13
Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro” ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013 GT 8. Marxismos latino-americanos 157 GT 8. Marxismos latino-americanos Frei Betto: um olhar sobre o marxismo Rhaissa Marques Botelho Lobo 1 Os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem segundo a sua livre vontade, em circunstâncias escolhidas por eles próprios, mas nas circunstâncias imediatamente encontradas, dadas e transmitidas pelo passado. (MARX, 2008, p. 207.) Resumo: O objetivo deste texto é apresentar a pesquisa que já venho desenvolvendo sobre o movimento “Teologia da Libertação” que nasceu na América Latina nos anos de 1960 e que tem como principais características a luta contra as injustiças sociais com inspiração marxista. O movimento passa por inúmeras transformações devido à conjuntura histórica que propiciou o seu nascimento e fortalecimento no período de luta contra as ditaduras militares que varriam o continente latino-americano, e seu declínio no período pós- socialismo real, onde todos os movimentos de inspiração marxista foram afetados, fatos já percebidos no estudo do intelectual Leonardo Boff através de suas obras selecionadas e analisadas em meu estudo anterior; agora a mesma linha será utilizada no estudo de outro intelectual da Teologia da Libertação no Brasil e na América Latina, Frei Betto. Frade Dominicano que auxilio diversos movimentos que participaram da luta armada dos quais mais destacam a ALN (Ação Libertadora Nacional). Palavras-chave: Militância; Teologia da Libertação; Marxismo; intelectual. INTRODUÇÃO A pesquisa iniciou-se com um levantamento bibliográfico sobre a Teologia da Libertação, posteriormente delimitou-se o recorte cronológico. A partir daí buscou-se o suporte teórico das ciências e da História das religiões. Elegeu-se Pierre Bourdieu, Mircea Eliade e Françoise Champion, Aline Coutrot, entre outros, que trabalham com os estudos nos campos, intelectual, político e religioso. Mais do qualquer outro período, talvez, o século XX vive a coexistência muitas vezes conflituada entre as forças de conservação e as de mudança. Este século marca 1 Bolsista PIBIC/PROPq, do Curso de História da Universidade Federal de Mato Grosso/UFMT, vinculado ao Grupo de Pesquisa "História, Religião e Política no Mundo Contemporâneo" (CNPQ), sob orientação do Prof.Dr. Cândido Moreira Rodrigues. [email protected].

Frei Betto: um olhar sobre o marxismo - UEL Portal · período pós- socialismo real, ... uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João ... que impede que o rico

  • Upload
    vananh

  • View
    229

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Frei Betto: um olhar sobre o marxismo - UEL Portal · período pós- socialismo real, ... uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João ... que impede que o rico

Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro”

ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013

GT 8. Marxismos latino-americanos 157

GT 8. Marxismos latino-americanos

Frei Betto: um olhar sobre o marxismo

Rhaissa Marques Botelho Lobo1

Os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem segundo a sua livre vontade, em circunstâncias escolhidas por eles próprios, mas nas

circunstâncias imediatamente encontradas, dadas e transmitidas pelo passado. (MARX, 2008, p. 207.)

Resumo: O objetivo deste texto é apresentar a pesquisa que já venho desenvolvendo sobre o movimento “Teologia da Libertação” que nasceu na América Latina nos anos de 1960 e que tem como principais características a luta contra as injustiças sociais com inspiração marxista. O movimento passa por inúmeras transformações devido à conjuntura histórica que propiciou o seu nascimento e fortalecimento no período de luta contra as ditaduras militares que varriam o continente latino-americano, e seu declínio no período pós- socialismo real, onde todos os movimentos de inspiração marxista foram afetados, fatos já percebidos no estudo do intelectual Leonardo Boff através de suas obras selecionadas e analisadas em meu estudo anterior; agora a mesma linha será utilizada no estudo de outro intelectual da Teologia da Libertação no Brasil e na América Latina, Frei Betto. Frade Dominicano que auxilio diversos movimentos que participaram da luta armada dos quais mais destacam a ALN (Ação Libertadora Nacional). Palavras-chave: Militância; Teologia da Libertação; Marxismo; intelectual.

INTRODUÇÃO

A pesquisa iniciou-se com um levantamento bibliográfico sobre a Teologia da

Libertação, posteriormente delimitou-se o recorte cronológico. A partir daí buscou-se o

suporte teórico das ciências e da História das religiões. Elegeu-se Pierre Bourdieu, Mircea

Eliade e Françoise Champion, Aline Coutrot, entre outros, que trabalham com os estudos

nos campos, intelectual, político e religioso.

Mais do qualquer outro período, talvez, o século XX vive a coexistência muitas

vezes conflituada entre as forças de conservação e as de mudança. Este século marca

1 Bolsista PIBIC/PROPq, do Curso de História da Universidade Federal de Mato Grosso/UFMT, vinculado ao

Grupo de Pesquisa "História, Religião e Política no Mundo Contemporâneo" (CNPQ), sob orientação do

Prof.Dr. Cândido Moreira Rodrigues. [email protected].

Page 2: Frei Betto: um olhar sobre o marxismo - UEL Portal · período pós- socialismo real, ... uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João ... que impede que o rico

Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro”

ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013

GT 8. Marxismos latino-americanos 158

também o deslocamento do centro de gravidade da Igreja Católica outrora contra-

revolucionária e que hoje ser quer consciência da sociedade moderna. (COUTROT,

p.340.2003).

