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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIROINSTITUTO DE CINCIAS HUMANAS E SOCIAIS

DEPARTAMENTO DE HISTRIA E RELAOES INTERNACIONAIS

BARBARA CARINA LIMA DA SILVA

GRAAS A DEUS:ANLISE DO DISCURSO PROVIDENCIALISTA DE CRISTVO COLOMBO NOS DIRIOS DA

DESCOBERTA DA AMRICA.

SEROPDICA2014

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O trabalho desenvolvido a seguir abrange uma breve anlise do discursoprovidencialista encontrado nos escritos de Cristvo Colombo em seus Dirios da descobertada Amrica. levada em considerao na anlise a produo do primeiro dirio das viagensfeita por Bartolom de Las Casas1, entendendo assim que a estruturao da narrativa sediferencia dentre os escritos da primeira viagem e as demais, assim como a viso

providencialista apresentada nas mesmas.

O interesse pela presena do providencialismo2 surge a partir das narrativas deColombo e Las Casas, nos quais possvel observar a constante necessidade de atribuircrdito aos acontecimentos das viagens a figura do divino. Na leitura da fonte encontram-seexpresses como Graas a Deus e Nosso senhor (esta com a inteno de demonstrar queos acontecimentos ocorreram em permisso do mesmo) e a palavra Deus tambm utilizada diversas vezes, algo que pode ser encarado como algo comum da poca visto que atransio entre Idades Mdia e Moderna estava acontecendo gradualmente e figuras como

Colombo e Las Casas eram homens de Deus, assim como outros cronistas contemporneosaos mesmos que tinham intrnsecos aos seus escritos a meno ao Deus que serviam.

Durante a leitura da fonte surgiu o questionamento por que a narrativa tem essaperspectiva providencialista?. Esta pergunta ser a norteadora deste trabalho onde ireidesenvolver, atravs da anlise da fonte, de historiografia e outras fontes primrias, umdilogo dentre as mesmas para apresentar os motivos nos quais Colombo e Las Casasutilizaram desse tipo de discurso.

Ao final desta anlise espera-se obter um maior entendimento da narrativa dos autores

dos dirios, assim como compreender, a partir da, o contexto histrico religioso no qual esseshomens estavam inseridos e as influncias teolgicas e filosficas expostas em seus textos.

Uma vez observadas estas particularidades no texto, foram buscados norteadores queembasassem a afirmativa de que tais fragmentos de narrativa continham traos

providencialistas. Para o conceito providencialismo" foi encontrada a definio daUniversidad Nacional Autnoma de Mxico, em seu Diccionario de FilosofaLatinoamericana3, o qual direcionar, a princpio, o entendimento do mesmo aplicado aosescritos:

El providencialismo tiene su fundamento en la presentacin del suceder

histrico como un proceso lineal desde un origen a una meta, normalmente

situada en tiempo futuro; idea que procede de la Biblia y que tiene un fuerte

contenido teolgico. De ah fue tomada por el Cristianismo que, a partir de

Agustn de Hipona, la desarroll en formade providencialismo histrico:el hombre, desde una situacin de profunda miseria, a causa del pecado que

1Las Casas: Sevilha 1474Madrid 1566, foi um cronista, telogo, padre dominicano, defensor dos ndios queparticipou da segunda viagem de Colombo a Amrica.2Sistema dos que tudo atribuem ao da providncia divina: Santo Agostinho e Bossuet tomavam Deus comoo ponto de convergncia de toda a atividade social, continuando-se a sua doutrina teolgicanoprovidencialismodos metafsicos. Disponvel em:

Acesso em: 20 de Out. de 20143Verbete: Providencialismo. Disponvel em:Acesso em: 20 de Out. de 2014

http://www.aulete.com.br/providencialismo#ixzz3HSxkXTAEhttp://www.cialc.unam.mx/pensamientoycultura/biblioteca%20virtual/diccionario/providencialismo.htmhttp://www.cialc.unam.mx/pensamientoycultura/biblioteca%20virtual/diccionario/providencialismo.htmhttp://www.aulete.com.br/providencialismo#ixzz3HSxkXTAE

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le da en su naturaleza, avanza, guiado y custodiado por Dios hacia el

Reino de Dios, que ni siquiera es de este mundo, segn la fe cristiana (en

otras palabras, es la historia de la salvacin).

Como dito na citao acima, temos como referencial para este conceito em SantoAgostinho de Hipona4que, em sua obra Cidade de Deus, apresenta um enredo da histriahumana movida pela providncia divina5. O entendimento religioso a partir do

providencialismo se pauta numa linearidade de acontecimentos que comea na queda dahumanidade, no Jardim do den, e finda no Juzo Final6, tendo Deus como protagonista eresponsvel por todos os acontecimentos ocorridos dentre estes dois pontos.

