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Informativo 908-STF (05/07/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Informativo comentado: Informativo 908-STF Márcio André Lopes Cavalcante Processo não comentado pelo fato de o julgamento não ter terminado: ACO 444/SC. ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL CONTRIBUIÇÃO SINDICAL É constitucional a lei que extinguiu a contribuição sindical obrigatória. DIREITO ADMINISTRATIVO APOSENTADORIA Funpresp e data limite para adesão ao regime de previdência complementar. DIREITO PENAL MILITAR CRIME MILITAR Configuração de crime militar e licenciamento. DIREITO PROCESSUAL PENAL PROVAS Busca e apreensão ordenada contra o marido da Senadora, mas cujo cumprimento ocorreu no imóvel funcional onde ambos residem: deve-se observar as regras de foro privativo. DIREITO CONSTITUCIONAL CONTRIBUIÇÃO SINDICAL É constitucional a lei que extinguiu a contribuição sindical obrigatória Importante!!! São compatíveis com a Constituição Federal os dispositivos da Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) que extinguiram a obrigatoriedade da contribuição sindical e condicionaram o seu pagamento à prévia e expressa autorização dos filiados. No âmbito formal, o STF entendeu que a Lei nº 13.467/2017 não contempla normas gerais de direito tributário (art. 146, III, “a”, da CF/88). Assim, não era necessária a edição de lei complementar para tratar sobre matéria relativa a contribuições. Também não se aplica ao caso a exigência de lei específica prevista no art. 150, § 6º, da CF/88, pois a norma impugnada não disciplinou nenhum dos benefícios fiscais nele mencionados, quais sejam, subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão.

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Informativo 908-STF (05/07/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Informativo comentado: Informativo 908-STF

Márcio André Lopes Cavalcante Processo não comentado pelo fato de o julgamento não ter terminado: ACO 444/SC.

ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL

CONTRIBUIÇÃO SINDICAL É constitucional a lei que extinguiu a contribuição sindical obrigatória.

DIREITO ADMINISTRATIVO

APOSENTADORIA Funpresp e data limite para adesão ao regime de previdência complementar.

DIREITO PENAL MILITAR

CRIME MILITAR Configuração de crime militar e licenciamento.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

PROVAS Busca e apreensão ordenada contra o marido da Senadora, mas cujo cumprimento ocorreu no imóvel funcional

onde ambos residem: deve-se observar as regras de foro privativo.

DIREITO CONSTITUCIONAL

CONTRIBUIÇÃO SINDICAL É constitucional a lei que extinguiu a contribuição sindical obrigatória

Importante!!!

São compatíveis com a Constituição Federal os dispositivos da Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) que extinguiram a obrigatoriedade da contribuição sindical e condicionaram o seu pagamento à prévia e expressa autorização dos filiados.

No âmbito formal, o STF entendeu que a Lei nº 13.467/2017 não contempla normas gerais de direito tributário (art. 146, III, “a”, da CF/88). Assim, não era necessária a edição de lei complementar para tratar sobre matéria relativa a contribuições.

Também não se aplica ao caso a exigência de lei específica prevista no art. 150, § 6º, da CF/88, pois a norma impugnada não disciplinou nenhum dos benefícios fiscais nele mencionados, quais sejam, subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão.

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Sob o ângulo material, o STF afirmou que a Constituição assegura a livre associação profissional ou sindical, de modo que ninguém é obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato (art. 8º, V, da CF/88). O princípio constitucional da liberdade sindical garante tanto ao trabalhador quanto ao empregador a liberdade de se associar a uma organização sindical, passando a contribuir voluntariamente com essa representação.

Não há nenhum comando na Constituição Federal determinando que a contribuição sindical é compulsória.

Não se pode admitir que o texto constitucional, de um lado, consagre a liberdade de associação, sindicalização e expressão (art. 5º, IV e XVII, e art. 8º) e, de outro, imponha uma contribuição compulsória a todos os integrantes das categorias econômicas e profissionais.

STF. Plenário. ADI 5794/DF, Rel. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgado em 29/6/2018 (Info 908).

Custeio das entidades sindicais Com o objetivo de garantir o seu custeio, a CF/88 assegurou às entidades sindicais duas contribuições diferentes. Veja:

Art. 8º (...) IV — a assembleia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei;

Desse modo, apesar de a redação do inciso ser um pouco truncada, é possível perceber que ele fala em duas espécies de contribuição: 1) Contribuição fixada pela assembleia geral (destacada na primeira parte); 2) Contribuição prevista em lei (destacada na segunda parte). Confira as diferenças que EXISTIAM entre elas:

Contribuição CONFEDERATIVA Contribuição SINDICAL

Prevista na 1ª parte do art. 8º, IV, da CF/88. Prevista na 2ª parte do art. 8º, IV, da CF/88.

Também chamada de “contribuição de assembleia”.

Também chamada de “imposto sindical”, expressão incorreta porque não é imposto.

NÃO é tributo. ERA considerada um TRIBUTO. ERA uma contribuição parafiscal (ou especial).

Fixada pela assembleia geral do sindicato (obrigação ex voluntate).

Era instituída por meio de lei (obrigação ex lege).

É VOLUNTÁRIA. A contribuição confederativa é considerada como voluntária porque somente é paga pelas pessoas que resolveram (optaram) se filiar ao sindicato. A contribuição confederativa de que trata o art. 8º, IV, da Constituição, só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo (SV 40): Súmula vinculante 40: A contribuição confederativa de que trata o artigo 8º, IV, da Constituição Federal, só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo.

ERA COMPULSÓRIA. ERA paga por todos aqueles que faziam parte de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, à Federação correspondente à mesma categoria econômica ou profissional. Não havia jeito: se o indivíduo fosse metalúrgico, p. ex., ele tinha que pagar a contribuição sindical, mesmo que não fosse filiado ao sindicato. ERA um tributo.

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O que fez a Lei nº 13.467/2017? A Lei nº 13.467/2017, conhecida como “Reforma Trabalhista”, alterou os dispositivos da CLT que tratavam sobre a contribuição sindical com o objetivo de fazer com que ela deixasse de ser compulsória e passasse a ser FACULTATIVA. Vamos comparar os principais dispositivos sobre o tema que foram alterados:

CLT

Antes da Lei 13.467/2017 Depois da Lei 13.467/2017

Art. 578. As contribuições devidas aos Sindicatos pelos que participem das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas pelas referidas entidades serão, sob a denominação do "imposto sindical", pagas, recolhidas e aplicadas na forma estabelecida neste Capítulo.

