17

Click here to load reader

Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

Imagem, matériaplástica

Uma leitura crítica de umfilme de Alain Resnais, Ocanto do estireno (Le chantdu styrène), feito sobencomenda em 1957

TextoMarie José MondzainFilósofa, diretora de pesquisas do Centre

National de la Recherche Scientifique de

Paris (CNRS)

Quanto à questão da relação que aencenação do real mantém com aficção e a política, reajo àheterogeneidade dos quatro termos– encenação, real, ficção e política –cuja combinação pressuporia jáestarmos de acordo no que se refereàs suas respectivas definições.Canonicamente, a filosofia nãopoupa esforços quando se trata detrabalhar pressupostos. No entanto,mesmo como filósofa, vou tentarestabelecer um pacto, entre nós,com relação a esses termos e àarticulação entre eles, dando umsalto metodológico radical. Vou partirde uma obra que operamassivamente no campo dessesquatro termos e que nos permitiria(ao menos espero que sim) dar umsentido a esse entrecruzamentoheterogêneo e indefinido, e isso pormeio da plasticidade mais banal:aquela da matéria plástica, opoliestireno. Quando a filosofiaassume essa postura é porque otema escolhido pode serconsiderado, sem a menorhesitação, uma obra-prima. Naverdade, parece-me que só se poderesponder às questões apresentadaspela conjunção desses quatro

normas de publicação parceiros edições

expediente editorial carta aos leitores seções

Page 2: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

termos se as enfrentamos tendo porbase o mundo da arte. Que seja,então, uma obra-prima. O que éuma obra-prima? É justamente umgesto ou um objeto que, direcionadoa qualquer um, sem distinção nasfiguras da ficção, põe em cena umarealidade viva, emocional,carregando-a de energia política. Eugostaria de destacar apenas queentendo, aqui, por política o mesmoque os gregos entendiam aoempregar esta palavra, ou seja,como uma partilha crítica, ouconflituosa, de todos os signos pormeio dos quais se conseguia manterunidos, e prazerosamente, aqueleshabilitados a fazer o uso da palavra.

Escolhi o filme de Alain Resnaisintitulado O canto do estireno porqueele reúne gestos imagéticos, gestossonoros e gestos discursivos paracontar a história viva de um objetosem vida. Essa coisa inerte,inanimada, informe, torna-se diantede nossos olhos um sujeito vivo,dotado de uma biografia, portador dememória intemporal e remetido auma infinidade de figuras futuras. Éfeita à nossa imagem, é talvez anossa imagem. Feito sobencomenda, este filme é uma ficçãoque constrói a vida política de umaquestão. Eis a minha questão: umavez que produzimos coisas, signos eimagens de coisas, a quais imagensdessas coisas devemos o prazer detomar forma humana, ou seja, nostransformar em sujeitos da palavra eda liberdade? A história da matériaplástica é aqui transformada nodiscurso das promessasemancipatórias da nossaplasticidade.

Alain Resnais faz em 1957 este filmeexemplar, documentáriomaravilhoso, no qual oentrelaçamento complexo deimagem, texto, voz e som atingeuma perfeição extrema. Filmeencomendado, financiado pelasusinas Pechiney, seu objetivo oficialé educativo, e publicitário. Entre asencomendas, está a de tornarconhecida uma nova área daindústria, a produção de plásticos apartir de hidrocarbonetos, que agoralevam o nome de poliestireno. Nadahavia de particularmente poético,nem no que se refere ao contexto,ou aos objetos, ou ao conteúdo. Noentanto, ao confiar a tarefa a AlainResnais, os patrocinadores contamcom o talento do cineasta para darao documentário um valor estético,apesar do grande número derestrições. Filmes encomendadossão sempre muito estimulantes paraos artistas, que são desafiados porum real sem plasticidade, quandooperam com a criação do possível. A

