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FLORA VAGINAL E CORRELAÇÃO COM ASPECTOSCITOLÓGICOS* Hygia Maria Nunes Guerreiro * * Helenemarie Schaer Barbosa ** João Lycio Conceição Filho ** Lúcia Maria Tishchenko * * Suraia Hagge * * GUERREIRO, H.M.N. et al. Flora vaginal e correlação com aspectos citológicos. Rev.Saúde públ., S.Paulo, 20:415-20, 1986. RESUMO: Com a finalidade de esclarecer a patogenicidade de microorganismos que compõem a mi- croflora vaginal, particularmente nas chamadas vaginites inespecíficas e de determinar o valor da citologia como método para identificação da flora vaginal, foram estudadas 97 pacientes, realizando cultura, exame direto a fresco, Gram e citologia do material cérvico-vaginal. Entre os microorganismos de importância clínica reconhecida, Gardnerella vaginalis foi o mais freqüentemente isolado, 48,4%, seguido de Trichomo- nas vaginalis, 10,3%, Candida albicans, 7,2% e Neisseria gonorrhoeae, 1,1%. Alterações citológicas indica- tivas de cervicite e/ou vaginite estiveram presentes na maioria dos casos de G.vaginalis, C.albicans e em todos os casos de T.vaginalis. Foi ressaltada a importância da avaliação semi-quantitativa dos microorga- nismos nos meios de cultura. Na avaliação da citologia como método diagnóstico para a microflora vaginal, foi observada que este foi o melhor dos métodos utilizados na identificação de T.vaginalis, tendo sido de- tectado cerca de 50% dos casos de C.albicans. No diagnóstico de G.vaginalis a citologia foi positiva em 48,9% dos casos, destacando-se que dos 31 casos positivos ao exame citológico, oito tiveram culturas negativas para G.vaginalis, embora tenham sido isolados nestes últimos: Haemophilus sp. ou Coryne- bacterium sp. UNITERMOS: Vagina, microbiologia. Vagina, citologia. Vaginite, diagnóstico. Cervicite, diagnóstico. * Pesquisa subvencionada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Processo n.° 40.0995/82. ** Do Departamento de Farmácia Qualitativa da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal da Bahia - Rua Barão do Jeremoabo, s/n.°, Campus, Ondina - 40000 - Salvador, BA - Brasil. INTRODUÇÃO Numerosos trabalhos sobre microflora vaginal têm sido publicados 3,6,11,13,15 , isolando-se uma larga variedade de microorganismos aeróbios e anae- róbios, cujo papel patogênico tem sido amplamente discutido. Trichomonas vaginalis, Candida albicans, Neisseria gonorrhoeae, Gardnerella vaginalis e Chla- mydia trachomatis são os patógenos mais freqüente- mente relacionados às cervicites e vaginites 2,15 , enquanto bactérias como os Staphylococcus sp, os Streptococcus sp e os Bacterióides sp têm sido iden- tificados como constituintes da flora normal 3,11,14 . Não se pode, no entanto, esquecer o papel que inú- meros fatores desempenham no equilíbrio microor- ganismo-hospedeiro. Desta forma, C.albicans e T. vaginalis, patógenos reconhecidos, podem ser isola- dos de mulheres sem sintomatologia clínica 10,15,16 , dificultando assim a interpretação do achado micro- biológico. Também em mulheres sintomáticas oca- sionalmente não se tem conseguido isolar um pató- geno reconhecido 2 . Devido à dificuldade em estabelecer o papel pato- gênico dos microorganismos que compõem a flora vaginal, procuramos correlacionar a microflora com a presença de colpocervicite, diagnosticada através do estudo do esfregaço citológico, objetivando es- clarecer a relação agente etiológico versus doença. Procuramos também, determinar a eficácia da citologia como método diagnóstico da microflora vaginal, através de um estudo comparativo entre o esfregaço citológico e os achados microbiológicos. MATERIAL E MÉTODOS Foi estudado material colhido de 97 pacientes do sexo feminino atendidas no ambulatório do Centro de Pesquisas da Maternidade Climério de Oliveira, da Universidade Federal da Bahia. O ma- terial, colhido com "swab" de algodão, dos seguin- tes locais: fundo do saco vaginal, endocérvice, ecto- cérvice e uretra, foi suspenso em 0,2 ml de solução fisiológica e semeado nos diferentes meios de cul- tura, em intervalo não superior a duas horas. Dessas suspensões eram realizados também o exame direto a fresco e o esfregaço corado pelo método de Gram. Para o exame citológico foram colhidos dois esfre-

