19

joão ramos almeida e josé castro caldas [cadenos do observatório] 2014_quanto é que os salários teriam de descer para tornar a economia portuguesa competitiva [mar].pdf

Embed Size (px)

Citation preview

  • Quanto que os salrios teriam de descer para tornar a economia portuguesa

    competitiva?

    Joo Ramos de Almeida e Jos Castro Caldas

  • Cadernos do Observatrio

    3

    Segundo um diagnstico muito difundido, Portugal acumulou grandes dvidas e

    dfices externos porque a sua economia perdeu competitividade em consequncia

    do aumento excessivo dos salrios. Deste diagnstico decorre que a soluo para

    o reequilbrio das contas externas seria a reduo dos salrios e dos impostos

    pagos pelas empresas que sobre eles incidem.

    Efetivamente, os dfices da balana corrente de Portugal aumentaram

    muito entre 1995 e 2007 e a dvida externa cresceu extraordinariamente. Mas ser

    que o crescimento dos dfices e da dvida so consequncia de um aumento

    desmesurado dos salrios? Ser que a reduo dos salrios e dos custos salariais

    das empresas permitiria recuperar a competitividade e assegurar o equilbrio das

    contas externas? Quanto teria de cair o salrio mdio para que se atingisse esse

    objetivo? Quantos postos de trabalho teriam de ser destrudos e qual o nmero de

    desempregados a criar para que os salrios descessem para os nveis desejados?

    E o que aconteceria sociedade portuguesa nesse caso?

    Este caderno do Observatrio sobre as Crises e Alternativas do Centro de

    Estudos Sociais (CES) coloca estas questes, que, na realidade, raramente so

    colocadas e muito menos respondidas com estudos aprofundados. E no entanto,

    esta tem sido a lgica imposta aos trabalhadores deste pas, atravs de um

    ajustamento econmico, apresentado como o nico possvel, nas condies de

    pertena zona euro.

    Dfice, dvida externa e salrios

    Entre 1996 e 2008, o dfice da balana corrente (ver caixa 1) aumentou

    extraordinariamente, passando de cerca de 4% do PIB para mais de 12%. Para

    esse aumento do dfice contriburam principalmente a degradao das balanas

    de mercadorias e de rendimentos (ver grfico 1). Nesses anos, o ritmo de

    crescimento das importaes de mercadorias (matrias-primas e produtos

    intermdios e bens de consumo) foi superior ao das exportaes. Por outro lado,

    os rendimentos transferidos para o exterior, sobretudo juros de emprstimos,

    cresceram mais do que os rendimentos de trabalho e de capital transferidos para

    Portugal.

  • #1 Quanto que os salrios teriam de descer para tornar a economia portuguesa competitiva?

    4

    A par do agravamento do dfice externo, a dvida externa (lquida, isto ,

    deduzida da dvida de entidades no-residentes a entidades residentes em

    Portugal), medida pela posio de investimento internacional lquida (ver caixa 2),

    agravou-se muito, tendo passado de 9,5% do PIB, em 1996, para cerca de 96%, em

    2008 (ver grfico 2).

    Grfico 1

    Balana corrente, total e componentes, 1996 - 2012

    Fonte: Banco de Portugal

    -15

    -10

    -5

    0

    5

    10

    19

    96

    19

    97

    19

    98

    19

    99

    20

    00

    20

    01

    20

    02

    20

    03

    20

    04

    20

    05

    20

    06

    20

    07

    20

    08

    20

    09

    20

    10

    20

    11

    20

    12

    % P

    IB

    Total MercadoriasServios RendimentosTransferncias correntes

    A balana corrente regista as transaes entre residentes e no residentes associadas ao comrcio internacional de mercadorias e servios e aos rendimentos do trabalho e de investimento. Incluem-se, tambm, nesta balana os valores correspondentes a transferncias correntes como: (a) remessas de emigrantes e imigrantes; (b) transferncias correntes com a Unio Europeia; (c) fluxos financeiros associados cooperao entre Estados; (d) recebimento de penses por emigrantes regressados definitivamente. Por grandes componentes, esta balana desagrega-se em: Mercadorias, Servios, Rendimentos e Transferncias correntes.

    Caixa 1 A balana corrente

  • Cadernos do Observatrio

    5

    Grfico 2

    Posio de investimento internacional lquida, 1996 - 2012

    Fonte: Eurostat

    Entre 1996 e 2007, em termos reais (isto , descontado o efeito do aumento

    dos preos), os salrios cresceram 11% e a produtividade 15%. Como visvel no

    grfico 3, os salrios em Portugal, quer em termos nominais, quer reais, evoluram

    a par da produtividade, pelo que atribuir a perda de competitividade a um

    aumento desproporcionado nos salrios, no tem fundamento.

    Para compreender as causas do agravamento do dfice e da dvida externa

    preciso olhar noutra direo e recuar um pouco mais na histria recente de

    Portugal.

    -140

    -120

    -100

    -80

    -60

    -40

    -20

    01

    99

    6

    19

    97

    19

    98

    19

    99

    20

    00

    20

    01

    20

    02

    20

    03

    20

    04

    20

    05

    20

    06

    20

    07

    20

    08

    20

    09

    20

    10

    20

    11

    20

    12

    % P

    IB

    A posio de investimento internacional lquida a diferena entre ativos e passivos financeiros de um pas face ao resto do mundo. Quando a posio de investimento internacional lquida negativa, o seu valor absoluto representa o passivo externo lquido do pas, uma medida do endividamento externo (privado e pblico) de um pas.