Ao observar o discurso de Santo Agostinho, possvel responder ao questionamentofeito no incio desse texto sobre o discurso utilizado por Colombo e Las Casas. Os escritos deSanto Agostinho vieram muito antes da produo dos dirios aqui analisados, logo, pode-sedizer que a narrativa na fonte produto de uma herana de escritas teolgicas com fortesideias providencialistas.

Para ilustrar esta afirmativa dentro da narrativa de Colombo podemos utilizar de umrelato do mesmo que teria ocorrido como uma espcie de revelao divina na qual oAlmirante ouve uma voz que diz No tenhas medo; confia; todas estas atribulaes estoescritas em pedra de mrmore e no sem motivo.7.

Ou seja, a partir dessa mensagem revelada a Colombo entende-se que as tormentas e asvitrias atribudas s suas viagens tem um direcionamento divino e, em consequncia disso,

deve-se dar graas a Deus. O que nos leva tambm ideia de Agostinho, que:

(...) a Providncia pode ser usada tanto para castigo dos mpios, comoprovao para os justos, sendo que os a diferena reside no estado final deambas as classes de pessoas: os mpios so castigados para a condenao, os

justos, para um futuro glorioso.8

Seguindo o raciocnio de que a provao guia o justo a uma vitria futura, possvelencontrar essa inteno de que no somente a salvao no fim dos tempos seria o futuroglorioso, mas, para Colombo, a conquista das ndias ilustrava bem essa ideia de provisodivina que o faria passar por momentos difceis no mar, porm, tais provaes levariam ao seudesejado destino. Sobre o fragmento que trata mais especificamente sobre uma promessa deterra feita pelo divino a Colombo falaremos mais a seguir.

4Santo Agostinho de Hipona foi bispo e doutor da Igreja (354-430), autor de obras de referncia para Igreja eestudiosos de teologia e patrstica como Confisses, sua biografia e Cidade de Deus. Fonte: SGARBOSSA,Mario. Os Santos e Beatos da Igreja do Ocidente e do Oriente. 3 ed. 2012. p. 732.5SOUZA NETO, Jos de Maria G. de; SOUZA, Juarlyson Jhones Santos de. Santo Agostinho: Enredo histricoe providencialismo. Revista de Teologia e Cincias da Religio da UNICAP. Paraba. V. 1 N.1. p. 81. 2011.6BASCHET, Jerome. A Civilizao Feudal: do ano mil a colonizao da Amrica. So Paulo: Editora Globo.

2006.7 COLOMBO, Cristvo. Dirios da Descoberta da Amrica. Porto Alegre. L&PM. 1991. 236 p. ColeoL&PM Pocket. (Grifo nosso)8SOUZA NETO, Jos de Maria G. de Souza; SOUZA, Juarlyson Jhones Santos de. Op. cit. p.81.

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H nuances muito aparentes nos dirios que caracterizam diferentes formas nas quaisesse providencialismo exposto. Por exemplo, na primeira viagem, onde temos a narrativa deLas Casas, vemos a predominncia da expresso Graas a Deus, onde so dadas graas atmesmo pelos danos sofridos e desventuras durante a navegao. O norteador de f doshomens que navegavam durante esse perodo estava ainda muito ligado ao imaginriomedieval cristo, formado por personalidades como o prprio Santo Agostinho j citadoanteriormente, em que se justificava tudo atravs da vontade de deus.

J nos outros dirios vemos ainda a presena da necessidadede ter essa ligao terrenax divino, mas no na forma da expresso utilizada por Las Casas. Agora Colombo transcreveos acontecimentos creditando a Deus as bonanas e provaes passadas. So nesses escritosque podemos observar a presena da expresso Nosso Senhor, que tem como objetivoilustrar a interveno do divino como fator decisrio e indispensvel. A escolha dos autores

para expressar literariamente esse providencialismo, utilizando-se de Graas a Deus e

Nosso Senhor, fica evidente e possvel, desse ponto, tambm perceber a diferena denarrativa entre um e outro.

Porm, vemos isso de forma muito mais clara durante as descries da quarta viagem doAlmirante (1502-04). Logo nos primeiros pargrafos de sua Carta aos Reis Catlicos temos afrase (...)Nosso Senhor os coloca minha frente quando lhe imploro.9

Nesta citao podemos analisar tambm no somente a ideia de Deus como centro eprovedor dos dias e dos acontecimentos, mas tambm que o mesmo proveria a eles emmomentos de tribulao, mostrando, assim, que ajudaria ao justo quando necessrio.

