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Índice

EditorialA ética e as Revoluções Científicas ...................................... 3Por William Saad Hossne

DúvidasA CONEP responde ...................................................... 5

ArtigoPesquisas em ciências sociais: aspectosepistemológicos e bioéticos............................................ 8Por Fermin Roland Schramm

ArtigoDireitos humanos e pesquisa em humanos ....................... 16Por Nilo Henrique Neves dos Reis

Em diaOito anos de evolução: um balançodo sistema Cep-Conep ................................................ 20Por Corina Bontempo D. de Freitas, Mirian Lobo e William Saad Hossne

CONEP na internet:http://www.saude.gov.br/sisnep

TITULARES:Anacleto Luiz Gapski, Célia Regina M.Delgado Rodrigues, Gysélle SaddiTannous, Heloisa Helena G. Barboza,Iara Coelho Zito Guerriero, JoséAraujo Lima Filho, Lílian SoaresCosta, Maria da Conceição Pio,Mônica Fragoso, Nilza Maria Diniz,Pedro Luiz Rosalen, Sônia Maria deOliveira Barros e William SaadHossne.

Cadernos de Ética em Pesquisa– Nº 16 – Novembro de 2005 –Publicação da Comissão Nacionalde Ética em Pesquisa – ConselhoNacional de Saúde – CNS/MS

Conselho EditorialSueli Gandolfi DallariMarcos Fábio Gadelha RochaOdilon Victor Porto DenardinWilliam Saad HossneCorina Bontempo de FreitasAlejandra Rotania

Participação Abrasco – Associação Brasileira dePós Graduação em Saúde Coletiva. Coordenação Nacional de DST/Aids do Ministério da Saúde.

UNDCP – Programa das NaçõesUnidas Para o Controle Internacio-nal de Drogas.

OPAS/OMS – Organização Pan-Americana da Saúde/OrganizaçãoMundial da Saúde.

EdiçãoPaulo Henrique de SouzaConsultoria TécnicaCorina Bontempo de FreitasRedação e CopidesqueAlessandro SoaresAlessandro SilvaReinaldo Palmeira

IlustraçõesLui RodriguesDiagramaçãoDual Design GráficoFotolito e ImpressãoGráfica Relevo LtdaTiragem7.000 exemplares

SUPLENTESBruno Rodolfo Schlemper Junior,Christian de Paul Barchifontaine,Cleuza de Carvalho Miguel, Dalton Luizde Paula Ramos, Edvaldo DiasCarvalho, Eliane Eliza de SouzaAzevedo, Heloisa Baccaro Rossetti,Ieda Harumi Higarashi, Jose AntonioGuimarães Ferreira, José TavaresCarneiro Neto, Marcos FábioGadelha Rocha, Odilon Victor PortoDenardin e Vitangelo Plantamura.

INTEGRANTES DA COMISSÃO NACIONAL DE ÉTICA EM PESQUISAConforme Resolução n.0 246, do CNS, de 03/07/97

Comissão Nacional de Ética em Pesquisa/Conselho Nacionalde Saúde/Ministério da Saúde –Esplanada dos Ministérios – Bloco G – sala 421SCEP 70058-900 – Brasília - DFFone (61) 3315-2951 / Fax: (61) 3226-6453e-mail: [email protected]

Todos os artigos podem ser reproduzidos integralmente,desde que a fonte seja citada. Os textos publicados são deresponsabilidade de seus autores.

ExpedienteISSN 1677-4272

CNSSecretária-executiva: Eliane Aparecida Cruz

CONEPCoordenador: William Saad Hossne

Secretária-executiva: Corina Bontempo de Freitas

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Cadernosde Ética em 3Pesquisa

Editorial

Por William Saad Hossne

William Saad Hossneé professor, médico,

pesquisador, membrodo Conselho Nacional

de Saúde (CNS) ecoordenador da

Comissão Nacional deÉtica em Pesquisa

(Conep).

A ética e as Revoluções Científicas

ara muitos, Galileu (séc.XVI) representa marcoreferencial do nascimentoP

das ciências experimentais, berçodos demais ramos da ciência. Estaposição, Galileu a conquistou nãosó pelas suas descobertas e estudos,como sobretudo pela sua posturafrente aos fenômenos da natureza ,ao postular que “a verdade” dosfatos não era verdade apenas porqueos escolásticos o afirmavam, averdade deveria ser buscada naexperimentação e na observação.

Nasce a metodologia experimentalque deu suporte ao grande desen-volvimento científico que ocorreu nosdois séculos seguintes. Da Itália deGalileu, o eixo científico de deslocanos séculos seguintes para a Françae para a Inglaterra, com Newton.

Ao final desse período, a soma deconhecimentos representou o quealguns denominam de RevoluçãoCientífica. Nesse período e até asprimeiras décadas do século XX, asquestões éticas advindas e ourelacionadas aos novos conheci-mentos eram equacionadas e obede-ciam precipuamente à ética davirtude do próprio pesquisador.

De certa forma, o primeirodocumento específico, formal,voltado para a ética da pesquisa(pesquisa médica) ocorreu em 1947com o Código de Nuremberg. Apartir de então, assumiu-se que aética própria do pesquisador nãoseria, infelizmente, suficiente paraevitar abusos na experimentação.Acrescia o fato de que, à medida

que surgiam novos avanços cien-tíficos e tecnológicos, novas ques-tões éticas e de maior complexidadeeram suscitadas envolvendo ahumanidade como um todo e nãoapenas o pesquisador.

Por outro lado, o número decientistas (no sentido amplo dapalavra) vem duplicando a cada 10-15 anos, desde o Renascimento,segundo alguns autores. De certaforma, a menos que a curva decrescimento sofra inflexão, teremosdaqui a 10 anos o dobro do númerode cientistas hoje existentes echegaremos, talvez, a ter número decientistas vivos e atuantes maior doque o número de cientistas que omundo já teve e morreram.

E, os cientistas, a cada dia,contribuem com novos conhe-cimentos, acompanhados, emgeral, de novas questões éticas ede implicação profunda emtodos os segmentos da sociedadee não apenas no âmbito de umacorporação.

A primeira Revolução Científica,ocorrida a partir do séc. XVI levoucerca de 2 séculos para se configurarcomo tal. No entanto, o extraor-dinário desenvolvimento científico-tecnológico recente leva, a meu ver,a identificar, talvez, cinco “revo-luções” apenas no século XX.

Na 1ª metade do século tivemosa Revolução Atômica, que nos deu,de um lado, a medicina nuclear e deoutro, a bomba atômica.

As questões éticas suscitadaspela Revolução Atômica não

foram, talvez, conscientizadas, àépoca da revolução, pois o mundoestava em guerra. Mas, logo apóso final da guerra e até hoje, sediscutem questões éticas advindasda revolução atômica.

A partir da 2ª metade do séculoXX , com a descrição da duplahélice do DNA, iniciou-se novarevolução – agora a RevoluçãoMolecular, cujo apogeu, talvez,estejamos vivendo hoje, com aclonagem, a reprodução assistida,uso de células tronco, engenhariagenética genética; em todas essescampos afloram questões éticas.

Passados cerca de 20 anos do inícioda Revolução Molecular, com oadvento da nova Biologia, os riscos,de natureza ética, geraram, de certaforma, “angústia” em diversossetores científicos e sociais.

Como soe acontecer em fasesde crises angustiantes, buscou-serefúgio na criação de um neo-logismo-Bioética.

Com clarividência, seu criador(Von Potter, em 1.971) acres-centou a expressão Bioética, pontepara o futuro.

Bioética surge, pois, comomovimento e ou uma preocupação(pluralista, multi e transdisciplinar)contra o eventual mau uso daRevuloção Molecular.

Hoje, a Bioética é muito mais doque um neologismo, limitado apenasà conotação acima referida.

A Revolução Molecular levou,pois, à criação da Bioética. ARevolução Atômica não teve o▲▲

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mesmo tratamento.Nos últimos, digamos, 40 anos,

duas novas “revoluções” ocorreram:a Revolução de Comunicação, cujoemblema é a “Internet” e a Revo-lução Espacial, cujo emblema é apegada humana fora da terra.

As questões éticas advindas dessasduas Revoluções estão, a cada dia,se tornando mais concretas, envol-vendo toda a humanidade e todosos segmentos das sociedades.

Imitando, humildemente, VonPotter e procurando “aplacarangústias” ocorreu-me apelartambém para o neologismo, utili-zando as expressões “Internética” e“Sideroética”, respectivamente, nocaso da Revolução das Comuni-cações e da Revolução Espacial.

Nos últimos 20 anos do séculoXX, e início deste século, nova“Revolução” se configura, advindada Nanotecnologia, emblemati-camente refletida na nova indústriaem geral e na farmacêutica emparticular, com a imagem de umrobô, auto replicante, formado poruma única molécula.

As questões éticas decorrentes daNanotecnologia já estão presentes

na realidade e na ficção científica,com perspectivas alvissareiras ecom eventuais riscos hipotéticosespantosos.

Novamente, aqui também apelopara o neologismo – “Nanoética”.

Isto posto, caberia indagar: oseventuais riscos e as questões éticasdecorrentes do novo conhecimentodevem impedir ou obstacularizaras Revoluções Científicas? Obvia-mente que não.

O que se deve temer é a ignorânciae o obscurantismo e não o conhe-cimento, mesmo porque é destinoinexorável do ser humano buscar,continuamente, novos conheci-mentos. Afinal, o que distingue, decerta forma, o ser humano dosdemais animais é justamente suacapacidade de fazer perguntas(agindo como “filósofo”), buscandorespostas (agindo como “pesqui-sador”) e sabendo que a cadaresposta formulará novas perguntas,cada vez mais complexas.

Formulando perguntas, se angus-tiando com indagações, buscandorespostas, satisfazendo-se com onovo conhecimento, o ser humanosempre estará envolvido em relações

humanas e onde há relações existemvalores humanos, consubstanciadosna dignidade do ser humano. Valedizer, deve existir ética, não nosentido legalista, cartorial, moralistaou meramente deontológico, masprincipalmente como reflexão e/oujuízo crítico sobre valores, em geralem conflito.

A ética significa opção de valore por isso tem uma condição “sinequa non”, liberdade – liberdadepara fazer opção, com a devidaresponsabilidade.

Assim, saudemos os avanços doconhecimento, buscando adquiriresse conhecimento de forma etica-mente adequada e aplicando-o deforma também eticamente ade-quada. Façamos do saber, comoqueriam os filósofos fundadores,uma forma de atingir sabedoria ebuscar o saber com sabedoria.

A sabedoria reconhece que,dentre todos os atores envol-vidos em pesquisa em sereshumanos, o sujeito da pesquisaé o elo mais “frágil” mas aomesmo tempo, o mais impor-tante e que deve ter sempre suadignidade preservada.

Cadernos4 de Ética em

Pesquisa

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A consultaNosso CEP vem sofrendo

problemas para realizar suasreuniões. A dificuldade e a faltade quorum legal de metade maisum de seus membros (seis),sendo que as ausências levam aoadiamento dos encontros, comdesignações de outros em caráterextraordinário. Para resolver oimpasse, sugerimos que na faltade quorum seja nomeado ummembro ad hoc, não efetivo doCEP, para atuar naquela reuniãoespecifica, impedindo assim o seuadiamento. Gostaríamos de sabera opinião da Conep com respeitoa este procedimento.

Francisco Kupidlowiski(coordenador do CEP do Hospital

Felício Rocho)

A respostaPara responder à questão

apresentada, vamos enumeraralguns pontos a serem obser-vados por este CEP e poroutros que enfrentem o mesmotipo de dificuldade.

