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Formação do Sistema Internacional DBBHO1335- 16SB (4-0-4) Professor Dr. Demétrio G. C. de Toledo – BRI [email protected] UFABC - 2016.III Aula 9 5ª-feira, 20 de outubro

Formação do Sistema Internacional BHO1335-15 (4-0-4) · de produção que deveriam doravante fazer parte do conjunto integrado dos processos de produção, segundo os quais opera

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Formação do Sistema Internacional

DBBHO1335- 16SB

(4-0-4)

Professor Dr. Demétrio G. C. de Toledo – BRI

[email protected]

UFABC - 2016.III

Aula 9

5ª-feira, 20 de outubro

O mundo africano no século XIX

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Módulo II: A grande divergência

Aula 9 (4ª-feira, 20 de outubro): O mundo africano no século XIX

Texto base:

AJAYI. A. (2010) “A África no início do século XIX: problemas e

perspectivas”, p. 1-26, in: AJAYI. A. (2010).

Leituras complementares:

WALLERSTEIN, I. (2010) “A África e a economia-mundo”, p. 27-46,

in: AJAYI. A. (2010).

AJAYI. A. (2010) “Conclusão: a África às vésperas da conquista

europeia”, p. 905-930, in: AJAYI, A. (2010).

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Para falar com o professor:

• São Bernardo, sala 322, Bloco Delta, 3as-feiras e 5as-feiras,das 14-16h (é só chegar)

• Excepcionalmente hoje, quinta-feira, dia 20 de outubro, nãohaverá atendimento.

• Atendimentos fora desses horários, combinar por email com oprofessor: [email protected]

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O mundo africano no século XIX

• Nas primeiras aulas do curso, vimos que nos

séculos anteriores à formação do capitalismo

histórico e à ascensão europeia o comércio de

longa distância ligava de modo mais ou menos

frouxo as dinâmicas econômicas, políticas e

culturais de grande parte do mundo

afroeurasiano.

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O mundo africano no século XIX

• A África, e em especial o Magreb (norte da África),

eram importantes pontos de passagem de rotas

comerciais terrestres e marítimas que ligavam a Ásia

e o Oriente Médio à Europa do norte e do oeste.

• Além de sua posição geográfica, a expansão do

islamismo sobre a África saariana nos séculos VII ao X

e sobre a África subsaariana e oriental nos séculos XI

ao XV foi outro fator a conectar a África aos sistemas-

mundo eurasianos.

Extensão do domínio islâmico, c. 1500

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Abu-Lughod, principais circuitos comerciais, 1250-1350

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Rotas das caravanas africanas, África saarianae sahel

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A África islâmica

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O mundo africano no século XIX

• Como vimos, pode-se falar em dois momentos de

formação do capitalismo histórico: o período

mediterrâneo e o período atlântico.

• A África participou intensa e ativamente dos dois

períodos.

• Não só o comércio de longa distância, mas também o

tráfico escravista africano foram partes fundamentais

da formação do capitalismo histórico, em especial em

sua fase colonial.

• “Nenhuma sociedade ou economia poderia ter

escapado do traumatismo e do desalento geralmente

causados pelas consideráveis perdas demográficas

acarretadas pelo tráfico de escravos e as guerras

correlatas. O tráfico parece fornecer a melhor

explicação pelo fato de a África, entre todos os

continentes, ter tido as mais instáveis e frágeis

estruturas políticas e econômicas do século XIX.” (Ajayi

2010: 6) 13

O mundo africano no século XIX

Tráfico de escravos africanos

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Tráfico de escravos africanos

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• No século XIX, o interesse europeu (e também,

em menor grau, estadunidense) pela África

deixaria de ser por pessoas escravizadas e

passaria a visar o controle de territórios africanos

e suas populações para integrá-los à economia-

mundo capitalista como fornecedores de

matérias-primas e consumidores dos produtos

das revoluções industriais.

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O mundo africano no século XIX

• Na segunda metade do século XIX, as potências

europeias dividiriam seus esforços na corrida

imperialista entre a África e a Ásia.

