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Universidade Federal de Minas Gerais Instituto de Ciências Biológicas Programa de Pós-Graduação em Ecologia, Conservação e Manejo da Vida Silvestre História natural de Tripodanthus acutifolius (Ruiz & Pav.) Tiegh (Loranthaceae) e interação com a comunidade vegetal dos campos rupestres ferruginosos Isabelle Cerceau Brandão Belo Horizonte, dezembro de 2015

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Universidade Federal de Minas Gerais

Instituto de Ciências Biológicas

Programa de Pós-Graduação em Ecologia, Conservação e

Manejo da Vida Silvestre

História natural de Tripodanthus acutifolius

(Ruiz & Pav.) Tiegh (Loranthaceae) e interação

com a comunidade vegetal dos campos

rupestres ferruginosos

Isabelle Cerceau Brandão

Belo Horizonte, dezembro de 2015

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Universidade Federal de Minas Gerais

Instituto de Ciências Biológicas

Programa de Pós-Graduação em Ecologia, Conservação e

Manejo da Vida Silvestre

História natural de Tripodanthus acutifolius (Ruiz

& Pav.) Tiegh (Loranthaceae) e interação com a

comunidade vegetal dos campos rupestres

ferruginosos

Dissertação apresentada à Universidade Federal de Minas Gerais, como pré-requisito do Programa de Pós-Graduação em Ecologia, Conservação e Manejo de Vida Silvestre, para a obtenção do título de Mestre em Ecologia.

Isabelle Cerceau Brandão

Orientadora: Claudia Maria Jacobi

Co-orientadora: Fabiana Alves Mourão

(Depto. de Biologia Geral – ICB / UFMG)

Belo Horizonte, dezembro de 2015

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Agradecimentos

Primeiramente gostaria de agradecer minha orientadora, Claudia Jacobi, que me

recebeu de braços abertos no laboratório e confiou em mim a executar desse projeto

fantástico. Sempre me auxiliou no que foi preciso e me ensinou muito sobre ecologia e

as cangas.

A minha co-orientadora, Fabiana Mourão, que me ensinou tudo o que eu sei sobre

plantas parasitas. Revisou meus projetos mesmo durante suas viagens de férias, e me

tranquilizou nos momentos de dificuldade. Obrigada pela ajuda em campo, em

laboratório e na estatística.

Ao meu tutor, Rafael Arruda, que revisou meu projeto e me deu várias dicas para

melhorá-lo. Obrigada pelos ensinamentos, conversas e dicas para publicação.

Ao professor Leandro Assis, que ajudou na identificação das plantas hospedeiras,

sempre muito disponível.

Ao professor José Eugênio, membro da banca e professor, que me ensinou muito

sobre ecologia. Obrigada por corrigir meu trabalho e disponibilizar a balança de

precisão e a estufa para execução do segundo capítulo da dissertação.

Ao professor Fernando (Lelê), que ficou tão empolgado com o meu projeto, que me fez

ver a beleza que antes não tinha visto nas plantas parasitas. Obrigada pelos

ensinamentos no curso de campo, pela disciplina de “Biologia de Plantas Parasitas” e

por ser membro da minha banca.

Ao professor Clemens, que abriu meus olhos para aspectos ecológicos de

Tripodanthus que ainda não tinha visto.

Ao professor Tadeu Guerra, que ministrou a disciplina de “Biologia de Plantas

Parasitas”, e me ajudou a conhecer melhor esse grupo vegetal. Me emprestou livros

importantes sobre as parasitas, além de me mostrar estudos pioneiros sobre a

dispersão subterrânea de T. acutifolius, que abriu novos caminhos no meu trabalho.

Minha mãe Rose Marie por estar sempre ao meu lado e me apoiando, me dando força

quando eu estava desanimada. Sempre acreditou que eu conseguiria alcançar meus

objetivos.

Ao meu pai, Jacinto, por me apoiar e me ajudar sempre que precisei. Obrigada por

acreditar em mim e me dar forças para continuar as pesquisas no doutorado.

Ao meu namorado, Samuel, que me fez apaixonar pela Botânica e ver como as

plantas são fantásticas. Obrigada pela ajuda em campo e com a estatística, pelo apoio

e carinho sempre.

A minha irmã, Keul, que não importou do nosso carro ficar vermelho de minério.

As amigas que ajudaram em campo, Maria Clara, Débora, Ana Melo, Fernanda, Cris.

A minha avó Maria, que sempre acreditou em mim e rezou para eu passar no

mestrado e ganhar a bolsa.

A minha amiga Roxy, que sempre esteve do meu lado e entendeu a distância em

momentos de correria do mestrado. Nossa amizade só se fortaleceu.

A minha amiga Jacque, que sem o apoio dela não teria tentado a prova de mestrado.

Aos colegas do curso de campo, que tivemos experiências inesquecíveis no Parque

do Rio Doce. Que bom que tivemos a oportunidade de conhecer esse lugar fantástico

que hoje, infelizmente, não existe mais.

Ao pessoal do Parque Estadual Serra do Rola Moça pelo apoio e pela licença.

A Capes, CNPq e Fapemig pelo apoio financeiro.

Ao PPG-ECMVS por sempre auxiliar no que foi necessário.

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SUMÁRIO

Resumo geral.................................................................................................................1 Abstract...........................................................................................................................1 Introdução geral .............................................................................................................2 Referências Bibliográficas .............................................................................................4 Capítulo 1: Alocação de biomassa na hemiparasita Tripodanthus acutifolius (Loranthaceae) em campos rupestres ferruginosos Resumo...........................................................................................................................5 Introdução........................................................................................................................5 Material e Métodos .........................................................................................................8 Resultados.....................................................................................................................10 Discussão......................................................................................................................15 Referências Bibliográficas ............................................................................................18 Capítulo 2: O que determina a preferência e a especificidade por hospedeiras de hemiparasitas (Loranthaceae)? Resumo.........................................................................................................................21 Introdução......................................................................................................................21 Material e Métodos .......................................................................................................24 Resultados.....................................................................................................................26 Discussão......................................................................................................................29 Referências Bibliográficas ............................................................................................33 Apêndice........................................................................................................................36 Considerações finais.....................................................................................................40

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Resumo

O trabalho foi desenvolvido em uma área de campo rupestre ferruginoso no sudeste

do Brasil, onde ocorrem duas espécies de hemiparasitas da família Loranthaceae:

Tripodanthus acutifolius e Struthanthus flexicaulis. Indivíduos de T. acutifolius foram

monitorados em campo para descrição do processo de germinação, desenvolvimento,

padrões de floração, frutificação, produção de estruturas vegetativas e mortalidade das

hospedeiras e hemiparasitas. Para mensurar o impacto gerado pelo parasitismo na

comunidade vegetal, foi feito um levantamento florístico da área e das hospedeiras de

Tripodanthus acutifolius e Struthanthus flexicaulis. O grau de especificidade e

preferência por hospedeiras foi comparado. O processo de germinação e

estabelecimento de T. acutifolius é satisfatório, e seu desenvolvimento é rápido em

comparação a outras espécies da família Loranthaceae. A hemiparasita disponibiliza

recursos alimentares para a fauna local durante todo o ano, com a produção de

botões, flores e folhas na estação chuvosa e frutos na estação seca. As duas

hemiparasitas compartilham a principal hospedeira, Mimosa calodendron,

apresentando altas taxas de mortalidade e parasitismo simultâneo. Apesar de

preferirem a mesma hospedeira, apresentam grau de especificidade opostos.

Enquanto S. flexicaulis é generalista, T. acutifolius é especialista. As hemiparasitas

exercem importante papel na comunidade vegetal, como controle populacional das

hospedeiras e são recursos chave para a comunidade.

Palavras-chave: Hemiparasitas, Loranthaceae, Alocação de biomassa, preferência

por hospedeiras, ornitocoria, crescimento vegetativo.

Abstract

This work was developed in a rupestrian ferruginous field, in southeast Brazil, where

occur two species of mistletoes: Tripodanthus acutifolius and Struthanthus flexicaulis

(Loranthaceae). Individuals T. acutifolius were monitored in field to description of the

germination process, development, flowering, fruiting, production of vegetative

structures and mortality of hosts and mistletoes. To measure the impact generated by

the parasitism in plant community, a floristic survey was made in the area and was

identified T. acutifolius’s and Struthanthus flexicaulis’s hosts. The degree of specificity

and preference for hosts was compared. The process of germination and

establishment of T. acutifolius was satisfactory, and its development is fast compared

to other loranthaceous species. There are available resources for local fauna

throughout the year, with production of buttons, flowers and leaves in rainy season and

fruit in the dry season. Both mistletoes share the main host, Mimosa calodendron,

featuring high rates of mortality and simultaneous parasitism. Although they prefer the

same host, the degree of specificity is opposite. While S. flexicaulis is generalist, T.

acutifolius is specialist. The mistletoes exert important role in plant community, such as

M. calodendron population control and they are key resources for a community.

Keywords: Mistletoes, Loranthaceae, biomass allocation, host preference,

ornithochory, Vegetative growth.

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Introdução Geral

Algumas plantas parasitas são conhecidas como ervas-de-passarinho devido a sua

extrema dependência das aves. Além de serem os principais dispersores de suas

sementes (Kuijt, 1969) e exercerem um papel fundamental em sua reprodução (Calder

& Bernhardt 1983), eles influenciam diretamente na distribuição das plantas parasitas

na comunidade, normalmente de forma heterogênea e agredada, no nível de

indivíduo, mancha e de paisagem (Aukema, 2003).

Além das plantas parasitas serem alimento altamente nutritivo para as aves, essas

podem utilizar as parasitas como sítios de nidificação (Watson, 2001). A relação entre

ave e erva-de-passarinho pode ser tão especializada, que algumas espécies de aves

podem exibir características que coevoluiram dessa relação, como sistema digestório

especializado (Kuijt, 1969).

As plantas parasitas podem influenciar de diversas maneiras a comunidade que estão

inseridas. Apesar dos impactos negativos que exercem sobre suas hospedeiras,

como mortalidade, diminuição da biomassa (Press et al., 1999) e competição (Press &

Phoenix, 2005), são consideradas como recursos chave em muitas comunidades

(Watson 2001) e tem associações mutualísticas com seus dispersores e polinizadores

(Press & Phoenix 2005).

A maioria dos estudos sobre plantas parasitas se concentram nas regiões temperadas

(Arruda, et al. 2012), devido aos efeitos negativos que causam em plantações (Norton

& Carpenter, 1998). Por esse motivo, pouco se conhece sobre as ervas-de-passarinho

da região neotropical. Apesar de algumas plantas parasitas exercerem efeitos

econômicos negativos, muitas espécies são essenciais para a manutenção do

ecossistema e é necessária a conservação dessas para mantê-lo em equilíbrio e

preservar a diversidade associada à parasita (Aukema, 2003).

Na região neotropical ocorrem várias espécies da família Loranthaceae, a maior

família de plantas parasitas (Kuijt 2009), com ampla distribuição, encontradas em

ambientes naturais e impactados (Press, 1998). No Brasil existem 10% das espécies

de plantas parasitas do mundo inteiro (Arruda et al. 2009).

Este trabalho é o resultado de um estudo realizado no Parque Estadual Serra do Rola

Moça, em uma área de campo rupestre ferruginoso (Figura 1). Nessa área, co-

ocorrem duas espécies de hemiparasitas da família Loranthaceae: Tripodanthus

acutifolius e Struthanthus flexicaulis, que compartilham a principal hospedeira, Mimosa

calodendron Mart. ex Benth.

A principal espécie desse estudo, Tripodanthus acutifolius tem ampla distribuição no

Brasil, e é encontrada desde o Rio Grande do Sul ao sul da Bahia, nos biomas de

Mata atlântica, Cerrado, Caatinga, Pampas (Arruda, et al. 2012). Apesar de diversos

estudos sobre a farmacologia da planta, pouco se conhece sobre seus aspectos

ecológicos.

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Figura 1: Área de estudo. (a) Visão panorâmica da área de campo rupestre ferruginoso

do Parque Estadual Serra do Rola Moça; (b) Microlicia sp.; (b) Arthrocereus glaziovii

(K. Schum.) N.P.Taylor & Zappi; (d) Lychnophora pinaster Mart; (e) Tripodanthus

acutifolius parasitando Mimosa calodendron; (f) Struthanthus flexicaulis parasitando

Mimosa calodendron.