1) A eleição de metade dosmembros do CEP, conformedita a Resolução CNS 196/96,confere maior visibilidade,legitimidade e responsabilidadedos participantes;2) A participação de pessoasmuito envolvidas com outrasatividades, como, por exemplo,parlamentares, pode ser fatordeterminante de menor fre-qüência nas reuniões;

3) As reuniões do CEP devemser previamente agendadas,segundo cronograma fixo,pelo menos mensais, paraassegurar as respostas aospesquisadores em tempo hábil(30 dias) e para permitir aelaboração das agendas pes-soais dos integrantes;4) O regimento interno deveser elaborado e aprovado pelosmembros, inclusive com aindicação das providencias aserem tomadas em caso defaltas consecutivas;5) Podem ser indicados mem-bros suplentes, para seremconvocados nas ausências dostitulares, que, dentro do pos-sível, devem ser previamentecomunicadas.6) A composição do CEPdeve atender aos requisitosda Resolução CNS 196/96.O comitê recebe seu registrode acordo com a adequadaparticipação de membros dediversas áreas . Ass im, aconvocação de membros adhoc, não efetivos do CEP,compromete este equilíbrio,alem de impedir uma partici-pação responsável, não favo-recendo a acumulação deconhecimentos necessários ede experiência na partici-pação efetiva e continua juntoao grupo de trabalho.

Dúvidas

A Conep Responde*

Acada edição, asérie Cadernos

Cadernosde Ética em 5Pesquisa

▲▲

*Essas respostasforam elaboradas

pela SecretáriaExecutiva da Conep,Corina Bontempo D.

de Freitas.reserva espaço aoleitor para esclarecerquestões que apare-çam com frequênciadurante encaminha-mentos para realiza-ção de pesquisas.Todas as respostasapresentadas constamna Resolução CNS196/96, que tratadas Diretrizes e NormasRegulamentadoras dePesquisas EnvolvendoSeres Humanos.

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Cadernos6 de Ética em

Pesquisa

A consultaGostaria de saber a opinião da

Conep com relação a algunsquestionamentos com os quaistenho me defrontado nos últimostempos:

a) Pesquisas feitas com baseapenas em respostas dadas aquestionários aplicados em entre-vistas domiciliares de base popula-cional como na maioria dosestudos epidemiológicos neces-sitam mesmo de termo de consen-timento informado assinado?

b) Pesquisas realizadas comdocumentos abertos ao público,mas que ficam sob a custódiainstitucional, como por exemplocontas de uma prefeitura, reque-rem autorização formal para o usoda informação?

c) Estudos conduzidos comgestores de municípios raramentepodem garantir a confiden-cialidade, pois os municípiosprecisam ser identificados noprojeto/publicação para que possaser compreendido?

d) Em pesquisas conduzidascom pessoas em conflito com alei, como usuários de drogas, omaterial coletado, como fitas degravação de entrevistas, pelopesquisador, têm garantido aconfidencialidade dos dados soba guarda do pesquisador, ou ajustiça (polícia) poderá requererlegalmente esse material, produ-zindo provas contra os sujeitosda pesquisa?

e) Alguns alunos estrangeiros

que vêm como visitantes (não-oficialmente), para os nossosprogramas de pesquisa, parti-cipam de projetos nossos comocolaboradores. Isso implica emque o projeto seja enquadradocomo de cooperação estrangeira?

f) É requerido que cada instituiçãoparticipante de uma pesquisa(apenas como local de identificaçãode sujeitos da pesquisa, comohospitais, por exemplo) precisaaprovar o projeto em cada um dosseus CEP?

g) Em Saúde Coletiva, muitosprojetos são de ciências sociaisrealizados com antropólogos, quevem estranhando a aplicação decritérios da pesquisa biomédicapara os seus estudos. Já foi pensadoem se elaborar uma Resoluçãoespecífica para esses casos?

Vilma Santana(coordenadora do CEP

do Instituto de Saúde Coletivada Universidade Federal da Bahia)

A respostaSuas questões são realmente

importantes e complexas. Algu-mas estão contempladas nasdiretrizes éticas contidas nasResolução CNS 196/96 e suascomplementares, do ConselhoNacional de Saúde, para pesquisasenvolvendo seres humanos. Noentanto, outras dependem deinterpretação de legislação varia-da, especialmente, a Constituição,Código Civil e Código de ÉticaMédica e de outras profissões.Comentarei por partes:

a) Na definição de pesquisasenvolvendo seres humanos (itemII da Resolução CNS 196/96,portanto sob a abrangência dessanorma) está explicito que apesquisa com questionários deveser aprovada pelo CEP. Riscosreferentes a coleta de infor-mações pessoais são, freqüen-temente, maiores que os refe-rentes a coleta de materiaisbiológicos, cabendo medidas deproteção de sujeitos de pesquisa.O TCLE deve ser assinado porconstituir documento de compro-vação das informações dadaspara a obtenção do consen-timento e do próprio ato doautorização dado pelo sujeito depesquisa. Em casos excepcionais,especialmente quando não sequer identificar o respondente oupor impossibilidade (o que deveser justificado no protocolo depesquisa) cabe ao CEP avaliar edecidir pela aceitabilidade demodificações desse requisito. Porexemplo, em situações onde oquestionário fosse respondido napresença de um agente, talveznão houvesse uma justificativaplausível. Entretanto, em questio-nários distribuídos, para alunosem sala de aula, a Conep jáaprovou o TCLE como umaprimeira página, não assinado,com preenchimento do questio-nário pelos que concordarem.

b) O uso de documentos deserviços públicos está regula-mentado na legislação – inciso

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XXXIII da CF (assegura a todoso direito de receber dos órgãospúblicos informação de interesseparticular ou de interesse coletivogeral, ressalvadas as cujo sigilo sejaimprescindível à segurança doEstado e da sociedade), Lei 8149/91, Decreto que a regulamenta eLei do Regime Jurídico Único. Seforem os dados da prefeituradados públicos de acordo com alegislação, são sujeitos ao controlesocial (com as conseqüências paraos gestores).

c) Entendemos que vale o mesmoraciocínio do item anterior. Quandohouver coleta de dados não públicos,o TCLE deve incluir os benefícios eos riscos, contemplando ainda aResolução CNS 196/96 em seusitens .3 “i” e “o”:

i) prever procedimentos queassegurem a confidencialidade ea privacidade, a proteção daimagem e a não estigmatização,garantindo a não utilização dasinformações em prejuízo daspessoas e/ou das comunidades,inclusive em termos de auto-estima, de prestígio e/ou eco-nômico-financeiro;

o) comunicar às autoridadessanitárias os resultados da pes-quisa, sempre que os mesmospuderem contribuir para a me-lhoria das condições de saúde dacoletividade, preservando, po-rém, a imagem e assegurandoque os sujeitos da pesquisa nãosejam estigmatizados ou percama auto-estima;

d) A questão do sigilo extrapolaa ética na pesquisa, logicamenteincluindo a atividade dos pesqui-sadores. A questão está contem-plada no Código Civil - Art. 144:Ninguém pode ser obrigado adepor sobre fatos a cujo respeito,por estado ou profissão deveguardar segredo.

Ver também Código de ÉticaMédica (Art. 11 e 102 a 109) ecódigos de outras profissões,Código Penal (art. 154 e 269) eCódigo de Processo Penal (art.207 e 66).

e)De acordo com a ResoluçãoCNS 292/99, item I, a coope-ração de pessoas físicas ou jurí-dicas estrangeiras, caracterizacooperação estrangeira. Essesalunos visitantes, não oficiais,parece não se incluírem na exceçãodefinida em I.1 (pesquisadorestrangeiro que pertença ao corpotécnico de entidade nacional).

f) Projetos multicêntricos (um sóprotocolo realizado por pesqui-sadores diferentes) devem seranalisados em cada CEP dasinstituições envolvidas (Ver ResoluçãoCNS 196/96, item VII.13.a e também Resolução 346/05). Porémhá o caso de protocolo sob uma sóequipe ou pesquisador responsável,com coleta em múltiplos locais, quemuitas vezes não têm CEP, em quedeve ser solicitado um documentode anuência da direção de cadainstituição onde é feita a coleta dedados ou recrutamento de sujeitos.Se essa instituição tem CEP, deveser contatado o CEP.

g) Desde a elaboração da Reso-lução CNS 196/96 definiu-se aabrangência da norma em “pes-quisas envolvendo seres humanos”,em qualquer área do conhecimentoou realizada por pesquisador dequalquer categoria profissional.Constitui um recorte do ponto devista da proteção de sujeitos depesquisa, assumindo que todapesquisa tem risco de danos por lidarcom informações pessoais ou proce-dimentos envolvidos em incertezas.As diretrizes nasceram noConselho Nacional de Saúde, porse entender que os possíveis danossão à saúde física, mental ousocial, cabendo, portanto, aresponsabilidade de proteção aosórgãos ligados à saúde, especial-mente ao órgão de controle social,com representação da sociedadecivil.

Na prática, houve grandeadesão de todos os profissionais daárea da saúde, historicamenteenvolvidos com a questão, e têm-se alcançado paulatinamente, osprofissionais de outras áreas, comoeducação, direito, sociologia,antropologia, etc., que reconhe-cem a importância e legitimidadedesse sistema CEP-Conep. Res-salta-se que nas universidades temsido freqüente a participação deantropólogos nos CEP, nadaimpedindo também que se formeCEP em faculdades de antropo-logia ou outros institutos dessaárea (mantendo-se a composiçãoconforme solicitada na 196/96).

Cadernosde Ética em 7Pesquisa

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Ademais, sobre os aspectosepistemológicos e metodológicospodem surgir polêmicas devido aotipo de pesquisa quando, porexemplo, esta pertence ao campodas assim chamadas ciênciasbiomédicas ou das ciências soci-ais. Isto porque se pode argumen-tar que, de acordo com a distinçãoentre “ciências naturais” e “ciênci-as do espírito” (Dilthey, 1883), exis-tiriam duas tradições de pesquisa ci-entífica, com objetos distintos e que,portanto, não poderiam ser anali-sadas com o mesmo tipo de ferra-mentas conceituais. Mas, mesmoque se aceite tal distinção como sen-do correta quando referida aos as-pectos metodológicos e episte-mológicos de uma pesquisa, elapode ser questionada do ponto devista da competência ética, comotentaremos mostrar a seguir.

A distinção entre pesquisasbiomédicas e em ciências sociais

Uma das perguntas mais co-muns – e que nos remete à clássi-ca distinção entre ciências natu-rais e ciências humanas e sociais– feita pelos pesquisadores aos re-presentantes de um CEP diz res-peito à pertinência de se conside-rar as pesquisas cientificas comseres humanos desconhecendoeventuais diferenças substantivas

Artigo

Cadernos8 de Ética em

Pesquisa

Pesquisas em ciências sociais:aspectos epistemológicose bioéticosPor Fermin Roland Schramm

Fermin RolandSchramm é PhD,Pesquisador Titularda ENSP/FIOCRUZ.

CEP, deva ser necessariamenteinter e transdisciplinar para po-der avaliar criticamente qual-quer protocolo de pesquisa queenvolva seres humanos, tendoem princípio a necessária com-petência para avaliar sua eti-cidade, mas podendo fazer ape-lo também a consultores ad hocque tenham a competência in-dispensável para revisar aspec-tos científicos específicos quan-do tal competência não seja pos-suída por nenhum de seus mem-bros (Schramm, 1999).

Entretanto, existe uma série dequestionamentos não tanto sobre apertinência deste tipo de controle,mas sobre como este se daria de fato.Por exemplo, ocupar o lugar de ava-liador de um protocolo de pesquisapode ser objeto de controvérsias de-vido a questionamentos tanto sobrea efetiva competência (metodológicae epistemológica) quanto sobre anecessária isenção (moral e ideoló-gica) de quem avalia. Pode-se, porexemplo, suspeitar da avaliação serenviesada por conflitos de interessese de valores entre os agentes da ava-liação e os autores do protocolo depesquisa revisada, o que pode acres-centar um novo fator de conflito aosjá tradicionalmente reconhecidos en-tre agentes pesquisadores e pacien-tes pesquisados.

Naceita, segundo a qual toda pes-quisa, conduzida em qualquerárea do conhecimento e que en-volva seres humanos como obje-tos da investigação, deve neces-sariamente ser revisada, em seusaspectos científicos e éticos, poruma instância que tenha sufici-ente isenção, competência ade-quada em âmbito epistemológico,metodológico e ético reconheci-da por seus pares e a sociedadecomo um todo. Via de regra, estepapel cabe a comitês ou comis-sões de ética surgidos a partir dosanos 70 do século 20.

