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Fronteiras do sertão baiano : 1640-1750 Márcio Santos 1 Um século e meio separa a chegada dos primeiros europeus à costa brasileira das ações iniciais de conquista e ocupação dos sertões interiores. Em 1627 Frei Vicente do Salvador, um dos nossos primeiros historiadores, ainda reclamava da negligência dos portugueses em adentrar o sertão; segundo o autor, ainda que fossem grandes conquistadores de terras, os lusos vinham se contentando, no Brasil, a andar arranhando a costa como caranguejos. Frei Vicente dava uma explicação para isso: quando iam ao sertão, os portugueses se limitavam a buscar índios forros para escravizá-los, trazendo-os à força para o litoral. Não havia interesse em aproveitar efetivamente as terras descobertas. A explicação de Frei Vicente de fato resolve parte da questão. Índios vinham sendo utilizados, desde o primeiro século da colonização, como mão de obra escrava para tocar os empreendimentos agrícolas do litoral nordeste, concentrados na monocultura exportadora do açúcar, e do Planalto Meridional, onde se localizavam as vilas paulistas produtoras de trigo para o mercado interno. Quando os contingentes indígenas começaram a escassear no litoral, os traficantes de escravos índios se voltaram para o interior ainda pouco explorado, habitado por centenas de povos nativos. Nas vilas paulistas do sul, cuja população era formada por grupos híbridos portugueses e tupi, denominados mamelucos, tornou-se uma verdadeira especialidade a montagem de expedições apresadoras de índios. Essas incursões ao sertão, na época conhecidas como entradas, beneficiavam-se da tecnologia de adaptação mameluca à floresta tropical e aos campos interiores, desenvolvida a partir da matriz indígena que marcou a formação étnica dos paulistas. 1 Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo, Mestre em História pela Universidade Federal de Minas Gerais, autor de Fronteiras do sertão baiano : 1640-1750 (São Paulo, Edusp, no prelo); Bandeirantes paulistas no sertão do São Francisco : povoamento e expansão pecuária de 1688 a 1732 (São Paulo, Edusp, 2009); Rio São Francisco : patrimônio cultural e natural (Belo Horizonte, Assembleia Legislativa, 2003) e Estradas reais : introdução ao estudo dos caminhos do ouro e do diamante no Brasil (Belo Horizonte, Editora Estrada Real, 2001). Co-gestor, pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais, do Projeto Cidadania Ribeirinha, voltado para o desenvolvimento sustentável de comunidades carentes do Vale do São Francisco.

Fronteiras do sertão baiano - 1640-1750- M. Santos

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Fronteiras do sertão baiano : 1640-1750

Márcio Santos1

Um século e meio separa a chegada dos primeiros europeus à costa brasileira das ações iniciais de

conquista e ocupação dos sertões interiores. Em 1627 Frei Vicente do Salvador, um dos nossos

primeiros historiadores, ainda reclamava da negligência dos portugueses em adentrar o sertão;

segundo o autor, ainda que fossem grandes conquistadores de terras, os lusos vinham se

contentando, no Brasil, a andar arranhando a costa como caranguejos. Frei Vicente dava uma

explicação para isso: quando iam ao sertão, os portugueses se limitavam a buscar índios forros para

escravizá-los, trazendo-os à força para o litoral. Não havia interesse em aproveitar efetivamente as

terras descobertas.

A explicação de Frei Vicente de fato resolve parte da questão. Índios vinham sendo utilizados,

desde o primeiro século da colonização, como mão de obra escrava para tocar os empreendimentos

agrícolas do litoral nordeste, concentrados na monocultura exportadora do açúcar, e do Planalto

Meridional, onde se localizavam as vilas paulistas produtoras de trigo para o mercado interno.

Quando os contingentes indígenas começaram a escassear no litoral, os traficantes de escravos

índios se voltaram para o interior ainda pouco explorado, habitado por centenas de povos nativos.

Nas vilas paulistas do sul, cuja população era formada por grupos híbridos portugueses e tupi,

denominados mamelucos, tornou-se uma verdadeira especialidade a montagem de expedições

apresadoras de índios. Essas incursões ao sertão, na época conhecidas como entradas,

beneficiavam-se da tecnologia de adaptação mameluca à floresta tropical e aos campos interiores,

desenvolvida a partir da matriz indígena que marcou a formação étnica dos paulistas.

