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25 ESCOLA MODERNA Nº 33•5ª série•2009 Introdução O presente artigo inscreve-se no Programa de Investigação-Formação dinamizado pelo Movimento da Escola Moderna, o qual se centra na elaboração e no desenvolvimento do Projecto Curricular de Turma. Tem como principal objectivo reflectir acerca do processo de aprendizagem da escrita e da leitura segundo uma abordagem discur- siva e interactiva, vivido ao longo deste ano lectivo com uma turma do 1.º ano de escolari- dade organizada em sistema de cooperação, de acordo com o modelo de trabalho pedagógico do Movimento da Escola Moderna. Tem como elemento de recolha a elabora- ção de um diário profissional, onde vai sendo registada a observação quotidiana da prática, assim como a reflexão crítica facilitada pelo re- cuo e pela distância que a escrita propicia. A selecção de um objecto específico de aná- lise, continuadamente registado, reflectido e fundamentado, numa metodologia de investi- gação-acção, procura aprofundar o conheci- mento sobre essa matéria, ao mesmo tempo que contribui para pensar a prática pedagógica do lado de dentro da profissão. Neste caso, trata-se de observar, analisar e descrever o processo de aprendizagem da es- crita pelas crianças em fase de iniciação, pro- curando perceber como se apropriam das fun- ções sociais da linguagem escrita e como esse facto contribui para o seu avanço metacogni- tico da Língua, através das suas produções e do contexto interactivo que as enquadra, processo supervisionado pela Professora Margarida Al- ves Martins. Assim, ao mesmo tempo que se descrevem aspectos do trabalho da escrita através do diá- rio, procede-se à recolha de todos os textos produzidos pelos alunos desde o início do ano, segundo a sua tipologia, de modo a analisar a génese e a evolução da diversidade de produ- ções, relacionando-os com as situações comu- nicativas em que surgem. Este artigo constitui um ponto de situação do desenvolvimento do referido projecto. Pro- curar-se-á fazer um breve enquadramento con- ceptual para depois descrever a produção es- crita de duas crianças desde o início do ano, fazendo interagir, nessa descrição, as situações de contexto relacionadas com essas produções, mobilizando para o efeito excertos do diário profissional. Por fim, far-se-á uma pequena (in)conclu- são, onde se procurará simultaneamente regu- lar o próprio projecto. 1. Breve enquadramento conceptual 1.1. A escrita na escola actual Apesar do consenso obtido nos estudos no domínio da Psicolinguística sobre a importân- Iniciação e desenvolvimento da escrita – dois percursos Inácia Santana* * 1.º Ciclo do Ensino Básico. REVISTA N.º 33 09/07/09 19:12 Page 25

Iniciação e desenvolvimento da escrita – dois percursoscentrorecursos.movimentoescolamoderna.pt/dt/1_2_4_trab_curric... · assentes em processos de escrita-leitura são mais eficazes

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Introdução

Opresente artigo inscreve-se no Programade Investigação-Formação dinamizado

pelo Movimento da Escola Moderna, o qual secentra na elaboração e no desenvolvimento doProjecto Curricular de Turma.

Tem como principal objectivo reflectiracerca do processo de aprendizagem da escritae da leitura segundo uma abordagem discur-siva e interactiva, vivido ao longo deste anolectivo com uma turma do 1.º ano de escolari-dade organizada em sistema de cooperação, deacordo com o modelo de trabalho pedagógicodo Movimento da Escola Moderna.

Tem como elemento de recolha a elabora-ção de um diário profissional, onde vai sendoregistada a observação quotidiana da prática,assim como a reflexão crítica facilitada pelo re-cuo e pela distância que a escrita propicia.

A selecção de um objecto específico de aná-lise, continuadamente registado, reflectido efundamentado, numa metodologia de investi-gação-acção, procura aprofundar o conheci-mento sobre essa matéria, ao mesmo tempoque contribui para pensar a prática pedagógicado lado de dentro da profissão.

Neste caso, trata-se de observar, analisar edescrever o processo de aprendizagem da es-crita pelas crianças em fase de iniciação, pro-curando perceber como se apropriam das fun-

ções sociais da linguagem escrita e como essefacto contribui para o seu avanço metacogni-tico da Língua, através das suas produções e docontexto interactivo que as enquadra, processosupervisionado pela Professora Margarida Al-ves Martins.

Assim, ao mesmo tempo que se descrevemaspectos do trabalho da escrita através do diá-rio, procede-se à recolha de todos os textosproduzidos pelos alunos desde o início do ano,segundo a sua tipologia, de modo a analisar agénese e a evolução da diversidade de produ-ções, relacionando-os com as situações comu-nicativas em que surgem.

Este artigo constitui um ponto de situaçãodo desenvolvimento do referido projecto. Pro-curar-se-á fazer um breve enquadramento con-ceptual para depois descrever a produção es-crita de duas crianças desde o início do ano,fazendo interagir, nessa descrição, as situaçõesde contexto relacionadas com essas produções,mobilizando para o efeito excertos do diárioprofissional.

Por fim, far-se-á uma pequena (in)conclu-são, onde se procurará simultaneamente regu-lar o próprio projecto.

1. Breve enquadramento conceptual

1.1. A escrita na escola actual

Apesar do consenso obtido nos estudos nodomínio da Psicolinguística sobre a importân-

Iniciação e desenvolvimento da escrita – dois percursos

Inácia Santana*

* 1.º Ciclo do Ensino Básico.

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cia da abordagem comunicativa na aprendiza-gem da linguagem escrita, desenvolvidos a par-tir dos anos 70, assim como de todas as orien-tações curriculares que, desde o 25 de Abril,em Portugal, se têm apresentado de forma coe-rente com os avanços do conhecimento nestamatéria, quando actualmente se fala de inicia-ção à linguagem escrita na escola, normal-mente o discurso situa-se no ensino e aprendi-zagem da leitura, aprisionado pela dimensãoredutora dos métodos.

A escola desvaloriza o ensino da escrita, naconcepção implícita de que, aprendendo a ler,as crianças aprendem automaticamente a es-crever. Para além disso, só permite que acedamà escrita quando dominam o código alfabético,mas sempre de forma mecânica e policiada,para que adquiram um conjunto de «habilida-des e automatismos» (Colello, 2007, p. 65) enão se confrontem com os seus próprios erros.

Segundo esta autora, as práticas escolarespodem ser vistas à luz dos modelos de litera-cia, a saber:

o modelo autónomo, predominante na escola,desconsidera a dimensão sociocultural da lingua-gem e a pluralidade das suas manifestações [e o]modelo ideológico, que considera a linguagem, ba-seado em múltiplas práticas sociais e nos significa-dos que elas assumem nas diversas situações, co-loca em evidência as estruturas do poder da socie-dade (Colello, 2007, p. 61).