Page 3: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

indústria gosta de garantir o seulugar na cultura e o apelo a artistaslhe parece ser o meio mais segurode atingir uma dimensão simbólica,capaz de enobrecer o patrocíniofinanceiro e legitimar o mecenato.Engenheiros e aqueles que sãoresponsáveis pela comunicação como público em geral consideramprincipalmente a cultura e a arte umornamento lisonjeiro para a indústria.O que fizeram Resnais e Queneauconsistia em reconhecer e celebrar oproduto industrial como tal, a matériaplástica como o material cultural porexcelência, como paradigma de todaa plasticidade de vida. O podermetafórico do poliestireno étotalmente investido no processo deprodução em si. Em parceria comQueneau, Resnais não estavaapenas produzindo um objetoestético que permitiria ao espectador“aprender enquanto se diverte.”Juntos, eles entraram naplasticidade do material paraexplorar todos os desdobramentos etodas as modalidades no campo daprópria criação. Este filme captatodas as oposições, todas ascontradições confluentes, sejam ounão dialéticas, para jogar ainfinidade de entrelaçamentos emetamorfoses que derivam daquiloque no começo parecia serindependente. O filme trata daoposição convencional entre aprodução industrial e a criaçãoartística, entre a criação visual e alinguagem de invenção, imagem etexto, o silêncio e a voz, visível einvisível, e ainda mais geral, aocontrário do conteúdo, odocumentário e a ficção, a ciência ea crença na magia, a alquimia e aquímica. E todas essas duplasconflitantes são tratadas aqui comoduas faces inseparáveis eindefinidas, duas figuras emconstante movimento de um realinassimilável, em metamorfosecontínua.

Toda matéria é plástica: é o que ofilme revela, na indeterminação detodos os seus estados, e por meiodas formas mais sensíveis e maisdeterminadas, exibidas no formatode um filme de 14 minutos. O filmese passa numa área onde a matériaestá à espera de formas produzidasa partir de moldes, que por sua vezdão formas às nossas expectativas,sem nunca preenchê-las por umconteúdo particular ou fixo, de umavez por todas.

Compensar odescompasso

No lançamento do filme, em 1958,Jean-Luc Godard escreveu nos

Page 4: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

Cahiers du Cinema (nº 92):

Jamais acreditei, depoisde Eisenstein, que umfilme pudesse serpensado assimcientificamente. Acanção do estirenoexpõe 14 meses detrabalho em um filme de14 minutos… Um textode Queneau introduz odescompasso famoso,caro a Renoir, de planosrivais profundamenteencravados uns nosoutros – apesar daausência depersonagens vivos e,portanto, privando-se derelações dramáticas –,de uma centena deplanos tãoharmoniosamentesoldados queproporcionam asensação fantástica deserem apenas um longoplano-sequência, e umúnico travellingjupiteriano, cujo fraseadoé uma reminiscência dascantatas de JohannSebastian Bach.

É desse “descompasso famoso, caroa Renoir”, como afirma Godard, queprecisamos falar, porque se trata depensar sobre um desajusteconstitutivo da imagem, em relaçãoao texto e ao som.

No tocante à relação que tece e sedesvenda entre texto e imagem, aplasticidade torna talvezindiscerníveis as diferençaspropriamente específicas eintrínsecas de suas operaçõesrespectivas, e sempre distintas. É defato a história de objeto plástico quesustenta a poética da narrativa quese escuta. Entre o que a voz donarrador informa e o que a câmeradeixa ver se tece a complexidade deum jogo, que o som e a ironiapoética não cessam de embaralhar,de modo elegante e alegre.

Roland Barthes publica, em 1957,mesmo ano em que o filme foilançado, Mitologias, livro no qual elededica um capítulo ao plástico.Barthes parece inscrever suameditação na contracorrente do filmede Resnais, denunciando apseudopoesia de uma palavra que,ao designar uma realidade trivial,termina por substituir a vida. Noentanto, o texto mantém uma tênueambiguidade entre a crítica inquietae a homenagem à magia damodernidade. Entre o plástico e a

Page 5: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

plasticidade parece estar a diferençaindiscernível entre documentário eficção. Cito Barthes: “Apesar donome de pastor grego – poliestireno,fenoplast, polivinil, polietileno –, oplástico é essencialmente umasubstância alquímica. Na entrada doestande, o público faz uma longa filapara ver acontecer uma operaçãomágica por excelência: atransformação da matéria… De umlado, a matéria bruta, telúrica, e dooutro, o objeto perfeito; entre essesdois extremos, nada, nada mais queum trajeto, a duras penassupervisionado por um funcionáriocom um chapéu, meio deus, meiorobô”. É desse nada entre as duasextremidades que se encarrega ofilme de Resnais. Aquilo com o qualBarthes não se preocupa porquepersegue algo muito além: “Mais queuma substância, o plástico é a ideiade sua transformação infinita; ele é,como a palavra sugere, a ubiquidadetornada visível, o plástico é, emsuma, um espetáculo a decifrar”. Amatéria plástica, depois datrivialidade mais extrema, depois dabanalidade da imitação sem valor,faz assim uma entrada triunfal nocampo da filosofia: “Pela primeiravez, o artifício visa ao comum, e nãoao que é raro. E, no mesmo gesto, afunção ancestral da natureza éalterada: ela não é mais a ideia, asubstância pura a ser encontrada oua imitar; uma matéria artificial, maisfecunda do que todos os depósitosdo mundo, vai substituí-la, vaicomandar a invenção mesma dasformas.” Barthes diz claramente quea plasticidade industrial é umarevolução metafísica, antropológicae política que desloca o pensamentoda criação em si mesma paracompartilhar o que há de maiscomum para a comunidade.

