153
  LICENCIATURA EM ESPANHOL LATIM I

LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

Embed Size (px)

Citation preview

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 1/153

 

LICENCIATURA EM ESPANHOL

LATIM I

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 2/153

 

Presidenta da RepúblicaDILMA VANA ROUSSEFF

Ministro da EducaçãoRENATO JANINE RIBEIRO

Reitor do IFRNBELCHIOR DE OLIVEIRA ROCHA

Diretor-Geral do Câmpus Natal - CentralJOSÉ ARNÓBIO DE ARAÚJO FILHO

Coordenadora do Curso de Licenciatura em EspanholJULIANA KELLE DA SILVA FREIRE

Professor da Disciplina de Latim IMIGUEL AFONSO LINHARES

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 3/153

 

1LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ................................................................................................................................. 5PREFÁCIO ........................................................................................................................................... 6

Aquecimento.............................................................................................................................. 6

Contextualização ............................................................................................................................ 6

Uma língua morta? ........................................................................................................................ 7

Nem viva nem morta: uma língua................................................................................................... 9

Para que estudar o latim? .............................................................................................................10

Aprofundando a reflexão...........................................................................................................12

PLANO DE ENSINO ............................................................................................................................13

Descrição do livro-texto e objetivo ................................................................................................13

Metodologia .................................................................................................................................13

Avaliação ......................................................................................................................................14

HISTÓRIA DE ROMA E DA LÍNGUA LATINA .........................................................................................15

O Reino .........................................................................................................................................15

A fundação lendária ..................................................................................................................16

A pesquisa histórica...................................................................................................................18

Os documentos mais antigos em latim ......................................................................................19

A República ...................................................................................................................................21

A conquista da Itália ..................................................................................................................21

O começo da literatura latina ....................................................................................................22

A potência do Mediterrâneo .....................................................................................................22

As guerras civis ..........................................................................................................................23

A era áurea da literatura latina ..................................................................................................26

O Império ......................................................................................................................................28

Uma nova monarquia ................................................................................................................28

O apogeu ..................................................................................................................................30

A era argêntea da literatura latina .............................................................................................31

O declínio ..................................................................................................................................32

As reformas de Diocleciano e Constantino .................................................................................33

O cristianismo ...........................................................................................................................34A literatura latina cristã .............................................................................................................36

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 4/153

 

2LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

O fim do Império no ocidente ....................................................................................................37

O latim após o fim do Império .......................................................................................................39

Resumo da história de Roma e da língua latina..............................................................................43

ALFABETO E PRONÚNCIA ..................................................................................................................44

Formação do alfabeto latino .........................................................................................................44

Exercício ....................................................................................................................................47

Pronúncia do latim ........................................................................................................................48

Vogais .......................................................................................................................................48

Consoantes ...............................................................................................................................50

Acento ......................................................................................................................................52

Pronúncias vernaculizadas.........................................................................................................53

Exercício ....................................................................................................................................54

Resumo da pronúncia do latim ......................................................................................................54

INTRODUÇÃO À DECLINAÇÃO ...........................................................................................................56

Aquecimento.............................................................................................................................56

O homem e o tempo .....................................................................................................................57

Gramática .....................................................................................................................................57

Exercício ....................................................................................................................................63

O TEMA NOMINAL ............................................................................................................................64

Aquecimento.............................................................................................................................64

O homem e o tempo .....................................................................................................................64

Gramática .....................................................................................................................................65

Exercício ....................................................................................................................................69

A DESINÊNCIA NÚMERO-CASUAL ......................................................................................................71

Exercício ....................................................................................................................................74

A DECLINAÇÃO DOS ADJETIVOS ........................................................................................................76

Aquecimento.............................................................................................................................76

O homem e o tempo .....................................................................................................................76

Gramática .....................................................................................................................................78

Exercício ....................................................................................................................................82

A DECLINAÇÃO DOS PRONOMES .......................................................................................................84

Aquecimento.............................................................................................................................84

O homem e o tempo .....................................................................................................................84

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 5/153

 

3LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Gramática .....................................................................................................................................85

Pronomes possessivos ...............................................................................................................87

Pronomes demonstrativos ........................................................................................................88

Pronome relativo ......................................................................................................................90

Pronome interrogativo ..............................................................................................................90

Pronomes indefinidos................................................................................................................90

Exercício ....................................................................................................................................91

OS NUMERAIS ...................................................................................................................................93

Aquecimento.............................................................................................................................93

A obra e o tempo ..........................................................................................................................93

Gramática .....................................................................................................................................95

Aprofundando a reflexão...........................................................................................................98

Resumo do estudo da declinação ..................................................................................................99

INTRODUÇÃO À CONJUGAÇÃO........................................................................................................101

Aquecimento...........................................................................................................................101

O homem e o tempo ...................................................................................................................103

Gramática ...................................................................................................................................105

Exercício ..................................................................................................................................111

AS DESINÊNCIAS VERBAIS................................................................................................................112

Aquecimento...........................................................................................................................112

O homem e o tempo ...................................................................................................................112

Gramática ...................................................................................................................................113

Exercício ..................................................................................................................................119

A VOZ PASSIVA ................................................................................................................................121

Aquecimento...........................................................................................................................121

O homem e o tempo ...................................................................................................................121

Gramática ...................................................................................................................................122

Exercício ..................................................................................................................................126

AS FORMAS VERBAIS IMPESSOAIS ...................................................................................................127

Aquecimento...........................................................................................................................127

O homem e o tempo ...................................................................................................................127

Gramática ...................................................................................................................................129

Exercício ..................................................................................................................................135

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 6/153

 

4LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Resumo do estudo do verbo........................................................................................................136

VOCÁBULOS INFLEXIONÁVEIS .........................................................................................................137

Aquecimento...........................................................................................................................137

O homem e o tempo ...................................................................................................................137

Gramática ...................................................................................................................................138

Exercício ..................................................................................................................................146

Resumo do estudo dos vocábulos inflexionáveis .........................................................................147

BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................................148

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 7/153

 

5LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

APRESENTAÇÃO

Bem-vindo à disciplina de Latim I!

Meu nome é Miguel Afonso Linhares. Sou licenciado em Le-

tras com habilitação em Português, Espanhol e respectives Literatu-

ras pela Universidade Federal do Ceará (UFC), especialista em Filolo-

gia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Mi-

nas) e mestre em Linguística Aplicada pela Universidade Estadual do

Ceará (UECE). A partir de 2008, exerci o cargo de Professor de 1º e

2º Graus no Centro Federal de Educação Tecnológica de Roraima

(CEFET-RR), carreira e instituições convertidas em Professor do Ensino Básico, Técnico e Tec-

nológico (EBTT) e Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Roraima (IFRR) em

2009. Atuei aí nas três modalidades do curso de licenciatura em Letras – Espanhol (presencial,

segunda licenciatura e a distância), tendo coordenado a criação deste na modalidade a dis-

tância. Em 2013, passei a vincular-me ao IFRN, primeiro por cooperação técnica, depois, desde

2014, como servidor lotado no Câmpus Currais Novos, onde exerço o cargo de Professor do

EBTT, na área de Língua Espanhola, com colaboração no Câmpus Natal – Central.

De entrada, gostaria de dizer que não sou um latinista, mas um romanista, ou seja, não

me considero um especialista em língua latina, mas em línguas românicas. Não obstante, acompreensão integral das línguas românicas demanda, é claro, o conhecimento da língua la-

tina. Declaro isto porque o estudo das línguas românicas sempre me fez olhar o latim como a

língua de um povo (já que as línguas românicas são continuadoras do latim falado, o chamado

latim vulgar), e não como uma joia de erudição, como alguns latinistas.

Esta visão do latim como língua histórica (diria o grande linguista Eugenio Coseriu)

sempre me fez desconfiar do ensino-aprendizagem tradicional do latim, pautado não raro na

decoração das declinações e das conjugações e na tradução de sentenças forjadas expressa-

mente para ilustrar as peças dessas declinações e conjugações. Uma tradição que causa maisrepúdio ao latim do que o reconhecimento da sua importância.

O livro-texto que você tem nas mãos procura, precisamente, superar essa tradição da-

ninha com uma proposta de educação linguística e crítica na língua latina, a qual exporei nas

páginas imediatas.

Bom proveito.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 8/153

 

6LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

PREFÁCIO

AquecimentoAntes de ler o prefácio, será muito proveitoso que você diga – a partir da sua vivência até aqui – por quedeve estudar o latim e o que espera da disciplina de Latim I, que está começando agora.Feito isto, leia, então, o prefácio, procurando confrontar o que você disse com o que está dito nele.Sugiro-lhe que anote os argumentos que lhe chamarem a atenção, independentemente de você os tercompreendido bem ou não. Isso o ajudará a cumprir a tarefa que será pedida após a leitura.

Contextualização

Como tudo que fazemos, ainda mais quando se trata de um trabalho que demandaráa dedicação de uma quantidade considerável do nosso tempo, sempre escasso nos dias dehoje, e também por ser um trabalho que desenvolvemos no quadro da nossa formação pro-fissional, cumpre, antes de mais nada, perguntar-nos por que o fazemos. Quando não se fazessa pergunta, o risco de comprometer o desempenho do trabalho é grande, pois pomos umpé na via de cumprir uma obrigação pela coação. Seguindo essa via, em vez de alcançarmosum aprendizado que acrescente algo de bom à nossa vida, a vivência será uma daquelas emque se escudrinha algo de bom em uma experiência ruim. Para que, então, estudar o latim? 

O ensino-aprendizagem do latim fez parte da Educação Básica no Brasil desde a insta-lação das primeiras escolas no começo da colônia até surtirem os efeitos da primeira Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), a de nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961.Antes, e em cumprimento do Decreto-Lei nº 4.244, de 9 de abril de 1942 (Lei Orgânica doEnsino Secundário), estudava-se o latim nos quatro anos do Ciclo Ginasial e nos três anos doCurso Clássico do Ciclo Colegial. Depois, o estabelecimento das disciplinas foi compartilhadopelos conselhos federal e estaduais de educação. No fim da década de sessenta, sustentava-se o latim apenas no tradicionalíssimo Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro. Continuou-se a es-tudá-lo obrigatoriamente nos cursos de graduação em Letras, mas mesmo aí o ensino-apren-dizagem dessa língua sofreu um golpe em 1996, dado pela nova LDB (Lei nº 9.394, de 20 dedezembro), após a qual a sua inclusão nos currículos desses cursos se tornou optativa.

É certo que há uma relação entre as mudanças de como se concebe a escolarização eessa redução da presença do latim no sistema educativo brasileiro. Das Leis Orgânicas da EraVargas à LDB de 1971 (Lei nº 5.692, de 11 de agosto), vê-se que a concepção da formaçãoescolar transitou do humanismo ao tecnicismo, o qual ainda não foi superado, apesar da ori-entação para a cidadania que emana da LDB de 1996. O ensino-aprendizagem de línguas es-trangeiras tornou-se um caso ilustrativo: acrescentar um conhecimento de inglês ao curricu-lum vitae faz subir a nota de um candidato a um emprego, assim como a falta desse conheci-mento faz descer a de outro. Contudo, é possível que tal conhecimento jamais venha ser de-cisivo na carreira do trabalhador selecionado pela nota mais alta, assim como é possível queoutro conhecimento que tem o candidato não selecionado venha sim sê-lo. Em outras pala-vras, o conhecimento de uma língua estrangeira não é valorizado como elemento de umaformação crítica em relação à linguagem, especialmente da sua dimensão sociopolítica,

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 9/153

 

7LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

como sugerem os Parâmetros e Orientações Curriculares Nacionais; valoriza-se o conheci-mento do inglês  – antes de qualquer outra língua  – em virtude do seu cabedal simbólico,que resulta do poderio econômico, científico, bélico e cultural dos Estados Unidos da América.Em outras palavras, é um conhecimento oco.

Em um ensino-aprendizagem de língua estrangeira concebido assim, é claro que nãocabe o latim, precisamente porque essa língua já perdeu muito do imenso cabedal simbólicoque possuiu outrora. Neste sentido, estudar o latim não serve para nada, a não ser para serprofessor de latim... Não obstante, o caso do latim foi agravado pelo fazer dos professores.Enquanto os professores de línguas estrangeiras modernas foram aperfeiçoando o seu traba-lho com as pesquisas linguísticas nessa área, nomeadamente as da Linguística Aplicada, osprofessores de línguas clássicas mantiveram o seu trabalho atado ao mesmo aparelho teórico-metodológico. 

Passados mais de vinte anos, o progresso da didática das línguas clássicas continua

muito lento em relação à das línguas estrangeiras modernas e até mesmo à da língua materna.Em várias graduações em Letras, cursar a disciplina de Latim continua a ser um mero rito ,comparável a um rito de iniciação violento e doloroso, pelo qual a maioria passa a duras penasporque, como a disciplina é obrigatória, o preço de negar submeter-se é alto demais, poisimplica em desistir do curso inteiro. Uma minoria percebe as regras do jogo, amolda-se a elase passa com certa facilidade. Uns poucos – bem poucos – sentem-se atraídos de alguma ma-neira pelos estudos clássicos: são os que vêm especializar-se na área.

Uma língua morta?Felizmente, as posições de professor e aprendiz de latim são privilegiadas para refletir

sobre o ensino-aprendizagem de línguas. De entrada, ensinar e aprender o latim demandarefletir sobre o que é uma língua, posto que, como se sabe, o latim é uma “língua morta”.

Como ensina a Linguística desde a publicação do Curso de linguística geral , de Ferdi-nand de Saussure, em 1916, a língua é um sistema de signos que se estabelece e funcionamediante oposições de valores. Eugenio Coseriu (1979, p. 11-113) examinou a dicotomia sau-ssuriana fundamental que opõe a língua e a  fala e encontrou uma incoerência: segundo aexposição do Curso, Saussure entendia que a língua consiste no sistema de signos, abstrato esocial, enquanto a fala é a concreção individual desse sistema; no entanto, há fenômenos que

são sociais, mas não comportam oposição de valores. Por exemplo, as realizações de umapalavra como porta no português brasileiro ou como calle em espanhol são sociais (são comu-nidades inteiras que dizem [ˈpɔɹtɐ] ou [ˈpɔhtɐ], [ˈkaʝe] ou [ˈkaʒe]), mas essas realizações (do/R/ de porta como [ɹ] e [h], do /ʎ/ de calle como [ ʝ] e [ʒ]) não opõem valores, não constituemfonemas (não há par mínimo em português em que se oponham [ɹ] e [h], nem em espanholem que se oponham [ ʝ] e [ʒ]). Para suprir essa deficiência, Coseriu propôs acrescentar-se umterceiro elemento à dicotomia saussuriana, ao qual chamou norma.

Resumindo a proposta desse linguista, falar uma língua implica em valer-se de um con- junto fechado de possibilidades, que é o sistema: por exemplo, em português pode-se esco-lher [ɹ] ou [h] em porta e em espanhol [ ʝ] ou [ʒ] em calle. Também implica em obedecer a uma

fixação dessas possibilidades pela comunidade, que é a norma: por exemplo, quem identificaa sua fala com o dialeto do português falado em Goiás diz [ˈpɔɹtɐ] e quem a identifica com o

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 10/153

 

8LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

falado no Rio Grande do Norte diz [ˈpɔhtɐ]; igualmente, quem identifica a sua fala com o dia-leto do espanhol falado na Venezuela diz [ˈkaʝe] e quem a identifica com o falado no Uruguaidiz [ˈkaʒe]; isso ocorre de tal modo que dizer [ˈpɔɹtɐ] no Rio Grande do Norte e [ˈpɔhtɐ] emGoiás ou [ˈkaʝe] no Uruguai e [ˈkaʒe] na Venezuela é “anormal”, no sentido em que desobe-

dece à norma de um lugar e do outro (a norma é plural: há várias normas). Enfim, implica emexercer certa liberdade, que é a fala: por exemplo, se alguém em um recinto mantém a portafechada e alguém sai sem a fechar, essa pessoa pode dizer “A pooorta!” , com um [ɔ] alongado,que exerce uma função naquele momento (chamar a atenção a quem não fechou a porta).

Quem, pois, forma o sistema de possibilidades, estabelece a norma de obrigações egoza da fala de liberdades? As pessoas, as pessoas fazem tudo isso. Assumindo uma visão delinguagem que vai mais longe: o homem constitui e é constituído pela linguagem . A identi-dade de cada um e as relações de uns com os outros, e a própria criação do mundo são cons-truídas pela linguagem.

O latim não é mais a língua materna de ninguém . Não há um povo que forme o sis-tema de possibilidades, estabeleça a norma de obrigações e goze da fala de liberdades dolatim. Do latim nós possuímos um corpus muito vasto, pelo qual podemos conhecer parcial-mente o seu sistema, parcialmente porque é um conhecimento fundado quase todo em umasó norma – a literária –, na qual quase todo o corpus está lavrado.

Assim, é relativamente fácil traduzir um texto do latim para o português, para o espa-nhol ou qualquer outra língua hodierna. No caso do português, nós mesmos somos os juízesda tradução, de se há ou não nela algo que parece absurdo na nossa língua ou algo que pode-mos até aceitar, mas fica estranho, ou, em outras palavras, algo que desobedece respectiva-mente ao sistema ou à norma, por um abuso da liberdade de que se goza na fala. Em espanhol

ou outra língua hodierna, basta, igualmente, consultar um falante nativo para emitir o mesmo juízo. Em contrapartida, é impossível traduzir um texto do português ou espanhol (ou outralíngua hodierna) para o latim, porque falta, precisamente, juiz que julgue essa tradução.

Por exemplo, pode-se perfeitamente traduzir a sentença Etiam capillus unus habet um-bram suam, de Publílio Siro, como ‘Até um cabelo tem a sua própria sombra’, e comentar,com base em estudos (como o de Tosi, 2010, p. 73-74), que significa que até quem ou o queparece insignificante tem a sua importância, e pode (re)agir. Por outro lado, não se pode tra-duzir para o latim um ditado nosso tão singelo e comezinho como Quem vê cara não vê cora-ção. Alguém pode afirmar que ficaria Qui uultum uidet cordem non uidet , mas vejam-se osproblemas: primeiro, outra pessoa pode preferir Qui faciem uidet cordem non uidet , e outra,Qui orem uidet cordem non uidet , porque tanto uultus como facies e também os significam‘cara’, ‘face’, ‘rosto’; segundo, outra pessoa poderia preferir também Qui uultum non uidetanimum non uidet , ou Qui faciem non uidet animum non uidet , ou Qui orem non uidet animum non uidet , porque animus, assim como cor , também tem o sentido de sede dos sentimentos;terceiro, outra pessoa pode preferir ainda specit  a uidet , ou mesmo o seu derivado spectat ,porque specere e spectare significam ‘olhar’, ‘fitar’, ‘observar’. Ao todo, considerando essaspossibilidades, pode haver dezoito combinações! Cada um poderia esgrimir argumentos igual-mente defensáveis e respeitáveis, perante os quais teríamos de aceitar a justeza de todas as“traduções”. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 11/153

 

9LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Não obstante, perceba que em línguas hodiernas pode acontecer, em princípio, omesmo. Por exemplo, em espanhol poder-se-ia traduzir cara como cara, rostro ou haz; cora-ção como corazón ou alma; ver  como ver , mirar , observar . Contudo, em uma língua hodiernahá uma diferença decisiva: por mais que Quien ve cara no ve corazón seja uma sentença bem

construída do ponto de vista gramatical, se o seu tradutor apelar ao juízo de um falante nativodo espanhol, ouvirá dele que ela soa esquisito como ditado, porque o ditado que os hispano-falantes usam é Caras vemos, corazones no sabemos.

É razoável preferir uma construção que estranha o falante nativo àquela que ele cos-tuma usar? Nós procuramos falar uma língua estrangeira como os seus falantes nativos a fa-lam, e no caso do latim tudo que nos resta dessa fala são os textos que os falantes nativosescreveram e que remanesceram até os nossos dias. Assim, quando muito podemos ir buscarno corpus do latim algo que um falante nativo tenha deixado escrito, como Decipit frons primamultos, de Fedro (4, 2, 6), ou Fronti nulla fides, de Juvenal (Satirae, 2, 8), que significam res-pectivamente ‘A primeira impressão engana muitos’ e ‘Nenhuma confiança na cara’  (apud  TOSI, 2010, p. 101-102).

Compreender que o latim não é mais falado é fundamental, pois estabelece um enca-minhamento muito claro. Se queremos estudar o latim que era a língua do povo romano, en-tão o nosso estudo deve ser desenvolvido com base nos textos que os romanos nos legarame que se conservaram até hoje.

Com efeito, há uma contradição no ensino-aprendizagem tradicional do latim. De umlado, essa língua é tratada como um mero código, decifrado em uma porção de quadros comdezenas de peças e de listas de regras cheias de exceções, que se aprendem por memorização;ou seja, mata-se a língua naquele sentido em que é com ela que nós nos tornamos quem

somos e com ela fazemos existir o que cremos existir. Em outras palavras, é uma língua morta – matada –, porque é ensinada e aprendida como se nunca tivesse sido a língua de um povo.Do outro lado, para ilustrar a decifração, o próprio professor, seja o que ministra a aula seja oque elaborou o livro-texto adotado, produz sentenças e até pequenos textos nesse código,como se não fosse uma língua morta – obsoleta –, mas ainda a língua de um povo.

Precisamente, para evitar essa ambiguidade da expressão língua morta. Lima (1995, p.19) contorna-a chamando ao latim língua viva do passado, e acrescenta: “portanto, só emrelação a esse passado cabem as providências que diferenciam o seu ensino do de qualquerlíngua estrangeira do presente”. Ainda menos ambíguo seria chamar-lhe simplesmente língua

do passado, com o que se acabaria por eludir qualquer menção à língua como se fosse um servivo que nasce, cresce e morre.

Nem viva nem morta: uma línguaEmbora o autor citado exponha, no mesmo lugar, a necessidade de distinguir o ensino-

aprendizagem de uma língua do passado e o de uma do presente, mais adiante acaba, porém,reconhecendo que um não deve distanciar-se demais do outro. De fato, o ganho mais rele-vante da difusão da abordagem comunicativa no ensino-aprendizagem de línguas foi o enten-dimento de que não se deve estudar a língua com um fim em si mesma, pois as pessoas a

usam para fazer coisas. Neste sentido, o estudo é concebido como capacitação à comunicaçãocotidiana na língua que se ensina e se aprende. Para tanto, o trabalho é desenvolvido pela

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 12/153

 

10LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

interação dos sujeitos envolvidos com base em textos, autênticos sempre que possível (ouseja, que não tenham sido produzidos expressamente com fins didáticos); a gramática é evi-denciada de modo indutivo, a partir das atividades comunicativas.

No caso do latim, não há nenhuma razão para repudiar essa concepção de ensino-aprendizagem, como tem feito a prática tradicional. O latim foi uma língua como qualqueroutra, e a chave de uma abordagem comunicativa do seu ensino-aprendizagem está exata-mente na consideração desse “foi”: ensinar e aprender o latim requer tão somente uma adap-tação dessa abordagem às condições históricas que vieram restringir o estudo dessa língua àleitura. Entendida a leitura como negociação de sentido, ler não é uma habilidade meramentepassiva, mas interativa. Ainda que tenha sido produzido há séculos e mantenha a mesma ma-terialidade, o texto do escritor latino atualiza-se como evento comunicativo cada vez que érecebido de novo.

Pensando, precisamente, no papel da língua materna no ensino-aprendizagem de lín-

gua estrangeira, assumir a abordagem comunicativa não implica em rejeitar cabalmente aabordagem da gramática-tradução, na qual se pauta o estudo tradicional do latim. Efetiva-mente, a tradução continua a ser uma estratégia necessária e proveitosa no ensino-aprendi-zagem dessa língua. Na verdade, por mais que a abordagem comunicativa dê ênfase à estra-tégia de imersão na língua estrangeira, a língua materna é irremediavelmente o ponto de par-tida do aprendiz, de modo que o traduzir é inevitável.

Em geral, as escolhas com as quais um tradutor se depara demandam a integração decompetências e habilidades que costumam estar cindidas nos livros-texto de orientação co-municativa; ao traduzir um texto, é preciso levar em conta não só a redação, mas também aadequação ao gênero textual, à variedade linguística e ao contexto discursivo e o atravessa-

mento ideológico. É razoável arguir que a necessidade de conjugar essas competências e ha-bilidades torna a leitura destinada à tradução mais atenta do que outra que não tem esse fim.Essa necessidade também acaba favorecendo uma percepção mais sensível de matizes léxico-gramaticais e discursivo-pragmáticos envolvendo os usos de uma língua e da outra.

Em particular, como no caso do latim não é possível aplicar a estratégia de imersão,que induz a uma aprendizagem paulatina da gramática e do léxico, necessária ao mais básico,que é a codificação-decodificação, a tradução vem supri-la. É traduzindo que o aprendiz inici-ante de latim decodifica os textos que são o que resta da fala dos usuários nativos dessa lín-gua. À sua vez, a decodificação permite-lhe ir além: interpretar esses textos, o que implica emnegociação de sentido e comporta a atualização deles. Portanto, não se trata de uso da tra-dução como na tradição, pois a interpretação exige a compreensão não só da materialidadedo texto (o cotexto), mas também do seu contexto. Por outro lado, cabe acrescentar que nãose há de cobrar uma tradução literária, isto é, especialmente atenta à dimensão poética dotexto; trata-se antes de uma tradução palavra por palavra, uma tradução de trabalho, quefavorece a percepção da estrutura do sistema linguístico.

Para que estudar o latim?De entrada, convém vigiar o deslumbramento com uma resposta que pareça definitiva

e universal. Por não haver uma receita, creio que a resposta à pergunta “por que estudar o

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 13/153

 

11LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

latim?” tem de ser local, isto é, ser dada a partir do lugar onde se estuda o latim, no sentidode que deve considerar o meio em que acontece.