A militância de Frei Betto dentro dessas transformações da Igreja estudada por Coutrot

demonstra a importância do estudo deste intelectual, que por meio de sua rede de relações

manteve-se ao lado das forças de mudança contra as de conservação.

Frei Betto2 é analisado dentro de três eixos temáticos: Visão de mundo pós-socialismo

real (Fidel e a religião: conversas com Frei Betto3, Cristianismo e Marxismo, e O paraíso

Perdido); O papel da Igreja no mundo pós-1989 e pensamento místico-ecumênico em

Betto (Sinfonia universal, a cosmovisão de Teilhard de Chardin e A obra do Artista) e

Cartas do Cárcere (Batismo de Sangue e Diário de Fernando).4

A teologia da libertação no Brasil teve como seus maiores ícones Leonardo Boff, teólogo

dessa teologia revolucionária, e Frei Betto, militante dos movimentos católicos e principal

militante das comunidades eclesiais de base (CESBs). Boff pregou um cristianismo de luta

contra a pobreza e a injustiça social e não a caridade como ação amenizadora. Já Betto, por

meio da fundação das CESBs, formadas por leigos e Clérigos, luta contra as injustiças sociais

e contra o regime autoritário que se instalou no Brasil após 1964 com a deposição de João

Goulart.

Essa teologia tem como os principais fatores de criação e desenvolvimento a situação

política, econômica e social do continente em que a maioria dos países estava sob o governo

de regimes militares durante os quais as questões sociais se agravaram. O desenvolvimento do

marxismo como instrumento de analise social e as mudanças ocorridas dentro da igreja como

a experiência da ação católica e seu método ver-julgar-agir. O concilio do Vaticano II, A

conferência de Medellín na Colômbia, o berço da Teologia da Libertação, as CEBs e

enfrentamento dos bispos aos regimes militares. (DELGADO e PASSOS, 2007.).

Até na Igreja Católica o tempo de recusa intransigente da sociedade moderna

parece ultrapassado. Entre 1962 e 1965 tem lugar o concilio Vaticano II. Para além

das interpretações divergentes quanto á amplitude da rotura por ele operada

relativamente ao passado- mudança na Igreja ou mudança da Igreja-, a verdade é que

houve uma viragem: na leitura do mundo moderno, que deixa de ser considerado

unicamente como mau, sobre a questão da liberdade religiosa, sobre a concepção da

2 O frade Dominicano Carlos Alberto Libânio Christo, mais conhecido por frei Betto, mineiro de Belo Horizonte nascido

em 1944, formado em Jornalismo, Antropologia, Filosofia e Teologia, intelectual brasileiro, autor de 53 livros publicados no

Brasil e no exterior (América Latina e Europa), versando sobre as mais variadas áreas, destacando-se culinária mineira,

memória nacional com contestação social, educação popular, literatura e teologia. 3 Ganhador do prêmio José Marti\UNESCO de 2013, por seu trabalho em prol dos direitos Humanos. 4 Este divisão de eixos temáticos na obra de Frei Betto é analisada e exposta resulta da minha pesquisa de

Iniciação Científica desenvolvida dentro do grupo “História, Religião e Politica no Mundo Contemporâneo”, no

decorrer do biênio 2011/2012, entregue ao CNPQ.

Page 3: Frei Betto: um olhar sobre o marxismo - UEL Portal · período pós- socialismo real, ... uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João ... que impede que o rico

Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro”

ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013

GT 8. Marxismos latino-americanos 159

Igreja agora entendida antes de mais nada como o “povo de Deus”. (CHAMPIOM,

p.706,2002.)

A Teologia da Libertação vai perdendo força a partir do momento em que a Igreja sofre

uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João Paulo II. Por outro lado, a

redemocratização do Brasil acontece fazendo com que essa teologia não atenda mais aos

anseios imediatos do povo, perdendo espaço para a teologia da prosperidade5 que melhor

corresponde a esses anseios. No entanto, a teologia da libertação não desaparece, só diminui

sua publicidade, mas continua a influenciar a política com a atuação de representantes no

governo Lula e adere novas temáticas como ecologia, a liberdade feminina, a fluidez religiosa

caracterizando sua nova fase denominada Mística ecológica.

A aproximação da Teologia da Libertação com as religiões orientais ocorre após crise

paradigmática do pós 1989 gerada pela queda do socialismo real em todos os movimentos de

inspiração marxista. A Teologia da Libertação, como movimento que possui esta inspiração

será o nosso ponto de partida para analise dos contrastes entre os pensamentos dos dois

maiores representantes desta teologia no Brasil, Leonardo Boff, agora militante Laico e sem

vínculos com a Igreja Católica e Frei Betto ainda ligado a Igreja e diretor das CEBs, os dois

flertam com a fluidez das temáticas das religiões orientais como o equilíbrio da relação

homem- natureza resultando na mística ecológica.

Militante do Movimento estudantil desde os 13 anos, Frei Betto dirigiu a Juventude

Universitária Católica de 1962 a 1964 tendo sido preso pela primeira vez em Junho de 1964.