Este trabalho consiste em dois capítulos que visam descrever a biologia e

desenvolvimento de Tripodanthus acutifolius em campos rupestres ferruginosos e sua

interação com as hospedeiras e a hemiparasita S. flexicaulis.

No primeiro capítulo descrevemos o processo de germinação e estabelecimento de

Tripodanthus acutifolius em sua principal hospedeira, Mimosa calodendron, e

verificamos como a disponibilidade de água no ambiente influencia a alocação de

biomassa para a produção de estruturas vegetativas e reprodutivas na hemiparasita.

No segundo capítulo comparamos o grau de especificidade e preferência por

hospedeiras das duas hemiparasitas e discutimos os impactos que o parasitismo pode

causar na comunidade. A especificidade por hospedeiras é um fator importante da

ecologia de plantas parasitas (Arruda et al., 2012), e normalmente é apresentado

como um contínuo que varia de extrema especificidade à espécies muito generalistas

(Norton & Carpenter, 1998).

Os resultados obtidos nessa pesquisa contribuíram para o conhecimento sobre a

ecologia de Tripodanthus acutifolius, que são escassos na literatura atual. A

hemiparasita tem um importante papel na manutenção do equilíbrio dos campos

rupestres ferruginosos, que são altamente diversos e abrigam espécies endêmicas.

Apesar dos efeitos negativos da hemiparasita em sua principal hospedeira, espécie

ocorre no interior de uma Unidade de Conservação, em um ecossistema equilibrado e

protegido. Dessa forma, é importante evitar a retirada de plantas parasitas do local, o

que pode gerar diversos impactos negativos na comunidade.

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Oliveira, P.S. & Rico-Gray, V. (Orgs.). Tropical Biology and Conservation

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Arruda, R; Fadini, R.F.; Carvalho, L.N.; Del-Claro, K.; Mourão, F.A.;Jacobi, C.M.;

Teodoro, G.S.; van den Berg, E.; Caires, C.S.; Dettke, G.A. 2012. Ecology of

neotropical mistletoes: an important canopy dwelling component of Brazilian

ecosystems. Acta Botanica Brasilica. 26: 264-274.

Aukema J.E. 2003. Vectors, viscin, and Viscaceae: mistletoes as parasites, mutualists,

and resources. Frontiers in Ecology and Environment 1: 212–219

Calder, M., Bernardt, P. (Eds.), 1983. The biology of mistletoes. Academic Press,

Sidney.

Kuijt, J. 1969. The biology of parasitic flowering plants. Berkeley, University of

California Press.

Norton, D.A.; Carpenter, M.A. 1998. Mistletoes as parasites: host specificity and

speciation. Trends in Ecology and Evolution 13: 101–105.

Press, M.C. 1998. Dracula or Robin Hood? A functional role for root hemiparasites in

nutrient poor ecosystems. Oikos 82: 609–611.

Press, M.C.; Scholes, J.D.; Watling, J.R. 1999. Parasitic plants: physiological and

ecological interactions with their hosts. In: Press, MC, Scholes, JD, Barker, MG,

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Press, M.C.; Phoenix, G.K. 2005. Impacts of parasitic plants on natural communities.

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Watson, D.M. 2001. Mistletoe - a keystone resource in forests and woodlands

worldwide. Annu Rev Ecol Syst 32: 219-49.

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Alocação de biomassa na hemiparasita Tripodanthus acutifolius (Loranthaceae)

em campos rupestres ferruginosos

Isabelle C. Brandão, Fabiana A. Mourão & Claudia M. Jacobi

Depto. de Biologia Geral, ICB, Universidade Federal de Minas Gerais, Caixa Postal

486, 31270-901 Belo Horizonte, MG, Brasil.

E-mail para correspondência: [email protected]

Resumo

As plantas ajustam a alocação de sua biomassa de acordo as condições ambientais,

com finalidade de maximizar a captura de recursos essenciais. Ao contrário da maioria

das plantas, as parasitas obtêm recursos diretamente de suas hospedeiras e as

condições ambientais severas não impactam tanto seu desenvolvimento. O objetivo

desse trabalho foi descrever o processo de germinação, estabelecimento e alocação

de biomassa em plântulas de Tripodanthus acutifolius, enfatizando o investimento em

reprodução e produção de estruturas vegetativas em plantas adultas e relacionando

este investimento com o regime de chuvas. Foram acompanhadas em campo 71

sementes durante oito meses e 23 plantas adultas durante dezoito meses, todas

parasitando sua principal hospedeira, Mimosa calodendron. O processo de

germinação e estabelecimento de T. acutifolius é satisfatório e rápido quando

comparado com outras lorantáceas, sendo que 58% das sementes germinaram e 28%

se estabeleceram com sucesso. Houve diferença na alocação de biomassa nas

estruturas da hemiparasita ao longo do ano (ANOVA Two-way, f = 37.537, p <0.001).

Durante a estação chuvosa, houve maior investimento em produção de estruturas

vegetativas, botões e flores. Já na estação seca, houve produção e amadurecimento

lento e descontínuo de frutos. Durante a maturação no período seco, houve

mortalidade em massa de suas hospedeiras (97%), porém as hemiparasitas

continuaram vivas, sugerindo que há parasitismo subterrâneo. A hemiparasita

disponibilizou recursos alimentares durante quase todo o ano e as aves consumiram

os frutos antes da maturação total dos cachos.

Palavras-chave: Germinação, crescimento, desenvolvimento, estabelecimento, erva-

de-passarinho canga, biomassa

Introdução

A alocação de biomassa nas plantas é influenciada diretamente pela disponibilidade

de recursos no ambiente. De acordo com a teoria do particionamento ótimo, com a

finalidade de maximizar a eficiência de captura de recursos essenciais e limitantes

para o desenvolvimento vegetal, as plantas ajustam a alocação de biomassa (Bloom et

al., 1985) naquelas estruturas mais especializadas na aquisição de determinado

recurso (Bonifas & Lindquist, 2006).

Plantas que necessitam de maior aquisição de carbono e capacidade fotossintética

tendem a investir em tecido foliar, enquanto plantas que estão em ambientes com

limitação de água e nutrientes tendem a investir em raízes (Bloom et al., 1985, Bonifas

& Lindquist, 2006).

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A disponibilidade de recursos no ambiente flutua ao longo do tempo, e o crescimento

vegetal reflete essas variações (Bloom et al., 1985). O teor de água no solo influencia

diretamente a disponibilidade de recursos. Em ambientes úmidos, normalmente a

disponibilidade de nutrientes aumenta devido à umidade do solo (Bloom et al., 1985) e

há maior investimento em fotossíntese e alocação de biomassa na parte foliar

(Mccarthy & Enquist, 2007), consequentemente há aumento do crescimento relativo

da planta (Bonifas & Lindquist, 2006). Já em ambientes secos, os custos para

produção de biomassa são altos e o crescimento é lento devido à dificuldade na

captura de nutrientes e água (Bloom et al., 1985). A disponibilidade de água varia de

acordo com o regime de chuvas, o que provoca alteração nos padrões de crescimento

e alocação de biomassa ao longo do ano.

A alocação também é diferenciada em cada indivíduo, que direciona seus recursos

para reprodução, defesa e crescimento de maneira única. A quantidade de biomassa e

estruturas produzidas varia de acordo com a necessidade de cada indivíduo. Como o

mesmo recurso é utilizado para a produção de estruturas vegetativas e reprodutivas, a

alocação para diferentes funções é limitada pelo recurso (Bazzaz et al. 1987).

A produção de órgãos reprodutivos é altamente energética e menos lucrativa na

aquisição de recursos quando comparado ao investimento em órgãos vegetativos, que

trazem retorno nutricional. Os frutos dispersados por aves normalmente tem cores

chamativas e elevada qualidade nutricional, exibindo alta concentração de nitrogênio,

fósforo, lipídeos (Bloom et al., 1985) e carbono (Glatzel & Geils, 2009), o que requer

grande quantidade recursos para sua produção.

As hemiparasitas adquirem água e nutrientes provenientes de espécies hospedeiras,

através de conexões haustoriais (Kuijt, 1969), e mantêm a eficiência de captação de

recursos através do controle homeostático de água de suas hospedeiras (Glatzel &

Geils 2009). A retirada de nutrientes pode causar alterações no crescimento,

reprodução, alometria e fisiologia das hospedeiras (Press et al., 1999), principalmente

em ambientes com baixa disponibilidade de nutrientes, onde biomassa dos indivíduos

parasitados é reduzida drasticamente, podendo resultar em morte (Matthies & Egli

1999). De maneira geral, os recursos retirados pelas hemiparasitas não são totalmente

aproveitados. Elas exibem baixa eficiência no uso da água, nutrientes e possivelmente

de carbono, o que diminui a produtividade total dos sistemas (Matthies, 1995). A

aquisição de água e nutrientes pode ser vantajosa em ambientes com baixa

disponibilidade desses recursos, pois não sofrem tanto com condições ambientais

severas como outras plantas da comunidade vegetal (Mourão, 2012). Apesar de

adquirirem recursos de suas hospedeiras – nutrição essencial em longo prazo (Fineran

& Hocking, 1983) - as hemiparasitas são clorofiladas e fotossintéticas em pelo menos

alguma fase da vida (Nickrent, 2002). Sua própria fotossíntese é um fator muito

importante para seu desenvolvimento (Matthies, 1995) e aquisição de carbono (Bloom

et al., 1985, Mccarthy & Enquist, 2007). As hospedeiras podem ser competidoras por

luz para a fotossíntese, mas os benefícios da conexão para a captura de água e

nutrientes superam os malefícios do sombreamento (Matthies, 1995). É necessário

que as parasitas mantenham o balanço entre recursos retirados e disponíveis na

hospedeira para que não haja a morte das mesmas (Tennakoon & Pate 1996), e

consequentemente suspensão da oferta de recursos provenientes delas.

A conexão haustorial entre parasita e hospedeira é formada durante o processo de

estabelecimento das ervas-de-passarinho. O estabelecimento é constituído por três

etapas: adesão da semente, germinação e penetração na hospedeira (Lamont, 1983).

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Primeiramente, é necessário que aves depositem as sementes em galhos de

hospedeiras viáveis (Ladley & Kelly, 1996), que tenham a espessura ideal para a

germinação das sementes (Sargent, 1995). A viscina presente na semente auxilia no

processo de adesão no local de deposição (Lamont, 1983). Estímulos externos podem

desencadear o processo de germinação, como luz, água, temperatura (Kuijt, 1969,

Boone et al., 1985) e oxigênio (Lamont, 1983). Normalmente as sementes de plantas

parasitas apresentam fototropismo negativo, o que conduz a formação de estruturas

conectoras no galho da hospedeira, onde há menos luz quando comparado ao

entorno. Na germinação é formado um apressório em forma de disco na base da

semente, onde se desenvolverá o haustório posteriormente (Kuijt, 1969). O embrião se

alonga e um hipocótilo emerge entre os cotilédones da semente (Lamont, 1983). O

complexo haustorial se forma a partir da pressão interna do apressório, que rompe

células da periderme da hospedeira. O haustório penetra longitudinalmente até atingir

o xilema da espécie parasitada, onde há captação de água e nutrientes. Antes da

formação de conexões haustoriais, os propágulos estão expostos a diversos riscos

que diminuem sua sobrevivência ao longo das etapas de estabelecimento. As

sementes podem se descolar do local de deposição, estão sujeitas a predação

(Lamont, 1983) e podem ressecar (Kuijt, 1969). É necessário que a germinação e a

penetração na hospedeira ocorram para que as plântulas se estabeleçam (Lamont,

1983). Após o estabelecimento, é necessário que as hemiparasitas tenham água,

nutrientes e luz suficiente para completar seu ciclo de vida (Glatzel & Geils, 2009).

Somente alguns dos propágulos que sobrevivem a esse processo se desenvolvem até

atingir a fase reprodutiva.

A família Loranthaceae está amplamente distribuída nas regiões tropicais (Kuijt, 1969).