    Caixa 2

    Posio de investimento internacional lquida

  • #1 Quanto que os salrios teriam de descer para tornar a economia portuguesa competitiva?

    6

    Grfico 3

    Salrios e produtividade em Portugal (ndice 1996=100)

    Fonte: AMECO

    Antecedentes

    Em 1990, o governo de Cavaco Silva em que Miguel Beleza e Jorge Braga de

    Macedo foram ministros das Finanas e Vtor Gaspar o seu representante pessoal

    na conferncia intergovernamental que negociou o Tratado de Maastricht ps

    fim desvalorizao deslizante do Escudo. At essa altura, o Escudo ia-se

    desvalorizando periodicamente segundo um calendrio conhecido.

    Em consequncia destas desvalorizaes cambiais, os produtos

    portugueses tornavam-se mais baratos no exterior o que permitia s empresas

    exportadoras recuperar a competitividade perdida devido ao aumento dos preos

    internos e presso dos concorrentes internacionais e os preos dos produtos

    importados vendidos no pas subiam, facilitando a substituio de produo

    importada por produo nacional. As desvalorizaes cambiais impediam, por um

    lado, o agravamento do dfice externo, mas, por outro, geravam inflao.

    Aps um perodo de crescimento econmico nos anos 80, Portugal

    enveredou tal como outros pases europeus de caractersticas semelhantes

    100

    110

    120

    130

    140

    150

    160

    170

    180

    1901

    99

    6

    19

    97

    19

    98

    19

    99

    20

    00

    20

    01

    20

    02

    20

    03

    20

    04

    20

    05

    20

    06

    20

    07

    20

    08

    20

    09

    20

    10

    20

    11

    20

    12

    20

    13

    Remunerao real por trabalhador PIB real por trabalhador

    Remunerao nominal por trabalhador PIB nominal por trabalhador

  • Cadernos do Observatrio

    7

    (Espanha e Itlia) por uma estratgia de desinflao competitiva 1 . Ou seja,

    decidiu ancorar o Escudo taxa nominal do Marco alemo. Considerava-se ento

    que esta opo era vantajosa porque valorizando o Escudo atenuava-se a inflao

    importada e obrigar-se-ia as empresas a competir no exterior, no atravs de

    preos mantidos baixos pelas desvalorizaes cambiais, mas atravs da oferta de

    produtos mais sofisticados e com procura mais dinmica nos mercados

    internacionais. No horizonte, estava a adeso ao Euro e a preocupao de levar o

    pas a ocupar uma posio no peloto da frente da Unio Europeia.

    Essa poltica foi seguida mesmo aps a reunificao alem em 1989, a qual,

    ao igualar o Marco ocidental ao oriental, causou um abrandamento econmico na

    Unio Europeia. Em resultado, o Escudo apreciou-se em 1991 e 1992, e as taxas

    de juro nacionais aumentaram, degradando a situao financeira das empresas,

    provocando falncias e fazendo subir a taxa de desemprego. A economia entrou

    em recesso em 1993, uma das mais profundas da Europa. Apesar disso, Braga de

    Macedo afirmava comunicao social que Portugal um osis e insistia na

    poltica de Escudo forte. A convergncia real da economia portuguesa com a Unio

    Europeia, conseguida nos anos 1985/90, foi assim progressivamente substituda

    por uma divergncia real. A partir de 1993, comearam degradar-se as contas

    externas portuguesas.

    Os governos de Cavaco Silva e de Antnio Guterres, e as administraes do

    Banco de Portugal de Jos Tavares Moreira (1986/92), Miguel Beleza (1992/94),

    Antnio de Sousa (1994/2000), e Vtor Constncio (2000/2010), apostaram todos

    na poltica de Escudo forte, enfatizando os benefcios que dela decorreriam

    baixas taxas de juro, dada a reduo do risco do pas. A adeso ao Euro, em 1999,

    consagrou-a.

    Os efeitos da ancoragem da economia portuguesa a uma moeda que fraca

    para a economia alem, mas demasiado forte para a economia portuguesa, so

    hoje conhecidos. O prprio Vtor Gaspar, num artigo publicado em 2006 2 ,

    constatava que a participao de Portugal na Zona Euro redundou numa

    apreciao da taxa de cmbio efetiva real (ver grfico 4). Essa valorizao foi

    acentuada entre 2000 e 2005 cerca de 13%.

    1 Margarida Abreu, A natureza das crises cambiais do escudo entre 1992 e 1995, ISEG - CISEP Working Papers 2, 1999. 2 Gabriel Fagan e Vtor Gaspar, Adjusting to the Euro, Banco Central Europeu, working paper n. 716, 2007.

  • #1 Quanto que os salrios teriam de descer para tornar a economia portuguesa competitiva?

