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Universidade Federal do Rio de Janeiro Há muito tempo atrás Um estudo sobre haver + nome com valor temporal Maíra Silva de Paiva 2010

HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

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Page 1: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

Universidade Federal do Rio de Janeiro

Há muito tempo atrás

Um estudo sobre haver + nome com valor temporal

Maíra Silva de Paiva

2010

Page 2: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

HÁ MUITO TEMPO ATRÁS

UM ESTUDO SOBRE HAVER + NOME COM VALOR TEMPORAL

Maíra Silva de Paiva

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa

de Pós-Graduação em Letras Vernáculas da

Universidade Federal do Rio de Janeiro como

requisito para a obtenção do Título de Mestre em

Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).

Orientadora: Professora Doutora Marcia dos Santos

Machado Vieira.

Faculdade de Letras - UFRJ 2010

Page 3: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

Há muito tempo atrás – Um estudo sobre haver + nome com valor temporal

Maíra Silva de Paiva Orientadora: Marcia dos Santos Machado Vieira

Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).

Examinada por: _____________________________________________________________________ Presidente, Professora Doutora Marcia dos Santos Machado Vieira – Departamento de Letras Vernáculas da UFRJ ______________________________________________________________________Professora Doutora Eliete Figueira Batista da Silveira – Departamento de Letras Vernáculas da UFRJ _____________________________________________________________________ Professora Doutora Vera Lucia Paredes Pereira da Silva – Departamento de Linguística e Filologia da UFRJ ______________________________________________________________________Professora Doutora Maria Aparecida Lino Pauliukonis – Departamento de Letras Vernáculas da UFRJ _____________________________________________________________________ Professora Doutora Maria Maura Cezario - Departamento de Linguística e Filologia UFRJ

Rio de Janeiro Fevereiro de 2010

Page 4: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

Paiva, Maira Silva de.

Há muito tempo atrás - Um estudo sobre haver + nome com valor

temporal. / Maíra Silva de Paiva Rio de Janeiro: UFRJ/FL, 2010.

xvi, 165f.:il.; 31cm.

Orientadora: Marcia dos Santos Machado Vieira

Dissertação (Mestrado) – UFRJ/ FL/ Programa de Pós-Graduação em

Letras Vernáculas, 2010.

Referências Bibliográficas: f. 147 - 156

1. Funcionalismo 2. Caracterização das expressões temporais formadas

por haver 3. Gramaticalização de haver I. Machado Vieira, Marcia dos

Santos. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras,

Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas. III. Título.

Page 5: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

In absentia:

Dedico este trabalho à minha doce e amada mãe, Dolores, a maior

responsável por essa conquista.

In praesentia:

A

Mirla, minha irmã, por todos os sacrifícios feitos para me manter

estudando, e por ter gerado a Luiza, um lindo presente que trouxe a

alegria de volta a minha vida.

Eduardo, meu amigo e namorado, pela paciência, companheirismo e

cumplicidade.

Idelmar, meu pai, por ter investido e acreditado na minha formação.

Page 6: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

AGRADEÇO,

Primeiramente, a todos da minha família, por estarem a todos os

momentos ao meu lado dando força sempre que preciso e pelos sacrifícios para

que eu pudesse me dedicar ao Mestrado.

À minha orientadora, Marcia dos Santos Machado Vieira, por ter me

apresentado à pesquisa científica, pelos ensinamentos, pela paciência com os

prazos e, em especial, pela confiança por ter me dado, sempre, bastante

liberdade para criar, mudar, repensar e produzir, ao meu tempo, este trabalho.

Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas e

em Linguística, por todos os ensinamentos ao longo de minha trajetória

acadêmica que me impulsionaram e me fizeram crescer acadêmica e

profissionalmente.

Às professoras Eliete Figueira Batista da Silveira, Vera Lucia Paredes

Pereira da Silva, Maria Aparecida Lino Pauliukonis e Maria Maura Cezario por

terem gentilmente aceitado participar da banca examinadora.

Ao meu querido amigo Thiago Giamattey, pelo companheirismo desde

os primeiros passos na iniciação científica até hoje (“pegamos” muito!).

Agradeço muito pelas maravilhosas discussões, sobre todos os textos lidos, por

ter despertado em mim grande interesse em diferentes assuntos, devido a sua

total sede de conhecimento.

À minha amiga Alessandra de Paula, que em pouco tempo se tornou

extremamente importante em minha vida. Minha companheira nas aulas de

mestrado, parceira nos desesperos dos trabalhos produzidos. Agradeço pela

paciência nas minhas crises e nas nossas discussões, muitas vezes calorosas.

A Rodrigo Campos Ribeiro, pela amizade (furona), pelas conversas sérias

e a cumplicidade. Em especial, pelos diversos momentos divertidos junto com a

Alê e o Thiago, pelas nossas “farrinhas”.

Page 7: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

À Joana Mendes de Oliveira, Giselle Esteves, Leila Vasti da Paz, Lílian

Alves Jandir, por terem sido pacientes e atenciosas nos primeiros momentos de

Iniciação Científica, me ensinando e guiando nos primeiros passos e pelos

trabalhos em conjunto. Em especial, à Giselle, pelas ajudinhas, até mesmo via

telefone.

À Ana Paula Klem, à Adriana Rodrigues, à Cristina Marcia Monteiro de

Lima Correa, à Daniely Cassimiro de Oliveira Santos, à Maria de Fátima Vieira

e a Vinícius Maciel de Oliveira, pela companhia nos congressos e pelos

divertidos momentos na F-310.

À minha querida amiga, Nivia, que me atura, há quase 15 anos, com

muita paciência e companheirismo.

À Ana Paula, a Elson, à Mariana Corrêa, à Mariana Monteiro e a Wagner

Santa Cruz, pela amizade. E às amigas Aline Oliveira, Graziele Guerra, Luciane

Sant’ana e Renata de Carvalho, por estarem ao meu lado desde a infância e por

torcerem por mim, mesmo que distante.

Aos meus alunos e ex-alunos, por terem me proporcionado a descoberta

do amor que tenho por minha profissão.

Aos informantes que aceitaram produzir os textos narrativos e participar

dos testes de atitudes. Aos professores que me concederam um pouco de seu

tempo e ‘emprestaram’ seus alunos para que eu pudesse propor o tema das

narrativas e aplicar os testes. Aos colegas de profissão e de pesquisa que me

cederam redações.

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

(CNPq), pelas bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) e de Mestrado, que muito

auxiliam e estimulam o envolvimento nas pesquisas acadêmicas.

A todos aqueles que contribuíram direta ou indiretamente para o

desenvolvimento desta pesquisa.

Page 8: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

E falamos do tempo e do tempo, dos tempos e ainda dos tempos:

“Quanto tempo ele falou?, “Quanto tempo ele levou para fazer

isso?”, “Há quanto tempo que não vejo isso?” e “Essa sílaba tem o

dobro do tempo de uma sílaba breve”. Dizemos essas coisas,

ouvimo-las, os outros compreendem quando as dizemos,

entendêmo-las. São claríssimas, utilizadíssimas e, no entanto, nada

é tão obscuro, nada tem uma interpretação tão fora do domínio

corrente.

(Santo Agostino, Confissões, XXII, 28)

Page 9: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

Parte desta pesquisa foi desenvolvida com

financiamento do CNPq (03/2009 – 02/2010)

Page 10: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

SINOPSE

Análise funcionalista dos usos das expressões

formadas pelo verbo haver + Nome/Sintagma

Nominal com valor temporal nos gêneros narrativa

escolar e notícia jornalística. Investigação sobre a

gramaticalização de haver em tais expressões com

base no comportamento observável em textos e na

percepção de falantes do Português

Page 11: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

RESUMO

A presente dissertação focaliza o comportamento semântico e

morfossintático das expressões formadas pelo verbo haver + Nome/Sintagma

Nominal com valor temporal, a partir de uma amostra de dados do Português

Brasileiro dos gêneros narrativa escolar e notícia jornalística.

A pesquisa lida com as características funcionais das expressões

temporais, o estatuto do verbo haver na função de elemento integrante de tais

expressões e seu, possível, estágio de gramaticalização. Descreve o

comportamento desse verbo, considerando o processo de especialização

semântica e morfossintática, as motivações e as restrições desse processo.

A análise pauta-se em pressupostos da Teoria Funcionalista, da qual se

adotaram os conceitos de transitividade, planos discursivos (Hooper &

Thompson, 1980), status informacional (Chafe, 1984) e gramaticalização (Heine,

2003; Hopper, 1991 e Bybee, 2003).

Tratam-se separadamente os dois gêneros textuais, respeitando-se os

contextos discursivos. Ao exame de dados do uso, somam-se observações

resultantes da pesquisa em obras didático-pedagógicas e da pesquisa por meio

de testes de atitudes aplicados a alunos de diferentes níveis de escolaridade

(graduação, ensino fundamental e médio) e delineados com inspiração em

metodologia laboviana de testes de atitude.

Em linhas gerais, constata-se que há diferenças entre os dois gêneros

textuais nos usos das expressões temporais em estudo. Destacam-se, contudo,

características comuns: a estrutura haver + numeral/pronome indefinido +

substantivo com valor temporal, o ponto de ancoragem temporal no momento de

enunciação e a predominância de ocorrências em plano discursivo de fundo.

Sobre o verbo haver compondo a expressão, assume-se que esse item está

gramaticalizado, é um elemento instrumental formador de expressão adverbial.

Palavras chave: Funcionalismo, Gramaticalização, Expressão temporal, Haver

Page 12: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

ABSTRACT

This dissertation focuses on the semantic and morphosyntactic behavior

of expressions formed by the verb haver + Noun/Noun Phrase with temporal

value, from an sample of Brazilian Portuguese data of school essays and

journalistic news.

The research deals with the functional characteristics of temporal

expressions, the status of verb haver (there is) on that kind of expressions and its

possible stage of grammaticalization. It describes the behavior of this verb,

taking into account the process of semantic and morphosyntactic specialization,

its motivations and restrictions.

The analysis is guided by some Functionalist theory's presuppositions,

such as concepts of transitivity, discourse level (Hopper & Thompson, 1980),

informational status (Chafe, 1984), and grammaticalization (Heine, 2003;

Hopper, 1991 e Bybee, 2003).

The two textual genres previously mentioned have been treated

separately, taking into account their discursive contexts. Besides the data

analysis, it has done an observation of didatic-pedagogical works and material

obtained from subjective evaluation tests, which were based on sociolinguistics

methodology of attitude tests, applied to students of different levels of

education.

Overall it has seen that there are differences between the two textual

genres in regard to the use of temporal expressions in exam. Nevertheless they

share some characteristics: structure haver + numeral/indefinite pronoun +

noun with a temporal value; temporal anchorage point located on the moment

of enunciation; and predominance of occurrences on discursive background. It

is also assumed the verb haver composing the past time expression is

grammaticalizated, it is an instrumental part of the adverbial expression.

Keywords: Funcionalism, grammaticalization, verb haver (there is)

Page 13: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

SUMÁRIO

ÍNDICE DE QUADROS, FIGURAS E TABELAS.............................................. 15

INTRODUÇÃO....................................................................................................... 18

1. Revisão bibliográfica sobre haver e expressões de tempo passado............. 24

1.1. Origem e primeiros usos de haver................................................................. 24

1.2. Descrições sobre haver em dicionários de Língua Portuguesa.............. 27

1.3. Descrições sobre haver e expressões de temporais/advérbios em

gramáticas da Língua Portuguesa.......................................................................

31

1.4. Descrições sobre expressões de tempo decorrido em Gramáticas

descritivas e textos acadêmicos...........................................................................

36

2. Pressupostos teóricos......................................................................................... 42

2.1. Teoria Funcionalista........................................................................................ 42

2.1.1. Transitividade e planos discursivos.......................................................... 44

2.1.2. Fluxo de informação.................................................................................... 50

2.1.3. Processo de Gramaticalização.................................................................... 54

2.2. Gêneros e tipologias textuais ........................................................................ 59

2.2.1. Notícia jornalística........................................................................................ 64

2.2.2. Redação/narrativa escolar.......................................................................... 68

3. Metodologia........................................................................................................ 71

3.1. Dados do comportamento observável....................................................... 71

3.1.1. Constituição do corpus............................................................................... 71

Page 14: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

3.1.2. Procedimentos de análise dos dados do comportamento observável.. 74

3.2. Testes de atitude.............................................................................................. 76

3.2.1. As principais orientações teórico-metodológicas.................................... 77

3.2.2. Os testes analisados...................................................................................... 78

3.2.3. Procedimentos de análise dos testes de atitude................................... 80

4. Expressões temporais com o verbo haver...................................................... 81

4.1. Caracterização das expressões...................................................................... 81

4.1.1. Análise estatística sobre as expressões nas narrativas escolares........... 90

4.1.2. Análise estatística sobre as expressões nas notícias jornalísticas.......... 99

4.1.3. Comparação entre observações feitas nas redações e nas notícias....... 107

4.2. As expressões temporais nos planos discursivos figura e fundo.............. 110

4.3. As expressões temporais no fluxo informação........................................... 117

4.4. O comportamento semi-gramatical de haver nas expressões temporais. 122

5. Considerações finais.......................................................................................... 143

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................... 147

ANEXOS.................................................................................................................. 157

Page 15: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

ÍNDICE DE QUADROS, FIGURAS, GRÁFICOS E TABELAS

QUADROS

Quadro 1 – Usos pessoais do verbo haver............................................................. 29

Quadro 2 – Usos impessoais do verbo haver......................................................... 30

Quadro 3 – Usos pronominais do verbo haver...................................................... 30

Quadro 4 – Componentes considerados em relação à transitividade por

Hopper e Thompson (1980).....................................................................................

44

Quadro 5 – Fatores considerados na individualização do Objeto por

Hopper e Thompson (1980).....................................................................................

45

Quadro 6 – Caracterização de gêneros e tipos textuais segundo Marcuschi

(2002)...........................................................................................................................

59

Quadro 7 – Quadro adaptado das características da tipologia textual

narrativa.....................................................................................................................

60

Quadro 8 – Distribuição dos dados: textos consultados e textos utilizados.... 71

Quadro 1 – Distribuição dos testes pelos níveis de escolaridade...................... 77

Quadro 2 – Posições dos adjuntos adverbiais segundo Martelotta (1994)..... 85

Quadro 11 – Adaptação das cadeias de gramaticalização propostas por

Travaglia (2003).........................................................................................................

133

FIGURAS

Figura 1 - Organograma adaptado da constituição do sistema temporal

segundo Fiorin (1996)..............................................................................................

82

Figura 2 – Pontos de ancoragem da expressão temporal .................................. 82

Page 16: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

Figura 3 – Continuum de verbo predicador a verbo instrumental................... 94

Figura 4 – Continuum de verbo predicador a verbo auxiliar / verbo

funcional....................................................................................................................

133

GRÁFICOS

Gráfico 1 – Configuração Gráfico 1 – Produtividade das expressões

temporais nos textos consultados........................................................................

91

Gráfico 2 – Configuração do elemento nominal formador da expressão em

delimitável ou não delimitável.............................................................................

92

Gráfico 3 - Valor da expressão: durativo ou pontual........................................ 94

Gráfico 4 – Posição da expressão no texto nas notícias..................................... 103

Gráfico 5 - Posição da expressão na predicação nas notícias........................... 104

Gráfico 6 – Comparação entre aspectos durativo e pontual nas redações e

nas notícias..............................................................................................................

108

Gráfico 7 – Posição da expressão na predicação em narrativas e notícias..... 109

Gráfico 8 – Planos discursivos nas redações e notícias..................................... 117

Gráfico 9 – Status informacional nas narrativas e notícias............................... 114

Gráfico 10 – Fluxo de informação nas porções textuais.................................. 120

TABELAS

Tabela 1 –Distribuição dos dados das narrativas escolares pelas porções

textuais.....................................................................................................................

92

Tabela 2 – Distribuição dos dados das narrativas escolares pelas posições

das expressões na sentença...................................................................................

93

Page 17: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

Tabela 3 – Distribuição das expressões com ou sem h e seguidas ou não

por atrás pelos grupos de séries...........................................................................

95

Tabela 4 – Distribuição das expressões temporais entre O Globo e o Extra

em relação ao aspecto e ao termo ao qual a expressão se liga.........................

97

Tabela 5 – Posição da expressão no texto nos dados do jornal O Globo e

Extra..........................................................................................................................

100

Tabela 6 – Distribuição das expressões por seções dos jornais........................ 102

Tabela 7 – Produtividade dos planos discursivos figura, fundo 2 e fundo

1 nos corpora.............................................................................................................

108

Tabela 8 – Relação entre as sentenças com as expressões temporais e o

fluxo de informação...............................................................................................

113

Tabela 9 – fluxo de informação nas posições textuais (percentuais) em

cada gênero.............................................................................................................

117

Tabela 10 – Resultado dos testes aplicados a graduandos sobre a

manutenção do sentido básico da expressão depois da manipulação da

mesma......................................................................................................................

125

Tabela 11 – Resultado dos testes aplicados a alunos do EF e EM sobre a

manutenção do sentido básico das expressões durativas depois da

manipulação da mesma.........................................................................................

128

Tabela 12 – Resultado dos testes aplicados a alunos do EF e EM sobre a

manutenção do sentido básico das expressões pontuais depois da

manipulação da mesma.........................................................................................

129

Tabela 13 – Resultados dos testes sobre as possíveis classificações para as

expressões temporais.............................................................................................

131

Tabela 14 – Tipos de substantivos que acompanham haver na formação da

expressão.................................................................................................................

136

Page 18: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

18

INTRODUÇÃO

As questões relativas à expressão de tempo vêm sendo estudadas por

vários pesquisadores. Ainda assim, restam questões a responder, uma vez que

são diversas as expressões linguísticas temporais. Sabe-se que não se podem

tratar as expressões de tempo como uma classe homogênea, pois uma análise

mais profunda evidencia que esta designação recobre elementos distintos, tais

como: advérbios e sintagmas adverbiais em sentido estrito (ontem), (domingo

passado); outros advérbios a serviço desse tipo de referência (dez anos atrás);

sintagmas adverbiais compostos por preposições (desde anos) ou verbos

(há/faz/tem/vai (para) dez anos). Neste trabalho, observam-se, então, as expressões

temporais formadas pelo verbo haver em um conjunto de dados da variedade

brasileira da Língua Portuguesa.

O objeto de estudo são as expressões definidoras de intervalos as quais

operam uma medição a partir do um ponto de perspectiva, definido no eixo do

tempo. Pretende-se trabalhar apenas com um tipo de adverbial operador de

localização de tempo decorrido/escoado/passado, que indica (a) transcurso de

tempo ou (b) dado momento no passado em relação (b.i) ao momento presente

da enunciação ou (b.ii) a um momento anterior à enunciação.

As expressões configuram-se da seguinte forma:

haver + Nome/Sintagma Nominal1 indicador de valor temporal (+que)

1. A pouco tempo eu morava em um prédio de 6 andares [Redação, 9º ano]

2. Professores não recebem aumento há 11 anos. [Notícia, O Globo]

1 Tais formas serão respectivamente tratadas como N e SN.

Page 19: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

19

Será feita uma análise do comportamento semântico e morfossintático

das expressões temporais formadas pelo verbo haver comparando-se os gêneros

textuais redação escolar do tipo narrativo2 e notícia jornalística.

Vale ressaltar que, até onde se sabe, pouco se estudou o assunto no

Brasil, mas, na literatura encontrada sobre a impessoalidade de haver, há

menção ao seu uso como formador de expressões temporais. Porém, a descrição

sobre haver especificamente nessas expressões, aparentemente, não foi

aprofundada. Além disso, o assunto não é diretamente tratado nas gramáticas

tradicionais ou descritivas; quando mencionado, encontra-se na seção sobre as

orações sem sujeito ou, mais raramente, na seção destinada à classificação de

orações num período composto.

Tomou-se como ponto de partida para a formulação de questões e

hipóteses descritivas sobre o comportamento do verbo haver nesse tipo de

expressão a tese de doutorado de Machado Vieira (2001), que, na seção “os

casos de fazer com referência a tempo cronológico”, indica:

O verbo impessoal fazer atuaria, então, como elemento funcional que

opera sobre sintagmas nominais com sentido cronológico para a

indicação do somatório de tempo a partir de dois pontos (origem e

destino) ou para a localização de um evento no eixo temporal. E, como

operandum/operador temporal, possuiria propriedades que o

relacionam às categorias de verbo predicador, operandum/operador

causativo e constituinte gramatical de expressão adverbial. (op. cit.:

299)

Contribuíram significativamente também para o desenvolvimento deste

estudo os trabalhos de Dapena (1983) e Móia (1999) que fomentaram algumas

inquietações sobre o comportamento do verbo e da expressão como um todo.

Em artigo sobre a semântica das expressões temporais com haver, Móia (1999)

2 Esse gênero será posteriormente tratado como narrativa escolar.

Page 20: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

20

reforça a ideia de semelhança entre as expressões compostas por verbo e as

compostas por preposições/advérbios, tais como dentro de/daqui /daí a X-

TEMPO, X-TEMPO depois de/antes de ou a X-TEMPO de.

Dapena (1983), por sua vez, enfatiza a questão da função da expressão

temporal, apontando problemas em relação a esse assunto:

El primero de ellos corresponde al hecho insólito de que aquélla

pueda funcionar — ¿indistintamente? — como subordinante y como

subordinada (comp. Hace mucho tiempo que viven aquí junto a viven aquí

hace mucho tiempo). Por otro lado, en el uso subordinante se plantea la

cuestión de determinar el papel que la frase subordinada desempeña

dentro del conjunto oracional: ¿Se trata de una subordinada

substantiva o, más bien, de relativo?... Y por lo que se refiere al

empleo subordinado, resulta bastante extraño que una oración con

verbo en forma personal se subordine a otra sin ninguna marca o

elemento de relación, y que, a su vez, sea susceptible de ir regida

directamente por una preposición. (op. cit.: 485)

Motivada por uma pesquisa sobre a nomenclatura com que o assunto é

exposto em obras didáticas e gramaticais, Paiva (2007), em um artigo sobre as

possíveis classificações para as expressões temporais formadas pelo verbo

haver, constata que há incoerência quanto à categorização dessas estruturas e

indica que há, em gramáticas normativas, ao menos quatro possibilidades de

referência:

i) A oração introduzida pelo QUE é classificada como subordinada

adverbial temporal e, consequentemente, a com HAVER como

principal. (...)

ii) A oração com o verbo HAVER é classificada como oração

subordinada adverbial temporal. Sendo assim, a oração subordinada é

justaposta, visto que não se liga à principal por transpositor. (...)

Page 21: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

21

iii) A oração introduzida por QUE é classificada como subordinada

substantiva subjetiva. (...)

iv) A expressão temporal é classificada como adjunto adverbial de

tempo. Não é considerada, então, como uma oração. (...)

Desses trabalhos e dessa situação de tratamento de tal tipo de estrutura,

surgiu o interesse pela análise do comportamento funcional não só das

expressões temporais em si, mas também pela investigação do estatuto do

verbo haver — elemento integrante de tais expressões. Nesta análise, interessa

averiguar aspectos relativos à possibilidade de haver se encontrar em algum

estágio de gramaticalização.

Esta pesquisa propõe-se, assim, a descrever o comportamento desse

verbo de modo mais aprofundado, considerando o processo de especialização

semântica e morfossintática ao qual se submete haver, as motivações e as

restrições desse processo, a configuração das estruturas que esse item compõe, a

relação entre a disposição dessas estruturas e efeitos de sentido na construção

de textos, entre outros aspectos.

Podem-se, então, enumerar os seguintes objetivos:

i. Verificar as características semântico-discursivas das expressões temporais

formadas pelo verbo haver + N/SN;

ii. Analisar os efeitos de sentido obtidos a partir da ordenação da estrutura no

período e de seus elementos internos;

iii. Averiguar a relação das expressões temporais com os planos discursivos e o

fluxo informacional.

iv. Comparar os fatores acima nas narrativas escolares e nas notícias, a fim de

descrever o uso das expressões em cada gênero textual focalizado.

v. Checar a pertinência do nível de gramaticalização do verbo haver como

elemento formador de expressão de tempo decorrido sugerido em Machado

Vieira (2001).

Page 22: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

22

vi. Discutir, a partir da observação de testes de atitude linguística, a

possibilidade de terem "o mesmo sentido básico" as expressões formadas

apenas por haver e as acompanhadas de outro elemento indicador de tempo

decorrido com valor relativamente equivalente. Ainda a partir dos testes,

verificar se a supressão do verbo na expressão acarreta alteração semântica.

A análise fundamenta-se em pressupostos teórico-metodológicos da

Teoria Funcionalista. Para essa teoria, a função comunicativa possui um papel

predominante nas línguas, e a língua é concebida como um instrumento de

interação social. Seu foco é o uso da língua dentro de um contexto discursivo;

logo, encaminha que a observação das estruturas gramaticais se dê na situação

comunicativa.

Considerando, conforme princípios funcionalistas, a língua como uma

estrutura maleável e adaptativa e a função como elemento a partir do qual se

torna possível compreender a linguagem, este estudo parte da noção de que a

verdadeira gramática da língua opera no uso, levando em consideração, assim,

as motivações externas ao sistema linguístico e pressões comunicativas a que os

interlocutores estão expostos.

Para a análise das características das expressões, pretende-se levar em

conta conceitos da Teoria Funcionalista, tais como transitividade, planos

discursivos (Hooper & Thompson, 1980) e status informacional (Chafe, 1984).

E, por se considerarem as expressões temporais formadas por haver como

locuções adverbiais, é extremamente relevante, ainda, o conceito de

gramaticalização (Heine et al, 1991; Heine, 2003; Hopper, 1991 e Bybee, 2003).

Adotaram-se, também, tópicos da Linguística Textual sobre gêneros e

tipos textuais, a fim de se obterem fundamentos para a análise sobre as

diferenças de usos das expressões temporais em estudo nos gêneros adotados.

A análise terá como ponto de partida a observação de obras didático-

pedagógicas — de caráter normativo e descritivo — destinadas a público de

diferentes níveis de ensino, bem como pesquisas de cunho acadêmico. Terá

como objetos de análise empírica dados da produção linguística observada em

Page 23: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

23

textos da variedade brasileira do Português e, ainda, material obtido em testes

de atitude confeccionados com inspiração em metodologia sociolinguística de

pesquisa de atitudes e aplicados a alunos de graduação, ensino fundamental e

médio. Os dados de uso são representativos da modalidade escrita de dois

gêneros textuais: notícias de jornais e redações escolares, ambos do tipo

narrativo. Com isso, busca-se organizar basicamente duas amostras para

análise: (i) uma com dados da observação (crítica e com algum grau de

consciência) dos usuários a respeito da língua que usam e (ii) outra com dados

do uso escrito do PB coletados em textos produzidos em dois gêneros.

Esta dissertação divide-se em quatro capítulos além desta introdução,

que se apresentam da seguinte forma: capítulo 1 – revisão bibliográfica sobre o

verbo haver e expressões de tempo decorrido; capítulos 2 e 3 – aspectos teórico-

metodológicos da pesquisa; capítulo 4 – análise do objeto de estudo e

interpretação dos resultados. Por fim, seguem as considerações finais e as

referências bibliográficas.

Page 24: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

24

1. Revisão bibliográfica sobre haver e expressões de tempo passado

Fazem-se, neste capítulo, explanações sobre os usos do verbo haver e das

expressões temporais em gramáticas, dicionários e trabalhos de cunho

acadêmico de diversos autores. A análise das obras centrou-se nas expressões

indicadoras de tempo passado, e, em especial, nas formadas pelo verbo haver

— objeto de estudo deste trabalho. Entende-se, aqui, por expressões temporais

o que comumente se chama circunstanciais temporais ou locuções adverbiais.

Objetiva-se, com isso, sumariar aspectos de descrições já disponíveis que

possam contribuir para um melhor entendimento sobre o comportamento

dessas expressões e do verbo em estudo.

Na primeira seção, foi feita uma breve resenha da origem e dos primeiros

usos do verbo haver, verificando-se, também, suas acepções e funções descritas

em dicionários e gramáticas descritivo-normativas, bem como uma revisão

nestas das descrições sobre as expressões de tempo passado. Já na segunda

seção, procedeu-se à resenha das gramáticas de cunho descritivo e de trabalhos

e pesquisas acadêmicas sobre as expressões de tempo decorrido/escoado.

1.1. Origem e primeiros usos de haver

Haver é originário da forma latina habere que se apresentava com as

acepções de ‘possuir’, ‘obter’, ‘manter’, ‘reter’, ‘segurar’, ‘conter’ e ‘deter’.

Segundo Sampaio (1978), no latim clássico habere era verbo pleno empregado

com a noção de posse de coisas materiais — como em Tantas divitias habet: nescit

quid faciat auro.3 — e de posse espiritual, relacionando um sujeito a seu

complemento — como em vulneribus didicit miles habere metum4.

Nesse período, habere também era empregado como auxiliar dando à

conjugação perifrástica um matiz de dever, obrigação. Sampaio (1978) indica

que “a reunião de tempo e aspecto numa só forma verbal acabou por ocasionar 3 Ele tem tão grandes riquezas, que não sabe o que fazer com ouro. 4 Com os ferimentos o soldado aprendeu a ter medo.

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25

o aparecimento da perífrase com habere, que exprimia a posse da ação concluída

e a continuidade deste estado até o presente” (Sampaio, 1978:3).

A noção de posse expressa por habere posteriormente, devido a um

desgaste semântico, generaliza-se, e o centro semântico passa para o particípio

do outro verbo. Então, nesse contexto, habere torna-se um verbo auxiliar

desprovido de conteúdo semântico.

No português arcaico as duas formas coexistem até o século XV, como se

verificam nos seguintes exemplos5:

"..., ou hás o sem perdido ou és encantada, que és donzela de grã guisa...” (A

demanda do Santo Graal.157) — perífrase indicando o estado de posse, a

manutenção de uma ação.

“Ora hei pavor que a havemos perdida.” (A demanda do Santo Graal pg.168) —

perífrase reduzida a um mero pretérito.

Mantém-se, então, apenas a perífrase reduzida a pretérito, que posteriormente

passou a ter como alternante a perífrase formada através do verbo ter.

Ainda segundo Sampaio (1978), embora o uso padrão de habere no latim

clássico fosse pessoal significando ‘ter, possuir’, há documentos do latim da

decadência e do latim vulgar, em que o verbo habere aparece com o sentido

existencial.

Para a passagem do uso pessoal para o impessoal, a autora aponta a

hipótese de Bassols de Climent de que “houve primeiro uma mudança de

formulação mental que resultou em uma mudança de construção” (op. cit.:10).

Para a frase Dominus habet multum vinum6, houve a correspondência Domus

habet multum vinum7. A casa, como um ser inanimado, não pode logicamente

possuir; assim, a construção se aproxima a outra que exprime existência e não

posse domi est multum vinum8. Domus passou, então, a ser visualizado como

locativo e a construção sem um sujeito.