Nessa família, a espécie Tripodanthus acutifolius (Ruiz & Pavón) van Thiegen é

encontrada na região central e sul do Brasil. É uma hemiparasita de caules e raízes,

que forma o haustório primário após a germinação na parte aérea da hospedeira. A

raíz epicortical cresce até atingir o solo e cria conexões haustoriais secundárias com a

raiz de sua hospedeira principal (Amico, 2012), podendo criar conexões com raízes de

outros indivíduos através do espalhamento de suas raízes no solo (Kuijt, 1969).

Estudos sobre o desenvolvimento de plantas parasitas após a germinação são raros, e

são importantes para o entendimento do padrão de alocação de biomassa nas

hemiparasitas.

O objetivo desse trabalho foi descrever o processo de estabelecimento e alocação de

biomassa em plântulas de T. acutifolius, bem como sua reprodução, que disponibiliza

recursos alimentares para a fauna local. As perguntas que nortearam esse trabalho

foram: 1) Qual é a taxa de estabelecimento de plântulas de T. acutifolius? 2) Qual é o

padrão de alocação de biomassa nas estruturas foliares e radiculares de plântulas de

T. acutifolius? 3) A disponibilidade de água ao longo do ano influencia o local de

alocação de biomassa em plantas adultas? 4) As hemiparasitas causam impacto na

sobrevivência de suas hospedeiras quando há baixa disponibilidade de água no

ambiente?

As hipóteses para essas perguntas são: 1) A taxa de sobrevivência dos propágulos é

baixa nos estágios iniciais, devido as altas taxas de descolamento e ressecamento,

porém a sobrevivência se mantém após a conexão haustorial, com elevado sucesso

de estabelecimento; 2) A alocação de biomassa será maior na parte foliar (caule e

folhas) quando comparada as raízes, para a aquisição de carbono através da

fotossíntese; 3) A produção de estruturas vegetativas será maior quando houver maior

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disponibilidade de água; 4) Devido à baixa disponibilidade de água no ambiente na

estação seca e retirada desse recurso nas hospedeira, haverá taxas significativas de

mortalidade das mesmas nesse período do ano.

Materiais e métodos

Área de estudo

O estudo foi realizado na porção sul da Cadeia do Espinhaço, em Minas Gerais (20°

03’ 60”S, 44° 02’ 00” W). O clima da região é mesotérmico (Rizzini, 1997), com

precipitação anual de 1000 a 1500 mm (Nimer & Brandão, 1989). Nos topos de morro

localizam-se os campos rupestres ferruginosos, com alta diversidade vegetal e

ocorrência de espécies endêmicas. Essa área tem grande importância ecológica e é

prioritária para a conservação da biodiversidade (Azevedo et al., 2009). Nesse local há

incidência solar elevada, ventos constantes e temperatura média anual de 25°C

(Rizzini, 1997). É um ambiente rigoroso principalmente no período seco. O substrato é

compacto, composto por minério de ferro (Klein, 2000, Vilela et al., 2004), com baixa

quantidade de solo, qualidade nutricional e umidade (Silva et al., 1996). A vegetação é

dominada por espécies arbustivas e herbáceas, com alta representatividade das

famílias Asteraceae, Fabaceae, Myrtaceae, Melastomataceae, Rubiaceae, Poaceae e

Orchidaceae (Jacobi et al., 2007). Devido ao substrato composto por minério de ferro,

sua principal ameaça antrópica é a mineração (Drummond et al., 2005).

Germinação e crescimento de plântulas in situ

Foram marcadas 71 sementes da hemiparasita depositadas por aves em galhos de

Mimosa calodendron (Fabaceae), uma leguminosa dominante na área de estudo. As

sementes foram acompanhadas durante 240 dias, entre novembro de 2014 e julho de

2015, durante a estação seca e chuvosa. Foram feitos monitoramentos quinzenais

para acompanhamento da germinação, sobrevivência, medições de crescimento da

parte foliar e da raíz, e contagem de folhas. Quando existia mais de uma raíz, os

comprimentos foram somados. Ao final do monitoramento, as raízes de muitas das

plântulas atingiram o solo, impossibilitando novas medidas que relacionavam a

proporção entre crescimento entre raíz e parte foliar. Para a medida do crescimento

das estruturas ao longo do 240 dias, analisamos o comprimento da raíz e da parte

foliar das plântulas com o teste “Friedman Repeated Measures Analysis of Variance on

Ranks” e o teste de Wilcoxcon, visto que os dados não tinham distribuição normal.

Visando correlacionar o comprimento da parte foliar e da raiz, foram medidas 259

plântulas com até 16 cm de comprimento na parte foliar. Quando existia mais de uma

raíz, os comprimentos foram somados. Esses dados foram analisados usando

correlação de Spearman, visto que os dados não tinham distribuição normal.

Posteriormente, as medidas dessas plântulas foram utilizadas para estimar a

biomassa e superfície foliar.

Alocação de biomassa na raíz e parte foliar de plântulas

Para medidas de alocação de biomassa na parte foliar e no sistema radicular foram

coletadas 36 plântulas que formaram haustórios em galhos de Mimosa calodendron.

Após a coleta, foi separada a parte foliar das raízes, e pesadas em balança de

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precisão para obtenção do peso fresco. Foram medidos o comprimento da parte foliar

e da raíz, o número de folhas e a superfície foliar. As folhas foram classificadas quanto

ao comprimento em três categorias: Pequenas (0.1-3.0 cm), médias (3.1 - 5.0 cm) e

grandes (5.1 - 7 cm) para o cálculo da superfície foliar em papel quadriculado. Foi

obtida a biomassa por centímetro de plântula de acordo com o comprimento da parte

foliar e a área de superfície foliar.

Para a medida do volume das raízes, foi obtido o comprimento total e o diâmetro de

três regiões ao longo de cada raíz. Foi feita uma média dos três diâmetros para o

cálculo do volume, utilizando a fórmula do cilindro: r2 x h, onde: h= comprimento da

raiz. Após essas medidas, as plântulas foram colocadas em estufa durante 72 horas e

pesadas em balança de precisão para obter o peso seco. Usamos a correlação de

Spearman para relacionar a alocação de biomassa da parte foliar e das raízes, visto

que os dados não têm distribuição normal.

Crescimento de plantas adultas in situ

Foram marcadas aleatoriamente 23 plantas adultas em campo e acompanhadas

durante 18 meses quanto ao crescimento da parte foliar e desenvolvimento de

estruturas reprodutivas. Foram feitos monitoramentos quinzenais entre março de 2014

e julho de 2015, que consistiu em contagem dos ramos e classificação dos mesmos

em cinco categorias, de acordo com a estrutura predominante: vegetativo (somente

folhas), botão, flor, fruto verde e fruto maduro. Raízes das plantas adultas foram

desconsideradas devido à impossibilidade de medida sem danos à planta.

Para estimativa da superfície foliar de indivíduos adultos de T. acutifolius, foram

coletados aleatoriamente 25 ramos vegetativos de dez indivíduos. As folhas foram

contadas e medidas em papel quadriculado. O comprimento das folhas adultas variou

entre 7,5 - 11,5 cm e foram consideradas com tamanho extra grande, seguindo a

classificação das folhas das plântulas. O comprimento dos ramos vegetativos variou

de 10 a 15 cm.

Para estimativa de produção de frutos por indivíduo, foram coletados aleatoriamente

25 ramos com frutos verdes em dez indivíduos de T. acutifolius e quantificado o

número de frutos. Nos ramos existiam frutos que não se desenvolveram. Esses foram

utilizados para estimar a média da produção de flores por indivíduo de T. acutifolius. O

comprimento dos ramos variou de 10 a 15 centímetros.

Para correlacionar a oferta de água no ambiente com a produção de estruturas

vegetativas e reprodutivas, foram utilizados dados meteorológicos da estação de Ibirité

(Rola Moça) do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) para definição da estação

seca e chuvosa. Os meses com menores concentrações de precipitação – junho a

setembro de 2014 – foram considerados a estação seca. Os meses com maiores

concentrações de precipitação – dezembro de 2014 a março de 2015 – foram

considerados a estação chuvosa. A produção média de estruturas vegetativas e

reprodutivas em cada estação foi comparada com o teste ANOVA Two-way. Para

discriminação de grupos, foi utilizado o teste de Tukey.

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Resultados

Germinação, sobrevivência e estabelecimento de plântulas

A germinação ocorreu em 58% (n=41) sementes depositadas por aves nos galhos das

hospedeiras (Figura 1. a). O início da germinação foi caracterizado pelo alongamento

axial do embrião da semente, com surgimento de um hipocótilo e formação do

apressório em aproximadamente 15 dias após a deposição das sementes. Das

sementes germinadas, 51% (n=21) se desprenderam dos galhos da hospedeira, e

49% (n=20) produziram folhas e raízes. Do total de sementes depositadas pelas aves,

apenas 30% (n=20) se tornaram plântulas e, após 240 dias, apenas 28% (n=19)

estavam estabelecidas nos galhos das hospedeiras.

Desenvolvimento e alocação de biomassa em fases iniciais

As folhas desenvolveram-se antes das raízes epicorticais. Duas folhas opostas de

coloração esverdeada surgiram em 68% (n=14) das plântulas a partir do 48º dia após

a germinação, e se desenvolveu em todas as plântulas até o 130º dia (Figura 1. b).

O desenvolvimento posterior da parte foliar foi caracterizado pelo crescimento de um

ramo principal e desenvolvimento das folhas com coloração avermelhada (Figura 1.c),

que variaram de tamanho de acordo com o comprimento do ramo (Tabela 1). Durante

240 dias os ramos vegetativos de plântulas cresceram em média 6.14 (± 3.57) cm em

comprimento, e desenvolveram em média 17 (± 6) folhas.

Plântulas com mais de 240 dias de desenvolvimento já possuiam as folhas verdes e

desenvolveram folhas com mais de 3 cm de comprimento.

Figura 1: Germinação e desenvolvimento de T. acutifolius. (a) Semente depositada em

galho de Mimosa calodendron. (b) Germinação e formação do apressório. (c): Plântula

jovem iniciando o desenvolvimento das raízes epicorticais. (d)-(e): Crescimento das

raízes epicorticais ao longo do tronco da hospedeira.

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Tabela 1: Desenvolvimento de ramos vegetativos. Superfície foliar e o tipo de folhas

variaram de acordo com o comprimento do ramo. Categorias de folhas: P (1.30 ± 0.25

cm2), M (3.37 ± 0.59 cm2), G (5.44 ± 0.62 cm2), GG (15.00 ± 1.98 cm2)

Comprimento do ramo (cm)

Fase do desenvolvimen

to

Superfície foliar total/ramo (cm2)

Quantidade de folhas

Tipo de folhas

0 – 5.0 Plântulas até 240 dias

8.37 ± 2.23 14.67 ± 3.21 P

5.1 – 10.0 61.46 ± 15.50 20.64 ± 3.12 P, M, G

10.1 – 12.0 Plântulas > 240 dias

101.30 ± 8.11 28.00 ± 1.00 M, G

>12.0 Adultas 225.34 ± 70.15 14.88 ±4,47 GG

O sistema radicular começou a se desenvolver após o surgimento das folhas, em 5%

(n=1) das plântulas a partir do 48º dia após a germinação, até o 165º dia, quando

todas as plântulas (n=20) já possuíam raízes. Apesar do desenvolvimento da parte

foliar e das raízes acontecerem simultaneamente, houve diferença significativa no

comprimento das estruturas ao longo do tempo, onde todas as plântulas apresentam

raízes mais longas que a parte foliar (Teste de Friedman= 247.36; DF=3; p< 0.0001).

Durante 240 dias, as raízes epicorticais cresceram em média 22.68 (± 15.05) cm em

comprimento no sentido do solo (Figura 1.d/ 1.e). As plântulas desenvolveram uma

raiz principal com até duas ramificações. O comprimento total das raízes foi maior do

que o comprimento total dos ramos vegetativos (Figura 2).

Figura 2: Teste de Spearman demonstrou que há correlação positiva entre

comprimento das raízes e comprimento da parte foliar (rs = 0.820; n=259; p < 0.0001).

