Jornal Hoje: o humor na apresentação do telejornal sob a óptica das teorias da comunicação, da linguagem e da cultura do corpo

Embed Size (px)

Citation preview

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    1/17

    Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da

    comunicao, da linguagem e da cultura do corpo

    Autora: Isabella Reis Pichiguelli

    Universidade de Sorocaba

    Resumo

    Este texto resulta de um projeto de pesquisa que teve como objetivo avaliar, luz das

    teorias da comunicao e da linguagem, perpassando as teorias da cultura que tratam do corpoenquanto meio comunicador, a presena do humor nas apresentaes do Jornal Hoje,

    quando este apresentado pela dupla de jornalistas Evaristo Costa e Sandra Annenberg.

    Discute o telejornalismo como linguagem hbrida; o corpo como mdia e sua utilizao na

    linguagem do humor; o humor, o corpo e o papel dos narradores no telejornalismo e as

    funes referencial, ftica e emotiva da linguagem verbal utilizadas nos telejornais. Por meio

    da anlise de contedo de algumas edies do telejornal e do estudo terico que encontrou

    base em autores como Vladimir Propp, Cleide Riva Campelo, Samira Chalhub e Guilhermede Rezende, observa o humor como dispositivo de aproximao entre os apresentadores e seu

    pblicoalvo e o uso das expresses corporais dos narradores da notcia como dispositivo

    fundamental na composio das cenas em que o humor aparece.

    Palavras-chave: telejornalismo, humor, corpo, teorias da comunicao e da linguagem

    Introduo

    Piadas que se intercalam entre as chamadas de matrias e comentrios que acontecem

    aps a exibio de alguma reportagem; sorrisos estampados nos rostos enquanto se anuncia

    alguma notcia; conversas que originam gargalhadas. Tudo isso faz parte da apresentao do

    Jornal Hoje telejornal exibido pela Rede Globo de Televiso, de segunda a sbado,

    geralmente das 13h15min s 13h45min quando a dupla de jornalistas Evaristo Costa e

    Sandra Annenberg est em ao.

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    2/17

    O humor costumeiramente se percebe na apresentao de programas televisivos que

    pertencem, no jornalismo, editoria de esportes, como o caso de programas como Jogo

    Aberto e Terceiro Tempo, da Rede Bandeirantes, Gazeta Esportiva, da TV Gazeta, e

    com ainda mais nfase no Globo Esporte So Paulo, da Rede Globo. Mas, excluda a

    apresentao do Jornal Hoje, quando comandado por Evaristo Costa e Sandra Annenberg,

    pouco se v o humor em telejornais considerados de variedades, que mesclam diversas

    editorias como poltica, meio-ambiente, economia, factuais, etc. A afirmao pode ser

    comprovada ao se assistir, por exemplo, ao Jornal Nacional, da Rede Globo, ao Jornal da

    Gazeta, da TV Gazeta, e ao Jornal da Band, da Rede Bandeirantes.

    Da curiosidade acerca destas constataes que teve origem o projeto de pesquisa que

    alcanou, como um dos resultados, o presente artigo. O intuito, aqui, compendiar o que seobteve com o estudo. Em sntese, sugerir razes para o modo diferenciado de se apresentar o

    telejornal em questo, a partir da compreenso de quais e de como so utilizados os artefatos

    que constroem o cenrio descrito. So elementos que compem o quadro, por exemplo, o fato

    de serem dois apresentadores e, portanto, existir possibilidade de dilogo direto, comunicao

    interativa e primriapresencial, [...] em um mesmo espao fsico [...] do tempo presente e

    suas tenses e surpresas, de sua sensualidade mltipla e da sua sensualidade potencial

    (Baitello, 2000, apud POSTALI, 2010, p.42-43); a linguagem utilizada por eles e os temas dasmatrias que vo ao ar no telejornal, entre outros.

    Metodologia

    Para que se pudesse chegar a alguma concluso acerca do humor que permeia o

    Jornal Hoje quando apresentado por Evaristo Costa e Sandra Annenberg, foi observado ocontedo das edies deste telejornal pelo perodo de oito semanas, a saber, as edies que

    foram ao ar de segunda a sexta-feira, sendo excludas as edies de sbado, entre os dias

    06/09 e 29/10 de 2010 (seis de setembro e vinte e nove de outubro de dois mil e dez). As

    edies de sbado foram eliminadas da delimitao da pesquisa pois, via de regra, os

    jornalistas Evaristo Costa e Sandra Annenberg no apresentam o telejornal neste dia da

    semana, sendo substitudos por outros jornalistas.

    Inicialmente, o projeto de pesquisa previa a anlise de contedo de todos esses

    programas. No entanto, na medida em que eram assistidos, percebeu-se que as caractersticas

    das situaes de humor que surgiam durante cada edio do telejornal eram, em geral, as

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    3/17

    mesmas, parecidas/similares. A partir deste entendimento, decidiu-se separar amostras, no

    total de dez telejornais, para a anlise quantitativa e qualitativa do contedo, uma vez que

    analisar todas as edies que abrangem a primeira delimitao se tornaria repetitivo e

    desnecessrio para a elaborao das consideraes finais acerca do estudo.

    Desta forma, do ms de setembro de 2010, foi pinada de cada semana uma edio,

    sendo que cada edio escolhida se refere a um dia diferente da semana, como se v: primeira

    semana, programa do dia 03/09 (sexta-feira); segunda semana, programa do dia 08/09 (quarta-

    feira); terceira semana, programa do dia 13/09 (segunda-feira); quarta semana, programa do

    dia 23/09 (quinta-feira); quinta e ltima semana, programa do dia 28/09 (tera-feira). De

    outubro de 2010, diferenciadamente, foram escolhidas para anlise edies de uma semana

    cheia, a saber, a segunda semana do ms, que compreende os dias 04/10, 05/10, 06/10, 07/10e 08/10 (segunda, tera, quarta, quinta e sexta-feira, respectivamente).