Art. 578. As contribuições devidas aos sindicatos pelos participantes das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas pelas referidas entidades serão, sob a denominação de contribuição sindical, pagas, recolhidas e aplicadas na forma estabelecida neste Capítulo, desde que prévia e expressamente autorizadas.

Art. 579. A contribuição sindical é devida por todos aqueles que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, na conformidade do disposto no art. 591.

Art. 579. O desconto da contribuição sindical está condicionado à autorização prévia e expressa dos que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, na conformidade do disposto no art. 591 desta Consolidação.

Art. 582. Os empregadores são obrigados a descontar da folha de pagamento de seus empregados, relativa ao mês de março de cada ano, o imposto sindical por estes devido aos respectivos sindicatos. (...)

Art. 582. Os empregadores são obrigados a descontar da folha de pagamento de seus empregados relativa ao mês de março de cada ano a contribuição sindical dos empregados que autorizaram prévia e expressamente o seu recolhimento aos respectivos sindicatos. (...)

Art. 587. O recolhimento da contribuição sindical dos empregadores efetuar-se-á no mês de janeiro de cada ano, ou, para os que venham a estabelecer-se após aquele mês, na ocasião em que requeiram às repartições o registro ou a licença para o exercício da respectiva atividade.

Art. 587. Os empregadores que optarem pelo recolhimento da contribuição sindical deverão fazê-lo no mês de janeiro de cada ano, ou, para os que venham a se estabelecer após o referido mês, na ocasião em que requererem às repartições o registro ou a licença para o exercício da respectiva atividade.

Veja, portanto, que o legislador alterou todos os dispositivos que dispunham sobre a contribuição sindical como sendo algo obrigatório, passando a ser tratada como um pagamento facultativo. ADI Algumas entidades sindicais ingressam com ADIs contra essas alterações. Nas ações, as entidades alegaram, dentre outros argumentos, que: • a contribuição sindical foi recepcionada pela Constituição de 1988 como sendo uma contribuição parafiscal (art. 149 da CF/88), ou seja, um tributo;

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• o art. 146, III, “a”, da CF/88 prevê que a instituição de tributos parafiscais e suas definições, espécies, bases de cálculo, fatos geradores e contribuintes devem ser feitas por meio de lei complementar. Ocorre que a Lei nº 13.467/2017 é uma lei ordinária, de modo que teria havido uma inconstitucionalidade formal; • além disso, o fim da obrigatoriedade da contribuição sindical foi promovida pela Lei nº 13.467/2017 que tratou sobre vários outros assuntos. Para as entidades, isso não seria possível porque o art. 150, § 6º, da Constituição exige explicitamente que a matéria seja regulada por meio de lei tributária específica:

Art. 150 (...) § 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g.

• a alteração legislativa teria violado direitos fundamentais previstos no art. 5º da Constituição, especialmente quando ela fala em acesso à Justiça, em direito ao contraditório e à ampla defesa e à assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. Além disso, teria afrontado também os direitos à educação, à saúde, à alimentação, ao trabalho, à moradia, ao transporte, ao lazer, à segurança. Isso porque os sindicatos oferecem assistência judiciária integral e gratuita para os trabalhadores carentes e esses serviços eram custeados com a contribuição sindical obrigatória. Sem essa verba, os sindicatos não poderão mais oferecer essa assistência, o que representa um enorme retrocesso social. O que o STF decidiu? A ADI foi julgada procedente? O fim da obrigatoriedade da contribuição sindical viola a Constituição Federal? NÃO. A ADI foi julgada improcedente e o STF decidiu que:

São compatíveis com a Constituição Federal os dispositivos da Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) que extinguiram a obrigatoriedade da contribuição sindical e condicionaram o seu pagamento à prévia e expressa autorização dos filiados. STF. Plenário. ADI 5794/DF, Rel. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgado em 29/6/2018 (Info 908).

Dispor sobre o fim da obrigatoriedade sindical não significa tratar sobre normas gerais de tributário No âmbito formal, o STF entendeu que o assunto tratado pela Lei nº 13.467/2017 (fim da obrigatoriedade da contribuição sindical) não pode ser considerado como norma geral de direito tributário. Logo, o fim da obrigatoriedade sindical não precisava ter sido veiculado por meio de lei complementar por não se enquadrar na exigência do art. 146, III, “a”, da CF/88, como argumentavam as entidades sindicais:

Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;

Acabar com a obrigatoriedade da contribuição sindical não exige lei específica O § 6º do art. 150 da CF/88 exige lei específica para conceder subsídio, isenção, reduzir base de cálculo e conceder outros “benefícios fiscais”. A Lei nº 13.467/2017 não disciplinou nenhum desses benefícios fiscais. Logo, não se exigia a edição de uma lei específica.

