39
Francisco Barros Neto A NECESSIDADE DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NOS CURSOS DE DIREITO Rio de Janeiro 2005

Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

Francisco Barros Neto

A NECESSIDADE DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NOS CURSOS DE DIREITO

Rio de Janeiro 2005

Page 2: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

2UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATU SENSU”

PROJETO VEZ DO MESTRE

A NECESSIDADE DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NOS CURSOS DE DIREITO

OBJETIVOS: Mostrar a necessidade de ministrar aulas de Língua Portuguesa nos cursos de Direito.

Page 3: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

3

AGRADECIMENTOS

A todas as pessoas que, no decorrer do curso, me apoiaram e de certa forma me ajudaram a terminá-lo.

Page 4: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

4

DEDICATÓRIA

Dedico esta pesquisa aos meus alunos de Língua Portuguesa, que fazem com eu esteja sempre avaliando minha atuação enquanto professor da nossa língua materna.

Page 5: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

5

RESUMO

Diante da atual situação da educação superior brasileira nos dias atuais,

considerada não desejável, este trabalho acadêmico aborda a necessidade de se

ministrar aulas de língua portuguesa, especificamente, nos cursos de direito.

A linguagem é vista como uma atividade humana que influencia e é

influenciada pelo contexto social, sendo assim, é importante entender como ela se

processa nas relações sociais.

Nos cursos de direito, o ensino de língua portuguesa deve ser privilegiado,

buscando assim uma melhor qualidade dos futuros profissionais, tornando-os melhor

preparados para exercerem suas funções, mostra-se ainda o porquê de ser tão

necessário o ensino de língua portuguesa aos futuros advogados, não sendo suficiente

no curso superior ensinar apenas as matérias jurídicas.

São trabalhados quais os objetivos deste ensino nos cursos de direito , onde e

por quem esta necessidade é apontada, para que seja tema de uma pesquisa de

tamanha abrangência.

Finalizando a pesquisa, são oferecidos alguns caminhos para que se realize

um trabalho nos cursos de direito com o objetivo de ensinar língua portuguesa de

forma contextualizada para a atuação profissional dos futuros advogados.

Page 6: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

6

METODOLOGIA

A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica nas diversas

fontes, buscando-se assim um material claro e coerente, que consiga

definir a situação-problema e esclarecer as hipóteses traçadas

inicialmente, atendendo também aos objetivos da pesquisa.

Page 7: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

7

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08 CAPÍTULO I A LINGUAGEM COMO ATIVIDADE HUMANA 09 CAPÍTULO II A NECESSIDADE DO ENSINO DE LÍNGUA POTUGUESA NOS CURSOS DE DIREITO 15 CAPÍTULO III OBJETIVOS DO ENSINO DE LÍNGUA POTUGUESA NOS CURSOS DE DIREITO 21 CAPÍTULO IV CAMINHOS PARA UM EFETIVO TRABALHO DE LÍNGUA PORTUGUESA NOS CURSOS DE DIREITO 25 CONCLUSÃO 31 BIBLIOGRAFIA 32 ÍNDICE 34

Page 8: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

8

INTRODUÇÃO

O ensino de língua portuguesa deve ser ministrado nos diversos cursos do

ensino superior, tomando como base as dificuldades que os alunos deste nível

apresentam. Sendo assim, a pesquisa buscou mostrar como se faz necessário o ensino

de língua portuguesa, mais especificamente nos cursos de direito, pois a maioria dos

alunos não consegue utilizar de uma forma adequada a língua pátria na sua atuação

profissional.

No capítulo I, foi trabalhada a linguagem como sendo a atividade humana de

forma ampla, oferecendo ao leitor conceitos básicos relacionados à formação da

linguagem como comunicação social.

No capítulo II trabalhou-se a necessidade do ensino de língua portuguesa nos

cursos de direito, destacando os aspectos importantes deste ensino e

contextualizando-os com a prática jurídica. Este capítulo aborda o ensino de língua

portuguesa no decorrer dos anos escolares e como a aprendizagem não ocorre,

mostrando com isso um ensino equivocado durante os períodos anteriores ao ensino

superior.

No capítulo III, são destacados os objetivos do ensino de língua portuguesa

nos cursos de direito, buscando com isso uma não contextualização da norma culta

com a linguagem utilizada nos meios acadêmicos e na futura atuação profissional do

advogado.

No capítulo IV, a pesquisa apresenta caminhos para um efetivo trabalho de

língua portuguesa nos cursos de direito, visando atender às necessidades do curso. O

capítulo aponta como devem ser as aulas de língua portuguesa nos cursos superiores

de forma a favorecer a uma aprendizagem e aplicação da língua de maneira mais

significativa e contextualizada com a profissão do advogado. A utilização das novas

tecnologias possibilita a prática de ensino também é tratada neste capítulo.

Sendo assim, a pesquisa busca atingir seus objetivos iniciais, se tornando um

material acadêmico que suscita questionamentos e aponta caminhos.

Page 9: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

9

CAPÍTULO I

A LINGUAGEM COMO ATIVIDADE HUMANA

“Aprender a ler, não para ser letrado,

mas para conseguir a educação social

indispensável aos filhos de um país

moderno”. (BAKHTIN, 1982, p.113)

Page 10: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

10

Considerando o homem um ser que fala e a palavra a senha de entrada no

mundo humano, se faz necessário examinar mais profundamente o que vem a ser a

linguagem especificamente humana.

A linguagem é um sistema simbólico. O homem é o único animal capaz de

criar símbolos, isto é, signos arbitrários em relação ao objeto que representa, e por

isso mesmo, convencionais, dependendo assim da aceitação social; por exemplo, a

palavra casa, não há nada no som nem na forma escrita que remeta ao objeto por ela

representado. Designar esse objeto pela palavra casa, é então, um ato arbitrário.

A partir do momento em que não há relação alguma entre signo casa e o

objeto por ela representado, é necessário uma convenção, aceita pela sociedade, de

que aquele signo representa aquele objeto. É só a partir dessa aceitação que a

comunicação passa a ser comum e será usada todas as vezes que tal objeto for

citado. A linguagem, portanto, é um sistema de representações aceitas por um grupo

social, que possibilita a comunicação entre integrantes desse mesmo grupo.

Entretanto, na medida em que esse laço entre representação e objeto

representado é arbitrário, ele é, necessariamente, uma construção da razão, isto é,

uma iniciação do sujeito para poder se aproximar da realidade. A linguagem,

portanto, é produto da razão e só pode existir onde há racionalidade.

Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado

pela linguagem se apresenta mais estável e sofre mudanças mais lentas do que o

mundo natural. Pelas palavras, pode-se transmitir o conhecimento acumulado por

uma pessoa ou sociedade, pode-se também passar adiante esta construção da razão

que se chama cultura.