    Todas as edies apanhadas como amostra para anlise de contedo tm Evaristo

    Costa e Sandra Annenberg, juntos, como apresentadores do telejornal, com exceo de dois

    programas: do dia 03/09, comandado apenas por Sandra Annenberg, e do dia 28/09,

    apresentado somente por Evaristo Costa. Tais situaes no haviam sido previstas na

    confeco do projeto, mas optou-se por analisar estes programas de carter espordico pela

    compreenso de que avali-los enriqueceria o resultado final da pesquisa, uma vez que, tendo-os analisado, seria possvel fazer a comparao com as demais edies, nas quais os dois

    jornalistas atuam lado a lado na conduo do telejornal, e apontar eventuais diferenas.

    Como base terica para o referido estudo, foram utilizados autores que falam sobre as

    teorias da comunicao, como Mauro Wolf e as pesquisadoras Patrcia Bezerra e Fernanda da

    Silva; os que tratam do humor, da oralidade e do discurso, como M. Bakhtin, Vladimir Propp

    e Srio Possenti; Cleide Riva Campelo, Mnica Rector, Aluizio Trinta e Norval Baitello, que

    discorrem sobre a cultura do corpo; Samira Chalhub, que versa sobre a linguagem; eescritores que abordam os gneros jornalsticos e, em especfico, o telejornalismo, como Vera

    Iris Paternostro e Guilherme de Rezende.

    justo ainda aqui sinalizar que a leitura dos que falam sobre a questo cultural do

    corpo como meio de comunicao ocorreu aps o projeto j estar em andamento, uma vez que

    se percebeu que os movimentos corporais dos apresentadores Sandra Annenberg e Evaristo

    Costa, como levantamento de sobrancelhas, inclinao de coluna/postura para frente ou para

    trs, risadas, sorrisos, gestos-batuta, apontamento de dedos um para o outro, etc., contribuem

    de maneira relevante para os momentos em que o humor se faz presente no telejornal.

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    4/17

    Hibridismo nos Telejornais e no Jornal Hoje

    Em encontro com a Escola de Frankfurt, que prega que a Indstria Culturalda qual a

    televiso faz parteexiste para nos divertir, cada vez mais se firma o entendimento de que os

    telejornais, enquanto produtos televisivos e, portanto, produtos da Indstria Cultural, tm

    entre os seus principais objetivos no apenas informar, mas tambm entreter o consumidor.

    Vem-se notcias, mas o que se consome entretenimento. O prprio ato de sentar-se para

    assistir televiso j traz embutido o momento do descanso, do relaxamento no sof,

    exemplifica Proba (2009, p.4).

    As observaes feitas pela Teoria Crtica acerca da Indstria Cultural, neste sentido,ainda so considerveis quando se atenta para a relao que h entre o ndice de audincia dos

    programas televisivos e o mundo da publicidade e propaganda. Esta ligao de mercado faz

    do telespectador, sim, um consumidor, uma vez que tem que ser atrado pelo produto de

    consumoneste caso, o telejornalpara gastar seu tempo livre com ele.

    Alguns autores apontam essa busca por audincia como principal fator para que o

    telejornalismo tenha se tornado entretenimento. Pinto (1997) diz que para atrair

    pblico/consumidor, devido crescente concorrncia, preciso apresentar contedosdiferenciados atravs de formas diferenciadas, afinal, notcia por notcia, os computadores,

    via Internet, podem fornecer(p. 122). Ciro Marcondes Filho (1989), na mesma linha, chega a

    dar uma nova conotao para notcia: a informao transformada em mercadoria com todos

    os seus apelos estticos, emocionais e sensacionais. (apud GABRIOTI, 2008, p. 155).

    De uma forma ou de outra, razes mercadolgicas impelem a produotelejornalstica, como de resto toda a programao televisiva, a procurar

    atender aos desejos e s expectativas de um expressivo contingente detelespectadores que se situam no outro extremo do processo de comunicao.(REZENDE, 2000, p. 24)

    Temer (2009) usa a expresso novelizao do contedopara ilustrar o que acontece

    com o telejornal a partir do momento em que este deixa a sua, em tese, misso primordial de

    informar (BEZERRA, 2009, p.4), para ser mais um produto de entretenimento na grade

    televisiva: [...] deixa de ser valorizada a informao em si, e sim os aspectos estticos

    (predominantemente visuais) e emocionais que envolvem o fato. (p.7).

    Neste caso, o telejornal aproxima-se muito da narrativa ficcional. A notcia parte, um

    componente, das narrativas do cotidiano, mas com a fora da imagem, reforam-se os clichs

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    5/17

    emocionais; criam-se personagens sobre os quais se enfatiza a dor, o enredo, o envolvimento

    em uma trama cujo objetivo principal prender o pblico em frente TV.

    O jornalista Perseu Abramo (2003) esquematiza este roteiro e afirma que as matrias,

    nos telejornais, se dividem basicamente em trs momentos padronizados. Os dois primeiros,

    claramente, se apiam essencialmente no fator emocional e em uma sequncia novelizada.

    O Primeiro Momento, ou 1 ato, o da exposio do fato. [...] O fato apresentado sob os seus ngulos menos racionais e mais emocionais, maisespetaculares e mais sensacionalistas. As imagens e os sons mostram oincndio, a tempestade, a enchente, ou a conveno do partido majoritrio, a

    passeata, a greve, o assalto, o crime etc. [...] O Segundo Momento, ou 2 ato, o da sociedade fala. As imagens e os sons mostram detalhes e

    particularidades, principalmente dos personagens envolvidos. Eles

    apresentam seus testemunhos, suas dores e alegrias, seus apoios e suascrticas, suas queixas e propostas. (ABRAMO, 2003, p. 35-36).