Flora Vaginal e Correlação Com Aspectos Citológicos. Rev. Bras

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Flora Vaginal

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  • FLORA VAGINAL E CORRELAO COM ASPECTOS CITOLGICOS *

    Hygia Maria Nunes Guerreiro * *Helenemarie Schaer Barbosa **Joo Lycio Conceio Filho **Lcia Maria Tishchenko * *Suraia Hagge * *

    GUERREIRO, H.M.N. et al. Flora vaginal e correlao com aspectos citolgicos. Rev.Sade pbl.,S.Paulo, 20:415-20, 1986.

    RESUMO: Com a finalidade de esclarecer a patogenicidade de microorganismos que compem a mi-croflora vaginal, particularmente nas chamadas vaginites inespecficas e de determinar o valor da citologiacomo mtodo para identificao da flora vaginal, foram estudadas 97 pacientes, realizando cultura, examedireto a fresco, Gram e citologia do material crvico-vaginal. Entre os microorganismos de importnciaclnica reconhecida, Gardnerella vaginalis foi o mais freqentemente isolado, 48,4%, seguido de Trichomo-nas vaginalis, 10,3%, Candida albicans, 7,2% e Neisseria gonorrhoeae, 1,1%. Alteraes citolgicas indica-tivas de cervicite e/ou vaginite estiveram presentes na maioria dos casos de G.vaginalis, C.albicans e emtodos os casos de T.vaginalis. Foi ressaltada a importncia da avaliao semi-quantitativa dos microorga-nismos nos meios de cultura. Na avaliao da citologia como mtodo diagnstico para a microflora vaginal,foi observada que este foi o melhor dos mtodos utilizados na identificao de T.vaginalis, tendo sido de-tectado cerca de 50% dos casos de C.albicans. No diagnstico de G.vaginalis a citologia foi positiva em48,9% dos casos, destacando-se que dos 31 casos positivos ao exame citolgico, oito tiveram culturasnegativas para G.vaginalis, embora tenham sido isolados nestes ltimos: Haemophilus sp. ou Coryne-bacterium sp.

    UNITERMOS: Vagina, microbiologia. Vagina, citologia. Vaginite, diagnstico. Cervicite, diagnstico.

    * Pesquisa subvencionada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (CNPq). Processon. 40.0995/82.

    ** Do Departamento de Farmcia Qualitativa da Faculdade de Farmcia da Universidade Federal da Bahia - Rua Barodo Jeremoabo, s/n., Campus, Ondina - 40000 - Salvador, BA - Brasil.

    INTRODUONumerosos trabalhos sobre microflora vaginal

    tm sido publicados3,6,11,13,15, isolando-se umalarga variedade de microorganismos aerbios e anae-rbios, cujo papel patognico tem sido amplamentediscutido. Trichomonas vaginalis, Candida albicans,Neisseria gonorrhoeae, Gardnerella vaginalis e Chla-mydia trachomatis so os patgenos mais freqente-mente relacionados s cervicites e vaginites2,15,enquanto bactrias como os Staphylococcus sp, osStreptococcus sp e os Bacteriides sp tm sido iden-tificados como constituintes da flora normal3,11,14.No se pode, no entanto, esquecer o papel que in-meros fatores desempenham no equilbrio microor-ganismo-hospedeiro. Desta forma, C.albicans eT. vaginalis, patgenos reconhecidos, podem ser isola-dos de mulheres sem sintomatologia clnica10,15,16,dificultando assim a interpretao do achado micro-biolgico. Tambm em mulheres sintomticas oca-sionalmente no se tem conseguido isolar um pat-geno reconhecido2.

    Devido dificuldade em estabelecer o papel pato-gnico dos microorganismos que compem a floravaginal, procuramos correlacionar a microflora com

    a presena de colpocervicite, diagnosticada atravsdo estudo do esfregao citolgico, objetivando es-clarecer a relao agente etiolgico versus doena.