Genericamente, a escrita na escola, refémda simplificação de processos a que é sujeita,através da atomização dos seus elementos,para pretensamente se tornar acessível aos alu-nos numa lógica cumulativa de conhecimento,é-lhes apresentada de forma fragmentada, ex-terior à sua própria experiência e cultura, e porisso mesmo desprovida de sentido e comouma entidade autónoma da comunicação.Assume-se, consequentemente, discriminató-ria daqueles que não tiveram a possibilidadede aceder ao mundo da escrita fora da escola.

Subtrai-se, assim, à escrita na escola a suadimensão cultural, ignorando-se o seu poder

enquanto ferramenta na construção do conhe-cimento da própria linguagem escrita, instru-mento de regulação do oral e motor de desen-volvimento do pensamento.

1.2. A abordagem sócio-cultural1.2. da escrita no MEM

A perspectiva sócio-cultural do modelo doMEM opõe-se veementemente à concepçãocastradora da escrita enquanto habilidade mo-tora e, portanto, mecânica, e assume toda a suacomplexidade apostando na inteligência dascrianças e no seu potencial comunicativo. Estaabordagem parte da produção escrita dascrianças, na qual mobilizam a sua experiênciade vida e os seus saberes, para a construção deníveis progressivamente superiores de conhe-cimento da língua. Trata-se da utilização fun-cional da escrita pelas crianças, em situaçõesreais de comunicação, mediada pelas múltiplasinteracções e pelos instrumentos e artefactosculturais disponíveis, numa abordagem inte-gradora e desenvolvimentista.

Como nos diz Sérgio Niza (2003), a produ-ção escrita

constrói a compreensão da escrita, a leitura. É porisso mesmo que as estratégias de alfabetizaçãoassentes em processos de escrita-leitura são maiseficazes na aprendizagem e no desenvolvimento daescrita e da leitura do que as estratégias apoiadasnos métodos tradicionais de ensino fonético ou glo-bal da leitura. (p. 118)

Liberta da punição do erro e de modelospré-fabricados impostos às crianças, a escritasurge naturalmente desde muito cedo, aindaem idade pré-escolar, no dizer de Vygotsksycomo «desenho da fala» ou «álgebra da lingua-gem», para progressivamente constituir umaforma de representação directa do mundo semprecisar da fala como elemento de mediação.(Niza, 1996).

Esta escrita, produzida e desenvolvida nainterlocução, vai sendo apropriada através doesforço de explicitação do discurso interior no

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código escrito. Para isso, os pequenos autoresreflectem acerca da escrita dos enunciados edas palavras, recorrendo a todas as ferramen-tas de que dispõem, nomeadamente o patri-mónio de escrita da turma, discutem as suashipóteses, confirmam, analisam, comparam,relacionam, numa gradual aproximação ao va-lor fonético dos grafemas, construindo simul-taneamente uma progressiva consciência fono-lógica e metalinguística. Nesta dinâmica dialó-gica, negociando significados no esforço deadequar a textualização ao que querem comu-nicar, as crianças vão estruturando o discursointerior mas também a própria fala, num com-plexo processo polifónico.

Trata-se de valorizar a escrita

enquanto modelo de conhecimento que per-mite: revelar aos que se iniciam na sua produção alógica do princípio alfabético; desenvolver e aper-feiçoar o modo oral da língua; aprofundar a lisibili-dade dos textos escritos; fixar a fala (boa parte dela)dando nome aos seus sons, registando-os grafica-mente, o que faz com que a escrita nos permita to-mar consciência da própria fala. (Niza, 2004, p. 109)

1.3. Interacção entre a linguagem falada 1.3. e a linguagem escrita

Distante dos seus interlocutores, a escritaimplica um trabalho de explicitação e de ela-boração bastante mais exaustivo que a lingua-gem oral, que vive do próprio contexto e dasinteracções não verbais, bem como da com-preensão imediata do nível de entendimentodos outros, permitindo adequar sucessiva-mente o discurso na situação comunicativa.

Este esforço de enunciação fora do acto co-municativo directo, tendo em vista a clarezado discurso interior que se procura explicitar,corresponde a «um processo psicológico supe-rior avançado: além de implicar o domínio deum instrumento de mediação de maior poten-cial descontextualizador, implica o desenvol-vimento de formas de consciência e vontadesuperiores no domínio intelectual em jogo.»(Baquero, 2001, p. 86)

No entanto, numa fase inicial, a escrita viveda linguagem oral, à medida da apropriaçãopelas crianças da concepção «de que se podedesenhar, além de coisas, também a fala».(Vygotsky, 1987/1988, p. 131).

A fala e a escrita, num contínuum comuni-cativo (Camps, 2003), desempenham assimum papel fundamental no desenvolvimentohumano, em interacção directa com a lingua-gem interior, sendo que, do ponto de vista dasua génese, a linguagem oral precede e con-corre para a construção da linguagem interior,enquanto a linguagem escrita pressupõe a exis-tência de uma linguagem interior já constituída(Baquero, 2001). Mas é a escrita que se impõeà fala: modela, estrutura, regula e faz avançar opensamento e, como tal, também a linguagemoral. No entanto, como refere Sérgio Niza, «foiao distanciar-se da fala, pela natureza diferen-ciada do seu processamento e pela distinçãocomplementar das suas funções sociais, que aescrita se foi complexificando e intelectuali-zando». (2007, p. 15)

Deste modo, a escrita pode constituir umfactor de desenvolvimento, situando-se nodomínio das «boas aprendizagens» de queVygotsky (1978/1988) fala, sobretudo se se ins-crever num modelo de «transformação do co-nhecimento» (Bereiter e Scardamalia, 1993).Tal desiderato «pode ser alcançado se os do-centes fornecerem autênticas, desafiadoras eestimulantes finalidades para a escrita, se ex-plorarem, através do debate, as característicasde diferentes tipos de textos, e se eles modela-rem a escrita com as crianças.» (Rily & Reedy,p. xiii)

1.4. A diversidade de escrita em contextos 1.4. comunicativos

A escrita na escola enquanto actividade cul-tural autêntica, inscrita numa comunidade deaprendizagem, é determinada por uma forteintencionalidade que decorre da natural moti-vação comunicativa. Tem como destinatárioimediato o grupo-turma, para depois se alargar

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a uma audiência mais vasta, constituída a par-tir de um conjunto de circuitos de comunica-ção com destinatários mais distantes, o queexige um aperfeiçoamento continuado dosprodutos escritos. Por sua vez, esta exigênciapromove a tomada de consciência da sintaxe eda semântica na construção da coerência e dacoesão, nos processos de composição e nas re-visões sucessivas a que os escritos são sujeitospara servirem os objectivos comunicativos aque se destinam.

