Gestão de Resíduos

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GESTO DE RESDUOSVALORIZAO E PARTICIPAO

Jayme de Oliveira Campos Roberto Braga(Organizadores)

Laboratrio de Planejamento Municipal Deplan - IGCE - UNESP Rio Claro 2005

Jayme de Oliveira Campos Roberto Braga (Organizadores)

GESTO DE RESDUOSVALORIZAO E PARTICIPAO

Laboratrio de Planejamento Municipal Deplan - IGCE - UNESP Rio Claro 2005

Universidade Estadual Paulista Reitor: Prof. Dr. Marcos Macari Instituto de Geocincias e Cincias Exatas Diretor: Prof. Dr. Sebastio Gomes de Carvalho Departamento de Planejamento Territorial e Geoprocessamento Chefe: Prof. Dr. Roberto Braga Laboratrio de Planejamento Municipal Coordenador: Prof. Dr. Roberto Braga Rua Dez, n0 . 2527 13500-230 Rio Claro SP Tel. (019) 526-2241 / Fax. (19) 534-8250 e-mail: [email protected] www.rc.unesp.br/igce/planejamento Esta publicao contou com o apoio de: ABES/SP Associao Brasileira de Engenharia Sanitria e Ambiental Seo So Paulo Capa: Arnaldo Rosalem

Campos, Jayme de Oliveira Gesto de resduos: valorizao e participao / Jayme de Oliveira Campos e Roberto Braga. Rio Claro: LPM/IGCE/ UNESP, 2005 117 p. : grfs., tabs. Inclui bibliografia ISBN 85-89154-06-8 1. Resduos. 2. Gesto ambiental. 3. Valorizao de resduos. I. Braga, Roberto. II. Ttulo.

CDD 604.6Ficha Catalogrfica elaborada pela STATI Biblioteca da UNESP Campus de Rio Claro/SP

SUMRIOLixo e Cidadania Gesto e Participao Scio-Ambiental Ana Lcia Brasil A Poltica Nacional de Resduos Slidos: a responsabilidade das empresas e a incluso social Elizabeth Grimberg Gesto compartilhada de resduos slidos Srgio Hornink et al. Uma abordagem ao problema da gesto ambientalmente correta para resduos industriais ps-consumo na cidade de Rio Claro (SP) Denise Antunes da Silveira Jayme de Oliveira Campos Bolsa de Reciclagem Sistema FIEP fortalecendo o mercado da reciclagem e facilitando a gesto de resduos slidos Elisabeth Stapenhorst Flvia Gadotti Noronha A areia de fundio: um problema complexo com vrias solues Elson Longo Uso de resduos industriais como fonte alternativa de matria orgnica em processos de compostagem atravs de pilhas estticas com aerao forada Katia Goldschmidt Beltrame Valorizao de Resduos de laboratrios Mary Rosa R. de Marchi Gesto racional e valorizao de resduos de construo civil e demolies Stela Goldenstein Tratamento e valorizao de resduos qumicos no Laboratrio de Resduos Qumicos LRQ da USP, Campus de So Carlos Leny Borghesan Alberguini Maria Olmpia de Oliveira Rezende Resduos de Servios de Sade: Conceitos, Legislao e Recomendaes Tcnicas Angela Maria Magosso Takayanagui 05

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1. Lixo e Cidadania Gesto e Participao ScioAmbientalAna Lcia BRASIL 1

IntroduoNo Estado de So Paulo so geradas 20,5 toneladas/dia de resduos domiciliares. Dos 645 municpios 30% j gam seus resduos a cu aberto, em lixes, e so conceituados o como em situao inadequada, segundo o Inventrio Estadual de Resduos Slidos Domiciliares, organizado pela CETESB/SMA/SP e publicado em 2002. Outros 25% dos municpios encontram-se em situao controlada, e os 45% restantes operam em condies adequadas. O documento salienta, contudo, que a pontuao obtida pelos dois aterros da cidade de So Paulo, classificados em condies adequadas, por operarem grandes quantidades de lixo, deslocam a mdia do Estado, mascarando os resultados para uma condio melhor. Deve-se levar em conta que os aterros sanitrios, sendo uma modalidade de destinao final de resduos adequada do ponto de vista do saneamento ambiental, apresentam quatro aspectos negativos a serem considerados: a) provocam impactos ambientais; b) ocupam grandes reas, cada vez mais escassas nos conglomerados urbanos; c) no contribuem para a criao de uma cultura ambiental da reduo da gerao de resduos e; d) materiais destinados aos aterros no voltam para o circuito do reaproveitamento, o que se configura como um grande desperdcio de matrias-primas. As doenas veiculadas atravs do lixo, como leptospirose, diarria, tifo, salmonelose etc, atingem especialmente crianas. O ambiente tambm afetado com a disposio irregular do lixo: gua, ar e solo sofrem agresses, muitas vezes irreversveis. Estima-se que a carga difusa de resduos que chega nas reservas hdricas atinja entre 20 a 30%, provocando forte impacto nos mananciais, alguns j em estgio avanado de assoreamento e contaminao, agravando a situao de escassez de gua potvel vivida nas cidades do Estado de So Paulo. Neste contexto, a questo social, que envolve a presena de catadores de lixes e de rua, apresenta-se como um grande desafio: pessoas atingidas pelo desemprego e pelo processo mais amplo de excluso social retiram diariamente do lixo sua sobrevivncia. No Estado de So Paulo, h milhares de pessoas vivendo nos e dos lixes (2919 pessoas, em 225 municpios, segundo dados da CETESB. Considerando que 70% dos municpios dispem seus resduos de forma inadequada ou controlada, situao que favorece a presena de pessoas, deduz-se que este nmero deve elevar-se consideravelmente). Cabe ressaltar que tambm existem catadores de rua, dentre eles os organizados em associaes ou cooperativas que no foram contabilizados neste Inventrio.1

Frum Lixo e Cidadania do Estado de So Paulo [email protected]

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O trabalho dos catadores ocorre em condies extremamente precrias e indignas: famlias inteiras de catadores trabalham misturadas ao lixo. Estas so populaes que vivem em situaes de vulnerabilidade e de alto risco, dado que, entre outras coisas estes depsitos a cu aberto esto sujeitos a exploses pela concentrao de gases e pela falta de sistemas de drenagem. Para agravar mais este quadro constata-se a presena de centenas de menores de 14 anos, portanto crianas, trabalhando na separao de materiais reciclveis! Estas crianas correm inmeros riscos quanto sua sade e mesmo de morte. Risco to grande quanto estes o de elas no terem nenhuma perspectiva de se integrarem na sociedade como cidados e cidads dignos e com o direito a um futuro em patamares pleno de humanidade. A partir de pesquisa realizada pela UNICEF em 1998, identificando a presena de 50.000 crianas e adolescentes vivendo no e do lixo no pas, um conjunto de instituies decide criar o Frum Nacional Lixo e Cidadania, que hoje envolve 56 parceiros, para enfrentar esta realidade. A principal estratgia do Frum nacional o desenvolvimento da campanha Criana no lixo nunca mais, lanada em 1999, que visa sensibilizar os governantes e o conjunto da sociedade para que todas as crianas e seus familiares tenham seus direitos efetivados e uma vida digna e humana. Esta iniciativa tem como referncia uma srie de dinmicas sociais em andamento no Estado de So Paulo. Existem, mais de 300 grupos organizados de catadores, distribudos em mais de 126 municpios, que consideramos ser a base para implantao de polticas pblicas de incluso social no campo do reaproveitamento e reciclagem de resduos. Dinmicas sociais consideradas Estratgias e aes prioritrias frum lixo e cidadania Gesto sustentvel dos resduos slidos urbanos Aes a serem implementadas pelo Frum Estadual- 2003/2004 Papel dos atores do Frum

Estratgias e Aes Prioritrias Frum Lixo e Cidadania1. Mobilizao e sensibilizao: sociedade, rgos estaduais, Legislativo Estadual, instncias regionais, governos municipais, ONGs e Ministrio Pblico. 2. Pesquisa e levantamento de dados: diagnstico da situao scio ambiental dos resduos no Estado de So Paulo, cadastramento de experincias com resduos slidos no Estado de So Paulo, Inventrio Estadual de Resduos Slidos Domiciliares (CETESB) 3. Capacitao dos atores: controle ambiental, catadores (profissional e cidadania), gestores municipais, controle social (ONGs, Ministrio Pblico) 4. Divulgao: experincias bem sucedidas, apoio, divulgao, articulao com demais atores, troca de experincias e informaes 5. Promoo da incluso social: estmulo implementao dos programas : BolsaEscola, Bolsa Criana Cidad, Renda Cidad, Complementao Escolar, Alfabetizao de Adultos 6. Jurdico Legal : articulao junto s: Procuradorias e Promotorias (suas instncias regionais e locais): Infncia, Trabalho , Meio Ambiente, Conselhos Tutelares.

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Gesto Sustentvel dos Resduos Slidos UrbanosGesto ScioAmbiental Integrada e Compartilhada Participao da sociedade Participao de todas as instituies envolvidas na identificao e busca de solues para os problemas dos resduos slidos Mobilizao de lideranas Criao de um Ncleo de Articulao Local Processo de formao do Frum Municipal Lixo e Cidadania Integrao e participao em Frum Regional Lixo e Cidadania

Principais Funes do Ncleo de Mobilizao Local Provocar interesse pelo tema da Gesto Sustentvel dos Resduos Slidos Urbanos; Identificar problemas, aes, programas e projetos em desenvolvimento relativos aos resduos slidos; Identificar as diversas instituies que possam estar envolvidas na identificao e solues para os problemas encontrados; Buscar o comprometimento do corpo tcnico e das lideranas das instituies identificadas; Idealizao da estratgia de ao para o alcance das metas; Identificao de programas, projetos e aes em desenvolvimento; Mobilizar a sociedade para participar do grupo de discusso sobre a gesto dos resduos slidos no municpio; Participar do processo de identificao e de busca de solues para o problema; Proposio de um grupo coordenador e identificao de um articulador; Formao de subgrupos temticos; Elaborar e/ou contratar estudos e projetos; Implantar servios e obras; Monitorar e avaliar o mesmo e, Realizar suas posteriores adaptaes.