5 Exemplos de Sampaio (1978). 6 O senhor tem muito vinho. 7 A casa tem muito vinho. 8 Em casa há muito vinho.

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26

Mattos e Silva (1997) afirma que, no século XIII, habere com o sentido de

existir co-ocorre com o verbo esse. Em sua análise sobre as Cantigas de Santa

Maria, percebe que nesse uso há uma predominância do ser (56% das

ocorrências) em relação a haver (44% das ocorrências).

Em estruturas possessivas, haver é o verbo mais usual ocorrendo com

complemento de qualquer valor semântico, utilizado para posse de objetos

materiais adquiríveis, de bens/qualidades imateriais adquiríveis e posse

inadquirível e inalienável.

Ainda segundo Mattos e Silva (2000), do século XIV para o século XV, em

construções existenciais o verbo haver já apresenta maior número de

ocorrências do que o verbo ser. Na primeira metade do século XV, haver

possessivo torna-se menos frequente perdendo espaço para ter. O que ocorre

também em perífrases com particípio passado e nas construções em que tem

papel de auxiliar de tempo composto.

Na segunda metade do século XVI haver é suplantado por ter em todos

os contextos de posse. Nos séculos XVII e XVIII, haver só predomina em

contextos existenciais. Já no século XX, parece completar-se o processo de

esvaziamento semântico do verbo haver, usado essencialmente em construções

existenciais na modalidade escrita da língua.

Sintetizando-se os usos pode-se apresentar o seguinte quadro:

Latim clássico habere:

• verbo pleno — tem noção de posse.

• auxiliar — apresenta matiz de dever, obrigação.

• auxiliar — é desprovido de conteúdo semântico.

Latim da decadência e latim vulgar:

• Apresenta sentido existencial.

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27

Português arcaico:

• As duas formas de particípio coexistem.

• Mantém-se apenas a perífrase reduzida a pretérito.

Século XIII:

• existencial — co-ocorre com esse.

Século XIV e XV:

• Existencial — haver é mais produtivo que ‘ser’.

Século XV:

• Possessivo — perde espaço para ‘ter’.

Segunda metade do século XVI:

• Possessivo — é suplantado por ter em todos os contextos de posse.

Séculos XVII e XVIII:

• Só predomina em contextos existenciais.

1.2. Descrições sobre haver em dicionários de Língua Portuguesa

Nos dicionários etimológicos de Silveira Bueno (1976), Machado (1973),

Cunha (1999) e, ainda, Houaiss (2007), verificou-se a origem de haver no verbo

habere do latim com acepções de ‘possuir’, ‘obter’, ‘manter’, ‘reter’, ‘segurar’,

‘conter’ e ‘deter’. Machado (1973) aponta, como fonte histórica, em 1012, a

forma avemus em kartula venditionis de ereditate nostra ue avvemus in Villa Fornele.

Em relação aos possíveis usos de haver, todos os autores consultados

apresentam as mesmas possibilidades: uso transitivo com diversas acepções9,

impessoal, pronominal ou emprego auxiliar.

Como verbo auxiliar, viu-se que ele pode aparecer: junto a particípio,

indicando tempo pretérito (havia sido); seguido de de mais presente do infinitivo

9 Cf. quadro de acepções página 29.

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28

de outro verbo, exprimindo futuridade promissiva (hei de andar); seguido ou

não pela a preposição de, indicando futuro (havias-te surpreender).

Houaiss afirma que, no sentido de 'receber, ganhar' e nas extensões deste,

como 'experimentar, sentir' e 'ter', o verbo haver pode formar, com seu objeto

direto, uma unidade semântica e funcional.

Haver é impessoal nos sentidos de 'existir, continuar a existir, acontecer,

ocorrer'. Freire (1954) chama atenção para a questão de que o verbo haver como

verbo impessoal não deixa de ser transitivo. Os autores consultados ressaltam,

ainda, que, quando haver aparece em complexos verbais, seu auxiliar também

permanece invariável (há pessoas/deve haver pessoas), toda a locução é impessoal.

Houaiss afirma que, nas construções nas quais o haver possui o sentido

de 'existir', como nas orações do tipo há muito que fazer, o verbo não é auxiliar,

tem sentido pleno (impessoal). Indica, ainda, que, no Brasil, nas acepções

impessoais de 'estar presente, encontrar-se', 'existir', 'acontecer, realizar-se',

haver pode ser substituído, no registro da língua informal, pelo verbo ter,

também impessoal.

Encontraram-se registros, em todas as obras avaliadas, do uso impessoal

de haver como formador de expressão de tempo passado. Nesse uso, o verbo

haver é combinado a um elemento que faça referência temporal, tal como em

“há dias”.

Os autores chamam atenção para a correlação temporal de haver com o

outro verbo nessas construções. Se o verbo da frase seguinte estiver no passado,

haver deve apresentar-se também no passado. O uso no futuro denota

incerteza. Alguns autores, como Houaiss apontam, que, no registro informal,

haver costuma ser empregado no presente do indicativo. Verificou-se também

que, nessas construções de tempo, o verbo pode vir antecedido da preposição

de, em especial em Portugal.

Para Fernandes (1958), nesses casos a oração de haver é subordinada

adverbial, e o que, que às vezes aparece, deve ser considerado simples expletivo.

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29

Para Freire (1954) e Almeida (2008), nessa acepção formam-se com o verbo

haver frases adverbiais.

Segundo Almeida (2008), nessas expressões temporais, o “há não é

percebido como verbo, mas antes como preposição, e daí o antepor-se-lhes de,

desde, até, por analogia com expressões como de então, desde ontem, até hoje”

(op. cit.: 337). Defende, assim, que essas construções são locuções adverbiais de

tempo em forma oracional intercaladas na oração; como prova, diz que vêm

modificando um verbo.

Esse autor ressalta, ainda, que há redundância no acréscimo de atrás e de

passados, à expressão (1954) "há dias". “A simples presença do verbo haver

dispensa essas e qualquer outra palavra que venha a denotar tempo decorrido.”

(op. cit.: 237).

Quadro resumitivo dos usos e acepções do verbo Haver10

Usos pessoais:

SIGNIFICADOS EXEMPLOS

ter ou obter comunicação de;

receber, alcançar

logo os Noronhas houveram notícia da

sua prisão

estar na posse de, ser proprietário

de; possuir

os Albuquerques hão cabedal de escudos

para muito mais

experimentar uma sensação, ser

afetado por; sentir

por presenciáreis tais atrocidades, haveis

receio de ali ficar

considerar, julgar Se houveres que é fraqueza morrer em tão

penoso e triste estado.

receber de volta; reaver nada conseguiu haver do que lhe havia

sido roubado

Quadro 1 - Usos pessoais do verbo haver

10 Os exemplos, com poucas exceções são de Houaiss.

Page 30: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

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Usos impessoais:

SIGNIFICADOS EXEMPLOS

ter existência (material ou

espiritual); existir, subsistir

para ela, só há no mundo o neto

estar ou encontrar-se concretamente

em determinado lugar ou situação

há alguém à porta, batendo

ter transcorrido ou ser decorrido

(tempo)

há cinco anos deixei de fumar

ser ou tornar-se realidade no tempo

e no espaço; acontecer, realizar-se

não houve sessão de cinema

ser possível – seguido de infinitivo

sem preposição

Não há fartar um moiro, se come na mesa

alheia.

Quadro 2 – Usos impessoais do verbo haver

Usos pronominais:

SIGNIFICADOS EXEMPLOS

proceder socialmente; conduzir-se, lidar

com, sair-se

elas se houveram com elegância na

discussão

andar às voltas com; arcar quem entra naquela repartição

começa a se haver com as

complicações da burocracia

ter trato com; lidar, prestar contas a; avir-

se

quem não for já para a cama vai

haver-se comigo depois

Quadro 3 – Usos pronominais do verbo haver

Page 31: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

31

1.3. Descrições sobre haver e expressões de temporais/advérbios em

gramáticas da Língua Portuguesa

Todas as gramáticas consultadas mencionam os usos de haver

encontrados nos dicionários. São descritos, em especial, os usos como verbo

auxiliar e seus usos impessoais.

Dias (1959) descreve haver como auxiliar e formador de expressão

temporal. Defende que esse verbo pode ser empregado como substantivo em

expressões formadas por preposição e substantivo, tal como de há muito. Afirma,

ainda, que o que usado depois de construções temporais com o verbo haver

funciona como uma conjunção temporal.

Said Ali (1966), ao falar sobre verbos sem sujeito, apresenta a

possibilidade de análise do verbo haver nessas estruturas de forma semelhante

a sua acepção de posse — o que chama de abuso de alguns gramáticos. Esses

gramáticos apresentam, nas palavras de Said Ali, dois absurdos: a) há = tem =

possui. Ex.: Há homens = possui homens; b) devido à noção de posse pressupor

um possuidor, levantam a possibilidade de um sujeito oculto.

O autor afirma, então, que “nenhum substantivo ou palavra

substantivada é sujeito sintático dos verbos que exprimem fenômeno da

natureza; nenhum substantivo ou palavra substantivada pode tão pouco

exercer essa função em orações existenciais como 'há homens'”(op. cit.: 85).

A visão de Barreto (1903) se enquadra na linha criticada por Said Ali,

pois o autor, ao tratar não do verbo haver, mas de fazer em estruturas

temporais, comenta que, na estrutura “— Já esteve no Recife! Em que épocha?—

Fazem dois annos”, é erro supor que o sujeito do verbo fazer é “dois annos” (op.

cit.: 93).

O autor considera que “dois anos é complemento directo do verbo fazer,

verbo transitivo activo. Qual então é o sujeito? A proposição latente — que

estive no Recife. Logo, o verbo fazer deve estar no singular, porque uma oração

que exercita o officio de sujeito de um verbo qualquer, exprime uma noção

substantiva singular, e o verbo deve pois, ficar n'esse numero.” (op. cit.: 93).

Page 32: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

32

Barreto afirma, ainda, que há outros autores que consideram fazer nessas

frases como impessoal. E finaliza o capítulo afirmando que “o infinitivo de fazer

comunica sua impessoalidade aos auxiliares. Tal como no caso de haver”.

Góis (1958), ao tratar da sintaxe de haver, defende que, quando

empregado impessoalmente, concorda com sujeito indeterminado. Para ele,

“nas formas — há dias, há pouco, havia meses, havia quatro semanas, — o

verbo HAVER é igualmente impessoal e intransitivo: como tal fica no singular,

concordando com sujeito indeterminado.” (op. cit.: 57) Diz, ainda, que haver

pode aparecer no futuro indicando incerteza sobre a quantidade de tempo

decorrido ou regido pela preposição de se estiver no presente do indicativo.

Maciel (1931), na seção sobre a sintaxe do verbo haver, defende que esse

verbo funciona como adjunto adverbial em frases ou expressões em que apenas

indica circunstância de tempo, podendo ser seguido às vezes do que expletivo,

que, ainda segundo o autor, funciona como elemento apenas decorativo e

pleonástico, sem prestabilidade sintática.

Bechara (1999:440) afirma que os adjuntos adverbiais temporais “podem

referir-se ao verbo, ao sintagma verbal ou a toda oração”. Enfatiza que podem

ser representados por advérbio, sintagmas preposicionados ou por oração e

representam o tempo propriamente dito, a duração, a quantificação temporal

etc.

Ainda segundo o autor, a ordem dos advérbios está diretamente ligada

ao seu papel sintático-semântico e sua relação com o verbo. Assim, os advérbios

mais internamente ligados ao núcleo verbal não possuem flexibilidade de

posição, já aqueles mais externamente ligados apresentam certa flexibilidade.

Em sua gramática, Bechara (1999) menciona as expressões em estudo

quando trata das orações subordinadas adverbiais temporais. O autor defende

que é opinião generalizada considerá-las como orações subordinadas adverbiais

temporais e o que que, às vezes, as segue como conjunção temporal.

Esse gramático apresenta outras possíveis classificações, propostas por

diferentes autores, para essas expressões. Dentre elas está a possibilidade de

Page 33: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

33

considerar o que como expletivo dentro da oração principal e a oração com

haver como adverbial temporal, sendo, então, justaposta à oração subordinada

— opção que Bechara julga boa. Apresenta, também, a proposta seguida por

Barreto (1903) — considerar o verbo como pessoal nessa construção — e a

seguida por de Maciel (1931) — considerar a expressão como uma locução

adverbial.

O mesmo ressalta, porém, que “em tais orações, a análise se torna difícil

pelo fato de a construção ter-se fixado apesar de alterado o sentido lingüístico.

Há um visível descompasso entre sua estrutura de superfície e profunda.” (op.

cit.: 504)

Cunha e Cintra (1985) apenas comentam sobre a impessoalidade do

verbo haver quando formador de expressão de tempo, sem questionar, porém, a

função sintática de tal expressão.

Cunha (1976), ao falar sobre a colocação dos advérbios na sentença,

afirma que esses podem ser antepostos ou pospostos ao constituinte com o qual

se relacionam. Ressalta, porém, que há uma função de realce na antecipação do

advérbio ao verbo.

Esses autores levantam a questão da dificuldade de generalização sobre a

ordem dos advérbios. Apontam que, em função de pressões de informatividade

ou discursivas, eles podem deslocar-se na sentença.

Rocha Lima (1998) menciona a impessoalidade do verbo haver ao formar

expressões de tempo passado. E, comenta, ainda, sobre a classificação de tais

expressões ao tratar das orações subordinadas adverbiais temporais,

nomeando-as justapostas.

Em síntese, na investigação em gramáticas normativas sobre as

expressões temporais formadas por haver, perceberam-se ao menos quatro

classificações possíveis para tais expressões. Foram consultadas gramáticas de

décadas anteriores e gramáticas contemporâneas; as classificações vistas

encontram-se nos materiais das diferentes épocas. Abaixo são apresentadas e

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34

exemplificadas as quatro classificações para as expressões em estudo e alguns

autores que as adotam:

i) A oração introduzida pelo que é classificada como subordinada adverbial

temporal e, consequentemente, a com haver como principal. Dessa forma, o que

é entendido como uma conjunção temporal. É esta, segundo Bechara (1999), a

orientação mais seguida.

3. Há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia11 [O Globo]

Oração Principal (OP) Oração Subordinada Adverbial Temporal (OSAT)

Em construções como a seguinte, acredita-se na elipse do QUE

subordinativo.

4. o time carioca não sofria gol no Maracanã há quatro jogos [Jornal, Extra]

OSAT OP

há quatro jogos que o time carioca não sofria gol no Maracanã

ii) A oração com o verbo haver é classificada como subordinada adverbial

temporal. Sendo assim, a oração subordinada é justaposta, visto que não se liga

à principal por transpositor. Essa é a visão de alguns autores, incluindo Rocha

Lima (1999).

Neste caso, o que “reduzido a simples palavra memorativa, relembra, na

oração principal, a partir de que fato se faz alusão ao tempo na subordinada

anterior” (Bechara, 1999).

11 Nos corpora adotados não foram verificados dados nos quais a expressão temporal fosse seguida pelo conectivo que; por isso, para a exemplificação foram coletados alguns dados, em jornais, que servissem de exemplo.

Page 35: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

35

5. Há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia [O Globo]

OSAT OP

6. eu morava em Bangu a 4 anos atrás [Redação, 7º ano EF]

OP OSAT

iii) A oração introduzida por que é classificada como subordinada substantiva

subjetiva.

Neste caso, o que é entendido como conjunção integrante e o verbo haver

não é considerado impessoal, visto que possui uma oração como sujeito.

7. há dois meses que não fazia uma refeição completa12 [Jornal, O globo]

OP Oração Subordinada Substantiva Subjetiva (OSSS)

Tal classificação seria mais adequada para o verbo fazer, segundo os

autores que a consideram, como Mário Barreto e Cândido Jucá Filho. Porém,

ainda segundo eles, como as estruturas são equivalentes, pode-se aplicar a

ambos os verbos.

iv) A expressão temporal é classificada como adjunto adverbial de tempo. Não é

considerada, então, como uma oração.

8. A 1 mês atrás eu e minha prima estava brincando [Redação, 7º ano EF]

Adjunto Adverbial de Tempo

(AAT)

Predicação nuclear

12 Nos corpora adotados não foram verificados dados nos quais a expressão temporal fosse seguida pelo conectivo que, por isso para a exemplificação foram coletados alguns dados, em jornais, que servissem de exemplo.

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36

9. O BuscaPé foi fundado há dez anos [Jornal, O Globo]

Predicação nuclear (AAT)

O autor Maximino Maciel, em sua Grammatica descriptiva de 1931, já

mencionava esta possibilidade de classificação na seção sobre a sintaxe do

verbo haver dizendo que ele pode atuar “como adjunto adverbial em phrases

ou expressões em que apenas indica circunstância de tempo, seguido ás vezes

do QUE expletivo.” Definia, ainda, que o que na frase funciona “como elemento

apenas decorativo e pleonástico, sem prestabilidade syntactica”

Há de se mencionar, também, que outros autores, tal como Antenor

Nascentes, por exemplo, consideram esta classificação apenas para as

expressões justapostas, isto é, sem a presença do que:

10. A disputa interna no Palácio começou há dois meses [Jornal, Extra]

1.4. Descrições sobre expressões de tempo decorrido em Gramáticas

descritivas e textos acadêmicos

Câmara Jr. (1977) defende que há três tipos de advérbios, dentre eles os

que se destinam a situar eventos no tempo. Afirma que esses são de natureza

pronominal — do mesmo modo que os de lugar — e são, portanto, diferentes

dos demais advérbios, de natureza nominal. Os advérbios temporais situam o

evento comunicativo no tempo em relação à posição temporal do falante,

podendo esse evento situar-se no momento da comunicação ou fora dele.

Segundo Mira Mateus et alii (2003),

os localizadores temporais são constituídos por advérbios capazes de

fornecer as coordenadas temporais que permitem situar a

eventualidade descrita numa frase, selecionando um intervalo de

tempo constituído como seu referente(op. cit.: 168).

Page 37: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

37

A localização temporal pode ser relativa ou absoluta; no último caso, é

dêitica (referência estabelecida pelo momento de enunciação) ou anafórica

(referência em uma expressão na frase ou texto).

A autora indica que alguns adverbiais possuem certa duplicidade em

relação ao tipo de referência; ou seja, podem ser dêiticos ou anafóricos,

conforme o contexto em que aparecem. Apresenta como exemplos as frases

“Maria chegou há pouco.” e ”Os meus amigos foram ao Brasil apesar de terem

marcado a viagem há pouco.” (op. cit.: 169).

Fiorin (1996) apresenta três momentos na constituição do sistema

temporal: o momento da enunciação, o momento da referência, e o momento do

acontecimento. Segundo ele, os advérbios de tempo articulam-se em dois

sistemas, um enunciativo, isto é, centrado no momento de referência presente, o

da enunciação, e um enuncivo, centrado em um momento de referência

pretérito ou futuro, um momento de referência instalado no enunciado.

O sistema enunciativo expressa-se para revelar concomitância,

anterioridade ou posterioridade. Para revelar anterioridade, podem-se utilizar

ontem, em + SRT13 + passado, em + ultimo + SRT, há +numeral ou pronome + SRT;

numeral ou pronome + tempo ou SRT + atrás.

Fiorin lembra que “é possível usar conjuntamente um tempo verbal e

uma expressão adverbial temporal que não pertencem ao mesmo sistema de

referência, quando dois momentos distintos de referência estiverem

implicados” (op. cit.: 166). Com a expressão temporal em estudo, pode verificar-

se o exemplo “há dois anos eu faria isso”.

Moura Neves (2000), ao abordar as formas dos adverbiais, menciona,

entre outras, as formas verbais há/faz/havia/fazia + substantivo qualificativo.

Para ela, as categorias de lugar e de tempo são dêiticas, visto que “fazem

orientação por referência ao falante e ao aqui - agora, que constituem o

complexo modo-temporal que fixa o ponto de referência do evento de fala”.

(op. cit.: 258) 13 Substantivo de referência temporal

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38

Os circunstanciais temporais podem ser em si mesmos fóricos ou não-

fóricos. Os fóricos “indicam circunstância que é referida no momento da

enunciação, numa escala de proximidade temporal” (op. cit.: 258). Já os não-

fóricos indicam a circunstância de tempo.

Moura Neves (2002) questiona o estatuto dos advérbios de tempo e

lugar, defendendo que possuem um estatuto particular, não avaliado pela

tradição gramatical. “De fato, se o advérbio se define como modificador do

verbo (ou, ainda, do adjetivo ou advérbio), como ocorre tradicionalmente, os

circunstanciais não pertencem à classe, já que nenhum advérbio de tempo ou

lugar realmente modifica o verbo. Por outro lado, se o advérbio se define como

a palavra que indica circunstância, conforme também ocorre tradicionalmente,

os circunstanciais são os advérbios por excelência.” (op. cit.: 250)

Novamente, nesse outro trabalho, Moura Neves define fórico como

“elemento que propicia a busca ou a recuperação de informação, por remissão a

um ponto do enunciado, ou à situação de enunciação” (op. cit.: 251). A autora

diferencia, então, dêixis de forismo, afirmando que todo circunstancial fórico é

dêitico.

Martelotta (1994) subdivide os circunstanciadores temporais em cinco

grupos de acordo com sua função discursiva. São eles circunstanciadores: de

tempo determinado, de tempo indeterminado, iterativos, de simultaneidade e

delimitativos.

A categoria com a qual se identificam as expressões temporais com haver

é a dos circunstanciadores temporais delimitativos. Para ele, “Sua função é

referir-se a situações estáticas ou a eventos não-específicos, delimitando o início

e/ou o fim de sua permanência no tempo” (op. cit.: 41). O autor apresenta os

exemplos: “há três anos, durante dois meses, até o ano que vem.”

Em relação à posição dos circunstancias na sentença, Martelotta (1994)

apresenta seis posições. As três antes do verbo são: 1) não ocorrendo sujeito

antes do verbo, 2) antes do sujeito, 3) entre o sujeito e o verbo. E as três depois

do verbo: 1) não ocorrendo complemento ou predicativo depois do verbo, 2)

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39

entre o verbo e o complemento ou predicativo, 6) depois do complemento ou

predicativo.

Móia (1999) aponta que têm sido referidos, de maneira geral, casos em

que o complemento da expressão formada pelo verbo haver é um predicado de

quantidades de tempo, como três anos, muito tempo. Porém, esse complemento

pode também ser uma expressão que designa intervalos (há três domingos) ou

um predicado situacional (cinco refeições).

Ressalta, ainda, que as expressões com haver podem aparecer em, ao

menos, três contextos distintos: (i) como argumentos (geralmente

preposicionados) de predicados “Os vestígios arqueológicos encontrados datam

de há cem mil anos”; (ii) precedidas por uma preposição temporal em posição

adverbial “Esta cidade tem sido governada por autarcas socialistas desde há

duas décadas”; (iii) não precedidas de preposição e em posição adverbial “Esse

edifício foi demolido há dois anos”. Porém, o ator considera que “em todas

estas estruturas, os sintagmas encabeçados por haver são meramente expressões

designadoras de intervalos” (op. cit.: 220).

Toral (1992), ao analisar, na língua espanhola, o verbo hacer indicando

tempo cronológico, aponta que as expressões por ele formadas podem indicar

um caráter pontual (Hace seis ú ocho meses que dejé yo El cuartelllo) ou

durativo (¡Né! ¡Pero si hace diez dias que estoy aqui, gusano!) de “um estado de

coisas” a depender da correlação temporal entre o tempo do discurso e os

verbos envolvidos na construção.

Segundo a autora, o sintagma nominal que acompanha o verbo apresenta

as seguintes características: (i) São sempre substantivos que designam

transcurso de tempo; (ii) nunca aparecem precedidos do artigo definido, (iii)

podem ser contáveis, acompanhados por quantificadores (Hace dos años), ou

não contáveis (Hacia mucho tiempo).

Dapena (1983), também analisando a língua espanhola, questiona o

caráter funcional das expressões temporais formadas por hacer. Aponta algumas

dúvidas: essas expressões funcionam como subordinantes ou subordinadas?; se

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40

subordinante, a que tipo de subordinada se relacionam?; como se ligam sem

conector?

Para ele, uma explicação pode ser considerar toda a expressão como uma

forma fixa, equivalente a um advérbio de tempo. O autor comenta, ainda, que

não há dúvida quanto ao caráter adverbial ou circunstancial da expressão, dada

a possibilidade de comutação com outros sintagmas adverbiais, como em: Su

padre murio { hace cuatro años / em mayo de 1982 / el domingo pasado / ayer / antes /

después etc.

Dapena afirma, porém, que tal explicação não dá conta de todas as

questões que envolvem as expressões com hacer e prossegue sua análise

buscando entender como funciona a oração formada por “hacer + que + or” e a

formada por or + hacer. As expressões formadas sem que14 são orações

adverbiais, porém são distintas das descritas nos tratados gramaticais. Afirma

que as orações temporais tradicionais situam temporalmente a ação de um

verbo em relação à ação de outro verbo, já as formadas por hacer situam

temporalmente a ação do segundo verbo em relação a quantidade de tempo

decorrido.

Sobre o verbo hacer, o autor diz “en este contexto se hallaría totalmente

gramaticalizado y cuya funcíon consistiría en indicar, por una parte, el término

ad quem del transcurso y, por outro lado, el carácter retospectivo del cómputo

realizado.” Por fim, menciona que se trata de um sintagma adverbial autônomo,

uma expressão adverbial.

Machado Vieira (2001), em sua tese de doutorado sobre predicações com

o verbo fazer, defende que esse verbo, ao atuar na indicação de tempo passado,

apresenta um comportamento gramaticalizado: “como operandum/operador

temporal, possuiria propriedades que o relacionam às categorias de verbo

predicador, operandum/operador causativo e constituinte gramatical de expressão

adverbial”.

14 As expressões formadas sem que assemelham-se às formadas por haver verificadas no corpus adotado.

Page 41: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

41

Segundo ela, fazer junto de um SN temporal assume uma unidade com o

significado específico de “ter passado um determinado lapso de tempo, desde

certo fato”; “apresenta uma estrutura sintática e semântica previsível”; pode ser

substituído apenas por um número reduzido de verbos que tenham

comportamento sintático-semântico semelhante.

Por fim, Paiva, no trabalho Variação de HAVER, FAZER e TER em

expressões temporais15, apresentado na XXIX Jornada Giulio Massarani de

Iniciação Científica, Artística e Cultural da UFRJ, verificou que “a variante

HAVER é a mais produtiva em expressões temporais, seja na modalidade

escrita ou oral”. Nesse estudo, 81,8% das expressões foram formadas por haver,

13,1% por ter e 5,1 por fazer.

15 Trabalho de iniciação científica desenvolvido por Paiva, em 2007, juntamente com o grupo do projeto de pesquisa PREDICAR – coordenado pela Professora Doutora Marcia dos Santos Machado Vieira.

Page 42: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

42

2. Pressupostos teóricos

Essa pesquisa baseia-se fundamentalmente em conceitos e pressupostos

da Teoria Funcionalista. Não obstante, lida ainda com teorizações da

Linguística Textual relativas aos conceitos de gêneros e tipos textuais e com

orientações teórico-metodológicas desenvolvidas no âmbito dos estudos

sociolinguísticos e relacionadas ao estudo das atitudes dos falantes de uma

língua e/ou das avaliações subjetivas de certas formas/estruturas linguísticas.

Recorreu-se a tópicos da Linguística Textual a fim de se obter

conhecimento sobre as diferenças de usos das expressões temporais em estudo

nos gêneros adotados e a métodos/técnicas e/ou materiais característicos dos

estudos sociolinguísticos com o intuito de se somar à análise qualitativa o

tratamento empírico e quantitativo de aspectos envolvidos no estudo do

fenômeno linguístico em foco.

2.1. Teoria Funcionalista

Na Teoria Funcionalista, concebe-se a língua como um instrumento de

interação social. Nessa corrente teórica, importa explicar as regularidades

observadas no uso com base no exame das circunstâncias discursivas em que se

dão as estruturas linguísticas e seus contextos prototípicos. Desta maneira, no

Funcionalismo rejeita-se a dissociação entre sistema e uso, ou língua e fala, já

que entende que pressões de ordem funcional moldam a estrutura da língua.

Conforme Martelotta & Áreas (2003: 20), “a língua não pode ser

analisada como objeto autônomo, mas como uma estrutura maleável, sujeita a

pressões oriundas das diferentes situações comunicativas, que ajudam a

determinar sua estrutura gramatical”.

Numa análise funcionalista, é relevante levar em consideração, além dos

fatores discursivos, os cognitivos e interacionais, tais como as intenções

comunicativas, o conhecimento de mundo partilhado entre falante e ouvinte e o

conhecimento a respeito do assunto. Moura Neves (1997:113) considera a

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43

competência comunicativa como “a capacidade que os indivíduos têm não

apenas de codificar e decodificar expressões, mas também de usar e interpretar

estas expressões de uma maneira interacionalmente satisfatória.”

Por haver várias correntes, cada qual com suas particularidades, a

caracterização do Funcionalismo torna-se tarefa complexa. Porém, embora haja

vertentes distintas, todas apresentam pontos em comum, como aponta Moura

Neves (1997:2):

Qualquer abordagem funcionalista de uma língua natural, na

verdade, tem como questão básica de interesse a verificação de como

se obtém a comunicação com essa língua, isto é, a verificação do modo

como os usuários da língua se comunicam eficientemente.

Este trabalho segue pressupostos do funcionalismo norte-americano,

cujos textos pioneiros datam de 1970 e visam a observar a língua baseando-se

na situação de produção linguística. Alguns de seus principais representantes

são Talmy Givón, Paul Hopper, Sandra Thompson, entre outros.

Givón (apud Martellota et alii 2003: 28) apresenta um grupo de premissas

que caracterizam a visão funcionalista da linguagem:

i) A linguagem é uma atividade sociocultural;

ii) A estrutura serve a funções cognitivas e comunicativas;

iii) A estrutura é não-arbitrária, motivada, icônica;

iv) Mudança e variação estão sempre presentes;

v) O sentido é contextualmente dependente e não-atômico;

vi) As categorias não são discretas;

vii) A estrutura é maleável e não-rígida;

viii) As gramáticas são emergentes;

ix) As regras de gramáticas permitem algumas exceções.

Page 44: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

44

Segundo essa concepção, a sintaxe é influenciada pela situação

comunicativa; isto é, a sintaxe, a semântica e a pragmática são interdependentes

e estão sempre relacionadas. Conforme Givón (1979), a sintaxe origina-se no

discurso, este considerado como o conjunto de estratégias aplicadas pelo falante

na organização funcional do seu texto para um dado ouvinte em determinada

situação comunicativa.

As questões principais investigadas na vertente norte-americana são as

circunstâncias discursivas envolvidas na utilização de diversas estruturas

linguísticas, a relação entre as estruturas e as necessidades/funções

comunicativas, os processos envolvidos na mudança linguística, entre outras.

Entre os temas presentes em estudos funcionalistas, vale destacar alguns

que interessam mais especificamente a esta pesquisa. São eles: transitividade,

planos discursivos, fluxo da informação e processo de gramaticalização.