    Avaliando tais ponderaes, identifica-se um contnuo processo de hibridizao em

    andamento, com caractersticas da novela, do teatro, da publicidade, entre outros, sendo

    incorporadas ao telejornal:

    [...] observo jornalistas que mais parecem atores, novas tcnicas e linguagempara atrair o pblico, inmeros efeitos especiais: visuais, sonoros e denarrativa, [...] notcias com comeo, meio e fim, cheias de personagens parailustrar as matrias (SOUZA, 2009, p. 1).

    Desta forma, no dado contexto, no difcil enxergar os apresentadores dos telejornais

    como mitos da atualidade neste processo. Eles, os narradores com o porte da beleza, de

    austeridade, do carter de celebridade quem daro credibilidade ao noticiado. No

    encontro do mpeto do imaginrio para o real e do real para o imaginrio, situam-se as vedetes

    da grande imprensa, os olimpianos modernos. (MORIN, 1986, p. 105).

    [...] so, simultaneamente, magnetizados no imaginrio e no real,simultaneamente, ideais inimitveis e modelos imitveis; sua dupla natureza anloga a dupla natureza teolgica do heri-deus da religio crist;olimpianos e olimpianas so sobre humanos no papel que eles encarnam,humanos na existncia privada que eles levam. (idem, p. 106)

    As descries de Souza (2009) e de Edgar Morin (1986), bem como tudo o que foi

    pontuado at o momento, se referem, em geral, a todos os telejornais. No entanto, o Jornal

    Hoje mostra ter ainda mais fatores de hibridizao, uma vez que, na prpria pgina do

    programa na internet, o histrico informa que quando foi concebido, em 1971, o telejornal

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    6/17

    tinha o formato de uma revista diria, com matrias sobre arte, espetculos e entrevistas. Com

    o passar das dcadas, o programa sofreu vrias alteraes na linha editorial, mas em 2003

    voltou a ser um telejornal-revista, como nomeiam os produtores, com predominncia de temas

    que envolvem comportamento humano, social e tico, entrevistas especiais e cultura.

    [...] da mesma forma em que a sociedade mvel e est em permanentetransformao, tambm os gneros se transformam, no apenas no que diz respeito aseu contedo interno, por meio da incorporao de novos formatos e contedos, masquanto forma de produo. Os gneros se reestruturam tambm a partir de processosde hibridizao ou seja, prticas e contedos estruturados e consolidados quefuncionam de forma separada combinam-se para dar origem a novas prticas e/ouestruturas. Ou, ainda, novos gneros surgem a partir da somatria de elementos degneros j existentes ou a partir da incluso de elementos tpicos de outros gneros.(TEMER, 2009, p. 4).

    O carter hbrido do Jornal Hoje, que como se pode perceber, ao mesclar elementos

    de dois ou mais formatos, originou um novo j no nem telejornal, nem revista, mas sim

    telejornal-revista corroborado por ainda outro ponto. Souza (2009) relata que Sandra

    Annenberg, que apresenta o referido telejornal junto a Evaristo Costa, antes de ser jornalista,

    era atriz. Essa tnue fronteira que existia entre os gneros telenovela e telejornal ficou mais

    evidente ainda com a migrao de profissionais de uma rea para a outra (p. 11).

    Assim, sendo atriz, mais possvel ainda afirmar que Sandra, como apresentadora /

    narradora da notcia, incorpora uma personagem, trazendo no corpo e na voz o peso dramtico

    e todas as suas gradaes como ambincias especficas para cada fato a ser narradoh de vir

    um novo enredo, com novos personagens para construir a realidade e entreter o pblico.

    A Linguagem, o Corpo e o Humor no Telejornal

    Compreender os telejornais como produtos hbridos, que buscam o entretenimento do

    telespectador, e as caractersticas que diferenciam o Jornal Hoje dos demais, como a linha

    editorial que mescla factuais com temas mais leves chamados por Resende (2000) de

    features, as conhecidas matrias de gaveta, que abordam temas de permanente interesse, mas

    que no sofrem o mesmo processo de rpido envelhecimento a que se submete o factual (p.

    147)e o fato de ter, como apresentadora do telejornal, uma jornalista que tambm atriz,

    ajuda a entender a presena mais constante do humor no telejornal em questo.

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    7/17

    Humor, como define Propp, em sentido lato [...] a capacidade de perceber e criar o

    cmico (1992, p. 152). Silva considera que rir expressar o prazer (2010, p. 113). O humor

    se constitui de uma atribuio inusitada de sentido a algum signo sugerido (POSSENTI, 1998,

    p. 39), o que importa dizer que ele composto por uma esfera subjetiva e por outra coletiva;

    social, cultural (idem, p. 42). Ora, se o humor capacidade de percepo, expresso de prazer

    e envolve o ato de atribuir, tem origem dentro de cada ser humano. Disto se entende, portanto,

    que o humor , no s, mas em primeiro lugar, inerente ao sujeito que o produz.

    Gabrioti (2008) defende que, no jornalismo, so subjetivos at mesmo os critrios para

    a seleo e excluso de notcias, o que vai sair, como, com que destaque e com que

    favorecimento(p. 152). Com isso, a inteno no dizer que o humor, dentro dos telejornais,

    somente subjetividade, efeito e causa da diverso dos narradores da notcia enquantoapresentam o programa, afinal, no se pode esquecer que

    a maneira como ncoras e reprteres de telejornal apresentam um texto naverdade uma dramatizao. [...] A dramatizao nada mais que o esforo detornar uma narrativa mais interessante, comovente, com vida, dando, assim,importncia ao seu teor. Aquele que dramatiza aquele que interpreta,representa. Uma interpretao uma explicao, um comentrio, umdesempenho. (PINTO, 1997, p. 118).