Parecem-me mais que razoáveis as respostas quase uníssonas de vários autores quese ocuparam da questão (BRUNO, 1992, p. 166; PRADO, 1992, p. 155; LIMA, 1995, p. 87;LONGO, 2006, p. 17; MIOTTI, 2006, p. 11; TEIXEIRA, 2009, p. 92; FERNANDES, 2010, p. 220;FORTES, 2010, p. 67): estuda-se o latim para se ter acesso aos textos que os falantes nativosescreveram, nomeadamente os textos literários, e, dentre estes, os clássicos, que remanes-ceram até nós, nos quais está testemunhada a sua vivência. Com “vivência” refiro-me a tudoque o povo romano pensou e fez. Mas por que nos interessa conhecer a vivência dos roma-nos? Poderia debulhar um rosário de coisas que fazem parte da nossa vivência atual as quaistêm origem na Antiguidade greco-romana, mas Fiorin (1991, p. 516-517) dá uma respostamais engenhosa, concisa e convincente: o estudo do latim permite-nos fazer um movimentoaparentemente contraditório, porque por um lado é olhar-se no espelho, é conhecer a simesmo, é compreender a nós mesmos, pois não só pertencemos à civilização ocidental, queé continuadora da Roma antiga, como também falamos uma língua românica, que é continu-adora do latim; por outro lado é olhar para o outro, é conhecê-lo, é compreender a sua dife-rença, pois apesar da continuação, não somos romanos nem falamos latim. Um trabalho quefomenta ao mesmo tempo o senso crítico em face da identidade e o respeito à alteridade nãonos faz senão homens e mulheres melhores.

No nosso caso, que é a licenciatura em Espanhol do IFRN, ofertada no Câmpus Natal – Central, o primeiro projeto pedagógico do curso, aprovado pela Resolução nº 23/2005-CD/CEFET-RN, não destinou nenhum componente curricular ao estudo do latim. Não obs-tante, estabeleceu uma disciplina de História da Língua Espanhola, com uma duração de ses-

senta horas, situada no terceiro período, integrada ao bloco de formação em literatura e cul-tura espanhola e hispano-americana, que tem entre os seus objetivos “dar uma visão da evo-lução histórica da língua espanhola, tanto no que se refere à sua dimensão externa quanto àsmudanças que, ao longo do tempo, cederam lugar ao sistema lingüístico atual” (CEFET -RN,2005, p. 19). Especificamente, a disciplina ganhou a ementa seguinte: “Enfoque panorâmicodos principais momentos na formação do sistema da língua espanhola: a evolução históricado espanhol, partindo do latim até os dias de hoje [...]” (CEFET-RN, 2005, p. 25).

No entanto, quando se pôs o curso em funcionamento e as ofertas da disciplina deHistória da Língua Espanhola foram sucedendo-se, logo se percebeu que é quimérico abordara evolução do espanhol partindo do latim sem o estudo do latim , pois para que tivesse êxito

seria preciso que o graduando trouxesse esse conhecimento da Educação Básica, o que singe-lamente inexiste. Nesse sentido, é ao próprio curso de graduação que cabe fornecer o conhe-cimento básico necessário ao ensino-aprendizagem de um conteúdo julgado relevante para ocumprimento dos fins aos quais serve o curso. Assim, o segundo PPC, aprovado pela Resoluçãonº 12/2012-CONSUP/IFRN, incluiu uma disciplina de Latim I, com uma duração de sessentahoras, no segundo período, a qual foi integrada ao núcleo epistemológico, “relativo a discipli-nas de fundamentos históricos, filosóficos e científicos, que abrangem o conhecimento neces-sário à compreensão dos conteúdos específicos” (IFRN, 2012, p. 14). A ementa que recebeu éa seguinte: “Compreensão da língua latina numa perspectiva linguística e soc iocultural, le-vando-se em consideração uma abordagem crítica da história e literatura latinas”  (IFRN,

2012, p. 68).

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 14/153

 

12LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Também se acrescentou uma disciplina de Latim II na qualidade de optativa, a qual,apesar do nome, não consiste em aprofundamento daquela de Latim I, como se depreendeda sua ementa: “Compreensão, a partir do latim, do processo histórico relacionado ao surgi-mento das línguas romances, com destaque para a língua espanhola” (IFRN, 2012, p. 131). 

O fato de o estudo do latim ter sido localizado no segundo período junto a disciplinasdo mencionado núcleo epistemológico é bastante revelador da concepção que norteou a suainserção nesse currículo, que nada mais é que a concepção dominante nos currículos das gra-duações em Letras: o conhecimento do latim como meio que viabiliza o saber a língua româ-nica que é o objeto da formação ao nível da graduação. Dessa maneira, por mais que o estudose paute sobre uma perspectiva comunicativa, intercultural e emancipatória, não sairá do cír-culo vicioso de não se aprender a língua românica por não se saber o latim e fracassar nistopor não se saber a língua românica. Não se romperá esse círculo vicioso precisamente emvirtude de o estudo ficar constrangido pelas condições da sua situação no currículo, que oprendem dentro do círculo.

Enfim, o terceiro PPC da licenciatura em Espanhol do IFRN, agora com o nome de Letras – Espanhol, aprovado pela Deliberação nº 45/2014-CONSEPEX/IFRN, arrojou-se à inovação: asdisciplinas de História da Língua Espanhola e Latim II foram renomeadas respectivamentecomo Filologia Hispânica e Filologia Românica, para nome e ementa se coadunarem melhor.A Filologia Românica permaneceu como optativa, enquanto a Filologia Hispânica foi deslocadado segundo ao sétimo período. Consequentemente, a disciplina de Latim I, agora Língua La-tina, foi ressituada no sexto período. Além disso, entre as competências que compõem o perfilde conclusão adicionou-se “analisar a léxico-gramática da língua espanhola a partir de umavisão dialética desta com o uso, tanto do ponto de vista diacrônico como do sincrônico”

(IFRN, 2014, p. 12, grifo meu).Assim, se de um lado o estudo do latim continua a constituir o subsídio sem o qual os

estudos das Filologias Hispânica e Românica se tornam inviáveis (seria mesmo uma desones-tidade fazer crer que em sessenta horas alguém será capaz de ler os textos dos autores latinosclássicos), de outro o sucesso ou o fracasso do ensino-aprendizagem do conteúdo restante docurso deixa de depender do latim, entendido como fundamento para se saber quase tudo.Liberado desse encargo hercúleo, o conhecimento do latim, sinergicamente com o da históriado espanhol e complementarmente com o da história das línguas românicas, pode servir aopropósito mais humilde de contribuir com uma formação que não só procura ser a mais in-tegral possível, mas também aproveitar as possibilidades do legado romano de contribui-

ções com uma formação comunicativa, intercultural e emancipatória.

Aprofundando a reflexãoAgora que você leu o prefácio, o que está dito nele se aproxima ao que você disse na atividade deaquecimento? Ou, ao contrário, diverge bastante? O que aproxima e o que diverge? Há algum argumentoque você não entendeu bem? Se você cumpriu a recomendação de anotar os argumentos do texto, estaé a hora de usar essa anotação.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 15/153

 

13LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

PLANO DE ENSINO

O prefácio foi mais uma argumentação a favor de certa perspectiva epistemológica e

pedagógica em face do ensino-aprendizagem da língua latina, justificável por ser uma ativi-

dade ainda muito mal delineada, e, por isso mesmo, problemática. O plano de ensino passo a

traçar agora.

Descrição do livro-texto e objetivo

Este livro-texto é composto de dez capítulos, dedicados à aprendizagem da língua la-tina em um nível básico. Como se disse no prefácio, o latim está concebido aqui como a língua

de um povo, do povo romano, portanto uma língua que tem uma história. Persegue-se o ob-

 jetivo de perceber como os elementos que compõem um texto em latim se articulam , por-

tanto um estudo que passa pela compreensão de como funcionam os mecanismos cardeais

da gramática latina.

Cada capítulo foi elaborado de forma bastante semelhante. Para começar, há uma ati-

vidade de aquecimento, consistente em uma reflexão sobre um tema abordado no texto la-

tino sobre o qual o capítulo está alicerçado. Esse texto é apresentado primeiramente em uma

tradução para o português. Seguem-se-lhe considerações acerca do autor, da obra e do texto

citado, após as quais é desenvolvida a reflexão gramatical, primeiro com base no texto em

português e depois com base no original latino. Com efeito, o contraste entre o passado e o

presente no campo da história e entre o latim e o português no campo da gramática é a coluna

vertebral deste livro-texto. Depois, o capítulo é finalizado por um exercício, que consiste em

perceber os mecanismos gramaticais estudados até então em outro texto latino. Assim pois,

trata-se de exercícios cujo volume de trabalho vai crescendo à medida que vai ampliando-se

a compreensão do funcionamento da língua.

Metodologia

Como se terá notado na descrição acima, o presente livro-texto não se distingue de

maneira alguma por uma sobrecarga de atividades e exercícios. Prima-se muito mais pela

construção do conhecimento mediante a reflexão. As atividades de aquecimento e de apro-

fundamento deixam ver bem isso, já que boa parte delas consiste em defender a própria opi-

nião sobre certo assunto, mas os exercícios de gramática também não fogem a esse princípio:

para cumpri-los não é preciso decorar nada; é preciso, isso sim, entender como funcionam os

mecanismos gramaticais estudados. É claro que a repetição pode ser uma estratégia didática

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 16/153

 

14LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

proveitosa, tanto que os exercícios têm a mesma natureza e são cumulativos, mas a repetição

por si não gera aprendizagem, mas memorização mecânica. Nesse sentido, o uso de textos

autênticos é muito relevante, pois aduz algo muito próprio do uso da linguagem, que é a con-

tingência, o dado inesperado.Todo o livro-texto foi elaborado de modo a permitir e incentivar o autodidatismo,

sendo que o acompanhamento do formador pode e deve enriquecer esse processo. Na ver-

dade, o estudante não necessita nem mesmo consultar ou adquirir uma gramática ou um di-

cionário de latim (costumeiramente obras raras e caras), algo comum no ensino-aprendiza-

gem tradicional dessa língua, se bem obras de referência que o estudante de Letras não pode

deixar de ter e usar são uma boa gramática e um bom dicionário de português. Não se trata

de cair no mito de que é preciso “saber” português para aprender o latim, mas  é que esta

disciplina de Língua Latina integra um curso de Letras, onde dominar certa metalinguagem é

muito importante. Além disso, estudando textos de um passado distante, mesmo traduzindo-

os, é bastante provável deparar-se com palavras desconhecidas.

Enfim, algumas convenções adotadas: tudo que está escrito em latim está em verme-

lho; tudo que está em português está em azul; o que está em espanhol aparece em verde e

em outras línguas, em laranja.

Avaliação

O maior objetivo desse livro-texto é que o aluno alcance o décimo capítulo reconhe-

cendo todos os componentes de um texto latino, requisito para decodificá-lo e lê-lo. É claro

que um texto latino composto de construções estudadas, pois há várias minúcias que não

cabem em uma disciplina introdutória com uma duração de sessenta horas.

Assim, as atividades e os exercícios propostos neste livro-texto sejam avaliados de

modo a comporem a nota correspondente a 30% da média. Equivalente a outros 30%, haverá

uma oficina, ministrada na forma de um pré-teste, em que diferentes grupos de alunos tra-

duzirão diferentes textos latinos a partir dos conhecimentos adquiridos até então, dados os

subsídios para suprir os não adquiridos. Uma prova poderá ser aplicada da mesma maneira,

mas individualmente (40% restantes).

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 17/153

 

15LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

HISTÓRIA DE ROMA E DA LÍNGUA LATINA

 AquecimentoNeste capítulo, começamos a fazer um percurso pela história de Roma e da língua

latina. Observe esta imagem:

Figura 1

Você já a tinha visto? Sabe a que ela alude?

O Reino

Essa escultura é conhecida como Loba Capitolina. Foi esculpida provavelmente no sé-

culo XIII (os meninos foram acrescentados no século XV). Está guardada nos Museus Capitoli-

nos, em Roma. Chamam-se capitolinos porque se acham no Capitólio, uma das colinas sobre

as quais foi edificada essa cidade e onde ficava o templo de Júpiter Ótimo Máximo, o deus

tutelar do Estado romano, e por isso um lugar muito solene.

A Loba Capitolina representa a lenda da fundação de Roma. A seguir você encontrará

a exposição dessa lenda segundo a narração de Tito Lívio, um historiador romano que nasceu

em Patávio, província da Gália Cisalpina (hoje Pádua, Itália), em 59 ou 64 a.C., e morreu em

17 d.C. O relato faz parte da obra Ab V   rbe condĭtā, isto é, ‘Desde a fundação da Cidade’.

Essa obra compunha-se de 142 livros, dos quais remanesceu mais ou menos um

quarto: do I ao X (desde o exílio de Eneias até o ano de 293 a.C.) e do XXI ao XLV (desde o ano

de 218 a.C. até o de 167 a.C.), além de resumos, chamados “períocas”, de quase todos, um

compêndio similar de uns poucos e mais de oitenta fragmentos. Salvo o primeiro livro, queabrange toda a história antes do estabelecimento da República, cada livro está preenchido

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 18/153

 

16LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

com os acontecimentos de um ano (que era a duração do mandato de uma magistratura). O

conjunto está ordenado em seções de cinco livros, ou “pêntalas”. 

A fundação lendária

A lenda relativa à Loba Capitolina constitui o conteúdo do quarto capítulo do livro I.

No primeiro capítulo, narra-se a saída de Antenor e Eneias de Troia, a quem os aqueus (ou

seja, os gregos) pouparam as vidas após conquistar a cidade. Antenor, junto com uma multi-

dão de ênetos (um povo que habitava a Paflagônia, na atual Turquia) aportou nos confins do

mar Adriático, onde deu origem ao povo vêneto. Eneias, após passar pela Macedônia e pela

Sicília, entrevistou-se com Latino, rei da cidade de Laurento, com cuja filha, Lavínia, se casou

e em cuja homenagem fundou a cidade de Lavínio.

No segundo capítulo, conta que Turno, rei dos rútulos, a quem Lavínia estava prome-

tida antes da chegada de Eneias, sentindo-se ofendido, declarou guerra a este e a Latino.

Eneias e Latino venceram a guerra, mas à custa da morte deste. Turno aliou-se, então, a

Mezêncio, rei dos etruscos. Perante tamanha ameaça, Eneias uniu a sua gente e a de Latino

sob o nome de latinos, que assim conseguiram defender-se, vitória que foi o derradeiro ato

de Eneias.

No terceiro capítulo, relata que Ascânio, filho de Eneias, como Lavínio crescera muito,

fundou uma colônia que se prolongava pelo monte Albano, daí o seu nome: Alba Longa. Doze

gerações de reis sucederam-se aí até Numitor, que foi destronado pelo seu irmão Amúlio,

quem extinguiu todos os seus herdeiros varões e obrigou a sua filha, Reia Sílvia, a tornar-se

uma vestal, ou seja, uma sacerdotisa de Vesta, a deusa do lar. Como as vestais deviam manter-

se castas, a descendência de Numitor estaria aniquilada.

Eis, pois, o quarto capítulo em uma tradução para o português do texto latino de Lívio,

que estudaremos adiante:

Mas, a meu parecer, deveram-se ao fado a origem de tamanha cidade e o co-meço do maior poder após o poderio dos deuses. Tomada à força, a Vestal,como tivera um parto de gêmeos, ou porque crido assim ou porque um deusera um autor mais honroso para a falta, declara Marte o pai da incerta cepa.Mas nem os deuses nem os homens poupam da crueldade real ou a ela ou acepa: a sacerdotisa é dada amarrada à prisão; manda que os meninos sejamarremessados em água corrente. De certa maneira por um acaso vindo dosdeuses, o Tibre, derramado sobre as margens em remansos suaves, de algummodo não podia achegar-se ao curso da corrente certa e dava a esperançaaos que levavam as crianças de elas poderem afogar-se na água mesmo queesmorecida. Assim, como se estivessem quites com o mandado do rei, aban-donam os meninos no alagamento mais próximo, onde está agora a figueira

Ruminal – contam que chamada Romular –. Havia então vastas solidões nes-ses lugares. O rumor sustenta que, como a água rasa deixara no seco a cuba

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 19/153

 

17LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

boiante em que os meninos tinham sido abandonados, uma loba sedenta to-mou o rumo dos montes que havia ao redor para o berro meninil; ofereceuas tetas abaixadas às crianças tão dócil que um maioral do rebanho real – contam ter tido o nome de Fáustulo – a terá achado lambendo com a língua

os meninos, dados por ele à sua esposa Larência para serem educados juntoàs estrebarias. Há quem considere que Larência, de corpo devassado, era cha-mada loba entre os pastores, donde o que deu lugar à lenda e ao milagre. As-sim gerados e assim educados, tão logo aumentou a idade, ao invés de esta-rem vadios ou nas estrebarias ou junto aos rebanhos, percorrem os bosquescaçando. Ganho disto vigor para os corpos e para as almas, já não afrontamapenas feras, mas fazem assaltos a ladrões carregados de presa e dividem osroubos com os pastores, e crescendo de dia em dia a grei de jovens, celebramcom eles jogos e coisas sérias.

Este texto trata da lenda de Rômulo e Remo. Lí-

vio acaba de contá-la nos três capítulos seguintes. No

quinto, conta que os ladrões tomaram Remo e o entre-

garam a Amúlio sob a acusação de desrespeitar as pro-

priedades de Numitor, a quem foi encaminhado. Com

medo, Fáustulo  revelou a Rômulo a sua origem, en-

quanto Numitor, desconfiado, quase reconheceu o neto

preso. Rômulo levantou, então, uma revolta contra Amú-

lio, a quem matou.

No sexto capítulo, Numitor convocou a assem-bleia, perante a qual denunciou os crimes do seu irmão

e reconheceu os seus netos, e esta lhe devolveu a digni-

dade de rei. Rômulo e Remo desejaram, então, fundar uma cidade no lugar onde tinham sido

abandonados e educados, mas como eram gêmeos, surgiu o impasse de quem deveria dar

nome à nova cidade e regê-la. Rômulo subiu ao monte Palatino e Remo ao Aventino para

tomar os agouros dos deuses.

No começo do sétimo capítulo, o agouro veio primeiro para Remo: seis abutres, mas a

Rômulo apareceu o dobro de aves, de modo que cada multidão saudou um como rei. Travada

uma discussão, desatou a matança, na qual Remo foi morto. Todavia, segundo Lívio, estava

mais divulgada a versão de que Rômulo matou Remo porque este, desdenhoso, trespassou

os muros da nova cidade, que foi chamada, então, com o nome do seu fundador.

Marco Terêncio Varrão  (116-27 a.C.), “o homem mais erudito dos romanos”  (“uīr

Rōmānōrum ērudītissĭmus”), segundo o historiador Suetônio  (70 d.C.-126), precisou que

Roma foi fundada em 21 de abril do ano que pela nossa contagem foi 753 a.C. 

Perceba que embora Lívio impute asorigens de Roma ao fado (em latim

 fātum, mas no texto de Lívio fāta, noplural, quase aludindo às Parcas, astrês divindades que cuidam do des-tino), semeia a dúvida quanto ao epi-sódio da amamentação dos meninospor uma loba, dado que a palavralupa, ‘loba’ em latim, também signi-fica ‘prostituta’ (tanto que um dos si-nônimos de  prostíbulo  é lupanar ).Seja como for, a loba, seja o bichoseja a prostituta, foi divinizada sob onome de Luperca. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 20/153

 

18LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

A pesquisa histórica

Na verdade, podem-se interpretar as lendas so-

bre a fundação de Roma como uma metáfora de um pro-

cesso fundacional que durou por todo o tempo durante

o qual a cidade-Estado foi um reino e também no co-

meço da República. Seja como for, a pesquisa histórica

não é abissalmente diferente da lenda, ao menos quanto

aos atores coadjuvantes e ao cenário. Efetivamente,

Roma deve ter surgido de um amontoado de aldeias er-

guidas por pastores sobre cerros em meio a brejos pesti-

lentos. Os alagadiços foram drenados no reinado de Tar-

quínio Prisco (616-579 a.C.), quando se construiu, entre

outros edifícios de alvenaria, a Cloaca Máxima, o que

permitiu a pavimentação do Fórum, a praça onde se en-

contravam os cidadãos, a qual tinha esse nome porque

ficava fora da cidadela. Para defenderem-se de inimigos

mais poderosos, as aldeias tinham formado uma liga.

Sérvio Túlio (579-535 a.C.) levantou a muralha de pedra 

que as cingiu, além de ter reformado o ordenamento do

povo e do exército.

Contudo, muito antes de fundar Roma, a gente que veio ser, em parte, os latinos  – opovo ao qual os romanos pertenciam – empreendeu uma longa migração até estabelecerem-

se no território que veio ser a Itália. Cumpre lembrar que o latim fazia parte da família de

línguas à qual se conveio chamar indo-europeia, pelo fato de, na sua existência histórica, es-

tender-se da Índia à Europa, convenção que também se deve ao fato de a língua da qual deri-

vam as línguas indo-europeias não estar atestada por nenhum documento, de modo que não

se sabe qual nome lhe dava o povo que a falava, nem qual nome dava a si mesmo.

Hipotético também é o lugar donde partiram os indo-europeus para alcançar as terras

que vieram ocupar ao aparecerem na história. Desde meados do século passado, a hipótesemais aceita é a proposta pela arqueóloga lituana Marija Gimbutas, que identifica os indo-eu-

ropeus com o povo que construiu os kurgans, túmulos grandes em forma de montes. Segundo

a sua pesquisa, os kurgans mais antigos estendem-se pelas estepes entre os rios Volga e Dni-

eper, nas atuais Rússia e Ucrânia, e remontam a 4500 a.C.

Na atual Itália, os sinais de indo-europeização mais antigos remontam a cerca de 1200

a.C. Seis séculos depois, no princípio da história de Roma, a península apresentava uma com-

posição multiétnica. Ao nordeste viviam os vênetos, cuja língua – indo-europeia – estava apa-

rentada com a dos ilírios, que habitavam a península dos Bálcãs junto ao mar Adriático; ilírica

também era a língua falada no sudeste: o messápio. No noroeste habitavam os lígures, de

Diz a lenda que Roma foi construídasobre sete colinas (em latim,mōntēs): o Aventino, o Capitólio, oCélio, o Esquilino, o Palatino, o Quiri-nal e o Viminal. Daí o nome da liga:Septimōntĭum. No entanto, as aldeiasque deram origem a Roma estavamsobre o Palatino, o Gérmalo, o Vélia,o Esquilino, o Ópio, o Císpio, o Fagu-tal e o Célio, e depois é que a cidadese estendeu sobre os outros morros,o que contradiz a conta de sete coli-nas. É que o elementosepti- não deve

corresponder ao número septem ‘sete’, mas à palavra sēptum, que sig-nifica ‘paliçada’ (perceba que a pala-vra sebe  em português significa‘cerca viva’, e vem precisamente dapalavra latina sēpēs). Assim, o Sep-timōntĭum  não foi a liga dos setemontes, mas das aldeias cercadaspor uma paliçada. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 21/153

 

19LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

origem desconhecida; desconhecida é também uma língua atestada em quatro inscrições ao

norte do Piceno. No vale do rio Pó assentaram-se gauleses vindos de além dos Alpes durante

o século VI a.C. Ao norte do rio Tibre até os montes Apeninos e além em direção ao nordeste

até o Pó, habitavam os etruscos, de origem desconhecida. Em toda a costa meridional e tam-bém nas costas da Sicília havia as colônias helênicas que compunham a Magna Grécia. O povo

latino vivia no território que lhes dava nome: o Lácio (em latim, Latĭum, daí latīnus), a planície

entre o rio Tibre e o monte Circeu. Os seus parentes, falantes das línguas umbra e osca, habi-

tavam os montes Apeninos.

A longuíssima história das conquistas de Roma

começou pelo assenhoreamento do próprio povo ao

qual os romanos pertenciam: os latinos, que se federa-

ram a Roma no começo do século V a.C. Também desde

as origens houve lides contra os etruscos; na verdade,

mais do que enfrentamento, houve uma forte influência

etrusca no processo fundacional de Roma: os próprios

reis não lendários tinham origem etrusca. Com efeito,

tem a mesma origem o ordenamento na forma de uma

cidade-Estado onde a constituição estava fundada em la-

ços de parentesco que favoreciam os homens mais ricos,

os quais se articulavam em assembleias que escolhiam o

rei e intervinham no governo, assim como têm a mesma

origem os símbolos do poder, alguns dos quais se usam

até hoje, como a toga, o cetro e os feixes de lictores. A

crença na adivinhação, não só pelo auspício (observação

das aves) mas também pelo haruspício (observação das

entranhas de animais sacrificados), tão forte na religião

romana, deveu-se igualmente à influência etrusca. Algo

que parece hoje tão romano como os combates de gla-

diador também foi importado da Etrúria.

Os documentos mais antigos em latim

Os documentos remanescentes mais antigos em latim remontam ao século da funda-

ção de Roma. Trata-se de uma inscrição sobre um cipo, conhecido como Lapis Niger  ‘Pedra

Negra’, encontrado junto ao túmulo de um rei que foi enterrado na baixa do Fórum nos pri-

meiros tempos da Cidade. Outra foi feita sobre um vaso triplo, chamado de Duenos, pois o

vaso (isto é, a inscrição) diz que foi feito por um Duenos, que pode ser uma forma arcaica de

bonus ‘bom’. Nem uma nem a outra são fáceis de entender, porque há palavras que desapa-

Diz a lenda que a conquista de AlbaLonga, durante o reinado de TuloHostílio, não aconteceu por mor daguerra, mas por um trato que os dois

lados convieram: um combate até amorte entre três campeões albanos etrês romanos. Por Alba Longa esco-lheram-se os irmãos Curiácios e porRoma, os irmãos Horácios. Ao pri-meiro embate, dois Horácios tomba-ram, o que deixou o campeão ro-mano sobrevivente em forte desvan-tagem, mas ele percebeu que doisCuriácios estavam feridos. Fingiu,então, fugir; os Curiácios foram per-

segui-lo, mas os ferimentos deixou-os desencontrados. De repente, o Ho-rácio parou de correr e golpeou oprimeiro Curiácio; não foi difícil ma-tar o segundo, mais cansado pelador, muito menos o terceiro, que oalcançou já esgotado. Cumprindo otrato, Alba Longa submeteu-se aRoma. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 22/153

 

20LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

receram no latim literário e outras cujo sentido mudou. Seja como for, o Estado romano de-

mandou o uso da escrita desde cedo: o pontífice máximo relatava o que acontecera de mais

importante durante o ano em uns  Annālēs ‘Anais’; o direito foi compilado pela primeira vez

em 451 e 450 a.C., compilação conhecida como as Leis das Doze Tábuas (Duodĕcim TabulārumLēgēs); escritos também eram os tratados com outros povos. Infelizmente, pouco ou nada

desses textos chegou até nós.