Essa é a razão pela qual este filmeme parece exemplar, por capturaralgo de essencial e não substancialsobre as relações entre imagem etexto, a partir do traçado daplasticidade. Aqui se joga nasubjetivação da matéria aplasticidade subjetiva de cada um denós, sem distinção.

A plasticidade do material é elevadaao seu nível mais alto, uma vez queo filme faz a demonstração dupla deque a plasticidade do material emnada se iguala ao gesto criador,embora a técnica industrial seja amais sofisticada, mas, ao contrário,qualquer movimento técnico pode setornar um gesto artístico e darorigem a uma emergência doficcional. Essa proposição ressoaimediatamente como duchampiana,uma vez que objetos plásticos,produzidos em série, entram aqui no

Page 6: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

campo da arte, como no processode fundação do readymade. MarcelDuchamp fez do readymade o objetode uma decisão soberana por partedo artista, fazendo um apelo àcriatividade do espectador; aqui, oobjeto industrial é capturado nasubjetivação de uma narrativabiográfica, é ele o artista, o lugar dogesto que interroga criticamente anossa plasticidade criativa. Oprocesso de fabricação, matriz emetáfora da criação, faz uma ofertade liberdade para o espectador,porque poliestireno é um objetodotado de vida, marcado por toda avida com o selo do determinismo eda liberdade. Não se trata apenas deexpor a história de um material, mastambém de fazer surgir de suabiografia a plasticidade imaginária,ou fantasiada, de todo discurso. Amatéria plástica é vertida paradentro do molde que dá forma serialao semelhante, de modo que oespectador reencontra a matriz damultiplicação do mesmo e do outro.Essa matéria informe e enformadapode ser muito bem uma metáforapara nossas semelhanças e nossasdiferenças com os outros. Sequalquer semelhança é apenas onível mais baixo, digamos o grauzero, da diferença, num artigomoldado em série parece viver umobjeto; o filme se dirige aoespectador como lugar próprio dopensamento plástico, a uma só vezcompatível com todos os outros eainda assim singular. A questão é atensão irredutível que mantém, emtodo processo de subjetivação, umpolimorfismo potencial. A questão daplasticidade estava no centro dereflexão de Duchamp sobre osemelhante e o inframince, e isso apartir das impressões e dos moldesde duas figuras da identidade:aquela do seu rosto With my tonguein my cheek (1959), mas tambémantes, Dart object (1951), e Feuillede vignefemelle (1950). Jean Claircomenta justamente que Duchampnão podia ignorar o trabalho deRémy de Gourmont, publicado em1903, intitulado Physique de l’amour.Para Gourmont, os órgãos sexuaismasculino e feminino são como“engrenagens que devem morderuns aos outros com precisão”, e elecita a propósito o texto de Galeno:“Todas as partes do homem sãoencontradas na mulher; não hádiferença, a não ser no ponto de queas partes da mulher são internas, e ados homens, externas, a partir daregião do períneo. Imaginemaquelas que se oferecem primeiro àvossa imaginação, não importamquais, redobrem para fora as partesdas mulheres, e dobrem para dentroas partes dos homens, e você vaiencontrar em tudo semelhanças.”

Page 7: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

Estamos no coração do inframince,que assinala a região inassimilável,e portanto bem real, que separa omolde da coisa moldada sobre omodelo da diferença e dasimilaridade entre os sexos ou dasimpressões que levamos da morte eda vida. Podemos ouvir aqui aressonância erótica da biografia dopoliestireno.