No Brasil, este papel cabe aoconjunto formado pela ComissãoNacional de Ética em Pesquisa(Conep) e os Comitês de Éticaem Pesquisa (CEP), cuja tarefaconsiste em analisar, de maneiracrítica e imparcial, as ferramen-tas científicas (conceitos, teorias,paradigmas); os materiais e mé-todos; os valores e as crenças so-bre o correto e incorreto, o justoe o errado, diretamente envolvi-dos pela pesquisa, seja ela per-tencente ao âmbito das ciências na-turais ou das ciências sociais. As-sim sendo, parece que a instânciarevisora, representada por um

a sociedade democráticacontemporânea existe umapercepção, cada vez mais

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entre tipos de pesquisa, comopoderiam ser as pesquisas no cam-po das ciências biomédicas e aque-las no campo das ciências sociais.Em particular, pode-se perguntarse as diferenças de métodos e ob-jetos, admitidas por especialistasde ambos os campos, implicariamem diferenças substantivas do pon-to de vista da ética.

Em outros termos, mesmo ad-mitindo a pertinência desta dife-rença, problemático é saber se adiferença epistemológica e meto-dológica implicaria diretamentetambém numa diferença substan-tiva em âmbito moral, visto que,pelo menos desde a vigência daLei de Hume em filosofia (Moore,1903), não poderíamos derivarimpunemente enunciados válidosno campo dos valores a partir deenunciados fidedignos no campodos fatos empíricos.

Em suma, não é dito que os doistipos de pesquisa não devam es-tar sujeitos ao mesmo tipo de exi-gências éticas implicadas pelas re-soluções que regulam as pesqui-sas com seres humanos, mesmoque elas sejam diferentes em seusmateriais e métodos. Nesse senti-do, para um sujeito pesquisadopode ter peso igual, se não maior,que seja protegida a privacidadedas informações referidas às suaspreferências, crenças e escolhas doque aquelas referentes à sua cons-tituição e determinação biológica.É por isso – e considerando que abioética pretende ser uma ferra-

Cadernosde Ética em 9Pesquisa

menta ao mesmo tempo cognitiva,normativa e protetora (Schramm,2002) – que o sistema de avalia-ção constituído pelos CEP e pelaConep pode constituir uma fer-ramenta legítima e eficaz para darconta da eticidade em pesquisa,seja ela biomédica, seja ela social.

Boas razões para a avaliaçãoética das pesquisas

De acordo com a percepçãoemergente nas sociedades contem-porâneas acerca dos possíveis efei-tos adversos, voluntários ouinvoluntários, da pesquisa em se-res humanos, claramente detectávelem documentos normativos, comoo Código de Nüremberg (1947) eas várias versões da Declaração deHelsinque (1964-2000), e de acor-do com a distinção, de origemaristotélica, entre “saber teórico”(relativo a idéias); “saber prático”(relativo a relações entre atoressociais); e “saber poiético” (refe-rente à fabricação de objetos)(Aristóteles, 1998), toda atividadehumana caracterizável como prá-tica de pesquisa que envolva seresvivos e a fortiori indivíduos e po-pulações de humanos – conside-rados, portanto, objetos da inves-tigação – tem necessariamente umadimensão ética e, por tratar-se deseres vivos, bioética.

Com efeito, diferentemente dasatividades que visam à mera des-crição e compreensão da realida-de por meio de construtos sim-bólicos ou idéias (theoría), as ati-

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Cadernos10 de Ética em

Pesquisa

vidades práticas sempre implicam,direta ou indiretamente, pelo me-nos um sujeito, que tem o papelde agente moral e, pelo menos,um outro sujeito, objeto da práti-ca do agente moral e que podeentão ser denominado pacientemoral. Por isso, uma prática temsempre a ver, implícita ou expli-citamente, com uma ação huma-na que é ao mesmo tempo umainter-relação entre atores sociais,tendo, portanto, implicações mo-rais, fato já percebido pelos gre-gos, que “utilizavam o termopráxis para indicar a ação moral”(Ferrater Mora, 1999).

Mas como prática social, todaprática humana se inscreve ine-vitavelmente na dialética entreconflitos e cooperação que mol-da as sociedades históricas. E aética pode ser vista como o “sa-ber prático” que visa justamentedar conta desta dialética do pon-to de vista de suas implicaçõesmorais. E isso de duas maneiras.Em primeiro lugar, tentandoentendê-la e explicá-la, pois “emqualquer realidade existem con-flitos, mas nem toda realidade sereduz a conflitos [visto que] sesão reais a inimizade e a guerra,também o são a amizade e a paz.Em seu conjunto, a realidade écomplexa e constitui um conglo-merado de conflitos e harmonia”(Maliandi, 1998). Em segundolugar, tentando justificar suapertinência, pois [a] ética seriasupérflua em um mundo total-

mente harmônico, e seria impossí-vel em um mundo totalmenteconflituoso (Maliandi, 1998).

Tal dialética entre conflitos ecooperação em bioética pode serdesignada como a dialética queperpassa o conjunto de relaçõesentre aqueles que o bioeticistaH.T. Engelhardt Jr. chamou“amigos” e “estranhos” morais(Engelhardt, 1996). Neste sen-tido, as práticas de pesquisa queenvolvem seres humanos (“pes-quisadores” e “pesquisados”) po-dem implicar conflitos de interes-ses e valores entre determinadosatores, autores da pesquisa e ou-tros atores, objetos da mesma, noqual caso pesquisadores e pesqui-sados podem tornar-se “estra-nhos morais”. Por isso, na mai-oria das sociedades contemporâ-neas, tais pesquisas estão sendopaulatinamente submetidas à ava-liação (e ao “controle”) por par-te de CEP, guiados por normase regulamentações que visam, apartir de uma necessária descri-ção – a princípio fidedigna e im-parcial – dos aspectos éticos dapesquisa e de uma também ne-cessária compreensão dos even-tuais conflitos envolvidos, pres-crever e proscrever comporta-mentos considerados, respectiva-mente, corretos ou errados, ten-tando evitar, portanto, que pes-quisadores e pesquisados se tor-nem “estranhos morais”.

O trabalho dos CEP tem entãouma dupla função: a) uma fun-

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ção descritiva e compreensiva damoralidade de uma pesquisa; b)uma função normativa, consisten-te em resolver (ou, quando issonão for possível, regular) os confli-tos de interesses e de valores, tan-to no sentido de propor a melhorsolução possível quanto no senti-do, mais comum, de reduzir aomáximo os eventuais danos pos-síveis, inclusive aqueles de tipomoral (que podem tornar o pes-quisador e o pesquisado “estra-nhos morais”). Mas isso não étudo, pois existe uma terceira fun-ção, além das duas tradicionalmen-te aceitas em campo bioético, queé a função protetora.

A tríplice função daferramenta bioética

A bioética pode ser consideradaa ética aplicada às ações humanasreferidas a fenômenos e processosvitais; mais especificamente – deacordo com a distinção feita porAristóteles na Política (I, 2, 1253a7-5) entre vida orgânica (zoé) e vidaprática (bíos) – como o conjunto deconceitos, argumentos e normas quevalorizam e legitimam eticamente osatos humanos [cujos] efeitos afetamprofunda e irreversivelmente, de ma-neira real ou potencial, os sistemas vi-tais (Kottow, 1995). Em outros ter-mos, a bioética pode ser considera-da um novo campo de investigação[que visa] compreender [de forma crí-tica] as conseqüências de uma ação(...), responder questões filosóficas subs-tantivas relativas à natureza da éti-

ca, ao valor da vida, ao que é seruma pessoa, ao sentido de ser hu-mano, (...) [incluindo] as conse-qüências das políticas públicas e orumo e controle da ciência (Kuhse& Singer, 1998).

Mas pode-se também entendera bioética de uma maneira maisradical, recuperando o sentidoprovavelmente mais antigo dapalavra ethos, que, na origem,significava “guarida” para os ani-mais domésticos contra ameaçaspor predadores e, por extensão,“proteção” do humano (Schramm& Kottow, 2001). Em suma, seconsiderarmos que o “ethos”constitui em cada sociedade o sis-tema de crenças normativas acer-ca de como se deve lidar com osconflitos (Maliandi, 1998) e quea ética é a “filosofia prática” [quevisa] uma reflexão sistemática so-bre o normativo [e que] deve li-dar também com a aplicabi-lidade, [o] caráter de “filosofiaprática”, próprio da ética, excedeaquele de mera “teoria do práti-co”, pois traz um saber que ajudaa desenvolver a capacidade mo-ral do agente (Maliandi, 1998),pode-se inferir que a bioéticatem de fato uma terceira função,também prática, e socialmenterelevante, consistente em prote-ger indivíduos e populações hu-manas suscetíveis contra amea-ças e riscos decorrentes das prá-ticas humanas que podem vul-nerar tais indivíduos e popula-ções (Schramm, 2002).

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Cadernosde Ética em 11Pesquisa

A identidade da pesquisa emciências sociais e sua

relevância para o trabalhode avaliação bioética

As pesquisas em ciências sociais,como qualquer pesquisa que en-volva seres humanos, devem res-peitar as normas e resoluções na-cionais e internacionais para se-rem consideradas eticamenteaceitáveis, embora isso possa le-vantar uma série de dúvidas e re-sistências nos pesquisadores. Pa-rece, portanto, razoável per-guntar se as pesquisas em ciên-cias sociais deveriam tambémestar regulamentadas pelo mes-mo tipo de regras ou se, aocontrário, precisariam de regrasde conduta específicas, devidoà identidade diferente, do pon-to de vista epistemológico emetodológico, das ciências so-ciais quando comparadas comas ciências naturais e, em parti-cular, com as biomédicas.

Mas esta pergunta é de fatodúplice, pois a questão da cienti-ficidade, embora deva ser distintadaquela da eticidade (respeitandoprima facie a lei de Hume), nãopode ser separada desta, visto que,atualmente, pode-se admitir aexistência de uma relação comple-xa entre fatos e valores, logo tam-bém uma interpretação complexada Lei de Hume, sobretudo quan-do a referimos aos problemas en-frentados pela bioética (Schramm,1997), inclusive aqueles relativosaos CEP abordados aqui. Com

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Pesquisa

efeito, de acordo com o métododa complexidade e que podemossintetizar pela competência em sa-ber distinguir sem separar e juntarsem confundir (Morin, 1990),pode-se considerar que um mes-mo sujeito tenha tanto a necessá-ria competência epistêmica emetodológica para avaliar corre-tamente uma pesquisa quanto atambém desejável competênciaética para avaliar a moralidade damesma, ou seja, o mesmo sujeitopode muito bem “fazer comuni-car estas instâncias separadas”(Morin, s/d). Isso vale a fortioripara um CEP como um todo de-vido à sua composição multipro-fissional que, em princípio, ga-rante a pluralidade de competên-cias necessárias para dar contados vários tipos de pesquisa. In-versamente, existe um relativoconsenso entre eticistas e bioe-ticistas em dizer que uma pesqui-sa deva ser não só aceitável mo-ralmente, mas também relevantesocialmente e válida do ponto devista epistemológico e meto-dológico, caso contrário ela seriapraticamente inútil.

No caso específico que nos ocu-pa aqui, a pergunta pertinente é seas ciências sociais teriam um es-tatuto específico ou se as ferramen-tas conceituais da epistemologiageral e os procedimentos dametodologia adotados para analisaros objetos estudados pelas ciênciasbiomédicas poderiam ser válidostambém, mutatis mutandis, para

compreender os objetos de estudodas ciências sociais, como preten-dia de fato o positivismo (Kincaid,1996). Mas tal pergunta implicauma controvérsia. Com efeito, te-mos, por um lado, quem defendeque ao estudo dos fenômenos so-ciais devem-se aplicar os mesmosmétodos das ciências naturais, ten-tando descobrir regularidades cau-sais do tipo quando existe uma cau-sa C ocorre o evento E, e integran-do-as numa teoria sistemática apli-cável a todos os casos. Por outrolado, temos quem defende, ao con-trário, que os métodos devem serdiferentes, pois nos “fenômenos”humanos e sociais o mesmo tipode inferência seria arbitrário, vistoque esses incluem o sentido queos atores sociais atribuem a suaspráticas e às tentativas de se co-municar e cooperar com os ou-tros e o mundo, devendo-se, por-tanto, pensar segundo a formaquando existe a situação S todos de-vem ter o comportamento C e po-dendo, eventualmente, chegar auma sistematização teórica dasnormas que forem adotadas porum grupo social determinado(Braybrooke, 1998).