Precisamente por ser um sistema de signos, toda linguagem possui um

repertório, ou seja, uma relação de signos que vão compô-la. Por exemplo, um

dicionário da língua portuguesa relaciona signos que pertencem a essa língua. Além

do repertório também é preciso que se estabeleçam as regras de combinação desses

signos. Quais podem ser usados juntos ou não? Continuando com os exemplos

semânticos, não pode combinar signos que tenham sentidos opostos; subir/descer,

nascer/morrer etc Não se pode dizer “Ele subiu descendo as escadas” mas pode-se

dizer “ele subiu correndo as escadas” e por aí muitas outras situações de combinação

que merecem atenção.

Page 11: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

11 Como último passo, a linguagem deve estabelecer as regras de combinação e

as regras de uso desses signos para se dizer que a linguagem é dominada pelo

indivíduo. Este é principalmente um dos grandes objetivos da língua portuguesa

durante todos os anos de escolaridades e que não deve ser esquecido em nenhum

momento.

Sendo a linguagem um fato social, sabe-se que a estrutura lingüística é tão

complexa quanto a estrutura social da comunidade em que ela funciona. As inter

relações entre língua e a sociedade são muito complexas e na maior parte das vezes

se depara frente a frente com uma co-variação de fenômenos lingüísticos e sociais.

Todas as variedades da língua estão sujeitas a mudança, e mesmo no dialeto rural ,

mais isolado e conservador, há elementos de diferenciação.

Há muito que se começou a despertar para uma concepção de língua como

instrumento de comunicação social, maleável e diversificada em todos os seus

aspectos, meio de expressão entre indivíduos, em sociedade também diversificada

social, cultural e geograficamente. Nesse sentido, uma língua histórica, não é um

sistema lingüístico unitário, mas um conjunto de sistemas lingüísticos, isto é, um

diassistema, em que se inter-relacionam diversos sistemas e subsistemas.

A VARIAÇÃO DA LINGUAGEM

Em princípio, uma língua representa pelo menos três tipos de diferenças

internas, que podem ser mais ou menos profundas:

- diferenças no espaço geográfico ou variação diatópica;

- variação entre as camadas socioculturais ou variação diastrática;

- diferenças entre os tipos de modalidades expressivas (língua falada, língua escrita,

literária, formal coloquial...)

Pelo fato de a linguagem como fenômeno social estar profundamente ligado à

estrutura social e aos sistemas de valores da sociedade, diferentes dialetos e sotaques

diversos são avaliados de forma distinta. A língua padrão, por exemplo, representa

mais status e prestigio do que qualquer outra variante, de acordo com LUFT “ o

Page 12: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

12pensamento tradicional só aceita a variante culta, formal, a linguagem policiada,

cerimoniosa, considerando todo o resto”errado””(LUFT, 1998, p.45)

Entretanto, a linguagem padrão vem a ser apenas uma variedade entre muitas,

embora uma variedade particularmente importante, pois atua como uma das forças

contrárias à variação. Não existe aspecto inerente às variantes da língua padrão que

as torne inferiores. Atitudes contra dialetos são atitudes que refletem a estrutura

social da comunidade.

A língua não é um código simples, único, usado da mesma forma por todas as

pessoas, em todas as situações. Embora reconhecendo que o sistema admite uma

infinidade de realizações, uma língua não é uma soma de variações, senão uma

integração. Em qualquer descrição lingüística deve-se levar em consideração a

existência de formas alternativas cuja substituição parece não alterar o sentido. A

variação ocorre em todo os níveis: fonético, fonológico, morfológico, sintático, etc.

A depender da perspectiva teórica é possível aceitar a premissa de que a variação é

um fato acidental ou faz parte da natureza da própria língua.

O estudo da variação está relacionado ao estudo da mudança lingüística, pois

mudanças implicam variação embora a recíproca não seja verdadeira. Atualmente a

mudança lingüística não é interpretada da mesma forma entre os neogramáticos. Para

estes, a mudança lingüística baseava-se no principio da regularidade da mudança

fônica (lei fonética) e na aceitação do fato de que as condições que governam a

mudança fônica são puramente fonéticas.

Até há relativamente pouco tempo, a variação não era sistematicamente

estudada, mas essa variação na fala de uma comunidade vem a ser fundamental no

mecanismo de mudança lingüística. Isto não significa, como já foi visto, que toda

variação implique mudança. A pesquisa sociolingüística veio demonstrar que a

distribuição de variantes não ocorre aleatoriamente e está condicionada a fatores

sociais.

Este tipo de análise fonológica era incompatível com a fonêmica tradicional e

o lingüista Willian Labov no começo da década de 1960 veio a pressupor como os

fonólogos faziam uma distinção entre representação subjacente e a superficial,

embora de forma distinta na sua concepção teórica, a fonologia justifica um fonema

sistemático na base de uma alternância morfológica (mar-mar e guerra), enquanto a

Page 13: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

13análise sociolingüística postula uma variável fonológica na base de variação

fonológica de uma comunidade.

Cada modelo concebe que as realizações de uma unidade subjacente são

governadas por regras fonológicas, mas para Labov as regras são variáveis. O

conceito de regras variáveis distintas de regras obrigatórias permite avaliar a

tendência de cada um dos falantes, e do grupo de falantes no uso de uma ou outra

variante. O principio básico de variação é assinalar não apenas cada ocorrência de

uma determinada variante, mas também o número de vezes em que esta poderia

ocorrer, mas não ocorreu.

A mudança lingüística tem inicio quando ocorre a generalização de uma

forma particular dentro de um determinado subgrupo de uma comunidade lingüística.

Numa perspectiva sincrônica o uso diferenciado das variantes em função da idade

constitui um indício de mudança que não é, por outro lado, uniforme ou instantânea,

implica co-variação de formas alternativas durante um longo período de tempo. De

acordo com Celso Cunha:

“Criação da sociedade, não pode (a língua) ser imutável; ao

contrario, tem de viver em perpetua evolução, paralela à do

organismo social que a criou [...] A petrificação lingüística

é a morte do idioma. A linguagem é, por excelência, uma

atividade do espírito, e a vida espiritual consiste num

progresso constante.” (CUNHA, 1994, p.82)

A esta altura, convém deixar claro o que se entende por variante e variável.

Variantes são formas diferentes de dizer a mesma coisa, num mesmo contexto, sem

alteração básica de sentido. Variável pode ser definida como um conjunto de

variantes dentro da estrutura lingüística, mas não todo conjunto de variantes. Pode se

assinalar finalmente que uma língua varia e se modifica porque variam e se

modificam as condições sociais de sua utilização.

A língua escrita marcou uma nova etapa na vida humana. A passagem da

cultura oral para a cultura escrita sinalizou uma relação diferenciada entre os

indivíduos e deu novo significado à memória social. O texto na forma escrita fala por

si mesmo e à medida que o texto conquistou uma distância entre o seu autor e o

leitor, favorecida pelos registros sociais, trouxe um novo entendimento sobre a

Page 14: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

14realidade científica e social. Concluindo esta explanação com as palavras de

Chomsky:

“Desde que a criança seja rodeada de um ambiente falante,

a linguagem se desenvolverá automaticamente, com uma

rígida historia de desenvolvimento, uma forma altamente

especifica de comportamento de generalização, e uma

relativa dependência maturacional da criança.”