• Não devemos, no entanto, pensar na história da África

no século XIX exclusivamente por suas relações com o

mundo exterior. Suas dinâmicas internas, ao menos

até 1850, foram os fatores definidores de sua forma

de inserção na economia-mundo.17

O mundo africano no século XIX

• A coleção História Geral da África, da Unesco, é um

marco na compreensão da história da África a

partir de pontos de vista dos africanos.

• Iniciada nos anos 1960, a coleção ofereceu a

primeira versão africana completa da história da

África, até então quase apenas obra de homens

brancos europeus ou norte-americanos.

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Coleção História Geral da África da UNESCO

• Volume I: Metodologia e pré-história da África (Editor J. Ki-Zerbo)

• Volume II: África antiga (Editor G. Mokhtar)

• Volume III: África do século VII ao XI (Editor M. El Fasi; Editor Assistente I.

Hrbek)

• Volume IV: África do século XII ao XVI (Editor D. T. Niane)

• Volume V: África do século XVI ao XVIII (Editor B. A. Ogot)

• Volume VI: África do século XIX à década de 1880 (Editor J. F. A. Ajayi)

• Volume VII: África sob dominação colonial, 1880-1935 (Editor A. A. Boahen)

• Volume VIII: África desde 1935 (Editor A. A. Mazrui; Editor Assistente C.

Wondji)

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Coleção História Geral da África da UNESCO

História Geral da África, vol. 8

• “Durante muito tempo, mitos e preconceitos

de toda espécie esconderam do mundo a real

história da África. As sociedades africanas

passavam por sociedades que não podiam ter

história.” (Prefácio, M. Amadou-Mahtar

M’Bow)

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• “É importante estudar aqui em que medida as

mudanças do século XIX prolongariam as do

século XVIII, e em que medida novos fatores,

ligados à intensificação da atividade dos

europeus e à crescente integração da África ao

sistema econômico mundial, poderiam explicá-

las.” (Ajayi 2010: 2)

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África no início do século XIX: problemas e perspectivas (Ajayi)

• “A partir do momento em que se admitiu o fato de as

mudanças ocorridas na África não remontarem à época

colonial, despertou-se um considerável interesse no que

concerne ao século que precede à colonização. Os

historiadores consagraram vários trabalhos aos

acontecimentos revolucionários do século XIX, tais como

as reformas de Muhammad ‘Ali no Egito, a reunificação da

Etiópia sob os imperadores Tewodros e Menelik, o

Mfecane dos Estados sotho-nguni na África Central e

Austral, ou as jihad da África Ocidental.” (Ajayi 2010: 1)22

África no início do século XIX: problemas e perspectivas (Ajayi)

• Deve-se evitar “(...) a tendência para explicar,

exageradamente ou exclusivamente, as

mudanças ocorridas na África durante o

‘século pré-colonial’ em função da

intensificação da atividade dos europeus (...).”

(Ajayi 2010: 2)

