Imagem Corporal, Estado Nutricional e Indicações de Transtornso Alimentares Em Bailarinos

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    RBAFS

    Revista Brasileira de Atividade Fsica & Sade

    SOCIEDADE BRASILEIRA DE ATIVIDADE FSICA E SADE

    Brazilian Journal of Physical Activity and Health

    RBAFS

    Revista Brasileira de Atividade Fsica & Sade

    SOCIEDADE BRASILEIRA DE ATIVIDADE FSICA E SADE

    Brazilian Journal of Physical Activity and Health

    RBAFS

    Revista Brasileira de Atividade Fsica & Sade

    SOCIEDADE BRASILEIRA DE ATIVIDADE FSICA E SADE

    Brazilian Journal of Physical Activity and Health

    Rev Bras Ativ Fis Sade p. 771-781DOI:http://dx.doi.org/10.12820/rbafs.v.18n6p771

    1 Universidade do Estado de Santa Catarina UDESC. Centro de Cincias da Sade e do Esporte CEFID. Departamento de Educao Fsica. Florianpolis SC, Brasil.

    Imagem corporal, estado nutricional e sintomas de transtornos alimentares em bailarinos Body image, nutritional status and symptoms of eating disorders in dancersNycolle Martins Reis1 Zenite Machado1Andreia Pelegrini1 Leonessa Boing1Fernanda Christina de Souza Guidarini Monte1Joseani Paulini Neves Simas1Adriana Coutinho de Azevedo Guimares1

    ResumoObjetivou-se analisar a percepo de imagem corporal, estado nutricional e sintomas de transtor-nos alimentares de bailarinos. Por convenincia, participaram 156 bailarinos do 31 Festival de Dana de Joinville, fazendo-se uso de um questionrio autoaplicvel (variveis sociodemogrfi-cas, antropomtricas, percepo da imagem corporal e sintomas de transtornos da alimentao). Utilizou-se estatstica descritiva e inferencial: testes U-Mann Whitney e teste t de Student, regresso logstica multinomial, anlises bruta e ajustada. A maioria das mulheres possua ensino superior (65%), estava sem companheiro (60%), pertencia ao nvel econmico alto (83%) e reali-zavam bal clssico (74%), enquanto entre os homens o destaque foi para danas urbanas (48%). A prevalncia de insatisfao com a imagem corporal foi de 72%, em que os homens encontra-vam-se mais insatisfeitos pela magreza, enquanto as mulheres estavam insatisfeitas pelo excesso de peso; 21% e 75% dos bailarinos apresentaram sintomas de anorexia e bulimia nervosas, respec-tivamente. Os bailarinos da modalidade dana contempornea apresentaram maiores sintomas de anorexia nervosa. Associao negativa foi observada entre insatisfao pela magreza, sexo e sintomas da bulimia nervosa. Os bailarinos com sintomas de bulimia nervosa apresentaram 1,94 vezes mais chance de estarem insatisfeitos pela magreza. As mulheres e os bailarinos com sinto-mas de anorexia nervosa apresentaram, respectivamente 3,8 e 5,7 vezes mais chances de estarem insatisfeitas pelo excesso de peso quando comparadas aos homens e bailarinos sem sintomas de anorexia nervosa. Concluiu-se que as variveis estudadas possuam relao entre si e a percepo da imagem corporal pode estar associada presena de sintomas de transtornos alimentares.Palavras-chaveImagem corporal; Estado nutricional; Dana.

    AbstractThe aim of the study was to analyze the perception of body image, nutritional status and symptoms of eating disorders in dancers. For convenience, attended 156 dancers from 31st Joinville Dance Festi-val, making use of a self-administered questionnaire (sociodemographic, anthropometric, body image perception and symptoms of eating disorders). We used descriptive and inferential statistics: Mann - Whitney U test and t test, multinomial logistic regression, crude and adjusted analyzes test. Most women had higher education (65 %), were single (60 %), belonged to high socioeconomic status (83 %) and performed classical ballet (74 %) while among men the highlight was urban dance (48 %). The prevalence of body image dissatisfaction was 72%, in which men were also more dissatisfied with thin-ness, while women were dissatisfied by weight excess, 21% and 75% of the dancers showed symptoms of anorexia and bulimia, respectively. The contemporary dancers showed higher presence of nervous anorexia symptoms. It was found a negative association between dissatisfaction with thinness, sex and symptoms of bulimia nervosa. The dancers with symptoms of bulimia nervosa were 1.94 times more likely to be dissatisfied with thinness. Women and dancers with symptoms of nervous anorexia were respectively 3.8 and 5.7 times more likely to be dissatisfied by excess weight when compared to men without symptoms and dancers from nervous anorexia. The variables were related between them and the perception of body image may be associated with the presence of symptoms of eating disorders.KeywordsBody image; Nutritional status; Dancing.