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Livre associação profissional ou sindical Sob o ângulo material, o STF lembrou que a Constituição assegura a livre associação profissional ou sindical, de modo que ninguém é obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato (art. 8º, V). O princípio constitucional da liberdade sindical garante tanto ao trabalhador quanto ao empregador a liberdade de se associar a uma organização sindical, passando a contribuir voluntariamente com essa representação. Não se pode admitir que o texto constitucional, de um lado, consagre a liberdade de associação, sindicalização e expressão e, de outro, imponha uma contribuição compulsória a todos os integrantes das categorias econômicas e profissionais. CF/88 não impõe que a contribuição sindical seja obrigatória “A contribuição sindical não foi constitucionalizada no texto magno”. O que o STF quis dizer com essa frase: não há qualquer comando na Constituição dizendo que deverá ser instituída uma contribuição sindical compulsória, com natureza de tributo, em favor dos sindicatos. O inciso IV do art. 8º da CF/88 prevê que a lei poderá instituir uma contribuição sindical, mas sem mencionar que deva ser obrigatória. Contribuição confederativa é a principal fonte de custeio dos sindicatos Analisando o inciso IV do art. 8º, o STF afirma que fica claro que a contribuição sindical, na forma da lei, é uma fonte de custeio (fonte de receita) subsidiária das entidades sindicais. A principal fonte de custeio é a contribuição confederativa, instituída em assembleia geral. Modelo de gestão sindical é uma decisão política A discussão a respeito do modelo de gestão sindical a ser adotado no Brasil é eminentemente política, cujo protagonista é o Congresso Nacional. O STF deve ser autocontido, de forma a respeitar as escolhas políticas do Legislativo. Sistema sindical moderno Ademais, a reforma trabalhista buscou a evolução de um sistema sindical centralizador, arcaico e paternalista para um modelo mais moderno, baseado na liberdade. O modelo de contribuição compulsória não estimulava a competitividade e a representatividade, levando a um verdadeiro negócio privado, bom apenas para sindicalistas. A sistemática anterior criou um associativismo com enorme distorção representativa. No Brasil, são quase 17 mil sindicatos, enquanto em outros países apenas algumas centenas. A contribuição compulsória vinha gerando oferta excessiva e artificial de associações sindicais, o que configura perda social em detrimento dos trabalhadores. Esse número estratosférico de sindicatos não se revertia em aumento do bem-estar de nenhuma categoria. Nesse contexto, as entidades sindicais frequentemente se engajam em atividades políticas, lançando e apoiando candidatos, conclamando protestos e mantendo estreitos laços com partidos políticos. Ocorre que o discurso político é o núcleo por excelência da liberdade de expressão. Ao exigir que indivíduos financiem atividades políticas com as quais não concordam, por meio de contribuições compulsórias a sindicatos, o regime anterior certamente vulnerava a garantia fundamental da liberdade de expressão, protegida pelo art. 5º, IV, da Constituição. Por sua vez, a nova sistemática leva a um novo pensar da sociedade sobre como lidar com as categorias econômicas e trabalhistas e com as formas de atuação na sociedade, sem depender necessariamente do Estado. Os sindicatos passarão a ser sustentados por contribuições voluntárias, do mesmo modo que as demais associações.

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Votos vencidos Ficaram vencidos os Ministros Edson Fachin, Rosa Weber e Dias Toffoli, para quem as alterações legislativas são inconstitucionais formal e materialmente.

DIREITO ADMINISTRATIVO

APOSENTADORIA Funpresp e data limite para adesão ao regime de previdência complementar

O art. 3º, § 7º, da Lei nº 12.618/2012 e o art. 92 da Lei nº 13.328/2016 previram que os servidores titulares de cargos efetivos da União (inclusive magistrados, membro do MP e do TCU) poderiam aderir, até o dia 29/07/2018, aos planos de benefícios administrados por entidades fechadas de previdência complementar.

Duas associações de magistrados ingressaram com ação requerendo a prorrogação deste prazo.

O STF, contudo, negou o pedido.

O deferimento do pleito representaria indevida manipulação de opção político-normativa do Parlamento.

Ao STF, à semelhança do que ocorre com as demais Cortes Constitucionais, cabe exercer o papel de legislador negativo. É sua a relevante função de extirpar do ordenamento jurídico normas incompatíveis com a Lei Maior, devendo, exatamente por esse motivo, atuar com parcimônia.

Não há, sob o ângulo material ou formal, qualquer traço de incompatibilidade direta com a Constituição Federal.

STF. Plenário. ADI 4885 MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 27/6/2018 (Info 908).

EC 20/98 A EC 20/98 acrescentou o § 14 ao art. 40 da CF/88 prevendo a possibilidade de a União, os Estados, o DF e os Municípios instituírem regime de previdência complementar para seus servidores. Se for instituído esse regime complementar, os servidores passam a receber, no regime próprio, aposentadoria e pensão com valor máximo igual ao que é pago pelo INSS (regime geral de previdência social). O “complemento” a esse valor é pago em um plano administrado por uma entidade privada de previdência complementar:

Art. 40 (...) § 14 - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, desde que instituam regime de previdência complementar para os seus respectivos servidores titulares de cargo efetivo, poderão fixar, para o valor das aposentadorias e pensões a serem concedidas pelo regime de que trata este artigo, o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201. (Incluído pela EC 20/98)

EC 41/2003 A EC 41/2003 alterou o § 15 do art. 40 da CF/88, que também trata sobre esse tema:

Art. 40 (...) § 15. O regime de previdência complementar de que trata o § 14 será instituído por lei de iniciativa do respectivo Poder Executivo, observado o disposto no art. 202 e seus parágrafos, no que couber, por intermédio de entidades fechadas de previdência complementar, de natureza pública, que

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oferecerão aos respectivos participantes planos de benefícios somente na modalidade de contribuição definida. (Redação dada pela EC 41/2003)

Lei nº 12.618/2012 A fim de regulamentar, no âmbito federal, o art. 40, §§ 14 e 15 da CF/88, foi editada a Lei nº 12.618/2012:

Art. 1º É instituído, nos termos desta Lei, o regime de previdência complementar a que se referem os §§ 14, 15 e 16 do art. 40 da Constituição Federal para os servidores públicos titulares de cargo efetivo da União, suas autarquias e fundações, inclusive para os membros do Poder Judiciário, do Ministério Público da União e do Tribunal de Contas da União.

Assim, a Lei nº 12.618/2012 instituiu o regime de previdência complementar para os servidores públicos federais titulares de cargo efetivo, inclusive para magistrados, membros do MPU e do TCU. Além disso, a Lei autorizou a criação de três entidades fechadas de previdência complementar (EFPC) para administrar os planos de previdência complementar dos servidores: I - a Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do Poder Executivo (Funpresp-Exe): para os servidores públicos titulares de cargo efetivo do Poder Executivo; II - a Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do Poder Legislativo (Funpresp-Leg): para os servidores públicos titulares de cargo efetivo do Poder Legislativo e do Tribunal de Contas da União e para os membros deste Tribunal; e III - a Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do Poder Judiciário (Funpresp-Jud): para os servidores públicos titulares de cargo efetivo e para os membros do Poder Judiciário. Como funciona? Com a instituição desse regime de previdência complementar, a União passou a garantir o pagamento da aposentadoria do servidor até o teto do RGPS (INSS), da mesma forma que ocorre com o trabalhador da iniciativa privada. Aquele servidor que quiser receber um valor maior que o teto do INSS quando se aposentar, deverá filiar-se, facultativamente, ao plano de previdência complementar e fazer suas contribuições com direito à contrapartida paritária do Governo. Exemplo: João nunca havia ocupado cargo público e tomou posse, em 2018, como Juiz Federal. Ele tem duas opções: 1) pode decidir não aderir ao Funpresp-Jud: neste caso, ele pagará sua contribuição previdenciária com base no teto do INSS (atualmente R$ 5.645,80). Assim, todos os meses pagaria 11% de R$ 5.645,80 (valor que vai sendo reajustado todo ano) e, quando completar os requisitos, irá se aposentar recebendo o teto do INSS; 2) pode decidir aderir ao Funpresp-Jud: neste caso, ele continuará pagando contribuição previdenciária com base no teto do INSS, mas, além disso, também pagará uma contribuição adicional destinada ao Funpresp-Jud. A União também verterá uma quantia em favor do servidor. Assim, imaginemos que o servidor pague R$ 300,00 para o Funpresp-Jud; a União também verterá esse mesmo valor. A Funpresp-Jud investirá o valor arrecado no mercado financeiro e, quando o servidor completar os requisitos, irá receber duas “aposentadorias”: uma igual ao teto do INSS e outra com base no resultado dos investimentos feitos pelo Funpresp-Jud. Como era antes? Antes, o servidor contribuía sobre o valor que recebia (ex: 11% de R$ 30.000,00) e, quando completava os requisitos recebia o valor da aposentadoria “cheio”, ou seja, sem essa limitação do teto do INSS. Desse modo, temos dois regimes de aposentadoria para os servidores:

