69
5/12/2018 JoseBleger-PsicoHigieneePsicologiaInstitucional-slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 1/69 i Psico-Hiliene e Psico,logia In titucion,al P s i c :o.b t .l e n e e PllEDlaallil Instituc:ionll" do medico, pslc61ogo. p$lcanaliSla e professor Jose Bleger. ~ urn marco na literature psIcologla Su a v,sao mevade ra sobre 0 fun~lonamento des IndMdlJos e des pepels t'lue deseli~" I'm nstitul~ e eta d-~ t ne re n te an f~rll:::ionatnel'lt~ do:s grupdS lro~ UI'i'la prepesta intqra:dorn, contexwalinda e, ccnseqoenrernente, pl'mIEntiva de aylo no campo da saUde mental. a a u tn r ressitua 0 trabalho des medicos e psic6logos. retiram:lo-05 do constJlt6no para ook:Ia\·1os oo ;im bito da 'lim~la, das Instrtll.li¢e$ e da ccrnunidade - p od end o, de ss a f or ma , d esen vo lv er urn assessoramento realmente (Itil e qualifica~h _. DQ - I! II II II ~ VI -- t o & .. i sico Higiene e Psic I,· II nsti ucional i i

Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional

Embed Size (px)

Citation preview

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 1/69

i Psic o-H i lie ne e

P s i c o , l o g i a

In titu c ion ,a l

Ps i c :o.b t .l e n e e P l l E D l a a l l i l Instituc:ionll"

do medico , ps lc61ogo. p$lcanaliSla e p r o fe s s o r

Jose Bleger. ~ urn marco na literatureps Icologla Su a v,sao m evad e ra sobre 0

fun~lonamento d e s In dM dl Jo s e d es pepe lst ' lue deseli~" I'm nstitul~ e e ta d-~

t ne re n te a n f~rll:::ionatnel'lt~d o : s g r updS l ro~

UI'i' la prepesta i nt qr a :d o rn , c o nt e xwa li nd a e ,

c cns e qo e nr er ne n te , p l' m IEn ti va de aylo noc ampo da s aUde ment al.

a a u tn r r es si tu a 0 tr ab alh o d es medicos e

psic6logos. re t i ram: l o -05 do constJlt6no para

ook:Ia\·1os oo ;im bito da 'lim~la,das Ins tr t ll . li ¢e$

e da c crnu nid ad e - podendo, dessa forma,

desenvolver urn assessoramento realmente

(It il e qualifica~h

_ .

DQ-I!IIIIII~VI- -to

&. .i

s ic o H ig ie n e ePsic I,· •

II

n s ti u c io n al

ii

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 2/69

Obra publicada orig inal mente em espanhol, sob 0 titulo

Psicohigiene y Psicologia Institucional, Editorial Paid6s, Buenos Aires

© da Editora Artes Medicas Sui, Porto Alegre, 1984

Prologo

Capa:

Angela B. Fayet e Janice A lves - Programar;ao Visual

Supervisao editorial:

Paulo Flevio Ledur

o professor Jose Bleger vem desenvolvendo em nosso meio um bri-

Ihante e ja longo trabalho como medico, psicotoqo, psicanalista e profes-

sor universiterio.

Por isso se toma Ibgicasua preocupecdo com a colocecdo deproblemas

e aspectos ainda insuficientemente estudados daprofissifo do psicotoqo.

Da mesma forma que no campo da profissifo medica, uma perspec-

t iva mais ampla dos problemas da protlssso permite entrever uma ativida-de orientadora para a sotucso de questiies de ordem metsdoloqice e de

csrster pretico , dirig idas a defender e incrementar a seude e 0 bern-ester da

populeciio.

Sair dos limites estreitos de uma atividade profissional interessada

quase que exclusivamente nos aspectos curativos e individuais da doencs,

para entrar francamente no campo das cienciss do comportamento, inte-

ressa igualmente ao medico e ao psicoloqo. Voltar-se do individual ao so-

cial e conseqiiencie de um claro reconhecimento de que os problemas de

ssude, de doence e de convivencie normal excedem 0 ambito profissional

privado e individual, transformando-se em areas de trabalho das insti tu i-

c;oesencarregadas de organizar a etenciio da comunidede.

A incorporeciio defin it iva , no sentido tecnico e protissionet , do psi-

coloqo e do psicoterapeuta a equipe medica e a de ssude publica e conse-

aiiencie de um melhor conhecimento do homem sadio e doente e de uma

compreensiio mais adequada da historie natural da ssude e da doence.

Numa medicina da totalidade, 0 organico, 0psiquico, 0 emocional,

o individual e 0 social sao insepsreveis do que pertence ao homem e ao

ambiente em que ele nesce, cresce, se desenvolve e vive.

Compos icao, arte e rev lsao:AGE - Assesso ria Greiice e Edito rial Ltda.

Reservados todos as direi tos de publi cacao em l ingua por tuguesa aARTMED EDITORA LTDA.

Av. Jeronimo de Ornelas, 670 - Fane (51) 330-3444 FAX (51) 330-2378

90040-340 Porto A legre, RS, Brasi l

sxo PAULO

Rua Francisco l.eltao, 146 - Pinheir os

Fone (11) 883-6160

05414-020 Sao Paulo, SP, Brasi l

IMPRESSO NO BRASIL

PRINTED IN BRAZIL

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 3/69

D eststico se converte em dinf imico: a seude e a doencs aparecem

como "processes", onde a hereditariedade e 0 ambiente atuam como ieto-

res permanentemente relacionados. A ssude e a doencs s o se tornam com-

preensiveis num estudo longitudinal, onde 0 presente constitui um rno-

mento de algo que tem historie passada e possibi lidades de projeciio no

futuro.

Mas a diversidade de aspectos a contemplar na tarefa de estudar e

stender 0 homem em ssude e doence, em seu ambiente, com criteria holis-

tico, leva a tormuteciio de denomlneciies que, como asde medicina cureti-vs, medicina preventive, medicina social, medicina ecoiaqice e outres, per-

dem siqniiicedio a medida que se compreende que nao pode haver mais do

que urns medicine, a que se ap6ia na multicausal idade: no bioloqico, no

psicoloqico e no social ao mesmo tempo.

Novas concepciies rompem com 0esquema de uma medicina baseada

na etiologia espec/fica das doencss e levam a uma atividade profissional

interdisciplinar.

D processo cienttti co e a tecnologia acentuam a tendenc ia a espe-

cializar;:aoe levam a crisciio de protissbes novas ou a novas tunciies den-

t ro das pro ti ssi ies c tsss ice s. Mas estas devem ester coordenadas e integra-

das; por isso, se fala do trabalho em equipe interdiscip/l inar ou multidis-

ciplinar.

A inteqreciio e coordenedio de tunciies exigem, por outro ledo, uma

correta divisao do trabalho.

D complexo s o pode funcionar harmoniosamente dentro de um

alto grau de orqenieeciio, onde os objetivos formulados e 0 planejamento e

programas de trabalho se elaboram cientifi camente e se repartem as res-

ponsebilidedes.

A complex idade da vida e das orqenizsciies criadas para defender

a vida do homem e tecilitsr 0 seu bern-ester , como parte insepsrsvel da

seude, levaram a perfeita compreensiio de que uma medicine, para ser real-

mente efetiva no sent ido promocional da seude e do bern-ester, deve ado-

tar uma franca ati tude preventiva. Isto rompe com 0 esquema clsssico doque parecia ser, ate bem pouco tempo, campos snteqonicos: as chama-

das "medicine curetive" e "medicine preventive". Na realidade, mIo exis-

te tal antagonismo. Nao existe mais do que uma medicina: a boa medici-

na. E esta adquire um alto grau de eticiencie e de capacidade de prevenir

doencas, de sbrevier e erradicar as existentes e de ·promover a seude e a

eficiencie, quando e "compreensive" e interdiscipliner, quando toma em

considereciio, ao mesmo tempo, 0 bioloqico, 0 orqdnico, 0 psiquico e 0

social . Algo seme/hante pode se dizer do psicoloqo em contato com pro-

blemas medicos e sociais.

D medico, por si so, nao pode resolver todos os problemas relaciona-

dos com a seude do homem, nem quando se trata de uma etenciio eficien-

te e da prevendio de doence.

Por outro lado, se torne incompreensivel para a sociedade contem-

pordnes, cientifica e tecnologicamente svsnceds, nao dedicar 0maximo de

etenceo ao estudo das necessidedes totals do homem e dos grupos humanos,

em estado de seude e de doence, para evitsr e prevenir tudo0

que possa di-f icul tar e impedir a consecuciio do alto nivel de seude e de bern-ester de-

sejevet para a popular;:ao.

E, a partir de um ponto de vista metodoloqico e pretico, resultou

conveniente formular urns concepciio do trabalho medico essencialmente

orientado para a prevenciio, estsbelecendo, como oportunamente 0 iormu-

laram Leavell e Clsrck, os cinco nfveis hoje aceitos como clessicos: 1 -

promociio da seude ou prevencdo inespecifica; 2 - prevenciio especffica;

3 - disqnostico antecipado e tratamenta adequado; 4 - t imitecio da

incapacidade; e 5- resbiliteciio.

Em todos estes niveis h c i muito que prevenir. Antecipar-se aos males

possiveis pelo conhecimento exaustivo da "historie natural da seude e

da doence".

Mas isto deve-se fazer com a coopersciio de equipes profissionais

interdisciplinares. Nao existem, realmente, profissiies nem tecnices auxilia-

res. Trata-se de um conjunto de tunciies que se coordenam e integram.

Muitas protissiies e etividedes tem, pols, relsceo direta e indireta com

a seude. Sao aspectos parciais, mas nao interdependentes de uma mesma

coisa. D psicoloqo e um profissional absolutamente necesssrio na equipe

medica e de ssude publica , como 0 demonstra 0 Dr. 81eger em seu livro.

A eusencis de ssude, a incapacidade t isice ou mental, tanto como

as dificuldades de comuniceciio e capacidade de coleborsciio entre os ho-

mens, entre estes e suas insti tuicoes e entre asinstituici ies entre si, conspi-

ram contra0

exercicio da /iberdade individual e ados grupos humsnos, afelicidade e 0 bern-ester da comunidade.

Aqui os psicoloqos e os medicos tern um amplo campo comum de

trabalho para prevenir e facilitar 0 progresso e eperteicoemento da vida

do homem e da comunidade.

Por isso, compreende-se que 0 psicoloqo clinico de hoje deve se

achar familiarizado tanto com os fundamentos da sociotoqie e da antropo-

logia cultural, como com 0usa e significado das estetis tices medicss e 0

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 4/69

metoda epidemioloqico aplicados eo trabalho medico e a investiqscio cien-

t /t ice de problemas medicos e suas insti tu ic /ies . Mals ainda, deve ter ideie

clara do que significam as principios e tecnices de edministrecio aplicados

a etenciio da ssude e do bern-ester da comunidade.

Com estas ideiss, caras a medicina atual, orientadas para a prevenciio

e a ssude da comunidede, a doutor B/eger medico se integra com a profes-

sor de psicologia B/eger e coloca no livro que prolongamos sua experiencie

na tormecio de psicoloqos clinicos e seu desejo de converter a psicoloqo

em um profissional claramente posto ao service da comunidade. Introduza termo "psico-hiqiene" como parte da higiene mental, par sua vez cept-

tulo importante da medicina preventive, para delimitar a campo de aplica-

(:aoracional dos conhecimentos e as tecnicss psicotoqicss meis efetivas em

beneficia da comunidade. 0 autor denomina "psico-hiqiene" a este

conjunto de ativ idades propries do psicoloqo, "nao porque se busque a seu-

de psiquice (0 que seria lim ebsurdo] e sim porque se age fundamental-

mente sobre 0 nivel psicaloqico dos fen6menos humanos, com metoda

e tecnicss procedentes do campo da psicologia e dapsicologia socie!",

Mas como ao autor interessam tembem as problemas metoda to-

gicos, proprios da atividade cienti tice e profissional, estudJ cuidadosa-

mente e com grande objetiv idade a possibilidade de eoliceciio dos conhe-

cimentos da psicologia individual e social com a proposi to de melhorar a

presente realidade social, que msntem a homem doente, angust iado e de-

sajustado de seu grupo familiar ou social, e que.perturbe e diticulte 0 pro-

gresso necesssrio das instituiciies criadas pelo homem e nem sempre a

seu servico.

Falar de relsciies humanas constitui, como multo bem 0 assinala a

eutor, um problema que transcende a a(:ao de um profissional que age na

intimidade de um consultorio, para se voltar a uma atividade de marcado

cereter preventive no seio mesmo da familia, dos grupos humanos e sues

instituicdes.

Tudo isto implies "re-situer" 0 psicotoqo em sell encerqo proiis-

s ionel, comecendo por modificar sua iormecio nos ambientes universite-rios e Ihe dando acesso a vida profissional l iberal como investigador de

processos psicoloqicos no campo individual, insti tucional e social e como

psicoterapeuta, onde a a(:i io do medico nao alcance a ntvel tecnico sufi-

ciente.

E evidente que a atividade do psicoloqo no campo da psicoterapia

traz e tem trazido conili tos e msl-entendidos com psiquietres , psicoters-

peutas medicos e psicsnstistss , devido a pretendida intromissio dsquele

profissional no campo aparentemente exclusivo do medico au do psiquie-

tra; mas tsrnbem e certo que a iormecio universiterie do medico nao e su-

ficientemente profunda no que se refere a psicologia como para fazer de

cada medico um psicoterepeute cientif icamente preparado para a etencio

carreta do doente e a solucso de problemas de inter-releciies humanas na

comunidede aparentemente sa. Menos ainda para enfrentar as repercussiies

psicoloqices e sociais da doence sobre 0qrupo familiar e as instituidies.

o doutor Bleger aborda estes problemas com sinceridade e objeti-

vidade pouco habituais, chegando a conclusiio de que a psicoloqo deveencontrar sua maior Fonte de trabalho e preocupeciio no terreno au ambi-

to da "psico-hiqiene", para ser u ti ! a comunidsde.

Isto 0 leva diretamente a se ocupar com problemas de prevenciio das

elterscties da vida de comuniceciio e compreensiio entre as homens no selo

da famflia, das instituiciies e da comunidsde.

Adquirir a experii incia necessaria, por parte do psicoloqo, em mate-

ria de investigat;ao operativa constitui lima atividade impreterivet, assim

como no uso correto do metoda clinico, para dar base cientifica a seu

encargo.

o psicoloqo - recorda insistentemente a autor - deve agir tundsmen-

talmente como assessor ou consultor em instituiciies publices ou privadas,

que, como 0 hospital, tern infinitos problemas de desejuste social, emocio-

nal e administrativo que travam com treqiiencie a sua a(:aoe eiiciencie.

o Dr. Bleger poe iin fase especial no estudo detalhado do que corresponde

ao psicoloqo fazer, a partir dos pontos de vista etico, profissionel e tecnico,

ao atuar nas instituicoes que solicitam seu assessoramento. A tarefa a reeti-

zar ntio constitui, evidentemente, 0 estudo exclusivo dos indivfduos doen-

tes ou nao e sim, fundamentalmente, 0 estudo dos pepeis e a at;aodesen-

volvidos pelos individuos que compiiem a insti tuici io em rela(:i iocom os

objetivos desta ultima, 0 que se esquece com treqiiencie.

JJ ex iste um ecumulo suficiente de conhecimentos em psicoloqie

individual, social e insti tucional que permite ao psicoloqo agircomo fator

de mudence em materia depautas de conduta .Esta a(:aoe muito mais valiosa quando vaidirig ida a chamada cornu-

nidade normal, para intervir nos processos que gravitam e inttuem na estru-

tura dapersonalidade e,portento, nas relsciies entre os seres.

Acentuar a necessidade de conhecer a melhor possivel as leis nstu-

reis e as tendencies que regem os processos psicoloqicos no contexto cut-

tursl particular resulta obvio para uma sociedade organizada e progressista,

ja que da a(:ao individuel de suas propries orqenireciies dependem a este-

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 5/69

bilidade social e a necessidade continua de crftica e melhoremento: u.. os

processos psicotoqicos formam parte da reslidede, da mesma maneira que

as insti tuici ies e os objetos da natureza - diz B/eger - e mfo e possivelconseguir modiiicscio radical senso tembem com um conhecimento de

suas leis peculiares ... " Mais adiante, 0 autor acrescenta: "Tode instituicio

e 0 meio pelo qual as seres humanos podem se enriquecer ou empobrecer

ou se esvaziar como seres humenos; 0 que comumente se chama de adapta-

c;aoe submissio a etienecio e a estereotipia institucionsl".

Muito f reqiientemente se reprime a capacidade do homem para seadaptar as verieveis condiciies i/sices, sociais au institucionais do embiente,

no sentido de sjustemento, conformidade ou submissio, considerando-se

isto como normal ou desejevet sem seadvertir que a "edepteciio" no senti-

do bioloqico nao elimina a tendencie natural do homem a independencie

ffsica e espiritual e a sua sede inextingiifvel de mudence e progresso.

E tsmbem capacidade do homem modificar a ambiente para a adap-

tar a seus desejos e espireciies superiores, dominando a natureza e aperfei-

coendo suas instituiciies.

A necessidade de situar 0 psicoloqo como profissional especializado

em diversas atividades especfficas levou 0 eutor a separar timbitos ou areas

de trabalho demasiado estreitas e delimitadas, 0 que se tome algo artificial

para nos.

Em nosso jutzo, a tarefa de cura e de prevencio nao e realizada s opelos medicos e especializados em ssude publica. Damesma forma, toma-

se dificil designar campos demasiado restritos ao psicoloqo, com 0 risco de

se criar um certo "irnperietismo e estreiteza protissionel" ao mesmo tempo.

A ideia de equipe integrada multidisciptiner, adequada para nosso mundo

tecnologicamente evencedo, exige compreensio total de problemas e res-

ponsabilidades em areas limitadas, mas nao "monopolizedes".

E assim como reclamam, as vezes, para si , 0 direito de orientar e

organizar a comunidade os socio logos, os assistentes socieis, os econo-

mistas e as politicos, e, as vezes, os especialis tas em seude publica e os

psicoloqos. 0 t rabalho em equipe impede, em boa medlde, part icipar deatividades "como de exclusive etribuiceo de uma protissio determinede",

aceitando a necessidade de especietizeciio, par entonomesie.

Coincidimos, nao obstante , com a Dr. Bleger, na conveniencie de

assinalar campos de ac;aoespeciiicos relativos para as diferentes proilssiies

dentro do trabalho em equipe e com program as compartilhados.

Adquire siqniflcecso part icular a defesa que faz a autor deste livro

da necessidede de dar amplo acesso a aprendizagem das tecnices e conhe-

cimentos proprios da psicensli se a medicos e socioloqos, que nao hao de

consagrar-se logo a exercer como psicenelistss, dada a indiscutlvel impor-

tt incie de par esta tecnice e estes conhecimentos a service de mut tiplos

problemas de seude mental de cereter social e institucional.

Torna-se sumamente grato para 0 que subscreve fazer a apresenta-

c;aodeste novo livro do professor Bleger, que 0 publica com a modestie

do homem de ciencis que so espera prom over a necessaria discussiio acer-

cade problemas que, como 0 da "psico-hiqiene" e da "psicoloqis institucio-

ne!", necessitam ser classificados e corretamente situados no campo doconhecimento medico e psicol6gico para que as tecnicss e metodos com

que se abordam os estudos relacionados com eles alcancem a seriedade e

a eticecie requeridas.

Pela cota de elementos de estudo e intormecio que tornece, pela

claridade de pensamento e profundidade das cotoceciies ete tuedes, deve

se considerar 0 trabalho como de real significac;ao e trenscendencie.

Muitos pontos sao passlveis de discussiio e de futura revisio, mas a

humanidade nao progrediria se niio houvesse homens capazes de afrontar

entices e abrir novos caminhos na aC;aoe no pensamento cientificos.

DAVID SEVLEVER

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 6/69

Sumario

l ntroducao . 15

1 - a psicblogo ctinico ea higiene mental. 19

Higiene. mental e psico-higiene. Objetivos da higiene ment al. Extremos

em higiene mental. l ndaqacao e acao. Saude publica e higiene mental.

Ambito de a tuacao . Educacao sani ta ri a

2 - Psicologia institucionst ..... . . . . 31

o que e a psicol oqia institucional, Objetivos da i nstitu i<;ao e objetivos do

psico loqo . Me todo do t rabalho inst itucional . Tacnicas do enquadramento .

lnsercao do psicoioqo na i nstltuicao, "Grau de dinarnica" da instituicao,

Psicologia das inst ituicoes. Os grupos na instituicao. 0 hospital como ins-

tituicao. A empresa. Psicol ogia da equipe de psicoloqos. Conclusao. Bi-

bl iografia.

3- a psicoloqo na comunidade . 71

Objeti vos e ni veis da higiene mental. Constel acao multifatorial. 0 psico-

logo e a terapia. Pontes focais para 0 t ratamento e a pr evencao . Comuni -

dade. Objetivos. Comunidade-tipo.

4 - Grupo familiar epsico-higiene ... 96

5 - Perspectivasdapsicenelise epsico-hiqiene . 108

Psicanalise cI In ica. Tre s f ormas da psicanal is e. Formacao do psicana li st a.

Ps icalog ia e psico loqos, Ps icanal is e e medicos. Outr os problemas re lacio-

nados, 0 psicanal ist a no hospi ta l.

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 7/69

Apendicss

Estudo-pi loto em uma comunidade

Programa do curso de higiene mental .. ..

Bibliografia detalhada sobre higiene mental.

126

131

133

Iruroducdo

E possivel que nao se tenha dado nunca em tal magnitude em nos-

so pais 0 fen6meno tao singular que, para os psicoloqos de minha qeracao,

significou 0 desenvolvimento da psicologia durante os ultirnos vinte ou

vinte e cinco anos. 0 saito que tivemos que dar foi e segue sendo muito

grande. A partir de uma total desorientacao e contusao de campos t ivemos

que nos orientar nos objetivos e rnetodos da psicologia e, fundamental-

mente tarnbern, nos preocupar pelo desenvolvimento de uma psicolo-

gia que nao fosse puramente nacional ou filosof lca, chegando agora ao

ponto em que nos vemos necessitados e exigidos a elaborar um novo passo ,

que consiste no fato de que os problemas cientlficos da psicologia e 0 de-

senvolvimento de sua investiqacao nao pod em ou nao devem estar desvin-

culados dos requerimentos e exiqenc ia s da vida real e cotidiana.

Sou dos que creern que a desenvolvimento da psicologia e uma

necessidade impreterfvel, do qual dependem nao so um melhor conhe-

cimento das leis psicoloqicas que regem a conduta dos seres humanos, co-

mo tarnbern a possibilidade de poder compreender e orientar a orqanlzacao

e a vida dos se res humanos.

E evidente que aprendemos - como especie - a manejar os fatosnaturais, a manejar a natureza, a construir e manejar instrumentos, tecni-

cas e objetos, mas nao aprendemos ainda 0 suficiente para orientar a vida

eas relacdes dos seres humanos, quer sejam estas de carater individual,

grupal, institucional ou cornunitario [nacional e internacional). Creio que

a psicologia deixou totalmente de ser um conhecimento "de luxo" e pas-

sou a ser uma necessidade impreterivel, porque conhecemos as leis que re-

gem 0 movimento de um objeto, mas nao conhecernos ainda bern as leis

15

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 8/69

psicoloqicas que regem a vida humana. E creio que delas dependem, em

certa medida, as situacoes de enorme tensao que estamos vivendo na atua-

lidade, as situacdes de insequranca, riscos permanentes, situacoss cacti-

cas que podem chegar ao auto-exterrmnlo de grande parte da humanidade,

de seus sucessos e ainda de todos os seres humanos. l stonao significa de

nenhuma maneira que creia que tudo dependa da psicologia, mas, sim,

creio que a psicologia po de e deve gradualmente nos oferecer uma cota

de bens consideravel para salvaguardar e melhorar a vida dos seres huma-

nos.Enfocada desta mane ira, a psiclogia tem que se inserir, penetrar cada

vez mais na realidade social e em circulos mais amplos, incluindo 0 estudo

d05 grupos, das instituicoes e da comunidade, tanto como problemas 50-

ciais nacionais e internacionais de todo tipo, ja que a dirnensao psicolo-

gica se faz presente em tudo, posto que em tudo a ser humano intervern.

Orientado desta maneira, penso que, se bem que nao tenhamos par

que nos exigir resultados imediatos, por outro lado devemos trabalhar

com uma finalidade de investiqacao, mas orientada por certos objetivos e

finalidades que seguramente a mesma lnvestiqacso nos fara variar, rnos-

trando-nos roteiros cada vez mais exatos e frutfferos. A funcso social do

psicoloqo e a transcendencia social da psicologia constituem para mim

uma preocupacao ha muitos anos e me propus ampliar gradual mente a

campo de investiqacao e de apllcacao da psicologia. E assim que, desde

1962, se realizaram no departamento de psicologia da Faculdade de Filo-

sofia e Letras de Buenos Aires serninarios distintos. a meu cargo, sobre

higiene mental e especialmente sabre tudo 0 que neste cap itulo corres-

ponde ao psicoloqo e a psicologia; e a criacao, em 1965, da cadeira de

higiene mental me obrigou definitivamente a um esforco para re-situar a

psicologia como ciencia e 0 pslcoloqo como profissional.

Destes seminaries e desta cade ira , da revisao biblioqraf ica , da discus-

sao dos problemas com os integrantes da cadeira e com os estudantes deri-

varam alguns estudos que publico agora em forma de livro, sem a pre-

tensao de que constitua um livro de texto, e sim com0

proposito de pro-mover inquietacao, de problematizar as questoes e especialmente de am-

pliar as perspectivas da psicologia e do s psicoloqos .

Dos aspectos positivos e negativos dos caprtulos que constituem este

livro poderao fazer eco todos aqueles que de uma ou outra maneira

tenham tratado de enfocar estes problemas.

Parte-se de um capitulo no qual se abrem as perspectivas do psico-

logo clfnico frente a higiene mental; sequern-se outros sabre psicologia

16

institucional, psicologia da comunidade, grupo familiar e um ultimo sobre

as perspectivas da psicanalise em relacao com a psico-higiene.' E dada a

carencia de suficiente clareza sobre estes problemas e a maneira de encara-

los no ensino, julguei conveniente acrescentar no Apendice 0 programa do

curso de higiene mental proferido no segundo quadrimestre de 1965, com

a bibliografia detalhada correspondente e tarnbern um breve cornentario

sobre 0 trabalho pratico realizado, que constituiu uma tentativa de sis-

tematizar 0 estudo psicoloqico de uma comunidade, tarefa que foi levada

a cabo pelos estudantes, dirigidos pelo excelente corpo de colaboradorescom que contei. Com todos eles tenho uma divida de gratidao, ja que ofe-

receram e utilizaram generosamente seu tempo, sua capacidade e sua inte-

ligencia na diffcil tarefa de organizar uma cadeira de psico-higiene, tarefa

cujas maiores dificuldades nao s6 residiram na ostruturacso formal da

rnesrna corno tarn bern fundarnentalrnente na orqanizacao da materia, seu

conteudo, sua bibliografia, sua crientacao, seus objetivos, sua inteqracao

teorica e pratica, e a revisao de esquernas conce ituais e tecnicas.

Especialrnente que ro rnencionar a inestimavel colaboracao que pres-

tou, generosarnente, 0 professor adjunto da cadeira, Dr. Abraarn Son is,

corno reconhecido especial ista nos problemas da saude publica, interessa-

do sernpre no panorarna psicol6gico dos problernas da saude publica.

Guia-rne 0 proposito fundarnental de que os distintos caprtulos des-

te livro possarn prornover interesse para orientar os psicoloqos no carnpo

da psico-higiene e a psicologia ern urn carninho que supere as antinornias

entre teoria e pratica, entre ciencia e aplicacao. Para rnirn, pessoalrnente,

este livro, ou estes capitulos, constituern urna baliza a rnais no proposito

de construir urna psicologia concreta e vejo ja corn satisfacao a existen-

cia de urn born nurnero de psico loqos trabalhando de acordo corn os deli-

nearnentos que aqui se resenharn. Estes estarao rnuito ern breve ern condi-

coes de rati fi car, corrigir , arnpliar e aprofundar 0 que aprenderarn.

1 ~ 0 primeiro capi tu lo foi publ icado emActa psiquietrice V psicotoqice argentina

em 8/4/1962; 0segundo, no departamento de psicologia da Faculdadede Filosofia

e Letrasde Buenos Aires (1965), 0 quarto e quinto foram lidos ~ respectivarnente~

no sirnposio "Doenca mental e familia", organizado por Acta psiquietrice Vpsicoto-

gia argentina e em umareuniao cientrfica do Instituto dePsicanalise(1965).

17

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 9/69

1

opsicologo clin ic o e a higiene menta l

A criacao da carre ira de psicologia em distintas universidades do pais e

o fato de contar ia com egressos das mesmas, cujo nurnero ira progressiva-

mente aumentando, coloca problemas de distinta indole. Um deles eo do pa-

pel do psicoloqo na saude publica e, mais espec ia lmente , na higiene menta l.

Da correta colocacao, desde 0 corneco, dos psicoloqos clinicos como

profissionais na sociedade e no momenta atual depende, em grande

proporcao, que nao nos vejamos ulteriormente enfrentando problemas su-

mamente graves. Para escla rece r melhor 0 que quero significar, vou tomar

super fic ia lmente como exemplo 0 que ocorre atualmente no campo da

medicina: sabemos que a melhor medicina seria aquela na qual os profis-

sionais dedicassem seus estorcos a saude publica, quer dizer, dentro de

uma orqanlzacao que centre e dirija os esforcos coletivos para proteger,

fomentar e reparar a saude, E, no entanto, 0 medico profi ss ional e prepa-

rado e exerce, em forma individual, uma medicina fundamentalmente

assistencial. Com isto, e na pratica - entre outros males do sistema - es-

peramos que a pessoa adoaca para cur a-Ia, em lugar de evitar a doenca e

prom over um melhor nivel da saude, A rnodificacf io de tal estado de coisas

tornou-se na atualidade um problema sumamente dificil, como ocorresempre que e necessar io introduzir rnudancas radicals, com 0 agravante de

que 0 mesmo medico tem, ainda em grande proporcao, uma dicotomia ou

dissociacao entre saude publica e medicina assistencial e de que sao os me-

dicos os que, em nao escassa medida, apresentam uma certa resistencia a

rnudanca e 11 orqanizacao mais racional da medicina. Nao e menos certo

que esta mudanca nao depende unicamente da vontade dos medicos; mas

tampouco contamos com este ultimo para isto, nem com a consciencia

19

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 10/69

cabal do problema e de suas solucoes, E necessario levar em conta que sao

as condicoes sociais e econornicas as que atualmente tornam mais facil pa-

ra 0 profissional a pratica da medicina privada, assistencial e individualista.

E muito possfvel, no entanto, que muito rapidamente isto va deixando de

ser certo em nosso pais, ou talvez ja nao 0 seja.

Sao muito variados os campos de atuacao do psicoloqo cllnico; mas

se este se acha interessado predominantemente nos problemas psicoloqi-

cos da saude, tem que sesituar corretamente no, ate agora, pouco definido

campo da higiene mental e, 11medida em que 0 va fazendo, 0 campo ira se

configurando mais clara e nitidamente. Quero esclarecer e sublinhar que

a minha posicfio e a de que 0 psicoloqo cl(nico, suficientemente preparado

para isto, deve ser plenamente habili tado para poder desenvolver uma ati-

vidade psicoterapica, porque - entre outras razdes - e, atualmente, 0

profissional melhor preparado, tecnica e cientif icamente, para dita tarefa;

mas, ao mesmo tempo, creio que a carrei ra de psicologia tera que ser con-

siderada como um fracasso, a partir do ponto de vista social, se os psic6-

logos ficam exclusivamente e em sua grande proporcao limitados a terapeu-

tica individual. A fun<;:aosocial do psicoloqo cI (nico nao deve ser basica-

mente a terapia e sim a sauce publica e, dentro dela, a higiene mental. 0

psicoloqo deve intervir intensamente em todos os aspectos e problemas que

concernem a psico-higiene e nao esperar que a pessoa adoeca para recernpoder intervir. E a este problema que me referi no corneco , e sua correta

orientacao deve ser encarada muito precocemente. Estas sao verdades que

nao se poem teoricamente em duvida, mas que nao se fazem ainda praticas

na dirnensjio necessaria.

que indicam as publ icacoes correntes sobre a materia, encontramo-nos

com 0 que terfamos que repetir conhecimentos que 0 psicoloqo ja adquiriu

no curso de sua aprendizagem, proposicdo que nos deixa logicamente mui-

to insati sfei tos, ainda contando que a repeticao nao e nunca totalmente

tal , mas sim sempre uma aplicacao e aprofundamento. Mas conhecer psi-

cologia e psicopatologia nao e ainda conhecer higiene mental, a inda que es-

ta ultima pressuponha 0 primeiro.

Neste sentido, creio que 0 que realmente cor responde em um semi-

nario de higiene mental e 0 estudo da edmlnistreciio dos conhecimentos,

atividades tecnicas e recursos psicol6gicos que ja foram adquiridos, para

encarar os aspectos psicol6gicos da saude e da doenca como fen6menos

sociais e coletivos. Temos que adquirir uma dirnensao social da profissao

do psicblogo e, com isto, consciencia do lugar que ela ocupa dentro da

saude publica e da sociedade. Desejo promover uma rnudanca na atitude

atual do estudante, tanto como na do psicoloqo como profissional, levando

seu interesse fundamental desde 0 campo da doenca e da terapia ate 0 da

saude da comunidade; desejo evitar que os psicoloqos tomem como

modelo do exercfcio de sua profissao a atual orqanizacao da medicina, na

falsa crenca de que esta pode ser a orqanizacao otirna ou necessaria.

A extensa bibliografia existente sobre 0 tema nao esclarece suficien-

temente esta perspectiva, que cremos ser a unica correta. Fazemos total-mente nossa a opinifo de Sivadon e Duchene para quem a maior parte das

publ icacdes sobre higiene mental sao irritantes e decepcionantes.

Objetivos da higiene mental

Higiene mental e psico-hiqiene

Uma vez aceita a premissa sustentada mais acima, ficam varies pro,

blemas muito basicos por colocar e resolver. Quando se quer ensinar higie-

ne mental, 0 que habitualmente se faz e, simplesmente, ensinar psicologia e

psicopatologia; testemunho disto sao os textos mais habituais de higiene

mental, que sao, em sfntese, nao outra coisa que tratados abreviados de

psicologia evolutiva, psicopatologia e psiquiatria.

o primeiro problema que nos colocamos e. entso, 0do conteudo

da materia que temos que tratar neste seminario. Se nos orientamos pelo

Um dos primeiros objetivos, com 0 qual histor icamente nasce a

higiene mental, figura ou se encont ra entre os prop6sitos do movimento

que moveu 0 livro de C. W. Beers, publicado em 1908: "fazer algo pelo

doente mental" , no sentido de ,modificar a assistencia psiquiatr ica, levan-

do-a a condicfies mais humanas (melhores hospitais e melhor atencao) e

com isto a possibilidade de uma maior proporcao de curas.

Um segundo passo hist6rico de fundamental importancia se da ao

colocar como objetivo ja nao s6 0 prop6sito anterior e sim tarnbem, ba-

sicamente, 0 diagri6stico precoce das doencas mentais, com 0 que se possi-

bi lita nao s6 uma taxa mais elevada de curas como tambern diminulcao de

20 21

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 11/69

sofrirnentos e do tempo necessario de internacao. chegando-se a que esta

seja em algumas ocasioes desnecessaria. Isto significa que, uma vez preen-

chidas as necessidades basicas mlnimas de leitos, se propenda a uma

melhor utilizacao dos mesmos, com um criterio funcional ou dinarnico da

internacao, mediante 0 diaqnostico precoce - momentos em que a inter-

nacao pode ser obviada ou reduzida em sua duracao. Isto segue sendo para

nos um objetivo fundamental, no nivel em que se desenvolve ou realiza a

assistencia psiquiatr ica em nosso pais; em geral, 0 diaqnostico se faz ainda

muito tardiamente e se diagnostica a doenca mental em momentos ou pe-

dodos equivalentes ao do diaqnostico do cancer quando ja ha caquexia e

rnetastasa. Nis to , 0 psicoloqo cl m ico pode colaborar de maneira multo

fundamental, mas a responsabilidade deste problema recai preponderante -

mente sobre 0 psiquiatra.

Um terceiro objetivo, que foi se delineando cad a vez mais firme e

nitidamente, ja nao se refere somente 11possibilidade do diaqnostico preco-

ce, e sim basicamente 11profilaxia ou prevencao das doencas mentais, agin-

do antes que estas facarn sua aparicao e, em consequencia, evitando-as.

Enquanto que se tern desenvolvido, em certa medida, os objetivos

anteriores, aparece na higiene mental a necessidade de atender 11reabili ta-

c;:ao, quer seja do paciente que deve se rei n tegrar 11vida plena, quer seja do

curado com deficit ou sequelas. ou quer seja daquele por quem a medicinacurativa nao pode fazer nada.

o objetivo historicamente mais recente na higiene mental ja nao se

refere tao so 11doenca ou 11 sua profilaxia e sim t amb er n 1 1p ro rn oc ao de um

maior equilibrio, de um melhor nlvel de saude na populacao. Desta manei-

ra, ja nao interessa somente a ausencia de doenca e sim 0 desenvolvimento

pleno dos individuos e da comunidade total. A enfase da higiene mental

translada-se, assim, da doence a seude e. com isto, a etencso da vida coti-

diana dos seres humanos. E isto e , para nos, de vital irnportancia e interes-

se.

rivam do campo da patologia e da terapeutica A profi laxia, como possi -

bilidade concreta, chega muito tarde no campo da psiquiatria, pelo fato de

que para desenvolve-Ia requer-se conhecer as causas da doenca, 0 qual -

em forma cientificamente rigorosa - fica ainda como urna perspectiva do

futuro. De tal maneira, a profilaxia especifica (atacar uma causa para evi-

tar uma dada doenca) so se torna atualmente possivel em muito poucos

casos (paralisia geral progressiva, por exernplo], de tal maneira que nossa

arma profilatica mais poderosa no presente e de ca rater inespecifico: a pro-

tecao da saude e, com isto, a prornocao de melhores condlcoes de vida.

A escolha do objetivo a preencher em determinado momento tam-

pouco pode ser um fato rnecanico, porque se bem que devemos tender ao

ul timo dos enumerados (prornocao da saude), nao e m.enos certo que, em

distintas comunidades, os problemas e a urqencia dos mesmos podem de-

terminar que 0 peso da atencao recaia em um dado momenta sobre 0 as-

pec to assistencial ou sobre 0 profilatico. Devemos confeccionar, sense uma

escala, pelo menos criterios de prioridade para decidir sobre a urqencia e

possibilidades de agir sobre os problemas e suas distintas irnplicacfies. E

esta decisao nao e somente um problema teorico, mas sim eminentemente

pratico, ainda que auxiliado pela teoria empregada de forma flexivel ou

plastica, ta l como deve ser utilizada toda teoria.

o psicoloqo clinico deve ocupar um lugar em toda equips da sau-de publica, em qualquer e em todos os objetivos da higiene mental, nos

quais tem funcoes especificas para cumprir (as da psico-higiene ).

Extremos em higiene mental

Estes cinco objetivos da higiene mental nao se sucedem cronologi-

camente e em forma rigorosa em sua aplicacao nem tampouco se excluem

e, inclusive, os limites entre um e outro nao sao totalmente ru'tidos: a

terapeutica - por exemplo - rende beneff cios diretos a profilaxia enquan-

to que curar um sujeito pode signif icar que ele nao gravite patologicamente

sobre seus filhos e, por outra parte, se atuamos no nivel da profilaxia, isto

e insepatave l do melhoramento do nlvel da saude da comunidade. Alern

disso, nao deixa de ser certo que, em boa medida, os conhecimentos neces-

sarios para atuar na profilaxia, na reabilitacao e na prornocao da saude de-

Devemos estudar enos prevenir sobre certas atitudes ou precon-

ceitos frente 11higiene mental que nao so estao presentes no publico como

tarnbern entre os profissionais e, por certo, tambern ent re os ps icoloqos

cl inicos.

Um dos primeiros preconceitos que devemos atender refere-se aos

dos poles idealizacao-rnenosprezo das possibilidades da higiene mental:

ou se espera desta ultima solucfies milagrosas ou se desvalorizam todas as

suas possibilidades e realizacoes, Estas atitudes extremas dificultam ou

impossibilitam 0 necessaria senti do de realidade e, como em todas as

atitudes extremas, uma vez embarcados em uma delas, com facilidade

22 23

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 12/69

gira-se a inversa. Com isso, corre-se paralelamente 0 risco de flutuar entre a

impotencia e a onipotencia, com todos os prejuizos e danos de am b as. Ate

pouco tempo e, em certa medida, ainda na atualidade, esperava-se tudo da

educacao, exage rando visivelmente suas possibilidades reais. Para alguns,

deu-se 0 mesmo fenorneno corn a eugenia. Devemos evitar que 0 mesmo se

rep ita agora com a psicologia, esperando que ela resolva todos os males.

Trabalhar no campo da psico-higiene significa inevitavelmente estar

atuando nos problemas sociais e nas condicoes de vida dos seres humanos;

daqui deriva outra possibilidade de extremos, muito relacionados com os

recern-descritos e que consiste - por uma parte - em crer que a higiene

mental Ie a higiene em geral) reduz-se a uma reforma economico-polrtica

da sociedade e - por outra parte - na tendencia a transformar a higiene

mental em um movimento ideoloqico em si mesmo. Situando a higiene

mental em sua justa medida e possibilidades, nao podemos nem deve-

mos nos desentender das condicoes econornicas e sociais de uma cornu-

nidade, entre outras razfies porque ha situacoes sob as quais a higiene men-

tal consiste justamente em atender ditos problemas sociais (alimentacao,

moradia, etc.l, 0 profissional deve agir em sua condicso inseparavel de

ser humano: um nao deve absorver nem anular 0 outro.

as modificacoes ja conseguidas e isto num processo de permanente intera-

t;:ao. Todos os fatores que compreendem a investiqacao e a at;:ao devem ser

inclu (dos como variaveis do fen6meno mesmo que se estuda e que se vai

modificando enquanto se estuda. Cada passo dado na at;:ao deve, per sua

vez, ser investigado em seus efeitos, incluindo nisto 0 fato de que a pro-

pria lnvestiqacao ja e uma atuacao. Esta indaqacao operative deve ser tida

muito em conta tanto pelo psicoloqo clinico como por todo trabalhador

social e so com ela sera frutifera tanto a investiqacao como seus efeitos e a

aplicacao de seus resu Itados. Cad a hipotese torna-se investigada no fato

de sua aplicacao dando isto lugar de imediato a sua arnptiacao ou retifi-

cacao, A etapa de apllcacao implica necessariamente a investiqacao do

que se asta apl icando.