 Aprofundando a reflexão1. O relato de Lívio se assemelha ou difere de um livro de história de hoje? Em que se assemelha e/ouem que difere?

2. Como você crê que um historiador deva posicionar-se perante o seu objeto de estudo? Lívio cumpre

ou descumpre o que você espera de um historiador? Por quê?

3. Será que Lívio não distinguia lenda e história? Leia o que disse no prólogo de Ab V   rbe condĭtā:

As honras que são contadas antes de fundada ouquando fundada a Cidade, mais com lendas poé-ticas do que com documentos incorruptos de coi-sas feitas, não tenho em mente nem afirmá-lasnem refutá-las. Dá-se licença à antiguidade paraque, misturando as coisas humanas às divinas,faça mais veneráveis esses primórdios das cida-des. 

Quae ante condĭtam condendamue V   rbem poētĭcīsmagis decōra fābŭlīs quam incorruptīs rērum ges-tārum monumentīs trāduntur, ea nec adfirmārenec refellĕre in anĭmō est. Dātur haec uenĭa an-tīquitātī ut miscendō hūmāna dīuīnīs prīmordĭaūrbĭum augustiōra facĭat 

4. Você acha que há muita diferença entre a lenda e a historiografia? Por quê?

5. Observe essa outra imagem:

Figura 2 

É muito provável que você já tenha visto essa imagem em algum livro-texto de História do Brasil, pois éuma pintura muito famosa de Pedro Américo (1843-1905), guardada hoje no Museu Paulista, em SãoPaulo. Foi pintada em 1888 e alude à Independência do Brasil. Vários “documentos incorruptos de coisasfeitas” (“incorrupta rērum gestārum monumenta”), como disse Lívio, atestam que o evento que está re-tratado nesse quadro aconteceu mesmo, mas você acha que aconteceu com toda essa grandeza que

aparece aí? Ou será que Pedro Américo tomou essa “licença para fazer mais veneráveis os primórdiosdas cidades” (“uenĭa ut prīmordĭa ūrbĭum augustiōra facĭat”)?

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 23/153

 

21LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

A República 

 AquecimentoOs termos rēs pūblĭca formam a palavra latina mais estendida por todo o mundo, seja apenas acomoda-dos aos sons de outras línguas, como Republik   em alemão,  республика  (respublika) em russo ouriphabhuliki  em zulu, seja traduzidos os termos a outras visões de mundo, como

مهوري

( jumhūriyya,literalmente ‘coletividade’) em árabe,  गणराजय  (gaṇr ājya, literalmente ‘governo igual’) em híndi ou共和

国 (gònghéguó, literalmente ‘Estado todo harmônico’) em chinês. E você, o que entende por “república”?

Sabe o que significa essa palavra? Na sua vivência, esse significado é real, acontece mesmo?Começada essa reflexão, continuemos o nosso estudo sobre a história de Roma e da língua latina. 

A conquista da Itália

Banido o rei Tarquínio o Soberbo, o go-

verno passou a ser exercido por vários magistrados

em uma hierarquia encimada por dois cônsules 

com um mandato de um ano. É a constituição à

qual se conveio chamar República romana.

Continuando a sua expansão, os romanos

toparam montanha acima com os seus parentesmais distantes de língua osca e umbra. Um deles

esteve envolvido com os romanos desde as origens

da cidade: os sabinos. Os demais foram vencidos

paulatinamente até o ano de 290 a.C., fim da Ter-

ceira Guerra Samnita.

Após a conquista dos povos montanheses,

para o lado do sul restou a faixa costeira entre a

serra e o mar, sob o domínio das cidades que com-punham a Magna Grécia. Roma subjugou-as em

275 a.C., quando foi derrotado Pirro, rei do Epiro

(região ao noroeste da Grécia), que atravessara o

mar Jônico a pedido de Tarento, a mais poderosa

dessas cidades. Isso não só estendeu o domínio romano a toda a península Itálica, mas tam-

bém comportou consequências enormes sobre a cultura romana. A cultura grega já produzira

então a filosofia de Sócrates, Platão e Aristóteles, a física de Hipócrates, a história de Heró-

doto e Xenofonte, a oratória de Péricles, a poesia de Simonides, o teatro de Ésquilo e Sófo-

cles. O conhecimento das obras desses homens infundiu aos romanos a vontade de fazer arteà imitação deles.

Diz a lenda que os homens de Roma esta-vam fora guerreando contra os rútulos.Sexto Tarquínio, filho de Tarquínio o So-berbo, e Tarquínio Colatino, seu sobrinho,entabularam uma conversa em que um elo-giava mais a sua esposa em detrimento daalheia. A conversa esquentou e os dois deci-diram sair para averiguar o que fazia cadamulher. Enquanto Lucrécia, a esposa de Co-latino, se dedicava a fiar, a de Sexto entre-gava-se à esbórnia. Vexado, Sexto voltou nooutro dia à casa de Lucrécia, que o hospe-dou, mas enquanto todos dormiam, ele en-trou no quarto dela e estuprou-a. De manhã,ela mandou chamar o marido, diante doqual denunciou o crime de Sexto e se matougolpeando o coração com um punhal. LúcioJúnio Bruto, parente de Lucrécia, inflamouo povo contra o Soberbo, que antes de en-trar na cidade foi declarado banido juntocom a sua família. Os comícios elegeram,então, Bruto e Colatino os primeiros cônsu-les da República romana. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 24/153

 

22LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

O começo da literatura latina

Na verdade, ainda que já houvesse uma literatura oral em latim, como o demonstramos cantos que certos sacerdotes entoavam de geração em geração (como o Carmen Aruāle,

dos irmãos Arvais, e o Carmen Saliāre, dos sacerdotes sálios, que são conhecidos por trans-

missão indireta) a ponto de se terem perdido os significados das palavras, a literatura latina

culta teve início sob a influência helênica: o primeiro escritor latino, Lívio Andronico (c. 284-

204 a.C.), nasceu provavelmente em Tarento e a sua obra, cuja maior parte se perdeu, foi em

grande medida tradução dos clássicos gregos, entre eles a Odusĭa, tradução da Odisseia. Ou-

tros escritores da chamada era antiga da literatura latina foram:

  Névio (c. 275-201 a.C.), autor de tragédias e comédias e introdutor do gênero épico

na literatura latina com o Bellum Poenĭcum ‘Guerra Púnica’;

  Plauto (254-184 a.C.), que escreveu ao menos vinte e uma comédias, das quais a

mais famosa é Pseudŏlus;

  Ênio (239-169 a.C.), que se dedicou a vários gêneros, tendo criado a sátira, o pri-

meiro gênero genuinamente latino, tornou-se famoso com os Annālēs ‘Anais’;

  Catão (c. 234-149 a.C.) recorreu do todo o cursus honōrum, a carreira pública ro-

mana, é autor de várias orações, do tratado histórico Orīgĕnēs ‘Origens’, dos edu-

cativos Ad Marcum fīlĭum ‘Ao meu filho Marco’, entre os quais está o Dē agrī cul-

tūrā ‘Sobre o cultivo do campo’ e o Carmen dē morĭbus ‘Canto sobre os costumes’;  Terêncio (c. 195/185-159 a.C.) dedicou-se, como Plauto, à comédia, tendo escrito

seis que remanesceram íntegras.

A potência do Mediterrâneo

Os escritores da idade antiga da literatura latina foram contemporâneos das Guerras

Púnicas. Capturada a Magna Grécia, as fronteiras de Roma foram os Apeninos setentrionais e

o mar, mas o mar tinha dono a essas alturas. No fim do século IX a.C., os destros mercadoresfenícios fundaram uma colônia perto de onde fica hoje a cidade de Túnis, no norte da África.

Chamaram-lhe Cartago e ela veio gozar da hegemonia no comércio no Mediterrâneo ociden-

tal. As Guerras Púnicas foram, pois, a luta por essa hegemonia entre Roma, a potência emer-

gente, e Cartago, a potência consolidada ( poenĭcus ou pūnicus em latim quer dizer ‘cartaginês’,

do grego ϕοίνικας, que significa ‘fenício’).

A Primeira Guerra Púnica aconteceu entre 264 e 241 a.C. e o seu resultado foi a insta-

lação da primeira província romana na ilha da Sicília, passando a ser governada por um ma-

gistrado romano, o qual era nomeado pelo Senado. A Segunda Guerra Púnica ocorreu entre

218 e 201 a.C., mas antes os romanos já tinham incrementado o seu poder em 238 e 237 a.C.,

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 25/153

 

23LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

quando as ilhas da Sardenha e da Córsega foram feitas província romana. Durante essa guerra,

a cidade de Roma chegou a ser ameaçada pelo general cartaginês Aníbal Barca, quem, não

obstante, foi vencido pelo general romano Públio Cornélio Cipião na Batalha de Zama. Roma

assenhoreou-se, então, de toda a costa mediterrânea da Hispânia, repartida em duas provín-cias (Citerior e Ulterior) em 197 a.C. A Terceira Guerra Púnica, entre 149 e 146 a.C., foi, na

verdade, a destruição de Cartago, que se tornou a província da África.

Destruída Cartago, não houve mais povo à beira do mar Mediterrâneo, nem no oci-

dente nem no oriente, capaz de resistir ao jugo romano. Já antes, em 168 a.C., houvera as

conquistas da Macedônia (com a Grécia desde 146 a.C.) e da Ilíria. Seguidamente, foram re-

duzidos a províncias romanas:

  o reino de Pérgamo com o nome de Ásia em 132 a.C., com a Bitínia desde 74 a.C.;

 

a Gália Transalpina, depois chamada Gália Narbonense, em 121 a.C.;  a Gália Cisalpina no começo do século I a.C. após uma ocupação secular;

  a Cilícia em 101 ou 100 a.C., com a ilha de Chipre desde 58 a.C.;

  a Cirenaica em 74 a.C., com a ilha de Creta desde 67 a.C.);

  a Síria em 64 a.C.;

  o Ponto em 63 a.C.

As guerras civis

Ao longo do século I a.C., Roma sofreu disputas sangrentas pelo poder, que levaram à

constituição de uma nova monarquia. Na verdade, a República foi um regime atravessado por

conflitos sociais desde o início. Embora os homens plebeus também fossem cidadãos, apenas

os patrícios  – descendentes dos patrēs ‘pais’ que geriram a sociedade romana desde a funda-

ção da Cidade e donos das maiores propriedades agrícolas – regiam o Estado. Assim, somente

os patrícios podiam propor os candidatos às magistraturas, os senadores plebeus não tinham

o direito de votar e patrícios e plebeus não podiam sequer casar-se. Além disso, permitia-se

que um pai vendesse um filho como escravo e que um homem livre endividado entregasse a

sua própria liberdade ao credor, formas de escravidão que afligiam sobretudo os plebeus, acada geração mais empobrecidos pela partilha da propriedade agrícola.

Em 494 a.C., após uma secessão, quando a plebe se retirou da cidade, criou-se o tribu-

nado da plebe: dois tribunos (depois dez) invioláveis passaram a representar os interesses da

plebe. Em 445 a.C., a Lei Canuleia aboliu a proibição de os patrícios e os plebeus se casarem.

Por volta de 443 a.C., deve ter começado a vigorar o novo ordenamento do povo em classes:

o cidadão era adscrito a certa classe de acordo com a sua riqueza, o que deu lugar à ascensão

dos plebeus mais ricos. Em 387 a.C., as Leis Licínias Séxtias impediram que um cidadão arren-

dasse mais de quinhentas jeiras de terras públicas, suprimiram parcialmente a escravidão (de-finitivamente em 326 a.C. pela Lei Petália Papíria) por dívida e permitiram que um plebeu

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 26/153

 

24LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

pudesse eleger-se um dos cônsules. Em 300 a.C., a Lei Ogúlnia abriu os colégios sacerdotais

aos plebeus. Enfim, em 287 a.C., a Lei Hortênsia equiparou os plēbiscīta, as decisões das as-

sembleias dos plebeus (concilĭa plēbis), às leis.

Essa última medida aponta que no começo do século III a.C. os interesses do patriciadoe da plebe convergiam mais do que divergiam. Isso não pressupõe que a sociedade romana

se tivesse tornado mais “igualitária”. O que mudou é que a nobreza deixou de ser uma nobreza

apenas de sangue. Em outras palavras, a República passou de ser uma aristocracia para ser

uma oligarquia. A ordem senatória continuou a deter o poder, se bem já não se compunha

apenas da nobreza, mas também estava aberta, ao menos formalmente, aos “homens no-

vos”. A riqueza que borbotava das conquistas incessantes foi partilhada com os homens de

negócio, que foram adscrevendo-se à cavalaria do exército, daí terem formado a ordem

equestre, tão endinheirada que formaram as sociedades de publicanos para prestar serviços

ao Estado por arrendamento. O número dos proletários engrossou, pois a eles se somaram os

camponeses: não tivesse bastado terem sido arruinados pelas campanhas de Aníbal, continu-

aram a ser recrutados para o exército e tiveram de concorrer com a mão de obra escrava,

abundante e barata.

Em 107 a.C., Gaio Mário, um “homem novo”, foi eleito cônsul e reformou o recruta-

mento do exército, admitindo também os proletários, aos quais equipou e prometeu um lote

de terra para se assentarem depois de cumprirem o serviço militar. De 104 a 100 a.C., Mário

voltou a exercer o consulado, primeiro passo rumo a um regime autocrático. Em 88 a.C., o

cônsul Lúcio Cornélio Sila foi encarregado pelo Senado de comandar a guerra contra Mitrida-tes, rei do Ponto, mas Mário conseguiu contornar essa decisão por intermédio do tribuno da

plebe Públio Sulpício Rufo; pela primeira vez um general romano marchou contra Roma: Sila

fez Mário fugir da Cidade e retomou o comando da guerra. Aproveitando o seu afastamento

para o oriente, Mário assaltou-a e obteve o sétimo mandato consular em 86 a.C., e embora

tenha morrido poucos dias depois, o governo continuou nas mãos dos seus partidários. Em 83

a.C., Sila retornou e aniquilou-os. Em 81 a.C., fez-se nomear ditador para organizar a República

por tempo indeterminado, e embora tenha vindo renunciar ao cargo em 79 a.C., após reforçar

tremendamente o poder do Senado, a sua própria ditadura desrespeitou os princípios repu-

blicanos fundamentais: a elegibilidade e a colegialidade.

Em 63 a.C., Gneu Pompeu venceu Mitridates do Ponto, tornando-se o mais triunfante

general romano e Gaio Júlio César, já bastante popular, elegeu-se pontífice máximo. Em 60

a.C., César, Pompeu e Marco Licínio Crasso, que era o homem mais rico de Roma, firmaram

um pacto secreto visando a benefícios mútuos, conhecido como Primeiro Triunvirato. César

exerceu o consulado no ano seguinte e em 58 a.C. assumiu o governo das Gálias. Em sete

anos, subjugou todos os gauleses  livres ao oeste do rio Reno, aquinhoando-se um poderio

imenso. Entrementes, Crasso morreu e Pompeu aproximou-se do Senado.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 27/153

 

25LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Tendo expirado o seu mandato na Gália em 50 a.C. e tendo sido

rejeitada a sua candidatura a um consulado imediato, o Senado pediu

a César que dispensasse o seu exército e viesse a Roma, mas ele sabia

que se tratava de uma cilada, e quando, no começo de 49 a.C., atraves-sou com a Legião XIII o riacho Rubicão  – fronteira entre a Gália Cisal-

pina e a Itália –, deu lugar a uma nova guerra civil. Como Pompeu fugiu,

César foi nomeado ditador com um mandato de um ano e ganhou o

consulado em 48 a.C. Nesse mesmo ano derrotou Pompeu, que foi as-

sassinado logo depois em Alexandria, onde César interveio contra o fa-

raó Ptolomeu XIII a pedido da irmã deste, Cleópatra Filópator, com

quem teve um romance e um filho, conhecido como Cesarião. Após a

estadia no Egito, César assegurou o domínio romano sobre o Ponto em

47 a.C. e conquistou a Numídia em 46 a.C.

O governo de César foi atravessado por reformas que abrangeram desde o calendário

(o chamado Calendário Juliano) até a composição do Senado. Este, que Sila ampliara de tre-

zentos a seiscentos membros, ganhou mais trezentos membros, sobretudo de outras extra-

ções sociais diferentes dos nobres. Também aumentou o número de magistrados, passou a

nomear uma metade e a indicar os candidatos da outra metade. Diminuiu os mandatos dos

governadores de província. Dilatou o perímetro de Roma e aperfeiçoou o censo. Construiu a

Basílica Júlia e o Fórum Júlio, este com um templo a Vênus Genetriz, de quem descenderia.

Favoreceu a colonização fora da Itália ao mesmo tempo com medidas que freavam uma emi-

gração massiva.

César continuou a ser nomeado dita-

dor e a ser eleito cônsul ano a ano, até que

em fevereiro de 44 a.C. o Senado o nomeou

ditador perpétuo. Não se sabe até onde ele

queria chegar, mas havia muitos rumores

acerca de vir ser rei. A constituição republi-

cana estava pouco menos que desmante-

lada, mas o título de rei de Roma era umtabu: por mais que uma oligarquia detivesse

o poder, os romanos criam que a sua república era o modo de governo mais perfeito, pois

obstava a tirania. Dessa crença entende-se a ousadia tremenda daqueles senadores e preto-

res, encabeçados por Gaio Cássio Longino e Marco Júnio Bruto, que, nos idos de março, pro-

fanaram o Senado, onde cercaram e apunhalaram César até a morte, quem, além do mais,

estava investido da inviolabilidade tribunícia.

O cônsul colega de César em 44 a.C. era Marco Antônio, que almejava apropriar-se do

seu legado. Mas César adotara em segredo o seu sobrinho-neto Gaio Otávio Turino, entãocom dezoito anos, e fizera-o o seu herdeiro. Em um primeiro momento, Otaviano (Gaio Júlio

Figura 3 - Busto de César.

Figura 4 – Morte de César , de Vincenzo Camuccini (1804-1805)

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 28/153

 

26LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

César Otaviano, nome que assumira em virtude da adoção; chamado César pelos seus con-

temporâneos) e o Senado aproximaram-se para afugentar Antônio. O Senado reconheceu a

herança de Otaviano, nomeou-o senador e legitimou o seu comando militar. Mas Otaviano

deu-se conta de que Antônio era forte demais, de modo que concertou uma aliança com elee Marco Emílio Lépido, pontífice máximo e governador da Gália Narbonense. A Lei Tícia, de

novembro de 43 a.C., oficializou essa aliança, conhecida como Segundo Triunvirato, com um

mandato de cinco anos.

Juntos, levaram a cabo um expurgo

de todos aqueles que os contrariavam. Cás-

sio e Bruto foram vencidos por Antônio e

Otaviano em outubro de 42 a.C.: César não

só foi vingado, mas também deificado pelo

Senado com o nome de Divo Júlio. Dois anos

depois, os triúnviros partiram o domínio ro-

mano entre si: Lépido ficou com a África,

Otaviano com o Ocidente e Antônio com o

Oriente, onde encetou um romance com

Cleópatra. Quando, em 34 a.C., Antônio abandonou a sua esposa Otávia  – irmã de Otaviano –

, declarou Cesarião herdeiro de César e doou a este, a Cleópatra e aos três filhos que teve dela

domínios romanos orientais e a Armênia, que acabara de conquistar. Em 32 a.C., Otaviano

apropriou-se e delatou o testamento de Antônio, que continha disposições semelhantes às

doações mencionadas, ao que o Senado respondeu declarando guerra a Cleópatra. No ano

seguinte, Otaviano derrotou ambos na Batalha de Áccio, e perseguiu-os até Alexandria, onde

um e a outra se suicidaram e Cesarião foi executado. O Egito tornou-se uma província romana.

A era áurea da literatura latina

Curiosamente, o tempo mais alvoraçado da história de Roma até então foi também a

idade de ouro da literatura latina. Com efeito, Marco Túlio Cícero (106-43 a.C.) e César (101-

44 a.C.), não foram apenas hábeis homens de Estado, mas doutos homens de letras. A obra

de Cícero é considerada o cume da língua latina, a que está lavrada no estilo mais prestigioso,

o modelo a ser imitado pelos pósteros. Ele foi o primeiro romano que compôs obras filosófi-

cas, entre as quais sobressaem Dē officĭīs ‘Sobre os deveres’ e Dē lēgĭbus ‘Sobre as leis’. Tam-

bém escreveu sobre a retórica, do que destaca Dē ōrātōre ‘Sobre o orador’. Além disso, che-

garam-nos 58 orações suas, cujas mais famosas são as quatro que pronunciou contra o conju-

rador Lúcio Sérgio Catilina (In Cat ilīnam), e cerca de 860 epístolas. Quanto a César, sabe-se

por fontes indiretas que investigou questões de astrologia, língua latina e religião romana,

mas a nós chegaram apenas os seus relatos da conquista da Gália, Dē Bellō Gallĭcō, e da Guerra

Civil, Dē Bellō Cīuīlī .

Figura 5 - A morte de Cleópatra, de Reginald Arthur (1892).

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 29/153

 

27LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Mais velho que ambos foi Varrão (116-27 a.C.), um dos escritores mais fecundos da

literatura latina. Escreveu sobre muitos e variados assuntos. O seu principal mérito é ser o

autor do primeiro tratado sobre a língua latina, Dē linguā latīnā ‘Sobre a língua latina’, em 25

livros, dos quais nos chegaram seis. Outros escritores de monta foram:  Lucrécio (98/96-55/53 a.C.), autor de Dē rērum nātūrā ‘Sobre a natureza das coi-

sas’, um poema filosófico em que reflete sobre a natureza de uma perspectiva epi-

curista;

  Salústio (86-34 a.C.), que introduziu a historiografia por episódios na literatura la-

tina e cuja obra mais importante é Dē coniūrātiōne Catilīnae ‘Sobre a conjuração

de Catilina’;

  Catulo (84-54 a.C.), que foi o primeiro grande poeta lírico em língua latina, de quem

nos chegou um Līber  ‘Livro’ com 116 poemas;

  Virgílio (70-19 a.C.), considerado o maior de todos os poetas latinos, autor das Bu-

cólicas  e das Geórgicas, obras-primas líricas, e da epopeia do povo romano: a

Eneida;

  Horácio (65-8 a.C.), outro grande poeta lírico, cujas obras mais importantes são

Lambī  ‘Epodos’, Sermōnēs ‘Sátiras’, Carmĭna ‘Odes’ e Epistŏlae ‘Epístolas’;

  Tito Lívio, de quem já tratamos;

  Propércio (47-14 a.C.), poeta lírico notável pelas suas elegias;

  Ovídio (43 a.C.-17 d.C.), cuja obra-prima são as Metamorfoses, poema épico que

narra vários mitos greco-romanos, mas também escreveu elegias ( Amōrēs ‘Amo-res’ e Trīstĭa ‘Tristes’), epístolas (Hērōĭdēs ‘Heroínas’, nas quais o eu lírico são he-

roínas de mitos greco-romanos) e um tratado no qual ensina o jogo do amor:  Ars

amātōrĭa ‘Arte de amar’.

 Aprofundando a reflexão1. Vejamos se a sua leitura deste capítulo foi mesmo atenta. Três guerras civis minaram os alicerces daRepública romana ao longo do século I a.C. Quando aconteceram e que personagens se enfrentaramnelas?

2. O fundamento da República romana era o fato de que o poder era exercido por magistrados, cujosmandatos se assentavam sobre dois princípios: a elegibilidade e a colegialidade. O que significam essesprincípios?

3. As magistraturas da República romana estavam ordenadas em uma hierarquia chamada cursushonōrum, ou seja, ‘carreira das honras’. Pesquise qual era a idade mínima para assumir cada cargo equais eram as suas funções durante a República. Os cargos eram os seguintes:

a) Questor (quaestor );

b) Edil (aedīlis);c) Pretor ( praetor );

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 30/153

 

28LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

d) Cônsul (consul );e) Censor (censor );f) Tribuno da plebe (tribūnus plēbis).

4. Que semelhanças e diferenças você vê entre a República romana e uma república contemporânea?

O Império

 Aquecimento1. Embora o povo romano contasse mais de setecentos anos de história quando a República foi sendotransformada em uma monarquia, a Roma antiga permaneceu na nossa memória mormente na formado Império Romano. Comprovemos isto: o que lhe vem à mente quando se fala em Roma?

Pensou e disse? Retomemos, então, o fio de meada.

Uma nova monarquia

Após a Guerra Civil, Otaviano  foi pouco a pouco concen-

trando o poder na sua pessoa. Desde 42 a.C., já usava o agnome Dīuī

Fīlĭus, ou seja, ‘Filho do Divo’. Em 38 a.C., trocou os seus prenome e

nome pelo agnome que o Senado concedera a César em 45 a.C.: Im-

 perātor , pelo que passou a chamar-se Imperātor Caesar Dīuī Fīlĭus.

No entanto, a desdita de César ensinou a Otaviano que era perigosoagredir as instituições republicanas. Assim, quando o Senado lhe ofe-

receu o título de Rōmŭlus ‘Rômulo’, esquivando a polêmica palavra

rēx  ‘rei’, recusou-o porque a figura de Rômulo estava ligada demais

à monarquia. Em contrapartida, aceitou, em 28 a.C., o título de prin-

ceps ‘príncipe’, o qual já existia na forma do  princeps Senātūs ‘prín-

cipe do Senado’: um senador escolhido pelos censores entre aqueles

que tinham desempenhado a censura para presidir o Senado. Aceitou também, no ano se-

guinte, o cognome de  Augustus, uma palavra não fácil de traduzir  –‘sagrado’, ‘venerável’  – 

que acrescentou ao seu nome, a partir de então Imperātor Caesar Dīuī Fīlĭus Augustus. O ca-ráter religioso desse cognome foi a base do culto imperial, que se desenvolveu desde então.

Figura 6 - Augusto como imperador(comandante do exército).