Efectivamente, os processos de escrita e deleitura, inscritos em situações relacionais,constituem permanentes negociações de signi-ficado, tendo sempre presente o outro paraquem se escreve e de quem se lê, recons-truindo internamente o sentido, de acordocom a «concepção backhtiniana sobre a natu-reza da linguagem, essencialmente dialógica,polifónica e responsiva.» (Colello, 2007, p. 77)

Assim, nesta escrita emergente do discurso,o texto é considerado a unidade de comunica-ção, falando a várias vozes (Camps, 2003), asque o autor apropriou e que mobiliza na suaescrita, aquelas com quem ele interage durantea produção ou a revisão e aqueles para quemproduz e com quem dialoga internamente noacto da textualização.

Essa consciência do outro durante a enun-ciação escrita permite a descentração necessá-ria à «construção da perspectiva do leitor»(Gladys Rocha, 1999, p. 121), competência fun-damental de um escritor competente. Nestesentido, a autora reforça «a importância docontexto situacional e da interacção no pro-cesso de apropriação das habilidades textuaispor parte do aprendiz.» (idem)

São as situações de comunicação real emque as crianças estão mergulhadas que natural-mente determinam a génese de diferentes ti-pos de textos, de acordo com os diferentes des-tinatários e as diversas finalidades da escritaque produzem, o que acontece espontanea-mente mesmo antes da sua entrada na escola.

Segundo Steward (1995), «os padrões detexto influenciam a linguagem falada mesmo

antes do começo da leitura.» (p. 7) A mesmaautora refere que as crianças, quando chegamà escola, já têm o conhecimento implícito deum conjunto de estruturas organizativas de di-ferentes géneros de textos, que identificam eexploram na linguagem oral, pela «leitura» ade-quada com marcas de prosódia apropriada.

Cabe à escola organizar-se em comunidadede aprendizagem, multiplicando os canais deedição e de difusão dos textos produzidos pe-las crianças, aperfeiçoados em situação de coo-peração a pares, em pequenos grupos e colec-tivamente, de onde emerge uma cultura de re-flexão sobre a escrita e de co-construção desaberes sobre a linguagem escrita, procurandoassim tornar progressivamente explícito o co-nhecimento gramatical implícito dos alunos,com a ajuda do professor a quem cabe o papelde mediador na apropriação da cultura.

Podemos, deste modo, democratizar a es-crita na escola, devolvendo-a aos alunos comouma ferramenta fundamental de aprendiza-gem, «associada ao binómio «saber e poder»,ao desenvolvimento, à modernidade e à eman-cipação do sujeito». (Colello, 2007, p. 58)

2. Dois percursos de escrita

O Jorge e a Andreia são duas das dezoitocrianças que este ano iniciaram o 1.º ano de es-colaridade. Ambas têm 6 anos de idade e estãona escola pela primeira vez. O Jorge não tevefrequência de Jardim de Infância e a Andreiafrequentou o Jardim de Infância durante 3 anos.Ela é filha de pais romenos e por isso dominaduas línguas. Começaram o ano com compe-tências de leitura muito semelhantes, embora aAndreia parecesse mais direccionada para a es-crita que o Jorge, e provavelmente com con-cepções distintas das referidas funções.

Tal como mostrou Alves Martins (2000),mais importante do que qualquer tipo de habi-lidades ou outros requisitos, a representaçãoque as crianças têm das funções da linguagemescrita, bem como a sua intencionalidade rela-

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tivamente a essa aquisição, são decisivas parao sucesso da aprendizagem neste domínio.Assim, na tentativa de perceber as suas con-cepções iniciais da linguagem escrita, nos pri-meiros dias de aulas foram-lhes feitas pergun-tas individuais nesse sentido, procurando queexplicitassem as razões pelas quais queriamaprender a ler:

– Para ter boas notas e para ir para a outraescola. Jorge

– Porque gosto. Andreia

Do mesmo modo, explicitaram as razõespara quererem aprender a escrever:

– Para desenhar e escrever letras e cartas. Jorge– Para saber escrever tudo. Andreia

A Andreia parecia mais determinada nosseus propósitos que o Jorge, cujas motivaçõesainda pareciam decorrer do que socialmentelhes é incutido sobre o processo de escolariza-ção. No entanto, ambos pareciam ter mais cla-ras as funções da escrita que da leitura.

A escolha destas duas crianças obedeceuapenas ao facto de mostrarem competênciasaparentemente semelhantes no início do ano,embora tivessem diferentes percursos, comodiferentes são as suas histórias, as quais, emambos os casos, integram aspectos que pode-riam constituir, à partida, dificuldades naaprendizagem da linguagem escrita.

2.1. Contextualização do trabalho 2.1. da escrita na sala de aula

A escrita nos primeiros dias de escola surge,naturalmente, integrada na própria organiza-ção, assim como continuará a acontecer aolongo de todo o ano, no trabalho curricular quecaracteriza o modelo pedagógico do MEM.

Neste grupo, para além dos registos habi-tuais do que se faz e do que existe na sala, a es-crita no Diário de Turma assumiu, desde logo,um lugar de destaque, como se torna evidenteno Diário Profissional de 21/09/08:

…Cheguei ao pé dela e disse-lhe que estavacontente porque ela tinha conseguido partilhar aplasticina e que ia escrever isso no Diário de Turma(«Gostei muito de ver que a Joana foi capaz de par-tilhar a sua plasticina»). Mais tarde foi novamentea partir de um incidente passado com ela que escrevino Diário de Turma a primeira ocorrência negativa,porque alguém a aleijou. Assim, a Joana passou oresto da semana a falar do que estava escrito noDiário de Turma e era a que estava mais despertapara a sua leitura na Sexta-feira.

As rotinas vão-se organizando. Uma dasmais importantes, pelo seu carácter comunica-tivo, é o momento diário de Apresentação deProduções onde, entre outras coisas que ascrianças apresentam, surgem os enunciadosorais normalmente com a intenção de se regis-tarem em texto.