    Procuramos tambm, determinar a eficcia dacitologia como mtodo diagnstico da microfloravaginal, atravs de um estudo comparativo entre oesfregao citolgico e os achados microbiolgicos.

    MATERIAL E MTODOS

    Foi estudado material colhido de 97 pacientesdo sexo feminino atendidas no ambulatrio doCentro de Pesquisas da Maternidade Climrio deOliveira, da Universidade Federal da Bahia. O ma-terial, colhido com "swab" de algodo, dos seguin-tes locais: fundo do saco vaginal, endocrvice, ecto-crvice e uretra, foi suspenso em 0,2 ml de soluofisiolgica e semeado nos diferentes meios de cul-tura, em intervalo no superior a duas horas. Dessassuspenses eram realizados tambm o exame diretoa fresco e o esfregao corado pelo mtodo de Gram.Para o exame citolgico foram colhidos dois esfre-

  • gaos com esptula de madeira, um do material defundo de saco vaginal e outro do crvice, fixadosem lcool a 95% e corados pelo mtodo de Papani-colaou. O material de vagina, colo e uretra foi se-meado nos meios de Agar sangue, Agar vaginalis4,Agar chocolate, Agar Thayer Martin e Agar Sabou-raud, sendo que o de vagina era semeado tambmem Agar Eosina Azul de Metileno (EMB). O AgarSabouraud e o EMB foram acrescentados rotinabacteriolgica usual para o trato genital, na expec-tativa de isolamento de leveduras e enterobact-rias, que acreditvamos ter uma incidncia maiselevada. O Agar vaginalis foi acrescentado visandoo isolamento de Gardnerella vaginalis.

    A identificao das bactrias isoladas foi feitapor mtodos convencionais. Nos exames bacte-riolgicos, tanto na cultura quanto na bacterios-copia, foi feita uma avaliao semi-quantitativa dasbactrias, classificando-as entre numerosas e raras.A identificao de leveduras foi dirigida para C.albi-cans, identificada pelo teste do tubo germinativo.As leveduras identificadas como Candida sp., peloaspecto microscpico-morfolgico a partir do meiode Cornmeal e cujos resultados no teste do tubogerminativo foram negativos, foram agrupadoscomo Candida sp. Na interpretao dos esfregaoscitolgicos, para caracterizar a presena de inflama-o, foram considerados o nmero de leuccitos, apresena de macrfagos e clulas gigantes multinu-cleadas e as alteraes inflamatrias presentes nasclulas epiteliais19.

    A todas as pacientes foi aplicado um question-rio visando obter dados como idade, escolaridade,atividade sexual, uso de mtodos contraceptivosentre outros.

    RESULTADOS

    A faixa etria da populao estudada variou de16 a 50 anos, sendo a idade mdia 33 anos.

    Em sua maior parte eram mulheres com baixograu de escolaridade: 37(38,1%) eram analfabetas,23(23,7%) tinham primrio incompleto e 16(16,5%)haviam feito o curso primrio completo. Apenasduas tinham nvel universitrio e as restantes enqua-dravam-se entre o 1. e 2. graus.

    A maioria das mulheres era de baixo nvel scio--econmico uma vez que 76(78,3%) relataram umarenda familiar inferior a trs salrios mnimos.Quanto cor, 55(56,7%) eram pardas, 30(30,9%)brancas e 15(l5,5%) negras.

    A maioria, 94(97%), referiu um nico parceirosexual. No que se refere ao uso de contraceptivos,57(58,7%) no usavam nenhum tipo, 20(20,6%) fa-ziam uso de dispositivo intra-uterino, 10(10,3%)usavam anticoncepcional oral e 11(11,3%) haviamfeito ligadura de trompas uterinas.

    Com relao profisso, 57(58,8%) eram donasde casa enquanto 18(18,5%) tinham profisses noespecializadas.

    Quanto s caractersticas da flora vaginal das pa-cientes estudadas, a Tabela l relaciona os microor-ganismos encontrados. As bactrias do gnero Cory-nebacterium, Staphylococcus e G. vaginalis foram asmais freqentemente isoladas: 73,2%, 52,6% e47,4%, respectivamente.