1 Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo, Mestre em História pela Universidade Federal de Minas Gerais, autor de Fronteiras do sertão baiano : 1640-1750 (São Paulo, Edusp, no prelo); Bandeirantes paulistas no sertão do São Francisco : povoamento e expansão pecuária de 1688 a 1732 (São Paulo, Edusp, 2009); Rio São Francisco : patrimônio cultural e natural (Belo Horizonte, Assembleia Legislativa, 2003) e Estradas reais : introdução ao estudo dos caminhos do ouro e do diamante no Brasil (Belo Horizonte, Editora Estrada Real, 2001). Co-gestor, pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais, do Projeto Cidadania Ribeirinha, voltado para o desenvolvimento sustentável de comunidades carentes do Vale do São Francisco.

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Imagens de índios botocudos, na legenda original. Conhecidos pelos portugueses como botocudos em razão de utilizarem objetos rituais nas orelhas e nos lábios, esses índios habitavam o Brasil central e foram alvo de guerras de extermínio até o século XIX. Fonte: Rugendas, Viagem pitoresca através do Brasil.

Nas primeiras quatro décadas do século XVII as entradas apresadoras paulistas concentraram-se nas

províncias jesuíticas da região conhecida como Guairá, em território do atual estado do Paraná,

habitadas por numerosos contingentes guarani mantidos em missões religiosas controladas pelos

inacianos. Para o Guairá partiram expedições preadoras, que devastaram a província jesuítica. Na

sequência, os ataques apresadores voltam-se para as missões do Itatim, localizadas no atual Mato

Grosso do Sul, e dos tapes, no sul do território gaúcho.

Mas não foi somente o interesse no lucrativo negócio do apresamento indígena o fator determinante

da “negligência” portuguesa em ocupar efetivamente os sertões. No nordeste da colônia também a

ocupação holandesa, realizada entre 1624 e 1654, contribuiu para frear as tímidas iniciativas de

avanço interior que surgiram no período. Presa ao objetivo comercial de controle das praças

açucareiras e escravagistas do Atlântico Sul, a ocupação holandesa foi inevitavelmente costeira, não

tendo gerado movimentos significativos de adentramento do interior. Os holandeses não fizeram

diferente do que vinham fazendo os portugueses desde a implantação da cultura canavieira. Uma

pujante economia de exportação estava instalada no litoral e para lá se voltavam as energias luso-

brasileiras. Capistrano de Abreu inicia o terceiro capítulo de “Os caminhos antigos e o povoamento

do Brasil” com a vívida descrição de uma paisagem costeira rica e povoada, na qual se destaca o

Recôncavo Baiano e, em especial, a cidade do Salvador. O mar desse pequeno mediterrâneo

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garantia a atividade dos engenhos, a exportação do açúcar, a importação dos artigos necessários ao

funcionamento da economia e à vida da população e a alimentação da gente pobre e dos escravos. A

conclusão é inevitável: “[...] esta gente não trocaria de boa vontade as vantagens da marinha pelas

asperezas e descômodos das brenhas do interior”2.

A resistência do meio foi outro condicionante ecológico do não avanço pelo interior. O conjunto de

perigos e dificuldades a que se expunham os exploradores e primeiros ocupadores do sertão era

quase interminável: serras empinadas e fragosas; campos homogêneos e expostos ao sol, onde era

possível se perder; travessias de terrenos estéreis e sem água; rios caudalosos ou de águas

pestilentas; animais perigosos, como a onça, a cobra, o porco-do-mato, a piranha; pragas e insetos

daninhos, como o morcego, o bicho-de-pé, o mosquito, a formiga, a barata, o cupim, o carrapato, a

pulga, o gafanhoto; doenças e males do corpo, como a malária, a desinteria, as verminoses. E,

principalmente, de distribuição generalizada pelo espaço interior da colônia, os grupos indígenas

hostis, que cronistas e autores de documentos oficiais distinguem invariavelmente pela coragem e

tenacidade com que se defendiam dos invasores luso-brasileiros.

Guerrilhas, na legenda original. A pintura retrata um combate entre luso-brasileiros e indígenas. Fonte: Rugendas, Viagem pitoresca através do Brasil.

2 Capistrano de Abreu. Os caminhos antigos e o povoamento do Brasil. p. 270.

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As décadas de 40 e 50 do Seiscentos assistiram a desdobramentos históricos que abriram caminho

para a reversão desse quadro. Entre 1648 e 1654 os holandeses são expulsos das zonas açucareiras

da América e das áreas escravagistas da África, que voltam ao controle da Coroa portuguesa. Num

plano geral, a reconquista da soberania lusitana sobre a primeira grande área econômica da América

portuguesa garante, na faixa litorânea, a estabilidade necessária para que se possa pensar no avanço

rumo aos sertões. Mas os efeitos da dupla reconquista lusitana são mais profundos. Abre-se

caminho para que o tráfico negreiro retome a sua centralidade no Atlântico Sul, esvaziando a

importância econômica do cativeiro indígena. Esses fatores reorientadores da conjuntura

internacional são reforçados pelos movimentos internos. Em 1641 os índios das reduções jesuíticas

do sul, armados pelos padres, derrotam os invasores paulistas no rio Mbororé (afluente do alto

