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1 IGUAL #00 DESTAQUES Casa da Música DIGITÓPIA A Digitópia é um projecto do Serviço Educativo da Casa da Música com um alcance artístico, cultural e social. O objectivo é explorar a composição musical com recurso a meios digitais. Partilha e descoberta são conceitos chave num espaço aberto a todos. A Digitópia – Plataforma para o Desenvolvimento de comunidades de Criação Musical em Computador é um dos ramos do vasto programa do Serviço Educativo (SE) da Casa da Música. Nasceu em Julho de 2007 (depois de um breve período em formato ex- perimental) através de uma parceria entre a Casa da Música, o INESC-Porto, a ESMAE, a Universidade Católica Portuguesa e a Porto Digital. Presentemente tem sete monitores que prestam regime tutorado das 16h00 às 19h00. A partir das 10h00 o regime é livre. Situada debaixo das escadas de acesso às salas prin- cipais, e de frente para as bilheteiras da Casa da Música, a Digitópia suscita frequentemente a curiosidade dos visitantes. Há quem pense que o espaço, onde vários computadores estão alinhados em duas filas, é um simples local de acesso à internet. O aspecto cuidado e a boa qualidade dos materiais na Digitópia também costumam criar dúvidas quanto ao preço do serviço. É totalmente gratuito – sempre e para todos. Para todos é mesmo o lema oficioso da Digitópia. O projecto, caso ímpar a nível mundial, ignora quaisquer limitações formais e está aberto a todos os públicos, independentemente da idade, conhecimentos musicais ou objectivos de cada um. Sob o lema “o público faz a sua música”, este sim o oficial, a Digitópia está aberta ao público todos os dias. O visitante é convidado a criar a sua própria música, recorrendo para isso ao software e hardware disponíveis. Depois, pode levar para a casa a música composta. E volta sempre que quiser. A afluência da Digitópia é imprevisível e difícil de calcular, mas é sabido que é um sucesso, nomeadamente graças aos “digi reports”, pequenos resumos do dia escritos e partilhados pelos orientadores. Aqui, a utilização livre promove a criação e a partilha em ambiente descontraído. E a partilha é mesmo um dado fundamental na Dig- itópia, estando até presente no seu nome completo na palavra “comunidades”. A Digitópia coloca à disposição dos visitantes vários softwares de criação musical. Dois deles foram desenvolvidos por Rui Penha, curador da Digitópia e licenciado em composição: o Políssonos e o Narrativas Sonoras. O Políssonos, que nasceu em Setembro de 2007, é provavelmente o mais interessante dos dois. Consiste num sequenciador midi baseado em loops e num interface gráfico geométrico que explora os conceitos de espaço, som e imagem. O Live (Ableton), Reason (Propellerhead Software) e Garage Band (Apple) são exemplos de software comercial na Digitópia. Em termos de hardware estão disponíveis teclados midi e drum pads. A Digitópia promoveu em Dezembro o concurso Miniaturas em que o vencedor levou para casa um drum pad da Korg e dez bilhetes à escolha para a Programação da Casa da Música em 2009 depois de ter composto uma pequena música de 90 segundos. Por aqui se vê como a Digitópia reflecte bem a crescente preponderância do computador, e meios digitais no seu conjunto, no panorama artístico. Das relações entre visitantes, entre estes e os moderadores e entre os próprios moderadores nasce outro conceito fundamental do espaço a interactividade. Descomplexada, experimental, ampla. Todos os dias são diferentes José Alberto Gomes é um dos monitores da Dig- itópia. Chegou ao Serviço Educativo através de “uma indicação” e graças ao protocolo com a ESMAE, onde também lecciona. Licenciado em composição e formado no Conservatório do Porto, José Alberto Gomes destaca “as mais valias fantásticas” da Digitópia, dando grande relevo ao seu ambiente informal e descontraído onde ninguém se prende a “currículos, programas ou avaliações” e em que o

IGUAL #00: Digitópia - II

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Reportagem da IGUAL. Paginação para AJ/imprensa.

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DIGITÓPIA

A Digitópia é um projecto do Serviço Educativo da Casa da Música com um alcance artístico, cultural e social. O objectivo é explorar a composição musical com recurso a meios digitais.Partilha e descoberta são conceitos chave num espaço aberto a todos.

A Digitópia – Plataforma para o Desenvolvimentode comunidades de Criação Musical em Computadoré um dos ramos do vasto programa do Serviço Educativo (SE) da Casa da Música. Nasceu em Julhode 2007 (depois de um breve período em formato ex-perimental) através de uma parceria entre a Casa daMúsica, o INESC-Porto, a ESMAE, a UniversidadeCatólica Portuguesa e a Porto Digital. Presentementetem sete monitores que prestam regime tutorado das16h00 às 19h00. A partir das 10h00 o regime é livre.Situada debaixo das escadas de acesso às salas prin-cipais, e de frente para as bilheteiras da Casa daMúsica, a Digitópia suscita frequentemente a curiosidade dos visitantes. Há quem pense que o espaço, onde vários computadores estão alinhadosem duas filas, é um simples local de acesso à internet. O aspecto cuidado e a boa qualidade dosmateriais na Digitópia também costumam criar dúvidas quanto ao preço do serviço. É totalmentegratuito – sempre e para todos.