Para conectarmos as narrativas apresentadas influncia dos telogos e filsofos dareligio possvel fazer uma anlise comparativa de fragmentos encontrados em textos deSanto Agostinho de Hipona em sua obra Cidade de Deus e dos escritos dos Dirios comoapresentado a seguir: Quem lhes assombrou, freou, admiravelmente abrandou as mentesassim truculentas e ferozes foi Ele [Deus], que por boca do profetah longo tempo dissera:(...)10e Quem de ser, Deus, pela boca do profetano dcimo quarto salmo, quem diz:(...).11.

Ento, vemos que, em ambos os discursos, Deus se faz presente para interferir em algo,provendo de sua presena e do acontecimento que ali se julga necessrio acontecer.

Reforando ainda mais a ideia de uma narrativa providencialista em Colombo.O providencialismo aplicado nos mais diversos aspectos dessas narrativas nuticas.

Ainda em anlise do ltimo dirio vemos que o mesmo agradece por um naufrgio evitado,pelas terras conquistas e at mesmo por uma navegao vantajosa como na passagem (...) eali Nosso Senhor me concedeu vento e corrente propcios.12

9COLOMBO, Cristvo. Dirios da Descoberta da Amrica. Porto Alegre. L&PM. 1991. p.195. ColeoL&PM Pocket.10AGOSTINHO, Santo. A Cidade de Deus: contra os pagos. 9. ed. Trad. de Oscar Paes Lemes. Bragana

Paulista: Ed. Universitria So Francisco, 2006.11COLOMBO, Cristvo. Op. Cit.p. 236.. (Grifo nosso)12COLOMBO, Cristvo. Dirios da Descoberta da Amrica. Porto Alegre. L&PM. 1991. Coleo L&PMPocket. p. 196.

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Retomando a revelao em sonho tida por Colombo podemos observar pontos aindamais claros que expem a vontade divina na atuao do Almirante, como em: (...) Que foi eleque fez por Moiss ou por Davi seu sdito? (...) fez teu nome ressoar maravilhosamente pela terratoda. As ndias, que constituem partes to ricas do mundo, deupara que fossem tuas.(...)13

Ou seja, de toda a anlise da fonte encontramos a mxima de Colombo nesse brevetexto, que mostra a conquista das ndias como uma ddiva concedida pelo divino,legitimando ainda mais a ideia de uma histria que corre de acordo com a vontade de Deus etira do tempo e da constituio do mesmo a imagem da deusa da Fortuna, que tinha o destinocomo imprevisvel, alocando no lugar a proviso do deus cristo como a regente de toda avida.

Atravs das anlises desses trechos, do conjunto da obra e do dilogo feito com osautores que abordam essa temtica possvel afirmar que nas narrativas dos Dirios daDescoberta da Amrica existe a presena providencialismo, fruto de uma herana denarrativas teolgicas de autores como Santo Agostinho de Hipona, em vias de agradecer ereconhecer durante os escritos interferncia divina dos acontecimentos terrenos nos perodosde navegao feitos por Colombo.

13COLOMBO, Cristvo. Dirios da Descoberta da Amrica. Porto Alegre. L&PM. 1991. Coleo L&PMPocket. p. 200.

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REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

AGOSTINHO, Santo. A Cidade de Deus: contra os pagos. 9. ed. Trad. Oscar Paes Lemes.

Bragana Paulista: Ed. Universitria So Francisco, 2006.BRAGA, Tefilo. Sistema de Sociologia. p. 92, ed. 1884. Disponvel em:

Acessado em: 20 deOutubro de 2014.

BASCHET, Jerome. A Civilizao Feudal: do ano mil a colonizao da Amrica. So Paulo:Editora Globo. 2006.

COLOMBO, Cristvo. Dirios da Descoberta da Amrica: As quatro viagens e otestamento. Porto Alegre. L&PM. 1991. 236 p. Coleo L&PM Pocket.

GUERRA, Franois-Xavier (org.) Mmoires en Devenir. Amrique latine XVIe-XXe sicle.Trad. Jaime Almeida. Bordeaux: Maison des Pays Ibriques, 1994, p. 9-27.

NETO, Jos de Maria G. de Souza; SOUZA, Juarlyson Jhones Santos de. Santo Agostinho:Enredo histrico e providencialismo. Revista de Teologia e Cincias da Religio daUNICAP. Paraba. v. 1 n.1. 2011.Disponvel em: Acessoem: 20 de Out. de 2014

SGARBOSSA, Mario. Os Santos e Beatos da Igreja do Ocidente e do Oriente . 3 ed. Ed.

Paulinas. 2012. 732 p.

Acesso em: 20 de Out. de 2014

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