Já em 1965 ingressa na Ordem Dominicana, cursando Filosofia e Teologia, exerce a Profissão

de jornalista e atua na resistência contra o regime militar, o que motivou a sua segunda prisão

de 1969 a 1973. Assessora diversos movimentos sociais dentre os quais se destacam a partir

de 1974 as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) símbolo do modelo de Igreja comunitária

defendida pela Teologia da Libertação, a Pastoral Operária de São Bernardo do Campo, e do

Centro de Educação Popular do Instituto Sedes Sapientiae. E conjuntamente com Leonardo

Boff é o maior nome do movimento teológico da libertação do Brasil, e dos mais

representativos na América Latina e no Mundo. Foi coordenador de Mobilização social do

Programa Fome Zero entre 2003 e 2004, no governo Lula.

5 É um movimento teológico norte-americano do inicio do século XX, a partir da interpretação de alguns textos

bíblicos, segue a premissa de que os verdadeiros fiéis a Deus devem possuir excelente situação financeira.

Entanto sua abrangência mundial começa a partir dos anos 70.

Page 4: Frei Betto: um olhar sobre o marxismo - UEL Portal · período pós- socialismo real, ... uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João ... que impede que o rico

Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro”

ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013

GT 8. Marxismos latino-americanos 160

A História é um processo em construção permanente, marcado por temporalidades,

delimitações espaciais, construída por sujeitos individuais e coletivos. Dinâmica complexa,

envolvendo ideologias, culturas, vida privada, ações públicas, representações, imaginários,

lutas, reações, valores, resistências, e demais variáveis constituintes da rede complexa pela

qual o homem se insere na vida em sociedade através do tempo. A partir desta premissa a

História política é a forma como o homem constrói heterogeneamente a teia de realidades

imbricando-se e inter-relacionando-se em conjuntos dinâmicos sociais, às vezes consensuais,

às vezes conflituosos. Os sujeitos que constroem essa história política são diversos,

representam interesses plurais da realidade humana. Estes sujeitos individuais, mulheres,

homens, inserem-se na militância ou escolhem a vida pública como profissão. Sendo sujeitos

coletivos institucionais, como organizações políticas e partidos, reunindo pessoas que

compartilham identidades e projetos comuns, mesmo localizando-se só no campo da teoria,

inseridos na sociedade ou país. (DELGADO, 2010, p.129.).

As obras Cristianismo e Marxismo e O paraíso perdido: nos bastidores do socialismo,

são consequências de um projeto inicial do autor de 1979, passa a ter formas reais a partir da

publicação de Fidel e a religião: conversas com Frei Betto. É que o próprio autor enuncia

no prefácio Caminhos de um encontro:

Havia proposto ao meu querido compadre e editor Ênio Silveira a idéia de um

livro que teria o título de A fé no socialismo. Realizá-la exigiria que viajasse aos

países socialistas para entrar em contato com as comunidades cristãs sob um regime

qualificado de materialista e ateu. Múltiplas tarefas acabaram distanciando-me da

idéia, acrescido do fato de sua consecução ser demasiado cara. (BETTO, 1985,p.11.)

O livro Cristianismo e Marxismo de Frei Betto é um ensaio teórico conciso sobre a

relação entre as duas visões de mundo, apresentadas pelo título da obra, publicada em 1986,

pela editora Vozes e contém uma introdução e três capítulos, em anexo estão dispostos textos

de Marx e Engels sobre a religião. Tralharei com a 2º edição.

Na introdução Frei Betto, inicia sua argumentação, com propósito de desmanchar a ideia

de contradição entre socialismo e Cristianismo, ele o faz por meio da conceitualização das

visões de mundo, demonstrando que não se podem exaurir os conceitos do evangelho. A

primeira sinônimo de materialismo, coletivismo e de comunismo ateu. Já a segunda de

espiritualismo, personalismo e lugar onde Igreja intermedia as relações sociais. Entretanto é

equivocado identificar a mensagem libertadora expressada por Jesus nos evangelhos de

projeto politico de convivência social, com um regime social que sempre é imperfeito e

transitório. Não se pode considerar o sistema capitalista cristão, pois neste sistema o trabalho

Page 5: Frei Betto: um olhar sobre o marxismo - UEL Portal · período pós- socialismo real, ... uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João ... que impede que o rico

Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro”

ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013

GT 8. Marxismos latino-americanos 161

coletivo é subordinado por meio de exploração ao lucro individual. Frei Betto dialoga sobre a

manipulação do cristianismo pelo aparelho ideológico capitalista, e as distorções feitas com

Cristianismo, exemplificado com uma citação de Napoleão I, onde este vê na religião um

instrumento de ordem social, que impede que o rico seja massacrado pelo pobre, e que

Charlatões e feiticeiros da Alemanha a exemplo de Kant consigam envenenar a sociedade.

Frei Betto admite, porém que o cristianismo detém maior liberdade nos países capitalistas

do que nos socialista reais. Outro equivoco que Betto pretende abordar é o que considera

países como os nórdicos socialistas, estes possuem índices elevados de bem estar social

obtido através da exploração do Terceiro Mundo. E em alguns períodos são dirigidos por

líderes provenientes de partidos socialistas, a exemplo da França (François Miterrand) e

Espanha (Felipe Gonzáles), entretanto não há alteração estrutural do sistema, e sim governos

temporários presididos por políticos provenientes de partidos socialistas. Segundo Frei Betto:

Ao falar de Cristianismo devemos- antes de considerar suas expressões históricas-

partir de seu fundamento bíblico. E por socialismo entendemos os regimes em que

se predominam a propriedade social dos meios de produção, a erradicação dos

antagonismos de classes, o Estado como expressão dos interesses da grande maioria

dos trabalhadores. (1986, p.11.)