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1) Aqueles que ingressaram ANTES da instituição do regime de previdência complementar: podem manter essa forma tradicional de recebimento da aposentadoria (sem limitação ao teto do INSS). Apenas para fins didáticos, vamos chamá-los aqui de “servidores mais antigos”; 2) Aqueles que ingressaram DEPOIS da instituição do regime de previdência complementar: são obrigados a adotar o novo regime de previdência. A única opção que eles vão ter é a de aderir ou não ao Funpresp-Jud. Caso decidam não aderir, irão receber apenas o teto do INSS. Se decidirem aderir, terão direito ao teto do INSS mais a aposentadoria complementar do Fundo. Apenas para fins didáticos, vamos chamá-los de “servidores mais novos”; Os servidores que ingressaram antes da Lei nº 12.618/2012 podem decidir optar pelo novo regime? SIM. Veja o que diz o art. 3º da Lei:

Art. 3º Aplica-se o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social às aposentadorias e pensões a serem concedidas pelo regime de previdência da União de que trata o art. 40 da Constituição Federal, observado o disposto na Lei nº 10.887, de 18 de junho de 2004, aos servidores e membros referidos no caput do art. 1º desta Lei que tiverem ingressado no serviço público: I - a partir do início da vigência do regime de previdência complementar de que trata o art. 1º desta Lei, independentemente de sua adesão ao plano de benefícios; e II - até a data anterior ao início da vigência do regime de previdência complementar de que trata o art. 1º desta Lei, e nele tenham permanecido sem perda do vínculo efetivo, e que exerçam a opção prevista no § 16 do art. 40 da Constituição Federal.

Inciso I: trata dos “servidores mais novos”. Inciso II: trata dos “servidores mais antigos”. Veja que o inciso II fala que os “servidores mais antigos” poderão escolher abandonar o regime de previdência tradicional e aderir ao regime de previdência complementar porque isso é autorizado pelo § 16 do art. 40 da CF/88:

Art. 40 (...) § 16 - Somente mediante sua prévia e expressa opção, o disposto nos §§ 14 e 15 poderá ser aplicado ao servidor que tiver ingressado no serviço público até a data da publicação do ato de instituição do correspondente regime de previdência complementar. (Incluído pela EC 20/98)

A Lei nº 12.618/2012 estabeleceu, contudo, um prazo para que os “servidores mais antigos” fizessem essa opção. Veja:

Art. 40 (...) § 7º O prazo para a opção de que trata o inciso II do caput deste artigo será de 24 (vinte e quatro) meses, contados a partir do início da vigência do regime de previdência complementar instituído no caput do art. 1º desta Lei.

Desse modo, a Lei falou o seguinte: servidores mais antigos, vocês podem também passar a adotar esse novo regime de previdência complementar, mas precisam fazer isso em até 24 meses. Lei nº 13.328/2016 O objetivo do Governo era o de que mais “servidores antigos” fizessem essa opção. No entanto, como isso não aconteceu, decidiu-se reabrir o prazo por mais 24 meses. Foi o que fez o caput do art. 92 da Lei nº 13.328/2016:

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Art. 92. É reaberto o prazo para opção pelo regime de previdência complementar de que trata o § 7º do art. 3º da Lei nº 12.618, de 30 de abril de 2012, por 24 (vinte e quatro) meses, contados a partir da data de entrada em vigor desta Lei.

Como a Lei nº 13.328/2016 foi publicada em 29/07/2016, o prazo de opção de que trata o art. 92 terminaria em 29/07/2018. Ações para prorrogar esse prazo Muitos servidores, em especial os magistrados mais antigos, ficaram na dúvida se valeria a pena ou não fazer a opção e passar a adotar o regime de previdência complementar. Isso porque se fala muito na crise da Previdência e existe um receio de que, no futuro, o regime próprio de previdência social não consiga pagar o valor “cheio” das aposentadorias. Assim, alguns defendiam que, mesmo sendo um servidor mais antigo, seria melhor fazer essa migração porque se passaria a pagar menos contribuição previdenciária todos os meses, considerando que o servidor seria obrigado a contribuir apenas 11% sobre o teto do INSS (e não mais 11% sobre o valor total da remuneração recebida) e, com esse dinheiro que “sobraria” no fim do mês, o próprio servidor poderia fazer seus investimentos privados ou, então, aderir ao Funpresp-Jud. Como havia essa dúvida, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) ingressaram com uma ADI impugnando a validade do art. 1º da EC 41/2003 no ponto em que alterou a redação do § 15 do art. 40 da CF/88 e também questionando a Lei nº 12.618/2012. Na ação, as associações pediram, como medida cautelar, a prorrogação do prazo final de migração para o regime de previdência complementar até que houvesse o julgamento do mérito da ADI. Em outras palavras, as associações disseram o seguinte: nós consideramos que esse regime de previdência complementar é inconstitucional; no entanto, enquanto não se julga o mérito desse pedido, deve-se prorrogar o prazo para que os magistrados que quiserem, possam fazer a opção por este novo regime. O STF acolheu o pedido? NÃO.