(CHOMSKY, 1971, p.86)

Hoje, o processo de criação e difusão das novas tecnologias na sociedade é

irreversível, um novo paradigma da informação vem gerando transformações

econômicas, sociais e culturais na sociedade. Vive-se numa época em que as formas

de comunicação e o acesso às informações são marcados pela rapidez, pela

multiplicidade, modificando assim a relação de todas as pessoas com seu espaço e

tempo.

O grande avanço das tecnologias da informação e os novos modelos

educacionais favorecem uma maior aproximação dos textos nas suas diversas formas,

seja livro, vídeo, software...Cada vez mais a informação chega mais rápido aos

lugares e a leitura faz parte desta evolução mais do que nunca.

Na escola, ainda são predominantes a linguagem oral e o texto impresso. Tem

representado um grande desafio aos professores incorporar outras linguagens na

transmissão dos conhecimentos acadêmicos.

Page 15: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

15

CAPÍTULO II

A NECESSIDADE DO ENSINO DE

LINGUA PORTUGUESA NOS CURSOS DE DIREITO

“O indivíduo, por força dos próprios

mecanismos de ajuste social, se vê

continuamente assimilado por essa tendência

cristalizadora da linguagem, condição

inevitável da própria interlocução”.(HAKIRA

OSAKABE, 2000, p. 27)

Page 16: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

16 O modo com que uma criança aprende uma língua e a ordem em que adquire

os padrões são questões importantes, neste aprendizado a criança comete erros,

desvia-se num ou noutro nível dos padrões da norma culta. Qualquer pessoa que

escute crianças pequenas pode aprender exemplos em todos os níveis: fonético,

fonológico, gramatical e lexical. Na verdade é um útil exercício lingüístico classificar

os erros à medida que se apresentam.

Os erros corrigem-se por si mesmos. Na época em que a criança vai para a

escola, a maioria destes erros já foram eliminados e os poucos restantes, em breve

desaparecem. Uma vez dominadas as necessárias habilidades fonéticas, a eliminação

dos erros que se corrigem por si mesmos, de qualquer espécie, é um aspecto

altamente especifico e limitado do aprendizado de sua língua materna, aspecto este

que não deveria ser excessivamente acentuado, como aponta Magda Soares:

“ de um lado há os que pretendem que a escola deva

respeitar e preservar a variedade lingüística da classes

populares, e sua peculiar relação com a linguagem,

consideradas tão validas e eficientes, para comunicação

[...] Por outro lado, há os que afirmam a necessidade de que

as classes populares aprendam a usar a variedade

lingüística socialmente privilegiada, própria das classes

dominantes.” (SOARES, 1983, p.44)

As professoras das séries iniciais sabem que não há necessidade de se ater a

correção dos erros restantes deste tipo, relativamente poucos. Em qualquer caso o

ensino de língua portuguesa nos primeiros anos escolares tem de enfrentar uma tarefa

muito maior e positiva, o ensino da leitura e da escrita.

A magnitude da tarefa de aquisição destas novas habilidades, incluindo novas

habilidades manuais, é tão evidente que não exige esforços. Mas não se compreende,

às vezes, que existe o outro lado do problema, a saber, que ao adquirir mais

conhecimentos da língua está ao mesmo tempo aprendendo a usar a linguagem para

finalidades completamente novas. E é neste ponto que surge pela primeira vez o

principal problema da língua portuguesa: o do equilíbrio entre ensino prescritivo e

proscritivo de um lado e o ensino descritivo do outro, porque as convenções da

língua portuguesa escrita são diferentes das que regem a língua falada.

Page 17: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

17 Alguns professores julgam que as crianças lucrariam mais em

aprender a escrever, sendo-lhes permitido escrever o que dizem tal como dizem,

outros sustentam a opinião de que, visto a linguagem escrita ter suas próprias

convenções estas deveriam ser ensinadas desde o inicio.

A liberdade quanto a convenções ortográficas, tais como o modo de

escrever, a pontuação e o uso das maiúsculas, por exemplo, é uma questão

inteiramente diferente; estas coisas são ensinadas produtivamente, uma vez que não

há padrões existentes para serem alterados e as razões para não corrigir os erros

ortográficos em certa fase só poderiam repousar na teoria educacional geral.

Há sem duvida, uma implicação lingüística. Se esta opinião é emitida em

favor de certa tolerância ortográfica significa que o ensino da ortografia é

considerado como ensino de uma técnica, um meio para um fim, e que o verdadeiro

propósito da instrução consiste no uso da linguagem escrita.

Diante disto tem-se uma situação altamente complicada na educação atual,

que começa pela educação básica chegando no ensino superior após tantos anos de

escolaridade e tendo estudado muitos anos de língua portuguesa.

Questiona-se então como e o que está sendo ministrado nos anos que

antecedem o curso superior já que os alunos, mesmo os bem selecionados no exame

vestibular, chegam a uma graduação sem um domínio adequado da língua

portuguesa, seja no que diz respeito ao domínio da escrita ou da fala de sua língua

materna. Questiona-se ainda, a importância da gramática estudada tantos anos nos

bancos escolares e a que ela se propõe.

SINAIS DE UM ENSINO EQUIVOCADO

Alguns aspectos devem ser observados no ensino tradicional da língua

materna e suas seqüelas para o aluno que estuda tantos anos e mesmo assim não a

domina. O pressuposto de que o aluno não sabe a língua, de certa forma se justifica

parcialmente numa fase inicial: é normal que chegando à escola a criança não saiba

ler nem escrever, necessitando assim ser alfabetizada e aprender a língua em letras,

mas mesmo após a alfabetização ainda se considera que o aluno não sabe a língua

por ele ainda escrever com erros na ortografia vigente.

Page 18: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

18Inicia então um ensino concentrado na ortografia e esta obsessão ortográfica

persegue o aluno em todo o seu caminho educacional até o ensino médio e depois de

todos esses anos ele chega à universidade e mesmo assim ainda não sabe o que

deveria ter aprendido nos anos anteriores; pode-se dizer que quanto mais estuda

menos se aprende. Como sinaliza Luft: “ a verdadeira teoria gramatical que subjaz

ao empenho do aluno, começa e acaba nos fatos da língua: as frases ouvidas

veiculam e revelam à criança a teria que ela deve estruturar na sua mente, sem

tomar consciência disso, como aprende a andar, a comer, a nadar, etc.” (LUFT,

1998, p.21)

Não é só a ortografia que o aluno ignora, ignora a língua literária, e não sabe

regras, não sabe se expressar, não interpreta corretamente e muitas vezes não entende

o que lê. A escola se prende a aspectos da língua de forma técnica e “decorativa”

esquecendo muitas vezes de sua real finalidade, que é a comunicação e sendo assim o

aluno que chega à universidade estudou tanto e não aprendeu nem uma coisa nem

outra. Não se expressa e nem domina a norma culta tão desejada pela escola.