    8

    Grfico 4

    Taxa de cmbio efetiva real de Portugal (ndice 2003=100)

    Fonte: Banco de Pagamentos Internacional

    A apreciao real do Euro para Portugal no poderia deixar de ter como

    consequncia uma perda de competitividade da produo nacional face

    produo internacional. Neste contexto, ao mesmo tempo que os setores

    produtores de bens transacionveis (sujeitos concorrncia internacional)

    perdiam rendibilidade e regrediam, os sectores de bens no-transacionveis (no

    sujeitos concorrncia externa) tornavam-se mais rentveis e expandiam-se. No

    conjunto da economia observou-se uma substituio de produo nacional por

    bens importados que teve como resultado um progressivo desequilbrio das

    contas externas.

    O desequilbrio tornou-se cumulativo porque a economia portuguesa

    passou a ter acesso a crdito abundante e barato (ver grfico 5). Este fenmeno,

    potenciado pela ampliao e crescente desregulamentao da atividade bancria,

    deu origem ao extraordinrio endividamento externo acima referido.

    84

    86

    88

    90

    92

    94

    96

    98

    100

    102

    104

    106jan/94

    ago/94

    mar/95

    out/95

    mai/96

    dez/96

    jul/97

    fev/98

    set/98

    abr/99

    nov/99

    jun/00

    jan/01

    ago/01

    mar/02

    out/02

    mai/03

    dez/03

    jul/04

    fev/05

    set/05

    abr/06

    nov/06

    jun/07

    A taxa de cmbio real (TCR) o produto da taxa de cmbio nominal (o preo de um dlar em euros, por exemplo) e o rcio dos preos nos dois pases a que as moedas se referem: TCR = e P*/P, em que e representa a taxa de cmbio nominal da moeda do pas A expressa na moeda do pas B, P* o preo de um cabaz de bens no pas B e P o preo do mesmo cabaz no pas A. A taxa de cmbio efetiva real a mdia ponderada das taxas de cmbio reais bilaterais entre um pas e os seus principais parceiros comerciais.

    Caixa 3

    Taxa de cmbio efetiva real

  • Cadernos do Observatrio

    9

    Grfico 5 Taxas de juro real de longo prazo (mdia ponderada de ttulos pblicos e privados acima

    de cinco anos)

    Fonte: AMECO

    A sobrevalorizao do Euro para Portugal e o sbito acesso a crdito

    abundante e barato so subestimados nas anlises convencionais sobre a origem

    do endividamento. No entanto, contrariamente ao diagnstico convencional, o

    endividamento externo no resultou de um crescimento desmesurado dos

    salrios mas de: 1) uma valorizao cambial artificial, decorrente da ancoragem

    ao Marco alemo, primeiro, e ao Euro, depois; 2) da expanso do sector de bens

    no-transacionveis em detrimento dos setores expostos concorrncia

    internacional; 3) do acesso a um financiamento abundante e a baixos custos

    proveniente de economias superavitrias.

    Um mau diagnstico leva sempre a terapias erradas. E esse tem sido o caso

    a nvel internacional e no caso portugus. Julgando que tudo se trata de um

    desajuste entre a produtividade e os nveis salariais praticados, os defensores do

    diagnstico convencional encontram como soluo para o desequilbrio em

    Portugal a desvalorizao interna, isto , a reduo dos salrios nominais e de

    outros custos salariais das empresas.

    Num artigo muito influente sobre a economia portuguesa, publicado em

    2006, o economista-chefe do Fundo Monetrio Internacional (FMI), Olivier

    Blanchard3 , defendia a desvalorizao interna como via para reequilbrio das

    contas externas, num contexto de moeda nica em que a desvalorizao cambial

    3 Olivier Blanchard, Adjustment within the euro. The difficult case of Portugal, 2006, http://economics.mit.edu/files/740.

    0

    2

    4

    6

    8

    10

    12

    19

    96

    19

    97

    19

    98

    19

    99

    20

    00

    20

    01

    20

    02

    20

    03

    20

    04

    20

    05

    20

    06

    20

    07

    20

    08

    20

    09

    20

    10

    20

    11

    20

    12

    20

    13

    %

  • #1 Quanto que os salrios teriam de descer para tornar a economia portuguesa competitiva?

    10

    no possvel. Com esse objetivo, defendia toda uma panplia de polticas

    econmicas, visando reduzir os custos salariais das empresas (sobretudo das

    empresas exportadoras) e, assim, baixar os seus preos para promover ganhos de

    quotas de mercado no exterior: 1) alterar as leis de proteo do emprego; 2)

    desproteger o desemprego, forando a um ajuste entre oferta e procura que

    tenderia a forar a desvalorizao salarial; 3) congelar ou reduzir os salrios

    nominais, por presso do aumento do desemprego; 4) aumentar os preos

    relativos dos bens no-transacionveis, mantendo o preo dos bens

    transacionveis; 5) aumentar os impostos que mais influenciam a procura interna

    (nomeadamente o IVA).

    As polticas preconizadas nos PEC do governo de Scrates e no Memorando

    da troica, seguidas em Portugal a partir de 2010, obedecem em grande parte a esta

    lgica de desvalorizao interna, quer quanto ao aumento dos impostos sobre o

    rendimento, quer na reduo da proteo ao desemprego, quer forando mesmo

    um maior desemprego como varivel de ajustamento salarial.