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    INTRODUO

    O culto ao corpo sempre esteve presente na sociedade, e apesar de modificar-se com o passar dos anos encontra-se associado ao perfil ideal de beleza e ascenso social1-3. Percebe-se que o padro de beleza imposto pela mdia e sociedade no s influencia a populao de maneira geral, mas tambm atletas de alto rendimento, sendo que em algumas modalidades, tais como a ginstica e a dana acabam se destacando pela busca de um padro de magreza constante2,4,5,6.

    A exigncia da manuteno de um padro esttico entre os bailarinos maior do que entre a populao em geral, e a partir do momento em que estes se tornam profissionais, a necessidade de manter o peso aumenta6. A conservao de uma excelente qualidade fsica torna-se necessidade bsica quando esses se veem na busca incansvel para equilibrar preparo fsico, fora, leveza e expresses dramti-cas, necessrios a um espetculo6,7.

    A presso para atingir esse perfil ideal parece distorcer a imagem corporal e remeter a vcios alimentares como a restrio diettica progressiva, eliminao de carboidratos, episdios de compulso alimentar, prtica exagerada de exerccios, consumo tanto de medicamentos quanto de drogas lcitas e ilcitas, e o vmito auto induzido8-10.

    Elementos individuais como baixa autoestima, depresso, traos obsessivos e perfeccionistas, parecem ser alguns dos fatores que influenciam a insatisfao com a imagem corporal3,8. Atrelados a esse contexto, formas no saudveis de regular a massa corporal, como dietas abusivas e restries alimentares, so incentivadas diariamente pela mdia, a qual preconiza um culto magreza que nem sempre possvel de se alcanar3,5,9,12. Esse modelo tambm est presente na dana, na qual inmeras exigncias fsicas para manter-se em palco, acabam impulsionando bailarinos ao desejo do corpo magro, podendo gerar transtornos alimentares, tais como anorexia e bulimia6,7,10.

    Foram encontrados estudos relacionando algumas das variveis abordadas (per-cepo da imagem corporal, estado nutricional e transtornos da alimentao) com populaes especficas como universitrias5,10,12,13, adolescentes14, escolares15,16 e atle-tas2,17. Na mesma temtica foram encontrados poucos estudos com bailarinos6,10,18,19.

    Neste sentido, so necessrios estudos voltados para a modalidade de dana para alertar os bailarinos e coregrafos quanto influncia que a imagem corporal, o estado nutricional e os transtornos da alimentao podem ter no desempenho do bailarino. Com base nisto, o presente estudo objetivou analisar a relao en-tre percepo de imagem corporal, estado nutricional e sintomas de transtornos alimentares de bailarinos das modalidades bal clssico, dana contempornea e danas urbanas da categoria avanado do 31 Festival de Dana de Joinville SC.

    MTODOS

    Trata-se de um estudo de corte transversal com uma amostra por convenincia composta de 157 bailarinos de ambos os sexos das modalidades Bal Clssico (n=48), Dana Contempornea (n=23) e Danas Urbanas (n=86), inscritos na ca-tegoria avanada (nascidos no ano de 1996, com idade superior a 16 anos), do subgnero conjunto, do Festival de Dana de Joinville, realizado na cidade de Join-ville/SC. O Festival de Dana de Joinville/SC considerado o maior festival de dana do mundo, segundo o Guiness Book20, evento que recebe bailarinos de todo o Brasil e de diversos pases da Amrica Latina.