A alocação de biomassa na parte foliar foi em média 3.7 (peso fresco) e 3.1 (peso

seco) vezes maior do que a biomassa nas raízes (Figura 3). O teste de Spearman

0

10

20

30

40

0 5 10 15 20

Raí

zes

(cm

)

Parte Foliar (cm)

Comp. Total Raízes Linear (Comp. Total Raízes)

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demonstrou que há forte correlação positiva entre a alocação de biomassa na parte

foliar e nas raízes (Peso fresco: rs= 0.682; n=36; p < 0.0001/ Peso seco: rs = 0.831;

n=36; p < 0.0001).

Figura 3: Alocação de biomassa na parte foliar e raíz de plântulas de acordo com o

comprimento da estrutura.

Na parte foliar, ramos com até 5 cm têm biomassa média de 0.03 (± 0.01) g/cm2. Já

ramos de 5.1 a 12 cm têm 0.04 g/ cm2. Nas raízes, quanto maior o comprimento, maior

seu diâmetro, e consequentemente seu volume e biomassa (Tabela 2).

Tabela 2: Volume e biomassa (peso fresco) de raízes epicorticais de acordo com seu

comprimento.

Comprimento (cm)

Volume (média ± DP cm³)

Biomassa (média ± DP

g/cm)

0 – 5 0.01 ± 0.01 0.02 ± 0.01

5.1 -10 0.09 ± 0.12 0.02 ± 0.00

10.1 – 20 0.10 ± 0.09 0.02 ± 0.00

20.1 – 30 0.14 ± 0.12 0.02 ± 0.01

30.1 – 40 0.41 ± 0.46 0.03 ± 0.02

40.1 – 50 0.85 ± 0.26 0.03 ± 0.00

50.1 – 60 0.77 ± 0.26 0.03 ± 0.00

> 60 1.49 ± 0.46 0.04 ± 0.01

Investimento em estruturas vegetativas e reprodutivas em plantas adultas

No início do monitoramento a média de ramos vegetativos em indivíduos adultos foi de

20.17 (± 17.20) e após 18 meses, 34.04 (± 30.63). A produção média por planta foi de

aproximadamente 14 ramos. Ao longo do ano, houve alteração da alocação de

biomassa para a produção de estruturas vegetativas e reprodutivas (ANOVA Two-way,

0,0

0,5

1,0

1,5

2,0

2,5

3,0

3,5

4,0

4,5

5,0

0 20 40 60

Bio

ma

ss

a (

g)

Comprimento da estrutura (cm)

Foliar - PF

Foliar - PS

Raíz - PF

Raíz - PS

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f = 37.537, p <0.001). Durante a estação chuvosa, houve maior investimento na a

produção de ramos vegetativos (Teste de Tukey, p < 0.001). Já a produção de

estruturas reprodutivas foi maior na estação seca (Teste de Tukey, p = 0.021). (Figura

4). A quantidade de estruturas vegetativas produzidas foi significativamente maior que

a quantidade de estruturas reprodutivas (Teste de Tukey, p < 0.001).

Figura 4: Número de ramos com estruturas reprodutivas e vegetativas nas estações

seca e chuvosa.

A fase reprodutiva de T. acutifolius se inicia em outubro com a produção de 84 (± 30)

botões por planta (Figura 5). Nesse período, as chuvas são mais constantes no

ambiente, marcando o início da estação chuvosa. Os botões começam a se abrir em

novembro e a floração se estende até abril. Durante o ano, a maior quantidade de

flores está disponível no ambiente em janeiro, acompanhada pelo início da formação

dos frutos. Cada planta produz em média 42 (± 22) frutos verdes, que estão

disponíveis no ambiente em maior quantidade no mês de abril. Sua maturação se

inicia em maio, acompanhada com o início da estação seca. Esse processo é lento,

gradual e descontínuo, e os cachos apresentam tanto frutos verdes quanto maduros,

que são consumidos pelas aves antes da maturação total dos cachos. Em 2014, o

monitoramento iniciou-se no final de março, na fase de pico da produção de frutos

verdes e no final da floração (Figura 6). Alguns ramos com frutos verdes

permaneceram nas hemiparasitas durante todo o ano, até o início do ciclo reprodutivo

seguinte, em 2015 (Figura 7).

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Figura 5: Desenvolvimento de estruturas reprodutivas de T. acutifolius.

Figura 6: Produção de estruturas reprodutivas ao longo de 18 meses (Março de 2014 a

julho 2015). (n=23).

Figura 7: Padrões fenológicos de T. acutifolius ao longo de 18 meses (Março de 2014

a agosto 2015). (n=23).

A produção de estruturas reprodutivas no mesmo período de 2014 e 2015 diferiu. Em

março de 2014, as 23 plantas adultas produziram juntas 423 ramos reprodutivos,

enquanto em março de 2015, apenas 176. Isso pode estar relacionado com a

mortalidade de suas hospedeiras. Em 2014, durante a época de produção de frutos

pela hemiparasita, ocorreu a morte em massa de 97% (n=32) hospedeiras e 15%

(n=5) hemiparasitas. As mortes se iniciaram em agosto de 2014, no final da estação

0

100

200

300

400

500

M A M J J A S O N D J F M A M J J A

Fruto Maduro Fruto Verde Flor BotãoMeses

Ram

os

0%

20%

40%

60%

80%

100%

M A M J J A S O N D J F M A M J J A

Fruto Maduro Fruto Verde Flor BotãoMeses

Ram

os

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seca, quando frutos verdes começaram a amadurecer, e se estendeu até abril de

2015, quando quase todas as hospedeiras estavam mortas. Apesar dessa alta taxa de

mortalidade das hospedeiras ao longo de 18 meses, a parasita ainda continuou viva,

apresentando taxa de mortalidade de apenas 15%. Isso demonstra que não há

dependência total da hemiparasita por sua hospedeira, onde houve a formação do

haustório primário. Apesar de continuar viva, o investimento em produção de

estruturas reprodutivas em 2015 caiu pela metade quando comparado com o mesmo

período de 2014. Já a produção de estruturas vegetativas fotossintéticas dobrou no

mesmo período (Figura 8).

Figura 8: Alocação de recursos para a produção de estruturas reprodutivas e

fotossintéticas ao longo de 18 meses (Março de 2014 a julho 2015). (n=23).

Discussão

Germinação e estabelecimento

As altas taxas de descolamento de sementes da hemiparasita nos galhos de M.

calodendron diminuem a sobrevivência e sucesso no estabelecimento de T. acutifolius

nas fases iniciais de desenvolvimento. Alguns fatores geralmente estão relacionados

com mortalidade inicial das sementes das plantas parasitas. Normalmente as

sementes provenientes de frutos verdes não estão aptas a germinar (Lamont, 1983).

Quando a ave consome frutos antes da maturação total, as sementes deixam de ter

sucesso elevado na germinação. Para a germinação bem sucedida, as sementes

devem ser depositadas em galhos com diâmetros entre 10 e 14 milímetros. Além

disso, infecções por fungos também podem diminuir o sucesso de germinação

(Lamont, 1983). Daquelas que germinaram, metade se desprendeu dos galhos. O

descolamento de sementes normalmente está relacionado com vento, chuva e

predação (Lamont, 1983). Menos de um terço das sementes depositadas tornaram-se

plântulas, e algumas dessas morreram devido ao ressecamento. Esse ressecamento

pode estar relacionado com a alta incidência solar nos campos rupestres ferruginosos

e a ausência da penetração na hospedeira (Lamont, 1983), a principal fonte de água

para as hemiparasitas (Nickrent, 2002). Essa conexão pode ser impossibilitada se a

0

100

200

300

400

500

600

700

800

900

M A M J J A S O N D J F M A M J J A

Ramos reprodutivos Ramos vegetativos

Meses

de r

am

os

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hemiparasita apresentar crescimento insuficiente para penetração na hospedeira

(Sargent, 1995), e uma vez que a conexão entre parasita e hospedeira é estabelecida,

não é interrompida (Fisher, 1983). Apesar das altas taxas de mortalidade nas fases

iniciais do desenvolvimento de T. acutifolius, seu processo de estabelecimento de

pode ser considerado eficiente. De acordo com Lamont (1983), se 5% a 69% das

sementes depositadas em galhos de hospedeiras se tornarem plântulas, o processo

de estabelecimento pode ser considerado bem sucedido.

Desenvolvimento e alocação de biomassa

As plântulas que sobreviveram às fases do estabelecimento investiram três vezes

mais biomassa em parte foliar fotossintética quando comparado às raízes. Alguns

aspectos podem estar relacionados com essa diferença no crescimento das

estruturas. A associação das hemiparasitas às hospedeiras requer menor crescimento

de raízes (Matthies 1995), visto que há prévia conexão haustorial e fluxo de água e

nutrientes da hospedeira para a parasita (Kuijt, 1969). Os recursos limitantes para o

crescimento da hemiparasita são aqueles não adquiridos na quantidade ideal através

da conexão com a hospedeira, como carbono, que é obtido através da fotossíntese da

própria hemiparasita. Por esse motivo, o investimento em estruturas fotossintetizantes

pode ser maior (Matthies, 1995, Bloom et al., 1985, Mccarthy & Enquist, 2007). Além

disso, as plantas parasitas crescem abaixo de copas das hospedeiras, e na fase inicial

de desenvolvimento são parcialmente sombreadas, o que pode gerar competição por

luz entre parasita e hospedeira (Matthies, 1995). Por esse motivo, plântulas

sombreadas tendem a investir mais no crescimento de área foliar quando comparada

as raízes, devido à necessidade aumentar a área fotossintética (Lambers et al., 2008).

Estudos detalhados sobre germinação, desenvolvimento e estabelecimento de plantas

parasitas são raros. Na Nova Zelândia, espécies da família Loranthaceae foram

acompanhadas em florestas de Nothofagus, suas principais hospedeiras. Alepis

flavida e Peraxilla colensoi tiveram 69% - 82% de sucesso na germinação e 16% -

28% de estabelecimentos bem sucedidos. Apesar de serem espécies de porte similar

à T. acutifolius (i.e. tamanho de folha similar), o desenvolvimento foi lento, e mediam

apenas 10 mm em 12 meses. Após 24 meses desenvolveram apenas um ramo com

oito folhas (Ladley & Kelly, 1996). Apesar do sucesso de germinação de T. acutifolius

ser menor do que as espécies da Nova Zelândia, a proporção de estabelecimentos

bem sucedidos foi a mesma. O crescimento da hemiparasita brasileira foi mais veloz:

Em três meses após a germinação, uma plântula possuía um ramo com nove folhas. O

crescimento foi oito vezes mais rápido quando comparada as essas espécies

estudadas na Nova Zelândia. De acordo com Yan (1993), o crescimento lento está

relacionado com o desenvolvimento tardio das conexões haustoriais entre parasita e

hospedeira.

O crescimento rápido normalmente está relacionado com o tamanho das folhas que,

quanto maiores, maior captação de luz, obtendo maior capacidade fotossintética e

maior ganho de carbono através da fotossíntese. A maior parte do carbono captado

por plantas de crescimento rápido normalmente é alocado nas folhas (Lambers et al.,

2008). Estudos anteriores demonstraram que plantas tendem a investir mais em

crescimento de raíz do que de parte foliar em sistemas com baixa oferta de nutrientes

(Chapin 1980; Bloom et al. 1985). Esse padrão foi observado também em vários

sistemas radiculares de hemiparasitas (Matthies 1995), porém não foi observado em

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T. acutifolius, que investe mais no desenvolvimento da parte foliar do que em raízes.

Provavelmente, T. acutifolius retira grande quantidade de recursos de sua hospedeira

para crescimento foliar na fase de desenvolvimento da plântula e para produção de

estruturas reprodutivas na fase adulta. A alta taxa de mortalidade das hospedeiras

ocorreu na fase de produção e maturação dos frutos da hemiparasita, sugerindo que

há grande quantidade de nutrientes sendo retirado de M. calodendron. A mortalidade

ocorreu ao final da estação seca, com baixa precipitação durante quatro meses. Em

condições ambientais adversas, a combinação entre estresse hídrico e parasitismo

intensifica o impacto nas hospedeiras (Mourão et al 2009), que devido à escassez de

água, a retirada de nutrientes do solo pode ser insuficiente para sua própria

manutenção (Mourão, 2012). Esse conjunto de fatores reduz significativamente a

biomassa da hospedeira, principalmente em ambientes com baixa qualidade

nutricional do solo (Matthies & Egli, 1999), como nos campos rupestres ferruginosos

(Silva et al., 1996), induzindo a mortalidade das hospedeiras. As condições secas não

afetam as plantas parasitas na mesma intensidade que suas hospedeiras (Mourão et

al., 2009).