Aes a serem 2003/2004

implementadas

pelo

Frum

Estadual

I Sustentabilidade Poltica e Financeira 1. Descentralizao do Frum Por Regio; Por sub-bacia hidrogrfica; Parceria com os municpios atravs de um Ncleo de Articulao Local; Sensibilizao e mobilizao da sociedade; Capacitao dos atores;

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Promoo da gesto pblica de resduos slidos; Implantao da gesto scio ambiental integrada e compartilhada;

2. Ampliao das parcerias Aes em parcerias com as instituies componentes do Frum; Promoo da parceria com o setor privado; Incluso social na promoo e desenvolvimento das atividades; Promoo do trabalho das ONGs e integrao com as universidades;

3. Viabilidade Econmica e Financeira Integrao das atividades e dos programas, maximizando os resultados; Capacitao dos responsveis pela gesto operacional; Informao e acesso s linhas de financiamento e incentivos fiscais para implantao da coleta seletiva; Programas permanentes de sensibilizao e incorporao da sociedade;

II Estruturao de Informaes e Difuso 1. 2. 3. 4. Construo de um banco de dados sobre resduos; Diagnstico scio ambiental; Disponibilizar informaes; Indicadores;

III Capacitao 1. Programa de Capacitao Continuada para: Membros do Frum, Atores sociais, Gestores de Polticas Pblicas em seus diversos nveis;

2. Instrumentos: Cursos, seminrios, oficinas e demais instrumentos sensibilizao,mobilizao e implementao das aes. que promovam

Papel dos atores do FrumInstituies/ Profissionais 1. Integrar e envolver o Frum nas atividades da Instituio relativa aos resduos slidos; 2. Mobilizar e sensibilizar os integrantes da instituio; 3. Promover atividades integradas em comum com outros parceiros do Frum; 4. Incorporar a coleta seletiva na instituio e promov-la junto a vizinhana;

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5. Incorporar os catadores (cooperativas/associaes) nos programas de coleta seletiva internos; 6. Colaborar e apoiar os eventos e divulgar a concepo e idias do Frum; 7. Participar dos Programas de Capacitao dos atores do Frum; 8. Disponibilizar informaes das atividades profissionais de interesse do Frum;

Prefeituras 1. Criar um grupo representativo de discusso e articulao das questes relativas a resduos slidos; 2. Integrar e envolver o Frum nas atividades da Prefeitura, relativas aos resduos slidos; 3. Promover a coleta seletiva solidria no municpio; 4. Promover a coleta seletiva solidria nos rgos municipais; 5. Incorporar os catadores de reciclveis: (cooperativas/associaes) em todos os programas de coleta seletiva do municpio; 6. Colaborar nos eventos e divulgao da concepo e idias do Frum; 7. Participar dos Programas de Capacitao dos atores do Frum;

ConclusoA partir da constituio do Frum Nacional Lixo e Cidadania em junho de 1998 hoje composto de mais de 56 instituies -, do lanamento da campanha Criana no Lixo Nunca Mais em junho de 1999 e da formao de diversos Fruns Estaduais, deu-se incio, a princpio modestamente e, atualmente, de forma mais acentuada, a constituio de Fruns Municipais Lixo e Cidadania. Esses fruns tm se constitudo em importante ferramenta de trabalho para as administraes municipais, para a maior transparncia das aes e o estmulo participao da sociedade na Gesto Pblica e sobretudo na sustentabilidade das atividades dos servios de limpeza urbana implementadas. Para se obter sucesso na implantao de um Modelo de Gesto Sustentvel dos Servios de Limpeza Urbana, a mobilizao de lideranas sociais e instituies dever ser a principal ferramenta na estratgia a ser utilizada. A participao da sociedade na identificao dos problemas relativos aos resduos slidos, no estudo de alternativas tcnicas para o seu enfrentamento, no desenvolvimento e implantao dos programas e projetos e no monitoramento e avaliao das atividades relativas limpeza urbana, fator fundamental e decisivo para o sucesso na implantao e na operao dos servios. No entanto deve-se levar em conta que o processo de criao desse ncleo mobilizador local uma atividade inovadora, complexo e depende de grande habilidade dos seus constituintes. Esse ncleo poder vir a ser o Frum Municipal Lixo e Cidadania e / ou estar organizado dentro de conselhos e/ou fruns municipais j existentes. Podem compor o Conselho de Sade, Meio Ambiente, Saneamento, o Frum de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentvel DLIS e/ou se organizar junto Conferncia das Cidades ou outro arranjo de acordo com cada municipalidade. O pressuposto bsico no funcionamento desse ncleo o de que ele deve buscar resolver seus prprios problemas. No caso de se apresentar desafios que fogem capacidade do ncleo este deve buscar apoio de consultoria externa. No entanto todo o

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trabalho a ser desenvolvido pela consultoria dever ser discutido e acompanhado pelos componentes do ncleo que devem dar as diretrizes para trabalho da consultoria. Regimes democrticos de poder exigem cada vez uma participao da sociedade no somente na escolha dos seus dirigentes como tambm na discusso e elaborao de polticas municipais, estaduais e nacional. Em uma atividade que lida diretamente com cada cidado como a limpeza urbana, essa participao no somente importante, ela fundamental. Sem ela o programa no est completo.

BibliografiaABES-SP, Instituto PLIS, CAIXA, ANAMMA, UNICAMP, Projeto Pares (Poli-USP), OAF, Sindicato dos Engenheiros, Frum Recicla So Paulo, CRUMA CETESB/SMA/SP. Inventrio Estadual de Resduos Slidos Domiciliares, 2002. COORDENAO do FRUM LIXO E CIDADANIA DO ESTADO DE SO PAULO GESTO PARTICIPATIVA DOS SERVIOS DE LIMPEZA URBANA Ministrio do Meio Ambiente, Secretaria de Qualidade Ambiental, Projeto Gau, gua e Vida Centro de Estudo de Saneamento Ambiental. MINISTRIO PBLICO - Procuradoria Regional dos Direitos do Cidado Secretarias Estaduais: SERHS, SEADS e SERT SECRETARIA EXECUTIVA - Associao Brasileira de Engenharia Sanitria e Ambiental - ABES SP (www.abes-sp.org.br/lixoecidadania)

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2. A Poltica Nacional de Resduos Slidos: a responsabilidade das empresas e a incluso socialElizabeth GRIMBERG1

Resduo no lixoInicialmente queremos esclarecer que nesta reflexo sero abordadas questes concernentes formulao de uma Poltica Nacional de Resduos Slidos, que no pretende esgotar todos os contedos relativos ao tema. Para tratar deste assunto de forma mais coerente, preciso diferenciar lixo de resduos slidos - restos de alimentos, embalagens descartadas, objetos inservveis quando misturados de fato tornam-se lixo e seu destino passa a ser, na melhor das hipteses, o aterro sanitrio. Porm, quando separados em materiais secos e midos, passamos a ter resduos reaproveitveis ou reciclveis. O que no tem mais como ser aproveitado na cadeia do reuso ou reciclagem, denomina-se rejeito. No cabe mais, portanto, a denominao de lixo para aquilo que sobra no processo de produo ou de consumo. Marcar estas diferenas de suma importncia. A clareza na compreenso destes conceitos o que permite avanar na construo de um novo paradigma que supere, inclusive o conceito de limpeza urbana.

DestinaoA estruturao de uma Poltica Nacional de Resduos Slidos vem ao encontro de um dos grandes desafios a ser enfrentado pelos governos e pelo conjunto da sociedade brasileira - a magnitude do problema da gerao de resduos slidos. Hoje, no Brasil, segundo a Pesquisa Nacional de Saneamento Bsico - PNSB, realizada em 2000 pelo IBGE, coleta-se diariamente, cerca de 125.281 mil toneladas de resduos domiciliares, sendo que 47,1 % dos mesmos vo para aterros sanitrios. O restante, 22,3%, segue para aterros ditos controlados e 30,5% para lixes. Uma parcela mnima (nem contabilizada na pesquisa) coletada seletivamente e destinada para a reciclagem. Cabe salientar que os dados referentes destinao para aterros sanitrios, so passveis de reviso, inclusive pelo IBGE, conforme matria publicada no jornal O Estado de So Paulo (28/03/2002): os informantes (prefeituras) podem ter sido demasiadamente otimistas. A pesquisa revela uma tendncia de melhora no quadro, entretanto o prprio Instituto ressalva que no provvel que se tenha atingido a qualidade desejada de destinao final do lixo urbano no Brasil, na medida em que estes locais, por estarem geralmente na periferia das cidades, no1

Mestre em Sociologia. Coordenadora da rea de Ambiente Urbano do Instituto PLIS. Coordenadora do Frum Lixo e Cidadania da Cidade de So Paulo.

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despertam interesse da populao formadora de opinio, tornando-se, assim, pouco prioritrios na aplicao de recursos por parte da administrao municipal (IBGE, 2000). Corrobora esta avaliao, o fato de 3.502 dos municpios brasileiros, ou seja, 63,6% do total, usarem lixes para depositarem seus resduos! Por outro lado, se considerarmos que os chamados aterros controlados so uma modalidade de disposio de resduos extremamente frgil, portanto questionvel quando definida como uma forma adequada de tratamento. Aterros controlados so inadequados porque facilmente podem tornar-se lixes e, por sua engenharia, so muito inferiores a do aterro sanitrio, causando problemas ambientais, tais como contaminao do ar, do solo e das guas subterrneas. Assim, pode-se considerar que 52,8% do total de resduos gerados no pas so gerenciados de forma inadequada. Vale lembrar que as cidades, especialmente as grandes, enfrentam a crescente falta de espaos, para a construo de aterros. Nos municpios pequenos e mdios estes espaos podem servir para outras finalidades mais importantes como a agricultura, turismo, lazer. A estas dificuldades e desvantagens de destinao para aterros sanitrios, acrescenta-se os altos custos para instalao e gerenciamento deste tipo de infraestrutura. Outra face da questo o gravssimo quadro social que envolve a presena de crianas, adolescentes e adultos vivendo no e dos inmeros lixes e muitas vezes em aterros sanitrios e controlados. Estas pessoas coletam alimentos e materiais reciclveis para da extrarem sua sobrevivncia. So pelo ao menos 35 mil crianas em lixes e uma estimativa de 200 mil a 800 mil catadores trabalhando em depsitos a cu aberto e nas ruas em todo o pas! No devemos deixar de considerar tambm a falta de alternativas mais adequadas de descarte dos resduos, os graves problemas de sade pblica, bem como os desastres ambientais no meio urbano e rural, provocados pelo lixo jogado nos rios e crregos.

DesperdcioOutro aspecto a ser considerado na tica das mudanas necessrias no enfrentamento da excessiva gerao de resduos, refere-se ao desperdcio. Os resduos orgnicos representam 69% do total descartado hoje no pas. Anualmente 14 milhes de toneladas de sobras de alimentos, segundo o Ministrio da Agricultura, viram literalmente lixo devido a procedimentos inadequados em toda a cadeia produtiva. A ttulo de exemplificao: perde-se 30% das hortalias ao longo das fases de produo, industrializao, armazenagem, transporte e distribuio. Perde-se outras tantas toneladas de hortifrutigranjeiros com o descuido do consumidor no manuseio nos supermercados, e tambm nas cozinhas domiciliares e comerciais, em funo dos preconceitos da nossa cultura alimentar que despreza, por exemplo, talos, verduras, cascas de frutas e de ovos, sementes etc. Dados publicados na revista SUPERINTESSANTE (03/2202) apontam que 19 milhes de pessoas poderiam ser alimentadas diariamente com as sobras desperdiadas. Constata-se, assim, um duplo desperdcio. Por um lado, deixa-se de reutilizar ou reciclar materiais - vidro, papel, papelo, metais, alguns plsticos que podem dinamizar um mercado gerador de trabalho e renda. E, por outro lado, gastam-se significativas cifras para enterrar resduos. Estes recursos podem, por sua vez, ser redirecionadas para finalidades mais relevantes como educao, meio ambiente, sade, cultura.