2.1.1. Transitividade e planos discursivos

A relação entre transitividade e planos discursivos mostra-se

importante para o presente trabalho, pois eles correspondem a parâmetros que

são aqui analisados para a caracterização do comportamento das expressões

temporais em estudo. Em outras palavras, interessa verificar qual o contexto

prototípico para as expressões temporais, figura ou fundo. Parte-se da hipótese

de que as expressões, por indicarem circunstâncias, sejam mais produtivas em

trechos de fundo.

Segundo Hopper & Thompson (1980), o discurso narrativo apresenta as

duas estruturas, figura (foreground) e fundo (background), cada qual

caracterizada por determinados traços semântico-gramaticais. Esses conceitos

relacionam-se à noção de porção de texto central e periférica em termos de

estrutura.

Figura é a parte na qual são apresentados os pontos importantes do

discurso, caracterizada por sequência temporal de eventos concluídos,

pontuais, afirmativos, realis, sob a responsabilidade de um agente. Fundo, por

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45

sua vez, é a parte que contém as informações que comentam ou ampliam o que

está sendo destacado pelo falante, correspondendo a localizações dos

participantes ou das situações, comentários avaliativos, descrições de ações,

estados e eventos simultâneos à porção textual de figura (Cunha, Oliveira &

Martelotta, 2003).

Conforme Hopper (1979), o plano discursivo figura está relacionado ao

que é narrado, é o conjunto das sequências narrativas; já fundo diz respeito a

fatores que estão fora da sequência em si, embora, de certa maneira, a

completem.

Esse conceito de planos discursivos está diretamente relacionado, de

acordo com Hopper e Thompson (1980), ao de transitividade. Dado isso, ambos

serão tratados em conjunto. Segundo esses autores, uma cláusula com alta

transitividade tende a funcionar no discurso no plano de figura, enquanto uma

com baixa transitividade tende a funcionar no discurso no plano de fundo.

De acordo com esses autores, a transitividade está relacionada à

efetividade de uma dada ação; isto é, quanto mais efetiva a ação, mais transitiva

é a sentença. Relaciona-se, também, à transferência, que se dá de um agente

para um paciente. Dessa forma, uma sentença transitiva envolve, ao menos,

dois participantes. Segue abaixo um quadro com os componentes considerados

para a verificação do grau de transitividade para os autores supracitados.

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46

COMPONENTES ALTA TRANSITIVIDADE BAIXA TRANSITIVIDADE

1 Participantes um dois

2 Cinese ação não-ação

3 Aspecto télico atélico

4 Pontualidade pontual não-pontual

5 Volitividade intencional não-intencional

6 Polaridade afirmativa negativa

7 Modalidade modo realis modo irrealis

8 Agentividade mais agente menos agente

9 Afetamento do Objeto totalmente afetado não-afetado

10 Individualização do objeto muito individualizado não-individualizado

Quadro 4 – Componentes considerados em relação à transitividade por Hopper e Thompson (1980)

Esses componentes são utilizados para a verificação do grau de

transitividade da sentença através da atribuição de pontuação um para cada

item que confere alta transitividade à sentença e pontuação zero para os que

conferem baixa transitividade. Com base na baixa ou alta transitividade

apresentada pelas sentenças, é possível enquadrá-las nos planos discursivos

figura e fundo. Conforme os autores, os planos discursivos devem ser

analisados não só a partir de uma propriedade, mas de um conjunto delas.

Sobre os componentes, os autores defendem que só há transferência de

uma ação se houver, ao menos, dois participantes. Em relação à cinese, só há

transferência se houver ação; os estados não envolvem transferências entre

participantes. O aspecto diz respeito à completude da ação, em uma ação

perfectiva, a transferência é mais certa do que em uma ação em progresso. A

pontualidade é relacionada à duração, ações que se dão sem uma fase de

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47

transição são mais efetivas que as que envolvem uma duração maior ou as

contínuas. Há volitividade quando o agente tem o propósito de fazer algo. A

polaridade é ligada a sentenças afirmativas, que indicam as ações que, de fato,

ocorreram, ou negativas, que indicam as ações que não se efetivaram. A

modalidade também está relacionada à concretização de uma ação: o modo

realis indica que algo, de fato, ocorreu, e o irrealis, algo que ainda não ocorreu.

Sobre a agentividade, um participante que é mais ativo pode transferir uma

ação mais efetivamente que um participante não ativo. Se o objeto é afetado, a

transferência se dá em maior grau. E, por fim, para a individualização do

objeto, Hopper e Thompson (1980) apresentam cinco fatores, conforme quadro

abaixo. O objeto será mais individualizado quanto mais características das

apresentadas na coluna “individualizado” do quadro o objeto possuir.

Individualizado Não-individualizado

próprio comum

humano, animado inanimado

concreto abstrato

singular plural

contável incontável

determinado, específico não-determinado

Quadro 5 – Fatores considerados na individualização do objeto por Hopper e Thompson (1980)

Com base nesses aspectos, percebe-se que a transitividade está presente

em diferentes partes de uma cláusula. Assim, a depender dessas partes, uma

sentença pode ser caracterizada como mais transitiva ou menos transitiva, de

acordo com uma noção de continuum (não categórico), uma concepção escalar.

Além disso, um componente da transitividade pode influenciar outro. A partir

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48

dessa escala de transitividade, chega-se ao plano discursivo em que se encontra

o trecho no texto, conforme exemplo abaixo:

11. O dia amanheceu claro. Não tinha sol, mas, felismente, já não chovia

mais.

Era dia do meu aniversário, macabro porque na cidade em que eu moro

e Estile Estily, o dia do aniversário é dia de tortura. Falanse que a um

fantasma que aterrorisa a cidade a mais de 100 anos.

Todo mundo da cidade quando alguêm faz aniversário todo mundo foge

do local e vai para outro bem longe tem lendas que se o fantasma pegar

vai torturar até sair sangue. [Redação, 6º ano EF]

Fundo Figura

O dia amanheceu claro. Não tinha sol,

mas, felismente, já não chovia mais.

Era dia do meu aniversário, macabro

orque na cidade em que eu moro e

Estile Estily, o dia do aniversário é dia

de tortura.

Todo mundo da cidade quando

alguêm faz aniversário todo mundo

foge do local e vai para outro bem

longe tem lendas que se o fantasma

pegar vai torturar até sair sangue.

Falanse que a um fantasma que

aterrorisa a cidade a mais de 100 anos.

No texto acima, pode-se verificar que a sentença formada pela expressão

temporal com o verbo haver se encontra no plano discursivo figura, porque

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49

apresenta alto grau de transitividade. Possui dois participantes (fantasma e

cidade); é uma ação na modalidade afirmativa; o sujeito é intencional e agente,

enquanto o objeto é afetado e individuado. Essa sentença apresenta pontuação

8, pois o verbo não é pontual e o aspecto dele não é perfectivo.

Silveira (1990), em estudo sobre a relevância em narrativas orais, faz uma

releitura da proposta de Hopper (1979). A autora destaca que Hopper (1979)

caracteriza figura pela sequencialidade e, então, propõe uma revisão desse

conceito, afirmando que, além da sequencialidade, a importância é outro fator

característico das cláusulas-figura.

Ela propõe também uma revisão do conceito de fundo, já que considera

muito abrangente a definição apresentada por Hopper (1979) de que essas

cláusulas ampliam e comentam as afirmações feitas pela figura. Segundo ela, há

distintos tipos de cláusulas-fundo e em seu estudo verificou 17 tipos dessas

cláusulas.

Assim, Silveira (1990) propõe uma hierarquia de fundidade abordando

os planos de figura e fundo como um processo contínuo. Para ela, há tipos de

fundo que se aproximam mais da figura e outros que se afastam. Adota, então,

em sua análise, cinco níveis de fundidade:

1º - apresentam informações concretas sobre o evento;

2º - especificam o âmbito em que os fatos ocorrem, as circunstâncias;

3º - especificam a cláusula anterior, ampliando as informações sobre ela;

4º - especificam relações inferidas dos fatos narrados através de especificação;

5º - apresentam interferências do falante no evento que está narrando.

Sobre a hierarquia proposta, a autora ressalta que serve apenas aos dados

de sua análise. No presente estudo, também será adotada uma hierarquia de

fundidade. Essa, porém, será baseada nos parâmetros de transitividade (cf. 4.2.).

Page 50: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

50

2.1.2. Fluxo de informação

Na análise sobre a funcionalidade das expressões temporais formadas

por haver, chama atenção a questão da ordenação dos elementos na sentença,

que parece estar relacionada a aspectos discursivo-pragmáticos, como o fluxo

informacional. Sendo assim, fazem-se de extrema importância os postulados

sobre tal assunto neste trabalho. Dentre os autores que tratam o status

informacional, destacam-se Prince (1981) e Chafe (1984).

Prince contempla (a) a menção ou não do referente na sequência textual

anterior ou (b) sua presença no contexto situacional, adota as noções de

predicabilidade/recuperabilidade e conhecimento partilhado. Considera quatro

possibilidades de status informacional: novo em folha, inferível, disponível e

evocado. Por outro lado, Chafe não parte da menção no texto, mas centra-se na

noção de consciência do falante, em como são tratados os conceitos. Reformula,

então, a terminologia tradicional nova/velha e dado/novo em ativa,

previamente inativa, informações acessíveis ou previamente semi-ativas.

Optou-se, para a análise dos dados, pela adoção das categorias propostas

por Chafe (1984), focadas na consciência do falante. Segundo Furtado da Cunha

(2003:43), “a informatividade manifesta-se em todos os níveis da codificação

lingüística e diz respeito ao que os interlocutores compartilham, ou supõe que

compartilham, na interação”. O falante, na situação comunicativa, pressupõe o

que é ou não conhecido pelo ouvinte, e busca, a partir disso, moldar seu

discurso marcando as informações mais relevantes e as que seriam

desconhecidas do interlocutor.

Segundo Chafe (1984), o status informacional é relacionado a aspectos

cognitivos, tem relação com o “empacotamento” da informação, ou seja, com a

maneira como ela é armazenada na memória. O teórico preocupa-se, então, com

o que se passa na cabeça do falante quando manipula informação nova e velha,

tópico e comentário, sujeitos e predicados, unidades entonacionais, orações,

períodos e parágrafos — conceitos que, segundo o autor, são manifestações de

processos cognitivos básicos.

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51

Ao analisar cognitivamente o fluxo de informação, Chafe reavalia os

conceitos de dado e novo e propõe em seu lugar os termos informação ativa

(que está no foco de consciência do falante), previamente inativa (localizados na

memória de longo prazo) e adiciona o conceito de informação semi-ativa (está

na consciência periférica, mas não no foco).

Afirma, também, que, embora a mente armazene muitas informações, a

cada momento apenas uma pequena parte pode estar ativa ou estar em foco,

devido a limitada capacidade do ser humano de ativar informações. Essas

informações temporariamente ativas são verbalizadas pelo falante, uma após a

outra, e cada porção dessas de informação compõe uma unidade entonacional.

Chafe define unidade entonacional como “uma seqüência de palavras

combinadas sob um único e coerente contorno entonacional, geralmente

precedido por uma pausa” (op. cit.: 22). As unidades entonacionais são,

geralmente, orações e servem para desenvolver o fluxo informacional no

discurso. Não ocorrem dois conceitos novos em uma única unidade

entonacional e elas têm a função de fornecer orientação (temporal, espacial,

epistêmica) para as adjacentes, seja anterior ou posterior. As ideias que são

expressas em unidades entonacionais (objetos, eventos e propriedades) são

denominadas pelo autor de conceitos. Os estados de ativação referem-se aos

conceitos que residem nas partes de informações expressas na unidade

entonacional.

Segundo Chafe, quando os conceitos estão ativados na mente do

comunicante, o mesmo julga que estejam também ativos para o interlocutor,

visto que são informações velhas. Esses conceitos são pronunciados de forma

atenuada (átona) e são passíveis de pronominalização ou omissão. Porém,

quando o comunicante reintroduz ou enfatiza uma informação já ativa, o

pronome pode aparecer com acento forte para contrastar com o discurso

anterior.

Os conceitos semi-ativos são aqueles dos quais os participantes têm

consciência ou conhecimento. Um conceito pode tornar-se semi-ativo por

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52

desativação de um estado ativo anterior ou por associação a esquemas

cognitivos. Essa associação ocorre porque, quando um dado esquema é evocado

no discurso, conceitos relacionados a ele passam ao estado de semi-ativação,

podem ser inferíveis.

Os conceitos inativos são aqueles que não se tornaram ativos nem pelo

discurso prévio nem por evocação de esquema cognitivo, são informações

novas. Trazer esses conceitos não ativados requer um maior esforço cognitivo,

por isso só se ativa um conceito por vez durante a pausa inicial, que tem uma

duração maior.

Há duas formas de ativação de um conceito: passagem do estado

previamente não ativo para o ativo ou do semi-ativo para o ativo

(rememoração). E uma para a desativação de um conceito: passagem do estado

ativo para o semi-ativo.

No trecho abaixo, há um exemplo de ativação de um conceito

previamente inativo. Trata-se da introdução de uma informação nova. Ainda

não havia sido feita, no texto, qualquer referência à Guerra Mundial.

12. A Copa do Mundo do Brasil em 1950

A Segunda Guerra Mundial terminara havia cinco anos. E os países

europeus, com as finanças arrasadas, não puderam bancar a realização

da Copa do Mundo. O Brasil se apresentou como solução e pôs fim ao

período de 12 anos sem o maior evento do futebol (o último Mundial

tinha sido em 1938, na França). O país construiu o maior estádio do

planeta na época, o Maracanã. [Jornal, O Globo]

No exemplo 13, por outro lado, a expressão representa um conceito semi-

ativo. Já no título há informação sobre o grande número de assaltos. Então,

devido a uma associação a esquemas cognitivos, torna-se acessível a informação

de que “Há duas semanas, três homens armados invadiram, no início da

manhã, um prédio na Rua General Roca”.

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53

13. Assaltos sobem 87%

Os índices da violência de julho, os últimos divulgados pelo Instituto de

Segurança Pública (ISP), da Secretaria de Segurança, mostram que o

número de assaltos a residências subiu 31% no estado, passando de 98

casos, em 2008, para 129 este ano. Na capital, o aumento foi maior: 87%,

de 24 casos, em julho de 2008, para 45, em julho deste ano. Segundo a

polícia, há quatro quadrilhas atuando na capital.

Há duas semanas, três homens armados invadiram, no início da manhã,

um prédio na Rua General Roca, na Tijuca. Os criminosos saquearam

cinco dos 14 apartamentos. (...) [Jornal, O Globo]

No trecho abaixo, há um exemplo de um conceito que estava

previamente ativo:

14. (...) Depois eu fui para casa do meu avó e passei o carnaval inteiro la foi

muito legal e me diverti bastante e reencontrei meus amigos porque eu

nasci e morei lá por bastante tempo, mas me mudei para o maracanã e

tou morando lá a 2 anos e meio (...) [Redação, 9º ano EF]

O narrador primeiro afirma que se mudou para o Maracanã, assim ativa

o conceito de que mora no Maracanã; depois afirma morar nesse lugar há 2

anos e meio, retomando o conceito.

Os autores afirmam que a forma mais comum de se apresentar uma

informação é escolher um conceito como ponto de partida e adicionar

informação acerca dele. A relação entre os conceitos de “ponto de partida” e

“informação acrescentada” ocorre ao passo que, geralmente, aquele é um

referente ativado (velho) ou acessível, só será novo no início do discurso, e este

contém um conceito novo, pode conter conceitos acessíveis, ou mesmo velho, se

expressar um contraste.

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54

O conceito de oração aqui é ampliado (extended clauses), abrangendo

orações simples ou acrescidas de fragmentos de orações, orientações, etc. As

orações são unidades que os falantes encadeiam com marcas de conexão, tais

como e, aí, então etc. Vale ressaltar que o estudo do autor é baseado na língua

oral espontânea, e o presente trabalho centra-se na língua escrita; por isso, há

adaptações dos conceitos.

2.1.3. Processo de Gramaticalização

O termo gramaticalização é adotado por diversos autores funcionalistas

que investigam mudanças linguísticas decorrentes do uso; mas, segundo Moura

Neves (2004), há várias divergências e abrangências em relação a esse termo.

Identificam-se diferentes definições para gramaticalização, de acordo com a

concepção de cada estudioso.

Segundo Heine (2003), os estudos acerca da gramaticalização se dividem

em três fases históricas: i) filósofos franceses e ingleses do século XVIII, tais

como Etienne Bonnot de Condillac e John Horne Tooke; ii) linguistas alemães

do século XIX e início do século XX, Franz Bopp e Meillet e iii) Talmy Givón,

como principal representante da década de 70 em diante. Meillet é apontado

como o primeiro estudioso a definir gramaticalização tal como é concebida hoje.

Segundo ele, o termo refere-se “à passagem de uma palavra autônoma, à função

de elemento gramatical” (Meillet, 1912 apud Gonçalves, Lima-Hernandes e

Casseb-Galvão, 2007:19).

Para Moura Neves (2004), nas décadas de 80 e 90, autores tais como

Traugott e Heine apresentam ideias que vão ao encontro das do precursor

Meillet. Eles relacionam gramaticalização à parte da teoria da linguagem

ocupada pela interdependência entre langue e parole, o categorial e o menos

categorial, o fixo e o menos fixo da língua. Heine (2003) indica contribuições de

alguns autores para as teorias sobre gramaticalização, tais como: i) Traugott,

que colaborou com novas maneiras para a reconstrução da mudança semântica;

ii) Bybee, que se ocupou da descrição e explicação das estruturas de categorias

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55

gramaticais de diferentes línguas; iii) Hopper, que evidenciou um movimento

contínuo envolvido em estratégias recorrentes usadas na construção de

discursos. Por fim, há a contribuição de Heine (2003), segundo o qual a

principal motivação que orienta a gramaticalização é a comunicação.

Neste trabalho, adotam-se os parâmetros e/ou princípios discutidos em

Hopper (1991), Heine (2003), Bybee (2003). Esses princípios enfatizam o aspecto

gradual da gramaticalização, visto que conferem aos elementos analisados o

grau de “mais” ou “menos” gramaticalizados. A gramaticalização, aqui, é vista,

então, como um processo por meio do qual elementos lexicais, ao longo do

tempo, se desenvolvem passando a elementos gramaticais em certas

construções, que podem tornar-se mais gramaticais ainda — um processo que

segue um continuum de mudança.

Nesse processo de mudança, um elemento ou expressão é utilizado(a)

desempenhando novas funções gramaticais ou novos significados na

organização da frase/discurso, diferentes do(a) inicial. Martelotta (2006) define

o termo gramaticalização como

processo unidirecional, segundo o qual itens lexicais e construções

sintáticas, em determinados contextos, passam a assumir funções

gramaticais e, uma vez gramaticalizados, continuam a desenvolver

novas funções gramaticais. Com o processo de gramaticalização, que

ocorre basicamente com itens ou expressões muito freqüentes, o termo

tende a sofrer desgaste fonético e perder expressividade, deixando de

fazer referência a entidades do mundo biossocial para assumir

funções de caráter gramatical, como ligar partes do texto, indicar

categorias gramaticais como o tempo de um verbo ou o gênero de um

nome.

Segundo Heine et alii (1991), no processo de gramaticalização está

envolvido o mecanismo da metáfora. Para a adoção de rótulos para novos

conceitos, a estratégia mais recorrente é a utilização de formas já existentes na

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56

língua, que são introduzidas em contextos novos e aplicadas a novas situações.

Os autores apontam que conceitos mais concretos são usados para apresentar

conceitos menos concretos, conforme a escala de graus de abstração metafórica:

PESSOA > OBJETO > ATIVIDADE > ESPAÇO > TEMPO > QUALIDADE

Objetos concretos (partes do corpo), processos, verbos servem,

geralmente, como pontos de partida do processo de gramaticalização. O

processo, porém, tende a resultar em noções mais abstratas e elementos

relativos à organização interna do texto.

Heine (2003) apresenta quatro mecanismos básicos envolvidos na

gramaticalização de expressões linguísticas:

i) Dessemantização (bleaching) – perda semântica que uma expressão sofre num

determinado contexto;

ii) Extensão – uso de uma expressão em novos contextos;

iii) Decategorização – perda de propriedades características das formas fonte,

perda morfossintática;

iv) Erosão (redução fonética) – é a perda de substância fonética.

Esses mecanismos não são específicos de gramaticalização, mas, estando

inter-relacionados, são responsáveis por ela.

O autor descreve um modelo do processo de gramaticalização: há uma

expressão linguística A que é recrutada para a gramaticalização, ela adquire um

novo uso B, havendo ambiguidade entre A e B, depois A é perdido, havendo

somente o uso B. Porém, Heine afirma que nem todas as expressões linguísticas

chegam ao uso B.

Hopper (1991) propõe cinco princípios essenciais que auxiliam na

verificação dos estágios iniciais do processo de gramaticalização. São eles:

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57

i) estratificação (layring) – em um domínio funcional complexo, surgem novas

formas que coexistem e interagem com as antigas, que não necessariamente

deixam de ser produzidas. Ou seja, está relacionado à tendência de as línguas

apresentarem mais de uma forma para desempenhar funções idênticas.

(ii) divergência (divergence) – quando uma forma sofre gramaticalização, pode

preservar sua forma lexical de origem, estando sujeita às mesmas mudanças de

qualquer outro item lexical. Da mesma origem podem surgir várias formas com

diferentes funções.

OBS: A diferença entre estratificação e divergência é que neste um mesmo item

lexical se gramaticaliza em um contexto e não em outro, e naquele, domínios

funcionais similares envolvem itens lexicais diferentes.

iii) especialização (specialization) – há uma redução de funções da forma

gramaticalizada, isto é, um estreitamento de possibilidades para expressão de

uma dada noção gramatical, assim, um número menor de formas assume a

expressão de sentidos mais gerais.

iv) persistência (persistence) – após passar pelo processo de gramaticalização,

uma forma pode continuar com traços de seu significado original e pode

manter também particularidades de sua história.

v) decategorização (de-categorization) – a forma gramaticalizada tende a perder

marcas morfológicas ou privilégios sintáticos característicos de categorias

plenas e passam a assumir características de categorias secundárias.

Um fator considerado como caracterizador do processo de

gramaticalização é a frequência de uso, segundo Bybee (2003). Quando uma

forma passa a ocorrer com maior frequência, ela começa a ser interpretada

como uma forma ‘padrão’ para expressar um conceito — há uma “ritualização”,

dada a repetição do processo. Essa ritualização é característica da

gramaticalização, visto que uma expressão usada de modo frequente passa a ser

automática, como uma única unidade de processamento, e seus componentes

Page 58: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

58

individuais podem sofrer um enfraquecimento semântico, desassociando-se dos

demais usos.

O autor chama atenção para o fato de que toda a construção sofre

gramaticalização, não apenas o item — o processo ocorre porque o elemento

está inserido em um dado contexto. A frequência não é apenas o resultado da

gramaticalização, mas também um fator motivador de tal processo. Bybee

indica que frequência provoca:

1) um enfraquecimento da força semântica de determinado item linguístico pelo

hábito;

2) a redução ou fusão fonológica da construção em sentenças de informação

velha ou de fundo;

3) o condicionamento de uma maior autonomia para a construção, gerando

enfraquecimento ou perda de associação com outros usos dos mesmos itens;

4) a perda da transparência semântica, o que propicia o uso da construção em

novos contextos, estabelecendo mudança semântica;

5) a autonomia do elemento frequente, o que faz com que ele fique mais fixo na

língua.

Há dois métodos de controle frequência: o que examina a frequência de

ocorrência – que diz respeito à produtividade de um item em um dado corpus; e

o que verifica a frequência de tipo, relacionada a uma estrutura em particular,

um padrão específico dentre os possíveis.

Vale ressaltar que, conforme Hopper & Traugott (1993), há dois pontos

de vista para o estudo da gramaticalização: o histórico, focado no percurso

diacrônico de algumas formas linguísticas e nas mudanças típicas que as

afetam; e o mais focado nos padrões fluidos do uso linguístico, observando o

processo que pode passar por um percurso completo de mudança ou ser

interrompido em certo ponto. Este estudo caracteriza-se como o segundo tipo,

uma observação dos usos linguísticos de forma sincrônica.

Page 59: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

59

2.2. Gêneros e tipologias textuais

A análise das características gerais das expressões em cada subamostra

adotada nesta pesquisa indicou a necessidade de entendimento dos gêneros

textuais que compõem o corpus. Assim, fez-se um levantamento teórico,

primeiramente, sobre gêneros e tipos textuais — em especial a tipologia

narrativa — e, em seguida, sobre o gênero notícia jornalística e o gênero

narrativa escolar.

O tratamento de gêneros textuais requer, primeiramente, o entendimento

do que é texto. Nesta análise, adotou-se o conceito de Koch & Travaglia (1991),

que caracterizam texto como

unidade lingüística concreta — perceptível pela visão ou audição —

que é tomada pelos usuários da língua — falante, escritor/ouvinte,

leitor — em uma situação de interação comunicativa, como uma

unidade de sentido e como preenchendo uma função comunicativa

reconhecível e reconhecida, independentemente da sua extensão. (op.

cit.: 10).

Segundo os PCN (1998:21), “O discurso, quando produzido, manifesta-se

linguisticamente por meio de textos. O produto da atividade discursiva oral ou

escrita que forma um todo significativo, qualquer que seja a sua extensão, é o

texto.”

Para o entendimento dos gêneros, tomou-se como base, entre outras, a

visão de Marcuschi (2002), que define gêneros textuais como textos

materializados, do cotidiano, que apresentam características sócio-cognitivas

definidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição

característica. Aponta, também, que os gêneros se organizam internamente de

diferentes maneiras, e a essas formas de organização textual chamam-se tipos

textuais.

Page 60: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

60

Travaglia (2007) indica que o gênero se caracteriza por exercer uma

função social específica de comunicação e que cada gênero possui uma função

sociocomunicativa. Ressalta, também, a natureza social dos gêneros, exterior ao

texto. Os falantes conhecem diversos gêneros e sabem qual gênero usar em cada

situação.

Mikhail Bakhtin define os gêneros como “tipos relativamente estáveis de

enunciados” (BAKHTIN, 1997, p. 279) e aponta:

A utilização da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e

escritos), concretos e únicos, que emanam dos integrantes duma ou

doutra esfera da atividade humana. O enunciado reflete as condições

específicas e as finalidades de cada uma dessas esferas. (BAKHTIN,

1997, p. 279).

O tipo textual é definido, segundo Marcuschi (2002), pela natureza

linguística de sua composição, isto é, os aspectos lexicais, sintáticos, tempos

verbais e relações lógicas. No quadro abaixo, Marcuschi (2002:23) diferencia

tipos e gêneros textuais:

TIPOS TEXTUAIS GÊNEROS TEXTUAIS

• Constructos teóricos definidos por

propriedades lingüísticas intrínsecas.

• Constituem seqüências lingüísticas ou

seqüências de enunciados e não são

textos empíricos.

• Sua nomeação abrange um conjunto

limitado de categorias teóricas

determinadas por aspectos lexicais,

sintáticos, relações lógicas, tempo

• Realizações lingüísticas concretas

definidas por propriedades sócio-

comunicativas.

• Constituem textos empiricamente

realizados cumprindo funções em

situações comunicativas.

• Sua nomeação abrange um conjunto

aberto e praticamente ilimitado de

designações concretas determinadas

Page 61: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

61

verbal.

• Designações teóricas dos tipos:

narração, argumentação, descrição,

injunção, exposição.

pelo canal, estilo, conteúdo,

composição e função.

• Exemplos de gênero: telefone,

sermão, carta comercial, romance,

bilhete, aula expositiva, reunião de

condomínio, horóscopo, outros...

Quadro 6 - Caracterização de gêneros e tipos textuais segundo Marcuschi (2002)

Marcuschi (2002:25) destaca que todos os gêneros são organizados por

tipos textuais, e um único gênero pode realizar diferentes tipos. “Assim, um

texto é em geral tipologicamente variado (heterogêneo)”. Ainda segundo ele,

“quando se nomeia um certo texto como ‘narrativo’, ‘descritivo’ ou

‘argumentativo’, não se está nomeando o gênero e sim o predomínio de um

tipo de sequencia base. (op. cit.: 27)

O autor indica que os tipos textuais se definem pelos traços linguísticos

predominantes, tais como aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações

lógicas. Compõem-se pelos conjuntos de traços que formam uma sequência.

Marcuschi apresenta, então, cinco tipos textuais com base em Werlich (1973):

argumentativo, descritivo, expositivo, injuntivo e narrativo.

Segundo Travaglia (2007), a tipologia é constituída pelo modo de

comunicação, varia de acordo com a maneira de interlocução adotada pelo

produtor. Ele aponta quatro tipos textuais: descrição, dissertação, narração e

injunção.

Em especial sobre o tipo narrativo, Travaglia (1991) indica:

O tipo narrativo tem como conteúdo temático os acontecimentos ou

fatos organizados em episódios (indicação e detalhamento —

geralmente por meio de descrição — de lugar, tempo,

participantes/actantes/personagens + acontecimento: ações, fatos ou

fenômenos que ocorrem) (apud Travaglia, 2007:43)

Page 62: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

62

O autor detalha algumas características da tipologia textual narrativa

(Travaglia, 2003).16

Perspectiva do produtor do

texto

Enunciador na perspectiva do fazer /acontecer

inserido no tempo.

Objetivo do enunciador

O que se quer é contar, dizer os fatos, os

acontecimentos, entendidos como os episódios, a

ação/o fato em sua ocorrência.

Forma como se instaura o

interlocutor

Como assistente, espectador não participante, que

apenas toma conhecimento do(s) episódio(s)

ocorrido(s).

Tempo referencial Não simultaneidade das situações, portanto

sucessão.

Relação entre o tempo de

enunciação e o referencial.

O tempo da enunciação pode ser posterior,

simultâneo ou anterior ao tempo referencial.

Quadro 7 – Quadro adaptado das características da tipologia textual narrativa

Em seu estudo sobre o funcionamento textual-discursivo do verbo no

Português do Brasil, Travaglia (1991) menciona relações entre o uso dos tipos

de verbos e situações por eles indicadas e o uso das formas e categorias verbais

e os tipos de textos (descrição, dissertação, injunção e narração). Destacam-se,

então, alguns pontos característicos dos verbos nos textos narrativos:

a) os verbos gramaticais predominantes são os marcadores temporais

e os auxiliares aspectuais, o que é coerente com a propriedade dada

pela perspectiva de inserção no tempo e também os auxiliares

semânticos (que dão detalhes ou nuances dos fatos narrados); 16 Quadro adaptado de Travaglia 2003. No original são tratados os quatro tipos textuais, aqui optou-se pela exposição apenas da tipologia narrativa – foco de análise.