As conseqüências deste ensino são vistas claramente quando um aluno chega

à faculdade e além de precisar aprender o que o curso se propõe a ensinar sente

necessidade de saber melhor a língua portuguesa, algo que ele estudou por tantos

anos e se depara com uma situação como se não soubesse o que precisa em muitos

momentos, ou seja, percebe que ainda falta muito a aprender ou o que é pior, não

sabe usar aquilo que já aprendeu.

Durante todos os anos que antecedem a faculdade ele recebe uma carga de

regras, normas, conceitos, definições... Muita coisa da língua portuguesa de forma

descontextualizada e na hora de aplicar não consegue, pois não foi assim que

aprendeu. Os alunos que aprendem realmente aquilo que lhes foi ensinado pouco

farão com isso pela vida afora, mesmo sendo profissionais de quem se exija

conhecimento da língua. Se souberem falar e escrever bem, comunicando-se com

precisão e clareza, será pelo fato de terem sido bons leitores, com talento pessoal

para escrever e se expressar, pois a escola não prepara para tal habilidade.

Por força de uma sobrecarga nos estudos não sobra tempo para o que

realmente interessa na língua portuguesa, que seriam estudos de vocabulário,

semântica, sintaxe mais elaborada, recursos e técnicas de expressão, interpretação e

redação de texto, expressão oral e escrita... Mil coisas importantes do funcionamento

Page 19: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

19prático da língua, que deveriam ter sido ensinados pela prática e não pela teoria,

prática esta que deveria ser o caminho da escola em tantos anos de ensino,

colaborando assim para melhorar o poder de comunicação dos alunos, na escrita e na

fala, objetivo este em que fracassa o ensino tradicional.

A escola tradicional tende a fracassar naquilo que constitui seu grande objetivo,

toda insistência na gramática, paradoxalmente redunda nisto: teoria gramatical é o

que os alunos menos aprendem apesar de tantos anos de “decoreba” e exercícios

descontextualizados. Pode-se dizer que quanto mais se ensina menos se aprende, um

exemplo clássico é o uso da crase, se estuda isso anos e poucos alunos têm segurança

no emprego do acento grave. A crase é um testemunho simples do fracasso desse

ensino gramaticalista. Pode-se perceber melhor com a visão Ilari: “Quem sabe

muitos professores talvez abandonassem a superstição da teoria gramatical,

desistindo de querer ensinar a língua por definições, classificações, análises

inconsistentes e precárias hauridas em gramáticas. Já seria um grande benefício.”

(ILARI, 1995, p.34)

Muitos docentes também não sabem para si e ensinam de forma teórica e técnica

aquilo que há nos livros, não avançando nem proporcionando um ensino mais

adequado às necessidades de todo e qualquer estudante, que é a expressão oral e

escrita adaptando a ela o uso correto da norma culta. Desta forma, jovens saem da

escola convictos de que a língua portuguesa é algo muito complicado, convicção esta

que permanece por sua vida inclusive na idade adulta.

Com essa convicção negativa que a escola desenvolveu ao longo dos anos em

que buscava ensinar, chega-se a um momento muito ruim em que o aluno tanto

estudou e tem insegurança na sua língua materna, inibição para se comunicar por não

saber se expressar adequadamente, bloqueio da criatividade por ter decorado tanta

coisa e não aplicado quase nada na sua comunicação e outras dificuldades que vão

aparecer, muitas vezes, na vida profissional e no curso superior.

A gramática, que seria um sistema natural de regras para propiciar expansão

comunicativa e veiculo de libertação, se torna, pelo contrário, um instrumento de

opressão aos que a conhecem e não sabem usá-la. Com ela o aluno conclui que não

sabe a língua que fala nem nunca saberá, pois saber gramática, no sentido de dominar

e aplicar as regras em prol de uma comunicação mais adequada e clara, se confunde

com uma gramática com regras explícitas, mal explicadas e mal entendidas.

Page 20: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

20Diante disto pode-se perceber porque a língua portuguesa, na versão escolar das

aulas de português, é tão desamada e detestada pelos alunos, quando deveria ser

entendida, usada e saboreada.

Page 21: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

21

CAPÍTULO III

OBJETIVOS DO ENSINO DE LINGUA

PORTUGUESA NOS CURSOS DE DIREITO

“Nas circunstancias atuais – que parecem ser de um

deliberado esvaziamento de todo esforço educacional

autêntico – deve-se ter em mente que não estamos diante

de uma discussão teórica, mas sim de uma questão

pratica, à qual é preciso responder também com soluções

práticas. Pode-se tratar a queda de uma telha como um

problema dinâmico, formulando hipóteses teóricas

alternativas e debatendo a adequação destas ultimas. È

uma abordagem legítima, mas não é a melhor do ponto de

vista de quem está embaixo. “ (RODOLFO ILARI, 1985,

p.47)

Page 22: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

22

Deveres e obrigações se impõem à conduta de todas as pessoas no convívio

familiar, nas relações de trabalho e nos vínculos religiosos. A solução dos

conflitos, com base no direito e mediação do estado, torna possível a vida em

sociedade. Direito é o conjunto de normas obrigatórias que disciplinam as

relações humanas e também a ciência que estuda essas normas.

A ciência jurídica tem por objeto discernir, dentre as normas que regem a

conduta humana, as que são especificamente jurídicas. Caracterizam-se estas pelo

caráter coercitivo, pela existência de sanção no caso de não observância e pela

autoridade a elas conferida pelo estado, que as consagra.

Após a aprovação no vestibular ou ingresso no curso de direito o estudante se

depara com grandes dificuldades no que diz respeito à língua portuguesa, ainda no

curso de direito percebe-se a necessidade de um melhor domínio da língua

portuguesa que não foi adquirido nos anos anteriores ao ingresso na faculdade,

apesar de terem sido muitos anos estudando português, decorando regras gramaticais,

lista de coisas relacionadas à gramática, conjugando verbos em vários modos e

tempos, enfim tanta coisa e que de repente se vê sem um domínio mais pratico de sua

língua pátria.

Nos cursos de direito, o aluno, ao contrário do que o senso comum pensa, não

passa cinco anos “decorando” leis e códigos, pelo contrário, ele tem que entender e

saber encontrar as leis de que precisa para estudar e que necessitará no seu futuro

profissional. No momento em que ingressa no curso ele não só estudará leis, mas

todo um conjunto de matérias que envolvem a área jurídica e que o aluno precisa

entender, contextualizar e interpretar de forma clara e adequada para assim também

se expressar..

É neste momento em que os estudantes de direito se sentem um pouco fracos

em termos de domínio da língua, pois muitas vezes não entendem o que lêem e não

conseguem explicar aquilo que está escrito em seu material acadêmico. O estudo de

direito passa por um estudo abrangente que envolve doutrinas, leis de diversas fontes

e estudos de casos concretos, sendo assim a linguagem e a comunicação são

instrumentos essenciais para um bom desempenho no curso.

Além de tudo isto o acadêmico de direito precisa se expressar de forma clara e

que se faça entender, em sua linguagem escrita e falada, pois seu futuro profissional

Page 23: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

23e sucesso na advocacia dependem de suas habilidades de expressão e comunicação,

além é claro dos conhecimentos jurídicos.