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Papel estratgico da legislaoDiante deste quadro, a perspectiva de se constituir uma Poltica Nacional para estabelecer princpios, objetivos e instrumentos, bem como diretrizes e normas para o gerenciamento dos resduos no pas, de extrema relevncia. Mais relevante ainda o fato dessa poltica definir um papel para o Estado na direo de um desenvolvimento socialmente justo e ambientalmente sustentvel. A Poltica Nacional est sendo intensamente debatida por inmeros setores sociais interessados na implementao de uma legislao que no apenas regule o funcionamento desta rea, mas principalmente institua leis que resultem em mudanas na situao dos resduos slidos em nvel federal, estadual e municipal. Portanto, est em questo a regulamentao de sistemas de tratamento de todos os resduos gerados e, tambm, a instituio de responsabilidades bem definidas, segundo os tipos de resduos. Aqui ser enfocado, alm dos resduos comuns, aqueles considerados como especiais: industriais e de minerao, de servios de sade, rurais, de transportes, radioativos, de construo civil, do comrcio e de servios, tecnolgicos, pneumticos, de explosivos e armamentos, de embalagem. Este um ponto chave que envolve mudanas em toda cadeia produtiva, tendo em vista a busca de um novo paradigma o da sustentabilidade ambiental. A responsabilizao das indstrias envolve desde o processo de p roduo de bens e servios at o ps-consumo, o que dever levar reviso de processos produtivos com vistas reduo da gerao de resduos. Esta abordagem requer do setor produtivo uma redefinio e uma nova postura quanto s matrias-primas utilizadas e quanto ao perfil de produtos oferecidos no mercado. A proposta que est sendo defendida em mbito mundial e em diversos fruns e redes sociais no pas aponta para a no produo de novos materiais e produtos que exijam tecnologias novas de fabricao e de reciclagem, visto que os dois processos exigem aportes de matrias-primas e energia cada vez maiores. Outra via para a reduo estimular a produo de bens com alta durabilidade e integralmente reciclveis. Trata-se assim, de se instituir leis que n induzam apenas diminuio do volume o de resduos gerados, mas reduo da quantidade (massa) produzida, pois est em questo contemplar uma transformao mais ampla e conseqente com patamares sustentveis de produo e consumo. O princpio da reduo precede o da reutilizao e o da reciclagem e acima de tudo prescinde da incinerao de materiais. Este ltimo mtodo de tratamento consiste na queima dos resduos, seja como forma de destino final, seja como forma de recuperao energtica. Cabe lembrar que no processo de incinerao, os resduos no desaparecem, apenas so transformados em cinzas, lquidos e gases contaminantes. No Brasil, 60% da composio dos resduos matria orgnica. Para obter-se energia a partir da queima de resduos, preciso injetar mais combustvel, devido expressiva presena de resduos orgnicos (misturados aos inorgnicos), elevando os custos da incinerao. Alm disso, quanto mais energia se quer recuperar, menor ser a velocidade de resfriamento da queima, o que implica num aumento da quantidade de compostos txicos formados como organoclorados (furanos e dioxinas), causadores de cncer e outros graves danos sade humana. Outro argumento para que no se permita a instalao de incineradores, em lei so seus altos custos. As plantas destes equipamentos requerem investimentos entre US$ 1 milho e 700 milhes. Um volume de recursos deste porte termina por obrigar a continuidade no funcionamento do incinerador como justificativa de no perder os investimentos feitos, mesmo que o equipamento traga problemas ambientais e de sade. Cabe lembrar que o municpio, ao adquirir este tipo de 13

instalao, contrai uma dvida que dever ser paga ao longo de vinte anos. Assim, governos, que no escolham esta modalidade de destinao, acabam herdando este tipo de dvida. Mais grave ainda so as implicaes sobre os programas de recuperao e reciclagem. Depois que se gastou cifras exorbitantes para incinerar, torna-se praticamente invivel o desenvolvimento de outras polticas mais conseqentes para a destinao ambientalmente adequada dos materiais ps-consumo: a reutilizao e a reciclagem. A lgica de operao do incinerador exige que uma quantidade significativa de resduos seja queimada, para que no opere com capacidade ociosa. A ttulo de exemplo, nos Estados Unidos, nos ltimos dez anos, houve uma grande campanha pblica para no se construir mais incineradores e, hoje, discute-se um plano para desativao das plantas existentes. Da mesma forma que no se deve priorizar a destinao de materiais reciclveis para aterros sanitrios, no cabe investir recursos para a queima de resduos. Melhor e mais adequado usar estes recursos para apoiar uma poltica social que gere trabalho e renda. No Brasil temos apenas 451 municpios, 8% do total (IBGE, 2000), com programas de coleta seletiva executada pelo poder pblico. Entretanto, no est dimensionada e devidamente valorizada a coleta seletiva operada pelos catadores e catadoras que, h pelo menos 50 anos, atuam na limpeza urbana e como agentes ambientais, recuperando materiais reciclveis. A valorizao destes trabalhadores caminha lado a lado promoo do desenvolvimento de polticas sociais, econmicas e ambientais sustentveis. O potencial econmico dos materiais que hoje so desperdiados enorme. So milhares de postos de trabalho que podero ser criados, se estabelecidas metas na Poltica Nacional para a reciclagem de embalagens, praticada a responsabilidade social empresarial e implementados sistemas pblicos com incluso social para a coleta seletiva das mesmas. Esta valorizao deve explicitar-se na Poltica Nacional de Resduos Slidos atravs: 1) do reconhecimento do catador como profissional apto a realizar a coleta seletiva, triagem, beneficiamento, comercializao e reciclagem de materiais reaproveitveis, orgnicos e inorgnicos; 2) da destinao de recursos federais e estaduais prioritariamente para aqueles municpios que implementarem sistemas de recuperao de reciclveis integrando os catadores de lixes e de ruas, organizados em cooperativas ou associaes autnomas; 3) e do apoio do poder pblico municipal a programas de capacitao tcnico-gerencial e tambm de formao para o desenvolvimento integral dos catadores e catadoras atuarem como profissionais independentes e ao mesmo tempo remunerados. Um passo importante nesta direo foi a criao, em setembro deste ano, do Comit Interministerial de Incluso Social dos Catadores de Lixo, cujo principal objetivo a formulao de um projeto no mbito do Fome Zero, associado incluso social dos catadores e a erradicao dos lixes.

A responsabilidade dos empreendedores e a coleta seletiva com incluso socialA participao dos empreendedores, sejam eles fabricantes, importadores, envasadores ou comerciantes, enquanto responsveis por toda a cadeia produtiva que resulta na gerao de resduos ps-consumo pode ocorrer em dois nveis: 1) gerenciamento direto dos resduos denominados de especiais; 2) pagamento de taxa por todos os setores envolvidos com as embalagens (segundo o tipo de resduo, a quantidade produzida e/ou comercializada etc). Este recurso poder, por sua vez, ser transferido para fundos distritais

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ou municipais daqueles municpios que implantarem sistemas de reaproveitamento de resduos com incluso social. Esta forma de gerenciar a questo das embalagens uma das propostas, feita pelo Frum Lixo e Cidadania da Cidade de So Paulo, encaminhada em 2002 ao ento relator da Comisso Especial do Projeto de Lei, visando assegurar a integrao dos catadores e catadoras de maneira mais efetiva. O conjunto de propostas acima mencionado tambm foi encaminhado Secretaria de Qualidade Ambiental do Ministrio de Meio Ambiente e ao Presidente da Cmara de Deputados, em 2003. Diversas modalidades de funcionamento de sistemas de coleta de materiais reciclveis podem ser implementadas paralelamente ao sistema pblico de coleta seletiva de carter associativo, com incluso social. Os grandes geradores, supermercados, shoppings, clubes, etc podero contratar cooperativas de trabalhadores para coletarem seletivamente seus materiais e desenvolverem simultaneamente programas de educao scio-ambiental junto comunidade. E ainda outra possibilidade as empresas separarem seus materiais e doarem s cooperativas operadas por catadores ou por outros trabalhadores. Incentivos fiscais seria uma forma de viabilizar estas modalidades de economia solidria. Ainda que priorizando o segmento dos catadores e catadoras de reciclveis quando da implantao de polticas pblicas para o reaproveitamento de resduos, outros agentes econmicos estaro participando do processo de recuperao de materiais ps-consumo. Por fim, outra responsabilidade do setor empresarial na perspectiva da sustentabilidade ambiental, a instituio de metas para a reutilizao de embalagens de produtos que possam ser retornveis. Em resumo, a grande preocupao, ao se elaborar uma Poltica Nacional de Resduos Slidos, do ponto de vista da afirmao dos direitos de cidadania destes trabalhadores que atuam, h dcadas, sem nenhum respaldo legal, a de no reexclu-los. Trata-se, portanto, de reconhec-los como profissionais no mbito da legislao. O desafio estruturar uma Poltica que responsabilize o setor privado quanto destinao dos resduos gerados e ao m esmo tempo promova a insero dos catadores em toda a cadeia produtiva. Estes trabalhadores vm intensificando sua mobilizao na perspectiva de garantir seus direitos em lei. Processos de organizao em nveis municipal, estadual e nacional esto em andamento no pas - tome-se como referncia a realizao do 1 Congresso Nacional de Catadores, em Braslia, em 2001, que reuniu 1.500 catadores e 200 tcnicos e agentes sociais. Os Fruns Lixo e Cidadania, com atuao em mbito nacional, estadual e municipal tambm reforam a necessidade de se instituir diretrizes e normas que possibilitem a plena integrao dos catadores e catadoras em toda a cadeia do reaproveitamento de resduos - da coleta seletiva reciclagem industrial. O poder pblico municipal, neste n ovo sistema de gesto, ter um papel central ao ser responsvel no s pelo gerenciamento integrado de resduos slidos comuns, mas tambm pela estruturao de estratgias e aes que mobilizem o conjunto da sociedade para implementao da gesto scio-ambiental compartilhada e com incluso social.

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Limpeza pblica ou uma nova concepo de gesto de resduos slidos?Um aspecto central, para que se instaure uma nova concepo de gesto e destinao de resduos slidos, refere-se garantia, por um lado, de educao scioambiental e, por outro, promoo da mobilizao da populao. Para tal preciso assegurar, na legislao, instncias e instrumentos para que a sociedade exera controle social, acompanhe a prestao de servios de limpeza urbana e tambm participe da implementao de programas que priorizem o desenvolvimento social e a economia solidria. A sociedade dever contar com leis que impulsionem a participao social e a gesto compartilhada com incluso social, atravs, por exemplo, de conselhos gestores de resduos slidos, federal, estadual e municipal. A perspectiva a de avanar para uma sociedade sensibilizada, informada e educada para as questes do no desperdcio de materiais, para consumir com critrios, para descartar seletivamente e para no jogar resduos nas ruas, crregos, terrenos baldios, ou seja, de forma inadequada. Neste cenrio, poderemos superar o conceito de limpeza urbana, que pressupem a sujeira urbana governos, empresas, cidados e cidads tero conscincia de suas atitudes e no mais jogaro lixo em locais imprprios. Pelo contrrio, estaro participando da construo de uma nova concepo de gesto de resduos estruturada a partir: da participao da sociedade; da incluso social; da educao para os 3 Rs- reduzir, reutilizar, reciclar; da responsabilidades social empresarial; da solidariedade na economia. A elaborao, de forma democrtica, de uma Poltica Nacional de Resduos Slidos, poder gerar um novo estilo de desenvolvimento social e ambientalmente sustentvel e ser motivo de jbilo para as geraes futuras do nosso pas e uma referncia em nvel mundial.