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 31/153

 

29LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Todos esses títulos conferiam dignĭtās, ou seja,

‘dignidade’, a Augusto, mas para reger o Estado, ele tam-

bém precisava de auctōrĭtās, isto é, ‘autoridade’. Foi re-

eleito cônsul seguidamente até 23 a.C., quando o Se-nado lhe outorgou um imperĭum prōcōnsulāre maius et

infīnī tum, o que o tornou comandante supremo e vitalí-

cio do exército, e também o poder tribunício, com o

qual inteirou o seu domínio sobre o Senado, pois desde

então não só o presidia, mas também podia vetá-lo e ex-

pedir atos equivalentes à lei, além de gozar da inviolabi-

lidade dos tribunos da plebe. Para acabar, assumiu o

cargo de pontífice máximo em 12 a.C. e ganhou o título

de Pater Patrĭae, ou seja, ‘Pai da Pátria’, em 2 a.C.

Augusto não só preservou o cursus honōrum 

(além de ter instituído outro para o exército), mas o re-

formou de modo que ele se esvaziou de poder sem dei-

xar de ser uma honraria para as camadas mais favoreci-

das da sociedade. O próprio consulado foi mantido e

alargado, não mais como o posto mais poderoso do go-

verno, mas como a mais alta honra a que um senador

podia aspirar. Designou, ainda, funcionários à margem

do cursus honōrum para cuidar de certos negócios. Ao

fim e ao cabo, Augusto instaurou um novo regime mo-

nárquico sob a aparência de restaurar a República.

Augusto terminou os edifícios que César come-

çara, a Cúria Júlia e o Teatro de Marcelo, e em sua honra

levantou o Templo do Divo Júlio e, junto a um novo fó-

rum, o Templo de Marte Ultor (‘Vingador’), além de ou-

tros templos. Com o seu beneplácito, foram construídos

o Panteão  (templo de todos os deuses), bem como osSēpta Iūlĭa (recinto destinado à votação dos cidadãos),

dois aquedutos ( Aqua Iūlĭa e Aqua Vīrgō) e as primeiras

termas públicas de Roma. Em 9 a.C., o Senado mandou

edificar no Campo de Marte a  Ara Pācis Augustae ‘Altar

da Paz Augusta’, um monumento cuja harmonia, com

elementos gregos clássicos, helenísticos e romanos tradicionais, e cuja decoração, com alego-

rias em relevo que recordam as origens lendárias de Roma e exaltam uma natureza farta, re-

sumem bem a ideologia da era augustana.

As palavras imperĭum  e imperātor  eram tão ou mais velhas que a pró-pria República romana. Traduçõespossíveis dos seus sentidos originais

são ‘comando’ e ‘comandante’. Muitoantes dos imperadores, o imperĭum era um poder de natureza militarque permitia um cidadão comandaroutros cidadãos, poder com que es-tavam investidas as magistraturasde cônsul e pretor. Quanto ao títulode imperātor , era outorgado a um ge-neral após uma grande vitória poraclamação dos seus homens, um ritonecessário para celebrar o seu

triunfo (que era outro rito), duranteo qual mantinha o título e após o qualo entregava. O que Augusto mudou éque imperātor   deixou de ser um tí-tulo para se tornar um prenome, demodo que ele e os seus sucessores sechamaram Imperātor Caesar Augus-

tus. Portanto, as expressões ImpérioRomano  e imperador romano  sãoconvenções historiográficas para no-mear as novas constituição e chefia

do Estado romano. O sentido atual dapalavra imperador   não vem dotempo dos imperadores romanos,mas tem origem medieval, e foi cu-nhado primeiramente em grego. Atradução de Imperātor Caesar Augus-

tus para essa língua era Αὐτοκράτωρ

Καῖσαρ Σεβαστός, mas em 629, Herá-clio trocou essa forma de nomeaçãopelo título de  βασιλεύς, palavra queaté então significava ‘rei’, mas que

desde então teve o sentido que se dáhoje à palavra imperador . Assim, àimitação do  βασιλεύς, Carlos Magnoassumiu, no ano 800, o título de Im-

 perātor Rōmānōrum, ou seja, ‘Impe-

rador dos Romanos’, completando amudança semântica do termo. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 32/153

 

30LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

O apogeu

Dias antes de receber o cognome de  Augustus,

Otaviano ensaiou devolver ao Senado o imperĭum  (co-

mando militar), mas este lho revigorou por dez anos so-

bre as províncias mais hostis. Daí surgiu a diferença entre

províncias públicas, que continuaram a ser governadas

por um procônsul ou propretor nomeado pelo Senado e

cuja arrecadação ia parar ao erário, a caixa do Estado, e

províncias de César, que eram governadas por um le-

gado ou prefeito nomeado pelo imperador e cuja arre-

cadação ia parar ao fisco, a caixa do imperador. Isso lhe

permitiu conduzir as novas conquistas:

  sob Augusto,

o  a Mésia em 29 a.C.,

o  a Galácia em 25 a.C.,

o  os povos ástur e cântabro em 19 a.C.

(remate da conquista da Hispânia),

o  a Récia em 15 a.C.,

o  os Alpes ocidentais em 14 a.C.,

o  a Panônia em 9 a.C.

e a Judeia em 6 d.C.;

  sob Tibério, a Capadócia em 17;

  sob Calígula, a Mauritânia em 40;

  sob Cláudio,

o  a Britânia e a Lícia em 43,

o  a Trácia em 46

o  e o Nórico em 50;

  sob Trajano,

o  a Arábia Petreia e a Dácia em 106,

o  a Armênia em 114,

o  a Mesopotâmia e a Assíria em 116.

Adriano abandonou a Armênia, a Mesopotâmia e a Assíria, e em 271 Aureliano fez o

mesmo na Dácia, de modo que na maior parte do tempo as fronteiras do Império foram:

  os rios Reno e Danúbio no continente europeu,

  o rio Eufrates e o deserto da Arábia no continente asiático 

  e o deserto do Saara no continente africano.

Quando o costume de destruir umacidade conquistada e levar a sua

gente para Roma se tornou insusten-tável, por razões óbvias, os romanosvaleram-se de dois meios para sujei-tar o povo vencido: converter a ci-dade em um município (mūnicipĭum)e fundar colônias (colōnĭae). A dife-rença entre o município e a colôniaconsistia, pois, no fato de que a popu-lação daquele, embora sujeita à leiromana, podia manter um ordena-mento prévio, enquanto a população

desta não obedecia senão à lei ro-mana, sendo que havia colônias ondeos homens livres eram cidadãos ro-manos e outras onde eram cidadãoslatinos. Como o nome sugere, a cida-dania latina fora concedida original-mente às cidades do Lácio; diferia dacidadania romana por carecer de di-reitos políticos. Assim, os cidadãosde uma colônia latina não podiameleger os magistrados da cidade, que

eram escolhidos em Roma. O jogoentre as condições de estrangeiro( peregrīnĭtās), de cidadão latino(latīnĭtās) e de cidadão romano(rōmānĭtās) constituiu um instru-mento eficiente de romanização,pois ser romano se apresentavacomo um privilégio. Esse processofoi coroado em 212 pela ConstituiçãoAntoniniana, do imperador Caracala,que estendeu a cidadania romana a

todos os homens livres do império. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 33/153

 

31LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Ao contrário do que aconteceu durante a República,

quando os povos itálicos tiveram de travar uma guerra (a

chamada Guerra Social ) pela igualdade de direitos, ou seja,

pela concessão da cidadania romana em 89 a.C. (Lei PláuciaPapíria), ao longo dos dois primeiros séculos do Império

houve uma integração progressiva das sociedades provinci-

ais à sociedade romana. As melhorias infraestruturais que

beneficiavam a cidade de Roma foram levadas às provín-

cias, onde vinham fundando-se inúmeras colônias e aonde

se chegava por estradas pavimentadas. No oriente do Império, sempre houve muitas cidades.

Em contrapartida, no ocidente cada nova cidade – seja município seja colônia, quer com cida-

dania romana quer com cidadania latina  – era uma pequena Roma que atraía a população

local para a identidade romana. Pouco a pouco, os povos ocidentais foram romanizando-se,em contraposição aos orientais, que permaneceram fiéis à cultura e à língua gregas.

Fora de Roma, os homens mais ricos formaram uma

oligarquia em cada cidade: a ordem dos curiais. Os curiais

mais bem-sucedidos ascendiam à ordem equestre, que já

no tempo da dinastia Flávia (69-96) tinha mais membros

provinciais que itálicos. No fim desse mesmo século, reinou

o primeiro imperador nascido em uma província: Trajano,

natural de Itálica, na Hispânia Bética. Não muito tempo de-

pois, no reinado de Marco Aurélio (161-180), os provinciais

alcançaram a maioria no próprio Senado.

A era argêntea da literatura latina

Apesar do progresso que ocorreu durante os dois primeiros séculos do Império, julga-

se que os escritores que viveram nesse tempo produziram a idade de prata da literatura la-

tina. Com efeito, as obras dos escritores do século I a.C. foram revestidas de tal prestígio que

a norma literária estacionou aí: é a variedade da língua à qual se costuma chamar latim clás-

sico, cujos exemplos supremos são Virgílio na poesia e Cícero na prosa. Assim, mais que ino-

var, os autores da era argêntea consolidaram um legado. Os principais foram:

  Fedro (c. 20 a.C.-c. 50 d.C.), que introduziu a fábula na literatura latina, traduzindo

Esopo, fabulista grego, e acrescentando outras fábulas da sua autoria;

  Sêneca (4 a.C.-65 d.C.), que foi filósofo, adepto da filosofia estoica, da qual é con-

siderado o maior autor em latim, sendo as suas obras mais importantes os Diálo-

gos, consistentes em nove tratados filosóficos, e as Cartas a Lucílio, de conteúdo

também filosófico;

Figura 7 - Anfiteatro Flávio, mais conhecidocomo Coliseu (ano de 80).

Figura 8 - Anfiteatro de Tisdro, província daÁfrica, hoje al-Jamm, Tunísia (século III).

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 34/153

 

32LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

  Petrônio (14-66), autor do primeiro romance da literatura latina, o Satirĭcon, da

qual restam apenas fragmentos;

  Plínio o Velho (23-79), que escreveu uma enciclopédia, a Nātūrālis historĭa ‘Histó-

ria natural’, que foi usada como fonte de conhecimento sobre muitos assuntos du-rante toda a Idade Média;

  Quintiliano (35/40-96), que escreveu o tratado mais completo sobre a arte retó-

rica, a Īnstitūtĭō ōrātōrĭa ‘A formação do orador’;

  Marcial (40-104), que foi o maior cultor do gênero do epigrama;

  Tácito  (55-120), provavelmente o historiador latino de mais qualidade literária,

aproveitou o melhor que a historiografia romana produzira até o seu tempo;

  Juvenal (55/60-c. 127), que se dedicou à sátira, gênero no qual espelhou todos os

vícios da sociedade romana do seu tempo;

 

Suetônio (70-126), que é o grande biógrafo da literatura latina, tendo historiado avida de César e dos onze primeiros imperadores em Dē uītā Caesărum, conhecido

como ‘As vidas dos doze césares’;

  Apuleio (125-170), autor do único romance latino que nos chegou íntegro, o Asĭnus

aurĕus ‘O asno de ouro’, precursor, como o Satirĭcon, do romance picaresco.

Na idade de prata, a influência helênica atingiu o auge, infiltrando-se mesmo na sin-

taxe do latim. O próprio imperador Marco Aurélio teria sido um autor notável da literatura

latina se não tivesse escrito em grego Τὰ εἰς ἑαυτόν , conhecidos como Meditações.

O declínio

Até o governo de Marco Aurélio, Roma foi um Estado que assentava o seu desenvolvi-

mento sobre a sujeição, muito bem-sucedida, de outros povos, que lhe aportavam escravos,

terras, grãos, metais e dinheiro. Depois dele, o Estado procurou manter a expansão que al-

cançara, cada vez com menos sucesso, até que sucumbiu.

Quando a mão de obra escrava começou a escassear, foi sendo trocada por colonos,

que desfalcaram as pequenas e médias propriedades em favorecimento das grandes. Mas aocontrário do que possa parecer à primeira vista, o decrescimento do trabalho escravo não

comportou o crescimento do trabalho livre, mas a convergência de ambos para o trabalho

compulsivo. Em outras palavras, perdeu-se muito da diferença entre homens livres ou libertos

e escravos, de modo que toda a camada mais baixa da população veio padecer de condições

de vida muito más. Além disso, as propriedades médias pertenciam sobretudo aos curiais, que

foram perdendo o poder de fazer os investimentos que costumavam e deviam nas cidades.

Por conseguinte, estas começaram a definhar.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 35/153

 

33LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Esse estado de coisas foi agravado por se dar em um momento em que as fronteiras

estavam sendo ameaçadas pelos bárbaros, o que aumentou sobremaneira o valor dos exér-

citos que as defendiam. Depois do reinado de Cômodo (180-192), o imperador ser traiçoeira-

mente morto e um novo ser imposto por um conchavo de parentes seus, da guarda pretorianae/ou do exército tornaram-se acontecimentos absolutamente comezinhos.

À medida que o cabedal político do exército foi aumentando, o Senado foi ficando cada

vez mais relegado, mas como o ordenamento do Estado se subverteria, não foi a ordem se-

natória que desapareceu, mas a ordem equestre que, segundo a riqueza de cada um, se dis-

solveu para cima, fundindo-se na ordem senatória, e para baixo, nos curiais. Estes, e com

muito mais dureza as camadas mais baixas do povo, eram brutalmente oprimidos pelo Estado

para que o sustentassem.

Durante os quase três séculos do longo ocaso do Império Romano, houve pouco menosde dois momentos em que se conseguiu recobrar a estabilidade: os reinados de Diocleciano 

(284-305) e Constantino (306-337), dois dos poucos imperadores que não morreram assassi-

nados nesse tempo.

As reformas de Diocleciano e Constantino

Desde 286, Diocleciano partilhou o governo com o seu amigo Maximiano, a quem deu

o título de augusto e confiou a metade ocidental do Império. Não era uma medida propria-

mente nova, pois desde Marco Aurélio se tornara comum o imperador nomear um parente

ou alguém de confiança césar a modo de herdeiro aparente e coimperador. A novidade foi

que, em 293, Diocleciano escolheu um césar e Maximiano, outro, respectivamente Galério e

Constâncio. Ao cabo de vinte anos, os césares deviam tomar os lugares dos augustos e nomear

novos césares.

Ao mesmo tempo, o ordenamento territorial foi reformado: as províncias foram agru-

padas em doze dioceses, à frente das quais estava um vicário. Cada augusto e cada césar

governava o território de três dioceses.

Com esse novo sistema de governo e de sucessão, chamado Tetrarquia, Diocleciano

esperava remediar a instabilidade política e a ineficiência administrativa, mas quando che-

gou o momento de os césares ascenderem a augustos e escolherem outros césares, uns e

outros se desavieram, e o sistema salvou-se porque Diocleciano interveio. Assim sendo, estava

claro que o sucesso da Tetrarquia dependia da autoridade do seu criador, de modo que desa-

pareceu após a morte dele.

Constantino, filho de Constâncio, começou o seu reinado enleado em lutas contra os

sucessores da Tetrarquia e usurpadores (ele mesmo era um). Venceu todos até 324 e desde

então foi o único imperador romano. Trocou a Tetrarquia por uma nova divisão do Império

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 36/153

 

34LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

em quatro prefeituras, cujos prefeitos  – sem comando militar  – respondiam apenas a ele.

Reformou também a administração imperial e o exército, no sentido de espargir o poder sobre

várias pessoas, de modo que o seu próprio ficasse fortalecido.

Não obstante, a maior obra de Constantino foi ter fundado, em330, uma nova capital. Construída sobre a cidade de Bizâncio, a Nova

Roma  ou Constantinopla  (em grego Κωνσταντινούπολις , ou seja, ‘Ci-

dade de Constantino’, latinizado como Cōnstantīnopŏlis, hoje Istambul,

Turquia) estava em uma posição privilegiadíssima: às margens do Bós-

foro, o estreito que separa a Ásia e a Europa, a meio caminho da fron-

teira oriental e da fronteira danubiana, e longe do bulício de Roma. Em

Constantinopla, instalou-se não só a administração imperial, mas tam-

bém um Senado. Estavam, pois, plantadas, as condições para a partição

definitiva do Império em 395, após a morte do imperador Teodósio, que

legou o oriente ao seu filho Arcádio e o ocidente ao seu outro filho Honório.

O cristianismo

Diocleciano e Constantino sobressaem também na história de Roma por terem rea-

gido de maneiras opostas ao crescimento da fé cristã. Desde Septímio Severo (193-211), os

imperadores intitularam-se domĭnī  ‘senhores’ e, por vezes, deī  ‘deuses’. Isso representou uma

mudança ideológica bastante relevante, pois domĭnus era, dentre outros usos, o dono do es-cravo (a própria palavra dono vem de domĭnus). Ademais, se bem é verdade que o cognome

 Augustus elevava, de uma perspectiva religiosa, o imperador acima dos demais homens, de

acordo com a tradição augustana, a apoteose ocorria somente após a morte. Trocando em

miúdos, antes, por mais o imperador possuísse um poder absoluto e sacrossanto, ele era ofi-

cialmente o primeiro entre os iguais, e não era um deus, mas um homem venerando; depois,

ele assumiu de vez a sua condição de monarca divino, de modo que se ainda restava algo da

fachada republicana que Augusto procurara preservar, acabou de ruir.

Que desdobramento religioso se seguiu disso? É que não ruía apenas a fachada doregime, mas todo o edifício das tradições romanas. Se se levar em conta que até o começo do

século I a.C. o exército romano se compunha de cidadãos que se armavam às suas próprias

expensas a serviço da Rēs Pūblĭca e que ultimamente os militares matavam o imperador que

não só deixasse de pagar os seus soldos, mas também a peita pelo seu apoio, tem-se uma boa

ideia de quanto se tinham perdido as tradições. As mudanças foram, pois, cavando um vazio

ideológico, que em tempos de míngua e insegurança foi preenchido por crenças que satisfa-

ziam mais do que as necessidades civis.

Figura 9 - Busto de Constan-

tino.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 37/153

 

35LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Na verdade, os romanos sempre foram abertos ao sincretismo. A sua religião mistu-

rara-se em grande medida primeiro com a dos etruscos e logo com a dos gregos. Já em mea-

dos do século I a.C. erguera-se um templo aos deuses egípcios Ísis e Serápis em Roma. Desde

274, quando reinava Aureliano, os próprios imperadores cultuaram o Sol Invicto, uma divin-dade de origem também oriental. A diferença do cristianismo é que a promessa de vida eterna

em um reino que não é deste mundo em um mundo atravessado pela miséria e pela truculên-

cia consolava quase todas as camadas da população. Mas quando os imperadores se intitula-

ram senhores e deuses, os cristãos, que creem em um Deus e um Senhor, foram de encontro

ao Estado. É preciso entender que se para um cristão render culto aos deuses romanos era

um ato de apostasia, para um romano não cristão negar-se a isso era um ato de deslealdade 

ao Estado.

A primeira reação, a de Diocleciano,

foi revivescer a tradição. Com efeito, ele e o

seu césar assumiram o agnome de Jóvio  e

Maximiano  e o seu césar, o de Hercúleo,

isto é, estavam associados respectivamente

a Júpiter  e a Hércules. É certo que houve

perseguições dos cristãos desde ao menos o

incêndio de Roma em 64, ocasião em que,

segundo a tradição, foram martirizados os

apóstolos Pedro e Paulo. Mas até o reinado

de Décio (249-251), houve mais tolerância que perseguição. De todo modo, foi durante a Te-

trarquia, mais precisamente desde 303, que os cristãos foram julgados claramente uma ame-

aça ao Estado. Mártires muito estimados nas igrejas cristãs que dispõem a veneração dos

santos – São Sebastião, Santos Cosme e Damião, Santa Luzia, Santa Inês, Santa Bárbara etc.

 – pereceram nessa Grande Perseguição.

A segunda reação, a de Constantino, foi acomodar-se ao soçobro das tradições junto

com a difusão da fé cristã. A Grande Perseguição acabou em 311, quando foi promulgado um

edito de tolerância pelo imperador Galério, o qual foi ratificado em 313 por outro edito dos

imperadores Constantino e Licínio em Mediolano (daí conhecido como Edito de Milão). Cons-tantino outorgou o poder de juiz aos bispos, isentou a Igreja  de impostos e reconheceu-a

como pessoa jurídica. Apoiou a edificação de grandes basílicas, como a basílica de São João

de Latrão  – catedral de Roma – e a de São Pedro, sobre o túmulo do apóstolo na colina do

Vaticano, além da basílica do Santo Sepulcro em Jerusalém e da igreja de Santa Irene em

Constantinopla. Convocou e presidiu o primeiro  concílio ecumênico, celebrado em Niceia,

província da Bitínia (hoje İznik, Turquia), em 325, feito enormemente importante, pois foi es-

tabelecida uma compreensão oficial da doutrina cristã, ou, em outras palavras, semearam-se

as noções de ortodoxia e de heresia. Efetivamente, um cristianismo conflituoso não servia

aos interesses do Império.

Figura 10 - A última oração dos mártires cristãos, de Jean-Léon Gérôme(1863-1883).

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 38/153

 

36LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Embora a tradição situe a conversão de Constantino à crença cristã na Batalha da

Ponte Mílvia em 312, quando venceu o usurpador Maxêncio, fato é que só recebeu o batismo

no leito de morte. Na verdade, apesar de todo o favorecimento que dispendeu em pró do

cristianismo, Constantino manteve uma posição ambígua em face da sua própria fé. A deco-ração do arco alusivo ao triunfo sobre Maxêncio, erguido em 315, é puramente tradicional. A

disposição de que o diēs Sōlis ‘dia do Sol’ fosse feriado reconhecia o costume cristão do diēs

Dominĭcus  ‘dia do Senhor’ (daí domingo), mas o nome do dia permitia entendê-lo também

como uma consagração ao Sol Invicto. A fundação de Constantinopla também seguiu o rito

romano tradicional, e no meio do fórum ergueu-se uma coluna em cujo cimo repousava uma

estátua de Constantino como deus-sol. Enfim, Constantino continuou a ser pontífice máximo,

portanto chefe da religião romana, durante todo o seu reinado.

Seja como for, após Constantino o cristianismo foi cada vez mais a religião majoritária 

do Império Romano. Os cristãos, que tinham padecido e perecido sob a intolerância dos não

cristãos, trocaram de papel com eles e começaram eles mesmos a perseguir os agora chama-

dos pagãos. O imperador Graciano foi o derradeiro pontífice máximo, titulação que assumi-

ram os bispos, especialmente o bispo de Roma, ou seja, o papa. Em 380, ele, Valentiniano e

Teodósio promulgaram um edito – o Edito de Tessalônica  – em que exprimiram a vontade de

que todos os povos que regiam se convertessem à doutrina nicena com o nome de cristãos

católicos, o que tem sido interpretado como a oficialização do cristianismo. Em 391, Valenti-

niano e Teodósio dispuseram que não se podia entrar nos templos pagãos, tampouco andar

perto deles, nem mesmo olhar para eles ou para as estátuas dos deuses. A reboque dessa

disposição, muitos templos pagãos foram destruídos, como o Serapeu de Alexandria, onde

presumivelmente se conservava parte da grande biblioteca fundada em 288 a.C. Em 392, Te-

odósio vedou também o culto pagão doméstico. Em 394, extinguiu os Jogos Olímpicos. A pri-

meira Olimpíada fora celebrada, segundo a tradição, em 776 a.C.!

A literatura latina cristã

Na verdade, a cristandade cruzou o caminho da língua latina muito tempo antes de

ascender ao poder. Como ela se expandiu a partir da Judeia, assentou-se primeiro na parte

oriental do Império, onde a língua dominante era o grego. Em grego escreveram-se os livros

do Novo Testamento e compuseram as suas obras os Padres da Igreja nascidos nessa parte

do Império, como Atanásio de Alexandria (295-373), Basílio Magno (239-378), Gregório Na-

zianzeno (329-390) ou João Crisóstomo (344/354-407). Mas quando a pregação cristã alcan-

çou o ocidente, foi preciso empregar a língua que era comum aí: o latim. Efetivamente, as

gerações de escritores que se seguiram à idade de prata não renovaram o fazer literário, per-

manecendo à sombra da literatura clássica. Os autores que aportaram novidades à literatura

latina do século III em diante foram os cristãos, não só por engenho, mas também por neces-

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 39/153

 

37LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

sidade, pois a divergência de visão de mundo entre as crenças tradicionais e as cristãs deman-

dou mudanças sobretudo lexicais. O primeiro grande escritor cristão em latim foi Tertuliano 

(c. 155-c. 230), em cujas obras está a atestação mais antiga de alguns dos termos latinos cris-

tãos. Seguiram-se-lhe:  Cipriano, bispo de Cartago (210-258), província da África, que pereceu na perse-

guição do imperador Valeriano;

  Lactâncio  (c. 250-c. 327), chamado “Cícero cristão”, que confrontou a doutrina

cristã e as escolas filosóficas helenísticas;

  Vitorino (250-304), bispo de Petóvio, província da Panônia (hoje Ptuj, Eslovênia),

que foi o primeiro exegeta cristão latino;

  Hilário (315-367), bispo de Pictávio, província da Aquitânia (hoje Poitiers, França),

autor do Dē trīnitāte ‘Sobre a trindade’, o primeiro grande tratado teológico em

latim;

  Ambrósio (339-397), bispo de Mediolano (hoje Milão, Itália), que além de ter sido

um grande escritor, gozou de grande respeito da parte dos imperadores Graciano 

e Teodósio, em cuja política religiosa interveio;

  Jerônimo de Estridão (347-419/420), que, por encargo do papa Dâmaso I, levou a

cabo, a partir de 382, a versão da Bíblia em latim conhecida como Vulgata (de uul-

gāta ēditĭō ‘edição popular’), composta em parte pela revisão de traduções latinas

anteriores e em parte por traduções novas do hebraico e do grego;

 

Agostinho (354-430), bispo de Hipona, província da Numídia (hoje ʿ Annābah, Argé-lia), cuja obra vastíssima – cume da literatura latina cristã e da qual sobressaem os

Cōnfessiōnum lībrī  ‘Livros das confissões’, a sua autobiografia, e Dē cīuitāte Deī con-

trā pāgānōs ‘Sobre a cidade de Deus contra os pagãos’, o primeiro tratado de filo-

sofia da História – influenciou enormemente toda a filosofia ocidental posterior.