A pouco e pouco vamos conquistando rotinas. Osprimeiros momentos de entrada na sala eram caóti-cos e eu própria ainda não tinha bem a certeza doque seria melhor fazer primeiro. Depois de algumastentativas, verifiquei que o melhor mesmo era che-garmos à sala, puxar as cadeiras para a frente e co-meçarmos a apresentação de produções, já com ospresidentes a assumir as suas funções de registo e dedar a palavra. Os textos têm surgido a partir de coi-sas que trazem (brinquedos) ou que querem contar(têm contado sonhos com monstros, o que é engra-çado!). Eu escrevo esses textos numa folha que afixono quadro e que, depois de escritos, lhes passo paraa mão para ilustrarem mais tarde (logo que tiveremos materiais distribuídos). Já ficam assim, bastantecalmos, durante cerca de meia hora. (Diário profis-sional – 21/09/08)

Esses relatos orais são muitas vezes objectode negociação quando se passam a escrito, jáque a sequência nem sempre é organizada e asregras da escrita não se compadecem com osavanços e recuos que a oralidade permite.

Os momentos de apresentação de produções con-tinuam a correr muito bem, havendo sempre bastan-tes meninos inscritos para contar e mostrar coisas,

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que depois querem escrever. Foi visível, esta se-mana, a negociação que se tem de fazer do que ficaescrito, uma vez que os relatos se começam a com-plexificar. Lembro-me da Mathilde, que contavaque tinha ido à festa de anos do tio e que lá tinhaconhecido uma amiga, com quem esteve a brincar.É difícil, no momento, sobretudo se escrevemos aosabor do relato, organizar a escrita. Por isso prefiroouvir o relato completo e depois pergunto: «Então oque é que vamos escrever?» É claro que eles ficamatrapalhados com a pergunta e eu, normalmente,avanço uma proposta: «Eu fui aos anos do meu tio…pode ser assim?» A certa altura ela queria introduzira questão da amiga, o que já não era muito fácil deinscrever naquela organização da narrativa. Entãoreli o que tinha escrito e propus: «Depois fui brincarcom uma amiga que conheci…» e depois refiz: «oucom uma amiga nova? Como é que preferes? Pode-mos dizer de várias maneiras.» Ela preferiu, umaamiga nova, e acrescentou chamada Inês. Tive aclara consciência de que estávamos a trabalhar otexto, negociando significados e a organização tex-tual. É das coisas que mais prazer me dá. Talvezisso se transmita, porque sinto que estão a ficar cadavez mais despertos para os textos. Não tanto parafazer tentativas de escrita, o que me inquieta. Porisso disse-lhes que ia começar a deixar espaços empalavras que já tinham aparecido nos textos traba-lhados. Assim, num texto do Pedro «Eu tenho um…» deixei estes três espaços para ele completar.Disseram-me logo que também podia deixar o es-paço do nome. (Diário Profissional – 29/09/08)

Como também é habitual, estes textos sãoobjecto de trabalho em colectivo. São analisa-dos a vários níveis em três ou quatro sessõesde trabalho ao longo da semana: as descober-tas, ou seja, a identificação de regularidadesque, alargadas a outras palavras e organizadasem listas, vão ajudando à construção, pelascrianças, de uma progressiva consciência fono-lógica do sistema alfabético; a selecção de pa-lavras para ilustrar que integram o ficheiro deimagens construído pela turma; o recorte, re-composição e colagem do texto no caderno eno livro de leitura (instrumento construído por

cada um). Assim, logo na primeira semana seiniciou essa actividade com o texto da Cons-tança, por ter sido o primeiro que surgiu.

Eu tenho um ursinho amarelo.

Constança

Uma vez escrito no quadro, convidei os me-ninos a fazerem descobertas. A primeira reac-ção foi de perplexidade e parecia não terempercebido muito bem o que se lhes pedia. Porisso, o primeiro texto registou muito poucasdescobertas. Posteriormente, foi escrito nocomputador, copiado, recortado em palavras,recomposto, colado no livro de leitura, ilus-trado e iniciado o ficheiro de imagens com aspalavras ursinho e amarelo.

Seguiu-se o trabalho dos textos dos outrosmeninos segundo uma rotatividade por ordemalfabética dos nomes, pelo que na segunda se-mana foi o texto da Alexandra, que ela selec-cionou de entre os que já tinha elaborado.Como ambos começavam da mesma forma,na terceira sessão de trabalho de texto da se-mana propus a análise comparativa dos doistextos, como é relatado no diário de 29/09/08:

Esta semana foi trabalhado o segundo texto. Asdescobertas são muito elementares e apenas detec-tam regularidades de letras. Assim, passámos deimediato à leitura do texto e à localização de pala-vras. No final da semana, depois de todo o trabalhohabitual com o texto da Alexandra, coloquei os doistextos trabalhados no quadro:

Eu tenho um ursinho amarelo.

Constança

Eu tenho um telemóvel com música.

Alexandra e Mathilde (que ajudou a pas-

sar no computador)

Foram convidados a descobrir as palavrasiguais, o que foi fácil. O mais difícil foi descobrir bo-cadinhos iguais. Eu pensei que podíamos, a partirdaqui, fazer a lista do te, mas também descobriramo nho e foi ainda mais evidente para eles (pasme-

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-se!) o ma (de amarelo e de Mathilde), pelo que fi-zemos as listas do ma com o a aberto e fechado.

Estes textos trabalhados, naturalmente, aca-bam por influenciar as produções escritas indi-viduais das crianças, tornando-as temporaria-mente mais reduzidas às expressões ou temá-ticas dominantes. Mas a dinâmica de edição edivulgação procurará regular essas tendências.

Um acontecimento que fez sucesso, esta semana,foi a chegada do nosso primeiro livro de textos, quea mãe do Gonçalo se ofereceu para fotocopiar a corese que, para além disso, também encadernou. A sur-presa e o deslumbramento foram gerais, quando oGonçalo começou a distribui-los (um para cada um).Alguns nem queriam acreditar: «É para nós?»«É para levar para casa?» «É para ficarmos com elepara sempre?» E vários foram os comentários acercado que se podia fazer com ele: «Podemos copiar tex-tos daqui»; «Podemos ler no TEA.»; «Podemos ler emcasa com as mães.» Agora, no Estudo Autónomo, éfrequente vê-los a fazer descobertas de bocadinhos e

de palavras nos textos uns dos outros. Confirma-se:a mobilização para o trabalho tem de ser a constru-ção de produções culturais autênticas. Temos de co-meçar já o segundo livro de textos. Entretanto as his-tórias também começam a surgir e tenho de incenti-var mais a sua produção.

Diário Profissional – 07/11/08

É esta dinâmica de utilização funcional daescrita que vai desencadeando uma gradual di-versidade de produção de textos, regulada pelogrupo durante a Apresentação de Produções.

