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Saúde promove ações para humanização do parto Entre as medidas, estão a presença de acompanhante para a mãe e iniciativas para estimular a redução no número de cesáreas Gestantes atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) ganharam o direito de escolher, entre amigos e parentes, alguém de sua confiança para estar presente na sala de parto e também no pós-parto. A medida faz parte de uma série de ações do Ministério da Saúde para melhorar a qualidade do atendimento às gestantes e humanizar os partos no país. A portaria que regulamenta a Lei 11.108, de abril de 2005, foi assinada pelo ministro Saraiva Felipe durante a II Conferência Internacional sobre Humanização do Parto e Nascimento, no Rio de Janeiro, em dezembro, e estabeleceu um prazo de seis meses para que os hospitais adaptem suas instalações e procedimentos à nova regra. “A presença do acompanhante é um direito de todas as mulheres da sociedade. O Ministério da Saúde trabalhou para que essa conquista acontecesse, porque entende a importância da humanização do parto. A lei parece pequena, mas é grandiosa: além de ser uma vitória da sociedade, irá proporcionar melhores condições na assistência obstétrica", afirma a diretora do Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas do Ministério da Saúde, Cristina Boaretto. A presença de um acompanhante no período de parto e pós-parto é um dos fatores que contribuem para a humanização desse procedimento e que podem ajudar na redução do número de cesarianas. De acordo com 14 estudos científicos, nacionais e internacionais, realizados em mais de 5 mil mulheres, as gestantes que contaram com a presença de acompanhantes se sentiram mais seguras e confiantes durante o parto. Nessas circunstâncias, registrou-se também a redução da necessidade de medicações para alívio da dor, da duração do trabalho de parto e do número de cesáreas. Alguns estudos ainda sugerem a possibilidade dessa presença trazer outros efeitos a médio prazo, como a diminuição dos casos de depressão pós-parto. “Durante o parto, o medo leva à tensão, que leva à dor, que leva a mais medo. A presença de uma pessoa de confiança da mulher transmite mais segurança durante o trabalho de parto”, garante Daphne Rattner, técnica especializada da área técnica da Saúde da Mulher, do Ministério da Saúde. Caminhadas pelo corredor – A brasiliense Juliana Cristina atesta a experiência de ter tido um filho em ambiente com a presença de um acompanhante. Evelin nasceu no dia 21 de dezembro de 2005, no Hospital Materno-Infantil de Brasília, de parto normal. Juliana chegou à maternidade no dia 20, para uma consulta, mas, como o líquido amniótico (que envolve o bebê) havia diminuído de volume, foi logo internada. A avó fez companhia para Juliana, auxiliando-a a caminhar pelo corredor, para diminuir as dores que aumentavam a cada contração. Dona Josélia Maria da Conceição, de 60 anos, chorou quando viu a bisneta nascer. “Foi uma grande emoção”, lembra. “O melhor foi que a presença da minha avó me fez sentir muito mais confiante e segura”, recorda Juliana. “Ela segurou minha mão o tempo todo, enquanto eu fazia força para minha filha nascer”, conta a moça, que já pensa em outra gravidez: “Gostaria que da próxima vez meu marido me acompanhasse. Acho que ele adoraria ver o nascimento do filho”. Profissionais de saúde já constataram a relação entre a participação dos companheiros na assistência ao parto e a redução nos casos de violência familiar. Segundo esses especialistas, ao acompanhar o processo o homem começa a admirar e valorizar mais a companheira. Para especialistas, há um momento no pós-parto em que se estabelece o vínculo emocional entre mãe e filho e, se o pai participa, isso fortalece esse laço na família e desenvolve-se uma relação de respeito entre seus membros. Daphne Rattner, especialista do Ministério da Saúde, explica que

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Humanização do Parto

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  • Sade promove aes para humanizao do parto

    Entre as medidas, esto a presena de acompanhante para a me e iniciativas para estimular a reduo no nmero de cesreas

    Gestantes atendidas pelo Sistema nico de Sade (SUS) ganharam o direito de escolher, entre amigos e parentes, algum de sua confiana para estar presente na sala de parto e tambm no ps-parto. A medida faz parte de uma srie de aes do Ministrio da Sade para melhorar a qualidade do atendimento s gestantes e humanizar os partos no pas.

    A portaria que regulamenta a Lei 11.108, de abril de 2005, foi assinada pelo ministro Saraiva Felipe durante a II Conferncia Internacional sobre Humanizao do Parto e Nascimento, no Rio de Janeiro, em dezembro, e estabeleceu um prazo de seis meses para que os hospitais adaptem suas instalaes e procedimentos nova regra.

    A presena do acompanhante um direito de todas as mulheres da sociedade. O Ministrio da Sade trabalhou para que essa conquista acontecesse, porque entende a importncia da humanizao do parto. A lei parece pequena, mas grandiosa: alm de ser uma vitria da sociedade, ir proporcionar melhores condies na assistncia obsttrica", afirma a diretora do Departamento de Aes Programticas e Estratgicas do Ministrio da Sade, Cristina Boaretto.