O filme

Mas mesmo antes que as imagensde Resnais venham a dançar diantedos nossos olhos em companhia dotexto de Queneau, são quatro versosalexandrinos de Victor Hugo queabrem o filme, dando-lhe umasolenidade metafísica e poética coma qual Queneau pretende jogar, comum tanto de ironia e outro derespeito. Quatro versos de VictorHugo extraídos de Voix intérieuresaparecem na tela sobre um fundopreto, sem imagens, lidos por PierreDux:

L’homme se fait servir par l’aveuglematièreIl pense, il cherche , il crée. À sonsouffle vivantLes germes dispersés dans la natureentièreTremblent comme frissonne uneforêt au vent

[O homem se faz servir de matériacegaEle pensa, ele busca, ele cria. Aoseu sopro vitalOs germes dispersados por toda anaturezaTremem como se agita uma florestaao vento]

O sopro de Hugo entra no mundoindustrial da usina, anunciando oenlace da produção em série e dacriação. Não é isso precisamente oque o cinema reivindica ser, “umaarte e também uma indústria”, comoMalraux declarou em seu Esquissepour une psychologie du cinéma?Ele falava do poder do cinema paraa compreensão do sopro imemorialdas origens do mundo e dahumanidade.

O canto da sereia

O canto de estireno, tal é o título quedá o tom. Nós jogamos com aspalavras e a proximidadehomofônica do canto da sereiaimediatamente estabelece umaanalogia sorridente e mítica. Aimagem de Ulysses no Canto XII daOdisseia tem alimentado inúmerasespeculações em torno daseparação entre arte e tecnologia,diversão e trabalho. Lembramo-nos

Page 8: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

da análise dessa canção feita porAdorno e Horkheimer em DieDialektik derAufklärung (“A dialéticado esclarecimento”). Eles articularama leitura do Canto XII da Odisseia àdialética hegeliana do senhor e doescravo. A energia disjuntiva operajá no título e aqui estamosembarcados num navio antigo, ondeas pessoas que remame trabalhamsão privadas do prazer de ouvirassim como aquele que desfruta nãopode fazê-lo sem obstáculo. Seriadifícil reconhecer diante desta cenaa existência de qualquer liberdadeentre aqueles que são surdos eaquele que está acorrentado. Assereias (e as sirenes) não seduzemmais e, no mundo industrial, elespontuam as horas de trabalho, ouservem de alarme. Para ouvir ocanto do estireno é preciso entãovaler-se da estridência dos alarmese tornar o trabalho poético. Apenas ogesto de arte dará às sirenes (e àssereias) a potência de uma vozjubilosa e de valor críticoemancipatória. Essa potênciaemancipatória, nova promessa dassereias (e das sirenes) na artemoderna, não é uma oferta deprazer não compartilhada, ou nãocompartilhável, como no naviohomérico. É, ao contrário, uma arteque, ao dirigir-se aos olhos e aosouvidos de todos, sem distinção,agirá sobre os espectadores com umencanto lúdico, um rigor didático euma liberdade tão prazerosa, que oassunto, aqui um filme, comunicará,sem os meandros do ativismo, umaenergia subjetivante e cumprirá suafunção política. De fato, se a sereia(e a sirene) é uma oferta sedutora emortal, então é melhor não sucumbira ela, mas se a arte de fazer cantar oestireno é também suscetível de nosdar a palavra e a liberdade, então aarte nos permite ouvir o canto dopossível e nos desencanta da ordemda necessidade. É como MauriceBlanchot em Le livre à venir (“O livropor vir”): “Ouvir o canto da sereia éque Ulysses tentava, tornar-seHomero”. Mas aqui o estireno vaicantar. No lugar de Homero, Resnaise Queneau nos farão ouvir a músicado poliestireno e vão nos levar auma zona de prazer não industrial,onde poderemos desfrutar dasliberdades polimórficas daplasticidade. Este é um filmeastucioso, tanto quanto Ulisses emmil viagens. Esse Ulisses damodernidade pode ouvir sementraves o canto do estireno desdeque o gesto da arte desaperte ascorrentes de dialetização.

O cineasta, o poeta, o compositor eo ator são todos libertos para umexercício polifônico e dissonante,emque a relação da imagem com o

Page 9: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

texto, do texto com a voz, da vozcom a imagem é o alvo de um lanceininterrupto de exclusões e inclusõesmútuas. O texto parece jogado sobrea imagem, mas a imagem não separece com texto, e o som brincacom a voz para fazer ouvir o que avoz não diz. A dissonância musicalindica ao ouvido que aquilo que nósvamos ouvir e ver é, provavelmente,uma relação de deslocamento e nãode ilustração. Essa discordância éaudível de modo genérico, uma vezque a música de Peter Barbauddesenvolve aqui o que ele chamoude música algorítmica, nascida tantodo cálculo matemático quanto dainfluência do free jazz e, portanto, deuma combinação instável de cálculoe improvisação.