Uruguai). Batidos no sul, os caçadores de índios paulistas se voltam para as regiões ao norte da

capitania de São Paulo. A expansão paulista é reorientada, a partir do meado do século, para as

áreas centrais e setentrionais da América portuguesa, inclusive o sertão baiano. Novos espaços

passam a ser alvo da ação vicentina: a futura região das jazidas auríferas mineiras, o norte mineiro,

o interior da Bahia, o Piauí. Recompensas materiais pela participação em tropas mercenárias de

combate a índios hostis, conquista de terras para o avanço das frentes de expansão e busca de

riquezas minerais assumirão posições centrais entre os objetivos concretos que mobilizam os

sertanistas de São Paulo rumo a esses espaços, diminuindo a ênfase no apresamento indígena.

A pecuária bovina nos campos interiores passa a figurar como alternativa econômica para

aventureiros e pequenos empreendedores que não tinham espaço na faixa costeira, em São Paulo ou

no Reino. Os terrenos de caatinga e cerrado característicos dos sertões eram, em razão da topografia

relativamente plana, da vegetação arbustiva e da ausência de matas fechadas, os mais propícios às

pastagens que formariam a zona pecuária. Os povos nativos que habitavam essas terras passaram a

ser considerados obstáculo à expansão colonizadora e, como tal, populações a serem sumariamente

removidas. As guerras de conquista de antigos espaços indígenas para a instalação das frentes

pioneiras, que marcam o sertão nordeste a partir do meado do século XVII, constituem um dos

capítulos dramáticos da formação territorial brasileira.

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Campos, na legenda original. As terras de campos, caracterizadas pela topografia suave e vegetação arbustiva ou de pequeno porte, revelaram-se o espaço ideal para a pecuária bovina. Fonte: Rugendas, Viagem pitoresca através do Brasil.

Transporte de carne de corte, na legenda original. Fonte: Debret, Viagem pitoresca e histórica ao Brasil.

Exploração de uma pedreira de granito, na legenda original. Debret, Viagem pitoresca e histórica ao Brasil.

Além de servir ao abastecimento humano, a criação de gado servia a diversos outros usos na colônia.

A atuação mercenária paulista foi largamente utilizada na conquista das terras interiores. Em troca

de ganhos pecuniários, terras, plantéis indígenas e mercês, experientes sertanistas de São Paulo

foram contratados para as guerras de dizimação ou escravização dos povos indígenas que habitavam

os sertões. Esses homens deixaram a sua marca no espaço que ia do sul do atual Piauí ao norte das

Minas Gerais, passando pela porção central da Bahia, a leste e a oeste do vale do São Francisco,

áreas interiores que, não obstante a sua vastidão, possuíam características geofísicas e históricas

comuns. Esse espaço, formado por campos homogêneos, colinas baixas, vegetação de caatinga e

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cerrado e rios perenes e intermitentes, de larga distribuição dos povos então conhecidos como

tapuias, foi explorado e conquistado por sertanistas reinóis, baianos e, principalmente, paulistas.

A conquista do médio Paraguaçu, na porção central da Bahia, é emblemática desse movimento.

Entre 1672 e 1674 o paulista Estevão Ribeiro Baião Parente, contratado pelo governo-geral, liderou

quatro expedições contra os maracá, aprisionando e levando para Salvador, nesses dois anos, mais

de dois milhares de indivíduos. Os grupos indígenas capturados na guerra foram enviados para o

Recôncavo Baiano e, principalmente, para a Capitania de São Paulo, onde eram utilizados como

mão de obra escrava nas plantações paulistas. As novas terras conquistadas eram então repovoadas

com índios aculturados trazidos do Recôncavo ou das vilas paulistas. Esse processo de

despovoamento e repovoamento cruzados garantia que o novo território fosse formado por

contingentes indígenas sem ligação anterior com ele, uma forma evidente de evitar qualquer

tentativa de retomada das terras.

Para garantir o avanço da frente pioneira de ocupação é erguido na região o arraial de Santo

Antonio da Conquista (hoje Vila de João Amaro, pertencente ao município baiano de Iaçu). Após as

guerras de conquista povoadores paulistas são estimulados a se mudarem para a região, para o que o

governo-geral oferece-lhes condições favoráveis: concessão de sítios para currais e terras para

lavouras, sem pagamento de tributo por vinte anos; custeio de roupas e de ferramentas; provimento

dos mantimentos para a viagem a partir de São Paulo; custeio do frete das embarcações para a

jornada; e ajuda financeira para custear a mudança para o novo lugar.