A morte das hospedeiras não acarretou na morte dos indivíduos de T. acutifolius. A

sobrevivência das hemiparasitas na ausência da hospedeira pode estar relacionada

com o espalhamento das raízes de T. acutifolius no solo. Kuijt (1969) relatou que essa

espécie pode criar conexões haustoriais com raízes de plantas vizinhas. Já foi relatado

que um único indivíduo de T. acutifolius se conectou a raízes de quatro espécies

simultaneamente, e essas pertencentes a quatro famílias distintas (Molau, 1995). Nas

áreas de campos rupestres ferruginosos, estudos sobre a dispersão vegetativa

subterrânea não existem. O substrato compacto e composto por minério de ferro

(Klein, 2000, Vilela et al., 2004) provavelmente é um fator de dificuldade para a

dispersão das raízes de T. acutifolius no solo, diminuindo sua capacidade de

espalhamento. Quando não há a dispersão vegetativa, a morte da atual hospedeira

leva também a morte da parasita (Mourão, 2012).

A hemiparasita produz estruturas reprodutivas mesmo quando sua hospedeira está

morta, porém em menor quantidade. O desempenho da parasita está diretamente

relacionado com a condição da hospedeira (Glatzel & Geils, 2009). O investimento no

crescimento de estruturas fotossintéticas nessa situação foi dobrado, e pode estar

relacionado com a grande quantidade de recursos necessários para produção de

estruturas reprodutivas quando comparado à produção de folhas. Apesar da produção

de estruturas reprodutivas ter sido menor em 2015 quando comparado a 2014, a

hemiparasita disponibilizou recursos (i.e. flores e frutos) na comunidade durante todo o

período de estudo. As flores estão disponíveis durante cinco meses do ano e são fonte

alimentar para diversas espécies de insetos e aves. Normalmente as flores de plantas

parasitas produzem néctar em abundância (Watson, 2001). Durante todo o ano há

disponibilidade de frutos da hemiparasita, que podem ser fonte de alimento para

diversas espécies da fauna local, como mamíferos, insetos herbívoros e aves. As

folhas das hemiparasitas também são uma fonte de nutrientes para espécies

herbívoras (Press & Phoenix 2005), que normalmente possuem alta quantidade

nutricional quando comparada a plantas não-parasitas (Watson, 2001). A maturação

lenta dos frutos pode estar relacionada com a baixa disponibilidade de água no

ambiente, pois ocorreu durante estação seca. Além disso, a maturação também

ocorreu na época da morte em massa das hospedeiras, o que pode ter diminuído a

quantidade de recursos adquiridos pela hemiparasita. Os frutos amadurecem de forma

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descontínua, havendo presença de frutos verdes e maduros num mesmo indivíduo. Os

frutos maduros são consumidos rapidamente pelas aves e isso pode ser considerada

uma estratégia para evitar o desperdício de frutos maduros. A produção de frutos é

altamente energética, e frutos maduros não consumidos rapidamente pelas aves, são

consumidos por insetos e larvas. Além disso, a maturação descontínua dos frutos

aumenta o período de tempo em que há disponibilidade de frutos maduros na

comunidade. Esta estratégia poderia aumentar a assiduidade pelas aves que

consomem seus frutos aumentando assim a possibilidade de dispersão das sementes

(Watson, 2001). O consumo contínuo de frutos, mesmo antes do amadurecimento

total, demonstra que são uma fonte alimentar preferencial pelas aves dispersoras

(Ladley & Kelly, 1996), e que o ambiente está em equilíbrio. O excesso de frutos

maduros observados em algumas espécies hemiparasitas pode indicar escassez de

aves dispersoras na comunidade (Ladley & Kelly, 1996). A dispersão e deposição das

sementes em galhos de novas hospedeiras irão completar seu ciclo de vida e manter a

população de hemiparasitas na comunidade.

Os padrões de crescimento e alocação de biomassa de T. acutifolius se assemelham

com a maioria das lorantáceas tropicais, com rápido desenvolvimento inicial (Ladley &

Kelly, 1996). O estabelecimento bem sucedido e crescimento rápido provavelmente

estão relacionados com a elevada retirada de nutrientes de suas hospedeiras, e

consequentemente a alta taxa de mortalidade das mesmas. Como sua principal

hospedeira, M. calodendron, é uma espécie dominante, os efeitos do parasitismo

podem ser vistos no nível de comunidade (Mourão et al. 2009). A hemiparasita tem um

papel importante no controle populacional de sua hospedeira (Pennings & Callaway,

2002), e favorece o crescimento de espécies menos dominantes (Press & Phoenix,

2005). Apesar de ser considerada uma hemiparasita agressiva para suas hospedeiras,

T. acutifolius é importante na comunidade. Além de favorecer a diversidade local

devido ao controle populacional de sua hospedeira (Press, 1998), é uma fonte de

recursos constante num ambiente severo.

Agradecimentos

Agradecemos ao Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais pela licença de

coleta, aos funcionários do Parque Estadual da Serra do Rola Moça pelo apoio

logístico, e à CAPES e FAPEMIG pelo auxílio financeiro e bolsas às duas primeiras

autoras. A bolsa produtividade do CNPq de Claudia Maria Jacobi. Agradecemos a

Maria Clara Trotta, Cristiana Vasconcelos, Fernanda Figueiredo e Samuel Siriani pela

ajuda em campo.

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O que determina a preferência e a especificidade por hospedeiras de

hemiparasitas (Loranthaceae)?

Isabelle C. Brandão, Fabiana A. Mourão & Claudia M. Jacobi

Depto de Biologia Geral, ICB, Universidade Federal de Minas Gerais, Caixa Postal

486, 31270-901 Belo Horizonte, MG, Brasil.

E-mail para correspondência: [email protected]

Resumo

Plantas parasitas podem gerar diversos impactos na comunidade que geralmente

estão relacionados com a preferência por hospedeiras. As hemiparasitas Struthanthus

flexicaulis e Tripodanthus acutifolius co-ocorrem em campos rupestres ferruginosos no

sudeste do Brasil. Comparamos o grau de especificidade, preferência por hospedeiras

e seus efeitos na comunidade vegetal. Dados sobre abundância, mortalidade e

composição da comunidade foram obtidos em uma área de 1.000 m2. Foram

identificados 16.134 indivíduos de 87 espécies (25 famílias). Struthanthus flexicaulis,

parasita 34 espécies de 15 famílias, e utiliza 13 espécies como suporte. Já T.

acutifolius apresentou comportamento mais especialista, parasitando apenas 12

espécies de 10 famílias, todas de porte arbustivo-arbóreo. As hemiparasitas

compartilham a principal hospedeira, a leguminosa Mimosa calodendron, com altas

taxas de mortalidade e casos frequentes de parasitismo simultâneo. O grau de

especificidade e preferência estão fortemente relacionado com o tipo de dispersão das

hemiparasitas e o comportamento das aves. Enquanto T. acutifolius é totalmente

dependente das aves para colonizar novas hospedeiras, S. flexicaulis também se

dispersa de forma vegetativa, atingindo uma maior gama de hospedeiras através do

espalhamento dos ramos.

Palavras-chave: campo rupestre, canga, comunidade, Loranthaceae, parasitismo,

ornitocoria, crescimento vegetativo

Introdução

Plantas parasitas desenvolveram modos de nutrição complexos que diferem daqueles

considerados usuais. Enquanto a maioria das plantas utiliza recursos provenientes do

meio abiótico para se nutrirem (luz, água e minerais), hemiparasitas adquirem água e

nutrientes também em fontes vivas, retirando-os diretamente do xilema de plantas

hospedeiras através de conexões haustoriais (Nickrent, 2002). Essa interação entre

planta parasita e hospedeira gera diversos impactos tanto nos indivíduos quanto na

comunidade, num efeito em cascata (Pennings & Callaway, 2002). A retirada de

nutrientes e água das plantas hospedeiras causam alterações negativas no

crescimento, reprodução, fisiologia e vigor dessas plantas, o que induz a morte

quando se associam a alta intensidade do parasitismo e a condições ambientais

adversas (Hawksworth, 1983, Mourão et al. 2009). Por sua vez, a mortalidade das

hospedeiras modifica a dinâmica e estrutura de populações e comunidades (Pennings

& Callaway, 2002).

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De maneira geral, os impactos causados pelas plantas parasitas estão relacionados

com a preferência por hospedeiras (Press & Phoenix, 2005). Por exemplo, se o

parasitismo for mais frequente em espécies dominantes, o desenvolvimento das

competidoras fracas pode ser favorecido, o que aumenta a diversidade de espécies na

comunidade (Press, 1998).

As plantas parasitas podem ser classificadas de acordo com o grau de especificidade

por suas hospedeiras: generalistas, quando estão associadas a diversas espécies, ou

especialistas, que se associam a uma ou poucas espécies (Norton & Carpenter, 1998).

As plantas parasitas podem apresentar preferência por alguma hospedeira de acordo

com características da mesma, como qualidade nutricional (Press & Phoenix 2005),

formas de vida (Kelly et al, 1988) e diâmetro dos galhos, que influencia diretamente no

estabelecimento das hemiparasitas (Sargent, 1995, Arruda et al, 2006). A preferência

pode estar relacionada apenas com a abundância da hospedeira, onde aquela

preferencial é facilmente encontrada na comunidade. A preferência verdadeira é

observada quando uma espécie é parasitada desproporcionalmente à sua abundância

(Press & Phoenix, 2005).

Devido à ampla distribuição de plantas parasitas e os vários impactos gerados por elas

na comunidade, é importante entender sua relação com as hospedeiras e o papel

desempenhado nas comunidades vegetais. No Brasil, a maior família de plantas

parasitas é a Loranthaceae, que têm ampla distribuição em regiões tropicais (Kuijt,

1969). Dentro dessa família, duas espécies co-ocorrem em uma região de campos

rupestres ferruginosos no sudeste do Brasil: Struthanthus flexicaulis Mart., com vasta

distribuição nas áreas de cerrado do Brasil Central (Rizzini, 1980), e Tripodanthus

acutifolius (Ruiz & Pav.) Tiegh., com distribuição na região centro-sul brasileira (Amico

et al, 2012). As duas hemiparasitas possuem porte e estratégias de dispersão

diferentes (Figura 1.a). Struthanthus flexicaulis possui ramos longos e flexíveis, com

diâmetro aproximado de 2mm (Figura 1.b). Além da dispersão ornitocórica, típico em

ervas-de-passarinho (Kuijt, 1969), S. flexicaulis também dispersa seus ramos

vegetativamente. A dispersão vegetativa ocorre através do crescimento dos ramos,

onde haustórios secundários são formados espaçadamente e novas hospedeiras são

atingidas (Calvin & Wilson, 2006; Mourão, 2009; Mourão, 2012). A dispersão

ornitocórica ocorre através do consumo de seus frutos alaranjados pelas aves

dispersoras, principalmente Elaenia cristata (Tyrannidae) (Guerra, 2005). Já T.

acutifolius possui galhos lenhosos e grande porte (Arruda et al., 2012). Seus galhos

têm diâmetro aproximado de 20 mm, e formam apenas um haustório principal na parte

aérea de suas hospedeiras através da deposição de sementes na dispersão

ornitocórica (Figura 1.c). Tripodanthus acutifolius não dispersa seus ramos

vegetativamente como S. flexicaulis. Seus frutos carnosos e avermelhados são

consumidos por aves dispersoras não identificadas.