    Este desempenho aparece na voz, no texto, no corpo, na relao entre os corpos.

    possvel afirmar, ento, que a apario do humor no telejornalismo uma mistura de

    subjetividade e intencionalidade, sem excluir o fato de que, por trs da dramatizao, houve

    uma escolha subjetiva de o que dramatizar, no caso do humor: o que ser comentado, o que

    ser tema de conversa entre os apresentadores, de que se achar graa.

    Quando pensamos o humor nos telejornais e falamos em intencionalidade e

    dramatizao, questionamos com qu intenoe como se dramatiza.

    Porque, como sabiamente Freud j assinalou, o chiste consistefundamentalmente numa certa tcnica, na forma, e no num contedo ou numsentido. Certamente, se dissermos a algum que achamos os nova-iorquinosmal educados, que pouqussimos so educados, a rigor, s dois etc, embora se

    possa dizer que este o contedo daquela piada, isso no provoca nenhumefeito de humor. (POSSENTI, 1995, p. 17)

    Para responder a essas duas perguntas, necessrio passar primeiro pelas questes da

    linguagem verbal e no-verbal, afinal:

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    8/17

    nem s de mensagens verbais vive o ser humano. A linguagem participa deaspectos mais amplos que apenas o verbo. O corpo fala, a fotografia flagra, aarquitetura recorta espaos, a pintura imprime, o teatro encena o verbal, ovisual, o sonoro, a poesia forma especialmente indita de linguagem surpreende, a msica irradia sons, a escultura tateia, o cinema movimenta etc.

    (CHALHUB, 1990, p. 6)

    Ao se assistir ao Jornal Hoje, possvel perceber uma srie de dispositivosuns de

    verbo, outros no que compem um momento de humor no telejornal. Com fins didticos,

    utilizaremos uma situao cmica que ocorreu na edio de 07/10/2010 para exemplificar tais

    fatores, j que representa o que acontece na maioria das vezes:

    Logo aps tecerem comentrios acerca de uma matria sobre cuidados com a

    catapora, Sandra Annenberg e Evaristo Costa esto sentados na bancada. Quando Sandra

    est terminando de dizer, olhando para a cmera: na pgina do Jornal Hoje na internet

    voc pode encontrar dicas sobre sintomas e cuidados com a catapora, Evaristo, que estava

    um pouco reclinado mesa, corrige sua postura, comea a sorrir (boca fechada, sem som) e,

    quando Sandra acaba de falar, direcionado cmera, diz: E l na nossa pgina na internet

    tambm esto os nmeros da Mega-Sena que rendeu um prmio de R$ 119 milhes de reais

    para um nico apostador.... Evaristo se vira para Sandra quando est falando o final desta

    frase, a partir de para. Neste mesmo momento, Sandra comea a sorrir (sem som, boca

    fechada) e a balanar a cabea de cima para baixo, em sinal de concordncia. Sandra diz:

    Sortudo, n.... Ao mesmo tempo em que Sandra fala isto, Evaristo diz, sorrindo e

    apontando sua mo esquerda (aberta, dedos colados, palmas para cima) para Sandra: Voc

    veio trabalhar, n?. Os dois do gargalhadas (Sandra at inclina a postura um pouco para

    frente na primeira risada que solta) que continuam at mesmo enquanto Sandra responde:

    Voc tambm, n! Ento no somos ns!. Quando diz voc tambm, Sandra aponta o

    dedo indicador direito para Evaristo, que, ainda rindo, assente afirmao de Sandra

    inclinando sua cabea para o lado esquerdo. Em ento no somos, Sandra balana a

    cabea algumas vezes em sinal de negativo, reforado pelo movimento de sua mo direita

    que, aberta, com a palma para baixo, vai da esquerda para a direita. No mesmo momento em

    que Sandra est dizendo somos ns, Evaristo j comea a dizer, rindo e meneando a

    cabea em sinal de negao: No, o sortudo no de SoPaulo.... Em So Paulo,

    Evaristo se vira em direo cmera e Sandra abaixa a cabea para ler algo no papel que

    contm o script do jornal. Os dois permanecem com largos sorrisos nos rostos. Sandra d

    risadas curtas e baixas, som de retomada de flego, enquanto Evaristo continua: Ele do

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    9/17

    municpio de Fontoura Xavier, no Rio Grande do Sul. Quando Evaristo fala Fontoura

    Xavier, Sandra levanta a cabea, olha para a cmera, arma outro sorriso, levanta as

    sobrancelhas e meneia a cabea levemente para dentro, franzindo o queixo, como quem est

    admirada. Evaristo termina de falar e olha para baixo, tambm para ler, sorrindo. Sandra

    muda de assunto, iniciando a passagem de bloco, quando ela e Evaristo param de sorrir.

    O primeiro ponto a ser observado, aqui, o da conversao que permeia a situao de

    humor. Em geral, quando os dois apresentadores conversam que o humor se faz. Ao

    utilizarem a conversao para configurar suas estratgias de construo, os programas

    telejornalsticos tomam posse de prticas sociais j estabelecidas na vida cotidiana (SILVA,

    2007, p. 4). Isto faz com que as pessoas que assistem ao programa se reconheam nateleviso, uma vez que os narradores da notcia, ao conversarem, reproduzem uma

    circunstncia que comum ao cidado telespectador. Os indivduos esto de tal forma

    familiarizados com as regras da conversao que as utilizam de forma intuitiva e isso que

    confere a impresso de espontaneidade to atribuda conversao (idem).