23

África no início do século XIX: problemas e perspectivas

África no início do século XIX: problemas e perspectivas

• No século XIX, “há um elemento do qual temos

certeza: os europeus mostraram, então, pela África

um crescente interesse, cuja importância como fator

de mudança na história da África foi certamente

exagerada. (...) Convém não exagerar, nem a

potência dos europeus na África no início do século

XIX, nem o ritmo com o qual adquiriram ‘posses’ ou

penetraram no interior do continente antes de

1850.” (Ajayi 2010: 7-8)24

• “É preciso lembrar que os europeus e os americanos

chegavam à África pelo mar, concentrando–se assim

nas costas. Penetraram pouco no interior do

continente antes de 1850, enquanto os principais

acontecimentos do início do século XIX na África,

tais como o Renascimento Etíope, o Mfecane ou as

jihad da África Ocidental, surgiram todos, com

exceção da reforma de Muhammad ‘Ali, no interior

do continente.” (Ajayi 2010: 9)25

África no início do século XIX: problemas e perspectivas

• “Convém destacar o fato de, no início do século XIX,

a economia de todas as comunidades africanas

fundar-se na produção de alimentos por meio de

uma ou mais atividades: cultivo do solo, criação de

animais, pesca e caça. Todas as outras atividades –

comércio, política, religião, produção artesanal e

industrial, construção, exploração de minas – eram

secundárias em relação à agricultura, e sem esta,

não poderiam ter existido.” (Ajayi 2010: 12)26

África no início do século XIX: problemas e perspectivas

• “Não se deve traçar uma imagem deformada da

evolução da África no início do século XIX, fazendo

remontar a essa época a influência preponderante

que os europeus só terão mais tarde sobre os

processos de transformação. No início do século XIX,

as tradições herdadas do século XVIII e as mudanças

próprias à África tiveram muito mais importância do

que as mudanças vindas de fora. (Ajayi 2010: 26)

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África no início do século XIX: problemas e perspectivas

A África e a economia-mundo

• “A grande transformação das relações econômicas da

África com o resto do mundo não foi o produto da

partilha do continente no fim do século XIX. Ao contrário,

a partilha da África foi uma consequência da

transformação das relações econômicas desse continente

com o resto do mundo e, em particular, com a Europa:

processo que começou por volta de 1750, resultando na

grande empreitada europeia de colonização dos últimos

decênios do século XIX.” (Wallerstein 2010: 27)28

Wallerstein (2010) A África e a economia -mundo

• “Há tempos, vastas regiões da África encontravam-se

sulcadas por rotas comerciais que se prolongavam

frequentemente para além do continente, atravessando o

Oceano Índico, o Mediterrâneo e o Oceano Atlântico. Podemos

dizer que estas relações comerciais extracontinentais

correspondiam mais ou menos ao ‘comércio à longa distância’

praticado, há milênios, na Ásia e na Europa, e no quadro do qual

se trocava aquilo que convém chamar produtos de luxo, ou seja,

produtos que rendiam muito por um baixo volume.”

(Wallerstein 2010: 27) 29

A África e a economia-mundo

• “Entretanto, por volta de 1730 -1750, por razões inerentes ao

seu funcionamento, a economia-mundo capitalista retomou

sua expansão econômica e geográfica. No curso dos cem anos

que se seguiram, ela absorveria, em sua rede de produção,

cinco grandes zonas geográficas que, até então, haviam

permanecido à margem de seu sistema: a Rússia, o Império

Otomano, a Índia, as zonas ‘longínquas” do continente

americano (o Canadá, a parte ocidental da América do Norte, a

ponta meridional da América do Sul), bem como a África (do

Norte, do Oeste e do Sul)” (Wallerstein 2010: 30-31) 30

A África e a economia-mundo

• “A integração de um novo elemento na economia-

mundo passa basicamente por duas fases.

Primeiramente, pela fase fundamental: a transformação

de uma parte relativamente importante dos processos

de produção que deveriam doravante fazer parte do

conjunto integrado dos processos de produção, segundo

os quais opera a divisão do trabalho na sociedade da

economia-mundo.” (Wallerstein 2010: 32)

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A África e a economia-mundo

• “Em segundo lugar, a transformação das estruturas

políticas, resultando na constituição de ‘Estados’

submissos às regras e aos mecanismos do sistema

interestatal; tais Estados eram fortes o suficiente para

facilitar uma circulação relativamente fluida dos fatores

de produção no interior da economia-mundo, mas não

tinham a potência necessária para se oporem a ela,

salvo por certos meios restritos e por tempos limitados.”

(Wallerstein 2010: 32) 32

A África e a economia-mundo

I. Transformação dos processos de produção e

sua integração à divisão internacional do

trabalho;

II. Transformação das estruturas políticas, fortes

internamente, mas fracas externamente.

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A África e a economia-mundo

• “Estamos convencidos de que tal processo de

integração se desenrolou a partir de 1750 (até

aproximadamente 1900), para a África do Norte, a

África do Oeste e a África do Sul, ao passo que a África

do Leste apenas começou sua integração por volta de

1850, ou até mesmo 1875.” (Wallerstein 2010: 32)

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A África e a economia-mundo

• “É preciso parar de superestimar o papel dos fatores

externos na criação dos Estados africanos. De fato, as

forças internas constituem o motor da evolução política,

ao passo que o processo lógico de desenvolvimento

explica a maior parte dos fenômenos secundários.”

