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WEB AULA 1 1.Inconstitucionalidade: conceito e espécies. Os eminentes professores, Sylvio Motta e Willian Douglas, em seu livro “Controle de Constitucionalidade”, 3ª edição, publicado pela editora Impetus, 2004, p. 47, ensina sobre o conceito de inconstitucionalidade o seguinte: “Podemos definir inconstitucionalidade como sendo: 1 – a desconformidade do ato normativo primário ou da norma constitucional derivada com o conteúdo material da Constituição. ou 2 – o vício da norma elaborada sem observância das normas constitucionais concernentes ao processo legislativo ou aos limites do poder de reforma do texto constitucional. Espécie de Incostitucionalidade Inconstitucionalidade formal Os vícios relativos à formalidade afetam o ato normativo sem atingir seu conteúdo, referindo-se aos procedimentos e pressupostos relativos às feições que formam a lei. Ensina-nos Gilmar Mendes que “os vícios formais traduzem defeito de formação do ato normativo, pela inobservância de princípio de ordem técnica ou procedimental ou pela violação de regras de competência”. (In: BRANCO; COELHO; MENDES, 2010, p. 1170). Paulo Bonavides explica sobre o controle formal: “Confere ao órgão que o exerce a competência de examinar se as leis foram elaboradas de conformidade com a Constituição, se houve correta observância das formas estatuídas, se a regra normativa não fere uma competência deferida constitucionalmente a um dos poderes, enfim, se a obra do legislador ordinário não contravém preceitos constitucionais pertinentes à organização técnica dos poderes ou às relações horizontais e verticais desses poderes, bem como dos ordenamentos estatais respectivos, como sói acontecer nos sistemas de organização federativa do Estado”. (2003, p. 297). Também sobre a inconstitucionalidade formal, Pedro Lenza distingue a dois tipos de vícios formais, que são o vício formal subjetivo e o vício formal objetivo. Explica o autor:

Jurisdição constitucional

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apostila de jurisdicção constitucional

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Page 1: Jurisdição constitucional

WEB AULA 1 

1.Inconstitucionalidade: conceito e espécies.

Os eminentes professores, Sylvio Motta e Willian Douglas, em seu livro “Controle de Constitucionalidade”, 3ª edição, publicado pela editora Impetus, 2004, p. 47, ensina sobre o conceito de inconstitucionalidade o seguinte:

“Podemos definir inconstitucionalidade como sendo: 

1 – a desconformidade do ato normativo primário ou da norma constitucional derivada com o conteúdo material da Constituição.

ou 

2 – o vício da norma elaborada sem observância das normas constitucionais concernentes ao processo legislativo ou aos limites do poder de reforma do texto constitucional.

Espécie de Incostitucionalidade

Inconstitucionalidade formal

Os vícios relativos à formalidade afetam o ato normativo sem atingir seu conteúdo, referindo-se aos procedimentos e pressupostos relativos às feições que formam a lei.

Ensina-nos Gilmar Mendes que “os vícios formais traduzem defeito de formação do ato normativo, pela inobservância de princípio de ordem técnica ou procedimental ou pela violação de regras de competência”. (In: BRANCO; COELHO; MENDES, 2010, p. 1170).

Paulo Bonavides explica sobre o controle formal:

“Confere ao órgão que o exerce a competência de examinar se as leis foram elaboradas de conformidade com a Constituição, se houve correta observância das formas estatuídas, se a regra normativa não fere uma competência deferida constitucionalmente a um dos poderes, enfim, se a obra do legislador ordinário não contravém preceitos constitucionais pertinentes à organização técnica dos poderes ou às relações horizontais e verticais desses poderes, bem como dos ordenamentos estatais respectivos, como sói acontecer nos sistemas de organização federativa do Estado”. (2003, p. 297).

Também sobre a inconstitucionalidade formal, Pedro Lenza distingue a dois tipos de vícios formais, que são o vício formal subjetivo e o vício formal objetivo. Explica o autor:

“(...) o vício formal subjetivo verifica-se na fase de iniciativa. Tomemos um exemplo: algumas leis são de iniciativa exclusiva (reservada) do Presidente da República como as que fixam ou modificam os efeitos da Forças Armadas, conforme o art. 61, § 1º, I, da CF/88 (...). Em hipótese contrária (ex.: um Deputado Federal dando início), estaremos diante de um vício formal subjetivo insanável, e a lei será inconstitucional.