Na área de ocorrência das hemiparasitas – campos rupestres ferruginosos - as

condições abióticas são naturalmente severas: pouca quantidade de solo, nutrientes e

umidade, além de alta concentração de metais pesados e temperaturas elevadas

(Silva et al., 1996). Essas características ambientais podem prejudicar o

desenvolvimento das hospedeiras, que também é influenciado negativamente pela

presença das hemiparasitas. A fitofisionomia de campos rupestres, com estrato

herbáceo predominante e árvores escassas, pode influenciar diferentemente o

estabelecimento das parasitas. Assim, comparamos o grau de especificidade e

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preferência de S. flexicaulis e T. acutifolius por hospedeiras, os fatores que influenciam

esses padrões, e as consequências da preferência na população de hospedeiras.

Figura 1: Comparação do porte das hemiparasitas Tripodanthus acutifolius e

Struthanthus flexicaulis. (a) S. flexicaulis parasitando T. acutifolius. (b) S. flexicaulis

parasitando M. calodendron.(c) T. acutifolius parasitando M. calodendron, já morta.

As perguntas que nortearam esse trabalho foram: 1) S. flexicaulis e T. acutifolius são

generalistas ou especialistas?; 2) Essas hemiparasitas tem preferência por

hospedeiras?

A nossa hipótese do estudo é: Devido à dispersão vegetativa e ornitocórica de S.

flexicaulis, essa hemiparasita provavelmente é mais generalista quando comparada a

T. acutifolius, que não dispersa seus ramos vegetativamente. Como T. acutifolius

depende da dispersão ornitocórica para atingir suas hospedeiras, essas

provavelmente serão exclusivamente espécies com galhos lignificados devido à

escolha da ave por poleiros.

Se a hipótese for verdadeira, é esperado observar: 1) S. flexicaulis apresentará

conexões haustoriais numa maior gama de espécies quando comparada a T.

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acutifolius; 2) S. flexicaulis irá parasitar espécies herbáceas e arbustivas, enquanto T.

acutifolius parasitará preferencialmente arbustivas.

Material e métodos

Área de estudo

O estudo foi realizado numa área de campos rupestres ferruginosos (20° 03’ 60”S, 44°

02’ 00” W), na porção sul da Cadeia do Espinhaço, um conjunto de serras paralelas ao

Oceano Atlântico com extensão de 1200 km. Nas áreas mais altas dessa cadeia,

localizam-se campos rupestres que apresentam alta diversidade, com muitas espécies

endêmicas e relevante importância ecológica (Azevedo et al., 2009).

O clima da região é do tipo mesotérmico com precipitação anual de 1000 a 1500 mm

(Nimer & Brandão, 1989) e temperatura média anual de 25°C (Rizzini, 1997). Os

afloramentos ferruginosos localizam-se nos topos de serras, onde há alta incidência

solar, altas temperaturas e ventos constantes. São consideradas áreas prioritárias

para a conservação da biodiversidade devido à alta diversidade e presença de

espécies endêmicas, sujeitas a diversas ameaças antrópicas, principalmente

mineração (Drummond et al., 2005). A comunidade vegetal cresce nestas áreas de

canga, num substrato compacto de minério de ferro que atinge altas temperaturas

(Klein, 2000; Vilela et al., 2004), com escassez do solo, baixo teor de umidade, água e

nutrientes (Silva et al., 1996).

A vegetação da área de estudo é composta principalmente por espécies herbáceas e

arbustivas, dominada principalmente por Asteraceae, Fabaceae, Myrtaceae,

Melastomataceae, Rubiaceae, Poaceae e Orchidaceae (Jacobi et al., 2007). Estas

espécies podem se desenvolver em habitats abertos ou fechados. As áreas abertas

possuem fendas e fissuras no substrato rochoso onde ocorre acúmulo de pequena

quantidade de matéria orgânica, que possibilita o desenvolvimento de espécies

campestres. As espécies arbustivas não ultrapassam dois metros de altura e as

herbáceas cobrem grande parte da área. Já nas áreas fechadas, conhecidas como

ilhas de vegetação, as espécies atingem maiores alturas do que nas áreas abertas. A

quantidade de solo e matéria orgânica disponível é maior, e se acumulam em grandes

depressões que permitem o desenvolvimento de espécies arbustivas de porte grande

(Carmo & Jacobi, 2012). O total aproximado de áreas abertas no local de estudo é de

381.526 m2, e as ilhas de vegetação ocupam 43.004 m2.

Lista de espécies

Para o levantamento de espécies hospedeiras de Tripodanthus acutifolius foram

percorridos 64 transectos de 50x1m2, totalizando uma área de 3.200 m2 em áreas

abertas e ilhas de vegetação, entre os meses de junho de 2014 a abril de 2015

durante as estações seca e chuvosa. Plantas vasculares parasitadas por T. acutifolius

foram identificadas em campo e no herbário do Instituto de Ciências Biológicas, UFMG

(BHCB). A lista de hospedeiras de T. acutifolius foi comparada com a de S. flexicaulis,

retirada de Mourão et. al. (2006), e acrescida de novas espécies e reclassificações

quanto ao parasitismo.

As espécies foram classificadas de acordo com o Angiosperm Phylogeny Group –

APG III (2009) e as formas de vida, de acordo com Raunkiaer, adaptadas às

condições brasileiras. As espécies foram classificadas em cinco formas de vida:

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Fanerófitas (arbóreas e arbustivas), caméfitas (sub-arbustivas ou ervas),

hemicriptófitas (herbáceas), geófitas (ervas) e terófitas (plantas anuais).

Formação de apressórios e haustórios

Foi analisada a formação de apressórios nas hospedeiras em campo, pois esta

estrutura pode indicar a presença de conexões haustoriais entre a parasita e o xilema

da hospedeira. De acordo com Sargent (1995), para a formação do haustório é

necessário que a semente seja depositada em estruturas com diâmetros entre 10 a 14

mm. Como a presença do haustório só pode ser confirmada mediante cortes

anatômicos (Sallé, 1983), adotamos um critério de classificação de acordo com o

diâmetro e características das estruturas onde houve a formação do apressório na

hospedeira: 1) Hospedeiras verdadeiras, quando os apressórios se desenvolviam em

galhos, pois provavelmente haveria formação do haustório devido à presença dos

vasos condutores (Vidal & Vidal 2007) e diâmetros entre 10 e 14 mm (Sargent, 1995);

e 2) Suporte, quando os apressórios se desenvolviam em folhas, flores e frutos, cujos

vasos condutores seriam de pequeno calibre (Vidal & Vidal 2007) e as estruturas não

teriam o diâmetro ideal para formação do haustório (Sargent, 1995).

Disponibilidade de hospedeiras, preferência e mortalidade

Para avaliar a disponibilidade, a preferência e a mortalidade de hospedeiras, foi feito

um levantamento das espécies presentes em uma área aberta de 1.000 m2 de campos

rupestres ferruginosos. O levantamento de hospedeiras de T. acutifolius seguiu o

mesmo procedimento realizado para S. flexicaulis (Mourão, 2006). Todas as espécies

no interior de 10 transectos de 50m x 1m foram identificadas e contadas, exceto

gramíneas (Poaceae e Cyperaceae). Foram calculadas a densidade, a porcentagem

de mortalidade, e a representatividade de cada espécie na comunidade vegetal. Cada

indivíduo foi classificado como parasitado ou não parasitado, e vivo ou morto. Também

foram registrados indivíduos parasitados simultaneamente por T. acutifolius e S.

flexicaulis. Plantas foram identificadas em campo e no herbário do Instituto de

Ciências Biológicas (BHCB), da Universidade Federal de Minas Gerais. Na avaliação

de preferência de hospedeiras por hemiparasitas foram analisadas somente espécies

com abundância relativa maior que 1% na comunidade.

Resultados

Foram identificados 16.134 indivíduos de 87 espécies, representando 25 famílias.

Apenas 12 espécies, distribuídas em 10 famílias, foram parasitadas por T. acutifolius.

Já S. flexicaulis parasitou 34 espécies pertencentes a 15 famílias (Apêndice). Foram

encontradas 61 espécies nas áreas abertas e 26 espécies nas ilhas de vegetação.

T. acutifolius formou haustórios apenas em ramos de fanerófitas, através da deposição

de sementes por aves na dispersão ornitocórica. Já S. flexicaulis, quando se dispersou

de forma ornitocórica e vegetativa, formou haustórios em ramos de espécies

fanerófitas (Mourão, 2006) e da hemiparasita T. acutifolius (Figura 2).

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Figura 2: Formas de vida de espécies da comunidade vegetal (n=87), de hospedeiras

verdadeiras de S. flexicaulis (n=34) e T. acutifolius (n=12).

Ilhas de vegetação tiveram 61% (n=16) espécies parasitadas e 39% (n=10) não

parasitadas, enquanto áreas abertas tiveram 32% (n=20) espécies parasitadas e 68%

(n=41) não parasitadas. Tripodanthus acutifolius atacou aproximadamente 15% das

espécies de cada habitat, porém S. flexicaulis parasitou o dobro das espécies

disponíveis em ilhas de vegetação (60%) quando comparada a áreas abertas (30%),

devido à alta densidade de plantas que facilita a infecção de novas hospedeiras em

ilhas de vegetação através do crescimento de ramos (Figura 3). Em áreas abertas, as

plantas estão menos agregadas na paisagem, e S. flexicaulis utilizou 13 espécies

somente como suporte através da dispersão vegetativa dos ramos. Nessa situação

formou apressórios em folhas, frutos e inflorescências de espécies fanerófitas,

caméfitas e hemicriptófitas (Figura 4) (Mourão et al, 2006). Em ilhas de vegetação não

foi observado espécies utilizadas somente como suporte.

0 10 20 30 40 50 60

Fanerófitas

Caméfitas

Hemicriptófita

Hemiparasita

Geófita

Terófita

T. acutifolius S. flexicaulis Community

Número de espécies

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Figura 3: (A) Total de espécies na comunidade (n=87) distribuídas nos habitats de

áreas abertas (OP) (n=61) e ilhas de vegetação (FI) (n=26). (B) Hospedeiras

verdadeiras de T. acutifolius (n=12) e (C) S. flexicaulis (n=34) em cada habitat. (D)

Formas de vida de espécies utilizadas como suporte de S. flexicaulis em open areas

(n= 13).

Figura 4: T. acutifolius parasitando fanerófitas. (a) Mimosa calodendron; (b) Eriope

macrostachya; (c) Tibouchina heteromalla; (d) Stachytarpheta glabra. Struthanthus

flexicaulis utilizando espécies como suporte na dispersão vegetativa (Mourão et al,

2006): (e) Acianthera teres; (f) Cattleya caulescens; (g) Vellozia compacta.

Hospedeiras T. acutifolius

A B

C D

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Dentre as 87 espécies identificadas na comunidade vegetal, as hemiparasitas

compartilharam dez hospedeiras. Mimosa calodendron foi a principal espécie

parasitada, representando 91.6% dos indivíduos infectados por T. acutifolius e 35.3%

de S. flexicaulis. Dos indivíduos de M. calodendron parasitados somente por T.

acutifolius, 63.6% foram encontrados mortos, enquanto no parasitismo somente por S.

flexicaulis, 45.9% dos indivíduos estavam mortos. Foram encontrados 102 indivíduos

de M. calodendron parasitados simultaneamente por ambas as hemiparasitas, sendo

que 62.7% (n=64) desses indivíduos estavam mortos.

Em populações de espécies hospedeiras, S. flexicaulis parasita mais indivíduos

quando comparada a T. acutifolius (Figura 5).

Figura 5: Principais hospedeiras de S. flexicaulis e T. acutifolius e porcentagem de

indivíduos parasitados na população de cada espécie. Mc (Mimosa calodendron), Lp

(Lychnophora pinaster), Th (Tibouchina heteromalla), Sg (Stachytarpheta glabra), Em

(Eriope macrostachya), Br (Baccharis reticularia).

Além das altas taxas mortalidade em M. calodendron, S. flexicaulis causa morte de

outras espécies representativas na comunidade, como Baccharis reticularia,

Lychnophora pinaster, Stachytarpheta glabra, Eriope macrostachya e Microstachys

daphnoides. A mortalidade provocada por T. acutifolius foi observada somente em

indivíduos de M. calodendron.

Tripodanthus acutifolius parasitou somente as espécies com maior porte na

comunidade, que atingem alturas entre 1 a 2 metros, como Ocotea percoriacea, M.

calodendron, Tibouchina heteromalla, S. glabra, E. macrostachya e B. reticularia.