    No que se refere presena de processo inflama-trio, de acordo com o resultado do exame citol-gico, 87 pacientes apresentavam alteraes inflama-trias em vagina e/ou crvice, enquanto em apenas10 pacientes no foram encontradas tais alteraes.Quando se comparou a flora bacteriana destes doisgrupos (Tabela 2), as diferenas mais marcantes fo-ram no isolamento de Lactobacillus sp., que esteveassociado ausncia de processo inflamatrio(P < 0,1), e de G. vaginalis, que foi mais freqente-

  • mente isolada de pacientes com vaginite e/ou cervi-cite, embora no se tenha encontrado significadoestatstico pelo teste de Qui Quadrado (P > 0,1).

    T.vaginalis, Streptococcus do grupo D, tantoenterococos como no enterococos, Escherichiacoli, Streptococcus do grupo B, Candida sp., levedu-ras no identificadas, Neisseria gonorrhoeae, Citro-bacter sp., Aeromonas sp., Pseudomonas sp. eMoraxella sp. foram encontrados apenas em pacien-tes com processo inflamatrio.

    Com a finalidade de obtermos uma avaliaomais real do significado de cada microorganismopresente no exame, procuramos fazer uma avalia-o semiquantitativa da relao das bactrias entresi. No se fez avaliao quantitativa de T. vaginalis.Nas leveduras a avaliao semi-quantitativa foi feitaquando estas foram isoladas nos meios de cultura

    bacteriolgicos, mas no quando isoladas apenas nomeio de Agar Sabouraud.

    Relacionamos separadamente os microorganismosreconhecidos como patognicos e potencialmentepatognicos para o trato genital feminino. Na cate-goria flora normal foram includos microorganismoscomo: Corynebacterium sp., Staphylococcus epider-midis, Lactobacillus sp., Micrococcus sp., Strepto-coccus sp. e leveduras8. Foram agrupados como pa-tgeno em potencial aqueles cuja predominncia erade microorganismos potencialmente patognicoscomo Haemophilus sp.,Candida sp. e Streptococcusdos grupos B e D. Nas 87 pacientes relacionadas naTabela 3, que apresentaram alteraes inflamatriasao exame citolgico, G. vaginalis foi o microorganis-mo mais freqentemente isolado, sendo predomi-nante em 32,2% das pacientes. Embora no constena Tabela 3, G. vaginalis foi isolada como bactriapredominante em trs pacientes sem alteraes in-flamatrias. Todos os casos com tricomonase apre-sentavam alteraes de inflamao e apenas um casode C.albicans no apresentava tais alteraes.

    A fim de determinar o valor da citologia comomtodo diagnstico da microflora vaginal, foramcomparados os resultados obtidos pelos exames mi-crobiolgicos com aqueles da citologia vaginal.Pde-se observar que a eficincia deste mtodovaria de acordo com o patgeno, como descrevere-mos a seguir.

    BactriasDentre as bactrias que apresentam um quadro

    citolgico que permite um diagnstico presuntivo,destacamos a G. vaginalis e a N. gonorrhoeae. Paraa identificao de G. vaginalis levou-se em conside-rao a presena de clulas guias2 ou fenmeno

  • Gardner-Dukes, observando-se resultados compat-veis como G. vaginalis em 31 casos e obtendo-se aconfirmao bacteriolgica em 23 destes, dos quais20 casos tiveram G. vaginalis isolada como microor-ganismo predominante. Nos oito casos restantes, valeressaltar, foram isolados Haemophilus sp. como bac-tria predominante em dois e Corynebacterium sp.nos outros seis, ambos microorganismos com ca-ractersticas morfolgicas semelhantes G. vaginalis.Entretanto, a cultura revelou um total de 47 amos-tras positivas para G. vaginalis, verificando-se queem 24 casos a citologia no apresentou aspectosque permitissem a identificao deste microorga-nismo. Dos casos no identificados pela citologia,11 eram de G. vaginalis, predominante sem outropatgeno, enquanto que em 8, embora houvessepredominncia de G. vaginalis, outros microorga-nismos patognicos foram tambm encontrados.Nos outros 5 casos G. vaginalis no era predomi-nante. Uma nica cultura foi positiva para N. go-norrhoeae. Entretanto, havia Corynebacterium sp.em predominncia na cultura e a citologia foi su-gestiva de G. vaginalis, no havendo aspectos indi-cativos de N. gonorrhoeae7. Embora no houvessesido utilizado mtodo microbiolgico para a culturade Chlamydia trachomatis, procurou-se pela citolo-gia identificar este microorganismo5, no sendo en-contrados aspectos diagnsticos.