Em “Fundamentos do Cristianismo e sua concretude histórica”, Frei Betto busca por meio

da manifestação histórica do Cristianismo, ressaltar seus atributos libertadores e

revolucionários, instrumentalizado pela Bíblia e pela História da Igreja. Dialoga diretamente

com Engels e Marx, para demonstrar que não há contradição entre as duas visões de mundo, e

sim objetivos comuns, distorcidos ao longo do tempo cunhado a falsa oposição. O

cristianismo Primitivo é visto por Frei Betto como exposto nos parágrafos abaixo e virtude

disto o cristianismo não é contraditório aos ideais marxistas.

A prática libertadora do Cristianismo nasce no primeiro século da comunidade de Jesus e

seus apóstolos na Palestina, a região dominada militarmente, politicamente, economicamente

pelo Império Romano. Dá origem a Jesus de Nazaré que assume a causa do pobre e do

oprimido pela religião opressora dos Fariseus e Saduceus, desmistifica o reino de César,

promete o Reino de Deus, onde todas as desigualdades sócias serão suprimidas, colide com o

poder Judaico-romano, é preso, torturado e morto. A sua ressureição testemunhada por seus

discípulos o faz ser conhecido o filho de Deus manifesto na história humana.

As primeiras comunidades cristãs a margem do mediterrâneo, são oriundas dessa fé

retratada socialmente pelo apóstolo Paulo em sua primeira Carta aos Coríntios, e nos Atos dos

apóstolos. A peculiaridade das primeiras comunidades cristãs era a socialização dos bens, já

Page 6: Frei Betto: um olhar sobre o marxismo - UEL Portal · período pós- socialismo real, ... uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João ... que impede que o rico

Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro”

ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013

GT 8. Marxismos latino-americanos 162

que Deus escolheu aqueles que o mundo marginalizava, esta ocorria em comunidades à parte.

Betto analisa e debate essas comunidades por meio da visão que Friedrich Engels expõe em

seu texto “Contribuição Para a História do Cristianismo Primitivo”. Engels aponta grande

semelhança entre os cristãos primitivos e o moderno movimento da classe operaria, pois os

dois nascem da luta de homens oprimidos que buscam sair dessa condição, entretanto o

socialismo busca a transformação da sociedade, já o cristianismo espera a salvação numa

outra vida. Apesar de perseguidos os dois avançam e marca posição, o primeiro é reconhecido

religião oficial do império que o perseguia e o segundo após 60 anos de sua constituição

conquista uma posição. Betto discorda de Engels de que os cristãos primitivos só almejavam

a salvação miséria e da escravidão numa vida pós-morte. Frei Betto lembra que o próprio

Engels reconhece que o Socialismo existiu de fato nesta época e obteve no cristianismo uma

posição dominante. Outra discordância entre os dois é afirmação de Engels de que o

cristianismo não quis realizar as transformações sociais neste mundo dadas às condições

históricas. Para rebater esta postura de Engels, Betto vai buscar seus argumentos em Marx, e

em sua declaração de que uma organização social nunca entra em declínio antes que dentro de

seu próprio seio, sejam formadas as condições necessárias à mudança.

É verdade que os primeiros Cristãos não elaboraram um projeto politico de

transformação da sociedade. A subversão que operaram no Império Romano,

criando comunidades populares de igualdade social e partilha econômica, decorria

de motivações religiosas. No entanto para a nova ordem vigente elas tiveram forte

incidência política, tanto que os cristãos, tidos como “inimigos da raça humana”,

sofreram três séculos de violentas perseguições. (BETTO, 1986, p.18.)

Frei Betto encerra essa primeira parte de sua argumentação, com o auxilio do teólogo Hans

Küng, enfatizado os predicados e os pecados do Cristianismo, transformado em religião

oficial do império por Constantino no século IV, institucionaliza-se na Igreja Católica

mantendo-se continuamente ao lodo poder, a exceção dos padres e movimentos que clamam a

favor dos pobres e contra as injustiças, sendo considerados heréticos a exemplo de São

Francisco de Assis e da Teologia da Libertação.

“A crítica marxista da religião” é ratada por Frei Betto pela ótica teórica e da realidade

histórica, pois nos países que ingressaram no regime socialista o cristianismo serviu de base

ao antigo regime e a sua ideologia na defesa da exploração do trabalho e da propriedade

privada dos meios de produção. As transformações introduzidas pelo processo revolucionário

colidiam com os interesses da Igreja, ameaçava suas regalias sobre a isenção de impostos,

posse de patrimônio ocioso significativo e renda advinda do trabalho de outrem, domínio de

Page 7: Frei Betto: um olhar sobre o marxismo - UEL Portal · período pós- socialismo real, ... uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João ... que impede que o rico

Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro”

ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013

GT 8. Marxismos latino-americanos 163

escolas católicas elitistas, mediação entre o povo e o poder. O regime socialista não

reconhecia esta igreja, que em muitos países resguarda os contra revolucionários e realizam

campanhas diretas contra a revolução. “O pretexto de que o socialismo impunha o comunismo

ateu era apenas uma forma de confessionalizar uma luta de classes. De fato o que a Igreja

reivindicava o “direito” de ser reconhecida com um Estado dentro do Estado, mantendo

relações de poder a poder.” (Betto, 1986, p.24.).