Page 63: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

63

b) são constituídos essencialmente por verbos dinâmicos (ações, fatos,

fenômenos, transformativos);

c) aparecem verbos enunciativos de contar e assistir, já que o produtor

é o contador e o receptor é o assistente dos episódios: presenciar,

assistir, ver (tudo/o que acontecer/suceder/ocorrer), contar, relatar,

narrar, falar/dizer (tudo/o que acontecer/ suceder/ocorrer);

d) só são possíveis com o aspecto perfectivo que caracteriza a

narração. Dos aspectos de duração, os mais característicos da narração

são o durativo, o iterativo e o pontual;

e) as modalidades características desse tipo de texto são a certeza e a

probabilidade, uma vez que são os textos que dão a conhecer os

acontecimentos;

f) também para a narração o tempo atualizado depende da relação

entre o tempo referencial e o da enunciação: a) presente na narração

presente (85,65% dos verbos com tempo atualizado. O passado

aparece com função retrospectiva.); b) passado na narração passada

(98,50% dos verbos com tempo atualizado). O presente aparece com

função de relevo emocional; c) futuro nas narrações futuras (os dados

não foram quantitativamente significativos, mas confirmam a

hipótese). (apud Travaglia, 2007:66)

Por fim, pode-se definir narrativa como:

entidade formal e funcional. Formal na medida em que se identifica

como discurso constituído à base de padrões recorrentes,

característicos, discriminados desde o nível da oração, passando por

unidades maiores, até o nível da narrativa simples completa.

Funcional, na medida em que esses padrões são identificados a partir

das funções que o discurso narrativo cumpre na situação da

comunicação: uma ‘função referencial’, uma vez que uma de suas

finalidades é recapitular experiências passadas, com a

particularidade de que a seqüência das orações narrativas se

organiza de maneira semelhante à seqüência temporal dos

acontecimentos vividos pelo personagem-narrador, e uma ‘função

Page 64: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

64

avaliativa’, desde que, normalmente, o relato da experiência

passada revela o empenho pessoal do narrador no sentido de

valorizar os fatos narrados de forma a acentuar seu caráter 'narrável'.”

(LABOV & WALETZKY apud BASTOS, 1985, p. 23-4).

Com base nas propostas acima, caracterizam-se tanto as narrativas

escolares quanto as notícias jornalísticas como textos do tipo narrativo. A

seguir, procura-se caracterizar os dois gêneros textuais que compõem o corpus

dessa pesquisa.

2.2.1. Notícia jornalística

A notícia é um gênero bastante comum, do qual muitos usuários da

língua têm conhecimento e, por conseguinte, domínio, tanto no que diz respeito

à sua identificação/reconhecimento quanto ao emprego/produção. Ela é

caracterizada como um meio de divulgação de dados ou acontecimentos

socialmente relevantes no passado, presente ou futuro. Pode tratar de diferentes

assuntos, tais como política, economia, cultura, esporte etc.

Como em qualquer enunciado, identificam-se nas notícias um

enunciador (quem fala/produz o texto), seu interlocutor (para quem se

fala/produz) e um suporte (meio através do qual se efetua a comunicação). Os

textos analisados têm como suporte um jornal impresso. O enunciador é um

jornalista que tem como objetivo principal fazer de seu texto uma fonte de

informação. Esse enunciador centra-se na informação e no leitor, seu

interlocutor. Para garantir a precisão, oferece dados estatísticos, depoimentos,

indicações exatas das pessoas do discurso, do tempo e do espaço.

O enunciador usa, ainda, como recurso para provocar uma identificação

com o leitor uma linguagem objetiva em um texto sintético, formulado em

terceira pessoa. Devido à necessidade de concisão, e ao auxílio de outros

recursos, tais como fotografias e infográficos, o texto noticioso é, geralmente,

simplificado, e centrado nos elementos que potencialmente podem atrair a

Page 65: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

65

atenção. As notícias são predominantemente do tipo narrativo, mas comumente

apresentam trechos descritivos e podem conter trechos dissertativos/

argumentativos.

Sobre a estrutura, sabe-se que, em geral, na porção inicial, há indicação

do que se trata o texto, declarando o evento principal e/ou outros eventos.

Aparecem inicialmente duas partes destacadas com letra diferenciada: o título

principal ou manchete e o subtítulo da manchete.

Na primeira sentença ou parágrafo da notícia, aparece o Lead, que repete

a declaração inicial e busca esclarecer as questões Quem?, O quê?, Onde?,

Quando? e Como?. Esse recurso facilita a compreensão do texto, já que esclarece

para o leitor o evento narrado e seus participantes.

No corpo do texto aparecem informações adicionais que situam e dão

clareza ao fato narrado. Em algumas notícias há um ativamento de informações

relacionadas à principal, com a inserção de dados relevantes para a

compreensão do evento. Essas informações podem ser de contexto (presente) —

correspondendo ao momento ou à situação em que o evento ocorre — ou

histórica (passado) — informando o leitor sobre circunstâncias anteriores ao

evento narrado.

As notícias podem apresentar, ainda, algumas consequências ou

indicações sobre o assunto. Podem dar informações posteriores ao evento,

declarações de envolvidos, ou de pessoas relacionadas ao acontecimento e as

implicações do evento narrado.

Há um esquema convencional da estrutura das notícias que é chamado

de pirâmide invertida:

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66

_____________________________________________

Quem • O quê • Quando • Onde • Como • Por Quê (leade)

_____________________________________

Informações que complementam o leade

_______________________________

Detalhes de importância mediana

_________________________

Detalhes secundários

________________

(Zanchetta apud Frare & Oliveira, 2006)

Alguns desses pontos podem ser verificados na notícia jornalística da

subamostra do jornal O Globo que segue abaixo:

Título

Subtítulo

Lead

Evento

Contexto

presente

15. PMS EVITAM QUE MAIS UM ÔNIBUS SEJA INCENDIADO EM

FAVELA NA MARÉ

Criminosos assaltaram passageiros na Linha Amarela e sequestraram

veículo

A rápida ação de policiais do 22º BPM (Penha) evitou ontem de manhã

que traficantes da Vila do João, no Complexo da Maré, em Bonsucesso,

incendiassem um ônibus da linha 485 (Penha-Leblon), que fora assaltado

e sequestrado momentos antes num ponto na Linha Amarela, perto da

Vila dos Pinheiros.

Quando se preparavam para atear fogo ao veículo, os criminosos foram

surpreendidos pelos PMs. Os bandidos fugiram e o ônibus foi levado

pelos policiais para a 21ª DP (Bonsucesso).

Eram cerca de 6h quando três homens, um deles armado de pistola,

fizeram sinal ontem para o 485 parar. Os cerca de 35 passageiros foram

saqueados e liberados. Já o motorista e o trocador foram obrigados a

seguir com os bandidos até a Vila do João, onde só então receberam

ordem para descer.

Page 67: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

67

Conse-

quências

Contexto

passado

Contexto

passado

Depois que os policiais resgataram o veículo, o motorista, que pediu para

não ser identificado, contou que ficara o tempo todo com uma arma

encostada em sua cabeça.

Ele informou que o ônibus não tem câmeras.

Polícia diz que parte do bando já foi identificada.

Segundo policiais da 21ª DP, parte da quadrilha que vem assaltando

ônibus na região já está identificada.

— Estamos de olho naquela região — disse a delegada titular Valéria de

Castro. — A Polícia Militar chegou a tempo de evitar que o ônibus fosse

incendiado. O veículo estava cheio de trabalhadores.

Eles tiveram roubados celulares e dinheiro.

Há oito dias, num caso parecido, quatro criminosos incendiaram um

ônibus da linha 634A (Ilha do Fundão-Del Castilho, que faz integração

com o metrô), na Vila dos Pinheiros, também na Maré, depois de

sequestrá-lo na Linha Amarela e assaltar os passageiros.

Os bandidos aproveitaram que o ônibus parou num ponto da via

expressa para render o motorista, que foi obrigado a levar o veículo para

a favela. Lá, cerca de 30 passageiros foram saqueados e depois receberam

ordem para desembarcar.

O ônibus, então, foi incendiado.

Policiais do 22º BPM (Maré) e do Serviço Reservado (P2) chegaram à

comunidade logo depois, mas não conseguiram evitar que o veículo fosse

destruído.

Segundo a delegada Valéria de Castro, tanto no caso de ontem como no

anterior, o ônibus foi sequestrado no mesmo ponto.

Ela informou que o trecho é o mesmo também onde, no dia 5 deste mês, a

professora de educação física Ciléa Cordeiro, de 27 anos, teve seu carro

atingido por uma pedra. Perto dali também, o fiscal da Secretaria de

Transportes Marcos Tognozzi teve o carro atacado a pedradas no último

dia 16.

Ônibus com funcionários da Petrobras também foi atacado Outro caso

registrado na Linha Amarela aconteceu no dia 26 de agosto passado. As

vítimas foram funcionários da Petrobras que eram levados para o

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68

2.2.2. Redação / narrativa escolar17

O gênero redação escolar é estritamente ligado à situação de ensino, é

trabalhado em sala de aula, muitas vezes sem que se considerem os contextos

extra-instituição escolar e necessidades reais de interação, comunicação e

“ação”/intervenção/participação na sociedade. O enunciador nesse gênero é

um aluno, que, em geral, tem como objetivo exclusivo atender a uma tarefa

proposta pelo professor, que, por sua vez, lê o texto, entre outras finalidades,

com o intuito de corrigi-lo.

Na tarefa de produzir redações, percebe-se uma preocupação com o

domínio das regras gramaticais do registro formal e com o atendimento à

temática dada, visto que o aluno precisa atender ao que o professor propõe para

obter o grau de excelência em jogo nesse ambiente de produção textual.

A redação escolar é um gênero produzido sob a pressão desse ambiente e

sob a pressão da hierarquia que se estabelece entre os interlocutores

(professor/aluno). Por isso, em todos os níveis de escolarização é comum os

alunos-produtores reagirem negativamente ou, pelo menos, com certo

desconforto às situações de redação propostas.

Segundo Beth Marcuschi (2005),

17 As redações adotadas na presente pesquisa são do tipo narrativo; por essa razão, como já mencionado, serão tratadas como narrativas escolares.

trabalho de ônibus.

Por volta das 7h, três criminosos armados entraram no veículo, que fez

uma parada na via expressa, perto da Vila do João, para pegar mais um

passageiro.

Dos 28 ocupantes do ônibus, oito ficaram sem joias, celulares, carteiras,

bolsas e dinheiro, entre outros objetos de valor. Segundo as vítimas, os

assaltantes pareciam calmos. Após a fuga dos criminosos, o motorista

mudou seu itinerário e foi direto para a 21ª DP.

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69

Com base em sua avaliação o professor faz com que o aluno, além de

absorver, aos poucos, a cultura escolar, incorpore a lição de que deve

escrever pouco e recorrer a frases estereotipadas. [...] Neste sentido, o

aprendiz exercita predominantemente a reprodução mecânica, e a

redação consolida-se como uma atividade controlada de escrita. (op.

cit.: 145)

As redações do tipo narrativo têm como características a presença de um

narrador, de personagens, de um fato, de acontecimentos ou ações que

localizam no tempo e no espaço. Quanto às propriedades linguísticas desse

tipo, utilizam-se referências diretas às personagens (eu, ele, meu, dele) e ao

quadro espaço-temporal (há dois anos, um dia, em São Paulo, em seu quarto

etc.), além do uso de verbos de ação no pretérito perfeito ou imperfeito. Espera-

se que nas narrativas escolares sejam apresentados elementos centrais, tais

como o anúncio do tema, apresentação de personagens, apresentação das

circunstâncias, problema, solução e a conclusão.

Segundo Bastos (2001), nas narrativas escolares é possível perceber um

maior ou menor grau de envolvimento dos alunos-produtores que depende da

situação de produção na qual ele está inserido. Esse envolvimento do aluno

pode provocar ou não particularidades no texto, tais como a presença de um

resumo/orientação ou a maneira como o aluno se coloca em seu texto.

Diferentemente das notícias, a narrativa escolar pode ser redigida em 1ª

ou 3ª pessoa. O aluno-produtor pode se incluir no texto, sendo um narrador-

personagem, ou não se incluir, sendo um narrador-observador. O narrador

pode, também, iniciar seu texto apresentando sentenças que resumem a

história, assim pode despertar o interesse do leitor.

Nas narrativas analisadas foi possível verificar os dois tipos de

narradores e ainda alguns textos iniciados por um resumo. Na narrativa (16), o

produtor do texto participa como narrador-personagem e inicia seu texto

apresentando uma orientação na frase “há dez anos ocorreu algo perigoso e

Page 70: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

70

engraçado”. Já no exemplo (17), a narração é feita em 3ª pessoa, com um

narrador-observador.

16. O afogamento

Há dez anos ocorreu algo perigoso e engraçado. Eu estava em uma

reunião em família em uma sítio, nós fomos brincar em um lago

próximo, eu estava com o meu amigo jogando a bola para lá e para cá, ó

que em um momento a bola estorou. [...] [Redação, 9º ano]

17. Em um dia bem lindo, a muito tempo atrás, um garoto chamado Walace

andava calmamente até a locadora para trocar a fita e mega drive (FIFA

98), tudo foi dando certo, mas no meio do caminho de volta para casa,o

garoto pisa em um prego enferrugado, assim fazendo o correr

desesperado para casa, após chegar em casa, sua mãe calmamente tira o

prego do seu filho e todo mundo fica feliz. Fim da historia. [Redação, 2º

ano]

Sobre a ordenação, diferentemente das notícias, é comum, nas redações

escolares, que se faça a exposição das circunstâncias e justificativas

primeiramente, para posteriormente apresentar o foco da narrativa. Segue-se,

geralmente, a estrutura de introdução, desenvolvimento e conclusão de tal

forma que se apresentam as personagens e a localização espaço-temporal, para

posteriormente construir-se a trama e apresentar-se o desfecho.

Verificam-se algumas das características mencionadas no texto abaixo,

que compõe a subamostra das narrativas escolares:

Page 71: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

71

Título

Apresentação de

personagens /

Localização

tempo- espaço

Fato

Ações/

acontecimentos

Conclusão

18. A sete anos atrás, aconteceu uma coisa muito engraçada!

Uma vez, a minha mãe estava na casa de uma amiga... E nesse dia

estava chovendo muito, então a minha mãe foi embora, e a chuva

ia cada vez mais aumentando, a minha mãe abriu o guarda-chuva

e deu na minha mão. Como eu só tinha 5 anos, eu era bem

pequenininha, e não tinha força suficiente para segurá-lo.

Então bateu um vento muito muito muito forte! E o guarda-

chuva saiu da minha mão, e desceu a rua dando cambalhotas, eu

bem que tentei correr atrás dele, mais eu não consegui.

Mais à frente eu ainda fiz o favor de pisar numa possa de lama, e

escurregar!

Moral da história: eu fiquei toda suja e molhada e no dia seguinte

o dia amanheceu ensolarado. [Narrativa escolar, 7ª. ano EF]

3. Metodologia

Este estudo sobre as expressões de tempo decorrido formadas por haver

adota essencialmente dois tipos de materiais de análise: (i) dados da variedade

brasileira do Português, representativos da modalidade escrita; (ii) material

obtido em testes de atitude aplicados a alunos e profissionais do curso de língua

portuguesa18.

3.1. Dados do comportamento observável

3.1.1 Constituição do corpus

Adotou-se, para a análise, um corpus constituído a partir de duas

diferentes subamostras, uma representativa do gênero textual narrativa escolar

e outra do gênero notícia jornalística. A opção por tais gêneros deve-se à

semelhança de tipologia textual: ambos se configuram predominantemente pela

18 Cf. anexos 1, 2 e 3

Page 72: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

72

tipologia narrativa. Optou-se pela análise apenas de textos de caráter narrativo,

devido à maior produtividade das expressões em estudo nesse tipo de discurso,

visto que tempo é um dos elementos considerados essenciais à narrativa.

Inicialmente, pretendia-se trabalhar apenas com um corpus de redações,

mas foram consultados mais de mil textos nos quais se encontraram apenas 100

dados. A necessidade de uma apreciação mais ampla sobre os usos das

expressões levou a uma ampliação do número de dados, o que se conseguiu

com a adoção da subamostra de notícias jornalísticas. Essa decisão encaminhou,

consequentemente, a pesquisa para uma comparação entre os usos das

expressões nos gêneros.

A subamostra de redações foi formada a partir de 100 textos obtidos em

função da proposta de redação feita a alunos dos ensinos fundamental e médio

de diferentes escolas situadas na cidade do Rio de Janeiro. Indicou-se o seguinte

enunciado19:

Escreva um texto contando uma história que tenha ocorrido com você

ou algum conhecido. Procure contar algo que seja engraçado, triste ou

alegre, ou seja, uma história que você ache interessante. Não se

esqueça de contar: onde, com quem e quando ocorreu a história (em

que época - se é uma história muito antiga ou recente).

As produções textuais foram acompanhadas em algumas escolas pela

pesquisadora; em outras, pelo próprio professor. Visando a diminuir os efeitos

do ambiente escolar, foi avisado aos alunos que o texto não seria corrigido pelo

professor, que os participantes não teriam os nomes divulgados e que estavam

participando de uma pesquisa.

19 Deve-se esclarecer que nem todos os dados foram provenientes da aplicação do tema específico. A fim de acrescentar a amostra, agregaram-se algumas narrativas aplicadas em aula, pelos professores, como conteúdo dos cursos e com enunciados diversos.

Page 73: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

73

A subamostra de notícias jornalísticas é formada por 100 textos de dois

jornais de circulação na cidade do Rio de Janeiro. Coletaram-se 50 dados em

textos do jornal O Globo e 50 em textos do jornal Extra, todos publicados no

período entre os anos de 2008 e 2009. Por haver discrepância entre o número de

cadernos e, consequentemente, entre o número de notícias nos dois jornais, não

há equivalência entre a quantidade de edições consultadas.

Abaixo há um quadro demonstrativo do número de textos pesquisados e

da quantidade de dados encontrados, além da distribuição dos dados por níveis

de escolaridade e pelos dois veículos jornalísticos.

Subamostra Origem dos dados Textos consultados Dados Coletados

Redações

3º , 4 e 5º anos EF 251 15

6º, 7º e 8º anos EF 314 28

9º ano EF e 1º ano EM 238 27

2º e 3º anos EM 235 30

Jornais O Globo 6 edições completas 50 dados

Extra 11 edições completas 50 dados

Quadro 8 – Distribuição dos dados: textos consultados e textos utilizados

Deve-se destacar que, em um primeiro momento de análise, se

observaram as redações narrativas de cada ano escolar separadamente. Em

seguida, foi feita uma distribuição dos textos por grupos de anos escolares. O

primeiro grupo abarca as séries do 1º segmento EF, e o segundo engloba as três

primeiras séries do 2º segmento EF. Já no terceiro grupo, foram reunidos textos

do 9º ano EF e 1º EM; tal junção foi motivada pelas semelhanças de

características gerais entre essas séries e pela finalidade de se obter um melhor

equilíbrio na distribuição dos dados. Por fim, o quarto grupo abarca as duas

séries finais no EM.

Page 74: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

74

Pretende-se, com a adoção dos duas subamostras, verificar se há

mudança nos usos das expressões em relação aos anos escolares agrupados (1º

segmento EF, 2º segmento EF, 9º ano EF e 1º ano EM, 2º e 3º anos EM) e se há

diferença de usos em relação aos dois jornais adotados (Extra e O Globo). Serão

observadas, ainda, comparativamente, as semelhanças e diferenças entre os

usos das expressões nas redações e nos jornais.

3.1.2. Procedimentos de análise dos dados do comportamento observável

Os dados das subamostras de redações e notícias foram observados de

modo a levantarem-se características gerais e específicas dos usos das

expressões temporais formadas por haver em cada gênero. Elencaram-se, então,

alguns fatores característicos percebidos nessa observação que foram agrupados

para que se procedesse a um tratamento estatístico de sua relação com o

emprego das expressões temporais.

Foi feita, assim, uma codificação dos dados de cada subamostra em

função de propriedades dos fatores detectados. Para proceder à avaliação

estatística dessas características, recorreu-se a uma ferramenta usada em

estudos sociolinguísticos, o pacote de programas GOLDVARB. Vale ressaltar

que, embora tenha sido adotado esse programa computacional, o presente

estudo não se pretende variacionista, uma vez que não há um fenômeno

variável a ser estudado e nem hipóteses que justifiquem essa orientação teórico-

metodológica. Seguiram-se apenas alguns dos procedimentos de utilização do

GOLDVARB como ferramenta auxiliar na verificação da distribuição de valores

absolutos e percentuais das expressões em estudo pelas características

examinadas.

Observou-se, na comparação, a fonte original de cada dado: a

subamostra extraída do Extra e o do O Globo para as notícias, bem como o de

cada grupo de séries para as narrativas escolares. Para esse exame, consideram-

se ainda, inicialmente, 10 fatores característicos tanto de toda a expressão como

dos elementos integrantes da mesma. Foram eles:

Page 75: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

75

• Sobre a configuração do elemento que acompanha haver

1) É um Nome ou Sintagma nominal?

2) Sua configuração é delimitável (contável) ou não?

3) Tem significado temporal ou não? Ou seja, é um predicado temporal ou

situacional/eventivo?

• Sobre a expressão

4) O valor aspectual da expressão é durativo ou pontual?

5) O ponto de ancoragem temporal ocorre na enunciação (dêitico) ou não

(anafórico)?

6) O elemento ao qual a expressão se refere é uma oração ou um nome?

7) A expressão está inserida no plano discursivo figura ou fundo?

8) O status da informação na qual está inserida a expressão é inativo ou

previamente (semi-)ativo?

• Quanto à localização da expressão

9) A posição na sentença, se relacionada a um verbo, é anterior, posterior ou há

uma relação de complementariedade com ele? Se relacionada a um nome, é

anterior ou posterior?

10) Na distribuição de porções textuais, está em trecho inicial, central, final?

Além desses, observaram-se dois fatores relativos apenas aos dados de

redações:

11) A expressão é acompanha por outro indicador temporal (atrás ou desde)?

12) O verbo haver foi redigido com ou sem a letra H?

E ainda, verificou-se um fator relativo apenas aos dados das notícias:

13) Em qual seção do jornal está o texto com a expressão temporal?

Para a observação das propriedades acima nas expressões temporais,

parte-se da hipótese de que o elemento que se junta ao verbo haver seja um

sintagma nominal contável, com significado temporal. Essa hipótese é motivada

pelos estudos de Toral (1992) e Machado Vieira (2001) sobre o verbo fazer

indicando tempo cronológico, que apontam uma maior frequência de

Page 76: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

76

ocorrências de sintagmas nominais temporais contáveis. É motivada, ainda,

pelo estudo de Móia (1999), que indica que as expressões temporais formadas

pelo verbo haver podem admitir um predicado situacional, embora sejam mais

comuns os predicados temporais.

As considerações de Mira Mateus et alii (2003) e de Fiorin (1996) levaram

à observação do ponto de ancoragem da expressão temporal, pois, segundo os

autores, essa propriedade está relacionada ao contexto em que o circunstancial

aparece. A investigação do aspecto da expressão decorre de uma observação

em Machado Vieira (op. cit.: 281), que verificou que “a referência temporal de

fazer parece ser indistintamente pontual ou durativa”.

Com relação aos planos discursivos, parte-se da hipótese de que, por

indicarem uma circunstância, as expressões ocorram predominantemente no

plano fundo. Imagina-se, ainda, que possa haver relação entre a posição da

expressão no texto ou na sentença e o status da informação. Segundo Cunha

(1976) e Cunha & Cintra (1985), os adverbiais podem deslocar-se na sentença

em função de pressões de informatividade ou pressões discursivas e a

expressão em posição inicial atende a uma função de realce.

Quanto ao controle dos fatores próprios das expressões verificadas na

subamostra de redações, acredita-se que tenham relação com o nível de

escolaridade. Supõe-se que, nos textos produzidos por alunos das séries iniciais,

ocorra um maior número de expressões acompanhadas por outro indicador

temporal ou de expressões nas quais o verbo haver é redigido sem h, visto o

pouco contato com as regras de gramáticas normativas, que condenam os dois

usos.

3.2. Testes de atitude

Além da análise dos dados do comportamento linguístico observável,

conta-se com a observação de resultados de testes em que falantes avaliam

subjetivamente certas estruturas/expressões e/ou enunciados em que elas

ocorrem. A concepção de tais materiais de análise tem inspiração em

Page 77: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

77

orientações da metodologia sociolinguística relativa a testes de atitudes

linguísticas.

3.2.1. As principais orientações teórico-metodológicas

Durante a comunicação, os falantes, mesmo que inconscientemente,

moldam e adaptam seu discurso à situação comunicativa. Ou seja, adotam uma

ou outra forma linguística de acordo com suas percepções e reações. Esse

comportamento reflete as atitudes do falante em relação a elementos e

estruturas línguísticas.

Entende-se atitude linguística, segundo Fasold (1987), por um estado

mental de predisposição a determinadas formas linguísticas. Essa relação pode

ser de preferência, recusa ou neutralidade. As atitudes linguísticas dependem

do contexto sociolinguístico, ou seja, dependem da situação comunicativa e

acabam por refletir um comportamento coletivo.

O autor indica que é bastante comum estudos sobre atitude de falantes se

basearem em um ponto de vista da atitude mentalista, isto é, na visão de que, a

partir de algum estímulo, um estado mental pode gerar um tipo de resposta e

não outro. Visto que a atitude é um estado interno, o pesquisador depende do

relato do falante, e este relato resulta de suas percepções e avaliações somadas a

suas expectativas e predileções sobre dadas estruturas linguísticas.

Falsod (1987) indica dois tipos de métodos de pesquisa para a

investigação das atitudes/percepções relacionadas à linguagem: testes diretos e

indiretos. Nos primeiros, os participantes expõem suas opiniões cientes de

contribuírem para uma investigação linguística; no segundo, por outro lado, os

informantes não têm ciência de que suas atitudes linguísticas estão sendo

investigadas.

Os testes podem ser, ainda, abertos — oferecendo liberdade para o

informante responder às questões — ou fechados — com um formato único de

respostas, do tipo múltipla escolha ou sim/não.

Page 78: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

78

Tarallo (1990) apresenta, também, duas possibilidades de testes: de

percepção e de produção. Nos testes de percepção, o informante deve opinar

sobre a aceitabilidade de certas estruturas linguísticas, já, nos de produção, o

informante deve ser levado a produzir a variável optando por uma ou outra

variante linguística. Os testes de percepção são similares ao que Falsod (1987)

chama de teste de insegurança linguística, no qual o falante aponta a forma que

considera correta dentre as apresentadas.

3.2.2. Os testes analisados

Consideram-se, nesta análise, resultados obtidos em dois tipos de testes

de natureza fechada, visto que são compostos por questionários de múltipla

escolha. Há um teste que questiona a aceitabilidade de algumas estruturas

linguísticas, e outro que investiga a classificação mais aceita para as expressões

em estudo20. Ambos os testes classificam-se, segundo Falsod, como diretos, pois

nos dois os participantes têm ciência de que participam de uma pesquisa que

objetiva saber como eles compreendem ou utilizam certas expressões

linguísticas.

Os testes foram aplicados a estudantes de diferentes níveis de

escolaridade, como proposto por Labov (1972:214). Segundo o autor, não se

deve contar apenas com informantes mais escolarizados, pois esses são

inseridos, comumente, em situações comunicativas que exigem a adoção de um

padrão culto formal e, assim, podem ser influenciados por orientações

prescritivas.

O teste sobre a aceitabilidade de algumas estruturas linguísticas foi

apresentado a alunos de diferentes séries dos ensinos fundamental e médio e a

graduandos de quatro diferentes períodos do curso de Letras da UFRJ. O teste

sobre as possíveis classificações para a expressão foi aplicado apenas aos alunos

de Graduação.

20 Os dois testes aplicados encontram-se nos anexos 1, 2 e 3

Page 79: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

79

O primeiro teve o intuito de averiguar possíveis efeitos semânticos

obtidos pelo acréscimo de elementos indicadores de tempo decorrido (atrás,

desde, já) à expressão, pela substituição do verbo por um desses elementos e/ou

pela omissão do verbo na construção.

A aplicação do segundo teste teve como objetivo verificar a percepção

dos futuros profissionais de Língua Portuguesa sobre as possíveis classificações,

segundo gramáticas normativas, para expressões temporais formadas pelo

verbo haver.

Em cada teste havia um cabeçalho solicitando a identificação do grau de

escolaridade dos participantes. Não foram pedidas quaisquer informações

pessoais, tais como nome ou idade. Havia, ainda, um texto informando que o

teste não contava com certo ou errado, que o objetivo era descobrir as opiniões

do falante de língua portuguesa sobre as estruturas marcadas nos trechos

dados.

As aplicações de testes foram supervisionadas pela própria pesquisadora

ou por uma professora, e os alunos tiveram ciência de tratar-se de uma pesquisa

que não seria avaliada pelo professor. Procurou-se entregar o questionário para

que fosse efetuada a leitura dos comandos, com a orientação de que os

participantes não conversassem entre si, e de que as dúvidas deveriam ser

esclarecidas com a pesquisadora/professora.

Sabe-se que os alunos tendem a tomar a pesquisa de opinião como uma

avaliação, por isso enfatizou-se o objetivo da pesquisa, com a indicação de não

haver uma resposta correta. Procurou-se, também, deixar os participantes

menos tensos afirmando-lhes que os testes não seriam vistos por seus

professores.

Abaixo há um quadro demonstrativo da quantidade de testes aplicados a

cada grupo de escolaridade.

Page 80: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

80

Testes de atitude linguística

Escolaridade

Teste 1 (alterações

na estrutura da

expressão)

Teste 2

(classificação das

expressões)

Ensino Fundamental 27 ---

Ensino Médio 50 ---

Graduação 1º período 25 25

Graduação 3º período 25 25

Graduação 5º período 25 25

Graduação 8º período 18 18

Quadro 9 – Distribuição dos testes pelos níveis de escolaridade

3.2.3. Procedimentos de análise dos testes de atitude

Para o entendimento dos resultados dos testes de atitude, averiguaram-se

as respostas de cada uma das frases apresentadas em cada tipo de teste.

Posteriormente, para o teste sobre as manipulações na estrutura da expressão,

agruparam-se os resultados do conjunto de frases durativas e do conjunto de

frases pontuais, a fim de verificar se havia um padrão de respostas para cada

grupo. Já para o teste sobre as possíveis classificações para as expressões,

agruparam-se os resultados das frases nas quais as expressões estavam

inseridas em início ou em fim de predicação.

Page 81: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

81

4. Expressões temporais com o verbo haver

Neste capítulo, expõem-se, primeiramente, os principais fatores

característicos das expressões temporais formadas pelo verbo haver, em cada

subamostra de narrativas, e tece-se uma comparação entre tais subamostras, a

fim de que se detectem particularidades de cada gênero textual relativas a esse

tema e generalizações sobre as expressões.

Nas seções 4.2 e 4.3 são estabelecidas relações entre as expressões em

estudo e os planos discursivos (figura e fundo) e o status informacional. Por

fim, descreve-se o comportamento semi-gramatical de haver nas expressões

temporais.

4.1. Caracterização das expressões

Na observação das características gerais das expressões temporais,

perceberam-se fatores relativos não apenas à configuração e ao comportamento

da expressão, mas também ao elemento que acompanha o verbo haver

expressando de tempo passado.

