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Governo, sociedade e família: juntos por uma cultura de paz Por Romeu Tuma Júnior* Ultimamente, os cidadãos vêm sendo bombardeados por uma enorme quantidade de informações divulgadas pela mídia cuja temática principal é a violência. São acontecimentos absurdos que vão desde o assassinato de crianças a crimes envolvendo pais e filhos. Parece cada vez mais rotineira a vitimização de crianças e adolescentes nessas tragédias. Será coincidência ou conseqüência de um mundo que está perdendo o controle? É fato que a violência sempre esteve presente em nossa História e a agressividade do homem manifesta-se sob as formas mais cruéis e inesperadas. A existência humana é uma história de lutas, armadas ou não. Temos uma cultura de violência herdada de nossos antepassados, pois somos descendentes de indivíduos que aprenderam a caçar, que lutaram por um pedaço de terra e que sobreviveram a guerras tribais e à violência. O tempo passou. A tecnologia chegou. E a violência permaneceu. E não é só pelo pedaço da terra, pelo alimento ou pelas oportunidades que ela acontece. Agressões físicas, verbais, culturais, políticas, contra a mulher, contra o idoso, contra a criança e o adolescente, contra as pessoas com deficiência estão estampadas e presentes na literatura, na arte, nos impressos, nos telejornais, novelas, filmes, jogos e até no esporte. Recentemente, uma modalidade de esporte, o "Muay Thai", boxe tailandês, que já virou "febre" na Ásia e Europa, chegou ao Brasil e vem atraindo a atenção de pais que incentivam seus filhos à prática esportiva porque querem que eles aprendam a defender-se e sejam lutadores desde cedo. Chutes, socos, cotoveladas e joelhadas são movimentos fundamentais da atividade, que é praticada por crianças de apenas três anos!

Governo, sociedade e família: juntos por uma cultura de paz

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Page 1: Governo, sociedade e família: juntos por uma cultura de paz

Governo, sociedade e família: juntos por uma cultura de paz

Por Romeu Tuma Júnior* Ultimamente, os cidadãos vêm sendo bombardeados por uma enorme

quantidade de informações divulgadas pela mídia cuja temática principal é a

violência. São acontecimentos absurdos que vão desde o assassinato de

crianças a crimes envolvendo pais e filhos.

Parece cada vez mais rotineira a vitimização de crianças e adolescentes

nessas tragédias. Será coincidência ou conseqüência de um mundo que está

perdendo o controle? É fato que a violência sempre esteve presente em nossa

História e a agressividade do homem manifesta-se sob as formas mais cruéis e

inesperadas. A existência humana é uma história de lutas, armadas ou não.

Temos uma cultura de violência herdada de nossos antepassados, pois somos

descendentes de indivíduos que aprenderam a caçar, que lutaram por um

pedaço de terra e que sobreviveram a guerras tribais e à violência.

O tempo passou. A tecnologia chegou. E a violência permaneceu. E não é só

pelo pedaço da terra, pelo alimento ou pelas oportunidades que ela acontece.

Agressões físicas, verbais, culturais, políticas, contra a mulher, contra o idoso,

contra a criança e o adolescente, contra as pessoas com deficiência estão

estampadas e presentes na literatura, na arte, nos impressos, nos telejornais,

novelas, filmes, jogos e até no esporte.

Recentemente, uma modalidade de esporte, o "Muay Thai", boxe tailandês,

que já virou "febre" na Ásia e Europa, chegou ao Brasil e vem atraindo a

atenção de pais que incentivam seus filhos à prática esportiva porque querem

que eles aprendam a defender-se e sejam lutadores desde cedo. Chutes,

socos, cotoveladas e joelhadas são movimentos fundamentais da atividade,

que é praticada por crianças de apenas três anos!

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O esporte tem como característica promover a saúde do corpo e da mente.

Mas será que crianças de três anos estão preparadas para compreender que

chutes, socos e cotoveladas devem estar limitados aos ringues? Será que elas

sabem conviver tanto com a derrota como com a vitória? Saberiam discernir o

bem e o mal, o certo e o errado? Além do incentivo, será que os pais

conversam com seus filhos sobre os limites das atividades e sobre o significado

de defesa, de luta, de esforço e de respeito?

O esporte é apenas um exemplo. Existem outros "produtos" a serem

"ofertados" às crianças, principalmente. Estudos já comprovaram que crianças

que imitam o que vêem e sem orientações podem tornar-se violentas num

piscar de olhos. É o caso das influências decorrentes de desenhos animados,

novelas, filmes e jogos eletrônicos, cada vez mais presentes na rotina dos

pequenos. Além de incentivar o uso desses veículos, os pais deveriam criar o

hábito de exercer o controle e a discussão sobre o conteúdo do que é

disponibilizado a seus filhos.

É importante destacar que o Estado faz a sua parte para proteger crianças,

adolescentes e todos os cidadãos em diversas áreas. Uma delas é a

Classificação Indicativa, realizada pela Secretaria Nacional da Justiça, do

Ministério da Justiça, que tem como objetivo prestar uma informação

consistente aos telespectadores sobre conteúdos de obras audiovisuais.

Símbolos e frases informam para que idade uma obra não é recomendada e

essa indicação é feita com base na quantidade e nos níveis de violência,

drogas e sexo, que podem alterar, de alguma forma, o comportamento de

indivíduos que ainda estão em fase de desenvolvimento.

Outra ação do Ministério da Justiça que merece destaque e está diretamente

relacionada à batalha contra a violência é o Programa Nacional de Segurança

Pública com Cidadania (Pronasci), que é uma iniciativa inédita no combate à

criminalidade no país. O projeto tem como meta a articulação de políticas de

segurança pública com ações sociais e no ataque às causas da violência e não

apenas às suas conseqüências. Enfim, tem por foco a prevenção criminal.

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Mas, tão importante quanto o papel do Estado e da sociedade no combate à

violência e no desenvolvimento de uma cultura de paz é o do núcleo familiar.

Conforme disposto no artigo 227 da Constituição Federal, e no artigo 4º do

Estatuto da Criança e do Adolescente, "É dever da família, da comunidade, da

sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a

efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à profissionalização, à

cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e

comunitária". O compromisso é de todos, inclusive das empresas de

telecomunicações, que devem produzir mais programas de cunho educativo,

artístico, cultural e informativo e ter mais cuidado ao divulgar a violência em

sua programação.

A apatia, conseqüência de um mundo cada vez mais individualizado e egoísta,

é ingrediente para o retrocesso à barbárie. Juntos, o Estado, a sociedade, as

emissoras e as famílias devem agir para evitar que crianças e adolescentes,

que têm seus softwares mentais "zerados", absorvam - como esponjas - as

mensagens recebidas e imitem a violência exagerada e banalizada e

transformem-se em adultos que protagonizarão dramas em reprodução à

indiferença e à violência.

* Romeu Tuma Júnior é secretário Nacional de Justiça