Quem responde positivamentea esta pergunta defende umapostura epistemológica que sepode qualificar de “naturalista”,a posição contrária podendo serchamada de “antinaturalista”(Keat, 1998) ou “interpretativa”(Braybrooke, 1998). Entretan-to, o termo “naturalismo” em

filosofia das ciências sociais temvários sentidos e alguns especia-listas consideram que o padrãode ciência natural, adotado tan-to por naturalistas (para aceitá-lo) como por antinaturalistas(para criticá-lo) é de fato a con-cepção positivista de ciência,concepção que, no entanto, setornou cada vez mais problemá-tica em filosofia da ciência, por-que as próprias ciências naturaisjá não seriam em sua maioria“positivistas” (Keat, 1998).

Existe pelo menos uma apa-rente boa razão para se decla-rar epistemologicamente “natu-ralista”. Consiste em admitirque o pesquisador que preten-de conhecer o mundo, em seusaspectos humanos e sociais, fazparte deste mundo, comparti-lhando, portanto, muitas dascaracterísticas possuídas pelosentes e seres deste mundo. Estarazão em favor do naturalismofoi defendida em particular porJohn Stuart Mill (1843), paraquem se os seres humanos fa-zem parte da ordem natural cau-sal estudada pela ciência e se amente é parte dos seres huma-nos, então ela é também parteda natureza, tendo, portanto,base empírica. No entanto, estaposição, chamada em episte-mologia também de “empi-rista”, tornou-se hoje mino-ritária em razão das críticas vin-das do neo-racionalismo e doconstrutivismo, que admitem, no

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ticos, ao contrário das ciênciasnaturais, que poderiam ser con-sideradas em seus aspectos me-ramente técnico e instrumental(Habermas, 1981).

Considerações bioéticas finais

Em nosso meio acadêmico,uma das queixas mais freqüen-tes dos pesquisadores que sub-metem seus protocolos de pes-quisa a um CEP é que as nor-mas vigentes e sua interpreta-ção e aplicação na emissão doparecer pelo CEP dificultariame até inviabilizariam de fato apesquisa científica. Isso é iden-tificado com uma suposta buro-cratização crescente do proces-so que leva do desenho da pes-quisa, passando pela obtençãodo consentimento livre e escla-recido dos indivíduos e popula-ções a serem pesquisados, atéo procedimento consistente emobter o compromisso dos res-ponsáveis das instituições envol-vidas de que a pesquisa que seráfeita por seus pesquisadores es-teja de acordo com as regrasestabelecidas pelo ConselhoNacional de Saúde (CNS).

Este tipo de queixa é particu-larmente vivo entre os pesqui-sadores em ciências sociais emsaúde e uma razão disso podeser que o pesquisador em ciên-cias sociais pensa que as infor-mações a serem obtidas dos su-jeitos pesquisados representari-

primeiro, a preexistência de al-gum ponto de vista sobre a rea-lidade a ser estudada; no segun-do, a “co-construção” entre su-jeito cognoscente e realidadeconhecida no processo de co-nhecimento (Piaget, 1937).

Mas existem também aparen-tes boas razões para adotar umaepistemologia antinaturalista emciências sociais. Para o episte-mólogo Fred D’Agostino (1999)existiriam de fato três razões vá-lidas para isso. Em primeiro lu-gar, a natureza “reflexiva” dasciências sociais em relação aseus objetos de estudo, ou seja,o fato de os seres humanos es-tarem, com seus pontos de vis-ta e crenças, em interação sim-bólica entre si, contrariamenteaos objetos das ciências natu-rais, que, em princípio, nãointeragiriam com o pesquisador.Em segundo lugar, a naturezaparticularmente “complexa”dos fenômenos sociais que tor-naria extremamente difícil fazerpredições sobre os comporta-mentos dos atores sociais estu-dados. Em terceiro lugar, a na-tureza controvertida de muitasdas categorias das ciências so-ciais, visto que seriam inse-paráveis de julgamentos de va-lor. Esta diferença faria comque, do ponto de vista ético ebioético, as ciências sociais de-vessem ser consideradas, comojá pretendia Jürgen Habermas,em seus aspectos práticos e crí- ▲▲

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terior e tentando “aplicar” concre-tamente a solução que, dentre aspossíveis, possa ser consideradamais adequada a uma situação deconflito determinada, ou seja, pon-derando as várias condutas que pos-sam ser adotadas por se mostraremmoralmente justificáveis, e escolhen-do aquela(s) que tenham as melho-res conseqüências (ou, mais realis-ticamente, as menos negativas) paraa solução de um determinado con-flito; considerando, sobretudo, ofato de que, nas sociedades com-plexas contemporâneas, os sistemasde valores existentes, e que orien-tam as diversas comunidades mo-rais nelas existentes, não sãocomensuráveis entre si a priori, mastão somente, e na melhor das hipó-teses, a posteriori, depois de inevi-táveis tentativas dialógicas. Em ter-ceiro lugar, pensando uma bioéticada proteção como uma espécie de“tarefa síntese” das outras duas (adescritiva e a normativa), o que,por um lado, resgataria o sentidomais antigo da palavra ethos (“gua-rida”) e, por outro, proporia o sen-tido mais amplo pensável de umaética de nosso tempo e cada vezmais inclusiva.

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Cadernos14 de Ética em

Pesquisa

am, de fato, um risco menor deprejudicá-los e até um risconulo, no caso de pesquisas fei-tas com dados secundários ob-tidos a partir da anál ise ereinterpretação de dados jádisponíveis publicamente. Um ar-gumento em geral utilizado é que,contrariamente às pesquisas emcampo biomédico – que sempreimplicariam algum risco físico dossujeitos pesquisados, além dasempre possível estigmatização ediscriminação dos eventuais por-tadores de doenças atuais e futu-ras por parte de planos de saúde,seguros e até pela população emgeral –, a pesquisa social teria emprincípio muito menos riscos, eaté nenhum, porque seus dadosseriam quase sempre menos“aproveitáveis” por planejadores,seguros, etc., devido à sua me-nor quantificação possível, logoa seu baixo poder de predição.

Afinal – argumenta-se – a pes-quisa em ciências sociais, inclu-sive em ciências sociais em saú-de, é essencialmente “qualitati-va”, logo o que ela detectariaseria sempre tão somente indi-ciário. O que mal se adaptariaao paradigma da verificação/refutação tradicionalmente ado-tado nas ciências naturais, àsquais pertence cada vez maistambém a ciência biomédicadesde que ela se tornou, graçasà genética e à engenharia gené-tica, uma das formas da biotec-nociência. Este argumento está

ligado a um outro, pois se a ati-vidade de pesquisa em ciênciassociais em saúde tem as caracte-rísticas descritas acima, ela tor-naria o pesquisador social menossuscetível de estar envolvido comgrupos de interesses, tais comoindústria farmacêutica, seguros eoutros agentes econômicos po-tencialmente “suspeitos”. Tal ar-gumento se expressa geralmentepela afirmação de que amoralidade do agente pesquisa-dor seria garantia suficiente daeticidade da pesquisa, haja vistaa tradicional vocação das ciênci-as sociais em estar do lado dosmais vulneráveis e desamparados!

Sensível aos anseios acerca daqualidade de vida de indivíduos epopulações humanas, por um lado,e preocupada com a credibilidadefutura da filosofia como saber ca-paz de dar sentido às práticas dosagentes morais e de reconstruir acredibilidade das antigas “ciênciasmorais”, a bioética pode subsidiarna solução desse tipo de problemas,e isso de três maneiras distintas ecomplementares. Em primeiro lu-gar, adotando um ponto de vistacrítico, segundo o qual a análise mo-ral deve sempre adotar a linguagemde segunda ordem consistente emanalisar, de maneira racional e im-parcial, todas as crenças e os enun-ciados morais vigentes, para tãosomente reter a força argumentativaou “cogência” (cogency) de cadajustificação de comportamento efe-tivamente existente. Em segundo lu-gar, tirando partido da análise an-

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Artigo

Direitos humanos e pesquisa emhumanosPor Nilo Henrique Neves dos Reis

Nilo Henrique Nevesdos Reis é professorde filosofia daUniversidade Estadualde Feira de Santana.

ão é possível escrever sobreo homem sem afastar essaimagem do literato norte-

Um dos erros lamentáveis do Criador: Satã, depois de promovido a categoria de Arcanjo, passou a ser umcontraditor insaciável e, por essa razão, acabou sendo, finalmente, expulso do paraíso. Na metade da descida,parou, raciocinou um pouco e voltou atrás: “Há um favor que gostaria de pedir”, ele disse. “Diga lá”, respondeuo Criador. “Fiquei sabendo que o HOMEM será criado; ele precisará, portanto, de leis”. “O quê, infeliz? Você, seuinimigo declarado, destinado a odiar a alma do homem desde os primórdios da eternidade, pretende fazer as suasleis?” “Perdão, a única coisa que peço é que eles mesmos as façam”, retrucou o diabo. E assim se fez.

(Bierce, A, Dicionário do Diabo, 1999, p. 212-213).

Namericano Ambrose Bierce. Aocontrário dos animais não-humanos,que apenas interagem com ascondições ambientais, os homensparecem ser os primeiros quetentaram entender a essência danatureza humana. Pois bem, anatureza humana não será um tematratado aqui hoje, mas estará sub-repticiamente presente nessasconsiderações; e mais, a imagem dohomem como um legislador de suaspróprias leis!

Parece-nos que o título proposto,direitos humanos e pesquisas emhumanos, merece mais perguntasdo que respostas. Nosso temapossibilita múltiplas interpretações,levam-nos ao limites da inter-rogação filosófica entre o quepodemos não saber e o que, semdesculpas, certamente ignoramos.

Devemos absolutizar os direitoshumanos e relativizar as pesquisasem humanos? Ou deveríamosfazer o contrário? Afinal, o quesão direitos humanos? Tal inda-

gação nos encaminha para outrasperguntas, por exemplo, o que éo homem? O que significa dizerdireitos universais do homem? Oque significa dizer que os homenssão todos iguais? Essas indagaçõessão fundamentais para estabelecerum ponto de referência para otítulo dessa exposição. Além disso,antes de apresentar uma linha deraciocínio sobre o que significapesquisas em humanos, devemosperguntar: tem a vida humanaalgum sentido?1 Sem a consciênciafavorável e explícita pela vida nãohá como estabelecer princípiosnormativos para a pesquisa emhumanos.

Mas o que são direitos humanos?Podemos tentar uma conceituação:são os direitos que asseguram atodos os homens que seus direitospolíticos, econômicos, religiosos,sociais e do meio-ambiente serãorespeitados para pleno gozo daexistência humana e instituídos peloEstado democrático. Conside-rando também que proteção aosdireitos humanos é uma questãoque passa pelo entendimento das

liberdades fundamentais, torna-seimperioso compreender o que sãoos direitos fundamentais do ho-mem. Nesse sentido, cabe-noslembrar a Declaração dos Direitosdo Homem e do Cidadão feita nodia 26 de agosto de 1789:

I - Os homens nascem e per-manecem livres e iguais em direitos;as distinções sociais não podem serfundadas senão sobre a utilidadecomum.

A mesma declaração torna-semais enfática em determinar osdireitos fundamentais do homem:

IV - A liberdade consiste empoder fazer tudo que não prejudiquea outrem. Assim, o exercício dosdireitos naturais do homem não temlimites senão aqueles que asseguramaos outros membros da sociedade ogozo desses mesmos direitos; seuslimites não podem ser determinadossenão pela lei.