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3. Gesto compartilhada de resduos slidosSrgio HORNINK1 ; Jos Soares Pimentel2 ; Mrcia de Arajo B. Nunes3 Zelinda Esterci; Wilma dos Anjos Piedade; Snia Vilar Campos6 Sandra Tereza Freitas7; Marina Sendacz 8 , Gilsene L.R.P. Fajersztajn9 Gabriela de Figueiredo Laurelli10 ; Fbio Jos Alves Vieira11 ; Edina da Cunha Lima12; Alosio de Castro Gama 13 ; Affonso C.N. de Andrade14

ResumoO gerenciamento de resduos slidos no Estado de So Paulo encontra-se numa condio considerada crtica apresentando como conseqncias proliferao de vetores e doenas, contaminao das guas superficiais e subterrneas atravs da percolao de poluentes advindos de formas inadequadas de disposio de resduos slidos, principalmente os de origem domiciliar, provocando degradao de reas e comprometimento do meio ambiente. A permanncia de adultos e crianas que subsistem da atividade de catao leva ao agravamento da sade dessas pessoas, alm de evaso escolar. Dentre os fatores que determinam essa situao, destaca-se que a gesto de resduos slidos, isoladamente por municpio, tem sido ineficiente pelos fatores seguintes: ausncia de tcnicos especializados; metodologia inadequada de trabalho; falta de estrutura de suporte operacional; escassez de recursos financeiros; e ainda ausncia de suporte tcnico mnimo para os equipamentos. Neste trabalho apresentada proposta de gesto compartilhada dos resduos slidos municipais que, alm do lixo domstico, incluem os resduos de sade, resduos de construo civil e industriais. Para esse propsito, utiliza-se a metodologia da consorciao regional, com nfase na negociao de conflitos entre setores sociais, o envolvimento progressivo de um grupo de municpios que tenha uma populao preocupada com a questo dos Resduos Slidos, em rea geogrfica em que fique demonstrada afinidade

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Tecnlogo Civil/Hidrulica ( FATEC UNESP), atua na CETESB desde 1976, Gerente de Agencia Ambiental de 1995 a 2000, atividade principal controle de poluio e negociao de conflitos. Atuou como Consultor de Meio Ambiente no gabinete do Secretrio de Recursos Hdricos, Saneamento e Obras, de fev. 2001 a fev. 2004. Autor da proposta temtica e da consultoria deste trabalho. 2 Engenheiro Civil/Sanitarista, Mestre em Engenharia de Sade Pblica Tropical (Universidade de Leeds, UK), Coordenador de Saneamento da SRHSO, atuou na Sabesp desde 1980 nas reas de Planejamento, Informaes e Informtica e Desenvolvimento Tecnolgico. 3 Engenheira Civil/Sanitarista, Diretora do Grupo Tcnico-Gerencial da Coordenadoria de Saneamento, atuou na Sabesp desde 1993 como Gerente de Projetos e Gerente de Operao de Esgotos. 4; 5; 6; 7; 8; 9; 10; 11; 12; 13; 14 Equipe da Coordenadoria de Saneamento, com formao universitria multidisciplinar nas reas de 4; 10: Engenharia Civil; 5; 9: Geografia e Planejamento Urbano; 6 Arquitetura e Planejamento Urbano e Regional; 7 Comunicao Social; 8 Pedagogia; 11 Direito; 12 Matemtica; 13; 14: Cincias Econmicas e Meio Ambiente.

intermunicipal e desejo expresso de lideranas para a obteno de solues e que a encontrem de forma consorciada. Esse modelo de gerenciamento de resduos slidos se apia no exemplo de experincias bem sucedidas, de esforos conjuntos e do compartilhamento de recursos e da eficincia tcnica para propiciar a continuidade da prestao do servio, de forma completa e adequada. A resposta ao quadro de precariedade no gerenciamento dos resduos slidos em todo o Estado, e as conseqncias j mencionadas, decorre da necessidade da participao efetiva, na busca de solues ambientalmente aceitas, objetivando as melhores prticas e melhor utilizao de mo de obra especializada face insuficincia de recursos para tratar individualmente o problema e ao grande nmero de aes promovidas pelo Ministrio Pblico Estadual.

IntroduoA anlise dos dados disponveis relativos ao setor Resduos Slidos no Estado de So Paulo indica uma situao bastante precria, tanto do ponto de vista sanitrioambiental, quanto do ponto de gesto e normatizao. A universalizao da coleta encontra muitas vezes obstculos tcnicos de difcil soluo, devidos geralmente ao crescimento desordenado das cidades; e a fiscalizao e regulamentao dos servios so, no mnimo deficientes. O resultado o lixo jogado nas ruas, encostas de morros e corpos dgua poluindo as guas, causando enchentes e graves problemas sade pblica e qualidade de vida em geral. Muitos dos municpios ainda fazem a disposio final dos resduos de forma inadequada, muitas vezes contaminando corpos dgua e o lenol fretico, degradando reas e propiciando a proliferao de vetores de doenas. Constata-se, verdade, uma evoluo na situao da disposio final de resduos. Essa evoluo, entretanto, ainda bastante lenta, e no raro um aterro implantado dentro das melhores normas tcnicas transformar-se em pouco tempo em um lixo. A implantao de aterros sanitrios dentro de normas tcnicas adequadas fundamental, sendo tambm a mais simples15 porque conta com normas consolidadas, envolve poucos agentes, ocorre num prazo relativamente curto e a que demanda menores recursos. Por outro lado, a operao do sistema de limpeza pblica demanda aes e recursos constantes, precisa estar sempre se ajustando dinmica da cidade, sofre a influncia das mudanas sociais e das oscilaes da vontade poltica dos governantes. Nesse quadro h ainda uma sria questo social - a dos catadores - adultos e crianas que, muitas vezes, h varias geraes, sobrevivem da catao do lixo, estigmatizados pela sociedade, sem as mnimas condies de vida, higiene e sade, de escolaridade e de dignidade. Os resduos produzidos tambm crescem a cada dia, em quantidade e periculosidade. Cada vez produzimos mais descartveis. A atual crise energtica traz mais um fator de periculosidade aos resduos domiciliares com a popularizao do uso de lmpadas fluorescentes, que tem um potencial altamente contaminados pelo mercrio. A responsabilizao ps-consumo, prevista em lei e na Agenda 21 Brasileira no est ainda institucionalizada.

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Isso talvez no seja inteiramente verdade em regies metropolitanas, como no caso da RMSP, onde a alta densidade demogrfica, aliada ao fato de grande parte de seu territrio ser constituda por Zona de Mananciais, torna crtica a questo da disponibilidade de rea.

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mnima a quantidade de resduos que so reciclados ou que sofrem processo de compostagem, as poucas usinas de reciclagem e de compostagem que existem no Estado esto na maioria das vezes operando de modo inadequado, muitas vezes com capacidade ociosa ou at mesmo desativadas. A reciclagem das latas de alumnio, que atinge uma alta porcentagem, deve-se muito mais a uma conjuntura scio-econmica do que a iniciativas governamentais. Um outro problema do setor a viso compartimentada da gesto. Ela se faz geralmente margem das outras polticas de habitao, do planejamento urbano, de transporte, etc. Vemos, por exemplo, aterros implantados nas proximidades de aeroportos e polticas equivocadas de transporte induzirem a ocupao de reas protegidas; muitas vezes at a inter-relao das vrias etapas do sistema de limpeza pblica no so adequadamente equacionadas. A questo Resduos Slidos portanto extremamente complexa; envolve aspectos jurdico-institucionais, tcnicos, de sade pblica, ambientais, econmicos e sociais. Alm disso, enquanto os servios de gua e esgoto j contam com algumas prticas, indicadores de eficcia/eficincia, normatizaes e estruturas tarifrias razoavelmente estabelecidos, no setor Resduos Slidos praticamente muito ainda est por fazer. Para reverter o quadro atual necessria a conjugao de uma srie de questes: Vontade poltica dos governantes; Viso abrangente do problema, que vai muito alm das questes estritamente tcnicas e dos limites do municpio; Gerenciamento que considere as inter-relaes entre as vrias etapas e servios de limpeza pblica desde a gerao dos resduos at a sua disposio final e tambm a adequao dos servios de limpeza pblica dinmica e organizao geral do Municpio; Profissionais capacitados para as diversas funes, desde o planejamento at a operao; Equipamentos; Regulamentao; Regulao e fiscalizao; Educao ambiental e controle social; Recursos financeiros.

O modelo de gestoTradicionalmente, a gesto de resduos slidos tem se dado de forma isolada, isto , cada municpio administra isoladamente seus resduos. Essa administrao consiste na maioria dos casos numa coleta mais ou menos eficiente e numa disposio final apenas afastada dos ncleos urbanos, muitas vezes s margens de rios e at mesmo mananciais. A maioria dos municpios que administra diretamente a limpeza pblica no sabe quanto gasta com o setor; no existem indicadores de eficcia/eficincia; os que terceirizam o setor carecem de mecanismos eficientes para regulamentao e fiscalizao. Nas regies metropolitanas, que por suas caractersticas intrnsecas exigem aes articuladas, no s intersetoriais como intermunicipais, a gesto isolada no est conseguindo resolver os desafios que so cada vez maiores. Um desses desafios o crescente aumento da quantidade e periculosidade dos resduos, aliado disponibilidade cada vez menor de reas para a disposio final dos resduos.

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Nos pequenos municpios, a pouca quantidade de resduos leva a um alto custo/tonelada devido principalmente impossibilidade de se otimizar recursos materiais e humanos para tais situaes. O resultado um servio caro e inadequado do ponto de vista ambiental e de sade pblica. A necessidade de tcnicos especializados e equipamentos demandam recursos muitas vezes incompatveis com a receita do municpio. Os avanos da conscincia ambiental aliados fiscalizao e ao do Ministrio Pblico vm colocar em cheque esse modelo; os administradores municipais esto encontrando muita dificuldade em se adaptar s novas exigncias, a includas as da Lei de Responsabilidade Fiscal. Procurando dar resposta a essas questes se prope a Gesto Compartilhada de Resduos Slidos.

O Projeto Gesto Compartilhada de Resduos SlidosObjetivoO objetivo principal buscar viabilidade tcnico-econmica-ambiental da gesto dos servios de limpeza pblica atravs da otimizao dos recursos financeiros, humanos e ambientais.

AbrangnciaA rea de abrangncia do projeto foi proposta para todo o Estado de So Paulo. Num primeiro momento entretanto devem ser priorizados os pequenos e mdios municpios que so justamente os que encontram maiores dificuldades para equacionar a otimizao de recursos com as baixas quantidades de resduos gerados. Dos 645 municpios do Estado, 532 tm uma populao total inferior a 50.000 habitantes e desses, 299 com menos de 10.000 habitantes (IBGE/SEADE).

A propostaA proposta bsica do projeto que, a partir da constatao da dificuldade de se adequar legislao vigente atravs da gesto isolada, os municpios busquem resolver o problema de forma solidria atravs de consrcios intermunicipais. A proposta fundamenta-se em experincias bem sucedidas de se conseguir menores custos, melhor qualidade dos servios e, o que particularmente importante, propiciar uma garantia substancial na continuidade na prestao desses servios, tornando-os menos vulnerveis alternncia do poder municipal. Para isso fundamental, claro, um instrumento que discipline o Consrcio muito bem elaborado, com os direitos e obrigaes muito claros para todas as partes envolvidas.