O estudante de direito percebe neste momento a defasagem do que foi a ele

ensinado até o ensino médio e no próprio curso pouco ou nada se vê de língua

portuguesa , pois o sistema educacional superior parte da premissa que o currículo

estabelecido no ensino fundamental e médio são suficientes para que se prossiga a

faculdade com um conhecimento adquirido previamente, adequado ao estudo

especifico das matérias do referido curso.

Diante da realidade onde muitos estudantes de direito lêem ,escrevem e se

expressam mal, é que os próprios alunos e professores apontam para a necessidade

de inserir o ensino da língua portuguesa no curso em que atuam, pois para que o

estudo de matérias jurídicas seja efetuado de forma positiva também é necessário o

conhecimento da língua portuguesa.

Tal conhecimento desejado no curso de direito não é o mesmo que até então

foi ensinado nos anos anteriores à faculdade, mas sim um ensino de língua

portuguesa efetivo e que faça com que o aluno realmente utilize a língua de forma

adequada, clara e necessária a sua atuação profissional. Neste aspecto vale ressaltar

Geraldi: “ A escola deveria cuidar primariamente da fala dos alunos, único meio de

comunicação que a imensa maioria terá pela vida toda.” (GERALDI, 1981, p.20)

Os professores de língua portuguesa têm se esforçado para reformular o seu

ensino, deixando de ser um ensino castrador e transformando-se e num ensino

necessário e prazeroso. Com uma orientação lingüística correta, aulas dadas com

bom-senso e com objetivos definidos, buscam transformar as aulas em algo prático,

livre e produtivo, onde o aluno seja agente de seu pleno desenvolvimento verbal e

um agente interessado realmente nisto.

Não basta ao aluno de direito ter conhecimento em sua área de formação se

não souber aplicá-los na prática com uma linguagem adequada e inteligível, pois

apenas seus conhecimentos técnicos na área não são suficientes para exercer sua

futura profissão, cabe ao futuro advogado ter o domínio de sua língua pátria de forma

a utilizá-la com clareza, coerência e coesão, além, é claro, de estar apto a utilizar a

norma culta.

Para receber a qualificação de advogado e poder exercer efetivamente esta

profissão, o bacharel em direito precisa passar por uma avaliação chamada de

Page 24: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

24“Exame da Ordem” ou seja, realizar uma prova na Ordem dos Advogados do Brasil,

cuja aprovação é a única maneira de receber a carteira que o habilita a exercer a

profissão. Nesta avaliação muitos são reprovados não são apenas por não saber

conteúdos jurídicos necessários a sua atuação profissional, mas também por não

saber expressar com clareza o que quer e por cometer erros absurdos, ferindo assim a

norma culta. (ANEXO 01)

Diante desta situação os alunos e professores de direito avaliam a grande

necessidade de ministrar aulas de língua portuguesa para os alunos de direito

aprenderem a utilizar a língua materna de forma adequada e condizente com sua

atuação profissional, não sendo suficiente apenas estudar matérias jurídicas, mas é

necessário e urgente que os futuros advogados aprendam aquilo que não aprenderam

ao longo de tantos anos de escolaridade anteriores à faculdade.

Page 25: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

25

CAPÍTULO IV

CAMINHOS PARA UM EFETIVO TRABALHO

DE LÍNGUA PORTUGUESA NOS CURSOS DE DIREITO

“Os indivíduos não recebem a língua pronta para ser

usada; penetram na corrente da comunicação verbal, ou

melhor,somente quando mergulham nessa corrente é que sua

consciência desperta e começa a operar...Os sujeitos não

adquirem a língua materna, é nela e por meio dela que ocorre

o primeiro despertar da consciência." (EGLÊ FRANCHI,

1984, p.85)

Page 26: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

26

Muito se tem escrito sobre as deficiências do ensino da Língua Portuguesa e

do excesso de erros cometidos pelas crianças nas escolas. O aluno é bem capaz de

estudar em uma escola por mais de oito anos e sair para a faculdade com o mesmo

registro lingüístico com o qual chegou a ela e, o que é pior, muitas dessas crianças

saem dessa escola mudas, enquanto espontaneidade e originalidade de linguagem.

Questiona-se a origem de mais esse problema de um ensino, que não atende

aos interesses da comunidade, que faz o aluno distanciar-se da escola, que não o

prepara para a vida. Pobre do estabelecimento e do professor que acreditar que a

linguagem, com a qual a criança chega à escola, não tem criatividade, não tem poder

de comunicação e tem que ser mudada. Pior ainda é aquele professor, que nem chega

a perceber que essa criança domina uma linguagem inadequada para todos os

momentos e locais do mundo altamente globalizado.

Nos muitos anos de escolaridade que antecedem à faculdade, não raras vezes,

a escola contribui para a regressão da criatividade da criança, sobretudo das classes

desfavorecidas ao apontar o registro lingüístico com o qual o aluno chega à escola

como vulgar e incorreto. Assim, tudo que o menino fala (e não corresponde à

linguagem culta), é apontado como erro e estigmatizado pelo mestre. Caberá à escola

saber trabalhar a partir desse material e não penitenciar o aluno, até mesmo fazendo-

o passar de ano sem trabalhar falsas hipóteses.

A imposição da norma culta, pura e simplesmente, como única forma de

comunicação, rompe o sistema lingüístico da criança, o que também é uma forma de

violência das escolas. Nega-se a linguagem da criança e condena-a ao mutismo e ela,

certamente, interiorizará a idéia, totalmente preconceituosa, de que já que não sabe

falar tem que permanecer muda.

Há que se tomar muito cuidado quanto à artificialidade das situações de

linguagem na escola e à prática pedagógica de caráter acentuadamente corretivo.

A Língua Portuguesa não é somente a variação culta, assim como o latim não o foi.

A língua permite os mais diversos registros que o falante deve ser capaz de dominar

diante de cada situação de comunicação em que se encontrar e diante do falante com

o qual deve interagir.

Se a linguagem com a qual a criança chega à escola não é a desejada pelo

professor, cabe a ele trabalhar para que o aluno entenda a língua como ela deve ser

Page 27: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

27entendida e não fique apenas repetindo e decorando regras, listas e exercícios

descontextualizados. Todos os registros são valiosos, se aplicados à situação de

comunicação do momento.

Entretanto, há que se ressaltar que a pessoa é valorizada pela linguagem

dominada pelo grupo em que vive e que a linguagem verbal não é o único meio

eficaz de comunicação. O que não se pode é reprimir e agredir a linguagem familiar

e socialmente utilizada pela criança, atitude essa, que não a levará ao

desenvolvimento da competência comunicativa, mas à perda da linguagem.