    Trs anos de ajustamento imposto

    Desde a alterao da poltica europeia de combate crise no incio de 2010, com a

    passagem do estmulo oramental para a austeridade, as medidas adotadas tm-

    se baseado na terapia de desvalorizao interna. Cortes nos vencimentos do

    funcionalismo pblico (uma referncia para o sector privado), impostos sobre os

    rendimentos dos assalariados e pensionistas (subida exponencial do IRS, com

    descida do IRC), constantes presses por parte do Conselho Europeu, da Comisso

    Europeia, do Eurogrupo e da OCDE, para flexibilizar a legislao laboral, facilitar o

    despedimento individual (como varivel de ajustamento salarial), cortar

    compensaes por despedimento, reduzir a proteo no desemprego (tanto em

    durao como no montante de subsdio) e reduzir o mbito da contratao

    coletiva. Medidas todas elas tendentes reduo dos salrios.

    A presso no sentido da desvalorizao interna intensificou-se ao longo de

    2011. Em maro/abril de 2011 fez-se sentir no movimento Mais Sociedade

    promovido pelo PSD de Passos Coelho. Na conferncia realizada, foi defendido que

    Portugal tem de "promover o ajustamento rpido dos custos salariais", o que

    deveria passar "pelo aprofundar da flexibilizao do mercado de trabalho, tanto

    no mbito dos modelos contratuais, como na reduo custos de resciso e na

    reduo dos custos de oportunidade que os desempregados enfrentam para

    aceitar novas propostas de trabalho.

    Numerosos economistas corroboraram na televiso as mesmas solues. O

    prprio Banco de Portugal, nos seus boletins, fez publicar artigos enfatizando a

    vantagem de tributar mais o consumo (via IVA) e reduzir os encargos patronais

    associados ao emprego. Em abril de 2011 utilizou mesmo o seu modelo econmico

    PESSOA para estudar os impactos desta poltica. Reduzindo 4 pontos percentuais

  • Cadernos do Observatrio

    11

    na taxa social nica (TSU) patronal, conclua que o PIB aumentaria 0,2 pontos

    percentuais no ano de adoo da medida e, a partir da, cresceria 0,6 pontos

    percentuais face ao cenrio base.

    Na mesma altura, a ideia de reduo da TSU patronal foi trazida pelo PSD

    para cima da mesa das negociaes com a troica e sugerida ao governo, em carta

    que foi tornada pblica. O chefe da equipa negociadora do PSD, Eduardo Catroga,

    defendeu que a medida estava j h meses a ser estudada por Pedro Passos

    Coelho: Se algum aumento de impostos, direto ou indireto, tiver de existir, essa

    receita deve servir apenas para reduzir a TSU, refere-se na carta. O Memorando

    de Entendimento, de 3 de maio de 2011, adotou a reduo da TSU como medida

    de promoo da competitividade4. Trs dias mais tarde, o chefe de misso do FMI

    em entrevista ao stio online do FMI defendeu uma reduo da TSU patronal entre

    12 a 16 pontos percentuais. A reduo da TSU patronal passou a constar do

    programa eleitoral do PSD para as eleies antecipadas de 5 de junho de 20115.

    J em plena campanha eleitoral, o Presidente da Repblica veio defender a

    reduo dos impostos que incidem sobre o fator trabalho pagos pelas empresas6.

    Durante a campanha, Passos Coelho volta a insistir: "Diminuir rapidamente os

    custos do trabalho" a "nica possibilidade" que Portugal tem, nos prximos anos,

    de promover a competitividade da economia visto que todos os outros fatores o

    marketing, a identificao de novos canais de distribuio e a qualificao dos

    recursos humanos, apontou "demoram muito tempo a evoluir e a ter reflexos".

    O coordenador do programa eleitoral do PSD Eduardo Catroga volta a provocar

    polmica ao afirmar que a descida de 4 pontos da TSU prevista no programa

    eleitoral era apenas a primeira fase de duas descidas, at 8 pontos percentuais7.

    4 Na pgina 12, ponto 39, refere-se: Um objetivo crtico do nosso programa aumentar a competitividade. Isto envolve uma reduo substancial a major reduction nas contribuies dos empregadores para a Segurana Social. 5 O reforo da competitividade da economia portuguesa passa, j em 2012, pela reduo dos encargos sociais sobre o fator trabalho em sede de Taxa Social nica (TSU), dirigida para as empresas exportadoras ou que evitam importaes. A compensao das receitas da Segurana Social seria feita com uma eventual reestruturao do IVA. A TSU ser reduzida at 4% entenda-se quatro pontos percentuais ao longo da legislatura, tendo em vista o objetivo estratgico de acorrer a reduo dos custos de produo do sector de bens transacionveis, bem como no caso das empresas exportadoras, segundo modelo a definir no OE 2012. 6 Cavaco Silva disse ser possvel ganhar competitividade diminuindo os impostos que incidem sobre o fator trabalho e, eventualmente, aumentando impostos sobre o consumo". sabido que, para conseguir uma desvalorizao num pas que no tem moeda prpria, temos que abrir mo de impostos que incidem sobre o factor trabalho, disse Cavaco Silva, em Beja, durante a visita feira agropecuria Ovibeja. 7 Em declaraes ao Dirio de Notcias, afirma: No pode ser tudo feito numa fase porque o governo do PS esgotou a margem de manobra para mexer no IVA. O objectivo que a medida tenha uma dimenso estrutural, estendendo-se por vrios anos. Quanto aplicao da segunda fase, Eduardo Catroga, explica que depende da reao da economia, at porque, na sua opinio, a medida autofinancivel em trs ou quatro anos. Catroga conclua que o PSD poderia optar por s reduzir os segundos quatro pontos percentuais numa prxima legislatura, at porque seria muito provvel que a economia portuguesa no conseguisse recuperar o suficiente at 2015. Mais tarde, Carlos Moedas, do gabinete de estudos do PSD, veio dizer que Catroga falava em nome

  • #1 Quanto que os salrios teriam de descer para tornar a economia portuguesa competitiva?