Apesar de algumas espécies apresentarem elevada abundância relativa, não foram

parasitadas por T. acutifolius, sugerindo que há outros fatores que também

determinam a preferência por hospedeiras, como a morfologia das espécies (Tabela

1). Symphyopappus brasiliensis e M. daphnoides possuem galhos finos com densa

ramificação e complexidade estrutural, enquanto L. pinaster possui porte baixo e

0

5

10

15

20

25

30

35

40

Mc Br Lp Em Sg Th

Popula

ção (

%)

S. flexicaulis T.acutifolius

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ramos flexíveis de crescimento lateral. Esses fatores podem dificultar a deposição de

sementes da hemiparasita pelas aves dispersoras.

Tabela 1: Espécies com abundância relativa maior que 1% na comunidade vegetal. Classificados em vivos, mortos, parasitados (P), não parasitados (NP) para cada hemiparasita. Levantamento da comunidade vegetal e de hospedeiras de S flexicaulis foi feito em 2006, e de T. acutifolius em 2014 /2015. As hospedeiras foram ordenadas de acordo com a abundância relativa na comunidade em 2006.

Espécies

Struthanthus flexicaulis Tripodanthus acutifolius

Total Vivos Mortos Total Vivos Mortos

NP (%)

P (%)

NP (%)

P (%)

NP (%)

P (%)

NP (%)

P (%)

Microstachys daphnoides 1136 97.4 2.3 0.3 0.1 358 100 * * *

Mimosa calodendron 858 63.2 19.1 1.5 16.2 431 79.6 3.2 11.6 5.6

Lychnophora pinaster 806 86.4 12.0 0.9 0.7 369 100 * * *

Tibouchina heteromalla 750 96.8 3.2 * * 206 99.5 0.5 * *

Stachytarpheta glabra 382 93.5 6.3 * 0.3 223 99.6 0.4 * *

Symphyopappus brasiliensis 368 98.6 1.1 0.3 * 481 100 * * *

Vellozia compacta 297 94.9 4.7 0.3 * 212 100 * * *

Eriope macrostachya 202 91.6 7.9 * 0.5 189 95.8 4.2 * *

Borreria capitata 200 97.5 2.5 * * 39 100 * * *

Baccharis reticularia 167 79.0 15.6 3.0 2.4 138 96.4 3.6 * *

Croton serratoideus 135 98.5 0.7 0.7 * 31 100 * * *

Chromolaena multiflosculosa 90 98.9 1.1 * * 52 100 * * *

Discussão

Grau de especificidade: Generalistas ou especialistas?

Tripodanthus acutifolius é especialista quando comparada a S. flexicaulis.

Normalmente as ervas-de-passarinho especialistas apresentam uma hospedeira

principal e algumas hospedeiras pouco parasitadas (Norton & Carpenter, 1998), como

ocorre com T. acutifolius, que ataca somente espécies com galhos lignificados e

principalmente M. calodendron. Essa especificidade pode aumentar a eficiência da

captura de recursos (Norton & Carpenter, 1998). Assim como T. acutifolius, a maioria

das espécies do gênero Psittacanthus (Loranthaceae) são especialistas (Monteiro et

al. 1992). Essas hemiparasitas são aéreas, lenhosas, com um único haustório

(Marshall & Ehleringer 1990), e são dependentes das aves para dispersar suas

sementes (Monteiro et al. 1992; López de Buen & Ornelas, 2001; Collazo & Geils,

2002), semelhantes a T. acutifolius. Psittacanthus robustus, parasita espécies da

família Vochysiaceae (Monteiro et al. 1992), principalmente Vochysia thyrsoidea

(Teodoro, et al. 2010), P. schiedeanus parasita preferencialmente Liquidambar

styraciflua (López de Buen & Ornelas 1999), P. eucalyptifolius é encontrada em

Vatairea macrocarpa e P. plagiophyllus em Anacardium occidentale. Outras espécies

da família Loranthaceae também são especialistas: Na Austrália Amyema linophyllum,

A. miquelii, A. miraculosum, A. preissii, e A. quandang parasitam somente uma

espécie, ou espécies taxonomicamente próximas (Yan, 1990) e a espécie africana

Tapinanthus ogowensis parasita preferencialmente Dacryodes edulis (Dibong et al.,

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2008). Na Nova Zelândia, espécies de porte similar a T. acutifolius, como Alepis

flavida, Peraxilla colensoi e P. tetrapetala parasitam preferencialmente hospedeiras do

gênero Nothofagus (Norton & De Lange, 1999).

Struthanthus flexicaulis possui o triplo de hospedeiras que T. acutifolius e apresenta

comportamento generalista, típico da maioria das espécies de plantas parasitas

(Gibson & Watkinson, 1989) e das lorantáceas brasileiras (Arruda et al. 2006, Arruda

et al. 2012). Apesar de estarem associadas a diversas hospedeiras, as generalistas

normalmente se associam preferencialmente a algumas espécies (Norton & Carpenter,

1998), como no caso de S. flexicaulis. Esse comportamento também é exibido na

espécie S. polyanthus, que é generalista, mas parasita preferencialmente Kielmeyera

coriacea, Pouteria ramiflora e Styrax ferrugineus (Arruda et al. 2006). Outras

espécies de lorantáceas generalistas ocorrem na Austrália - Lysiana exocarpi (Yan,

1990), na África - Tapinanthus bangwensis e Phragmanthera capitata (Dibong et al.,

2009, 2010) e Nova Zelândia - Ileostylus micranthus e Tupeia antarctica (Norton & De

Lange, 1999). O comportamento generalista pode ser vantajoso em comunidades

heterogêneas, pela maior facilidade de encontrar uma hospedeira quando comparada

a uma espécie especialista (Norton & De Lange, 1999).

A especificidade por hospedeiras na família Loranthaceae tende a seguir um padrão

latitudinal. Plantas parasitas geralmente são generalistas em regiões tropicais (alta

riqueza de espécies) e especialistas em regiões temperadas (baixa riqueza) (Norton &

Carpenter, 1998). Porém, a especialização parece estar mais relacionada com a

riqueza de espécies do que a latitude: Em ecossistemas tropicais com baixa riqueza

de espécies, plantas parasitas exibem comportamento especialista (Barlow, 1992). T.

acutifolius e S. flexicaulis ocorrem na mesma região, porém tem comportamentos de

especialização opostos. Isso pode ocorrer devido a diferenças morfológicas e

estratégias de dispersão, que faz com que riqueza de potenciais hospedeiras seja

única para cada hemiparasita. Portanto, S. flexicaulis tem maior variedade de

potenciais hospedeiras quando comparada a T. acutifolius, já que pode atingir

espécies através do crescimento de seus ramos e da dispersão ornitocórica. Isso a

torna generalista, pois há grande variedade de espécies que podem se encontrar com

S. flexicaulis, principalmente na dispersão vegetativa. Já T. acutifolius é sempre

direcionada para potenciais hospedeiras pelas aves dispersoras. A comunidade

vegetal para T. acutifolius tem menor riqueza de potenciais hospedeiras, pois não será

direcionada para espécies que as aves não conseguem se empoleirar. Isso a torna

especialista.

Preferência e mortalidade

Mesmo se comportando de maneiras diferentes (especialista x generalista) ambas

hemiparasitas preferem M. calodendron. Esta leguminosa, apesar de ser uma das

espécies mais abundantes da área, é parasitada desproporcionalmente à sua

abundância quando comparada a outras hospedeiras na área de estudo (Mourão et

al., submetido). Essa relação pode ser considerada uma preferência verdadeira (Press

& Phoenix, 2005) das hemiparasitas pela espécie M. calodendron.

Estudos anteriores demonstraram que existem relações simbióticas entre M.

calodendron e bactérias do gênero Burkholderia, com presença de nódulos e fixação

aparentemente efetiva de nitrogênio (dos Reis Junior et al., 2010). Essa característica

é um fator de preferência para as plantas parasitas, pois hospedeiras leguminosas

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normalmente possuem alta qualidade nutricional devido à elevada concentração de

nitrogênio, sendo superior quando comparada a outras plantas da comunidade

(Schulze & Ehleringer, 1984). Além disso, M. calodendron é dominante na

comunidade, com alta representatividade, podendo ser considerada uma forte

competidora. Acredita-se que é importante na estruturação da comunidade vegetal em

que se encontra inserida, pois cria microambientes que favoreceriam o

estabelecimento de outras espécies (Jacobi et al., 2007). Altas taxas de mortalidade

são observadas quando M. calodendron é parasitada por uma das duas hemiparasitas

ou simultaneamente. Aproximadamente metade dos indivíduos parasitados por T.

acutifolius também foram parasitados por S. flexicaulis, e metade desses foram

encontrados mortos. Isso indica que essas hemiparasitas podem estar envolvidas no

controle populacional de M. calodendron, o que provavelmente favorece o

desenvolvimento das espécies menos dominantes, aumentado a diversidade local de

espécies (Press, 1998).

Especificidade e preferência estão relacionadas com a dispersão

O grau de especificidade e preferência das hemiparasitas estão fortemente

relacionados com o tipo de dispersão. Enquanto T. acutifolius se dispersa de forma

ornitocórica, S. flexicaulis também se dispersa vegetativamente, atingindo um maior

número de indivíduos e espécies com diferentes portes. Alguns têm função de suporte,

o que é especialmente importante para a sobrevivência de S. flexicaulis em áreas

abertas devido à alta temperatura do solo. Na dispersão vegetativa, os ramos que

atingem o substrato rochoso podem se queimar. Nesse caso, as espécies que atuam

como suporte evitam o contato das pontas dos ramos com o substrato (Mourão, 2012),

facilitando a dispersão de S. flexicaulis até que atinja uma nova hospedeira e forme

conexões haustoriais. A hemiparasita pode se espalhar sobre as plantas vizinhas e

infectar plantas que não possuem galhos adequados para o empoleiramento das aves

(i.e. o que impede que essas espécies sejam infectadas por via ornitocórica). A

dispersão vegetativa é eficiente principalmente em ambientes com alta densidade de

plantas, possibilitando à hemiparasita se espalhar na comunidade vegetal,

aumentando sua gama de hospedeiras (Mourão et al., 2009), como ocorre em habitats

de ilhas de vegetação e áreas abertas com alta densidade de plantas.

Todas as hospedeiras verdadeiras de T. acutifolius e a maioria de S. flexicaulis são

espécies fanerófitas e possuem os maiores portes na comunidade vegetal. Essa

característica está relacionada com o comportamento das aves dispersoras, que se

empoleiram nos galhos das hospedeiras para depositar as sementes das

hemiparasitas. Esses galhos devem suportar o peso das aves e possuir diâmetros

entre 10 e 14 milímetros para que as hemiparasitas consigam penetrar na hospedeira

e atingir os vasos condutores (Sargent, 1995). O diâmetro dos galhos é uma

característica importante para a ocorrência e estabelecimento das ervas-de-

passarinho (Arruda et al., 2006). Após a deposição da semente de T. acutifolius, o

haustório primário é formado logo que ocorre a germinação na parte aérea da

hospedeira. A plântula desenvolve uma raíz epicortical que cresce ao longo do caule

da hospedeira em direção ao solo, criando conexões haustoriais secundárias com as

raízes (Amico, 2012). Na comunidade vegetal sobre canga, a riqueza de plantas

lignificadas – possíveis poleiros para aves e potenciais hospedeiras para T. acutifolius

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– é baixa. A pequena quantidade de solo disponível (Klein, 2000; Vilela et al., 2004)

dificulta o crescimento dos indivíduos, que normalmente apresentam porte baixo e

tamanho reduzido. Entre as espécies mais representativas na comunidade, oito

possuem galhos lignificados, e T. acutifolius parasita cinco dessas espécies. As

espécies não parasitadas, como Symphyopappus brasiliensis, Microstachys

daphnoides, e Lychnophora pinaster, tem a morfologia que dificulta o empoeiramento

de aves, como baixo porte, ramos finos e crescimento lateral.