(Wallerstein 2010: 40-41)

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A África e a economia-mundo

• “A questão se situa em um outro nível: de fato, a

participação na economia-mundo implicava a existência

de estruturas políticas capazes de assegurar o

funcionamento da economia, em termos de comércio, de

produção, de mão de obra. Pressões exercidas do exterior

visavam impor tais estruturas. Quando as estruturas

vigentes bastavam para desempenhar o papel esperado,

de qualquer modo que fosse, pouca pressão era exercida

para impor a mudança.” (Wallerstein 2010: 41) 36

A África e a economia-mundo

• “Contudo, a participação na economia-mundo

reforçava a importância econômica de certos agentes

internos capazes de criar estruturas políticas

adequadas; e foram eles que pressionaram para

obter as modificações de estrutura. (...) Sabe -se que

esse processo tendeu, finalmente, em grande parte

da África, à criação dos Estados coloniais.”

(Wallerstein 2010: 41)37

A África e a economia-mundo

• “A produtividade das plantações de cana-de-açúcar das

Antilhas britânicas não parou de cair no século XVIII. Logo,

a Índia ofereceu à Grã-Bretanha uma vasta zona de

produção, permitindo-a paliar essa situação. Entretanto,

tratava-se de uma região onde a produção agrícola já era

densa e a prática da escravidão arriscava ser

economicamente dispendiosa demais (se se quisesse

reduzir a população autóctone à escravidão), além de ser

muito difícil politicamente, caso se optasse pela importação

de escravos.” (Wallerstein 2010: 42-43)38

A África e a economia-mundo

• “Consequentemente, desde então, o tráfico de

escravos parecia, de imediato, menos útil para a

produção açucareira e para as outras culturas

praticadas nas zonas de influência britânica, e até

mesmo contra-indicado se houvesse a intenção de

encorajar as culturas comerciais na África Ocidental.”

(Wallerstein 2010: 43)

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A África e a economia-mundo

• “A Grã-Bretanha, graças à sua supremacia sobre o mundo

nesta época, encontrava-se em uma situação político-

militar que lhe permitia executar a abolição da

escravidão. (Wallerstein 2010: 43)

• “Compreendemos, então, que os interesses de todos

os capitalistas da economia-mundo se encontravam

condizentes com aqueles, mais particulares, da subclasse

dos capitalistas britânicos, a fim de criar um clima político

favorável ao abolicionismo.” (Wallerstein 2010: 43) 40

A África e a economia-mundo

• “Se a Grã-Bretanha pôde tornar-se a campeã da

doutrina do livre-câmbio na África, foi em virtude de

sua hegemonia no mundo, nesses ‘felizes dias’ em que

os produtos britânicos triunfavam face à concorrência

de todos os seus rivais, e em que sua frota lhe garantia

uma liberdade de acesso aos mercados do mundo todo,

tal como ela jamais conhecera, e não mais conheceria

depois’.” (Wallerstein 2010: 43)

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A África e a economia-mundo

• Entre 1750 e 1850 a África seria definitivamente integrada

à economia-mundo capitalista, não mais como

fornecedora de bens de luxo, metais preciosos ou pessoas

escravizadas, mas como fornecedora de matéria-prima e

mercado consumidor dos produtos industriais das

potências europeias, naquele momento em processo

acelerado de industrialização. Essa divisão internacional

do trabalho se manteria ao longo de todo o século e meio

seguinte, e se mantém nos dias de hoje.42

A África e a economia-mundo

• “Portanto, pensamos que o processo de integração da

África (do Norte, do Oeste e do Sul) em um sistema

histórico particular, a economia-mundo capitalista,

remonta a 1750. Assim, a partilha do continente

constitui não o início, mas o resultado desse

processo.” (Wallerstein 2010: 45)

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