As posições de cristãos e marxistas exacerbaram os preconceitos entre os dois, nos países

socialistas. Os dirigentes revolucionários ao tenderem sua abordagem absoluta a critica de

religião como “ópio do povo” contrariaram o raciocínio dialético materialista, concluindo que

a religião é inseparavelmente reacionária e própria do aparelho Burguês. Os manuais

escolares e outro artifícios de propaganda ateísta difundiam que ideia da existência de Cristo

que já durava quase dois mil anos, tinha sido derrubada pela ciência que comprovara cristo

nunca existiu. Frei Betto questiona o surgimento dessa postura “materialista metafísica” que

sobre a influencia de Darwin proclama a “eternidade da matéria” e vê o ateísmo como

decorrente da teoria marxista. Para entender e combater essa postura o autor vai buscar na

trajetória pessoal e intelectual de Marx os elementos para trabalhar a interpretação marxista da

questão religiosa. “Karl Marx não nasceu ateu. Aos 17 anos, num exame escolar redige linhas

dignas dos grandes místicos da Igreja.” (Betto, 1986, p. 25.). Marx fala sobre a capacidade de

cristo de consolar as dores humanas e da alegria que cristo proporciona ao ligar o Homem e a

Deus. Entre 1837 e 1842 em seus estudos de Filosofia e mais especificamente em sua tese de

doutorado em 1841 sobre os filósofos gregos Epicuro e Demócrito, Marx crítica

rigorosamente à religião e os Deuses.

Como Prometeu para quem o “homem é a divindade suprema”, Marx rejeita

todos os deuses, participa das lutas anti-religiosas na Universidade, combate a união

entre a Igreja e o Estado, considera que toda concepção religiosa é irracional e

deixa-se imbuir pelas idéias do liberalismo francês. (BETTO, 1986, p.26.).

A partir de 1843-44 Marx passa a trabalhar com Moses Hess (primeiro comunista alemão).

Influenciado por Hegel e Feuerbach (“A Essência do Cristianismo”) retoma as ideias desses

autores por meio de “Contribuição à crítica da Filosofia do direito de Hegel”, onde à crítica da

religião segue a premissa de que o homem faz a religião e esta não o faz homem. Segundo

Frei Betto:

Em seu ateísmo filosófico, Marx evolui para uma abordagem dialética da

religião na medida em que considera sua dimensão positiva de “protesto contra a

miséria real”. Como cientista, já não retoma sua indignação prometéica contra os

deuses, não diz que “Deus é o opio do povo”, mas sim a religião, esse fenômeno

Page 8: Frei Betto: um olhar sobre o marxismo - UEL Portal · período pós- socialismo real, ... uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João ... que impede que o rico

Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro”

ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013

GT 8. Marxismos latino-americanos 164

sócio- cultural que pode ser analisado assim como a família, nunca o amor que une

João e Maria e que, como a fé em Deus escapa a todos os instrumentos científicos de

análise. (1986, p. 27.).

Posteriormente a crítica filosófica da religião Marx passa a crítica política, objetivando

conhecer a realidade, trazer à luz todas as formas de alienação, e assim a opção pelo

comunismo já não está atrelada diretamente a adesão do ateísmo. Frei Beto trabalha com “O

Capital” para rebater a tendência leninista que decreta que a morte da religião coincide com o

inicio do processo revolucionário, essa postura Betto denomina como messianismo

ideológico. Pois Marx acredita que os reflexos da religião no mundo real só desaparecerão

quando o homem em sua prática cotidiana, estabelecer relações racionais e claras entre si e a

natureza. O processo é longo e deve resultar da vontade consciente e livre do homem. E a

sociedade precisa oferecer base material para o desenvolvimento do processo. Segundo

Betto:

Assim de 1845 até a sua morte em 1883, Marx considera a religião enquanto

uma forma de consciência social, dentro da esfera da superestrutura ideológica. Já

não há nele uma posição anti- religiosa, mas sim a- religiosa, de quem procura não

se afastar do terreno empírico da ciência e enfoca o mundo religioso enquanto

reflexo do mundo real. Como mercadoria, a religião é um fetiche que oculta à

realidade que está por trás. Em outras palavras, ela é uma manifestação ideológica.

(1986, p.29.)

Ao criticar a religião, Marx está diante dos laços que unem o cristianismo a classe

dominante na Alemanha do século XIX, é sobretudo influenciado pela concepção religiosa de

Hegel, que considera a historia como uma manifestação da religião. Pois a superação de todas

as contradições e antagonismos se dá por meio da teologização da história, com a adequação

entre sentido absoluto do processo histórico e a consciência individual. O “pensamento de

identidade” de Hegel é considerado por Frei Betto como concepção autoritária por não

distinguir a totalidade do fenômeno religioso de sua manifestação particular, não havendo

relação dialética entre os dois, pois estes coincidem. A formação hegeliana de Marx é

considerada por Betto um dos seus principais problemas em sua analise do caráter funcional

da religião, apesar de Marx substituir o totalitarismo de Hegel, com a dialética entre o

universal e o particular, na analise da historia da sociedade, não o faz em relação à religião e

pronuncia sobre ela um juízo definitivo. Pois já que a religião encontra-se atrelada ao

capitalismo no século XIX, a sua essência é alienante ou de inversão da realidade. Ao final do

Capítulo Frei Betto questiona a que conclusões Marx chegariam, caso tivesse aplicado sua

dialética ao analisar a religião, afirma que provavelmente não teria pronunciado um juízo

definitivo sobre a questão, verificaria a contradição histórica do Cristianismo com sua

Page 9: Frei Betto: um olhar sobre o marxismo - UEL Portal · período pós- socialismo real, ... uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João ... que impede que o rico

Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro”

ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013

GT 8. Marxismos latino-americanos 165

essência de comunhão pessoal com Deus em Jesus Cristo e de reconciliação entre os homens,

e a sua utilização como arma ideológica de dominação.