Desse modo, podemos perceber,ainda que não saibamos, o quesignifica dizer direitos fundamentaisdos homens, que a essência dadeclaração consistia em propor-cionar aos indivíduos os meios

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Pesquisa

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necessários para seu desenvol-vimento natural, quais sejam aLiberdade, a Justiça e a Vida.Nesse sentido, o papel da razão éfundamental, a ela cabe estimularou criar as condições necessárias,pela educação, pela política sociale econômica, para que os indiví-duos tenham acesso, desde onascimento a maturidade. Isto é,compete à razão introduzir à vidacivilizada, a igualdade entre oshomens, estimulando a existênciaem comunidade e, ao mesmotempo, afastando a barbárie davida coletiva.

Tais princípios serão ratificadospela Declaração Universal dosDiretos Humanos em 10 dedezembro de 1948:

Artigo ITodas as pessoas nascem livres e

iguais em dignidade e direitos. Sãodotadas de razão e consciência edevem agir em relação umas àsoutras com espírito de fraternidade.

Artigo IIToda pessoa tem capacidade

para gozar os direitos e as liberdadesestabelecidos nesta Declaração, semdistinção de qualquer espécie, sejade raça, cor, sexo, língua, religião,opinião política ou de outra natu-reza, origem nacional ou social,riqueza, nascimento, ou qualqueroutra condição.

Essa declaração suscitou umaconcepção humana que contribuipara estabelecer o respeito aoindivíduo e, em especial, aoexercício da liberdade. Tal enten-

dimento nos força a perceber ooutro como ser humano e sersocial, impedindo todo e qualquerato que violente sua integridadefísica ou psíquica. Para reforçar essaleitura, o artigo VII é preciso:

Todos são iguais perante a lei etêm direito, sem qualquer distinção, aigual proteção da lei. Todos têm direitoa igual proteção contra qualquerdiscriminação que viole a presenteDeclaração e contra qualquer incita-mento a tal discriminação.

Existem hoje declarações, trata-dos e acordos que estimulam aconstrução de uma cidadaniarespeitável e o cuidado com o serhumano, no entanto, é notórioainda o desrespeito à pessoa emtodos os lugares do globo. Daí apreocupação de traçar uma refle-xão sobre os direitos humanos e apesquisa em humanos. O códigode Nuremberg assinala que:

1. O consentimento voluntáriodo ser humano é absolutamenteessencial. Isso significa que as pessoasque serão submetidas ao experimentodevem ser legalmente capazes de darconsentimento; essas pessoas devemexercer o livre direito de escolha semqualquer intervenção de elementos deforça, fraude, mentira, coação, astúciaou outra forma de restrição posterior;devem ter conhecimento suficiente doassunto em estudo para tomarem umadecisão. Esse último aspecto exige quesejam explicados às pessoas a natureza,a duração e o propósito do experimento;os métodos segundo os quais seráconduzido; as inconveniências e os

riscos esperados; os efeitos sobre a saúdeou sobre a pessoa do participante, queeventualmente possam ocorrer, devidoà sua participação no experimento. Odever e a responsabilidade de garantira qualidade do consentimento repou-sam sobre o pesquisador que inicia oudirige um experimento ou se compro-mete nele. São deveres e respon-sabilidades pessoais que não podem serdelegados a outrem impunemente.

A questão aqui não é a falta deuma legitimidade normativa, nemtampouco a busca universal de umethos ou da aplicação dos direitoshumanos, mas uma inversão naprática científica de que os fins dasciências justificam seus meios.Novamente nos cabe indagar oque significa a vida humana?

Em 1900, o Ministério da Saúdeda Prússia, já tinha estabelecidoregras para pesquisa científica.Além disso, em 1931, ainda naAlemanha, ficaram comumenteconhecidas as 14 diretrizes paranovas terapêuticas e a pesquisacientífica em seres humanos2 . Amaneira histórica alemã de res-guardar o ser humano diante daexperimentação alterou profun-damente as relações entre opesquisador e o sujeito de suapesquisa, pois esse último precisavaautorizar os procedimentos.Infelizmente, a ascensão donazismo redefiniu o conceito dehomem e, portanto, quem deveriagozar da prerrogativa de possuirtraços de humanos.

O que afinal podemos saber,

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sem incorrer em dúvidas, sobre oque é uma pesquisa ética emhumanos? O compromisso médicoda Associação Médica Mundial,citada na Declaração de Helsinki,aponta umbilicalmente a questão,asseverando: “A Saúde do meupaciente será minha primeiraconsideração”. Parece-nos umaresposta lúcida, sucinta e clara. Éevidente que a celeuma não seresolve aqui. O que pretendemosé um novo olhar sobre a legiti-midade normativa, a tradiçãocientífica e o respeito ao serhumano. Nesse sentido, as ciênciasdeixam de ser os fins, e o homemdeixa de ser os meios; há umchamamento à inversão.

Aí, e somente aí, podemosintroduzir uma discussão entredireitos humanos e pesquisas emhumanos. Em alguma parte dapesquisa científica teremos queconfrontar o problema de comoé feita a pesquisa científica e decomo ela deveria ser realizada.Não estamos aqui contestando ovalor da experimentação e dosexperimentos introduzidos pelaciência moderna; estamos sim,perguntando por que uma tradi-ção edificou um modelo de comose entender os fenômenos danatureza sem conciliar o respeitoà vida? Afinal,

Nosso corpo é o mesmo velhocorpo do homem primitivo. É sujeitoàs mesmas velhas doenças. Nossocrânio é ainda o mesmo no qual osantigos bem-intencionados, com

uma lógica dolorosa, faziam bu-racos para aliviar dores de cabeçaou libertar os demônios da loucura.As múmias sofreram de apendicite,artrite e dente estragados.

(Gordon, R. A assustadorahistória da medicina, 2004, p. 30).

A partir dessa citação, podemosespecular que não foram asinovações metódicas da ciênciamoderna que alteraram o enten-dimento do ser humano, trata-sede uma tradição. A modernidaderevolucionou os procedimentos, osaber que os antigos já tinhamestabelecido sobre o homem e ouniverso, mas não lhe interessavauma interpretação filosófica sobreo homem e as ciências.

Parece-nos que chegamos àquestão central do problema entredireitos humanos e pesquisas emhumanos e não nos referimos maisà normativa jurídica (emborapresente) sobre os direitos universaishumanos, mas sim a Ética, oumelhor, a falta de ética na pesquisacientífica. Não pretendemos iniciaruma discussão especializada sobreo tema, mas entendemos que asdivergências entre os direitoshumanos e pesquisas em humanosacontece pela ausência de umareflexão ética que possa diale-ticamente permitir conquistascientíficas e respeito aos animaishumanos e não-humanos.

Não cabe aqui apresentar exem-plos de ações virtuosas ou vis napesquisa, mas nos cumpre pensarque toda ação que não enxerga o

outro como um indivíduo queprecisa ser respeitado, instala aviolência contra o homem. Aliás, osabusos cometidos contra os homenslevaram a discussão de quais seriamas normas para uma pesquisacientífica ética. Desse modo, talempresa ganhou contornos alémdos salões filosóficos, pois vemsendo muito discutida por pesqui-sadores das áreas de saúde3 etambém possibilitou a construçãodo Relatório Belmont.

As inovações tecnológicas, noúltimo século, bem como a faltade sensibilidade e do respeito àdignidade humana levou a socie-dade a se conscientizar sobre asações não-éticas de uma consi-derável soma da comunidadecientífica. Os embaraços éticosprovocados pelo sucesso da ciênciapermitiu revelar o alto preço quepaga a espécie humana em nomede seu deslumbramento científico;tais descobertas levaram a refletirque os experimentos científicosdevem beneficiar a humanidade enão ser usado contra ela.

Nessas linhas, apontamos arazão e seu papel como fonteinstaladora da civilidade em contra-posição a barbárie. Sabemostambém que a perda da liberdadepara uma mente generosa é piordo que a morte (Andrew Hamiltonapud Figueredo, Carlos. 100discursos históricos, 2002, p.173);sabemos mais, sabemos que ohomem é a única criatura capazde raciocinar e tomar ações e

Cadernos18 de Ética em

Pesquisa

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medidas a partir de suas reflexõese também de sofrer, consciência,pelas ações e omissões. Sabemosque o problema não é a falta deuma legislação. A solução? Sobreisso não direi uma só palavra, masterminarei com uma citação feitapor Mohandas Gandhi e, aomesmo tempo, com um conviteao diálogo: A não-violência é oprimeiro artigo da minha fé(Gandhi, M. apud Figueredo,

Carlos. 100 discursos históricos,2002, p.306).

1 Essa indagação retira a paz do

intelecto. Histor icamente temos

algumas hipóteses e muitas crenças.

Para Richard Gordon, cientif ica-

mente, embora seja deprimente, não

passamos de sacos à prova d‘água

cheios de produtos químicos car-

regados de eletricidade que um dia

sofrem uma pane de força. In. A

assustadora história da medicina, p.

32.2 http://www.ghente.org/bioetica/

historico.htm3 Michael Palmer em Problemas

morais em medicina: curso prático.

Tom Beauchamp, Princípios da ética

biomédica; Raymond Devettere,

Practical Decision Making in Healthy

care ethics; Thomas Mapes, Biomedical

ethics; Gregory Pence, Classic cases

in medical ethics por exemplo.

Cadernosde Ética em 19Pesquisa

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Comissão Nacional de Éti-ca em Pesquisa (Conep)foi criada pela Resolução

Em dia

Oito anos de evolução: umbalanço do sistema CEP-ConepPor Corina Bontempo D. de Freitas, Mirian Lobo e William Saad Hossne

Corina BontempoDuca de Freitas émédica pediatra esanitarista, SecretáriaExecutiva - CONEP.

Mirian Lobo é médicapediatra e sanitarista,Consultora da CONEP.

William Saad Hossne émédico, professortitular e prof. honoriscausa/UNESP,Coordenador da CONEP.

A196/96 do Conselho Nacional deSaúde (CNS) como órgão de con-trole social para analisar e acompa-nhar os aspectos éticos das pesqui-sas em seres humanos, desenvolverregulamentação sobre proteção dossujeitos de pesquisa e constituir umainstância final de recursos para qual-quer das partes interessadas. Temum papel coordenador da rede deComitês de Ética em Pesquisa(CEP) criados nas instituições comos quais forma o Sistema CEP-Conep. Constitui-se também emórgão consultor junto ao Ministérioda Saúde (MS) e outros órgãos do

Cadernos20 de Ética em

Pesquisa

Resoluções complementares 196/96, para áreastemáticas específicas

Tabela 1

Ano Resolução Observação1997 Resolução CNS 251/97 Para a área temática especial de novos fármacos, vacinas e testes

diagnósticos. Delega aos Cep a análise final dos projetos exclusivosdessa área, quando não enquadrados em outras áreas especiais.

1999 Resolução CNS 292/99 Para protocolos de pesquisa com cooperação estrangeira. Requisitode aprovação final pela Conep, após aprovação do Cep.

2000 Resolução CNS 303/00 Para a área de Reprodução Humana, estabelecendo subáreas quedevem ser analisadas na Conep e delegando aos Cep a análise deoutras subáreas.

2000 Resolução CNS 304/00 Para a área de Pesquisas com Povos Indígenas, a serem apreciadasna Conep após aprovação nos Cep.

2004 Resolução CNS 340/04 Para pesquisas em genética humana. Estabelece critérios para análisena Conep e para aprovação final delegada aos Cep.

2005 Resolução CNS 346/05 Para projetos multicêntricos do grupo I, definindo o envio apenas doprojeto do primeiro centro à Conep e delegando aos Cep dos outroscentros a aprovação final.

2005 Resolução CNS 347/05 Para projetos que incluem armazenamento ou uso de materiaisbiológicos armazenados (formação de bancos de materiais).