O termo que acompanha haver pode ser um ‘Nome’ (N) ou ‘Sintagma

Nominal’ (SN). Esse N é indicativo de tempo — que pode primariamente

indicar um intervalo de tempo ou ter outro referente no mundo biossocial —,

geralmente no plural, tal como “dias” ou “meses”. O SN é composto por um N

antecedido por um numeral, podendo haver entre eles um advérbio, como

“apenas” ou “exatamente”. Seguem exemplos de trechos do corpus com

expressão formada por N e por SN, respectivamente.

19. Ele poderia ter vendido e pago os seus atletas que estão há meses sem

receber salário, mas não foi isso que ele fez... Depois de perder a pose

agredido jornalistas o então presidente foi para uma boate gay revelar

sua outra personalidade, cantou, dançou. Fez tudo o que não poderia

fazer após a derrota de seu clube. [Redação, 9º ano EF]

Page 82: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

82

20. O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, assinou ontem a primeira

ordem de serviço para o início das obras da usina nuclear de Angra 3. A

produção de energia elétrica deverá começar em maio de 2015, e o custo

total da obra será de R$ 8,112 bilhões. A construção será feita pela

empresa Andrade Gutierrez, que venceu a primeira licitação para obra,

há 20 anos. [Jornal, O Globo]

Outra característica do N/SN é poder formar um predicado temporal ou

situacional. Isto é, pode indicar tempo, como os nomes “dia”, “semana” ou

“mês”, por exemplo, ou apresentar uma situação ou evento que

metaforicamente indique uma quantidade temporal, como “aulas”, “jogos”,

conforme:

21. Há um ano atras, eu e minha família fomos ao zoológico, foi muito bom

divertimos muito, vimos todos os tipos de animais que possam imaginar,

mas o que foi o mais engraçado foi o macaco, ele era muito esperto,

quando chegamos perto dele, ele vinha e jogava lama na gente e ni todas

s pessoas que chegavam perto, rimos muito. [Redação, 3º ano EM]

22. Sem perder há três rodadas, o Duque de Caxias tenta dar sequência à

boa fase hoje, às 21h, contra o vice-líder Guarani, no Estádio Brinco de

Ouro, pela 30ª rodada. [Jornal, Extra]

O elemento nominal que se junta ao verbo haver pode também

apresentar uma configuração morfossemântica delimitável ou não. Ou seja, o

valor temporal indicado pela expressão pode ser exato ou não, ter uma

quantidade de tempo definida. Porém, sempre que o elemento for um N, a

configuração será não delimitável, pois só há delimitação, se houver um

numeral. Os exemplos seguintes representam um elemento nominal delimitável

e um não delimitável:

Page 83: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

83

23. A um ano atrás eu e minha vó ia soutar o meu cachorro na rua ai ela

desamarrou o cachorro e levou par andar em pouco, depois de ter levado

o cachorro para andar quando ela amarrou na árvore em frente a casa

para falar com a colega dela, o cachorro tinha fogido. [Redação, 7º ano

EF]

24. Se há bem pouco tempo o mercado formal demonstrava preconceito em

relação aos trabalhadores que passavam dos 45 anos — desdenhando da

experiência acumulada —, hoje já há empresas absorvendo profissionais

que cruzaram a barreira dos 55 anos, e com direito a registro. [Jornal,

Extra]

No primeiro exemplo, o SN que se une ao verbo haver é delimitável, pois

apresenta a exata quantidade de tempo, “um ano” representada pela expressão.

Nesse exemplo, é possível precisar quando ocorreu o evento narrado. Já no

segundo, há um SN não delimitável, pois, a partir dele, não é possível definir

exatamente a quantidade de tempo que a expressão representa.

No que tange ao aspecto ou valor da expressão na sentença, segundo o

qual ela indica se o evento expresso é durativo ou pontual, observa-se se a

expressão se refere a um dado momento no passado ou representa um

transcurso de tempo desde um momento anterior. Segundo Ilari (1997:48), a

expressão “há cinco anos” pode aplicar-se a eventos pontuais, que ficam assim

localizados no tempo, ou, “quando aplicada a processos de tempo escoado, ela

mede uma duração (“cinco anos”) que tem como limite final o momento de

fala”.

Ainda segundo Ilari (1997: 40), “os adjuntos de duração, quando

combinados com predicados que referem um processo pontual, não indicam a

duração interna do processo, e sim o período no interior do qual o processo se

reitera ou o período além ou aquém do qual o processo ocorre”.

Page 84: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

84

Abaixo verifica-se um exemplo de expressão durativa e um de pontual,

respectivamente:

25. Um dia eu estava já na janela á uns dez minutos, quando o menino me

tacou gelatina no meio da cara, eu fiquei com muita raiva e disse para ele

que eu ia me vingar. [Redação, 9ª ano EF]

26. Criada há nove anos por funcionários e professores da Unirio, a

fundação atua na área de "Ensino, Pesquisa e Assistência". De 2006 para

cá, a fundação participou da organização de 37 concursos, cinco deles em

andamento. [Jornal, O Globo]

No exemplo 25, a expressão temporal evidencia aspecto durativo, visto

que faz referência à duração do evento, indica por quanto tempo o narrador

ficou na janela (dez minutos). No exemplo 26, por outro lado, o aspecto da

expressão é pontual, sinaliza um ponto no passado, momento em que a

“fundação” foi criada.

Sobre a ancoragem da expressão, como já indica Mira Mateus et alii

(2003), sabe-se que pode ser dêitica ou anafórica (relacionada a uma expressão

na frase ou texto). Esse fator refere-se à relação entre o momento passado

indicado pela expressão temporal e o momento da enunciação.

Ilari (1997:13) apresenta, para o verbo, a “capacidade de relacionar

cronologicamente três tempos ou momentos”: momento de fala, momento de

realização da ação expressa pelo verbo, momento de referência. De forma

semelhante, Fiorin (1996) menciona três momentos na constituição do sistema

temporal: o momento da enunciação (ME), o momento da referência (MR), e o

Page 85: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

85

momento do acontecimento (MA). Esse autor apresenta o seguinte

organograma21:

ME (presente implícito)

Sistema enunciativo concomitância MR presente

Sistema enuncivo Não concomitância

Concomitância MA presente

Não- concomitância

Anterioridade MR pretérito

Posterioridade MR futuro

Anterioridade MA pretérito

Concomitância MA presente

Não-concomitância

Anterioridade MA pretérito

Figura 1 - Organograma adaptado da constituição do sistema temporal segundo Fiorin (1996)

Nesse fator, verificou-se se a informação indicada pela expressão

está relacionada ao momento presente da enunciação (dêitica) ou a um

momento anterior (anafórica).

Anafórica

Dêitica

Momento Anterior 2

Momento Anterior 1

Momento da Enunciação

Figura 2 – Pontos de ancoragem da expressão temporal

21 O organograma foi adaptado; não foram apresentados o momento de referência (MR) e momento de acontecimento (MA) futuro, visto que só interessa à presente análise a expressão de tempo passado.

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86

27. Tudo começou a 2 meses atráz quando eu descobri que o meu namorado

estava colocando uns “xifres” em mim. Na hora fiquei arrasada

perguntei para ele e como se esperava negou tudo.

Numa bela sexta-feira as minhas amigas viram essa garota que o meu

namorado estava me traindo e perguntaram se era verdade, e ela falou

que estava namorando com ele a um tempo e as minhas amigas falaram

que ele estava comigo a uns 10 meses no dia seguinte nós duas fomos

falar com ele e o cachorro não sabia onde enfiar a cara.

Hoje em dia nós viramos amigas e quando a gente lembra dessa história

rimos muito. [Redação, 2º ano EM]

No exemplo acima, verificam-se três expressões temporais formadas pelo

verbo haver. A primeira expressão “a 2 meses atráz” é ancorada no momento

da enunciação. Indica que o evento ao qual a expressão se refere ocorreu dois

meses antes do momento da enunciação.

Já as duas outras expressões temporais são anafóricas, ancoradas em um

momento anterior ao da enunciação. No trecho “estava namorando com ele a

um tempo”, a expressão é ancorada em “numa bela sexta-feira” e não na

enunciação. O mesmo ocorre com a terceira expressão no trecho “ele estava

comigo a uns 10 meses”. Os dez meses representados pela expressão são

ancorados no momento em que houve a conversa entre as amigas e a garota

com quem o namorado a traia, dois meses antes da enunciação.

A expressão pode, ainda, estar ligada a uma oração ou a nome22. A

indicação temporal pode ser relativa a uma ação, um evento, um estado ou até a

uma característica. No exemplo 28, a primeira expressão está relacionada a um

nome, e a segunda, a uma oração.

22 Estão sendo tratados por nome os substantivos, adjetivos e formas verbais não finitas.

Page 87: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

87

28. Jordan, que jogou pelo Chicago Bulls, foi confundido com o cantor

Michael Jackson, morto há três meses (...)

Há um ano, ao ser perguntado sobre quais cidades ameaçavam o Rio na

disputa para sediar os jogos, não teve dúvidas: — Chicago e Japão!

[Jornal, O globo]

Foram observados dois fatores atinentes ao posicionamento da

expressão: i) a localização no texto; ii) a localização na predicação. Com relação

à posição da expressão no texto, ou seja, na distribuição dos parágrafos ou

porções textuais, consideram-se três possibilidades: porção inicial, central ou

final.

No texto abaixo há duas expressões temporais, a primeira está em uma

porção inicial de texto e a última em porção central. No exemplo 30, a expressão

está localizada na parte final do texto.

29. Um pedreiro que virou empresário

Atrás de uma vida mais promissora, o maranhense José Raimundo dos

Santos, de 28 anos, chegou ao Rio de janeiro, em 2002, com planos de

montar um negócio. Ex-pedreiro no nordeste, faltava-lhe capital para

iniciar a empreitada no estado. Há três anos, porém, descobriu, enquanto

folheava jornais, um projeto social que viabilizaria o antigo sonho. Hoje,

José Raimundo tem uma pequena gráfica em santa Cruz e já pensa em

expandi-la.

A ONG Fabricando Empresários foi a responsável pelo início da carreira

empreendedora. Por meio de um treinamento baseado em vendas de

livros, a instituição prepara pequenos empresários há quatro anos,

gratuitamente.

— Aprendi técnicas de convencimento e venda — conta José Raimundo.

Sempre motivado pelo desejo de abrir sua própria empresa, ele se

destacou nas vendas e foi promovido a instrutor. Na nova função,

Page 88: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

88

formou cinco empreendedores, cumprindo a meta estabelecida pela

organização para financiamento de novos negócios. Com um

empréstimo de R$ 2 mil, Santos pagou três meses de aluguel de um

imóvel em Santa Cruz e começou a desenvolver seu projeto de vida.

[Jornal, Extra]

30. Profissão na área de beleza perto de ser regulamentada

Mais de três milhões de trabalhadores que atuam no setor de beleza

poderão ter a profissão regulamentada. Ontem, a Comissão de Assuntos

Sociais (CAS) do Senado aprovou um projeto de lei que beneficiará as

atividades de cabeleireiro, barbeiro, esteticista, manicure, pedicure,

depilador e maquiador. A matéria ainda passará por outras votações e,

caso seja aprovada, entrará em vigor.

De acordo com o projeto, para exercer qualquer uma dessas funções será

obrigatório ter o ensino fundamental completo e curso

profissionalizante. A proposta reconhece, entretanto, o direito de quem já

esteja trabalhando há, pelo menos, um ano de permanecer na função,

mesmo sem preencher as exigências. [Jornal, Extra]

Para verificar a ordem dos sintagmas que integram a predicação, isto é, a

posição das expressões temporais na sentença, tomou-se como base a proposta

de Martelotta (1994) que apresenta seis possíveis posições para o adjunto

adverbial:

Antes Do Verbo Depois Do Verbo

a) sem sujeito d) sem complemento

b) antes do sujeito e) entre o verbo e o complemento/predicativo

c) entre o sujeito e o verbo f) depois do complemento/predicativo

Quadro 10 – Posições dos adjuntos adverbiais segundo Martelotta (1994)

Page 89: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

89

A partir dessa proposta, foram acrescidas três posições, devido a

necessidades verificadas na análise. Duas referem-se a expressões que não estão

relacionadas a um verbo, mas, sim, a um nome, como já visto. A outra, como

proposto por Móia (1999), refere-se a expressões que “complementam” um

verbo23.

Assim sendo, analisaram-se as sentenças considerando as posições da

expressão da seguinte forma:

a) Antes do verbo – sem sujeito (AV – SS)

31. Há pouco mais de 8 anos, havia meia dúzia de empresas oferecendo esse

serviço. [Jornal, Extra]

b) Antes do verbo – antes do sujeito (AV – AS)

32. A minha história é num dia de 6ª feira a uns dias eu fui pro cinema ver

Hanah Montana [Redação, 3º ano EF]

c) Antes do verbo – entre o sujeito e o verbo (AV – ESV)

33. Certo dia, João e Maria, há mais ou menos 2 anos, passeavam perto de

sua casa [Redação, 1º ano EM]

d) Depois do verbo – sem complemento predicativo, (locativo) (DV – SC)

34. Certo dia, um garoto estava andando perto da casa de um garoto que

morreu a muito tempo. [Redação, 3º ano EF]

e) Depois do verbo – entre o verbo e o complemento, predicativo, (locativo) (DV

– EVC)

23 Móia (1999) indica que expressões temporais com haver podem ocorrer “como argumentos (geralmente preposicionados) de predicados, não ocorrendo portanto em posição adverbial", como em “Os vestígios arqueológicos encontrados datam de há cem mil anos”.

Page 90: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

90

35. A Polícia Nacional hondurenha (...) expulsou um grupo de sem-teto que

ocupava há três meses um prédio público em protesto contra a

destituição do presidente Manuel Zelaya [Jornal, o Globo]

f) Depois do verbo – depois do complemento, predicativo, (locativo) (DV – DC)

36. Eles não recebem salários, em média, há três meses. [Jornal, O Globo]

g) Relacionado ao Nome – Antes do nome (AN)

37. Estados Unidos e Cuba discutirão na quinta-feira a possível retomada de

um serviço postal direto há muito tempo suspenso. [Jornal, O Globo]

h) Relacionado ao Nome – Depois do nome (DN)

38. Budista há mais de 12 anos, responsável por uma comunidade religiosa

no Rio, Carmo leva a prática a sério. [Jornal, Extra]

i) “Complementando” um verbo (CV)

39. Maria Vitória Pinheiro Gonçalves, de 54 anos, cumpriu ontem um ritual

que começou há 20 anos. [Jornal, Extra]

4.1.1 Análise estatística sobre as expressões nas narrativas escolares24

As primeiras observações feitas sobre as redações foram em relação ao

número de dados e à distribuição dos mesmos pelos grupos de séries. Dos 1038

textos consultados, apenas 9,63% apresentaram expressões temporais com o

verbo haver. Esse resultado indica a baixa frequência dessas expressões, que são

formas alternantes a diversos advérbios e preposições, como se verifica nos

exemplos abaixo:

40. Há duas semanas, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu

afastar Dácio Vieira (...) [Jornal, O Globo]25 24 Nesta seção, não são apresentados os números absolutos juntamente com os percentuais, pois se trata de um total de 100 dados, o que os faz equivaler.

Page 91: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

Duas semanas atrás,

Duas semanas antes,

Anteriormente, o tribunal de Justiça do Distrito Federal havia decidido (...)

No dia 15 de setembro, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)

Terça feira retrasada, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)

Sobre os grupos de séries, percebeu

produtividade das expressões cresce conforme o nível de escolaridade. No

primeiro grupo, que abrange o 3º, 4º e 5º anos do EF, as expressões ocorreram

em 15 dos 251 textos. Já no segundo, referente aos 6º, 7º e 8º anos do EF, as

expressões ocorreram em

o 1º do EM, e em 27 dos 238 textos desse grupo houve a presença da expressão

em estudo. E, por fim, no quarto grupo, que abarca o 2º e 3º anos do EM, as

expressões com haver ocorreram em 30 dos 235 tex

Essa distribuição pode ser verificada em percentuais no gráfico abaixo:

Gráfico 1 - Produtividade das expressões temporais nos textos consultado

Das características do N/SN que acompanha

fortes tendências: o elemento formador da expressão é, em geral, um SN

temporal. Houve SN em 99% dos dados, e em 100% destes foi identificado um

predicado temporal. Apenas no dado abaixo ocorreu N temporal. 25 Notícia de 01/10/2009 26 As cinco frases em itálico exemplificar algumas formas alternantes às expre

5,97%

1º seg. EF

semanas atrás, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu

semanas antes, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)

Anteriormente, o tribunal de Justiça do Distrito Federal havia decidido (...)

No dia 15 de setembro, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)

retrasada, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)

Sobre os grupos de séries, percebeu-se que, na subamostra

produtividade das expressões cresce conforme o nível de escolaridade. No

primeiro grupo, que abrange o 3º, 4º e 5º anos do EF, as expressões ocorreram

em 15 dos 251 textos. Já no segundo, referente aos 6º, 7º e 8º anos do EF, as

expressões ocorreram em 28 dos 314. O terceiro grupo engloba o 9º ano do EF e

o 1º do EM, e em 27 dos 238 textos desse grupo houve a presença da expressão

em estudo. E, por fim, no quarto grupo, que abarca o 2º e 3º anos do EM, as

ocorreram em 30 dos 235 textos.

Essa distribuição pode ser verificada em percentuais no gráfico abaixo:

Produtividade das expressões temporais nos textos consultado

Das características do N/SN que acompanha haver, destacam

tendências: o elemento formador da expressão é, em geral, um SN

temporal. Houve SN em 99% dos dados, e em 100% destes foi identificado um

predicado temporal. Apenas no dado abaixo ocorreu N temporal.

As cinco frases em itálico resultam de modificações feitas pela pesquisadora a fim de exemplificar algumas formas alternantes às expressões formadas por haver.

8,91%11,34% 12,75%

2º seg. EF 9º EF/1º EM 2º/3º EM

91

o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)

o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)

Anteriormente, o tribunal de Justiça do Distrito Federal havia decidido (...)

No dia 15 de setembro, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)

retrasada, o tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu (...)26

na subamostra adotada, a

produtividade das expressões cresce conforme o nível de escolaridade. No

primeiro grupo, que abrange o 3º, 4º e 5º anos do EF, as expressões ocorreram

em 15 dos 251 textos. Já no segundo, referente aos 6º, 7º e 8º anos do EF, as

28 dos 314. O terceiro grupo engloba o 9º ano do EF e

o 1º do EM, e em 27 dos 238 textos desse grupo houve a presença da expressão

em estudo. E, por fim, no quarto grupo, que abarca o 2º e 3º anos do EM, as

Essa distribuição pode ser verificada em percentuais no gráfico abaixo:

Produtividade das expressões temporais nos textos consultados

, destacam-se duas

tendências: o elemento formador da expressão é, em geral, um SN

temporal. Houve SN em 99% dos dados, e em 100% destes foi identificado um

predicado temporal. Apenas no dado abaixo ocorreu N temporal.

modificações feitas pela pesquisadora a fim de

12,75%

2º/3º EM

Page 92: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

41. Ele poderia ter vendido e pago os seus atletas que estã

receber salário, mas não foi isso que ele fez... Depois de perder a pose

agredido jornalistas o então presidente foi para uma boate gay revelar

sua outra personalidade, cantou, dançou. Fez tudo o que não poderia

fazer após a derrota de seu c

Sobre a configuração do elemento nominal em delimitável ou não, os

números evidenciam um pequeno equilíbrio entre os dois fatores, a diferença

foi de 14 dados. Do total de 100 dados, 57 apresentaram configuração contável e

43 configuração não-contável.

A distribuição dos dados pelos grupos de escolaridade pode ser

observada em percentuais no gráfico abaixo.

Gráfico 2 – Configuração do elemento nominal formador da expressão nos grupos escolares em

A distribuição pelas séries chamou atenção, porque, nos três últimos

grupos de escolaridade, se registrou maior produtividade de elemento nominal

delimitável. Diferentemente, no primeiro grupo o percentual de elementos

0102030405060708090

100

1º seg. EF

20%

80%

N/SN delimitável ou não delimitável

Ele poderia ter vendido e pago os seus atletas que estão

receber salário, mas não foi isso que ele fez... Depois de perder a pose

agredido jornalistas o então presidente foi para uma boate gay revelar

sua outra personalidade, cantou, dançou. Fez tudo o que não poderia

fazer após a derrota de seu clube. [Redação, 9º ano EF]

Sobre a configuração do elemento nominal em delimitável ou não, os

números evidenciam um pequeno equilíbrio entre os dois fatores, a diferença

foi de 14 dados. Do total de 100 dados, 57 apresentaram configuração contável e

contável.

A distribuição dos dados pelos grupos de escolaridade pode ser

observada em percentuais no gráfico abaixo.

Configuração do elemento nominal formador da expressão nos grupos escolares em delimitável ou não delimitável

A distribuição pelas séries chamou atenção, porque, nos três últimos

grupos de escolaridade, se registrou maior produtividade de elemento nominal

delimitável. Diferentemente, no primeiro grupo o percentual de elementos

1º seg. EF 2º seg. EF 9º EF/1º EM 2º/3º EM

57%67% 67%

80%

43%33% 33%

N/SN delimitável ou não delimitável

Delimitável Não delimitável

92

o há meses sem

receber salário, mas não foi isso que ele fez... Depois de perder a pose

agredido jornalistas o então presidente foi para uma boate gay revelar

sua outra personalidade, cantou, dançou. Fez tudo o que não poderia

Sobre a configuração do elemento nominal em delimitável ou não, os

números evidenciam um pequeno equilíbrio entre os dois fatores, a diferença

foi de 14 dados. Do total de 100 dados, 57 apresentaram configuração contável e

A distribuição dos dados pelos grupos de escolaridade pode ser

Configuração do elemento nominal formador da expressão nos grupos escolares em

A distribuição pelas séries chamou atenção, porque, nos três últimos

grupos de escolaridade, se registrou maior produtividade de elemento nominal

delimitável. Diferentemente, no primeiro grupo o percentual de elementos

2º/3º EM

33%

Page 93: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

93

delimitáveis foi bastante baixo. Acredita-se que esse resultado possa estar

relacionado à faixa etária dos alunos, pois a quantificação temporal é uma

questão ainda complexa para as crianças nas faixas etárias mais baixas.

Segundo Antunes, Menandro e Paganelli

[…] há um longo caminho a ser percorrido pela criança no domínio

progressivo da noção de tempo. Essa construção é lenta e se dá

paralelamente ao processo de descentração, como ocorre com a noção

de espaço e com a própria socialização da criança […] (apud

ARRIADA, E.; NOGUEIRA, G. M.; SANTOS, R. de C. dos, 2008)

Tal resultado pode estar relacionado, ainda, à influência da literatura

infantil, em especial dos contos — gênero com o qual os alunos têm forte

contato nessa fase escolar. Nesse gênero, é comum a presença de expressões do

tipo “Há muito tempo” — com elemento não delimitável —, e esse foi o padrão

seguido em 11 dos 15 textos representativos do 1º segmento do EF. No total dos

100 dados das redações, em 32 o elemento nominal que acompanha haver é

formado pelo substantivo tempo (muito tempo, pouco tempo, um tempo).

Os resultados acima confirmam as hipóteses para essas propriedades,

pois acreditava-se que, semelhantemente ao resultados apresentados por

Machado Vieira (2001) para as expressões temporais com fazer, o elemento que

se junta ao verbo haver fosse predominantemente um sintagma nominal

contável. Esperava-se, ainda, que houvesse predominância de predicados

temporais, o que foi confirmado.

O trecho abaixo exemplifica as propriedades acima destacadas, um SN

contável e com valor temporal acompanhado o verbo haver na expressão.

42. A três meses atrás, foi notificado que João, menino de 15 anos, estuprou

uma criança de 3 anos de idade, o nome dele é Lucas e ele ficou muito

traumatizado com o que foi feito. [Redação, 9º ano]

Page 94: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

Quanto aos fatores característicos da expressão, registra

que não houve variação em relação ao elemento ao qual se liga a expressão. Nas

redações vistas, em todos os dados a expressão estava ligada a uma oração, não

houve qualquer expressão ligada a um nome.

Sobre o aspecto da expressão, percebeu

para a apresentação de eventos pontuais, o que ocorreu em 88% das expressões

vistas. Os textos do 1º segmento outra vez chamaram atenção, porque o a

é pontual em 100% dos dados (cf. ex. 43 e 44)

que o uso de expressões com valor durativo aumenta conforme nível de

escolaridade.

43. A muintos e muintos ano

44. A minha história é num dia de 6ª feira

Hanah Montana [Redação, 4º ano]

Gráfico 3

0

20

40

60

80

100

1º seg. EF

100%

0%

Aspecto da expressão: durativo ou pontual

Quanto aos fatores característicos da expressão, registra-se, inicialmente,

que não houve variação em relação ao elemento ao qual se liga a expressão. Nas

redações vistas, em todos os dados a expressão estava ligada a uma oração, não

e qualquer expressão ligada a um nome.

Sobre o aspecto da expressão, percebeu-se uma tendência ao uso delas

para a apresentação de eventos pontuais, o que ocorreu em 88% das expressões

vistas. Os textos do 1º segmento outra vez chamaram atenção, porque o a

é pontual em 100% dos dados (cf. ex. 43 e 44). O gráfico abaixo evidencia, ainda,

que o uso de expressões com valor durativo aumenta conforme nível de

A muintos e muintos ano aconteceu uma inchente. [Redação, 3º ano]

A minha história é num dia de 6ª feira a uns dias eu fui pro cinema ver

Hanah Montana [Redação, 4º ano]

3 – Aspecto da expressão: durativo ou pontual

2º seg. EF 9º EF/1º EM 2º/3º EM

92% 89%77%

8% 11%23%

Aspecto da expressão: durativo ou pontual

Pontual Durativo

94

se, inicialmente,

que não houve variação em relação ao elemento ao qual se liga a expressão. Nas

redações vistas, em todos os dados a expressão estava ligada a uma oração, não

se uma tendência ao uso delas

para a apresentação de eventos pontuais, o que ocorreu em 88% das expressões

vistas. Os textos do 1º segmento outra vez chamaram atenção, porque o aspecto

O gráfico abaixo evidencia, ainda,

que o uso de expressões com valor durativo aumenta conforme nível de

aconteceu uma inchente. [Redação, 3º ano]

eu fui pro cinema ver

Page 95: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

95

Novamente identifica-se a dificuldade que os alunos do primeiro

segmento do EF — faixa etária mais baixa — possuem com as relações

temporais. Conforme Piaget,

Se as relações de tempo resultam de uma intuição direta ou de uma

esquematização intelectual independente do seu conteúdo, é claro que

as questões precedentes não darão motivo a nenhuma dificuldade

para a criança, de vez que todos os acontecimentos que caracterizam

este processo temporal se desenvolvem sob os olhos do sujeito. Mas,

se o tempo é a coordenação operatória dos próprios movimentos,

então as relações de simultaneidade, de sucessão e de duração

deverão se construir, todas, progressivamente, e apoiando-se umas

nas outras […] (s/d, p. 13).

O ponto de ancoragem temporal foi na enunciação na grande maioria

dos dados, pois, em 92%, a expressão é dêitica. Esse padrão foi seguido em

textos de todos os anos escolares estudados, sem grandes diferenças. Foi

categórico nos textos do 1º segmento EF.

No que tange à localização da expressão na sentença, a posição inicial

mostrou-se a mais comum em todos os grupos de séries, e a posição final foi a

menos produtiva, como se verifica na tabela abaixo:

Porção de texto inicial Porção de texto central Porção de texto final

77 /77% 15 / 15% 8 / 8%

Tabela 1 – Distribuição dos dados das narrativas escolares pelas porções textuais

Sobre a localização da expressão na sentença, destaca-se, conforme tabela

um, uma grande tendência à posição inicial, antes do verbo, o que ocorreu em

60% dos dados. Chamaram atenção, também, os 16% de expressões

Page 96: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

96

complementando um verbo e a falta de ocorrência de expressão temporal se

referindo a um nome.

As frases abaixo exemplificam os três tipos de verbos os quais as 16

expressões da subamostra “complementam”.

45. Este dia aconteceu a cerca de 2 anos e um montão de amigos meus

pulamos na casa do vizinho para tomar banho de piscina porque estava

muito quente. [Redação, 8º ano]

46. Esse ano minha mãe ficou triste com a noticia, que um colega nosso tinha

falecido em um acidente de moto, mas com essa notícia, veio a mente

dela, o fato que ocorreu a uns 2 anos atrás. [Redação, 9º ano]

47. Essa história foi a três meses atras. A história aparece Renan, eu, Luca,

minha mãe, minha vó, meu avô e o Renato. [Redação, 4º ano]

As posições menos produtivas foram: (i) a de expressão inserida entre o

sujeito e o verbo e (ii) a de expressão entre o verbo e o complemento. Isso já era

esperado por que, como se sabe, o português brasileiro tem como ordem

canônica a orientação SVO, e, nesses casos, a expressão está intercalada entre o

sujeito e o verbo ou entre o verbo e o complemento.

Page 97: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

97

Escolaridade

Posição

1º seg.

EF

2º seg.

EF

9º/1º anos

EM

2º/3º anos

EM Total

Total

(%)

AV – SS 0 4 4 2 10

60% AV – ESV 0 0 1 0 1

AV – AS 11 16 7 15 49

DV – SC 2 0 6 3 11

24% DV – EVC 0 0 1 0 1

DV – DC 0 4 2 6 12

CV 2 4 6 4 16 16%

Tabela 2 – Distribuição dos dados das narrativas escolares pelas posições das expressões na sentença

Acredita-se que a tendência às expressões temporais ocorrerem em início

do texto e de sentença também se deva à influência de contos, gênero textual

geralmente trabalhado na escola. É bastante comum que os textos desse gênero

se iniciem com uma expressão temporal formada por haver, como nos contos

abaixo:

Há muito tempo, num reino distante, vivia um rei, uma rainha e sua filhinha, a princesa Branca de Neve. Sua pele era branca como a neve, os lábios vermelhos como o sangue e os cabelos pretos como o ébano. (Branca de Neve e os sete anões)

Era uma vez, há muito tempo, um rei e uma rainha jovens, poderosos e ricos, mas pouco felizes, porque não tinham concretizado maior sonho deles: terem filhos. (A Bela adormecida)

Há muitos anos, em uma terra distante, viviam um mercador e suas três filhas. A mais jovem era a mais linda e carinhosa, por isso era chamada de “Bela”. (A bela e a fera)

Page 98: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

98

Além das características gerais apresentadas, verificaram-se duas outras

próprias das redações: a expressão pode ou não ser seguida por outro indicador

temporal (atrás ou desde); o verbo haver pode ser redigido com ou sem a letra H.