A catedral Hegeliana começa a desabar quando se constata que a história não é

monolítica e nem se encontra mecanicamente conduzida por um espírito absoluto. O

que há são povos com diferentes nacionalidades (Fichte) ou classes com interesses

antagônicos (Marx). São os homens que fazem a história e, dentro dela, o fenômeno

religioso deve ser encarado em suas dimensões particular e funcional, ou seja, a

religião não existe em abstrato, mas concretamente encarnada na vivência social e

política de pessoas situadas historicamente e que mantêm entre si determinadas

relações de Produção. Por isso Marx estuda a inter- relação que há entre

Cristianismo e sociedade capitalista. (BETTO, 1986, p.30.)

“As relações entre Marxistas e Cristãos” é o ultimo capítulo do livro nele Frei Betto trata

da relação, através dos exemplos latino-americanos especialmente o Cubano, Nicaraguense6.

A partir daí ele tece sua argumentação sobre essa relação, que nessa parte do texto será

abordada pelo seu viés mais teórico prático. Nessa argumentação o autor aborda as diversas

correntes interpretativa dos marxistas. A partir dessas abordagens a grande pergunta se as

utilizações dos instrumentais científicos analíticos do Marxismo pressupõem ou exigem

comprometimento político? E quando há engajamento político como isso influência as

análises?

O marxismo é, sobretudo uma teoria da práxis revolucionaria. Isso não impede que

certos marxistas queiram transformá-lo num espécie de religião com seus dogmas,

fundada na leitura fundamentalista que faz das obras de Marx, Engels e Lênin uma

nova Bíblia. Afinal o marxismo, como qualquer outra obra teórica, jamais poderá ter

uma única leitura. O processo epistemológico ensina que um texto é sempre lido a

partir do contexto do leitor. Esses “óculos” da realidade determinam interpretação da

teoria. Assim, a obra de Marx pode ser lida pela ótica do materialismo positivista de

Kautsky, do neokantismo de M. Adedler, do hegelianismo voluntarista de Gramsci

ou objetivista de Lukács, do existencialismo de Sartre, do estruturalismo de

Althusser, bem como a luta camponesa de Mao Tsé-Tung, da guerrilha cubana, da

realidade peruana de José Carlos Mariátegui ou de inserção popular sandinista. O

que importa é utilizar a teoria marxista como ferramenta de libertação dos povos

oprimidos e não como uma árvore totêmica ou Talismã. Fruto do Proletariado, o

marxismo deverá ser sempre aferido por essa mesma luta, pois só assim sempre será

aferido por essa mesma luta pois só assim não perderá seu vigor revolucionário para

transformar –se numa abstração acadêmica.(BETTO,1986, p.35-36.).

Frei Betto chama a atenção dos marxistas afirmando que o marxismo não pode ignorar o

novo papel do cristianismo processo de libertação da América Latina, pois este age como

6 A vida dos Cristãos nos países Socialista é tratada de forma mais detalhada na obra O Paraíso Perdido:

nos bastidores do socialismo, resulta dos relatos de viagem de Frei Betto por países socialistas entre 1979 á

1992. Os textos vão do ensaio a Crônica, onde o autor busca compreender a vida cotidiana dos cristãos nesses

países. Os 33 capítulos tem seus títulos sempre temas ligados à culinária dos países retratados. Outro aspecto

importante dessa obra é o simbolismo dela como o livro que é publicado aos 50 anos de vida do autor, onde este

se inspira em Graciliano Ramos para se autorretratar neste momento. A capa da obra é outro aspecto interessante

do livro, pois traz representados os líderes e figuras marcantes dos países socialistas, além de Marx e Engels.

Page 10: Frei Betto: um olhar sobre o marxismo - UEL Portal · período pós- socialismo real, ... uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João ... que impede que o rico

Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro”

ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013

GT 8. Marxismos latino-americanos 166

fermento sobre as massas. Mas para dimensionar esse potencial revolucionário do

cristianismo, o marxismo devera romper a camisa de força de sua ótica objetivista,

reconhecendo a subjetividade humana na história. Implicando na superação da tendência

economicista, nos regimes socialista, de certa “metafisica do Estado”, admitindo autonomia

relativa das superestruturas. Pois a prática revolucionária não se esgota em análises estritas da

ciência, extrapola o conceito e se encerra nas dimensões éticas, místicas e utópicas. A partir

daí Frei Betto questiona o progresso nos países socialista diante da contradição entre este e a

subjetividade humana. Para ele negar a importância da subjetividade e da intencionalidade

humana em detrimento das relações de produção é reduzir o marxismo em teoria puramente

cientifica é caminhar a um neo-hglianismo, contraditório ao marxismo. Pois a riqueza e a

originalidade da teoria marxista residem na união de teoria e prática revolucionária. Pois de

acordo com Betto “Sem essa relação dialética teoria-práxis, o marxismo se esclerosa numa

ortodoxia acadêmica perigosamente manipulável por quem controla os mecanismos de

poder.” E partir daí o marxismo é obrigado a reconhecer que em grande parte dos casos suas

concepções acerca da religião são religiosas, dogmáticas e desvinculadas da prática histórica.