2.2. As diferentes tipologias de textos

A comunicação escrita, enquanto registo dafala, produz naturalmente diferentes tipologiasdiscursivas que, uma vez identificadas em ca-tegorias segundo a sua função social, dão ori-gem ao embrião de diferentes tipos de textos.

O quadro que se segue apresenta as produ-ções do Jorge e da Andreia desde o início doano até ao final de Março:

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Analisando o quadro, podemos perceberque nos primeiros tempos domina a escrita derelatos do quotidiano. A partir de Dezembrodiminui, mas diversifica-se também, gradual-mente, a produção, numa progressiva descen-tração dos relatos do quotidiano para umamaior abrangência de utilização social da es-crita, de acordo com os diferentes destinatáriosou as diferentes funções comunicativas. Veri-fica-se, assim, o «enriquecimento progressivoda compreensão e produção nas formas maiscomplexas da linguagem escrita, segundo asdiferentes tipologias discursivas do seu meiocultural.» (Braslavsky, 1992, p. 97)

Deste quadro estão excluídas todas as ten-tativas iniciais de escrita, bem como as cópiasde textos e as listas de palavras escritas espon-taneamente no caderno de escrita livre, moda-lidades espontâneas que também concorrempara a apropriação do código convencional.

Os relatos do quotidiano

Os relatos orais durante a Apresentaçãode Produções

O Jorge cedo se apropriou da rotina deApresentação de Produções e até ao início deNovembro realizou 22 relatos orais nesse con-texto, passando por diversas fases de elabo-ração.

Os primeiros textos, escritos integralmentepor mim, parecem decorrer genuinamente dasua experiência e são diversificados nas temá-ticas que apresentam:

Eu vi um cão fantasma na televisão. (22/

/09/08)

Uma vez estive doente e vomitei. Depois

tomei chá e fiquei bom. (23/9/08)

Eu sonhei com um monstro muito grande

e depois ele comeu-me. Depois a minha mãe

foi ter comigo e eu acordei. (24/09/08)

A partir do início de Outubro, como seria deesperar, os seus relatos orais ficam mais limita-

dos na sua temática, por influência dos relatosdos colegas e dos textos trabalhados até aí.Assim, onze dos catorze textos enunciados naApresentação de Produções durante o mês deOutubro começam por Eu tenho. Por outro lado,esta limitação auto imposta permitiu-lhe ini-ciar-se no domínio do código convencional daescrita, por certo decorrente do facto de se terinstituído na turma que, sempre que nos relatosorais se integrassem palavras suas conhecidas,eu deixaria espaço para completarem. Assim,em todos esses textos, a expressão Eu tenho éescrita por ele. Muitas vezes parecia inscrever--se para a Apresentação de Produções sem terclaramente na ideia o que iria contar, elabo-rando na altura um enunciado dessa natureza.

No caso da Andreia, que a seguir ao pri-meiro dia de aulas ficou hospitalizada duranteduas semanas para se submeter a uma inter-venção cirúrgica e não esteve presente duranteos dois primeiros momentos de trabalho detexto, os relatos do início de Outubro são di-versificados, genuínos e totalmente passados aescrito por mim.

Eu fui ao médico, ele pôs-me uma más-

cara na cara para eu adormecer e tratou-me.

Não doeu nada. 29/09/08

Muitos destes relatos resultam da mostra deobjectos que trazem para a escola e a seguir di-zem que querem escrever um texto, como é ocaso do exemplo:

Eu trouxe uma carta para a professora.

Fui eu que escrevi e fiz um desenho. (03/10/

/08)

Só a partir de meados do mês passa a escre-ver sozinha, elaborando os inevitáveis relatoscircunscritos às expressões trabalhadas, deforma a sentir alguma segurança no domínioda escrita. Assim, onze dos doze textos elabo-rados entre quinze e trinta e um de Outubro,tal como quatro dos cinco textos orais de No-vembro começam por Eu tenho, Eu fiz ou Eu es-crevi. (Fig. 1)

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Outra forma de se irem apropriando da lin-guagem escrita dominante é a elaboração derelatos orais muito próximos de outros enun-ciados por colegas, que constituíram objectode trabalho ou que foram editados, comoacontece em dois dos quatro textos orais deNovembro do Jorge.

Esta limitação da oralidade imposta pela es-crita, empobrecendo e repetindo os enuncia-dos, se por um lado é inevitável e compreensí-vel do ponto de vista de quem procura apro-priar-se do código convencional, por outro éinquietante para a professora, que quer preser-var a autenticidade da comunicação e, sobre-tudo, para quem tem como objectivo que a es-crita decorra verdadeiramente do discurso in-terior das crianças.

Os relatos orais no caderno de escrita livre

Apesar de sempre se valorizarem todas astentativas de escrita nos cadernos que cada umtem para o efeito, a verdade é que muitos dos

relatos do quotidiano dos alunos passavampela Apresentação de Produções, mesmo jácom algumas palavras escritas por eles. Porisso, a partir de certa altura propus ao grupoque tentassem primeiro escrever o que que-riam comunicar, como soubessem, para depoisapresentarem.

Utilizando a metáfora de Bruner (1983),pode dizer-se que, com o retirar deste «an-daime», os textos orais na Apresentação deProduções acabaram no início de Novembro,dando lugar à leitura de textos autónomos, es-critos como eram capazes, o que permitiu darmais visibilidade às tentativas de escrita queiam sendo feitas.

Continuamos a ter muitos textos, alguns muitograndes. Já se verifica mais escrita nos cadernos deescrita livre, que é muito valorizada na apresentaçãoque fazem dela. (Diário Profissional – 17/10/08)

A escrita, nas primeiras páginas do cadernodo Jorge, é um misto de listas de palavras co-nhecidas e de pseudo-palavras, constituídas porsignos convencionais desenhados aleatoria-mente, assim como inícios de textos que con-tinuam com as mesmas pseudo-palavras oulistas de palavras suas conhecidas parecendoserem objecto de experimentações diversas.(Fig. 2)

Existe ainda a cópia de um texto traba-lhado. Em Novembro foram feitos dois relatosdo quotidiano, constituídos pela cópia parcelarde textos trabalhados mudando apenas umaou duas palavras, e sete textos escritos a meiascom um adulto em que ele mobiliza palavrasdos textos.