O canto do estireno encena umregime polifônico que conjuga olhos,ouvidos e voz no desajuste e nadiscordância das operaçõessensíveis como para explorar asincertezas daquilo que, de bomgrado, eu denomino uma zona. Essazona é um lugar de indeterminação,onde a palavra e a imagem, o sabere a crença, a seriedade e a ironiajogam uma partida sem outra regraque aquela do desajuste contínuo. Amecânica das engrenagens quepermite encapsular o material paradar-lhe forma, a transformação delíquido em sólido, do granulado emfilamento, do filamento em plano, doplano em volume, é como truques demágica em que a voz do poemapretende esclarecer cientificamente,uma vez que ela flutua ao lado dasimagens. Nenhuma dessas relaçõesse revela em situação dialética, mascada registro expressivo éconstantemente deslocado parapreservar uma indeterminaçãoconstituinte.

O poema e imagem

O poema de Raymond Queneau, lidopor Pierre Dux, oscila entreinformação e música. Osalexandrinos dão uma amplitudeirônica e uma seriedadepseudoclássica a um discurso duplo,aquele do físico-químico e aquele dopoeta olímpico, que não hesita emfazer do alexandrino um exercíciolúdico burlesco.

Resnais faz, então, este comentário:“Senti vagamente que havia umarelação entre o alexandrino e ocinemascope”. O cinemascopeconsiste, nos anos 50, a dispor deuma segunda objetiva à frente dalente de projeção a fim de obter umaampliação anamórfica do campo.Uma tomada simples se tornapanorâmica. O alexandrino é então

Page 10: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

percebido por Resnais como umaextensão panorâmica do campovisual e auditivo, a mutação doquadro em paisagem dopensamento. A voz dispõe, então, deum espaço visual e sonoro dilatado,que oferece um horizonte vasto paraa evocação multimilenar da aventurahumana no coração de plasticidade.O cinemascope é para o cinema oque foi Victor Hugo para a poesia.

A lição das coisas é como umarecitação aprendida na escola edotada de uma virtudemnemotécnica. A simplicidade e ageneralidade orgânica doalexandrino difere aqui, portanto, daeloquência emocional e muitasvezes lírica de Painlevé em seusdocumentários didáticos, embora elepermaneça, apesar de tudo, umverdadeiro modelo para aqueles quedão aulas de cinema. Driblando osperigos da ilustração, Resnaispassa, imperceptivelmente, dodocumentário à ficção.

O rigor científico fornece suamatéria-prima para a plasticidadepoética, que lhe confere, de volta, oseu humor. Queneau não hesita emarrastar aqui e ali na pesada fábricado trabalho humano a ligeirezapreguiçosa de versos fáceis. A vozde Peter Dux tem a clareza e aneutralidade de quem dá uma lição.O conjunto abstém-se de qualquerinexatidão e descreve o processoexato, mas inverso, do tempo queremonta da tigela de plástico aominério pré-histórico, às origens damatéria numa espécie de anamneseque parte da forma finita e retornaao informe primordial. A plasticidadeassume seu duplo estatuto deprodutor genealógico e criador de ummundo fantástico. Em ordemcronológica inversa, a voz nos leva àmatéria-prima, a esta prôtè hylé(substância primordial) que nos fazentender que iremos do conhecidopara o desconhecido, para a noitede toda a origem. O filme terminacom o mistério do nascimento domundo, e Queneau prefere nosdizer, de forma intempestiva, que aquestão serve, talvez, para um outrofilme. Num espaço inteiramenteconsagrado à produtividade é aescolha de um movimento regressivoque remonta dos efeitos à causaprimeira, anterior à próprialinguagem. Mas, de tudo isso, háimagens e designações porque aplasticidade é trabalhada comoconceito e como dado sensível.

De tuyau en tuyau ainsi nousremontonsÀ travers le désert des canalisations,Vers les produits premiers vers lamatière abstraite

Page 11: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

Qui circulait sans fin, effective etsecrète…

[De duto em duto assim nósremontamosAtravés do deserto dascanalizações,Para os primeiros produtos à matériaabstrataQue circulou sem fim, eficaz esecreta ...]