A maneira como se utiliza a linguagem está ligada ao modo pelo qual

entende-se a classe social e nela o individuo interage. Na verdade, a sala de aula é

um espaço adequado para o exercício da linguagem. Com efeito, assim como não

podemos ir à praia de terno e gravata ou não é de bom gosto ir a um casamento, às 20

horas, de jeans e camiseta, cabe à escola dar aos alunos os instrumentos e colocá-los

em situações de comunicação, que lhes permita o uso das diversos registros

lingüísticos

Essa prática é sugerida por Vygotsky, quando diz que a “possibilidade de

comunicação não é somente o resultado de um trabalho social, uma herança

adquirida passivamente, mas algo que se adquire em ambiente de rica interação

social” (VYGOTSKY, 2002, p.25). Utilizando métodos pedagógicos adequados, o

aluno será capaz de se comunicar nas diversas situações de interlocução.

Devem ser promovidos aos alunos exercícios lingüísticos, procurando evitar a

estigmatização da linguagem das crianças, estimulando a produção de textos que

objetivam reforçar a sensibilidade para diferentes usos da linguagem,

conscientizando da existência de variados registros lingüísticos e do seu prestígio

social relativo; levar à compreensão do fato de que os usos da linguagem são regidos

por convenções; mostrar que o registro-padrão é uma variação lingüística

socialmente prestigiada, mas equivalente ao dialeto trazido pela criança, enquanto

expressividade e poder de comunicação e conduzir, através da prática, à

compreensão de que o melhor falante é aquele capaz de se adaptar a cada uma das

situações de comunicação; levar o aluno a observar a oposição entre o padrão culto e

o popular, possibilitando à classe produzir textos nos diferentes registros lingüísticos.

Essa conscientização e o domínio dos diferentes registros lingüísticos têm o

poder de desinibir o aluno-cidadão e levá-lo ao respeito das diferenças.

Page 28: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

28Agora, atenção: respeitar a linguagem do aluno não significa, de modo algum, deixá-

lo dominar apenas o registro de sua comunidade, com o qual ele chegou, como

falante, à escola. Não se pode privar o aluno do acesso aos diferentes registros

lingüísticos, pois nenhum é menos expressivo que o outro. O que o aluno deve

compreender é que existem diferentes situações de comunicação e que ele sairá

muito melhor se souber se adaptar a elas.

Desse modo, fica claro que a linguagem culta deverá ser, inegavelmente, de

domínio dos professores, pois a escola é um dos raros locais, no qual o aluno ainda

poderá ouvi-la, exercitá-la e apoderar-se dela, para ser capaz de utilizá-la nos devidos

momentos.A escola deverá motivar o aluno a querer aprender o padrão culto por seus

benefícios e não o “enfiar goela abaixo”, o que certamente traria seriíssimas

conseqüências.

Concebendo a linguagem como uma forma de interação, onde sujeito se

constitui pelo processo de interlocução, propõe-se para o ensino de língua portuguesa

nos cursos de direito, atividades baseadas em três práticas interligadas e

fundamentais:- leitura de textos; -produção de textos e -análise lingüística.

Tais práticas têm dois objetivos: tentar ultrapassar, apesar dos limites da

escola, a artificialidade que se institui na sala de aula quanto ao uso da linguagem;

possibilitar, pelo uso não artificial da linguagem o domínio da língua padrão em suas

modalidades oral e escrita.

A leitura de um texto não é mera decodificação de sinais gráficos, mas a

busca de significações, marcadas pelo processo de produção desse texto e também

marcadas pelo processo de produção de sua leitura.

Coerentes com a concepção de linguagem assumida, professores e alunos, nas

aulas de língua portuguesa, tornam-se interlocutores que falam, escrevem, lêem e

analisam fatos lingüísticos. Na visão de Chomsky:

“Não foi por escolha que adquirimos o idioma que falamos:

ele simplesmente se desenvolveu em nossa mente em virtude

de nossa constituição interior e do meio ambiente em que

vivemos[...] para cada um de nós, a língua se desenvolve em

conseqüência de nossa constituição atual, quando somos

colocados no meio ambiente apropriado.” (CHOMSKY,

1971, p.62)

Page 29: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

29Em linhas gerais, essa é a perspectiva básica que orienta as atividades que se

desenvolvem nas salas de aula. Os alunos devem produzir textos significativos e

relacionados com sua realidade e não redações sem sentido algum.

A analise lingüística se coloca como uma forma de retomada do texto

produzido pelo aluno, atuando sobre possíveis problemas de compreensão que tal

texto, produzido em sua primeira versão, possa oferecer no processo de leitura.

A leitura, por sua vez, é entendida como um processo de interlocução entre

leitor/texto/autor. O aluno leitor não é passivo, mas o agente que significações. E

nesse processo de leitura, de interlocução do aluno leitor com o texto/autor, a posição

do professor não é a do mediador do processo que dá ao aluno sua leitura do texto,

tampouco, é a da testemunha, que, alheia ao processo, apenas o vê realizar-se e dele

pode dar testemunho. Se, em algum momento, o professor passa a testemunhar, isso

se deve ao fato de que como sujeito já se colocou como interlocutor de seus alunos,

possibilitando as condições materiais para que o processo se desencadeasse.

AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA NOS CURSOS SUPERIORES

Como objetivo geral tem-se: levar os alunos a concluir que o aprendizado da língua-padrão é essencial para a comunicação do cidadão e do futuro advogado.

Para atingir o objetivo das aulas de língua portuguesa nos cursos superiores é

preciso ressaltar e levar em consideração alguns aspectos como cada aluno já chega à

faculdade dominando uma forma de comunicação e expressão; esse registro não é

único; valores de cada registro; diante da enormidade das situações, dominar,

conscientemente, o maior números de registros lingüísticos; a linguagem culta é

importantíssima e precisamos dominá-la e utilizá-la em situação em que nosso

interlocutor a usa; cabe aos professores, em geral, o uso e o domínio da linguagem

culta, como registro próprio para a sala de aula e também, os alunos deverão se

conscientizar de que a linguagem culta é apropriada para ser usada em sala de aula.

Tudo isso busca uma meta a alcançar que é levar os alunos à motivação para o

aprendizado e domínio da linguagem culta.

Page 30: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

30

UTILIZAÇÃO DAS NOVAS TECNOLOGIAS PARA

UMA MELHOR APRENDIZAGEM

Com o fácil acesso as novas tecnologias no mundo de hoje, o uso do

computador pode ser um grande instrumento nas aulas de lp nos cursos de direito, há

professores já convencidos de que o computador tem seu lugar na escola, perguntam-

se sobre qual é a melhor forma de usá-lo na aula de Português. Mais uma vez vale

lembrar que, para usar o computador na sala de aula, é preciso se desprender do que

vem sendo feito na escola tradicionalmente há anos e vislumbrar uma nova realidade

do ensino.

Nessa nova realidade não há lugar para a “decoreba” nem para o que não seja

significativo para o aluno. O que está valendo são todas as tentativas de fazer com

que o aprendiz se envolva na construção do seu próprio conhecimento. É também

importante lembrar que a obtenção de resultados satisfatórios com o uso do

computador depende de como esse equipamento esteja sendo usado. O computador

não faz nada sozinho e nem faz milagres. Ele tem muitos recursos e nos dá acesso a

uma infinidade de informações em sala de aula.