Dentro deste enquadramento geral e que estudaremos a adrnini st ra-

t;:ao de rnetodos e tecnicas psicoloqicas e sociais que 0 psicoloqo ja apren-

deu anteriormente no decurso de seus estudos e a isto deve se acrescentar

o conhecimento do metoda epidernioloqico no estudo dos transtornos

mentais, que se tornou um instrumento fundamental e imprescind i'vel no

campo da higiene mental.

Saude publica e higiene mental

Indaqacao e a c ; :a o

Quando se fala de lnvestlqacao, temos ainda, em grande medida, 0

modelo do investigador experimental das ciencias naturals, que configura

uma situacao artificial de poucas variaveis para poder trabalhar e com isso

caimos no preconceito de crer que, fora destas condic;6es, a investiqacao eimpossivel. As ciencias socials, especialmente, mostraram ate a evidencia

de que isto nao e correto.

o psicoloqo clfnico deve, no campo da higiene mental, aplicar 0

princfpio de que indagaC;ao e ac;ao sao inseparaveis e que ambas se en-

riquecem reciprocamente no processo de uma praxis. Isto nao constitui

uma rnanifestacao de desejos e sim uma condicao fundamental para operar

corretamente. A aC;ao deve ser precedida de uma investiqacao: mas a inves-

tigac;ao mesmo e ja uma atuacso sobre 0 objeto que se indaga. As modifi-

cacoss obtidas ou resultantes devem, por sua vez, reagir sobre os n ( veis e

passos seguidos na investiqacso, de tal maneira que outra vez ajam sobre

A higiene mental e um ramo da saude publica e deve ser encarada em

concordancia com a orqanlzacao eo nfvel que esta ultima tenha alcancado

em cada lugar, de tal maneira que nao podem se desvincular entre si.1

A higiene compreende 0 conjunto de conhecimentos, rnetodos e

tecnicas para conserver e desenvolver a saude, 0 relatorio nurnero 31 da

Orqanizacao Mundial da Saude, de dezembro de 1952, diz que a higiene

mental "consiste nas atividades e tecnicas que promqvem e rnantern a

saude mental". Dentro da higiene mental pode-se contar com um ramo

especial, que interessa particularmente 0 psicoloqo clinico: e 0 campo da

psico-hig iene. Ass im se 0 denomina nao porque se busque a saude psfquica

(0 que seria um absurdo], mas sim porque se age fundamental mente sobre

o nivel psicol6gico dos fenomenos humanos, com rnetodos e teenicas pro-

1 - Tende-se atualmente a empregar a expressao seude mental para facilitar 0 concei-

to de inteqracao das chamadas medic ina curat iva, p revent iva e social .

24 25

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 13/69

cedentes do campo da psicologia e da psicologia social. E este e 0 campo

privative do psicoloqo clmico.

o mesmo que para 0 caso da psico-higiene, seria necessario, a rigor,

falar de higiene mental e de saude mental so para se referir ao campo de

acso e nao a um setor dos resultados, porque toda atuacao na saude publ i-

ca tem efeitos sobre os tenornenos menta is e psicoloqicos [alimentacao,

avitaminose, ln feccoes, etc.) tanto como as medidas de psico-higiene tern

repercussao direta sobre a saude corporal (exemplo: os estudos de Spitz,

M. Ribble e outros sobre a carencia de amor e seus efeitos patoloqicos).

De outra maneira, estamos prolongando na terminologia urn dualismo que

rechacarnos na teoria.

A higiene mental, como ja dissemos, e parte integrante da saude pu-

blica, mas cremos que a psico-hiqiene ultrapassa os limites da medicina,

tanto como ultrapassa as possibilidades de ac;ao do medico, Quando al-

guns situ am 0 psicoloqo clinico como auxiliar da medicina e porque nao

se entendeu a tuncso e extensao da psico-higiene, reduzindo-a a terapia das

neuroses e psicoses. Seria semelhante ao fato de querer situar os mestres

como auxiliares da medicina em tuncao da intervencao e inf luencia que

eles tern como profissionais sobre 0 equihbrio emocional e psicoloqico

das criancas, E possivel que se tenha que admitir como capitulo mais vasto

o da saude mental e, dentro dele, considerar inclu idas tanto a higienemental como a psico-higiene, como dois caprtulos que nao se sobrepdern

totalmente, ainda que com a grande quantidade de pontos de contato.

o psicoloqo clmico opera, na realidade, com esquemas conce ituais

e com tecnicas que correspondem rnais ao campo da aprendizagem (lear-

ning) que ao da clinica,

Tudo 0 que e relativo a saude publ ica tem est reita conexao com a

orqanizacao estatal edisto deriva, com rnuita frequencia, uma atitude de

expecta tiva ou dependencia, na qual espera-se tudo dos poderes publ icos.

Certamente que deles dependem, em grande medida, a planificacao racio-

nal e a possibilidade de levar a cabo os projetos na escala necessaria, mas

nao e menos certo que tarnbern n6s somos um "podar publico" e que

muitos projetos e aedes devem e tern que partir dos proprios profissionais,

no carater de tais, A psico-higiene, que e a tarefa de qravltacao que cortes-

ponde especificamente ao psicoloqo cI inico, tem tarnbem, e em grande

med ida, que confiar e se basear em esforcos profissionais nao totalmente

estatais.

Depois disso, corresponds-nos agora responder tarnbern a distintas

interroqacoes que se nos colocarn de imediato: com a psico-higiene, onde

26

intervir? Sobre quem ou que? Como? Com que? Estas sao perguntas

cujas respostas van nos ocupar extensamente.

o esquema que se estereotipou e definiu e que a ac,:aoem higiene

mental e em psico-higiene consiste em abrir urn consultorio, dispsnsario

ou laboratorio para atender os doentes mentais ou suspeitos de se-los que

a ele acodem ou Ihe sao remetidos. Isto e justamente, e em prime iro luga r,

o que nao se deve fazer, se se pretende uma atividade racional e frutifera,

o psicoloqo cl ( nico deve sair em busca de seu "cliente": a pessoa no

curso de seu trabalho cotidiano/O grande passo em psico-higiene consis te

nisto: nao esperar que a pessoa doente venha consultar e sirn sair a tratar

e a intervir nos processos psicoloqicos que gravitam e afetam a estrutura da

personalidade e - portanto - as rei acoes entre os seres hurnanos, rnoti-

vando com isto a publico pa ra que possa concorrer a sol icitar seus services

ern condicoes que nao impliquem em doenca, Isto abre uma perspectiva

ampla e promissora para a saude da populacao e uma fonte de profunda

qratificacao para 0 profissional.z

Ambitos de atuacao

Nesta passagem do psicoloqo clmico da doenca a prornocao da

saude, ao encontro das pessoas em suas ocupacoes e tarefas ordinar ias e

cotidianas, encontramo-nos nos distintos nfveis de orqanizacao. entre os

quais temos que ter em conta, fundamentalmente, as instituicoas, os gru-

pos, a comunidade, a sociedade.

Uma instituicao nao e so um lugar onde 0 psicoloqo pode trabalhar;

e um ruvel de sua tarefa. Quando ingressa para tr abalharern uma institui-

c;ao (escola, hospital, tabrica, clube, etc.}, 0 primeiro que deve fazer enao abrir um gabinete , nem laborat6rio, nem consultorio em atencao aos

indivfduos doentes que integram a instituicao. Sua primeira tarefa e in-

vestigar e tratar a propria instituicao: este e 0 seu primeiro "clients", 0

mais importante. Nao se deve criar outra instituicao dentro da primeira,

a maneira de uma superestrutura, porque a psico-higiene nao e uma super-

estrutura que tem que ser manejada a parte ou acrescentada a vida e as

instituicoes, mas sim dentro das mesmas. Deve-se examinar a instituicao

a partir do ponto de vista psicoloqico: seus objetivos, funcoes, meios,

tarefas, etc.; as lideranc,:as formais e informais, a comunicacao entre os ste-

27

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 14/69

tus (ver tical) e os intrestetus (horizontal), etc. Tendo sempre em conta que

esta indaqacao em si ja e uma atuacao que modifica a instituicao e cria,

alern disso, distintos tipos de tens5es com 0 proprio psicoloqo, que este

tem que atender como parte integrante de sua tarefa. 0 psicoloqo e , em

urna instituicao, urn colaborador e de nenhuma maneira deve se converter

em centro da mesma; suas funcoes devem se exercer atraves dos integrantes

regu lares da mesma. Nesta ordem de coisas, 0 psic61ogo e um especiali sta

em tensoes da relacao ou comunicacao humana e este e 0 campo especrfico

sobre 0 qual deve atuar. A psico-hiqiene em uma instituicfo deve funcio-

nar engrenada ou inclufda no processo regular ou habitual da mesma e nao

se transformar em uma superestrutura sobreposta. Os que 0 consu Itam e

os acontecimentos que deve atender nao devern ser encarados em fun<;:ao

da problernatlca individual e sim ins titucional .

Um segundo nlvel, muito relacionado com 0 anterior, eo da atuacao

sobre os grupos humanos. E muito variada a composicso dos grupos e 0

psicoloqo deve tender a atuar sobre os que configuram "unidades natu-

rais", quer dizer , grupos pre-forrnados. aqueles que ja te rn dinamicamente

configurada a sua func ;:ao dentro de determinada instituicso soc ial: 0 grupo

familiar, 0 fabril, 0 educacional, a equipe de trabalho, etc. Outra de suas

modalidades e ados grupos artificiais, que podem ser hornoqeneos ou he-

teroqeneos, em idade, sexo, problernatica, grau de saude ou de doenca,etc. As tecnicas grupais a utilizar devem ser escolhidas, segundo 0 caso,

entre as disponiveis: terapeuticas, de discussao, operativas, de tarefa , e tc.

o traba l ho sobre 0 n [vel da comunidade tem que se fazer aprovei-

tando todos os meios de cornunicacfo (radio, televisfio, cartazes, [ornais,

folhetos, etc.) e os organismos e instituicoes ja existentes (clube, tabrica.

escola, hospital, etc.). atuando sobre a problematica, as tarefas e as situa-

coes de tensao coletiva. As tecnicas sao tam bern variadas e devem se ade-

quar aos problemas, objetivos perseguidos e reallzacoes factlveis.

Sem animo de apresentar uma classificacao exaustiva ou integral,

os tipos de sltuacao ou de problernatica nos quais 0 ps icoloqo deve inter-

vir podern se agrupar da seguinte mane ira: 1 - Momentos ou per iodos do

desenvolvimento ou da evolucao normal: gravidez, parto, lactancia, infan-

cia, puberdade, juventude, maturidade, idade crrtlca, velhice; 2 - Momen-

tos de rnudanca ou de crise: imigrac;:ao ou ernlqracao, casamento, viuvez,

service militar, etc.: 3 - Situacdes de tensao normal ou anormal nas rela-

90es humanas: familia, escolas, fabricas. etc.; 4 - Orqanizacso e dinarnica

de instituicoes socials: escolas, tribunais, clubes, etc.; 5 - Problemas que

criam ansiedade em momentos ou peri'odos mais especfficos da vida:

28

sexualidade, orientacso profissional, escolha de trabalho, etc.; 6 - Situa·

95es altamente significativas que requerem intorrnacao, educacao ou dire-

9ao: educacao das criancas, jogos, ocio em todas as idades, adocao de

menores, etc. Como e Iacll deduzir, 0 psicoloqo intervern absolutamente

em tudo 0 que inclui ou implica seres humanos, para a protecao de tudo 0

que concerne aos fatores psicoloqicos da vida, em suas multiples mani-

testacoes: interessa-se, em toda a sua amplitude, pela assirnilacao e inte-

gra<;:ao de experiencias em uma aprendizagem adequada, com plena sa-

t is facao de todas as necessidades psicoloqicas,

Fora de todos estes aspectos da psico-higiene, mais implicados no ob-

jetivo de prornocao da saude, toea tarnbern ao psicoloqo assumir um papel

de irnportancia em todos os enumerados anteriormente: terapeutica, pro-

f il ax ia , reabil itacao, d iaqnos tico precoce. Det ivemo·nos mais especialmente

na prornocao da saude porque cremos que e ai onde deve se centrar predo-

minantemente 0 estorco da higiene mental, ainda que em centros ou dis-

pensarios eminentemente terapeuticos ou de reabilitacjio. Confio que,

progressivamente e com esta amplitude, a psico·higiene sera 0 campo

especifico do psicoloqo chnico. Como pode se deduzir do ate aqui exposto

a psico-hiqiene nao exclui a possibilidade do exercfcio privado de uma pro-

f issao. Aqui 0 psicoloqo encontra -se com uma anomalia muito par ticular,

que, em grande proporcso, encontram tarnbern bom nurnero de outrosprofissiona is: a de que, com muitfssima frequencia, a s atividades prof issio-

nais mais racionais e socialmente mais produtivas sao as menos ou pior

remuneradas. Por outra parte, e em forma quase para lela, possuirnos em

todos os campos da higiene muito mais conhecimentos do que realmente

podemos aplicar, devido a limitacoes economicas, sociais e politicas. 0

problema de incrementar a efetividade dos profissionais e distinto ao do

melhoramento de sua cornpetenc ia cientlfica e tecnica . l

Educacao sani taria

Este capitulo da higiene rnerecera atencao especial do psicoloqo,

em virtude da grande irnportancia que tem e pela contr ibuicao especial que

pode levar a mesma. Nao ha programa de higiene que possa se realizar

sem a colaboracao e participacao ativa da comunidade; a educacao sani-

taria tende a produzir rnudancas estaveis de determinadas pautas de

conduta da comunidade.

29

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 15/69

Nesta tarefa corresponds ao psicoloqo avaliar os preconceitos e as

res is tencias, os medos a rnudanca, 0 estudo da mensagem em tuncao dos

resultados que deseja obter, selecionar as pessoas a quem deve se dirigir

de pref'erencia: a comunidade total, profissionais, pessoas-chaves da co-

munidade (professores, rei igiosos, pol iciais, ju izes, presidentes de clu-

bes, etc.). A forma de chegar ao publico e tarnbern um item que deve

ser cuidadosamente considerado: contatos pessoais, imprensa, televisao.

etc.

Devem-se ter t arnbern em conta as distorcoes e perigos que podeoriginar uma sducacao ou uma propaganda sanitaria mal processada;

entre eles, promover atitudes paran6ides ou hipocondr iacas na popu-

lacfio,

30

2

Piscologia ins t i tucional

Em continuacao de um serninario para graduados sobre higiene men-

tal proferido no ana de 1962 no Departamento de Psicologia da Faculdade

de Filosofia e Letras da Universidade de Buenos Aires, realizou-se em 1964

- tarnbern sob minha direcao - outro sob 0 mesmo tema, mas que ja se

centrou totalmente na psicologia ins ti tucional; e deste ultimo que aqui se

-da urn resume. 0 nexo entre ambos os temas e multo evidente e resi-

de na perspective e nos del ineamentos dentro dos quais desejamos verse desenvolver a psicoloqia e a prof issao do psicoloqo , Esta propria pu-

blicacao continua este proposito fundamental de criar inquietacao, es-

pecialmente nas novas prornocoes de psicoloqos, atraindo a atencao

dos mesmos para enfoques menos limitados - ou mais amplos - que

permitam sua melhor situacao social, um cumprimento mais eficaz de

seu papel profissional ou tecnico da psicologia, voltando seu trabalho

para atividades sociais de maior envergadura, transcendencia e signifi-

cacao.

A posicao geral sustentada pode se resumir nas seguintes proposi-

coes, ja dadas a conhecer anteriormente em outra publicacao: a) 0 psico-

logo como profissional deve passar da atividade psicoterapica (doente e

cura) a da psico-higiene (populacao sadia e promocao de saude): b) para

isso, irnpfie-se uma passagem dos enfoques individuals aos sociais. 0 enfo-

que social e duplo: por um lade, compreende os modelos conceituais res-

pectivos e. por outra parte, a ampliacao do ambito em que se trabalha.

Para conseguir tudo isto e necessario 0 desenvolvimento de novos ins-

trumentos de trabalho: conhecimentos e tecnicas que possam fazer viavel

a tarefa e frutfferos os principios. Mas, por outra parte, estes instrumentos

31

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 16/69

so podem ser conseguidos enfrentando paulatinamente a tarefa, porque

so nesta exper iencia viva podem ir-se gestando.

Psicologia institucional - tal como a entendo aqui - e um capitulo

recente no desenvolvimento da psicologia e ninquern pode, na atualidade,

ostentar nem se apolar em uma vasta experiencia. Tampouco posso eu; a

minha experiencia pessoal direta e ate agora limitada e inclui fundamental

e quase unicamente organismos hospital ares e educacionais; em outras ins-

tituicoes minha participacao foi, com grande trequencia, indireta, at r aves

da supervisao do trabalho de psicoloqos, A necessidade de promover novas

inquietacoes e de or i entar precocernente e adequadamente a situacao

profissional correta do psicoloqo faz com que agora comuni que esta

expe rienc ia e conhecimentos sobre 0 tema, tal como - em grande parte -

foram desenvolvidos e elaborados nos sem inarios a que fiz referencia enos

quais contei com a colaboracao lnest irnavel de um grupo de diplomados na

carreira de psicologia que, com grande entusiasmo e inteliqencia, fizeram

eco da necessidade de ter consciencia clara de seu papel na sociedade e de

cumpri-lo 0 mais eficientemente posstvel. Entre os antecedentes fun-

damentais em que nos baseamos encontram·se as contribuicoes de Enrique

Pichon Riviere e Elliot Jaques, para quem devemos deixar certeza de nossa

qratidao pela obra realizada neste sentido. 0 Dr. Enrique J. Pichon Riviere

tem sido, tarnbern neste campo, urn eficaz promotor de inquietacdes, talcomo 0 tern side sernpre em nosso pais na totalidade da psicoloqia, da

psicanalise e da psiquiatria.

Ate agora, sublinhei a psicologia institucional em relacso com 0

psicoloqo enquanto profissional e isto pode levar ao erro de supor que

estamos fa lando de uma atividade subalterna. de uma "parte pratica",

de aplicacao da psicologia, enquanto que a "verdadeira" ciencia psicolo-

gica e a investiqacao psicoloqica acham-se em outro lado. Tais presuncoes

derivam de uma concepcao abstrata e irreal da ciencia, A psicologia inst i-

tucional se insere tanto na historia das necessidades sociais como na his-

toria da psicologia e, dentro desta ultima, nao se trata 56 de urn campo de

aplicacao da psicologia, mas, sim, fundamentalmente, de um campo de

investiqacso: nao ha possibilidade de nenhuma tarefa profissional correta

em psicologia se nao e, ao mesmo tempo, uma investiqacao do que esta

ocorrendo e do que esta se fazendo. A pratica nao e uma derivacao subal-

terna da ciencia, mas sim seu nucleo ou centro vital; e a investiqacao

cientffica nao tem lugar acima ou fora da pratica, mas sim dentro do cur-

so da mesrna. Neste sentido, pesa 0 exemplo (0mau exemplo) de outras

ciencias e atividades profissionais, tais como a medicina; nela, a ciencia e a

32

investiqacao estfo nos laboratorlos, enquanto que a pratica constitu i a fun-

<;:aodos medicos, que devem aplicar as conseqiiencias de dita investlqacao.

Este e urn esquema al ienante e de efeitos ou resu Itados altamente pern i-

ciosos: para os medicos, os doentes, a sociedade e a ciencia, 0 experimen-

to e 0 laboratorio devem constituir um momenta do processo total da in-

vestiqacao, que e inseparavel da propria pratica, tanto como esta ultima

transforma-se, sem investiqacao concomitante, em um empirismo qros-

seiro.

Com tudo isso quero assinalar claramente que a psicologia insti-

tucional nao e um ramo da psicologia aplicada", mas sim um campo da psi-

cologia, que pode significar em si mesmo urn avanco extraordlnario tanto

na investlqacao 'como no desenvolvimento da psicologia como profissao.

:- Para dize-Io de outra maneira, pen so que nao se pode ser psicoloqo se nao

se e , ao mesmo tempo, um investigador dos fen6menos que se querem

modificar e nao se pode ser investigador se nao se extraem os problemas

da propria pratica e da realidade social que se esta vivendo em urn dado

memento, ainda que transitoriamente e por razfies metodol6gicas da

investiqacdo isolern-se momentos do processo to tal. 2

Pode-se dizer que a psicologia desenvolve -se ganhando te rre no da abs-

tra<;:ao e se afirmando gradual e progressivamente no terreno do concreto;

desde uma psicologia inumana do hornernate uma psicologia que capte 0

especificamente humano. Brevemente, podemos expor as seguintes e tapas:

a) Estudo de partes abstratas e abstraidas do ser humano {atencac,

memoria, jUIZO, etc.):

b) Estudo do ser humane como totalidade, mas abstraido do contex-

jo social (si stemas mecanici stas, energeti stas, organicis tas, etc .) :

c} Estudo do ser humane como totalidade nas situacoes concretas e

em seus vinculos interpessoais (presentes e passados). A partir deste te rcel-

ro enfoque conceitual e metodol6gico, 0 desenvolvimento cumpriu-se,

arnpliando os arnbl tos em forma progressiva:

a} ambito psicossocial (individuos);

b} ambito socio-dinam ico (grupos);

1- Toda a assim chamada psicologia aplicada tern em siuma alienaffao como vicio.

2 - A distorcao aparece enquanto ditos momentos sao assumidos por pessoas distin-

tas qu e se mantern isoladas entre si e e nq ua nto s e perde 0 c ar a te r t ec ni co qu e t em 0

isolamento na investigaffao e se desemboca em uma perda ou cerencia da visiioglobale da interacso do processo.

33

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 17/69

Figura 1

Ambito da psicologia: a) psicossccial: b) s6cio-dinilmico;

c) institucional; d) eomunltario. As setas sao explicadas

no texto.

c) ambito institucional (institulcoes}:

d) ambito cornunitario (comunidades).

Convern esclarecer que nao sao sin6nimos e que, portanto, nao coin-

cidem psicologia individual e ambito psicossocial, tanto como tampouco

coincidem psicologia social com ambito socio-dinarnico: a diferenc;:a entre

psicologia individual e social nao reside no ambito particular que abarcam

uma e Dutra, mas sim no modelo concei tual que cada uma delas util iza;

assim pode-se estudar a psicologia do grupo (ambito socio-dinarnico) -

por exemplo - com um modele da psicologia individual, tanto como se

pode estudar 0 indivlduo (~mbito psicossociall com um modelo da psico-

logia social. Por isso eu dizia anteriormente que se l rnpde uma passagem

dos enfoques individuais aos sociais no duplo sentido de reforma dos mo-

de/os conceituais e amplia~iio do ambito de trabalho. A psicologia institu-

cional requer e implica ambas as coisas.

Enquanto ampliacso de ambitos, 0 desenvolvimento da ~cologia

seguiu 0 curso do sentido A (na figura 1). mas.esta direc;:aocoincidiu, em

certa medida, com uma extensso dos modelos da psicologia individual a

todos os outros ambitos. A medida que vamos abarcando, na pratlca, no-

34

vos arnbitos e se estruturam novos modelos conceituais adequados, irnpde-

se 0 sentido B (da mesma figura); quer dizer, devemos retomar 0 estudo

das instl tuicoes com modelos da psicologia da comunidade, 0 estudo de

grupos com modelos da psicologia institucional e da comunidade, eo estu-

do de indivfduos com os modelos da psicologia de grupos, comunidades e

instituicfies. Fica, neste sentido, evidentemente, uma grande tarefa por

realizar no desenvolvimento da psicologia. A rigor, este desenvolvimento

apenas comec;:oue e muito recente.r'

--b Quando falo de modelos da psicologia individual, refiro-me ao fato

de que os mesmos caracterizam-se fundamentalmente por partir do indivf-

duo isolado para expl icar as aqrupacdes humanas e aplicam a estas ultirnas

as categorias observaveis e conceituais que correspondem ou se utilizaram

para 0 indivfduo isolado (organismo; homeostase; l ibido, etc. ) e , desta

maneira, explicarn-se os grupos, as instituicoes e a comunidade, pelas

caractertstlcas do individuo. Quando me refiro aos modelos da psico-

logia social tenho em conta 0 fato de util izar categorias adequadas ao

carater dos fenornenos das aqrupacoes humanas (cornunlcacao, interacao,

ident ificacao, etc.) que, em grande parte, tem que ser ainda descobertos e

criados.

o estudo das instituicoes abarca tres cap i tulos fundamentais em

estreita relalfao e interdependencia , mas que podem ser caracterizados daseguinte forma:

a) Estudo da estrutura e dinarnica das instituicoes:

b) Estudo da psicologia das instituicoes:

c) Estrateqia do trabal ho em psicologia institucional.

Aqui nao estudaremos a lnstitulcfo em si mesma, quer dizer, sua es-

trutura e sua dinamica e sim fundamentalmente a estrategia geral do psi-

coloqo no traba/ho institucionsl: ainda que resenhemos brevemente 0

capitulo da psicologia das lnstl tuicoes, tampouco nos ocuparemos aqui

dos instrumentos especfficos (as tecnicasl para trabalhar em psicologia ins-

titucional.

Da analise realizada em nossos serninarios, surgiu como 0 mais fun-

damental ou urgente neste momenta 0 estudo do que chamamos de a

estrateqia do trabalho inst itucional e, neste sent ido - dent ro da estrate-

gia-,0 mais importante e 0enquadramento da tarefa, quer dizer, a fixac;:ao

3 - ",«, 0 que a psicologia classics considera como 0ponto de partida da psicologia,

quer dizer 0 conhecimento do individuo, nao pode se achar senao precisamente ao

final., .: (POLITZER)

35

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 18/69

de certas constantes dent ro das quais podem-se controlar as variaveis do

fenorneno, pelo menos em certa medida. Dentro destas constantes, que de-

vern ser dadas pelo enquadramento, duas delas tern uma lmportancia rele-

vante, a saber:

a) a relal(ao do psicoloqo com a lnstituicso na contratacao, progra-

malfao e realizacao do trabalho profissional;

b) os criterios que sustentam dita rJlalfao.

o conjunto de todos estes fatores consti tui a estrateqia do trabalho

tanto como sua teoria no campo da psicologia institucional.

Este enfoque e 0 mais conveniente e 0 que mais corresponde utilizar

ao se tratar de profissionais pslcoloqos, como no caso dos serninarios

realizados, dado que eles ja possuem os instrumentos ou tecnlcas para tra-

balhar tanto no ambito psicossocial como no soclo-dlnarnico, institucional

e da comunidade (entrevistas, pesquisas, tecnicas grupais, etc.); enquanto

que 0 que faz falta e 0 l imite dentro do qual ditas tecnicas vao ser empre-

gadas, quer dizer, a forma como se devem administrar os conhecimentos

e tecnicas. Este esclarecimento se faz necessario em funlfao de que e pos-

slvel que para outros profissionais que tentam abarcar ou realizar tarefas

no ambito insti tucional pode ser necessario ou imprescindlvel outro tipo

de aproxlmacao ao problema, distinto do aqui utilizado.

o fundamental do exposto ate agora pode ser sintetizado da seguintemaneira:

PSICOLOGIA INSTITUCIONAL

1 - Caracteri za-se

por {

A) Urn ambito espec ia l, quer d izer , por urn segrnento da ex-

tensao dos fenomenos

B) Um modelo conceitual pertencente it psicologia social

2 - Cornpreende 0

estudo de C) Estrategia

do trabalho

do psic61ogo

A) Estrutura e dinil rnica das insti tulcoes

B) Psicologia das instit{Jicoes

a) F ixacao de

constantes

1. Enquadramento

da tarefa b) Admlnistr.

de conhec.

tecnicas

2. Teoria do enquadramento

36

o qu e e a ps i c o lo g i a i n s t it u c io n a l

I

Como ja vimos, a psicologia institucional caracteriza-se pelo ambito

(as insti tulcoes) e por seus modelos conceituais; dentro de sua estrateqia

inclui-se, como parte fundamental, 0 enquadramento da tarefa e a admi-

nlstracao dos recursos. .

o ambito, que compreende a extensao ou amplitude particular em

que os fenornenos sao abarcados para seu estudo ou para a at ividade pro-

fissional, e, na psicologia institucional - por certo' - a instituicao. Este

ult imo termo tern diversos sentidos que requerem ser, aqui , superficial -

mente examinados. Em seu Dicionerio de socioloqis, Fairchild inclui duas

acepcoes: 1 - "Confiquracao de conduta duradoura, complete , integrada

e organizada, mediante a qual se exerce 0 controle social e por meio da

qual se satisfazem os desejos e necessidades sociais fundamentals": 2 -

"Orqanizacao de carater publico ou sernipubl ico que supoe urn grupo di-

ret6rio e, cornumente, urn ediHcio ou estabelecimento f isico de alguma

fndole, destinada a servir a algum fim socialmente reconhecido e autori -

zado, A esta categoria correspondem unidades tais como os asilos, univer-

sidades, ortanatos, hospitals , e tc ." . Em nossa definicao de psicologia ins-

titucional, compreende-se a lnstl tulcao no segundo dos sentidos dados por

Fairchild e, dentro deste, inclui-se 0 estudo dos fatores caracterizados naprimeira das acepcoes. Psicologia institucional abarca, entao, 0 conjunto

de organisrnos de existencia ffsica concreta, que tern urn certo grau de per-

rnanencia em algum campo ou setor especifico da atividade ou vida hu-

mana, para estudar neles todos os tenornenos humanos que se dao em rela-

((aOcom a estrutura, a dinamica, tuncoes e objetivos da in;ti tu ic;:ao. Com

esta definicfo, quero sublinhar que a psicologia institucional nao corres-

pondern, por exemplo, as leis enquanto inst ituicoes e sim os organismos

em que concretamente se aplicam ou funcionam [tribunals, prisoes, etc. )

di tas leis em sua forma especffica. Em algumas ocasides, dao-se certas

discrepancies ent re urn e outro sent ido, como e 0 caso, por exernplo, da

familia, que e urna insti tuicao social, mas que, para 0 psic6logo, e urn gru-

po enquanto orqanizacao concreta que enfrenta em sua tarefa profissional.

Da mesma forma, a rel igiao e tarnbern uma insti tuicao social, mas a reli-

giao de urn grupo familiar nao e uma insti tulcao: para a religiao, as insti-

tuicfies que interessam a psicologia institucional sao as de seus organismos

espedficos (igreja, paroquia, etc.).

Burgess (citado por Young) menciona quatro tipos principais de ins-

tituicfies:

37

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 19/69

a) institulcfies culturais basicas [famil ia, igreja, escola);

b) instituicoes comerciais (empresas comerciais e econornlcas,

unioes de trabalhadores, empresas do Estado);

c) instituicdes recreativas (clubes atleticos e artfsticos, parques, cam-

pos de jogos, teatros, cinemas, salOesde ballet:

d) instituicoes de controle social formal (agencias de services socials

e governamentais).

A elas, Young acrescenta:

e) instltuicoes sanitarias (hospitais,cImicas, campos e lugares paraconvalescentes, que possam [ncluir-se ou nao no grupo de agencias de ser-

vico social);

f) insti tuicoes de comunicacao (agencias de transports , service pos-

tal, telefones, jornais, revistas, radios).

Incluo esta classificacao a tftulo mais bem ilustrativo da amplitude

do trabalho profissional em psicologia institucional, mas, para nosso objs-

t ivo presents, nao se faz de maneira alguma imprescindfvel uma classifica-

<;:aoexaustiva ou rigorosa das lnstituicoes.

Dada uma instituicao, 0 psicoloqo centra sua atencao na atividade

humana em que ela tem lugar e no efeito da mesma, para aqueles que nela

desenvolvem dita atividade. Para isto, irnpoe-se um minimo de intorrnacao

sobre a propria instituicao que, por exernplo, inclui:a) finalidade ou objetivo da instituicao:

b) instalacdes e procedimentos com os quais se satisfaz seu obje-

tivo;

c) situacao geogrMica e relacfies com a comunidade;

d) relacoes com outras instituicoes:

e) origem e tormacao:

f) evolucao, hlstorla, crescimento, rnudancas, f lutuacoes: suas tra-

dicfies:

g) orqanizacao e normas que a regem;

h) contingente humane que nela intervern: sua estratif icacao social e

estratificacao de tarefas;

i) avallacso dos resultados de seu funcionamento; resul tado para a

lnstituicao e para seus integrantes. Itens que a propria lnstltulcso util iza

para isto.

Circunscrito 0 ambito no qual corresponde trabal har, 0 que caracte-

riza especificamente a psicologia institucional e um enquadramento parti-

cular da tarefa; dentro do enquadramento devem se contar, em primeiro

lugar, dois principios, estritamente lnter-relacionados:

38

a) toda tarefa deve ser empreendida e compreendida em funcdo da

unidade e totalidade da instituicao:

b) 0 psicoloqo deve considerar, muito particularmente, a diferenca

entre psicologia institucional e 0 trabalho pslcoloqico em uma insti tui-

<;ao.

Em psicologia institucional, interesse-nos a insti tulcfio como tota-

lidade; podemos nos ocupar de uma parte dela , mas sempre em fun<;:aoda

totalidade. Para isto, 0 psicoloqo deduz sua tarefa de seu proprio estudo

dlaqnostico, ,~iferentemente do pslcoloqo que trabalha em uma institui-

<;ao,mas em funcdes que Ihe sao fixadas pelos diretores da mesma ou por

um corpo profissional, que nao deixou lugar para que 0 psicoloqo deduzis-

se sua tarefa de uma avaliacao propria e tecnica da insti tuicao. No primeiro

caso, 0 psicoloqo e um assessor ou consultor e , no segundo, e um empre-

gado e a tarefa que cancerne a psicologia institucional nao pode se realizar

em situacso de ernpreqado," mas sirn na de assessor ou consultor; porque

ha uma distancia otima na dependencie economice e na dependiincie

pro fissional, que e basica no manejo tecnico das situacoes, Um psicoloqo

empregado - por exemplo - para selecionar pessoal ou para aplicar testes

aos integrantes ou socios, nao realiza uma tarefa dentro do enquadramento

da psicologia insti tucional, porque a sua tarefa nao derivou de seu estudo

e diagn6stico da situacao, assim como nao foi deduzida do que em seu J U I -zo profissional realmente corresponds realizar na lnstituicao. A experien-

cia mostra, alern disto, que na lnstituicao que se estuda nao se deve ter se-

nao um s6 papel; por exemplo, nao se pode ser 0 psicoloqo institucional

em um hospital e ao mesmo tempo real izar, no mesmo lugar, uma tarefa

de outra ordem (assistencial ou didatica, por exemplo). 0 cumpri r dais

papeis diferentes no mesmo lugar implica uma superposicso e confusao

de enquadramento com situacoes que se fazern muito diHceis de avaliar e

manejar.

Ele au os assessores podem ser contratados para 0 estudo de um pro-

blema definido proposto pela propria Instituicao, sem que ele, por si so,

invalide a condicao de assessor, enquanto que 0 estudo se realize dentro da

total idade e unidade da instituicao, valorizando 0 peso e 0 significado do

problema, os motivos pelos quais foi proposto e os term os e relacoes do

mesmo.

4 - Empregado refe re-se, aqui, ao status no qual sereal izam tarefas dispostas por urn

status superior, sem haver participado na proqramacao das mesmas; em outros

termos s6 se cumprem ordens.

39

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 20/69

o realmente lrnportante e impretenvel e que a dependencia eco-

nomica do psicoloqo institucional tem que ser fixada em termos tais

que nao comprometem sua total independencip profissional; todos os

detalhes que concernem a lnclusso do psicoloqo em uma instituicao

tern que ser recolhidos por ele como Indices das caracterlsticas da ins-

tituiceo e das situacoes que devera enfrentar. A condicao de ter um sa-

lario fixo mensal e uma obriqacao no cumprimento de horarios nao in-

valida por si proprio e s6 por este fator a condicso de consultor ou as-

sessor , mas esta ultima deve ser sempre especialmente est ipulada e, de-

pois, sempre defend ida, A experiencia aconselha a fixar um horat io glo-

bal para uma primeira tarefa diagn6stica que tem que ser previamente

del imitada em sua duracao e, posteriarmente, a fixar honorarios, assim

como as horas diarias ou semanais a dedi c ar a insti tuicao, ao mesmo

tempo que a estabelecer 0 horatio e dias de trabalho, que logo tern que

se respeitar riqorosamente. Os horarios devem ser fixados em fun<;:ao

do nurnero de pessoas que VaG i ntervir na tarefa, tendo em conta 0

compute do tempo que vai se dedi c ar, fora da propria institulcao, ao

estudo do material recolhido ou a redacao de protocolos e relatorios,

Torna-se total mente inadequada, e contra-indicada, a fixa<;:aode hora-

rios em funcfo e em proporcao das utilidades que vai trazer 0 trabalho

do psicoloqo a instituicso. Nao deve ser deixado sem esclarecimentoprevio nenhum detalhe do enquadramento da tarefa; tampouco se de-

ve dar lugar a arnbiquidade ou aos subentendidos tacitos, que devem

ser sempre explicitados. Nao e tampouco util, a partir do ponto de

vista da tarefa, a real izacao de estudos diagn6sticos com 0comprornis-

so de nao cobrar ou de fixar honorarios a posteriori; isto induz geral-

mente a uma desvalorlzacao da funcao do psicoloqo ou 0 coloca na si-

tuacao de desvantagem de ter que "vender" seu assessoramento. Quan-

do assinalo que estas situacoes nao sao uteis ou sao desvantajosas, isto

se refere basicamente ao fato de que compromete a independencia pro-

fissional do psicoloqo e com isto seu manejo tecnico correto das situacdes,

Se se vai realizar uma tarefa gratuitamente, isto tarnbern deve ser exp li-

citado e nao deixar a situacao indecisa, nem menos ainda a crlterio da

instituicso.

Nunca vi como favoravel ou positivo 0 ingresso numa lnstituicao

como empregado (no sentido definido na nota de rod ape da paqina 39).

mas com a intencao secreta de "convencer" e setransformar gradualmente

em psicoloqo insti tucional da mesma. Esta atitude vicia total mente 0 en-

quadramento da tarefa.

40

Dentro do enquadramento da tarefa conta-se tarnbern 0 problema

dos objetivos do psicoloqo e da psicologia inst itucional, que devem ser

considerados cu idadosamente.

O b je ti vo s d a instituicao e o b je tivo s do psicoloqo

Cada instituicao tem seus objetivos especfficos e a sua pr6pria

orqanlzacao, com a qual tende a sat isfazer ditos objetivos. Ambos (fins e

meios) tern que ser perfeitamente conhecidos pelo ou pelos psicoloqos, co-

mo ponto de partida para decidir seuingresso como profissional na ins-

tituicao,

Toda instituicao tem objetivos explicitos tanto como objetivos im-

pllcitos ou, em outros term os, conteudos manifestos e conteudos latentes.

Estes devem ser valorizados de forma separada dos efeitos laterais que uma

instituicdo pode produzir. A criacfo de uma indust ria, por exemplo, faz-

se para produzi r - manifestamente - determinada mercadaria ou materia-

prima, mas seu conteudo latente pode ser 0 de povoar uma regiao par

razfies pollticas ou militares; e distinto do caso em que a dita industria te-nha como efeito colateral 0 enraizamento e aumento da populacao das zo-

nas vizinhas. Se bem que e certo que 0efeito colateral pode se transformar

posteriormente num conteudo latente, ate que isto ocorra 0 seu peso e

totalmente distinto. Pode ocorrer que coexistam conteudos latentes e ma-

nifestos que se equilibrem em sua qravitacfo e ate entrem em contradicao

e pode tarnbern acontecer que 0 conteudo latente ultrapasse, em sua forca,

o conteudo explici to, Assim, por exemplo (e para utilizar um muito sim-

ples), numa sala de um hospital uma situacao confli tuosa deste carater

apareceu atras do motivo da consulta, que foi formulado como uma de-

sorqanizacao cronica e desatencao da assistencia profissional aos doentes; 0

problema residia, em parte, em que a equipe profissional, formada total-

mente por gente muito jovem, tinha primordialmente propositos ou obje-

tivos de aprendizagem, nos quais se viam totalmente frustrados. 0 psico-

logo deve saber que, sempre, 0 motive de uma consulta nao eo problema e

sim um sintoma do rnesrno,

Se bem que e certo que se torna de grande util idade para 0 psicoloqo

conhecer os objetivos explfcitos de uma insti tuicao para decidir e realizar

sua tarefa profissional, nao e menos cer to que os latentes ou implicitos as

41

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 21/69

vezes so aparecem como consequencia do estudo diaqnostico que realiza

o proprio psicoloqo.

Alern do estudo destes objetivos e de sua dinarnica e consequencias,

devem tarnbern ser valorizados as finalidades ou objetivos que a lnstituicao

tem para sol icitar a colaboracao prof issional de um psicoloqo e aqui con-

tam tanto os objetivos explicitados como aqueles que formam parte das

fantasias da mstltuicao, que podem, por outra parte, ser total mente incons-

cientes. Um service hospitalar solicita 0 assessoramento de um psicoloqo,

mas entorpece total e permanentemente sua atividade; 0 exame da situacao

descobre 0 fato de que 0 interesse da instituicao reside basicamente em os-

tentar uma orqanizaclio progressiva e cientffica frente a outros servicos

hospitalares competidores, mas a atividade do psicoloqo e, na realidade,

temida.