    12

    Na sua tomada de posse, a 21 de junho de 2011, Pedro Passos Coelho reafirma a

    medida8.

    No entanto, os acontecimentos seguintes viriam a revelar a impreparao

    de instituies internacionais e dos defensores da desvalorizao interna como

    medida de promoo da competitividade e emprego.

    Em julho de 2011 elaborado o primeiro estudo acerca dos efeitos da

    descida da TSU, a cargo de tcnicos de diversos ministrios e do Banco de Portugal.

    A concluso bastante crtica em relao aos propsitos do governo porque: 1)

    dificilmente se poder adotar medidas discriminadas para o sector exportador; 2)

    sendo generalizada para o conjunto das empresas, qualquer descida de 1 ponto

    percentual da TSU teria um custo de 400 milhes de euros para a Segurana Social,

    que, a ser compensado pelo aumento do IVA, teria efeitos macroeconmicos que

    no devem ser ignorados (no consumo, na receita fiscal, no dfice oramental);

    3) a reduo da TSU poderia no se refletir nos preos dos bens, o que limitaria o

    impacto desta medida na competitividade externa da economia portuguesa e

    teria um custo para a sociedade elevado, uma vez que se est a transferir poder

    de compra dos consumidores para lucro dos produtores, o que significaria um

    subsdio s empresas menos eficientes.

    Nesta fase, o PSD e o CDS entram em sucessivas contradies sobre a forma

    de tornar a medida neutra do ponto de vista oramental e a proposta de

    desvalorizao fiscal por reduo da TSU patronal perdeu fulgor a favor de outras

    medidas de desvalorizao interna.

    Isso mesmo confirmado pela sucesso de medidas negociadas em

    concertao social, todas elas visando a desvalorizao dos custos do trabalho:

    reduo da compensao por despedimento, reduo das obrigaes das

    empresas junto das autoridades de superviso, alterao legislao laboral,

    aumento do horrio de trabalho9.

    individual e que apenas pretendiam baixar "at quatro pontos percentuais" e de forma gradual ao longo da legislatura. 8 estagnao econmica respondemos com o Programa para o Crescimento, a Competitividade e o Emprego, que ataca os bloqueios produtividade e iniciativa empresarial, e que aposta nos sectores dos bens transacionveis, disse. As medidas da chamada desvalorizao fiscal constituem uma aposta decisiva na reaquisio de competitividade externa, de crescimento do sector de bens transacionveis, mas tambm na criao de emprego, ao diminurem a penalizao fiscal do trabalho. 9 O aumento da jornada de trabalho tem o objetivo de tentar colmatar a desvalorizao dos custos de trabalho, que a troica e o governo consideravam que era possvel com a descida da TSU, afirmou Passos Coelho. Substitui a descida da TSU, que requer condies oramentais particulares que, neste momento, o pas no rene. Para os sindicatos, tratar-se-ia de um recuo histrico que punha em causa a jornada de 8 horas, redundando a medida em dar ao patronato, pelo menos, um sbado por ms de trabalho gratuito. Joo Proena, da UGT, classificou a proposta do governo de inqualificvel e que no assinaria o acordo tripartido. Apesar da CIP ser favorvel, entendia que esta poderia ser melhorada e propunha a criao de uma bolsa anual de horas de trabalho, em vez das duas horas e meia por semana que teriam de ser usadas na 5. semana de trabalho. A proposta da meia hora adicional agradou ao presidente da CCP Vieira Lopes, embora considerasse que

  • Cadernos do Observatrio

    13

    O aumento do horrio de trabalho foi inicialmente proposto por dois

    economistas e ex-ministros de governos socialistas Campos e Cunha e Daniel

    Bessa. Em teoria, corresponderia a uma desvalorizao de 6,25% dos custos de

    trabalho, estimando o governo que iria aumentar a produtividade das empresas

    em 4%.

    O acordo tripartido firmado a 18 de janeiro de 2012 com o patronato e com

    a UGT serviu de matriz proposta de terceira alterao do Cdigo do Trabalho

    aprovada em Conselho de Ministros, a 2 de fevereiro. O texto acabou por no

    incluir o aumento de 30 minutos na jornada de trabalho, mas indo mais longe do

    que o Memorando de Entendimento com a troica, contemplou medidas cujo efeito

    foi ainda superior10. Nas 14 das 53 pginas do Compromisso para o Crescimento,

    Produtividade e Emprego, previu-se a criao de banco de horas individuais, a

    reduo para metade da remunerao pelo trabalho extraordinrio e em feriado,

    o fim do descanso compensatrio por trabalho extraordinrio, o fim de 3 dias de

    frias por assiduidade e de 4 feriados nacionais, maior flexibilidade nas formas de

    despedimento por extino do posto de trabalho e por inadaptao, o corte de

    33% nas compensaes por despedimento de acordo com o Memorando de

    Entendimento11 e, ainda, corte no subsdio de desemprego em 10% ao fim de 6

    meses e a reduo da durao at um mximo de 540 dias (contra 1140 dias ento

    em vigor).