Depois da morte do conquistador Baião Parente, a donataria da vila é transferida, após uma querela

judicial, para o seu filho João Amaro Maciel Parente. Nos primeiros anos do século XVIII a Vila de

João Amaro se tornaria estratégica no controle do tráfego mercantil entre a Bahia e as minas do

ouro. Em 1705 e 1706 tanto João Amaro quanto o capitão Pedro de Afonseca e Melo, também

morador da vila, recebem cartas do governador-geral sobre o confisco dos comboios ilegais que

seguiam pela estrada da Bahia para as minas do ouro. Eram confiscados ouro em pó e em barra,

escravos, pólvora, chumbo, espoletas, sal, açúcar e vários outros artigos.

Os arraiais sertanejos, como Santo Antonio da Conquista, surgiam com a função de estruturas de

defesa da ocupação luso-brasileira dos novos territórios. A partir dessa origem militar podiam

evoluir, assim que estabilizada a região, para aglomerações urbanas permanentes, tornando-se

povoados e vilas. No extremo sul do espaço que estamos considerando uma povoação semelhante

foi erguida, também por conquistadores paulistas, na margem direita do rio São Francisco, na altura

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da foz do seu afluente Verde Grande. O responsável foi o sertanista paulista Matias Cardoso de

Almeida, que participara de várias ações de adentramento do interior, entre elas a famosa bandeira

de Fernão Dias, que, entre 1674 e 1681, percorreu boa parte do que viria a ser o território mineiro.

Na década de 80 do Seiscentos já há registros de que Matias Cardoso se encontrava estabelecido no

sertão do São Francisco, dedicando-se à criação de gado e empenhando-se em arregimentar novos

povoadores em São Paulo, de onde trazia parentes e amigos.

A Igreja de Nossa Senhora da Conceição, no município mineiro de Matias Cardoso, é um dos exemplares mais antigos da arquitetura da conquista dos sertões. Há indícios documentais de que tenha sido erguida entre as últimas décadas do século XVII e os primeiros anos do seguinte, por obra de Januário Cardoso de Almeida, filho do conquistador Matias Cardoso de Almeida. Os especialistas destacam o seu caráter de estrutura fortificada, provavelmente construída não só com objetivos religiosos, mas também como defesa contra as tentativas indígenas de retomada do território ocupado. Foto: Rodrigo Faleiro / Iepha-MG

O arraial de Matias Cardoso foi um verdadeiro enclave luso-brasileiro nesse remoto espaço

sertanejo. Por décadas a povoação funcionou como base de apoio logístico e mercantil no contato

entre as Minas Gerais e a Bahia;; por ela passava o chamado “Caminho dos Currais e Bahia”, a

extensa via que ligava os núcleos auríferos mineiros às fazendas de gado do São Francisco e daí,

pelo Vale do Paraguaçu, ao porto de Salvador. Aberto nos primeiros anos do século XVIII, esse

caminho foi decisivo na circulação de pessoas, ouro, gado, mantimentos e ferramentas entre as

minas e o porto de Salvador, que por sua vez era uma das alternativas litorâneas de contato entre o

Brasil e a Europa. Registros documentais mostram que nas três primeiras décadas do século XVIII a

circulação mercantil na via baiana foi mais expressiva do que nos dois outros caminhos

responsáveis pela ligação entre a região mineradora e o litoral – o Caminho Velho, que partia das

vilas paulistas e de Parati, e o Caminho Novo, que se iniciava no Rio de Janeiro.

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Valor de arremate do contrato (arrobas de ouro/ano)

Período do contrato

Caminho 1717 – 1721 Setembro de 1721

maio de 1724

Outubro de 1724 –

setembro de 1727

Do Rio de Janeiro e

São Paulo

Dos currais e Bahia

11,50

15

20,03

25

26,52

20,19

A tabela mostra que, até 1724, a soma dos valores pagos para o arremate da exploração dos caminhos do Rio de Janeiro e São Paulo foi menor do que o mesmo valor pago pelo Caminho da Bahia. O valor de arremate, pago em leilão do contrato de exploração dos caminhos, projeta, evidentemente, a expectativa de lucro do arrematante na cobrança pelo uso da via. Um valor mais alto de arremate significa, portanto, uma circulação mercantil mais intensa. Fonte: Márcio Santos, Bandeirantes paulistas no sertão do São Francisco.