Fonte: Secretaria Executiva da Conep, 2005

Sistema Único de Saúde (SUS).Tem ainda a atribuição de apreciar

projetos de pesquisa a seremdesenvolvidos em áreas temáticasespeciais, após análise e aprovaçãoprévia pelos CEP. São áreas defi-nidas pelo CNS, escolhidas porcritério de risco e que encerramdilemas éticos mais complexos. Comessa atividade a Conep vem acumu-lando experiência que permitiu aelaboração de diretrizes e normascomplementares, que propõemrequisitos específicos para análiseética dos projetos de pesquisa e sãode fundamental importância paradelegação progressiva de respon-sabilidade aos Comitês (Tabela 1).Tais diretrizes abrangem as principais

áreas e orientam pesquisadores,patrocinadores, público em geral eo próprio sistema CEP-Conep naproposição e avaliação de pesquisas.

Os Comitês de Ética cumprem amissão de zelar pela proteção aossujeitos da pesquisa em nome dasociedade, de forma independente(múnus público), ao qualificareticamente os projetos. Tornam-se,assim, co-responsáveis pela parteética, juntamente com o pesquisador(cuja responsabilidade é indelegávele intransferível), a instituição e opatrocinador para assegurar orespeito aos direitos dos sujeitos depesquisa.

O presente trabalho resulta daanálise de dados levantados em 2005

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na Comissão Nacional de Ética emPesquisas (Conep), vinculada aoCNS. Foram consultados relatóriosanuais, arquivos de pareceres deprojetos e o sistema interno deinformação do órgão, com data atéfinal de 2004, portanto, a análisecontempla 8 anos de atividade darede CEP-Conep. Assim, estedocumento preliminar constituisubsídio oferecido ao planejamentodas atividades do Sistema CEP-Conep para os próximos anos.

▲▲

Cadernosde Ética em 21Pesquisa

Evolução do registro de CEP de 1997 a 2004

Tabela 2

ANO Nº de CEP Nº de CEP Nº de CEP

registrados no ano registrados no ano registrados no ano

1997 112 112

1998 72 184 6

1999 58 242

2000 45 287

2001 46 333 4

2002 42 375 02

2003 49 390 31

2004 50 415 19Fonte: Secretaria Executiva da Conep, 2005

Aos CEP é atribuída a respon-sabilidade da avaliação prévia deprojetos de pesquisa a seremdesenvolvidos, o acompanhamentoda execução das pesquisas e odesenvolvimento de atividadeseducativas objetivando a construçãode uma cultura de reflexão éticaentre os diversos atores envolvidos.Desde 1997 as instituições come-çaram a criar seus Comitês. Até ofinal de 2004 foram avaliadas 650solicitações de registro na Conep.Ao final desse período, 415 CEPmantinham-se em funcionamento,incluindo os que preencheram ascondições de registro e os quetiveram seu registro renovado(Tabela 2). Alguns tiveram o regis-tro cancelado após avaliação decondições mínimas de funciona-mento de acordo com a Resolução196/96 e critérios aprovados noCNS (Figura 1). Os CEP apre-sentam uma média de 11 membros

Visão do Sistema pelos dados disponíveis

Regiões QuantidadeCentro-Oeste 22Nordeste 59Norte 19Sudeste 241Sul 74Total 415

Fonte: Secretaria Executiva da Conep, 2005

Comitês de Ética em Pesquisa institucionaisFigura 1

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Fonte: Secretaria Executiva da Conep, 2005

Composição dos CEP por profissão - 06/2003

Gráfico 1

por Comitê e um caráter multi-disciplinar, como evidenciado emlevantamento de 2003 (Gráfico 1),o que permite estimativa de cercade 5 mil pessoas envolvidas naavaliação ética dos projetos depesquisa no país.

Dentre os CEP registrados atéjulho/05, 75% eram de insti-tuições públicas e 35% de insti-tuições privadas. Cerca de 50%desses CEP foram criados emuniversidades ou faculdades eoutros 30% em hospitais, muitosdeles também ligados a uni-versidades.

A evolução das atividades dos CEP e oseu acompanhamento pela Conep

Com o funcionamento regular dosCEP observou-se aumento ano aano dos projetos captados peloSistema, inclusive os de áreastemáticas especiais apreciados naConep. Isso reflete a estruturaçãoprogressiva do Sistema e um incre-mento real das atividades de pesquisano país. Verificou-se também,notável aumento de projetos daindústria farmacêutica, responsávelpor 70% dos projetos de cooperaçãoestrangeira apresentados (projetosmulticêntricos internacionais).Observou-se também uma propor-ção cada vez maior de projetos da

área de Genética Humana.Observou-se aumento progressivo

e importante de projetos de áreastemáticas especiais enviados à Conepaté 2002 e um incremento menorde 2002 a 2004, quando foramrecebidos 1.738 projetos. Com aaprovação do novo fluxo de trami-tação de projetos multicêntricos(Resolução 346/05) espera-se dimi-nuir significativamente o número deprojetos enviados à Conep a partirdo segundo semestre de 2005, umavez que somente o primeiro dosmulticêntricos deverá ter aprovaçãoda Conep (Tabela 3).

A principal forma de acom-panhamento do trabalho dos CEPconsiste na apreciação de projetosde áreas temáticas especiais apro-vados previamente pelos mesmos.Complementa-se esse acompa-nhamento mediante relatóriostrimestrais, notificações de eventosadversos e emendas, consultas esolicitação de renovação de registroenviados pelos Comitês.

Em 2004, a Conep emitiu 2.650pareceres para 1.738 projetosapresentados. Dos projetos decooperação estrangeira, a grandemaioria corresponde a projetosmulticêntricos de novos medica-mentos, vacinas ou testes diag-nósticos (1.181). Eles distribuem-se em 7% de projetos de fase I, 19

Cadernos22 de Ética em

Pesquisa

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% de fase II, 60 % de fase III e 14%de fase IV (Gráfico 2). Estes1.181 foram projetos enviados portodos os Comitês, correspon-dendo, porém, a 259 protocolosdiferentes com uma média de 4 a5 centros participantes em cadaprotocolo (259 multicêntricos).

Comparando-se a situação dosprojetos ao receberem o primeiroparecer na Conep viu-se que de1998 a 2002 foi crescente o númerode projetos em condições de seremaprovados (Gráfico 3). Nota-seque o número de projetos com pen-dências caiu progressivamente de70% a 30% até 2002. Entretanto, em2003 e 2004, houve aumento donúmero de projetos com pendências,superando 50%, cujos pareceresapresentavam requisitos para escla-recimentos e modificações nos proto-colos. De 1998 a 2004, o percentualde projetos não aprovados porenvolverem situações de riscoinaceitáveis para os sujeitos depesquisa, dentre todos os projetosanalisados, incluindo-se os multi-cêntricos, variou de 3% a 5%.

Para identificar os motivos dependências resultantes de difi-culdades na aplicação das diretrizespara pesquisa em seres humanos,foram selecionados os 636 projetosde pesquisa submetidos à pauta dereuniões da Conep em 2004.Considerou-se, portanto, apenasum de cada projeto multicêntrico.Observou-se que dentre os pro-jetos apreciados, 383 receberam oprimeiro parecer com pendências(60%). Foram sorteados, aleato-riamente, 125 dos projetos compendências (30%) cujos pareceres

foram classificados de acordo comos motivos citados, com base naadequação à regulamentação, ecomparados com dados dos anosanteriores.

Verificou-se que protocolosincompletos e Termos de Consen-timento Livre e Esclarecido (TCLE)inadequados continuam sendo osmotivos principais de pendências(Tabelas 4 e 5) . Houve aumentode óbices relacionados ao uso,estocagem e envio de materiais

biológicos ao exterior, incremento deproblemas relativos a desconti-nuidade do tratamento, quebra deconfidencialidade no acesso aprontuários e dados pessoais einadequações na metodologia. Taistendências revelam lacunas nosprotocolos quanto ao cuidado comos sujeitos de pesquisa e maioratenção e acurácia da Comissão naidentificação de situações persisten-temente classificadas como ina-dequadas, principalmente, nos

Evolução do nº de projetos de áreas temáticasespeciais apreciados na Conep - 1997 a 2004

Tabela 3

ANO N de projetos % aumento em relação

apresentados ao ano anterior

1997 169 -

1998 265 57

1999 559 111

2000 958 71

2001 1.317 37

2002 1.563 19

2003 1.537 -

2004 1.738 13Fonte: Secretaria Executiva da Conep, 2005

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Cadernosde Ética em 23Pesquisa

Projetos do Grupo I - segundo as Fases

Gráfico 2

Fonte: Secretaria Executiva da Conep, 2005

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projetos multicêntricos internacionaisde novos fármacos.

Dentre os 636 projetos de pesquisaanalisados, 42 não foram aprovados.Os pareceres foram também classi-ficados pelos motivos da nãoaprovação. Ressalta-se que nessegrupo estão 31 projetos que nãoforam aprovados logo no primeiroparecer e 11, onde exigênciasexplicitadas no parecer inicial ou nosegundo ou mesmo no terceiroparecer pendente não foram aten-didas, resultando em parecer final denão aprovação (Tabela 6). Todosos projetos distribuídos por áreastemáticas especiais, estão explicitadosno Gráfico 4 e na Tabela 7. Osprojetos não aprovados, classificadospor áreas temáticas especiais, podemser vistos na Tabela 8.

Um dos aspectos mais impor-tantes do acompanhamento daspesquisas corresponde à vigilância deeventos adversos de drogas em teste,principalmente os classificados comograves. A Conep recebe as notifi-cações de eventos adversos e avaliase houve análise do pesquisador, suaconduta frente aos sujeitos e aavaliação destas pelos CEP. Enviaposteriormente as notificações àAnvisa. Foram analisadas na Conep,em 2004, 5.721 notificações deeventos adversos (a maioria ocorridafora do país, em estudos de coo-peração estrangeira, com repetidasnotificações por todos os centrosparticipantes). Desde o início de2000, a Conep vem orientando osCEP quanto ao monitoramentodesses eventos, enfatizando a neces-sidade de posicionamento dospesquisadores responsáveis quanto

Tabela 4

Distribuição de pendências nos projetosenviados a Conep - 2004 - problemas relativosa formação do protocolo

Especificação nos pareceres pendentes N %Informações inadequadas quanto aos sujeitos de pesquisa: 29 33(sem caracterização da amostra ou informações incoerentes/sem plano de recrutamento)Orçamento ausente, incompleto ou confuso 25 29Sem informação sobre o país de origem ou sobre a realização 25 29do estudo no país de origem; sem justificativa quando não érealizado no país de origem; ausência de doucmento deaprovação ética no paí de origemSem informação de autoria, coordenação internacional 11 13ou patrocinadorAusência de currículo / muito resumido ou não traduzido 9 10Classificação errônea da área temática 8 9Pesquisa genética como subestudo, sem protocolo completo 6 7Sem anuência da instituição responsável 5 6Outros motivos 14 16Total de projetos com pendências relativas à formação 87 100(*)do protocolo

(*) Obs.: Os pareceres apresentaram 1 ou mais pendências, portanto, os itens não são excludentes.Fonte: Secretaria Executiva da Conep, 2005

Cadernos24 de Ética em

Pesquisa

Classificação dos projetos apreciados na Conepno primeiro parecer (%) - 1998 a 2004

Gráfico 3

Fonte: Secretaria Executiva da Conep, 2005

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às medidas de proteção dos sujeitosde pesquisa e à apreciação do CEPinstitucional. Observou-se evoluçãofavorável na qualidade das notifi-cações, que passaram a incluir ascondutas do pesquisador e do CEP,efetivando-se dessa forma as medidasde segurança para os sujeitos de pes-quisa. Não se conta ainda comsistema de vigilância regulamentadoe implementado pela Anvisa, aguar-dando-se este apoio imprescindívelpara a segurança dos sujeitos.

A Conep acompanha também otempo de demora dos projetos nosCEP, do CEP até a chegada àComissão e na própria Conep. Em2003, o primeiro parecer da Coneppara 90% dos projetos foi emitidodentro de 60 dias. Em 2004, estepercentual foi de 79%. Há umesforço contínuo de agilização naapreciação dos projetos, o que temlevado à realização de reuniõesextraordinárias da Comissão sempreque necessário. Porém, pode-se ver-ificar a repercussão do aumento deprojetos com pendências nos últimosanos (50% de pendências no primeiroparecer, em 2003, e 60%, em 2004)no aumento do tempo de aprovaçãofinal. Por outro lado, melhorracionalidade no fluxo está sendoalcançada com a Resolução 346/05,com avaliação pela Conep apenas doprotocolo do primeiro centro no casodos multicêntricos, o que, junto coma delegação da maior parte dosprojetos de genética aos CEP pelaResolução 340/04, poderá levar adiminuição e racionalização noencaminhamento de protocolosdependentes de aprovação naComissão, evitando-se repetições.

