38
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Fernando Herculano Gonçalves 2010 - ibconcordia.org Natureza da Fé.pdf · 8 Enciclopédia de Bíblia Teologia e Filosofia, pag.693 . 9 “Ora, se é corrente pregar-se que Cristo

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A NATUREZA DA FÉ

A fé em Perspectiva

Fernando Herculano Gonçalves

2010

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RESUMO

Essa pesquisa apresenta uma reflexão bíblica a respeito da fé, tema esse abordado

e desenvolvido em todas as Escrituras. A abordagem apresenta desde a etimologia

do termo fé, apresentação a respeito de sua origem, sua natureza e aplicações. A fé,

é aqui apresentada como um dom, uma graça de Deus ao homem, não que ele a

receba de modo completa, ele recebe uma semente, um princípio que em si

plantada, pode desenvolver gerando diversos benefícios. Gerada por Deus, mas

exercida pelo homem. Assim sendo, ela se torna o instrumento provido por Deus,

para que o homem O perceba, relacione e desenvolva sua vida espiritual.

Palavras-Chaves: Fé, graça, dom, salvação, mediação, chamado, resposta.

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SUMÁRIO

1 Introdução..............................................................................................................10

2 Definições Gerais...................................................................................................11

3 Os Tipos de Fé.......................................................................................................13

3.1 A Fé Objetiva....................................................................................................13

3.2 A Fé Subjetiva..................................................................................................14

4 A Origem da Fé......................................................................................................16

5 Fé e Razão.............................................................................................................19

5.1 O Campo da Razão..........................................................................................19

5.2 O Campo da Fé................................................................................................21

6 A Fé e a Salvação.................................................................................................23

7 A Justiça de Deus Mediante a Fé.........................................................................26

7.1 A justiça pela fé é Anterior à Nova Aliança......................................................27

8 As Aplicações da Fé..............................................................................................30

9 A Fé, Uma Virtude Progressiva.............................................................................33

9.1 Porque a Fé Desenvolve?................................................................................33

9.2 Como a Fé Desenvolve?..................................................................................34

10 A Fé Como Resposta...........................................................................................36

11 A Fé e a Prática Cristã Social...............................................................................39

12 Conclusão..............................................................................................................42

13 Referências Bibliográficas.....................................................................................43

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1 INTRODUÇÃO

Sabe-se que a fé é um amplo e complexo assunto, pertinente ao ser

humano e a toda forma de religião. Esse é o tema proposto para esse estudo.

Sobretudo, o foco da pesquisa será a Bíblia. Como as Escrituras apresentam o

tema? Já que Elas são consideradas o Livro da Fé.

A fé sob vários pontos de vista será analisada para que as minúcias

sejam compreendidas. E perguntas altamente relevantes serão respondidas para

descortinar os mistérios da fé.

A proposta desse documento visa uma compreensão do termo fé e seus

correlatos, sua origem, os tipos distintos, a relação fé e razão, sua importância

diante da obra de salvação, seu desenvolvimento e operação.

A fé também é apresentada como o único modo possível de iniciar e

manter a comunhão com Deus. E ela é apresentada como originada no Eterno, que

a aperfeiçoa, para que o homem tenha uma maior percepção das coisas divinas. A

fé é o modo através do qual Deus o Criador, ameniza as deficiências humanas

devidas ao pecado, para que esse possa compreender a verdade.

A fé também é apresentada como fundamental para que a sociedade seja

influenciada a partir dos valores do Reino de Deus.

É a fé a bússola que orientará todo aquele que está em busca da

verdade, pois ela é a percepção das coisas que não se podem ver.

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2 DEFINIÇÕES GERAIS

A fé é um assunto próprio da Bíblia, e são vários os termos originais que

são traduzidos como fé ou palavras sinônimas.

Segundo o NDB1, o termo fé é encontrado apenas duas vezes no Antigo

Testamento: em Deuteronômio 32.20 e Habacuque 2.4, e em ambas as referências

o termo hebraico é “emuná” que significa firmeza, fidelidade e estabilidade.

Essas não são as únicas referências a fé no Antigo Testamento, pois, é

expressa através de outros verbos como: crer, confiar e esperar, como é observado

na seguinte passagem:

“Ele creu no SENHOR, e isso lhe foi imputado para justiça”. (Gênesis 15.6)

Essa é uma referência a Abraão que exerceu fé em Deus e nessa

passagem o termo hebraico usado é “’aman” que significa apoiar, confirmar, ser fiel,

confiar, crer.

No Novo Testamento, segundo o NDB2 o termo fé é altamente relevante.

O substantivo “pistis” e o verbo “pisteuo” ocorrem ambos mais de duzentas e

quarenta vezes, e o adjetivo “pistos” ocorre sessenta e sete vezes. Esses são os

principais termos gregos traduzidos por fé para a língua portuguesa.

O termo que mais aparece no Novo Testamento traduzido por fé é “pistes”

que é verificado no seguinte texto:

“E recebeu o sinal da circuncisão como selo da justiça da fé que teve quando ainda incircunciso; para vir a ser o pai de todos os que crêem, embora não circuncidados, a fim de que lhes fosse imputada a justiça, e pai da circuncisão, isto é, daqueles que não são apenas circuncisos, mas também andam nas pisadas da fé que teve Abraão, nosso pai, antes de ser circuncidado.” (Romanos 4.11, 12)

De acordo com a Bíblia Online3, o significado de “pistis” é: convicção da

verdade de algo, crença que diz respeito ao relacionamento do homem com Deus e

1 O Novo Dicionário da Bíblia, p. 605

2 O Novo Dicionário da Bíblia, p. 606

3 Bíblia Digital On line

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com as coisas divinas, geralmente com a idéia inclusa de confiança e fervor santo

nascido da fé e unido com ela, fé religiosa, fidelidade, lealdade.

Em relação a Deus: A convicção de que Deus existe e é o criador e

governador de todas as coisas, o provedor e doador da salvação eterna em Cristo

Em Relação a Cristo: Convicção ou fé forte de que Jesus é o Messias,

através do qual nós obtemos a salvação eterna no reino de Deus

Abaixo indicação dos principais termos relacionados a fé na Tradução

Brasileira Atualizada de João Ferreira de Almeida:

Palavra Quantidade Testamentos

Fé O1 Antigo

Fé 230 Novo

Crer 01 Antigo

Crer 15 Novo

Creu 03 Antigo

Creu 13 Novo

Confiar 07 Antigo

Confiar 03 Novo

“Ora, a fé é a certeza de coisas que se esperam, a convicção de fatos que

se não vêem.” (Hebreus 11.1)

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3 OS TIPOS DE FÉ

Sendo a fé um assunto amplo, pode-se perceber dois tipos diferentes: O

primeiro a fé como uma crença em um princípio doutrinário e o segundo, a fé como

uma virtude da alma.