Aqui estão algumas sugestões, entre inúmeras outras, para usar o

computador na aula de língua portuguesa nos cursos de direito, usar a Internet e CD

Rom para fazer pesquisas. Os alunos podem pesquisar sobre assuntos relacionados

aos temas que dizem respeito ao mundo jurídico e assim terão mais informações para

sua formação acadêmica e acesso à leitura como forma de estudo de língua

portuguesa. Feita a pesquisa, os alunos podem fazer relatórios e apresentar para a

turma, como forma de treinar a expressão escrita e oral, tão importantes aos futuros

advogados.

É importante lembrar que, durante a realização dessas atividades, professores

e alunos deverão estar atentos à adequação e ao bom emprego dos elementos

lingüísticos que estão sendo usados, como, por exemplo, os elementos coesivos, a

seleção lexical, a estruturação dos períodos, a organização dos textos, entre outros.

Page 31: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

31

CONCLUSÃO

Após terminar esta pesquisa, que mostrou a necessidade do ensino de língua

portuguesa nos cursos de direito, percebe-se que os alunos e futuros profissionais do

mundo jurídico sinalizam que o ensino de português, ministrado nos anos escolares

que antecedem ao curso superior, não é pouco, porém não é eficiente e eficaz.

Durante anos, a língua portuguesa é ensinada nos diversos níveis de ensino,

de uma maneira inadequada à sua real função, baseando-se em regras e normas

gramaticais de forma descontextualizada de sua utilização na prática, na vida. Isto

posto, foi visto que o ensino de língua portuguesa não tem cumprido seu papel social

e sua prática precisa ser revista, com o objetivo de atender aos usuários da língua

pátria e não só ser oferecida como matéria escolar sem qualquer relação com a vida

do aluno.

A metodologia do ensino de língua portuguesa que vem sendo realizada faz

com que o aluno chegue ao curso superior com grandes dificuldades de expressão

oral e escrita, com erros que ferem a norma culta. Diante disto, os alunos do curso de

direito precisam continuar estudando a matéria, não como era feito anteriormente a

sua entrada na faculdade, mas de uma forma prática, favorecendo a utilização da

língua no contexto social e profissional; sem esta habilidade o futuro advogado

apresenta uma falha em sua formação, que em algum momento precisa ser superada.

Não se pode acreditar que tantos anos de escolaridade são suficientes para

aprender a língua portuguesa, é preciso continuar este ensino nos cursos de direito,

não da mesma maneira que antes, mas de uma forma mais prática, voltada para a

aplicação da língua nas situações cotidianas, exigidas pela profissão de advogado.

É necessário rever o conceito de ensino de língua portuguesa e voltar sua

prática para uma real aprendizagem da língua materna, sem regras vazias, mas com a

verdadeira função que uma língua tem em sua nação.

Page 32: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

32

BIBLIOGRAFIA

BAKHIN, Mikhall. Psicologia e educação. São Paulo: Ática,2002. BECHARA, Ivanildo. Gramática da Língua Portuguesa. BELTRAN,J.L. O ensino de português – intenção e realidade. São Paulo: Moraes, 1999. CASTRO, Marcos de. A imprensa e o caos na ortografia. Rio de Janeiro, Record, 1998. CHOMSKY, Noam. Linguagem e pensamento. Petrópolis: Vozes, 1971. CUNHA, Celso. Uma política de idioma. Rio de Janeiro: Livraria São José, 1994. FERREIRA, Luiz Antonio. Oralidade e escrita: um diálogo pelo tempo. São Paulo. Efusão, 2003. FISCHER, R.M.B. A questão das técnicas didáticas. Ijuí: Fidene, 1986. GERALDI, J. Subsídios metodológicos para o ensino de língua portuguesa. Cadernos da Fidene, n. 18, 1981, p.70. HAYAKAWA, S.I. A linguagem no pensamento e na ação. São Paulo. Pioneira, 1996. ILARI, Rodolfo. A lingüística e o ensino de língua portuguesa. São Paulo: Martins Fontes, 1995. LABOV, Willian. Sociolinguistic Patterns. Philadelphia: University of Pennsylvania,1972. LUFT, Celso Pedro. Língua e liberdade: por uma nova concepção da língua materna. Porto Alegre, L&PM, 1998. PÉCORA, Alcyr. Problemas de Redação. São Paulo, Martins Fontes, 1998. ROCCO, Maria Thereza Fraga. Crise na linguagem: redação no vestibular. São Paulo, Mestre Jou, 2002. ROCCO,Maria Thereza Fraga. Linguagem autoritária-televisão e persuasão. São Paulo, Brasiliense, 1988. SOARES, Magda. Aprendizagem da língua materna: problemas e perspectivas. Aberto, Ano 2, n.12, 1983.

Page 33: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

33_______. A linguagem e escola – uma perspectiva social. São Paulo: Ática, 1996. TEBEROSKY, Ana. Aprendendo a escrever – perspectivas psicológicas e implicações educacionais. São Paulo: Ática, 1994. VYGOTSKY, Lev. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1987. Martins Fontes, 1987. VANOYE, Francis. Usos da linguagem: problemas e técnicas na produção oral e escrita. São Paulo, Martins Fontes, 1999.

Page 34: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

34

ÍNDICE

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I

• A LINGUAGEM COMO ATIVIDADE HUMANA 09

• A VARIAÇÃO DA LINGUAGEM 11

CAPÍTULO II

• A NECESSIDADE DO ENSINO DE LINGUA PORTUGUESA NOS

CURSOS DE DIREITO 16

• SINAIS DE UM ENSINO EQUIVOCADO 17

CAPÍTULO III

• OBJETIVOS DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA

NOS CURSOS DE DIREITO 21

CAPÍTULO IV

• CAMINHOS PARA UM EFETIVO TRABALHO DE 25

LINGUA PORTUGUESA NOS CURSOS DE DIREITO

• AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA NOS CURSOS SUPERIORES 29

• UTILIZAÇÃO DE NOVAS TECNOLOGIAS PARA UMA MELHOR

APRENDIZAGEM 30

CONCLUSÃO 31

BIBLIOGRAFIA 32

ÍNDICE 34

Page 35: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

35

FOLHA DE AVALIAÇÃO

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO MESTRE Pós-Graduação “Lato Sensu”

A NECESSIDADE DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NOS CURSOS DE DIREITO

Data da entrega: ______________ Banca avaliadora:____________________________________________ Avaliado por: _______________________________ Grau: __________ Rio de Janeiro, ______de _____________de________.

Page 36: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

36

ANEXOS

Page 37: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

37

ANEXO 01 Provimento nº 81/96 (publicado no Diário da Justiça, Seção I, em 23ABR96, p. 1207) Estabelece normas e diretrizes do Exame de Ordem. O CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelos arts. 54, V, e 8º § 1º, da Lei 8.906, de 04JUL94, tendo em vista o decidido no Processo CP nº 4.111/96,

RESOLVE baixar o seguinte Provimento:

Art. 1º - É obrigatória aos bacharéis de Direito a aprovação no Exame de Ordem para admissão no quadro de advogados.