    A 28 de maro desse ano, o ministro lvaro Santos Pereira foi ao Parlamento

    e defendeu a proposta de lei como sendo capaz de desarticular a relao entre a

    subida estrutural do desemprego (registada desde 2001, aps a adeso ao Euro)

    e as leis laborais, atenuando a sua rigidez. O papel do governo passa por acelerar

    o ritmo, procurando antecipar os bons efeitos que esta reforma vai produzir no

    mercado laboral em Portugal, disse o ministro.

    No entanto, nenhum estudo sobre o impacto da alterao legislativa no

    emprego foi distribudo. Os nicos clculos conhecidos foram os divulgados na

    vspera da lei entrar em vigor, a 1 de agosto de 2012, apenas comunicao social.

    Pouco mais do que uma tabela em que se refere que a eliminao de 4 feriados

    geraria um aumento do emprego de 0,83% no curto prazo e de 3,46% no longo

    prazo; o fim dos 3 dias de frias daria uma subida do emprego de 0,63% no curto

    podia ser alterada, passando a dez dias a mais por ano, jogando com trs dias de frias e quatro feriados. Ambas as ideias seriam acolhidas na terceira alterao ao Cdigo do Trabalho, com o aval da UGT. 10 Passos Coelho declarou na cerimnia de assinatura do acordo, a 18 de janeiro: No se pode dizer que o acordo ficou preso letra do Memorando de Entendimento. Conseguimos em vrios aspetos ser mais ambiciosos, mais inovadores e mais audazes do que constava dos nossos compromissos internacionais, disse. 11 Durante a negociao do acordo, o governo ainda tentou acabar com a salvaguarda de a reduo da compensao apenas se aplicar aos novos desempregados (prevista no Memorando de Entendimento), mas no teve fora suficiente. E voltou a pens-lo em julho de 2012, mas voltou a recuar.

  • #1 Quanto que os salrios teriam de descer para tornar a economia portuguesa competitiva?

    14

    prazo e de 2,6% no longo prazo; o corte na retribuio do trabalho extraordinrio

    e o fim do seu descanso compensatrio mais 0,3% no curto prazo e 1,26% no longo

    prazo e que a reduo da compensao por despedimento aumentaria o emprego

    em 0,78% no curto prazo e de 3,23% no longo prazo. Ao todo, o governo previa

    que parte das alteraes lei laboral resultassem num corte de 5,23% no custo

    por hora trabalhada e que essa reduo nos custos do trabalho redundaria na

    subida do emprego de 2,54% no curto prazo (dentro de um ano) e de 10,55% a

    longo prazo.

    Todas as alteraes proposta da lei do trabalho foram rejeitadas pelos

    deputados do PSD e CDS. A aprovao final deu-se a 11 de maio, a lei foi

    promulgada a 18 de junho e publicada a 25 de junho de 2012, como lei 23/2012,

    com efeitos a 1 de agosto de 2012.

    Ao todo, como o Observatrio sobre Crises e Alternativas estimou por

    defeito 12 , estas alteraes podem representar um acrscimo significativo do

    Excedente Bruto de Explorao das empresas. Reduo da retribuio por

    trabalho extraordinrio (632 milhes de euros), dois feriados apropriados (440,9

    milhes de euros), reduo da retribuio de trabalho em feriado (13,3 milhes

    de euros), trs dias de frias (736,3 milhes de euros), fim do descanso

    compensatrio por trabalho suplementar (373 milhes de euros). Ao todo, e por

    defeito, quase 2,2 mil milhes de euros. Na realidade, a lei 23/2012 concedeu s

    empresas um benefcio agregado superior ao que o governo chegou a pretender,

    em 2011, quando quis descer quatro pontos percentuais da TSU das empresas,

    pagos com a subida das taxas de IVA 1,6 mil milhes de euros. As alteraes

    lei laboral equivaleram a uma descida de mais de 5,5 pontos percentuais da TSU.

    Passado um ms da entrada em vigor da nova lei laboral, a 7 de setembro de

    2012, e para surpresa geral, o governo retomou a proposta da desvalorizao

    fiscal. O espanto foi tanto maior quanto o prprio Vtor Gaspar hesitava em

    defender a medida13 e at Passos Coelho afirmara que Portugal no seria palco de

    experincias radicais. A alterao TSU foi, contudo, anunciada nas vsperas de

    um exame decisivo pela troica e quando as metas oramentais estavam muito

    longe do previsto. A inteno era reduzir a TSU das empresas, de 23,75 para 18%,

    compensada desta vez pelas contribuies dos trabalhadores que subiriam de 11

    para 18%. Torna-se claro que a medida correspondia, sim, a uma transferncia

    dos trabalhadores para as empresas de 2,3 mil milhes de euros14. A medida nunca

    tinha sido anteriormente testada em algum pas.