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O que um Consrcio Intermunicipal?A Fundao Prefeito Faria Lima CEPAM (1997) conceitua e esclarece bem os aspectos jurdicos dessa forma de gesto, como segue. Consrcio intermunicipal, tambm denominado consrcio administrativo, o acordo firmado entre municpios para a realizao de objetivos ou interesses comuns, mediante a utilizao de recursos materiais e humanos de que cada um dispe. Segundo Hely Lopes Meirelles, nos consrcios as municipalidades renem recursos financeiros, tcnicos e administrativos que uma s prefeitura no teria para executar o empreendimento desejado e de utilidade geral para todos (in Direito Municipal Brasileiro. 6 ed. So Paulo: Malheiros, 1993, p309). Para a celebrao de um consrcio intermunicipal, nesses moldes, basta uma lei autorizadora de cada municpio interessado, permitindo integr-lo ao ajuste. Essa lei h de ser prvia formalizao do ajuste, onde sero estabelecidos os direitos e as obrigaes de cada consorciado. O incio dos trabalhos s poder acontecer depois dessa formalidade. Se for necessrio assegurar, previamente, a unio dos interessados, possvel a assinatura, pelos prefeitos, de um protocolo de intenes. No h necessidade de nenhum registro, embora deva ser mantido nos municpios consorciados um controle desse ajuste. Ressalte-se ainda que o consrcio no tem personalidade jurdica e, portanto, no agente capaz de direitos e obrigaes. Trata-se de mero ajuste institucional. Os municpios, separadamente, que tm personalidade jurdica, e a unio deles pelo consrcio no cria uma nova personalidade jurdica. Todas as despesas e responsabilidades so assumidas pelos municpios consorciados. Assim, se a inteno dos municpios no a reunio de recursos, mas a produo de bens atravs da unio, necessria a constituio de uma pessoa jurdica, a exemplo de uma sociedade civil ou comercial. Uma sociedade civil ou comercial, cuja criao foi previamente autorizada pelas cmaras municipais interessadas, detentora de direitos e obrigaes e, portanto, pode assumir o que for necessrio execuo dos seus objetivos (contratar pessoal, comprar e vender bens, contrair emprstimos nacionais ou estrangeiros), observada, evidentemente, a legislao em vigor. Sendo esses os interesses dos municpios, no se fala mais em consrcio, mas em sociedade. So situaes distintas, que no se confundem. A sociedade civil intermunicipal constituda para execuo de uma atividade no mercantil, ou seja, para uma atividade que no envolve atos de comrcio, como por exemplo, a despoluio de um rio, a construo de um hospital, a prestao de um servio como coleta de lixo. Assim, aqueles municpios X, Y e Z se no dispusessem de pessoal, nem tampouco de mquinas e de local para disposio do lixo, poderiam construir uma sociedade civil entre eles capaz de contratar, por concurso pblico, o pessoal necessrio e comprar, atravs de licitao, os caminhes e a rea prpria para instalar a usina de reciclagem e o aterro sanitrio. a sociedade civil, devidamente constituda, quem estar realizando os atos necessrios execuo dos fins ajustados. Mas, como veremos adiante, a necessidade tem levado os municpios a no se restringirem ao servio pblico de coleta e disposio final do lixo, mas a praticarem atos de comrcio (venda do lixo reciclado) que no so prprios de uma sociedade civil, mas de uma empresa mercantil, ou cooperativas para tal fim. Alis, o consrcio, embora largamente utilizado para minorar dificuldades e adequado para que a prestao de certo servio da responsabilidade municipal ocorra mediante atividade conjunta de mais de um municpio, no o nico instrumental posto pelo ordenamento jurdico disposio das pessoas pblicas (Unio, Estado-membro, Municpio). Com efeito, os municpios podem obter os mesmos resultados instituindo pessoas de direito privado, a exemplo das sociedades civis ou das empresas pblicas e

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sociedades de economia mista, de carter intermunicipal. Alguns autores, dentre eles o jurista Celso Antnio Bandeia de Melo, (in: Manual das autarquias, publicao, s.d., do Servio Nacional dos Municpios SENAM, rgo do Ministrio do Interior) entendem ser possvel a criao de autarquia intermunicipal.

Empresa Pblica IntermunicipalEmpresa pblica uma sociedade mercantil-industrial, constituda mediante autorizao de lei e essencialmente sob a gide do Direito Privado, com capital exclusivamente da administrao pblica (...) destinada a realizar imperativos da segurana nacional e relevantes interesses da comunidade (GASPARINI, Digenes. In: Direito administrativo. 3 ed. So Paulo: Saraiva, 1993, p.285). O municpio pode, para realizar relevantes interesses da comunidade, intervir na economia, criando uma empresa pblica municipal ou mesmo intermunicipal. Assim h de ser ante a autonomia que cabe ao municpio para dispor sobre todos os assuntos de interesse local, a exemplo da instituio, organizao e execuo dos servios pblicos de sua responsabilidade, conforme prescreve a Constituio Federal (art. 30, I). De sorte que no se pode estranhar esse comportamento. Se isoladamente podem criar empresa pblica e a ela atribuir determinadas competncias, resta seguro dizer que dois ou mais municpios podem se unir para criar uma entidade dessa natureza de carter intermunicipal e lhe atribuir competncias comuns, isto , da responsabilidade dos municpios, a exemplo da execuo do servio de coleta e disposio final dos resduos. Ademais, se por expressa disposio constitucional se reconhece ao municpio o poder de organizar os seus servios pblicos, h de se entender que possa livremente dispor sobre sua prestao, executando-os isolada ou conjuntamente com outros municpios. Por fim, diga-se que no h princpio jurdico legal que vede a associao de dois ou mais municpios para o alcance de certo objetivo e que a empresa pblica observa o regime aplicvel s empresas privadas, deve-se entender permitida a sua constituio por associao de municpios, de Estado-membro e assim por diante, para a cura de problemas que interessem a ambos, a exemplo da coleta e disposio final de lixo. A empresa assim criada, depois de devidamente autorizada, executar o servio antes da competncia de um dos seus scios. Assentado que municpios interessados na prestao conjunta de alguns servios de natureza mercantil que existem em seus respectivos territrios podem criar uma empresa pblica intermunicipal, isto , integrada por essas comunas, isto no significa que vemos como juridicamente invivel a utilizao de uma sociedade de economia mista, mas, tos, que a enxergamos menos prtica para os mesmos fins, pois s pode ser instituda nos moldes do Direito Comercial. A empresa pblica tanto pode ser civil como mercantil. O mesmo se pode dizer da fundao, embora o objetivo de sua no-utilizao seja outro. Essa entidade governamental indicada para a prestao de servios de educao e cultura. A necessidade de se criar uma empresa mercantil intermunicipal fundamenta-se no fato de que o servio de coleta e disposio final dos resduos pode vislumbrar a prtica de uma atividade de natureza econmica, ao se comercializar o produto da coleta seletiva ou o resultado obtido nas usinas de reciclagem de lixo. Com a venda do lixo reciclado ou do composto orgnico, o servio de coleta e disposio final do lixo adquire caractersticas de atividade mercantil que, pelo municpio, s pode ser exercida atravs de uma empresa pblica. Sendo assim, e nos termos do artigo 173 da Constituio Federal, a explorao direta da atividade econmica pelo Estado s ser permitida quando necessria aos imperativos da segurana nacional ou a relevante interesse coletivo, nos termos da lei. 22

Assim, o municpio s pode desempenhar atividades econmicas (mercantis-industriais) essencialmente, das empresas pblicas ou sociedades de economia mista, quer sejam municipais ou intermunicipais. Dizer que a simples coleta de lixo, que sempre foi explorada pelo municpio, pode tornar-se uma atividade econmica decorre da falta de recursos pblicos e da necessidade de se adotar novas tecnologias para se resguardar o equilbrio do meio ambiente. Isto se explica porque, para o municpio adequar-se aos tratados internacionais, s exigncias federais e estaduais e s leis municipais, precisar adotar tcnicas mais modernas de disposio final do lixo capazes de no mais agredir o meio ambiente. E como isso tem um custo para o qual o municpio no dispe de recursos, buscou-se ento a alternativa de se transformar o que era lixo em um produto vendvel, capaz de minimizar os custos. Esta atividade, que decorre da prestao do servio pblico, tem natureza estritamente mercantil e, desse modo, s pode ser exercida atravs de uma empresa pblica. Ou seja, vender produtos, mesmo considerados por alguns como lixo, praticar atos de comrcio intervindo na economia, e isto, para os municpios, s pode acontecer via empresa pblica ou sociedade mista.

ConclusoA atividade de coleta e destino final do lixo pode, portanto ter natureza mercantil. Assim, pelo exposto, entendemos que os municpios devem constituir uma empresa pblica capaz de gerir, em nome de todos os partcipes, esse servio pblico. De maneira coloquial poder-se-ia at dizer que o consrcio intermunicipal assumir a personalidade jurdica de uma empresa pblica intermunicipal, ou ainda que os municpios, com interesses e caractersticas prprias, instituiro uma empresa pblica intermunicipal. Muito embora seja a empresa pblica intermunicipal a entidade que melhor se adapte gesto dos resduos slidos, associada comercializao do lixo reciclado, alguns municpios j se consorciaram e constituram sociedades civis e outros j participam de consrcios intermunicipais de desenvolvimento regional. Para estes, sugerimos uma adaptao dos estatutos, alterando-os s novas atribuies, como por exemplo, finalidade de comercializao do lixo reciclado (Consrcio Intermunicipal das Bacias dos Rios Piracicaba e Capivari, 1998).

O Processo de Implantao O processo de implantao do projeto se inicia com o levantamento das demandas dos municpios por recursos financeiros e assistncia tcnica. feito ento um estudo preliminar visando agrupar municpios que, por suas caractersticas (proximidade geogrfica um fator fundamental), poderiam viabilizar a implantao de um consrcio/empresa intermunicipal, e um levantamento dos dados disponveis desses municpios como demografia, quantidade de resduos gerados, situao atual dos servios de saneamento bsico, atividades econmicas, organizao municipal, etc. Outros aspectos no considerados, podero, no decorrer do processo, apontar para um agrupamento mais adequado.

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Para cada grupo se identifica um municpio lder que ir entrar em contato com os municpios vizinhos para saber quais dentre eles esto interessados em buscar solues compartilhadas para os seus problemas. A entidade propositora promove uma reunio com representantes dos municpios interessados para uma exposio do projeto e levantamento preliminar das possibilidades de cada participante, bem como anuncia das partes; na ocasio os dados levantados so disponibilizados para os participantes para serem complementados/ retificados/ atualizados pelos municpios. Essa base de dados consolidada ir se constituir em importante instrumento para subsidiar os trabalhos subseqentes. Iniciam-se ento as tratativas em nvel tcnico e jurdico-administrativo, buscandose a soluo mais adequada de local; tcnicas de coleta, transbordo, separao e triagem, reciclagem, compostagem e destino final, enfatizando-se sempre as melhores prticas e a integrao regional. importante ressaltar que essa fase s ser considerada encerrada quando todos os direitos e responsabilidades estiverem claramente estabelecidos e consensados e constarem de um documento conjunto que defina, inclusive, a modalidade jurdica para a gesto compartilhada dos resduos slidos, e que se constituir em minuta do Protocolo de Intenes. feita uma reunio especfica para discusso e aprovao da Minuta do Protocolo de Intenes. Essa fase termina com a consolidao do Protocolo de Intenes que ser registrado em Cartrio. O Protocolo de Intenes um recurso administrativo indispensvel, nele estaro transcritos os objetivos, critrios tcnicos, jurdicos e as obrigaes das partes, assumindo um carter de compromisso entre os envolvidos, transferindo para o consrcio/empresa intermunicipal a obrigao do gerenciamento dos resduos slidos. Consolidam-se essas aes com um Contrato de Gesto Intermunicipal de Resduos Slidos que reflita o consenso final alcanado.