Essa afirmação é fundamentada no papel desempenhado no processo de libertação por

cristãos cubanos e principalmente nicaraguenses descritas de forma mais detalhada em “O

Paraiso Perdido”.

Portanto, falsas certezas estão desmontadas pela prática histórica. Nos últimos

vinte anos, nos países do Terceiro Mundo, especialmente na América Latina, o

cristianismo passa a revelar seu caráter libertador como expressão de resistência dos

oprimidos. E por outro lado, contrariando todos os prognósticos acadêmicos, a

religião não desapareceu nos regimes socialistas. Ao contrario, as Igrejas

constituem, hoje importante força na luta pela paz e cresce o número de seus fiéis.

(BETTO, 1986, p. 40).

Entretanto Betto ressalta que ainda há dificuldades dentro da igreja, devido a bispo e

pastores, não possuírem clareza e consenso sobre como se inserir pastoralmente em regimes

socialistas. E Segundo Frei Betto “Fora, sobretudo no âmbito dos partidos no poder, certos

preconceitos anti-religiosos nutrem a discriminação que reforçam a proximidade entre cristãos

e setores contra-revolucionários.” (1986, p.40.). Os tabus cristãos referentes ao socialismo

permanecem, alimentada pela propaganda capitalista e pelo sectarismo de certos militantes

marxistas. Para entender essas questões Frei Betto vai buscar a gênese desse conflito nas

proclamações anticomunista da Igreja Católica nos séculos XIX e XX. Para Betto a exceção

nessa relação pode ser exemplificada pela postura de bispos brasileiros durante a ditadura

militar, onde estes se colocam contra a pobreza, a fome e a morte, buscando um mundo onde

Page 11: Frei Betto: um olhar sobre o marxismo - UEL Portal · período pós- socialismo real, ... uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João ... que impede que o rico

Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro”

ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013

GT 8. Marxismos latino-americanos 167

não haja divisão entre ricos e pobres. Frei Betto termina sua obra marcando as afinidades

entre os projetos de mundo cristão e marxista. Pois nada politica ou na história garante a

realização desses projetos, assim caminho a ser seguido é o compromisso pela libertação dos

oprimidos, sobressaindo sobre os preconceitos e as discussões teóricas.

Em anexo da obra Frei Betto, traz fragmentos da introdução de Engels a edição de 1895 do

livro de Marx “As lutas de Classes na França, de 1848 a 1850”. Este fragmento é a parte final

do texto, onde Engels fala do papel subversivo desempenhado pelos Cristãos durante o

Império Romano, da repressão que este sofria e da ineficácia do processo repressivo, pois o

Cristianismo acabou sendo proclamada religião oficial do império. Frei Betto não tece

qualquer comentário sobre o fragmento ou sobre o contexto que ele ocupa na argumentação

de Engels.

Engels durante o prefácio analisa a partir seu modo materialista o processo de

transformações pela qual a Europa passa no século XIX, dando enfoque especial Alemanha,

França e Inglaterra. O sufrágio universal, a institucionalização dos exércitos e a criação de leis

anti-socialistas redimensionam os instrumentos de luta proletária. “O período das revoluções a

partir de baixo estava por agora terminado; seguiu-se lhe um período de revoluções a partir de

cima.” (ENGELS, 2008, p.47.). A partir daí o autor utiliza resistência dos cristãos diante das

perseguições do Império Romano, como exemplo da possibilidade de superação para os

socialistas perseguidos.

O imperador Diocleciano não podia assistir já podia assistir tranquilamente ao

minar da ordem da ordem, da obediência e da disciplina de seu exército. Interveio

energicamente porque era ainda tempo para isso. Emitiu uma lei contra os

socialistas, queria dizer, uma lei contra os cristãos. Foram proibidas as reuniões de

subversivos, os locais de reunião encerrados ou demolidos, os símbolos cristãos,

cruzes etc., proibidos como na saxônia os lenços os lenços vermelhos. Os cristãos

foram declarados incapazes de ocupar cargos Públicos, e nem sequer podiam ser

cabos. Como nessa altura não se dispunha de juízes tão bem amestrados no que diz

no que diz respeito à “consideração da pessoa”, como pressupõe o projeto de lei do

senhor Herr von Köller, proibiu- se sem mais rodeios os cristãos de defender os seus

direitos perante o tribunal. Mas até essa lei de exceção não teve êxito. (ENGELS,

2008, p.61-62).

A Obra do Artista: Uma visão Holística do Universo, faz parte do esforço de Frei

Betto para compreender a totalidade da existência, para isso ele se utilizará a ciência e

espiritualidade, demonstrado que não incompatibilidade entre elas. O livro possui 15

capítulos. A sua edição original é de 1995 pela editora Ática.