A povoação erguida pelo bandeirante paulista foi uma das bases urbanas de uma extensa região

pecuária, que se iniciava na altura da foz do rio das Velhas e se prolongava ao longo do médio São

Francisco, cortando o sertão baiano. Um documento oficial, escrito por volta de 1705, informa que

nos primeiros anos do século XVIII mais de cem famílias paulistas, algumas delas detentoras de

expressivos cabedais, viviam nas margens desse trecho do São Francisco.3 A implantação das

fazendas de gado, ou “currais”, como eram conhecidos os estabelecimentos pecuários na época, era

propiciada pela rede de corpos hídricos que se distribuía pelo território são-franciscano. Rios,

riachos, ribeirões, lagoas e olhos d´água formavam o que se pode denominar base hidrográfica

como elemento ordenador da ocupação. O rio, no domínio do semiárido, assumia funções

essenciais no processo ocupador: provimento de água para homens e animais, abastecimento de

peixes e crustáceos, fertilização de terrenos, navegação, orientação geográfica. Nas suas margens,

terrenos laterais e ilhas se plantava e criava; das matas ribeirinhas se retirava a madeira e a caça; dos

barreiros fluviais se extraíam as reservas de sal para o gado.

3 Anônimo. Informação sobre as minas do Brasil.

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A ocupação predominantemente ribeirinha é invariavelmente destacada nas fontes textuais e

cartográficas e pode ser reconhecida na própria nomeação dos lugares, na qual é frequente a

associação aos rios. “Sertão do rio de São Francisco”, “sertão do rio Verde” ou “sertão do rio das

Contas”, entre diversas outras expressões similares, aludem, do ponto de vista da ocupação dessas

áreas, à unidade geo-histórica representada por cada um dos territórios ribeirinhos. Nesses sertões

ribeirinhos foram instalados os primeiros enclaves luso-brasileiros: fazendas de gado, engenhos,

sítios, missões religiosas, arraiais, registros, guardas, casas-fortes, quartéis, caminhos.

As chamadas “cartas sertanistas” constituíram esboços cartográficos de regiões interiores da América portuguesa, provavelmente desenhados por bandeirantes, militares e mineradores na primeira metade do século XVIII. Nessas raras peças cartográficas é representado o papel da base hidrográfica como elemento ordenador da ocupação. Fonte: Acervo da Fundação Biblioteca Nacional – Brasil

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A expansão luso-brasileira chegou ao extremo norte desses sertões por ação do sertanista reinol

Domingos Afonso Sertão. Partindo do Vale do São Francisco, Sertão atingiu, na década de 70 do

século XVII, o espaço que hoje é o Piauí. Aí combateu e submeteu os índios gurgueia, numa guerra

implacável, que resultou na degola de 400 homens e redução à escravidão de mulheres e crianças.

Sertão, que já possuía fazendas de gado na margem pernambucana do São Francisco, estabeleceu o

primeiro curral da futura região piauiense, denominado Poções de Baixo, no rio Canindé. A fazenda

mais importante seria, todavia, a da Aldeia do Cabrobó, que em 1697 foi escolhida pelos moradores

pioneiros do Piauí para abrigar a igreja de Nossa Senhora da Vitória. Em 1712 a povoação é elevada

à condição de vila, com o nome de Mocha, com instalação efetiva em 1717. A Vila da Mocha se

tornaria a atual cidade de Oeiras, que constitui, portanto, o núcleo urbano pioneiro do Piauí.

No mapa do jesuíta Jacobo Cocleo, provavelmente desenhado na última década do século XVII, são representadas dezenas de fazendas de gado ao longo dos trechos médio e baixo do rio São Francisco. Duas dessas fazendas são identificadas como de propriedade de Domingos Afonso. Na parte superior da figura é representada a região hoje piauiense do Parnaguá. Fonte: Mapoteca do Arquivo Histórico do Exército – Brasil

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A conquista do Piauí retrata também o processo que pode ser denominado de descontinuidade e

reversibilidade da ocupação luso-brasileira. A ocupação não era contínua no tempo e no espaço e

podia mesmo recuar por ação dos índios ou por imposição das condições desfavoráveis do meio.

Entre as manifestações dessa tendência figuram a reocupação indígena de espaços conquistados por

luso-brasileiros; o abandono de frentes de ocupação; a ocultação de áreas conquistadas, com a

consequente frenagem do seu desenvolvimento histórico rumo à integração ao território colonial; os

conflitos territoriais entre grupos ocupadores, que em alguns casos contribuíam para neutralizar a

ação luso-brasileira nos novos espaços conquistados; e, por fim, a dificuldade da Coroa em impor a

soberania lusitana sobre as áreas sertanejas. No limite, temos a desinstalação ou desterritorialização

luso-brasileira dos espaços conquistados.