Conclusões e estudos futuros

Como o grau de especificidade das hemiparasitas está intimamente relacionado com o

tipo de dispersão e o comportamento da ave, fica claro que a dispersão vegetativa dos

ramos de S. flexicaulis, ausente em T. acutifolius, aumenta sua gama de hospedeiras.

Porém, alguns estudos sugerem que T. acutifolius possui modo versátil de parasitismo

(Kuijt, 1969). Essa espécie, além de parasitar a parte aérea das hospedeiras, tem um

complexo sistema radicular que pode procurar por novas hospedeiras no solo. Quando

há um encontro entre parasita e uma planta vizinha, o sistema radicular da parasita

envolve a base da nova hospedeira e cria novos ramos a partir da extremidade das

raízes. Nesse processo, a hemiparasita cresce e se estabelece na parte aérea de uma

nova hospedeira. Novas conexões haustoriais são formadas, apresentando um tipo de

dispersão vegetativa subterrânea (Kuijt, 1969). Esse modo de dispersão foi pouco

documentado até o momento, e o gênero Gaiadendron também apresenta a

diferenciação de raízes em ramos (Kuijt, 1969). O hábito subterrâneo em

Loranthaceae é raro, e estudos são pouco detalhados (Kuijt, 1969). Não foram

observados em campo hospedeiras sem a conexão haustorial primária, formada a

partir da germinação de sementes. Porém, parasitas sobreviveram mesmo com suas

hospedeiras mortas. Estudos futuros são necessários para compreensão dessa

estratégia de parasitismo subterrâneo no substrato ferruginoso, que dificulta a

penetração e o espalhamento das raízes devido à presença de minério de ferro (Klein,

2000, Vilela et al., 2004). Se confirmada, a dispersão vegetativa de raízes de T.

acutifolius poderia aumentar sua gama de hospedeiras, e torná-la tão generalista

quanto S. flexicaulis. Em ambientes severos como os campos rupestres ferruginosos,

as estratégias nutricionais das plantas podem garantir sua sobrevivência em meio à

escassez de nutrientes e água, além da independência de sua hospedeira principal,

sobrevivendo mesmo quando essa morre.

Agradecimentos

Agradecemos a Leandro Assis pela ajuda na identificação de material botânico, ao

Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais pela licença de coleta, aos

funcionários do Parque Estadual da Serra do Rola Moça pelo apoio logístico, e à

CAPES, FAPEMIG, CNPq pelo auxílio financeiro.

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Mistletoes in Southern South-Australia. Australian Journal of Botany 38(5) 475 -

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Apêndice: Lista de espécies da área de estudo e hospedeiras de Tripodanthus acutifolius e Struthanthus flexicaulis. Hospedeiras foram infectadas através da dispersão vegetativa (Veg), ornitocórica (Orn) ou utilizadas somentes como suporte (Sup) pela hemiparasita. Tipo de habitat: Ilhas de vegetação (Fi); Áreas abertas (Op).

Família Espécie Forma de vida

Habitat S. flexicaulis

T. acutifolius

PTERIDÓFITAS

Polypodiaceae Microgramma squamulosa (Kaulf.) de la Sota Hemicriptófita Fi

Pleopeltis minarum (Weath.) Salino Hemicriptófita Fi

ANGIOSPERMAS BASAIS

Lauraceae Ocotea tristes (Nees & Mart.) Mez Fanerófita Fi Orn + Veg

Ocotea percoriacea Kosterm. Fanerófita Op Orn

Piperaceae Peperomia decora Dahlst. Caméfita Op

Peperomia galioides Kunth Caméfita Op

MONOCOTILEDÔNEAS

Alstroemeriaceae Alstroemeria plantaginea Mart. ex Schult. & Schult.f. Geófita Op

Aracea Anthurium minarum Sakur. & Mayo Caméfita Fi

Bromeliaceae Aechmea bromeliifolia (Rudge) Baker Hemicriptófita Op Sup

Billbergia minarum L.B.Sm. Hemicriptófita Op Sup

Dyckia simulans L.B.Sm. Hemicriptófita Op

Vriesea minarum L.B. Sm. Hemicriptófita Op Sup

Cyperaceae

Bulbostylis fimbriata (Nees) C.B.Clarke Caméfita Op

Lagenocarpus rigidus Nees. Caméfita Op Sup

Orchidaceae

Acianthera teres (Lindl.) Borba Caméfita Op Sup

Epidendrum secundum Jacq. Caméfita Op Sup

Habenaria magdalenensis Hoehne Geófita Op

Coppensia blanchetii (Rchb.f.) Campacci Caméfita Op Sup

Prosthechea vespa (Vell.) W.E. Higgins Caméfita Op

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Orchidaceae Hoffmannseggella caulescens (Lindl.) H.G.Jones Caméfita Op Sup

Poaceae Andropogon bicornis L. Hemicriptófita Op

Andropogon ingratus Hack. Hemicriptófita Op Sup

Melinis minutiflora P. Beauv. Hemicriptófita Op

Panicum sellowii Nees Hemicriptófita Op

Paspalum scalare Trin. Hemicriptófita Op Sup

Velloziaceae Vellozia compacta Mart. ex Schult. & Schult.f Fanerófita Op Sup

Vellozia albiflora Pohl Caméfita Op Sup

Vellozia graminea Pohl Caméfita Op

EUDICOTILEDÔNAS

Acanthaceae Justicia riparia Kameyama Fanerófita Op

Apocynaceae Ditassa mucronata Mart. Fanerófita Op

Ditassa sp Fanerófita Op

Asteraceae

Ageratum fastigiatum (Gardner) R.M. King & H. Rob. Fanerófita Op

Ageratum myriadenium (Sch.Bip. ex Baker) R.M.King & H.Rob.

Fanerófita Op Sup

Aspilia sp Fanerófita Op

Baccharis pingraea DC. Fanerófita Op Orn + Veg Orn

Baccharis reticularia DC. Fanerófita Op Orn + Veg Orn

Chromolaena multiflosculosa (DC.) R.M. King & H. Rob.

Fanerófita Op Veg

Dasyphyllum sprengelianum (Gardner) Cabrera Fanerófita Fi Orn + Veg

Eremanthus erythropappus (DC.) MacLeish Fanerófita Fi Orn + Veg

Opnophyllon adamantium (Gardn.) R.M. King & H. Rob.

Fanerófita Op

Lychnophora pinaster Mart Fanerófita Op Veg

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Asteraceae Symphyopappus brasiliensis (Gardn.) R.M.King & H Rob

Fanerófita Op Veg

Trichogonia hirtiflora (DC.) Sch.Bip. ex Baker Fanerófita Op

Trixis vauthieri DC. Fanerófita Op Orn + Veg Orn

Stevia sp. Fanerófita Op

Begoniaceae Begonia rufa Thunb. Fanerófita Op

Cactaceae Arthrocereus glaziovii (K. Schum.) N.P.Taylor & Zappi Caméfita Op

Celastraceae Maytenus gonoclada Mart. Fanerófita Fi Orn + Veg Orn

Clusiaceae Clusia arrudea Planch. & Triana ex Engl. Fanerófita Fi Orn + Veg Orn

Convolvulaceae Evolvulus filipes Mart. Caméfita Op

Ipomoea sp. Caméfita Fi

Euphorbiaceae

Croton serratoideus Radcl.-Sm. & Govaerts Fanerófita Op Veg

Microstachys daphnoides (Mart.) Müll.Arg Fanerófita Op Veg

Fabaceae Bauhinia rufa (Bong.) Steud. Fanerófita Fi Orn + Veg

Copaifera langsdorffii Desf. Fanerófita Op Orn + Veg

Mimosa calodendron Mart. ex Benth Fanerófita Op Orn + Veg Orn

Periandra mediterranea (Vell.) Taub Fanerófita Op Orn + Veg

Lamiaceae Eriope macrostachya Mart. ex Benth. Fanerófita Op Orn + Veg Orn

Vitex sellowiana Cham Fanerófita Fi

Loranthaceae Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. Hemiparasita

Op / Fi Veg

Tripodanthus acutifolius (Ruiz & Pav.) Tiegh. Hemiparasita

Op / Fi Veg

Malpighiaceae

Byrsonima variabilis A. Juss. Fanerófita Fi

Heteropterys sp. Fanerófita Op

Melastomataceae Leandra australis (Cham.) Cogn. Fanerófita Op Orn + Veg

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Melastomataceae Microlicia sp. Fanerófita Op Veg

Tibouchina sp. Fanerófita Op

Tibouchina heteromalla (D.Don) Cogn. Fanerófita Op Orn + Veg Orn

Meliaceae Cabralea canjerana (Vell.) Mart. Fanerófita Fi

Myrtaceae Eugenia sonderiana O.Berg Fanerófita Fi Orn + Veg Orn

Myrcia mutabilis (O.Berg) N. Silveira Fanerófita Fi Orn + Veg

Myrcia splendens (Sw.) DC. Fanerófita Fi Orn + Veg

Siphoneugena densiflora O.Berg Fanerófita Fi Orn + Veg

Nyctaginaceae Guapira opposita (Vell.) Reitz Fanerófita Fi Veg

Ochnaceae Ouratea semiserrata (Mart. & Nees) Engl. Fanerófita Op Orn

Portulacaceae Portulaca hirsutissima Cambess. Caméfita Op

Rubiaceae

Cordiera concolor (Cham.) Kuntze Fanerótita Fi Orn + Veg

Borreria capitata (Ruiz & Pav.) DC. Terófita Op

Coccocypselum lanceolatum (Ruiz & Pav.) Pers. Fanerófita Fi

Galianthe angustifolia (Cham. & Schltdl.) E.L.Cabral Fanerófita Fi Veg

Psychotria vellosiana Benth. Fanerófita Fi Orn + Veg

Sapindaceae Matayba mollis Radlk. Fanerófita Fi

Solanaceae

Solanum refractifolium Schltdl Fanerófita Op

Solanum subumbellatum Vell. Fanerófita Op Orn + Veg

Styracaceae Styrax ferrugineus Nees & Mart. Fanerófita Fi Orn + Veg

Verbenaceae Lantana camara L. Fanerófita Op

Stachytarpheta glabra Cham. Fanerófita Op Orn + Veg Orn

Vochysiaceae Vochysia sp. Fanerófita Fi

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Considerações finais

O presente estudo foi uma pesquisa pioneira sobre a ecologia de Tripodanthus

acutifolius (Loranthaceae). Essa espécie foi considerada uma praga em algumas

cidades brasileiras devido o parasitismo excessivo nas áreas urbanas. Apesar disso,

tanto em áreas naturais quanto em áreas urbanas, exerce muitos efeitos positivos na

comunidade, principalmente como fonte alimentar para a fauna local. Estudos sobre

sua ecologia em ambiente natural são inexistentes na literatura. Nos campos rupestres

ferruginosos, apesar de a hemiparasita causar altas taxas de mortalidade em suas

hospedeiras, se encontra em um ecossistema equilibrado no interior de uma unidade

de conservação. Provavelmente a hemiparasita exerce um importante papel na

manutenção da diversidade local.

O estudo identificou as hospedeiras de T. acutifolius e quantificou a mortalidade

causada pela hemiparasita nos campos rupestres ferruginosos. Devido a morte

seletiva de espécies, concluímos que a composição e a estrutura da comunidade

podem ser alteradas futuramente.

O acompanhamento dos padrões de floração e frutificação da hemiparasita

demonstraram que há disponibilidade de frutos durante todo o ano. Esta espécie pode

ser considerara uma fonte de recursos permanente para a avifauna da região, cuja

oferta constante de frutos intensifica o parasitismo. Estudos futuros da fenologia em

longo prazo, juntamente com a fenologia de outras espécies vegetais serão

interessantes para quantificar a importância dos recursos alimentares ofertados pela

hemiparasita na manutenção da fauna local.

Ao longo desse estudo, novos questionamentos surgiram a cerca do impacto da

hemiparasita na comunidade vegetal. Um ponto importante a ser investigado é a

dispersão subterrânea das raízes de T. acutifolius, visto que há indícios da existência

de conexões haustoriais no solo, uma vez que a morte da hospedeira não acarretou a

morte da hemiparasita. Acreditamos que o substrato compacto de minério de ferro

diminui a capacidade de dispersão das raízes de T. acutifolius.