O fim do Império no ocidente

O empoderamento do cristianismo acabou engrossando o fervedouro em que Roma

estava mergulhada. Mais que isso: o Estado hostilizou a própria camada mais alta da socie-

dade, os senadores, que se julgavam os guardiães das tradições romanas. Chegou-se, assim, a

um estado em que qualquer ninharia atiçava uma revolta. Havia uma tremenda violência por

toda a parte, o que se voltava contra o próprio Estado, pois empurrava ainda mais os pobres

a procurar a proteção dos ricos ou, pior, para a bandidagem.

Ao fim e ao cabo, o Estado, que não se segurava mais que pela força do seu aparelho

repressor, o qual, à sua vez, dependia dos próprios cidadãos que fustigava, teve de pactuar

com os bárbaros, não tréguas, mas alianças, como fizera em priscas eras, quando não passava

de uma pequena cidade-Estado do Lácio. Contudo, se naquele tempo esse recurso lhe deu

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 40/153

 

38LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

margem para manobrar a sua expansão, nesse momento veio apenas preparar o golpe que o

destroçou de vez. O próprio comando dos exércitos romanos foi entregue a generais de ori-

gem bárbara, em cujas mãos alguns imperadores não passavam de títeres.

Em 410, Alarico, rei dos visigodos, invadiu e saqueou Roma, algo que acontecera poruma única vez em 390 a.C. Apesar de ter comovido profundamente os contemporâneos, o

acontecimento veio repetir-se em 455: desta vez foram os vândalos de Genserico. Enfim, em

476, o chefe germânico Odoacro depôs Rômulo Augústulo, o último imperador romano no

ocidente, ironicamente homônimo do fundador da Cidade. Em vez de escolher mais um im-

perador-fantoche, Odoacro mandou entregar as insígnias imperiais a Zenão, imperador ro-

mano no oriente, e assumiu o título de rei, primeiro da sua gente e depois da Itália.

A parte oriental do Império, que sempre foi mais populosa, urbanizada e produtiva,

aguentou-se, e atravessando momentos de prosperidade e de reveses, durou mais um milê-nio. Embora tenha continuado a ter o nome România e os seus próprios habitantes se identi-

ficassem como romanos, para não haver confusão, os historiadores modernos convieram cha-

mar-lhe Império Bizantino, do gentílico da antiga cidade sobre a qual foi levantada Constan-

tinopla: Bizâncio. Aí o latim seguiu sendo língua oficial até 620, quando o imperador Heráclio 

o trocou pelo grego, língua majoritária da população desde antes da conquista romana.

 Aprofundando a reflexão

1. Foi durante o Império que Roma alcançou a sua expansão máxima. Na verdade, ao estudar a civiliza-ção greco-romana, deparamo-nos amiúde com nomes de lugares que já não achamos nos mapas dehoje. O quadro a seguir contém o rol das províncias romanas até o tempo do imperador Nerva (96-98).Pesquise em que país atual fica cada uma.

província localização atual províncialocalização

atual Achāĭ a (Acaia) Germānĭa (Germânia)  Aegyptus (Egito)  Hispānĭa Baetĭca (Hispânia Bética)  Afrĭca ( frica)  Hispānĭa Tarracōnēnsis (Hispânia Tarraconense)  Aquītānĭa (Aquitânia)  Iūdaea (Judeia)  Arabĭa Petraea (Arábia Petreia) 

Lycĭa et Pamphylĭa (Lícia e Panfília) 

 Asĭa (Ásia)  Lūsītānĭa (Lusitânia) Bīthynĭa et Pontus (Bitínia e Ponto)  Macedonĭa (Macedônia) 

Britannĭa (Britânia) Maurētānĭa Caesariēnsis (Mauretânia Cesari-ense) 

Cappadocĭa (Capadócia)  Maurētānĭa Tingitāna (Mauretânia Tingitana) Cil icĭa et Cyprus (Cilícia e Chipre)  Moesĭa (Mésia) Crēta et Cyrēnē (Creta e Cirene)  Nōrĭcum (Nórico) Dācĭa (Dácia)  Numidĭa (Numídia) Dalmatĭa (Dalmácia)  Pannonĭa (Panônia) Epīrus (Epiro)  Rhaetĭa (Récia) Galatĭa (Galácia)  Sardinĭa et Corsĭca (Sardenha e Córsega) Gallĭa Belgĭca (Gália Bélgica)  Sicilĭa (Sicília) Gallĭa Lugdūnēnsis (Gália Lugdunense)  Syrĭa (Síria) Gallĭa Narbōnēnsis (Gália Narbonense)  Thrācĭa (Trácia) 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 41/153

 

39LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

2. A seguir você encontrará os nomes de uma cidade britânica, três portuguesas, cinco francesas, cincoitalianas e dezessete espanholas que já existiam quando houve a conquista romana ou foram fundadaspelos romanos. Informe o nome atual de cada uma.

nome latino nome atual nome latino nome atualAstur ĭ ca Augusta Leg ĭō Augusta Taurīnōrum Londin ĭ umBarc ĭ nō  Lūcus AugustiBrācăra Augusta LugdūnumBurdigăla Lūt ēt  ĭ a ParīsiōrumCaesaraugusta (pelo árabe Saraqusṭ a) MalăcaCarthāgō Noua Massil ĭ aConimbr ĭ ga MediolānumCordŭba NeāpŏlisĒmer ĭ ta Augusta Olisīpō Flōrent  ĭ a Tarrăcō 

Genŭa TolōsaHispălis (pelo árabe Išbiliya) Valent  ĭ a

3. Ordene cronologicamente os acontecimentos seguintes, que levaram à queda do Império Romano noocidente:

alianças com os povos bárbaros desfalque de mão de obra nas propriedades médiasascensão dos bárbaros à chefia do exército diminuição dos investimentos nas cidadesbusca dos pobres pela proteção dos ricos escassez de mão de obra escrava

decadência dos decuriões ou curiais opressão do Estado para manter-sedeposição do imperador Rômulo Augústulo uso da mão de obra dos colonos

4. Pesquise as vidas de ao menos dois mártires cristãos que tenham perecido durante a Grande Perse-guição empreendida pelo imperador Diocleciano. Pesquise também as conclusões do Concílio de Niceia,convocado pelo imperador Constantino. Escreva, então, um texto resumindo a sua pesquisa e respon-dendo à pergunta seguinte: como os martírios desses cristãos e o Concílio de Niceia influenciaram aevolução do cristianismo?Lembre-se de que o escopo desta atividade não é defender certa visão teológica desses acontecimentos,mas compreendê-los de uma perspectiva não doutrinária.

O latim após o fim do Império

 Aquecimento1. Imagine que você está assistindo a uma palestra em uma universidade e o palestrante usa expressõescomo Bellum omnium contra omnes (‘Uma guerra de todos contra todos’), Cogito ergo sum (‘Penso, logoexisto’), Hypotheses non fingo ( ‘Não moldo hipóteses’) ou Natura non facit saltus ( ‘A natureza não dásaltos’), com a propriedade de quem as conhece. Como você reagiria? Que juízo faria dessa pessoa?Por quê?Pensou? Respondeu? Pois acabemos o nosso percurso pela história da língua latina.

Quando, ao longo do século VI, as escolas desapareceram porque os municípios nãopodiam pagar os mestres, foi a Igreja que guardou o estudo da língua latina. Fundaram-se

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 42/153

 

40LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

escolas junto às igrejas e aos mosteiros, onde não se lia a Eneida, de Virgílio, mas a Bíblia.

Com efeito, somente os clérigos tinham acesso às fontes do conhecimento escolar, se bem

que esse conhecimento decaiu de tal maneira que a língua grega, tão prezada pelos romanos,

foi esquecida. O latim continuou, pois a ser a língua escrita e culta da cristandade ocidental.A literatura não cessou, tanto que ainda se contam grandes escritores, como:

  Boécio (475-525), que firmou a vitória da fé cristã entre os romanos, tanto pela sua

linhagem nobre como por ter-se dedicado à filosofia grega clássica;

  Gregório de Tours (c. 538-594), autor da Historĭa Francōrum ‘História dos francos’;

  o papa Gregório I (c. 540-604), quem, ao mesmo tempo que foi um escritor notá-

vel, repudiou a literatura não cristã;

  Isidoro de Sevilha (c. 560-636), que escreveu os Orīgĭnum sīue etymologiārum lībrī  

‘Livros das origens ou das etimologias’, uma enciclopédia na qual procurou coligir

todo o conhecimento do seu tempo.

Portanto, a história da língua latina não acabou junto com o Império Romano do Oci-

dente. No que diz respeito ao seu uso, não houve nenhuma quebra. O que houve foi uma

infiltração paulatina de elementos da língua falada  – o chamado latim vulgar  – na escrita,

que, de resto, começara a aparecer nos autores romanos tardios.

Na verdade, formas do latim vulgar estão espalhadas por todo o

corpus do latim, mas na literatura elas se amiudaram muito mais nas obras

desses escritores tardios. Como o padrão do latim é a norma literária do

século I a.C., esse latim impregnado da fala ordinária pareceu bárbaro aos

pósteros, tanto que em 782 Carlos Magno, rei dos francos, convidou o

monge Alcuíno de York a ensinar na escola da sua corte. O trabalho de

Alcuíno foi decisivo na reaproximação do latim escrito então ao latim clás-

sico, o que, na verdade, fez parte de um quadro mais amplo de valorização

da Antiguidade clássica e de expansão da escolarização, chamado Renas-

cimento Carolíngio. Convém lembrar que Carlos Magno foi coroado impe-

rador dos romanos (Imperātor Rōmānōrum) pelo papa Leão III no Natal

do ano 800 em Roma, origem do Sacro Império Romano-Germânico, queperdurou até 1806.

Contudo, a reforma encabeçada por Alcuíno produziu um efeito colateral contrário ao

que se almejava: o divórcio cabal entre a língua falada e a escrita. Quando se procurou res-

taurar esta à imagem do latim clássico, a distância agigantara-se após tantos séculos. As pes-

soas começaram, então, a julgar que a língua que falavam era outra diferente do latim, nome

da língua que escreviam. Como essas pessoas ainda se identificavam como romanos, en-

quanto descendentes dos antigos romanos, começaram a chamar romance à língua falada. A

palavra romance vem da forma adverbial do adjetivo rōmānĭcus (sinônimo de rōmānus ‘ro-

mano’), ou seja, rōmānĭcē  ‘à romana’. Esse romance não era nada mais nada menos que o

Figura 11 - O Imperador

Carlos Magno, de Al-brecht Dürer (1512).

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 43/153

 

41LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

português, o espanhol, o francês, o italiano etc. quando ainda não tinham esses nomes espe-

cíficos. Aliás, é por isso que esses idiomas são classificados como línguas românicas.

O testemunho mais antigo desse novo estado de coisas é o artigo 17 dos cânones do

Concílio de Tours, no qual se ordenou que os pregadores traduzissem as suas homilias ‘paraa língua romana rústica ou a tudesca’ (“in rūstĭcam Rōmānam linguam aut Thiotiscam”), para

que todos pudessem entender mais facilmente o que se dizia. Desde então, pode-se dizer que

o latim se tornou uma língua morta, ou, trocando em miúdos, uma língua que não é a verná-

cula de nenhum povo, uma língua de ninguém, mas que todos continuaram a escrever. É claro

que a expressão língua morta é uma metáfora, dado que as línguas nem nascem nem morrem

como se fossem seres vivos: não houve uma noite em que as pessoas foram dormir falando

latim e despertaram falando romance. Em outras palavras, a transformação do latim nas lín-

guas românicas foi uma mudança ideológica, uma mudança de percepção: as pessoas foram

deixando de perceber o latim como a língua que falavam.

Durante o resto da Idade Média, o latim – ou melhor, o latim medieval, para diferençá-

lo do latim como língua do povo romano  – continuou a ser a língua dominante nos âmbitos

de uso mais formais. Após o Renascimento dos séculos XV e XVI, que foi uma revalorização

da Antiguidade clássica, dessa vez mais vasta e mais profunda que a carolíngia, o uso de lín-

guas vernáculas crescera consideravelmente: tinham acumulado certo patrimônio literário,

eram empregadas no governo e começavam a ser codificadas. Por conseguinte, o latim – ao

qual agora convém chamar latim renascentista, e, depois do Renascimento, neolatim  (não

confunda com as línguas neolatinas, outro nome para as línguas românicas) – tornou-se aindamais artificial, restringindo-se à diplomacia, à ciência, à educação e à religião.

Na diplomacia, ainda que bilíngue (francês-latim), o Tratado de Viena, assinado pela

França e pelo Sacro Império Romano-Germânico entre 1735 e 1738, foi o primeiro redigido

em uma língua vernácula. Mas, em data tão recente quanto 1844, o latim ainda era a língua

oficial do reino da Hungria. Quanto à ciência, o último grande cientista que empregou o latim

foi Carlos Lineu (1707-1778), que estabeleceu a nomenclatura científica dos seres vivos nessa

língua. Antes dele, homens do talhe de Giambattista Vico, Gottfried Leibniz, Isaac Newton,

Bento de Espinosa, René Descartes, Thomas Hobbes, Johannes Kepler, Galileu Galilei e Fran-cis Bacon compuseram ao menos parte da sua obra em latim. No tocante à educação, em

Portugal e nas suas colônias, ensinou-se em latim até 1759, quando o rei Dom José I, secreta-

riado por Sebastião José de Carvalho e Melo, futuro Marquês de Pombal, expulsou os jesuítas 

e reformou o ensino, que passou a ser ministrado em português. Não obstante, os candidatos

ao doutorado em Letras da Sorbona (Universidade de Paris) tinham de apresentar uma tese

complementar em latim até 1903! E até hoje nas universidades inglesas de Cambridge e Ox-

ford e nas norte-americanas de Harvard e Princeton há cerimônias em que se pronuncia um

discurso em latim.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 44/153

 

42LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Com relação ao uso religioso do latim, merece um esclareci-

mento à parte. O latim foi a língua majoritária do rito latino da Igreja

Católica, mas foi trocada quase em toda a parte por línguas vernácu-

las quando se permitiu o emprego destas em 1963, no bojo do Concí-lio Vaticano II. Também foi, como ainda é, a língua oficial da Santa Sé,

isto é, a sé da diocese de Roma, cujo bispo é o papa, que governa a

Igreja Católica. Isso não quer dizer que se fala latim no Vaticano. Em-

bora se diga amiúde o nome Vaticano quando a referência é, na ver-

dade, a Santa Sé, são entidades diferentes. O Estado da Cidade do Va-

ticano foi constituído para garantir a independência e soberania da

Santa Sé. As leis do Vaticano são escritas em italiano e é essa língua

que emprega a sua administração. A bem da verdade, a Santa Sé é

hoje mais plurilíngue com o predomínio do italiano do que bilíngueem latim e italiano: a mídia que difunde os seus atos é veiculada em

várias línguas, mas não em latim. Assim, apesar de haver uma Pontifícia Academia da Latini-

dade no Vaticano, o latim eclesiástico é tão artificial quanto o neolatim científico-acadêmico,

e o seu uso aí não passa de uma tradição litúrgica e uma obrigação protocolar.

Ao fim e ao cabo, essas relíquias contemporâneas são, precisamente por estarem tão

longe do latim enquanto língua dos romanos, uma prova da transcendência ímpar dessa lín-

gua na história da civilização ocidental. Em outras palavras, a língua latina possui um poder

simbólico tão grande que mesmo depois da sua vigência histórica, forjaram-se formas artifi-

ciais suas que fizessem crer que se mantinha a língua de Roma.

 Aprofundando a reflexão1. O lema de Andorra é Virtus unita fortior  (‘A força unida é mais forte’), o do Canadáé A mari usque ad mare (‘De um mar até outro mar’), o da Espanha é Plus ultra (‘Maisalém’), o dos Estados Unidos é E pluribus unum (‘De vários, um’) e o da Suíça é Unus

 pro omnibus, omnes pro uno (‘Um por todos, todos por um’). Por que será que essespaíses abriram mão das suas próprias línguas pelo uso do latim?

2. Como estudamos neste capítulo, uma das instituições mais apegadas ao uso dolatim é a universidade. Você já percebeu que a maioria dos lemas das universidadesbrasileiras não está em português, mas em latim? Por exemplo, o da UniversidadeFederal do Ceará (UFC) é exatamente o mesmo de Andorra: Virtus unita fortior . Pes-quise e cite um lema em latim de uma universidade brasileira. Uma dica: acesse o sítioda universidade e observe o escudo dela, pois o lema geralmente é gravado nele.

Figura 12 - Terceira carta encí-clica do papa Bento XVI (2009).Perceba que o título está em la-tim, mas o texto é difundido naslínguas mais faladas pela cristan-dade.

Figura 13 - Escudo deAndorra. 

Figura 14 - Escudo daUFC. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 45/153

 

43LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Resumo da história de Roma e da língua latina

A história de Roma pode ser partida muito claramente em três períodos: o Reino, a

República e o Império.

O Reino é um tempo meio mítico meio histórico, que começou com a fundação da

Cidade, segundo a lenda por Rômulo, filho de uma vestal violada por Marte e neto do rei de

Alba Longa, irmão gêmeo de Remo, a quem matou. Sucederam-lhe os reis Numa Pompílio,

Tulo Hostílio, Anco Márcio, Tarquínio Prisco, Sérvio Túlio e Tarquínio o Soberbo. A eles atri-

bui-se o assentamento dos alicerces de diferentes instituições romanas.

A República é o tempo em que Roma deixou de ser uma modesta cidade-Estado do

Lácio para se converter na incontestável potência do mar Mediterrâneo. Começou com o ba-

nimento do último rei por tirania, foi atravessado por conflitos graves, primeiro entre os pa-trícios e os plebeus, depois entre os oligarcas que defendiam a conservação da constituição

de cidade-Estado, favorável à classe senatorial, e os que defendiam a sua adaptação ao

imenso Estado em que Roma se tornara, consoante as demandas do resto da sociedade, e

chegou ao fim após as guerras civis que levaram Júlio César ao poder quase monárquico e

que travaram os seus herdeiros depois do seu assassinato.

O Império é o tempo em que Roma atingiu o poderio máximo e também aquele em

que se arrastou o seu lento declínio. Começou quando Augusto, herdeiro legal de César, se

tornou, sob a aparência de restaurar a República, efetivamente um monarca. Até o reinado

de Marco Aurélio, Roma é um Estado cada vez mais pujante. Mas o crescimento do Estado

romano sempre dependeu das conquistas, de modo que quando estas cessaram, uma cadeia

de consequências acabaram minando a sustentação desse Estado no Ocidente.

A história da língua latina não é senão um reflexo da história da sociedade romana.

Assim, o período do Reino corresponde ao início do uso escrito do latim, quando se produzi-

ram os documentos mais antigos. O período da República foi quando, após o contato com a

cultura grega no sul da Itália, se desenvolveu a literatura latina, que alcançou o apogeu no

século I a.C. O prestígio que as gerações pósteras conferiram aos autores dessa época, mor-

mente a Cícero e a Virgílio, foi tão grande que a norma literária parou aí de acompanhar asmudanças da língua: é o chamado latim clássico.

Desde então, já fora dos limites temporais do Império Romano no Ocidente, não só a

distância entre a língua falada e a língua escrita aumentara consideravelmente em relação ao

século I a.C., mas também elementos distintivos daquela “vazavam” cada vez mais nesta, até

que Carlos Magno promoveu uma reforma que reaproximou a língua escrita ao latim clássico,

o que surtiu o efeito colateral de patentear definitivamente o divórcio entre esta e a língua

falada, que mais ou menos desde então passou a ser vista como outra língua, o romance, mais

tarde como outras línguas: as línguas românicas.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 46/153

 

44LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

ALFABETO E PRONÚNCIA

Neste capítulo, encetamos a nossa caminhada pelo ensino-aprendizagem da língua la-

tina. Começamos ensinando e aprendendo o conhecimento pelo qual se costuma iniciar o es-

tudo de uma língua adicional: o sistema fônico e a sua realização. Assim, o objetivo do capítulo

é dispor os fundamentos da pronúncia do latim, que você dominará paulatinamente ao longo

da disciplina.

A relação entre o som e a escrita comporta uma vantagem aos aprendizes do latim em

detrimento daqueles que aprendem línguas do presente: como o alfabeto latino foi desen-

volvido para escrever especificamente a língua latina, a cada letra corresponde um único som,

com a exceção das vogais, já estudaremos por quê.

Contudo, antes de empreender esse estudo, uma pergunta impõe-se: se o latim é uma

língua do passado, cujos falantes nativos estão mortos há séculos, como se pode saber como

pronunciá-lo? A resposta tem duas faces.

De um lado, chegaram-nos descrições da fonética-fonologia do latim feitas pelos pró-

prios gramáticos latinos. Estudando-as em confronto com as variações gráficas no próprio

corpus do latim e mais as mudanças das continuações do latim, que são as línguas românicas,

é possível alcançar um conhecimento considerável de como soava essa língua.

De outro lado, por mais que esse conhecimento esteja assentado sobre bases seguras,

é preciso sermos humildes e reconhecermos que ele não passa de uma aproximação. Com

efeito, embora os gramáticos se ativessem à norma culta do período clássico, eles viveram

depois, quando já tinham acontecido mudanças fonético-fonológicas. Além disso, não dispu-

nham de uma teoria e de uma terminologia que permitissem descrições precisas. Enfim, não

há quem ouça e avalie a nossa reprodução do que, em última análise, é uma reconstrução da

fonética da norma culta clássica.

Formação do alfabeto latino

A origem mais remota do alfabeto latino é a escrita fenícia. Entre os séculos XX e XVIII

a.C., um povo de língua semítica que habitava a península do Sinai desenvolveu uma escrita

nova em que cada sinal representava uma consoante. Os vizinhos egípcios  já usavam uma

escrita em princípio ideográfica, isto é, em que cada sinal, chamado hieróglifo, representava

uma ideia. Esse povo do Sinai tomou, então, alguns hieróglifos e convencionou que o primeiro

som da palavra que exprimia a ideia de cada hieróglifo na sua língua fosse representado por

ele. Em outras palavras, o hieróglifo foi transformado em uma letra.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 47/153

 

45LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Essa escrita estendeu-se à terra de Canaã, onde

os desenhos das letras foram simplificados, dando lugar,

desde o século XI a.C., à escrita fenícia. Os fenícios eram

um povo de mercadores que singravam o mar Mediter-râneo em todos os rumos, e consigo levaram a sua es-

crita, que os gregos  importaram no começo do século

VIII a.C. No entanto, o grego não é uma língua semítica

como o fenício, mas uma língua indo-europeia, o que de-

mandou ajustes que o acomodassem melhor à escrita fe-

nícia. Com efeito, as línguas semíticas  – família linguística à qual pertencem, além do fenício 

(que está extinto), o árabe, o aramaico e o hebraico  – têm uma estrutura que dispensa a

notação de vogais, mas o mesmo não acontece às línguas indo-europeias. Engenhosamente,

os gregos usaram algumas letras cujos sons não existiam em grego para representá-las.

Mas os próprios gregos também eram um povo

de navegadores. Fundaram várias colônias  à beira do

mar, dentre as quais sobressaem as que ficavam no sul

da península Itálica e na Sicília, a Magna Grécia. Aí os gre-

gos comerciavam com os etruscos, um povo de minera-

dores que lhes vendiam sobretudo ferro e que se apro-

priaram do alfabeto grego, mais precisamente da varie-

dade que era usada na cidade de Cumas, para escrever a sua própria língua. Por volta do sé-

culo VII a.C., os latinos  – povo do qual os romanos faziam parte – tomaram o alfabeto etrusco 

e adaptaram-no à sua língua: o latim.

A evolução da primeira letra do alfabeto é um exemplo ilustrativo

do que acabo de expor. O hieróglifo A, como o próprio desenho sugere,

representava a ideia de ‘boi’. Na escrita sinaítica, esse hieróglifo passou a

representar a consoante oclusiva glotal [ʔ], que era o primeiro som da pa-

lavra semítica que significa ‘boi’: ʾ alf . Com o tempo, o desenho desse sinal

mudou até assumir a forma  no alfabeto fenício. No uso grego, esse de-

senho evoluiu para a forma A com o nome de ἄλφα, palavra que não queriadizer nada em grego a não ser o nome mesmo da letra. Todavia, nessa lín-

gua não havia o som [ʔ], de modo que o sinal passou a representar a vogal 

aberta anterior não arredondada [a]. Com a mesma forma e o mesmo valor,

essa letra encabeçou o alfabeto etrusco, e a partir dele, o alfabeto latino.

Originalmente, o alfabeto latino tinha vinte e uma letras, a saber:

A B C D E F  H I K L M N O P Q R S T V X 

Como a fricativa alveolar sonora [z] desaparecera do latim no século IV a.C., a letra

 (diferente do I), que a representava, foi suprimida, segundo a tradição, pelo censor Cláudio

Figura 15 – Inscrição fenícia sobre o sarcófago do reiAirão de Biblos (século X a.C.).

Figura 16 – Inscrição grega sobre o chamado vaso deDipylon (século VIII a.C.).

Figura 17 – Inscrição la-tina sobre o chamadoLapis Niger   (século VIa.C.).

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 48/153

 

46LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Ápio Ceco em 312 a.C. Por outro lado, a letra C representava tanto a oclusiva velar surda [k ]

como a sonora [ɡ]. Por exemplo, no Lapis niger  está escrito RECEI ‘ao rei’ e no vaso de Duenos,

VIRCO ‘virgem’, palavras que devem ser lidas como /ˈreːɡei/ e /ˈwir ɡoː/. Também segundo a

tradição, foi Espúrio Carvílio Ruga quem inventou a letra G em 293 a.C., acrescentando umahaste à ponta inferior do C. Essa letra nova foi posta, então, no lugar do .

Em virtude da influência crescente do helenismo em Roma, introduziram-se as letras

gregas Y e Z para transcrever palavras dessa língua que continham a vogal fechada anterior

arredondada [y] e a consoante fricativa alveolar sonora [z], as quais foram colocadas no fim

do alfabeto, completando, então, o alfabeto latino clássico:

A B C D E F G H I K L M N O P Q R S T V X Y Z Em princípio, escrevia-se tanto da direita para a esquerda como da esquerda para a

direita, e também combinando ambas as direções, combinação denominada bustrofédon (pa-lavra grega que significa ‘como ara o boi’, que cava um sulco em uma direção e volta cavando

outro na direção contrária). Depois, fixou-se a ordem da esquerda para a direita.