A Andreia começa o seu caderno de escritapela cópia de um texto recolhido em casa,logo em Setembro. Em Outubro, o seu ca-derno regista cinco cópias de textos trabalha-dos. Mas é também em Novembro que se ve-rifica uma clara caminhada para a autonomiana escrita: para além da cópia de um texto e deuma lista de nomes dos colegas, existem trêscópias parcelares, em que apenas muda uma

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palavra de textos trabalhados ou divulgados,dois textos escritos a meias com a professora,em que mobiliza palavras do património dogrupo, e já um texto escrito autonomamente,mobilizando igualmente palavras conhecidas.(Fig. 3)

Em ambos os casos continuam a ser textosmuito condicionados pelo universo de palavrasque sabem escrever. No entanto, é com essascoordenadas que se vão apropriando progres-sivamente do mundo da escrita e que vão ga-nhando confiança para se aventurarem portentativas mais arrojadas.

Este equilíbrio entre o estímulo que é necessário irfazendo para escreverem autonomamente o quequerem dizer e a riqueza e autenticidade comunica-tiva que é importante manter nos textos é uma ges-tão difícil numa altura em que os meninos se queremtestar em termos de escrita e querem, naturalmente(e nós também), escrever textos sozinhos. Esses tex-tos ficam muitas vezes reféns das palavras que jásabem escrever, apesar de lhes dizermos que não seinibam de tentar escrever ou, em último caso, deixemespaço para que outros depois completem as pala-vras que não sabem. Por isso, na apresentação deproduções, há muito que deixei de lhes escrever ostextos, embora eles mantenham o ritmo de contarcomo se estivessem a ditar. Mas vou lembrando oque já sabem escrever daquele enunciado e escrevoo seu nome no quadro para não se esquecerem deque têm um texto para escrever no TEA. No entanto,sobretudo quando têm mais do que um texto, reparoque muitas vezes já não se lembram do que queriamescrever e eu também não, no meio de tanta coisapara dar resposta. Então, a partir da discussão dostítulos para as histórias, começámos também a pen-sar nos títulos dos textos orais que, uma vez nego-ciados, ficam registados no quadro à frente dos no-mes dos seus autores, como forma de todos nos lem-brarmos do que cada um tem de escrever no TEA.Esses títulos já têm palavras do conteúdo do texto, oque lhes facilita também a escrita.

Mas a sua persistência em se autonomizarem naescrita às vezes traz dificuldades na negociação doconteúdo. Estou a lembrar-me do texto que a Cons-tança escreveu para o jornal: «Eu adoro o pai natal,a mãe natal e o cão. O pai natal é vermelho». Ela ti-nha escrito tudo isto sozinha durante a revisão quefez do seu texto e veio-me mostrar, o que valorizeibastante. Mas depois perguntei-lhe:

– Olha lá, mas então o pai-natal não tem renas?Não era isso que querias dizer? Eu posso-te ajudara escrever renas.

– O pai natal tem um animal. Pode ser um cão.Rendi-me e acabei por aceitar a sua argumenta-

ção. (Diário Profissional – 05/12/08)

Por outro lado, a revisão de textos feita co-lectivamente, que tem como finalidade pri-

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meira expandir o enunciado, ajuda-os a expli-citar cada vez melhor o seu pensamento natu-ralmente condensado e sintético.

Esta semana já foi possível fazermos revisão doescrito durante o trabalho de texto, de forma aindamuito conduzida por mim. O texto inicial era:

Eu tenho um pião,

um avião e um comboio

João

Escolhido de entre os seus muitos textos, aindada altura em que levavam brinquedos para mostrare a partir dos quais queriam escrever textos. Convi-dei-os a fazerem perguntas ao João. A Alexandraperguntou:

– Porque é que tu tens tantos brinquedos?– Eu não posso responder, é segredo. – respon-

deu ele.– Então se é segredo, podemos perguntar outras

coisas. – disse eu.Mas ele disse logo a seguir:– Está bem, eu digo. É que eu achei no lixo, mas

a minha mãe disse para eu não dizer a ninguém.– Então não vamos escrever isso, porque senão

assim toda a gente vai saber. E nós prometemos quenão vamos contar a ninguém, pois não? – disse eu.

– Não. – responderam prontamente.– Mas – continuei – podemos dizer porque é que

o João trouxe estes brinquedos para a escola, nãopodemos? Como é que podemos dizer isso?

Ficaram um momento a olhar para mim, até quea Constança avançou:

– Eu trouxe para a escola um pião, um avião eum comboio.

Escrevi e ainda perguntei:– Mas não podemos dizer para quê?

Alguém disse:– Para apresentar na apresentação de produ-

ções.Voltei a questionar:– Apresentação e apresentar não é muito pare-

cido? Podíamos substituir «apresentar» por outra pa-lavra.

Acabou por surgir o «mostrar» e ficou:

Eu trouxe para a escola

um pião, um avião e um comboio

para mostrar na Apresentação de Produ-

ções.

João

Apesar da negociação da forma acontecer muitasvezes durante o processo de escrita dos seus enun-ciados, foi importante este trabalho de negociaçãoexplícita com vista à construção colectiva do enun-ciado, para que vão tomando consciência de formasprogressivamente mais adequadas e claras de dizero que queremos, por escrito.

(Diário Profissional – 14/11/08)

A partir de Dezembro o Jorge vai elabo-rando os seus relatos do quotidiano no ca-derno de escrita livre, ainda alternados comtextos copiados por iniciativa própria, adqui-rindo uma gradual autonomia, desde a cópiaparcelar mudando apenas uma palavra, à es-crita a meias com a professora ou com colegasmobilizando palavras dos textos, o que semantém até Março.

Relativamente à Andreia, dos sete relatosdo quotidiano registados no seu caderno de es-crita livre em Dezembro dois são escritos au-tonomamente, mobilizando palavras dos tex-tos e um deles já evidencia escrita fonética,modalidade que vai desenvolvendo nos mesesseguintes, abandonando gradualmente a es-crita só de palavras conhecidas.

No entanto, os relatos do quotidiano tam-bém limitam a própria escrita, já que as vivên-cias ou os acontecimentos que relatam acabampor se repetir, por contaminação ou por poucadiversidade de vivências. Era preciso alargar ouniverso de comunicação escrita, ou seja, re-gistar outros tipos de discurso.

As histórias

A primeira história do Jorge surge em De-zembro, na Apresentação de Produções, numanarrativa oral, tendo depois dado origem a um

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livrinho, ilustrado por ele, para integrar oacervo da biblioteca da sala.

Não é por acaso que surge nestas circuns-tâncias, já que foi a altura em que o grupo semobilizou para a construção de histórias a pro-pósito da edição do jornal da turma.