Para todos é mesmo o lema oficioso da Digitópia. Oprojecto, caso ímpar a nível mundial, ignora quaisquer limitações formais e está aberto a todos ospúblicos, independentemente da idade, conhecimentos musicais ou objectivos de cada um.Sob o lema “o público faz a sua música”, este sim o

oficial, a Digitópia está aberta ao público todos osdias. O visitante é convidado a criar a sua própriamúsica, recorrendo para isso ao software e hardwaredisponíveis. Depois, pode levar para a casa a músicacomposta. E volta sempre que quiser. A afluência daDigitópia é imprevisível e difícil de calcular, mas ésabido que é um sucesso, nomeadamente graças aos“digi reports”, pequenos resumos do dia escritos epartilhados pelos orientadores. Aqui, a utilizaçãolivre promove a criação e a partilha em ambiente descontraído.

E a partilha é mesmo um dado fundamental na Dig-itópia, estando até presente no seu nome completona palavra “comunidades”. A Digitópia coloca à disposição dos visitantes vários softwares de criaçãomusical. Dois deles foram desenvolvidos por RuiPenha, curador da Digitópia e licenciado em composição: o Políssonos e o Narrativas Sonoras. OPolíssonos, que nasceu em Setembro de 2007, éprovavelmente o mais interessante dos dois. Consistenum sequenciador midi baseado em loops e num interface gráfico geométrico que explora os conceitos de espaço, som e imagem.

O Live (Ableton), Reason (Propellerhead Software)e Garage Band (Apple) são exemplos de software

comercial na Digitópia. Em termos de hardwareestão disponíveis teclados midi e drum pads.

A Digitópia promoveu em Dezembro o concursoMiniaturas em que o vencedor levou para casa umdrum pad da Korg e dez bilhetes à escolha para aProgramação da Casa da Música em 2009 depois deter composto uma pequena música de 90 segundos.Por aqui se vê como a Digitópia reflecte bem a crescente preponderância do computador, e meiosdigitais no seu conjunto, no panorama artístico. Dasrelações entre visitantes, entre estes e os moderadores e entre os próprios moderadores nasceoutro conceito fundamental do espaço – a interactividade. Descomplexada, experimental,ampla.

Todos os dias são diferentesJosé Alberto Gomes é um dos monitores da Dig-itópia. Chegou ao Serviço Educativo através de “umaindicação” e graças ao protocolo com a ESMAE,onde também lecciona. Licenciado em composiçãoe formado no Conservatório do Porto, José AlbertoGomes destaca “as mais valias fantásticas” da Digitópia, dando grande relevo ao seu ambiente informal e descontraído onde ninguém se prende a“currículos, programas ou avaliações” e em que o

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janeiro 2009

contacto com a música e sua criação-execução “é totalmente despreocupado”. A harmonia entre o factor humano e material é,na opinião de José Alberto Gomes, a chavedo sucesso.

No entender do monitor não é possível traçaruma demografia dos frequentadores da Digitópia, apesar de admitir que o projectoestá mais “direccionado para jovens” por sero público “que mais adere e que mais se fideliza”. Quanto a tendências de composição no laboratório de experiênciasque é a Digitópia, José Alberto Gomes dizque existe uma tendência ligada “às coisasactuais, às modas musicais, ao hip-hop e àmúsica de dança”, mas ressalva que essa percepção pode ser enganadora porquealgum do software comercial na Digitópia éclaramente vocacionado para esse padrão decomposição. Ainda assim, estes softwaressão essenciais porque “o público geral nãoestá habituado a lidar com o software “free-ware” por serem menos imediatos.

José Alberto Gomes descreve a sua activi-dade de monitor da Digitópia e do SE daCasa da Música em geral como “algo es-quizofrénica” pela variedade de públicos,música e estilos. “Não há dias iguais”, re-sume. Por entre dias diferentes entre sisurgem muitas vezes histórias caricatas.Como aquela espécie de concerto impro-visado entre skaters e um artista plástico.José Alberto Gomes desenvolve outros pro-jectos musicais a nível pessoal, extra-Dig-itópia, mas será que o ambiente informal e opúblico muitas vezes leigo o incomodam, aele que tem formação musical? “Não, quantomuito é um desafio. Ou seja, ter que memoldar esteticamente ao que não estou habituado”.

Serviço Educativo – o que é?

O SE nasceu em 2005 aquando da inauguração da própria Casa da Música,mas só mais tarde viria a adoptar onome e conceitos actuais. O lema “todospodem ser ouvintes, intérpretes e criadores” corporiza a vontade do SEestar aberto à cidade, abertura que é aforça e razão da existência do SE.

Os objectivos passam por dotar oscidadãos de faculdades musicais, ensi-nando sem sobranceira. O serviço pre-tende, de resto, ser o mais inclusivopossível e para isso desenvolve activi-dades para todos os públicos. Para bebése cidadãos séniores, para pessoas com esem conhecimentos musicais, para participantes isolados ou em grupo, paraactividades de uma hora ou de um mêsinteiro. A programação do SE incluiworkshops, acções de formação, concertos, períodos temáticos ou concertos comentados e estende-se aquase todos os cantos da Casa daMúsica: Sala Suggia, Sala 2, Salas deEnsaio 1 a 3, Sala Laranja, Sala Roxa efoyers.

Espaços privilegiados para criar relações com a Música.

JOSÉ ALBERTO GOMES, orientador

a Digitópia reflecte bem a crescente preponderância do computador, e meios digitais no seu conjunto,no panorama artístico