Até o século III d.C., as letras latinas tinham uma só figura, à qual chamamos hoje mai-

úscula. Usavam-se com dois desenhos: a letra capital e a cursiva. Depois, a cursiva evolveu

para a letra uncial, mais arredondada. Ao mesmo tempo, surgiu uma cursiva nova, que hoje

denominamos minúscula. Na alta Idade Média, desenvolveram-se diferentes estilos regionais

de uncial e minúscula: a escrita insular (das ilhas Britânicas), a lombarda (do norte da Itália),

a beneventana (do sul da Itália), a merovíngia (da França), a visigótica (da península Ibérica).Como uma das consequências do seu ideal de universalidade e aproximação à Antiguidade

clássica, durante o reinado de Carlos Magno surgiu outro estilo de letra: a escrita carolina ou

carolíngia, que se sobrepôs aos estilos regionais, dando origem à minúscula moderna.

Perceba, ainda, que não havia as letras j , u e w. O w foi inventado a partir da necessi-

dade de grafar a semiconsoante labiovelar sonora [w] das línguas germânicas, para o que se

usaram dois vv , que acabaram ligando-se. Quanto ao j  e ao u, primitivamente eram variações

do i  e do v minúsculos. Apenas desde o século XVI é que se estendeu o costume de usar o i  e

o u para representar vogais e o j  e o v  para consoantes. Desde então, tornou-se comum editar

textos mesmo em latim empregando essas letras novas em vez do i  e do u na função de con-

soantes. Até hoje muitos dicionários seguem essa convenção, de modo que uma palavra como

iuuĕnis ‘jovem’ aparece escrita nessas publicações como juvĕnis. Ainda que prática, por dife-

rençar bem o i  e o u como consoantes, a verdade é que os romanos não conheceram tal me-

canismo, de modo que se o objeto de estudo é o latim como língua dos romanos, não parece

ser apropriado escrever juvĕnis, o que, além do mais, induz o aprendiz a pronúncias divergen-

tes do padrão clássico reconstruído. Assim, neste livro-texto escrevo sempre V  como figura

maiúscula e u como minúscula, tenha a letra valor vocálico ou consonântico.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 49/153

 

47LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Diferentemente dos gregos, os latinos não mantiveram os nomes semíticos das letras

(alfa, beta, gama...). Nomearam-nas de três maneiras:

  As letras das vogais chamavam-se pelos seus sons alongados: ā, ē, ī , ō, ū.

 

As das consoantes oclusivas, pelos seus sons seguidos da vogal longa ē: bē, cē,dē, gē, pē, tē,

o  mas as letras K e Q tinham os nomes de kā e qū.

  As das consoantes fricativas, nasais e líquidas, pelos seus sons antecedidos da

vogal breve e: ef , el , em, en, er , es, ex ,

o  do que se excetuava a letra H, chamada hā.

o  Além disso, o X representava propriamente uma consoante africada e

podia chamar-se também ix .

  As letras importadas Y e Z conservaram os seus nomes gregos: h  e zēta.

Em suma:

A B C D E F G H I K L M N O P Q R S T V X Y Zā  bē  cē  d ē  ē  ef gē  hā   ī   kā  el em en ō   pē  qū  er es tē  ū  ex h   zeta

Exercício1. Observe as letras fenícias a seguir. Cada uma deu origem a certa letra do alfabeto romano. Qual?

letra sinaítica letra feníciasignificado do nome

fenício da letraletra romana?

K    ‘palma da mão’ M    ‘água’ N    ‘serpente’ E    ‘olho’ T    ‘sinal’ 

2. As línguas europeias são escritas hoje por três alfabetos: o grego, o romano e o cirílico. Este surgiuno século X d.C. e é usado hoje para escrever algumas línguas eslavas (bielorrusso, búlgaro, macedônio,russo e ucraniano) e algumas outras de povos que estiveram ou estão sob o domínio russo. A seguir,observe esses três alfabetos e responda:

a) O alfabeto cirílico deriva do alfabeto grego ou do alfabeto romano? Em que se fundamenta a suaobservação?b) Que divergências há entre as letras gregas e as romanas?

gregoletra Α  Β  Γ  Δ  Ε  Ζ  Η  Θ  Ι  Κ   Λ  Μ som /a/, /aː/  /b/ /ɡ/  /d/ /e/ /zd/ /ɛː/  /tʰ/  /i/, /iː/  /k/ /l/ /m/

letra  Ν  Ξ  Ο  Π  Ρ  Σ  Τ  Υ  Φ  Χ  Ψ  Ω som /n/ /ks/ /o/ /p/ /r/ /s/ /t/ /y/, /yː/  /pʰ/  /kʰ/  /ps/ /ɔː/ 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 50/153

 

48LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

romanoletra A B C D E F G H I K L Msom /a/, /aː/  /b/ /k/ /d/ /e/, /eː/  /f/ /ɡ/  /h/ /i/, /iː/, /j/  /k/ /l/ /m/

letra N O P Q R S T V X Y Z

som /n/ /o/, /oː/  /p/ /kʷ/  /r/ /s/ /t/ /u/, /uː/, /w/  /ks/ /y/, /yː/  /z/

cirílicoletra А  Б  В  Г  Д  Е  Ж  З  И  К  Л  М  Н som /a/ /b/ /v/ /ɡ/  /d/ /je/ /ʒ/ /z/ /i/ /j/ /k/ /l/ /m/ /n/

letra О  П  Р  С  Т  У  Ф  Х  Ц   Ч  Ш  Щ  Ь  Ю   Я som /o/ /p/ /r/ /s/ /t/ /u/ /f/ /x/ /ts/ /t ʃ / / ʃ / / ʃ t ʃ / /ʲ/  /ju/ /ja/

3. As palavras no quadro a seguir são nomes de cidades europeias cuja língua é escrita pelo alfabetoromano. Perceba que em cada um há ao menos um diacrítico (destacado em vermelho), isto é, um sinal

acrescentado a uma letra romana, o qual mudou o seu som originário (também em negrito). Reflita: porque terá sido necessário acrescentar esses diacríticos às letras romanas?

país cidade pronúncia país cidade pronúnciaNoruega Ås [os] Finlândia Jyväskylä  [ˈjyvæsˌkylæ] França Besançon [bəzɑ  ˈsɔ]   Dinamarca K ø benhavn [kʰøb  m ˈhɑʊ  ˀn] 

Moldávia Chişinău [ki ʃiˈnəu  ]  Espanha Logroño [loˈɣro ɲo]Portugal Covilhã  [kuviˈʎɐ ] Islândia  Nor ður  þing [ˈnɔrðʏrθiŋk] Croácia Đur đevac [ˈdʑuːrdʑɛʋats] Lituânia Panevėžys [panʲævʲeˈʒiːs] 

Alemanha Düsseldorf [ˈdʏslˌdɔɐ  f] República Tcheca Plzeň  [ˈplzɛɲ]Hungria Győr [ ɟøːr]  Polônia więtochłowice [ɕfjɛntɔxwɔˈvitsɛ]

Pronúncia do latim

Vogais

Opostos por traços segmentais, no latim clássico havia cinco fonemas vocálicos: uma

vogal aberta central, /a/; duas médias, sendo uma anterior, /e/, e a outra posterior, /o/; duas

fechadas, sendo também uma anterior, /i/, e a outra posterior, /u/.

Havia, ainda, outra oposição por um traço suprassegmental: cada vogal podia ser

breve ou longa, o que dobrava o número dos fonemas vocálicos a dez. As vogais breves eram

produzidas com uma duração comparável à articulação normal das vogais em português. As

longas duravam o dobro, mais ou menos como a articulação enfática de uma vogal em portu-

guês. Mas ao contrário do que acontece na nossa língua, a distinção entre vogais breves e

longas era fonológica: mălum /ˈmalum/, com /a/ breve, significa ‘(o) mal’, e mālum /ˈmaːlum/,

com /aː/ longo, significa ‘maçã’;  pŏpŭlus  /  populus/, com /o/ breve, quer dizer ‘povo’, e

 pōpŭlus /ˈpoːpulus/, com /oː/ longo, quer dizer ‘choupo’, uma espécie de árvore.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 51/153

 

49LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Na escrita, os romanos não notavam a duração das vogais. As letras a, e, i , o, u distin-

guiam apenas os traços segmentais. É claro que enquanto a oposição entre vogais breves e

longas vigorou, os falantes nativos do latim não necessitaram de que isso transparecesse por

escrito, pois todos sabiam quais vogais eram breves e quais longas. Nós, em contrapartida,sentimos tal necessidade, em virtude da qual nos textos que se destinam ao ensino-aprendi-

zagem do latim, como este livro-texto, costuma-se colocar um semicírculo voltado para cima

(˘), chamado braquia, sobre a letra da vogal para assinalar que é breve, e um traço horizontal

(ˉ), chamado macro, para assinalar que é longa.

Em suma, o sistema vocálico do latim clássico pode ser ilustrado assim:

 ĭ  /i/, ī  /iː/ ŭ /u/, ū /uː/

ĕ /e/, ē /eː/ ŏ /o/, ō /oː/ă /a/, ā /aː/

Não obstante, as descrições dos gramáticos latinos junto com a evolução do latim para

as línguas românicas permitem depreender que à oposição pela duração se acrescentava ou-

tra pelo grau de abertura-fechamento da vogal. Assim, as vogais breves tendiam a ser mais

abertas que as longas, com a exceção do par /a/ e /aː/, cuja breve não podia ser mais aberta,

por já estar no grau máximo de abertura, de modo que a realização fonética do sistema vocá-

lico do latim clássico pode ser configurada da maneira seguinte:

 ī  [iː] ū [uː] ĭ  [ɪ] ŭ [ʊ]

ē [eː] ō [oː]ĕ [ɛ] ŏ [ɔ]ă [a], ā [aː]

Em outras palavras, o /i/ e o /u/ breves soavam como o [ɪ] e o [ʊ] finais das palavras

portuguesas teme e temo, enquanto o /e/ e o /o/ breves tinham os sons do [ɛ] e do [ɔ] abertos

das palavras pé e  pó. O /a/, breve ou longo, era sempre aberto, como na palavra  pá. Deste

modo, a transcrição fonética das palavras pŏpŭlus e pōpŭlus, que citei acima, seria [  pɔ pʊlʊs]

e [ˈpoːpʊlʊs].

Quanto aos ditongos, havia três, escritos au, ae e oe. O primeiro pronunciava-se como

sugere a sua notação, p. ex. aurum ‘ouro’: /ˈau  rum/. Em contrapartida, os dois outros, embora

se tenha grafado e no latim clássico, continuou-se a articular um / i/, p. ex. aedēs ‘templo’,

 foedus ‘aliança’: /ˈaideːs/, /ˈf oidus/.

Além disso, desde a Idade Média, houve o costume de escrever os ditongos ae e oe 

ligados: æ e œ. Isso se deveu à mudança na pronúncia desses ditongos, que evolveu respec-

tivamente para [ɛ] e [e]. Como o nosso escopo é o estudo do latim dos romanos, que escre-

viam AE e OE desde o período clássico, essas ligaduras não são usadas neste livro-texto.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 52/153

 

50LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Consoantes

A série das consoantes oclusivas compunha-se de três pares, sendo uma surda e a

outra sonora. Havia, pois, um par de bilabiais, outro de dentais e o terceiro de velares: / p/ e

/ b/, /t/ e /d/, /k / e /ɡ/, representados pelas letras p, b, t , d , c e g.

Não obstante, no período arcaico costumava-se escrever a letra c antes das vogais an-

teriores (i  e e), k  antes da central (a) e q antes das posteriores (o e u), o que sugere que se

percebiam as realizações palatal, velar e uvular (cujos símbolos no AFI são, precisamente, [c],

[k ] e [q]) do fonema /k /. Seja como for, a letra k  caiu em desuso depois, permanecendo apenas

em algumas abreviaturas, p. ex. Kal., de Calendae ‘primeiro dia do mês’, e o q foi usado so-

mente antes do u mais outra vogal.

Na verdade, os gramáticos latinos também não consideravam que esse u mais outra

vogal formassem um ditongo. Ele era sentido como parte da própria consoante /k /. Em outras

palavras, o qu representava uma oclusiva velar surda labializada, o mesmo som que articula-

mos em uma palavra como quando em português, p. ex. quis ‘quem, qual, o quê’, quattŭor  

‘quatro’: /ˈkʷis/, /ˈkʷatːuor /. O correspondente sonoro dessa velar labializada escrevia-se gu,

p. ex. unguis ‘unha’, unguĕre ‘untar’: /ˈunɡʷis/, /ˈunɡʷere/.

Por conseguinte, as letras c e g representavam os fonemas /k / e /ɡ/ antes de todas as

vogais, p. ex. cinis ‘cinza’, centum ‘cem’, gignere ‘engendrar’, genus ‘raça’: /ˈkinis/, /ˈkentum/,

/ˈɡiɡnere/, /ˈɡenus/.

A profusão de consoantes oclusivas não se refletia na série das fricativas, que eram

poucas, apenas três surdas, sem as correspondentes sonoras: a labiodental /f /, a alveolar /s/

e a glotal /h/, representadas pelas letras  f , s e h. P. ex. frater  ‘irmão’,  facĕre ‘fazer’,  fornus 

‘forno’; scrībĕre ‘escrever’, rosa ‘rosa’, est  ‘é’; hiems ‘inverno’, homō ‘homem’, uehĕre ‘trans-

portar’: /ˈfrater /, /ˈfakere/, /ˈfornus/, /ˈskriːbere/, /ˈrosa/, /est/, /ˈhiems/, /ˈhomoː/, /ˈwehere/.

De consoantes africadas, havia apenas uma velar-alveolar: /ks/, representada pela le-

tra x , como em dīxī  ‘disse’, uxor  ‘esposa’: /ˈdiːksiː/, /ˈuksor /.

As consoantes nasais eram duas, uma bilabial e outra dental: /m/ e /n/, representadaspelas letras m e n. Como as observações dos gramáticos latinos não permitem interpretar que

houvesse uma nasalização que assimilasse inteiramente a consoante nasal final de sílaba à

vogal anterior, como acontece em português, é razoável supor que o fonema nasal nessa po-

sição se realizasse no ponto de articulação da consoante posterior, p. ex. tempus  ‘tempo’,

ambō  ‘ambos’, cantus  ‘canto’, mandāre  ‘entregar, mandar’, quīnque  ‘cinco’,  fungus  ‘cogu-

melo’, infer   ‘que está embaixo’: [ˈtɛ  mpʊs], [ˈãmboː], [ˈkãntʊs], [mãnˈdaːre], [ˈkʷĩːŋkʷe],

[ˈf ʊŋɡʊs ], [ ɪɱ fer ]. Os gramáticos latinos indicam uma nasalização sensível somente no caso

do /m/ final de palavra, que, de resto, era articulado debilmente, fato que não se estende ao

/n/ na mesma posição, p. ex. decem ‘dez’, nōmen ‘nome’: [ˈdɛk ẽm

], [ˈnoːmen].

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 53/153

 

51LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Duas também eram as consoantes líquidas, uma vibrante alveolar e outra lateral al-

veolar: /r / e /l/, representadas pelas letras r  e l , p. ex. rēx  ‘rei’, mortŭus ‘morto’, calcar  ‘es-

pora’, lēx  ‘lei’, albus ‘branco’, sōl  ‘sol’: /reːks/, /ˈmortuus/, /ˈkalkar /, /ˈleːks/, /ˈalbus/, /soːl/.

Não obstante, algumas observações dos gramáticos latinos dão azo a interpretar que o /l/final de sílaba tinha uma realização velarizada, de modo que a transcrição fonética de albus,

calcar  e sōl  seria [ˈaɫ bʊs], [ˈkaɫkar ] e [soːɫ].

Havia, ainda, duas semiconsoantes, uma palatal e outra labiovelar: / j/ e /w/, repre-

sentadas pelas letras i  e u. Por conseguinte, abstraindo a oposição entre vogais breves e lon-

gas, o i  e o u são praticamente os únicos casos de letras que têm dois valores no latim clássico,

pois cada uma delas podia assinalar uma vogal (na verdade, duas) ou uma consoante (na ver-

dade, uma semiconsoante): o i  podia representar /i/ ou /iː/ e / j/; o u, /u/ ou /uː/ e /w/. Re-

presentavam as semiconsoantes quando antecediam uma vogal sem que antecedesse a elas

mesmas uma consoante (a não ser que fosse uma líquida no caso do /w/), p. ex. iugum ‘jugo’,

iecur   ‘fígado’, ouis  ‘ovelha’, uīuus  ‘vivo’, seruus  ‘escravo’, silua  ‘selva’: /  juɡum/, /  jekur /,

/ˈwiːwus/, /ˈowis/, /ˈserwus/, /ˈsilwa/. 

Enfim, as letras importadas y  e z conservavam os sons que representavam em grego.

A primeira era uma vogal anterior fechada arredondada e a segunda uma consoante fricativa

alveolar sonora: /y/ e /z/, p. ex. būtrum ‘manteiga’, hyacinthus ‘jacinto’, zōdiăcus ‘zodíaco’,

zōna ‘cintura, zona’: / buːˈtyːrum/, /hyaˈkintʰus/, /zoːˈdiakus/, /ˈzoːna/. O mesmo vale para a

pronúncia no latim clássico das consoantes oclusivas surdas aspiradas gregas, representadas

pelas letras ῥ (rô), φ (fi), θ  (teta) e  χ  (qui), transcritas como rh, ph, th e ch, p. ex. rhētor  ‘rétor’, philosŏphus ‘filósofo’, thēsaurus ‘tesouro’, chorda ‘corda (de instrumento musical)’: /ˈreːtor /,

/ pʰiˈlosopʰus/, /tʰeˈsau  rus/, /ˈkʰorda/.

Por último, assim como as vogais podiam ser breves ou longas, existia uma oposição

semelhante entre as consoantes: elas podiam ser singelas ou dobradas. Comparem-se os pa-

res mínimos seguintes: de um lado, anus /ˈanus/, com /a/ breve, opõe-se a ānus /ˈaːnus/, com

/a/ longo; anus  significa ‘(mulher) velha’ e ānus  significa ‘anel’  (e daí ânus). De outro lado,

anus /ˈanus/, com /n/ singelo, opõe-se a annus /ˈanːus/, com /nː/ dobrado; anus, como se

disse, significa ‘(mulher) velha’ e annus significa ‘ano’.Se a articulação de uma vogal longa equivalia à de duas vogais breves, igualmente a

articulação de uma consoante dobrada equivalia à de duas consoantes singelas. Uma dica para

treinar esta especificidade da fonologia latina, que deixou de existir no português, é dizer uma

palavra com uma consoante dobrada, deter-se alguns segundos nessa consoante e logo soltar

o resto da palavra, p. ex., por annus dizer an... (1, 2, 3 segundos) ...nus.

Como assinala o exemplo, na escrita, a oposição entre consoantes singelas e dobradas 

aparece na forma da repetição por duas vezes das dobradas, por exemplo stuppa  ‘estopa’,

sabbătum ‘sábado’, gutta ‘gota’, addūcĕre ‘aduzir’, uacca ‘vaca’, agger  ‘amontoação’, officīna ‘oficina’,  passus  ‘passo’,  flamma  ‘chama’,  pannus  ‘pano’, terra  ‘terra’, capillus  ‘cabelo’:

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 54/153

 

52LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

/ˈstupːa/, /ˈsabːatum/, /ˈɡutːa/, /aˈdːuːkere/, /ˈwakːa/, /ˈaɡːer /, /ofːiˈkiːna/, /ˈpasːus/,

/ˈflamːa/, /ˈpanːus/, /ˈterːa/, /kaˈpilːus/. A única exceção a essa regra é a letra i , que entre

vogais representa uma consoante dobrada, apesar de não ser escrita repetida, por exemplo

maius ‘maio’: /ˈmajːus/.

Acento

No latim clássico, a oposição entre vogais breves e longas estendia-se à sílaba: distin-

guiam-se sílabas breves e sílabas longas, e era sobre essa distinção que se assentava o esta-

belecimento da sílaba tônica da palavra.

Para que uma sílaba se constituísse, era necessário que tivesse ao menos um núcleo 

formado por uma vogal ou um ditongo, p. ex. /.a./ ou /.au  ./. O ataque da sílaba, ou seja, oelemento que antecede ao núcleo, podia ficar vazio ou ser formado por uma ou duas conso-

antes, p. ex. /.a./, /.pa./, /.pra./. A coda da sílaba, ou seja, o elemento que sucede ao núcleo,

também podia ficar vazio ou ser formado por uma ou duas consoantes, por exemplo /.a./,

/.ap./, /.arp./. A estrutura silábica do latim clássico pode, pois, ser representada pela fórmula

seguinte (C = consoante, V = vogal, D = ditongo):

(C(C))V/D(C(C))

À sílaba que tem a coda vazia, (C(C))V/D, chama-se sílaba aberta, e àquela que tem a

coda formada por uma consoante, (C(C))V/DC(C), chama-se sílaba fechada.

Assim, a sílaba era breve se tivesse uma vogal breve no núcleo e fosse aberta, e era

longa se tivesse uma vogal longa ou um ditongo no núcleo ou fosse fechada  independente-

mente de ter uma vogal breve ou longa no núcleo. Usando a fórmula acima, a estrutura de

cada tipo de sílaba pode ser representada deste modo (Vb = vogal breve, Vℓ = vogal longa):

Sílaba breve = (C(C))VbSílaba longa = (C(C))Vℓ/D ou (C(C))V(C(C)

Entendida essa diferenciação, o estabelecimento da sílaba tônica da palavra no latim

clássico dava-se a partir de umas regras muito singelas:

1.  O acento tônico nunca recaía sobre a última sílaba, não importava se ela fossebreve ou longa. Portanto, uma palavra dissílaba era sempre paroxítona;

2.  Uma palavra trissílaba ou polissílaba podia ser paroxítona ou proparoxítona:2.1.  Paroxítona se a penúltima sílaba fosse longa;2.2.  Proparoxítona se a penúltima sílaba fosse breve.

Examinemos alguns exemplos.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 55/153

 

53LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Como não havia oxítonos, as palavras octō ‘oito’, caput  ‘cabeça’, princeps ‘o primeiro’,

iūdex   ‘juiz’, mīlēs  ‘soldado’, bellum  ‘guerra’, dolor   ‘dor’  eram paroxítonos, independente-

mente de como estava constituída a última sílaba, portanto óc.tō, cá.put , prín.ceps, iū  .dex ,

mī    .lēs, bél.lum, dó.lor .

As palavras  for mī ca ‘formiga’, crūdēlis ‘cruel’, piscātor  ‘pescador’, per sōna ‘máscara’,

mātūrus ‘maduro’, ballaena ‘baleia’, magister  ‘mestre’, argentum ‘prata’, caballus ‘pangaré’,

oportet   ‘é preciso’, columbus  ‘pombo’  eram paroxítonas, porque a penúltima sílaba  era

longa, portanto  for.mī    .ca, crū.d.lis,  pis.cā  .tor ,  per.s.na, mā.tū  .rus, bal.láe.na, ma.gís.ter ,

ar.gén.tum, ca.bál.lus, o.pór.tet , co.lúm.bus.

Os vocábulos dīuitĭ ae ‘riqueza’, anĭ mal  ‘ser vivo’, iuuĕnis ‘jovem’, cerăsum ‘cereja’, in-

cŏla ‘morador’, ocŭlus ‘olho’ eram proparoxítonos, porque a penúltima sílaba era breve, por-

tanto dī.uí.tĭ.ae, á.nĭ .mal , iú.uĕ.nis, cé.ră.sum, ín.cŏ.la, ó.cŭ.lus. 

Nos livros-texto, gramáticas e dicionários de latim, nem sempre se encontra um uso

coerente da braquia e do macro. Neste livro-texto, coloco o macro sobre toda vogal longa,

visando não só ao reconhecimento da sílaba tônica, mas também à observação da pronúncia.

Quanto à braquia, coloco-a apenas sobre a vogal breve da penúltima sílaba de palavras tris-

sílabas ou polissílabas, para indicar que são proparoxítonas. Todos os vocábulos latinos cita-

dos até aqui podem ser exemplos dessa convenção.

Pronúncias vernaculizadas

Como eu já disse, a pronúncia do latim exposta acima é uma reconstrução, por mais

que alicerçada nos testemunhos relativos à fonética da norma culta no período clássico.

À medida que o latim foi deixando de ser a língua de um povo e foi restringindo-se a

ser uma língua apropriada a certos usos até acabar por ser um código litúrgico, a lembrança

da pronúncia clássica deu lugar ao costume de vernaculizar a pronúncia do latim, ou seja,

pronunciá-lo de acordo com as convenções ortográficas de línguas vernáculas. As palavras

caelum ‘céu’, uīgintī   ‘vinte’ e scientĭa  ‘conhecimento’ são exemplos ilustrativos dessas pro-núncias vernaculizadas.

Assim, na pronúncia clássica reconstruída diz-se /ˈkailu m/, /wiːɡintiː/, /skiˈentia/, mas

na pronúncia portuguesa do latim /ˈsɛlũ/, /vi ʒĩ ti/, /siˈẽsia/. Na pronúncia espanhola, fica

/ˈθelum/, / biˈxinti/, /θiˈenθia/ e na pronúncia italiana, /ˈt ʃɛlum/, /viˈdʒinti/, / ʃiˈɛntsia/. Esta

última, também chamada pronúncia romana, é a adotada pela Igreja Católica, por isso tam-

bém conhecida como pronúncia eclesiástica.