Foi esse o caso do território piauiense, onde a guerra defensiva movida pelos índios provocou, a

partir de 1712, o despovoamento luso-brasileiro de mais de cem fazendas de gado, tendo se perdido

para os nativos cem léguas do sertão, que já haviam sido povoadas com grandes fazendas.

Propriedades territoriais haviam se tornado, por força da ação indígena, “meio bravas” ou “bravas

de todo”, expressões coevas que retratam, do ponto de vista das unidades econômicas, a reversão da

ocupação luso-brasileira. Os índios sublevados chegaram a ameaçar o São Francisco, invertendo a

lógica e o sentido geográfico da conquista luso-brasileira do Piauí, que partira exatamente do vale

do rio quatro décadas antes.

Nota histórica constante de um mapa de 1722, na qual se menciona o despovoamento de 15 fazendas nas margens do rio Parnaíba, que divide o Piuaí e o Maranhão, por ação dos índios. Fonte: Acervo da Fundação Biblioteca Nacional – Brasil

Além da pecuária, também outras atividades econômicas eram afetadas pelas condições adversas

dos sertões. Um exemplo é a tentativa de instalação de unidades de extração de salitre, minério que

era a matéria-prima para o fabrico da pólvora, no sertão baiano. Em 1696 o sertanista baiano Pedro

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Barbosa Leal descobriu reservas do mineral na foz de um dos afluentes baianos do São Francisco,

que se tornaria conhecido como rio Salitre. A expedição liderada por Leal objetivava encontrar

minas de prata e percorrera, como descreve um documento da época, “mais de 539 léguas de sertões

demasiadamente ásperos, despovoados, e inabitáveis, padecendo muitas fomes e sedes.”4 O

sertanista levara doze brancos e sessenta índios, tendo arcado pessoalmente com a paga desses

homens, e quatorze escravos de sua propriedade. Vinte e oito cavalos seus morreram durante a

jornada. Mesmo tendo adoecido gravemente, Leal manteve as buscas, tendo a expedição durado

nove meses e dezoito dias. Acabou não encontrando as ambicionadas minas de prata, mas chegou a

reservas de salitre, que despertaram o interesse do governo-geral.

No ano seguinte uma fábrica de extração do mineral foi instalada na região das jazidas, tendo sido

Leal nomeado o seu administrador. Os problemas, todavia, logo apareceram. As minas não davam o

rendimento esperado e, principalmente, vinham enfrentando a rebeldia dos trabalhadores indígenas

alocados na extração. Um longo e difícil percurso levava o mineral das jazidas na foz do rio Salitre

até a Jacobina e daí até o porto da Cachoeira, de onde seguia em embarcações para Salvador. Em

1706, apesar do parecer contrário de João de Lencastro, que fora governador-geral do Estado do

Brasil, a atividade foi encerrada. Percorrendo a região três décadas depois, um explorador encontra

apenas as ruínas das antigas oficinas, que se encontravam abandonadas, tendo esse espaço, portanto,

tornado-se novamente “bravo”.

Terras para a pecuária, índios para as lavouras e minerais preciosos para o enriquecimento rápido

estavam entre os principais fatores que mobilizavam sertanistas paulistas, baianos e reinóis à

penetração no interior da América portuguesa. Mas um quarto objetivo marcou também esse

movimento: a expansão da fé católica. Missionários de diversas ordens religiosas e nacionalidades

percorreram os sertões implantando estabelecimentos religiosos em aldeamentos indígenas ou

mesmo praticando uma espécie de missionação itinerante, sem base fixa, denominada missão

volante.

Jesuítas e capuchinhos franceses estão entre as primeiras ordens religiosas a se instalarem nos

sertões brasileiros. Os primeiros implantaram as missões religiosas pioneiras do sertão baiano,

localizadas entre os rios Itapicuru, Real e Vaza-Barris, nos anos 60 do século XVII. Essas primeiras

missões sertanejas foram importantes como provedoras de mão de obra indígena para o transporte

4 [Carta de mercê], 26/08/1703. Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Registro Geral de Mercês, D. Pedro II, livro 15, fls. 314-314v.

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de gado para Salvador, a partir do São Francisco e do Piauí, e também como bases de apoio nas

difíceis viagens terrestres entre o Recôncavo Baiano e o vale do São Francisco.