Atores do ProjetoOs municpios so os principais atores do Projeto. So eles que iro decidir quais os servios que sero compartilhados e estabelecero as normas que disciplinaro esses servios. Para isso participaro ativamente de um processo de negociao, na busca de consenso, junto com administradores e tcnicos do setor de cada um dos municpios envolvidos. Indispensvel a presena da Agencia Ambiental do Estado e de rgo de proteo de recursos naturais, bem como de organismos pblicos ou privados com experincias semelhantes. A entidade ou municpio lder tem basicamente dois papeis no Projeto: o primeiro atuar como ente facilitador no processo de negociao; o segundo prestar apoio na elaborao dos instrumentos para a criao do consrcio intermunicipal e para a adequao da legislao municipal especfica, a fim de viabilizar legalmente sua implantao. A Sociedade Civil outro ator. Se bem informada e conscientizada ela poder se transformar em defensora da gesto compartilhada e se constituir na garantia de sucesso e continuidade do empreendimento. Caso contrrio, ela poder vir a ser um fator inibidor do processo. 24

A negociaoA negociao uma fase decisiva no processo. nessa fase que so definidos os servios a serem compartilhados, a localizao dos equipamentos e estabelecidos os direitos e as responsabilidades de cada agente envolvido. a tambm que diferentes interesses, explicitados ou no, se confrontam, podendo criar situaes de impasse que inviabilizam o processo. At mesmo o louvvel empenho dos prefeitos em defender os interesses dos seus respectivos municpios, pode, se mal administrado, criar situaes de impasse. Um ator mais distanciado de eventuais conflitos locais pode ento atuar como agente facilitador contribuindo para o amadurecimento do processo, facilitando o consenso e viabilizando uma proposta solidria entre os municpios. A negociao um instrumento eficaz na resoluo de conflitos, especialmente nas questes ambientais. Experincias adquiridas da participao no convnio estabelecido entre o governo do Canad e o Estado de So Paulo levaram a resultados eficazes, em menor espao de tempo, na resoluo de conflitos (experincias da CETESB na regio de Piracicaba com o setor cermico de piso esmaltado). Busca-se o envolvimento de todos os atores no processo, de forma progressiva, consistente e com base em consenso no encaminhamento das propostas. So pontos fortes a transparncia e o envolvimento de todos os atores, de forma a propiciar um clima de confiana mtua.

Fatores de inibio do processoO principal fator inibidor do processo a falta de tradio de aes compartilhadas na rea de Resduos Slidos. Pessoas e instituies tm dificuldade de romper com prticas estabelecidas mesmo aps a conscientizao de que elas no esto correspondendo s demandas atuais. Isso atua no processo de negociao dificultando o consenso. Outro fator a presso popular. Pode acontecer que os muncipes se posicionem contra um prefeito que concorde, por exemplo, que o seu municpio seja o local da disposio final. Portanto fundamental uma campanha de esclarecimento junto populao. Ela precisa estar segura das medidas de segurana sade pblica e dos benefcios que a ao compartilhada ir trazer ao seu municpio e a pratica de aes regionais em todas as dimenses da sociedade.

Instrumentos legais para a formao e implementao do consrcioVisando subsidiar e agilizar o processo, recomendamos disponibilizar aos municpios minutas dos principais instrumentos legais necessrios criao/ implementao do consrcio, que so: Protocolo de Intenes e Termo de Convnio; Lei Municipal (autorizao legislativa); Estatuto Social; Edital de Licitao; Termos de Referncia para: Contratao de consultoria; Concesso de servios; Esses documentos devero ser adequados situao real de cada consrcio. 25

Consideraes finaisA proposta visa otimizar recursos tcnicos, financeiros e ambientais, propiciando coletividade garantia de sade e bem estar, tanto para a presente como para as futuras geraes. Solidificando teses de suporte ambiental e social de vida minimamente adequada, na sua forma mais ampla. Este trabalho abrange os diversos tipos de resduos gerados nos municpios, com nfase aos resduos de origem domiciliar e de servios de sade. Sendo possvel estender tais aes para os resduos de construo civil, tratados nas Resolues CONAMA N. 307/2002 e SMA N. 41/2002, bem como, para os resduos industriais. A experincia que mais se aproximou de xito no tratamento de resduos de servio de sade, de forma regional, foi o desenvolvido na regio do baixo Rio Piracicaba, Estado de So Paulo, entre os anos de 1997 e 2000, contando a CETESB, com no Consrcio Intermunicipal das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundia - PCJ, com sede em Americana, e como Municpios lideres os Americana, Limeira, Piracicaba, Santa Brbara DOeste e Rio Claro, de regio que abrangeria 30 municpios, com aproximadamente 4000 kg por dia de tais resduos, com reduzido custo de transporte, tratamento e disposio final. Abrangendo toda matriz que envolve os resduos de servios de sade, desde a gerao disposio final, incluindo treinamentos dos geradores. O produto deste trabalho se encontra em relatrio do Consrcio Intermunicipal das Bacias dos rios Piracicaba e Capivari e do Comit das Bacias dos rios Piracicaba, Capivari e Jundia (1998), e em trabalho de Hornink e Campos (2000). Experincia com plano regional de resduos industriais tambm ocorreu na regio da bacia do Rio Piracicaba e teve incio nos meados do ano de 1995, no mesmo Conscio acima citado (Campos, 2004). Para o desenvolvimento de experincias de Gesto Compartilhada Recomendamos, a aplicao da metodologia de - Negociao de Conflitos Entre Setores Sociais -, utilizada nas experincias da CETESB quando do desenvolvimento do Projeto no convnio Brasil Canad. Recomendamos ainda, a aplicao de metodologias de Planejamento Estratgico, com uso de cenrios provveis para tempo mnimo de 10 anos, considerando os fatores e peculiaridades de cada regio. Este trabalho objetivou ampliar as formas de tratar os assuntos que atingem diretamente o meio ambiente e por conseguinte a sociedade, lembrando que na dinmica social a velocidade dos acontecimentos se redobraram nas ltimas dcadas, exigindo do poder pblico requalificao administrativa e uso de sistemas de gesto, tornando eficaz os recursos disponveis. Estamos em um pas com necessidades crescentes, tais como: gerao e renda s classes sociais mais carentes, e sair da condio de refm dos problemas sociais, o que no deve ser justificativa para o desenvolvimento, na verdade crescimento econmico, de forma desordenada, sob pena de recair em futuro prximo e sobre a mesma sociedade problemas de maior impacto que os atuais. (...o que ocorrer com a terra recair sobre os filhos da terra ... chefe Seatle 1854)

BibliografiaCAMPOS, J. de O. Um paradigma para o sistema de tratamento coletivo de resduos industriais nas bacias dos rios Piracicaba, Capivari e Jundia (SP). Revista Geotecnia, Sociedade Portuguesa de Geotecnia, Lisboa, Portugal, n 100, pg. 24-56, maro 2004.

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CONSRCIO INTERMUNICIPAL DAS BACIAS DOS RIOS PIRACICABA E CAPIVARI. Sumrio executivo sobre o gerenciamento integrado do lixo dos servios de sade e hospitalar nos Municpios de Piracicaba, Rio Claro, Limeira, Santa Brbara dOeste e Americana, Estado de So Paulo, 1998. FUNDAO PREFEITO FARIA LIMA CEPAM: CENTRO DE ESTUDOS E PESQUISAS DE ADMINISTRAO MUNICIPAL. Consrcio Intermunicipal para o tratamento de resduos. Srie Manuais, 2a edio, vol. 3, 39 pg. 1997. HORNINK, S., CAMPOS, J. de O. A Regional Proposal for the Medical Waste Management in Brazil. 5th World Congress and Trade Show, Toronto, Canada, 2000.

ApndiceGlossrio de termos tcnicos Acondicionamento adequado do lixoPara o acondicionamento adequado deve-se ter embalagens que apresentem bom desempenho para que atendam a requisitos de acondicionamento local e esttico do lixo.

Aterro sanitrioProcesso utilizado para a disposio de resduos slidos no solo, particularmente lixo municipal que, fundamentado em critrios de engenharia e normas operacionais especficas, permite um confinamento seguro em termos de controle de poluio ambiental e proteo sade pblica.

Coleta seletivaprocesso diferenciado de coleta de resduos, que tem por objetivo recolher os resduos segregados na origem. Essa modalidade de coleta est ligada Reciclagem.

CompostagemNome dado ao processo biolgico de decomposio da matria orgnica contida em restos de origem animal ou vegetal. Esse processo tem como resultado final um produto o composto orgnico que pode ser aplicado ao solo para recuperar ou melhorar suas caractersticas, sem ocasionar riscos ao meio ambiente.

Disposio final para onde aps a coleta, triagem e tratamento os resduos considerados inservveis sero destinados, para completarem o tratamento e/ou incorporao ao solo, quando se tratarem de resduos de coleta municipal, por intermdio da tcnica do aterro sanitrio, para aguardar sua inertizao natural.

Efluentes lquidosO lquido gerado pela decomposio do lixo o chorume e seu escoamento deve ser controlado e encaminhado para tratamento e disposio adequada.

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EntulhoConjunto de fragmentos ou restos de tijolo, concreto, argamassa, ao, madeira etc., provenientes do desperdcio na construo, reforma e/ou demolio de estruturas, como prdios, residncias e pontes.

Gerenciamento consorciado de resduos municipaisConjunto articulado de aes normativas, operacionais, financeiras e de planejamento que um conjunto de administradores municipais desenvolvem (com base em critrios sanitrios, ambientais e econmicos), para coletarem, segregarem, transportarem, tratarem e disporem os resduos slidos municipais, gerado em suas cidades.

LixoForma inadequada de disposio final de resduos slidos municipais, que se caracteriza pela simples descarga sobre o solo, sem medidas de proteo ao meio ambiente ou sade pblica.

ReciclagemResultado de uma srie de atividades, pelos quais materiais que so considerados inservveis so desviados, coletados, separados e processados para serem usados como matria prima na manufatura de novos produtos.

Resduos municipais ou LixoSo os restos das atividades humanas, principalmente domiciliar, considerados pelos geradores, como inteis, indesejveis e descartveis.

Tratamento trmicoOs resduos slidos municipais e os resduos de servios de sade podem ser tratados termicamente, isto , serem submetidos a altas temperaturas, com o objetivo de eliminarem os patgenos e reduzirem o volume, antes de sua disposio final em aterros. Esse tipo de tratamento de resduos, deve estar associado implantao prvia de polticas de reduo de gerao e reciclagem de resduos.

Usinas de triagemEstruturas fsicas usadas para o processamento da separao ou catao dos materiais reciclveis do lixo, provenientes da coleta e transporte usuais.