A tigela serve de ponto de partida, éo pretexto de um jogo de linguagemconstitutivo do tempo do filme: Ôtemps suspends ton bol! (Ó temposuspende a tua taça!). Essa paródiade Lamartine invoca uma suspensãoe todo o filme encarna anecessidade de suspensão:suspensão do trabalho de sonharpoeticamente sobre os lugares dotrabalho, suspensão da cronologiapara operar uma regressão histórica.Que seja uma tigela, arbitrariamenteescolhida entre todas as formaspossíveis, escrevamos sua história.Esse suspense sobre uma forma fixase inscreve no coração da infinitudeserial dos objetos domésticos. Asfábricas Pechiney trabalham, sem osaber, entre dois infinitos, aindeterminação informe das origense aquela inominável das formaspossíveis. Na cadeia de produçãoem série do mundo industrial, existeainda uma zona de indeterminaçãoque preserva a liberdade e o prazerdo trabalhador? Penso aqui no“filósofo plebeu” do qual JacquesRancière publicou escritos, LouisGabriel Gauny. Carpinteiro deprofissão, Gauny, descreve, emjunho de 1848, em Le Tocsin destravailleurs, a seguinte cena: oparqueteur banhado de sol eleva desúbito seus olhos: “Se a janela seabre para um jardim em que dominao horizonte pitoresco, num momentoele suspende seus braços e planacom sua mente na direção de umaperspectiva espaçosa para desfrutarmelhor da vista do que osproprietários de casas vizinhas. Comum golpe circular de olhos, elecontempla tudo, os monumentos eas prisões, a cidade dos tumultos edas muralhas [...]” E mais adiante:“Ele imagina, combina e cria,vasculha todos os cantos possíveis[...] Seu olhar tem a acuidadedaquele de uma ave de rapina, sempouso.” A capacidade de qualquerhomem, seja o mais humildes dostrabalhadores, de olhar por cima deseu trabalho e contemplar a janelado mundo, na qual ele poderia serum poeta, tal é o lugar queimaginariamente se dão Queneau eResnais, deixando atravessar seutrabalho conjunto com um sopro deliberdade. Será que isso significa

Page 12: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

que este filme revela a zona onde aindústria produz a própria cultura, nacondição de entreter com o materialuma relação metafórica e, portanto,simbólica?

O gesto da arte é então uma fábricada forma, que transborda a açãoindustrial, mantendo-se fiel a essesdois infinitos que são o informe dasorigens e a infinitude daspossibilidades por vir. Texto, voz eimagem estão a serviço dessa duplaindeterminação praticando odesajuste mútuo ininterrupto nocoração da indústria de moldes, darepetição e da série. Mas esseexercício de disjunção não seconcentra apenas na relação entrepalavra e imagem, ele opera nocoração da imagem e do coração dapalavra, pois é no tecido mesmo dofracasso do visível, pois é nafalência do visível que as palavrasvêm posicionar sua energia única, eé nas falhas do discurso que asimagens estabelecem o seu poderde sedução. A voz explica, mas nãodescreve; a imagem mostra, masnão explica. É que há muito maiscoisas no visível do que a palavrapode dizer, e esta palavra podeenunciar muito mais coisas do que oque nossos olhos podem ver.Estamos na presença desse duplotransbordar: imagem excede apalavra e esta, por sua vez, excedea imagem.

O olhar do espectador passeia eesbarra no emaranhado ininteligívelde redes multicoloridas quetrabalham em conjunto para a razãoe a desrazão. A fábrica seassemelha por um momento àquiloque foi o sonho arquitetônico dosconstrutores do Centro Beaubourg,em Paris, um lugar destinado àcultura e à arte, mas que seusprimeiros visitantes qualificavam de“refinaria”. Talvez isso signifique queeles sabiam onde situar o lugar doverdadeiro “refinamento”! Osarquitetos Richard Rogers, RenzoPiano e Gianfranco Franchinidesejavam, diziam eles, oferecer aomundo das artes visuais e dacomunidade cultural um “diagramaespacial evolutivo”. É verdade quenós lá encontramos um exemploefetivo da combinação dopensamento industrial com o mundoda criação. Mas sua fórmula parecetão abstrata e difícil para desenhar oque é uma zona, bem menossedutora e bem menos eficaz do queo filme.