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    Como critrios de incluso foram considerados elegveis os bailarinos que se propuseram a participar voluntariamente do estudo e assinaram o termo de consentimento livre esclarecido. O projeto foi aprovado pelo Comit de tica em Pesquisa em Seres Humanos (CEPSH) da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) sob parecer n. 200.140. Aps a divulgao dos grupos sele-cionados pela organizao do Festival, os pesquisadores entraram em contato por meio de e-mails, contatos telefnicos, sites de relacionamentos (facebook/twitter), para saber do interesse em participar da pesquisa, afim de fazer um levantamento do nmero de bailarinos por grupo e estratgia de coleta de dados. Dessa forma, foi encaminhado por e-mail aos pais e/ou responsveis de bailarinos menores de 18 anos, o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE), que foi entregue devidamente assinado, no dia da coleta de dados.

    A coleta de dados foi realizada durante o ms de julho de 2013, aps a apro-vao do CEPSH/UDESC e da organizao do 31 Festival de Dana de Join-ville SC. Os participantes foram esclarecidos sobre o correto preenchimento do questionrio e elucidados sobre o objetivo do mesmo. O questionrio foi aplicado antes das apresentaes da mostra competitiva das respectivas modalidades de dana e respondido de forma presencial com o auxlio dos pesquisadores, sendo respondidos individualmente, com garantia de sigilo das respostas e da identidade dos bailarinos.

    Apesar do regulamento do Festival indicar que os participantes tenham 16 anos ou mais, foram encontrados bailarinos com idade inferior (n=11), de modo que foram retirados da amostra. Excluiu-se tambm um bailarino com 57 anos, por diferir-se demasiadamente da idade dos demais participantes do estudo.

    Para a coleta de dados foi utilizado um questionrio autoaplicvel construdo por meio de instrumentos validados, dividido em trs blocos:

    Primeiro bloco: informaes gerais coletadas de forma objetiva no question-rio idade (em anos completos), sexo (feminino/masculino), escolaridade (ensino fundamental/ensino mdio/ensino superior), estado conjugal (com ou sem com-panheiro), ocupao funcional (estudante/autnomo/funcionrio pblico/ empre-sa privada), presena de doena (sim/no), nvel econmico e variveis antropom-tricas (massa corporal e estatura).

    A massa corporal e a estatura foram coletadas por meio de medidas autorrefe-ridas pelos bailarinos. Por tratar-se de adultos em sua maioria, a correspondncia entre medidas referidas e aferidas satisfatria, de modo que o uso deste mtodo tem sido considerado uma alternativa vivel em situaes em que no possvel a obteno direta dessas informaes21, ou quando preciso tornar o estudo mais r-pido e acessvel quanto aos custos22. A partir das medidas de massa corporal e es-tatura, calculou-se o ndice de massa corporal (IMC). O nvel econmico foi ava-liado por meio do instrumento denominado Critrio de Classificao Econmica Brasil (CCEB), proposto pela Associao Brasileira de Empresas de Pesquisa23, que classifica os indivduos em estratos (A1, A2, B1, B2, C1, C2, D, E) a partir da soma dos pontos de cada questo. Para fins estatsticos, as variveis foram agrupa-das em: nvel econmico baixo (C1+C2+D+E); mdio (B1+B2) e alto (A1+ A2).

    Segundo bloco: percepo da imagem corporal - avaliada por meio da esca-la de nove silhuetas corporais proposta por Stunkard, Sorenson e Schlusinger24, a qual representa um continuum desde a magreza (silhueta 1) at a obesidade severa (silhueta 9). O conjunto de silhuetas foi apresentado aos indivduos, e as seguintes perguntas foram realizadas: Qual a silhueta que melhor representa a sua aparncia fsica atualmente (real)? Qual a silhueta que voc gostaria de ter

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    (ideal)? Para avaliar a satisfao corporal, foi calculada a diferena entre a silhueta real e a silhueta ideal. Quando a variao entre a silhueta real e ideal foi igual a zero, os bailarinos foram classificados como satisfeitos, quando essa variao foi positiva, foram considerados insatisfeitos pelo excesso de peso, e quando negativa, insatisfeitos pela magreza.