Champlin4 apresenta esses dois tipos de fé e as nomeia da seguinte

forma: a crença em um código doutrinário como: A Fé Objetiva, e a fé como virtude

da alma: A Fé Subjetiva.

3.1 A Fé Objetiva

Essa modalidade de fé requer algo como o objeto da fé, ou como fonte e

base para a fé. É um princípio doutrinário no qual se acredita, a Bíblia é o objeto da

fé cristã de onde são extraídas a crenças e doutrinas.

“A fé objetiva, esse é o objeto da fé, aquilo em que se crê, o sistema dos princípios religiosos, como é o caso do cristianismo. Esse tipo de fé está confinado quase inteiramente, se não mesmo exclusivamente, às epístolas pastorais, onde seu emprego é mais freqüente.”

5

Segundo essa afirmativa, as Escrituras tornam-se o objeto da fé, que é

apoiada por seus princípios e doutrinas. As doutrinas cristãs formam um código

doutrinário no qual o cristão confia, são preceitos, ensinamentos, doutrinas e

dogmas.

A ressurreição, por exemplo, é uma doutrina bíblica, a qual o cristão

reivindica para si, dessa forma, aceita a ressurreição de Cristo e a ressurreição do

salvo no final dos tempos.

4 Russell Norman Champli, Ph. D. autor da Enciclopédia de Bíblia Teologia e Filosofia, p.692

5 CHAMPLIN, R. N. pag692, 693

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8

Segundo Norman Geisler6 a fé objetiva é então uma base racional onde a

virtude da fé se desenvolverá.

“Evidências da verdade devem preceder a fé. Nenhuma pessoa entra em um elevador sem razão para crer que ele vai sustentá-lo. Nenhuma pessoa sensata entra num avião que está sem parte de uma asa e com cheiro de fumaça na cabine. As pessoas lidam com duas dimensões de fé: fé que e fé em. Fé que dá a evidência e base racional para a confiança necessária para estabelecer fé em. Quando a fé que é estabelecida, podemos depositar fé em alguma coisa.”

7

Conclui-se então que para um bom e saudável exercício da fé, é

necessário o conhecimento da revelação de Deus por meio das Escrituras

Sagradas.

“Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina. Continua nestes deveres; porque, fazendo assim, salvarás tanto a ti mesmo como aos teus ouvintes.” (I Timóteo 4.16)

A doutrina é a fé objetiva, a qual deve ser conhecida e que sustentará o

exercício e a prática cristã.

3.2 A Fé Subjetiva

Segundo Champlin8 a fé subjetiva é o exercício da fé, por parte do homem

espiritual, é a fé exercida, a crença ativa, é a dependência a Cristo quando o homem

outorga sua alma aos seus cuidados. Pode-se usar o mesmo exemplo da

ressurreição que é uma doutrina bíblica fundamental do cristianismo. Se as

Escrituras afirmam que Cristo ressuscitou, e que o justificado por Cristo ressuscitará

igualmente, conclui-se que há uma base para que a fé exercida seja estabelecida e

desenvolva.

6 Norman Geisler, deão e professor de teologia e apologética no Southern Evangelical Seminary, Estados

Unidos. Renomado Apologista Cristão, autor de vários livros, dentre eles, a Enciclopédia Apologética.

7 GEISLER, N. pag 57

8 Enciclopédia de Bíblia Teologia e Filosofia, pag.693

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9

“Ora, se é corrente pregar-se que Cristo ressuscitou dentre os mortos, como, pois, afirmam alguns dentre vós que não há ressurreição de mortos? Mas, de fato, Cristo ressuscitou dentre os mortos, sendo ele as primícias dos que dormem.” (I Coríntios 15.12, 20)

A fé é uma virtude da alma inundada por razões suficientes que a fará

crer e esperar determinadas coisas. Nesse sentido essa fé deverá ser tanto limitada

quanto direcionada por aquilo que se crê, ou seja, a fé objetiva. Para que se evite

uma fé sem justificativa, inconsistente, incoerente e perigosa. Para tal se faz

necessário o estudo regular das Escrituras bem como um compartilhamento com

outros cristãos para que se evite os extremos e os excessos da religiosidade.

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10

4 A ORIGEM DA FÉ

Sabe-se que nas Escrituras há uma infinidade de homens que exerceram

a sua fé no Deus Eterno e Criador, e esse fenômeno do exercício da fé não está

restrito a tais figuras, e sim a inúmeras pessoas de todas as épocas bem como no

presente. Há uma pergunta intrigante: Qual a origem da fé, como ela nasce?

“olhando firmemente para o Autor e Consumador da fé, Jesus, o qual, em troca da alegria que lhe estava proposta, suportou a cruz, não fazendo caso da ignomínia, e está assentado à destra do trono de Deus. (Hebreus 12.2)

“Cristo é também o originador de nossa fé – tanto da fé objetiva, a fé cristã, como da nossa própria fé, que é a fé subjetiva, e isso através da operação do seu Espírito.”

9

Segundo Champlin10 Jesus é o originador da fé, ou seja, aquele que gera

a fé, ou dá início a fé. Em Hebreus 12.2 o autor sagrado revela que Cristo é o Autor

da fé. Pode-se, portanto, concluir que a fé não é puramente humana, já que é

produzida por Deus. Assim sendo, a fé não parece ser algo apenas do campo

racional, pois o ser humano é competente para tal, mas ela se revela como algo

espiritual e muito provavelmente que o homem por si só seria insuficiente ou incapaz

de produzi-la, por decorrência da corrupção espiritual que é o pecado.

“E, assim, a fé vem pela pregação, e a pregação, pela palavra de Cristo.” (Romanos 10.17)

Champlin11 diz que a fé vem pelo que se ouve, e não por causa do ato de

ouvir, a Palavra de Deus é a Semente da fé, concordando com isso a parábola do

Semeador que diz:

“Eis que o semeador saiu a semear. E, ao semear, uma parte caiu à beira do caminho; foi pisada, e as aves do céu a comeram. Outra caiu sobre a

9 Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado Versículo por Versículo, vol. 05, pag.640

10 ídem

11 ídem

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11

pedra; e, tendo crescido, secou por falta de umidade. Outra caiu no meio dos espinhos; e estes, ao crescerem com ela, a sufocaram. Outra, afinal, caiu em boa terra; cresceu e produziu a cento por um. Dizendo isto, clamou: Quem tem ouvidos para ouvir, ouça.” (Lucas 8.6-8)

E na interpretação da parábola Jesus diz:

“...a semente é a palavra de Deus.” (Lucas 8.11)

Dessa forma, a fé é gerada pela semente que é a Palavra de Deus e a

pregação se torna o meio para despertar o pecador gerando fé em seu coração.

Pode-se entender que o Evangelho é o modo através do qual Deus chama uma

pessoa.