    A presena de um acompanhante no perodo de parto e ps-parto um dos fatores que contribuem para a humanizao desse procedimento e que podem ajudar na reduo do nmero de cesarianas. De acordo com 14 estudos cientficos, nacionais e internacionais, realizados em mais de 5 mil mulheres, as gestantes que contaram com a presena de acompanhantes se sentiram mais seguras e confiantes durante o parto. Nessas circunstncias, registrou-se tambm a reduo da necessidade de medicaes para alvio da dor, da durao do trabalho de parto e do nmero de cesreas. Alguns estudos ainda sugerem a possibilidade dessa presena trazer outros efeitos a mdio prazo, como a diminuio dos casos de depresso ps-parto.

    Durante o parto, o medo leva tenso, que leva dor, que leva a mais medo. A presena de uma pessoa de confiana da mulher transmite mais segurana durante o trabalho de parto, garante Daphne Rattner, tcnica especializada da rea tcnica da Sade da Mulher, do Ministrio da Sade.

    Caminhadas pelo corredor A brasiliense Juliana Cristina atesta a experincia de ter tido um filho em ambiente com a presena de um acompanhante. Evelin nasceu no dia 21 de dezembro de 2005, no Hospital Materno-Infantil de Braslia, de parto normal. Juliana chegou maternidade no dia 20, para uma consulta, mas, como o lquido amnitico (que envolve o beb) havia diminudo de volume, foi logo internada. A av fez companhia para Juliana, auxiliando-a a caminhar pelo corredor, para diminuir as dores que aumentavam a cada contrao. Dona Joslia Maria da Conceio, de 60 anos, chorou quando viu a bisneta nascer. Foi uma grande emoo, lembra.

    O melhor foi que a presena da minha av me fez sentir muito mais confiante e segura, recorda Juliana. Ela segurou minha mo o tempo todo, enquanto eu fazia fora para minha filha nascer, conta a moa, que j pensa em outra gravidez: Gostaria que da prxima vez meu marido me acompanhasse. Acho que ele adoraria ver o nascimento do filho.

    Profissionais de sade j constataram a relao entre a participao dos companheiros na assistncia ao parto e a reduo nos casos de violncia familiar. Segundo esses especialistas, ao acompanhar o processo o homem comea a admirar e valorizar mais a companheira. Para especialistas, h um momento no ps-parto em que se estabelece o vnculo emocional entre me e filho e, se o pai participa, isso fortalece esse lao na famlia e desenvolve-se uma relao de respeito entre seus membros. Daphne Rattner, especialista do Ministrio da Sade, explica que

  • nos partos cirrgicos, em que raramente permitido que o companheiro participe, perde-se a chance de viver essa experincia.

    Com os avanos da tecnologia, da medicina e dos diagnsticos nas ltimas dcadas, houve muitas mudanas na forma de atendimento aos partos. Medicamentos passaram a ser administrados mais freqentemente e os protocolos ficaram cada vez mais rgidos quanto permanncia de pessoas que no so do corpo clnico durante o parto. Nessa situao, a mulher se sente sozinha, no meio de pessoas estranhas com as quais no tem qualquer intimidade. E em muitos hospitais as rotinas impem aos bebs uma srie de procedimentos antes que sejam levados, finalmente, me.

    Centros de parto normal O Ministrio da Sade incentivou a partir de 2001 a abertura de 14 Centros de Parto Normal. O ambiente nesses locais procura proporcionar bem-estar s pacientes, com paredes coloridas e msicas relaxantes. Os quartos tm espao suficiente para que a mulher se movimente vontade, buscando posies que aliviem a dor e banheiros para que possa tomar banhos quentes e relaxantes o que atenua a espera.

    Os lanches podem ser servidos junto com as enfermeiras, obstetras e outros funcionrios. Assim, as parturientes vo aos poucos ganhando intimidade com as pessoas que lhes ajudaro na hora do nascimento. Nesse momento, as mulheres podem optar por ter o parto na posio que lhes for mais confortvel at mesmo dentro dgua. O mais importante que elas sempre tm por perto algum de sua confiana, seja o companheiro, um familiar ou amigo.

    Existem 14 Centros de Parto Normal. Sete funcionam fora de hospitais: em Itaiaba (CE), Braslia (DF), Juiz de Fora (MG), Rio de Janeiro (RJ), duas unidades em Natal (RN) e So Paulo (SP). Outros sete desenvolvem suas atividades dentro de unidades hospitalares em Pindoretama e Fortaleza (CE), Ceres (GO), Belo Horizonte (MG), dois em So Paulo capital e um em Itapecerica da Serra (SP).