Estes fatos nao invalidam, nao impossibili tam a fun<;ao do psicolo-

go, e sim que ja sao as circunstancias sobre as quais justamente se tem

que agir. Este deve saber que a sua participacao numa insti tuicdo promove

ansiedades de tipos e graus diferentes e que 0 manejo das rssistencias.

contradicoes e arnbiquidades forma parte, infalivelmente, de sua tarefa. E

que, alern disso, tem que contar com estas resistencias ainda na parte ou

no setor da insti tulcao que promove ou alenta a sua contratacso ou inclu-

sao. Quando 0 psicoloqo se encontra com dois bandos, um que 0 aceitae outro que 0 rejeita, deve saber que ambos sao partes de uma divisfio es-

quisoide e nao deve tomar partido de nenhum. Um clube incorporou um

conjunto de psicoloqos, aos quais ofereceu todas as possibilidades de tra-

balho, organizando para eles uma ceia de homenagem na sede social. Os

psicoloqos sao declarados em disponibilidade "casual mente" depois de

realizadas as eleicoes para renovar as autoridades integrantes da comis-

sao diretora: uma auspiciosa recepcao foi inconscientemente parte de uma

estrateqia eleitoral. 5

Para que uma instituicso solici te e aceite 0 assessoramento de um

psicoloqo enquanto psicoloqo insti tucional, a instituicdo tem que haver

chegado a um certo grau de maturidade ou insight de seus problemas ou

de sua situacao confli tuosa, mas a fun<;ao do psicoloqo conduz tarnbem a

que setome maior consciencia de sua necessidade.

Os objetivos da inst ituicao que consideramos referem-se, entao, a

dois aspectos diferentes; urn, a seus propr ios objetivos (explfcitos ou im-

5 - Nilo corresponde desenvolver, massim assinalarque foi um erro participar do

banquete tanto como aceita-lo,

42 ]

plfcitos) e outre, aos objetivos para os quais sesolicita ou aceita 0 trabalho

do psicoloqo, A isto temos agora que acrescentar a consideracjio dos obje-

tivos do proprio psicoloqo aos objetivos da psicologia institucional. Sabe-

mos que a finalidade ou 0 objetivo que se deseja alcancar orienta a a<;ao,

iormsndo parte do enquadramento da tarefa. No que concerne ao psico-

logo e seus proprios objetivos, esse deve resolver acerca de:

a) dernarcacao dos objetivos gerais ou mediatos de sua tarefa;

b) sua acel tacao ou nao dos objet ivos da instituicao e/ou dos meios

que esta utiliza para alcanca-los:

c) diaqnostico dos objetivos particulares, imediatos ou especfficos.

A demarcacao dos objetivos mediatos ou gerais da tarefa coincide

plenamente com os objetivos da psicologia insti tucional que 0 psicoloqo

deve ter perfeitamente esclarecidos e nao adm itir sobre eles nenhuma

c1assede equivocos. Em todos os casos, 0 objetivo do psicoloqo no campo

institucional e um objetivo de psico-higiene: conseguir a melhor organiza-

<;ao e as condicoes que tendem a promover saude e bem-estar dos inte-

grantes da lnstituicao. 0 psicoloqo institucional pode se definir, neste

sentido, como um tecnico da relacao interpessoal ou como um tecnico

dos vlnculos humanos e - pelo que veremos depois - pode se dizer

tambern que e 0 tecnico da explicitacdo do implicito . A ajuda a compre-

ender os problemas e todas as variaveis posslveis dos mesmos, mas eleproprio nao decide, nao resolve nem executa. 0 papel de assessor ou con-

sultor deve ser rigorosamente rnantido, deixando a solucao e execucao em

rnaos dos organismos proprios da instituicao: 0 psicoloqo nao deve ser em

nenhum caso nem um administ rador nem um diretor nem um executivo,

nem deve sobrepor-se na instituicao como um novo organismo.

o psicoloqo nao e 0profissional da allenacao nem da exploracao,

nem da submissao ou coercao, nem da desumanlzacao. 0 ser humano,

sua saude, sua inteqracjio e plenitude consti tuem 0 objetivo de seu t ra-

balho profissional, aos quais nao deve renunciar em nenhum caso. Sua

tuncao tampouco deve ser confundida coI)' la educacional, no sentido cor-

rente que tem este ultimo termo.

Um psicoloqo foi chamado para trabalhar em uma insti tuicao social

(c1ube) com os aspirantes da mesma (um grupo de menores de doze anos).

para conseguir que estes "melhorem seu comportamento"; 0 exame

diaqnostico levou a conclusao de que ate este setor derivavam-se situacfies

de conflito no corpo diretor, pelo que 0 psicoloqo levou a esclarecer a

queixa como um sintoma e a atender a verdadeira situacao confl ituosa.

De outra maneira, 0 psicoloqo teria agido como agente de coercao, como

43

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 22/69

instrumento dos adultos e como agente de manutencao de um sintoma;

e 0 psicoloqo nao deve agir nunca como agente de coercao. nem aindaI

com meios psicoloqicos. A educacso se vale aqui, fundamentalmente, da

aprendizagem (learning) que capacita a insti tulcao a enfrentar situacdes

e poder reflet ir sobre elas como primeiro passo para qualquer solucao. 0

esquema que inicialmente se oferece ao psicoloqo como causa de um pro-

blema nao e, geralmente, outra coisa senao um preconceito.

o segundo ponte, 0 da aceitacao por parte do psicoloqo dos objeti-

vos da lnsti tulcao, coloca problema

4profissionais e eticos de primeira

magnitude e da maier gravidade. Em primeiro luqar, nao se deve aceitar

em nenhum caso 0 trabalho numa insti tuicao com cujos objetivos 0 psi-

coloqo nao esteja de acordo ou entre em conflito; seja com os objetivos

ou seja com os meios que a institulcao tem para leva-los a cabo. Em

psicologia, a etice coincide com a tecnice ou, melhor dito , a etica forma

parte do enquadramento da tarefa, ja que nenhuma tarefa pode ser levada

a cabo corretamente se 0 psicoloqo rejeita a instituicao (se]a em seus obje-

tivos ou em seus meios ou procedimentos). Se um psicoloqo, por exemplo,

e chamado para cumprir suas funcdes numa insti tuicao cooperativa, este

nao deve acei tar a tarefa se rejeita (por qualquer motivo) 0 movimento

cooperativista. Em segundo lugar, tampouco pode 0 psicoloqo aceitar uma

tarefa profissional se esta demasiado inclufdo ou participa na orqanizacsoou no movimento ideoloqico da insti tuicao: uma afinidade ou identidade

ideol6gica nao deve, no entanto, ser tom ada em si mesma como uma

contra-indicacao absoluta, e a decisao depende da capacidade do psicoloqo

para estabelecer uma certa dlstancia operative e instrumental em seu tra-

balho profissional, de tal maneira que, dentro deste, possa trabalhar como

psicoloqo e nao como proseliti sta ou politico (em qualquer dos sentidos

deste termo). Nao esta vedada ao psicoloqo uma intervencao ativa em qual-

quer movimento ideol6gico ou poli tico, mas neste caso nao atua profi s-

sionalmente neste setor. Deve-se entender claramente que 0 pslcoloqo nao

tem por que se exigi r neutral idade nem passivldade, mas, si rn, tem que se

exigir em sua tarefa profissional um enquadramento que Ihe permi ta tra-

balhar e operar como psicoloqo.

Em terceiro lugar, 0 psicoloqo nao pode nem deve aceitar trabalho

em qualquer insti tuicfio a qual rejeita , com 0 animo oculto de torcer seus

objetivos ou seus procedimentos.

Em quarto termo - e nao menos importante - conta-se 0 fato de

que aceitar 0 trabalho, aceitando os objetivos de uma instituicso, significa

somente uma condicao para 0 enquadramento de sua tarefa, mas os obje-

44

t ivos da instituicio nao sao seus objetivos profissionais. 0 psicoloqo tem

obietivosaos quais nao deve renunciar em nenhum caso.

Os objetivos particulares, imediatos ou especfficos se referem a

aspectos do problema central, mas estudados e manejados em funcao da

unidade e totalidade da inst itulcso. 0 psicoloqo nao pode trabalhar com

todos os integrantes ou todos os organismos da insti tuicao ao rnesrno tem-

po nem tampouco isto e de desejar; por isso, devem-se examinar os "pon-

tos de urqencia" sobre os quais intervir como objet ivos imediatos. Este

esclarecimento sobre os objetivos diferencia nitidamente, ja desde 0 pon-

to de partida, 0 psicoloqo trablhando em uma insti tuicfio do psicoloqo

trabalhando no ambito da psicologia institucional, 0 primeiro realiza uma

tarefa que se Ihe encomenda realizar; 0 segundo diagnostica a situacso e se

propde agir sobre os nfveis ou fatores que detecta como sendo realmente

de necessidade para a instituicao. 0 primeiro serve, com frequencia. de

fator tranqiiil izante ("ha um psicoloqo trabalhando"], enquanto que 0 se-

gundo nao ace ita dito papel e e, basicamente, um agente de rnudanca,

o primeiro e um empregado; 0segundo e um assessor ou consultor com

total independsncia profissional.

Como e facil entender, os objetivos mediatos tampouco sao fixos ou

im6veis e sirn que podem e devem mudar a medida que se desenvolve a

tare fa.

Metodo do trabalho institucional

E possfvel que se possam enumerar distintos rnetodos ou diferentes

procedimentos e enquadramentos para 0 trabalho em psicologia institu-

clonal, Aqui desenvolvemos 0 que cremos mais de acordo com nossos obje-

tivos e descartamos tudo 0 que possa significar uma obrigac;:ao, exigencia

ou urgencia em obter resultados praticos imediatos, no sentido de que nao

interessa desenvolver um empirismo com certas tecnicas ou regras estereo-

tipadas que nos distanciam dos fins que perseguimos: os da psico-higiene.

Descartamos igualmente toda contaminacao messianica de instituir 0 psi-

coloqo e a psicologia como "salvadores" de qualquer especie.

Por sua vez, vemos como irnpreterfvel 0 fato de que 0 objetivo ou

finalidade que fixamos para a psicologia insti tucional seja realizado com

o carater de uma invest iqacao cient ffica submetida a um rnetodo que de-

45

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 23/69

vemos conseguir que seja progressivamente mais rigoroso. 0 objetivo que

queremos alcancar e para 0 qual tendemos formar parte do enquadramento

da tarefa e 0 meio de alcanca-Io e atraves da investiqacfio . Nao setrata, em

psicologia institucional, de um campo no qual ha que "aplicar" a psicolo-

gia , mas sim de um campo no qual ha que investigar os fenornenos psicolo-

gicos que nele tern lugar. Nenhuma invest iqacao pode ser realizada sem

objetivos - explicitos ou implfci tos -, mas os objetivos constituem parte

do enquadramento, uma especie de tela ~ fundo e, a rigor, temos que nos

ater estritamente a propria investiqacso.

a trabalho em psicologia insti tucional requer ainda uma investiga-

c;:aomais ampla e profunda que a realizada ate agora, que nos permita

configurar mais claramente as tecnicas e criterios a empregar, tanto como 0

carater do problema que temos que enfrentar.

Todos os nossos objetivos, 0 da tarefa e 0 da lnvestiqacao Iinvestiqacao

de fatos e tecnlcas) s6 podem ser abarcados, em nosso entender, com a

utilizacao do metodo clinico. Desta maneira, 0 que vamos desenvolver aqui

pode-se resumir, dizendo que se refere fundamentalmente ao emprego do

rnetodo chnico no ambito da psicologia insti tucional e dentro do metoda

clfnico guiamo-nos pela sistematica do enquadramento introduzido pela

tecnica psicanallt ica, adaptado as necessidades deste ambito e aos proble-

mas que aqui temos que enfrentar.Sem animo de explicar aqui 0 metoda clfnico, recordemos que 0

mesmo se caracteriza por uma observacao detalhada, cuidadosa e comple-

ta, realizada em um enquadramento rigoroso; este enquadramento pode-se

definir como 0 conjunto das condicoes nas quais se realiza a observacao e

constitui uma f ixacao de varlaveis ou - dito de outra maneira - uma eli-

minacfo de parte das variaveis ou uma lirnitacso das mesmas, ou a Iixacao

de um conjunto de constantes, que tanto nos serve como meio de padro-

nizacao como de sistema de reterencla do observado. Seria aqui muito inte-

ressante e importante poder estabelecer as sernelhancas, diferencas e rela-

c; :5esdo metodo cl fnico com os chamados metodos ou procedimentos

epidemiol6gicos.

a modele do enquadramento psicanahtico se estende a rnoda-

lidade da observacao que se leva a cabo, que nao consiste somente num

registro . cuidadoso, detalhado e completo dos acontecimentos, mas sim

numa indaga(:iio operativa, cujos passos podem se sistematizar as-

sirn:

a) observacao de acontecimentos e seus detalhes, com a continuida-

de ou sucessao em que os mesmos se dao;

46

b) cornpreensao do significado dos acontecimentos e da forma como

eles se relacionam ou integram;

c) inclui r os resultados de dita cornpreensao, no momento oportu-

no, em forma de interpretacao, assinalamento ou retlexao:

d) considerar 0passe anterior como uma hipotese que, ao ser emi-

tida, inclui-se como uma nova variavel, e 0 registro de seu efeito - tal co-

mo no passe (a) - leva a uma verificacdo, ratificacao, correcao, enrique-

cimento da hipotess ou a uma nova; com isto, volta-se a reiniciar 0 proces-

so no passo (a), com uma interacao permanente entre observacao, compre-

ensao e ac;:ao.

a mais importante que ocorre e que nao somente podem se escla-

recer e corrigir problemas e sltuacoes, mas sim que gradualmente tem

lugar urna meta-aprendizagem que consiste em que as implicados na ta-

refa aprendern a observar e refletir sobre os acontecimentos e a encontrar

seu sentido, seus efeitos e integrac;:5es.Para a proprio psicoloqo nao se tra-

ta de uma "apt icacao" da psicologia - que conduz rapidamente a estereo-

tipos -, mas sim a de uma conjuncao de Sua condlcao de profissional e

investiqador. A investiqacao .r.odiflca 0 investigador e a objeto de estudo,

o que, por sua vez, e investigado na nova condicao modificada. Com isso,

da-se uma praxis na qual 0 investigar e, ao mesmo tempo, operar e 0

agir se torna uma experiencia enriquecedora e enriquecida com a retlexfioe a compreensao,

Tecnicas do enquadramento

Uma vez caracter izado a metoda a seguir (incluidos os cri terios de-

rivados do objetivo da tareta) , que consta fundamentalmente de um enqua-

dramento rigoroso e de uma observacao operativa, faz-se agora necessario

fixar a tecnica do enquadramento, quer dizer, 0 conjunto de operacoes e

condicdes que conduzsrn a estabelecer a enquadramento e que constituem

tarnbern uma parte do mesmo. J a expostos 0 criterlo e a teoria que sus-

tentam a enquadramento que desejamos, podemos expor sua tecnica em

forma de regras que comentaremos suscintamente.

a) A primeira condtcao do enquadramento se refere ao proprio psi -

coloqo, que deve cumprir com que chamaremos de atitude clfnica, que

consiste no manejo de um certo grau de dissoclacao inst rumental que Ihe

47

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 24/69

permita, por urn lade, identificar-se com os acontecimentos ou pessoas,

mas que, por outro lade, Ihe possibilite manter com eles uma certa distan-

cia que faca com que nao se veja pessoalmente implicado nos acontecimen-

tos que devem ser estudados e que seu papel especifico nao seja abandons-

do, A atitude chnica forma parte do papel do psicoloqo e 0 mante-lo

permanentemente em sua tarefa e uma das exigencias fundamentais do

enquadramento.

b) Estabelecimento de relac;:oes.xpllcitas e claras em tud~ 0 _qu~

corresponde a tuncao profissional e que abarca 0 tempo de dedicacao a

tarefa, honorarios, dependencia aconomica e independencia profissional,

de tal maneira que ha de se constituir num assessor ou consultor e nao

num empregado.

c) Esclarecimento do carater da tarefa profissional a se realizer, elu-

dindo tota l mente 0 ver-se comprometido com exigencias (explfcitas ou

lmplicitas) que nao se possam cumprir ou que estao fora da tarefa profis-

sional.

d) Realizar uma tarefa de esclarecimento sabre a carater da tarefa

profissional em todos os grupos, secedes ou niveis nos quais se deseje aqir,

alcancando a aceitar;ao explfcita do profissional e da tarefa. Dita aceita-

c;:ao d eve nao so ser explfcita como tarnbern l ivre, sem coercao e derivada

exclusivamente do esclarec imento correspondente, e nao realizar nenhumatarefa com aque les grupos, secoes au nfveis da instituicao que nao manifes-

tam a aceitaciio correspondente. 0 tempo que isto custa nao deve ser con-

siderado como tempo perdido, mas sim urn tempo no qual ja se esta cum-

prindo parte da tarefa, atraves do esclarecimento e da inforrnacfo ampla e

detalhada, mas recolhendo elementos de observacao sobre as caracterfs-

ticas do grupo, sec;:ao ou nfvel e de suas tensfies, conflitos, tipos de comu-

nlcacao, liderancas, etc.

e) Estabelecer em forma pratica, definida e clara 0 carater da infor-

macae dos resultados, tanto como os grupos e pessoas a quem sera dirigida

dita intorrnacao e as situaebes em que dita inforrnaeao sera submetida; que

nao deve ser nunca fora do contexto institucional nem fora da tarefa pro-

fissional. Nao admitir imposicdes nem suqestfies sabre urn parcelamento

da lntorrnacao,

f) Segredo profissional e lealdade estritamente observadas, no sen-

tide de que 0 que corresponde a cada grupo, secso ou nfvel nao sera trata-

do sendo com ele ou eles de forma exclusiva. Tratar em forma aberta e

franca tudo aquilo que possa transcender e tudo aquilo sobre 0 qual a

pessoa, 0 grupo ou os nlveis implicados desejem ou acedam que trans-

48

cenda, respeitando totalmente suas decisoes: urn relat6rio psicoloqico nao

deve ser apresentado enquanto tudo 0 que em dito relatorio possa constar

nao tenha sido previamente submetido a elaboracao do grupo ou da secao

de que se trate. Todo relatorio ou interpretacso deve respeitar 0 "ritmo"

(timing) da elaboracao dos dados. De nenhuma rnaneira.a dependencia eco-

nornica obriga a apresentar dito relatorio aos dirigentes de uma institui-

c;:aose 0 grupo a que concerne dito relatorio se opoe a isto. Se 0 psicoloqo

esta obrigado ou comprometido a apresentar dito relatorio a outros seto-

res da instituicao, deve faze-to sabendo antes de comecar a trabalhar com

urn grupo ou com uma secso,

g) Limitar os contatos extra-profissionais ao mlnimo ou, no pos-

sfvel, excluf-los totalmente; no caso de que ditos contatos nao possam ser

eludidos ou excluidos, eles nao devem implicar nenhuma lnformacao

nem nenhum comentario sobre a tarefa ou 0 curso da mesma . 0manejo

da intormecso nao e so um prob lema etico, mas sim, ao mesmo tempo, um

instrumento tecnico.

h) Ser abstinente e nao tomar partido profissionalmente por nenhum

se tor nem posicso da instituicao,

i) Limitar-se ao assessoramento e a atividade profissional, nao assu-

mindo nenhuma func;:ao diretora, administrativa nem executiva. 0 psico-

logo nao dirige, nao educa, nao decide, nao executa decisoes: ajuda a com-preender os problemas que existem e ajuda a problematizar as situacoes.

Nao transformar uma Instituicdo em uma clfni ca de conduts. Nao tratar

problemas pessoais de forma individual au grupal. Centrar 0 trabalho psi-

col6gico na tarefa ou funr;ao que se realiza e em como se a realiza.

j) 0 psicoloqo deve compartilhar responsabilidades na parte em que

as efeitos de uma medida ou de uma rnudanca dependam de seu assesso-

ramento e de sua atuacdo, mas nao deve assumir responsabi lidades alheias .

k) Nao formar superestruturas que desgostem ou se sobreponham

com as autoridades ou IIderes da orqanizacao formal au informal da ins-

tituicao, Tomar em conta a parte em que as autoridades de uma institui-

c;:ao sintam-se afetadas au menosprezadas por ter que recorrer a outro pro-

fissional.

I) Nao fomentar a dependencia psicoloqica ( int ra au intergrupal) ,

mas sim todo 0 contrario: ajudar a resolve-fa.

m) Estrito controle e tlmttacao da inforrnecao, no sentido de que a

mesma nao ultrapasse 0 que real mente se conhece au deduz cientificamen-

teo Neste sentido, um criteria fundamental e 0 do controle dos traces da

propria onipotencia, em nao agir nem admitir a aureola de mago nem de

49

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 25/69

"pode-tudo", A func;:ao e a de um estudo cienti'fico dos problemas para

transmitir 0 conhecido num dado momento.

n) Nao tomar como fndice de avaliacso da tarefa profissional 0 pro-

gresso da lnstltuicao em seus objetivos e sim 0 grau de "cornpreensao"

(insight). de "independencia e de rnelhoramesto 'das relac;:5es;quer dizer, 0

progresso nos objetivos da psicologia institucional.

0) A (mica forma de operar e atraves da subminlstracso de informa-

c;:ao.A operatividade da mesma nao so depende de seu grau de veracidade

como tarnbern do timing (momento em que e dada) e de sua quantif ica-

c;:ao(graduac;:aoda mesma). Em ultima lnstancia , nao se trata de informar

e sim de fazer compreender os fatores em jogo; em outros termos, da

tomada de insight.

p) 0 psicoloqo deve contar sempre com a presenca de resistencia

(explkita ou irnplfcital , a inda que da parte daqueles que manifestamente

o acei tam. 0 investigar a resistencia forma parte fundamental da tarefa

profissional e, ao investiqa-la, 0 psicoloqo constitui-se infalivelmente e so

por este fato em um agente de rnudanca, que pode incrementar ou promo-

ver rssistencias.

q) Uma lnstl tuicao nao deve ser considerada sadia ou normal" quan-

do nela nao existem conflitos, e sim quando a lnstituicao pode estar em

condicoes de explicitar seus conflitos e possuir os meios ou a possibilidadede arbitrar medidas para sua resolucao,

r) Nao aceitar prazos fixos para tarefas e resul tados, e sim somente

para 0 caso de um relatorio diaqnostico. Nao aceitar tampouco exigencias

de solucoes urgentes (que sao svasoes do insight).

Inserc;ao do psicoloqo na instituicao

Os contatos e as relacoes que 0 profissional toma com a instituicao

constituem, desde 0 primeiro momento, 0 material que 0 psicoloqo deve

recolher e avaliar. Isto Ihe dara a possibil idade de conhecer, ja desde 0

corneco, tanto si tuacoes vitai s da instituicao como os fatores negativos e

6 - as termos "saude ou normalidade", sao , mais adiante, subst itu idos pela expras-

sao "grau de dinarnica", que entendemos mais adequada para nos refer irmos a estes

conceitos, ao tratar de instltuicoes.

50

posit ivos que tera que enfrentar, ja que a forma como a instituicao se

relaciona com 0 psicoloqo e um indice do grau de insight de seus pro-

blemas, das defesas e resistencias frente aos mesmos, dos esforcos e

direcdes em que se tentou a solucao ou encobrimento ate este momento.

Convern que 0 psicoloqo tome nota e escreva cuidadosamente todos

os detalhes dos primeiros contatos e das primeiras entrevistas, porque 0 es-

tudo deste protocolo e ainda sua mera redacao darjio a oportunidade de

avaliar melhor e levar em conta detalhes que passam faci lmente inadver-

tidos, mas que sao significativos: tudo isto tara com que 0 psicoloqo possa

organizar melhor os passos sucessivos que tem que dar. Quanto melhor se

maneje 0 metoda cl inico e seus instrumentos, quanto mais seguro se sin-

ta no estabelecimento do enquadramento, tanto melhor 0 psicoloqo

podera tratar com as distintas alternativas de sua insercso no campo de

trabalho, que segue sendo sempre uma etapa dificil e, ao mesmo tempo,

uma etapa geralmente decisiva de todo 0 enquadramento posterior. A par-

tir deste ponto de vista convern, pelo menos nas primeiras etapas da tare-

fa, solicitar a supervisso de um colega que, pelo mero fato de estar fora

ou nao estar tao comprometido na situacso. podera sempre resultar de

grande util idade.

Os primeiros contatos que 0 psicoloqo estabelece com a insti tui-

<;:aodevem levar 0 proposito definido de estabelecer 0 enquadramento datarefa, 0 conhecimento das ansiedades frente a mudanca (intensidade e

qualidade, mecanismos de defesa), 0 grau de aceitacao ou rejei<; :aodo

psicoloqo, as dissociacoes entre grupos que aceitam e outros que rejeitam,

as fantasias que se projetam sobre 0 psicoloqo, 0 grau de realidade e ade-

quacao das espectativas, etc. Todos os primeiros contatos jii conduzem

a uma impressao preliminar de carater diaqnostico, para 0 qual se deve

conhecer tarnbem a hlstoria da instituicao e - pelo menos - os grandes li-

neamentos de suas caracterfsticas.

"Grau de dinamica" da instituicao?

o melhor "grau de dinarnica" de uma lnstitulcao nao e dado pela

ausencia de conflitos, mas sim pela possibilidade de explicita-los, rnaneja-

I - Ver nota de rodape da paqina 50.

51

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 26/69

los e resolve-los dentro do limite institucional, quer dizer, pelo grau em

que sao realmente assumidos por seus atores e interessados no curso de

suas tarefas ou funcbes, 0 confl ito e um elemergo normal e imprescindi-

vel no desenvolvimento e em qualquer manifestacao humana: a patologia

do conflito se relaciona, mais do que com a existencia do proprio confli to ,

com a ausencia dos recursos necessaries para resolve-los ou dlnamiza-Ios.

A estereotipia e uma das defesas insti tucionais frente ao conflito,

mas se transforma, assim mesmo, em um problema atras do qual e necessa-

rio encontrar as conflitos que se aludem au evitam. 0 "desideratum"

do psic6logo nao e conseguir uma ausencia de conflitos nem de tentar uma

conclllacao entre os termos dos mesmos; e ainda no caso da estereot ipia,

sua funr;:ao e a de mobiliza-los, quer dizer, conseguir que os conflitos se

manifestem.

o pslcoloqo e - seja por sua mera presence - um agente de rnudanca

e um catal izador ou deposita rio de conflitos e, por isso, as forcas operantes

na instltuiciio vao agir no sentido de anular ou amortizar suas funcdes e sua

ar;:ao;uma das modalidades mais comuns em que isto setenta ou seconse-

gue e a de enquistar 0 psicoloqo em alguma atividade estereotipada, com

o que se consegue um efeito rnaqico, tranquilizador ("ha um psicoloqo")

ao mesmo tempo em que se alude sua ar;:aoou se 0 imobiliza. Par isso, 0

grau e a forma de aceitacdo e rejei r;:aodo psicoloqo sao indices do grau dedinarnlca da lnsti tulcao. Em outros casas, se anula sua funr;:ao profissio-

nal, envoivenda e comprometendo pessoalmente a pslcoloqo em algum dos

conflitos ou dos grupos controvertidos ou com uma densa rede de

rumores. Em todos as casas, a funr;:aodo psicoloqo e a de reconhecer to-

dos estes mecanismos e nao agir em funr;:ao deles, mas sim agir sabre eles,

tratando de rnodifica-los.

Por tudo isso, convern que 0 psicoloqo ou a equipe institucional nao

pertenca a lnsti tulcao, senao pelo mero e unico ligamento profissional de

assessor au consultor no sentido mais estri to; isso perrnltira ou facil itara,

em certa medida, que a psicoloqo conserve certa dlstancia para nao assumir

os papeis que se projetam nele. Em psicologia insti tucional e impossivel

agir em dois papeis ao mesmo tempo; como assessor e como membra in-

tegrante da instltuicao, Assim, por exemplo, numa escola nao convern

que se aja como psicoloqo institucional ao mesmo tempo que como pro-

fessor da equipe docente.

o enquadramento rigoroso da tarefa significa converter 0 maior

nurnero possivel de variavels em constantes, de tal maneira que 0 trabalho

se realize dent ro de certos l imites fixos que dao maior sequranca e servem

52

de esquema referencial. Este enquadrarnento eo que n~o pode ser mantido

com dois papeis dist intos da mesma pessoa. Ouanto mais baixo for 0 grau

de dinamica em que se encontra a insti tuicdo, mais se vera atacado 0 en-

quadramento do psicoloqo e mais fatos ocorrerao que tratam de compro-

meter 0 psicoloqo como pessoae nao como profissional, Um indice ainda

mais baixo se encontra no caso em que 0 enquadramento se vi!atacado de

maneira latente, totalmente dissociada das expressdes manifestas.

Para que uma insti tuicao recorra ao psicoloqo insti tucional requer

chegar a ter um certo grau de insight de seus confli tos ou de que "algo esta

acontecendo". Quando isto nao existe , 0 psicoloqo deve desistir de todoestorco para se incluir na mesma como consultor ou assessor. Um rmnimo

de insight e colaboracao se torna indispensavel para uma aceitacao ativa do

psicoloqo (ainda sendo esta aceitacao constraditorla) e se nao h a uma acei-

tar;:ao ativa e que nao se dao as condicfies minimas para que 0 psicoloqo

trabalhe nela, pelo menos com as instrumentos, enquadramentos e objeti-

voscom que a fazemos no presente.

o t ipo de motivacao que se da para solicitar ou aceitar 0 psicoloqo

deve ser um dos primei ros fata s que temque ser submetido a uma anal ise

rigorosa, porque geralmente s6 e um sintoma e nao 0 proprio conflito.

Desde a corneco podem se apresentar conflitos, problemas au dilemas.

No confli to, se apresentam forcas cont rover tidas em interjogo e,

geralmente, 0 confli to de que se queixa encobre as verdadeiros confli tos

ou os problemas que nao so se acham deslocados, assim, em seus objetos

como tarnbern podem estar nos niveis de estratl ftcacao da- instl tuicdo: a

conflito de um nivel se acusa em outro. No problema, se apresentam varia-

veis au disjunt ivas de uma situacao que requerem ser orientadas e di rigi -

das em alguma dlrecao: quando grupos distintos assumem as diferentes

orientacdes (as encarnam), 0 problema se transform a em conflito. No

dilema, se colocam opcoes l rreconcil laveis que deixaram de estar dina-

rnicamente em interjogo, como no cas a do conflito, e ja nao existe ne-

nhurna interacao e sim somente a possibilidade de ellminacfio. 0 dilema

l! a forma defensiva extrema dos problemas au conflitos. .

No problema deve-se resolver au confirmar se se trata realmentede um problema ou de um pseudoproblema. Assirn, em um hospital se

pediu a colaboraeao de psicoloqos para conseguir que os pacientes pudes-

sam descansar melhor e transcorrer 0 dia de forma mais tranqUila . Trata-

va-se de uma sala de cirurgia na qual existia um alto indice de complica-

( ,:oespos-operatorlas de indole pslqulatr lca que nao se justificavam pelo

t ipo e qual idade de assistencia medica que ali se prestava. Chegou-se a

53

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 27/69

conclusao de que este "problema" era so um sintoma - e, portanto,

nao um problema - e que 0 problema residia em um mau manejo da rela-

<;:ao do corpo medico com os familiares dos pacientes; isto promovia situa-

«;:oes d e extrema ansiedade nos familiares, que 1e "canalizavam" nos pa-

cientes,

Os dilemas constituem (ndtces de mau progn6stico ou (ndice de uma

tarefa muito ardua que 0 psicoloqo tem que realizar porque encobre, em

ultima instancia, situacdes de muita confusso e arnbiquldade, 0 fator mais

perturbador e mais diHcil de manejar nao e 0 confl ito e s im a arnbiquidade

. que age como um amortizador ou "des-desenhador" dos conflitos. Parapoder trabalhar, se requer transformar a arnbiquidade em conflito e os con-

fli tos em problemas.

Igualmente se pode prognosticar uma tarefa muito diflcil se os

conflitos recaem sobre objetos muito personificados individualmente ou

se os tende a referir como estritos conflitos individuais; da mesma forma,

quando se tende reiteradamente a resolver um conflito com a seqreqacao

ou etiminacao de um ou de varies indivfduos. Neste ultimo caso, 0 psicolo-

go deve prever que se canallzarao nele os conflitos e que se tentara "resol-

ve-los" segregando 0 psicoloqo da instituicao, quando a segrega<;:ao se con-

verteu na forma automatica de "resolver " conf litos e problemas.

Poder-se-ia levar ainda mais adiante a diferenc;:a ou a classiflcacao

dos conflitos, em individuals, intergrupais, de nfveis ou status, de tarefas,

ideol6gicos, de estrateqia institucional, etc., mas ainda nao temos suficien-

tes conhecimentos nem experiencia para isto.

Psicologia das instituicoes

o problema das relacoes entre indivlduo e sociedade, indivfduo e

instituicoes, se acha tao impregnado de distorcoes que se torna imprescin-

dlvel comecar esclarecendo alguns dos pressupostos au preconceitos que,por estarem difundidos em alto grau, se poem de imediato em jogo en-

quanto se faz 0 anuncio do tema.

Por psicologia das instituicdes nao deve se en t ender a origem psicol6-

gica das instituic;:6es sociais; nem tampouco se afirma 0 carater subjetivo

delas ou se nega 0 carater objetivo das mesmas, suje itas a le is da estrutura

soc ia l e econornica da sociedade. Por psicologia das instituicdes se entende

54

o estudo dos fatores psicoloqicos que se acham em jogo na lnstitulcao, pelo

mere fato de que nela participam seres humanos e pelo fato da rnediaeao

imprescind Ive l do ser humane para que ditas instituicdes existam.

Toda a vida dos seres humanos transcorre em instituicdes, mas nao

nos interessa aqui sublinhar ou estudar 0 papel das mesmas na estrutura-

<;:ao da personalidade do curso do desenvolvimento do indivlduo, tema que

se encontrara com facilidade exposto numa copiosa bibliogra fia ; tarnpouco

nos interessa aqui a origem e a estrutura das instituicdes em relacao com os

processos baslcos de producso, distribulcao da riqueza e controle do com-

portamento dos seres humanos, que corresponde a outra dire«;:ao que aque aqui queremos apresentar. Inter essa -nos agora a dinarnica psicol6gica

que tem lugar quanto ao fato de que cada indivlduo tem sua personalidade

comprometida nas instituicdes sociais e se conduz com respeito as mesmas

em qualidade de precipitados de retacoes humanas e em qualidade de depo-

s itarias de par tes de sua propria personalidade.

A instituicfo forma parte da orqanizacao "sujeitiva" da personalida-

de", de tal maneira que em certos setores da personalidade, poder-se-ia

dizer, 0 esquema corporal inc lui a lnstltulcao ou parte dela, ou vice-ver sa.

o ser humane encontra nas distintas instituicoes um suporte e um

apoio, um elemento de sequranca, de identidade e de insercso social ou

pertenca, A partir do ponto de vista psicoloqico, a instituicao forma parte

de sua personalidade e na medida em que isto ocorre, tanto como a forma

em que isto se da, configuram distintos significados e valores da institui-

c;:ao para os distintos indivfduos ou grupos que a ela pertencem. Quanto

mais integrada a personalidade, menos depende do suporte que Ihe presta

uma dada lnstltulcao: quanto mais imatura, mais dependente e a relac;:ao

com a instituicao e tanto mais diHcil toda rnudanca da mesma ou toda se-

paracao dela. Desta maneira, toda instituicao nao e s6 um instrumento de

orqanizacao, requlacao e controle social, mas tambem, ao mesmo tempo,

e um instrumento de regula9ao e de equilibria da personalidade e, da mes-

ma maneira que a personalidade tem organizadas dinamicamente suas defe-

sas, parte destas se acham cristalizadas nas institulcoes: nas mesmas se dao

os processos de reparacao tanto como os de defesa contra as ansiedadespsicoticas (no sentido que M. Klein da a este terrno), Desta maneira, se

bem que a instltulcao tenha uma axistencla propria externa e independente

8 - Apresentamos a diferenca entre subjetivo e "sujeitivo" noApfmdice ePsic%gia

Concrete, de Politzer. 0 "sujeitivo" se refere ao sujeito; 0 subjetivo, aumsparte do

sujeito.

55

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 28/69

dos seres humanos individual mente considerados, seu funcionamento se

acha regulado nao so pelas leis objetivas de sua propria realidade social ,

como tambern pelo que os seres humanos prcJtetam nela (pelas leis da

dinamica da personal idade).

Um dos primeiros problemas que aparecem neste sentido e que a

instituicao pode se ver enormemente limitada em sua capacidade de ofe-

recer seouranca. qratlflcacso, possibilidade de reparacso e desenvolvimento

eficiente da personalidade. Inclusive, esta tlmltacao pode se tornar , em um

dado momento, ou em algumas instituicoes, em uma verdadei ra fonte de

.empobrecimento e estereotipia do ser humano. Este ultimo se deve - apartir do ponto de vista psicoloqlco - ao fato de que estso atuando na ins-

t ituicfo as ansiedades psicoticas dos seres humanos ou a que a instituicso

se converteu, predominantemente, em um sistema externo de controle des-

tas mesmas ansiedades. 0 que os psicoloqos temos que obter e que a tarefa

que se realiza em uma instltuicao sirva de meio de enriquecimento e de-

senvolvimento da personal idade: esta aqui - em ult ima instancia - o obje-

tivo basico da psicologia institucional.

Aqui corresponde um novo esclarecimento que salve as possibil ida-

des de cornpreender 0 exposto no sentido que pode oferecer 0 psicologis-

mo. Uma fonte de infelic idade e distorsao psicoloqica dos seres humanos

na insti tuicao se baseia na estrutura alienada das insti tuicoes, relacionada

com a mesma estrutura alienada de todo 0 sistema de producao e distr i-

bulcao da riqueza. Sobre esta mesma base se dao as caracterlsticas da alie-

nac;:aodos seres humanos. 0 que queremos investigar e desenvolver e esta

ac;:aoreclproca dos seres humanos sobre as lnsti tuicoes porque este escla-

recimento e parte da passagem de uma falsa consciencia a uma maior

consciencla da realidade. Uma rnudanca institucional radical deixa, todavia,

grande l iberdade para que nela se jogue de todas as maneiras 0 que os ho-

mens projetam nas insti tuicoes, 0 que interessa e a discrlrninacao entre 0

funcionamento e os objetivos reais de uma instituicso e as satisfacdes e

compensacoes (normais e neurottcas) que os seres humanos obtem nelas.

Temos provas de que os seres humanos nao mudam mecanica e imediata-

mente sua estrutura psicoloqica pelo fato de uma rnudanca insti tucionalradical e que - inclusive - levam a estas ultimas suas caracterlst icas psico-

logicas anteriores, comprometendo ou retardando a mudanca total das ins-

tituicdes. Os processos psicoloqicos formam parte da realidade, da mesma

manei ra que as instltuicoes e os objetos da natureza e nao e posslvel con-

seguir uma rnodificacso radical, senao tarnbern com um conhecimento

de suas leis peculiares. Pela interdependencia dos tenornenos, uma rnudan-

56

ca parcial se acompanha sempre de uma rnudanca da totalidade, mas 0

impedimento em uma de suas subestruturas significa tarnbern um irnpedi-

mento no sistema total . Uma sociedade alienada 0 e por sua estrutura to-

tal, mas, dentro desta ultima, se deve contar tambern como parte a orga-

nizacao psicoloqica dos seres humanos. Nao temos nenhum contato -

por outra parte - com todas as posicoes que tentam uma modificacfio psi -

col6gica com 0 unico objetivo de pretender uma persistencia e manutencao

de um mundo humane alienado, com manutencao das prerrogat ivas das

classes poderosas nem tampouco com a intencso mistif icadora com que se

emprega a psicologia nas assim chamadas human relations.Uma mudanca insti tucional nao pode conseguir um "salto" da estru-

tura psicoloqica dos seres humanos e, por outra parte, uma rnudanca ins-

titucional radical so pode se dar com uma certa consciencia previa, quer

dizer, com uma certa mudanca previa da est rutura psicol6gica. 0 que nos

interessa e tudo 0 que os seres humanos se esforcam por nao mudar as

insti tuicdes, em bora, por outro lado e ao mesmo tempo, se esforcem par

rnudalas, par considera-Ias inadequadas ou insatisfatorias, Enos interessa

tarnbern muito na medida em que indivlduos alienados, submetidos a

instl tuicdes alienadas, se retorcarn em um circulo de resistencia a rnudan-

ca , As coisas tern torca porque nelas estao alienadas torcas dos seres burna-

nos. As insti tuicdes se tornam depositaries e sistemas de defesas ou contro-

Ie frente as ansiedades psicoticas e nao s6 cumprem dita func;:aoas institui-

c; :oese sim tarnbern, em igual medida,a cumpre a imagem que 0 homem

tem de si mesmo e de suas insti tuicoes.

Toda instituicao e 0 meio pelo qual os seres humanos podem se en-

riquecer au se empobrecere se esvaziar como seres humanos; 0 que cornu-

mente se chama de adaptacao e a subrnlssao a alienacao e a subrnlssao a

estereotipia insti tucional. Adaptacao nao e 0 mesmo que inteqracso: na

primeira se exige do indivfduo sua homoqenelzacao maxima, na segunda

o individuo se insere com um papel em um meio heteroqeneo que fun-

ciona de maneira unitaria, Evidentemente, se confunde com muita facil i-

dade a lnteqracao com a aqlutlnacso de grupos e instituicoes homogeneiza-

das com individuos despersonalizados.Todas as instltuicdes tendem a reter e formalizar seus membros a

uma estereotipia espontanea e facilmente contagiosa. Esta homogeneidade

se cumpre de acordo com as est rat ificacdes de mando, de tal maneira que

ao status superior se veja facili tada a tarefa de mando. Esta e a razjio pela

qual os conflitos dos est ratos superiores se canalizam e agem nos nlveis

inferiores; como sempre, 0 fio se corta pelo mais fino e 0 mais fino e aqui

57

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 29/69

o estrato mais homogeneizado e ambfguo; em outros term os, 0 mais de-

pendente (0 mais desumanizado ou esvazsado]. "0 homem pertence a

instituicao ". Esta aqui a ordem que deve ser mudada pela de "a insti tuicao

pertence ao homem". E isto nao pode ser conseguido unicamente com a

psicologia. Mas tampouco pode ser conseguido sem ela.