    Terceiro bloco: sintomas de transtornos alimentares - para a avaliao dos sin-tomas de transtornos alimentares foram utilizados dois instrumentos. O Teste de Atitudes Alimentares (EAT-26)1 foi utilizado para avaliar os sintomas de anorexia nervosa. O questionrio composto por 26 questes, agrupadas em diferentes aspectos de comportamento alimentar (escala de dieta, escala de bulimia, preo-cupaes com os alimentos e escala de controle oral). As questes do EAT-26 apresentam seis opes de resposta em escala Likert (nunca, quase nunca, poucas vezes, s vezes, muitas vezes e sempre) que pontuam de zero a trs. Desta forma, as respostas nunca, quase nunca e poucas vezes somam zero ponto, e as respostas s vezes, muitas vezes e sempre pontuam 1, 2 e 3 pontos, respectivamente. Na questo 25, a pontuao conferida de forma inversa s demais, somando-se zero ponto para as alternativas s vezes, muitas vezes e sempre, e 1, 2 e 3 pontos para as alternativas poucas vezes, quase nunca e nunca, respectivamente. A pontuao final do questionrio pode variar de 0 a 78 pontos e o ponto de corte estabelecido pelos autores da escala original 2125, sendo que indivduos que somarem 21 pon-tos ou mais apresentam comportamento alimentar de risco ao desenvolvimento de transtornos alimentares. Assim, o resultado do EAT-26 foi classificado em duas categorias: Presena de sintomas (EAT-26 21) e ausncia de sintomas (EAT-26 < 21)14.

    O segundo instrumento utilizado foi o Bulimic Inventory Test Edinburgh (BITE)26, o qual tem sido utilizado para detectar e avaliar a bulimia nervosa. O questionrio composto por 33 questes e duas escalas14. A primeira escala sin-tomtica possibilita uma classificao do grau dos sintomas bulmicos presentes, com no mximo trinta pontos: compulso e grande probabilidade de diagnstico de bulimia (pontuao 20 pontos), grupo subclnico (15 a 19 pontos), padro alimentar incomum (10 a 14 pontos) e ausncia de comportamentos tpicos da bulimia (0 a 9 pontos). A segunda escala, de gravidade, fornece um ndice base-ado na frequncia dos comportamentos compulsivos e purgativos. Os resultados podem ser sem significncia (total 4 pontos), clinicamente significante (5 a 9 pontos) ou indcios de alta gravidade ( 10 pontos)14. Para fins estatsticos os par-ticipantes foram classificados na varivel BITE sintomas com presena (compul-so e grande probabilidade de diagnstico de bulimia + grupo subclnico + padro alimentar incomum) e ausncia (ausncia de comportamentos tpicos da bulimia) de bulimia; e na varivel BITE gravidade, com presena (clinicamente significante + indcios de gravidade) e ausncia (sem significncia) de bulimia.

    A anlise estatstica foi realizada por meio do pacote estatstico Statistical Pa-ckage for Social Sciences (SPSS) verso 20.0. Fez-se uso da estatstica descriti-va, mediante o clculo de mdia, desvio padro e distribuio de frequncias. A normalidade dos dados foi verificada por meio do teste de Komogorov Smirnov. Para a comparao das caractersticas da amostra com as modalidades de dana utilizou-se os testes U-Mann Whitney (distribuio no normal) e teste t de Student para amostras independentes (distribuio normal). Como a varivel de-pendente (percepo da imagem corporal) consiste de trs categorias, a regresso logstica multinomial foi usada para estimar as associaes entre a percepo da imagem corporal e as variveis independentes (sexo, modalidade, EAT, BITE-

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    gravidade e BITE-sintomas). Para a varivel dependente, a categoria satisfeitos foi escolhida como o grupo de referncia. Foram realizadas anlises bruta e ajus-tada para todas as variveis independentes, onde o nvel de significncia estatstica adotado foi de 95%.

    RESULTADOS

    A tabela 1 apresenta as caractersticas gerais dos bailarinos das modalidades bal clssico, dana contempornea e danas urbanas da categoria conjunto avanado do Festival (n=157). A mdia de idade foi de 21,73,8 e 20,34,3 anos, respectiva-mente, para mulheres e homens. Referentes s mdias das variveis massa corpo-ral, estatura e IMC, foram encontrados resultados superiores para os homens em relao s mulheres (p

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    comportamentos compulsivos e purgativos, bem como na escala sintomtica, que apresenta o grau dos sintomas bulmicos presentes, verificou-se, respectivamente, 39,5% e 35,7% de presena do desfecho (dados no apresentados).