    Esta espontaneidade, ainda que componente de uma dramatizao planejada,

    marcada, tambm, pela oralidade que se emprega nestes momentos, em que o predomnio da

    linguagem oral informal; os apresentadores falam como falam os de casaSortudo, n [...]Voc veio trabalhar, n?. Aqui, se observa que a informalidade aparece, no telejornal,

    como uma fora norteadora, contribuinte na construo de um cenrio de intimidade, o qual

    busca se dar no apenas entre os apresentadores, mas tambm na relao narradores da notcia

    e pblico. Da mesma maneira que acontece com a conversao, por conseguinte, tanto o uso

    da oralidade informal quanto a ideia de intimidade, projetada nas cenas de interao entre os

    apresentadores e tambm na linguagem, facilitam a presena do riso no telejornal.

    Em segundo lugar, est a abundncia de movimentos corporais presente no exemplocitado, mas tambm na apresentao do Jornal Hoje como um todo. J que o corpo

    comunica, como refora Norval Baitello (1999) ao afirmar que haver sempre um sentido,

    uma mensagem a ser lida por um corpo vivo diante do outro corpo (apud POSTALI, 2010, p.

    43), impossvel pensar o humor no telejornal sem conceber a influncia direta da utilizao

    do corpo neste cenrio, afinal, os sorrisos, os risos e as gargalhadas, bem como todas as suas

    variveis, tambm so expresses corporais (idem) e, na interao entre os narradores da

    notcia, causam outros risos, sorrisos e gargalhadas.

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    10/17

    [...] quando os homens se comunicam, lanam mo de todo um repertrio:usam o corpo todo e todos os textos nele latentes ou manifestos participam decada comunicao. Essas comunicaes so textos do corpo: gestos aquicom um sentido mais amplo do que apenas a movimentao de uma parte docorpo, ampliado para todo texto do corpo at um largo acenar com os braos

    [...] so todos gestos, textos da cultura, movimentos comunicativos docorpo impressos pelas leis fsico-qumico-biolgicas entremeadas por umadeterminada cultura. (CAMPELO, 1997, p. 77).

    possvel perceber, ainda, que o uso dos corpos de Evaristo Costa e de Sandra

    Annenberg vai alm da pontuao de frases que ocorre em todos os telejornais e at mesmo

    nas conversaes dirias. Mencionada por Mnica Rector e Aluzio Trinta (1995), os autores

    sinalizam que estudos realizados mostram que [...] cada vez que h uma pausa breve ou

    vrgula na fala, muda-se a posio da cabea ou da mo; e, quando ocorre uma pausa, muda-

    se a posio do corpo ou da perna (p. 62). Os apresentadores do Jornal Hoje tambm se

    utilizam destes movimentos, como se pode ver no exemplo dado, em levantes de sobrancelhas

    e gestos-batuta, mas no apenas. Afora isso, inclinam suas posturas para frente e para trs

    ora voltados um para o outro ora direcionados cmera e, apenas como outro exemplo,

    apontam dedos um para o outro e tambm para a cmera. Tanto quando se dirigem cmera e

    chamam o cidado para a conversa, para dentro da tev, quanto nos momentos em que, por

    meio de conversas e risadas, em dramatizao do cotidiano, mostram ao telespectador que so

    iguais a ele, admissvel afirmar que tais atos so tentativas de aproximao com o pblico.

    Como versa Silva (2010), no se separa [...] corpo e linguagem, j que nosso corpo

    linguagem, e a linguagem, corpo (p. 45). Portanto, o mesmo que se compreendeu ao observar

    os movimentos corporais de Evaristo Costa e Sandra Annenberg pode ser apreendido quando

    se atenta fala de cada um dos apresentadores no telejornal. Samira Chalhub ensina que os

    noticirios de rdio e televiso tm, nuclearmente, a funo referencial organizando a

    estrutura da mensagem (1990, p. 11). A mesma autora explica: o uso da funo referencial

    marca-se, lingisticamente, com o trao da 3 pessoa do verbo, ou seja, de quem ou do que se

    fala (idem). a linguagem da informao: Ele de Fontoura Xavier, no Rio Grande do

    Sul, noticia Evaristo Costa no exemplo transcrito.

    Vera ris Paternostro, em seu manual, ensina que o texto para o jornalismo televisivo

    deve ser coloquial, claro e preciso. Objetivo, direto. Informativo, simples e pausado

    (PATERNOSTRO, 1999, p. 61). No entanto, durante a apresentao do telejornal, a regra por

    inmeras vezes quebrada, nos momentos que os apresentadores deixam o uso da funo

    referencial (nfase em terceiros) e passam a utilizar mais o eu, funo emotiva (nfase noemissor da mensagem), e o voc, funo conativa(nfase no receptor da mensagem).

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    11/17

    O uso da funo conativa no novidade nem exclusivo do Jornal Hoje. Como

    aponta Gabrioti (2010), muitos jornais tm se utilizado deste artifcio de convidar o

    telespectador a participar do jornal, para atrair audincia: os telejornais [...] tm percebido

    que precisam ser mais dialgicos com o pblico. Aquele formato engessado em que pesa a

    voz do ncora j no parece ter um efeito satisfatrio nos grupos de recepo (p. 151).

    O que h de diferente no Jornal Hoje, ento? Podemos dizer que o uso da funo

    conativa por um apresentador em estmulo a uma resposta imediata do outro apresentador,

    que, via de regra, tem predominncia da funo emotiva. o que ocorre neste dilogo entre

    Evaristo Costa e Sandra Annenberg, que aconteceu no ltimo bloco do programa de

    13/09/2010, aps uma reportagem sobre cortes de cabelos para homens:

    Sandra diz, sorrindo: Tava olhando o seu cabelo durante a reportagem, n?.