O deferimento do pleito representaria indevida manipulação de opção político-normativa do Parlamento. Ao STF, à semelhança do que ocorre com as demais Cortes Constitucionais, cabe exercer o papel de legislador negativo. É sua a relevante função de extirpar do ordenamento jurídico normas incompatíveis com a Lei Maior, devendo, exatamente por esse motivo, atuar com parcimônia. Não há, sob o ângulo material ou formal, qualquer traço de incompatibilidade direta com a Constituição Federal. STF. Plenário. ADI 4885 MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 27/6/2018 (Info 908).

Além da ausência de plausibilidade jurídica da pretensão, não se vislumbrou prejuízo decorrente do retardamento da decisão para os servidores que, tempestivamente, fizerem opção pelo ingresso em regime de previdência complementar, caso o Tribunal, no julgamento do mérito da ação direta, declare a inconstitucionalidade dos preceitos nela impugnados. Na hipótese de vir a ser assentada a inconstitucionalidade da instituição de entidade fechada de previdência complementar de natureza pública, o cenário anterior deverá ser restaurado, com a devida reparação dos danos causados aos servidores públicos atingidos pelas normas eventualmente glosadas pelo STF.

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Execução de honorários sucumbenciais e fracionamento

Imagine que 30 pessoas, em litisconsórcio ativo facultativo, propuseram uma ação ordinária contra determinada autarquia estadual. Desse modo, 30 pessoas que poderiam litigar individualmente contra a ré, decidiram se unir e contratar um só advogado para propor a ação conjuntamente. A ação foi julgada procedente, condenando a entidade a pagar "XX" reais ao grupo de 30 pessoas. Na mesma sentença, a autarquia foi condenada a pagar R$ 600 mil reais de honorários advocatícios sucumbenciais ao advogado dos autores que trabalhou no processo. O advogado dos autores, quando for cobrar seus honorários advocatícios, terá que executar o valor total (R$ 600 mil) ou poderá dividir a cobrança de acordo com a fração que cabia a cada um dos clientes (ex: eram 30 autores na ação; logo, ele poderá ingressar com 30 execuções cobrando R$ 20 mil em cada)?

• É válido o fracionamento dos honorários advocatícios em litisconsórcio simples facultativo, por se tratar de cumulação de ações com o mesmo pedido. Posição da 1ª Turma do STF.

• Não é possível fracionar o crédito de honorários advocatícios em litisconsórcio ativo facultativo simples em execução contra a Fazenda Pública por frustrar o regime do precatório. Corrente adotada na 2ª Turma do STF.

STF. 1ª Turma. RE 913536/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 24/6/2018 (Info 908).

STF. 2ª Turma. RE 949383 AgR/RS, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 17/5/2016 (Info 826).

Imagine a seguinte situação hipotética: 30 pessoas, em litisconsórcio ativo facultativo, propuseram uma ação ordinária contra determinada autarquia estadual. Desse modo, 30 pessoas que poderiam litigar individualmente contra a ré, decidiram se unir e contratar um só advogado para propor a ação conjuntamente. A ação foi julgada procedente, condenando a entidade a pagar "XX" reais ao grupo de 30 pessoas. Na mesma sentença, a autarquia foi condenada a pagar R$ 600 mil reais de honorários advocatícios sucumbenciais ao advogado dos autores que trabalhou no processo. O advogado dos autores, quando for cobrar seus honorários advocatícios, terá que executar o valor total (R$ 600 mil) ou poderá dividir a cobrança de acordo com a fração que cabia a cada um dos clientes (ex: eram 30 autores na ação; logo, ele poderá ingressar com 30 execuções cobrando R$ 20 mil em cada)?

O STF está dividido sobre o tema:

1ª Turma: SIM 2ª Turma: NÃO

É válido o fracionamento dos honorários advocatícios em litisconsórcio simples facultativo, por se tratar de cumulação de ações com o mesmo pedido. STF. 1ª Turma. RE 913536/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 24/6/2018 (Info 908).

Não é possível fracionar o crédito de honorários advocatícios em litisconsórcio ativo facultativo simples em execução contra a Fazenda Pública por frustrar o regime do precatório. STF. 2ª Turma. RE 949383 AgR/RS, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 17/5/2016 (Info 826).

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Informativo 908-STF (05/07/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 11

Dessa forma, o advogado poderá ingressar com 30 execuções cobrando R$ 20 mil em cada. Isso, para ele, será mais vantajoso no caso concreto porque, se ele cobrasse o valor total, teria que entrar na fila dos precatórios (art. 100, caput, da CF/88). Como o valor de cada crédito agora é de R$ 20 mil, ele poderá receber a quantia por requisição de pequeno valor (art. 100, § 3º, da CF/88), de modo muito mais rápido. A 1ª Turma afirmou que o sistema processual possibilita a concentração das demandas por meio de ações conjuntas como uma forma de se buscar a eficiência da jurisdição. Logo, seria totalmente contraproducente (prejudicial) exigir que a execução dessas demandas ficasse vinculada ao todo, proibindo a execução facultativa e individualizada das partes substituídas no processo original. Isso levaria ao enfraquecimento do movimento de coletivização das demandas de massa e provavelmente geraria proliferação de processos, pois nada impediria que os advogados fracionassem os litisconsórcios facultativos para depois executarem os honorários de forma proporcional ao valor principal de cada cliente. Inviabilizar o recebimento proporcional e individualizado de honorários advocatícios em litisconsórcio simples facultativo afeta a racionalização do sistema judicial, uma vez que haverá, inevitavelmente, a proliferação de demandas individuais, medida que se encontra na contramão da tendência de eficiência na prestação jurisdicional.

A 2ª Turma do STF afirmou que, na situação dos autos, a parte recorrente pretendia promover a execução dos honorários advocatícios, não apenas de forma autônoma do débito principal, mas também de forma fracionada, levando-se em conta o número de litisconsortes ativos. No entanto, como a verba honorária pertence a um mesmo titular, seu pagamento de forma fracionada, por requisição de pequeno valor (RPV), encontra óbice no art. 100, § 8º, da CF/88. Em acréscimo, o Ministro Teori Zavascki afirmou que a existência de litisconsórcio facultativo não pode ser utilizada para justificar a legitimidade do fracionamento da execução dos honorários advocatícios sucumbencias se a condenação à verba honorária no título executivo for global, ou seja, se buscar remunerar o trabalho em conjunto prestado aos litisconsortes. O fato de o valor da condenação previsto no título executivo judicial (sentença) abranger, na realidade, diversos créditos, de titularidade de diferentes litisconsortes, não tem o condão de transformar a verba honorária em múltiplos créditos devidos a um mesmo advogado, de modo a justificar sua execução de forma fracionada. Em outras palavras, o fato de terem sido vários autores e de cada um deles ter direito a uma parte na condenação não faz com que o valor dos honorários também possa ser dividido. Isso porque o titular do crédito de honorários é um só. Além disso, os honorários advocatícios gozam de autonomia em relação ao crédito principal, e com ele não se confunde.