(...) por seu turno, o vício formal objetivo será verificado nas demais fases do processo legislativo, posteriores à fase de iniciativa. Como exemplo citamos uma lei complementar sendo votada por um quorum de maioria relativa. Existe um vício formal objetivo, na medida em que a lei complementar, por força do art. 69 da CF/88, deveria ter sido aprovada por maioria absoluta”. (2011, p. 232).

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Luís Roberto Barroso traz a seguinte classificação:

“A primeira possibilidade a se considerar, quanto ao vício de forma, é a denominada inconstitucionalidade orgânica, que se traduz na inobservância da regra de competência para a edição do ato (...). De outra parte, haverá inconstitucionalidade formal propriamente dita se determinada espécie normativa for produzida sem a observância do processo legislativo próprio”. (2006, 26-27).

Do exposto, fica claro que a inconstitucionalidade formal faz referência ao erro na observância da competência ou nas regras relativa ao processo definido na Constituição.

Inconstitucionalidade material 

Os vícios materiais, diferentemente dos formais, estão ligados ao próprio mérito do ato, referindo-se a conflitos de regras e princípios estabelecidos na Constituição.

Gilmar Mendes apresenta o seguinte entendimento da questão:

“A inconstitucionalidade material envolve, porém, não só o contraste direto do ato legislativo com o parâmetro constitucional, mas também a aferição do desvio de poder ou do excesso de poder legislativo.

É possível que o vício de inconstitucionalidade substancial decorrente do excesso de poder legislativo constitua um dos mais tormentosos temas do controle de constitucionalidade hodierno. Cuida-se de aferir a compatibilidade da lei com os fins constitucionalmente previstos ou de constatar a observância do princípio da proporcionalidade, isto é, de se proceder à censura sobre a adequação e a necessidade do ato legislativo”. (In: BRANCO; COELHO; MENDES, 2010, p. 1172).

Nas palavras de Barroso,

“a inconstitucionalidade material expressa uma incompatibilidade de conteúdo, substantiva entre a lei ou o ato normativo e a Constituição. Pode traduzir-se no confronto com uma regra constitucional – e.g., a fixação da remuneração de uma categoria de servidores públicos acima do limite constitucional (art. 37, XI) – ou com um princípio constitucional, como no caso de lei que restrinja ilegitimamente a participação de candidatos em concurso público, em razão do sexo ou idade (arts. 5º, caput, e 3º, IV), em desarmonia com o mandamento da isonomia. O controle material de constitucionalidade pode ter como parâmetro todas as categorias de normas constitucionais: de organização, definidoras de direitos e programáticas.” (2006, p. 29).

Destarte, a inconstitucionalidade material se dá quando a norma vai contra os parâmetros explícitos da Constituição ou contra o as vertentes do princípio da proporcionalidade (adequação e necessidade).

Inconstitucionalidade por ação e inconstitucionalidade por omissão

Além das formas de inconstitucionalidade até então vistas, temos, por fim, também a inconstitucionalidade por ação e a inconstitucionalidade por omissão.

A inconstitucionalidade por ação é aquela advinda da incompatibilidade entre uma norma e a Constituição, enquanto que a omissão legislativa inconstitucional pressupõe a “inobservância de um dever constitucional de legislar, que resulta tanto de comando explícitos da Lei como de decisões fundamentais da Constituição identificadas no processo de interpretação” (MENDES In: BRANCO; COELHO; MENDES, 2010, p. 1184-1185).

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Explica Luís Roberto Barroso que

“A referência a inconstitucionalidade por ação, portanto, abrange os atos legislativos incompatíveis com o texto constitucional. (...). Os múltiplos modelos de controle de constitucionalidade (...) foram concebidos para lidar com o fenômeno dos atos normativos que ingressam no mundo jurídico com um vício de validade”. (2006, p. 31-32).

Cabe também registrar a lição de Kildare sobre a inconstitucionalidade por ação:

“Este tipo de inconstitucionalidade pressupõe uma conduta positiva do legislador, que se não compatibiliza com os princípios constitucionalmente consagrados. Envolve um facere do Estado, e compreende os atos legislativos incompatíveis com a Constituição. A inconstitucionalidade por ação acarreta a invalidação de um ato que existe, que foi praticado”. (2008, p. 353).

A idéia de controle de constitucionalidade vem do fato que a Constituição é a norma base para as demais e, como ensina Kelsen, “regem a conduta recíproca dos membros da coletividade estatal, assim como das que determinam os órgãos necessários para aplicá-las e impô-las, e a maneira como devem proceder, isto é, em suma, o fundamento da ordem estatal”. (2003, p. 131).