    Na figura 1 apresentada a distribuio dos bailarinos em relao percepo da imagem corporal e sintomas de anorexia e bulimia nervosas de acordo com o sexo. Foi possvel observar que enquanto os homens apresentam maior insatisfao pela magreza (41,5%), as mulheres esto mais insatisfeitas pelo excesso de peso (70,5%). Quanto aos sintomas de anorexia e bulimia nervosa, as mulheres apresentaram maior percentual de sintomas quando comparadas aos homens (p

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    Figura 2 Percepo da imagem corporal, sintomas de anorexia e bulimia (gravidade e sintomas) de bailarinos profissionais de acordo com as modalidades de dana. * significativo p-valor

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    DISCUSSO

    De acordo com a literatura pesquisada, ainda so escassos os estudos que abranjam as modalidades de dana (bal clssico, dana contempornea e danas urbanas) e percepo da imagem corporal, estado nutricional e sintomas de transtornos alimentares (bulimia e anorexia nervosa).

    A maior parte dos bailarinos que compuseram este estudo foram mulheres com ensino superior, sem companheiro e pertencentes ao estrato econmico alto. Uma hiptese para tais resultados est relacionada com a mdia de idade dos partici-pantes, pertencentes a faixa etria dos 20-21 anos, idade que geralmente encon-trada em estudos conduzidos com universitrios3,5,11,13,18 que por encontrarem-se em fase acadmica e estabelecendo-se socialmente, incluem-se na categoria sem companheiro.

    Neste estudo, a maioria dos homens praticava danas urbanas enquanto a maioria das mulheres encontrava-se na modalidade bal clssico. Tal direciona-mento na escolha da modalidade praticada pode estar associado aos esteretipos inseridos na sociedade, no qual o homem dever ser musculoso, forte e viril, de modo que outros tipos de perfis no so bem aceitos27.

    Os participantes apresentaram comportamentos de risco para transtornos de alimentao, o que leva a crer que a percepo do corpo pode ter uma maior influ-ncia quando comparada ao peso para a prevalncia de transtornos de alimenta-o18. No que diz respeito dana, Kuwae e Silva28 relatam que a exigncia por um corpo mais magro maior em bailarinos clssicos, pois durante a prtica precisam demonstrar leveza de corpo e gestos; sendo que esta cobrana demasiada nem sempre se faz presente nas demais modalidades, como a dana contempornea, no qual os movimentos so mais livres e adquirem a forma do bailarino que os representa.

    Sobre a prevalncia de insatisfao com a imagem corporal, foram encontrados valores superiores para insatisfao pelo excesso de peso em relao insatisfao pela magreza. Estes resultados corroboram com outros estudos realizados com bailarinos, nos quais a distoro da imagem tende sempre pela busca de um corpo mais magro6,18. Os resultados do presente estudo indicam que os homens apresen-tavam-se mais insatisfeitos pela magreza, fato que se deve provavelmente ao desejo pela hipertrofia muscular, enquanto as mulheres apresentavam-se mais insatisfei-tas pelo excesso de peso. Tais resultados podem ser associados a uma preocupa-o com a esttica, culturalmente imposta pela sociedade e pela mdia9. Os dados descritos sobre a insatisfao corporal corroboram com os encontrados no estudo de Silva, Saenger e Pereira3 que, ao analisarem estudantes de Educao Fsica, ob-servaram que os homens tinham 2,7 vezes mais chance de estar insatisfeitos pela magreza em comparao aos seus pares. Ainda, em relao PIC, os bailarinos da modalidade bal clssico encontravam-se insatisfeitos pelo excesso de peso. Pode-se associar o resultado ao tipo de treinamento encontrado na modalidade, no qual a sustentao, o equilbrio e a leveza so pr-requisitos para o uso das sapatilhas de ponta. Para tanto, exigido do bailarino um corpo magro a fim de evitar leses nos tornozelos, quadril e joelho4. O padro esttico de bailarinas clssicas costuma exigir ndices menores de estatura e massa corporal, reforando a existncia de uma constante busca pelo corpo leve e com baixo percentual de gordura6.