“As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me

seguem.” (João 10.27) “A fé vem pelo que se ouve, e não por causa do ato de ouvir, o que

empresta uma significação diferente do que aparece no décimo sexto versículo. Aquilo que se ouve é aquela mensagem concernente a Cristo, e o Espírito Santo pode usar a mesma a fim de convencer os homens sobre a grande necessidade que eles têm do Salvador. A alma pode reagir favoravelmente a essa mensagem, rendendo-se ao Senhor Jesus, aceitando o destino preparado por ele para os remidos, a saber, a transformação deles segundo a imagem moral e metafísica do Filho de Deus. Ora, a essa reação favorável ou entrega é que damos o nome de fé. A fé, pois, envolve muito mais do que o assentimento mental a algum credo ou sistema doutrinário. Deve transcender a tudo quanto é físico e mental. É antes uma atividade espiritual, produto do Espírito Santo atuante no íntimo do homem, embora sempre com a cooperação do livre-arbítrio humano.”

12

O genuíno Evangelho pregado vai gerar a verdadeira fé espiritual dando

início ao relacionamento do homem com Deus, ficando patente que o próprio Criador

é quem acende a centelha da fé e do relacionamento homem e Deus.

Para confirmar essa afirmativa a fé é vista e descrita como um dom

espiritual, que é uma graça concedida pelo Espírito Santo:

“Porque a um é dada, mediante o Espírito, a palavra da sabedoria; e a outro, segundo o mesmo Espírito, a palavra do conhecimento; a outro, no mesmo Espírito, a fé; e a outro, no mesmo Espírito, dons de curar; a outro, operações de milagres; a outro, profecia; a outro, discernimento de

12

Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado Versículo por Versículo, vol. 03, pag.781

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espíritos; a um, variedade de línguas; e a outro, capacidade para interpretá-las.” (I Coríntios 12.8-10)

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13

5 Fé e Razão

A relação entre fé e razão é de grande importância para o cristão de sorte

que se torna um grande desafio a compreensão da dimensão dessas duas

possibilidades e realidades humanas. Esse tema constitui-se um dos maiores e

importantes debates entre cristãos reflexivos de todos os tempos.

Para Tomas de Aquino13, a fé e a razão se entrelaçam, a fé usa a razão e

a razão não pode ser bem-sucedida para se perceber a verdade sem a fé. A razão

se torna incapaz de produção da fé, apenas a acompanha.

“O livre-arbítrio é inadequado para o ato da fé, já que o conteúdo da fé está acima da razão...Então, o fato de um homem acreditar não pode surgir nele a não ser que Deus o conceda.”

14

Fé e razão operam juntas, se completam, mas é possível distinguir o

campo da fé e o campo da razão. O homem pelo fato de ser racional está

possibilitado ao exercício da fé, pelo fato da constituição humana: A racionalidade e

a espiritualidade.

5.1 O Campo da Razão

Segundo Aquino, a razão é necessária e suficiente para entender os

“preâmbulos da fé” como, por exemplo: a existência de Deus através de argumentos

filosóficos tradicionais ou através da teologia natural. É suficiente para analisar e

expor as doutrinas cristãs, já que elas podem ser compreendidas e expostas a partir

da revelação especial. A razão também é suficiente para a refutação de falsas

doutrinas.

13

Teólogo, filósofo e apologista da igreja medieval (1224-1274)

14 Geisler, N. p.341

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14

Mas para Aquino a razão não era suficiente para uma pessoa acreditar

em Deus. Apenas para provar que Deus existe, mas não convence a acreditar ou

confiar.

A razão abre o caminho para a crença. Entende-se para acreditar. Essa

ordem é observada de forma clara na parábola do semeador:

“E de muitas coisas lhes falou por parábolas e dizia: Eis que o semeador saiu a semear. E, ao semear, uma parte caiu à beira do caminho, e, vindo as aves, a comeram. Outra parte caiu em solo rochoso, onde a terra era pouca, e logo nasceu, visto não ser profunda a terra. Saindo, porém, o sol, a queimou; e, porque não tinha raiz, secou-se. Outra caiu entre os espinhos, e os espinhos cresceram e a sufocaram. Outra, enfim, caiu em boa terra e deu fruto: a cem, a sessenta e a trinta por um. Quem tem ouvidos para ouvir , ouça.” (Mateus 13.3-9)

“Atendei vós, pois, à parábola do semeador. A todos os que ouvem a

palavra do reino e não a compreendem, vem o maligno e arrebata o que lhes foi semeado no coração. Este é o que foi semeado à beira do caminho. O que foi semeado em solo rochoso, esse é o que ouve a palavra e a recebe logo, com alegria; mas não tem raiz em si mesmo, sendo, antes, de pouca duração; em lhe chegando a angústia ou a perseguição por causa da palavra, logo se escandaliza. O que foi semeado entre os espinhos é o que ouve a palavra, porém os cuidados do mundo e a fascinação das riquezas sufocam a palavra, e fica infrutífera. Mas o que foi semeado em boa terra é o que ouve a palavra e a compreende; este frutifica e produz a cem, a sessenta e a trinta por um.” (Mateus 13.18-23)

No texto da parábola e em sua interpretação vê-se claramente que a

razão abre o caminho para a fé; quanto à semente que caiu à beira do caminho, foi

comparada à pessoa que ouve a Palavra e não a compreende, a sua fé fica

infrutífera. Por outro lado, a semente que caiu em boa terra é interpretada pelo

próprio Jesus como a pessoa que ouve e compreende a mensagem. Essa é a

semente que frutifica.

Conclui-se que a razão foi necessária para que a fé fosse gerada

mediante a mensagem divina. E dessa forma pode-se afirmar que a fé não é

irracional, muito pelo contrário; a fé é pensada, refletida e compreendida.

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15

“A razão só pode ir até certo ponto. A fé vai além da razão e a completa. A fé não destrói a razão, mas vai além dela e a aperfeiçoa.”

15

5.2 O Campo da Fé

A fé por sua vez lida com a espiritualidade humana e é uma percepção

espiritual. Deve ser vista como uma graça de Deus para superar os efeitos da

corrupção do pecado no ser humano.

Se a razão possibilita saber que Deus existe, contudo, não é suficiente

para fazer alguém confiar em Deus. A confiança é transmitida a partir de uma

revelação, e isso é a fé, uma revelação de Deus.

“Além de ser necessária por causa da depravação humana, a fé também é necessária porque algumas coisas simplesmente vão além do poder da razão. Isso não significa que sejam contrárias à razão, mas que não são completamente compreensíveis.”

16

A salvação, por exemplo, não é um assunto apenas de ordem racional,

mas de revelação, fé e experiência: Apenas saber que Jesus Cristo morreu em uma

cruz para a redenção do homem não é suficiente para salvar alguém, esse é um fato

que pode ser conhecido e entendido, e mesmo assim isso ainda não é salvação.

Mas a fé se torna segundo a Bíblia o meio de salvação.

“Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus;” (Efésios 2.8)

A salvação, portanto é um resultado do exercício da fé, e não apenas

isso, mas também a experiência da vida cristã é proporcionada pelo mistério da fé.

Confiar em Deus é outorgar a alma aos seus cuidados.

A razão se encarrega de conhecer e a fé de experimentar o espiritual, daí

conclui-se que ela a completa. Se a razão abre o caminho, a fé a eleva.

15

Geisler, N. p.344

16 Geisler, N. p. 345

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16

“Quem acredita tem, de fato, motivo suficiente para acreditar, a saber, na autoridade do ensinamento de Deus, confirmado por milagres, e o mais importante, na inspiração interior de Deus convidando-o a acreditar.”

17

17

Geisler, N. p.342

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17

6 A FÉ E A SALVAÇÃO

Para Champlin18 as Escrituras e, sobretudo no Novo Testamento, nos

ensinos paulinos, a fé se torna essencial na obra redentora provida por Deus. Assim

sendo, o homem pecador participa da Graça de Deus no exercício de sua fé. Graça

e salvação mediadas pela fé de modo “independente” das obras humanas.

“Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie.” (Efésios 2.8, 9) “A graça de Deus é a fonte de nossa salvação. Mediante a fé. Paulo não diz nunca por causa da fé, pois a fé não é a causa, apenas o canal por meio do qual recebemos a nossa salvação”

19

Acerca dessas afirmativas podem-se considerar alguns pontos:

a. A fé não é nova forma de mérito que substitui as obras, de forma que a fé

agrade mais a Deus que as obras, a importância da fé é que ela constituiu

uma posição receptiva e de compreensão da verdade espiritual revelada.

Contribuindo com isso as próprias Escrituras também declaram que a fé sem

as obras é morta em si.

b. Não é a fé humana a causa da salvação. A causa ou o modo de salvação é

tudo aquilo que Cristo realizou através de sua vida, morte, ressurreição, etc.

Tudo isso é a graça de Deus manifestada e competente para gerar a

salvação. A fé constitui-se um meio, um caminho por onde a graça salvadora

se manifesta na vida do homem.

c. A fé não é a substância da salvação, a justiça de Deus sim é a substância da

salvação, justiça é o modo provido por Deus através do qual Ele em sua

graça aceita em sua comunhão o homem pecador.

18

Enciclopédia de Bíblia Teologia e Filosofia, v.2, pag.699

19 Harrison, Everett F. pag.168

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18

d. A fé é um instrumento da salvação. Equivale dizer que a fé é aquilo que trás a

salvação aos homens, o que faz os homens a receberem. Na fé está implícito

muitas outras ações ou iniciativas daquele que a exerce, como: entendimento,

arrependimento, confiança, esperança, dentre outros. O próprio Deus proveu

a fé como esse caminho de todo o seu plano eterno de redenção até ao

homem. A fé, portanto é o elo entre a graça e o pecador.

Percebe-se claramente que a fé é exigida por Deus em seu plano

salvador, Ele proveu todas as coisas para a salvação, mas exige ou capacita o

homem a recebê-la por meio da fé. Pode-se entender a fé e a salvação a partir da

seguinte analogia:

“A mão de um homem é capaz de trabalhar e de realizar muitas coisas. Entretanto, a mão não funcionará a menos que seja impulsionada pelos músculos e pelos nervos. E os músculos e os nervos operam por causa de sinais enviados pelo cérebro. Por igual modo , para que a salvação ocorra, é mister o impulso da fé, de sua instrumentalidade, porque de outra maneira, nada poderá ser efetuado.”

20

A salvação e todas as suas implicações são totalmente providas por

Deus, e chama-se de graça, tudo aquilo que Deus fez objetivando a salvação do

pecador. Deus provê tudo, devido à incapacidade e impossibilidade do homem

corrompido em buscar um meio de salvação por si só.

“Ele vos deu vida, estando vós mortos nos vossos delitos e pecados, nos quais andastes outrora, segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe da potestade do ar, do espírito que agora atua nos filhos da desobediência; entre os quais também todos nós andamos outrora, segundo as inclinações da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos; e éramos, por natureza, filhos da ira, como também os demais. Mas Deus, sendo rico em misericórdia, por causa do grande amor com que nos amou, e estando nós mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo, — pela graça sois salvos,” (Efésios 2.1-5)

Essa total corrupção do gênero humano fez com que Deus em sua graça

provesse um modo salvífico baseado n’Ele mesmo e em Sua justiça. Mas segundo

20

Champlin, R. N. pag.699

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Efésios 2.8, Ele propôs em Seu plano a fé como o caminho de manifestação da

graça salvadora. É, pois, uma exigência para o recebimento da graça, contudo, Ele

mesmo é o provocador, ou estimulador e até mesmo o autor da fé. Pois, concebe-se

a fé como um dom de Deus.

Dessa forma a participação do homem no plano salvador é mínima, visto

que a única exigência da parte humana nessa relação é a fé que é gerada pelo

próprio Deus. Essa afirmativa não deve significar que o homem não tenha

responsabilidades relacionadas com a salvação e à vida cristã, de modo algum.

Essa afirmativa está restrita ao ato de salvação, conforme as afirmativas de Russell

Norman Champlin:

“A fé também é um dom de Deus. Não é contrário ao texto o conceito que a própria fé é um dom e uma operação de Deus, porquanto há passagens bíblicas que assim o afirma. (ver, por exemplo, João 6.29, 65 e II Timóteo 2.25). A conversão se compõe do arrependimento e da fé, sendo essa uma operação do Espírito Santo. A fé também figura como um dos aspectos do fruto do Espírito (Gálatas 5.22). Portanto, a verdadeira fé, aquela que conduz a conversão, à santificação e à glorificação, só pode ser uma operação divina. A passagem de Colossenses 2.12 parece ensinar-nos que a fé é causada por uma operação de Deus, a menos que aquele versículo queira dizer que é a fé na operação divina que nos confere a vida em Cristo....O trecho de II Tessalonicenses 2.13 vincula definidamente a santificação com a fé na verdade, o que conduz o homem à salvação, à eleição, tornando-a algo transcendental ao que é meramente humano. “

21

21

O Novo Testamento Interpretado Versículo por versículo, pag.560

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7 A JUSTIÇA DE DEUS MEDIANTE A FÉ

Segundo Champlin22 a doutrina da justificação não é meramente uma

declaração de inocência como a exemplo de uma cena de um tribunal, mas que se

amplia aos benefícios da salvação.

É de fato uma declaração de inocência, que aponta para um réu acusado

e de fato culpado e que sem a mínima condição de defesa recebe a imputação do

crédito da justiça de Jesus Cristo, ou seja, Deus credita a justiça de Cristo que é

justo e justificador sobre o pecador no exercício de sua fé, tornando-o justo.