Como o escopo deste livro-texto é o ensino-aprendizagem do latim como língua dos

romanos, não aprofundaremos o estudo de pronúncias vernaculizadas.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 56/153

 

54LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Exercício1. A melhor maneira de aprender a fazer algo é fazendo, portanto a pronunciar, pronunciando. Neste

exercício, tudo que você terá de fazer, em princípio, é pronunciar as palavras e os textos a seguir. Vejaque a dificuldade nele cresce em quatro graus: do vocábulo incompleto a um dístico.Não obstante, o professor necessita avaliar o seu desempenho nesse exercício, o que demanda umasegunda tarefa de você, depois de pronunciar essas palavras e textos. Essa segunda tarefa você cum-prirá fazendo a transcrição fonemática dessas palavras. Essa transcrição você pode fazer no próprioeditor de textos usando as extensões IPA do recurso Símbolos (no Microsoft Word o caminho é Inserir  >Símbolo > Subconjunto > Extensões IPA) ou pode fazê-la à mão. Convém lembrar que os subsídios parafazer transcrições fonemáticas foram dados durante a disciplina de Fonética e aqueles para fazê-las depalavras, sentenças e textos latinos estão dados no presente capítulo.Todas as palavras e textos foram retirados de textos usados neste livro-texto, os quais, portanto, vocêencontrará nos próximos capítulos. Ei-los:

I.palavra transcrição palavra transcrição

actĭō ‘ação’  /ˈakti__/  iugŭlus ‘pescoço’  /ˈ__uɡulus/ argentum ‘prata’  /arˈ__entum/ nihil ‘nada’  /ˈni__il/ 

decem ‘dez’  /ˈde__em/ perīculōsus ‘perigoso’   /periːkuˈloː__us/ exĭgit ‘cobra’  /ˈe____iɡit/  quaerit ‘busca’  /ˈkʷ____rit/ foenerātor ‘usureiro’  /f__ __neˈraːtor/  seruus ‘escravo’  /ˈser__us/ 

II.palavra transcrição palavra transcrição

accĭpit ‘aceita’  /_______/ proelĭum ‘luta’  /_________/cēna ‘ceia’  /_____/ prouincĭa ‘província’  /__________/cīuis ‘cidadão’  /______/ quīndĕcim ‘quinze’  /__________/

diffĕrit ‘difere’  /_________/ relĭquī ‘os demais’  /________/Ōceănus ‘oceano’  /________/ ūsus ‘uso’  /_____/

III. Obsequĭum nuptae citō fit odĭum pēlĭcis. ‘O recato da casada torna-se rapidamente o ódio da man-ceba.’ 

IV. Cum tibi uel socĭum uel fidum quaeris amīcum, / non tibi fortūna est homĭnis sed uīta petenda.‘Quando buscares um companheiro ou um amigo fiel  para ti, não leves em conta a fortuna do homem,

mas a vida que deve ser mirada.’  

Resumo da pronúncia do latim

Nas ortografias das línguas românicas, é comum que uma mesma letra  represente

mais de um som. Por exemplo, em todas elas, a letra c tem o valor de um fonema oclusivo

velar surdo, /k/, antes das letras a, o e u: cor  /ˈkoh/ em português, color  /koˈlor/ em espanhol,

couleur  /kuˈlœʁ/ em francês, colore /koˈlore/ em italiano; mas antes das letras e e i  assume

outros valores: cereja  /seˈɾeʒa/, cereza  /θeˈɾeθa/, cerise  /səˈʁiz/, ciliegia  /t ʃiˈljɛdʒːa/. Isto

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 57/153

 

55LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

acontece porque essas línguas são escritas por um alfabeto que não dá conta de toda a vari-

edade dos seus sistemas fônicos.

Em latim, havia apenas dois  casos em que isso ocorria: cada uma das letras  que

representavam os fonemas vocálicos tinha os valores de uma vogal breve e outra longa; alémdisso, as letras i   e u tinham também dois valores consonânticos: /j/ e /w/. Cada uma  das

demais letras latinas assinalava um só fonema:

   p e b, t  e d , c e g, qu e gu, as oclusivas /p/ e /b/, /t/ e /d/, /k/ e /ɡ/, /kʷ/ e /ɡʷ/; 

  m e n, as nasais /m/ e /n/;

   f , s e h, as fricativas /f/, /s/ e /h/;

   x , a africada /ks/;

  r  e l , as líquidas /r/ e /l/.

Além disso, usavam-se as letras y  e z e os dígrafos ph, th, ch e rh para escrever sons

próprios da língua grega em palavras tomadas dessa língua: /y/, /z/, /pʰ/, /tʰ/, /kʰ/ e /r  /. 

Quanto à acentuação, a posição do acento tônico variava segundo a estrutura silábica 

da palavra. Se a palavra era dissílaba, era sempre paroxítona. Se era trissílaba ou polissílaba,

podia ser paroxítona ou proparoxítona. Era paroxítona quando a penúltima sílaba era longa 

(era fechada ou continha uma vogal longa ou um ditongo) e era proparoxítona  quando a

penúltima sílaba era breve (era aberta).

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 58/153

 

56LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

INTRODUÇÃO À DECLINAÇÃO

De agora em diante passaremos a percorrer a gramática latina. Todo o percurso será

fundamentado sobre textos latinos autênticos, isto é, textos produzidos por usuários do latim

quando ele era a língua do povo romano, mas começaremos sempre o estudo de cada parte

do percurso a partir do que já sabemos, ou seja, a nossa língua portuguesa.

Em particular, este capítulo e os seguintes estão dedicados ao mecanismo gramatical

chamado declinação. Ao longo dos tempos, a declinação tem sido encarada como um verda-

deiro bicho-papão que assombra os anseios mais puros de aprender o latim, tornando-os um

pesadelo horrível. O pior é que quem tem pagado o pato é o próprio latim, por ser uma língua

terrivelmente difícil... quando, na verdade, os únicos responsáveis são os mestres que o têm

ensinado, que transformaram o seu ensino-aprendizagem na mera decoração das chamadas

“declinações”. 

O nosso objetivo neste capítulo é enfrentar esse pretenso bicho-papão, constatando

que ele não existe. Deveremos, pois, alcançar o fim do capítulo não sofrendo por decorar “ter-

minações”, mas esforçando-nos por compreender como funciona o mecanismo da declina-

ção nas classes de vocábulos em que estava presente: substantivos, adjetivos e pronomes.

Aquecimento1. O que os romanos costumavam comer? Quantas refeições costumavam fazer? O que costumavamconsumir em cada uma? Pesquise e escreva um texto respondendo a estas perguntas. 

Leia o texto a seguir:

Porquanto já não sou chamado para a ceia por um preço como antes, por quenão é dada a mim a mesma ceia que a ti? Tu tomas ostras engordadas no lagoLucrino, por mim, com a boca cortada, um mexilhão é chupado; tens boletos,

eu tomo cogumelos de porcos; para ti há algo com um rodovalho, mas paramim com uma brema. Enche-te uma rola dourada com ancas desmesuradas,para mim é posta uma pega morta na gaiola. Por que ceio sem ti quando ceiocontigo, Pôntico? Seja proveitoso não haver mais a cestinha: comamos omesmo.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 59/153

 

57LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

O homem e o tempo

Este texto é um epigrama de Marcial. Como dito no capítulo an-

terior, Marco Valério Marcial (40-104) é um autor notável da era ar-

gêntea da literatura latina. Nasceu e morreu em Bílbilis, na Hispânia

Tarraconense, mas foi em Roma onde começou a sua carreira de escri-

tor e onde formou a verve mordaz que ficou atada ao seu nome.

Quanto ao epigrama, é um gênero literário antiquíssimo. De ori-

gem grega, era primitivamente uma inscrição votiva, mas no período

helenístico, se bem manteve a forma concisa, teve o seu conteúdo di-

versificado. Na literatura latina, o epigrama cruzou com a tradição satí-

rica itálica, e foi precisamente o epigrama escarninho que Marcial com-

pôs com perfeição e aquele ao qual conferiu um grande prestígio.

O texto acima é, pois, uma tradução em prosa do sexagésimo epigrama do terceiro

livro de Marcial. Trata do patronato, uma instituição social que existia desde a fundação de

Roma, pela qual dois cidadãos com diferentes cabedais firmavam um laço de confiança ( fidēs),

visando ao recebimento de benefícios mútuos: o mais poderoso era o patrono ( patrōnus) e o

mais fraco, o cliente (cliēns). O texto alude a um velho costume: o patrono devia convidar o

cliente para jantar, o que não tinha somente um valor material, mas também simbólico. Com

o tempo, tomou o lugar desse costume a doação de uma porção de víveres em uma cestinha 

(sportŭla), a qual também acabou sendo trocada pela entrega de uma quantia em dinheiro.Contudo, o imperador Domiciano (81-96) quis restaurar o antigo costume, do que se seguiram

convites para jantares em que se serviam comidas diferentes ao patrono e ao cliente: as me-

lhores àquele e as piores a este. Nesse texto, Marcial, que assumiu o eu do cliente, escarnece

da mesquinharia dos patronos, representados por Pôntico.

Gramática

Que observações gramaticais se podem tecer a partir desse texto? Observe os termossublinhados nas sentenças seguintes, colocadas na ordem não marcada:

1. 

Tu tomas ostras engordadas no lago Lucrino.2.  Uma rola dourada com ancas desmesuradas enche-te.3.  A ceia é dada a ti.4.

 

Por que ceio sem ti quando ceio contigo?

As palavras tu, te, ti , contigo têm o mesmo significado de ‘segunda pessoa do singular’,

mas têm formas diferentes porque desempenham funções sintáticas diferentes: em 1, tu é o

sujeito do verbo tomas; em 2, te é o objeto direto do verbo enche; em 3, (a) ti  é o objeto

Figura 18 - Doação de pão re-tratada em um afresco emPompeia.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 60/153

 

58LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

indireto do verbo é dada; em 4, (sem) ti  e contigo são complementos oblíquos do verbo ceio.

Acrescentemos mais exemplos contidos no texto:

5. 

Eu como cogumelos de porcos.

6. 

A mesma ceia não é dada a mim.

Igualmente, eu e mim têm o mesmo significado de ‘primeira pessoa do singular’, mas

em 5, eu desempenha a função de sujeito do verbo como, e em 6, (a) mim, a de objeto indi-

reto do verbo é dada.

Com efeito, nas gramáticas tradicionais da língua portuguesa diz-se que os pronomes

pessoais apresentam formas retas, como tu, e formas oblíquas, como te, ti  e contigo. As for-

mas retas são empregadas como sujeito do verbo e as oblíquas, como objeto ou adjunto 

tanto do verbo quanto do nome. À sua vez, a variação das formas oblíquas é causada por

condições fonéticas: umas, como te, são átonas, e as outras, como ti  e contigo, são tônicas,usadas estas unicamente em um sintagma preposicional, como a ti .

Tecidas estas observações, e fazendo abstração das formas comigo, contigo, consigo,

conosco, convosco e consigo, que são específicas do sintagma nucleado pela preposição com,

pode-se desenhar o seguinte quadro dos pronomes pessoais em português:

pronomes pessoais em português

núm.

pess. casos

retooblíquo

formas átonas formas tônicas

singular 1ª eu me mim

2ª tu te ti

3ªmasculino feminino

objeto direto objeto indiretomasculino femininomasculino feminino

ele ela o a lhe ele ela

plural

1ª nós nos nós2ª vós vos vós

3ªmasculino feminino

objeto direto objeto indiretomasculino femininomasculino feminino

eles elas os as lhes eles elas

É claro que este quadro resume o sistema pronominal do português de uma perspec-

tiva tradicional, que no momento é a mais útil ao nosso propósito. Sabe-se que no portuguêscontemporâneo as formas você(s) e o(s) senhor(es)/a(s) senhora(s) são tão (ou mais) usadas

como pronome pessoal de segunda pessoa como as formas tu e vós, além de que no português

brasileiro as formas ele(s)/ela(s) não são empregadas como oblíquas apenas em um sintagma

preposicional.

Avancemos. Leia agora o texto original de Marcial:

Cum uocer ad cēnam non iam uēnālis ut ante, cūr mihi non eădem quae tibi cēna dātur? Ostrĕa tū sūmis stagnō saturāta Lucrīnō, sūgĭtur incīsō mitŭlus ōre mihi; sunt tibi bōlētī, fungōs egō sūmō suīllōs; 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 61/153

 

59LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

rēs tibi cum rhombō est, at mihi cum sparŭlō. Aurĕus inmodĭcīs turtur tē clūnĭbus implet, pōnĭtur in cauĕā mortŭa pīca mihi. Cūr sine tē cēnō cum tēcum, Pontĭce, cēnem? Sportŭla quod non est prōsit: edāmus idem. 

E as sentenças correspondentes às que destaquei, igualmente na ordem não marcada:

7. 

Tū saturāta ostrĕa stagnō Lucrīnō sūmis. 8.

 

Aurĕus t urtur inmodĭcīs clūnĭbus tē implet.9.  Cēna tibi dātur. 10.

 

Cūr sine tē cēnō cum tēcum cēnem? 11.

 

Egō suīllōs fungōs sūmō. 12.  Eădem cēna mihi non dātur. 

Observe que os pronomes pessoais  em latim

também tinham formas diferentes de acordo com afunção sintática que desempenhavam na sentença: tū,

tē, tibi ; egō, mihi  etc. Em 1, tū exerce a função de su-

 jeito de sūmis; em 2, tē, a de objeto direto de implet ;

em 3, tibi , a de objeto indireto de dātur ; em 4, tēcum,

a de complemento oblíquo de cēnem; em 5, egō, a de

sujeito de sūmō; em 6, mihi  a de objeto indireto de

dātur .

Na verdade, a distinção de formas dos pronomes pessoais em português (e nas demais

línguas românicas) segundo a função sintática é a continuação de um fenômeno já presente

na gramática latina. A diferença em latim era que se por um lado não se diferençavam formas

tônicas e átonas, por outro lado não se opunham apenas um caso reto e um caso oblíquo,

mas outros mais, seis ao todo, cada um com o seu próprio nome:

pronomes pessoais em latim

número pessoacasos

nominativo acusativo dativo ablativo genitivo vocativo

singular1ª pessoa egō  mē  mihi mē  meī   --2ª pessoa tū  tē  tibi t ē  teī   tū 

plural 1ª pessoa nōs  nōbīs  nostrī   --2ª pessoa uōs  uōbīs  uestrī   uōs 

Perceba que as formas eu e tu em português vêm das formas egō e tū em latim; me e

te, de mē e tē; mim e ti , de mihi  e tibi . Mas você sentiu a falta da terceira pessoa? De pronome

pessoal de terceira pessoa o latim tinha apenas a forma reflexiva: sē ou sese no acusativo e

no ablativo, sibi  no dativo e suī  no genitivo. A falta de outras formas era compensada por

vários elementos fóricos como hic, iste, ille, is, idem, ipse, mas no momento interessa mais

aprofundar o entendimento das funções dos casos latinos. Avancemos:

A ordem não marcada, tambémchamada ordem de base ou ordem

direta, em português é SVO, ou seja,sujeito-verbo-objeto, por exemplo:Um asno Sujeito coça Verbo outro asno Ob-

jeto. Em latim, essa ordem é SOV, ouseja, sujeito-objeto-verbo, por exem-plo:  Asĭnus  Sujeito  asĭnum  Objeto  fricatVerbo. Quanto a essa sentença, é um di-tado latino que se refere pejorativa-mente à relação de duas pessoas quese beneficiam mutuamente. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 62/153

 

60LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

  Caso nominativo: É o caso do sujeito. O sujeito é o argumento externo do verbo,

o qual concorda com tal argumento. É expresso por um sintagma nominal comu-

tável pelo pronome ele ou por uma sentença comutável por isso. O papel temático

do sujeito é, em geral, /agente/. Por exemplo:13.a. Quando um amigo pobre te der um presente, aceita-o com prazer e lembra-te de oenaltecer com firmeza.  13.b. Quando ele te der um presente...

  Caso acusativo: É o caso do objeto direto. O objeto direto é um argumento interno 

do verbo, expresso por um sintagma nominal comutável pelo pronome o ou por

uma sentença comutável por isso. O papel temático do objeto direto é, em geral,

/paciente/. Por exemplo:

14.a. Quando buscares um companheiro ou um amigo fiel , não leves em conta a fortuna

do homem, mas a vida que deve ser mirada.  14.b. Quando os buscares...

  Caso dativo: É o caso do objeto indireto. O objeto indireto é um argumento in-

terno do verbo, expresso por um sintagma preposicional nucleado por a ou para 

ou por uma sentença comutáveis pelo pronome lhe. O papel temático do objeto

direto é, em geral, /beneficiário/. Por exemplo:

15.a. Faze a/para um amigo o que queres para ti.  15.b. Faze-lhe o que...

  Caso ablativo: É o caso do complemento oblíquo. O complemento oblíquo é um

argumento interno do verbo, expresso por um sintagma preposicional cujo com-

plementador é comutável pelos pronomes ele ou isso. Os papéis temáticos do com-plemento oblíquo são, em geral, /fonte/, /instrumento/, /lugar/, /comitativo/.

Por exemplo:

16.a. Então Eneias dirige-se ao rei com/por palavras amigas.  16.b. Então Eneias di-rige-se ao rei com/por elas...

  Caso genitivo: É o caso de certos adjuntos adnominais. São expressos por um sin-

tagma preposicional nucleado por de. O adjunto adnominal não é um argumento

do verbo, mas toma por escopo um substantivo. Por exemplo:

17.a. A inveja dos amigos deve ser mais cuidada que as ciladas dos inimigos.  17.b. Ainveja deles...

  Caso vocativo: É o caso do vocativo, isto é, a interpelação ao interlocutor. Por

exemplo:

18. Quem quer dar aos outros não deve dizer: “Quereis?”. Mas diga com firmeza: “ Doceamigo, toma”. 

Os exemplos 13 e 14 são traduções de dísticos de Catão. Os dísticos de Catão são quase

150 poemas de dois versos e de conteúdo moralizante, compostos provavelmente por um tal

Dionísio Catão no século II d.C., o qual foi confundido com Marco Pórcio Catão (c. 234-149

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 63/153

 

61LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

a.C.), um dos grandes escritores da idade antiga da literatura latina. Foram muito utilizados

durante a Idade Média e ainda durante a Idade Moderna no ensino-aprendizagem do latim,

tradição que honro agora. O exemplo 18 também é uma tradução de um dístico, mas este, de

autoria anônima e de datação medieval.Os exemplos 15 e 17 são traduções de sentenças de Publílio Siro, um escravo de ori-

gem síria, depois liberto, que viveu no século I a.C. No seu tempo, ganhou uma pequena fama

como autor de mimos, que eram peças teatrais populares sobre costumes, mas da sua ativi-

dade literária nos chegou apenas uma coleção de cerca de setecentos aforismos (Sententĭae),

que, como os dísticos de Catão, também têm conteúdo moralizante e foram bastante usados

com fins educativos.

O exemplo 16 é um verso da Eneida, de Virgílio.

Leiamos, pois, as redações originais:

19.  Exigŭum mūnus cum dat tibi pauper amīcus,accipĭtō placĭdē, plēnē laudāre mementō. 

20. 

Cum tibi uel socĭum uel fidum quaeris amīcum,non tibi fortūna est homĭnis sed uīta petenda. 

21. 

 Amīcō ea exhibĕtō quae uelīs tibi. 22.

 

Tum rēgem Aenēās dictīs adfātur amīcīs.23.  Mage cauenda amīcōrum inuidĭa quam īnsidĭae hostĭum. 24.

 

Quī dāre uult alĭīs non dēbet dīcĕre: “Vultis?”. Sed dīcat plēnē: “Dulcis amīce, tene”. 

Observe que a palavra amigo tem apenas duas formas em português: amigo no singu-

lar e amigos no plural. Com efeito, a função de vocativo obedece mormente a elementos

prosódicos: pausa e entoação. Já as funções de sujeito e objeto direto, dependem basica-

mente da posição do termo com relação ao verbo, respectivamente antes e depois dele:

25.  O amigo pobre dá-te um presente pequeno. 26.

 

Tu buscas um amigo fiel. 

As demais funções  – objeto indireto, complemento oblíquo e o adjunto adnominal 

correspondente ao caso genitivo – são determinadas mediante preposições:27.

 

Faze isto a/para um amigo. 28.

 

Dirige-se com/por palavras amigas. 29.  A inveja dos amigos. 

Em latim, a exemplificação apresenta, porém, diversas  formas da mesma palavra:

amīcus, amīcum, amīcō, amīcīs, amīcōrum, amīce. Portanto, a função sintática é estabelecida

pela terminação do vocábulo. Confira como é a construção latina das sentenças de 25 a 29:

30. 

Pauper amīcus exigŭum mūnus tibi dat. 

31. 

Tū fidum amīcum quaeris. 32. 

Ea amīcō exhibĕtō. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 64/153

 

62LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

33. 

Dictīs amīcīs adfātur. 34.  Inuidĭa amicōrum. 

Esse mecanismo da gramática latina chama-se declinação. Ora, como vimos desde o

início deste capítulo, a declinação não é nenhum fenômeno exótico, mas um mecanismo quecontinua presente na gramática do português e de outras línguas românicas: cada vez que

dizemos eu te amo, declinamos o pronome pessoal de primeira pessoa no caso reto e o de

segunda pessoa, no caso oblíquo. A diferença do latim é que a extensão desse mecanismo era

mais ampla.

Perceba, ainda, que a extensão mais ampla da flexão de caso em latim comportava

mais liberdade de colocação para os constituintes da sentença que em português, especial-

mente em verso, onde, por mor da métrica, os vocábulos eram ordenados segundo as quan-

tidades das suas sílabas. O epigrama de Marcial que lemos antes contém alguns exemplos

ilustrativos disso:

35.a. RēsSujeito tibiObjeto indireto cum rhombōAdjunto adnominal do sujeito est Verbo.

36.a. SūgĭturVerbo incīsōAdjunto adnominal do complemento oblíquo mitŭlusSujeito ōreComplemento oblíquo mi-

hiAgente da passiva. 

A sentença 35.a estaria inteiramente na ordem não marcada se o adjunto adnominal

do sujeito estivesse colocado depois dele:

35.b. Rēs cum rhombō tibi est . 

Em contrapartida, na sentença 36.a todos os constituintes estão colocados em umaordem bem marcada. Na não marcada ficaria:

36.b. Mitŭlus mihi incīsō ōre sūgĭtur. 

Com efeito, na colocação original, o sujeito, mitŭlus, foi colocado entre os termos in-

cīsō ōre, que são o complemento oblíquo do verbo sūgĭtur ! Em português, é impossível dizer

*É chupado cortada um mexilhão com a boca por mim, mas em latim a ordem em que Marcial

colocou esses termos nesse verso não acarretava nenhum prejuízo comunicativo, pois a ter-

minação da palavra mitŭlus, no caso nominativo, assinala perfeitamente que ela é o sujeito 

do verbo sūgĭtur , o qual, de resto, concorda com ela; a terminação da palavra incīsō tambémassinala que ela concorda com a palavra ōr e, porque ambas estão no caso ablativo; o pronome

pessoal, mihi , está flexionado no caso dativo, o que assinala que ele é o agente da passiva do

verbo sūgĭtur , que está na voz passiva. Portanto: um mexilhão (mitŭlus) é chupado (sūgĭtur )

 por mim  (mihi ) com a boca cortada  (incīsō ōre). Em suma: os mecanismos da declinação e

também o da concordância são importantíssimos para decodificar o texto latino.

Enfim, convém declarar que as definições dos casos latinos que dei acima são, eviden-

temente, simplificadoras, além de estarem eivadas de termos técnicos. Como acontece em

qualquer língua usada por um povo, a gramática do latim estava sujeita à ação dos falantes,que é contingente, portanto o uso dos casos não se reduzia a um esquema fechado. Mas por

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 65/153

 

63LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

enquanto essas definições meio simplificadoras meio técnicas servem bem ao escopo de co-

meçar a compreender a declinação latina.

Exercício1. Lembra-se do texto de Lívio sobre a lenda de Rômulo e Remo? Você vai usá-lo agora para fazer oseu primeiro exercício de gramática nesta disciplina. Como é sempre bom começar pegando leve, traba-lhemos primeiro com o texto em português. O exercício é simples: identifique todos os sujeitos, obje-tos diretos, objetos indiretos, complementos oblíquos e complementos nominais dos verbos  con-

 jugados nesse texto. Na resposta, você pode pôr apenas o substantivo com o especificador (que ficaantes dele) ou também com o complementador (que fica depois dele), como quiser. No exemplo, o com-plementador está entre colchetes.Se você está enferrujado em análise sintática, eis uma ótima oportunidade para desenferrujar, pois esteconteúdo não só é fundamental para o estudo do latim, mas também é importantíssimo para avançarpelo curso de Letras.

Mas, a meu parecer, deveram-se ao fado a origem de tamanha cidade e o começo do maior poder apóso poderio dos deuses. Tomada à força, a Vestal, como tivera um parto de gêmeos, ou porque crido assimou porque um deus era um autor mais honroso para a falta, declara Marte o pai da incerta cepa. Masnem os deuses nem os homens poupam da crueldade real ou a ela ou a cepa: a sacerdotisa é dadaamarrada à prisão; manda que os meninos sejam arremessados em água corrente. De certa maneirapor um acaso vindo dos deuses, o Tibre, derramado sobre as margens em remansos suaves, de algummodo não podia achegar-se ao curso da corrente certa e dava a esperança aos que levavam as criançasde elas poderem afogar-se na água mesmo que esmorecida. Assim, como se estivessem quites com omandado do rei, abandonam os meninos no alagamento mais próximo, onde está agora a figueira Ru-

minal – contam que chamada Romular –. Havia então vastas solidões nesses lugares. O rumor sustentaque, como a água rasa deixara no seco a cuba boiante em que os meninos tinham sido abandonados,uma loba sedenta tomou o rumo dos montes que havia ao redor para o berro meninil; ofereceu as tetasabaixadas às crianças tão dócil que um maioral do rebanho real – contam ter tido o nome de Fáustulo– a terá achado lambendo com a língua os meninos, dados por ele à sua esposa Larência para seremeducados junto às estrebarias. Há quem considere que Larência, de corpo devassado, era chamada lobaentre os pastores, donde o que deu lugar à lenda e ao milagre. Assim gerados e assim educados, tãologo aumentou a idade, ao invés de estarem vadios ou nas estrebarias ou junto aos rebanhos, percor-rem os bosques caçando. Ganho com isto vigor para os corpos e para as almas, já não afrontam apenasferas, mas fazem assaltos a ladrões carregados de presa e dividem os roubos com os pastores, e cres-cendo de dia em dia a grei de jovens, celebram com eles jogos e coisas sérias.