Distribuição das inadequações do TCLE como pen-dências nos protocolos enviados à Conep (2004)

Tabela 5

Especificações nos pareceres pendentes Nº %TCLE incompleto / muito resumido 24 26Informações inadequadas sobre riscos/benefícios 21 22Linguagem inacessível 19 20Uso posterior de material biológico sem informaçãosobre armazenamento 19 20Cláusula de indenização restritiva 15 16Sem formas de contato com o pesquisador , CEPou instituição 12 13Informações em desacordo com o protocolo 12 13Ausência de TCLE para grupo controle 7 7Página e assinatura apresentadas como documento à parte(não integrada ao texto de esclarecimentos – corpo do TCLE) 6 5Não obtenção do consentimento sem justificativa 5 5Não descreve o processo de obtenção do consentimento 3 3Total de projetos com uma ou mais pendênciasreferentes ao TCLE 94 100(*)

(*) a soma não corresponde a 100% porque os itens não são excludentes.Fonte: Secretaria Executiva da Conep, 2005

Área temática especial dos projetosanalisados na Conep

Gráfico 4

Fonte: Secretaria Executiva da Conep, 2005

Ressalta-se também que uma partedos projetos encerra dilemas éticosimportantes, o que justifica maiorprazo para análise. Alguns dependem,

inclusive, de consulta a pareceristasad hoc (especialistas). Portanto,verificou-se que um período longopara aprovação nos CEP e na Conep▲▲

Cadernosde Ética em 25Pesquisa

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está relacionado, principalmente,à apresentação de protocolos semconformidade com as diretrizes

Atividades educativas e odesenvolvimento do Sistema

Motivos de não aprovação Projetos Grupo I (2004)

Tabela 6

(*) Obs: 11 receberam 1º parecer com pendências e 31 receberam1º parecer não aprovadoFonte: Secretaria Executiva da Conep, 2005

Especificações nos pareceres de projetos não aprovados NºProtocolo incompleto /sucinto /confuso /deficiência de informações 14Retorno de benefícios: ausência em estudo epidemiológico / 11não informado /falta aconselhamento genético /semacesso a resultados de exame/não estipula os cuidados com sujeitosMetodologia inadequada /inconsistente /sem fundamentação 9Sem análise risco/benefício /análise insuficiente/inadequada / 8risco sobrepondo benefício: procedimentos com placebo nãoinócuosSem justificativa ética para placebo ou washout /justificativa inaceitável 7Exposição de população vulnerável sem justificativa /não explicita 6as medidas de proteçãoContinuidade de tratamento não assegurada 4Confidencialidade /sigilo não garantida /facilidade de acesso às 4informações por terceirosMaterial biológico: armazenamento: injustificado /informações 4insuficientes sobre uso e destino e sobre formação de biobanco/armazenamento por + de 5 anosCláusula de indenização /inadequada /restritiva/ambígua 2Não justifica o envio de material biológico p/exterior/ 2justificativa inaceitável /comercialização de órgãos.Informações insuficientes de fases anteriores 1Outros: ganhos financeiros indevidos (genoma); sem transferência 7de tecnologia; pesquisa envolvendo embriões humanos; medicamentoretirado do mercado; cooperação estrangeira sem clareza naparceria; estudo principal não aprovado; conflito de interesses pelaforma indevida de recrutamento de pesquisadoresTotal de projetos não aprovados 42(*)

(responsabilidade inicial dospesquisadores), no entanto,podendo também, em pequena

parte, ser reflexo de deficiênciade estrutura e condições defuncionamento.

A Conep vem publicando osCadernos de Ética em Pesquisadesde julho de 1998, com o apoiofinanceiro da Coordenação doDST/Aids e da Abrasco. Já foramdistribuídas 15 edições. Essa temsido uma importante via decomunicação com os CEP, sendotambém instrumento educativo eespaço de discussão sobre diversospontos de vista.

Foi também editada uma publi-cação bilíngüe (português-inglês)contendo as resoluções do CNSpertinentes à ética em pesquisa. Otexto foi distribuído aos CEP,empresas farmacêuticas, órgãosinternacionais, entre outros. Umfolder com informações sobre osistema de acompanhamento de éticaem pesquisas foi igualmente divul-gado em diversos eventos, inclusivenas 11ª e 12ª Conferências Nacionalde Saúde. O Manual Operacionaldos CEP (elaborado com a partici-pação de 10 coordenadores deComitês), editado em 2002, 2004 e2005, tem auxiliado na implantaçãodas normas básicas para funciona-mento dos CEP. Foi construída umapágina na internet (http://conselho.saude.gov.br) para dar apoioaos diversos usuários do Sistema, naqual podem encontrar informaçõesbásicas, resoluções e outros docu-

mentos de referência.Em 1999 e 2000, os Encontros

Regionais de Integração dos CEP

para as regiões Centro-Oeste,Sudeste e Sul, além dos realizadosem São Paulo, se constituíram em

Cadernos26 de Ética em

Pesquisa

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importantes fóruns de discussãosobre a ética em pesquisa. Foramrealizados ainda cursos de Ciência,Tecnologia e Ética em Pesquisa emManaus e Belém (para Estados daRegião Norte), como parte deplano de ação do Planorte -DECIT/SPS/MS.

Com base nesses dados e naavaliação dos protocolos que chegamdos CEP vêm sendo implementadasações de avaliação e de apoio aodesenvolvimento do Sistema. Emmarço de 2000 foi feito recadas-tramento dos CEP já registrados, viaDisque-Saúde, para identificar ascondições de seu funcionamento.Foram identificadas dificuldadesoperacionais, principalmente, quantoàs condições físicas e de recursoshumanos (salas, arquivos, funcio-nários administrativos, etc.). Osdados foram discutidos com oscoordenadores no I EncontroNacional de CEP, em agosto/2000.

Avaliação semelhante foi realizadaem 2002. Com base numa primeiraanálise da situação dos CEP feita apartir de questionários e de requisitosexpressos nas resoluções do CNS,construiu-se uma relação de critériospara classificação dos Comitês, comrequisitos para registro, renovaçãoe funcionamento dos CEP. Essescritérios foram aprovados pelaConep e pelo Conselho Nacional deSaúde, tendo sido divulgados a todosos Comitês com o intuito deestimular a auto-avaliação e ascorreções necessárias. Os CEP semcondições mínimas de funcio-namento vêm sendo identificados epodem ter o registro cancelado. Osdados disponíveis, compilados nos

ÁREA TEMÁTICA ESPECIAL PROJETOSNº %

Genética humana 192 30,1Genética humana - (1) 169 26,6Genética + Cooperação estrangeira – (1 e 8) 15 2,4Genética + Reprodução humana ( 1 e 2) 4 0,6Genética e População indígena – (1 e 7) 3 0,5Genética humana + Biossegurança – (1 e 8)) 1 0,2Reprodução humana 16 2,5Reprodução humana (2) 11 1,7Reprodução humana +Cooperação estrangeira - (2 e 8) 1 0,2Reprodução humana +Genética ( 1 e 2) 4 0,6Novos equipamentos e dispositivos 6 0,9Novos equipamentos e dispositivos – (4) 5 0,8Novos equipamentos +Novos procedimentos – (4 e 5) 1 0,2Novos procedimentos 49 7,7Novos procedimentos – (5) 46 7,2Novos Fármacos +Novos procedimentos – (3 e 5) 2 0,3Novos procedimentos +Biossegurança – (5 e 7) 1 0,2População indígena (6) 47 7,4População indígena (6) 42 6,6População indígena +Genética (1 e 6) 3 0,5População indígena + Cooperação estrangeira 2 0,3Biossegurança – (7) 5 0,8Biossegurança – (7) 4 0,6Biossegurança + Genética humana (1 e 7)) 1 0,2Cooperação estrangeira 338 53.1Cooperação estrangeira - (8) 59 9,3Cooperação estrangeira + Genética– (1 e 8) 15 2,4Cooperação estrangeira +Reprodução humana - (2 e 8) 1 0,2Cooperação estrangeira +Novos Fármacos - (3 e 8) 251 39,5Cooperação estrangeira +Novos procedimentos – (5 e 8) 5 0,8Cooperação estrangeira +Novos equipamentos - (4 e 8) 4 0,6Cooperação estrangeira +População indígena (6 e) 2 0,3Coop. Estrangeira + Novos Fármacos +Novos Equip.– (3,4 e 8) 1 0,2A critério do Cep – (9) 6 0,9A critério do Cep – (9) 5 0,8A critério do Cep + Novos Fármacos – (3 e 9) 1 0,2Total Analisado 636* 100*

Tabela 7

Distribuição dos projetos do Grupo I por ÁreaTemática Especial - Conep - 2004

(*) Obs: não corresponde à soma por ter projetos classificados em mais de uma área temática -multicêntricos foram contados uma vez.Fonte: Secretaria Executiva da Conep, 2005

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Cadernosde Ética em 27Pesquisa

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relatórios anuais da Conep vêmsubsidiando estratégias de ação,como a parceria com o Depar-tamento de Ciência e Tecnologia doMinistério da Saúde (DECIT/MS)para o Projeto de Fortalecimento deCEP, que inclui financiamento paraestrutura física e capacitação demembros. Esse projeto contemplou34 Comitês, no primeiro ano, 60CEP, no segundo, e 107, no terceiroano (em andamento em 2005).Tem sido intensa a iniciativa dasinstituições na organização de cursose seminários com participação daCoordenação, membros e técnicosda Conep e de CEP, além doenvolvimento em encontros e con-gressos de diversas áreas.

Em 2001 foi elaborada umaproposta de desenvolvimento daavaliação e acompanhamento dosCEP, nos moldes definidos pelasResoluções 196/96 e 251/97. Oobjetivo era complementar asatividades de capacitação e fortale-cimento dos Comitês e de implan-tação do Manual Operacional dosCEP. Foi então elaborado Projetode Avaliação e Acompanhamentodos CEP, em colaboração com oDECIT, com consultoria especia-lizada, que possibilitou conhecer operfil de funcionamento dos Comi-tês, seu relacionamento intra-institucional e com a Conep.Entretanto, não se obteve recursospara a implementação da segundafase, com visitas interpares (feitas pormembros de outros CEP) e, desdeentão, vem sendo incluída noplanejamento das atividades daComissão, para obtenção de condi-ções, recursos humanos e materiais

necessários à sua implementação.Pela Conep tramita grande

número de documentos. Verifica-seque em 2004 a Comissão foi osegundo setor do Ministério daSaúde que mais recebeu corres-pondências (incluindo projetos,notificações de eventos adversos,relatórios e correspondências dosCEP para registro e renovação deregistro, consultas variadas, etc.). OSipar indicou, na época, a entradade 8.106 documentos na Comissão.Há, ainda, grande quantidade deconsultas via e-mail e telefone sobreas diretrizes das resoluções e sobreos aspectos operacionais dos CEP.

Está em implantação um sistemainformatizado on line interligando osCEP e a Conep. O Sistema Nacional

de Informações sobre Ética emPesquisa (Sisnep), com banco dedados único, possibilita o registro doprotocolo pelo próprio pesquisadore consultas dos diversos usuários:pesquisadores, CEP, Conep epúblico em geral, com disponi-bilização seletiva de informações. Talproposta vem sendo desenvolvida emparceria com o Datasus e o Decitestando em fase de finalização, sendoque já funciona em cerca de 50%dos CEP. O Sisnep contribuirá paraa universalização da apreciaçãoprévia das pesquisas, a agilização dosprocedimentos de aprovação e adescentralização das atividades.