Constitui-se, portanto, a justificação, o modo através do qual Deus aceita

o homem pecador:

“Justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo; por intermédio de quem obtivemos igualmente acesso, pela fé, a esta graça na qual estamos firmes; e gloriamo-nos na esperança da glória de Deus.” (Romanos 5.1, 2)

É, portanto, uma declaração que escancara as portas do relacionar com

Deus e todos os benefícios propostos em todo o plano de salvação. É o ponto inicial

do relacionamento com Deus, pois, essa declaração por parte de Deus transforma o

até então culpado pelo pecado em justificado, absolvido.

A justificação não é de modo algum resultado de mérito próprio, é

baseada na justiça de Cristo e é adquirida por meio da fé. Mais uma vez a fé surge

como uma instrumentalidade usada por Deus para executar a Sua vontade.

A paz com Deus é o primeiro resultado decorrente da justificação. Paz

com Deus indica o início do relacionamento proposto ao homem por obra de Jesus

Cristo e no exercício da fé que é competente para a justiça de Deus:

“O vocábulo grego eirene aparece aqui, sendo essa palavra a tradução regular do termo hebraico shalom, conforme se evidencia pela versão da Septuaginta. (tradução do A.T. hebraico para o grego, completada cerca de duzentos anos antes da era cristã.) Essa palavra pode ser usada para indicar todas as variedades de bênçãos favoráveis, que criam o sentimento ou o estado de bem-estar, mas que, mais particularmente ainda, apontam

22

O Novo testamento interpretado versículo por versículo, pag.644

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para a harmonia e a unidade, bem como para o vínculo da unidade que podem caracterizar as relações entre homem e homem, ou entre o homem e Deus.Inerente a essa palavra destaca-se igualmente a idéia de ordem e de repouso. Aqueles que foram justificados e estão reconciliados com Deus, gozam dessa harmonia, dessa ordem, desse repouso e dessa unidade com Deus, ou seja, do bem-estar não meramente intelectual, mas também espiritual, que se estende ao bem-estar da alma em sua existência total, tanto nesta vida ainda mortal como nos lugares celestiais, quando estivermos revestidos de nossa vida imortal.”

23

7.1 A JUSTIÇA PELA FÉ É ANTERIOR À NOVA ALIANÇA

Todo o capítulo quarto da Epístola aos Romanos é dedicado a esse

assunto: Abraão justificado pela fé. Preliminarmente é importante reconhecer que

Abraão é uma personagem que tem sua experiência de fé na Antiga Aliança,

portanto, anterior à consumação da obra redentora. Mas torna-se um precedente da

justiça pela fé.

Para Champlin, Paulo como qualquer outro judeu, estava disposto a

admitir que Abraão tivesse uma vida exemplar, e com um ideal sem igual de modo

que suas obras se tornassem relevantes, mas, contudo, suficientes para “se gloriar

diante de Deus?” Aqui está a tônica do capítulo que descreve que ninguém pode se

orgulhar em suas próprias realizações, porque esse orgulho nada tem haver com a

justificação. Deus jamais será devedor ao homem.

“Bem-aventurados aqueles cujas iniqüidades são perdoadas, e cujos pecados são cobertos; bem-aventurado o homem a quem o Senhor jamais imputará pecado. Vem, pois, esta bem-aventurança exclusivamente sobre os circuncisos ou também sobre os incircuncisos? Visto que dizemos: a fé foi imputada a Abraão para justiça. Como, pois, lhe foi atribuída? Estando ele já circuncidado ou ainda incircunciso? Não no regime da circuncisão, e sim quando incircunciso. E recebeu o sinal da circuncisão como selo da justiça da fé que teve quando ainda incircunciso; para vir a ser o pai de todos os que crêem, embora não circuncidados, a fim de que lhes fosse imputada a justiça, e pai da circuncisão, isto é, daqueles que não são apenas circuncisos, mas também andam nas pisadas da fé que teve Abraão, nosso pai, antes de ser circuncidado.” (Romanos 4.7-12)

O Apóstolo Paulo argumenta se a justiça pela fé, no caso de Abraão

ocorreu antes ou depois da circuncisão. Ele pretendia expor a ordem e o motivo da

23

Idem, pag645

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justiça de Deus, a fé simplesmente ou a circuncisão? Ele conclui dizendo que

primeiro a fé e depois a circuncisão. Cronologicamente Abraão primeiro creu, sendo

assim justificado ou aceito por Deus, e posteriormente foi circuncidado.

“Ele creu no Senhor, e isso lhe foi imputado para justiça.” (Gênesis 15.6)

Vê-se, portanto, a ordem, ele creu e isso lhe foi imputado para justiça, a

circuncisão é decorrente da fé. As obras deverão ser decorrentes da fé. Por isso o

apóstolo Paulo afirma em Efésios 2.9 que não vem de obras para que ninguém se

glorie.

A argumentação do Apóstolo referente ao modo de justiça de Deus: Pela

fé, é reforçada na busca de um precedente da mesma justiça, em Abraão. E assim

fica demonstrado que Deus não mudou de modo, sempre foi o mesmo, mas

certamente incompreendido pelo homem que normalmente prefere ao legalismo e às

obras em detrimento da fé.

Para Bruce24, Abraão era homem de notável piedade e justiça. Mas o

princípio pelo qual fora justificado exclui a idéia de acúmulo de méritos por obras de

piedade e justiça, pois, é um princípio válido igualmente para os ímpios que não tem

obras da mesma natureza em que possa se apoiar. Da mesma forma é visto na vida

do coletor de impostos da parábola e que voltou “justificado” para casa. O fariseu

apresentou seus méritos, o coletor não os tinha. Apenas confiou em Deus. Como

pode ser visto nos textos abaixo:

“Mas, ao que não trabalha, porém crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé

lhe é atribuída como justiça.” (Romanos 4:5)

“Propôs também esta parábola a alguns que confiavam em si mesmos, por se considerarem justos, e desprezavam os outros: Dois homens subiram ao templo com o propósito de orar: um, fariseu, e o outro, publicano. O fariseu, posto em pé, orava de si para si mesmo, desta forma: Ó Deus, graças te dou porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros, nem ainda como este publicano; jejuo duas vezes por semana e dou o dízimo de tudo quanto ganho. O publicano, estando em pé, longe, não ousava nem ainda levantar os olhos ao céu, mas batia no peito, dizendo: Ó Deus, sê propício a mim, pecador! Digo-vos que este desceu

24

Frederick Fyvie Bruce. M.A., D.D. Catedrático de Crítica Bíblica e de Exegese Bíblica Na Univerdidade de

Manchester. Autor de Romanos, Introdução e Comentário, p.93

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23

justificado para sua casa, e não aquele; porque todo o que se exalta será humilhado; mas o que se humilha será exaltado.” (Lucas 18.9-14)

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24

8 AS APLICAÇÕES DA FÉ

A fé atua em um campo muito vasto, tanto é que a vida cristã é vivida do

início ao fim através da fé:

“visto que a justiça de Deus se revela no evangelho, de fé em fé, como está escrito: O justo viverá por fé.” (Romanos 1.17)

Bruce25 interpreta a expressão “de fé em fé” da seguinte forma: Baseia-se

na fé e se dirige para a fé, um caminho que parte da fé e na fé termina.