    12 Relatrio preliminar A Anatomia da Crise: Identificar os Problemas para construir as Alternativas, Observatrio sobre Crises e Alternativas, dezembro 2013. 13 Apesar disso, Vtor Gaspar deu a cara pela medida e assumiu que mudara de opinio, aps novos estudos, realizados sob os auspcios da troica e em que o Banco de Portugal no participou. O Ministrio das Finanas nunca deu acesso pblico a esses estudos. 14 A reduo da TSU dos empregadores reduziria os custos mdios de produo das empresas em apenas 1,2%, mas provocava uma reduo de 7% do rendimento bruto mensal dos trabalhadores

  • Cadernos do Observatrio

    15

    Sob a contestao unnime, das ruas s confederaes patronais, o governo

    recuou15. Era o terceiro recuo do governo nas suas medidas para promover a

    competitividade custa dos custos salariais. Primeiro, foi a descida da TSU das

    empresas compensado por IVA (2011), depois a subida em meia hora no trabalho

    dirio (2011), embora mais do que compensado por outras alteraes da

    legislao laboral e, finalmente, o agravamento da TSU dos trabalhadores

    (2012)16.

    No entanto, o recuo na TSU tornou claro que as alteraes ao Cdigo do

    Trabalho concretizavam parte do objetivo da troica em realizar uma

    desvalorizao interna por via da reduo da TSU patronal, como forma de

    promover a competitividade externa. Em 2011, o FMI defendeu uma descida da

    TSU em 16 pontos percentuais. Caso no tivesse sido recusada, o impacto das

    mexidas na TSU com as alteraes laborais representavam uma reduo dos

    encargos salariais correspondente, pelo menos, a 11,25 pontos percentuais da

    TSU.

    Cortar nos salrios para ganhar competitividade?

    Atente-se no quadro reproduzido abaixo. Os nmeros representam os valores da

    atividade do conjunto das empresas de Portugal, calculados pelo Instituto

    Nacional de Estatstica (INE), a partir dos dados declarados pelas prprias

    empresas, referentes aos anos de 2010 e 2011, os ltimos anos disponveis.

    e, a prazo, um encarecimento de 45% do prmio para uma mesma futura penso de reforma. A poupana mdia das PME, por empresa, rondaria os 5 mil euros anuais e as grandes empresas conseguiriam ganhos mdios de 900 mil euros anuais. Ou seja, 75% do universo empresarial mal sentiria os seus benefcios, mas seria prejudicado pela forte contrao do poder de compra dos trabalhadores, aliado a mal-estar nas empresas e a quebras de produtividade. 15 pblico que a medida que foi apresentada foi percecionada pelo pas muito para alm daquilo que era a inteno do governo, declarou Passos Coelho. Foi tomada, em primeiro lugar, como um sinal de distribuio inequitativa do esforo que deveramos despender para vencer a crise, provocando uma transferncia de recursos do sector do trabalho para o sector do capital e ameaando dessa maneira o entendimento do consenso social (). E em segundo lugar, a medida foi, se no mal entendida, foi mesmo subvertida naquilo que eram os seus propsitos quando diversos empresrios e estruturas representativas dos empresrios afirmavam estar disponveis para anular o efeito dessa medida. Por isso, no faria sentido que o Estado lhes agravasse os seus custos. E menos sentido ainda faria que as prprias empresas decidissem aumentar os seus custos e penalizar a sua competitividade para anular o efeito de uma medida que o governo pretendia adotar justamente para que o crescimento pudesse ocorrer mais cedo. Por essa razo manifestei abertura para encontrar uma alternativa a essa alterao. 16 Passos Coelho lamentava-se: sem a descida da TSU, as medidas alternativas de promoo da competitividade e do emprego nunca tero o impacto to relevante quanto uma medida de desvalorizao fiscal como aquela que estava desenhada.

  • #1 Quanto que os salrios teriam de descer para tornar a economia portuguesa competitiva?

    16

    Tabela 1

    Atividades das empresas em Portugal (mil milhes de euros)

    2010 2011

    Volume de negcios 401,3 389,8 Produo 243,6 239 VAB 88 82,2 Gastos com pessoal 52,2 50,9 Excedente Bruto de Explorao17

    36,3 31,6

    Resultado operacional 20,1 5,4 Fonte: INE, Empresas de Portugal, 2011

    Os nmeros revelam que os gastos com pessoal (remuneraes e encargos

    sociais) representavam, em 2011, apenas 21% do valor da produo. O valor

    acrescentado bruto (VAB) da atividade empresarial, por sua vez, situava-se em

    34% do valor da produo. Por cada cinco unidades de valor criado pelas

    empresas, grosso modo, trs iam para os rendimentos do trabalho e duas para a

    remunerao do capital, expressa no Excedente Bruto de Explorao (EBE). Por

    outro lado, os custos intermdios da atividade representavam cerca de 66% do

    valor da produo, abarcando desde matrias-primas aos custos de energia,

    comunicaes, etc.).

    Daqui resulta que, na empresa mdia, por cada unidade percentual de

    reduo dos gastos de pessoal, o seu impacto potencial no valor final da produo

    ser apenas de 0,21%. Para se atingir uma melhoria da competitividade externa

    os salrios teriam de descer 60%!, estimava em 2010 o economista Joo Ferreira

    do Amaral18 a partir da anlise da estrutura de custos do sector exportador.