    Trichomonas Vaginalis

    O maior nmero de casos foi detectado pela cito-logia que identificou 9 casos positivos. Destes,

    7 foram positivos ao exame direto a fresco do mate-rial crvico-vaginal, um foi positivo ao exame diretodo material uretral, ficando apenas um caso dediagnstico citolgico de T. vaginalis sem confirma-o pelo exame fresco. O exame direto fresco domaterial crvico-vaginal revelou um caso no identi-ficado pela citologia. Na investigao do materialuretral fresco foram encontrados mais dois casosde tricomonase, no confirmados no material cr-vico-vaginal por qualquer das tcnicas utilizadas.

    Candida e Outras Leveduras

    No conjunto de mtodos utilizados, foramdiagnosticados 20 casos positivos para leveduras.Destes, 12 apresentavam C.albicans ou Candida sp.,sendo que em 6, na qual foi feita uma avaliaosemi-quantitativa, a quantidade presente foi consi-derada moderada ou superior12. A citologia fez odiagnstico de 3 destes ltimos. Dos 8 casos deoutras leveduras, a citologia identificou 2 casos, cujaquantidade foi considerada significativa. Os resulta-dos da possvel interferncia da utilizao de contra-ceptivos na flora vaginal, comparando a microflorade 20 mulheres em uso de dispositivo intra-uterinoe de 10 mulheres utilizando anticoncepcional oral,pareadas com 20 mulheres que no utilizavam qual-quer contraceptivo, esto apresentados na Tabela 4.As mulheres do grupo controle foram escolhidasentre aquelas cujo material foi colhido na mesmasemana das pacientes que utilizavam contraceptivo,e todas, nos trs grupos, eram pacientes com vagi-nite e/ou cervicite.

    DISCUSSO

    A flora bacteriana aerbia das 97 mulheres desteestudo mostrou grande variedade de microorganis-mos, com pequenas variaes em relao a outrostrabalhos sobre flora bacteriana6,17,20. Na tentativade determinar os microorganismos efetivamente en-volvidos na patogenia de vaginites e cervicites, avariedade de agentes isolados nestes processos, assimcomo o complexo papel do equilbrio ecolgico da

    flora microbiana, torna bastante difcil a interpreta-o do significado de cada um destes agentes. Estetpico tem sido objeto de estudo de outros pesqui-sadores10,11,13,20, com os quais partilhamos a visoda importncia da avaliao semi-quantitativa e darelao dos microorganismos entre si, como funda-mental para a compreenso do problema.

    Na microflora vaginal da populao estudadaforam encontrados C.albicans, T.vaginalis, N.go-norrhoeae e G. vaginalis, reconhecidos como micro-

  • organismos freqentemente envolvidos em processosinfecciosos do trato genital. Quanto aos microrganis-mos potencialmente patognicos, levamos em consi-derao no s o tipo de organismo encontrado,como tambm avaliamos o aspecto de predominn-cia sobre a flora reconhecidamente normal. Foramencontradas bactrias, s quais se poderia atribuirpapel patognico devido sua predominncia sobrea flora normal: Haemophilus sp., Streptococcus dosgrupos B e D e Citrobacter sp.

    A avaliao da importncia patognica de Candi-da sp. ou outras leveduras tornou-se mais complexadevido ao fato de que a avaliao semi-quantitativadestas s foi feita quando do seu isolamento nosmeios de cultura de bacteriologia, deixando de serfeita quando do seu isolamento do meio de AgarSabouraud. Desta maneira, consideramos como po-tencialmente patognicas Candida sp. e outras leve-duras que, isoladas nos meios de bacteriologia, esti-vessem, em uma avaliao semi-quantitativa, emquantidades consideradas moderadas ou superior13.Classificamos como flora normal todos os outroscasos de Candida sp. e outras leveduras.