Para Bengel26 essa expressão significaria “da fé de Deus, que faz a

oferta, à fé do homem, que a recebe”.

Karl Barth27 afirma, “da fé ou fidelidade de Deus à nossa fé”, ou seja, a

fidelidade de Deus vem primeiro e a fé do homem é uma resposta.

Stott28 alude a um crescimento da fé: “de um nível de fé para outro.”

É bem certo que todas essas vertentes de comentários apontam para a

necessidade do exercício da fé na experiência cristã e na vida comum.

Se a fé é o modo através do qual Deus resolveu se relacionar com os

homens, ela será manifestada em tudo aquilo que estiver relacionada com a prática

cristã. Para que essa afirmativa seja exposta de uma forma mais clara uma série de

eventos serão aqui enumerados:

a. A fé é necessária e suficiente para a salvação:

“Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie.” (Efésios 2.8, 9)

25

BRUCE, F. F. pag.66

26 Bengel, p.17

27 Barth, p.41

28 Stott, p.46

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25

b. A fé é necessária para a justificação:

“Justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo;” (Romanos 5.1)

c. Através da fé os desafios do mundo são vencidos:

“porque todo o que é nascido de Deus vence o mundo; e esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé.” (1João 5:4)

“Quem é o que vence o mundo, senão aquele que crê ser Jesus o Filho de Deus?” (1Jo 5:5)

d. Através da fé acontecem curas:

“Esse homem ouviu falar Paulo, que, fixando nele os olhos e vendo que possuía fé para ser curado.” (Atos14.9)

e. Através da fé, fortalecidos em comunhão:

“para que a bênção de Abraão chegasse aos gentios, em Jesus Cristo, a fim de que recebêssemos, pela fé, o Espírito prometido.” (Gálatas 3.14)

“e, assim, habite Cristo no vosso coração, pela fé, estando vós arraigados e alicerçados em amor,” (Efésios 3.17)

f. Através da fé vem o entendimento:

“Pela fé, entendemos que foi o universo formado pela palavra de Deus, de maneira que o visível veio a existir das coisas que não aparecem. (Hebreus” 11.3)

g. Através da fé alcança-se bom testemunho:

“Pois, pela fé, os antigos obtiveram bom testemunho.” (Hebreus 11.2)

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26

h. Através da fé vem a obediência a Deus:

“Pela fé, Abraão, quando chamado, obedeceu, a fim de ir para um lugar que devia receber por herança; e partiu sem saber aonde ia.” (Hebreus 11.8)

i. Através da fé milagres podem acontecer:

“Pela fé, atravessaram o mar Vermelho como por terra seca; tentando-o os egípcios, foram tragados de todo.” (Hebreus 11.29)

“Pela fé, ruíram as muralhas de Jericó, depois de rodeadas por sete dias.” (Hebreus 11.30)

A Bíblia está repleta de pessoas que vivenciaram a experiência da fé,

tornando o assunto por demais amplo. Na importância devida à fé, o Apóstolo

Paulo em seus escritos finais diz ter chegado ao final de sua carreira, mas, contudo

tendo guardado a fé. Assim ele expressa a sua vitória final:

“Quanto a mim, estou sendo já oferecido por libação, e o tempo da minha partida é chegado. Combati o bom combate, completei a carreira, guardei a fé. Já agora a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, reto juiz, me dará naquele Dia; e não somente a mim, mas também a todos quantos amam a sua vinda.” (II Timóteo 4.6-8)

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27

9 A FÉ, UMA VIRTUDE PROGRESSIVA

Pode ser observado nas Escrituras que a fé é uma virtude progressiva:

Existe o ponto inicial e desenvolve-se na caminhada cristã até chegar ao ponto de

maturidade ou experiência. O iniciante que faz a sua profissão de fé por meio do

batismo, terá apenas começado uma carreira de experiências e aprendizado que

proporcionará a maturação de sua fé até que chegue a uma estatura satisfatória de

sua espiritualidade, conforme o afirma Champlin.

“Olhando firmemente para o Autor e Consumador da fé, Jesus, o qual, em troca da alegria que lhe estava proposta, suportou a cruz, não fazendo caso da ignomínia, e está assentado à destra do trono de Deus.” (Hebreus 12.2)

A revelação diz que Jesus é o autor e o consumador da fé. Como já visto,

autor é o originador, e consumador é aquele que “aperfeiçoa a fé”:

“Consumador no grego é teleiotes, aperfeiçoador. Em Cristo temos o poder aperfeiçoador, que leva nossa fé à maturidade total, de modo a podermos compartilhar das perfeições de Deus, mediante sua implementação. ..Cristo nos deixou o exemplo do que é a fé perfeita; e agora insufla essa propriedade em nós como produto de nosso desenvolvimento espiritual. Assim, pois, a fé é uma virtude que é levada à perfeição, pelo poder do Espírito de Cristo.”

29

9.1 Porque a Fé Desenvolve?

A Fé desenvolve porque procede de Deus. Ela é da parte de Deus e

recebida pelo homem. Deus é perfeito e pleno e o homem corrompido pelo pecado,

dessa forma a fé se encarrega de comunicar a verdade eterna e perfeita de Deus

no homem corrompido, mediante a operação do Espírito Santo.

Dessa forma, a fé é o instrumento para o imperfeito perceber e entender o

Perfeito, sem dúvida, esse é o motivo pelo qual Deus usou o método da fé para

salvar e se relacionar com o homem. A fé então constitui-se uma linha que tem em

29

Champlin, R. N. pag. 640

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uma ponta Jesus e em outra o homem, a exemplo de um cordão umbilical que

transmite os nutrientes da genitora ao feto que existe em total dependência.

Os apóstolos entendiam que Jesus poderia lhes aumentar a fé quando

expressaram:

“Então, disseram os apóstolos ao Senhor: Aumenta-nos a fé. Respondeu-

lhes o Senhor: Se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a esta amoreira: Arranca-te e transplanta-te no mar; e ela vos obedecerá.” (Lucas 17.5, 6)

Segundo Champlin30, o ensino de Jesus que gerou esse pedido dos

apóstolos, que era o perdão, era um ensinamento de um grau muito elevado que

eles se viam impossibilitados em cumpri-lo, então sabiam que se exigia um

desenvolvimento espiritual especial e uma dependência da alma a Cristo que é a fé.

Dessa forma fica claro que quando o ensino ou a exigência do ensino de Cristo está

acima dos nossos padrões ou se percebe a incapacidade pessoal, o necessário é

desenvolver a fé, que nos eleva progressivamente a estatura de Cristo.