Podem-se verificar tais características no exemplo abaixo, no qual o verbo haver

redigido sem a letra h, semelhante a uma preposição — visto a crase — é

seguido pelo advérbio atrás:

48. Minha história, minha vida.

Quando eu nasci à 20 anos atrás, minha mãe presenciou um fato bem

engraçado. Ela me disse que assim que eu vim ao mundo meu destino já

estava traçado eu seria uma atriz. Os médicos ficaram encantados com

aquele bebê tão feio, mas engraçado. (...) [Redação, 2º ano EF]

Sobre esses dois fatores, os resultados estatísticos nas redações

apontaram 72% de expressões redigidas sem h e uma pequena tendência de a

expressão ser acompanhada de outro elemento temporal, o que ocorreu em 57%

dos dados.

Com relação aos grupos de séries, viu-se que a grafia padrão do verbo

ocorre com maior frequência na série final do EF e nas séries do EM; ainda

assim, em todos os grupos há mais expressões redigidas sem h. A observação

dos grupos de séries evidenciou que apenas no 1º segmento do EF não houve

tendência de a expressão ser seguida por outro elemento temporal.

Na tabela abaixo, a distribuição desses dois fatores pode ser verificada

em cada grupo de anos escolares em números totais e percentuais.

Page 99: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

99

Escolaridade Com H Sem H Sem atrás Com atrás

1º seg. 3 / 20% 12 / 80 % 8 / 53,3% 7 / 46,7%

2º seg. 2 / 7,1% 26 / 92,9% 8 / 28,6% 20 / 71,4%

9º /1º EM 11 / 40,7% 16 / 59,3% 13 / 48,1% 14 / 51,9%

2º / 3º EM 12 / 40% 18 / 60% 14 / 46,6% 16 / 53,4%

Total 28 72 43 57

Tabela 3 – Distribuição das expressões com ou sem h e seguidas ou não por atrás pelos grupos

de séries

Os resultados da tabela acima confirmam a hipótese de que, no primeiro

segmento, é mais comum o verbo haver ser redigido sem h. Diferentemente, a

hipótese de que nesse segmento haveria mais expressões seguidas por atrás não

se confirma. Acredita-se que esse resultado possa estar relacionado à influência,

já mencionada, das histórias lidas na escola, que comumente apresentam a

expressão “há muito tempo”.

4.1.2 Análise estatística sobre as expressões nas notícias jornalísticas

A análise dos dados não evidenciou diferenças significativas entre o

comportamento funcional dos jornais analisados — O Globo e Extra. A margem

de variação de resultados foi de dois a três dados para grande parte dos fatores

avaliados. Apenas alguns fatores permitiram notar alguma dessemelhança

entre os jornais considerados, os quais serão observados mais atentamente.

Em dois dos três fatores referentes à configuração do elemento que

acompanha o verbo haver na formação da expressão temporal, verificou-se

grande similaridade entre os dois veículos de imprensa analisados. No jornal

Extra, não se encontrou qualquer dado do verbo haver acompanhado por um N,

apenas por SN, e todos delimitáveis. Semelhantemente, no jornal O Globo, em 99

Page 100: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

100

dados, o elemento que se une a haver é um SN, houve apenas um dado com N;

desses 100 elementos, 97 são delimitáveis e três não-delimitáveis. Vale

mencionar que a observação dos três dados com SN não-delimitável mostrou

que dois estão na seção de esporte e são textos de um único autor (cf. exs.

abaixo).

49. Ele disse que, se aqui no Flamengo tem imperador, lá no Fluminense tem

o Digão. Está começando e já fala isso de uma pessoa que vem jogando

há muito tempo. [Jornal, O Globo]

50. Uma opção que vem estudando há muito tempo [Jornal, O Globo]

51. Amorim era filiado ao PMDB há muitos anos, mas não tinha militância

partidária. [Jornal, O Globo]

Nas notícias, foi predominante o predicado temporal, o que ocorreu em

91% do total de dados dos dois jornais. Porém, houve diferença entre os dois

jornais: no O Globo, identificaram-se 49 predicados temporais e um situacional;

já no Extra, 42 temporais e oito situacionais. Analisou-se cada um dos nove

dados com predicado situacional e observou-se que todos são da seção de

esportes e são compostos de SN de três tipos: (i) numeral + o nome “jogos”; (ii)

numeral + o nome “rodadas”; i) numeral + o nome “partidas”, como nos

exemplos abaixo:

52. Sem perder há três rodadas, o Duque de Caxias tenta dar sequência à

boa fase hoje. [Jornal, Extra]

53. O Vasco não perdia há cinco jogos, quando foi derrotado pelo Ceará no

Maracanã. [Jornal, Extra]

Page 101: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

101

54. Estou no clube há seis partidas, com uma vitória, três empates e duas

derrotas. [Jornal, Extra]

Novamente, as hipóteses referentes ao elemento que se une a haver se

confirmam, visto que há predominância de SN contável, com valor temporal,

como no exemplo baixo:

55. Segundo o jornalista Mauro Ventura, em seu blog no site do GLOBO, o

Comitê Olímpico Brasileiro já tinha se queixado à revista, querendo

saber o porquê de a reportagem, feita há quatro meses, ainda não ter sido

publicada. [Jornal, O Globo]

Em relação ao ponto de ancoragem, não houve divergência entre os

jornais. A ancoragem foi na enunciação em 91% do total de 100 dados das

notícias: em 46 dados do O Globo e em 45 do Extra.

Perceberam-se pequenas diferenças entre dois fatores relativos à

configuração da expressão temporal, o aspecto e o termo ao qual a expressão se

liga. Os resultados podem ser verificados na tabela abaixo:

Jornal Aspecto Termo

Pontual Durativo

Oração Nome

Globo 25 25 41 9

Extra 31 19 37 13

Total 56 44 78 22

Tabela 4 – Distribuição das expressões temporais entre O Globo e Extra em relação ao aspecto e ao termo ao qual a expressão se liga

Page 102: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

102

A tabela acima indica equilíbrio entre o aspecto durativo e o pontual

no jornal O Globo e uma leve tendência (62%) no Extra ao aspecto pontual. No

total de dados, considera-se que há equilíbrio entre os aspectos. Tal resultado

era previsto, visto que os jornalistas — diferentemente dos alunos do 1º

segmento do EF — possuem grande domínio de diversas estratégias linguísticas

e, devido à idade, como indica Piaget, já desenvolveram e construíram diversas

relações temporais.

As expressões temporais, nos textos jornalísticos, ligam-se

predominantemente a orações (77/100); ainda assim, diferentemente das

redações, elas podem estar ligadas a um nome, em geral adjetivo como morto,

fechado ou desaparecida. Em 23 dos 100 dados, a expressão refere-se a um nome;

desses 23 dados, 13 estão no jornal Extra e 10 no Globo. Abaixo verifica-se um

exemplo de expressão ligada a um nome e a uma oração, respectivamente.

56. Fechado há nove dias numa embaixada fortemente sitiada por soldados e

policiais armados, o presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya,

teve ontem momentos de festa em meio à tensão. [Jornal, Extra]

57. Há três semanas surgiu um buraco em frente ao número 160 da Rua dos

Açudes. [Jornal, O Globo]

Quanto à posição da expressão no texto, a análise dos 100 dados mostrou

que é mais comum nas notícias que a expressão esteja na porção textual central.

Mediante observação do gráfico 4, baseado em todos os dados de notícias,

percebe-se que a expressão ocorre com mais frequência localizada do meio para

o fim do texto. Atribui-se esse resultado a particularidades do gênero textual: as

notícias visam à informação em primeiro plano; por isso, apresentam

primeiramente o conceito, para posteriormente acrescentar outras informações

sobre ele, tais como as circunstâncias motivadoras, exemplos ou outros fatores

relacionados, como se verifica no exemplo abaixo.

Page 103: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

103

58. Um artilheiro bem precoce

Matheus Cardoso, de 11 anos, foi selecionado para um projeto social e

está na equipe mirim do Botafogo

Aos seis meses de idade, Matheus Cardoso, como toda criança, ainda não

sabia andar.

Mas isso não o impediu de ensaiar os primeiros passos futebolísticos.

Engatinhando, ele conduzia a bola pela casa, em Campo Grande, e

chegava ao fim do dia com as mãos bem machucadas. Hoje, aos 11 anos,

Matheus continua viciado no esporte, mas o quintal ficou pequeno para

seus sonhos.

O menino expandiu seus horizontes e, há seis meses, treina com a equipe

mirim do Botafogo.

— Precisava colocar meias nas mãos dele para não machucar tanto. No

vídeo do aniversário de um ano, ele só aparece com a bola — conta a

mãe, Silvia da Conceição.

Matheus treina em escolinhas de futebol desde os 6 anos. Em 2007, os

pais souberam de um projeto social de um colégio particular do bairro e

resolveram inscrevê-lo. Logo no primeiro teste, o coordenador Antenor

Corrêa viu o potencial de goleador.

Matheus tem sido artilheiro de campeonatos intercolegiais e vai

participar da Copa Light, de futebol profissional. Questionado sobre a

escolha da posição de centroavante, o menino tem a resposta na ponta da

língua.

— Eu gosto é de fazer gol — diz Matheus, que também adora balançar as

redes em jogos de videogame.

Como a maioria das crianças, Matheus sonha alto. Seu maior desejo é

jogar no time inglês Manchester United. Mas, para chegar lá, falta muito

chão. Literalmente.

[...] [Jornal, O Globo]

Page 104: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

104

Gráfico 4 - Posição da expressão no texto nas notícias

Na observação dos textos de cada um dos jornais analisados, por outro

lado, percebem-se diferenças entre os dados do O Globo e do Extra. Em ambos,

há mais dados com expressão em posição central, porém no Extra parece haver

um equilíbrio maior entre as posições inicial e central, o que não se verifica nos

textos do jornal O Globo.

Posição\ Jornal Globo Extra

Inicial 15/30% 17/34%

Central 27/54% 19/38%

Final 8/16% 14/28%

Tabela 5 – Posição da expressão no texto nos dados do jornal O Globo e do jornal Extra

32%

46%

22%

Posição da expressão no texto

Inicial

Central

Final

Page 105: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

105

Sobre a posição da expressão na predicação, foi mais comum a expressão

vir depois do verbo, conforme gráfico abaixo27:

Na compa

às expressões te

nos dados do jo

dos 50 dados do

ainda, que 6 do

são de textos do

diferenças signif

59. Em Nilóp

igreja em

27 No gráfico refeconjuntamente os rrelativas a um nom28 A tabela com os anexo 4.

25%

46%

6%

16%

7%

Posição da expressão na predicação

Antes do Verbo

Depois do verbo

Antes do nome

Depois do nome

Complementando

G

ráfico 5 - Posição da expressão na predicação nas notícias

ração entre os dois jornais chamou atenção que essa tendência

mporais virem nas posições posteriores ao verbo foi mais forte

rnal O Globo. A expressão encontra-se depois do verbo em 56%

jornal O Globo e em 36% dos 50 dados do Extra. Destaca-se,

s 7% de dados em que a expressão “complementa” um verbo

jornal Extra (cf. ex. 59). Nas demais posições não se perceberam

icativas entre os dois jornais28.

olis, na Paróquia Nossa Senhora Aparecida, os fiéis lotaram a

missas e festividades ao longo do dia. Maria Vitória Pinheiro

rente à posição da expressão na predicação, optou-se por apresentar esultados das posições anteriores ao verbo em oposição às posteriores, às e e às complementares ao verbo. resultados detalhados sobre a posição da expressão na sentença segue no

Page 106: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

106

Gonçalves, de 54 anos, cumpriu ontem um ritual que começou há 20

anos. [Jornal, Extra]

Na observação dos dados de notícias jornalísticas, também foi

investigada a seção do jornal na qual a notícia com a expressão temporal está

inserida. Encontraram-se expressões nas partes de esportes, país, economia e

cadernos de bairro dos dois jornais. Essas seções são comuns aos dois jornais,

mas há outras próprias de cada jornal. No Extra, coletaram-se dados nos

cadernos “viva mais”, “geral”, “Informática” e, no O Globo, no “Primeiro

caderno”, “Rio”, “mundo”.

Como muitas dessas seções apresentam conteúdo semelhante, embora

tenham nomenclatura diferente, optou-se por agrupá-las. No quadro abaixo,

verifica-se a distribuição dos dados pelas seções dos jornais.

Seções Globo Extra Total

Geral (1º caderno e mundo) 4 22 26

Rio 9 0 9

País 13 2 15

Esportes 11 17 28

Economia 5 4 9

Cadernos (bairro, info e saúde) 8 5 13

Tabela 6 – Distribuição das expressões por seções dos jornais

No jornal Extra, a maior produtividade das expressões do tipo haver +

N/SN foi detectada na seção País; no O Globo, foi na seção Geral. Em ambos,

verificou-se um grande número de expressões na seção de esportes.

Page 107: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

107

Ressalta-se que, embora todos os textos consultados sejam

predominantemente do tipo narrativo, em algumas seções, como Geral, País e

Economia, por exemplo, os textos apresentam consideráveis porções opinativas.

Esse caráter narrativo-opinativo de algumas notícias pode influenciar na

frequência das expressões em determinadas seções.

4.1.3 Comparação entre observações feitas nas redações e nas notícias

Na presente seção, será feita uma comparação entre os usos das

expressões temporais formadas por haver + N/SN nos gêneros textuais notícia

jornalística e narrativa escolar, a fim de sistematizar as características

aparentemente gerais das expressões e as próprias de cada gênero. Ressalta-se

que os resultados desta secção se baseiam em 200 dados, 100 de cada gênero.

Quanto aos fatores relativos ao elemento que acompanha haver na

formação da expressão, destacaram-se duas semelhanças entre as notícias e as

redações. Nos dois gêneros, o elemento foi predominantemente um predicado

temporal formado por um SN, confirmando a hipótese geral.

Porém, uma diferença significativa foi detectada em relação ao elemento

nominal que forma a expressão ser delimitável ou não. Se, por um lado, nas

narrativas houve um equilíbrio, por outro, nas notícias houve uma maioria de

97% de dados delimitáveis. Acredita-se que tal resultado esteja relacionado a

necessidades relativas ao gênero textual. A notícia jornalística visa a informar

da forma mais precisa possível; por isso, deve haver exatidão nas circunstâncias

em que se desenvolve a narrativa. Assim, se nas narrativas são comuns

expressões como a do exemplo (60), nas notícias elas quase não ocorrem,

havendo, quase predominantemente, expressões que indiquem precisão na

delimitação temporal, como no exemplo (61).

60. O que eu irei contar foi há bastante tempo atrás. [Redação, 3º ano]

Page 108: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

61. Em São Paulo, a obra de ampli

Guarulhos está parada

No que concerne às características principais das expressões, destaca

tendência, em ambos os gêneros, de as expressões temporais em estudo serem

dêiticas. O ponto de ancoragem foi na enunciação em 91 dados de notícia e em

92 de redações. Acredita

tipologia, pois, nesses dois tipos de narração, o que há, de fato, são relatos de

acontecimentos anteriores a partir da perspectiva do momento presente.

O fator aspecto mostrou

gêneros. Se, por um lado, nos jornais houve equilíbrio entre os aspectos

durativo e pontual; por outro, nas redações o resultado foi bastante diverso, o

aspecto pontual foi predominante. O gráfico abaixo demonstra com clareza essa

diferença de tendência entre as notícias jornalísticas e as narrativas escolares.

Gráfico 6 - Comparação entre aspecto durativo e pontual nas redações

Imagina-se que esse resultado tenha a ver com a complexidade do

conceito de tempo. Como já havia sido visto, nas narrativas escolares, quanto

menor o nível de escolaridade, menor o uso de expressões durativas, sendo

nulo esse uso em textos do 1º segmento e

0

20

40

60

80

100

Redações

12%

Comparação entre aspecto durativo e pontual nas

Em São Paulo, a obra de ampliação das pistas do Aeroporto de

Guarulhos está parada há um ano e sete meses. [Jornal, O Globo]

No que concerne às características principais das expressões, destaca

tendência, em ambos os gêneros, de as expressões temporais em estudo serem

dêiticas. O ponto de ancoragem foi na enunciação em 91 dados de notícia e em

92 de redações. Acredita-se que tal resultado possa estar relacionado à

tipologia, pois, nesses dois tipos de narração, o que há, de fato, são relatos de

acontecimentos anteriores a partir da perspectiva do momento presente.

O fator aspecto mostrou-se muito interessante na compara

gêneros. Se, por um lado, nos jornais houve equilíbrio entre os aspectos

durativo e pontual; por outro, nas redações o resultado foi bastante diverso, o

aspecto pontual foi predominante. O gráfico abaixo demonstra com clareza essa

tendência entre as notícias jornalísticas e as narrativas escolares.

Comparação entre aspecto durativo e pontual nas redações e nas n

se que esse resultado tenha a ver com a complexidade do

conceito de tempo. Como já havia sido visto, nas narrativas escolares, quanto

menor o nível de escolaridade, menor o uso de expressões durativas, sendo

nulo esse uso em textos do 1º segmento escolar. Nas notícias, por outro lado, os

Redações Notícias

12%

56%

88%

44%

Comparação entre aspecto durativo e pontual nas redações e nas notícias

Durativo

Pontual

108

ação das pistas do Aeroporto de

. [Jornal, O Globo]

No que concerne às características principais das expressões, destaca-se a

tendência, em ambos os gêneros, de as expressões temporais em estudo serem

dêiticas. O ponto de ancoragem foi na enunciação em 91 dados de notícia e em

ue tal resultado possa estar relacionado à

tipologia, pois, nesses dois tipos de narração, o que há, de fato, são relatos de

acontecimentos anteriores a partir da perspectiva do momento presente.

se muito interessante na comparação entre os

gêneros. Se, por um lado, nos jornais houve equilíbrio entre os aspectos

durativo e pontual; por outro, nas redações o resultado foi bastante diverso, o

aspecto pontual foi predominante. O gráfico abaixo demonstra com clareza essa

tendência entre as notícias jornalísticas e as narrativas escolares.

e nas notícias

se que esse resultado tenha a ver com a complexidade do

conceito de tempo. Como já havia sido visto, nas narrativas escolares, quanto

menor o nível de escolaridade, menor o uso de expressões durativas, sendo

scolar. Nas notícias, por outro lado, os

Durativo

Pontual

Page 109: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

109

enunciantes provavelmente possuem maturidade em relação ao conceito de

tempo e grande domínio de expressões linguísticas.

Acredita-se, então, que a forma mais básica do uso das expressões

temporais formadas pelo verbo haver + N/SN seja a indicação de

ponto/momento no passado. Consequentemente, a expressão de uma duração

por meio de tais estruturas seria uma construção mais complexa.

Outro ponto de divergência entre os dois gêneros textuais estudados que

parece estar ligado ao conhecimento de diversificadas estruturas linguísticas foi

a possibilidade de a expressão estar ligada a um nome ou a uma oração. Nas

redações, todas as expressões relacionam-se a uma oração, já nas notícias, isso

ocorreu em 77% dos dados.

Na comparação entre os gêneros quanto à localização da expressão, os

resultados foram bastante interessantes para as duas possibilidades: posição no

texto e na sentença.

Nas narrativas escolares a maior parte das expressões temporais está na

porção introdutória de texto. Como já visto, acredita-se que esse resultado seja

característico do gênero e influenciado por outros gêneros textuais trabalhados

na escola. É bastante comum, em gêneros baseados na tipologia narrativa, que

as circunstâncias, como tempo e lugar, apareçam na porção inicial de texto. Nas

notícias, porém, a configuração das expressões no texto é mais variável, embora

seja predominante a posição textual central.

Quanto à posição da expressão na predicação, viu-se que, nas narrativas,

não houve grande mobilidade; a posição mais frequente foi antes do verbo (cf.

ex. 62). Por outro lado, nas notícias, a expressão apareceu em diversas posições,

inclusive ligada a um nome; mas a posição mais frequente foi depois do verbo

(cf. ex. 63).

62. A muito tempo no parque eu estava sozinha mais, apareceu minha amiga

Gabriele ela é engraçada e alegre. [Redação, 5º ano]

Page 110: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

110

63. O casal vivia há cerca de um ano e meio num apartamento de subúrbio.

[Jornal, Extra]

Gráfico 7 - Posição da expressão na predicação em narrativas e notícias

Por fim, vale salientar que a primeira análise indicou particularidades

entre os gêneros estudados, mas também semelhanças quanto aos usos das

expressões temporais.

4.2. As expressões temporais nos planos discursivos figura e fundo

O conceito de planos discursivos é relacionado à característica das

narrativas de apresentarem elementos destacados em relação a outros. Esses

elementos em destaque são os que inserem o conteúdo narrativo, a história/o

problema, (figura); e os demais são os que inserem informações, situam,

temporalizam, enriquecem a narrativa (fundo).

Hopper e Thompson (1980) relacionam diretamente o conceito de planos

discursivos ao de transitividade e apresentam dez parâmetros que caracterizam

juntos uma cláusula transitiva, e, consequentemente, o plano figura: i) ter dois

ou mais participantes; ii) ser ação; iii) ter aspecto perfectivo, iv) ser um evento

60%

25%24%

46%

0%22%16%

7%0102030405060708090

100

Redações Notícias

Posição da expressão na predicação em narrativas e notícias

Antes do verbo

Depois do verbo

Ligado a um nome

Complementando

Page 111: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

111

pontual; v) ter sujeito intencional; vi) ser afirmativa; vii) estar no modo realis;

viii) ter sujeito agente; ix) ter objeto afetado; x) ter objeto individuado.

Considerando a noção de continuum dos planos discursivos, optou-se por

uma adaptação da proposta de Silveira (1990), estabelecendo uma escala que

considera dois níveis de fundidade. Assim, os parâmetros de transitividade

foram reorganizados em níveis de 0 a 10 em três grupos. O primeiro engloba as

pontuações de 0 a 4, o segundo, de 5 a 7, e o terceiro de 8 a 10. Dessa forma,

verifica-se o grau de fundidade do trecho no texto: o primeiro grupo representa

+ fundo (fundo 1); o segundo, um nível intermediário de fundo (fundo 2); e o

terceiro representa trechos de figura.

Caracterizam-se, então, as expressões temporais formadas por haver +

N/SN, de acordo com o plano discursivo, partindo-se da hipótese de que tais

expressões apareçam de forma predominante em contexto de fundo, visto que

indicam circunstâncias.

Deve-se ressaltar que, na observação dos dados, foram verificadas duas

questões em relação à análise da transitividade das cláusulas. A primeira

relaciona-se ao fato de que o conceito de transitividade não dá conta de

cláusulas passivas. A segunda diz respeito ao fato de que há expressões

inseridas em frases nominais, que não atendem a qualquer parâmetro.

Diante disso, havia três possíveis decisões: i) desconsiderar esses dados;

ii) adotar a proposta de Furtado da Cunha (1996) para análise de transitividade

de cláusulas passivas e, ainda assim, não resolver a questão das frases

nominais; iii) considerar tais dados como plano de fundo, visto que não

atendem a parâmetros de transitividade ou atendem a pouquíssimos.

Descartou-se a primeira porque se pretende verificar, de fato, as

tendências das expressões, sem que se percam informações. A segunda também

não foi adotada porque não daria conta das duas questões. Assim, optou-se por

categorizar as sentenças passivas e as frases nominais como plano discursivo

fundo 1, sem, porém, deixar de tecer observações sobre tais dados

separadamente.

Page 112: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

112

A primeira observação feita na análise foi a confirmação da hipótese de

que as expressões são mais produtivas no plano discursivo fundo 1. O

resultado era esperado, pois a indicação de tempo e lugar — circunstâncias em

que ocorre a história — costuma aparecer em trechos de fundo.

Como se verifica na tabela abaixo, houve raríssimas expressões em

cláusulas figura (3,5%). As expressões ocorreram predominantemente nos

planos discursivos de fundo.

Fundo 1 Fundo 2 Figura

137/200

68,5%

56/200

28%

7/200

3,5%

Tabela 7 – Produtividade dos planos discursivos figura, fundo 2 e fundo 1 nas suamostra

Aplicando-se os parâmetros de transitividade propostos por Hopper e

Thompson (1980) no exemplo abaixo, mostra-se que a expressão temporal está

inserida em trecho de fundo 1, pois a cláusula com a expressão apresenta baixa

transitividade. Nela há apenas um participante envolvido (o casal), que é um

sujeito não agente e não intencional; não há objeto afetado e individuado; o

verbo não indica uma ação e é imperfectivo, embora esteja no modo realis; o

evento não é pontual, e a frase é afirmativa. A essa sentença, então, atribui-se

pontuação 2.

64. Brasileira é assassinada com dois tiros em Portugal

Lisboa – Uma brasileira foi assassinada na última sexta-feira na cidade

portuguesa de Belas, a 16 quilômetros de Lisboa. Sandra Ruela, de 39

anos, levou dois tiros e, segundo jornal “Diário de Notícias”, há indícios

de que o responsável pelo crime é o seu namorado, o agente de polícia

Vitor Manuel Contente, de 42, que teria cometido o crime durante cena

de ciúmes.

Page 113: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

113

O jornal disse que Vitor se entregou à polícia, mas não houve

confirmação oficial. O casal vivia há cerca de um ano e meio num

apartamento de subúrbio. De acordo com uma vizinha, “quando o

policial bebia, alterava o seu comportamento e havia grandes brigas”.

[Jornal, Extra]

Percebe-se que a sentença com a expressão temporal está em plano de

fundo, além da baixa transitividade, porque ela apenas acrescenta elementos à

narrativa. O foco da narração está no fato de que uma brasileira levou tiros e

seu namorado, suspeito, se entregou à polícia.

Ainda em relação ao plano fundo 1, destaca-se a semelhança de

comportamento das expressões nos dois gêneros discursivos estudados. Nas

narrativas verificaram-se 68%29 e nas notícias 69% de expressões em trechos de

fundo 1.

Tal semelhança entre os gêneros pode ser verificada também nos demais

planos discursivos. Conforme gráfico 8, as expressões temporais em trechos de

fundo 2 (cf. ex. 65) ocorreram em 29% das redações e em 275 das notícias, e em

trechos de figura foram pouquíssimo produtivas (cf. ex. 66) nos dois gêneros.

29 Novamente aqui optou-se por não apresentar os números absolutos por serem equivalentes aos percentuais.

Page 114: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

Gráfico 8

Abaixo verifica-se um exemplo de expressão em plano de

segundo os parâmetros de transitividade. Na cláusula com a expressão

temporal, verifica-se que há um sujeito agente e intencional; o verbo indica uma

ação perfectiva e está no modo

evento não é pontual, não há objeto afetado ou individuado e há apenas um

participante — parâmetros positivos para a transitividade. Sendo assim, atribui

se a tal sentença a pontuação 6.

65. Eu e meu amigo

A muito tempo um dia ruim para mim eu vim para escola e já tinha

chego tarde. Então eu so pode entra no segundo tempo e foi que

começou.

No recreio eu e o meu amigoRonald fomos pego pelo epeto no banheiro

e quando nois dos tava fugindo do espeto eu levei o maio tom

mundo foi tão feio que o espeto esqueceu até de me leve para a

secretaria. [Redação, 7º ano]

No exemplo abaixo

alta transitividade, já que atinge pontuação oito, segundo os parâmetros

0

20

40

60

80

100

Redações

68%

Planos discursivos nas narrativas e notícias

8 – Planos discursivos nas narrativas e notícias

se um exemplo de expressão em plano de

segundo os parâmetros de transitividade. Na cláusula com a expressão

se que há um sujeito agente e intencional; o verbo indica uma

e está no modo realis; a sentença é afirmativa. Por outro lado, o

evento não é pontual, não há objeto afetado ou individuado e há apenas um

parâmetros positivos para a transitividade. Sendo assim, atribui

se a tal sentença a pontuação 6.

um dia ruim para mim eu vim para escola e já tinha

chego tarde. Então eu so pode entra no segundo tempo e foi que

No recreio eu e o meu amigoRonald fomos pego pelo epeto no banheiro

e quando nois dos tava fugindo do espeto eu levei o maio tom

mundo foi tão feio que o espeto esqueceu até de me leve para a

secretaria. [Redação, 7º ano]

No exemplo abaixo, a expressão com haver está em uma cláusula com

alta transitividade, já que atinge pontuação oito, segundo os parâmetros

Redações Notícias

69%

29% 27%

3% 4%

Planos discursivos nas narrativas e notícias

114

se um exemplo de expressão em plano de fundo 2,

segundo os parâmetros de transitividade. Na cláusula com a expressão

se que há um sujeito agente e intencional; o verbo indica uma

a sentença é afirmativa. Por outro lado, o

evento não é pontual, não há objeto afetado ou individuado e há apenas um

parâmetros positivos para a transitividade. Sendo assim, atribui-

um dia ruim para mim eu vim para escola e já tinha

chego tarde. Então eu so pode entra no segundo tempo e foi que

No recreio eu e o meu amigoRonald fomos pego pelo epeto no banheiro

e quando nois dos tava fugindo do espeto eu levei o maio tombo do

mundo foi tão feio que o espeto esqueceu até de me leve para a

está em uma cláusula com

alta transitividade, já que atinge pontuação oito, segundo os parâmetros

Fundo 1

Fundo 2

Figura

Page 115: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

115

adotados. Os pontos positivos para transitividade são: dois participantes

(quatro criminosos e um ônibus); ação perfectiva, no modo realis; o sujeito

intencional e agente; o objeto afetado; sentença afirmativa. Como pontos

negativos, indicam-se a não pontualidade do evento e a não individuação do

objeto.

66. PMs evitam que mais um ônibus seja incendiado em favela na Maré

Criminosos assaltaram passageiros na Linha Amarela e sequestraram

veículo

A rápida ação de policiais do 22º BPM (Penha) evitou ontem de manhã

que traficantes da Vila do João, no Complexo da Maré, em Bonsucesso,

incendiassem um ônibus da linha 485 (Penha-Leblon), que fora assaltado

e sequestrado momentos antes num ponto na Linha Amarela, perto da

Vila dos Pinheiros. [...]

Há oito dias, num caso parecido, quatro criminosos incendiaram um

ônibus da linha 634A (Ilha do Fundão-Del Castilho, que faz integração

com o metrô), na Vila dos Pinheiros, também na Maré, depois de

sequestrá-lo na Linha Amarela e assaltar os passageiros. Os bandidos

aproveitaram que o ônibus parou num ponto da via expressa para

render o motorista, que foi obrigado a levar o veículo para a favela. Lá,

cerca de 30 passageiros foram saqueados e depois receberam ordem para

desembarcar. [Jornal, O Globo]

Se observado, porém, o conteúdo narrativo da notícia acima, tal sentença

talvez não se enquadre no que se estipula ser figura, pois o trecho no qual está

inserida a expressão não apresenta o principal conteúdo narrativo. A

história/problema narrado é a tentativa de bandidos incendiarem um ônibus

que foi interrompida pela ação de policiais. O trecho com a expressão temporal

Page 116: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

116

acrescenta demais informações à narrativa, indica um caso parecido que

ocorreu anteriormente.

Ressalta-se, no entanto, que, dos sete dados encontrados nos jornais e

redações com expressão em trecho de figura (segundo os parâmetros de

transitividade), em apenas três a sentença analisada apresenta o foco da

narrativa. Nos demais, os trechos em questão exemplificam ou adicionam

informação à narrativa.