Assim, resultando o processo legislativo em incongruência com o texto constitucional, o ordenamento jurídico oferece meios para expulsar essas normas que são incompatíveis com a vontade da Constituição.

Temos omissão legislativa absoluta quando não são empregadas pelo legislador as diretrizes constitucionais reclamadas. Já a omissão parcial acontece quando a norma criada atende parcialmente a vontade constitucional ou de modo insuficiente.

Ensina Luís Roberto Barroso que “a omissão inconstitucional total ou absoluta estará configurada quando o legislador, tendo o dever jurídico de atuar, abstenha-se inteiramente de fazê-lo, deixando um vazio normativo na matéria”. (BARROSO, 2006, p. 35).

É mister demonstrar ensinamento do ministro Gilmar Mendes:

“Caso clássico de omissão parcial é a chamada exclusão de benefício incompatível com o princípio da igualdade. Tem-se a exclusão de benefício incompatível com o princípio da igualdade se a norma afronta o princípio da isonomia, concedendo vantagens ou benefícios a determinados segmentos ou grupos sem contemplar outros que se encontram em condições idênticas”. (In: BRANCO; COELHO; MENDES, 2010, p. 1186).

Pelo exposto, nota-se que a inconstitucionalidade não se dá apenas pela ação do legislador ao editar lei que vai contra os mandamentos da Constituição, mas também quando descumprir suas obrigações constitucionalmente descritas, simplesmente por não legislar ou por legislar de forma incompleta.

Inconstitucionalidade Total ou Parcial:

Será total a inconstitucionalidade quando abranger toda a lei ou todo o ato normativo. Em síntese: como nada poderá ser "salvo", tudo será nulo.

Já a inconstitucionalidade parcial alcança apenas uma parte da lei ou do ato normativo. Então, alguns trechos da lei ou do ato administrativo poderão continuar existindo, posto que não desobedece a norma constitucional.

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Conseqüências do ato inconstitucional no ordenamento pátrio

No Brasil vislumbra-se uma forte influência americana na doutrina do controle de constitucionalidade, a qual foi cedendo terreno para os pensamentos da Europa Continental.

Assim, no final do século XVIII e início do século XIX, o pensamento americano sobre o tema se concretizou no Brasil por intermédio de Rui Barbosa. Defendia, com maestria, que o ato inconstitucional era nulo. Esse posicionamento foi fincado em uma ação que se transformou numa magnífica obra por ser rica e moderna.

Nessa oportunidade, Rui Barbosa se apoio em inúmeros doutrinadores e juizes americanos, para defender a nulidade do ato inconstitucional.

Citou Dicey: “Dirigido a um ato do congresso, o vocábulo inconstitucional quer dizer que esse ato excede os poderes do congresso e é, por conseqüência, nulo. Neste caso a palavra nulo importa necessariamente reprovação. O americano poderia, sem incongruência alguma, dizer que um ato do Congresso é uma boa lei, beneficia o país, mas, infelizmente, peca por inconstitucional, isto é, ultra vires, isto é, nulo”.[13]

Citou Kent: Todo o ato do congresso, todo ato das assembléias dos Estados, toda cláusula das Constituições destes, que contrariarem a Constituição dos Estados Unidos, são necessariamente nulos. É uma verdade óbvia e definitiva em nossa jurisprudência.”[14]

Citou, como não poderia ser diferente, Marshall: “Ora, com certeza, todos os que têm formulado Constituições escritas, sempre o fizeram com o intuito de assentar a lei fundamental e suprema da nação; e, conseguintemente, a teoria de tais governos de ser que qualquer ato da legislatura, ofensivo a Constituição, é nulo. Está doutrina está essencialmente ligada às Constituições escritas, e, portanto, deve-se observar como um dos princípios fundamentais de nossa sociedade”.[15]

Para, por fim, concluiu: “Toda medida, legislativa, ou executiva, que desrespeitar preceitos constitucionais é, de sua essência, nula.”[16]

Essa tese foi sedimentada no Brasil. Vários doutrinadores, vários Ministros, vários juízes, a acolheram. Dessa feita, o país passou a adotar como conseqüência do ato inconstitucional a nulidade.

Percebe-se, com isso, que a lei inconstitucional não tem nenhuma eficácia, nem jamais teve, nem terá.