    Durante esta fala, Sandra aponta com o dedo indicador para Evaristo. Evaristo responde,

    quase que ao mesmo tempo em que Sandra: Tavaolhando. Evaristo d uma gargalhada,

    durante a qual meneia a cabea para cima e para baixo, em concordncia, e depois inclina

    seu corpo para frente, com os braos cruzados, como quem no consegue se conter de tanto

    gargalhar. Sandra, direcionando sua mo direita a Evaristo, faz a pergunta: Voct

    cortando de quanto em quanto tempo?. Evaristo responde, ainda dando risada: Quinze em

    quinze dias. Assim que Evaristo responde, Sandra abre suas mos para os lados e olha em

    direo cmera, como quem quer dizer est explicado.

    Importante , novamente, ressaltar que no comparamos, aqui, o Jornal Hoje com

    telejornais esportivos, como Globo Esporte So Paulo, da Rede Globo de Televiso, e o

    Jogo Aberto, da Rede Bandeirantes de Televiso, programas onde a utilizao destes

    dispositivos lingsticos (funo conativa> funo emotiva), se d em grande quantidade.

    Anlises acerca do humor no Jornal Hoje

    J buscamos compreender porque Evaristo Costa e Sandra Annenberg se utilizam

    constantemente do humor no Jornal Hoje, ao apontar que estas situaes de humor

    aproximam os apresentadores ao telespectador, causando empatia e intimidade para com

    quem os assiste: O riso levanta as barreiras, [...] proporciona a aproximao e a

    familiaridade.(BAKHTIN, 1997, p. 374). Tambm adiantamos que a maioria das situaes

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    12/17

    de humor ocorre durante as conversas protagonizadas, em geral, pelos dois apresentadores ou

    por eles com a moa do tempoou algum reprter em link(participao ao vivo) dos 63

    momentos de humor identificados nas dez edies eleitas como amostras para anlise, 57%

    deles eram permeados por dilogos. Mas, afinal, de qu riem os narradores da notcia do

    telejornal em questo?

    Wladimir Propp, em seu livro Comicidade e Riso, diz que o homem ri daquilo que

    ridculo. Existem, certamente, outras causas tambm, mas esta a mais comum e natural

    (1992, p. 41). O jornalista e humorista Millr Fernandes aponta para a mesma direo:

    Inextirpvel no ser humano, mesmo o mais sensvel, o gosto perverso decontar piadas sobre minorias (no Brasil, negros, judeus, portugueses, bichas),grupos j discriminados pela natureza (anes, corcundas, aleijados), pessoasmarcadas por caractersticas dramticas (caolhos, capengas, manetas), oucom defeitos ridicularizveis (gago, fanho, surdo) etc. (Fernandes, 1988,apud POSSENTI, 1998, p. 14).

    Na pesquisa realizada, constatamos que das situaes de humor que surgiram nas dez

    edies do Jornal Hoje separadas para anlise, a maioria, 44% delas tinham origem em

    algum elemento passvel de zombaria: em 05/10/2010, Sandra Annenberg brinca com defeitos

    de seu cabelo uma coisa que a gente sempre se preocupa com uns fiozinhos que ficam

    arrepiados; de vez em quando baixa um cebolinha aqui em mim... ; em 23/09/2010,

    Evaristo Costa caoa da incapacidade de distinguir as estaes do ano Se quea gente

    consegue identificar quando estamos no vero, quando estamos na primavera....

    [...] a contradio suscitadora do riso a contradio entre algo que, por umlado, encontra-se no sujeito que ri, no homem que d risada, e, por outro lado,naquilo que est em frente dele e que se manifesta no mundo que est voltadele, no objeto de seu riso. [...] Partindo-se desse conceito de contradio, a

    primeira condio para a comicidade e para o riso que ela suscita consistir

    no fato de que quem ri tem algumas concepes do que seria justo, moral,correto ou, antes, um certo instinto completamente inconsciente daquilo que,do ponto de vista das exigncias morais ou mesmo simplesmente de umanatureza humana sadia, considerado justo e conveniente. Nessas exignciasnada h de sublime ou de majestoso, trata-se apenas do instinto do que certo. [...] Em poucas palavras, o riso nasce da observao de alguns defeitosno mundo em que o homem vive e atua. A contradio entre esses dois

    princpios a condio fundamental, o alicerce para o nascimento dacomicidade e do riso que dela se produz. (PROPP, 1992, p. 174-175).

    H ainda outros elementos de humor que geram outras variveis de risadas e sorrisos

    durante o telejornal, embora apaream com menos frequncia.

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    13/17

    No Brasil, h o sorriso cordial (amvel ou simptico), o sorrir deorelha a orelha, o sorriso amarelo e o sorriso sem graa. [...] Quando setrata do riso, h o riso sardnico, o riso sarcstico, o riso irnico e oriso debochado;se nos irrita, um risinho; se nos ofende, uma risada.Quanto sua articulao, o riso admite pelo menos sete tipos: o sorriso

    simples; o riso articulado expresso facial; o riso com todo o rosto; a risadacompassada; a gargalhada prolongada; o riso convulsivo ou histrico; e o risoque leva s lgrimas. (RECTOR, TRINTA, 1995, 57-58).

    Ao contrrio dos momentos humorsticos em que os dilogos acontecem, nos quais

    geralmente os corpos (do centro-peito para cima, parte que a cmera mostra) ganham a tela da

    tev para dramatizarem descontrao e liberdade expressiva, nestas outras situaes apenas o

    rosto aparece, recebendo maior importncia na transmisso do humor. Afora o texto falado, a

    dramatizao inclui, evidentemente, a linguagem no-verbal. Interessa aqui a gesticulao

    facial sobretudo, j que os enquadramentos so fechados (PINTO, 1997, p. 118).