As orqanizacoes insti tucionais tendem a ser depositarias das partes

mais imaturas da personalidade, juntamente no enquadramento do funcio-

namento das mesmas, quer dizer, nas funcoes ou formas mais estereotipa-

das. Por lsso, estas ultirnas sao as que oferecern a maxima resistencia a

rnudanca porque esta significa, ao mesmo tempo que uma mudanca na ins-tttulcao, uma rnudanca na personalidade (em sua parte mais imatura, imo-

bilizada justamente na rotina dos habitos e automatismo).

Quanto mais reqressao existe numa lnsti tulcao, quer dizer, quanto

mais ela e depositaria das partes imaturas da personalidade de seus

integrantes, mais intensa encontraremos nela a estereotipia e mais predo-

mfnio havera da participacao sobre a interacao", quer dizer, de papeis

nao discriminados e de uma estrutura semelhante ados grupos primarios.

Os grupos na instituicao

Pode-se definir a tarefa do psicoloqo na insti tuicao dizendo tarnbern

que 0 enquadramento de seu trabalho e institucional, mas sua tecnics efundamentalmente grupal (intra e intergrupal)_

Neste sentido, podem-se considerar esquematicamente trss tipos de

instltuicao: as que se manejam como grugos primaries e as que 0 fazem

como grupos for-tr ial izados ou estereotipados. Um terceiro tipo, com

um melhor grau de dinarnica, e aquela que opera como um grupo secunda-

rio sem cair na estereotipia. No primei ro caso, a dire<;:aoda tarefa consiste

em transformar os grupos primaries em secundarios: no segundo caso, a

9 - Nao podemos desenvolver aqui esta diferenr; :a que foi estudada em outras publi-

cacdes anteriores ao investigar 0 fenomeno da simbiose. 56 diremos que participacdo

coincide com sincretismo.

Para evitar, aqui tarroern, termos que procedem da medicina e da psicopatologia, cha-

maremos daqui em diante de personetidede sincretics ao que ate aqui designamos

como a parte imatura da personalidade (jndiferenciada, amblgua, sinc ret ica) , que

promove ansiedade psic6tica.

58

tarefa consiste em elaborar e ultrapassar a rigidez que encobre na realida-

de uma estrutura de grupo prirnario fortemente reprimida, formalizada

reativamente .

.*, No grupo primario existe uma forte iambigi,iidadl;)j:!epapeis e status

dentro da lnsti tuicao: no grupo estereotipado esta ambiqiiidade tende a ser

"resolute" ou compensada com uma forte forrnalizacao (como formacao

raativa), a qual leva implicitamente a intensas seqmentacdes e incomunica-

<;:5es.0 grupo prirnario e um grupo no qual predominam as ldentificacoes

projetivas rnacicas (participacao], um deficit na diferenciacao e identida-

de de seus membros; seu molde e 0 do grupo familiar, que se continua nainstituicao como um grupo de pertence forte, mas como um grupo de tare-

Z a . .!!!!!iJQ_Jj.ebil, que se ve constantemente compromet ido por situacoes

conflituosas fortemente ernocionais.j-

Devemos ter mui to em conta que distintas estruturas coexistentes

da personalidade requerem instituicoes e grupos de caracterfst icas di-

ferentes, nos quais cada uma delas pode ser gratificada, compensada

ou controlada e, neste sentido, 0 ser humane necessi ta tanto de grupos

prirnarios como de grupos seeundarios. 0 grupo que constitui 0 prototlpo

do grupo primario, em nossa cultura, e a familia e nela ha uma forte depo-

sitacao e qratif icacao da personalidade sincretica, Por outra parte , e forte-

mente clivada da anterior , 0 nfvel mais maduro da personalidade requer

instituicoes e grupos onde 0 mesmo se pode por em jogo, se consolidar e

se enriquecer":)0 grau de dissociacfio e contradicso entre estas duas estrutu-

ras da personalidade costuma ser muito notavel e marca 0 grau de norma-

l idade e de plast icidade de cada indivfduo. Por isso, e dado que nem todas

as insti tuicoes respondem ao mesmo padrao de orqanizacao, requerem ser

estudadas as funcfies que devem nela se desenvolver ou secontrolar a par-

t ir do ponto de vista da estrutura da personalidade.

" Por outro lado, 0 deficit de inforrnacao e de relacoes interpessoais

favorece a regressao a grupos de estrutura primaria e, portanto, tarnbern

reqressao a personalidade sincretica.] -

Neste sentido, pode se compreender 0 problema pelo qual consul-

tou uma empresa que dispde de importantes lnstalacoss recreativas paraseus empregados e trabalhadores que estao facultados para ir com suas

famil ias e que se deparava com 0 fato de que, apesar de todas as facil ida-

des promovidas, seu pessoal nao concorria a desfrutar das instalacoes re-

creativas. 0 problema residia no fato de que 0 empregado tinha na empre-

sa e seu trabalho toda a parte mais madura de sua personalidade que re-

queria a forrnalizacao dos grupos secundarios e que nao desejava se ver ab-

59

sorvido totalmente pela empresa, mas sim manter a margem dela sua vida

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 30/69

em relacao com 0 grupo primario, A dissoclacso erspresa-Iamilia coincide

totalmente com a dissociacao da propria personalidade que requeria tipos

distintos de grupos que, por sua vez, estivessem totalmente separados entre

si. Deve-se tomar muito em conta que ha dissocieciies instrumentais que

devem ser respeitadasJ

Nao cabe "aqui desenvolver a dinarnica dos grupos e a das relacdes

intergrupais, que se acha fora de nosso prop6sito presente. Os grupos den- .

tro de uma mesma insti tuicso servem, por sua vez, para distribuir e contro-

lar ansiedades e com isto culpas e persequicoes, mas nem sempre se cumpreo postulado de que urn perigo externo leva a uma maior coesdo intragru-

pal, ja que quando se ultrapassa determinado umbral e 0 perigo externo

se torna lnqovernavel, 0 grupo ou a lnsti tulcao em sua totalidade reprodu-

zem dentro de sua propria est rutura a situacao de perigo, como uma tenta-

tiva de controla-lo ou qoverna-lo ficticiamente em condicces mais controla-

das.

Momentos de tensao produzem reqressao ao grupo prirnario: a este-

reotipia grupal nao permite tais reqressoes que, se sao dinarnicas, s a o posi-

tivas. 0 grupo psicologicamente atendido em uma lnst ituicao pelo psico-

logo tende a ser carregado com tensoes de outros que nao 0 sao.

Por outra parte , deve se contar com a possibilidade de existencia, ao

mesmo tempo, na mesma institulcao, de grupos e relacfies primaries, se-

cundarias e estereotipadas que devem ser avaliadas com cautela.

o hospital como instituicao

E na insti tuiclio hospitalar onde a psicologia insti tucional provou

ate agora ser um dos campos onde setorna muito proveitosa sua utll lzacao,

mas isto pode se dever somente ao fato de que e a instituicao mais direta-

mente ligada, na atualidade, a parte da atividede do psicoloqo e ao fato deser-Ihe urn dos organismos mais acessfveis (aindaque nao facilmente aces-

sfvel) . Os objetivos da psicologia insti tucional setornam tambern mais cla-

ros no hospital ja que tambern se da 0 fato de que esta insti tuicao e menos

conflituosa para 0 proprio psicoloqo em tudo 0 que se refere a sua ideolo-

gia e seus objetivos. 0 fato e que a psicologia insti tucional aplicada aos

hospi tais se torna, a rigor, uma arma terapeutica muito ef icaz, no sentido

60

de que todo 0 hospital (sua estrutura) se transforma em si mesmo em urn

agente pslcoterapico de grande eficiencia, em profundidade e amplitude. E

neste sentido se alcanca organizar a psicoterapia a nfvel institucional e

nao ao da psicoterapia individual ou grupal.

Uma tarefa altamente ansioqenica como 0 e 0 contato diario com os

problemas da doenca e da rnorte, cria necessariamente na equipe medica e

auxiliares comportamentes defensivos de distinto tipo, entre os quais nos

interessam particularmente aqueles que 0 psicoloqo deve atender em sua

tarefa de psicologia insti tucional. Urn deles consiste no fato de que muitas

tensfies na equips medica, que nao sao explicitadas e resolvidas neste nf-

vel sao deslocadas ao pessoal auxi liar ou as relacoes entre os pacientes

entre si e com 0 pessoal auxil iar. 0 medico tende - como conduta defen-

siva - a adotar uma ati tude onipotente que em muitos casos se aproxirna

de uma tantacao de "joqar" de mago. Esta atitude cria e fomenta uma in-

comunicacao entre os pr6prios medicos e entre estes com 0 pessoal auxiliar

e os doentes: isto se cornbina, alern disso, com uma exigencia implicita de

dependencia dos pacientes, que se ve facilitada pela reqressao a que conduz

a propria doenca, Mas, na medida em que se fomentar a dependencia, se

incrementam tambern as exiqencias e as consequentes frustracdes e ingra-

tidoes ou situacoes persecut6rias que se deslocam aos pacientes entre si

e com 0 pessoal auxiliar . 0 "se portar bern" e uma das exiqencias irnplici-tas que se faz ao paciente, entendendo por isto sua dependencia.

Toda esta sltuacao, altamente ansioqenica, se combina as vezes com

urn emprego alienante e abusivo de distintos medicamentos, especialmente

sedativos e hipn6ticos, com os quais so seencobrem assituacoes de confli-

to, com frustracoes para todos.

Outro problema insti tucional, como 0 do ritmo de altas e aprovei-

tamento de leitos, se ve relacionado com uma necessidade inconsciente ,

por parte do medico, de reter seu paciente e, por parte deste e em funcao

de sua dapendencia, com sua necessidade de ser retido. Estrutura-se uma

verdadeira simbiose hospitalar , dado que a alta de cada paciente obriga 0

medico a reintrojetar tudo 0 que nele tinha projetado ou depositado" 0,

com a consequente mobilizacao de ansiedades; e 0 mesmo ocorre com 0

paciente que, em suas condicoes de reqressao, se ve mobil izado em suas

ansiedades ao ter que se re-situar na vida extra-hospitalar e assumir obriga-

coes e conflitos dos quais se havia separado temporariamente por sua

10 - 0 medico mantern projetadas em seus pacientes suas proprias ansiedades hipo-

condr iacas e estes as aceitam em troca da seguranc;:a da dependencia,

61

. .

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 31/69

internacao. 0 intervir aqui sobre os pacientes e em sua relacso com a fa-

milia e os medicos torna-se de vital importancia para cortar este cfrculo

de realimenta<;:ao.

Por responder as mesmas estruturas socia is, as instituiciies tendem

a adotar a mesma estrutura dos problemas que tern que enfrentar. Assim,

no hospital geral, a dissociacao corpo-mente que rege os pacientes rege

a propria instituiciio e isto se recorda aqui, ja que nisto reside uma das

fontes da resistencia ao psicoloqo e a sua taref a, cujo trabalho significa,

neste contexte, nao outra coisa que urn retorno do reprimido, com a

rnobi lizacao consequents de ans iedade.

" 'v Nas instituicoes que atendem doentes mentais estes problemas se

tornam ainda mais agudos. Urn dos que se apresentam e sempre (ate ago-

ra) 0 de uma forte dissociacao entre os objetivos explicitos e implicitos

da instituicao: entre os primeiros se acha, evidentemente, 0 proposito de

curar doentes menta is, mas em contradicao com isto 0 instituto psiquiatri-

co tende a defender a sociedade do al ienado, segregando-o e, neste senti-

do, a institulcao tende, em sua orqanizacao total, a alienacao e a segrega-

<;:ao do doente mental. Como em nenhum outro caso, se faz aqui muito

evidente 0 fato de que a instituicfo tende a adquirir a mesma estrutura

e 0 mesmo sentido que 0 problema que se propos a resolver. 0 asilo tem

em sua organiza9fIo a mesma aliena9fIo que seus pacientes: os doentes ten-dem a ser tratados como coisas, a identidade se perde totalmente, os

contatos socials se empobrecem, se chega a uma monotonia com uma

forte desprivacao sensorial, que reforca e rnantern a alienacao dos pa-

cientes.

Os loucos, as prostitutas e delinqilentas sao os sintomas de uma

sociedade perturbada e as instituicdes tendem a reprimir e segregar tanto

como a propria sociedade, ja que as institu i<;:oessao os instrument"as desta

ultima. 0 adotar uma atitude distinta significa tomar consciencia ou

insight dos problemas e conflitos que, por sua mera presence ou existencia,

denunciam a sociedade que cria os alienados, as prostitutas e os del in-

qiientes. Alern disso, se compreende melhor este fato se se toma em conta

uma das funcoas fundamentais das instituicoss sociais: a de servir de pro-

je<;:aoou depositaria da per sonalidade sinc retica, Mobilizar a orqanizacao

de uma institui<;:ao significa, entao, mobiliza r as ansiedades psicoticas que

nela se acham condensadas e controladas. 0 proprio paciente oferece uma

notaval resistencia, dado que num limite circunscrito e nqido ele pode dis-

tribuir e controlar melhor sua personalidade sincretica que no mundo mais

mutante e dinamico da realidade.

62

o fenorneno da desprivacao sensorial nao e. por outra parte, exclusi-

vo das lnstituicoes psiquiatricas: sera encontrado com maior ou menor in-

tensidade e com distintas forrnacdes ou aparencias em todas as institu i-

coes, Nelas se tende sempre a estabilizaceo e a estereotipia, a monotonia,

que se bern por urn lade cumpre com uma das funcdes psicol6gicas da ins-

tituicdo, leva, por outro lado, a urn continuo e reiterado empobrecimento

das relacoes interpessoais. 0 hospitalismo se acha assim - em diferentes

formas ou expressoes - em todas as instituicfies. A burocratizacao respon-

de as mesmas causas e a mesma dina rnica socia l e psicol6gica . Eo fenorne -

no que, em seus termos gerais, pode se designar, tal como 0 fazem Bettel-

heim e Sylvester, como "instituclonalisrno psicoloqico", do qual 0 hospi-

talismo e a burocratizacao sao 56 dois aspectos. Todos eles significam, em

ultima instancia, a alienacao ou rnanutencao da alienacao do ser humano,

seu empobrecimento e sua desprivacao de vfnculos humanos e 0 esvazia-

mentode sua condicso hum ana.

A empresa

A ernpresa e a lnstituicao que coloca os problemas mais agudos

quanto a e lucldacao de obje tivos e a aceitacao da ta refa profissiona l.

Toda empresa tern como objetivo fundamental, de uma ou outra

rnaneira, urn incremento de sua produtividade - melhor dito, de suas uti-

lidades - e do pslcoloqo se espera, explfcita ou implicitamente, uma con-

ducao das relacdes humanas que leve a esta finalidade. Em nenhum caso

o psicoloqo deve se situar como agente ou promotor da produtividade,

porq ue nao e esta a sua fun<;:ao profissional; seu objetivo e a saude e ° bem-

estar dos seres humanos , 0 estabelecimento ou criacao de vincu los saudaveis

e diqnificantes, Seus objetivos podem levar tanto a urn aumento da produ-

tividade - ou dos beneHcios - como a uma dlminuicfio da mesma, de rna-

neira passage ira, transitoria ou estavel, mas em nenhum caso e isto 0 quemede a eticecie de sua tarefa. Infelizmente, isto pode ser urn obstaculo

insoluvel para seu trabalho profissional, em cujo yaso deve ser.sacr ificado

cste ul timo e nao seus objetivos profissionais.

No entanto, a empresa nao se acha sempre interessada em urn in-

cremento da produtividade; isto depende - em ultima instilncia - de que

coincida ou nao com urn incremento de seus beneflcios e, neste sentido,

63

E ineqavel que 0 psicoloqo se encontra, especialmente neste campo,

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 32/69

ha epocas ou ciclos economicos nos quais interessa a empresa diminuir a pro-

dutividade e acode ao psicoloqo para selecionar empregados para a dispensa

ou para uma rnudanca parcial de suas atividades e nos quais seespera que 0

psicoloqo nao so selecione como tambern "convenca". Em todos os casos,

o psicoloqo deve agir exclusivamente segundo seus objetivos (os da psico-

higiene) e rejeitar a tarefa se a ve incompatlvel com seus propositos,

Em uma ocasiso. foi solicitada a ajuda de um psicoloqo para ilustrar

um grupo de di rigentes de empresas sobre tecnicas pslcoloqicas. 0 obje-

tivo expl (cito era 0 de melhorar as relacfies humanas da empresa respecti-

va; a finalidade irnplfcita era a de poder "rnanejar" melhor os empregados

e operarios. 0 psicoloqo aceitou sua tarefa, mas a levou a cabo segundo

seus proprios objetivos: trabalhou com 0 grupo no sentido do esclareci -

mento destas finalidades encobertas e na dos proprios conflitos que tinham

estes dirigentes de empresa com suas proprias funcfies. que derivavam ba-

sicamente de estar submetidos a uma dupla pressao, que provinha, por uma

parte, das exiqencias de maior utilidade da empresa e, por outra parte,

de sua identif icacao parcial com os interesses e problemas de seus empre-

gados e operar ios (provinham todos de classe media).

Em outra ocasiao, um psicoloqo foi chamado para intervir numa si-

tuacso caotica que havia desembocado em uma greve operaria, sem que se

vissem com clareza quais eram os motiv?s e os proposi tos desta ult ima,ja que a ernpresa, inclusive, pagava com rernuneracoes superiores as dos

convenios. Trabalhou em primeiro lugar e unicamente com 0corpo diretivo

e desta reuniao derivou a analise da est rutura paternalista da dirscao, que

atuava com grande seducao sobre 0$ dirigentes operarios, amortizando

desta maneira a eficacia dos mesmos; mas isto levava a uma situacao de

grande lnsatisfacao e rnal-estar pela falta de identidade em que se encontra-

yam os operarios, que se achavam assim totalmente sujeitos e dependentes.

A mudanca se fez somente sobre esta estrutura paternali sta, a qual levou

indiretamente a uma orqanizacfio sindical autonoma, que dava um status

definido aos operarios.

Uma estrateqia fundamental em toda esta tarefa e a de considerar

o que consulta nao so como cliente, mas tembem como 0 sujeito sabre

a qual hfJ que agir, de tal maneira que ele mesmo esclareca suas motiva-

cfies, objetivos, suas contradicoes e confli tos, tanto como sua propria ma-

neira de agi r e as conseqiiencias que se derivam da mesma. Nao tocar este

aspecto e se ocupar de outro grupo ausente compromete 0 psicoloqo em

uma al ianca implfci ta ut ilit aria e perde no caminho seus objetivos como

tecnico da psicologia.

64

com problemas eticos muito ser ies, que nao deve evitar, mas nao e menos

certo que existem fortes resistencias e preconceitos que ha que desfazer,

assim como tarnbem e certo que existe a possibilidade de uma tarefa que

nao desvirtue a dignidade humana nem profissional. Nao e totalmente cer-

to que, de fato e de rnaneira insoluvel, todo trabalho em empresas indus-

triais ou comerciais seja diretamente uma atividade contra os operarios:

mas nao e rnenos certo que pode se-lo com grande facil idade e com muita

freqiiencia realmente 0 e. 0 nucleo de human relations reside em se ocupar

dos seres humanos para a empresa. Para nos, 0 fator humano e atendidona empresa para os seres humanos que a integram 1 1.

Gada avanco da psicologia ou cada avanco sobre um novo campo de

sua ap l t c a ca o tem side e e visto com grande desconfianca. E agora, espe-

cialmente este. Convern preter ir, em todo caso, 0trabalho neste campo

ate quando 0 psicoloqo haja acumulado experisncia em outros menos con-

f lituosos e possa se sentir mais segura no enquadramento da situacao e no

manejo das tecnicas respectivas. E particularmente interessante conside-

rar que os inimigos do avanco das ciencias naturais foram as torcas socia is

conservadoras, para quem um avanco no conhecimento cient ifico da na-

tureza significava rnudancas que Ihes resultavam desfavoraveis: mas atual-

mente, sao as torcas da esquerda polrtica as que desconfiam do avanco da

investiqacao psicoloqica e de sua aplicacso. Nao e menos certo que asfor-

cas sociais que agora mais alentam 0 desenvolvimento e aplicacdo da psi-

cologia 0 fazem tarnbern em um sent ido pol it ico que tampouco nos inte-

ressa, porque nao resulta progressista nem humano. Mas toda esta situacao

nao e insoluvel nem tampouco insuperavel.

Psicologia da equipe de psicoloqos

A psicologia insti tucional deve cornecar sempre por ser aplicada ao

proprio grupo que tem a seu cargo a tarefa numa institu ic;:aoe isto e assim

11 - Parece-nos ut i I recomendar a leitura das publicac fies de Crozier, Friedman,

Frasser. A respeito nos parece importante a atitude etica e tecnica de E. Jaques de

contar com a aceltacao das orqanizacoes operarias para ingressar a trabalhar com psi-

colog ia ins ti tucional em uma empress ou f flbr ica. Es ta aceitacao - l iv re e nao obt ida

par coercao - nao obriga - par outra parte - as operarios a serem objeto de estudo;

para isto faz falta uma segunda aceitacdo explfcita e indefectivel.

65

nao so por interesse ou conveniencla, mas tarnbem por uma exigencia

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 33/69

tecnica do trabalho a se realizar . Como em toda insti tuicao, as tensdes que

promove a tarefa afetarao as rela(:oespessoais e profissionais entre os inte-

grantes da equipe e as mesmas, por sua vez, repercutirao infalivelmente so-

bre a propria tarefa, em um currjculo vicioso que se potencia permanen-

temente nestes dois extremos.

Convem que se achem bem delimitadas as funcdes, status, papeis,

tanto como as vias de comunicacao e a qualidade e frequencia das mesmas;

para tudo isso e imprescindlvel (ate quando se constitua de maneira estavel

e haja provado sua eflciencla na auto-requlacsol que a equipe em sua tota-lidade trabalhe como grupo operativo sob a supervisao de um colega que

esteja totalmente fora da tarefa. Esta tarefa de auto-requlacao que se

aprende no,grupo operativo pode chegar a seu termo quando a equipe haja

incorporado as pautas do grupo operative e interacione espontaneamente

de forma posit iva, sem a necessidade ou requerimento de um diretor do

grupo. Desta maneira, 0 trabalho de saneamento de tensoes nao deve ter-

rninar nunca e sim ser sempre uma das tarefas fundamentais da propria

equipe.

Isto se faz imprescindfvel porque as tensoes do trabalho lnstitucional

sao muito grandes e aquelas tensdes da instituicfio das quais a equipe nao to-

mou insight se atuam no grupo de psic6logos, de tal maneira que os con-

flitos que se apresentam na equipe de psicoloqos tern a mesma estrutura

que os confl itos da lnstituicfo dos quais nao se tomou suficiente insight.

Por seu proprio enquadramento, os psicoloqos nao podem agir projetando

seus proprios conflitos e tampouco podem estruturar uma situacao

persecutoria com a instituicjo que tern que atender e e por isso que 0 con-

fli to da instituicao se reproduz facilmente dentro da propria equipe que

age necessarlarnente como absorvente de tensdes, Esta e uma das causas

rnais freqGentes que temos encontrado de esteril izacao e ainda de dissolu-

c;:aoda equipe de psicoloqos, com 0 fracasso conseqGente na tarefa empre-

endida ou proposta.

Outro fato que se vi!com freqiiencia na equipe e 0 das tensoes intra-

grupais que tendem a produzir uma forte compulsao para agi r na inst itui-c;:ao,saltando as etapas da organizac;:ao intragrupal e da,discussao acabada

da hipotese de trabalho, do enquadramento da tarefa e das tendencias a

empregar. A urgencia pela pratica, assim como a urgencia por produzir re-

sultados vislveis na tarefa deve ser vista como (ndice de uma sltuacao de

tensilo intragrupal nao explicitada. Recordar que nao eo mesmo a(:aoque

a~a¢o pstcopeticsr« prirneira e parte ou momento de uma praxis, que

66

proliferacao de problemas que se tendem a investigar e resolver, 0 que taz

com que 0 grupo caia numa desorientacao em sua tarefa profissional.

Tudo 0 que ocorre na equipe deve ser analisado em dois mveis em

lnteracao: um, no da equipe em funcao da tarefa e outro, no da tarefa

que se realiza.

A lealdade dos integrantes da equipe entre si e a reserva absoluta

com relacao aos dados da investiqacao, tanto como a lealdade as ordens da

equipe, sao prem issas fundamentals e toda falha nas mesmas deve ser exa-

minada, nao a partir do ponto de vista pessoal de quem incorreu nesta fa-

Iha e sim em tuncao da totalidade (da tarefa e da equipe). A inclusfio de

novos membros na equipe e um problema da totalidade grupal, que deve

encara-lo abertamente como parte da propria tarefa. Toda resistencia ao

ingresso de novos membros deve ser cuidadosamente analisada, tanto como

a tendencia a seqreqacfio ou a de incorporar frequenternente e com facili-

dade novos membros: elas costumam ser as formas como uma equipe

tende a tentar resolver magicamente seus problemas internos. Todo novo

membro deve ser, por sua vez, protegido de mio se const ituir em um foco

de cristalizacao e projec;:aodas tensoes intragrupais, tanto como a propria

equipe deve se cuidar de nao se constituir, ela rnesrna, em um foco de

projecao dos conflitos institucionais.Todas as fantasias rnaqicas e rnessianicas da equipe devem ser cuidado-

samente analisadas e resolvidas para conseguir um trabalho eficiente , ati-

ca e cientificamente correto ou rigoroso.

A interrupcao ou cessar de uma tarefa e outro dos problemas que

deve ser cuidadosamente avaliado e colocada a estrateqia do mesmo, ja

que a necessario evitar toda possibilidade de defesas neuroticas, tais como

a fuga frente a ansiedades claustrofoblcas ou as racionallzacoes frente a

imperfcia tecnica e evitar tarnbern 0 ir-se como desligados ou expulsos da

institulcao, promovendo inconscientemente tal safda, ja que e - nestas con-

dic;:6es- mais tacll tolerar e racionalizar sltuacoes persecutorias (de ingra-

tidao, de imaturidade, etc. ) que admitir a depressao pela perda e admitir 0

insight dos fatores reais do f racasso ou da perda. As perdas, mudanc;:asoufracassos podem levar a uma dissolucao do grupo ou a uma aqlutinacfio

dos membros do mesmo (reqressdo).

Se existem algumas instrucoes que tem que serindefectivelmente

respeitadas e cumpridas pela equipe e que podem servir de guia basico

para sua propria psico-higiene como equipe, elas poderiam ser enunciadas

assim: Nao deixar impllcita nenhuma situacao de tensao ou de rumor, ja

67

que toda dissociacao e sempre um foco ativo e desconhecido de novas ten-IlETHEL, L.; ATWATER, f. S.; SMITH, G. H. E. y STACKMAN, H. A.: Organiza-

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 34/69

scSes;em segundo lugar, nao deixar tampouco problemas e situacoes co-

nhecidas permanentemente pendentes sem que sejam - pelo menos - efe-

tiva e realmente encaradas. Em ultimo termo, toda explicitacao e esclare-

cimento nao deve ser feito em qualquer momenta nem em qualquer lugar

e sim dentro do l imite que para eledeve ter inst itucionalizado a equipe, de

tal maneira que devem ser rigorosamente respeitados os limites dos distin-

tos tipos de tarefa que 0 grupo se tenha designado: e toda tarefa levada a

cabo fora do contexte e de seu limite definitivo tem que ser vista e consi -

derada como uma atuacao que tem que ser examinada em si mesma, porsua vez, como outro sintoma de conflitos.

Neste sentido, 0 rumor deve ser considerado como um sintoma de

grande importancia ja que - a n (vel do grupo de psicoloqos ou da pro-

pria instituicao - significa um fndice fiel de deficit na cornunicacao. Este

ultimo se produz por uma disporsso esquiz6ide provocada, por sua vez.

pela ansiedade da tarefa.

Conclusdo

Todo 0 exposto pode ser resumido em dois prop6sitos basicos que

se inter-relacionam estreitamente: devemos configurar uma psicoloq is da

praxis e uma praxis na pslcoloqle. A psicologia institucional e um passo

mais neste caminho.

Neste sentido, nao devemos sobrepor nem confundir tarefa pratica

com praxis; a primeira - por si s6 - e alienante; a segunda enriquece 0

ser humano e a humanidade.

B ib l i og ra fi a

BARNES, H. E.: Socia/Institutions. NewYork. Prentice-Hall, 1946.

BENNETT, A. E.; HARGROVE, E.A. y ENGLE, B.:Psychiatry in General Hospital.

Univ. of California Press,1956.

68

cion y direcci6n industrial. Mexico, F.C. E., 1961.

IlETTELHEIM, B. y SYLVESTER, E.: A Therapeutic Milieu. En: Reed, C. F.; Ale-

xander, Y. E. y Tomkins, S. S.: Psychopathology. Havard University Press,

1958.

BRIE:RLEY, M.: "Theory, practice and public relations." Int. J. Pse, 24. 119. 1943.

BROWN, F. A. C.: La psicologfa social en laindustria. Mexico, F.C.E., 1958.

CANDILL, W.: The Psychiatric Hospital as a small Society. Cambridge. Mass.Har-

vard Univ. Press.,1958.

CONFERENCE DE ROME: Les relations humaines dans I'industrie: 1956.

CROZIER, M.: La tebricecion de hombres. BuenosAires, Deucali6n, 1954.

FREUD,S.:Psicologia de lasmasas y ami/isis del yo. ObrasCompl. Tomo IX.

FRIEDMANN, G.: Problemas humanos del maquinismo industrial. Buenos Aires,

Sudamericana,1j:l56.

FRIEDMANN, G. V NAVILLE, P.: Traite de sociologie du trevett . Paris, A. Colin,1961.

CILLON, J. J. y PLANQUES, L.: L'hygiene menta Ie dans t'entrerprise. Paris, Tou-

louse, 1955.

GRANICK, D.: Management o f the Indust ria l Firm in the V.R.S .S . New York, Co-

lumbia Univ. Press,1954.

GREENBLATT, M.; LEV INSON, D.J. y WILLIAMS, R.H.: The patient and the Men-

tal Hospital. Illinois, Glencoe,The FreePress,1957.

GUERREIRO RAMOS, A.: Relaciones humanas del trabajo. Universidad Nacional,

Mexico.

GURVITCH, G.: Traite deSocioloqie,

Paris, P.U.F., 1960.HALLIDAY, J.L.:Medicinapsicosocial. B. Aires, Eudeba, 1961.

HARTMANN, H.: "La aplicaci6n de los conceptos psicoanaliticos a las cienciasso-

ciales." Psychoanal. Quant. 19, 1950.

HERTZLER, J.O.: Social institutions. New York, McGrawHill C., 1929.

JAQUES, E.: "Social systemsasdefence against persecutory anddepressiveanxiety."

En: Kle in, M.: New Cirections in Psychoanalysis. Londres, Tavistock, 1955.

- "Psychoanalysis andthe Current Economic Crisis." En:Psychoanalysis andContempory thought. Londres, Hogarth PressLtd., 1958. "Disturbances in the

capacity to work." Int. J. Psa. 4.357, 1960.

JONES, M.: Social Psychiatry. A Study of Therapeutic Communities. Londres, Te-

vistock Publications, 1952. - "The Concept of aTherapeutic Community." En:

Psvchopetoloqv, editado por Reed, C.F.; Alexander, V.E. y Romkins, S. Har-

vard Univ. Press,1958. The Therapeutic Community. New York, Basic Books,

1953.KARN, H.W. y VON HALLER GILMER, B.: Readings in Industrial and Business

Psychology. New York. McGraw-Hili Book Co. Inc., 1952.

LANTOS, B.: "Work and the instincts." Int. J. Psa. 24. 114, 1943. - "Metapsycho-

logical considerations on the concept of Work." Int. Psa. 33. 4, 1952.

LIKERT, R. y HAYES, S.P.: Some applications of Behavioural Research. Unesco,

1957.

MACIVER, R. M.y PAGE, C.H.: Sociofogia. Madrid, Tecnos.

69

MAYO, D.: Problemas humanos de una civilizaci6n industrial. BuenosAi res, Galatea,

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 35/69

1959.

MC. GUIRE, J. W.: La conducts empresaria. Buenos Aires, Hobbs Sudamericana,

1965.

MEADOWS, P.: La tecnologfa y el orden social. Universidad Nacional Mexico.

MENZIES, I.: ..A casestudy in the functioning of Social systems asa defence against

anxiety." Human relations. 13. 2, 1960.

NADEL, S.F.: Fundamentos de entropologfa social. Mexico, F.C.E., 1955.

NOVEY, S.: "Ia utilizaci6n de las instituciones socialescomo una tecnica de defensa

en lasneurosis." Rev. Urug. Psa. 3.2-3, 1960.

PFI FFNER, J.M. y SHERWOOD, F.P.:Organizaci6n administrativa.

Mexico, Herrero

Hnos. S.A.

SIMON, H.~.: EI comportamiento administrativo. Madrid. Aguilar, 1962.

SIVADON, P.: "Psychopathologie du travail." L'evolution Psych., 1952.

STANTON, A.H.; SCHWARTZ, M.S.: The Mental Hospital. New York, Basic Books,

1954.

TREGOLD, R.F.: "Les relations humaines dens l'Industrie." Rev. Int . Sc. Sociales.

XI , 1. 1959.

YOUNG, P.:Metodos cientfficos de investigaci6n social. Univ. Nac. Mexico, 1953.

ZNANIECKI, F.: "Organisation sociale et institutions." En Gurvitch, G.: La socioto-

gieau XXe, Siecle, Paris, P.U.F., 1947.

70

3

opsicologo n a c omun id ad e

A higiene mental se acha, desde suas origens, ou desde 0corneco de

sua historia, ligada a doenca mental; e 0 mesmo aconteceu com a psico-

profilaxia e a psico-higiene. Nao se insistiu suficientemente sobre 0 papel

que podem jogar os psicoloqos e a psicologia no problema da saude e da

doenc;:ae tampouco se diferenciou nitidamente higiene mental de psico-

profilaxia e de psico-higiene.

Os relatorios da Orqanizacao Mundial da Saude nao esclarecemtampouco estes aspectos e 0 psicoloqo e a psicoloqia aparecem citados

ocasional e brevemente; assim, por exemplo, a relatorio 223 do ano de

1961, entitulado "Preparacao de programas de higiene mental", diz: "En-

tre os membros do pessoal dos grandes services de higiene mental figura

normalmente 0 psic61ogo cl(nico, Este especialista tem de conhecer a fun-

do a teoria e a pratica das provas de exploracao psicoloqica e dos rnetodos

especiais de educacao. Em alguns lugares se tende a que 0 psicoloqo abor-

de os mais diffceis problemas de psicoterapia e 0 cornite considera que nes-

tes casos convira exigir a ditos especialistas uma formacao complementar".

A meu entender, a psico-higiene excede amplamente os problemas

da doenca mental e da higiene mental, mas tambern tem objetivos que es-

tao legitimamente fora do campo da propria saude publica. Edisto e quequero me ocupar mais especificamente, comentando as funcoes do psic6-

logo na comunidade.

Insistiu-se reiteradamente que tanto os psiquiatras como os psicol0-

gas devem deslocar a entase de sua atividade profissional: deve-se tratar de

superar a orqanizacao de uma assistencia individual e privada, dedicada

fundamentalmente a cura, fazendo com que a enfase ou 0 maior peso da

71

da atividade profissional dos mesmos recaia sobre a populacao (a comuni- lhada, podemos considerar que a primeira etapa inclui 0 que se formulou

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 36/69

dade) e nao sobre indivlduos; promover bern-estar e nao somente curar;

nao atender unica, especffica e predominantemente fatores pat6genos a

nlvel individual e sim situacoes mais gerais da comunidade; em lugar da

doenca ha que se dirigir as condicoes correntes de vida; em lugar de criar

mais instituicoes onde se atende exclusivamente gente doente, sair a

comunidade e atende r as situacoes cotidianas, as tare fas e a tividades dia rie s

e ordinaries que a populacao desenvolve. Tudo isto pode se resum ir dizen-

do que devemos atender mais a adm inistracao e a planiticacao dos conhe-

cimentos e tecnicas para atender a relacao interpessoal , que e um fator

patoqeno basico de nossa civilizacao, controlando e ajudando 0 desenvol-

vimento da personalidade atraves das pautas de interacao e at r aves da ajuda

tecnica a pessoas chaves ou organismos importantes da comunidade.

Tudo isto exige uma atividade muito complexa e um desenvolvimen-

to de conhecimentos e tecnicas que ainda nao possutrnos em escala sufi-

ciente, pelo que nao estamos senao em condicoes de resenhar os problemas

tanto como as perspectivas destes enfoques. Necessitamos conhecer muito

mais a psicologia das situacoes e da vida cotidiana, tanto como necessita-

mos teor ia s psicoloqicas que nao par tam especificamente da patologia.

A par de revisao de teorias e conhecimentos necessi tamos arnpllacao

e cornprovacao de nossos recursos tecnicos: tecnicas de acesso a comunida-de, tecnicas de lnvestiqacao. tecnicas de operatividade, tecnicas para admi-

nistrar os recursos no limite da comunidade. E junto com isto. teremos

seguramente, a curto prazo, que considerar as pautas de atuacao de profis-

sionais da arte de curar , mas tarnbern criar novas pautas para eles e para os

psicoloqos,

Neste sentido, a diferenca do psiquiatra, que e um profissional da

arte de curar e um especialista nas doencas menta is, 0 psicoloqo nao se de-

ve situar dentro do campo da doenca, seja da cura ou da profilaxia, seja

da doenca mental au nao. Dentro da higiene mental e dentro da saude

publica,o psicoloqo tem rnultiplas tarefas e funcdes, mas as tem tambern -

e nao menos importantes - fora dos dois. A este ult imo e que especifi-

camente apl icamos 0 termo "psico-higiene".

Objetivos e niveis da higiene mental

as objetivos da higiene mental vern se modificando no curso de

suas distintas etapas hist6ricas. Sem animo de fazer aqui uma resenha deta-

72

como instrucao: "fazer algo pelo doente mental", que se referia basicamen-

te ao plano assistencial; a partir dos passos iniciais para conseguir um trato

mais humane para 0 doente mental, se adiantou muito no melhoramento

das instituicoes assistenciais, tanto a pa rtir do ponto de vista administrati-

vo como a partir do ponto de vista da obtencso de terapeuticas mais efe-

tivas e um incremento nao so da quantidade como tambern da variedade de

instituicdes assistenciais.

A instrucao de criar mais hospitais na~ se pode deixar ainda de lado

em muitos parses, mas e evidente ta rnbern a necessidade de um aproveita-

mento maior ou mais racional dos ja existentes, 0 qual inclu i internacdes

mais precoces e mais breves, com tratamentos mais ativos, a habilitacao

do day-hospital e a necessidade de incorporar services psiquiatricos nos

hospitais gerais. a ponto culminante deste desenvolvimento da assisten-

cia psiquiatrica esta dado pelo que na atualidade se denomina comunida-

de terapeutica, que consiste fundamentalmente em modificar a estrutura

institucional artificial e alienada, com suas proprias pautas , para conver-

ter a orqanizacao e as relacdes que nelas se dao em agentes positivos para

os seres humanos que a integram.

Para a planificacao da assistencia existe ainda , na a tualidade , escassa

inforrnacao correta sobre morbil idade psiquiatrica. Mas diz 0 Relatorionurnero 73 do ana de 1963 da O.M.S.: "Nao ha duvida de que na Europa

ocidental enos Estados Unidos os transtornos psiquiatricos enchem 40%

ou mais do total de leitos de hospital, constituindo um problema de grande

envergadura". Embora dev a se reconhecer e conseguir um rninirno de leitos

para doentes psiquiatricos, com frequencia 0 problema de prover mais

leitos tem side sublinhado em detrimento de outros services que reduzem

a necessidade de internacfio eo tempo da mesrna".

1 - L. J. Saul , em Bases de laconducta humana (B . Aire s. 1958) , diz, r ef er indo-se aos

Estados Unidos, que ha ao redor de um rnilhjio de psicoticos, dos quais a metade, ou

seja, quinhentos mil, esta alojada em inst ituicoes. Hit ao redor de quinhentos mil lei-

tos para todas as outras doencas, incluindo sanat6rios privados como hospitais para

tuber cu losos e seme lhan te s. "Em out r as palavra s, neste pai s exi ste aproximadamente

o mesmo numero de leitos para psicoti cos que para todas as demai s doenc;as juntas."

Embora seja d ifl ci l calcu la r 0 nurnero de neur6ticos, um calculo aproximado da uns

cinco milh5es, dado que provern dos exames realizados pel as autoridades militares

com 0 fim de rnobilizacoes. "Uma crianca em cada vin te Que nascem passara algum

tempo em uma instituicao para doentes mentais. Um de cada dez estara incapacita-

do por algum perlodo devido a sintomas mentais e emocionais."

73

A segunda etapa do desenvolvimento hist6rico da higiene mental foi mas frente aos organismos que enfrentam 0 problema da doenca mental, sua

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 37/69

a do diagn6st ico precoce, tanto em adultos como em criancas: quer dizer

o detectar precocemente as doencas mentais pode, por sua vez, dar lugar a

um aproveitamento maior dos services hospitalares, tanto como um resul-

tado mais frutffero ou exitoso dos procedimentos terapeuticos.

Como e tacil deduzir. estes dois objetivos se acham multo inter-re-

lacionados e exigem do psiquiatra experiencia , conhecimento e atuacao

"extramuros", tal como 0 aconselha - entre outros - 0 Relat6rio nurnero

73 da O.M.S., quando diz que 0 psiquiatra nao deve ter um contato

exclusivo ou experiencia unica na psiquiatria de "int rarnuros" e sim que

deve amp liar seu conhecimento e experiencia com distintos problemas da

psiquiatria.