O inframince eplasticidade

Nada de dialética entre palavras e

Page 13: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

imagens, mas exatamente aquiloque os padres da Igreja chamavamde “união sem confusão” e MarcelDuchamp perseguia sob o nome deinframince (o infinitesimal). Essa éuma questão da plasticidade que,entre o molde e a coisa, como entrelugares da mais perfeita similitude eidentidade, estabelece umadiferença, uma divisão irredutível,um absoluto intransponível. Comofazer ver plasticidadede todas aspossibilidades nas determinaçõesconstrangedoras de um dispositivoindustrial? Eu digo projeto dedispositivo, pois nós tocamos aquinaquilo que Foucault designa sob onome de dispositivo, associandoestreitamente as produçõesmateriais às condições dopensamento. Filmar um espaço deprodução industrial, na sua presençamecânica e sem alma, torna-se aquium verdadeiro jogo de aparências emetamorfoses mágicas entre o que édito e o que é mostrado. A matériaplástica é, portanto, a matéria dossonhos, em todo o caso, ela aparecediante de nós porque é também amatéria do filme. Resnais põe emcena a tigela, transformando-a numquadro. Ele compõe um desenhoanimado que evoca a metamorfosedas coisas, como se filmasse ummovimento natural das coisasacompanhado por um movimentofictício natural das palavras. Anatureza é plástica, o pensamento éplástico, a matéria plástica participada vida da natureza, do verbo e dopensamento.

Dizer que a relação entre imagem etexto não é dialética, mas puramenteplástica, requer um desvio. De qualplasticidade fala o filme, se ela nãodiz respeito à relação entre o visívele a palavra, entre a palavra e o som,o som e a imagem e tudo isso numexercício intrinsicamente habitadopela questão da união daquilo quese mantém em um nível irredutível?A plasticidade é um registrofundador da filosofia. CatherineMalabou, em seu trabalho sobre aplasticidade na obra de Hegel, dizque a plasticidade deixou, oumelhor, transbordou o campo da arteque produz formas para o campo deobjetos em sua relação constitutivacom o tempo. A plasticidadepertence ao mesmo tempo, diz ela, àdotação de forma e à destruição deforma num mesmo processotemporal. Ela assinalou, na línguafrancesa, a ambivalência doprocesso de produção e dedestruição, porque o verbo plastiquer(fazer explodir) não se refere mais àdotação de forma, mas sim à suadestruição e ao terrorismo.

Portanto, o filme de Resnais e

Page 14: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

Queneau não é hegeliano porqueentre texto, voz e imagem não hánegatividade no trabalho ou trabalhode negatividade, mas um enlacesimultâneo surgido da suspensão dotempo. Parece que devemosrenunciar à dialetização da imageme do verbo em favor do pensamentodo inframince. A similitude é tãosemelhante que Duchamp podedefinir o inframince, tomando oexemplo de objetos que saem domesmo molde nas produções emsérie (como se pode ler nas notas deMarcel Duchamp, publicadas porPaul Matisse).

J’ai choisi exprès le mot mince quiest un mot humain et affectif et nonune mesure précise de laboratoire.Le bruit ou la musique faits par umpantalon de velours côtelé commecelui ci quand on le fait bouger estlié au concept d’inframince. Le creuxdans le papier entre le recto et leverso d’une fine feuille… A étudier !…C’est une catégorie dont je mesuis beaucoup occupé pendant cesdix dernières années. Je pensequ’au travers de l’inframince, il estpossible d’aller de la seconde à latroisième dimension

[Eu escolhi expressamente a palavramince (fino) que é uma palavrahumana e afetiva e não uma medidaprecisa de laboratório. O ruído ou amúsica feitos por uma calça develudo cotelê, como aquele quandofazemos em movimento, estãorelacionados ao conceito deinframince. O intervalo do papelentre a frente e o verso de uma folhafina... A estudar!... Esta é umacategoria da qual eu tenho meocupado bastante durante a últimadécada. Penso que, através doinframince, é possível passar dasegunda para a terceira dimensão.]

A relação do texto com a imagem éesse indiscernível no qual se joga,apesar de toda a operação queconstitui o individual, na suasemelhança e na sua distinção. Aimagem é a zona do apelo, dainterlocução. Juntos, texto e imagemcompõem uma direção. Esta quesupõe a condição especulativa nãodialética: pode-se denominar aimagem de pura visibilidade, masdeve-se reservar o nome imagempara aquilo que, no visível, éhabitado pela energia invisível davoz. O silêncio do visível é a piortentação que oferece ao espectadoruma fruição abandonada pelopensamento do sujeito falante. Hámuitas espécies de silêncio. Apoesia é a espécie revolucionária dosilêncio, porque ela se exerce sobreo suspense que exige a novidade

Page 15: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

absoluta do possível.