9.2 Como a Fé Desenvolve?

Segundo Champlin31 a fé deve ser desenvolvida pelo seu próprio uso, no

relacionamento com o próximo e consigo mesmo, eliminando os apetites da carne

que bloqueiam a entrada da fé à mente consciente, onde deve haver a operação da

fé. Dessa forma então o pecado é algo que deve ser subjugado para não prejudicar

a operação da fé. As boas obras devem ser praticadas e incentivadas, pois,

constitui-se em uma ação movida ou resultante da fé.

A oração e a meditação são também instrumentos eficazes no

desenvolvimento da fé. Essas práticas se completam, na oração entramos em

contato mental e espiritual com Deus e na meditação ficamos à Sua espera pela

resposta. Constituindo assim um exercício espiritual que robusteça a alma e o

espírito.

30

Champlin, R. N. vol. 2, pag.164

31 Champlin R. N. Enciclopédia de Bíblia Teologia e Filosofia, vol.2, pag. 694

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29

“Exercita-te, pessoalmente, na piedade. Pois o exercício físico para pouco é proveitoso, mas a piedade para tudo é proveitosa, porque tem a promessa da vida que agora é e da que há de ser. Fiel é esta palavra e digna de inteira aceitação. (I Timóteo 4.7-9)

O exercício espiritual é sem dúvida de grande importância para a vida

cristã e o desenvolvimento da fé. Sendo assim, podem-se enumerar algumas

práticas que são favoráveis ao desenvolvimento espiritual da fé:

a. Leitura e meditação da Palavra de Deus;

b. Oração e meditação;

c. A comunhão com outros cristãos;

d. A prática dos dons espirituais;

e. A prática de boas obras;

f. A santificação, que é a luta contra o pecado e devoção a Deus.

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30

10 A FÉ COMO RESPOSTA

Karl Barth32 interpretando Romanos 1.17, em especial a expressão: “de fé

em fé”, ele diz: “da fé ou fidelidade de Deus à nossa fé”, ou seja, a fidelidade de

Deus vem primeiro e a fé do homem é uma resposta.

“visto que a justiça de Deus se revela no evangelho, de fé em fé, como está

escrito: O justo viverá por fé.” (Romanos 1.17)

Nesse sentido a fé torna-se uma resposta do homem ao chamado de

Deus. As Escrituras mostram de uma maneira clara que o relacionamento de Deus

com o homem só pode ser iniciado pelo próprio Deus, pois o homem está morto em

seus delitos e pecados, dessa forma corrompido, não goza de condições de iniciar o

relacionamento com o Deus Santo.

A ordem, portanto é a iniciativa de Deus e a recepção e resposta do

homem. Como já abordado anteriormente, a fé é de origem divina, mas exercida

pelo homem, tornou-se possível o relacionamento Deus-homem através desse elo.

As Escrituras revelam inúmeros homens vocacionados ao plano e

propósito de Deus. Deus escolheu e chamou dentre tantos, e a fé era a resposta

satisfatória para que Deus implementasse todo o seu projeto.

Esse fenômeno pode ser observado dentre tantos, na vida de Abraão:

“Ora, disse o SENHOR a Abrão: Sai da tua terra, da tua parentela e da casa

de teu pai e vai para a terra que te mostrarei; de ti farei uma grande nação,

e te abençoarei, e te engrandecerei o nome. Sê tu uma bênção! Abençoarei

os que te abençoarem e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; em ti serão

benditas todas as famílias da terra. Partiu, pois, Abrão, como lho ordenara o

SENHOR, e Ló foi com ele. Tinha Abrão setenta e cinco anos quando saiu

de Harã.” (Gênesis 12.1-4)

32

Barth, p.41

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31

Observa-se pela ordem a chamada e em seguida o exercício da fé por

parte de Abraão. A Palavra de Deus é que dá origem a fé, a Sua chamada é a

revelação da Sua Palavra a uma determinada pessoa, que responderá em fé.

Abraão em resposta ao chamado de Deus, em fé, saiu de onde estava e

foi para onde o Senhor lhe havia designado. A fé existente se manifestou a partir de

sua atitude de obediência.

Esse fenômeno se repete quando Deus chama outros tantos como: Noé,

Moisés, Davi, Isaías, dentro outros; Primeiro a chamada e em seguida a resposta em

fé. Assim sendo, está patente que a própria chamada provoca a fé.

Partindo desse princípio, pode-se perceber também, que na Nova Aliança

Deus continua vocacionando, chamando homens para a salvação. Conforme textos

abaixo descritos:

“Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta,

entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele, comigo.” (Apocalipse 3.20)

“As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me

seguem.” (João 10.27)

“E, assim, a fé vem pela pregação, e a pregação, pela palavra de Cristo.”

(Romanos 10.17)

Ouvir o chamado de Cristo é o passo inicial na geração da fé. A fé então

toma um lugar secundário dentro do plano eterno de Deus, pois o chamado que dá à

luz a fé inicial. Esse fenômeno é observado na vida dos Apóstolos quando

chamados:

“E disse-lhes: Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de homens.

Então, eles deixaram imediatamente as redes e o seguiram.” (Mateus 4.19,

20)

“Partindo Jesus dali, viu um homem chamado Mateus sentado na coletoria e

disse-lhe: Segue-me! Ele se levantou e o seguiu.” (Mateus 9.9)

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32

“Seguindo ele estrada fora, ao aproximar-se de Damasco, subitamente uma

luz do céu brilhou ao seu redor, e, caindo por terra, ouviu uma voz que lhe

dizia: Saulo, Saulo, por que me persegues? Ele perguntou: Quem és tu,

Senhor? E a resposta foi: Eu sou Jesus, a quem tu persegues; mas levanta-

te e entra na cidade, onde te dirão o que te convém fazer.” (Atos 9.3-6)

Os textos demonstram respectivamente a chamada de Pedro, Mateus e

Paulo, veio primeiro sobre eles a Voz do Senhor, a Sua chamada, o Seu propósito, e

em seguida a resposta mediante a fé e obediência.

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33

11 A FÉ E A PRÁTICA CRISTÃ SOCIAL

A fé é transcendente, liga o homem ao Eterno, ao Infinito, mas ela deverá

ser também imanente e operante na vida comum, na vida prática, nos

relacionamentos, e em todas as áreas da vida. Esse é o devido equilíbrio que todo

cristão deve almejar: A fé vertical, que olha para cima, que reflita a cerca das coisas

de Deus e Sua revelação, mas que seja também aquela fé horizontal, que olhe para

a terra, para os semelhantes, para as questões e demandas da vida. Esse é o modo

eficaz para que o Reino de Deus seja manifestado entre os homens.

Dessa forma fica patente que a fé jamais poderá ser um elemento

alienador, ao contrário, deverá ser esclarecedor, deverá completar o homem

tornando-o íntegro para a sua missão.