Estes dois objetivos da higiene mental requerem uma ampla partici-

pacaodo psicoloqo, nao so quanto ao psicodiagn6stico e a psicoterapia

como tarnbern na di fusao adequada de conhecimentos que alertem a co-

munidade para solicitar ajuda medica ou psicol6gica, combater os precon-

cei tos da doenca mental, tanto como atencao de todos os fatores psicol6-

gicos que intervem no funcionamento das instituicdes assistenciais, dos

grupos que a integram e das relacoes e tensdes que entre eles se estabele-

cem e atencao dos fatores psicoloqicos implicados nas tarefas profissionais

que se realizam. Quanto a tarefa frente ao doente e ao possfvel doente, 0

psicoloqo e um profissional que desempenha dent ro do campo da higie-

ne mental como integrante de uma equipe ou como assessor ou consultor;

o mesmo autor traz uma citacao de Bullis e O'Malley, que dizem que "de cada cem

crianc;:as em idade escolar nos Estados Unidos, as vidas de treze deles estariio de al gu-

ma forma alterada devido a sua incapac idade par a a lcanca r a ma turidade emocional ;

quatro terrninarao em hospitais mentais; um se convertera em dellnquente: oito se-

rao destroc;:ados por transtornos ernocionais". No entant o, est es cinco milh6es repre-

sentam so uma pequena parte do problema; a ele hfl que acrescentar 0 alcoolisrno, a

del inquencia, a c rimina lidade, os su lc fd ios. 0 divorcio e os t ranstornos psicossoma-

ticos, com 0 qual 0 quadro se faz enormemente grave. Assim, "de um e um quarto

a um milhiio e meio de criancas passam anualmente pelos juizados de menores; esti-

ma-se que h<i uma lncidencia anual de delinquencia de quase dois e meio milh6es de

criancas entre as idades de dez e dezesseis anos; calcula-se que tres milh5es de crian-

cas necessitam ajuda psiquiatrica. Cerca de sete milh5es de cidedaos tern prontuario

criminal; cometem-se mais de 1.650.000 crimes anualmente. Os div6rcios chegam a

uma media de aproximadamente meio milhiio por ana, com relac;:ao a um milhdo e

meio de casamentos par ano: quer dizer que um casamento em cad a trds term ina

em divorcio". No que se refere a nosso pais, ver a livro de G. Bermann: La salud

mental y la asistencia psiquiatrica en laArgentina. Buenos Aire s, Paidos , 1965.

74

tarefa pertence mais ao campo da psico-higiene, da mesma forma que nos ca-

sos em que intervern em lnstituicoes ou organismos nao assistenciais ou nao

medicos. Este e um aspecto que desejamos que possa se fazer cada vez mais

claro e expifcito a medida que avancemos na exposicao deste tema.

Uma terceira etapa ou objetivo da higiene mental se refere a profile-

xia ou a prevencao da doenca Ao psicoloqo correspondem os aspectos psi-

col6gicos desta tarefa e a isto e ao que se deve denom inar - em sentido es-

trito - "psicoprofilaxia", a qual se acha incluida totalmente dentro da

higiene mental (no caso das doencas mentais), a diferenca da psico-higiene,que a ultrapassa, ja que deixa de girar ao redor do eixo da doenca mental

(como e 0 caso da higiene mental). Devemos esclarecer, ainda m~is, 0 fato

de que "psicoprofilaxia" nao significa prevencao ou profilaxia das doencas

psfquicas (o que e um absurdo) e sim que se deve definir como 0 emprego

dos recursos psicoloqicos para prevenir as doencas, Como veremos tarnbern

rnais adiante, a psicoprofilaxia, definida desta maneira, e uma parte da sau-

de publica e da higiene em geral e nao s6 da higiene mental.

Dentro da prevencao ou da profilaxia da doenca mental temos que

reconhecer a diferenca entre prevencao especiflca e inespecifica: na pri-

meira se t rata de com bater determinada causa ou elo da serie causal, en-

quanto que na segunda nao podemos agir sobre causas especfficas, sejaporque nao existem ou seja porque nao as conhecemos e temos que aten-

der multiplas situacces medicas ou nao r ned i cas , As situacoas rnedicas nao

sao tampouco, neste caso, de exclusiva responsabil idade do psiquiat ra e

sirn de todos as medicos (obstetras, especialis tas em doencas infecciosas

etc .) . As situacoas nao medicas correspondern ao psicologo ', quer seja por

sua a<;:aodireta ou por seu assessoramento a outros profissionais (educa-

dores, advogados, juIzes, etc. ) em tudo 0 que significa atender os fatorss

psicol6gicos perturbados na vida corrente em suas multiples manifesta-

coes e fenornenos humanos.

A quarta etapa hist6rica da higiene mental e a reabil itacao, que con-

siste na ajuda psicol6gica ao sujei to curado ou curado com certo defici t,

para que possa se re-situar na comunidade e se reintegrar na sua famil ia,reduzindo 0 impacto dos fatores que desencadearam ou condicionaram sua

doenca ou que possam vol tar a torna-lo doente. A intervencao do psic6-

logo na reabilitacao tampouco se restr inge a higiene mental e sirn, como

se cornpreende facilmente, a toda a higiene, em sua totalidade.

A quinta etapa esta dada pela prornocso da saude e aqui e onde se

sobrepoe em certa medida com a prevencao inespecffica, sem que possa-

75

mos em muitos casos (e sem que na realidade tampouco por agora 0 de na planificat; :ao: gravidade do dano, possibi lidade de evitar 0 dano,

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 38/69

necessitemos) assinalar nitidamente os limi tes entre uma e outra. A pro-

rnocao da saude se inclui na denominacao de prevencao positiva, de-

norninacao que nao cremos adequada porque implica fazer girar a sau-

de e todos os fenornenos humanos ao redor da medicina e da doen-

ca.

Em grande parte das situacoes se impfie daramente a diferenca entre

prevencao inespecifica e promocao da saude, ja que a primeira gi ra em re-

dor da doenca enquanto que a segunda se independiza totalmente dela e

constitui 0 campo especifico da psico-higiene. A intervencao de um psico-logo nas tens6es de uma fabrica ou na correta cnacao das criancas ou na

preparacao dos jovens para a vida sexual ou afetiva pertence a psico-higiene

e nao a psicoprofilaxia ou a higiene mental. Com a psico-higiene, 0 psic6-

logo esta situado fora da higiene mental e fora da saude publica, a partir

do ponto de vista organizacional ou insti tucional da mesma e nela 0 psic6-

logo e um profissional autonorno e independente da medicina assistencial e

da saude publica, ainda com todos os pontes de contato que a tarefa do

psicoloqo na psico-higiene tem ou pode ter com a doenca, que sao tantos

como os que podem ter out ros profissionais ou outras prof issoes que nao

estdo incluidas na medicina, na higiene ou na saude publica (como e 0 caso

de professores, arquitetos, advogados, etc.), A doenca e a medicina nao

podem ser os eixos ao redor dos quais se centre toda a vida dos seres

humanos e as di ferencas que t ratamos de estabelecer se voltam com fre-

qiiencia ernbaracosas e diffceis justamente porque conhecemos mais a

doenca e 0 doente que a vida corrente e cotidiana e 0 ser humano em sua

vida real; e posslvel que dentro de pouco tempo possamos proceder em

sentido inverso. E 0 mesmo cabe dizer da psicologia que gi ra ainda, em

grande parte, seja ao redor da clinica e dos doentes ou do laborat6rio e

dos animais; em ambos os casos, fora do homem concreto e da vida em sua

realidade cotidiana.

Em cada momenta e em cada comunidade, a planificacao tem que

contemplar qual e 0 ponto de urqencia de cada um destes objetivos de

atuacao e elaborar certos criterios de prior idade que dependem, e claro,nao s6 do t ipo de problemas que ha que enfrentar com mais urqencia como

tarnbern dos recursos humanos, econornicos e tecnicos: mas a planificat;:ao

tem que contemplar nao 56 a urqencia imediata como tambem objet ivos

de mais largo alcance. Estes criterios nao se acham ainda bem estabelecidos

e seguramente sua tormulacso geral nao podera nunca deixar de ser relati-

va. Molina e Adriasola incluem os seguintes Indices para avaliar a priorida-

76

custo versus dano, rendimentos, atitude da comunidade.

Caplarr' aceita uma classiflcacao que difere em certa medida da que

darnos, mas que tem tarnbern pontos de contato com ela. Dito autor tala

de uma prevencao prirnaria, secundarla e terciaria. A primeira delas se re-

fere a uma redu( :ao do risco da doenca mental ; a segunda, a uma reducao

da duracao da doenca tanto como ao diagn6stico precoce e ao tratame~to

efetivo; a prevencao terciaria se refere a prevenir sequelas e deficit tanto

como ao retorno ou re-adequacao do sujeito curado (parcial ou totalmen-

tel a comunidade.Na realidade. a prevencao secundaria se sobrepde com 0 primeiro e

segundo objetivo da classifica~ao anterior; a prevencso primaria se corres-

ponde com 0 terceiro e quinto, enquanto que a prevencao terciaria coinci-

de totalmente com a reabilitat;:ao. Possivelmente este esquema de Caplan

corresponde mais a realidade e e mais util a partir do ponto de vista de

contar com uma ctassificacao mais simples e pratica.

Outro autor, G. S. Stevensorrl, classifica a prevencso em tres rotulos.alguns deles com subdivis6es:

~ 1 -:- Provencio presuntive: baseada na modificacao de uma condi -

cao associada ou previa a doenca que se presume etiologicamente relacio-

nada, como, par exemplo, intervir sobre a Introversso por nosso conheci-mento de sua relat;:aocom a esquizofrenia: sem que, inclusive, suponhamos

uma relac;ao causal entre arnbas, podemos supor a introversao como uma

situacao intermedia que pode ou nao levar a quadros mais graves.

2 - Prevencso re ls t ivs : a denomina assim porque aqui 0 transtorno

ja apareceu (em sua forma ou expressfo minima), e a rigor nao se deveria

f~'ar de prevent;:ao para estes casos. Aqui inciui tres modalidades: terapeu-

tica, substitutiva e radical. Na primeira se leva a cabo 0tra tamento de es-

tados~ou situacoss menos serias para prevenir outras mais graves; assirn, a

atu.ac;ao sobre fracassos escolares pode impedir ulteriores comportamentos

~eli~uosos ou sociopatioos. A substitutiva consiste na possibilidade de subs-

trtuir um problema ou uma sintomatologia dada por out ra menos seria ou

2 - CAPL~N, G.: Principles of preventive psychiatry. New York, Basic Books,

1964 (Ver sao castelhana : Principios de pSicologfa preventiva Buenos Aires P '_d6s, 1966. " al

3 - ST~VENSON, G.S.: "The prevention of personality disorders", Cap. 35 de

Personstttv and Behavior Disorders, editado por Mc. V. Hunt, New York, RonaldPress, 1944.

77

i--_

J - - - - - - . . . ,

) 'B i hi io te ca " Pr of J o~ e ' S t o r 6 , . " i• •• ,> C ' pOll·'. . . . . - - - - j

--"------_J

menos daninha para 0 sujeito ou para a comunidade, como seria 0 exe r n-

plo de substituir uma fobia ao trabalho por ur n r itual que 0 sujeito podecol6gicos que estao irnplicados na nao-satisfac ;:ao desta s necessidades ou

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 39/69

realizar em sua vida privada, e na clinica observamos com frsquencia estas

substituicdes em ambos os sentidos, no favoravel e no desfavoravel. A pre-

vencao ~reventiva radica l tende a modificacao das condicdes gerais qU~,

sem ter uma relacao especffica como determinante de uma doenca, perm 1-

tem que esta ultima possa ocorrer ou haja ocorrido; inclui medidas como

mudanca de lugar, de lar, isolamento, etc. Quer dizer, trata-se de uma mu-

danca nas condicoes gerais de vida para evadir ou eludir fatores de pertur-

bacao que se conside ram preponderantemente externos.

3 - Prevenr;ao abso luta: refere-se a anulacao das causas e a aplica-

cao de medidas cientfficas e inclui duas modalidades: racional e empfrica.

A primeira se baseia na eliminacso de causas cientificamente provadas, en-

quanto que a segunda se baseia em conhecimentos cuja exatidao nao se

provou cientificamente, mas que a experiencia liga de alguma maneira com

um tipo de beneffcio.

Seja qual for a discussso ou cornentario que possa suscitar este ul-

timo enfoque, nao e menos certo que pode ser um esquema util para en-

frentar problemas de tal magnitude e extensao e, por outra parte, mu ito

do que assina la Stevenson nao faz senao recolher grande parte do que real-

mente se faz na pratica diaria,

Constelacao multifatorial

A promocso de saude (dentro do campo da saude publica e da higie-

ne mental), tanto como a psicoprofilaxia e a psico-higiene, tern sua esfera

. d e atuacao no seio da propria comunidade, sobre todos os aspectos das

condi(,':o~s de vida e do tipo de vida que se desenvolve na comunidade. Tra-

ta-se de intervir sobre uma estrutura tao complexa que constitui uma ver-

dadeira constelacao multifatorial integrada por todas as atividades, insti-

tucionais , normas e intera(, ':Oes que se dao numa comunidade.

Esta constelacao multifator ia l inclui problemas de ordem economica ,

• s ocial e cultural, tais como os de rnoradia, t rabalho, desocupacao, alimen-

tacao etc. e 0 satisfazer estas necessidades, tanto como atender as condi-

co~s sanitarias e ta re fa que incumbe a · saude 'publica e a psico-higiene; a

esta ultima, e~pecificamente, corresponde atender a todos os fatores psi-

78

na promoc ;:ao necessaria para a tende-las na escala que se requer .

Se se trata do problema da afimentac;:ao, por exemplo, a saude p u -blica corresponde regular 0 tipo de alimentac;:ao e sua provisso, tanto como

a qualidads ou carencla da mesma e outros problemas relacionados com es-

tes temas; mas ao psic61ogo corresponde atender 0 problema de habitos

alimentares, preconceitos, rnudancas dos mesrnos, atitudes frente a

negac;:ao ou iqnoranela dos problemas, tanto como sua a tuac;:ao nos organ is-

mos especff icos relacionados com a aiirnentacao,

Como se compreende, este e um capftulo muito vasto que so a ex-periencia podera ir esclarecendo e definindo melhor seus term os e tecni-

cas necessarlas, Por agora, em tudo isto, no que respeita a psico-higiene,e stamos nos cornecos,

Fora do campo da saude publica e da higiene mental, 0 psicoloqo

tem tarnbern um vasto campo de trabalho que requer um conhecimento da

comunidade, de suas caracterlsticas gerais e especificas; e, em certa

medida, podemos expor uma estrateqla minima nesta atividade, que co-bre diferentes itens:

1 - Trabalho do psic6logo na comunidade tomada como totalidade

assessorando os poderes publicos, organismos diretivos, pessoas-chaves:etc.

2 - Trabalho em distintas instituic;:oes da comunidade: familia, fa-bricas, escolas , clubes , pr isdes, etc .

3 - Intervenc;:ao do psic61ogo em distlntas eta pas do desenvolvimen-

to da per sonalidade: infancia, adole scenc ia , juventude , maturidade , velhice.

4 - Periodos de mudanca no desenvolvimento da personalidade: nas-c imento, desmama, puberdade , etc.

5 - Estudo e atencao de acontecimentos humanos significativos en-

quanto sao experiencias de mudanca: casamento, gravidez, divorcio, ado-

c;:ao, r eform a, luto, e scolha de profissao .

6 - Per lodos entices da vida como enfrentamento de uma proble-

matica peculiar : mudanc;:as, imigrac;:ao , doenca, desas tres eccnornlcos , aci -

dentes, etc .

Ainda com a superposic;:ao destes distintos temas desta divisao, ela

pode resultar utll como ponto de partida para orientar 0 psicoloqo nas

rnultiplas face tas de sua tare fa na psico-higiene na comunidade.

Um mlnimo de experiencia neste sentido nos assinala a conve-

niencia de separar a psico-higiena da saude publica e da higiene mental,

oorque, tal como ja 0 disse, a psico-higiene nao gira ao redor da doenca e

79

sim das condicoes habituais e cotidianas da vida nas situacfies reais em que

elas se dao, tornando seus problemas e alternativas em simesmas e em fun-loqica", Em outro paraqrato dizem: "0l imite teorico com que opera a psi-

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 40/69

dio dos seres humanos que intervern em cada uma delas. Se na teoria isto

pode parecer superfluo, a diferenca e de irnportancia quanto as tecnicas,

ao enquadramento, 11atitude e aos objetivos. A atencao, por parte do

psicoloqo, dos fatores psicoloqicos irnplicados nos organismos e nas tecni-

cas da saude publica corresponde tarnbem ao campo da psico-higiene

porque- neste caso 0 psicoloqo nao atende 0 objetivo da saude pub.lica (a

doenca) e sim os organismos e sua estrutura e a tarefa que se realize em

ditas instituicfies ou em setores das mesmas.Assim como tratarnos de esclarecer a diferenc;:aexistente entre 0 tra-

balho do psicoloqo dentro da saude publica e fora da mesma (na psico-

hiqiene}, tambern devemos insistir em que ° psicoloqo nao 56 inter~em

dentro da higiene mental como tarnbern dentro da higiene em sua total Ida-

de, quer dizer, fora do problema das doencas menta is.

Em nenhuma de suas atividades 0 psicoloqo pode ser situado como

auxiliar da medicina. Ainda em tudo 0 que se trate da doenca (mental ou

nao) nas quais a responsabilidade e a direcao e medica, 0 psicoloqo age co-

mo urn profissional integrante de uma equipe ou como um assessor ou con-

sultor em problemas psicoloqicos, ou como um profissional independente

em alguma de suas tarefas especificas dentro das quais ele tem sua propria

responsabilidade profissional (grupos de reabilitaciio, grupos familiares,

terapia psicoloqica, etc.I.

Em slntesa, a psico-higiene ultrapassa 0 campo da higiene; esta ul-

tima se centra em tudo 0 que e relativo a doenca (mental ou nao) e a res-

ponsabilidade e direcso fundamental recai sobre 0 medico, com quem ,0

psicoloqo pode colaborar em condicao de profissional que assume sua pro-

pria responsabilidade no que faz, em como 0 faz ou no que deixa de fazer.

Enquanto que a psico-higiene se refere a adrninlstracao de recursos psicolo-

gicos para enfrentar os problemas relatives ascondicoes e situacfies em que

se desenvolve a vida da comunidade tomada em si mesma e nao tende co-

mo referente a doenca.

Um estorco de interesse foi levado a cabo por um grupo de psicolo-gos mexicanos integrados por G. Cohen De Govia, P. Rivadeneyra Neyra,

J. Fonseca, R. Avendano, L. Carrizosa e J. Ballesteros Mourroy, que, na

revista Higiene, da Sociedade Mexicana de Higiene, publicaram um conjun-

to de estudos introduzindo a denorninacao de psicologia sanitaria para a

"acao encaminhada a aplicacao da psicologia social como teoria, metodo e

pr~tica para 0 enfoque dos problemas de saude publica na realidade psico-

80

cologia sanitaria permite explicar que 0 enfoque multidimensional dos rno-

dos de vida humana que se manifestam no grupo pequeno, dentro do qual

se operam relacoes especfficas conhecfveis por metodo psicossocial, 0 que

permite uma ac;:aointegral e unitaria para favorecer a socializacfio de pes-soas e grupos".

A tarefa e 0 enfoque empreendidos nos parecem meritorios e'irnpor-

tantes, mas nao coincidimos com 0 termo de "psicologia sanitaria" que,

em todo 0 caso. so seria justo aplicar ao trabalho do psicoloqo dent ro da

sauds publica: preferimos insistir na diferenc;:a terminologica que estabele-

cemos ent re higiene mental , psicoprofilaxia e psico-higiene. Por out ra

parte, os autores restringem a definic,;al3para a ac,;aodentro dos pequenos

grupos, enquanto que em psico-higiene devemos, alem disso, acrescentar-

como aspectos nao menos importantes - as instituic, ;oes e a comunidade.

As diferenc,;as que agora assinalo com estes autores nao sao insoluveis,

porque seus t rabalhos estao impregnados do mesmo sentido no qual de-senvolvemos aqui nossa posic,;ao.

o psrcotoqo e a t erap ia

Fora da controversia que existe e pode seguir existindo acerca do

problema do exerc(cio da psicoterapia por parte do psicoloqo, sua inter-

vencao nos problemas terapeuticos sobre um campo mais arnplo que este.

Ouanto ao primeiro dos problemas, referimo-nos reiteradamente no

sentido de que 0 psicologo que adquira a preparacao suficiente deve ser

legalmente autorizado para 0exercfclo da psicoterapia , nas condicoss em

que eJa possa oportunamente se regulamentar (e urge faze-lo), tendo se-

guramente que contar sempre com 0 resguardo de que nao sedeve iniciar

nenhum tratamento psicoterapico sem contar com 0 previo exame medico

e a indicac,;ao escrita. Ainda que este problema seja urgente, 0 que a expe-

riencia assinala na atualidade como mais urgente ainda e a necessidade deque todo diaqnostico medico e toda intervencjio terapeutica [cirurqica OU

nao) nao deveriam se reaJizar sem con t ar com 0 assessoramento psico-

l6gico, enquanto 0 medico OlIo esteja capacitado para faze-lo por si

mesmo. E e evidente que 0 ensino da medicina em rnuitos de nossos ins-

titutos unlversitarios nao contempla esta necessidade nem para os futurosmedicos.

81

Fora da psicoterapia, entendida em seus termos tradicionais, 0 psic6-

logo pode intervir em distintos problemas da pratica medi~a, tais como, -Zona III - (area de problemas). Agrupa as pessoas em uma situa-

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 41/69

entre os mais urgentes - a preparacao emocional dos pacientes que tem

que sofrer intervencao cirurqica, especialmente em inte~ve~c;:6es.~utilan-

tes: nos casos de acidente, para detectar e retif icar tendencias ~ulcldas ou

automutilantes; em grupos de eplleticos, diabetlcos, obesos, hipertensos,

etc., nos que, ainda que 0 tratamento seja eminentemente medico, ~ psic~-

logo pode ajudar na retlf lcacao de pautas de comportame~t~ ~~e tem. rnur-

ta relacdo com a doenca ou com sua terapia, tais como a InlbllfaOsocial do

epileti~O, as transqressfiss de regime nos diabeticos e obesos, h~bitos devida no hipertenso: e tudo isto quer seja diretamente com os pacientes ou

com os que convivem com eles.

Pontos focais para 0 tratamento e a prevencao

Ainda que nao resulte total mente coincidente com 0 aqui exposto~ re-

produzimos 0 qrafico de Blain", que ~ostra uma c.'~ssifi:ac;:aoda populac;:a,oe

das unidades institucionaisem rela<;:aocom a planiflcacao no campo da s~ude

mental. Segundo este autor, os estorcos de prevencao prirnaria se aplicarnnas zonas I, II e III , enquanto que a secundaria se aplica na zona 'N V , ,

Zona'i - (pre-natal e nascimento) Inclui toda a popula<;:ao pre-na-

tal, quer dizer, todas as criancas em gestac;:ao,incluindo 0 nascimento, ,com

seu legado qenetico, desenvolvimento fetal e reacoes ao parto. Tambem a

todos os que nasceram, a maioria deles sadios, mas ligeiramente afetados

geneticamente ou traumatizados ao nascer.

Zona 1/ - (vida normal) Inclui todos aqueles da Zona I que cres-

cern e funcionam normal mente no meio social como bebes, criancas, ado-

lescentes, adultos, de idade media (maturidade) e ancides, Ele~ a~em

e sao influenciados pelo meio - alimentos, familia , c lima, esc~la, l~r~Jae

trabalho. 0 curso de seu desenvolvimento e relativamente satlsfaton~ e,

em sua rnaioria, manejam os altos e baixos da vida sem ajuda exterJ~r.

Permanecem na zona II, exceto quanto necessitam buscar ajuda para satis-

fazer necessidades especiais.

4 - BLAIN, D.: The organization of psyquiatry in the United States", Ca~. 100 do

American Handbook of Psychiatry, editada par S. Ariet i, New York , BaSIC Books,

1959.

82

sua protecao e adaptacao, Assim encontramos as agencias de saude, educa-

c;:aoe bem-estar; medicos familiares, hospitais, agencias de essistsncla pu-

blica, organiza<;:oesespeciais para criancas invalidas, orfanatos, casas para

ancifies, enfermeiras domiciliares, professoras diferenciais, polfcias, cortes

de justica, etc. Nesta zona encontramos gente que passou por um stress

com os conseqi ientes problemas emocionais, que podem ser de ordem se-

cundarla se suas necessidades especiais podem ser localizadas. Tendo eli-

rninado 0 stress, podem retornar a zona II.Zona I V - (doenr;a mental) Inclui todos os doentes mentais e

aqueles com defei tos de origem desconhecida e os que desenvolveram

respostas emocionais de tal magnitude a situacoss de stress que nao podem

ser atendidos nem na zona " nem na III. Necessitam services clinicos(consutras, diagnosticos e tratamentos).

Comunidade

Uma comunidade se define como um conjunto de pessoas que vivem

juntas, no mesmo lugar e entre as quais ha estabelecidos certos nexos, cer-

tas funcoes em comum OU certa organizac;:ao. Ouer dizer que no conceito

de comunidade intervern duas caracterrsticas fundamentais: a geogratica e

a funcional. A primeira se refere a um certo espaco no qual transcorre a

vida dos seres humanos; a segunda se refere aos aspectos que Ihe dao certo

grau de coesao, de inter-relac;:ao,de unidade.

Uma comunidade se diferencia de uma institulcao pelo fato de

que nesta ul tima, se bem que se da tambern a caracterfstica de limi tac; :ao

de um espaco geogratico, os seres humanos nao desenvolvem SU;J vida e sim

s6 uma funcao dentro de sua vida; na insti tuic;:ao, os seres humanos exer-

cem fun<;oes, tarefas que os unem, estabelecendo normas e nexos de todotipo. Por out ra parte, a insti tuicao tern, alem disso, objetivos defin idos

explfcitos e por sua vez uma certa planificacao, pelo menos em alguma

medida. Na comunidade, se desenvolve a vida como vida mesmo, quer

dizer, sem objetivos explicitamente definidos que tenham que ser al-

cancados, como sucede na instituic;ao: tampouco se acha presente, no

geral, a planifica<;:ao:tampouco ha uma tarefa comum que os una.

83

DIAGRAMA DE D. BLAIN

Para Maciver e PageS, "onde quer que os membros de urn grupo pe-

queno ou grande vivam juntos de tal forma que todos eles participam .. _

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 42/69

CLASSIFICACAo ZONAL: POPULACAO

Zona de perturbar;:5es

nao Psiquiatricas

III

Zona

Pre-natal

I

CLASSIFICACAO ZONAL: SERVICOS

CI~rigo, medicos, legistas,

etc. Agencias socials, cor-

tes. Hospitals gerais, err-

nicas. PrisOes,escolas

corretivas. Orfe-

natos e asilos

para anci-

ces. Pre-

ICuidado pre-na-

tal e obstetrlco.Desenvolvimento

fetal. Genetica.Preven ao.

84

das condicoes basicas da vida em comurn", al existe uma comunidade. En-

tao, "0que caracteriza uma comunidade e precisamente 0fato de que a vi-

da de qualquer de seus componentes pode ser intei ramente vivida dent ro

del a". "0 criterio basico de distincao da comunidade reside no fato de

que, dentro dela, pode se manter toda a ralacdo social de uma pessoa".

Desta mane ira , para Maciver e Page, a comunidade e urn espaco de

vida social caracterizado pela existencia de urn certo grau de coesao social.

A situacao geogri ifica ou 0 espaco vital, em si mesmos, nao criam acomunidade; 0 grau de coesao, 0 sentimento de comunidade, podem tal-

tar tarnbern numa comunidade e Maciver estuda os fatores que inclui no

conceito de sentimento de comunidade e os signos deste ultimo.

Possivelmente a definicao mais ampla e mais exata seja a que oferece

Pozas Arcinieqas", quando diz que a comunidade e uma unidade social

com certas caracter ist icas especiais que Ihe dao uma orqanlzacao dentro de

uma area l imitada e que se caracteriza, alern disso, por uma convivencia

pr6xima e duradoura de determinado numero de individuos em constante

interacao. Esse ultimo autor acrescenta out ros fatores: a cornpreensao

mutua, a coordenacao de atividades e a confiquracao de estruturas sociais

para satisfazer necessidades; caracterist icas que nao cremos que sejam irn-

prescindfveis e que seguramente dependem do tipo de comunidade que seestude.

Deve-se ter em conta que a delim ita<;:aode uma comunidade e tam-

bern sempre uma questao relativa e depende de mui tos fatores, dado que

a ampli tude da area territorial e da populacao a qual se aplica 0 conceito

de comunidade, e que se toma como unidade, pode ser muito varlavel,

dado que podemos falar de uma comunidade incluindo nesta denorninacjio

uma parte de urna cidade ou dist intas partes da mesma que tern urn nexo

comum entre si , a toda uma cidade, toda uma regiao ou uma comunidade

internacional; ainda com toda esta relatividade, 0 conceito resulta muito

util, porque permite trabalhar com unidades tecnicamente mais acessfveis

a partir do ponto de vista psicol6gico. Nao devemos esquecer que uma co-

munidade e so uma parte de uma sociedade global, mas nao possufmos ain-:

da os recursos tecnicos suficientes para estudar de maneira relativamente

" - MACIVE R, R.M. e PAGE, C.H.: Sociologia. Madrid, Teeros (ilegfvel), 1960.

G - POZAS ARCINIEGAS, R.: £1desarrollo de la comunidad. Univ. Nac.de M~xico,

1964.

85

rigorosa a psicologia de uma sociedade global, enquanto que, sirn, podemos

tenta-lo no caso de uma comunidade.

cia por resultados praticos nos distancia da possibi lidade de satisfazer nossa

necessidade de conhecimentos cientif icos, pelo menos no momenta atual,

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 43/69

Objetivos

Se bem que nossos objetivos sao os da psico-higiene, estamos numa

.etapa na qual ainda necessitamos muito da investiqacao e esta ultima e 0

objetivo fundamental que necessitamos cumprir na atualidade, dado que

nossos conhecimentos psicoloqicos acerca da comunidade sao totalmente

insuficientes; 0 mesmo poderfarnos dizer de nossos instrumentos de tra-

balho, mas de qualquer maneira e uma tarefa que devemos empreender,

com todos os riscos de erros e confusoes que estao implicitos em toda

investiqacao: corn isso queremos especialmente sublinhar que desejarlamos

nos ver totalmente livres de propositos tais como 0 de conseguir uma mu-

danca, 0 desenvolvimento ou 0 progresso de uma comunidade. A rigor, 0

movimento espontaneo de uma comunidade tem mais "sabedoria" que to-

dos os conhecimentos que possufrnos na atualidade para tentar estes ult i-

mos objetivos enfocados a partir da psicologia.

Creio que, por agora, 0 acesso do psicoloqo a uma comunidade temque ter como objetivo 0 estudo de sua estrutura, de sua orqanizacso, de

seus problemas, da forma como se vive, das normas que a regem, suas

necessidades e a maneira da satisfaze-Ias.

Este objetivo fundamental da lnvestiqacdo, quer dizer, 0 estudo de

uma comunidade com mira ou com fins mais distanciados de psico-higie-

ne, faz com que nossas instrucdes para 0 estudo de uma comunidade te-

nham que ser absolutamente claras, dado que estas instrucdes constituem

o enquadramento de nossa tarefa, quer dizer, as constantes com as quais

temos que trabalhar.

De qualquer maneira, ja sabemos que nunca poderemos realizar uma

investiqacfio livre de suposlcoes, livre de finalidades ou de objetivos, mas 0

importante tambern desta colocacao reside em que, a medida que estu-

damos a comunidade, vamos tomando consciencia de objetivos ou final ida-

des implicitas que de todas asmaneiras existem, mas em forma inconscien-

te ou nao totalmente consciente.

Queremos nos ver livres da urgencia de conseguir beneflcios imedia-

tos ou de obter melhoras ou rnudancas na comunidade, porque esta urqen-

86

dado 0 grau de nossa ignorancia presente.

De qualquer maneira, nos so estudo tampouco e uma recepcdo

passiva de dados e sim que - tal como 0 colocarnos para 0 problema da

psicologia institucional - tarnbern aqui trabalharnos com 0 metoda clfnico

e, de acordo com ele, na medida em que empreendemos determinados

nfveis ou situacdes da comunidade, tratamos de que a mesma tome cons-

ciencia ou conhecimento de seus problemas, assirn como de esclarecer as

fugas ou neqacdes dos problemas reais. 0 que nos interessa e ajudar a

esclarecer os problemas e objetivos que a mesma comunidade tem ja

funcionando em seu seio e - sobretudo - ajudar para que os integrantes

de uma comunidade tomem consciencia de suas ati tudes e de suas possibi-

lidades como seres humanos.

Se examinamos alguns dos livros correntes ou mais comuns que se

publicaram sobre trabalho em comunidade nos encontraremos com fre-

quencia com certas correntes rnessianicas ou "salvadoras" que, no fundo,

nao significam em muitos casos senao 0 quebrar a orqanizacso e a dinarnica

de uma comunidade, introduzindo nela pautas ou interesses que legitima-

mente nao Ihe correspondem, com 0 fim de satisfazer certas necessidades

que nao sao de direto interesse da propria comunidade ou que nao respei-

tam 0 desenvolvimento que lhe e peculiar.E importante assinalar a relacao entre 0 trabalho do psicoloqo na

comunidade e 0 servic;:osocial ou assistencia social e tarnbern como que se

denomina services de comunidade; neste sentido, as diferenc; :as com 0

que expornos ficam facilmente vislveis setranscrevemos alguns dos concei-

tos baslcos relativos a essas disciplinas. S.V. Sierra , em lntroducclon a la

Asistencia Social", diz: "De acordo com a colocacao terrninoloqlcaqus aca-

bamos de fazer, corresponds definir a assistencia social como a disciplina

ou ciencia normativa que se ocupa de estabelecer os principles, normas e

procedimentos para ajudar os indivfduos, grupos e comunidades na soluc;:ao

de seus problemas ou dificuldades. A assistsncia social e sobretudo lnvesti-

gar;:fio e rettexso sobre os fatos, mas nao com a finalidade de um puro

"conhecimento" (ciencia pura] e sim com a fundamental intencso de "fa-

zer", aplicando ditos conhecimentos as sltuacoes reais que sao seu princi-

pio e seu fim (clencia normat iva)". Esta autora reproduz uma definic;:ao

do padre Swi thum Bowers, diretor da escola de Bem-Estar Social da Uni-

7 - Buenos A ires , Ed. Humanitas , 1963.

87

versidade de Otawa, que define a assistencia social como a "discipl ina

profissional que aplica clinicamente 0 conhecimento das inter-relacdes

atividade sanitaria, recreativa, educacional ou cuItural. A orqanizacao pres-

supoe certa responsabilidade administrativa, f inanceira e geralmente vo-

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 44/69

humanas por meio de uma habilidade aperteicoada em materia de rela-

coes com as pessoas. indivfduos ou em grupo, com 0 f im de conseguir uma

adaptacso social mais satisfatoria". A comissao de especialistas nas Nacoes

Unidas define 0 service social como "atividade organizada cujo objetivo

e contribuir para uma adaptacso mutua entre 0 indivfduo e seu meio

social" e "este objetivo se consegue mediante 0 emprego de tecnicas

e rnetodos destinados a que os indivlduos, grupos e comunidades possam

satisfazer suas necessidades e resolver seus problemas de adaptacao a um

tipo de sociedade que se acha em processo de evolucao, assim como por

meio de uma acao cooperativa para melhorar as condicdes aconornicas

e socia is".

M.H. de Bousquet reproduz em Le Service Social8 a definicao dada

por Mary Richmond, criadora da primeira escola de service social nos Es-

tados Unidos, que diz que 0 service social e "a arte de fazer diferentes

colsas para diferentes pessoas, com 0 concurso das mesmas, cooperando

com elas, para conseguir, ao mesmo tempo, melhorar a sua situacao e a

da sociedade . .. 0 service social deseja servir aos homens em sua plenitude

de seres humanos e para isto investiga os rnetodos que desenvolvem a res-

ponsabilidade, reajustando consciente e individualmente entre si os

homens e seu meio social". A autora do livro assinala que, nas definicdesda assistencia socia I , se encont ram duas nocoes basicas: a de equi hbrio

e desenvolvimento do individuo e a de ajustamento, quer dizer, a de

adaptacao: duas nocoes intimamente ligadas.

Neste sentido, 0 service social e 0 trabalho do psicoloqo na comuni-

dade se diferenciam fundamentalmente pelo fato de que este ultimo se

propoe basicamente a investigar a dinarn ica psicoloqica de uma comunidade

nas sltuacfies concretas e reais em que se desenvolve a vida e sua interven-

~ao se reduz a esclarecer os problemas, atuando como assessor ou consu 1-

tor, fazendo tomar insight das situacoes e agindo exclusivamente atraves

de procedimentos e tecnicas psicol6gicas.

Os servicos de comunidade sao organismos mul to mais heteroqe-

neos; munidos muito mais de um proselit ismo que de uma sistematizacao

cient ifica, seja da investiqacao ou da tarefa. Uma das definicoes de "ser-

vico para a comunidade" diz que ele e "urn trabalho planejado, aprovado

pelos membros e organizado em forma de servir a comunidade em uma

8 - Paris, PressesUniversitaires de France, 1965.

88

luntaria" (A. I.H. Trecker) 9. Este livro da tarnbern exemplos de distintas

orqanizacoes e seus objetivos e a transcricao de alguns deles define por si

so as diferencas com 0 trabalho do psicoloqo na comunidade. Assirn, um

ex-presidents do ramo nacional de atividades de service para a

comunidade da Legiao Americana Auxiliar diz: "A palavra ' service' tem

multiples significados. Pode ser uma conduta que cont ribua para 0 bem

dos demais (a real izacao de um trabalho para beneflcio de outros), qual-

quer resultado de uma tarefa que possa produzir ou nao um bem tanglvel

ou, espiritualmente, pode implicar um service assemelhaval ao das

obras de bondade e amor . ._A Legiao Americana Auxiliar nao poderia pro-

por-se melhor final idade que a de prestar um service ill rni tado a todos e

a Gadaurn",

Outra orqanizacao, 0 Clube de Otirnistas, expressa: "A Irmandade de

Otimistas se acha intimamente identif icada com a ideia de servir as comu-

nidades; as Irmas Otim istas estao reconhecidas como mulheres dispostas a

se sacrificarem para satisfazer as necessidades das comunidades. Como

resulta evidente, 0 service e 0 l aco que une mais estreitamente as Irmas

Otimistas de todas as partes." '

Outro organismo, a Camara Jovem de Cornercio, que e a maior or-

qanizacao mundial de homens jovens e conta com mais de duzentos milafiliados, oferece guia em questdes cfvicas a mais de tres mil e setecentas

comunidades do pais. Citaremos suas proprias palavras: "Os interessados

e entusiastas membros da Camara Jovem sao chamados com frequencia

'velas de auto '. Nos aperfeicoamentos de comunidades, sao eles os homens

que conseguem com que 0 povo e os recursos colaborem com mira ao

objetivo do melhoramento da comunidade. Com sua fe e vontade de

trabalhar, acendern a chispa que provoca a a9ao necessaria para que as

coisas marchem ... Em ultima analise , 0 real melhoramento de uma cornu-

nidade deve ser obra de cidadaos conhecedores, interessados e ativos."

No livro de Trecker se encontra a enumeracao dos tipos de projetos

a cargo dos services de comunidade; eles consistem em orqanizacdss que

podem reunir dinheiro para entreqa-lo a indivfduos ou aqencias facuItadas

para distr ibuf-Io e utiliza-lo com fins especi ficos ou gerais; os membros

das orqanizacdes podem prestar services voluntaries a agencias e insti tui-

9 - TRECKE R, A.I .M.: Manual de proyectos de servicio de comunidad. Buenos Ai-

res, Omeba, 1964.

89

c;:oes; os meios, equipamentos, provisoes ou demais bens podem ser submi-

nistrados aos individuos ou grupos para ajuda-los a cornecar ou conti-

dividuos ambiciosos utilizem a inquietude popular para seus fins pes-

seals, ou que um povo frustrado se converta num povo desordenado."

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 45/69

nuar seu trabalho; e as combineciies des tes ss forcos podem desenvolver-

se de forma que se adapte as condicoes e c ir c un st an c ia s v a rl av e is ,

D . Gonzalez, em Proceso del servicio social de comunidad! 0, diz

que ao Service Social nas comunidades se 0 conhece atualmente sob 0 no-

me de "orqanizacao e desenvolvimento da comunidade". Em um relatorio

das Nacdes Unidas a respeito, diz-se: "A expressac desenvolvimento da

comunidade se incorpora ao uso internacional para designar aqueles pro-

cessos em virtude dos quais os esforcos de uma populacao se somam aos

de seu governo para melhorar as condicoes economicas, socials e culturais

das comunidades, integrar estas na vida do pa is e pe rmitir-Ihes contr ibuir

plenamente para 0 progresso nacional, Neste complexo de processo inter-

vem, portanto, dois elementos essenc ia is: a participacdo da propria popula-

<;:ao nos esforcos para melhorar seu nfvel de vida, dependendo todo 0 pos-

slvel de sua propria iniciativa e a subministracao de services tecnicos e

de outro carater na forma que estimula a iniciativa, 0 estorco proprio e a

ajuda mutua e aumentem sua eficacia. 0 desenvolvimento da comunida-

de encontra sua expressao em programas encaminhados para conseguir

uma grande variedade de melhoras concretas. "

Neste sentido, no livro de C.F. Ware, Organizaci6n de la comunidad

para el bienestar social (Union Panamericana, Washington) se sobrepfiemuito mais "service social" com "orqanizacao da comunidade", ja que

esta autora diz que "os prlncipios de toda classe de servico social estao

baseados em um conceito fundamental da dignidade do ser humano, em

qualquer circunstancia e em sua capacidade para se fazer responsavel por

suas proprias decisoes e conduta. Estao baseados tarnbern no conceito

cristao e dernocratico do respeito ao indivlduo e de fazer posslvel 0 desen-

volvimento da personalidade e os talentos de cada um. Presume-sa que emediante uma vida responsavel que 0 indivfduo alcanca seu desenvolvi-

mento potencial."