O desenvolvimento do sistemafundamenta-se, portanto, no acú-mulo de experiência em todos os

Área Temática Especial Nº Projetos %Novos Fármacos + Cooperação Estrangeira- (3 e 8) 13 30,1Cooperação Estrangeira - (8) 9 21,4Genética Humana – (1) 6 14,3Novos Procedimentos – (5) 4 9,5Populações Indígenas – (6) 2 4,8Novos Procedimentos + CooperaçãoEstrangeira - (5 e 8) 2 4,8Genética Humana + CooperaçãoEstrangeira - (1 e 8) 2 4,8Reprodução Humana - (2) 1 2,4Genética Humana + Reprodução Humana– (1 e 2) 1 2,4Genética Humana + Novos Fármacos +Cooperação Estrangeira - (1,3 e 8) 1 2,4Novos Equipamentos/dispositivos +Cooperação Estrangeira - (3,4 e 8) 1 2,4Total de Projetos 42 100,0

Fonte: Secretaria Executiva da Conep, 2005

Projetos não aprovados por área temática (2004)

Tabela 8

Cadernos28 de Ética em

Pesquisa

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níveis, valorizando o inter-relaciona-mento na avaliação de casos maiscomplexos e estabelecimento decritérios e linguagem comuns, papelessencial que vem sendo exercidopela Conep, principalmente atravésde estudo e emissão de pareceres deprojetos referenciados a ela. Para oalcance de um sistema competentee ágil, ações prioritárias foramdefinidas e estão em andamento,conforme já citado anteriormente,com parcerias dentro do Ministérioda Saúde e instituições de pesquisa.Entre elas, citamos:

> Elaboração de diretrizes éticaspara áreas temáticas especiais eorganização e revisão do fluxo deaprovação de projetos;

> Capacitação e estruturação dosCEP, em parceria com o Decit/SCTIS/MS e CEP institucionais;

> Elaboração, implantação eatualização do Manual Operacionalpara CEP, em parceria com osComitês institucionais e MS;

> Construção e implantação doSisnep, com a colaboração doDatasus;

> Avaliação contínua do perfilético dos projetos e do desempenhodo Sistema a partir de dadosgerenciais;

> Estímulo à avaliação externa doSistema apoiado pelo Decit e CNPq.

Ao final de 8 anos de trabalho,verifica-se ampla adesão aoSistema de acompanhamentoético dos projetos de pesquisa, oque está demonstrado pelos 415CEP integrados através da Conepaté dezembro de 2004 (448 atésetembro de 2005).

Na Tabela 9 estão distribuídas as

20 CEP que mais enviaram projetos (2004)Tabela 9

CEP institucionais Nº ProjetosNº %

UNIFESPP / EPM 110 6,4FCM UNICAMP 92 5,3FM RIB. PRETO / USP 70 4,0HC PORTO ALEGRE 52 3,0HC FM USP 51 3,0PUC/RS 40 2,3HOSP. HELIÓPOLIS 40 2,3SANTA CASA SP 39 2,3MAT. CLIMÉRIO OLIVEIRA / UFBA 29 1,7INCA / RJ 27 1,2HOSP. ALBERT EINSTEIN 27 1,2UFMG 26 1,5HC UF GOIÁS 26 1,5HOSP. SERV. PÚBLICO ESTADUAL / SP 25 1,4HU PEDRO ERNESTO / UERJ 25 1,4HC UF PARANÁ 25 1,4FM BOTUCATU / UNESP 25 1,4HU WALTER CANTÍDIO / UFCE 22 1,3HU CLEMNTINO F. Fº / UFRJ 21 1,2SANTA CASA DE BH 20 1,2TOTAL (*) 1738 100,0(*) Total Geral (inclui projetos de todas as instituições)Total de Ceps que enviaram projetos=235Fonte: Secretaria Executiva da Conep, 2005

20 instituições que mais enviaramprojetos à Conep naquele ano. Apartir do total de 1.738 projetosrecebidos pela Conep e estimando-se que correspondam a 10% dos quepassam pelos CEP, pode-se inferirque o Sistema CEP-Conep teriacaptado cerca de 17 mil projetos depesquisa envolvendo seres humanosem 2004. Estimando-se uma médiade 40 sujeitos de pesquisa porprojeto (com base em levantamentodos que chegam à Conep), issosignificaria cerca de 680 mil pessoas

diretamente envolvidas em pesquisasem todo o país.

A eficácia do Sistema pode seravaliada pelo seu papel protetor,considerando os diversos atores:os sujeitos, os pesquisadores, ospatrocinadores e o próprio go-verno. Em diversos países têm sidodenunciados abusos, mobilizandoa opinião pública. Verificou-se, noentanto, que o Brasil não foi citadopela imprensa internacional aomencionar locais onde a falta denormas e de estruturas de controle

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Cadernosde Ética em 29Pesquisa

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social levaram à exploração depopulações mais vulneráveis empesquisas de HIV/Aids.

Com os projetos que não foramaprovados em 2004, cerca de 30mil sujeitos foram protegidos departicipação em situações desfavo-ráveis. Além disso, considerávelproporção de sujeitos foi protegidapelas modificações nos protocolosexigidas antes da aprovação final dosprojetos após atendimento dependências.

Casos de descumprimento dasresoluções têm sido encaminhadosatravés de processos administrativosnas instituições e da intervenção dosconselhos profissionais e do Minis-tério Público dos Estados e daUnião. Esse modelo de sistema deregulação das pesquisas no Brasil temsido reconhecido internacional-mente. Foi apresentado em Reuniãoda Comunidade Européia, emPortugal, em 2000, e em WorkshopInternacional sobre Regulação dePesquisas Envolvendo Seres Huma-nos, no Canadá, em 2005. Desde2004, o Brasil tem representação naComissão Internacional de Bioéticada Unesco, através do seu Coor-denador da Conep.

Comentários finais

A análise dos dados vem mos-trando a evolução favorável naqualidade do funcionamento doSistema CEP-Conep. Aponta,também, as principais dificuldadese os pontos prioritários a seremtrabalhados com vistas à dimi-

nuição de resistências às normas eatendimento às expectativas daparte de patrocinadores e pes-quisadores da área de testes denovos medicamentos, principal-mente quanto a prazos e à algunsprocedimentos para aprovação dosprojetos. Destaca-se a necessidadede trabalhar com os Comitêsquestões relativas às dificuldades naaplicação das normas na apreciaçãoética dos projetos de pesquisa. Osdados levantados, tais como osmotivos de pendências e de nãoaprovação, devem ser objeto deanálise e reflexão pelos CEP.Questões relevantes, referentes àexperiência dos CEP e suas formasde organização e inserção institu-cional, precisam ser percebidas apartir da visão dos própriosparticipantes dos Comitês, ressal-tando-se a importância da viabili-zação das visitas interpares emprojeto de avaliação que possatrazer resultados diretos na melho-ria do Sistema.

A necessidade da realização doII Encontro Nacional dos Comitêsde Ética em Pesquisa também seevidencia, considerando-se que oaperfeiçoamento e a consolidaçãodo Sistema CEP-Conep passa peloengajamento efetivo da sua base(os CEP) e da sua coordenação (aConep e o CNS), mediante pro-cesso de discussão e reflexão quepossibilite a identificação de fatoresdeterminantes de maior capacidadede proteção de sujeitos de pesquisae de formas de consolidação destapolítica pública de controle social

no Brasil.A Conep tem ainda metas e

desafios permanentes que conti-nuam a fazer parte da agenda paraaumentar a abrangência do Siste-ma, ou seja, a capacidade decaptar projetos de áreas diversaspara apreciação nos CEP. Entreos objetivos, ressaltam-se:

> Promover a atuação integradae eficaz dos CEP, com critérios eprocedimentos comuns, atravésdo estímulo à formação de seusmembros;

> Sensibilizar as instituições nosentido de oferecer as condiçõesmínimas estruturais ao funciona-mento dos CEP, visando indepen-dência, agilidade e qualidade nostrabalhos, com melhoria na capaci-dade de acompanhamento dosprojetos;

> Rever as responsabilidades doscomponentes do Sistema CEP-Conep e a integração com Conse-lho Nacional de Saúde, ConselhosMunicipais de Saúde, Ministérioda Saúde e outros órgãos do SUS,como Anvisa (acompanhamentodos eventos adversos) e Funasa,além da Funai (pesquisas em áreasindígenas), etc;

> Sensibilizar os órgãos defomento e de publicações cien-tíficas para a exigência de apro-vação ética dos projetos a seremfinanciados ou publicados;

> Promover maior interaçãocom o público, usuários deserviços de saúde, pesquisadorese patrocinadores, com trans-parência e agilidade.Cadernos

30 de Ética emPesquisa

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Índice

EditorialA ética e as Revoluções Científicas ...................................... 3Por William Saad Hossne

DúvidasA CONEP responde ...................................................... 5

ArtigoPesquisas em ciências sociais: aspectosepistemológicos e bioéticos............................................ 8Por Fermin Roland Schramm

ArtigoDireitos humanos e pesquisa em humanos ....................... 16Por Nilo Henrique Neves dos Reis

Em diaOito anos de evolução: um balançodo sistema Cep-Conep ................................................ 20Por Corina Bontempo D. de Freitas, Mirian Lobo e William Saad Hossne

CONEP na internet:http://www.saude.gov.br/sisnep

TITULARES:Anacleto Luiz Gapski, Célia Regina M.Delgado Rodrigues, Gysélle SaddiTannous, Heloisa Helena G. Barboza,Iara Coelho Zito Guerriero, JoséAraujo Lima Filho, Lílian SoaresCosta, Maria da Conceição Pio,Mônica Fragoso, Nilza Maria Diniz,Pedro Luiz Rosalen, Sônia Maria deOliveira Barros e William SaadHossne.

Cadernos de Ética em Pesquisa– Nº 16 – Novembro de 2005 –Publicação da Comissão Nacionalde Ética em Pesquisa – ConselhoNacional de Saúde – CNS/MS

Conselho EditorialSueli Gandolfi DallariMarcos Fábio Gadelha RochaOdilon Victor Porto DenardinWilliam Saad HossneCorina Bontempo de FreitasAlejandra Rotania

Participação Abrasco – Associação Brasileira dePós Graduação em Saúde Coletiva. Coordenação Nacional de DST/Aids do Ministério da Saúde.

UNDCP – Programa das NaçõesUnidas Para o Controle Internacio-nal de Drogas.

OPAS/OMS – Organização Pan-Americana da Saúde/OrganizaçãoMundial da Saúde.

EdiçãoPaulo Henrique de SouzaConsultoria TécnicaCorina Bontempo de FreitasRedação e CopidesqueAlessandro SoaresAlessandro SilvaReinaldo Palmeira

IlustraçõesLui RodriguesDiagramaçãoDual Design GráficoFotolito e ImpressãoGráfica Relevo LtdaTiragem7.000 exemplares

SUPLENTESBruno Rodolfo Schlemper Junior,Christian de Paul Barchifontaine,Cleuza de Carvalho Miguel, Dalton Luizde Paula Ramos, Edvaldo DiasCarvalho, Eliane Eliza de SouzaAzevedo, Heloisa Baccaro Rossetti,Ieda Harumi Higarashi, Jose AntonioGuimarães Ferreira, José TavaresCarneiro Neto, Marcos FábioGadelha Rocha, Odilon Victor PortoDenardin e Vitangelo Plantamura.

INTEGRANTES DA COMISSÃO NACIONAL DE ÉTICA EM PESQUISAConforme Resolução n.0 246, do CNS, de 03/07/97

Comissão Nacional de Ética em Pesquisa/Conselho Nacionalde Saúde/Ministério da Saúde –Esplanada dos Ministérios – Bloco G – sala 421SCEP 70058-900 – Brasília - DFFone (61) 3315-2951 / Fax: (61) 3226-6453e-mail: [email protected]

Todos os artigos podem ser reproduzidos integralmente,desde que a fonte seja citada. Os textos publicados são deresponsabilidade de seus autores.

ExpedienteISSN 1677-4272

CNSSecretária-executiva: Eliane Aparecida Cruz

CONEPCoordenador: William Saad Hossne

Secretária-executiva: Corina Bontempo de Freitas

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