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Informativo 908-STF (05/07/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 12

DIREITO PENAL MILITAR

CRIME MILITAR Configuração de crime militar e licenciamento

Na configuração de crime militar observa-se a data do evento delituoso, considerado neutro o fato de o autor estar licenciado.

STF. Plenário. HC 132847/MS, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 26/6/2018 (Info 908).

O fato de o paciente não mais integrar as fileiras das Forças Armadas não tem qualquer relevância sobre o prosseguimento da ação penal pelo delito tipicamente militar de abandono do posto, visto que ele, no tempo do crime, era militar da ativa.

STF. 2ª Turma. HC 130793, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 02/08/2016.

Imagine a seguinte situação hipotética: João, soldado, desacatou seu superior hierárquico. Foi denunciado pela prática do crime de desacato, previsto no art. 298 do CPM:

Desacato a superior Art. 298. Desacatar superior, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, ou procurando deprimir-lhe a autoridade: Pena - reclusão, até quatro anos, se o fato não constitui crime mais grave.

João estava respondendo o processo na Justiça Militar quando foi, então, licenciado. Diante disso, a defesa suscitou a incompetência da Justiça castrense para julgá-lo, considerando que ele não mais seria militar. A tese da defesa é acolhida pela jurisprudência? NÃO. Se o crime foi praticado pelo réu quando ele ainda era militar, é irrelevante, para fins de competência, o fato de ele ter posteriormente perdido o vínculo com a corporação. A competência da Justiça Militar é fixada considerando a situação do agente no momento em que o crime é cometido. Em suma:

Na configuração de crime militar observa-se a data do evento delituoso, considerado neutro o fato de o autor estar licenciado. STF. 1ª Turma. HC 132847/MS, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 26/6/2018 (Info 908).

Esse é o entendimento tranquilo do STF:

(...) Não prospera a alegação do impetrante de incompetência da Justiça Militar para processar e julgar o paciente pelo delito previsto no art. 290 do Código Penal Militar (posse de entorpecente em lugar sujeito à administração militar). Isso porque no momento do delito ele ostentava a condição de militar, sendo irrelevante que, posteriormente, tenha se licenciado. (...) STF. 2ª Turma. HC 137025, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 11/10/2016.

(...) o fato de o paciente não mais integrar as fileiras das Forças Armadas não tem qualquer relevância sobre o prosseguimento da ação penal pelo delito tipicamente militar de abandono do posto, visto que ele, no tempo do crime, era soldado da ativa. Com efeito, essa pretensão, se levada a cabo, acarretaria

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Informativo 908-STF (05/07/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 13

uma nova modalidade, não prevista em lei, de extinção de punibilidade pela prática de crime tipicamente próprio pela perda superveniente da condição de militar, o que não é aceitável. (...) STF. 2ª Turma. HC 130793, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 02/08/2016.

A legislação processual penal militar só exige a condição de militar (mediante reinclusão) como requisito de procedibilidade da ação penal em se tratando de delito de deserção (art. 457, §§ 2º e 3º, do CPPM), o que não é o caso.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

PROVAS Busca e apreensão ordenada contra o marido da Senadora, mas cujo cumprimento ocorreu no

imóvel funcional onde ambos residem: deve-se observar as regras de foro privativo

Importante!!!

Paulo Bernardo era investigado e o juiz de 1º grau determinou, contra ele, busca e apreensão.

Ocorre que Paulo Bernardo residia com a sua esposa, a Senadora Gleisi Hoffmann, em um imóvel funcional cedido pelo Senado.

Desse modo, a busca e apreensão foi realizada neste imóvel funcional.

O STF entendeu que esta prova foi ilícita (art. 5º, LVI, da CF/88) e determinou a sua inutilização e o desentranhamento dos autos de todas as provas obtidas por meio da referida diligência.

O Supremo entendeu que a ordem judicial de busca e apreensão foi ampla e vaga, sem prévia individualização dos bens que seriam de titularidade da Senadora e daqueles que pertenciam ao seu marido.

Diante disso, o STF entendeu que o juiz, ao dar essa ordem genérica, acabou por também determinar medida de investigação contra a própria Senadora. Logo, como ela tinha foro por prerrogativa de função no STF (art. 102, I, “b”, da CF/88), somente o Supremo poderia ter ordenado qualquer medida de investigação contra a parlamentar federal. Isso significa que o juiz de 1ª instância usurpou uma competência que era do STF.

Reconheceu, por conseguinte, a ilicitude da prova obtida (art. 5º, LVI, da CF/88) e de outras diretamente dela derivadas.

STF. 2ª Turma. Rcl 24473/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 26/6/2018 (Info 908).

A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte: Paulo Bernardo, político e ex-Ministro de Estado, atualmente sem mandato e cargo público, era investigado pela Polícia Federal em uma operação denominada “Custo Brasil”. O juiz de 1º instância determinou, contra ele, medida de busca e apreensão. Ocorre que Paulo Bernardo residia com a sua esposa, a Senadora Gleisi Hoffmann, em um imóvel funcional em Brasília, cedido pelo Senado Federal. Desse modo, a busca e apreensão foi realizada neste imóvel funcional. Reclamação O Senado Federal não gostou da diligência. Isso porque, na visão desta Casa, ao se determinar busca e apreensão em um imóvel funcional de uma Senadora, o que se está fazendo é, indiretamente, investigar a Senadora. Ocorre que medidas judiciais de investigação contra Senadora por fatos praticados durante o mandato é uma competência privativa do STF.