Esta autora e muito mais clara ainda nas lmpllcacoes pol (ticas de

tais atitudes e de tais objetivos, quando, na pagina 5 do mesmo livro, diz:

"AII~m disso, os membros da profissao de service social e outros I fderes

sabem que se 0 povo nao recebe ajuda profissional para solucionar seus

problemas de uma maneira construtiva existira 0 grande perigo de que in-

10- Buenos Aires, Ed. Humanitas, 1963.

90

I

Sem que a assistencia social e a orqanlzacao da comunidade estejam

sempre tao claramente sobrepostas, de todas maneiras, 0 que nos interessa

sublinhar sao as diferencas que fazem rnediacao entre estas atividades e

profissdes e a atividade e as funcoes do psicoloqo trablhando na cornuni-

dade.!!

Para que fique ainda melhor esclarecido este ponte, faremos um bre-

ve resumo das instrucoes que adotamos para um trabalho de psico-higiene

em uma comunidade, organizado como trabalho pratico para os estudantes

na cadeira de Higiene Mental.

Estas instrucdes foram discutidas, comentadas e assimiladas por to-

dos os integrantes da cadeira, tanto como pelos alunos e constituem uma

parte importante da tarefa (seu enquadramento), de tal maneira que toda

t ransqressao na qual nao se as respeitou rigorosamente era analisada como

um efeito tecnico, t ra tando de caracterizar , alern disso, as consequencias

que isto tinha. Citaremos algumas das instrucoes que cremos de suma im-

portancia,

Em primeiro luqar, necessitamos autorlzacao das autoridades da co-

munidade e de nenhuma maneira tratar de encobrir nossos objetivos ou

nos comprometer com reatizacoes que nao possamos levar a cabo. Este

requerimento de autor lzacao e ja uma tarefa fundamental, em cuja tram i-

tac;:ao vamos recolhendo dados de suma irnportancia e, por sua vez, vamos

esc lar ecendo, nao so nossos objetivos, como tarnbern a func;:ao destas auto-

ridades, assim como significa uma aprendizagem por parte destas ultirnas

da possibilidade de agir ativamente como seres humanos. Esta autorizacao

deve, alern disso, ser colocada e solicitada como uma autorizacao precaria,

no sentido de que fica em mjios das autoridades a possibilidade de revoqa-

la ou limita-la,

Um segundo aspecto que consideramos de suma irnportancia e 0 da

lealdade e 0 compromisso de manter e respeitar a privacidade, no sentido

de nao levar dados de um grupo a outro e de nao tratar senao as situacdas

presentes que se jogam em urn dado momento. Em terceiro lugar, e

embora esteja implfcito no anterior, a veracidade e out ra das condicdes

fundamentais e com isso queremos significar que nao devemos incorrer em

11 - Neste sentido, e de utilidade 0 l ivro de T.R. Batten, Las comunidades y su

desarrollo, Mexico, F.e.E., 1964.

91

nenhuma simulacao ou mentira e em nao ir mais alern do que realmente

desejamos ou nos propomos.

Outro aspecto muito importante - e que nao foi facil cumprir - foi

grande de preconceitos, ta is como 0 de supor que nos interessam especial ou

especificamente as pessoas doentes, ou 0 de que escolhemos uma cornu-

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 46/69

o de nao fomentar a dependencia ou, em outros termos, 0 de nao cons-

tituir uma sociedade de beneficencia, no sentido de que nao nos corres-

ponde fazer coisas pela comunidade que estejam fora de nossa funcao de

psicoloqos, de nossos metodos e de nossas tecnicas, 0 nao fomentar a

dependencia leva lrnplicita a instrucao de incrementar a independencia da

comunidade e de seus membros, agindo nos unicamente como assessores

e ficando em maos da comunidade 0 direito de seguir ou nao nossos es c l a -

recimentos ou nossas interpretacoes.

Conjuntamente com 0 anterior, outra das instrucoes foi a de que a

equips de psicoloqos. em nenhum caso, deve agir por conta propria, quer

dizer, os psicoloqos nao se devem constituir num organismo autonorno,

que age com independencia; ainda que em beneficio da comunidade. N6s

so devemos dar nosso assessoramento e a comunidade e a que ha de assi-

mila-to ou nao.

Outra das instrucdes foi a de nos comprometer a nao publicar ne -

nhum relatorio que nao tenha sido previamente conhecido, discutido e

consentido pelos implicados em dito estudo ou, pelo menos, pelas autori-

dades da comunidade.

Com estas instrucfies. se cumpre tarnbern 0 objetivo de nao realizarproselitismo de nenhuma Indole, em qualquer das acepcoes que possa ter

este termo.

Nossa metodologia e nossas tecnicas se propuseram tambem a nao

"psicologizar" a comunidade, no sentido de que aprendam e se manejam

com termos psicol6gicos e sim todo 0 contrario, 0 de que 0 contato da

comunidade com os psicoloqos possa se r uma exper iencia de aprendizagem

e de certo insight.

Devemos nos cuidar em toda forma de nao introduzir pautas que

correspondam a nossas modalidades de vida e sim tentar compreender as

pautas alheias , neste caso da comunidade.

Nossa experiencia foi a de que os membros da comunidade se dis-

poem a escutar aulas de psicologia como se se tratara de uma difusao de

conhecimentos e e necessario evitar e nao cair nesta tentacao: tentacao que

esta abonada por constituir uma simplificacfo da tarefa (mas tarnbern uma

terg lversacao).

o estabelecimento dos primeiros contatos com a comunidade levou

implicita a necessidade de reformar e modificar uma quanti dade rnuito

92

nidade determinada pelo fato de que constitui urna comunidade doente ou

mais doente que outras, ou porque tem rnais problemas de delinquencia,

de prostituicao, ou de qualquer outro "vlcio",

Comunidade-tipo

A tipologia mais frequents ou os termos que mais comumente se

veem aplicados para definir ou para precisar uma comunidade sao os de

inteqracao e desinteqracao, e na bibliografia 0 que frequenternente se en-

contra e a relacao entre 0 desenvolvimento econornico-social e tecnol6gi-

co e a ruptura de velhas ou de antigas pautas e normas, com a qual a

comunidade passa de uma condicao de integrada a de desintegrada.

Outra classificacao, desenvolvida por Redfield, baseada na diferen-

ca que Tonnies introduziu entre comunidade e sociedade, consiste em re -

conhecer uma sociedade folk e uma sociedade urbana.

A cornunidade folk e aquela que tern caracterfstica de orqanizacao

muito primitiva: pequena, isolada, analfabeta, hornoqenea, com um pro-

fundo sentido de solidariedade grupal, com uma producao de caracteristi-

cas prirnitivas, dedicada fundamentalmente ao autoconsumo. Nela, os

indivlduos sao muito semelhantes e a mobilidade e pequena ou nula, as

normas ou valores estao bem estabelecidos e tern um forte sentimento de

pertenca.

E 0 tipo de comunidade primitiva que deu lugar, no curso do desen-

volvimento, a nossa atual sociedade urbana, sobre cujas caracterfsticas

insistiram muitos auto res, pondo a enfase sobre a desaqreqacao, a descone-

xao, 0 individua lismo, forte mobilidade, desapa recimento do sentimento

de pertenca, novas formas de orqanizacso e forrnacfio de subgrupos. Todo

este processo esta ligado ao desenvolvimento econornico, ao desenvolvi-

mento da tecnologia e, no livro de Scott e Lynton12

, publicado pelaUnesco, poder-se-a encontrar um bom resumo deste tema, que esta eviden-

temente ligado ao conceito de anomia de Durkheim au ao de alienacao

de Marx.

12 - SCOTT, J. e LYNTON, R.P.: Le proqres technique e t 'inteqre tion soc ie te :

Unesco, 1953.

93

Sem que nos proponhamos separar 0 tipo de comunidade da organiza-

c;ao de seus meios de producao e do desenvolvimento da tecnologia estas , dade alienada ou desintegrada precede de uma comunidade de coesjio: es-

ta ultima corresponde a sociedade folk de Redfield, enquanto que a se-

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 47/69

classificacdes nos parecem satisfatorias quanto ao ponto de partida, mas to-

talmente insuficientes para responder a cateqorizacao das complexas condi-

cfies que observamos em toda comunidade e especialmente na que estuda-

mos. Estas deficiencias dos sistemas classificatorios sao muito evidentes para

todos, ate para os proprios autoresque os propuseram, mas, dequalquer rna-

neira, sao pontos de partida que ulteriormente teremos que iraperfeicoando.

Por outra parte, nao so existe um continuo entre estes distintos ti-

pos de orqanizacao da comunidade como tambern podem existir na mesmacomunidade como estruturas sobrepostas.

Nos preferimos, por considera-lo mais conveniente e mais correto,

supor tres tipos de estruturas coexistentes na mesma comunidade e carac-

terizar esta ultima nao somente pelo grau de predomlnio de alguma das

tres e sim pela inter-relacfo dinarnica que estas tres estruturas adotaram ou

tern em uma unica comunidade. Para isto nos baseamos em nossa propria

experiencia sobre estudos de comunidade, mas, alem disso, no que ja sa-

bfamos por nossos proprios estudos sobre grupos e institulcdes.

Niloc reio que neste caso se trate de uma transposicao de um ambito

a outro, quer dizer, de sobrepor ou tratar de compreender, neste caso, a

estrutura da comunidade com categorias que correspondem aos grupos ou

os indivlduos ou as insti tuicoes. Tudo pelo contrario: creio que nao setra-ta de uma transposicao e sim que os quatro ambitos que resenhamos cons-

tituem um so fenorneno e as relacoes entre os quatro ambitos nao sao re-

lacoes de interacso ou relacdes causais e sim que os quat ro ambiros tern

ou possuem urna unidade sstrutural e as mesmas orqanizacoes e as mesmas

estruturas as poderemos encontrar nos quatro arnbitos, dado que nao sao

quatro fen6menos distintos e sim uma so est rutura que nos parcelamos ou

fragmentamos, nao so em nossas categorias cientfficas e sim em nossa pro-

pria maneira ou modalidade de viver ' 3.

Creio que corresponde trabalhar com tres cetegorias de analise e que

frequenternente a comunidade folk se sobrepoe erroneamente com 0 con-

ceito de comunidade integrada. Nos propomos diferenciar entre coesao,dissociacao e inteqracao. A partir do ponto de vista historico, nossa socie-

13 - De todo este problema penso me ocupar em separado, num livro que tratara

sobre as relacoes entre alienacao, psicoloqia e psicopatologia, baseado em um curso

com 0 mesmo titulo, proferido na Escola Privada de Psiquiatria Soci al, no segundo

semestre do ana de 1965.

94

gunda corresponde a nossas atuais comunidades industrializadas. A diferen-

ca fundamental entre uma e outra radica em que na primeira a identidade

e grupal ou cornuni taria, enquanto que na segunda se desenvolveu a indi-

vidualidade. Na comunidade integrada e onde recern se alcanca a person i-

ficacao, que ainda consiste, em grande parte, em uma asplracao e nao em

uma obtencao ja efetiva.

Se bern que estas tres categorias de anal ise podem ser apl icadas ao

desenvolvimento hist6rico das comunidades e servem para caracterizarcada comunidade em sua totalidade, nao e menos certo que consti tui uma

tipologia, em certa medida forcada, porque nao ha nenhuma comunidade

que pertsnca totalmente a urn destes tres tipos. Melhor, 0 que ocorre eo

que encontramos e que estas tres orqanizacoes coexistarn, tanto na

comunidade como nas insti tuicdes, nos grupos e no proprio indivfduo, e 0

que nos interessa numa dada comunidade e poder identif icar que nlveis

da comunidade, que orqanizacoes ou subgrupos ou classes sociais

funcionam com caracterl st icas, quer seja de coesao, de desinteqracao ou

de inteqracao, E 0 outro aspecto interessante ou importante na analise de

uma comunidade e poder situar e compreender as inter-relacoes entre estes

tipos distintos de sub-estruturas. Nao podemos seguir desenvolvendo aqui

esta teoria que propomos para a analise da comunidade, porque ja trans-

cende ou vai mais alern da pr6pria comunidade e abarca tanto 0 processo

de alheamento, de alienacao, como a unidade est rutural dos quatro ambi-

tos e nao s6 a estrutura da comunidade. Este e 0 tema que nos propomos

para a nova publicacso anunciada, na qual trataremos de desenvolver e

detalhar de maneira mais estrita estes conceitos.

Coesao, desinteqracao e integrac;ao sao tres tipos de estruturas que

encontramos tanto na orqanizacao da personalidade como na dos grupos,

das instituicoes e da comunidade, e seguramente necessitamos das tres para

manter urn certo desenvolvimento relativamente equilibrado ou, pelo me-

nos, nao total mente ca6tico. Um aspecto importante e que queremos ja

deixar manifesto e 0 de que as estruturas relativamente integradas e asde-sintegradas (nos quatro arnbitos] se encontram fortemente clivadas ou se-

paradas das estruturas de coesao, fato que nos perm itiu estudar a cornpre-

ender melhor, psicologicamente, a cornunidade.l "

14 - Sobre a comunidade estudada e suas conclus5es se publicara ulteriormente um

relat6rio.

95

4tismo primitivo. A caracteristica fundamental desta identificacao massiva,

cruzada e multiple entre os membros do grupo fami liar configura 0 que

chamamos de um grupo de partieipar;;ao. Tomei este ultimo conceito da

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 48/69

Grupo fam il im e psico-higiene

Em toda planificacao de higiene mental e psico-higiene, a fam Ilia

ocupa um lugar chave, quer como instituicao fami liar, quer como grupo.

Quero incluir agora - dentro deste tema tao vasto - algumas considers-

c;oesrelativas a estrutura e a dinarnica do grupo familiar.

Uma tese fundamental imp l fcita da qual parto nesta exposicao se

refere a que a rnotivacao e a etiologia nao podem ser consideradas em fun-

c;ao de fatores, no sentido elementari sta, tal qual se procede nas ciencias

naturais e, em grande parte, ainda dent~o da psicologia; os t ranstornosmentais sao momentos exagerados, isolados e estereotipados na dinarnica

familiar , do movimento, do curso, do desenvolvimento e transtormacao

do grupo como totalidade e 0 que sempre se considerou como um estu-

do de rnotivacdes ou da etiologia, em termos de fatores, significa nao outra

coisa que uma caracterizacso e isolarnento de momentos mais significati-

vos da totalidade da dinarnlca familiar.

Aceito tarnbern como totalmente correta, para seu objet ivo, a divi-

sao que Cooley estabeleceu entre grupos primaries e grupos secundarios,

postulando, alern disso, que a diterenca entre um e outro se assenta nos

rnecanismos de projecao em jogo e nos resultados desta projecao. Nos

grupos secundarios, a projecaoeuma projecao discriminada de objetos

internos ou de partes do ego, enquanto que 0 grupo familiar (grupo pri-

mar io) se caracteriza (alern de tudo 0 estabelecido pelo proprio Cooley)

pelo fato de que os mecanismos de projecso se fazem com caracterlsticas

massivas e que a identificacao que resulta dessas projecoes massivas faz com

que este grupo prirnario, a familia neste caso, funcione num nivel de organi-

zacfio que os psicoloqos, entre eles Walton, caracterizaram como um sinere-

96

antropologia, tal como 0 estabelece fundamentalmente l.evv-Bruhl, en-

tendendo que a partlcipacso implica que a identidade nao seja senao

uma ident idade grupal e que no grupo familiar a identidade nao e de cada

um dos individuos integrantes do grupo famil iar. Em outros termos, e de

acordo com investiqacoes realizadas com 0 rnetodo da psicanalise clinica

dizemos que a familia se caracteriza fundamentalmente pelo estabeleci-

mento de uma simbiose e que nela intervern, se concentra, a parte psie6tieada personalidade de todos os seus inteqrantes.

Entendemos por parte psicotica da personal idade aquela parte da

personalidade que ficou nos niveis mais imaturos e regressivos, que secarac-

terizam fundamentalmente por uma falta de discrimineciio entre eu e nao

eu, entre objeto interno e depositarlo: de tal maneira, a simbiose e 0teno-rneno clfnico caracteristico do grupo familiar; 0 sincretismo e um de seus

atributos, enquanto que a participacso e 0 fenomeno dinarnico fundamen-

tal ou "mecanismo" pelo qual seestabelece ou se mantarn 0 sincretismo dasimbiose familiar.

A dinarnica do grupo familiar se caracteriza por ser a familia 0reser-

vatorio ou 0 depositario da parte menos diferenciada ou menos discrimi-

nada da personalidade eo traco cultural conternporanso reside tanto nestefato como em uma profunda dissociacao concomitante entre 0 intra

e extragrupo familiar, de tal maneira que neste ultimo (e qracas ao pri-

meiro fenomeno ja assinalado) resulta possfvel que um sujeito atue na

parte mais adaptada, mais discr iminada, mais evoluida de sua persona-lidade.

Em sintese, podernos dizer que no grupo secundario ha intersciio

(projec;ao-introjec;:ao) e se age em func;:ao de reciprocas internalizac;:5es

discriminadas; t rata-se de pessoas que formam um grupo. No grupo pri -

mario, trata-se de um grupo que - no melhor dos casos - formara pessoas.

Nele nao ha interac;:ao e sim psrticipecso: a identificac;:ao projetiva e mas-

siva e todo 0 grupoeum sistema unico: nao ha projec;:ao-introjec;:aoe sim

so identif icacflo projetiva, na qual cada membro e s6 parte de um todo e

por si mesmo nao const itui um todo nem uma unidade psicol6gica. Como

veremos, a instalacao da introjec;:ao-projec;:aosignifica um progresso na in-

dlvidualizacao, Um grupo familiar sadie e aquele no qual seda este ultimo

processo (de discrirninacao, diferenciacao e personificeeso). Devemos

ter em conta que ambos os sistemas (Interacso e particlpacaol coexistem,

97

podendo alternar em distintos momentos, e que nossa exposicao e esque-

rnatica para simplificar.

As psrturbacdes (normais e anormais) nao s6 dependem da dinamica

externo ou num meio indiviso. Para desenvolver estas ideias me baseio fun-

darnentalrnervts. como ja 0 disse, em inves tlqacoes clfnicas sobre 0 fen6me-

no da sirnbiose e no reconhecimento que fiz de que inicialmente, desde 0

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 49/69

do intragrupo familiar como tambern, alern disso, da dinarnica no extra-

grupo e das relacoes entre ambos. Existem transtornos ou parturbacoes da

familia que aparecem como consequencia da dinarnica intrinseca ou intra-

grupo, como pode ser 0 caso de mudanca por causas diferentes, entre elas

a morte de urn de seus membros, afastamento, casamento, nascimento de

novos membros, etc. Mas tarnbern temos que contar com que uma varlacao

no extragrupo, uma rnudanca que se produza na parte mais discriminada

e no setor mais maduro da atividade da personalidade pode fazer com que

a psrturbacao nao aoareca ali, onde inicialmente se origina, e sim dentro

do grupo famil iar.

Quero tarnbern me deter, antes de prosseguir, em outras caracterfs-

ticas fundamentais que tern 0 grupo s imbi6t ico (grupo familiar). AIE~mdas

caracteristicas descritas por Cooley: relacao face a face, relaC;ao profun-

damente emocional, etc., a simbiose do grupo familiar e uma estrutura

que resiste grandemente as mudanc;as intra e extragrupais: nela se produ-

zem polarizar;oes extremes, que subs tituem a verdadei ra div lsdo esquiz6ide,

tal qual foi estudada pela escola de Melanie Klein e seus discipulos Bion

e Rosenfeld. 0 tipo mais primitive de relac;:ao simbi6tica no grupo familiar

se da no que chamamos de 0 t ipo de grupo aglut inado. Nisto concordamoscom algumas anti gas lnvestiqacfies de Mme. Minkovsky sobre 0 grupo fa-

miliar de pacientes epileticos, cujas conclusoes podemos corroborar em

nossa propria sxperiencia clinica. Este grupo aglutinado funciona como

uma totalidade, na qual os papeis (nao as pessoas) se acham em urn inter-

jogo de relacoes e cornpensacoes dependentes; a identidade e grupal e ha

urn deficit da identidade individual ou, melhor dito, nao ha nenhum in-

dice de lndlvlduacao, pelo qual os individuos possam aqir como seres in-

dependentes, que possam reconhecer os demais integrantes da fam (Iia

como indivfduos distintos dele mesmo. Trata-se , para utilizar uma termi-

nologia mais psicanal itica , de uma verdadeira organizar;fio nsrcisistics, no

sentido de urn predomfnio de uma estrutura nao discriminada (falta dis-

crimlnacao mundo interne e mundo externo, eu e nao eu). Mas' na sim-

biose este predomfnio da .orqanlzacfio indiscriminada nao se del unicamente

dentro da esfera individual de cada sujeito e sim que 0 mundo interne se

projetou sobre 0 mundo externo, de tal mane ira que nao ha uma discrimi-

nac;:ao entre objeto interne e depositarlo: cada urn dos membros do grupo eparte do mundo interno,.que nao esta dentro de cada sujeito e sim no meio

98

momenta do nascimento, cada individuo nao e uma unidade fechada, que

tern que se abrir gradualmente, e sim que existe, desde 0 primeiro momen-

to do nascimento, e ainda antes, urn sincretismo, uma falta de discrimina-

c;ao de eu e nao eu, quer dizer, 0 mundo nao e ainda nem mundo interne

nem externo e sim uma totalidade indiscriminada (lndivlsal, da qual gra-

dual mente tera que se reconhecer, que se diferenciar, mundo externo ou

interne e e s6 entao que se estabelece urn mundo interne dentro do su-

jeito, diferenciado do mundo externo. No comeco, nao ha, entao, nem

prbjec ;:ao. Estas ultirnas s6 podem operar quando ja se estabeleceu cer ta dis-

crirninacao na orqanizacao ou estrutura sincretica indiferenciada. Quer di-

zer que 0 processo que se cumpre na dinarnica familiar nao e 0 de uma

conexao progressiva entre os membros da familia e sim urn processo de

gradual desprendimento e individuacao entre os membros da familia. No

grupo aglutinado, esta diferenciacao e discrimlnacao, indlviduacao e per-

sonificacao, nao se alcancou ou persiste em seus umbrais mais primitivos.

Para mostrar a repercussao deste fato, que esta inversao dos termos

do desenvolvimento qenetico acarreta, quero referir-me sumariamente ao

confl ito edipico e 11relacao inces tuosa. Classicamente, 0 conflito de Edipo

se estabelece como uma relacao do menino com seu pai e sua mae, mas, deacordo com este enfoque que colocamos, temos que valor iza r e spec ia lmen-

te tudo 0 que se passou a chamar de nfveis pre-qenitais do conflito edfpico.

Na realidade, neste sincretismo primitivo predomina a relacao do menino

com sua mae, mas nele nao se diferencia ainda 0 menino de sua mae; tam-

pouco diferencia a sua mae da totalidade, do resto do mundo externo. 0

primeiro passo se da quando 0 menino faz uma pequena discriminacao

entre ele mesmo e sua mae, tarnbern entre sua mae e outra parte que enao mae; neste momento, e quando se estabelece 0 conflito edjpico como

uma relacao triangular. 0 conflito edipico e assim uma das vicissitudes da

fusao-dlscrlminacao do nivel de orqanizacao sincretica. 0 que se chama de

cena primaria nao e outra coisa que esta fusao primitiva, que, desta manei-

ra, nao se produz entao por uma uniao da mae com 0 pai e 0 abandono

consequents do menino e sim por uma persistencia ou retorno ou reqressfio

a este nivel tao primitive, onde existe uma fusao entre mae e nao mae ou,

melhordito, onde ainda nao ha discrlrninacso entre mae e nao mae e sim

urn pequeno esboco entre ele mesmo e sua mae. Neste grupo aglutinado, a

aqressfio joga urn grande papel, porque e 0 lnstriirnento pelo qual cad a

99

um dos membros tende a se afirmar reativamente e nao se ver totalmente

fusionado num grupo indiscriminado e sincretico, 0 mesmo ocorre com 0

problema do incesto. 0 incesto traz um perigo de fusao, de perda dos limi-

quiz6ide ou disperso, em troca, ocorre 0 contrario, quer dizer que as ativi-

dades fundamentais que 0 sujeito desenvolve se fazem no extragrupo, com

grande frequencia com um alto nivel de adaptacaoou de maturidade, as

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 50/69

tes certamente ja conseguidos de um individuo com 0 resto do grupo, de

tal maneira que 0 horror ao incesto e hostilidade ou aqressso se unificam

como dois instrumentos fundamentals, com os quais se estabelece uma dis-

tancia e se rnantern os pequenos esbocos de discriminacdo, A dlnarnlca fun-

damental se estabelece ao redor de duas linhas diretrizes: por uma parte, a

luta contra a fusfio: mas, por outro lado, 0 sujeito necessita manter seu

vinculo neste nlvel com seu grupo familiar, porque nelese acha fundamen-

talmente controlada a parte psic6tica de sua personalidade, que, de outra

maneira, sofrera perigo de dissolucao, de dispersao, de desorqanlzacao psi-

cotica (esqulzofrenlcal, Toda a dinarnica neste nucleo aglutinado pode ser

entendida tarnbern como uma a lternancia entre claustrofobia e agora fobia.

o outro tipo extremo do grupo familiar e 0 que podemos chamar de

esquiz6ide ou disperso e nele cad a um dos integrantes, ou parte dos in-

tegrantes, incorporam 0 grupo indiscriminado como objeto interno e esta-

belecem a simbiose com 0 grupo dentro de si mesmo e, por uma formacao

reativa, na qual se utiliza 0 horror ao incesto e a hostilidade ou a aqressao,

o grupo se dispersa ou se bloqueiam as relacoes emocionais, que passarn

a ser frias e distantes. E , em todo 0 caso, uma forma de defesa frente a

fusao e a perda de identidade. Um minimo de identidade [lndivlduacso)fica aqui conservado at r aves desta dispersao ou dissociacso esquiz6ide;

a independencia e aqui um isolamento reativo e nao uma boa resotucso

da dependencia simbi6tica. 0 individuo pertence ao grupo, ja nao de rna-

neira fisica direta e sim porque age em funr;:ao do grupo, quer seja seguindo

suas pautas ou recorrendo a formacoes reativas contra 0 mesmo.

Se relacionamos isto com 0 comportamento dos membros do grupo

no extragrupo familiar, podemos tambem ver uma diferenr;:a, no sentido

de que um integrante de um grupo familiar aglutinado realiza todas as

suas funcdes em estreito ligamento com 0 grupo familiar e suas conexdes

ou relac;:5es mais maduras ou mais integradas sao bastante reduzidas com

o extragrupo, porque 0 maximo de identidade e grupal e 0 maximo de

protecdo 0 encontra desenvolvendo suas atividades e funcoes emocionais

e nao emocionais dentro ou em estreita relac;:ao com os demais integrantes

do grupo familiar que, com grande frequencla, nao se reduz a famllia-tipo

e sim que inclui uma grande quantidade de outros membros da familia

ligados entre si por diferentes graus de parentesco e nao somente 0 de

esposos ou de pais a filhos, como no caso da familia-tipo. No grupo es-

100

vezes s6 de adaptacao racional ou intelectual, mas, de qualquer maneira,

o predominio das relacoes e extragrupa l ou extra familia r e nao intrafami-

liar, como no caso anterior .

Pelo que havemos dito, a funCao institucional da familia e a de ser-

vir de reservat6rio, controle e sequranca para a satisfacao da parte mais

imatura ou pr imitiva , narc isfstica , da pe rsonalidade , mas, ao mesmo tempo,

pelo estabelecimento de uma boa relaceo simbi6tica dentro do grupo fa-mil iar (relacso simbi6tica normal e necessaria) , 0 grupo familiar, dentro de

sua dinarnica normal, permite 0 desenvolvimento das par tes mais adaptadas

ou mais maduras da personalidade no extragrupo. Poderiamos esquemati-

carnente dizer, em relacao com a dinarnica do grupo familiar, que a patolo-

gia deriva fundamental mente dos seguintes fatos: 1 - que a simbiose nao

funcione como situacao de sequranca dentro do grupo familiar e se trans-

forme numa simbiose patol6gica, caracterizada por um retorco da parti-

clpacso e uma absorcso do individuo de tal maneira que nao permite 0

estabelecimento de uma clivagem entre intra e extragrupo e - portanto -

nao da lugar ao desenvolvimento de relacdes extragrupais e ao suficiente

desenvolvimento da identidade pessoal; 2 - em outro caso, a simbiose tam-

bern e patol6gica, mas se introjeta, de tal maneira que 0 suje ito pode con-

seguir um certo grau de desenvolvimento da identidade, da personalidade e

de suas relacoes extragrupais, mas ao custo de uma forte dlssoclacso com

toda a sua vida emocional e afetiva, que se acha, entao, num grave deficit.

Destes do is f ates, se podem inferir as rnanitestacbes ou tr anstornos mentais

em sua relacao com a dinarnica do grupo familiar:

1 - Simbiose normal: reservat6rio familia r da parte mais pslcotica,

Clivagem intra-extragrupo, mas irrteracao entre ambos, que permite 0 de-

senvolvimento e individuacao no intra e extraqrupo, Uma simbiose grupal

nao e sempre normal. Passa por estaqlos como a 2 e 0 3 (reversiveis).

2 - Simbiose patol6gica: absorcao massiva do individuo no intr agru-

po. Rela<; :ao mais normal no extragrupo, mas de carater fundamentalmente

intelectual ou racional, a) Forte clivagem intra-extragrupo, sem interacao

entre ambos. 0 desenvolvimento s6 se faz na parte da personalidade liga-

da ao extragrupo. b) Falta clivagem intra-extragrupo: deficit global do

desenvolvimento da personalidade.

3 - Autismo: introjeejo do grupo familiar como nucleo: forte de-

pendencia dele. Bloqueio no intra e extragrupo, au desenvolvimento neste

101

ultimo de relac;:5esesquizoides, distantes, frias, racionais. Pode-se com pen-

sar 0 contato com atividade man iaca, contraf6bica ou psicopatica.

Em sfntese: a simbiose e 0 autismo sao etapas da dinarnica familiar,

ja tem estabi lizados seus dist intos segmentos da personalidade, e out ra

parte do grupo que tende a evoluir, a estabil izar , a discriminar, a desenvol-

ver talvez uma maior identidade individual; nestes casos, entao, produz-se

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 51/69

quer seja como estaqios transi t6r ios ou como estereotipias patol6gicas.

Deixamos de lado 0 estudo mais detalhado das vicissitudes dinarnicas nor-

mais e patol6gicas de cada uma destas organizac;:5es.

Entre estes dois tipos de estrutura grupal fam i liar - aglutinado e

disperso - se acham outros tipos de grupos que estfo caracterizados por

recorrer a outros mecanismos relacionados com estes dois, mas que estao

situados de maneira interrnediaria: referimo-nos, fundamentalmente, asrelacfiss ou manifestac;:5es tanto pslcopstices como hipocondrisces. Na

psicopatia, t rata- se de uma fuga da fusao claustrof6bica de um grupo pa-

tologicamente aglutinado. Isto poder-se-ia estudar a caracterizar especial-

mente no estudo do desenvolvimento dos adolescentes, nos quais sao mui-

to frequentes as rnanifestacoes psicopaticas, que aparecem como uma rea-

c;:aocontra a fusao e contra a dependencia do grupo aglutinado, quer dizer,

contra uma simbiose extrema e patoloqica, A reacao hipocondr iaca, as

manifestac;:5es hipocondrfacas, tanto como as doencas psicossornaticas

tern 0 mesmo valor que as manifestac;:5es pslcopaticas. No entanto, torna-se

tarnbern de radical importancia que nao possamos fazer uma dernarcacao

muito estri ta entre normalidade e patologia , no que se refere a dinamica do

grupo fami liar; momentos normais e momentos patoloqicos estao em in-teracao dialetica e so podemos falar de normal idade ou patologia frente a

uma relativa estabilidade ou perdurabilidade ou estereotipia de determi-

nados mecanismos ou de determinada estrutura ou orqanlzacso da Gestalt

familiar. Com isto, queremos significar que normalmente se produzem es-

tas manifestacoes. tanto psicopaticas como hipocondrfacas ou psicossorna-

ticas, em qualquer grupo familiar , em distintos momentos em que tem que

enfrentar rnudancas em sua estrutura, quer seja por rnudancas intra ou ex-

trafamiliares, de tal maneira que tanto as proprias manifestac;:5es psicopa-

ticas como a reacao hipocondrfaca e a doenca psicossornatica podem ser

momentos de passagem, em direcao a uma maior discrirninacao entre eu

e nao eu, entre mundo interno e externo, entre0

sujeito ou indivfduo eseus semelhantes dentro e fora do grupo familiar.

A patologia mais importante do grupo fami liar, no entanto, nao se

da nos casos que temos estado resenhando; pelo menos, nao sao os mais

importantes como causas da consulta ao psiquiat ra ou ao psicanal ista. 0

que 0 grupo percebe fundamentalmente como uma situacao patoloqica eo desajuste ou desacordo entre as necessidades de uma parte do grupo, que

um desajuste, que e 0 desajuste acusado pelo grupo familiar, pela parte

mais estabilizada Iestereotipada) do grupo familiar. De tal manei ra que

quando 0 grupo familiar consults, 0 faz acusando 0 agente de rnudanca,

com a fantasia de que curar implica que este agente de rnudanca se

resti tua 11estereotipia anterior para que deixe de "perturbar". Dacompre-

ensao destes fatores, derivam-se diretivas fundamentais para a lnvestlqacdo

e, sobretudo, para a asslstencia do grupo familiar ( terapeutica e psicopro-filat lca). Ha que ter em conta que, assim como 0 grupo familiar e 0 deposi-

tario da parte mais imatura ou simbi6tica da personalidade, da mesma rna-

neira e 0 grupo que mais tende a estereot ipia, porque necessita ter muito

bem controlada a parte psicotica da personalidade, para que, em certa

medida, se possa desenvolver uma parte mais discriminada e adaptada

da personalidade no extragrupo. A estereotipia maior se encontra naque-

les casos de grupo familiar que chamamos de "0 circulo de ferro", que

consiste num reforco de toda a dependencia ou participacjio slrnbiotica,

um retorco da identidade grupal e uma quase inexistencia de vida extrafa-

miliar; nao ha interjogo de papeis e sim estereotipia de papeis muito fixos.

Neste caso, os papeis sao multo rfgidos e mui to severamente mantidos; a

patologia, nestes casos, costuma ser mais severa (suicidio. psicose, etc. ),mas tarnbern pode dar-se como circunstilncias -fenornenos ou acontecimen-

tos que 0 grupo familiar nao pode detectar diretamente como tenornenos

patoloqicos: referimo-nos a frequencia de acidentes, a cornpulsao a inter-

vencoes cirurqicas, a persistencia de lutos nao elaborados que pesam

enormemente sobretodo 0 grupo familiar. Mas tarnbern costumam ocor-

rer fenornenos mais claramente patol6gicos e notorlos, como a crise

epiletica ou a desorqanlzacso psicotica, os episodios de mania ou me-

lancolia.

Quando 0 suporte narcisfstico endogrupal (a simbiose familiar) fa-

Iha, pode ocorrer uma desorqanizacao psicotica, que pode seestabilizar ou

se estereotipar como uma psicose, que pode se resolver pelo restabeleci-mento de uma rela9ao simbi6tica endogrupal, com 0 mesmo ou outro gru-

po, mas que pode tarnbern ser a ocasiiio de aprendizagem, de uma discri-

minacao. Estes sao os casos que French e Kassanin estudaram e, posterior-

mente, tarnbern 0 fizemos nos, que a desorqanlzacao psicotica serve como

uma verdadeira aprendizagem, ja que a desorqanizacao psicotica rompe 0

sincretismo primitivo e permite uma discrirninacao ou, pelo menos, pode

102 103

permiti-Ia se se age terapeuticamente de forma eficaz ou bem se as condi-

<; :oesse dao espontaneamente de maneira favoravel,

Ouero me referir agora a outro nlvel no qual pode funcionar 0grupo

profunda da dinamica familiar! e 0 procedimento insupe ravel. Mas quero

sublinhar particularmente que 0 rnetodo clfnico nao consis te somente nis-

to e sim num enquadramento rigoroso da observacao: isto significa que de-

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 52/69

familiar, pelo desenvolvimento ou a introducao no intragrupo de pautas

mais discr iminadas, aprendidas ou incorporadas em inter-relacao com 0 ex-

tragrupo. Nestes casos, a cl i vagem entre 0 intra e 0 extragrupo e menos ta-

xativa e permite uma certa inter-relaefio ou bem porque a simbiose do gru-

po familiar e multo mais normal e permite , entfio. 0 desenvolvimento ou

a personificacao. em certa medida, de seus integrantes. Nestes casos, 0

que aparece fenomenologicamente, em primeiro lugar, nao e a aqlutinacao

ou a dispersao dos casos anteriores e sim mecanismos neur6ticos: obsessi-

vos, f6bicos, paran6ides ou histericos, No en t anto, detras de todos estes

mecanismos de orqanizacao neur6tica do comportamento e da relacac in-

tragrupal, poder-se-ao encontrar com certa maior ou menor facilidade os

n iveis psic6ticos que subjazem e que tentam ser elaborados at raves des-

tes mecanismos neur6ticos. Ja aqui nos encontramos com uma estru-

tura grupal mais evoluida, onde a discriminscso permite a atuacao de

defesas neur6ticas e, portanto, a intereciio (em lugar da participa-

<;ao).

Quero assinalar, alern disso, que 0 problema da mudanr;a como

uma situacao normal conflituosa ou perturbadora, ou etioloqica, nao se

refere a causas extragrupais e sim que a rnudanca corresponde a pr6prianatureza (a dina rnica ] do fenorneno psicoloqico, corr esponde ou pertence

11natureza Intima ou intrlnseca da dinarnica do grupo familiar, de tal ma-

neir a que 0 que isolamos como fatores etiol6gicos ou causais sao s6 rno-

mentos das multiples relacoes que se estabelecem ou que se hajam esta-

belec ido na dinarnica do grupo familiar.

As situacoes de rnudanca podem provocar tres t ipos de ansiedades:

confusional, paran6ide e depressiva; mas a ansiedade caracteristica do gru-

po primar io (simbiotlco] e a ansiedade confusional. E so com a lnt roducao

da dlscrirnlnacao, a lnteracao (projetiva- introjetiva), que poderao apa rece r

nao so a ansiedade paranoide e a depressiva, como tambern 0 conflito,

que requer uma previa discriminacao para que haja contradicao. Nos

niveis simbi6ticos s6 existe a ambigiiidade e, em todo 0 caso, 0 confli-

to se da entre esta ambigiiidade e 0 nlvel mais integrado, mais rnadu-

ro o

vemos estabelecer uma quantidade de constantes que devem ser irremovl-

veis, entre as quais se encontram lugar, tempo, duracao das entrevistas,

tanto como 0 papel do observador, fatores constantes que emnenhum

caso devem entrar na ambigiiidade, sob pena de que a observacao se faca

ou se transforme em uma observacao caotica da qual nao seja posslvel ex-

trair conclusoes validas. 0 outro fator que queremos assinalar dentro do

metoda cI [nico, tal como 0 empregamos, e que a observacao nao se faz

unicamente como observacao pura e simples e sim como uma indagar;ao

operativa, quer dizer que devemos introduzir, ou que introduzimos, assi-

nalacdes e interpretacfies da dinarnica familiar no aqui-e-agora, e cada uma

destas interpretacfies ou assinalacoes configuram hipoteses que sao postas

a prova e ratificadas ou corrigidas de acordo com as respostas que se obte-

nham pela introducso de cada uma destas hipoteses em forma de uma nova

variavel, Cremos de fundamental irnportancia, e 0 cuidamos muito especial-

mente, que todo assinalamento e interpretacao nao recaia na esfera ou na

area individual dos integrantes da familia e sim, fundamentalmente, sobre

a inte racao, sobre 0 interjogo de papei s que tem lugar no aqui-e-agora en-

tre os integrantes da fam Ilia e com 0 terapeuta, que age como observador

participante, de tal maneira que possa jogar os papeis sem assumi-los: para

isto, deve trabalhar com uma divisao esquiz6ide instrumental, que Ihe

permite, em parte, estar vivendo empaticamente os fen6menos que

ocorrem no aqui-e-agora, mas ao mesmo tempo ter e manter uma parte do

ego como observadora e fora do vaivern da dinarnica da inter-relacao que

se estabelece entre os membros do grupo familiar e entre estes e oobserva-

dor par ticipante ou terapeuta.

Como e facil deduzir, toda esta sistematica do metoda clfnico se

acha fundamentalmente derivada da sistematica que seguimos para 0 esta-

belecimento da observacao, da investiqacao, e da terapia dentro do enqua-

dramento do rnetodo clinico, tal como se utiliza na psicanalise clinica,

Damos especial irnportancia, na tarefa de observacao e de investiga-

<;:ao, a os n I veis pre-verbals de cornunlcacao, quer dizer, nao somente ao

significado do conteudo explicito verbal de lnter-relacso, como tambern ao

104 105

Ouero me referir sumariamente ao rnetodo e a tecnica que util iza-

mos na investlqacao do grupo familiar. Encontramos que 0 rnetodo clfni -

co, quer dizer, a observacao rigorosa, met6dica, prolongada, intensiva e

1 - Nao descarto, de nenhuma maneira, outros me tod os ou tecnicas. mas creio -

sim - que as tecnicas experimentais devem trabalhar em estreita colaboracao com 0

metoda clrnico.

significado do conteudo irnplicito ou pre-verbal. E sublinhamos lsto, por-

que nossa diretiva fundamental se refere a obssrvacao e investiqacdo dos

nfveis psicoticos, e como ja 0 assinalamos em trabalhos anteriores sobre

simbiose e 0 de simbiose patoloqica (com a cornpreensao dos fenornenos

de participacao, sincretismo, identlficacao projetiva massiva) resultam ser

instrumentos conceituais e categorias que caracterizam fatos clinicos que

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 53/69

psicanalise clfnica, a simbiose e fundamentalmente uma relar;:aomuda,

quer dizer que tem que ser intencionalmente detectada e posta a manifes-

to, porque se da como implfcita; em outros termos, serve de enquadra-

mento, de conjunto de constantes a mesma dinarnica do grupo familiar,

mas se nao intervimos sobre a propria simbiose, nao vemos os fatores mais

importantes da rela<;:aoe da dinarnica familiar e tampouco podemos inter-

vir efetivamente com resultados validos, Em resumo, poderfamos dizer

que na tecnica seguida nos guiamos pelos seguintes objet ivos: 1 - trans-

formar a participacao em lnteracao. 0 que Ii equivalente a 2 - introduzir

a divisjio esquizoide em lugar da fusao e da ambiqiiidade e 3 - transformar

as confusoes em conflitos.