    Exemplificaremos estes outros tipos de elementos humorsticos no telejornal atravs

    de uma explanao acerca de dois risos sobre o quais Wladimir Propp discorre em seu tratado

    e que podem ser notados nas edies do Jornal Hoje: o riso alegre e o riso ritual.

    Comecemos pelo riso alegre, muitas vezes sem nenhuma causa precisa e quepode originar-se dos pretextos mais insignificantes: o riso alegre evivificador. [...] Desse riso sabem rir pessoas alegres por natureza, boas,dispostas ao humorismo. Demonstrar a vantagem e a utilidade geral e mesmosocial desse tipo de riso saudvel significa arrombar uma porta aberta. Com odomnio da esttica ele s tem relao na medida em que pode serrepresentado artisticamente. (PROPP, 1992, p. 162-163).

    Identificamos este riso alegre, classificado por Propp, at mesmo nos programas em

    que Evaristo Costa e Sandra Annenberg apresentaram os telejornais sozinhos. Para ilustr-lo,

    transcrevemos a seguinte situao, ocorrida em 03/09/2010:

    Sandra Annenberg est sentada e com a postura reta. Meneia levemente a cabea ao

    falar Boa tarde, Glria Maria, em uma chamada ao VT em que Glria Maria anuncia as

    atraes do programa Globo Reprter daquela noite. Quando enuncia o nome da reprter

    global, Sandra Annenberg abre um largo sorriso (sem som), que permanece (porm, com a

    boca fechada, sem mostrar os dentes) at a entrada do VT.

    J o riso ritual acontece em vrias edies observadas durante a pesquisa. Em todas

    elas, ocorre no comeo do telejornal, antes mesmo de os apresentadores darem incio

    escalada primeiro quadro do programa, quando os narradores anunciam as principais

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    14/17

    notcias do dia. Caracterizado por claramente parecer combinado e sempre ocorrer no mesmo

    momento do telejornal, pode ser visto, por exemplo, na edio do dia 05/10/2010:

    Sentados na bancada, cmera aberta nos dois, Sandra Annenberg e Evaristo Costa

    comeam o jornal olhando para baixo, como se estivessem lendo algum papel sobre a mesa,

    logo em seguida se olham, sorriem (sem som e de boca fechada) um para o outro, e, com o

    sorriso no rosto, se viram para a cmera e dizem boa tarde.

    Aos olhos do homem de hoje um riso intencional e artificial um riso falsoque merece reprovao. Mas nem sempre ele foi visto assim. Em algunscasos o riso era obrigatrio, assim como em outros era obrigatrio o choro,

    independente do fato de o sujeito sentir ou no dor. (PROPP, 1992, p. 164).

    Outro dado interessante que se extraiu desta parte da pesquisa foi que das 63 situaes

    de humor que surgiram nos dez programas analisados, quase a metade, 31 delas, ocorreu no

    primeiro bloco do programa, em geral, mais extenso que o segundo e terceiro bloco e, por

    consequncia e supostamente isto explique, com mais tempo para o dilogo, que como vimos,

    de onde se origina a maioria dos momentos de humor no Jornal Hoje.

    Consideraes Finais

    As ideias frankfurtianas acerca da Indstria Cultural, embora de certa forma

    ultrapassadas no tocante passividade da massa em relao mdia, ainda se mantm

    relevantes quando o assunto entretenimento. Os telejornais so produtos da Indstria

    Cultural e, portanto, no fogem regra: servem prioritariamente para entreter o telespectador.

    O Jornal Hojeentendido como um produto de carter hbrido, uma vez que mescla

    elementos do teatro, da novela, da publicidade, da revista, de outros programas televisivos,

    etc., para dar vida a um novo e prprio formato est inserido dentro deste contexto da

    Indstria Cultural, do entretenimento e, consequentemente, da busca por audincia.

    Neste sentido, relevante considerar o horrio em que o telejornal passa e a quem

    deseja atingir: das 13h15min s 13h45min, logo aps o almoo, quando donas-de-casa

    descansam da lida matinal, adolescentes e jovens chegam das escolas ou faculdades e

    trabalhadores relaxam um pouco antes de voltarem a suas empresas, o programa seguido do

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    15/17

    Vdeo-Show (sobre novelas, vida das celebridades, espetculos, etc.) e do Vale a Pena Ver de

    Novo (que reapresenta novelas de sucesso da ltima dcada).

    Desta busca pela conquista do pblico-alvo, sendo um produto de entretenimento,

    compreende-se que o humor no Jornal Hoje funciona como um dispositivo que procura,

    acima de tudo, aproximar os apresentadores Evaristo Costa e Sandra Annenberg de quem os

    assiste, causando a sensao no telespectador de intimidade e familiaridade com os narradores

    da notcia, tendo por eles empatia e, assim, prazer em assistir ao telejornal. O humor , deste

    modo, uma das maneiras de o telejornal cumprir sua misso de entreter e angariar audincia.

    Visto que intencional, o humor aparece, na maioria das vezes, quando o dilogo

    entre os apresentadores acontece. Movimentos corporais como gestos-batuta e apontamentos

    de dedo/mo um para o outro predominam nestas cenas, nas quais tambm os risos, risadas egargalhadas contribuem para a dramatizao humorstica. No somente, mas principalmente

    quando no h essa interao entre os narradores da notcia, o rosto e as expresses faciais

    ganham importncia determinante para a transmisso das situaes de humor.