    Alm destes, os bailarinos que apresentavam sintomas de transtornos alimen-tares como anorexia e bulimia nervosa, tambm se encontravam insatisfeitos pelo excesso de peso. Esta associao entre as variveis pode ser relacionada superva-

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    lorizao do corpo, podendo levar a comportamentos alimentares no saudveis e prticas inadequadas de controle da massa corporal. Isso nos leva a acreditar, assim como outros achados5,12,18,29, que a insatisfao pode ser um preditor de transtornos alimentares. Uma vez que bailarinos, mesmo entre aqueles eutrficos, possuindo corpos visualmente magros, encontram-se insatisfeitos corporalmente, e o desejo de perder ainda mais massa corporal pode estimular a comportamentos de risco para transtornos da alimentao18. Os mesmos autores encontraram evidncias de que o risco para o desenvolvimento de transtornos era duas vezes maior para os que se encontravam insatisfeitos e desejavam uma silhueta menor, quando com-parados aos satisfeitos pela imagem corporal. Os mesmos autores ainda ressaltam que a profisso de bailarino tambm pode ser um fator influenciador no desenvol-vimento dos transtornos, sendo difcil a recuperao, pois para grande parte dos bailarinos, o desejo de manter-se no trabalho prevalece sobre sua sade.

    Tambm foi verificado neste estudo que apesar de ambos os sexos apresenta-rem sintomas de anorexia e bulimia (sintomas e gravidade), o resultado foi mais evidente para as mulheres, corroborando com o estudo de Reinking e Alexander30, os quais evidenciaram que a incidncia era maior em atletas e mulheres jovens, principalmente nas modalidades no qual o baixo peso era primordial para o de-sempenho. Importante ressaltar que desde a poca do romantismo, a imagem da slfide norteia o padro esttico de bailarinas clssicas, que buscam constantemen-te um corpo longilneo e magro, acreditando assim realizar com mais graa e le-veza movimentos que exigem agilidade, flexibilidade e fora muscular6. Contudo, os resultados do presente estudo divergem dos encontrados por Ribeiro e Veiga22, no qual no houve diferena entre os sexos nas mdias de pontos para anorexia e bulimia nervosa.

    Neste estudo, os bailarinos da modalidade contempornea apresentaram valo-res superiores para sintomas de anorexia nervosa quando comparados s demais modalidades do estudo. No foram encontrados na literatura estudos que compa-rassem a varivel sintomas de anorexia e a relao entre a modalidade de dana contempornea com outras modalidades. Ainda no presente estudo, mulheres e os indivduos com sintomas de anorexia nervosa, apresentaram maiores chances de estarem insatisfeitos pelo excesso de peso. No estudo de Vieira et al2, observou-se que as mulheres tinham tendncia a ser mais vulnerveis insatisfao pelo excesso de peso, pela tendncia ocidental contempornea que mantm um padro de magreza e boa forma fsica direcionado especialmente a elas. O mesmo estudo encontrou distoro da imagem corporal em todas as avaliadas com presena de transtornos alimentares.

    O presente estudo apresentou algumas limitaes. Dos 261 questionrios en-tregues, alguns foram devolvidos sem resposta (n=78) e incompletos (n=14). Tal fato pode ser explicado por alguns questionrios terem sido entregues no aloja-mento dos bailarinos, o que contribuiu para a distrao dos mesmos e pelo fato de muitos no aderirem pesquisa por no entenderem a importncia ou por no es-tarem de acordo com a temtica. Alguns coregrafos no permitiram a realizao da pesquisa com seus bailarinos, alegando que esta atrapalharia a concentrao dos mesmos, ou ainda por exigir um certo tempo para a aplicao dos questionrios.

    Pode-se concluir que a percepo da imagem corporal esteve associada pre-sena de sintomas de transtornos alimentares. Sendo assim, o coregrafo deve estar atento s mudanas bruscas de peso e comportamento, orientando e esclarecendo as dvidas referentes alimentao e, ainda, evitando excluses de seus bailarinos de apresentaes/espetculos e coreografias considerando apenas seu peso4,6.

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    Adicionalmente, sugere-se a realizao de novos estudos que abordem a dana, de modo a relacionar as temticas abordadas no estudo com demais modalidades e valncias fsicas e de comportamento, que podem ser influenciadoras do desem-penho de seus praticantes.

    FinanciamentosO presente estudo no contou com fontes de financiamento para a sua realizao.

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    Endereo para CorrespondnciaRua: Tereza Lopes, n 734, Campeche.

    Florianpolis, Santa Catarina, Brasil. CEP: 88066-065.

    Telefone: (48) 9677-2813/3338-9016. E-mail: [email protected]

    Recebido 11/11/2013Revisado 06/01/2014 08/01/2014 12/01/2014Aprovado 12/01/2014

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