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Informativo 908-STF (05/07/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 14

Diante disso, a Mesa do Senado ajuizou no STF uma Reclamação para anular a decisão da Justiça Federal que determinou busca e apreensão no apartamento funcional da Senadora. Para o órgão, houve usurpação da competência do STF devido à previsão constitucional do foro por prerrogativa de função. Desse modo, a busca e apreensão deveria ser previamente autorizada pelo Supremo em virtude de Gleisi ser Senadora, pois é “indissociável a titularidade dos documentos, objetos e bens a serem apreendidos no domicílio de uma sociedade conjugal”. De acordo com a Mesa, o mandado emitido pelo Juiz Federal teria sido “completamente genérico, não permitindo ao órgão de execução efetivamente separar o que fosse de propriedade da senadora daquilo que efetivamente se referisse ao seu esposo, se é que isso seria possível”. O STF concordou com a reclamação proposta? SIM. A 2ª Turma do STF julgou procedente a reclamação para invalidar a ordem de busca e apreensão e determinar a inutilização e o desentranhamento dos autos de todas as provas obtidas por meio da referida diligência, ordenada por juiz de 1ª grau no imóvel funcional. STF. 2ª Turma. Rcl 24473/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 26/6/2018 (Info 908). Vamos entender com calma. Legitimidade da Mesa do Senado para a reclamação A reclamação foi ajuizada na defesa da prerrogativa de foro, perante o STF, da Senadora da República Gleisi Helena Hoffman, que teria sido violada pelo juízo reclamado ao direcionar à parlamentar, de forma indireta, a medida de busca e apreensão, realizada nas dependências do apartamento funcional por ela ocupado. Nos termos do art. 48, II, do Regimento Interno do Senado Federal, compete a seu presidente, membro nato da Mesa do Senado, “velar pelo respeito às prerrogativas do Senado e às imunidades dos Senadores". Encontra-se presente, portanto, a pertinência temática entre o objeto da reclamação e a atuação da Mesa do Senado Federal na qualidade de ente despersonalizado, o que lhe outorga a capacidade de ser parte ativa nesta ação. Corroborando essa conclusão, a própria Constituição Federal outorgou à Mesa do Senado Federal legitimidade para propor ADI e ADC (art. 103, II, da CF/88), vale dizer, reconheceu-lhe expressamente a capacidade de ser parte em juízo. Competência para decretar busca e apreensão Em estrita observância ao princípio do juiz natural, somente o juiz constitucionalmente competente pode validamente ordenar uma medida de busca e apreensão domiciliar. Nos termos do art. 102, I, b, da Constituição Federal, compete ao STF processar e julgar originariamente, nas infrações penais comuns, os membros do Congresso Nacional. Assim, as medidas judiciais de investigação contra Senadora por fatos praticados durante o mandato somente podem ser decretadas pelo STF. Prerrogativa é do membro (e não do imóvel) Vale ressaltar que a prerrogativa de foro junto ao Supremo Tribunal Federal, por óbvio, se relaciona ao membro do parlamento, e não à titularidade de um imóvel. Do contrário, ainda que se tratasse de imóvel funcional do Congresso não habitado por parlamentar, estar-se-ia a interditar, de forma desarrazoada, uma diligência de busca e apreensão por ordem judicial não emanada do Supremo Tribunal Federal. Dessa feita, no caso de investigação de um crime de homicídio praticado por uma secretária do lar de um parlamentar federal, por exemplo, o juiz de primeiro grau, em tese, poderia validamente ordenar a realização de busca em seu domicílio funcional, no intuito de apreender a arma empregada no crime.

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Informativo 908-STF (05/07/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 15

Essa hipótese seria uma diligência perfeitamente individualizada, estanque e, portanto, incomunicável ao parlamentar ali domiciliado, razão por que, em princípio, não importaria em investigação reflexa sobre o titular de prerrogativa de foro. Não faria sentido, nesse caso, afetar-se a competência para autorizar essa diligência ao STF. Desse modo, seria possível que o juízo diverso do STF decretasse a medida de busca e apreensão desde que houvesse absoluta incomunicabilidade do resultado da diligência com o titular de prerrogativa de foro, ou seja, desde que fosse possível separar, com muita clareza, a investigação do parlamentar. Essa não era, todavia, a hipótese dos autos. Mandado judicial era vago O juiz tentou delimitar a diligência de busca e apreensão ao investigado Paulo Bernardo. Contudo, isso se mostrou impossível diante da vagueza de seu objeto. Isso porque o que estavam sendo buscados eram documentos, computadores, celulares, mídias, sendo impossível delimitar-se, de antemão, o que seria de titularidade da Senadora da República e o que pertenceria ao investigado Paulo Bernardo. Não é válida a ideia de, posteriormente, separar o que era da Senadora A alegação de que, após a apreensão, proceder-se-ia, em primeiro grau, a uma triagem do material arrecadado, para selecionar e apartar elementos de convicção relativos à Senadora da República, não se sustenta, por implicar, por via reflexa, inequívoca e vedada investigação de detentor de prerrogativa de foro e manifesta usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal. Somente o Supremo Tribunal Federal, nessas circunstâncias, tem competência para ordenar busca e apreensão domiciliar que traduza, mesmo que potencialmente, investigação de parlamentar federal, bem como para selecionar os elementos de convicção que a ela interessem ou não. A legalidade da ordem de busca e apreensão deve necessariamente ser aferida antes de seu cumprimento, pois, do contrário, poder-se-ia incorrer em legitimação de decisão manifestamente ilegal, com base no resultado da diligência. Não se pode invocar a teoria do juízo aparente Diante da manifesta e consciente assunção, por parte da Procuradoria da República em São Paulo e do juízo reclamado, do risco concreto de apreensão de elementos de convicção relacionados a detentor de prerrogativa de foro, não cabe, repito, argumentar-se com descoberta fortuita de provas nem com a teoria do juízo aparente. Nessas circunstâncias, a realização de diligência por juízo sem competência constitucional é nula. Com efeito, na hipótese de usurpação, ainda que indireta, da competência do Supremo Tribunal Federal para supervisionar investigações criminais, a consequência deve ser a nulidade dos atos eventualmente praticados na persecução penal. Em suma:

A maioria dos Ministros entendeu que foi usurpada a competência do STF, prevista no art. 102, I, “b”, da CF/88, para processar e julgar, originariamente, nas infrações penais comuns, os membros do Congresso Nacional. O STF entendeu que a ordem judicial expedida foi ampla e vaga, sem prévia individualização dos bens que seriam de titularidade da parlamentar federal e daqueles pertencentes ao não detentor de prerrogativa de foro. Assim, reconheceu-se que as provas obtidas na busca e apreensão foram ilícitas (art. 5º, LVI, da CF/88), assim como as outras diretamente dela derivadas. STF. 2ª Turma. Rcl 24473/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 26/6/2018 (Info 908).