    A utilizao das funes emotiva e conativa da linguagem durante as conversaes dos

    apresentadores outro fator que contribui para o humor no Jornal Hoje. medida que se

    aproximam / se igualam aos telespectadores para causar familiaridade, Evaristo Costa e

    Sandra Annenberg colocam em evidncia um ao outro, contando experincias pessoais,estimulando o companheiro de apresentao a contar as suas ou emitir opinies. destes

    momentos que surge a maioria das situaes cmicas, classificadas por Propp como de

    zombaria, porquanto advm da graa que o defeito causa no ser humano.

    Por fim, ressaltamos que o humor no telejornal analisado s possvel, tambm, em

    razo das matrias que exibe em alternncia com as factuais. Por ser um telejornal-revista,

    aborda temas como moda, turismo, comportamento humano e cultura. Temas estes que

    permitem o dilogo entre os apresentadores e, de igual forma, abrem brecha para o cmico.

  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    16/17

    Referncias Bibliogrficas

    ABRAMO, Perseu. Padres de manipulao na grande imprensa. So Paulo: Ed.Fundao Perseu Abramo, 2003.

    BAKHTIN, Mikhail Mikhalovich. Esttica da criao verbal. Trad. Maria Ermantina G. G.Pereira. So Paulo: Martins Fontes, 1997.

    BEZERRA, Patrcia Rangel Moreira. Globo Esporte So Paulo: Ousadia e Experimentalismono Telejornal Esportivo. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CINCIAS DACOMUNICAO, 32., 2009, Curitiba, PR. Anais do XXXII Congresso Brasileiro de

    Cincias da Comunicao, Intercom. Curitiba, PR: Universidade Positivo, 2009. Disponvelem . Acesso em:7 dez. 2010.

    CAMPELO, Cleide Riva.Cal(e)idoscorpos: um estudo semitico do corpo e seus cdigos.So Paulo: Annablume, 1997. 138 p.

    CHALHUB, Samira. Funes da Linguagem.So Paulo: tica, 1990.

    GABRIOTI, Rodrigo. Interao e Intercidades: A Comunicao Regional naReconstruo dos Espaos.Dissertao (Mestrado em Comunicao e Cultura)Programade Ps-Graduao em Comunicao e Cultura da Universidade de Sorocaba, Sorocaba, 2008.

    PATERNOSTRO, Vera Iris. O Texto na TVManual de Telejornalismo.Rio de Janeiro:Campus, 1999.

    PINTO, Ivonete. A dramatizao no telejornalismo. Revista FAMECOS, Porto Alegre, RS,

    n. 7, p. 117-123, nov. 1997. Disponvel em:.Acesso em: 7 dez. 2010.

    POSSENTI, Srio. Os Humores da Lngua: Anlises Lingusticas de Piadas. Campinas:Mercado de Letras, 1998.

    POSTALI, Thfani. Prticas Culturais Urbanas: Estudo sobre o Blues e o Hip Hop comoComunicaes Especficas de Grupo. Dissertao (Mestrado em Comunicao e Cultura)Programa de Ps-Graduao em Comunicao e Cultura da Universidade de Sorocaba,Sorocaba, 2010.

    http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2009/resumos/R4-0543-1.pdfhttp://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/revistafamecos/article/viewFile/2991/2273http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/revistafamecos/article/viewFile/2991/2273http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2009/resumos/R4-0543-1.pdf
  • 7/25/2019 Jornal Hoje: o humor na apresentao do telejornal sob a ptica das teorias da comunicao, da linguagem e da cultura do corpo.

    17/17

    PROBA, Fabiane. Moas do Tempo: O Corpo no Telejornalismo. In: CONGRESSOBRASILEIRO DE CINCIAS DA COMUNICAO, 32., 2009, Curitiba, PR. Anais doXXXII Congresso Brasileiro de Cincias da Comunicao, Intercom. Curitiba, PR:

    Universidade Positivo, 2009. Disponvel em . Acesso em: 7dez. 2010.

    PROPP, Wladimir. Comicidade e Riso. So Paulo: tica, 1992.

    RECTOR, Mnica; TRINTA, Aluizio Ramos.Comunicao do Corpo. 3. ed. So Paulo:Editora tica, 1995. 88 p.

    REZENDE, Guilherme Jorge de. Telejornalismo no Brasil: um perfil editorial.So Paulo:Summus, 2000.

    SILVA, Mriam Cristina Carlos. A Pele Palpvel da Palavra. Sorocaba: Provocare, 2010.

    SILVA, Fernanda Maurcio da. Consideraes sobre a conversao no telejornalismo.Revistada Associao Nacional dos Programas de Ps-Graduao em Comunicao . 1-20, abr.2007. Disponvel em: . Acesso em: 7 dez. 2010.

    SOUZA, Karla Caroline Nery de. Hibridizao e Ps-modernidade: Novas formas deatualizao do audiovisual.In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CINCIAS DACOMUNICAO, 32., 2009, Curitiba, PR. Anais do XXXII Congresso Brasileiro deCincias da Comunicao, Intercom. Curitiba, PR: Universidade Positivo, 2009. Disponvelem . Acessoem: 7 dez. 2010.

    http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2009/resumos/R4-2255-2.pdfhttp://www.compos.org.br/seer/index.php/e-compos/article/view/129/129http://www.compos.org.br/seer/index.php/e-compos/article/view/129/129http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2009/resumos/R4-1500-1.pdfhttp://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2009/resumos/R4-1500-1.pdfhttp://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2009/resumos/R4-1500-1.pdfhttp://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2009/resumos/R4-1500-1.pdfhttp://www.compos.org.br/seer/index.php/e-compos/article/view/129/129http://www.compos.org.br/seer/index.php/e-compos/article/view/129/129http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2009/resumos/R4-2255-2.pdf