Ouero assinalar tarnbern, embora nao me seja posslvel desenvolve-

10 aqui, que a caracterizacao da dinarnica do grupo familiar, em termos de

estrutura de comportamento e um dos instrumentos mais validos e mais

frutfferos que achamos ate 0 presente; a concepcao de estruturas de com-

portamento se relaciona com a teoria das relacoes objetais e tarnbern com

a teoria da cornunicacao. As bases de tudo isto foram desenvolvidas em

outros trabalhos e nao podemos nos deter agora em explicita-las mais

detalhadamente.

Conelusfies

Ouero voltar a sublinhar que encontrei como particularmente per-

turbador e paral isante da investiqacao 0emprego dos esquemas causallstas,

monocausalistas e unidirecionais , aos quais nos acostumou tanto 0 rneca-

nismo, com 0 qual se estruturam as ciencias natura is. Alern disso, um fato

fundamental que nos permit iu ver com maior clareza uma grande quant i-

dade de problemas do grupo fami liar se refere a rnudanca radical no enfo-

que, que ja foi assinalado no corneco: 0 fato de que 0 individuo nao nas-

ce como um ente isolado, que se conecta gradual mente e sim que nasce

imerso numa inter-relacao massiva global, numa orqanizacao sincretica: dito

de outra maneira, os indivfduos nao formam os grupos e sim que, inversa-

mente, os grupos formam indivlduos e - as vezes - pessoas. 0 conceito de

106

tern uma qravitacao fundamental para compreender a dinarn ica do grupo

familiar , tanto em seus fen6menos normais como em suas manifestacoes

patol6gicas.

107

56 - Pela indole das ataccdes mentais, a grande maioria delas requer,

na profilaxia , atender ou evitar nao causas especfficas e sim uma complexa

constelacao multifatorial de indole social (educacao, relacao mae-filho,

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 54/69

P ersp ec tiv as d a psicanalise e psico-higiene

Achamo-nos, na atual idade, ante 0 que poder-se-ia denominar

sem exagero - uma verdadeira situar;ao de emerqencis no que con-

cerne ao problema da saude e da doenca mental e frente a necessida-

de de elaborar e aplicar pianos de vasto alcance social (em extensso e

em profundidade) no terreno da higiene mental e da saude publica;

a quantidade e variedade de acontecimentos e fenomenos que ter iamos

que enfrentar e resolver sao de uma magnitude incalculavel, ja que de-

vemos tomar em conta nao 56 os doentes mentais (no sent ido rigorosodesta denorninacaol como tarnbern as condutas anti-sociais e as pertur-

bacdes conflituosas de todo tipo e isto tampouco somente a partir do

ponto de vista da terapia e si rn, fundamental mente, a partir do enfoque

da profilaxia. Samariamente, os fatos sao, na atualidade, os seguin-

tes:

1 - Necessidade de melhorar e difundir a assistencia aos doentes

menta is.

2 - Atender os requerimentos do diaqnostico precoce e da reabili-

tacao,

3 - Necessidade de agir em situacfies que - sem ter doencas mentais

- se beneficiariam com a ajuda profi ssional do psicanal ista, pslcoloqo oupsiquiatra.

4 - Grande llmltacao social de muitos procedimentos que sao, em

primeiro lugar, de indole terapeutica e nao preventivos.

5 - Grande limita<;:aode muitos procedimentos, por ser, a lem disso,

de indole individual (no maximo, qrupal), mas com os quais 56 podemos

atender a uma pequena proporcao de individuos.

108

trabalho, alimentacao, moradia, etc .l , com 0 qual 0 problema a enfrentar

se faz sumamente complexo.

7 - Em slntese: 0 problema e social e nossos instrumentos sao indi-

viduais (ou grupais - quanto mais +): enfocamos, em pr imei ro lugar, a

doenca e 0 que se requer e a profilaxia e a prornocao de bem-estar e saude.

A tarefa e esmagadora; e frente a ela se estendeu uma certa urgencia

ou exiqencia que, em forma de instrucao, e simples: formar mais psiquia-

tras e mais psicoterapeutas; e este apuro nos contagiou implicitamente,

em certa medida, como uma urgencia por formar mais psicanal istas. Em

slntese: a filosofia que subjaz a esta colocacso, ou 0 pressuposto

fundamental do mesmo, reside em querer enf rentar 0 incremento das

doencas mentais com um incremento da quantidade de psiquiatras e psi-

coterapeutas",

Tais sao os pontos ao redor dos quais quero efetuar alguns cornen-

tarios nesta oportunidade, ja que 0 problema me vem ocupando ha algum

tempo e dele tratei emdiferentes ocasioes, especialmente em dois semina-

rios real izados com formados em psicologia na Faculdade de Filosofia e

Letras de Buenos Aires e na recente cria<;:aoda cadeira de Higiene Men-

tal , da qual fui designado professor. Entre os psicanalistas, nao nos ocupa-mos sistematicamente do tema, mas, de uma outra forma, certos pres-

supostos poderiam agir sobre nos - creio eu, em alguma medida - co-

mo verdadeiros preconceitos. Um deles poderia ser 0 de um certo prose-

lit ismo para formar mais psicanalistas e transformar em psicanalista todo

medico jovem que corneca sua analise por razfies terapeuticas, Nao emenos certo - por outra parte - que sao os psicanalistas tambern os que

melhor encararam este problema (Caplan, Lindemann, Dawler, Erikson,

etc.).

Mesmo que se possa por em duvida se realmente as doencas mentais

aumentaram, isto de nenhum modo invalida todas as nossas consideracoes,

posto que de qualquer maneira e evidente que temos colocado a exiqencia

de uma imensa tarefa par realizar, a partir de nosso ponto de vista de pro-

1 - 0 primeiro relat6rio do cornite de especiali stas reunidos pela O.M.S. (9/1953)

diz que "os problemas da higiene mental do mundo jamais poderiio ser adequada-

mente resolvidos por rnetodos rerapeutlcos".

109

fi ssionais da psicologia e da psicanalise, quer seja pelo aumento real das

doencas mentais, quer seja pelo fato de que nao nos interessam, (mica e

especificamente, as doencas menta is e sim as condicoes psicol6gicas de

promocao de saude e bem-estar; au quer seja porque nossos conhecimentos

cessos psicoloqicos e so podemos curar - alem disso - unicamente na

medida em que investigamos a que sucede em nossos pacientes. Alguns

autores disseram que, em psicanal ise, a cura e um by-product da invest i-

gac;:ao.

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 55/69

sabre a inf' luencia dos fatores psicol6gicos e emocionais sao hoje muito

superiores aos que tlnhamos ate pouco tempo atras, Em outros termos,

a problema pode se enunciar suscintamente assirn:

1 - temos conhecimentos psicol6gicos, deduzidos especialmente da

investiqacao psicanalftica , que sabemos podem ser muito benefices para

melhorar a vida dos seres humanos, mas,

2 - como aplica-los de maneira que beneficiem a toda ou a grande

parte da comunidade?

Como se ve, a problema ja nao e, especialmente, 0da dosnca mental

e sim 0 da promociio da seude: a psicoprofilaxia em seu mais alto nfvel.

o problema reside na construcao de uma estrateqia adequada, que nos per-

mita aplicar e aproveitar nossos conhecimentos em mais vasta escala.

Oeixo agora de lado uma quant idade de problemas e definicdes pre-

vias, que ja esclareci na ocasiao de uma publ ica<;:aoanterior ", tais como 0

que e que se deve entender par saude mental e par psico-higiene, a relaceo

de ambos com a saude publica e outras quest6es semelhantes mui to basi -

cas. Oesejo fazer girar aqui minhas consideracoes ao redor do pressuposto

a que fiz referencia mais acima e que se esgrime au se segue de maneiraimplfcita: podemos estabelecer uma corrida com as doancas mentais e tra-

tar de aumentar na mesma proporcao 0 nurnero de psiquiatras, psicotera-

peutas e psicanalistas? E esta a solucao do problema da doenca e da sau-

de mental?

Psicanalise clinica

A psicanalise se define por consti tuir ao mesmo tempo uma terapia,

uma teoria e uma investiqacao: tres aspectos que sao estreitamente solida-

rios e inseparaveis: so podemos curar cientificamente com uma tecnica

adequada e com uma teoria, tanto da tecnica como da doenca e dos pro-

2 - BLEGER, J.: HEI psicoloqo chnico y la higiene mental". Acta Psiquiatrica y

PsicoloqicaArgentina. 8-4-1962.

110

No entanto, devemos reconhecer que a valor social da psicanalise

enquanto terapia e bastante limitado, ainda contando com as rnudancas

que cada paciente pode promover sobre outras pessoas com quem rnantern

relacoes de distinto tipo, Quando afirmo a lirnitacao social da psicanalise

enquanto terapia me refiro, exclusivamente, ao fato de que e utopico pre-

tender formar tantos psicanalistas a fim de que toda a populacao seja

submetida a tratamento psicanalrtico '. A psicanalise e a terapia psicol6gica

mais racional, profunda e exitosa, mas - pelo tempo que toma - nao po-

demos pretender que possa constituir um procedimento eficaz para

resolver os problemas da doenca e da saude mental na escala e extensao

social em que isto e agora necessaria.

Sustento - em cornplernentacao do dito - que a t ranscendencia so-

cial da psicanalise reside fundamental mente em sua capacidade de ser

um metoda de investigar;:ao dos fen6menos psicoloqicos que, como tal,

contribui com conhecimentos valiosos sobre as leis pslcoloqicas que regem

a dinarnica tanto da sauda como da doenca enos permite tarnbern cornpre-

ender e valorizar os efeitos de determinados acontecimentos sobre a forma-

c; :aoe evolucao da personalidade. Se bem que, como ja 0 ,pisse, a investi-gac;:aoe inseparavsl da terapia e da teoria, ao dizer que a transcendencia

social da psicanalise reside fundamentalmente em sua capacidade de con-

tribuir com conhecimentos que derivam da investiqacfio , nao quero dizer

que se possa proceder a uma invest iqacao sem 0 objetivo terapeutico. mas

quero dizer, sirn, que as resul tados de dita investiqacao sao os de maior

transcendencia social, em muita maior proporcfio que a quantidade de pes-

soas que podem curar cada um ou todos as psicanalistas. A psicsnslise

clfnica nao pode, de nenhuma maneira, resolver por si mesma 0 proble-

ma da seude mental, na amplitude e extensao em que isto se faz necessario

no presente; portanto, a instrucao de formar urgentemente mais psicanalis-

tas para enfrentar 0 problema da doenca e da saude mental e totalmente

insustentevel, falsa e inconsistente".

3 - Em: "El anatlsls profano" (Obras camp/etas, tome XII), Freud adiantou a pos-

sibilidade da preparacao analftica de pedagogos e de "urn exerc ito auxiliar" desocia/ workers.

4 - 0 mesmopode-sedizer dos psiquiatras e dos psicoterapeutas.

111

Mas a investigar;fio da psicanalise clinica contribui com resultados e

conhecimentos de grande valor, que sao os que se podem e devem se

empregar em vasta escala e com grande prove ito nos programas de higiene

mental.

re com a psicanalise clfnica. Suas contribuic;:i5es podem ser utilizadas em

duas estrateqias da saude publica: na ordem administrativa e na da rela((ao

interpessoal''. 0 primeiro se refere ao fato de intervir por lntermedio de

uma a((ao governamental ou outra a9ao administrativa, influindo leis, sta-

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 56/69

A psicanalise clinica e, em meu entender, um metodo de laboratorio.

cuja enorme sficacia como procedimento de lnvestlqacso reside na exis-

tencia de uma rigorosa sistematlzacao da tecnica, baseada fundamental-

mente - esta ultima - na fixacso de um enquadramento, que consiste

numa tlrnttacao das varlaveis (fixa9ao de constantes) e um certo controle

das variaveis em jogo em cad a momento. Nao tem objeto, neste mornen-

to, estudar sua relacao e diferencas com 0 rnetodo experimental, mas 50-

mente assinalarei que, deste ultimo, a psicanalise clinica tem a condicao

fundamental de uma rsducao de varlaveis, que se obtern por meio da cons-

trucao de uma situacao artificial, na qual - por uma certa esquematizacao

dos fenornenos - conseguimos uma observacao rigorosa de uma sltuacao

simplificada. A psicanalise clfnica pertence, no entanto e a rigor, a uma va-

riante do rnetodo clinico: ou melhor dito, com a tecnica psicanalftica se

aperfeicoa 0 rnetodo cllnico numa medida nunca alcancada, ate agora, por

outras tecnicas. A rigor, enquanto a investiqaceo psicanalrtica se rnantem

como investlqacao no campo da transterencia, tanto mais participa de

caracterfsti cas do metoda experimental.

Embora 0 dito sobre a psicanalise enquanto tecnica de investiqacaopudesse se r bene ficamente ampliado, para maior c la reza, 0 que nos in teres-

sa aqui enos limitarmos aos fatos que abonam 0 criterlo que sustentamos:

a nenhuma tecnica de investiqacao (do metoda clinico ou do rnetodo expe-

rimental), em nenhuma disciplina cientlfica, se Ihe exige que resolva um

problema sobre 0 plano social. 0 unico que se espera e que contribua com

conhecimentos sobre os quais possa se basear uma planlficacao cientlfica

de alcance e extensao social. Reconhecer as lirnltacoes sociais de um pro-

cedimento de laborat6rio nao e nenhum dernerito para nenhuma tecnica,

porque, justamente, seria questionar as condicoes baslcas nas quais resulta

factfvel levar a cabo uma investiqacao de laboratorio. Da mesma maneira

ajustando-nos ao que realmente ocorre, devemos afirmar que a pslcanalise

ellnlca nao se pode exigir de nenhuma maneira que resolva 0 problema

da dosnca ou da saude mental. Seu valor e sua trenscendencie social resi-

dem no fato de que contribui com conhecimentos relat ivos a materia que

investiga, nas condiciies em que 0 faz. .

De maneira que sao os conhecimentos que ocasiona uma tecnica os

que podem ser empregados numa escala social significativa. 0 mesmo ocor-

112

tus, r egulamentos, costumes, com 0 intuito de ajudar a resolver ou impedir

tensdes de difer ente s tipos, a traves de mudancas cultur ais, Neste sentido, 0

psicanalista, agindo como especialista, pode assessorar os corpos adminis-

trativos, gove rnamentais ou nao, em tudo 0 que corresponde a saude e que,

em certa medida, depende da atuacso de fatores psicoloqicos, quer seja no

sentido de melhorar ou quer no de prevenir ou precaver prejufzos ou da-

nos. Assim - por exemplo - podem se utilizar os conhecimentossobre a re-

la9ao mae-filho e os efeitos nocivos de longas separacoes no caso da orqa-

nizacao de um service hospitalar ou uma lnstitulcdo educacional. Caplan

cita , a respeito, diferentes exper iencias (em Israel, Gra-Bretanha, Boston);

uma delas e a de Bowlby, que pode influir sobre a politica do Ministerio

de Saude da Gra-Bretanha, que distribuiu, em 1952, diretivas a todos os

hospitais para que se permitissem, e inclusive se estimulassem, as visitas

diarias dos pais das criancas internadas. Em 1960, de 80 a 90% das

instituicdes haviam adotado estas diretivas e, nos ultlrnos oito anos, a inci-

dencia da separacao mae-filho se viu drasticamente reduzida na Inglaterra.

A ac;:ao administrativa intervern com 0 objetivo de reduzir a inciden-

cia de situacoes traumaticas ou com 0 de produzir um incremento de satis-fa((ao de necessidades psicol6gicas.

No nlvel da relacao interpessoal, os conhecimentos da lnvestiqacao

psicanalftica podem ser empregados com muito proveito de maneira diver-

sa: em tecnicas pslcoterapicas mais breves (hipnoanalise, narcoanalise,

etc.I, ou em tecnicas grupais (em todas as variantes das mesmas) e especial-

mente numa nova possibilidade, sumamente promissora e em pleno desen-

volvimento, at raves do que se denomina a psicologia instituciona l, psicolo-

gia da comunidade e psicologia dos perfodos de crise",

5 - CAPLAN, G.: An approach to community mental health. Tavistock Publications,

1961.

6 - LINDEMANN, E.e DAWEA, L.G.: "The useof Psychoanalytic constructs in pre-ventive psychiatry" - The Psychoanalyt ic Study of the Child. Vol. III. New York,

Int. Univ. PressInc., 1952.

LINDEMANN, E.: "The nature of mental health work asaprofessional pursuit". Em:

Strother, C.R.: Psychology and Mental Health, American Psychological Assoc., 1956.

ERIKSON, E.: "Growth and crisesof the health personality". Cap.XII de: Kluckon,

c. e Murray, H.E.: Personality in nature, society and culture. New York, A. Knopf,

1956.

113

Nao podemos nos estender mais aqui sobre estes pontos e 0 leitor

pode recorrer a bibl iografia especffica sobre estes- temas, porque nos in-

ter~ssa nesta oportunidade s6 a exposicfo e 0 comentario geral das

perspectivas sociais da utilizacao dos conhecimentos derivados da investi-

observaveis, Neste sentido, fica ainda um longo caminho para percorrer,

de lndubitaveis e enormes beneflcios. De qualquer maneira, a psicanalise

aplicada nao e independente, de nenhuma maneira, da psicanalise clfnica

e e de desejar que a interacao e 0 enriquecimento recfproco, que se deu ate

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 57/69

gac;:ao psicanalltica7.

Tres formas de psicanalise

Ate aqui nos refe rimos exclusivamente a psicanalise chnica (a seu

valor e transcendencia nos problemas da saude e da higiene mental) mas

devemos tarnbern fazer rnencao da psicanalise aplicada, cuja origem e

desenvolvimento remonta ao pr6prio Freud.

A denomlnacao "psicanalise aplicada" nao e totalmente correta, ja

que nao se trata unicamente da aplicacso da psicanalise e sim de um ver-

dedeiro procedimento de investigar;; fio e, pa ra corroborar 0 dito, basta

recordar os estudos de Freud sobre a Gradiva de Jensen, Miguel Angelo,

Moises, 0 caso Schreber, 0 pintor Christoph Haizmann, Dostoievski, etc.,

e, em outro sentido, tarnbern estudos como Totem e tabu. A psicanalise

aplicada reduz tarnbern a complexidade dos fenornenos, como tarnbern

o faz a psicanalise clinica, mas numa direcso muito definida: na arnortiza-

c;:ao do impac to dire to da relac;:ao transferencial-contr atransferencial, que

faz com que alguns problemas (como os da psicose) possam ter sido pri-

meiro investigados mais profundamente com 0 procedimento da psicana-

lise aplicada.

o estudo de obras literarias ou artfsticas nao e 0 unlco campo em

que resulta posslvel utilizar a psicanalise aplicada, ja que 0 mesmo pode

ser benefico igualmente no caso de distintas rnanifestacdes culturais e de

distintos comportamentos ou a tividades (0 espectador, 0 artista, 0 inven-

tor, etc.) e tambern no estudo de pautas culturais e no da interacao indi-

vfduo-sociedade (Kardiner, Erikson, e tc .). Se ria de desejar que a psicanali-

se aplicada encontra sse tambern 0 autor que possa tanto sistematizar sua

metodologia como tarnbern fundarnenta-la teoricamente, ca tegorizando os

7 - CAPLAN, G.: 0 livro citado e, alern disso: Principles of preventive psychiatry,

New York, Basic Books, 1964.

Prevention of mental disordersin children. Travistock Publications, 1961. "Research

and development in community mental health". Harvard School of Public Health.-

"Working Papers in Community mental health". Harvard Medical School.

114

o presente , siga sem se quebrar.

Os resultados da psicanalise aplicada tern os mesmos beneflcios e as

mesmas limitacoes sociais que os resultados da psicanaliss clfnica: nao

podemos basear diretamente neles um beneflcio imediato e direto sobre a

saude mental de uma comunidade inteira, mas sua contribuicao pode ser

veiculada, da mesma maneira como 0 assinalamos para 0 caso da psicana-

lise cllnica.

Ate agora, considerei somente as duas variantes fundamentais e tra-

dicionais da psicanalise: a clfnica e a aplicada. Uma terceira forma de psi-

canal ise e a que quero assinalar nesta oportunidade (em relacao com 0 te-

ma basico que neste capitulo me interessa desenvolver) e que po de ser con-

siderada como uma variante da psicanallss aplicada. Denominamo-Ia de

psicanal ise operativa.

Esta ultima se caracteriza por ser uma psicanalise aplicada, quer dizer

se realiza fora do contexto no qual se realiza a psicanalise cllnica, mas tern

algumas caracterlsticas espec iais que a dif erenciam da psicanaliss aplicada

e que quero agora assina la r:

a) Utiliza-se em situacoes humanas da vida corrente, em qualqueratividade ou trabalho ou em toda instituicao na qual intervern seres hurna-

nos, quer dizer, na realidade e na situacso viva e concreta (educacao tra-

balho, jogo, 6cio, etc.) e em situacfies de crises normeis, pel~s quais

necessariamente passa 0 ser humano (mudancas de lugar, de estado civil,

de emprego, paternidade ou maternidade, morte de familiares, etc.].

alern das crises normais do desenvolvirnento".

b) Indaga-se - da mesma forma que na psicanaliss aplicada - os

dinamismos e as rnotivacoes psicol6gicas inconsc ientes, mas se uti liza dita

indagar;;fio para conseguir modificacdes atraves da cornpreensao do que

esta ocorrendo, como e por que.

c) Esta intervencao (operacao) se realiza atraves de multiples proce-

dimentos, seja interpretando as relacdes, a tarefa, os procedimentos, a

orqanizacao, a instituicao, a cornunicacso, etc., para conseguir uma modifi-

cac;:ao das situacdes, da orqanizacao ou das relacdes interpessoais, em fun-

S - Os t rabalhos de Lindemann - jil citados - recolheram este tema das cri ses na es-

trateqia da higiene mental e receberam tambam contribuicoes de Caplan e de suaescola.

115

c ;:ao d a ind aga <;a o re aliz ad a e d as c onc lu so es o btid as . A o in tr od uz ir a m od i-

f ic ac ;:a o o u a interpretacao, isto se faz a trtulo de hipotese, d e ta l m ane ira

qu e a m esm a se ratif ica ou corrige com a continu idad e d a obse rvacao . Co-

m o se ve , nao consiste num a operacao (m ica e sim num a reiteracao

Formacao d o p s ic a n a li s ta

P e lo qu e foi exposto, penso que , nos p ianos d e formacao de psica-

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 58/69

enriquecedora do m esm o circu ito form ado pe la observar;iio-intervenr;iio-

observar;iio. 0 desideratum e 0 d e um a proto-aprend izagem , qu e r d ize r ,

consegu ir qu e os se res hum anos possam reconhece r e re fle tir sobre 0

que ocorre num dado m om ento , reconhecer as motivacdes, agir d e acor-

do com este conhecim ento , sem su cum bir de im ed iato a ansiedad e e re -

c or re r a m e can is mo s d e d ef esa pe rtu rb ad or es .

d ) T ra ta mo s d e s iste m atiz ar 0 e nquad ram ento (a estrateqia e a tecni-

cal d a ps i cana l i s e ope rativa num trabalh o re ce nte sobre psicologia institu -

clonal". baseado nas experiencias re alizadas fundam entalm ente a partir

da s contribuicoes de E. P ic ho n R iv ie re1 0, p elo qu e na o e nc ontr ar em os

agora nos de talh es do m esm o, qu e nos afastaria multfssirno d e nosso te ma

cen tral p resente ; assinalarem os tarnbe rn aqu i - a respe ito - os trabalhos

fu nd am entais d e E. Jaqu es11. D e igu al m aneira, toda a psicologia e psi c o-

te rapia grupal de inspira< ;ao psicanalltica d eve se r lnclu id a com o variante

da psicanalise ope rativa. U m proxim o passo, ainda necessarlo na psicolo-

g ia g r up a l, e 0 d e su a utlllzacso fora do consultorio. qu er d ize r, nas situ a-

< ; oe s e instituicoes da vid a real e diaria.

A psicanallse operativa abre pe rspe ctivas sum am ente im portan te sno cam po da higiene m ental e no da psicoprofilaxia, no fato d e possib ili-

tar um a utillzacao da psicanalise n um a e sc ala d e ve rd ad eir a transcendencia

s oc ia l. A ps i cana l i s e op er ativa R aO e um a ps i cana l i s e n ov a e d is ti nt a; e um a

estrateqia p ar a u ti liz ar o s c on he cim e nto s p sic an allti co s.

9 - BLEGER, J.: "Psicologia institucional". Buenos Aires, departamento de psicolo-

gia, Fac. Filosofia y Letras, 1965.

10 - PICHON RIVIERE, E. e col .: "Tecnica de losgrupos operativos". Acta Neuro-

psip. Arg., 1960.

11 - JAQUES, E.: "Social systems as a defence against persecutory and depress ive

anxiety". Em Klein, M: New Directions in psychoanalysis. Londres, Tavistock Publi-

cations, 1955. (Ha versiio castelhana: Nuevas direcciones enpsicoenetisis. Buenos Ai-

res, Paid6s, 1965.) - The changing culture of a factory. Londres, Tavistock Publica-

tions, 1951.

JONE, M.: The therapeutic community. New York, Basic Books, 1953.

RODRIGUES, E.: Biograffa de una comunidad terepeutice. B.Aires, Eudeba, 1965.

116

n al is ta s, d e vem o s desernbaracar-nos to ta lm en te d e q ua lqu er contarnlnacso

qu e nos ade riu d as postu ras que criticam os, e spe cialm ente a partir d o angu lo

da saude publica e da h igiene m ental. Com isto, q ue r em o s c on cr et am e n te

assinalar:

a) Nao adm itir nenhum a urgencia (exte rior nem inte rior) por form ar

m ais e m ais psicanalistas, com 0 pr essu pos to d e qu e ne ce ss ita mo s u rge nte -

m ente d ele s para re solve r 0 proble ma social da sau de e da d oe nc;:a m ental,

nem tam pouco recorre r a nad a qu e sign ifiqu e um prose litism o neste sen-

tido . D evem os segu ir form ando os psicanalistas na quan tidad e qu e nossa

orqanizacao pe rm ita, sem d im inu ir nenhum a das eond icfie s e exigencias

que postu lam os para isto e que sao as qu e garan tem um a boa form ac;:ao

do p s ican a li s ta .

b) D evem os revisar nossos program as d e estu do, de tal m ane ira qu e

nao este jam os orien tados a form ar profissionais da psicanalise e sim in-

v es tig ad or es d a psicanallse: i st o s ig n if ic a 0 incre me nto d o e nsino d a m eto-

dologia, filosofia da cie ncia, p roce dim entos de ve rificacd o, m od elos con-

c eitu ais , e tc . S ig nif ic a, tarnbern, extrem ar os criterlos d e se le c;:ao de

cand idatos II psicanalise e orien tar os criterlos de selecao p ar a e ste o bj etiv od e f or m ar i nv es ti ga d or es .

c ) D e ve m os frisar qu e 0 unico o rga nism o e nc ar re ga do e h ab ilita do

p ar a f or m a r p si ca na li st as e 0 In stitu to d e Psicanalise e ser, p or ta nto , in fle -

xfve is e m tud o 0 qu e d esvirtue este propos ito e em tudo 0 qu e possa te n-

d er, d e m an eir a e xpllc ita o u im pif cita , a f orm ar p sic an alista s silv estr es.

O s psicanalistas form ados no Institu to de P sicanallse d eve m ad qui-

r ir c l ar a consclencia d e s ua f un c; :a o d e i nv es ti ga d or e s especlalizados no rneto-

do da pslcanalise clfn ica e , na m ed ida e m que Ihe s inte re sse , de ve m aplicar

tar nbe rn s eu s e sf or cos no d es env olv im e nto e n a in ve stiga c;:a o d a ps ic ana lis e

ap licada e da psicanalise ope rativa e /ou cum prindo tam be m fu nc;:5e s d e as-

sessores ou consu ltores nos problem as d a higiene m ental e d a saudepubli-

ca .

o e ix o f u nd am en ta l e a tor rne cso d o ps ic ana lista c lfn lc o e nqu an to

cie ntista e te cn ico d e um m etodo d e inve stiqacao. A isto d eve mos acresce n-

ta r 0 conh ecim ento d a valorizac;:ao e transce nd sncla social d e su a tare fa,

tanto com o as vias factfve is d e contato e enriqu ecim ento na ac;:ao da sau de

publica e da higiene m ental; 0 e sc la re cim en to d e su a r ela c;:a o c om o utr os

117

profissionais e, entre estes, especialmente e pelas caracterlsticas de nosso

meio, com os medicos e os psicoloqos, A isto queremos nos referir no que

segue, detendo-nos mais na psicologia enos psicoloqos que na medicina e

nos medicos.

Na atualidade, a psicologia e os instrumentos ou tecnicas da mesma

recebem uma contribuicf io valiosa da psicanalise, que permite que os psi-

co l ogos possarn enfrentar, com grandes beneffcios para a populacso, os

problemas que Ihes conrre sponde atender profissionalmente. 0 problema

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 59/69

e, entao, 0 de achar os meios para que os psicoloqos recebam a contribui-

c;:ao da psicanalise, sem deixar de ser psicoloqos e sem que se transform em

em psicanalistas silvestres ou em terapeutas.

A psicologia se divide, tradiclonalmente, em experimental e clinica

e estes dols aspectos se apresentam com muita frsquencia como contradi-

tori os e excludentes. E minha opiniao que a psicologia experimental e a

psicologia clfnica constituem uma so psicologia e que 0 trabalho com 0

metoda clfnico e uma parte fundamental da psicologia, dentro do qual 0

rnetodo experimental constitui um momento da totalidade da investiga-

c;:aocom 0 metodo clfnlco. Neste sentido, a psicanalise esta na metade do

caminho entre 0 metoda clfnico e 0 metoda experimental e quanto mais

r igoroso seja 0 enquadramento com 0 qual trabalhamos dentro do metodo

psicanal (tlco, tanto mais se acerca 0metoda cllnico, tal como e desenvolvido

no metodo psicanalrtico, a um metoda de condicoes quase experimental.

Quero esclarecer tarnbern que a divisao que se realiza entre psicologia pura

e psicologia aplicada e tarnbern inoportuna e, alern disso, erronea, porque a

psicologia chamada aplicada e a psicologia, e uma praxis com dois momen-

tos, um teorico e outro pratico, mas que sao inseparaveis entre si.

Os psicoloqos se orientam, em geral, tomando para suas condicoes de

trabalho profissional 0 modelo de trabalho profissional da atividade medi-

ca. E a isto e que devemos nos opor de forma decidida, ja que, justa-

mente, a partir de todos os pontos de vista, a orqanizacso da medicina co-

mo tarefa profissional de cerster individual e fundamentalmente or ienta-

da para a cura (asslstenciall e nao para ~ prevencso ou para a higiene e 0

ponto critico que deve ser reformado na medicina atual, pelo menos em

nosso pais e seguramente em muitos outros. 0 psic61ogo niio deve ser elen-

tado a ser terapeuta e penso que se as carreiras de psicologia se dao, como

missao fundamental, a formacao de psicoterapeutas, neste caso e a partir

do ponto de vista social, as carreiras de psicologia constituem um fracasso;

os psic61ogos tem que ser orientados profissionalmente ao campo da psico-

higiene, se Ihes deve munir dos conhecimentos e instrumentos necessaries

para agir antes que as pessoas edoecsm, dentro de atividades grupais, ins-

tituc ionais e de trabalho na comunidade.

Quero esclarecer este ponto ainda mais. Os psicoloqos devem ser -

em minha oplnlao - legalmente autorizados para exercer a psicoterapia,

P s ic olo gia e psicoloqos

Em nosso pafs, como ja se sabe, os psicoloqos nao podem ingressar

no lnstituto de Psicanalise e, portanto, nao podem ser psicanalistas. De

nenhuma maneira se soluciona 0 problema criando organismos encarr e-

gados de formar (direta ou indiretamentel psicanalistas silvestres. Ha uma

so classe de psicanalistas: os formados no Instituto de Psicanalise, enos

devemos ser os prime iros a nao cr iar estruturas informais ou marginais.

Diz-se, com certa frequencia, que ja existe um "rnercado negro"

da psicanalise: isto e um fato que nao podemos negar e que - em todo 0

caso - 0 melhor seria - diz-se - institucionalizar a formacao dos psicana-

listas silvestres, dando com isto as melhores garantias possfveis para sua

formacao. Minha opiniflo e terminante no sentido de que isto nao deve

ser feito, inclusive que deve ser combatido. Temos perspectivas socials

(crladas e por criarl para 0 trabalho profissional dos psicoloqos, que naotern nada que ve r com a existencia de um "rnercado negro" e, s ir n, t er n

que ver com as perspectivas racionais da higiene mental e da saude publi-

ca.

No momenta em que os psicoloqos possam (por razoes legais ou por

decisao dos organismos da Associacao Psicanalrtica] ingressar na formacao

pslcanalitica que da 0 Instituto de Psicanalise, poderao, entao, ser psica-

nalistas a par dos demais; no momento, nao deve haver possibilidade de ser

psicana lista "a meias" nem psicana lista "de mercado negro".

A essen cia do problema reside em que se tome consciencia cabal de

que 0 problema da saude e da doenca mental nao se pode resolver forman-

do mais psicanalistas, nem tampouco improvisando de alguma mane ira

psicoterapeutas semipsicanalistas; e tampouco se ve com clareza que a

func;:ao dos psicoloqos nao e a terapia e sim a psico-higiene: administr acao

dos recursos psicol6gicos, por meio da intervencao profissional nas condi-

< f o e s habituais e concretas da vida diaria ou nos momentos crfticos normais

dodesenvolvimento ou em momentos de crlse de situacdes vitals, traba-

Ihando na comunidade e em distintas instituicdes nso-medicss :

118119

mediando sua correta tormacso, mas nao devem ser alentados a isto, ja

que a partir do ponto de vista social nao e 0 otirno preparar profissionais

que se dediquem, em sua maior proporcao, a atividade assistencial e in-

dividual, porque 0 que necessitamos e a atencao da saude publica no

isto, e importante que 0 psic61ogo passe por uma experiencia pessoal de

psicanal ise terapeutica, Depois de uma selecao. para a qual havera que

fixar as pautas correspondentes e adequadas, 0 psic61ogo podera se incor-

porar a este instituto na qualidade de estudante durante urn periodo de

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 60/69

plano da promocdo de ssude e em escala social. 0 campo especi fico do

psiccloqo e 0 da psico-higiene, nao 0 da doenca mental. Psico-higiene quer

dizer util izacao de recursos (conhecimentos e tecnicasl psicol6gicos para

melhorar e promover a saude da populacao (e nao so evitar doencas),

tanto como quer dizer adrninistracdo adequada destes recursos a nlvel

da orqanlzacao da comunidade.

A preparacso dos psic61ogos como auxiliares da medicina e total-

mente erronea por sua llrnitacao, 0 campo fecundo da atividade profissio-

nal do psicoloqo ssta principalmente fora da medic ina e fora da doence+".

o que vimos expondo nao significa, de nenhuma maneira, que nao

se deve ensinar psicanalise aos psic6logos. Bern pelo eontrario . 0 que, sirn,

signif ica e que nao devemos transformar os psicoloqos em psicanalistas

silvestres; quer dizer, nao devemos Ihes ensinar a manejar a psicanalise elf-

nlca, ainda que, sirn, devam ter lnforrnacdo correta e completa da mesma.

o que se faz necessario e que ensinemos a psicanallse de tal meneira que

incorporem 0 pensamento psicanalltico, quer dizer, urn pensamento dina-

mico que Ihes permita compreender 0 comportamento dos seres humanos

na vida cotidiana, tanto no ambito individual como no grupal, insti tucio-nal e cornunitario: compreender as rnotivacoes inconscientes, reconhecer

os confli tos, os rnecanisrnos de defesa e as ansiedades, e que possam operar

segundo esta cornpreensao com tecnicas e procedimentos psicoloqicos, Em

uma palavra, devern incorporar 0 manejo da psicanalise aplicada da manei-

ra e no conceito que designamos mais acima como psicanalise operativa.

A tudo isto deve se acrescentar uma inforrnacso correta e profunda dos

conhecimentos que traz a psicanalise clinica acerca de tudo 0 que se refere

ao comportamento humano, para que possam utl liza-lo em seu trabalho

profissional especffico, que e 0 da psico-higiene, com seus instrumentos

proprios no campo onde Ihescorresponde atuar.

Neste sentido, com toda saquranca, devemos contemplar a necessida-

de de que a Associacso Psicanalftica possa organizar um instituto onde secomunique este ensino aos psicoloqos: ensino fundamentalmente centrado

na teoria psicanalitica e na squisici io de um pensamento diniimlco. Para

prova, no qual se vera a sua possibilidade de adquirir um pensamento dina-

mico e 0 insti tuto podera, em determinados casos, cancelar a inscricfio do

candidato psicoloqo, quando este tenha deflciencia na aquislcso do pensa-

mento dinamico,

P s i c an i ll is e e m e d ic o s

No mesmo sentido em que desenvolvemos a rela<;:aoda psicanalise

com a psicologia e os psicoloqos, creio que se deve entender tam bern 0 pro-

blema que coloca a medicina e os medicos. A Associacao Psicanalftica de-

ve criar tam bern - no possivel - urn instituto que se encarregue de

transmitir aos medicos a informacac necessaria e a formacao requerida

para incorporar urn pensamento psicanalitico, mas de tal maneira que

eles nao abandonem seu campo espec if ico de trebslho (seja a pediatria, a

dermatologia, gastroenterologia, etc.) e sim que incorporem 0manejo dos

fatores psicoloqicos dentro de seu pr6prio campo de trabalho e dentro de

suas pr6prias tecnicas, Isto quer dizer que nao devemos fomentar (e inclu-

sive devemos impedir no possfvel) que todo medico que se acerque da psi-

canalise abandone seu campo especifico para se transformar em psicana-

lista (e menos ainda, em psicanalista silvestre).

Ve-se, com muita frequencia , que 0 medico que inicia urn tratamen-

to psicanalrtico se ve, tarde ou cedo, frente a alternativa ou ao confli to de

seguir com sua especialidade ou muda-la pela de psicanalista. Nao sei em

que medida isto pode ser resultado de urn certo proseli tismo implfcito do

proprio psicanalista, mas si rn, devemos ter cuidado em que a rnudanca,

se se realize, seja realmente genu ina; mas que 0 otirno seria - em grande

proporcao de casos - que 0 medico continue com sua propria especialida-de, mas incorporando na mesma a dirnensdo psicoloqica em todo 0 seu tra-

balho, na rela<;:aomedico-paciente, em sua atitude, na indaga<;:aoe manejo

das situacdes conflituosas, sem que isto signi fique que se transforme em

psicoterapeuta e abandone a sua especialidade. A cura psicanalit ica de um

medico - e 6bvio esclarece-lo - nao reside em que setransforme em psica-

120 121

12 - Um organismo de atuacao do psico loqo no campo da psico-h ig iene & j a uma rea-

l idade no Departamento de Orlentacao Vocacional da Universidade de Buenos Aires.

nalista, nem em que "cure" ao adquirir urn suporte externo de identidade

grupal da instituicao que 0 taca sentir-se melhor ou bem, mas sim que

real mente se haja alcancado uma cura por uma rnodif i cacao da est rutura

de sua personalidade. Nilo sei em que medida isto e um problema real, mas

aspectos que Ihes sao necessanos. mas para que possam seguir desempe-

nhando muito melhor dentro de suas tarefas especit ices e dentro de seu

proprio campo de trabalho.

Vejo a cria<;:ilo de escolas ou de institutos privados onde se possa

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 61/69

vale a pena rnenciona-lo ainda a trtulo profissional. A respeito, Alvarez

de Toledo, L. Grinberg e M. Langer falaram num trabalho do "carater psi-

canalftico,,13.

Um ensaio previo nesta direcao que assinalo e que propugno pode se

levar a cabo formando pequenos grupos de estudo com medicos de igual

ou distintas especial idades (endocrinologistas, psiquiatras. pediatras , car-

diologistas, etc.I, os quais - setecao previa - poderao se formar num grupo

de estudo dirigido por um psicanalista, no qual se estudem os problemas

psicoloqicos de seus pacientes e os de seus procedimentos diaqnosticos e

terapeuticos, analisando os problemas praticos de seu trabalho profissional,

ajuntando, quando seja nacsssario, a inforrnacao teorica correspondente.

E atraves da revisao de suas tarefas praticas e de seus modelos con-

ceituais que 0 psicanalista podera ensinar e mostr ar os aspectos dinarnicos,

psicoloqicos, que estao implicados na tarefa e a maneira de enfrenta-Ios e

resolve-los sem sair do campo proprio de trabalho e das tecnicas e do en-

quadramento proprio que tenha cada campo especffico destes especialistas,

quer dizer, sem se transformar em psicana listas. Com isto, evitaremos 0 que

acontece com frequencia na atualidade; 0 psiquiatra, 0 pediatra, 0 endo-

crinologista, 0 cardtologista, 0 gast roenterologista, etc . tern como unica

possibilidade de uma intorrnacfo profunda do que e a psicanalise a inscri-

<;:ilo no Instituto de Psicanallse e a conseqiiencia que deriva disto e que 0

especialista se ve, num dado momento, frente ao conflito de ter que optar:

conve rter-se em psicanalista ou seguir com sua propria especialidade; ge-

ralmente 0 que ocorre - ao que parece - e que se converte em psicanali s-

tao Este processo, no qual 0 medico abandona a sua especialidade primi tiva

e se volta para a psicanalise como tarefa profissional, creio-o nocivo, por-

que, fora dos casos particulares onde isto esta total mente justificado, pen-

so que para os especialistas dos distintos ramos da medicina devemos criar

a possibilidade de que eles tenham uma formacao psicanalftica seria nos

13 - ALVAREZ DE TOLEDO, i..c.. GRINBERG, t., e LANGER, M.: "Termina-

cion del analisls". Mexico, 1964. Relata oficial ao Primeiro Congresso Pan-Americana

de Psicanatise.

