de mortalidade por homicídio foi observada em 05 UFs, entre elas o DF.(MJ, 2009)

3 - Teoria Sociológica Explicativa Segundo Molina e Gomes (2007), existem três modelos teóricos explicativos para o

comportamento criminal, a saber: a biologia criminal, a psicologia criminal e a sociologia criminal.(MOLINA E GOMES, 2007, p.206)

Partindo do pressuposto de que no crime de porte ilegal de arma não há uma vítima específica, mas potencial, pois o bem jurídico tutelado é a incolumidade pública, verifica-se que é notadamente concebido como crime subsidiário de outros delitos mais graves, o que ficou comprovado com o resultado das ações decorrentes do Estatuto do Desarmamento. Podemos inferir que a arma de fogo pode ser instrumento para comportamentos criminais dentro de qualquer dos três modelos propostos por Molina e Gomes.

3.1 -Teoria das Atividades Rotineiras (TAR) ou da Oportunidade Entretanto, os dados mostram que na maior parte dos casos de homicídio, a vítima e o autor já

se conheciam e freqüentemente não tinham antecedentes criminais, o crime ocorreu há poucos quilômetros da casa de algum deles, por motivos pessoais de brigas ou vingança, em situações banais cotidianas, tanto que ao passo que houve declínio nos índices de homicídio praticados por armas de fogo, houve também aumento dos índices de lesões corporais dolosas, indicando que muitas disputas violentas antes resolvidas com arma de fogo, se transformaram em brigas com menor potencial ofensivo. Com menos armas, menos oportunidades para cometer homicídios. (MJ, 2009)

Ainda segundo Molina (2007), apud Cohen e Felson, “para o efetivo cometimento do crime são necessários três fatores: um deliquente motivado com as habilidades técnicas necessárias, um objeto apropriado (pessoa ou coisa), isto é, valioso e acessível ao infrator e a ausência de guardiões”. Neste sentido, a redução do acesso às armas e o incremento na fiscalização e apreensão das mesmas retirou a habilidade técnica do infrator ou meio de cometimento do crime: A arma de fogo. (MOLINA e GOMES, 2007. p.214)

O fenômeno também poderia ser explicado pela Teoria da Opção Racional (TOR), na medida que os fatores de decisão motivadora são identificados como a relação custo-benefício que era pretensamente compensadora para o ofensor (DANTAS et al, 2006, p.8), antes da edição do Estatuto do Desarmamento. Essa relação sofreu alterações ao longo do tempo e foi se tornando progressivamente menos compensadora com o aumento da pena, o que pode explicar em parte a redução do porte ilegal de armas e consequentemente dos índices de homicídios.

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Para Molina e Gomes (2007) "uma opção reflexiva, calculada, oportunista, que pondera os custos, riscos e benefícios sempre em função de uma oportunidade ou situação concreta são fatores que influenciam o criminoso a decidir sobre sua ação”. Não basta a existência de um delinqüente motivado, é necessário que haja a oportunidade propícia para o cometimento do fato criminoso (MOLINA e GOMES, 2007, p.213).

4 - Explicação pela Criminologia ambientalDe acordo com Dantas et al (2006), partindo dos pressupostos estabelecidos pela Criminologia

Ambiental, para que seja entendido o evento criminal temos cinco dimensões a serem consideradas: o espaço, o tempo, a legislação, o criminoso e a vítima, não necessariamente nessa ordem. Esses cinco componentes constituem as condições necessárias e suficientes para a ocorrência de um crime. (DANTAS et al, 2006, p.7)

Segundo as constatações estatísticas sobre o homicídio, esse crime também está relacionado a brigas em bares e em determinados locais conhecidos como Hot Spots ou Zonas Quentes de Criminalidade. Ou seja, estão distribuídos espacialmente no ambiente urbano e em determinados horários, geralmente no período noturno. Foi identificado também o perfil dos autores e vítimas, que são do sexo masculino e se encontram predominantemente na faixa etária entre 15 e 24 anos, correspondendo a 38% dos casos.

Dessa forma, tem-se as cinco dimensões da Criminologia Ambiental, observando-se que 70% dos crimes de homicídio são provocados por arma de fogo, evidenciando a clara correlação entre as duas tipificações.

5 – Mitigação do Fenômeno pela Prevenção SituacionalAs ações realizadas em conseqüência do Estatuto do Desarmamento reduziram o alarmante

índice de homicídios nas principais capitais brasileiras, mas esses números estão distantes de uma situação confortável.

Segundo Molina e Gomes (2007), as numerosas técnicas de prevenção situacional classificam-se em quatro grandes grupos: as orientadas a incrementar a percepção do esforço associado com um particular delito, as que incrementam a percepção do risco, as tendentes a reduzir as recompensas esperadas e as que potencializam os sentimentos de culpa do infrator. Nessa linha de raciocínio, uma “técnica de prevenção situacional que persegue o incremento do esforço com fins preventivos é o chamado controle de facilitadores, ou objetos que se utilizam decisivamente na prática de delitos”. Está incluído nesse subgrupo o controle das armas (MOLINA e GOMES. 2007, p.384)

Seguindo o exemplo de São Paulo, que já vinha reduzindo seus índices de homicídio desde 2001, mesmo antes do Estatuto do Desarmamento, (CERQUEIRA, 2010) por meio de operações de combate ao porte ilegal de armas, intensificando a fiscalização e apreensão de armas através de blitz e abordagens por parte da sua Polícia Militar, a recomendação proposta é o planejamento e execução de ações dessa natureza que levem em consideração as cinco dimensões criminológicas ambientais, principalmente a dimensão espacial, já que é totalmente possível conhecer os locais de maior incidência dos dois tipos criminais por meio das técnicas de Geoprocessamento que permitem a delimitação das Zonas Quentes de Criminalidade, bem como da dimensão do autor, que já tem seu perfil conhecido. Essas ações devem ser coordenadas e constantes e não aleatórias e esporádicas.

6 – ConclusãoO fenômeno enfocado pode ser visto por vários ângulos e possui complexidade inversamente

proporcional à exigüidade de tempo e de laudas disponíveis para a realização desse Relatório de Grupo de Trabalho. As Teorias Criminológicas abordadas são descritas em Teses e Dissertações inteiras e certamente o tema do presente estudo poderia ser abordado em mais um trabalho nesse nível. Portanto, seria pretensão acreditar que o apresentado explica o fenômeno em sua inteireza, mas tivemos a oportunidade de ter contato com as Teorias que permitirão sair da abordagem cartesiana do crime e partir para a compreensão fenomenológica do homo complexus.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CERQUEIRA, Daniel. Resultados de pesquisa PUC-IPEA. In: 4º Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2010.

DANTAS, George Felipe Lima de et al. O medo do crime. 2006. Disponível em: http://www.observatorioseguranca.org/pdf/01%20(60).pdf. Acesso em 15/07/2010.

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA - MJ. Primeira Conferência Nacional de Segurança Pública - CONSEG. Cadernos Temáticos Ano 01, N.2, 2009.

MINISTÉRIO DA SAÚDE – MS. Redução dos Homicídios no Brasil, 2007. Disponível em: http://www.deolhonoestatuto.org.br/index.php?option=com_conten&task=view%id=23&itemid=27. Acesso em 15/07/2010.

MOLINA, Antonio García Pablos de; GOMES, Luiz Flavio. Criminologia. 6ª ed. São Paulo: RT, 2007.

UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME – UNODC. Brasil e Cone Sul. Dados Estatísticos, 2007. Disponível em http://www.unodc.org/southerncone/pt/crime/informacoes-adicionais.html. Acesso em 15/072010.