Em três dessas missões pioneiras explodiram os primeiros conflitos, no âmbito do sertão baiano,

entre potentados coloniais e missionários. Aos proprietários de grandes extensões de terras

sertanejas interessava a exploração ilimitada da mão-de-obra indígena, com ações de repressão

brutal contra os grupos que resistissem, que podiam incluir o extermínio de centenas de indivíduos.

Os missionários, por outro lado, ainda que participassem do processo de desculturação indígena por

meio da sua redução à fé católica e do seu confinamento em aldeamentos religiosos, lutavam pela

preservação física dos índios e por uma exploração mais “justa” da sua força de trabalho. Em razão

desses interesses divergentes, em 1669 o potentado Garcia de Ávila, senhor da Casa da Torre,

mandou destruir igrejas e residências dos padres nas missões de Itapicuru, Jeremoabo e Massacará.

Três outras missões, no entanto, progrediram e se tornaram, um século depois, com a extinção do

projeto missionário, povoações civis: em 1758 Natuba recebe o nome de Vila de Soure; Canabrava,

o de Vila Nova de Pombal; e Saco dos Morcegos, o de Mirandela. Canabrava fora a mais próspera

missão nesse eixo, tendo chegado a contar com novecentos índios aldeados em 1690.

O segundo eixo de expansão missionária nos sertões foi representado pelas missões capuchinhas

francesas implantadas no médio-baixo São Francisco. A missão da Ilha de São Pedro (hoje

pertencente ao município de Porto da Folha/SE), fundada pelo francês Anastácio de Audierne em

1671, foi uma das primeiras a serem estabelecidas. Na sequência os capuchinhos subiram o rio,

coincidindo o alinhamento geográfico das missões desse trecho, com algumas diferenças, com a

ordem cronológica da sua implantação. O sertão de Rodelas chegou a abrigar pelo menos sete

unidades capuchinhas, que se distribuíam pelas numerosas ilhas do médio inferior São Francisco. A

trajetória dessas missões, cujo controle pelos religiosos franceses foi relativamente curto, se tornou

emblemática da ação missionária no sertão do São Francisco, em grande parte devido ao vívido

relato deixado pelo missionário Martinho de Nantes, autor da obra Relação de uma missão no rio

São Francisco, escrita em 1706.

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Primeiras missões religiosas do sertão baiano. Na figura da esquerda são representadas as missões capuchinhas francesas (azuis) e jesuíticas (vermelhas) implantadas no médio-baixo São Francisco. Na figura da direita são destacadas as missões jesuíticas estabelecidas entre os vales dos rios Itapicuru, Real e Vaza-Barris. Fonte: Márcio Santos, Fronteiras do sertão baiano

As primeiras experiências de exploração e conquista dos sertões foram relativamente pouco

documentadas. Escrevia-se pouco entre os sertanistas. Uma cultura de baixo letramento, baseada em

grande parte na transmissão oral de conhecimentos, e o interesse em ocultar de outros grupos

sertanistas, das autoridades coloniais e da própria Coroa os resultados de expedições exploratórias

estão entre as principais razões desse fato.

Há, não obstante, exceções a essa tendência. O relatório do explorador Miguel Pereira da Costa, as

notícias dadas por sertanistas e militares aos cartógrafos conhecidos como “padres matemáticos”, os

relatos de reconhecimento do explorador Joaquim Quaresma Delgado e as cartas do sertanista Pedro

Barbosa Leal, todos eles elaborados entre as décadas de vinte e trinta do século XVIII, estão entre

as principais. No campo da cartografia, destaca-se o notável mapa elaborado pelo jesuíta Jacobo

Cocleo na última década do século XVII, de dimensões gigantescas (224 por 120 centímetros), no

qual foi representada a maior parte da costa e parte significativa do interior da América portuguesa.

O litoral representado tem como limite norte o Maranhão e sul a costa catarinense, na altura de

Laguna. Pelo interior, o mapa abarca as Minas Gerais, o interior da capitania do Rio de Janeiro, as

vilas da capitania de São Paulo e Minas do Ouro, as terras do sertão baiano e o vale do São

Francisco, aprofundando-se até os rios da atual região centro-oeste do Brasil. A peça a que hoje

temos acesso é uma cópia do mapa original, provavelmente desenhada nas primeiras décadas do

século XVIII.

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Legenda da cópia setecentista do “Mapa da maior parte da costa e sertão do Brazil”, de autoria do Padre Cocleo. Fonte: Mapoteca do Arquivo Histórico do Exército – Brasil

As ações de exploração e conquista do sertão baiano e das regiões vizinhas foram especialmente

intensas entre 1670 e 1730. Nesse período, bandeirantes, militares, mineradores, criadores de gado,

potentados, missionários e mascates percorreram e ocuparam boa parte do hoje é o interior da

Bahia, o sul do Piauí e o norte de Minas Gerais. As procedências e os interesses desses pioneiros

eram os mais diversos e a historiografia contemporânea tem se empenhado em desfazer aquela ideia

antiga de que foram somente bandeirantes paulistas em busca de ouro os responsáveis por esse

movimento.