Visando aclarar o tema, traremos a lume a precisa explicação sobre o tema de Ronaldo Poletti:

Para uma norma valer, isto é, para ela ter força como norma jurídica, será preciso que tenha essa qualidade do jurídico, que é a juridicidade. Ora, a norma jurídica não é apenas um imperativo atributivo, a ordem coercível contida num ordenamento estatal ou dela decorrente, ela precisa ser possível. Deve espelhar categorias jurídicas. Nelas estão incluídas as atinentes aos sistemas de Direito, consoante são eles adotados pelos ordenamentos jurídicos nacionais. A lei pode não produzir efeitos, se lhe faltar o fundamento que a realidade social lhe  nega, ao impor-lhe restrições. O problema da compatibilidade da norma com a Constituição também é uma questão do fundamento e da eficácia. O controle da constitucionalidade representa uma adaptação, como já escrevemos, dos princípios do direito natural, fundados nos costumes, na Lei da Terra, aos sistemas que adotam uma Lei Suprema escrita, um Código Constitucional. Sempre o fundamento axiológico, quer fundado no Direito Natural, quer na técnica constitucional dos países de Constituição escrita, é o elemento retirado da norma para negar-lhe eficácia, como por exemplo, através da declaração de inconstitucionalidade.

Isso ocorre nas declarações de inconstitucionalidade (a norma não tem fundamento na Constituição, logo não é lei), cujo corolário reside na retirada de sua eficácia fática: a lei continua a existir formalmente (vigência normativa), mas porque não se compatibiliza com a

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Constituição (ausência de fundamento axiológico) deixa de produzir efeitos, por força de uma repercussão social (eficácia fática).[17]

Note-se que a regra aceita, sem descartar as exceções jurisprudenciais e doutrinárias, é que o ato inconstitucional é nulo.

Essa nulidade comporta efeito ex-tunc. Pois, a eiva da inconstitucionalidade atinge a lei desde seu nascimento. Ademais, a nulidade é declarada, tendo a decisão natureza declaratória, isso é a regra.

Contudo a sanção nulidade não pode mais ser entendida como absoluta no sistema atual. Vez que o ato inconstitucional está suscetível de várias sanções, e de diferentes graus.

Com a Lei 9.868/99, que trata das Ações Diretas de Inconstitucionalidade e das Ações Declaratórias de Constitucionalidade, houve enormes e cruciais mudanças nos efeitos do ato inconstitucional.

O art. 27 da referida lei possui a seguinte redação: “Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.”

O mencionado artigo reforça, a contrario sensu, a idéia de que a o ato inconstitucional é nulo.[18] Pois se faculta ao Supremo manipular os efeitos, deixando claro que, ao fazer uso dessa exceção, poderá impor conseqüências que não correspondem ao ato nulo, infere-se que a regra é a nulidade. 

No entanto, a referida lei consagra a anulabilidade eventual, ou seja, como o STF pode manusear os efeitos da declaração, o ato aparece como anulável.

Isso importa no acolhimento, grosso modo, das teses e práticas defendidas na Europa. Onde prevaleceu a doutrina kelseniana. Kelsen entendia que a lei inconstitucional é uma lei anulável, por um processo especial. É uma norma anulável, com efeito retroativo, e neste sentido nula, pois a nulidade é apenas o grau mais alto da anulabilidade. Isso porque a lei foi válida até sua anulação, não era nula desde o início.

O STF pode manusear os efeitos do ato da seguinte forma: impor efeito ex-tunc (efeito retroativo); ou ex-nunc(efeito ultra-ativo); ou, ainda, determinar uma data entre o ato inconstitucional e a decisão, que na verdade não é nem ex-tunc nem ex-nunc. Isso sem mencionar os efeitos erga omnes e inter parts, os quais também podem ser restringidos.

Mas, para isso, terá que estar presente algumas condições, vejamos: segurança jurídica e excepcional interesse social.

Manoel Gonçalves Ferreira Filho afirma que tais critérios “ensejam uma discricionariedade que chega, no fundo, ao arbítrio.”[19]

Por fim, resta dizer que a natureza da decisão também comportará exceções, pois não será apenas declaratória, como requer a doutrina clássica. Poderá ser: a) declaratória, quando reconhece uma inconstitucionalidade como nulidade; b) constitutiva, quando opera uma restrição nos efeitos da inconstitucionalidade; e c) mandamental, no caso de inconstitucionalidade por omissão.