Importante destacar aqui alguns trechos da ementa:

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Informativo 908-STF (05/07/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 16

(...) 6. Por estrita observância ao princípio do juiz natural (CF, art. 5º, LIII), somente o juiz constitucionalmente competente pode validamente ordenar uma medida de busca e apreensão domiciliar. 7. A prerrogativa de foro junto ao Supremo Tribunal Federal, por óbvio, não se relaciona à titularidade do imóvel, mas sim ao parlamentar federal. 8. A tentativa do juízo reclamado de delimitar, em sua decisão, a diligência a bens e documentos do investigado não detentor de prerrogativa de foro, de partida, mostrou-se infrutífera, diante da própria vagueza de seu objeto. 9. A extrema amplitude da ordem de busca, que compreendia indiscriminadamente valores, documentos, computadores e mídias de armazenamento de dados, impossibilitou a delimitação prévia do que pertenceria à Senadora da República e ao investigado, não detentor de prerrogativa de foro. 10. A alegação de que, após a apreensão, proceder-se-ia, em primeiro grau, a uma triagem do material arrecadado, para selecionar e apartar elementos de convicção relativos à Senadora da República, não se sustenta, por implicar, por via reflexa, inequívoca e vedada investigação de detentor de prerrogativa de foro e, por via de consequência, usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal. 11. Somente o Supremo Tribunal Federal, nessas circunstâncias, tem competência para ordenar busca e apreensão domiciliar que traduza, ainda que reflexamente, investigação de parlamentar federal, bem como para selecionar os elementos de convicção que a ela interessem ou não. 12. A legalidade da ordem de busca e apreensão deve necessariamente ser aferida antes de seu cumprimento, pois, do contrário, poder-se-ia incorrer em legitimação de decisão manifestamente ilegal, com base no resultado da diligência. 13. Diante da manifesta e consciente assunção, por parte da Procuradoria da República em São Paulo e do juízo reclamado, do risco concreto de apreensão de elementos de convicção relacionados a detentor de prerrogativa de foro, não cabe argumentar-se com descoberta fortuita de provas nem com a teoria do juízo aparente. 14. Nessas circunstâncias, a precipitação da diligência por juízo sem competência constitucional maculou-a, insanavelmente, de nulidade. 15. Na hipótese de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal para supervisionar investigações criminais, ainda que de forma indireta, a consequência deve ser a nulidade dos atos eventualmente praticados na persecução penal. Precedentes. 16. Ainda que a decisão impugnada tenha sido proferida em inquérito desmembrado por determinação do Supremo Tribunal Federal, a diligência ordenada, em razão da busca indiscriminada de elementos de convicção que, em tese, poderiam incriminar parlamentar federal, se traduziu em indevida investigação desse, realizada por juízo incompetente. 17. O reconhecimento, portanto, da imprestabilidade do resultado da busca realizada no apartamento funcional da Senadora da República para fins probatórios, como também de eventuais elementos probatórios diretamente derivados (fruits of the poisonous tree), é medida que se impõe. 18. Nos termos do art. 5º, LVI, da Constituição Federal, “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. 19. Por sua vez, o art. 157 do Código de Processo Penal, ordena o desentranhamento dos autos e a inutilização das provas ilícitas, “assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais”, a fim de não interferir, subjetivamente, no convencimento do juiz. 20. Reclamação julgada procedente, para o fim de invalidar a ordem de busca no domicílio funcional do titular de prerrogativa de foro e, por consequência óbvia, reconhecer a ilicitude das provas ali obtidas, bem como de eventuais elementos probatórios outros delas derivados. 21. Determinado o desentranhamento dos respectivos autos de apreensão e dos relatórios de análise de material apreendido, com sua consequente inutilização, bem como a inutilização de cópias e espelhamentos de documentos, computadores e demais dispositivos eletrônicos, e a restituição de todos os bens apreendidos no citado local, caso já não tenha ocorrido.

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Informativo 908-STF (05/07/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 17

22. Determinada, ainda, a inutilização de todas as provas derivadas daquelas obtidas na busca, que deverão ser desentranhadas dos autos e, se for o caso, restituídas a quem de direito. STF. 2ª Turma. Rcl 24473, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 26/06/2018.

DIREITO DO TRABALHO

CONTRIBUIÇÃO SINDICAL É constitucional a lei que extinguiu a contribuição sindical obrigatória

Importante!!!

São compatíveis com a Constituição Federal os dispositivos da Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) que extinguiram a obrigatoriedade da contribuição sindical e condicionaram o seu pagamento à prévia e expressa autorização dos filiados.

No âmbito formal, o STF entendeu que a Lei nº 13.467/2017 não contempla normas gerais de direito tributário (art. 146, III, “a”, da CF/88). Assim, não era necessária a edição de lei complementar para tratar sobre matéria relativa a contribuições.

Também não se aplica ao caso a exigência de lei específica prevista no art. 150, § 6º, da CF/88, pois a norma impugnada não disciplinou nenhum dos benefícios fiscais nele mencionados, quais sejam, subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão.

Sob o ângulo material, o STF afirmou que a Constituição assegura a livre associação profissional ou sindical, de modo que ninguém é obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato (art. 8º, V, da CF/88). O princípio constitucional da liberdade sindical garante tanto ao trabalhador quanto ao empregador a liberdade de se associar a uma organização sindical, passando a contribuir voluntariamente com essa representação.

Não há nenhum comando na CF/88 determinando que a contribuição sindical é compulsória.

Não se pode admitir que o texto constitucional, de um lado, consagre a liberdade de associação, sindicalização e expressão (art. 5º, IV e XVII, e art. 8º) e, de outro, imponha uma contribuição compulsória a todos os integrantes das categorias econômicas e profissionais.

STF. Plenário. ADI 5794/DF, Rel. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgado em 29/6/2018 (Info 908).

Veja comentários em Direito Constitucional.

EXERCÍCIOS

Julgue os itens a seguir: 1) São compatíveis com a Constituição Federal os dispositivos da Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) que

extinguiram a obrigatoriedade da contribuição sindical e condicionaram o seu pagamento à prévia e expressa autorização dos filiados. ( )

2) Na configuração de crime militar observa-se a data do evento delituoso, considerado neutro o fato de o autor estar licenciado. ( )

Gabarito

1. C 2. C