    A avaliao da presena ou no de processo infla-matrio entra como a terceira varivel, de extremaimportncia na compreenso do problema. Na com-parao da microflora dos dois grupos, com ou semprocesso inflamatrio, a semelhana da composioda flora bacteriana vaginal e/ou cervical como umtodo fica por conta da presena de bactrias como:Corynebacterium sp., Staphylococcus epidermidis,Lactobacillus sp., Streptococcus no hemolticoque, fazendo parte da flora vaginal normal, podemestar presentes tambm em processos inflamatrios.

    Numa avaliao em que entra o componente se-mi-quantitativo, G. vaginalis destaca-se como um pa-tgeno importante de vaginite e cervicite, neste

    grupo em estudo. Em 40% das pacientes que apre-sentaram alteraes citolgicas indicativas de proces-so inflamatorio, G. vaginalis foi isolado como nicopatgeno, predominante ou no. A presena oca-sional de G. vaginalis como microorganismo pre-dominante na cultura, em pacientes sem atipiainflamatria, no invalida o seu papel patognico,uma vez que outros microorganismos j aceitoscomo patognicos, como a T. vaginalis, podemocorrer na ausncia de inflamao15. Em trs pa-cientes do presente estudo, em que cultura obser-vou-se G. vaginalis predominante com citologianormal, queremos destacar que o esfregao citol-gico e o esfregao corado pelo Gram apresentavamuma predominncia evidente de Lactobacillus sp,

    indicando possivelmente, que havia predominnciadeste microorganismo, mas que a no utilizao detcnica especfica para o seu isolamento fez comque G.vaginalis surgisse como predominante. Emnossa opinio, evidenciado o importante papel pato-gnico da G. vaginalis, no se justifica a sua inclusono grupo das chamadas vaginites inespecficasl,9,18.Tal designao deveria restringir-se queles casos emque apesar da citologia inflamatria, no foram iso-lados patgenos reconhecidos2.

    Na comparao de pacientes em uso de mtodoscontraceptivos com grupo controle, no houve dife-renas marcantes na microflora, mas o pequenonmero de casos estudados no permite uma avalia-o conclusiva.

    AGRADECIMENTO

    Dra. Indira Marxsen Chagas, da MaternidadeClimrio de Oliveira que gentilmente cedeu suas pa-cientes para esta pesquisa.

    GUERREIRO, H.M.N. et al. [Vaginal flora and correlation with cytological aspects]. Rev.Sade pbl.,S.Paulo, 20:415-20,1986.

    ABSTRACT: This work is an attempt to throw more light on the pathogenicity of microorganismsof the vaginal flora, specially those of the so-called nonspecific vaginitis. An attempt is made to determinethe value of cytology as a method for the identification of vaginal flora, by the study of microbiologiccultures, fresh and Gram stain direct exam and citology of the cervico-vaginal specimens of 97 patients.Among microorganisms with clinical significance, Gardnerella vaginalis was the most frequently isolatedorganism, 48,4%, followed by Trichomonas vaginalis, 10.3%, Candida albicans, 7.2% and Neisseria go-norrhoeae, 1.1%. Cytologic changes typical of cervicitis and/or vaginitis were seen in the majority of casesof G. vaginalis, C. albicans, and in all cases of T.vaginalis. The importance of a semi-quantitative evaluationof the vaginal flora on the culture plates was stressed. In the evaluation of cytology as a diagnostic me-thod of the vaginal microflora, we observed that it was the best of the two methods used in the identifica-tion of T.vaginalis and that it was capable of detecting the presence of about 50% of C.albicans. In thediagnosis of G. vaginalis cytology was positive in 48.9% of cases. It is of note that of 31 cases of positivecytologic smear, eight had negative culture for G. vaginalis, even though organisms such as Haemophilus spor Corynebacterium sp had been isolated in these cases.

    UNITERMS: Vagina, microbiology. Vagina, citology. Vaginitis, diagnosis. Cervicitis, diagnosis.

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    Recebido para publicao em 17/12/1985Reapresentado em 19/08/1986Aprovado para publicao em 29/08/1986.