Parágrafo Único - Ficam dispensados do Exame de Ordem os inscritos no quadro de estagiários da OAB que comprovem satisfazer as condições estabelecidas no art. 84 da Lei nº 8.906/94, assim como os que se enquadram nas disposições transitórias contidas nos incisos do art. 7º da Resolução nº 02, de 02.09.94, do Conselho Federal da OAB, os oriundos da Magistratura e do Ministério Público e os integrantes das categorias jurídicas elencadas no §1º do art. 3º da Lei nº 8.906/94.

Art. 2º - O Exame de Ordem é prestado apenas pelo bacharel de Direito, na Seção do Estado onde concluiu seu curso de graduação em Direito ou na de seu domicílio civil.

Parágrafo único – É facultado aos bacharéis em Direito que exerceram cargos ou funções incompatíveis com a advocacia prestar Exame de Ordem, mesmo estando vedada sua inscrição na OAB.

Art. 3º - Compete à Primeira Câmara do Conselho Federal expedir resoluções regulamentando o Exame de Ordem para garantir sua eficiência e padronização nacional, ouvidas a Comissão de Exame de Ordem e a Coordenação Nacional de Exame de Ordem.

§ 1º - Compete à Comissão de Exame de Ordem do Conselho Federal da OAB definir diretrizes gerais e de padronização básica da qualidade do Exame de Ordem, cabendo ao Conselho Seccional realizá-lo, em sua jurisdição territorial, observados os requisitos deste Provimento, podendo delegar, total ou parcialmente, a realização, sob seu controle, às Subseções ou às Coordenadorias Regionais criadas para esse fim.

§ 2º - À Coordenação Nacional de Exame de Ordem, composta de um representante de cada Conselho Seccional, sob a direção de um representante do Conselho Federal, compete acompanhar a realização do Exame de Ordem no País, atuando em harmonia com a Comissão de Exame de Ordem do Conselho Federal, dando-lhe o apoio no plano executivo.

§ 3º - As bancas examinadoras são compostas de, no mínimo, três (3) advogados, com, pelo menos, cinco (5) anos de inscrição e de efetivo exercício d d i d i d l P id t d C lh S i l id

Page 38: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

38

Comissão de Estágio e Exame de Ordem.

Art. 4º - O Exame de Ordem ocorrerá até três (3) vezes por no, sempre nos meses de março, agosto e dezembro, em calendário fixado pelos Conselhos Seccionais, que o realizarão em período único, em todo o território nacional, devendo o Edital respectivo ser publicado com o prazo mínimo de trinta (30) dias de antecedência.

Parágrafo único – Cabe aos Conselheiros Seccionais estabelecer a taxa de inscrição cobrada para cada Exame de Ordem, cujo valor não excederá a trinta por cento (30%) da respectiva anuidade.

Art. 5º - O Exame de Ordem abrange duas (2) provas:

I – Prova Objetiva, contendo no mínimo cinqüenta (50) e no máximo cem (100) questões de múltipla escolha, com quatro (4) opções cada, elaborada e aplicada sem consulta, de caráter eliminatório, exigindo-se a nota mínima cinco (5) para submeter-se à prova subseqüente;

II – Prova Prático-Profissional, acessível apenas aos aprovados na Prova Objetiva, composta, necessariamente, de duas (2) partes distintas:

a) redação de peça profissional, privativa de advogado (petição ou parecer), em uma das áreas de opção do examinado, quando da sua inscrição, dentre as indicadas pela Comissão de Estágio e de Exame de Ordem no edital de convocação retiradas do seguinte elenco: Direito Civil, Direito Penal, Direito Comercial, Direito do Trabalho, Direito Tributário ou Direito Administrativo;

b) respostas a até cinco (5) questões práticas, sob a forma de situações-problemas, dentro da área de opção.

§ 1º - A Prova Objetiva compreende as disciplinas profissionalizantes obrigatórias e integrantes do currículo mínimo de Direito fixadas pelo MEC, como também questões sobre o Estatuto da OAB, o Regulamento Geral e o Código de Ética e Disciplina.

§ 2º - A Prova Prático-Profissional, elaborada dentre os itens constantes do programa elaborado pela Comissão de Exame de Ordem do Conselho Federal, tem a duração determinada pela respectiva banca examinadora no Edital, permitidas consultas à legislação, livros de doutrina e repertórios jurisprudências, vedada a utilização de obras que contenham formulários e modelos.

§ 3º - N Prova Prático-Profissional os examinadores avaliam o raciocínio jurídico, a fundamentação e sua consistência, a capacidade de interpretação e exposição, a correção gramatical e a técnica profissional demonstrada, considerando-se aprovado o examinando que obtiver nota igual ou superior a seis (6).

§ 4º - Cabe à banca examinadora atribuir notas na escala de zero (0) a dez (10), em números inteiros, nas provas objetiva e prático-profissional.

§ 5º É l t h l f d id tifi ã d

Page 39: Francisco Barros Neto - AVM - Pós-Graduação BARROS NETO.pdf · Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais

39

examinando.

Art. 6º - Do resultado da prova objetiva ou da prova prático-profissional cabe recurso para a Comissão de Estágio e Exame de Ordem, sempre no prazo de três (3) dias úteis após a divulgação do resultado, sendo irrecorrível a decisão.

Parágrafo único – O recurso do Exame de Ordem, devidamente fundamentado e tempestivamente entregue no protocolo do Conselho Seccional ou Subseção, abrangerá o conteúdo das questões da prova objetiva ou prático-profissional ou sobre erro na contagem de pontos para atribuição da nota.

Art. 7º - A divulgação dos resultados de qualquer prova do Exame de Ordem, após homologação da Comissão de Estágio e de Exame de Ordem, dar-se-á na sede do Conselho Seccional ou da Subseção delegada.

§ 1º - É vedada a divulgação dos nomes dos examinados reprovados.

§ 2º - O candidato reprovado pode repetir o Exame de Ordem, vedada a dispensa de quaisquer provas.

§ 3º - O Conselho Seccional, após cada Exame de Ordem, deve remeter à Comissão de Ensino Jurídico do Conselho Federal, no prazo de trinta (30) dias, quadro estatístico indicando o percentual de aprovados e reprovados por curso jurídico e as respectivas áreas de opção.

Art. 8º - 0 certificado de aprovação tem validade por tempo indeterminado, devendo ser assinado pelo Presidente do Conselho Seccional ou da Subseção delegada e pelo Presidemte da banca examinadora.

Art. 9º - As matérias sobre Exame de Ordem, inclusive a atualização períódica do programa da Prova Prático-Profissional, com validade e abrangência nacionais, serão apreciadas pela Comissão de Exame de Ordem do Conselho Federal e submetidas ao Presidente do Conselho Federal da OAB.

Art. 10 – Este Provimento entrará em vigor em 1º de agosto de 1996, revogado o Provimento nº 74, de 11MAI92, e demais disposições em contrário.

Sala das Sessões, em 16 de abril de 1996

Ernando Uchoa Lima, Presidente Roberto Ferreira Rosas, Relator