O silêncio das sereias

A ameaça do silêncio é o tema deuma grande história dos contos deKafka, num texto intitulado “Osilêncio das sereias”. Kafka é onosso mestre maior da música, eleque leva nossos ouvidos a ouvir osilêncio da modernidade. As sereiasimaginaram de fato uma armadilhamais terrível do que as suas cançõespara capturar Ulisses: a armadilhado silêncio. Estranha leiturahomérica de Kafka, que transformaUlisses num prisioneiro falsamentesurdo, que é submetido ao silênciodas sereias, que nada quer escutar,ou que finge tudo ter ouvido. O queé admirável no texto de Kafka é quese trata do mesmo tema que usacera e correntes, como se a potênciado desejo e do prazer nãocessassem de percorrer de formacircular e reversível o mundo doshomens que trabalham e doshomens que têm prazer diante dastentações femininas, sem que jamaisdesejo e prazer se encontrem ousejam compartilhados. O Ulisseskafkiano joga com a lacunaimperceptível que separa o ouvir osilêncio da surdez e na diferençainframince (infinitesimal) que separao objeto do desejo e o objeto doprazer. Duas hipóteses sãoformuladas por Kafka: ou Ulissesacredita que as sereias cantam eque ele era o único surdo para assuas canções, ou fingia ouvi-lascantar para melhor resistir ao seusilêncio. Entre essas duas hipóteses,o intervalo é ainda inframince,assegurado apenas pelo jogo detruques e fintas. Duchamp sabemuito bem que a diferença dossexos se dissolve na imagem, semnunca ser apagada ou eliminada. Assereias desejam abolir essadiferença constituinte e salvadora?Na história de Kafka, as sereias sãomulheres que usam seus encantospara atrair olhares. “Elas nãodesejam mais seduzir, elas desejamapenas reter pelo tempo mais longopossível o reflexo dos grandes olhosde Ulisses”. Nada é maisaterrorizante do que a captura de umolhar fascinado, a ponto de anular opoder de deslocamento da palavra.Homero toma a palavra para dá-la aUlisses.

O canto do estireno também éhabitado pelas tentações mortais dosilêncio e é a palavra do poeta queinsufla à plasticidade das imagens aliberdade de seu desajuste. Aplasticidade é a única chance parapreservar o deslocamentoconstituinte da relação entre texto e

Page 16: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

imagem, na prática um inframince.

A verdade do documentário, semdúvida, não está em seu conteúdocientífico, mas, sobretudo, na duplaface do canto das sereias (sirenes):de um lado, é a música da magiaalquímica desse novo material quefaz sonhar; do outro é o apelo mortaldo trabalho alienante a serviço doinanimado. A modernidade plástica éuma canção ao mesmo temposedutora e fatal, à qual aqueles quetrabalham devem permanecersurdos? Então, somente os poetasda imagem e do som saberão nosfazer ouvir a melodia intempestivado possível.

As coisas têm uma história e essahistória é a nossa, objetos caem sobo poder das coisas e se deixammodelar no silêncio industrial dasformatações. O canto sedutor doestireno desincumbe os homens decumprir o seu destino, como podetambém dar-lhes a palavra eenfeitiçar sua liberdade. Há naracionalidade industrial uma cargade incognoscível, de estranheza,que a poesia e a imagem continuama fazer ouvir, em conjunto.

Trata-se também de não estar maissurdo ao canto industrial do cinema.A plasticidade da matéria imagéticaendereçada ao objeto das palavras éuma promessa de cinema. Comodisse um dia Godard: “S’il y aquelque vérité dans la bouche despoètes, je vivrai” (“Se houver algo deverdade na boca dos poetas, euviverei”).

PUBLICADO EM ENSAIOS

Page 17: Imagem, matéria plástica _ Revista Portfolio EAV

Imagem, matéria plástica | Revista Portfolio EAV

http://revistaportfolioeav.rj.gov.br/edicoes/02/?p=682[17/09/13 14:30:30]

REVISTA PORTFOLIO EAV

2013, volume 2, número 2, setembro [email protected]

Copyright 2013 - Revista Portfolio EAV