A fim de entender e sistematizar as características das poucas expressões

no plano discursivo figura, comparam-se os resultados referentes a esse plano

discursivo com as posições da expressão tanto na predicação quanto no texto.

Nos dois gêneros, as expressões de figura estão predominantemente no

início da predicação. Isso ocorre nos três dados das redações e em três dos

quatro dados das notícias. Nas redações, as três expressões em trecho figura

estão em porção inicial de texto; nas notícias, há uma distribuição entre as

posições: uma em início de texto, uma no centro e duas em posição final.

Embora tenham sido verificadas semelhanças nos dois gêneros

analisados em relação aos dois planos fundo e ao plano figura, foi vista

também uma grande diferença entre os gêneros quanto aos dados de frases

passivas e nominais, mencionados anteriormente.

Como já indicado, essas frases foram consideradas como fundo 1 na

análise, mas se observaram uma a uma a fim de se entenderem tais estruturas.

Percebeu-se, então, uma grande discrepância entre os gêneros. Registraram-se

32 dados dessas frases, dos quais 29 estavam em textos de notícias e apenas três

em textos de narrativas escolares.

Tal discrepância é compreensível se detalhados os dados. Nas redações,

as três ocorrências foram de frases passivas, tal como:

67. Há três semanas passadas uma menina de comunidade carente foi

brutalmente morta por uma bala perdida na saída de uma escola

municipal. [Redação, 9º ano].

Page 117: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

117

Já nas notícias, apenas sete dados foram de passivas, 22 foram de frases

nominais, como:

68. Prefeito há 25 dias, (...) [jornal, Extra]

Por não terem ocorrido expressões em frases nominais nas narrativas,

houve essa grande diferença. Assim, a opção de considerar essas frases como

fundo 1 influenciou significativamente no resultado dos jornais, mas não no das

redações.

4.3. As expressões temporais no fluxo de informação

O fluxo de informação relaciona-se ao armazenamento de informação na

memória. As informações no discurso podem ter três possibilidades de status de

acordo com o estado de ativação da informação: ativo (conceito focalizado),

semi-ativo (conceito do qual os interlocutores têm consciência ou

conhecimento) e inativo (conceito que ainda não esteve ativo ou semi-ativo).

A análise do fluxo de informação indicou, como se verifica na tabela

abaixo, que, no total de dados, foi mais comum o fato de as unidades

entonacionais com haver + N/SN expressarem conceitos semi-ativos ou

inativos.

Ativo Semi-ativo Inativo

38/200

19%

85/200

42,5%

77/200

38,5%

Tabela 8 – Relação entre as sentenças com as expressões temporais e o fluxo de informação

Page 118: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

Na comparação do fluxo de informação entre os gêneros

grande diferença entre as narrativas escolares e as notícias. Nas narrativas, as

expressões estão predominantemente em unidades que introduzem uma

informação, ou seja, representam um conceito

por outro lado, há um maior número informações de conceitos

ex. 66) ou ativos (cf. ex.

divergência nos resultados de cada gênero pode ser verificada no gráfico

abaixo:

Gráfico 9

O percentual de ocorrências do fator mais produtivo foi similar nos dois

gêneros: 59% de conceitos

ativos para as notícias.

Na notícia abaixo, do jornal

em uma unidade que apresenta um conceito

dias”. Esse conceito foi considerado

sido inserida a informação de que o namoro havia terminado. Lo

conceito ainda estava em foco na comunicação.

0

20

40

60

80

100

Redações

14%

Status informacional nas narrativas e notícias

Na comparação do fluxo de informação entre os gêneros

grande diferença entre as narrativas escolares e as notícias. Nas narrativas, as

expressões estão predominantemente em unidades que introduzem uma

informação, ou seja, representam um conceito inativo (cf. ex. 67). Nos jornais,

por outro lado, há um maior número informações de conceitos semi

65), que totalizam 83% dos dados desse gênero. E

divergência nos resultados de cada gênero pode ser verificada no gráfico

– Status informacional nas narrativas e notícias

percentual de ocorrências do fator mais produtivo foi similar nos dois

gêneros: 59% de conceitos inativos para as narrativas e 60% de conceitos

Na notícia abaixo, do jornal O Globo, a expressão temporal está inserida

em uma unidade que apresenta um conceito ativo: “O namoro acabou

”. Esse conceito foi considerado ativo porque em trecho anterior já havia

a informação de que o namoro havia terminado. Lo

conceito ainda estava em foco na comunicação.

Redações Notícias

24%26%

59%60%

17%

Status informacional nas narrativas e notícias

118

Na comparação do fluxo de informação entre os gêneros, percebe-se

grande diferença entre as narrativas escolares e as notícias. Nas narrativas, as

expressões estão predominantemente em unidades que introduzem uma

). Nos jornais,

semi-ativos (cf.

83% dos dados desse gênero. Essa

divergência nos resultados de cada gênero pode ser verificada no gráfico

percentual de ocorrências do fator mais produtivo foi similar nos dois

para as narrativas e 60% de conceitos semi-

, a expressão temporal está inserida

O namoro acabou há nove

m trecho anterior já havia

a informação de que o namoro havia terminado. Logo, esse

Ativo

Semi-ativo

Inativo

Page 119: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

119

69. Romance com sabor amargo

Pesquisa da Fiocruz revela que 85% das adolescentes já foram vítimas

de violência durante namoros

O namoro de Mariana (nome fictício), 16 anos, começou como qualquer

outro relacionamento adolescente, mas terminou com problemas de

gente grande. No início, o rapaz de 24 anos, seu primeiro namorado, era

calmo e presente. Quatro meses depois, ele se tornou autoritário,

ciumento, controlador e violento,a ponto de agredi-la verbalmente e

fisicamente diversas vezes. O namoro acabou há nove dias, quando ele,

depois de crise de ciúmes, bateu na adolescente, grávida de três meses.

(...) [Jornal, Extra]

O texto jornalístico abaixo exemplifica uma expressão contida em um

trecho com um conceito semi-ativo. No título e ao longo do texto, são

apresentas informações relativas a possibilidade de Juan jogar. Assim, por meio

de uma associação, torna-se previamente semi-ativada a noção de que há

interesse do técnico de que o jogador atue. Portanto, a informação de que o

técnico estuda essa opção há um tempo foi considerada semi-ativa.

70. Fla pode ter ala esquerda com Juan e Everton contra o Flu

Andrade faz treino secreto e experimenta uma nova formação para o

time

A medida em que o clássico contra o Fluminense se aproxima, o técnico

Andrade vai fazendo do mistério a grande arma do Flamengo. Ontem,

ele comandou um treino secreto e vai repetir a dose hoje. Tudo para

treinar uma possível mudança no time: a volta de Juan à lateral-

esquerda, com Everton passando para o meio campo e atuando ao lado

de Petkovic na armação das jogadas, com Zé Roberto e Adriano no

ataque.

Andrade nunca escondeu a sua admiração pelo futebol de Everton. Ao

Page 120: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

120

mesmo tempo, não pode abrir mão da experiência e do talento de Juan

na lateral esquerda. Uma opção que vem estudando há muito tempo, e

que poderá pôr em prática diante do Fluminense, é a escalação de

Everton como um meia, tendo liberdade para chegar ao ataque,

revezando com Zé Roberto na função. [Jornal, O Globo]

Já na narrativa escolar abaixo, há um exemplo de conceito previamente

inativo. Ocorre, nesse dado, a ativação de um conceito, a introdução de uma

informação. Ainda não havia sido mencionada no texto a morte de alguém, nem

mesmo algum termo com o qual tal assunto pudesse ser associado.

71. Certo dia, um garoto estava andando perto da casa de um garoto que

morreu a muito tempo. O meu amigo foi lá e vil e ele e falou assustado!

- Sai daí rápido!!!!!! O garoto respondeu:

- Por-que? Porque, você vai morrer disse o meu amigo. E o garoto saiu

correndo. [Redação, 3º ano EF]

Dadas as diferenças de tendências de fluxo informacional entre os

gêneros textuais, procuraram-se relações entre este e os demais fatores, a fim de

entender a divergência de comportamento e de sistematizar as particularidades.

Confirmando a hipótese, percebeu-se uma aparente relação entre a

posição da expressão no texto e o fluxo informacional. Conforme o gráfico

abaixo, a maior parte dos dados (62/109) com a expressão em posição textual

inicial expressa conceitos inativos. Por outro lado, os conceitos semi-ativos e

ativos foram mais recorrentes em posição central (32/61) ou final (22/30).

Page 121: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

Gráfico 10 - Fluxo de informação nas posições textuais (percentuais)

Na observação dos resultados referentes às notícias na tabela abaixo, não

se levantam muitas questões sobre a relação entre

posição da expressão no texto. Percebe

os tipos de conceitos, a posição central é mais produtiva. Já na parte

redações, chamaram atenção os conceitos

que introduzem um conceito estão em posição textual inicial.

Notícias

Ativo Semi

Inicial 9/24

37,5%

Central 12/24

50%

Final 3/24

12,5%

Tabela 9 - Fluxo de informação nas posições textuais (percentuais) em cada gênero

0

20

40

60

80

100

Ativo

14,7%

27,9%

Fluxo de informação nas posições textuais (percentuais)

Na observação dos resultados referentes às notícias na tabela abaixo, não

se levantam muitas questões sobre a relação entre status informacional e a

posição da expressão no texto. Percebe-se, apenas, que, na expressão de todos

os tipos de conceitos, a posição central é mais produtiva. Já na parte

redações, chamaram atenção os conceitos inativos, porque 93% das expressões

que introduzem um conceito estão em posição textual inicial.

Notícias Redações

Semi-ativo Inativo Ativo Semi-ativo

17/59

29%

6/17

35%

7/14

50%

14/26

54%

26/59

44%

8/17

47%

5/14

36%

6/26

23%

16/59

27%

3/17

18%

2/14

14%

6/26

23%

Fluxo de informação nas posições textuais (percentuais) em cada gênero

Ativo Semi-ativo Inativo

28,7%

59,9%

27,9%

52,4%

19,7%16,7%

73,3%

10%

Status informacional nas narrativas e notícias

121

Fluxo de informação nas posições textuais (percentuais)

Na observação dos resultados referentes às notícias na tabela abaixo, não

informacional e a

se, apenas, que, na expressão de todos

os tipos de conceitos, a posição central é mais produtiva. Já na parte referente às

, porque 93% das expressões

Redações

ativo Inativo

14/26

%

56/60

93%

6/26

%

4/60

7%

6/26

%

0/60

Fluxo de informação nas posições textuais (percentuais) em cada gênero

Inicial

Central

Final

Page 122: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

122

Destaca-se a grande diferença nos dois gêneros quanto às informações

em posição inicial. Se por um lado, nas redações foram predominantes

conceitos inativos nessa posição; por outro, nas notícias, houve um grande

número de conceitos semi-ativos e ativos. Acredita-se que tal diferença se deva

à presença obrigatória, nas notícias, de um título, que comumente vem

acompanhado por um subtítulo. Juntos, eles ativam uma série de informações

que serão tratadas no texto. Já nas redações, a presença do título não foi

obrigatória, e em muitas há um título, porém este não dá conta do tema a ser

tratado.

4.4. O comportamento semi-gramatical de haver nas expressões temporais

Na investigação dos usos das expressões de tempo passado formadas

por haver + N/SN temporal, importa também tratar do estatuto funcional desse

verbo. Com essa perspectiva, busca-se verificar o estágio de gramaticalização de

haver a partir da hipótese de que esse verbo atuaria como elemento integrante

de expressão temporal (verbo funcional30, segundo Travaglia, 2002).

Travaglia (1991), ao tratar de verbos gramaticais, engloba haver em um

conjunto de verbos que podem atuar como marcadores temporais. Para ele,

Os marcadores temporais são verbos que, em conjunto com um

sintagma nominal, constituem uma espécie de adjunto adverbial de

tempo indicando sobretudo o quando de uma situação ou sua

duração. Às vezes podem ser substituídos apenas pelo sintagma

nominal ou por um sintagma adverbial. Sua substituição pode

implicar mudança de toda estrutura da frase. (op. cit.: 57) 30 Segundo Travaglia (2002), um verbo funcional “é um item que não marca uma categoria gramatical dos verbos e outras classes, mas desempenha, nos textos e outras seqüências lingüísticas, um papel nitidamente gramatical, ou seja, de significação externa à língua. Estão nesse caso os marcadores conversacionais, os marcadores temporais, os ordenadores textuais etc."

Page 123: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

123

Na literatura consultada, encontraram-se diferentes possibilidades de

classificação para tais expressões: oração subordinada adverbial temporal;

oração principal de uma oração subordinada adverbial temporal; oração

subordinada substantiva subjetiva; adjunto adverbial.

Adotou-se, então, a última proposta, lembrando-se de que o verbo haver,

além de predicador, pode exercer uma função mais gramatical na predicação, a

de auxiliar. Acredita-se que, devido a uma adaptação às necessidades

comunicativas, o verbo predicador assuma outras diferentes funções, sofrendo

especializações morfossintáticas e semânticas e mudando seu status

convencional.

A observação dos dados neste estudo evidenciou que haver, de fato,

apresenta propriedades que podem relacioná-lo tanto à categoria de verbo

predicador — em uma de suas extensões de sentido — quanto à de constituinte

gramatical de expressão adverbial

Dentre as principais propriedades verificadas, destacam-se as seguintes:

i) Possibilidade substituição do verbo haver, em alguns casos, por outros verbos

predicadores, tais como completar ou somar(-se), como em:

72. Para se equiparar a São Paulo, que já tem seu museu do futebol em

funcionamento há um ano [Jornal, O Globo]

Para se equiparar a São Paulo, que já tem seu museu do futebol em

funcionamento soma um ano.

73. E às vésperas de um confronto com o vice-líder São Paulo, hoje, às

16h10m, no Maracanã, o bom momento do time, invicto há sete rodadas

[Jornal, Extra]

E às vésperas de um confronto com o vice-líder São Paulo, hoje, às 16h10m, no

Maracanã, o bom momento do time, invicto completam sete rodadas

Page 124: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

124

Por outro lado, há contextos nos quais tal substituição não é possível:

74. A princesa Isabela

A muito tempo atrás, existia uma princesa chamada Isabela. Ela morava

num castelo no meio de um vale.[Redação, 3º ano]

Soma-se/completa muito tempo atrás, existia uma princesa chamada Isabela. Ela

morava num castelo no meio de um vale.[Redação, 3º ano]

ii) Possibilidade, em alguns casos, de substituição do verbo haver por

preposição ou por um advérbio, como, por exemplo, já, de, desde, antes, atrás. Ou

a substituição de toda expressão por um adjunto adverbial. A substituição

depende do aspecto da expressão; desde, por exemplo, substitui haver em

expressões durativas.

75. Estou no clube há seis partidas. [Jornal, Extra]

Estou no clube desde seis partidas.

76. O BuscaPé foi fundado há dez anos por quatro estudantes de engenharia

da USP [Jornal, O Globo]

O BuscaPé foi fundado dez anos atrás por quatro estudantes de engenharia da

USP

O BuscaPé foi fundado década passada por quatro estudantes de engenharia da

USP

iii) Possibilidade, em alguns casos, de supressão do verbo sem acarretar perda

ou alteração semântica, como em:

77. Ele trabalhava no circo a pouco tempo, todas as criança adorava ele.

[Redação, 6º ano EF]

Ele trabalhava no circo pouco tempo, todas as criança adorava ele.

Page 125: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

125

78. Um dia eu estava já na janela á uns dez minutos, quando o menino me

tacou gelatina no meio da cara [Redação, 9º ano]

Um dia eu estava já na janela uns dez minutos, quando o menino me tacou

gelatina no meio da cara

Novamente há contextos nos quais essa propriedade não se aplica. A

possibilidade de supressão do verbo depende do contexto no qual a expressão

está inserida. Parece que só é possível suprimir o verbo se a expressão for

acompanhada por outro elemento temporal (cf. ex. 79) ou indicar um aspecto

durativo, como no exemplo (80). Se o aspecto for pontual, parece haver perda

ou alteração semântica (cf. ex. 81).

79. À um tempão atrás, fizeram votação para escolhermos o nome do

mascote, eram: Cauê, Cauã e Luka. O nome escolhido foi Cauê.

[Redação, 7º ano]

Um tempão atrás, fizeram votação para escolhermos o nome do mascote, eram:

Cauê, Cauã e Luka. O nome escolhido foi Cauê.

80. Sem perder há três rodadas, o Duque de Caxias tenta dar sequência à

boa fase hoje [Jornal Extra]

Sem perder três rodadas, o Duque de Caxias tenta dar sequência à boa fase hoje

[Jornal Extra]

81. A idéia, que surgiu há três meses, já rendeu mais de 240 obras doadas,

que incluem autores como Jorge Amado. [Jornal, Extra]

A idéia, que surgiu há três meses, já rendeu mais de 240 obras doadas, que

incluem autores como Jorge Amado.

iv) Pouca liberdade de manipulação posicional do verbo nas expressões. Haver

ocorre sempre em posição anterior ao termo que exprime somatório de tempo

(cf. ex. 82), não tendo sido verificada qualquer ocorrência com a ordem inversa

Page 126: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

126

(Quatro annos ha que não recebemos aqui cartas de V. P. o que não podemos deixar de

sentir assi por careceremos da consolação31 / A’ par disso, annos há que nenhuma

molestia de caracter epidemico tem se manifestado no Estado, conservando-se em

excellentes condições a saúde pública.32)

82. A muito tempo, em uma Terra de um universo paralelo ao nosso, existia

um grande mago chamado Kalak [Redação, 9º ano EF]

Muito tempo a, em uma Terra de um universo paralelo ao nosso, existia um

grande mago chamado Kalak

Em estágios anteriores da língua, houve maior mobilidade entre os

elementos da expressão, haja vista as inversões documentadas em um dado

datado de 1601 e em outro de 1904. Ao que parece, tais expressões se

submeteram a um processo de especialização que acarretou a fixação da ordem.

v) Neutralização das marcas morfológicas e semânticas do verbo. Haver, em

expressões temporais, só admite flexão de 3ª pessoa do singular presente, com

poucas exceções, ocorrendo no imperfeito (cf. ex. 83). Assume, ainda,

características próprias de categorias secundárias, como de preposição, por

exemplo, visto que se apresenta de forma invariável ligando o elemento ao qual

a expressão se relaciona (“lutava”, no ex. 83) e a quantidade de tempo (“alguns

anos”, no ex. 83). Soma-se a isso, ainda, a atitude dos falantes de relacionar esse

verbo com a preposição a (cf. ex. 84).

31 Carta de D. Luís Cerqueira ao Padre Geral. Nagasaki, 5 de Outubro de 1601 in ARSI, Jap-Sin 20 II, fl. 99-99v. (cham.fcsh.unl.pt/jesuitasnooriente/files/16011005.pdf) consultado em 05/01/2010. 32 Mensagem apresentada ao congresso legislativo pelo Exmo. Snr. Dr. Francisco Xavier da Silva (governador do estado), em 1904. (www.arquivopublico.pr.gov.br/arquivos/File/pdf/msg1904_p.pdf) consultado em 05/01/2010.

Page 127: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

127

83. Pouco antes, na noite de sexta-feira, o comunicador Francisco Carioca, de

69, que estava internado no Hospital do Câncer, em Vila Isabel, perdeu a

batalha coma doença contra a qual lutava havia alguns anos. [Jornal,

extra]

84. Os organizadores descubriram à pouco tempo que há relatos deque os

resultados estão sendo manipulados [Redação, 9º ano EF]

No trecho acima, fica claro que o aluno conhece a ortografia do verbo

haver, já que o representa com h em há relatos. Percebe-se, porém, pela

representação ortográfica de à pouco tempo, que o aluno, possivelmente, não

relaciona o elemento formador da expressão a um verbo, mas, talvez, a uma

preposição, haja vista o uso da crase.

Das cinco propriedades descritas anteriormente, a primeira parece

relacionar haver a um verbo predicador, uma vez que se assemelha a outros

verbos predicadores e pode ser substituído por alguns deles. As demais

propriedades, no entanto, respaldam o entendimento de que o verbo haver, ao

integrar uma expressão de tempo escoado, atua como elemento funcional, uma

espécie de verbo semi-gramatical. Afinal, revelam o processo de especialização

morfossintática e semântica ao qual se submete.

Exploraram-se alguns desses indícios de gramaticalização, na forma de

testes de atitudes linguísticas, direcionados a alunos de diferentes níveis de

ensino. Foram expostos quatro tipos de frases33 a alunos de Graduação e sete

outros tipos para alunos dos ensinos fundamental e médio.

Para os alunos de Graduação foram apresentadas as seguintes frases34:

(I) eu tô com uma rotina já há muito tempo, que, me deixa, muito, afastada do

comércio do bairro... [oral, NURC] 33 As frases utilizadas foram retiradas dos dados do trabalho Expressões temporais com HAVER, FAZER e TER (PAIVA, 2007). 34 Os teste são apresentados nos anexos 1,2 e3.

Page 128: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

128

(II) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que há anos

atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO SÃO [oral, NURC]

(III) Há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia. Liga lá, deve estar

passando agora. [escrito, O Globo]

(IV) mas vejam vocês ... há dois anos { } os estatutos do magistério não conseguem sair

[oral, NURC]

Nesse teste, dirigido a graduandos, questionou-se a aceitação dos

participantes em relação a algumas manipulações feitas nas frases apresentadas.

Perguntou-se se as modificações de supressão do verbo haver, de substituição

por desde ou de acréscimo de desde à expressão acarretariam alteração de sentido

em relação à frase original. Apresentaram-se as seguintes sentenças

modificadas:

(Ia) eu tô com uma rotina já muito tempo, que, me deixa, muito, afastada do

comércio do bairro...

(Ib) eu tô com uma rotina desde muito tempo, que, me deixa, muito, afastada

do comércio do bairro...

(Ic) eu tô com uma rotina já desde há muito tempo, que, me deixa, muito,

afastada do comércio do bairro...

(IIa) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que

anos atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO SÃO

(IIb) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que

desde anos atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO SÃO

(IIc) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que

desde há anos atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO

SÃO

(IIIa) Duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.

(IIIb) Desde duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.

(IIIc) Desde há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.

Page 129: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

129

(IVa) mas vejam vocês ... dois anos { } os estatutos do magistério não

conseguem sair

(IVb) mas vejam vocês... desde dois anos { } os estatutos do magistério não

conseguem sair

(IVc) mas vejam vocês ... desde há dois anos { } os estatutos do magistério não

conseguem sair

Os resultados obtidos na aplicação do teste aos graduandos podem ser

verificados na tabela abaixo:

Frases35 Acréscimo Substituição Supressão

I – “já há muito tempo que” 63/68% 81/87,1% 44/47,3%

II – “há anos atrás” 34/36,5% 50/57,7% 71/76,3%

III – “há duas semanas” 64/68,8% 68/73,1% 39/41,9%

IV – “há dois anos” 56/60,2% 51/54,8% 42/45,1%

Total (372) 217/58,9% 250/67,2% 196/52,7%

Tabela 10 - Resultado dos testes aplicados a graduandos sobre a manutenção do sentido básico da expressão depois da manipulação da mesma

A observação dos resultados leva ao entendimento de que a manipulação

mais bem aceita é a da substituição do verbo na expressão pela preposição

desde. O resultado das demais possibilidades de manipulação indica que há

alguma aceitação por parte dos participantes de que apresentam os mesmos

sentidos a frase original e as modificadas. Isso se afirma porque 52,7% dos

participantes concordam com a supressão do verbo e 58,9% admitem o

acréscimo de desde.

35 Cada frase pode ser assinalada 93 vezes, número do total de participantes do teste.

Page 130: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

130

Deve-se considerar, porém, que, como já afirmado, tais mudanças na

estrutura da expressão dependem do contexto em que elas ocorrem. Por isso,

fizeram-se observações sobre a aceitação das manipulações para cada frase

proposta, e pode-se salientar que:

(i) para o acréscimo de desde ao verbo, a frase “... são certas... liberdades... que

hoje existem... que desde há anos atrás poderiam parecer excessivas” foi a

menos aceita. Tal resultado pode ser justificado pelo caráter durativo da própria

preposição36, que só pode combinar-se com expressões que apresentem um

aspecto também durativo, o que não é o caso da frase proposta.

(ii) no caso da substituição de haver por desde, houve maior aceitabilidade para

as frases “eu tô com uma rotina já muito tempo que me deixa” e “Duas

semanas que o documentário vai ao ar”. Ambas as frases apresentam um

aspecto durativo, o que tenderia a combinar com a preposição desde; no entanto,

a frase II “dois anos { } os estatutos do magistério não conseguem sair” também

apresenta aspecto durativo e não foi bem aceita. O traço comum às frases

aceitas é que ambas são seguidas pelo conectivo que37.

(iii) houve maior aceitabilidade de supressão do verbo na única frase com

aspecto pontual, dentre as quatro apresentadas. Pode-se atrelar, então, a

possibilidade de supressão do verbo ao aspecto da expressão.

Para os alunos dos ensinos fundamental e médio, semelhantemente ao

proposto para os graduandos, apresentaram-se sete frases38, cada qual com três

possíveis modificações para que os participantes indicassem se as frases

modificadas mantinham o valor da original ou se havia alguma variação de

sentido. Solicitou-se que indicassem, ainda, se eles comumente não

produziriam alguma daquelas frases.

As frases apresentadas, com as devidas alterações foram: 36 Desde indica “movimento ou extensão a partir de um momento determinado”. 37 Ao longo das observações dos dados, não se trataram casos nos quais a expressão fosse seguida pelo conectivo que, porque não houve qualquer dado desse tipo nos corpora adotados. 38 A fim de evitar que os alunos copiassem as respostas uns dos outros, apresentaram-se quatro tipos de testes, cada qual com duas frases originais e três modificadas. Uma das frases foi repetida em dois testes distintos; por isso, são sete, não oito frases.

Page 131: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

131

(I) João e Maria, há mais ou menos 2 anos, passeavam perto de sua casa.

(Ia) João e Maria, mais ou menos 2 anos atrás, passeavam perto de sua casa

(Ib) João e Maria, mais ou menos 2 anos, passeavam perto de sua casa.

(Ic) João e Maria, já mais ou menos 2 anos, passeavam perto de sua casa.

(II) Estou no clube há seis partidas.

(IIa) Estou no clube desde seis partidas.

(IIb) Estou no clube seis partidas.

(IIc) Estou no clube desde há seis partidas.

(III) A um fantasma que aterrorisa a cidade a mais de 100 anos.

(IIIa) A um fantasma que aterrorisa a cidade desde mais de 100 anos.

(IIIb) A um fantasma que aterrorisa a cidade desde a mais de 100 anos.

(IIIc) A um fantasma que aterrorisa a cidade mais de 100 anos.

(IV) Há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.

(IVa) Desde duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.

(IVb) Desde há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.

(IVc) Duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.

(V) O namoro acabou há nove dias.

(Va) O namoro acabou desde há nove dias.

(Vb) O namoro acabou há nove dias atrás.

(Vc) O namoro acabou nove dias atrás.

(VI) O RPG foi criado há muito tempo atras por estudantes

(VIa) O RPG foi criado já muito tempo atras por estudantes

(VIb) O RPG foi criado muito tempo atras por estudantes

(VIc) O RPG foi criado já há muito tempo atras por estudantes

(VII) Bárbara faz parte há pelo menos dois anos do programa.

(VIIa) Bárbara faz parte desde pelo menos dois anos do programa.

(VIIb) Bárbara faz parte desde há pelo menos dois anos do programa.

(VIIc) Bárbara faz parte pelo menos dois anos do programa.

Page 132: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

132

Dados os resultados do primeiro teste, observaram-se separadamente as

frases que apresentam aspecto durativo e as que apresentam aspecto pontual.

Através da observação da tabela abaixo, percebe-se que, para o conjunto de

expressões durativas, os participantes avaliaram a anteposição da preposição

desde ao verbo haver como a estrutura que provoca mais alteração de sentido

(37,5%). A mesma estrutura foi considerada, também, como a que os

participantes menos usariam; 38,5% deles indicaram que não usam “desde há

+N/SN”.

Substituição Supressão Acréscimo

Altera

sentido

Não

usaria

Altera

sentido

Não

usaria

Altera

sentido

Não

usaria

II - há seis

partidas

5 /38

13,2%

7/38

18,4%

8/38

21%

12/38

31,6%

14/38

36,8%

15/38

39,5%

III - há mais de

100 anos

3/20

15%

6/20

30%

3/20

15%

1/20

5%

13/20

65%

10/20

50%

IV - Há duas

semanas que

5/18

27,8%

2/18

11,1%

5/18

27,8

2/18

11,1%

9/18

50%

12/18

66,7%

VII - há pelo

menos dois anos

11/20

55%

5/20

25%

2/20

10%

2/20

10%

0/20

0/20

Total 24/25% 20/20,8% 18/17,7% 17/17,7% 36/37,5% 37/38,5%

Tabela 11 - Resultado dos testes aplicados a alunos do EF e EM sobre a manutenção do sentido básico das expressões durativas depois da manipulação da mesma

Na observação de cada frase, percebe-se que:

(i) considerou-se como acarretando mais alteração de sentido a substituição de

haver por desde na frase VII “Bárbara faz parte desde pelo menos dois anos do

Page 133: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

133

programa”. Acredita-se que tal resultado seja porque, quando o SN que

acompanha haver é o substantivo ano, parece haver duas possibilidades de

entendimento: quantidade de tempo ou indicação de idade. Então, na frase

criada pode-se pensar que Bárbara faz parte do programa desde que tinha dois

anos de idade.

(ii) a supressão do verbo causou mais alteração de sentido na frase IV, talvez

porque nela a expressão seja seguida pelo conectivo que “Duas semanas que o

documentário vai ao ar”.

(iii) em relação às frases que não usariam, percebeu-se grande rejeição dos

participantes à substituição de haver por desde nas frases em que o elemento

nominal que compõe a expressão é ano, pela razão já exposta. Na supressão do

verbo, a frase II foi a mais rejeitada, visto que o elemento nominal que

acompanha haver não é um nome com valor temporal, mas situacional; assim, a

noção de quantidade de tempo decorrido desbota-se com essa modificação. Por

fim, para o acréscimo de desde, a única frase para a qual não houve recusa foi a

VII.

Quanto às frases com aspecto pontual, houve poucas indicações de

alteração de sentido em razão das modificações propostas. Isso fica evidente

porque, das quatro frases propostas, em apenas duas os participantes

consideram que houve alteração semântica. O mesmo ocorreu em relação ao

uso das frases apresentadas (cf. tabela 12).

As modificações de substituição de haver por desde e de acréscimo de

atrás à expressão não foram apresentadas na tabela porque não se registrou

qualquer indicação de alteração de sentido ou rejeição para essas mudanças.

Não houve, também, qualquer indicação para as modificações da frase V “O

namoro acabou há nove dias”.

Destaca-se que, para a frase VI, 40% de participantes indicaram apenas

que não usariam a modificação de substituição de haver por já “O RPG foi

criado já muito tempo atras por estudantes”.