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4. Uma abordagem ao problema da gesto ambientalmente correta para resduos industriais psconsumo na cidade de Rio Claro - SPDenise Antunes da SILVEIRA 1 Jayme de Oliveira CAMPOS 2

IntroduoA quantidade de resduos slidos gerados nas ltimas trs dcadas tem aumentado substancialmente, fato que desencadeia srios danos para a populao e para o meio ambiente. O aprimoramento das tecnologias aliado ao aumento do consumo de produtos industrializados pode ser considerado um dos principais fatores que estimulou a populao a produzir mais lixo. A correta destinao destes resduos, que podem ser de naturezas diversificadas (como domiciliares, de servios de sade, industriais, comerciais, etc.) um dos grandes desafios a ser solucionado. Prado Filho (2002a) afirma que no Brasil o setor de limpeza urbana vive uma complicada situao que exige mudanas na mentalidade dos servios pblicos, da populao e da iniciativa privada, alm de mudana de cultura e na nfase de gesto dos resduos. Atualmente, a prtica mais utilizada para a deposio dos resduos domiciliares o aterro sanitrio. Tal forma de destinao no pode ser considerada a mais correta visto que este tipo de resduo bastante heterogneo, e o aterro sanitrio, dependendo dos detalhes do seu projeto e da construo, pode ser considerado um equipamento impactante. A melhor forma de amenizar este problema a separao, ainda nas residncias, dos diferentes materiais que podem compor o resduo domiciliar (papel, plstico, resduos orgnicos, ao, alumnio, resduos perigosos, etc.). Um aspecto que deve ser salientado a presena de resduos industriais ps-consumo encontrados no lixo domiciliar, considerados perigosos, em particular, as pilhas, baterias e lmpadas fluorescentes. Outros resduos tambm considerados de grande problema ambiental so os pneus inservveis. Trata-se de uma tarefa difcil e complexa, pois h falta de legislaes especficas, e quando estas existem, falta a fiscalizao; o desconhecimento por parte da populao das conseqncias da m destinao destes produtos (os efeitos no so imediatos, e sim em longo prazo, sendo que alguns so dificilmente detectveis) mostra que o Brasil precisa investir mais recursos, no exclusivamente financeiros, mas tecnolgicos e educativos nesta rea, que demanda assuntos to discutidos atualmente. Um dos aspectos importantes para solucionar o problema dos resduos slidos a minimizao destes, incluindo a reduo, a reutilizao e a reciclagem. Os estudos1

Gegrafa, Mestre no Programa de Ps-Graduao em Geocincias, rea de Concentrao em Geocincias e Meio Ambiente, Instituto de Geocincias e Cincias Exatas, UNESP-Campus de Rio Claro. 2 Professor Livre Docente, Voluntrio no LPM Laboratrio de Planejamento Municipal, DEPLAN Departamento de Planejamento Territorial e Geoprocessamento, IGCE Instituto de Geocincias Exatas, UNESP Campus de Rio Claro.

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relacionados destinao e gesto dos resduos slidos tambm so fundamentais para o planejamento urbano e para a sade humana e ambiental.

O problema da contaminao ambientalSegundo o manual intitulado reas Contaminadas: relao de reas contaminadas editado pela CETESB (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental, 2003) so consideradas reas contaminadas os locais ou terrenos onde h comprovadamente poluio ou contaminao causadas por quaisquer substncias ou resduos que neles tenham sido depositados, acumulados, armazenados, enterrados ou infiltrados de forma planejada, acidental ou at mesmo natural. Os poluentes podem ser transportados por meio de diferentes vias, como o ar, o prprio solo, as guas subterrneas e superficiais. Dentre os elementos mais comuns na contaminao do subsolo esto os metais pesados (chumbo, mercrio e cromo), os organoclorados (pentaclorofenol e dioxinas) e os compostos orgnicos (benzeno, tolueno e xileno).Tais elementos podem ser facilmente encontrados em fontes domsticas (tanques spticos), aterros sanitrios e industriais, lixes, resduos de pneus, leos e graxas de veculos automotores, etc. Os problemas da contaminao no so gerados apenas pelas indstrias, tendo em vista que algumas situaes domsticas tambm podem causar danos sade, como o mercrio contido nas baterias e termmetros (txico para os rins e responsvel por causar irritao na vista e na pele, entre outros danos). Um problema grave, que contribui para o aumento das reas contaminadas, a destinao final inadequada dos resduos slidos domiciliares. Assim que o material (lixo) recolhido das casas, h trs possibilidades para o depsito: o lixo, o aterro controlado ou o aterro sanitrio. Cassano (2002) revela que o quadro brasileiro sobre o lixo j foi pior do que o atual: de acordo com dados do IBGE, no Estado de So Paulo, em 1991, 76% dos resduos urbanos eram depositados em lixes, 13% eram levados a aterros controlados e 10% a aterros sanitrios. Em 1999, 23% ainda eram depositados em lixes, 18% eram depositados em aterros controlados e 59% dos materiais eram levados a aterros sanitrios. No caso dos resduos slidos domiciliares a situao pode tornar-se pior quando o lixo coletado no passa por nenhum tipo de seleo prvia dos materiais. Dessa forma o aterro sanitrio receber uma grande mistura de materiais reciclveis (papel, vidro, plstico), compostos orgnicos (restos de alimentos, cascas de frutas e vegetais), produtos que contm metais pesados, considerados resduos perigosos (lmpadas fluorescentes, pilhas e baterias com vida til esgotadas) dentre outras dezenas de materiais encontrados nas residncias.

Pilhas, baterias e lmpadas fluorescentesO crescente acmulo de substncias txicas perigosas causadas por emisses como SO2 , CO, NO3 , pesticidas, metais pesados, etc., um dos problemas que vem causando agresses ao meio ambiente e ao homem. Dentre as substncias txicas normalmente lanadas ao meio ambiente, os metais pesados tm grande importncia, principalmente devido ao seu poder cumulativo em organismos vivos, representando srios riscos sade. Sua ocorrncia no meio ambiente provm de fontes naturais (erupes vulcnicas e depsitos naturais) ou artificiais

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(resultantes de atividades humanas como os efluentes industriais, as atividades da minerao e o descarte inadequado de pilhas, baterias e lmpadas fluorescentes). A industrializao e o aumento dos produtos consumidos pelo homem (fontes artificiais) podem ser os principais contribuintes que esto acarretando um aumento da ocorrncia de metais pesados no meio ambiente. Ao ser introduzido no ar ou na gua, o metal pesado disperso e diludo espacialmente, redistribudo e finalmente acumulado em compartimentos especficos do ambiente. Embora o processo de transporte seja semelhante para um grande nmero de metais pesados, a quantificao destes processos varia com a propriedade de cada metal. A contaminao do solo por metais pesados atualmente um tema bastante discutido, devido presena desses elementos em diversos materiais adicionados ao solo e gua. O problema agravado quando o solo usado para fins agrcolas ou h o consumo de peixes presentes em guas contaminadas, pois os poluentes podem ser absorvidos pelas plantas e entrar na cadeia alimentar. No Brasil, os mtodos de anlise de solo para metais potencialmente txicos (chumbo, cdmio, cromo e nquel) ainda no so estudados em profundidade. As pilhas e baterias so dispositivos que fornecem eletricidade a partir de reaes qumicas. Geralmente esses materiais contm metais que cumprem a funo de nodo (plo negativo) e ctodo (plo positivo). A diferena entre pilhas e baterias que, ao contrrio das pilhas, as baterias so produzidas para serem recarregadas. De todos os metais pesados utilizados na fabricao das baterias primrias e secundrias, o chumbo, o cdmio e o mercrio so os que causam maior preocupao. O mercrio utilizado como inibidor dos mecanismos de corroso que afetam a reao qumica pela gerao de gs, e tambm protege as baterias da autodescarga, aumentando, portanto, seu tempo de vida. Ressalta-se que as baterias alcalinas contm quantidades significativas de mercrio amalgamado com zinco em forma de p. As pilhas, misturadas ao resto do lixo (que ser depositado no aterro sanitrio) ficam expostas ao sol e chuva, oxidam-se. Com a oxidao, rompem-se e deixam vazar os metais que se misturam ao chorume. Com as chuvas, parte dos metais penetram no solo e atingem as guas subterrneas; outra parte atinge os crregos e riachos. Esta gua, misturada aos metais como o zinco, chumbo, mangans e mercrio, entre outros, acaba atingindo a cadeia alimentar humana atravs da irrigao da agricultura ou da ingesto direta. J as lmpadas fluorescentes so compostas tipicamente por um tubo selado de vidro preenchido com gs argnio baixa presso, e vapor de mercrio, tambm baixa presso parcial. O interior do tubo revestido com uma poeira fosforada composta por vrios elementos como alumnio, cdmio, chumbo, cromo, mercrio e zinco, dentre outros. Os pases desenvolvidos incluem as lmpadas fluorescentes usadas na lista de resduos nocivos ao meio-ambiente, pois essas lmpadas contm substncias qumicas que afetam o ser humano, como o mercrio metlico, um metal pesado que uma vez ingerido ou inalado, causa efeitos amplamente negativos ao sistema nervoso. Ao romper-se, uma lmpada fluorescente emite vapores de mercrio que so absorvidos pelos organismos vivos, contaminando-os; se forem lanadas em aterros controlados ou sanitrios as lmpadas contaminam o solo e, posteriormente, os cursos dgua, chegando cadeia alimentar. Ainda que o impacto sobre o meio ambiente causado por uma nica lmpada seja desprezvel, a somatria das lmpadas descartadas anualmente ter efeito sensvel sobre os locais onde so dispostas. A regulamentao dos teores admissveis de mercrio nos resduos slidos est definida na norma brasileira NBR 10.004 da ABNT.

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Enquanto intacta a lmpada no oferece risco. Entretanto, ao ser rompida, liberar vapor de mercrio que ser aspirado por quem a manuseia. A contaminao do organismo se d principalmente atravs dos pulmes. Quando se rompe uma lmpada fluorescente o mercrio existente em seu interior (da ordem de 20mg) se libera sob a forma de vapor, por um perodo de tempo varivel em funo da temperatura e que pode se estender por vrias semanas. O custo para a reciclagem e a conseqente descontaminao de lmpadas fluorescentes depende do volume, distncia e servios especficos escolhidos pelo cliente. Nos EUA, o custo para pequenos geradores de lmpadas usadas varia de US$ 1.08 a US$2.00 por lmpada. Para grandes geradores, o preo final da ordem de US$0.36 por lmpada, mais custos com frete e acondicionamento para transporte. No Brasil, uma tradicional empresa do ramo cobra pelos servios de descontaminao valores de R$0,60 a R$0,70 por lmpada. A esse preo, deve-se acrescentar os custos de frete (transporte), embalagem e seguro contra acidentes. Os subprodutos resultantes do processo de reciclagem, tais como vidro, alumnio, pinos de lato e mercrio, possuem baixo valor agregado: R$20,00/T para o vidro; R$900,00/T para o alumnio; R$900,00/T para o lato e R$0,04 a R$ 1,2/g para o mercrio, dependendo do seu grau de pureza.3 CAMPOS (2001) esclarece que os objetos industrializados descartados pela populao (como pilhas, baterias e lmpadas fluorescentes) no so na verdade resduos industriais, mas sim materiais que, aps usados, so descartados de forma desordenada pela populao, o que exige, por parte do poder municipal providncias para organizar sua disposio, atendendo desta forma legislao ambiental. O CONAMA aprovou e publicou em 30/06/1999, a Resoluo de n. 257 complementada pela de n. 263 de 12/11/1999, determinando que a partir de janeiro de 2001 os fabricantes e importadores de pilhas e baterias de nquel-cdmio e pilhas de xido de mercrio, devero criar uma infra-estrutura que possibilite o retorno e armazenamento em acordo com as normas de proteo ambiental, bem como uma disposio final adequada. A medida ainda fixou o prazo de um ano, a partir da publicao da Resoluo, para que sejam includas, nas matrias publicitrias e embalagens, advertncias sobre os riscos que os produtos oferecem sade humana e ao meio ambiente, e instrues para que aps o uso retornem aos revendedores ou rede de assistncia tcnica autorizada, que as repassaro aos fabricantes ou importadores. No caso das lmpadas fluorescentes a situao mais grave. Mesmo sabendo do perigo que os metais pesados presentes em seu interior oferecem, h ausncia de uma legislao especfica por parte dos rgos competentes.