Jesus através de uma parábola ensina esse princípio, mas, contudo,

denuncia igualmente a falha dos religiosos: Uma religião transcendente que não olha

pelas pessoas. Essa parábola é conhecida como: A Parábola do Bom Samaritano.

“25 E eis que certo homem, intérprete da Lei, se levantou com o intuito de pôr Jesus à prova e disse-lhe: Mestre, que farei para herdar a vida eterna? 26 Então, Jesus lhe perguntou: Que está escrito na Lei? Como interpretas? 27 A isto ele respondeu: Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu entendimento; e: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. 28 Então, Jesus lhe disse: Respondeste corretamente; faze isto e viverás. 29 Ele, porém, querendo justificar-se, perguntou a Jesus: Quem é o meu próximo? 30 Jesus prosseguiu, dizendo: Certo homem descia de Jerusalém para Jericó e veio a cair em mãos de salteadores, os quais, depois de tudo lhe roubarem e lhe causarem muitos ferimentos, retiraram-se, deixando-o semimorto. 31 Casualmente, descia um sacerdote por aquele mesmo caminho e, vendo-o, passou de largo. 32 Semelhantemente, um levita descia por aquele lugar e, vendo-o, também passou de largo. 33 Certo samaritano, que seguia o seu caminho, passou-lhe perto e, vendo-o, compadeceu-se dele. 34 E, chegando-se, pensou-lhe os ferimentos, aplicando-lhes óleo e vinho; e, colocando-o sobre o seu próprio animal, levou-o para uma hospedaria e tratou dele. 35 No dia seguinte, tirou dois denários e os entregou ao hospedeiro, dizendo: Cuida deste homem, e, se alguma coisa gastares a mais, eu to indenizarei quando voltar. 36 Qual destes três te parece ter sido o próximo do homem que caiu nas mãos dos salteadores?

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37 Respondeu-lhe o intérprete da Lei: O que usou de misericórdia para com ele. Então, lhe disse: Vai e procede tu de igual modo.” (Lucas 10. 25-37)

No ensinamento de Jesus a religiosidade pura é incompetente para

percepção dos valores reais da vida. O princípio ensinado nessa parábola é o do

amor ao próximo que será uma decorrência e obra da genuína fé.

Sobre esse tema Russel Champlin faz o seguinte comentário:

“A parábola do bom samaritano foi dada a fim de ilustrar o importantíssimo mandamento da lei: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. Podem-se fazer as seguintes observações a respeito: a. Jesus ensina aqui um importante princípio da ética humanitária. O próximo pode ser uma pessoa inteiramente desconhecida. b. O próximo pode ser de uma raça diferente, e até mesmo desprezada. c. O próximo pode ser pessoa de outra religião, até mesmo conhecida como herética. d. Contudo os cuidados de Deus por toda a humanidade devem manifestar-se nas vidas de todos quantos são chamados pelo nome.”

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A fé então dilata a visão humana, e alarga o amor e a compaixão, fazendo

o homem olhar para o seu próximo do ponto de vista de Deus. Se a fé vem de Deus,

é um modo de olhar para o mundo na perspectiva Divina ou Bíblica.

Cada cristão individualmente e a igreja como um todo, tem sem dúvida

uma missão social a cumprir. Segundo o Pacto de Lausanne34 a igreja tem uma

missão integral a cumprir. A proposta da missão integral é o Evangelho todo, para

todo o homem, e o evangelho todo implica o espiritual, e o social.

A respeito dessa responsabilidade da igreja o Pacto afirma:

“Afirmamos que Deus é o Criador e o Juiz de todos os homens. Portanto, devemos partilhar o seu interesse pela justiça e pela conciliação em toda a sociedade humana, e pela libertação dos homens de todo tipo de opressão. Porque a humanidade foi feita à imagem de Deus, toda pessoa, sem distinção de raça, religião, cor, cultura, classe social, sexo ou idade possui uma dignidade intrínseca em razão da qual deve ser respeitada e servida, e não explorada. Aqui também nos arrependemos de nossa negligência e de termos algumas vezes considerado a evangelização e a atividade social mutuamente exclusivas. Embora a reconciliação com o homem não seja reconciliação com Deus, nem a ação social evangelização, nem a libertação política salvação, afirmamos que a evangelização e o envolvimento sócio-

33

O Novo Testamento Interpretado versículo por versículo, pgs 108, 109

34 Pacto de Lausanne, 1974

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político são ambos parte do nosso dever cristão. Pois ambos são necessárias expressões de nossas doutrinas acerca de Deus e do homem, de nosso amor por nosso próximo e de nossa obediência a Jesus Cristo. A mensagem da salvação implica também uma mensagem de juízo sobre toda forma de alienação, de opressão e de discriminação, e não devemos ter medo de denunciar o mal e a injustiça onde quer que existam. Quando as pessoas recebem Cristo, nascem de novo em seu reino e devem procurar não só evidenciar mas também divulgar a retidão do reino em meio a um mundo injusto. A salvação que alegamos possuir deve estar nos transformando na totalidade de nossas responsabilidades pessoais e sociais. A fé sem obras é morta.”

35

A fé é, sobretudo o instrumento para trazer e estabelecer o Reino de

Deus entre os homens, e o papel do cristão e da Igreja torna-se altamente relevante

e necessário nesse processo. É bem claro que a Igreja sabe evangelizar, falar da

sua fé, mas fica claro também que a Igreja tem muitas dificuldades para demonstrar

sua fé através das ações.

Conclui-se, portanto, que evangelizar, falar e agir, faz parte de uma

mesma missão que não é seccionada, e na instrumentação da genuína fé o cristão e

a igreja será movidos de acordo com o aprazimento do Eterno.

“Porque, assim como o corpo sem espírito é morto, assim também a fé sem obras é morta.” (Tiago 2:26)

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Pacto de Lausanne, 1974

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12 CONCLUSÃO

Essa pesquisa teve por finalidade apresentar a fé e suas características,

levando-se em conta a proximidade desse tema a todo o ser humano,

proporcionando assim uma melhor compreensão sob os vários pontos de vista.

Pôde-se verificar que a fé é um recurso divino conferido ao homem para o

relacionamento entre o céu e a terra.

A fé foi apresentada como uma resposta ao soberano chamado de Deus,

e uma estrada, um caminho entre o humano e o Divino.

Todas essas reflexões tiveram como objetivo o crescimento da fé, uma

melhor qualificação para o serviço do cristão em sua igreja e uma inserção

qualitativa de todo aquele que professa a fé monoteísta e a fé em Jesus Cristo como

o Salvador, no meio de uma sociedade que necessita de uma influência decisiva e

equilibrada de modo a espelhar os grandes valores espirituais, morais e éticos,

trazendo dessa forma, o Reino de Deus para bem perto de todos.

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