Ao discutir e entender o cenário das transformações pelas quais a nossa sociedade

passa, Frei Betto realiza uma síntese das concepções cientificas e filosóficas vindas desde a

Page 12: Frei Betto: um olhar sobre o marxismo - UEL Portal · período pós- socialismo real, ... uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João ... que impede que o rico

Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro”

ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013

GT 8. Marxismos latino-americanos 168

antiguidade aos dias atuais, fala da dificuldade ao abandonar esses padrões arraigados em

nossa sociedade, e da confusão causada nessa sociedade onde tudo é fluido.

Considerável parcela de minha geração foi formada na concepção de que o

determinismo histórico seria inexorável e corresponderia ás leis objetivas existentes

no mundo natural. Mesmo reticentes a toda corrente filosófica que professa o

ateísmo como convicção religiosa, muitos de nós chegaram a acreditar que as leis do

materialismo dialético representavam a suprema objetivação da mente humana.

Bastava saber aplica-las aos fenômenos naturais e históricos para poder apreendê-los

em sua gênese e futuro. Com toda aquela catedral dogmática implantada na cabeça,

alguns de nós entraram em contato com a física. A teoria geral da relatividade

modificara o nosso conceito de tempo e espaço. Tivemos de Abandonar a ideia de

um amplo espaço como palco dos fenômenos físicos e de um tempo que, á parte, flui

no mesmo ritmo, do passado, ao futuro via presente.(BETTO, p. 21, 2012).

Considerações Finais

O conceito de intelectual desta analise de Frei Betto e que valida o estudo deste intelectual,

é a que o propõe como um elemento pelo qual é possível capitar os reflexos da sociedade

política do seu tempo, fundamentando-se nos teóricos franceses Louis Pinto e Jean François

Sirinelli. Onde o intelectual como aquele que por suas obras testemunhou o distanciamento

das convenções, preconceitos e conveniências, e que por sua influencia tem responsabilidades

com veiculação da ideologia que produz ou ajuda produzir. Entretanto o papel do historiador

aqui segundo Sirinelli é “Tentar destrinchar a questão das ideologias produzidas ou veiculadas

pelos intelectuais e a cultura política de sua época.” Com o cuidado de não produzir juízos de

valores sobre o intelectual e a sua ideologia.

A Teologia da Libertação passou por um Processo de Metamorfose com o pós- queda

do Muro de Berlim e com a adoção do Paradigma ecológico, entretanto não abandou seu

propósito inicial: a libertação do oprimido através da sua conscientização da condição

marginal à qual é submetido. O novo paradigma vê a terra como a oprimida e marginalizada,

e defende que sem a conscientização dessa realidade a libertação concreta não pode ocorrer.

REFERÊNCIAS

BETTO, Frei. A obra do Artista - uma visão holística do universo. Rio de Janeiro: José

Olympio, (4ª edição, 2012).

BETTO, Frei. Cristianismo e Marxismo. Petrópolis: Vozes, (2ª edição, 1986).

BETTO, Frei. O paraíso Perdido: Nos Bastidores do socialismo. São Paulo: Geração

Editorial, (2ª edição, 1993.).

BOURDIEU, Pierre: Razoes Práticas: Sobre a teoria da ação. São Paulo: Papirus, 1996.

CHAMPION, Françoise. Religiosidade flutuante, ecletismos e sincretismos. In:

DELUMEAU, Jean. (Org.). As Grandes Religiões do Mundo. 3ª Ed. Lisboa: Editora

Presença, 2002. p. 705-734.

Page 13: Frei Betto: um olhar sobre o marxismo - UEL Portal · período pós- socialismo real, ... uma volta à política conservadora implementada pelo Papa João ... que impede que o rico

Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro”

ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013

GT 8. Marxismos latino-americanos 169

CUTROT, Aline. Religião e Política. IN: RÉMOND, Rene (org.). Por uma história política.

Rio de Janeiro: FGV, 2003.p.331-364.

DELGADO, Lucila de Almeida Neves; PASSOS, Mauro. Catolicismo: Direitos sociais e

direitos humanos (1960-1970). IN: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucila de Almeida Neves

(org.). O Brasil Republicano- O tempo da Ditadura: regime militar e movimentos sociais em

fim do séc. XX. 2. Ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. V.4. p.93-133.

DELGADO, Lucila de Almeida. Partidos políticos e frentes parlamentares: projetos,

desafios e conflitos na Democracia. IN: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucila de Almeida

Neves (org.). O Brasil Republicano- O tempo da experiência democrática: da

redemocratização de 1945 ao golpe civil-militar de 1964. 2. Ed. Rio de Janeiro: Civilização

Brasileira, 2007. V.3. p.127-154.

FREI BETTO, (Carlos Alberto Libânio Christo): A fome como questão política. Estud.av,

São Paulo, v. 17, n. 48, Mai./ago. 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/>. Acesso em:

01 fev. 2011.

MARX, Karl. A Revolução antes da revolução. São Paulo: Expressão Popular, 2008.

PINTO, Louis. Carta a amigos estrangeiros sobre intelectuais franceses. IN: BOURDIEU,

Pierre; MICELI, Sergio. (Org.).

SIRINELLI, Jean François. Os intelectuais. IN: RÉMOND, Rene (org.). Por uma história

política. Rio de Janeiro: FGV, 2003.p.231-270.