Pneus inservveis: resduos perigososAlm da contaminao do solo, da gua e do ar por metais pesados, outro grande problema ambiental a enorme quantidade de pneus inservveis que existem no Brasil. No passado, pouca importncia foi dada ao assunto, pois carcaas de pneus eram dispostas em enormes aterros nos pases desenvolvidos; em pases em desenvolvimento e naqueles atrasados, o destino final eram (e continuam sendo) os cursos dgua, os terrenos baldios nas periferias das cidades, ou equivocadamente, as tentativas de conteno de eroses (voorocas). A situao torna-se ainda mais crtica quando h incndios, casuais ou

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Dados do ano de 2000, disponveis no site http:http://www.profcupido.hpg.ig.com.br/lampadas_fluorescentes.htm

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provocados, em reas de descarte de pneus, pois poluio visual e a agresso natureza soma-se uma violenta poluio atmosfrica. Ao considerar as dificuldades para a disposio das carcaas de pneus usados em aterros sanitrios, alm da falta de fiscalizao para a legislao existente, o que tem havido atualmente uma tendncia da populao em abandonar estes resduos slidos em cursos dgua, terrenos baldios e beiras de estradas, atitudes que apenas agravam mais o problema. Prado Filho (2002b) afirma que todo pneu, em algum momento, se transformar em um resduo potencialmente danoso sade pblica e ao meio ambiente, j que quando abandonados em terrenos baldios ou armazenados espera de destinao final tendem a acumular gua no seu interior e representam um criadouro potencial do mosquito Aedes aegypti, cujas larvas proliferam em gua parada. O autor ainda alerta que os dados da ANIP (Associao Nacional da Indstria de Pneumticos) revelam que no Brasil foram produzidos, em 1999, cerca de 40 milhes de pneus e, destes, 25 milhes destinaram-se ao mercado interno. Em relao ao produto importado, o levantamento feito para o mesmo ano, indicou a comercializao de quase 8 milhes de unidades. CAMPOS (2001 apud CAMPOS, 2002, p.73) calcula que existem cerca de 500.000 pneus usados disponveis no Brasil para utilizao como combustvel, que podem proporcionar uma economia de 12.000 t de leo. Em muitos pases desenvolvidos adotada a incinerao dos pneus com valorizao energtica como combustvel alternativo. Prado Filho (2002b) esclarece que para efeitos de disposio final, os pneus so classificados como resduos inertes, no havendo impedimento sua destinao em aterros sanitrios, desde que observadas as tcnicas adequadas de manejo, como a exigncia de retalhamento ou trituramento, fixada na resoluo estadual (para reduzir o volume e a possibilidade dos pneus voltarem superfcie, devido dificuldade de compactao). restrita sua disposio a cu aberto por acarretar problemas de sade e higiene, alm dos riscos de incndio e poluio. Relativamente legislao existente, h a publicao da Resoluo CONAMA n. 258, de 26 de agosto de 1999, determinando a responsabilidade da destinao final aos fabricantes e importadores do produto. De acordo com o novo texto da resoluo, a Secretaria de Comrcio Exterior (Secex) deve informar ao IBAMA bimestralmente a relao das empresas e as quantidades de pneus importados. As empresas devero, ainda, comprovar junto ao IBAMA a destinao final destes pneus. A proibio para a importao de pneus usados continua em vigor e a Resoluo 258/99 estabeleceu que a partir de janeiro de 2002, para quatro pneus novos fabricados no pas e pneus novos importados ou reformados (inclusive os que acompanham os carros importados), as empresas fabricantes e as importadoras devero dar destinao final a um pneu inservvel. A Resoluo CONAMA n 264, de 26 de agosto de 1999 que aborda a questo do co-processamento de pneus, obriga as produtoras e importadoras a destrurem os pneus velhos. Os tipos de empresas mais interessadas no co-processamento so, principalmente, as grandes cimenteiras, sendo que o processo relativamente simples: introduzidos em uma operao de co-processamento na fabricao do cimento, os pneus so utilizados como combustvel do forno e suas cinzas e seus componentes so agregados ao cimento. Neste caso, a vantagem do co-processamento que o pneu substitui o consumo de recursos naturais, como o coque, utilizado nos fornos de cimento. Por outro lado, o pneu totalmente aproveitado, j que o ferro usado no pneu substitui a adio do metal necessria para a fabricao do cimento.

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A problemtica enfocada no Municpio de Rio Claro/SPDiante da problemtica do tema em questo, foi elaborado para o municpio de Rio Claro/SP (Figura 01) um plano de gesto para a eliminao adequada dos produtos enfocados, que atendeu legislao CONAMA (Resoluo n 257, de 30 de junho de 1999 e Resoluo n 263, de 12 de novembro de 1999 para pilhas e baterias e Resoluo n 258, de 26 de agosto de 1999 e Resoluo n 264, de 26 de agosto de 1999 para pneus), alm das determinaes da CETESB. Para atingir tal objetivo, foram analisadas a destinao final que a populao do municpio de Rio Claro fornece aos produtos enfocados e a atuao de cada estabelecimento comercial frente s determinaes das legislaes atuais para tais tipos de produtos; alm da elaborao de fluxogramas que descreveram o caminho percorrido pelos produtos enfocados desde a compra pelo consumidor at sua destinao final.

Figura 01 Localizao do municpio de Rio Claro no Estado de So Paulo

Para analisar o nvel do conhecimento da populao e dos comerciantes do municpio sobre a legislao e os mtodos de reciclagem dos produtos enfocados, optou-se por trabalhar com a aplicao de questionrios por meio de entrevistas. Foi aplicada a amostragem casual simples (probabilstica) no Cdigo de Endereamento Postal (CEP) do municpio a fim de selecionar os endereos para as entrevistas.

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ResultadosRespostas da populao - Questionrio 1 / Pilhas e Baterias1. Aproximadamente, quantos aparelhos eletrnicos que utilizam pilhas e baterias h em sua casa?CEP 13500 13501 13502 13503 13504 13505 13506 De 1 a 4 17 7 6 4 10 3 11 De 5 a 9 29 10 21 11 23 12 21 De 10 a 12 37 14 31 40 53 29 63 Acima de 12 26 12 16 19 48 16 49 TOTAL 109 43 74 74 134 60 144

2. O que feito quando uma pilha/bateria acaba?CEP 13500 13501 13502 13503 13504 13505 13506 Jogo no lixo domstico 103 37 68 61 126 52 138 Encaminho p/ centros de reciclagem 0 1 0 0 2 0 4 Retorno ao revendedor 0 0 3 5 2 4 2 Outro 6 5 3 8 4 4 0 TOTAL 109 43 74 74 134 60 144

3. O que feito com a pilha/ bateria quando h vazamento? J houve contato direto com o material vazado?CEP 13500 13501 13502 13503 13504 13505 13506 Jogo no lixo domstico 109 43 74 74 134 60 144 Sim 101 38 69 51 123 57 132 No 8 5 5 23 11 3 12 TOTAL 109 43 74 74 134 60 144

4. Voc costuma examinar as informaes contidas nas embalagens de pilhas e baterias?CEP 13500 13501 13502 13503 13504 13505 13506 Sim 83 31 19 61 13 47 80 s vezes 12 7 4 2 17 9 21 No 14 5 51 11 4 4 43 TOTAL 109 43 74 74 134 60 144

5. Voc conhece alguma legislao que se refira a pilhas e baterias?CEP 13500 13501 13502 13503 13504 13505 13506 Sim 2 3 3 5 5 7 2 No 107 40 71 69 129 53 142 TOTAL 109 43 74 74 134 60 144

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Respostas da populao - Questionrio 2 / Lmpadas Fluorescentes1.Aproximadamente, quantas lmpadas fluorescentes h em sua casa?CEP 13500 13501 13502 13503 13504 13505 13506 Nenhuma 4 2 6 2 9 0 7 De 1 a 4 33 13 11 13 43 31 79 De 5 a 9 62 26 31 37 69 22 19 De 9 a 12 6 2 17 14 10 7 28 Acima de 12 4 0 9 8 3 0 11 TOTAL 109 43 74 74 134 60 144

2. O que voc faz com a lmpada quando ela acaba?CEP 13500 13501 13502 13503 13504 13505 13506 Ainda esto em uso 21 15 23 33 4 13 31 Jogo no lixo domstico 84 23 45 39 121 45 105 Encaminho Retorno ao TOTAL p/ centros de revendedor reciclagem 0 0 105 0 3 41 0 0 68 0 0 72 0 0 125 0 2 60 0 1 137

3. Voc conhece alguma legislao que se refira a lmpadas fluorescentes?CEP 13500 13501 13502 13503 13504 13505 13506 Sim 2 3 0 0 1 0 0 No 107 40 74 74 133 60 144 TOTAL 109 43 74 74 134 60 144

4. Quando uma lmpada fluorescente quebra, qual o procedimento adotado?CEP 13500 13501 13502 13503 13504 13505 13506 Jogo no lixo domstico 38 22 60 27 101 13 41 Enterro 0 0 0 0 1 0 0 Jogo em terreno baldio 0 0 3 4 0 0 0 Nunca quebrou 71 21 11 43 32 47 103 TOTAL 109 43 74 74 134 60 144

Respostas da populao - Questionrio 3 / Pneus1. Voc costuma manter pneus usados no quintal de sua casa?CEP 13500 13501 13502 13503 13504 13505 13506 Sim 0 0 0 2 0 0 0 s vezes 109 43 74 72 134 60 143 No 0 0 0 0 0 0 1 TOTAL 109 43 74 74 134 60 144

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2. Alguma vez voc j queimou pneus?CEP 13500 13501 13502 13503 13504 13505 13506 Sim, em algum terreno baldio 0 0 0 1 0 0 1 Sim, no quintal da minha casa 0 0 0 1 0 0 0 Sim, em outro local 0 0 0 0 0 0 0 No 109 43 74 72 134 60 143 TOTAL 109 43 74 74 134 60 144

3. Possui veculo? Caso positivo, ao realizar uma troca de pneu, o que fez com o antigo?CEP 13500 13501 13502 13503 13504 13505 13506 No possuo veculo 7 0 13 4 11 3 37 Queimei 0 0 0 0 0 0 0 Deixei no quintal 0 0 0 0 0 0 0 Deixei no local onde troquei 102 43 61 70 123 57 107 TOTAL 109 43 74 74 134 60 144

4. Voc conhece algum reciclagem de pneus?CEP 13500 13501 13502 13503 13504 13505 13506 Sim 3 0 0 2 2 1 4 No 106 43 74 72 132 59 140

processoTOTAL 109 43 74 74 134 60 144

de

5. Conhece alguma legislao que se refira disposio de pneus usados?CEP 13500 13501 13502 13503 13504 13505 13506 Sim 0 1 0 0 2 0 1 No 109 42 74 74 132 60 143 TOTAL 109 43 74 74 134 60 144

Comentrios s respostas fornecidas pelos comerciantesEm relao s pilhas, baterias e lmpadas fluorescentes, todos os estabelecimentos afirmaram devolver para os revendedores os produtos que esgotam o prazo de validade e no so vendidos, no entanto, alguns ressaltaram que esta atitude nem se