Page 134: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

134

Supressão Acréscimo de já Substituição por já

Altera

sentido

Altera

sentido

Altera

sentido

Não

usaria

Altera

sentido

Não

usaria

I - há mais ou

menos 2 anos

3/20

15%

9/20

45%

5/20

25%

3/20

15%

9/20

45%

11/20

55%

VI - há muito

tempo atras

0/20

0/20

0/20

0/20

0/20

8/20

40%

Tabela 12 - Resultado dos testes aplicados a alunos do EF e EM sobre a manutenção do sentido básico das expressões pontuais depois da manipulação da mesma

Diferentemente das demais frases pontuais, para a frase I foram

sinalizadas mudanças de sentido em três modificações. A que mais se destaca é

a substituição de haver por já, para a qual 45% dos participantes indicaram

mudança de sentido. 55% dos participantes afirmaram, também, não usar essa

frase modificada.

Aplicou-se, também, um outro teste a fim de verificar qual das quatro

possíveis classificações39 para as expressões temporais os estudantes de língua

portuguesa consideram mais adequada. Buscou-se investigar a aceitação da

classificação adotada nessa pesquisa. Propuseram-se as seguintes frases40:

I - tem funcionários que ganham um mil a mais que a gente e trabalham aqui há dez...

onze anos [D&G, oral]

II - Teve um dia que eu quase fui assaltado, pois eu estou nesta escola a quase 4 anos

[D&G, escrito]

III - A muitos anos atrás em uma arca que o noé tinha potar todos os animais dentro

dela... [Redação, 3º ano EF] 39 Apresentam-se as classificações na seção 1.2.1 da revisão bibliográfica. 40 Nos testes não foram utilizadas apenas frases dos corpora adotados na presente dissertação, incluíram-se frases de outros corpora.

Page 135: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

135

IV - há dois anos { } os estatutos do magistério não conseguem sair [NURC, oral]

Dadas as frases, os informantes, alunos de Graduação em Língua

Portuguesa, atribuíram para cada sentença a classificação que lhes parecia mais

pertinente. O resultado para as quatro frases pode ser verificado na tabela

abaixo.

Classificação

Fim de predicação Início de predicação

Total .../há dez

anos

.../a quase 4

anos

a muitos

anos atrás/...

há dois

anos/...

OSAT 50/93

53,7%

48/93

51,6%

32/93

34,4%

44/93

47,3%

174/372

46,8%

OP de OSAT 7/93

7,5%

6/93

6,4%

13/93

13,9%

7/93

7,5%

33/372

8,9%

OP de OSSS 7/93

7,5%

7/93

7,5%

9/93

9,6%

5/93

5,4%

28/372

7,5%

AAT 29/93

31,1%

32/93

34,4%

39/93

41,9%

37/93

39,8%

137/372

36,8%

Tabela 13 – Resultados dos testes sobre as possíveis classificações para as expressões temporais

Pela observação da tabela, percebe-se que as classificações mais

produtivas foram as que contemplam a expressão temporal como Oração

Subordinada Adverbial Temporal ou Adjunto Adverbial de Tempo. Os

números evidenciam que, embora muito influenciados pelas descrições

tradicionais, os alunos consultados já aceitam a possibilidade de a estrutura ser

concebida como uma expressão adverbial.

Page 136: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

136

No caso da expressão em início de predicação, as duas opções de

classificação se mostraram equilibradas. Para essas expressões, 40,8% dos

participantes da pesquisa indicaram como classificação OSAT, e 40,8%

indicaram AAT.

As observações dos dados e dos resultados dos testes de atitudes

contribuem para embasar a tese de que o verbo haver atingiu algum grau de

gramaticalização nas construções temporais.

Revendo a análise sob a perspectiva dos princípios apontados por

Hopper (1991) para depreensão de estágios de gramaticalização, apreende-se o

seguinte:

Com relação ao parâmetro da estratificação (Hopper, 1991), verificou-se

que há distintas estruturas para a expressão do tempo passado coexistindo, tais

como diferentes sintagmas adverbiais (dois meses atrás estive com ele, desde anos

estudamos juntos) ou verbos (há dois anos eu estudo aqui / faz uns seis anos que

eu não a vejo/ eu me mudei tem três meses / vai para sete anos que estudo aqui).

Todas essas estruturas podem ser igualmente usadas na expressão de tempo

passado, porém algumas se encaixam em determinados contextos e não em

outros. A preposição desde, por exemplo, é usada em eventos durativos, e atrás,

em eventos pontuais.

Quanto ao princípio da divergência, haver, nessas expressões, revela um

comportamento diferente do que tem em outros contextos. Sabe-se que, na

literatura linguística, são descritos usos do verbo haver em categorias diversas:

verbo predicador (Segundo a polícia, há quatro quadrilhas atuando na capital), verbo

auxiliar (Em São Januário, o time só havia perdido na estreia), verbo semi-auxiliar

(Amanhã há de ter uma boa ideia!), suporte (Houve controle da situação) e, como

mostra esta pesquisa, verbo funcional formador de expressão de tempo (O filho

de Sarney havia recorrido há dois meses).

Com relação ao princípio da especialização, constatou-se que essas

expressões apresentam evidências de se submeterem a esse processo. Na

formação de expressões de tempo passado por meio de verbos, haver integra

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137

um conjunto restrito de recursos, ao menos quatro tipos verbais podem ser

usados como recursos nesse sentido: haver, fazer, ter e ir. O verbo haver é o mais

utilizado na formação de tais expressões no português brasileiro, segundo

pesquisa já mencionada sobre a variação de haver, fazer e ter em expressões

temporais. E, ainda, haver, ao assumir juntamente com N/SN um valor

temporal, revela uma especialização semântico-funcional apresentando um

significado específico de “passagem temporal, desde um ponto no tempo”,

ocorrendo apenas na 3ª pessoa do singular e apresentando uma ordem fixa dos

elementos.

No que diz respeito ao princípio da persistência, haver, de certa forma,

mantém traços do significado original, pois há uma relação de

complementariedade entre o verbo e o elemento que o acompanha; e, ainda, o

verbo haver parece manter a ideia de existência.

Com isso, percebe-se que haver resulta de processo de decategorização:

de verbo predicador a verbo funcional. As expressões em questão parece

assemelharem-se a adjuntos adverbiais, haja vista a possibilidade de

substituição de uma estrutura por outra.

Segundo Castilho (1997:52), esses princípios propostos por Hopper

(1991) combinam em si processos e estágios. Por um lado, há os mecanismos

que levam à passagem de uma categoria lexical a categoria gramatical e, por

outro, há princípios gerais que conduzem essa mudança de estatuto. Para ele, os

princípios de especialização e persistência captam aspectos semânticos da

gramaticalização.

A partir dos princípios propostos por Hopper (1991), verifica-se que, de

fato, o verbo haver como formador de expressão temporal está em

gramaticalização. Então, a partir do pressuposto de que a gramaticalização é

um processo gradual, não é abrupta, pode-se propor um continuum de

gramaticalização do verbo haver:

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138

Verbo predicador Verbo funcional + LEXICAL + GRAMATICAL

Figura 3 – Continuum de verbo predicador a verbo funcional41

Segundo Travaglia (2003), os verbos em gramaticalização podem seguir

duas cadeias de estágios:

(I) Verbo pleno42 > (forma perifrástica: verbos semi-auxiliares/auxiliares) >

verbo de ligação ou outro verbo funcional – marcador temporal, operador

argumentativo etc. > aglutinação (clítico > afixo)

(II) Verbo pleno > forma perifrástica (verbos semi-auxiliares/auxiliares) >

aglutinação (clítico > afixo)

Quadro 111 – Adaptação das cadeias de gramaticalização propostas por Travaglia

No quadro acima, cadeia I, a forma perifrástica é colocada entre

parênteses por não ser obrigatória, logo pode haver passagem de verbo pleno

para verbo funcional. Apontam-se, então, com base no continuum proposto pela

pesquisadora, na cadeia I de gramaticalização proposta por Travaglia (2002), e,

ainda, na análise de Sampaio (1978) sobre a trajetória diacrônica de haver,

exemplos das possíveis trajetórias desse verbo:

Sampaio (1978) considera que “o verbo haver é um caso típico de

gramaticalização, processo sofrido por verbos que se tornam auxiliares”. Para

José Roca Pons (apud, Sampaio, 1978) na conjugação perifrástica está

41 Segundo Travaglia, verbo pleno é o núcleo do predicado (elemento com conteúdo nocional); verbo funcional é um item que não marca categoria gramatical dos verbos e desempenha papel gramatical; verbos auxiliares são os que na forma nominal acompanham verbos nucleares indicando as categorias de número, pessoa, tempo e modo. 42 O autor chama de verbo pleno os verbos predicadores, porque trata da gramaticalização de verbos, que se dá pela passagem de um verbo lexical para um verbo gramatical.

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139

“abandonada e olvidada a idéia de posse”. Assim sendo, conclui-se que o verbo

teria como exemplo de seu uso mais lexical, em seu sentido pleno, a seguinte

frase: E disse-lhe Lot: eu hei duas filhas, que ainda nom conhecerom barom. Seguindo

um caminho da trajetória de gramaticalização, há o uso auxiliar (mas ela me disse

que o nom faria, porque eu lhe havia feitas tantas enjúrias).

Com base no proposto, supõe-se que há uma outra trajetória seguida

pelo mesmo verbo: a partir do uso pleno, ocorrem extensões de sentido,

incluindo-se o valor impessoal existencial (Além destes soldados e capitães havia

outros, no recôncavo da cidade), e, como um tipo de uso impessoal, há o uso

funcional, mais gramaticalizado, indicador de circunstância de tempo (havia já

seis ou sete dias que era chegado) 43.

Castilho (1997) indica que o continuum de gramaticalização se constitui a

partir de categorias maiores (nome, verbos, pronomes) para categorias

medianas (adjetivo, advérbio) e posteriormente para categorias menores

(preposição, conjunção).

Consideraram-se, também, os mecanismos apresentados por Heine

(2003), a fim de aprofundar a análise do processo de gramaticalização. Assim,

acredita-se que a semi-gramaticalização do verbo haver em expressões de

tempo escoado seria iniciada pelo mecanismo de extensão, com a ampliação

dos contextos de uso. A partir do uso pleno, de posse, há a apresentação de

novos sentidos para os demais usos, incluindo os impessoais e o marcador

temporal, conforme os exemplos apresentados por Sampaio (1978):

I – ... nunca rei cristaaõ houve tantos cavaleiros, nem tantos homeēs bõos aa sua mesa,

como hoje eu hei, nem haverá jamais. (A demanda do Santo Graal, pág. 68) - posse

II - Rubião não sabia haver-se com senhoras. (Machado de Assis - Quincas Borba,

pág. 47) - “comportar-se”

43 Todos os exemplos expostos neste parágrafo e no anterior foram retirados de Sampaio (1978).

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140

III - Êste era um cabelereiro... que vendera ao Tomé Gonçalves dez cabeleiras,... sem lhe

haver um real. (Machado de Assis – Histórias sem data, pág. 28) - “receber,

perceber”

IV - Lula “está diretamente envolvido com a candidatura brasileira desde o seu

início, há dois anos”44 (Jornal, O Globo)— marcador temporal

Consequentemente, é acionada a dessemantização, porque ocorre uma

perda ou esvaziamento de valor semântico. Ou seja, na expressão temporal, o

verbo haver deixa de carregar um significado semântico e passa a significar,

conjuntamente com o N/SN que o acompanha, “uma dada quantidade de

tempo que se passou a partir de uma dado momento.”

Esse processo de mudança pode chegar a decategorização, visto que há

perda de propriedades características da forma matriz, como, por exemplo, a

possibilidade de flexão ou possibilidade de se mover pela sentença. A

decategorização levaria, assim, o verbo haver a funcionar não mais como um

verbo predicador, mas como um verbo funcional — um operandum auxiliar

temporal (cf. Machado Vieira, 2001).

Dentre os mecanismos propostos por Heine (2003), não se verifica apenas

a erosão, uma vez que não há perda de substância fonética. O autor já aponta,

contudo, que tal mecanismo não é condição necessária para a ocorrência da

gramaticalização.

Além dos mecanismos analisados acima, foi observada, também, a

frequência, um outro forte elemento apontado por Bybee (2003) que corrobora a

hipótese da gramaticalização. Analisando a frequência de tipo, ou seja, o

número de instâncias diferentes de uma determinada unidade linguística em

uma dada amostra, verificaram-se os tipos de substantivos que acompanham o

verbo haver na formação da expressão temporal.

No total da amostra, ocorreram apenas nove tipos de substantivos: dias,

tempo, meses, anos, semanas, décadas, jogos, partidas e rodadas. Esses

substantivos podem ser divididos em dois tipos, conforme o valor semântico. Os

44 Exemplo retirado da subamostra de notícias.

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seis primeiros são nomes que indicam quantidade de tempo e os três últimos,

embora, metaforicamente, também possam definir espaços temporais,

representam uma espécie de evento.

Eventos Dias Tempo Meses Anos Semanas Décadas

Jornal 9 9 3 20 47 11 1

Redação 0 5 32 16 41 6 0

Total 9/4,5% 14/7% 35/17,5% 36/18% 88/44% 17/8,5% 1/0,5%

Tabela 14 – Tipos de substantivos que acompanham haver na formação da expressão

O tipo mais frequente de elemento acompanhando haver na formação da

expressão foi o substantivo anos. Ainda que apareçam outros tipos de

substantivos, a expressão é formada essencialmente por nomes indicadores de

quantidades de tempo.

Analisando a frequência de ocorrência, percebe-se pouca produtividade

da expressão estudada, o que fica evidente se observada a coleta de dados de

redações: para um conjunto de 100 dados, foram consultados 1038 textos. Vale

ressaltar, todavia, que a pouca produtividade não é característica apenas das

expressões formadas pelo verbo haver, mas, sim, das expressões indicativas de

tempo passado de maneira geral, que ocorrem mais frequentemente em

narrativas.

Porém, em comparação com outras possibilidades de formação de

expressões temporais, percebe-se que o tipo mais frequente é o formado por

haver. Segundo Paiva (2007), a frequência desse verbo é maior até mesmo na

modalidade oral espontânea, — contexto esse propício para uma expressão

formada pelo verbo ter ou até mesmo sem verbo.

Dadas as considerações feitas, conclui-se que haver, ao atuar como

elemento formador de expressão temporal, não se enquadra em uma categoria

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142

de predicador, mas também não se pode afirmar que seja um elemento

totalmente gramatical, tal como uma preposição. Percebe-se, ainda, no verbo

haver algum traço do caráter verbal, embora a expressão indique o significado

específico de tempo decorrido e admita substituição por um advérbio ou

preposição. Considera-se, então, haver, nesse contexto, como um verbo (semi-)

gramaticalizado, um elemento funcional que juntamente com sintagma nominal

com valor temporal compõe adjuntos adverbiais.

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143

5. Considerações finais

Na presente dissertação, propôs-se investigar, à luz da Teoria

Funcionalista, os usos das expressões temporais formadas pelo verbo haver

que, juntamente com um elemento nominal, indica um transcurso de tempo ou

um dado momento no passado a partir de um ponto no eixo temporal.

Examinou-se, ainda, o processo de (semi-) gramaticalização de haver em tais

expressões.

Documentaram-se usos de haver em textos da modalidade escrita do

português brasileiro de: (i) redações escolares do tipo narrativo de níveis

distintos de escolaridade (primeiro e segundo segmentos do ensino

fundamental e ensino médio); (ii) textos do gênero notícia jornalística, oriundos

dos jornais Extra e O Globo. Além disso, registraram-se resultados obtidos em

testes de avaliação subjetiva de expressões temporais, realizados com base em

metodologia de pesquisa de atitudes.

A investigação sobre as propriedades das construções haver + N/SN

com valor temporal e seu comportamento sintático-semântico contribuiu para

uma descrição dos diferentes empregos desse tipo de expressão e, ainda, para

uma definição de seu estatuto, a partir da verificação do nível de

gramaticalização de haver.

Inicialmente, sintetizaram-se diferentes abordagens sobre as expressões

temporais, feitas por autores diversos. Verificando-se dicionários, gramáticas

normativas e pesquisas linguísticas, foi possível observar pontos de

similaridade e de diferença entre as interpretações sobre as expressões em

estudo. Não obstante, poucas são as pesquisas encontradas que se dedicam

aprofundadamente sobre o tema. Assim, o presente estudo contribui para um

conhecimento mais detalhado das expressões haver + SN temporal também pelo

fato de expor um pouco da literatura sobre o tema. Além disso, apresenta uma

investigação sobre as propriedades e o comportamento morfossemântico de

haver nessas estruturas e, ainda, sobre o seu estatuto categorial.

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144

A partir das observações dos dados, foi possível sistematizar as

características mais recorrentes das expressões de tempo passado formadas por

haver: apresentam-se na estrutura haver + numeral/pronome indefinido +

substantivo com valor temporal; têm como ponto de ancoragem temporal o

momento de enunciação; ligam-se a uma oração e ocorrem,

predominantemente, em plano discursivo de fundo.

Com apoio de orientações da Linguística Textual referentes a gêneros e

tipologias textuais, observaram-se particularidades nos usos das expressões em

cada gênero.

Nas notícias jornalísticas, o elemento nominal que acompanha haver foi

predominantemente delimitável. Em relação ao aspecto durativo ou pontual da

expressão, houve equilíbrio; já quanto ao fluxo de informação, as notícias

apresentam com mais frequência conceitos semi-ativos. A posição da expressão

nos textos de notícias é variável, porém, viu-se uma predominância de posição

textual central. Para a posição da expressão na predicação, também se percebeu

uma maleabilidade, embora a posição mais frequente tenha sido depois do

verbo.

Por outro lado, nas redações escolares, houve um equilíbrio entre o

elemento que acompanha haver ser delimitável e não-delimitável. O aspecto da

expressão foi predominantemente pontual, e os conceitos apresentados inativos.

As expressões ocorreram mais frequentemente em porções introdutórias de

texto e antes do verbo.

A investigação sobre a gramaticalização de haver partiu da observação:

(i) das possibilidades de substituição desse verbo por preposição ou por um

advérbio e de supressão do verbo sem que esta acarretasse perda ou alteração

semântica; (ii) da pouca liberdade de manipulação do verbo, que ocorre sempre

em posição anterior ao termo que exprime somatório de tempo; (iii) da

neutralização das marcas morfossemânticas do verbo, já que haver nessas

expressões só admite flexão de 3ª pessoa do singular presente e juntamente SN

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145

indica o significado específico de “ter-se decorrido um transcurso de tempo a

partir de um dado momento”.

Algumas dessas propriedades foram empiricamente verificadas por meio

de testes de atitude linguística. Constatou-se a aceitação dessas propriedades,

porém com algumas restrições: (1) houve mais aceitação da substituição da

expressão durativa pela preposição desde e da expressão pontual pelo advérbio

atrás; (2) a aceitação de supressão do verbo foi maior em frases pontuais.

Ressalta-se que esse teste foi aplicado para o ensino fundamental, ensino médio

e ensino superior e não houve diferença significativa entre os resultados por

níveis de escolaridade.

Averiguou-se, também por meio de testes de atitude, como estudantes de

graduação em Letras entendem a classificação das expressões em estudo, já que

na revisão da literatura sobre o assunto encontraram-se diferentes

possibilidades. Detectou-se que as expressões são entendidas, pelos

participantes, tanto como oração subordinada substantiva subjetiva, quanto

como adjunto adverbial.

Por fim, assumiu-se que haver, enquanto componente da expressão de

tempo passado, funciona como um elemento instrumental formador de

expressão adverbial. Dessa forma, a expressão composta por haver não se

caracterizaria como uma oração, mas, como um adjunto adverbial de tempo. Tal

concepção pode ser reforçada pela seguinte consideração de Adolfo Coelho

(apud Bechara 1999): “há muito se fixa como a indicação dum passado, há não é

apercebido como um verbo, mas antes como preposição (a)”.

Há que se mencionar, ainda, a questão da frequência, pois, embora as

expressões temporais não sejam muito produtivas na língua — tanto as

formadas por verbos como haver, fazer, ter, passar ou ir, quanto as formadas por

preposições ou advérbios —, sabe-se que, dentre todas as estratégias

mencionadas, a formada pelo verbo haver é a mais produtiva seja na

modalidade escrita seja na oral.

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146

Salienta-se que, de modo geral, esta pesquisa contribui para a ampliação

das descrições de propriedades estruturais e semânticas dos empregos das

expressões de tempo passado formadas pelo verbo haver e para o entendimento

do processo de gramaticalização desse verbo. Ainda assim, há muito que se

pesquisar sobre tais expressões. Podem-se investigar corpora diversificados de

modo a contemplar distintas modalidades da língua portuguesa, além de

gêneros textuais diversos. É possível, também, investir em uma análise

comparativa sobre as expressões temporais formadas pelos verbos ter, fazer e

haver para que se verifiquem e comparem os níveis de gramaticalização desses

verbos nessas estruturas.

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Page 156: HÁ MUITO TEMPO ATRÁS UM ESTUDO SOBRE HAVER+ NOME

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ANEXOS

Anexo 1: Teste de atitude — Modelo 1

Pesquisa de opinião

Escolaridade: ( ) Ensino Médio ( ) Superior ( ) Mestrado

ATENÇÃO: NÃO EXISTE CERTO OU ERRADO. NOSSO OBJETIVO É DESCOBRIR AS OPINIÕES

DO FALANTE DE LÍNGUA PORTUGUESA SOBRE AS ESTRUTURAS MARCADAS NOS

TRECHOS DADOS. DÊ SUAS RESPOSTAS, BASEANDO-SE NA MANEIRA PELA QUAL VOCÊ

REALMENTE FALARIA SE USASSE OS TRECHOS EXPOSTOS.

I) Há alguma diferença semântica entre as construções sublinhadas e a em

destaque?

Ou o sentido delas é idêntico?

Analise os trechos e marque com o número da resposta que achar mais

adequada.

1 - Acho que as duas frases possuem o mesmo sentido.

2 - Acho que as formas sublinhadas dão sentidos diferentes para as frases.

a) eu tô com uma rotina já há muito tempo, que, me deixa, muito, afastada do

comércio do bairro...

( ) eu tô com uma rotina já desde muito tempo, que, me deixa, muito, afastada

do comércio do bairro...

( ) eu tô com uma rotina já desde há muito tempo, que, me deixa, muito,

afastada do comércio do bairro...

( ) eu tô com uma rotina já muito tempo, que, me deixa, muito, afastada do

comércio do bairro...

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b) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que

há anos atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO SÃO

( ) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que

desde anos atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO SÃO

( ) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que

desde há anos atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO

SÃO

( ) eles têm às vezes não são... são certas... liberdades... que hoje existem... que

anos atrás poderiam parecer excessivas mas que na realidade NÃO SÃO

c) Há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia. Liga lá, deve

estar passando agora

( ) Desde duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia. Liga lá, deve

estar passando agora

( ) Desde há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia. Liga lá,

deve estar passando agora

( ) Duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia. Liga lá, deve estar

passando agora

d) mas vejam vocês ... há dois anos { } os estatutos do magistério não

conseguem sair

( ) mas vejam vocês ... desde dois anos { } os estatutos do magistério não

conseguem sair

( ) mas vejam vocês ... desde há dois anos { } os estatutos do magistério não

conseguem sair

( ) mas vejam vocês ... dois anos { } os estatutos do magistério não conseguem

sair

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Anexo 2: Teste de atitude — Modelo 2a

Pesquisa de opinião

1º Nome: _____________________ Série:_____________

ATENÇÃO: NÃO EXISTE CERTO OU ERRADO. QUEREMOS SABER SUAS OPINIÕES SOBRE

AS ESTRUTURAS MARCADAS NOS TRECHOS DADOS (ALGUNS FORAM REDIGIDOS POR

ALUNOS). DÊ SUAS RESPOSTAS, BASEANDO-SE NA MANEIRA PELA QUAL VOCÊ

REALMENTE FALARIA SE USASSE OS TRECHOS EXPOSTOS.

I) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?

(Marque a/as diferente/s) Você não usaria alguma delas? Qual?______________

Certo dia, João e Maria, há mais ou menos 2 anos, passeavam perto de sua casa.

a) Certo dia, João e Maria, mais ou menos 2 anos atrás, passeavam perto de sua

casa

b) Certo dia, João e Maria, mais ou menos 2 anos, passeavam perto de sua casa.

c) Certo dia, João e Maria, já mais ou menos 2 anos, passeavam perto de sua

casa.

II) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?

(Marque a/as diferente/s) Você não usaria alguma delas? Qual?______________

Estou no clube há seis partidas.

a) Estou no clube desde seis partidas.

b) Estou no clube seis partidas.

c) Estou no clube desde há seis partidas.

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160

Teste de atitude — Modelo 2b

Pesquisa de opinião

1º Nome: _____________________ Série:_____________

ATENÇÃO: NÃO EXISTE CERTO OU ERRADO. QUEREMOS SABER SUAS OPINIÕES SOBRE

AS ESTRUTURAS MARCADAS NOS TRECHOS DADOS (ALGUNS FORAM REDIGIDOS POR

ALUNOS). DÊ SUAS RESPOSTAS, BASEANDO-SE NA MANEIRA PELA QUAL VOCÊ

REALMENTE FALARIA SE USASSE OS TRECHOS EXPOSTOS.

I) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?

(Marque a diferente) Você não usaria alguma delas? Qual?___________________

A um fantasma que aterrorisa a cidade a mais de 100 anos.

a) A um fantasma que aterrorisa a cidade desde mais de 100 anos.

b) A um fantasma que aterrorisa a cidade desde a mais de 100 anos.

c) A um fantasma que aterrorisa a cidade mais de 100 anos.

II) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?

(Marque a diferente) Você não usaria alguma delas? Qual?___________________

Estou no clube há seis partidas.

a) Estou no clube desde seis partidas.

b) Estou no clube seis partidas.

c) Estou no clube desde há seis partidas.

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Teste de atitude — Modelo 2c

Pesquisa de opinião

1º Nome: _____________________ Série:_____________

ATENÇÃO: NÃO EXISTE CERTO OU ERRADO. QUEREMOS SABER SUAS OPINIÕES SOBRE

AS ESTRUTURAS MARCADAS NOS TRECHOS DADOS (ALGUNS FORAM REDIGIDOS POR

ALUNOS). DÊ SUAS RESPOSTAS, BASEANDO-SE NA MANEIRA PELA QUAL VOCÊ

REALMENTE FALARIA SE USASSE OS TRECHOS EXPOSTOS.

I) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?

(Marque a diferente) Você não usaria alguma delas? Qual?___________________

Há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.

a) Desde duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.

b) Desde há duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.

c) Duas semanas que o documentário vai ao ar noite e dia.

II) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?

(Marque a diferente) Você não usaria alguma delas? Qual?___________________

O namoro acabou há nove dias.

a) O namoro acabou desde há nove dias.

b) O namoro acabou há nove dias atrás.

c) O namoro acabou nove dias atrás.

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Teste de atitude — Modelo 2d

Pesquisa de opinião

1º Nome: _____________________ Série______________

ATENÇÃO: NÃO EXISTE CERTO OU ERRADO. QUEREMOS SABER SUAS OPINIÕES SOBRE

AS ESTRUTURAS MARCADAS NOS TRECHOS DADOS (ALGUNS FORAM REDIGIDOS POR

ALUNOS). DÊ SUAS RESPOSTAS, BASEANDO-SE NA MANEIRA PELA QUAL VOCÊ

REALMENTE FALARIA SE USASSE OS TRECHOS EXPOSTOS.

I) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?

(Marque a diferente) Você não usaria alguma delas? Qual?__________________

O RPG foi criado há muito tempo atras por estudantes

a) O RPG foi criado já muito tempo atras por estudantes

b) O RPG foi criado muito tempo atras por estudantes

c) O RPG foi criado já há muito tempo atras por estudantes

II) Há alguma diferença de sentido entre a construção sublinhada e as outras?

(Marque a diferente) Você não usaria alguma delas? Qual?__________________

Bárbara faz parte há pelo menos dois anos do programa.

a) Bárbara faz parte desde pelo menos dois anos do programa.

b) Bárbara faz parte desde há pelo menos dois anos do programa.

c) Bárbara faz parte pelo menos dois anos do programa.

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Anexo 3: Teste de atitude — Modelo 3

Pesquisa de opinião

Escolaridade: ( ) Ensino Médio ( ) Superior ( ) Mestrado

ATENÇÃO: NÃO EXISTE CERTO OU ERRADO. NOSSO OBJETIVO É DESCOBRIR AS OPINIÕES

DO FALANTE DE LÍNGUA PORTUGUESA SOBRE AS ESTRUTURAS MARCADAS NOS

TRECHOS DADOS. DÊ SUAS RESPOSTAS, BASEANDO-SE NA MANEIRA PELA QUAL VOCÊ

REALMENTE FALARIA SE USASSE OS TRECHOS EXPOSTOS.

I) Considerando que todas são contempladas pelas gramáticas tradicionais,

indique para as frases abaixo a classificação que lhe parece mais adequada.

a) tem funcionários que ganham um mil a mais que a gente e trabalham aqui /

há dez... onze anos

( ) 1- O. S. Adverbial Temporal 2- Oração Principal

( ) 1- Oração Principal 2- O. S. Adverbial Temporal

( ) 1- O. S. Substantiva Subjetiva 2- Oração Principal

( ) 1- Período Simples 2- Expressão Adverbial de tempo

b) Teve um dia que eu quase fui assaltado, pois eu estou nesta escola / a quase

4 anos

( ) 1- O. S. Adverbial Temporal 2- Oração Principal

( ) 1- Oração Principal 2- O. S. Adverbial Temporal

( ) 1- O. S. Substantiva Subjetiva 2- Oração Principal

( ) 1- Período Simples 2- Expressão Adverbial de tempo

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c) A muitos anos atrás / em uma arca que o noé tinha potar todos os animais

dentro dela...

( ) 1- O. S. Adverbial Temporal 2- Oração Principal

( ) 1- Oração Principal 2- O. S. Adverbial Temporal

( ) 1- Oração Principal 2- O. S. Substantiva Subjetiva

( ) 1- Expressão Adverbial de

tempo

2- Período simples

d) há dois anos { } / os estatutos do magistério não conseguem sair

( ) 1- O. S. Adverbial Temporal 2- Oração Principal

( ) 1- Oração Principal 2- O. S. Adverbial Temporal

( ) 1- Oração Principal 2- O. S. Substantiva Subjetiva

( ) 1- Expressão Adverbial de tempo 2- Período simples

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Anexo 4: Posição da expressão na sentença

Posição da expressão na sentença Globo Extra

Antes do verbo – sem sujeito 3 3

Antes do verbo – Entre Sujeito e verbo 1 2

Antes do verbo – Antes do sujeito 8 8

Depois do Verbo – Sem complemento 7 5

Depois do Verbo – Entre o Verbo e o Complemento 5 3

Depois do Verbo – Depois do Complemento 16 10

“Complementando” um verbo 1 6

Antes do nome 2 4

Depois do nome 7 9