A mobilização da turma para o jornal foi impor-tante para a revisão de textos e para a elaboração dehistórias. É nestas alturas que verificamos como aconstrução de obras faz avançar os grupos. De facto,depois de terem passado a computador os textospara o jornal (nas idas ao Centro de Recursos), le-vei-os para casa para montar na maqueta que já te-nho dos jornais dos outros grupos. Olhei para aque-les textos, seleccionados por cada um de entre osseus textos produzidos (orais ou os que já vão con-seguindo escrever sozinhos no caderno de escrita li-vre), e fiquei muito insatisfeita. Partilhei com aturma a minha insatisfação, por um lado por seremtextos muito pequenos e por outro por haver poucashistórias. Voltei a mostrar-lhes jornais de grupos an-teriores e convidei-os a melhorarem os seus textos apartir de perguntas feitas pelos colegas, em peque-nos grupos. Assim, num dos dias em que tivemosconnosco a Sofia e a Mafalda, organizámo-nos emgrupos e lá fomos gerindo essas revisões, que resul-taram em textos mais completos.

Mas o fenómeno mais interessante foi o da ela-boração de histórias, (que até aqui não têm ocorridomuito ou apenas a partir de sequências de imagensorganizadas no espaço dos ficheiros e das quais re-sultam livrinhos que depois ilustram) que começa-ram a surgir no momento de apresentação de produ-ções e assim substituíram os textos que os referidosautores já tinham seleccionado para o jornal. A suatextualização ia sendo objecto de negociação durantea escrita, feita de imediato numa folha afixada noquadro, à medida que o autor ia contando a história.Voltei a escrever o texto completo como fazia inicial-mente com os relatos orais, apesar de ouvir algumasvozes a lembrar «ele já sabe escrever essa palavra»,explicando que ele depois já não se lembraria e eraimportante agora não nos perdermos na sequencia-lização da história. O grupo ia ajudando, não sóna composição, como depois na selecção de um tí-

tulo, o que constituiu outra conquista importante quese generalizou a outros textos.

(Diário Profissional – 05/12/08)

Tendo tomado consciência da limitação dosenunciados dos meninos à sua fase de aquisi-ção do código alfabético, era preciso, de novo,libertar a comunicação imposta pela escrita ini-cial e voltar aos textos orais. Essas históriasnormalmente eram passadas a computadorpara darem origem a livros, como no exemploque se segue:

A turma do 1.º A

Era uma vez uma menina que encontrou

uma borboleta e um menino.

Foram brincar para um parque. Encon-

traram os meninos da turma do 1.º A. Brin-

caram muito.Jorge

No caso da Andreia, a produção de históriassurge em Janeiro durante o momento de es-crita, o que mais uma vez tem a ver com umaestratégia instituída na turma.

Um aspecto também falado no grupo cooperativoe que está a dar frutos é a existência de um momentopara a produção escrita, uma vez que, se assim nãofor, há meninos que não se aventuram pela escrita.Percebi mesmo que havia alguns que ainda não ti-nham sequer utilizado o caderno de escrita livre,mantendo a muleta da minha escrita apenas naapresentação de produções, quando ditam textos decoisas que contam. Foi também importante paraconvencer alguns mais resistentes de que já sabemmais do que imaginam ou de que estão convencidos:a Mathilde, por exemplo, insistia em dizer que nãosabia escrever. Conversei com ela acerca da impor-tância de tentar, convencendo-a de que, com a mi-nha ajuda, ela ia perceber como o podia fazer. Ládisse que queria escrever: «Eu gostei de compraruma bicicleta.» Convidei-a a procurar o «Eu gosteide», no texto dos correspondentes, escrevi «comprar»,disse-lhe para procurar «uma» e «bicicleta», pala-vras também do texto do Miguel. Ficou entusias-

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mada, circundou cada palavra que escreveu e con-tou as letras, etiquetando-as como se de um agrupa-mento se tratasse. Perguntou-me se podia fazer ou-tro texto, que escrevemos também a meias: «Eu gostode ir à escola». Venceu-se assim mais uma resistên-cia. No final iam pintando, no registo colectivo, o nú-mero de textos que iam escrevendo.

(Diário Profissional – 7/11/08)

Uma das propostas num desses momentosde escrita foi a construção de uma história apares.

O Jorge continua a sua produção de histó-rias com quatro narrativas em Janeiro, aindarelatadas oralmente, duas em Fevereiro, umadas quais onde já se verifica alguma autono-mia, e quatro em Março, uma realizada comajuda no momento de escrita, duas a meiascom a professora mobilizando palavras dostextos e uma autonomamente, mobilizando oque já sabe da linguagem escrita (palavras e bo-cadinhos). Parece ter sido este género de textoaquele em que se sentiu mais à vontade para seautonomizar neste domínio, embora utili-zando elementos de histórias anteriormenteelaboradas por si. (Fig. 4)

A Andreia continua igualmente a sua pro-dução de histórias em Fevereiro e em Marçodesenvolvendo, também neste género detexto, a escrita autónoma com recurso à escritafonética.

Muitas vezes essas tentativas de escrita au-tónoma são transcritas por mim, para que gra-dualmente os meninos sejam confrontadoscom o modelo correcto, sem ser de forma pu-nitiva, e com a finalidade de possibilitar a suapassagem a computador. (Fig. 5)

Os textos de opinião

A Andreia regista dois textos de opinião emJaneiro e o Jorge um em Fevereiro. Este tipo detexto surgiu no momento da leitura de textosdurante a Apresentação de Produções, quandose procurava categorizar o enunciado lido parase registar no mapa de Produção de Textos. Poresta altura, o referido instrumento de pilota-gem contava já com diferentes tipos de entra-das correspondentes aos textos produzidos atéaí (relatos do quotidiano, histórias e cartas).Quando foi lido um texto de alguém que ex-pressava uma opinião, foi discutida a necessi-dade de acrescentar mais uma coluna ao re-gisto. Uma vez aberta uma nova categoria, ogrupo ficou mais desperto para esse tipo de

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texto. Por outro lado, a edição de um livro so-bre uma visita de estudo à Quinta Pedagógicaestimulou a produção de textos de opinião so-bre o que mais tinham gostado na visita, umavez que combinámos que o livro iria integrar,além do que aprendemos com a visita, histó-rias com os animais da quinta e textos de opi-nião. (Fig. 6)

As cartas

Tanto o Jorge como a Andreia têm o mesmonúmero de produção de cartas. Iniciaram estetipo de texto na mesma altura, decorrente daevolução da correspondência interescolar comuma turma do 1.º ano de Trajouce desde o iní-cio do ano lectivo. Até aí as trocas eram apenascolectivas, mas, por alturas do Natal, ambas asprofessoras combinaram propor aos respecti-vos grupos o início da correspondência indivi-dual, porque alguns meninos tiveram a inicia-tiva de escrever para colegas da outra turma.Uma vez que os meninos ainda não domina-vam completamente a escrita e tendo em contaque aqueles textos iam ter de ser entendidospor outras pessoas distantes de nós, as cartasainda foram escritas num momento da semanacombinado de modo a facilitar a inter-ajudae para que o produto fosse completamente le-gível por quem o recebesse.