Num cornentar!o sabre a +ormacso de psicanalistas, a Ora. E.R. Zetzel expressou que

a tratamento psicanalitico (de urn candidato) naoe laborterapia.

122

ensinar psicanalise como um fator muito positlvo, sempre que estas escolas

nilo se constituam em escolas de psicanalistas silvestres, quer dizer, sempre

que se atenham a ensinar a teoria psicanal [tica, a teoria da tecnica e con-

seguir a aquisicao de um pensamento dinarnico, de um pensamento psica-

nal itico, integrado no trabalho de cada especialista da medicina.

O u tr os p ro b le m a s r el ac io n a do s

No que foi axposto, creio, responde-sa a algumas das questfies fun-

damentais que coloca a necessidade de atender numa escala social ampla e

extensa os problemas da saude e da doenca mental, em bora observamos

que - par certo - nilo abundamos em detalhes sspecificos, que esclarece-

.riarn ainda mais esta perspectiva, mas que poder-se-jio achar na bibliografia

que se acompanha. 0 que interessa, nesta contribuicao, e 0 assinalamento

da direciio geral (a estrateqla) que devemos imprimir a psicanalise narelacao com 0 problema social da saude e da doenca mental.

E certo, alern disso, que, em breve, sejamos requisitados por outros

profissionais que sentem t ambern a necessidade de canhecer e operar com

os tatores psicoloqicos em seu proprio campo detrabalho e teremos que

ampliar os grupos de ensino a educadores, arquitetos, sanitaristas, contado-

res, empresarlos, dirigentes sindicais, etc. No entanto, c reio prudente, pelo

menos num perfodo de prova, ater-nos a uma experiencia somente com

psicoloqos e medicos , sejam ou nilo ps iquiatras .

Mais adiante, devemos contar com a possibilidade nilo s6 de esten-

der os grupos de ensino a outros profissionais ou I (de r es em distintas ativi-

dades, senao de criar tarnbarn um centro de consulte, no qual os psicanalis-

tas possamos intervir, assessorando sobre os problemas psicol6gicos dis-

tintas lnstituicoes ou 0 que se denomina pessoas "chaves" da cornunlda-

de14

.

14- Creio que um passe importante ja foi dado com a criacao do Centro de Investi-

gaCaoeOrientecao Enrique Racker.

123

Ouanto it t ecnica a segui r nos grupos de ensino da psicanali se a me-

dicos e psicoloqos, haven! que sistematizar distintos instrumentos didati-

cos, mas ja temos ent re nos psicanalistas com experiencia em grupos de

ensino com tecnicas operatives, com rol l playing e outros procedimen-

tos. Na literatura existente, contamos com experiencia ja comunicada -

gos, alentando a que seocupem e intervenham mais sobre a psicoprofilaxia

que sobre a terapia, e mais de grupos, insti tuicdes e da comunidade que de

indivfduos; no caso dos medicos, a que compreendam e manejem as situa-

coes terapeuticas e a relacso rnedico-paciente com a assimilacao de conhe-

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 62/69

especialmente por Balint' 5 - e que garante que este ensino em grupos

com os objetivos expostos e muito promissor e exitoso, tanto como a

experiencia que se realiza ha varies anos na Escola Privada de Psiquiatria,

que e dirigida pelo Dr. Enrique Pichon Riviere e cuja tecnica empregamos

com os drs. Liberman e Rolla tambern em outros organismos de ensino

universltario+".

A tudo isto devemos acrescentar a conslderacao do problema dos

controles ou da supervisee do trabalho de psicoloqos, psiquiatras e medi-

cos de outras especial idades. Neste sent ido, penso que os candidatos que

se acham cursando os seminarios do Instituto de Psicanali se nao devem

tomar a seu encargo nenhuma tarefa deste carater e que so devem faze-

10 a partir da condlcao de egressos do Instituto de Psicanalise. Mas, de

qualquer maneira, nao me refi ro a que se deva fomentar a prat ica de con-

troles de tratamentos psicanalft icos silvestres a cargo de psicoloqos ou me-

dicos nao psicanalistas. 0 controle deve se centrar sobre a compreensao

psicanallt ica da tarefa, da si tuacao, do paciente e do pr6prio terapeuta,

tratando de que se mantenha 0 carater do t ratamento inst itu fdo pelo

proprio psicoloqo ou medico e, sobretudo, 0 6timo seria a ajuda que pos-

sa prestar 0 psicanalista a cornpreensao e atuacao em situacfies que nao es-

tejam configuradas como sltusciies te repeuticss dentro da tecnice da psi-

csnslise clinics. Em smtese, 0 que deveria ensinar-se no controle ou super-

visao e a psicanallse operativa e nao a psicanalise cl fnica; com os psicoto-

15 - BALINT, M.: EI medico, el paciente y la enfermedad. B. Aires, Libros Basicos,

1961.

16 - BLEGER, J.: "Enseiianza de la psicoloqfa". Rev. dePsic. y Psicoter. de Grupo,

1961.

BLEGER, J.: Aula inaugural da cadeira de Psicanalisa. Acta Neuropsiquietrics Arg.

8.1.1962.Osgrupos operativos os utiliza tarnbern F. Ulloa na Fac. de Filosofia de Buenos Aires,

tendo realizado uma importante experiencia neste sentido.

Arminda Aberastury comunicou-me pessoalmente experiancias exitosas, trabalhando

com grupos de odontologistas. Outros colegas psicanalistas tem tambern experiencies

semelhantes, que desejaria conhecer mais detalhadamente; desde ja me desculpo por

nao incluir seus nomes.

124

cimentos psicanalrticos, mas dentro das tecnicas que eles utilizam em cada

caso.

o psicanalista no hospital

Este e um tema que, por diferentes motivos, requer tarnbem uma

certa atencao, ja que a experiencia nos mostra que quando 0 psicanalista

vai trabalhar no hospital, 0 que nao dever ia fazer e tomar pacientes do hos-

pital em tratamento psicanalft ico dentro do hospital. Quando isto ocorre,

o psicanalista se ve imediatamente esmagado de trabalho e entao "ensina",

por sua vez, a tecnica psicanal ftica aos outros colegas da sala ou do hospi -

tal, de tal maneira que em pouco tempo toda a sala esta constitufda ou se

acha baseada na terapia psicanal ftica, feita desta maneira um pouco i rn-

provisada. A conseqiiencia e que 0 psicanalista e os medicos que estao tra-

balhando em dita sala se desmoralizam, porque seveern esmagados por umaenorme quantidade de trabalho, com a consequencia de que se desorganiza

o trabalho hospitalar e 0 psicanalista e os colegas deixam em pouco tempo

de t rabalhar no hospital . Penso que quando 0 psicanalista concorre a um

hospital deve fazer 0 que estivemos resenhando antes: ensinar os colegas a

pensar psicanaliticamente, a uti lizar os conhecimentos dinarnicos, de tal

maneira que eles os possam utilizar dentro de outras tecnicas terapeuticas

ou bem dentro de suas pr6prias relacoes grupais, ou dentro de toda a pro-

pria orqanlzecao insti tucional, da sala ou do hospital, tanto como na com-

preensao do trabalho da comunidade e em outras esferas da atividade do

medico, psiquiatra, psicoloqo, enfermeiras, assistentes sociais. A pratica -;

embora muito limi tada ainda - demonstra que 0 psicanalista e muito mais

uti l no hospital quando forma grupos operat ivos ou de ensino (com cole-gas, psicoloqos, enfermeiros, assistentes soclais) do que quando se dispoe a

uma tarefa assistencial com a psicanelise individual ou ainda com terapia

grupal com doentes ou familiares dos mesmos.

125

APENDICESvida e nao fora da mesma (na faculdade ou nos domicilios privados de

alguns dos psicoloqos).

Tivemos que par tarnbem especial enfase na necessidade de analisar

certas idealizacoes ou certas ati tudes de onipotsncia e limitar os alcances

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 63/69

Es tudo -p ilo to numa comun idade

Relatorio preliminar

Na cadeira de Higiene Mental, de recente criacao, no Departamento

de Psicologia da Faculdade de Filosofia e Letras de Buenos Aires, realiza-

mos um trabalho pratico que consistiu no estudo-piloto de uma comuni-

dade, escolhida especialmente para isto.

Baseados nas diretivas que enunciamos num capitulo anterior , tra-tamos de definir claramente nossa estrateqia e nossas tecnicas, tanto como

as ordens a utilizar na tarefa pratica, Nao setrata de uma investiqacao com-

pleta de uma cornunidade, e sim de um trabalho pratico ou um estudo-

piloto, quer dizer, de um primeiro contato que nos permitisse 0 acesso

a uma nova perspectiva no trabalho do psicoloqo.

Limitou-se, por agora, na medida do possfvel, a quantidade de estu-

dantes que se inscreveram na cadeira, para que nao resultasse numa invasao

a comunidade, e tivemos primeiro que trabalhar fundamentalmente sobre

certos a priori ou preconceitos da equipe, tais como 0 de supor que terra-

rnos que conseguir 0 desenvolvimento ou a rnudanca da comunidade, ou

que nosso estudo implicaria um proselitismo de rnudanca, ou que nos

propunharnos a educar ou dirigir a comunidade. Pusemos muita enfase emque 0 psicoloqo, em todos os seus contatos com a comunidade, mantivesse

sempre seu papel profi ssional e que no curso de sua tarefa nao deva haver,

ou nao haja encontros nem conversacfies que se suponham informais

ou fora da tarefa e que esta ultima deve se fazer di retamente sobre 0 cam-

po, quer dizer, no proprio lugar em que a comunidade desenvolve a sua

126

de nossa intervencao profissional ao objetivo de um estudo, no qual todos

os contatos com a comunidade estivessem totalmente regulados ou seguin-

do certas normas e nao liberados ao acaso. l imitando tarnbern 0 t empo do

estudo da comunidade ao perlodo de duracao dos t rabalhos praticos, de

tal maneira para nao nos ver, expllcita ou implicitamente, comprometidos

numa relacao sem terrnino e sem limites. Sublinhamos tarnbern que 0 psi-

coloqo, no seu papel profissional, nao deve assumir liderancas de nenhumaIndole e sirn se ater exclusivamente a seu papel profissional.

o estudo da comunidade se distribuiu em seis temas e de cada um

deles se fez cargo uma das com lssoes de trabalhos praticos, dir igida por um

ajudante de trabalhos praticos e um auxiliar, que se reuniam semanalmente.

com a comissao de alunos a seu cargo para analisar os dados e, previa-

mente, para incorporar as instrucfies e trabalhar sobre a orqanizacfio

da propria equipe de t rabalho e anali sar os problemas que surgiram em to-

do 0 perfodo de re-colecao de dados. Semanalmente, alern disso, os ajudan-

tes e auxiliares se reuniam com os professores e 0 chefe de trabalhos pra-

ticos para analisar os problemas e as sltuacoss que iam surgindo, tratando

tanto de resolve-las e de agir com instruefies uniformes como de planejaros pr6ximos passos do estudo.

Os seis temas nos quais se dividiu 0 estudo da comunidade sao os

seguintes: tensoes da comunidade, adolescencia e juventude, trabalho, in-

tancla, ocio ou tempo livre, famil ia. Os problemas mais importantes nao.

surgiram na propria comunidade e sim na orqanizacfio da propria equipe de

trabalho, especialmente na de vencer resistencias, temores, inexperiencia,

insequranca, preconceitos, objetivos erroneos: mas em tudo isto conta-

mos com 0 entusiasmo, tanto dos colaboradores da cadeira como dos

prbprios estudantes, com uma dedlcacao de tempo que ult rapassava em

muito as exiqencias regulamentares e vigentes na orqanizacao de uma ca-

deira. 0 outro fato importante foi 0 de que toda a equipe agiu com cons-

ciencia da necessidade de ampliar 0 campo de aplicacao da psicologia, deabrir novos caminhos e de revisar amplamente todos os nossos conheci -

mentes psicoloqicos e nossas tecnlcas,

o primeiro passo consistiu na colocacso geral e no trabalho de orga-

niza<;:aoda propria equipe, tanto como em analisar os primeiros contatos

que estiverarn a cargo dos dois professores e do chefe de trabalhos praticos,

127

· Uma visita informal, exclusivamente de observacao. caminhando pelos

distintos lugares, constituiu a primeira tarefa, que foi realizada primeiro

pelos professores e 0 chefe de trabalhos praticos, em segundo lugar pelo

chefe com seus ajudantes, e, em terceiro lugar, cada ajudante de trabalhos

Jji lrll ticos com seu auxil iar e os estudantes.

E evidente que com estas tecnicas nao esgotamos nem podemos es-

gotar 0 estudo da comunidade, mas nos interessava um estudo piloto, que

se dirigisse nao somente ao estudo da comunidade como tarnbern ao de-

senvolvimento de uma nova possibilidade da psicologia tanto como dos

psicoloqos, Carecemos de dados previos, que nos teriam side muito uteis,

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 64/69

Terminada a visita a comunidade, cad a membro da equipe redigiu

um relat6rio com suas impressoes sobre 0 observado e que constava de

tres partes: 1 - detalhes do observado; 2 - inf'erencias ou hip6teses que

pode fazer sobre 0 observado e os aspectos que mais Ihe chamaram a aten-

<;:ao; 3 - os dados que desejaria saber, os aspectos que desejaria investigar

ou a lntormacao que desejaria possuir.Estes relat6rios eram estudados em cada uma das com issdes e, atra-

ves deles , tlnharnos uma imagem da comunidade (lugar, moradia, ciima

geral da comunidade, aspecto dos individuos, relacdes entre eles, institui-

c;:oes e orqanizacoes existentes, forma de vestir, lugares de dive rtimento,

jogos, aspectos das criancas, jovens e adultos, caracter isticas da forma de

vida, etc.),

As tecnicas a utilizar se distribulram entre os distintos integrantes de

cada grupo e sobre cada tema se fizeram entrevistas pessoais, reunlfies gru-

pais, encontros informais. Cada uma destas tecnicas custou tambern um

tempo dedicado a planificacso da mesma, tratando de elaborar algumas

instrucoes fundamentais, tais como a de que nao se realize nenhum encon-

tro ou entrevista nas quais se incitasse ou se aceitasse a expllcacao de si-

tuacdes totalmente pessoais, e sim a de que cada individuo ou grupo

pudesse nos dar inforrnacfio sobre a comunidade, sobre os demais. Dutro

fato irnportante foi que todo encontro fosse precedido ou cornecasse por

uma apresentacao do ajudante ou do estudante, dando seu nome e sua

pertenca a uma lnstituicso ou a uma cadeira, explicando 0 proposito da

entrevista individual ou grupal, fixando desde 0 corneco 0 tempo de que

se dispfie, de comum acordo com 0 entrevistado e se atendo estritamente a

ele. Ficaram exclufdas toda tecnica de "encer rar" 0 entrevistado, arneacan-

do-o ou forcando-o a respostas, ou de confundi-Io, assinalando-Ihe contra-

dicdes ou fazendo perguntas diffceis ou indiscretas, insinuacfies ou in-

diretas; assim, se trabalhou sobre a atitude do entrevistador: que fossefranco, escutasse com interesse, aceitasse a negativa de uma pessoa ou

~upo a ser entrevistado, que aceitasse todos os mecanismos de defesa

do indivfduo ou do grupo e nao os interpretasse, terminando toda en-

trevista individual ou grupal com a pergunta de que mais desejaria contar

ou comentar.

128

tais como conhecimento exato da populacao quanto a seu nurnero, condi-

coes economicas, estratificacfo, trabalho, ingressos, etc.

Um aspecto que tivemos que enfrentar reiteradamente foi 0 fato de

nos ver com muita frequencia urgidos pela comunidade ou por seus distin-

tos integrantes ou grupos, a agir segundo os objetivos ou os interesses ou

as necessidades que eles sentiam, tratando de alcancar ou de conseguir nos-

sa colaboracao em distintos sentidos, tanto como a urqencia ou a exiqencia

de devolver rapidamente resultados positivos que pudessem Ihes ser uteis,

Este aspecto estava totalmente ligado ao de fomento ou aceitacfio da de-

pendencia e tivemos que trabalhar reiteradamente sobre este ponte dentro

da equips, para nao nos vermos envolvidos nestas exiqencias e ceder a

tentacao de um papel diretivo ou de qualquer outro papel que nao perten-

cesse estritamente a nosso pape l de profissiona is e psicoloqos,

Esta atitude de dependencia e de busca de dependencia por parte de

alguns setores da comunidade se corresponds com estruturas de coesfio,

nas quais, tal como 0 colocamos para os grupos, 0 fenorneno psicoloqico

predominante e a par ticipacao, a identificacao projetivo-introjetiva e nao

a interacao.

Tratamos, reiterada e permanentemente, de que toda dificuldade

e toda situacao se transformasse num problema que havia de investigar e

num [ndice ou um dado do que estava ocorrendo na comunidade.

Depois da re-colecdo de dados eo estudo dos mesmos, cada comissao

redigiu um relat6rio que foi lido e discutido em uma reuniao total da ca-

deira e da qual se obteve um esquema global e uma cornpreensao global

da estrutura total da comunidade. 0 objetivo segu inte foi 0 de planificar

o passe posterior, quer dizer, que e 0 que temos que fazer no sucessivo

se continuamos 0 trabalho ou 0 estudo da mesma comunidade.

Um momenta ulterior, seguramente mais tardio, e 0 da avaliacfio

da atividade dos psicoloqos numa comunidade. Chegamos somente a possi-

bilidade de avaliar nosso estudo-piloto ou nossa tarefa, no sentido de con-

siderar se a maneira como havlamos encarado 0 estudo da comunidade,

atraves das instrucoes e das tecnicas seguidas, havia nos perrnitido chegar a

conhecer problemas fundamentais e modalidades caracter isticas da

comunidade, assim como se havia nos permitido chegar a um esquema-

129

global da estrutura da comunidade. Neste sent ido, outra de nossas regras

de trabalho e a de que nenhuma conclusao e definitiva, dado que tem que

ser afinada, ajustada, corrigida ou ratificada a medida que 0 estudo prossi-

g a o

Pomos enfase especialmente sobre 0 estudo da comunidade, ja que 0

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 65/69

psicoloqo nao pode agir sobre a comunidade profissionalmente e de manei-

ra eficiente se nao estuda permanentemente 0 que esta ocorrendo e seper-

manentemente nao esta recolhendo indicios e dados do que asta aconte-

cendo e como esta aconteeendo (e 0 mesmo sepode dizer para a psicologia

no ambito psicossocial , socio-dinarnico e institucional).

Nao expomos mais detalhadamente os dados que se referem a pro-

pria comunidade, uma vez que nao se cumpriram ainda, em relacao com a

eomunidade, a difusflo e a devolucso da intormacao, tal como no-lo havia-

mos proposto. E esta resenha so tem 0 sentido de uma cronies de nossa es-

trateqia e sistematizacao do traba Iho, mais do que 0 de um ralatorio sobre

a propria eomunidade.

Em toda a tarefa da eadeira, tanto em sua orqanizacao como na dis-

cussao e eselarecimentos dos problemas novos que tinhamos que enfrentar

e na realizacao dos trabalhos prat icos, contei com a valiosa colaboracao

do professor adjunto da cadeira, Dr . Abraam Son is, do Dr. Armando Bau-

leo como chefe de trabalhos praticos e dos ajudantes Lie. Diana Marla

Averbuj. Teresa Calvo, Maria Rosa Glasserman, Estela Noemi Daichman

de Schujman, Fanny Levinton de Baranchuk e Nidia Dora Neira Manganoe seus auxiliares, Beatriz Adela Casti llo, Rebeea Cohen, Reina Cheja, Ana

Maria Lopez Day e Nora Raquel Cuchuk.

13(1

Programa do Curso de Higiene Mental

(Segundo quadrimestre de 1965)

1 - Higiene e hi gi ene mental. Psiquiatria soci al. H ist6ria e conceito, Psico-hi-

giene como ramo da higiene mental. Organismos nacionais e internacionais. Publica-

coes mais impor tantes e fontes bibliograticas.

2 - Saude publica e higiene mental. Adrninistracdo sanitaria. Medicina curari-

va, p reven tiva e medic ina social . Prevencao primarla, secundaria e ter ciari a (Cap lan).

3 - Objet ivos da higiene mental: terapeutica, diagn6stico precoce, profilaxia,

reabilit aeao e promocfi o de saude. Ambitos. Estado atual da saude mental.

4 - Saude e desenvolvimento econornico-social, Subdesenvolvimento: seus

car ac te re s cons ti tu tivos. Pa to logia do subdesenvolvimento; s eus ind icadore s. Subde-

senvolvimento regional.

5 - Saude e populacao. crescimento e mobilidade. Cicio demogrMico do

subdesenvolvimento. Natalidade e mortalidade. Mortalidade infantil . A Republica

Argentina e sua populacao. tmiqracao. Mobilidade. lrtdust rializacao e urbanizacao,

Patologia urbana e rural. Moradia: sua relacao com a saude, 0 problema das doenc;as

cronicas.

6 - Alimentacao, n Ivel de vida e saude, Polftica alimentar. M<l alirnentacfio e

suas causas. Fome oculta. Subalirnentaeao.

7 - Trsbalho, As funcoes psicol6gicas do trabalho, Mudanc;as tecnol6gicas e

saude, Trabalho e saude mental. Automacso. Produt ividade, racional izacjio e otimi-

zacao do trabalho. Taylorismo, fordismo, stajanovismo. 0 problema de relac;5es

humanas.

8 - Psicossociologia da rnudanca, Psi cossocioloqia dos confli tos e tens5es. Sau-

de e t ensao. Tensiio grupal e intergrupal. Tensii o internaci onal e saude. Preconceitos e

estereoti po. Hesistencia a mudanca,

9 - Insti tuic;5es. Conceito. Classificacfio, Fatores psicol6gicos na dinarni ca de

inst ituic;ao . Organ izac ;ao forma l e informa l. Grupos e cornun icacao , l ide ranc ;a s. Con-

f li tos. Objetivos da instr tuicao, estrutura e func;5es. Ins ti tucionalismo. Hospitalismo.

131

10 - Comunidade. Seu desenvolvimento e seuestudo. Principios daorganiza-

c;:aoda comunidade: concerto, rnetodos, recursos, programase tecnicas.

11 - Instrumentos, metodos e tecnicas em higiene mental e psico-higiene. Es-

tattstica, Metodo epidemiol6gico. Relac;:6esentre indagac;:aoe ac;:ao.Metodo operati-

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 66/69

vo. Teoria dos jogos. Decis6es.Tecnicasgrupais. Avaliacao. Planificacao e programa-

c;:aoa curto e Iongo prazo.

12 - Educacaoe saude publica. Educaciio nospianos sanitarios. Objetivos, me-

todos, rnotivacdes, preconceitos, estereotipos.

13 - Prioridade nos problemas de higiene mental. Camposde trabalho do psi-

c6logo. EQuipesde trabalho: formacao. diniimica, papeis e conflitos. Problemasderi-

vados da inclusfio do psicoloqo nospianosde psico-higiene e saudepublica.

14 - Ambitos de atuacao do psicoloqo fora dos organismosda saudepublica.

Prornocao de bem-estar social. Seu trabalho em instituicoes sanitarias e nao sanita-

rias, 0 psicoloqo no trabalho institucional e da comunidade. Trabalho institucional

e trabalho em instituicdes. Enquadrarnento de sua tarefa.

15 - 0 psicoloqo nos problemas do desenvolvimento normal e patol6gico:

infancia, adolescencia, juventude, maturidade, velhice, senilidade. Crise do desenvol-

vimento. Simbiose mao-filho. Problemasde recreacaoe 6cio.

16 - 0 psicoloqo em momentos crfticos: gravidez, parto, casamento, div6rcio,

rnorte. Conflitos familiares.

17 - 0 pslcoloqo e os problemas do desajustesocial: alcoolismo, suicidio, de-

linquencia. Crisessociais.Oesorqanizacaoe panico coletivo,

18 - 0 psicoloqo e a doenca. Doencasagudase cronicas. Sequelas, Doencas

mentais e suas institulcoes. 0 psicoloqo na terapia. Psicoterapia individual e grupal.

Terapia ocupacional. Leqislacao nacional.

132

B ib lio g ra lm d eta lh a da s ob re higiene menta l

1 - HIGIENE EHIGIENE MENTAL

BLEGER, J.: EI psicoloqo clinico y la psicohiqiene. Acta Psiquiatrica y Psicoloqic«

Argentina. 8-4-1962.

BROMBERG, W.: La mente del hombre. BuenosAires. J. Gil. 1940.

INGENIEROS, J.: La locura en laArgentina. BuenosAires. L.J. Rosso.

LEMKAU, P.V.: Higiene Mental, Mexico. F.C. E.

WORTIS, J.: La psiquiatr Ia sovietica, Buenos Aires. Ed. Ateneo.

ZILBOORG, G.: Historia de la psicologia medica. BuenosAires. Hachette. 1945.

BERMANN, G.: La salud mental y la asistencia psiquiatrica en la Argentina. Buenos

Aires, Paidos, 1965.

2 - SAUDE PUBLICA EHIGIENE MENTAL

GALDSTON IAGO: "The Meaning of Social Medicine", Harvard University Press.

1954. ,

HANLON, J.: Elementos de administraci6n sanitaria. Oficina Sanitaria Panamerica-

na.Washington. Publicaciones Tecnicas, 1961; Cap. 1: La filosof ia de salud publica.

MOLINA, G. y ADR IASOLA, E.: Principios deadministraci6n sanitaria; San Juan de

Puerto Rico, 1961.

Organizaci6n Mundial de la Salud: "Metodologia de planif icaci6n de un programa

integrado de salud para areasrurales", Informes Tecnicos N? 83; 1954.

SIGER1ST, H.: "Landmarks in the History of Hygiene". Oxford University Press.

1956.

3- NivEIS DEHIGIENE MENTAL

FELIX, R.H.: The Role of Psychology in the Menta l Health Effort . En: Strother,

C.R., Psychology and Mental Health. American Psychological Association. 1956.

(Capftulo Ill.

Organizaci6n Mundial de la Salud: Informe 31. "Actividades y tecnicas Quepromue-

ven y mantienen la salud mental."

133

RODMAN, H. Y GARNEY CLARK, E.: Preventive Medicine for the Doctor in the

Community.

MOLINA, G. y ADRIASOLA, E.: Principios de administraci6n Sanitaria. (Pr610goy

Cap.2 y 3).

4 - SAUDE E DESENVOLVIMENTO ECON()MICO-SOCIAL

SONIS, A.: Salud, medicina y desarrollo econornico-social. Buenos Aires, Eudeba.

(Cap. III.)

7 - TRABALHO

BROWN, J.A.C.: La psicologia social en la industria. Mexico, Fondo de Cultura Eco-

nornica, 1958, Cap.9:" Frustraci6n", Sumario y Conclusiones.

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 67/69

FURTADO, C.: "Desarrollo y subdesarrollo"; BuenosAires, Eudeba. 1964.

HERSCHEL, F.J. CIBOTTI, R.: Concepto y finalidad del desarrollo econ6mico. Bue-

nosAires. Revista de Desarrollo Economico, Nt?1; 1"961.

JAGUARIBE, H.: "Desarrollo econ6mico y desarrollo politico". Buenos Aires, Eu-

deba, 1964; Cap. I: EI desarrollo como proceso; paqs, 11-24.

GONZALEZ, N.: "Que esuna economia subdesarrollada?" Revista de la Universidad

de BuenosAires, Afio VI, Nt?I, enero-marzo 1961.MOLINA, G.: "Indicadores de salubridad, economia y cultura"; Revistade SaludPU-

blica La Plata, Nt?3/4. 1963.

5 - SAUDE EPOPULACAo

C.E.P.A.L.: "La situacion demogrMica en America Latina". Boletin Econornico de

America Latina; Vol. VI, Nt?2; octubre 1961.

CHIOZZA, E.: "Ideas sobre una pohtica demogrMica"; Revista de la Universidad de

BuenosAires, Afio VI, Nt?4; octubre-diciembre 1961.

DIFRIERI, H.: "Algunas caracteristicas y tendencias regionalesde la problacion ar-

gentina"; Revista de la Universidad de Buenos Aires, Afio VI, Nt?4; octubre-diciem-

bre 1962.

HAVEL, J.V.: "Habitat y vivienda". Buenos Aires. Eudeba, 1961; Cap.: "La habi-

tacion" y conclusion: "Hacia unasoluci6n tecnologica."Orqanizacion Mundial de laSalud: Informe tecnico Nt?225: "Higiene de la vivienda",

1961.

SONIS, A.: "Salud, medicina y desarrollo econornico-social", BuenosAires, Eudeba,

1964. Cap. II: Poblacion: Cap. IV: Vivienda; Cap. V: Urbanizaci6n.

UNESCO: Aspectos socialesdel desarrollo econornico en America latina, 1962.

NACIONES UNIDAS: "Los problemas socialesde la urbanizacion en lasregionesde

economia insuficientemente desarrollada." Antologia seleccionadapor G. Germani y

J. Graciarena. Dpto. sociologia, 1961.

6 - ALIMENTACAo

CASTRO, J.: Geopolftica del hambre. Buenos Aires, Raigal. EI libro negro del ham-

bre. BuenosAires. Eudeba, 1964.

C.E.P.A.L.: "Una pol itica agricola para acelerar el desarrollo econornico de Americalatina"; Boletin dela Cepal.Col VI, Nt?2. Oct. 1961, paqs. 1-12.

F.A.O.: "EI desarrollo econornico mediante la produccion de alimentos", 1962. "EI

estadomundial de la agricultura y la alimentacion",.1961.

MASSEYEFF, R.: "EI hambre", BuenosAires, Eudeba, 1962.

Orqanizacion Mundial de la Salud: "Malnutricion y enfermedad. Una cuesti6n capital

parael mundo." Serle de Estudios BasicosNt?12, 1963.

134

FLOYD, W.F.: ERLFORD, A.T. Y col.: "Fatiga y trabajo". Buenos Aires, Eudeba,

1964.

FRIEDMANN, G.: Problemas humanos del maquinismo industrial. Buenos Aires,

Sudamericana, 1956.

MAYO, E.: "Problemas humanos en una civilizacion industrial", Buenos Aires, Ga-

latea-Nueva Vision. 1959.

POLLOCK, F.:" Las consecuenciaseconornicas y socialesde la automatizacion", en"La revoluci6n de losrobots", paqs.55-99, BuenosAires, Eudeba, 1961.

Organizaci6n Mundial de la Salud: "Problemas de la higienedel trabajo en la agricul-

tura". Cuarto informe del Corni te Mixto O. I. T./O.M.S. de Higiene del Trabajo;

Serie de Informes Tecnicos Nt?246.

Organizaci6n Mundial de la Salud: Informe Tecnico Nt?135. "Higiene del Trabajo".

1957. Informe tecnico Nt? 183. "Problemas de Salud Mental que plantea la automa-

cion". 1959.

WEBER, A.: "La dorninacion del tiempo libre", en"La revolucion de los robots".

BuenosAires, Eudeba, paqs. 137-155.

GUERREI RO RAMOS, A.: Relacioneshumanasdel trabajo. Univ. Nac.de Mexico.

8 - PSICOLOGIA DA MUDANCA

COSTA PINTO, L.A.: "La socioloqia del cambio y el cambio de lasociologia." Bue-nosAires, Eudeba, 1963. Cap. VII: Problemas, tensiones y crisis sociales.

MEDINA ECHAVARRfA, J.: "Consideraciones socioloqicas sobre el desarrollo eco-

nornico." Buenos Aires. Solar-Hactiette. 1964. Parte III: Hacia lanueva sociedad.

MEAD, M.: Societes,Traditions et Technologie. Unesco. 1953.

Orqanizacion Mundial de laSalud: Informe tecnico Nt?152. "Los problemas de Salud

mental que plantea lautilizaci6n de la energia con fines pacificos". 1958.

OPPENHEIMER, R.: "Ciencia y entendimiento cornun". Buenos Aires, Galatea.

1957. Cap. I: pags.9-22, Cap.V I: paqs,87-99.

RUSSEL, B.: "Ciencias, filosofia y pol itlca". Cap.VII: Psicoloqia y pol itica.

STERN, B.J.: "Los progresos de la sociedad y la medicina". Buenos Aires. Ameri-

calee, 1944.

BERNARD, J.: "La socioloqia del conflito". Universidad de Mexico.

9 - INSTITUICOES

BLEGER, J.: Psicologia institucional (Dep, psicologia).

JAQUES, E.: "Social system asdefence against persecutory and depressiveanxiety."

En: Klein, M.: New Directions in Psychoanalysis. Version castellana: Nuevasdireccio-

nesen psicoanallsis. BuenosAires, Paidos, 1965.

YOUNG, G.: Metodos cientificos de investigaci6n social. Mexico, 1953. (Cap. 16).

135

10- COMUNIDADEROMERO BREST, G.: "Proposiciones para el planteamiento integral de la educa-

cion", Revistade la Univ. de Bs. Aires, Afio VI, N<?4; octubre-diciembre 1961.

WALL, W.D.: Education andMental Health. Unesco. 1955.

UNESCO: "Nuevas tendenciesde laeducaci6n de adultos". H.M. Hely. 1962.

Unesco: Educaci6n sanitaria. Estudios y documentos deeducaci6n N9 19.

ARONOVICI, c.: "La constituci6n de la comunidad". BuenosAires, Eudeba. 1965.

CAPLAN, G.: Principles of Preventive Psychiatry. (Cap.6 y 7).

NACIONES UNI DAS:" Aspectosde losprogramasde desarrollo de la comunidad que

guardan relaci6n con la administraci6n publica". Nueva York. 1960.

Organizaci6n Mundial de la Salud: Informe Tecnico N'? 177: "Psiquiatria social y 13- PRIORIDADE EMPROBLEMAS DE HIGIENE MENTAL

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 68/69

actitudes de la comunidad". 1951.

POZAS ARCINIEGAS, R.: "EI desarrollo de la comunidad". Mexico. Univ. Nac.de

Mexico. 1964.

SCOTT, J. y LYNTON, R.P.: "Le proqres technique et I'integration sociale" Cap.

I. "Les discordances de la societe industrial Ie." Cap. III. "Processusdu mairtien et

de la formation des communautes: etude de deux xas particuliers." Unesco. 1953.

YOUNG, P.: Metodos cientificos de investigaci6n social. Mexico, 1953. (Cap. 17y18).

MOll NA·ADR IASOLA: Principios de Administraci6n Sanitaria. (Cap. Ill.

BLEGER, J.: "EI psicoloqo clinico y la psicohigiene", Actas Psiquietrices y Psicolo-

gicasArgentinas. 8.4.1962.

Organizaci6n Mundial de la Salud: Informe Tecnico NO9. Cornite d' Experts de la

Sante MentaIe.

14- AMBITOS DE ATUACAo DOPSICOLOGO

11- INSTRUMENTOS, METODOS E TECNICAS

BLEGER, J.: Psicologfa institucional. Public. del dep. psicoloq ia de la Facultad de

Fil. y Letras de Buenos Aires.

CAPLAN, G.: Principles of Preventive Psychiatry: "Un programa de prevenci6n pri-

maria" y Capitulos 6 y 7.

ARONOVICI, C.: "La construcci6n de la comunidad". Cap. 15. "lndagaci6n e inves-

tigaci6n". BuenosAires. Eudeba, 1965.

BRADFORD HILL. A.: "Principios de Estadistica Medica". Cap. 15. Buenos Aires.

1957.

EDDISON, R.T.: Applications socieles de la recherche operationelle. Science et

societe. Impact. IV. 2.1953.

HORWITZ, J.: "EI uso del metoda epidemiol6gico en psiquiatria." Boletin de laOfi-

cina Sanitaria Panamericana. Vol. 1, N'?6.

LIT, TSUNGYI STANDLEY, G.: "Importancia de los metodos epidemiol6gicos en

psiquiatria". Cuadernosde Salud Publica. N9 16-196.

LUNDBERG, G.: "Tecnica de la investigaci6n social". Mexico, Fondo de Cultura

Econ6mica.

Organizaci6n Mundial de la Salud: Informe Tecnico N'? 185. "Epidemiologia de los

transtornos mentales."

REID, D.O.:" Los metodosepidernioloqicos en el estudio de lostrastornos mentales."

Cuadernosde Salud Publica. N'?2. 1964.

YOUNG, P.: Metodos cientificos de investigaci6n social.

STERN, E.: La psicoterapia en la actualidad. BuenosAires, Eudeba.

15 - PROBLEMAS DO DESENVOLVIMENTO

LEMKAU, P.M.: Higienemental. Mexico. Fondo de Cultura Econ6mica. (Parte 2~).

YOUNG, K.: Personality and Problemsof Adjustement. Routledge KeganPaul Ltd.

Cuadernode SaludPublica Nt?24: "EI cuidado del nino en lasguarderfas".

Organizaci6n Mundial de la Salud: Informe Tecnico 171. "Problemas de saludmental

del envejecimiento y de la vejez".

BOWLBY: Cuidados materiales y salud mental. Organizaci6n Mundial de la Salud.

Organizaci6n Mundial de la Salud: Informe Tecnico NO70. "Adopci6n."

Unesco: "Nuevas tendencias de lasorganizaciones de lajuventud" (N9 33).

16 - 0 PSICOLOGO NAS CRISES

12- EDUCACAo ESAUDE PUBLICA

YOUNG, K.: Personality and Problems of Adjustement.

CAPLAN, G.: Principles of Preventive Psychiatry. Nueva York. Basic Books. (Apen-

dice B paraconflicto familiar)' Crisis: Idem.

LINDEMANN, E.: "The Nature of Mental Health Worsk asa Profissional Pursuit."

En: Strother, C.R.:PsychiJogyand Mental Health (Apendice A).

HAVIGHURST, R.: La sociedad y la educaci6n en America latina. Buenos Aires.

Eudeba. 1962.

MOREl RA, R.: "Educaci6n y desarrollo"; Revistade la Universidad de BuenosAi res,

Afio VI, enero-marzo 1961, N'? 1.Organizaci6n Mundial de la Salud: Informe Tecnico N'? 58, "Infancia fisicamente

diminuida."

Organizaci6n Mundial de la Salud: Informe Tecnico N'? 177. "Psiquiatr ia social y

actitudes de la colectividad."

REISSIG, L.: "Ed ucacion y desarrollo econ6mico", BuenosAires, Losada 1961. Pro-

blemasEducativos en America Latina. BuenosAires, Eudeba. 1963.

17 - 0PSICOLOGO EOSPROBLEMAS DE DESAJUSTE SOCIAL

GIBLENS, T.C.: "Tendencies actuales de la delincuencia juvenil." Cuadernos de

SaludPublica NO5. 1964.Organizaci6n Mundial de la Salud: Informe Tecnico NO131. "Assistencia medica y

social a lostoxic6manos." 1957.

Organizaci6n Mundial de la Salud: Informe Tecnico N'? 42: "Higiene mental."

Alcoholismo. 1953-54.

Organizaci6n Mundial de la Salud: Informe Tecnico N9 9. Cornite d'Experts de la

SanteMentale.

136 137

Organizaci6n Mundial de la Salud: Informe Tecnico NO248. "EI peligro de lasradia-

cionesen relaci6n conotros riesgospara la salud."

Repport of the Narcotics Conference at University of California: "Contradictions in

addiction". 1963. Public Health Reports. Agosto 1963. Vol. 78. N<?5.

Repport of the Committee on Maladjusted Children: Ministry of Education. londres,

1958. Cap. IV. "The Nature, Symptoms and Causesof Maladjustement":

SYKES, G.: "EI crimen y lasociedad." BuenosAires. Paid6s. 1963.

5/12/2018 Jose Bleger - Psico Higiene e Psicologia Institucional - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/jose-bleger-psico-higiene-e-psicologia-institucional 69/69

1963.

ZOllA, E.: "Antropologfa negativa." Buenos Aires, Sur, 1962. "las regresionesen

la droga."

18- 0 PSICOlOGO EA DOENCA

BlEGER, J.: "EI psicoloqo c1inico y la higiene mental." Acta Psiquiatrica y Psicol6·

gica Argentina. 8.4.1962.

HARPE R, R.A.: 36 sistemasde psicoterapia. (Cap. VI y IX.)

JONES, M.: "The Concept of a Therapeutic Community." En: Paychopatology. Edi·

tado por Red. Alexander. Tomkins. Harvard Univ. Press,1958.

Legislaci6n Nacional sabre Psicoterapia (Publicaci6n del Dep. de psicologia de la Fac.

de FiL y letras de BuenosAires.)

Orpanizacion Mundial de la Salud: Informe Tecnico N<?134. "EI hospital psiquiatri-

co, centro de acci6n preventiva de la saludmental." 1957.

Orqanizacion Mundial de la Salud: Informe Tecnico N'? 73. "EI hospital psiquiatnco

en la comunidad." 1953.

Orqanizacion Mundial de la Salud: Informe Tacnico N'? 177. "Psiquiatrta social e

actitudes de la colectividad." 1959.

Orqanizacion Mundial de la Salud: Informe Tecnico N<?5. "EI hospital psiquiatrico,centro de acci6n preventiva de la saludmentaL"

Orqanizacion Mundial de la Salud: Informe Tecnico NO31. "Actividades y tecnicas

que promueven y mantienen la saludmental".

RODRIGUE, R.: Biografia de una comunidad terapeutica. Buenos Aires. Eudeba,

1965.

STERN, E.: la psicoterapia en la actualidad. Eudeba, (Cap. X.)

138

JA~Ti tO?OLI : .Industria Grafica Uda.