    Cesarianas demais

    Nos ltimos cinco anos, a taxa mdia de cesarianas nos hospitais que atendem pelos servios pblicos e privados ficou em torno de 40%, apesar de a recomendao da Organizao Mundial da Sade (OMS) ser de 15% O percentual corresponde proporo mdia de casos em que o parto normal traria riscos para a mulher ou para o beb, fazendo da cesariana uma interveno necessria.

    Os partos por cesariana podem influenciar a taxa de mortalidade entre mes e bebs. A cesrea uma cirurgia, com todos os riscos de uma interveno desse tipo e representa uma chance seis vezes maior de a mulher morrer do que com o parto normal. A cesariana tambm aumenta a possibilidade de a parturiente contrair uma infeco ou sofrer uma hemorragia. Para os bebs, o risco de eles terem que ir para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) quadruplica. No caso dos nascidos de parto normal, esse ndice de 3% e pula para 12% entre os nascidos por cesariana.

    Segundo mdicos, o trabalho de parto exerce papel fundamental para o desenvolvimento dos pulmes das crianas. As contraes liberam substncias que ajudam na maturao do pulmo do beb e estimulam os movimentos de suco, o que melhora qualidade da amamentao. Como, na maioria das vezes, a data das cesarianas fixada levando em considerao apenas a convenincia do mdico e da me, independentemente do incio do trabalho de parto, muitas crianas nascem sem estar totalmente prontas, sem os pulmes plenamente capacitados.

    Qualificao O Ministrio da Sade est atento para o problema e atua em duas frentes. A primeira a qualificao de profissionais para incentivar o parto normal. A Sade promove cursos nas maternidades vinculadas ao SUS, para conscientizar esses profissionais para a necessidade de mudar prticas e humanizar partos. A Agncia Nacional de Sade (ANS), que regulamenta as operadoras de sade, realiza encontros peridicos com mdicos e gestores privados para

  • informar sobre a necessidade de se diminuir o nmero de cesarianas. Em 2004, houve encontros dos tcnicos do Ministrio da Sade com diretores, chefes de obstetrcia, de neonatologia e de enfermagem dos principais hospitais de referncia de todos os estados, que atendem ao SUS.

    Em 2005, o ministrio promoveu (com o apoio das secretarias estaduais e municipais, organizaes profissionais e organismos internacionais) os seminrios de Qualificao na Ateno Obstetrcia e Neonatal Humanizados, com Base em Evidncias Cientficas. Reuniram-se maternidades de referncia de Alagoas, Bahia, Distrito Federal, Paraba, Par, Paran, Santa Catarina e Roraima. Os encontros se estendero aos estados restantes neste ano. Ao todo, cerca 130 maternidades j tiveram seus funcionrios qualificados. A previso capacitar profissionais de outras 300 instituies.

    A meta do Ministrio da Sade ao fim de 2006 ter 420 equipes, para qualificar maternidades responsveis por cerca de 70% dos nascimentos em hospitais pblicos no Brasil, prev o coordenador do Pacto pela Reduo da Mortalidade Materna e Neonatal do Ministrio da Sade, Adson Frana. Para ele, esses encontros serviro para mudar as prticas tradicionais de atendimento gestante e ao beb.

    O parto normal tambm estimulado em cursos para enfermeiras obstetras. Cerca de 1.500 profissionais j receberam qualificao. O ministrio tambm tem investido na qualificao de doulas (mulheres que no so necessariamente parentes ou profissionais de sade mas que trabalham como acompanhantes durante o parto). Foram treinadas 350 em 13 cursos.

    O ministrio tambm desenvolve, desde 2000, o programa Trabalhando com Parteiras Tradicionais. A iniciativa pretende melhorar a ateno ao parto domiciliar e busca sensibilizar os gestores do SUS e profissionais de sade para que reconheam as parteiras como parceiras e desenvolvam aes para apoiar e qualificar o trabalho. At outubro deste ano, o programa capacitou 904 parteiras tradicionais e 549 profissionais de sade.

    Outra frente de atuao o incentivo reduo das cesarianas. O Ministrio da Sade instituiu, em 2000, o Programa de Humanizao no Pr-natal e Nascimento (PHPN), para assegurar acesso e qualidade do acompanhamento pr-natal, da assistncia ao parto, ps-parto e neonatal.

    O programa repassa incentivos financeiros a municpios e maternidades que ofeream, em sua rede de servios, ateno ao pr-natal, ao parto e a possveis complicaes obsttricas. O incentivo financeiro aumenta a cada ano. Em 2004, foram repassados R$ 24,8 milhes, o que representou um reajuste de 42% em relao ao ano de 2003. Ao todo, 4.951 cidades j aderiram ao programa, o que corresponde a 89% do total de municpios do pas.

    O Ministrio da Sade tambm trabalha na formulao do Pacto pela Reduo da Cesrea Desnecessria, com previso de lanamento at o final do primeiro semestre deste ano.