Em ambos os casos já se verificava muitaescrita autónoma. (Figs. 7 e 8)

As actas

A Andreia foi das primeiras crianças a ten-tar registar a acta do Conselho, seguindo algu-mas marcas das actas elaboradas pela profes-sora desde o início do ano e lidas aos meninosno início de cada sessão seguinte. (Fig. 9)

A partir de certa altura passámos a pergun-tar ao grupo, no início de cada reunião de Con-selho, quem queria uma folha para registar asdecisões ou para escrever coisas que precisavade se lembrar. Alguns optavam por escrever osnomes dos que se iam inscrevendo para falar,outros tentavam escrever coisas que ouviam,mas a capacidade de registo ainda era muito li-mitada, porque ficavam muito absorvidos pelaescrita das palavras, processo bastante morosopara alguns.

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3. (In)conclusão

Neste momento (final do 2.º período), a An-dreia já lê, descodificando qualquer mensagemescrita, embora até há bem pouco tempo nãotivesse ainda completa consciência disso. Nodia 21 de Março levei os cadernos de escritapara casa e escrevi uma mensagem em cadaum deles. No dela escrevi:

«Andreia, gostei muito de ver a tua escrita. Estása escrever muito e já sabes escrever bem. Parabéns!Só tens de melhorar a letra, que sabes fazer bem,como mostram os últimos textos. Não te esqueças deescrever as datas nos textos. Inácia»

Quando lho entreguei resolveu marcar umaleitura no TEA para descodificar a mensagem.Apenas ajudei a ler uma parte de uma palavra,de resto leu tudo. Ficou muito contente, não sópelo conteúdo como pela confirmação de quesabia ler. No dia seguinte veio dizer-me que ti-nha lido à mãe o que estava ali escrito e que elanão tinha acreditado. Só quando a própria mãeleu a mensagem é que também acreditou que aAndreia estava a ler.

O Jorge apresenta um percurso mais lento.Por essa razão e aproveitando o facto de ter-mos as estagiárias na sala a partir de Janeiro,durante o 2.º Período foi apoiado sistematica-mente pela Sofia durante o Tempo de Estudo

Autónomo. Assim, fez uma enorme evoluçãoneste domínio: lê os textos trabalhados, identi-fica muitas listas e compõe palavras com as sí-labas conhecidas, mas ainda não domina com-pletamente o código alfabético. No entanto,sustenta que já lê, ficando muito admiradoquando alguém diz o contrário. A verdade éque ele percebeu a funcionalidade da lingua-gem escrita, utiliza-a nas mais diversas si-tuações comunicativas, e por isso não com-preende como é que ainda lhe possam dizerque não lê.

Trata-se de dois percursos divergentes, masque convergem nos propósitos comunicativosdo contexto escolar em que estão mergulhadose no ponto de chegada que todos irão atingir: ocompleto domínio da linguagem escrita, utili-zada nas mais diversas situações de vida.

Verifica-se, nestes dois percursos, como es-tão interligadas a fala, a escrita e a leitura,sendo evidente uma imposição inicial da es-crita à fala, circunscrevendo-a para possibilitara apropriação pelas crianças do desenho daspalavras. Mas torna-se também visível como àmedida que a escrita se vai distanciando dafala, através do trabalho de revisão progressi-vamente mais aprofundada dos textos e doalargamento das tipologias discursivas, aquelase vai autonomizando e complexificando,como sustenta Sérgio Niza (2007).

Trata-se de interrogar o pensamento parauma explicitação exaustiva, processo oposto àlinguagem interior, essencialmente predicativae condensada (Vygotsky, 1934/87), exigênciaimposta muito mais pela escrita do que pelooral.

De acordo com Braslavsky (1992), «pode-mos dizer que, dado o carácter abstracto da es-crita alfabética e dadas as diferenças estrutu-rais que existem entre a linguagem oral, inte-rior e escrita, a criança tem que realizar umaactividade reflexiva consciente» (p. 44). Mas éexactamente essa reflexão, na vivência de per-cursos de co-construção de produtos culturaisautênticos de escrita, estimulada pela intersub-jectividade inerente aos processos dialógicos,

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que propicia o desenvolvimento metacogni-tivo da linguagem.

No entanto, dada a complexidade do pro-cesso, Niza (2007) defende:

Essa sofisticada estruturação torna dificilmentenatural ou espontânea a sua aprendizagem. Acen-tua-se então a necessidade de um processo explí-cito de mediação dos adultos e dos pares na produ-ção compartilhada da escrita, quer na apropriaçãoinicial dos primeiros registos de coisas contadas,quer no desenvolvimento da comunicação escritadiferenciada, para produzir tipos de textos adapta-dos às distintas actividades sociais que a escritaserve (p. 15).

A par da procura de uma maior compreen-são de como as crianças se apropriam da lin-guagem escrita, é a optimização dessa media-ção que continuo a interrogar. Será que forammontados os andaimes necessários? De quemodo condicionaram o desenvolvimento daescrita? Em que medida esses mesmos andai-mes foram retirados no tempo certo? Será umainevitabilidade do processo a redução do dis-curso a uma dimensão mais mecânica da es-crita durante os primeiros tempos de apropria-ção do código alfabético? Como podemos ace-lerar o processo?

São interrogações destas que nos perse-guem e relativamente às quais não poderemos,no que se refere a este contexto, saber as res-postas. Apenas podemos olhar mais de perto,o que tem acontecido através da mediação re-flexiva da escrita, para melhor regular os per-cursos.

A maior revelação, nesta análise, foi a evi-dência da importância da abertura da escrita aoutras tipologias discursivas para o alarga-mento da comunicação e para a libertação dascrianças da natural tendência de repetição doconhecido, por se sentirem mais seguras.

É preciso agora promover a tomada deconsciência da macro-estrutura dos diferentestipos de textos, através do trabalho persistentee continuado de aperfeiçoamento dos enuncia-dos escritos, em múltiplas situações de interac-

ção, com vista à sua divulgação sistemática nosdiversos circuitos instituídos, procurando as-sim recuperar e alargar o fluxo comunicativoda escrita.

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