    A reduo dos salrios tem portanto um fraco impacto na competitividade

    preo das empresas e, ao mesmo tempo, dado o baixo nvel dos salrios mdios,

    um enorme impacto social.

    Mesmo assim a presso para a descida dos salrios mantm-se. Pelo seu

    impacto na procura interna, inaceitvel inclusivamente para os empresrios cujos

    produtos se destinam ao mercado nacional (90% das empresas), uma quebra dos

    salrios ainda maior do que a verificada at agora no poderia deixar de

    aprofundar a crise econmica.

    De igual modo, est fora de causa uma descida na TSU das empresas, como

    alternativa reduo dos salrios. Essa medida teria um efeito ainda mais

    reduzido e com impacto ao lado do objectivo pretendido: 1) segundo o INE, os

    encargos sociais representam menos de 5% do valor da produo 19 . Para a

    17 Excedente Bruto de Explorao da Empresa = VABcf Remuneraes Encargos Sociais Impostos + Subsdios. 18 Joo Ferreira do Amaral, Salrios e Competitividade, Dirio Econmico, 6/3/2010. 19 Empresas de Portugal, Instituto Nacional de Estatstica, 2011.

  • Cadernos do Observatrio

    17

    desvalorizao dos encargos sociais ser eficaz, teria de verificar-se um corte to

    pronunciado da TSU, que ou prejudicaria as contas da Segurana Social, ou faria

    aumentar bastante os impostos para evitar essa degradao; 2) alm disso, sem

    haver possibilidade de apoiar apenas as empresas exportadoras, a poupana

    obtida atravs da reduo da TSU seria absorvida em cerca de 40% pela hotelaria,

    restaurao, transportes, informtica, consultoria, administrao e sade; em

    20% pela indstria; em 20% pelo comrcio; e em 12% pela construo. Ou seja,

    sobretudo pelos sectores de bens e servios no-transacionveis, ao arrepio o

    objectivo oficial; 3) a poupana obtida atravs da reduo da TSU seria absorvida

    em cerca de um tero por 0,3% das 350 mil empresas (as maiores), enquanto a

    esmagadora maioria (87% das micro e pequenas empresas) obteria ganhos

    insignificantes.

    Este simples exerccio revela a impossibilidade de uma poltica de ganhos

    de competitividade atravs da reduo dos salrios nominais e dos impostos que

    incidem sobre o trabalho pagos pelas empresas. Alis, esse facto que motiva 1)

    que os dirigentes das confederaes patronais tenham, desde sempre, chamado a

    ateno para a necessidade, sim, da reduo dos custos de financiamento, de

    energia e de comunicaes, mais do que os custos com salrios, embora tenham

    aceite as polticas de reduo salarial; 2) que o prprio Memorando de

    Entendimento tenha fixado a necessidade de uma reduo daquilo que l se

    denomina de Rendas Excessivas dos servios prestados s empresas ou, de outra

    forma, dos Custos de Contexto, embora nada tenha sido conseguido desde 2011,

    apesar de estar no programa eleitoral do PSD e no Memorando de Entendimento.

    Para tanto, os lucros da EDP (recentemente privatizada), da Portugal Telecom e

    outras operadoras, da banca, e de todas as entidades que prestam servios s

    empresas teriam de ser reduzidos substancialmente, de modo a diminuir o seu

    peso no total da produo das empresas.

    Ora, por outro lado, e segundo as mesmas estatsticas, o custo das

    mercadorias vendidas e dos materiais consumidos correspondeu a cerca de 185

    mil milhes de euros, enquanto o custo total do fornecimento de servios externos

    se situou nos 85 mil milhes de euros, um valor bastante superior aos gastos com

    pessoal. Quando se analisa as diferentes atividades, repara-se que os servios

    consumidos so sempre superiores aos gastos com pessoal. Se no total

    representam 1,75 vezes os gastos com pessoal, na indstria transformadora

    representam 1,25 vezes, no comrcio 1,55 vezes, na construo 2,65 vezes mais e

    nos transportes 3 vezes mais.

    Ou seja, qualquer reduo percentual nesses servios teria um efeito

    superior nos excedentes brutos de explorao das empresas ao da reduo

    salarial. Mas se assim , legtimo ser suscitar a questo: de onde vem a obsesso

    pela flexibilizao dos gastos com pessoal, como forma de se ganhar

    competitividade externa repetida at exausto pelo discurso oficial em

  • #1 Quanto que os salrios teriam de descer para tornar a economia portuguesa competitiva?

    18

    Portugal ao longo de todo o perodo de ajustamento, de 2011 at aos nossos dias

    quando, na verdade, no ser por a que se consegue maiores ganhos de

    competitividade?

  • Observatrio sobre Crises e Alternativas

    CES Lisboa

    Picoas Plaza

    Rua do Viriato, 13, Lj 117/118

    1050-227 Lisboa

    T. +351 216 012 848

    F. +351 239 855 589F. +351 239 855 589

    E. [email protected]

    web. www.ces.uc.pt/observatorios/crisalt

    CadernoObserv_I_mar2014final_verso