As ações desses grupos exploradores e conquistadores redefiniram as fronteiras internas do

território colonial, agregando-lhe novas terras. Orientando-se pelos rios, os pioneiros submeteram

povos indígenas, ergueram fortificações, estabeleceram missões religiosas, fundaram arraiais,

implantaram fazendas de gado e abriram novas frentes de ocupação econômica. Em 1750 o

redesenho territorial do Brasil é oficialmente reconhecido pela assinatura do Tratado de Madrid, por

meio do qual são refeitos os limites entre a área portuguesa e a área espanhola na América, vigentes

desde o Tratado de Tordesilhas (1494). O Brasil passa a ter, a partir de então, uma configuração

territorial muito próxima da atual.

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A análise histórica da formação territorial dos sertões brasileiros mostra que, diferentemente do que

sugerem os estudos da primeira metade do século XX e mesmo perspectivas historiográficas mais

recentes, o processo foi marcado por reversões, lacunas e descontinuidades que põem em xeque o

modelo do território contínuo, da expansão geográfica e da dilatação das fronteiras. O principal

objetivo da tese Fronteiras do sertão baiano : 1640-1750 foi superar esse modelo a partir da

abordagem de situações de reversão da ocupação luso-brasileira do sertão baiano, assim entendido o

conjunto espacial constituído, no período de 1640 a 1750, pelo interior da capitania da Bahia, Piauí,

norte do atual estado de Minas Gerais e margem esquerda do médio São Francisco. Na

problematização proposta foram utilizadas as categorias de descontinuidade e reversibilidade

espaço-temporal da ocupação luso-brasileira. Para desenvolvê-las foi necessário rastrear a trajetória

histórica das zonas de fronteira desse espaço interior, de modo a realçar o processo de formação do

território luso-brasileiro como conquista e ocupação de antigos espaços tapuias. As zonas

fronteiriças foram tratadas como áreas de fricção entre o instável território luso-brasileiro e os

espaços nativos, sujeitas, portanto, à constante ameaça de retomada indígena ou de esvaziamento

pelas pressões do meio. A mobilização da categoria de fronteira resultou em análises comparativas

do espaço estudado com outras regiões fronteiriças e iluminou as possibilidades analíticas abertas

pela aplicação dessa ferramenta teórica à compreensão da colonização luso-brasileira do interior da

América portuguesa. Os fecundos resultados providos pela análise da ocorrência de expressões

como “fronteira”, “limite” e “última povoação” na documentação consultada forneceram a garantia

de que a fronteira foi um elemento histórico constitutivo da ocupação colonial dos sertões

brasileiros. A utilização de metodologia de análise quantitativa de dados permitiu, por sua vez, o

tratamento histórico das cinco principais estruturas de ocupação encontráveis nas zonas de fronteira

do sertão baiano no período estudado: o caminho, a sesmaria, a povoação, o posto militar e a missão

religiosa. A principal conclusão do estudo refere-se à abordagem da ocupação territorial dos sertões

não como o avanço gradualmente positivado da civilização luso-brasileira, mas como uma trajetória

multidirecional, descontínua e irregular.

Referências

Abreu, João Capistrano de. Os caminhos antigos e o povoamento do Brasil. In: Abreu, João

Capistrano de. Capítulos de história colonial, 1500-1800 & Os caminhos antigos e o povoamento

do Brasil. 5. ed. [Brasília]: Editora Universidade de Brasília, 1963.

Anônimo. Informação sobre as minas do Brasil, [c. 1705]. Anais da Biblioteca Nacional, Rio de

Janeiro, v. LVII, pp. 172-186, 1935.

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Debret, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. São Paulo, Círculo do Livro, [s.d.].

vol. I.

Rugendas, Johann Moritz. Viagem pitoresca através do Brasil. São Paulo, Círculo do Livro, [s.d.].

Santos, Márcio. Bandeirantes paulistas no sertão do São Francisco : povoamento e expansão

pecuária de 1688 a 1734. São Paulo : Editora da Universidade de São Paulo, 2009.

Santos, Márcio. Fronteiras do sertão baiano : 1640-1750. São Paulo : Editora da Universidade de

São Paulo, no prelo. Texto original da tese disponível em

http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8138/tde-09072010-133900/pt-br.php.