Exemplo de resposta:Sujeitos: a origem [de tamanha cidade] e o começo [do maior poder após o poderio dos deuses] deve-ram-se; a Vestal  tivera/declara; um deus era; ... Objetos diretos: tivera um parto [de gêmeos]; declara Marte o pai [da incerta cepa]; poupam a ela oua cepa; ... Objetos indiretos: deveu-se ao fado; é dada à prisão; ...Complementos oblíquos: Há apenas um e não direi qual é! Complementos nominais: a origem de [tamanha]  cidade; o começo do [maior]  poder ; ... 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 66/153

 

64LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

O TEMA NOMINAL

AquecimentoA cada geração, o conhecimento do homem, e, por conseguinte, o seu domínio sobre a natureza, têm-se aprofundado mais. Especialmente nos nossos dias, as inovações tecnológicas são desenvolvidasconstantemente. Mas esse conhecimento tem servido igualmente a todos os seres humanos? Tem ser-vido para aperfeiçoar a relação do homem com a natureza? Redija uma breve reflexão respondendo aessas duas perguntas.

Leia o texto a seguir:

Verdadeiramente, a madeira aporta grandes usos para fazer navios, por cujasviagens são fornecidos de toda a parte todos os recursos para a vida. Cadauma das coisas mais bravias que a natureza gerou, só nós temos o comedi-mento delas, do mar e dos ventos, graças ao conhecimento das coisas da na-vegação, e desfrutamos e usamos das mais numerosas coisas do mar. Domesmo jeito, está no homem todo o senhorio dos proveitos dos terrenos: nósdesfrutamos dos campos, nós dos montes, nossas são as torrentes, nossos oslagos, nós plantamos os grãos, nós as árvores; nós damos fecundidade às ter-ras pelas canalizações das águas, nós retemos, direcionamos e desviamos osrios; enfim, com as nossas mãos tentamos perfazer quase outra natureza nanatureza das coisas.

O homem e o tempo

Este texto é uma tradução de um trecho (o de número 152)

do segundo livro ‘Sobre a natureza dos deuses’ (Dē nātūrā deōrum),

de Cícero. Já sabemos que Marco Túlio Cícero, que nasceu em Ar-

pino, no Lácio, em 106 a.C., foi um grande estadista romano – cônsul

em 63 a.C., tendo sido assassinado em 43 a.C., precisamente pela

sua atuação política contra o triúnviro Marco Antônio  – e também o

maior escritor em língua latina, ao menos em prosa.

O livro Dē nātūrā deōrum foi escrito em 45 a.C. e é um dos

seus três tratados de cunho teológico, junto com o Dē dīuīnātiōne 

(‘Sobre a adivinhação’) e o Dē  fātō (‘Sobre o destino’). Convém ob-

servar que estas e as obras filosóficas de Cícero foram compostas em momentos em que ele

teve de se afastar da vida pública, de modo que o seu conjunto perfaz um projeto pessoal de

verter a filosofia grega para o latim como uma forma de serviço ao Estado, por meio do qual

os seus concidadãos ficariam mais esclarecidos.

Figura 19 - Busto de Cícero. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 67/153

 

65LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Ao contrário do que sugere o título, no Dē nātūrā deōrum Cícero não diz qual seja a

natureza dos deuses. O escopo da obra é mais problematizar a questão que responder a ela.

Com efeito, a matéria é discutida na forma de um diálogo ao qual Cícero teria assistido quando

 jovem. Diferentes personagens desenvolvem longos monólogos sobre o assunto, cada uma daperspectiva de certa escola filosófica: Gaio Veleio, do ponto de vista epicurista na primeira

metade do primeiro livro; critica-o Gaio Aurélio Cota do ponto de vista acadêmico na segunda

metade do mesmo livro; Quinto Lucílio Balbo, do ponto de vista estoico no segundo livro; no

terceiro, volta Cota para criticar agora a este. Dessa disposição das intervenções depreende-

se que a posição do autor coincide com a de Cota. O trecho citado faz, pois, parte do monólogo

de Balbo, em uma passagem em que louva o homem enquanto criação dos deuses.

GramáticaCompreendido o texto, em que pode servir para seguir o estudo da declinação latina?

Comecemos por retirar dele todos os substantivos na forma não marcada, ou seja, no singu-

lar, categorizando-os segundo o fonema final da palavra:

 Acabam em /a/ Acabam em /o/ Acabam em /e/ ou consoante Água, coisa, ma-deira, natureza,

terra, vida.

Campo, comedimento, conhecimento,lago, mão (pl. -ãos) , navio, proveito, re-curso, rio, senhorio, terreno, uso, vento.

 Árvore, canalização (pl. -ões) , fecundi-dade, homem, mar, monte, navegação

(pl. -ões) , parte, torrente, viagem.

Observe que em português os substantivos que acabam em /a/ são tendentementefemininos, os que acabam em /o/ são tendentemente masculinos e os que acabam em /e/ ou

consoante são masculinos ou femininos sem predominar um gênero sobre o outro.

Quanto aos artigos, adjetivos e pronomes, que ocupam os lugares de especificadores 

(antes do substantivo) e complementadores (depois dele) no sintagma nominal, concordam 

em gênero e número com o substantivo: a madeira, grandes usos, cujas viagens, todas as

 partes, as coisas mais bravias etc.

Leiamos agora o texto original:

[Māterĭa] magnōs uērō ūsūs adfert ad nāuigĭa facienda, quōrum cursĭbussubpeditantur omnēs undique ad uītam cōpĭae. Quāsque rēs uiolentissĭmās

nātūra genŭit, eārum moderātiōnem nōs sōlī habēmus, maris atque ue-

ntōrum, propter nauticārum rērum scientĭam, plūrimīsque maritĭmīs rēbus

fruĭmur atque ūtĭmur. Terrēnōrum item commodōrum omnis est in homĭne

dominātus: nōs campīs, nōs mōntĭbus fruĭmur, nostrī sunt amnēs, nostrī

lacūs, nōs frūgēs serĭmus, nōs arbŏrēs; nōs aquārum inductiōnĭbus terrīs

fēcunditātem dāmus, nōs flūmĭna arcēmus, dērigĭmus, āuertĭmus; nostrīs

dēnique manĭbus in rērum nātūrā quasi altĕram nātūram efficĕre cōnāmur. 

Passemos algumas orações à ordem não marcada:

1. 

Māterĭa magnōs ūsūs ad nāuigĭa facienda uērō adfert. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 68/153

 

66LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

2. 

Omnēs cōpĭae ad uītam cursĭbus nāuigiōrum undique subpeditantur. 3.  Plūrĭmīs maritĭmīs rēbus fruĭmur atque ūtĭmur. 4.

 

Omnis dominātus commodōrum terrēnōrum in homĭne est.  5.

 

Amnēs atque lacūs nostrī sunt. 

6. 

Nōs fēcunditātem terrīs inductiōnĭbus aquārum dāmus. 

Em português:

7. 

A madeira aporta verdadeiramente grandes usos para fazer navios. 8.  Todos os recursos para a vida são fornecidos de toda a parte pelas via-

gens dos navios. 9.

 

Desfrutamos e usamos das mais numerosas coisas do mar. 10.

 

Todo o senhorio dos proveitos dos terrenos está no homem. 11. As torrentes e os lagos são nossos. 12.

 

Nós damos fecundidade às terras pelas canalizações das águas. 

Observe que em 1 as palavras magnōs ūsūs estão no caso acusativo (são o objeto di-

reto do verbo adfert ), mas têm terminações ligeiramente diferentes; ligeiramente diferentes 

também são, em 4, as terminações das palavras omnis dominātus, que estão no nominativo 

(são o sujeito do verbo est ), e commodōrum terrēnōrum em 4 e aquārum em 6, que estão no

genitivo (são respectivamente complementos nominais de dominātus, commodōrum e induc-

tiōnĭbus).

Já em 2, as palavras omnēs cōpĭae estão no nominativo (são o sujeito do verbo subpe-

ditantur ), mas não têm terminações ligeiramente diferentes, mas inteiramente diferentes; o

mesmo acontece em 3, em que as palavras plūrĭmīs maritĭmīs rebus estão no ablativo (são ocomplemento oblíquo  dos verbos  fruĭmur   e ūtĭmur ): as duas primeiras compartilham a

mesma terminação, mas a terceira tem outra bem diferente. Também em 5, em que as pala-

vras amnēs, lacūs e nostrī  estão no nominativo (as duas primeiras são o sujeito de sunt  e a

terceira, predicativo do sujeito).

Essa bagunça morfológica é aparente. Há ao menos duas maneiras de a ordenar. Uma

é a da gramática tradicional ocidental, transmitida pelos próprios gramáticos latinos, que a

tomaram dos gramáticos gregos. A outra é a da linguística moderna.

A primeira parte deste princípio: se a palavra aqua ‘água’ apresenta a declinação se-guinte:

declinação da palavra aqua 

casonúmero

singular pluralnominativo aqua aquaeacusativo aquam aquās 

dativo aquae aquīs ablativo aquā  aquīs genitivo aquae aquārum vocativo aqua aquae

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 69/153

 

67LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Então a palavra terra ‘terra’, que tem a mesma terminação de aqua, deve ser declinada

do mesmo modo: terra, terram, terrae... Igualmente, se a palavra campus ‘campo’ apresenta

a declinação seguinte:

declinação da palavra campus 

casonúmero

singular pluralnominativo campus campī  acusativo campum campōs

dativo campo campīs ablativo campo campīs genitivo campī   campōrum vocativo campe campī  

Então a palavra dominātus ‘senhorio’, que tem a mesma terminação de campus, deve

ser declinada do mesmo modo: dominātus, dominātum, dominātō...

Por essa maneira de ordenar a morfologia (pro)nominal latina, chega-se a distinguir

cinco paradigmas  de declinação, chamados, precisamente,  primeira, segunda, terceira,

quarta e quinta declinação, as quais você pode contemplar a seguir, exemplificadas pelas pa-

lavras uīta ‘vida’, amīcus ‘amigo’, hostis ‘inimigo’, lacus ‘lago’ e rēs ‘coisa’:

as cinco declinações

casosdeclinações

1ª 2ª 3ª 4ª 5ªsing. pl. sing. pl. sing. pl. sing. pl. sing. pl.

nom. uīt a  uīt ae  amīcus  amīcī   host is  host ēs  lacus  lacūs  r ēs  r ē s 

ac.uīt am  uīt ās  amīcum  amīcōs  host em  host ēs  lacum  lacūs  r em  r ēs 

dat. uīt ae  uīt īs  amīcō  amīcīs  host ī   host ĭ bus  lacŭī   lacĭ bus  r eī   r ēbus abl. uīt ā  uīt īs  amīcō  amīcīs  host e  host ĭ bus  lacū  lacĭ bus  r ē  r ēbus gen. uīt ae  uīt ārum  amīcī   amīcōrum  host is  host ĭ um  lacūs  lacŭum  r eī   r ērum voc. uīt a  uīt ae  amīce  amīcī   host is  host ēs  lacus  lacūs  r ēs  r ēs 

Perceba que algumas terminações negritadas se repetem. De fato, uma só não se re-

pete nunca: a do genitivo singular. Efetivamente, se você for buscar essas cinco palavras em

um dicionário latino, vai encontrá-las assim:

13. uīta, ae 14.

 

amīcus, ī 

15. 

hostis, is 16.  lacus, ūs 17.

 

rēs, eī 

As letras após a vírgula são a terminação do genitivo singular, que assinala a declinação

à qual a palavra pertence: ae à primeira, ī  à segunda, is à terceira, ūs à quarta e ēī  à quinta.

Agora você pode entender melhor por que a declinação era, como ainda é em muitos

casos, o pesadelo dos aprendizes de latim: as terminações sublinhadas – sessenta ao todo – 

deviam ser decoradas! Aprendendo uma declinação por vez, quando alcançavam a quinta,

não lembravam mais a primeira. Contudo, por mais que a tradição mereça ser compreendida,

o sofrimento de aprender o latim dessa maneira pode ser poupado.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 70/153

 

68LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

O problema é que os gramáticos antigos  não souberam decompor  o vocábulo em

constituintes mínimos, o que foi desenvolvido pelos linguistas modernos. Olhemos mais de-

tidamente essas mesmas cinco palavras no caso acusativo, tanto no singular como no plural:

18.a. uītam 18.b uītās 19.a. amīcum 19.b. amīcōs 20.a. hostem 20.b. host ēs 21.a. lacum 21.b. lacūs 22.a. rem 22.b. rēs 

Desse conjunto depreende-se que não há por que aprender que o acusativo acabavaem -am e -ās na primeira declinação, -um e -ōs na segunda, -em e -ēs na terceira, -um e -ūs 

na quarta e -em e -ēs na quinta, porque as desinências  – que é o termo técnico correspon-

dente à palavra terminação  – do acusativo eram as mesmíssimas em todas as “declinações”:

-m no singular e -s no plural. Neste caso, a vogal não fazia, pois, parte da desinência do caso,

mas era um mero apoio que a ligava à raiz da palavra, dado que sequências de fonemas como

*uītm, *amīcm ou *hostm eram impossíveis na fonologia latina. Mesmo quando as termina-

ções são bem diferentes, quando se desconsidera essa vogal, a variação se reduz:

23. 

uītae 24. 

amīcī 25.

 

hostis 26.  lacūs 27.

 

reī 

Como eu disse, a terminação do genitivo singular é tomada na tradição como aquela

que distingue cada declinação, mas reparando bem, a desinência do genitivo singular  tem

apenas duas variações: - ī  em 13 (escrito -e; lembre-se de que ae é um ditongo que se pronun-

cia /ai/), 14 e 17; -s em 15 e 16. Em outras palavras, a gramática tradicional está equivocada 

quando entende que a desinência do genitivo singular é -ae na primeira declinação, - ī  na se-gunda, -is na terceira, -ūs na quarta e -ēī  na quinta; ela é, na verdade, - ī  e -s. Consequente-

mente, as próprias construções teóricas denominadas declinações desmoronam: não há nem

primeira, nem segunda, nem terceira, nem quarta, nem quinta declinação, mas sim um único 

mecanismo gramatical chamado declinação, que consiste em uma flexão conjunta de caso e

número, sendo o caso a função sintática que o vocábulo desempenha na sentença.

Todavia, embora a vogal entre a raiz e a desinência número-casual não tivesse nenhum

valor gramatical, ela é útil, pois como o demonstra o genitivo singular, as desinências podiam

apresentar variações – alomorfes, usando o devido termo técnico –, as quais eram seleciona-

das por essa vogal. Ao conjunto da raiz com tal vogal dá-se o nome de tema, e à vogal, vogal

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 71/153

 

69LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

temática. Em latim, havia cinco vogais temáticas nominais, que coincidem precisamente com

as declinações tradicionais. Isso quer dizer que os gramáticos antigos perceberam o meca-

nismo do tema, mas não souberam explicá-lo. As cinco vogais temáticas são as seguintes:

 

Temas em -a-, como uīta-;  Temas em -o-, como amīco-;

  Temas em -i-, como hosti-;

  Temas em -u-, como lacu-;

 

Temas em -e-, como re-.

Também havia palavras atemáticas, isto é, não apresentavam vogal temática, como

arbor- ‘árvore’, mas não formavam uma classe à parte, mas uma subclasse das palavras com

tema em -i-.

No fim das contas, ainda que seja um construto abstrato, já que o vocábulo sempre serealiza declinado, o tema é um princípio mais simples e eficaz de declinar um nome ou pro-

nome em latim do que um corte do genitivo singular que não corresponde efetivamente a

nenhum constituinte funcional da língua.

A propósito, lembra-se de que as palavras em português acabam normalmente em /a/,

/o/ e /e/ ou consoante? Pois é, isso é uma continuação dos temas latinos: na mudança do

latim para as línguas românicas, os temas em -u- confundiram-se com aqueles em -o- (lago 

tem a mesma terminação de amigo), e os temas em -e-, com aqueles em -a- (dia, de die-, tem

a mesma terminação de vida), de modo que os cinco temas originais se reduziram a três. Até

as tradicionais “declinações” continuam, de algum modo, presentes em português! 

ExercícioContinuaremos a trabalhar com o texto de Lívio, mas agora em latim. O exercício consiste em identificartodos os temas nominais possíveis. Como? Procurando as terminações constantes do quadro dascinco declinações. Por exemplo, deōrum (negritado no texto abaixo) apresenta a terminação -ōrum,do caso genitivo plural da segunda  declinação, portanto o seu tema é deo-, já que as palavras dasegunda declinação têm tema em -o-. Pode desconsiderar  aquelas palavras cuja terminação não per-

mite determinar  o tema. Por exemplo, fātīs apresenta a terminação -īs, do dativo e do ablativo noplural tanto da primeira como da segunda declinações, de modo que essa terminação não permiteidentificar  o tema dessa palavra, se é fāta- ou fāto-. Também não se preocupe com diferençar as pala-vras com tema em -i- e com tema em consoante, mas ponha-as na mesma categoria (veja o exemplo).Concentre-se, pois, nas palavras cuja terminação não deixa dúvida sobre o tema, por ser exclusiva de palavras com aquele tema, como é o caso de deōrum, que não pode ter outro tema senão deo-,porque a terminação -ōrum é exclusiva das palavras com tema em -o-.Perceba que para executar adequadamente este exercício você precisa saber distinguir os substanti-vos das palavras das demais classes, em português mesmo, através da tradução sobrescrita em azul.

Sedmas  dēbēbāturdevia-se, ut segundo  opīnōropino, fātīsao fado  tantaede tamanha  orīgōa origem  ūrbisde cidade  ma-

ximīquee de maior

 secundumapós

 deōrumdos deuses

 opēso poderio

 imperĭīdo poder

 principĭumo começo

. Vīà força

 com-pressatomada Vestālisa Vestal cumcomo gemĭnumgêmeo partumum parto ēdidisset tivesse tido, seuou itaassim ratacrida

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 72/153

 

70LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

[a coisa] seuou quiaporque deusum deus auctorum autor culpaepara a falta honestĭormais honesto erat era, MartemMarte in-certaede incerta stirpisda cepa patrempai nuncŭpat declara. Sedmas necnem dīos deuses necnem homĭnēsos homens aut ou ipsama ela mesma aut ou stirpema cepa āde crūdēlitātea crueldade rēgĭāreal uindĭcant poupam: sacerdōsa sacerdotisa uin-ctaamarrada ina custōdĭama prisão dāturé dada, puĕrōsos meninos inem prōfluentemcorrente aquamágua mittīserem ar-

remessados iubet manda. Fortepor um acaso quādamde certa maneira dīuīnĭtusvindo dos deuses supersobre rīpāsas margens Ti-bĕriso Tibre  effūsusderramado  lēnĭbusem suaves  stagnīsem remansos  necnão  adīrīachegar-se  usquamde algum modo  ada iūstīde certa cursumcurso potĕrat podia amnisda corrente et e possepoderem quamuīsmesmo languĭdāesmorecida mergīa-

fogar-se  aquāna água  infantēsas crianças  spema esperança  ferentĭbusaos que levavam  dābat dava. Itaassim  uelut como dēfūnctīquites rēgisdo rei imperĭōcom o mandado inem proxĭmāmais próximo alluuĭeo alagamento ubīonde nuncagora fīcusa

figueira RūminālisRuminal est está – RōmulāremRomular uocātamchamada ferunt contam – puĕrōsos meninos expōnun-t abandonam. Vastaevastas tumentão inem hīsestes locīslugares sōlitūdĭnēssolidões erant havia. Tenet sustenta fāmao rumor cumcomo fluitantemboiante aluĕuma cuba, quōem que exposĭtīabandonados erant tinham sido puĕrīos meninos, tenŭisrasa inem siccōo seco aquaa água dēstituisset tivesse deixado, lupamuma loba sitientemsedenta exde mōntĭbusos montes quīque circāao redor sunt havia adpara puerīlemmeninil uāgītumo berro cursumo rumo flexissetomou; eamela submissāsabaixa-

das  infantĭbusàs crianças adĕōtão mītemdócil  praebuisseofereceu mammāsas tetas ut que  linguācom a língua  lamben-temlambendo puĕrōsos meninos magisterum maioral rēgĭīde real pecŏrisdo rebanho inuēnĕrit terá achado – Faustŭlōde Fáus-

tulo  fuisseter tido nōmeno nome  ferunt contam –  abpor  eōele  adjunto a stabŭlaas estrebarias Lārentĭaeà Larência  uxōrīà

esposa  ēdūcandōspara serem educados  dātōsdados. Sunt há  quīquem  LārentĭamLarência  uolgātōde devassado  corpŏrede

corpo lupamloba interentre pastōrēsos pastores uocātamchamada putent considere; indedonde locumo lugar fābŭlaeà lenda ace  mīrācŭlōao milagre  dātumo que deu. Itaassim  genĭtīgerados  itaquee assim  ēdūcātīeducados, cum prīmumtão logo adolēuit aumentou  aetāsa idade, necnem  inem  stabŭlīsas estrebarias  necnem  adjunto a  pecŏrao rebanho  sēgnēsvadios uēnandōcaçando peragrārepercorrem saltūsos bosques. Hincdaqui rōbŏrevigor corporĭbuspara os corpos animīsquee para

as almas sūmptōganho iamjá nonnão ferāsferas tantumapenas subsistereafrontam sedmas ina latrōnēsladrões praedāde

presa onustōscarregados impĕtūsassaltos facĕrefazem pastōribusquee com os pastores raptaos roubos dīuidĕredividem et e cumcom hīsestes crēscentecrescendo in diēsde dia em dia gregea grei iuuĕnumdos jovens sērĭa[coisas] sérias ace iocōsjogos celebrārecelebram.

Exemplo de resposta:

Temas em -a- : culpa- (culpae), custōdĭa- (custōdĭ am), ...Temas em -o- : deo- (deōrum, deus, d ī ), imperĭo- (imperĭ ī , imperĭ ō), ...Temas em -i-  ou consoante: urb- (urbis), Vestāli - (Vestāl is), ...Temas em -u- : saltu- (salt ūs), ...Temas em -e- : não há nenhum que seja possível identificar indubitavelmente. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 73/153

 

71LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

A DESINÊNCIA NÚMERO-CASUAL

Leia os textos a seguir:

1.  O que um deus entenda, não queiras esquadrinhar por sortilégio; o queestabelece para ti, ele decide sem ti.

2. 

Faze com que vejas que a morte não deve ser temida por ti, porque senão é boa, ela é, todavia, o fim de todos os males.

3. 

Tirarás muitos proveitos, mas se, ao contrário, tiveres desdenhado isso,não terás descuidado de mim, o professor, mas de ti mesmo.

Estes textos são traduções de outros dísticos de Catão, respectivamente o 12º do se-

gundo livro, o 22º do terceiro livro e o que está no prefácio desse mesmo livro.

Se eu lhe perguntar qual substantivo na língua portuguesa não é nem masculino nem

feminino, você poderá responder que nenhum, pois em português todos os substantivos são

ou masculinos ou femininos. Em alguns substantivos, o gênero equivale ao sexo do ser vivo

ao qual se refere, como em  filho e  filha, mas na maioria dos substantivos, o gênero é tão

arbitrário quanto o próprio signo, afinal o livro ou a morte não têm nada que demande os

gêneros masculino e feminino.

Semelhantemente, você dirá que o pronome ele, grifado no texto 1, tem gênero mas-

culino e que o pronome ela, grifado no texto 2, tem gênero feminino. Mas qual é o gênero do

pronome isso, grifado no texto 3? Em latim, o pronome uter  quer dizer ‘um dos dois’; a sua

forma negativa era neuter , ou seja, ‘nenhum dos dois’. O gênero do pronome isso não é ne-

nhum dos dois (masculino e feminino), mas sim neutro. E isso não é o único pronome neutro

em português: juntam-se a ele os demais chamados demonstrativos isto e aquilo e também o 

em sentenças como:

4. 

O que pôde ser dado pode ser tirado. 

Que é uma sentença de Publílio Siro. Leia agora os quatro textos originais:

5. 

Quid deus intendat, nōlī perquīrĕre sorte; quid statŭat dē tē, sine tē dēlībĕrat ille.6.

 

Fac tibi prōpōnās mortem non esse timendam, quae bona sī non est, fīnis tamen illa malōrum est.

7. 

Commŏda multa ferēs, sīn autem sprēuĕris illud,non mē doctōrem sed tē neglēxĕris ipse. 

8.  Auferrī et illud quod dārī potŭit potest. 

Você se lembra de que em latim não há pronomes pessoais de terceira pessoa? Os

pronomes ille, illa e illud  não são pessoais, mas fóricos (demonstrativos, na terminologia tra-

dicional), equivalentes a aquele, aquela e aquilo em português, mas justamente por não haver

pronomes pessoais de terceira pessoa é que algo tinha de ser usado no lugar deles: nesses

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 74/153

 

72LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

textos usaram-se esses fóricos, em outros textos aparecem outros. Seja como for, os prono-

mes pessoais ele e ela em português vêm justamente desses fóricos latinos, ille e illa. Em es-

panhol, a reminiscência do gênero neutro é ainda mais clara, pois nessa língua se mantiveram

as três continuações de ille, illa e illud : él , ella e ello; além de que o artigo masculino el  édiferente do neutro lo. Leiamos as traduções desses quatro textos para o espanhol:

1.  Lo que un dios entienda, no quieras escudriñar por sortilegio; lo que es-tablece para ti, él lo decide sin ti. 

2. 

Haz que veas que la muerte no debe ser temida por ti, porque si no esbuena, ella es, empero, el fin de todos los males.

3. 

Sacarás muchos provechos, pero si, en cambio, hayas desdeñado ello, nohabrás descuidado a mí, el profesor, sino a ti mismo.  

4.  Lo que pudo ser dado puede ser quitado. 

Como acontece à declinação, a extensão do gênero neutro era bem maior em latim doque nas línguas românicas. Com efeito, os nomes (substantivos e adjetivos) e os pronomes 

(salvo os pessoais) podiam ter gênero neutro. Mas o que isso tem a ver com a declinação, que

é o assunto que nos ocupa? É que a declinação dos nomes e pronomes neutros apresenta

particularidades, às quais cumpre atentar.

No capítulo anterior, expus um quadro com as sessenta terminações que o estudante

de latim tem de decorar pelo método tradicional. A seguir, procurarei enxugá-lo podando o

que não for necessário. A exemplificação será feita com as palavras aqua  ‘água’, domĭnus 

‘dono, senhor’, hostis ‘inimigo’, dūx  ‘general’, manus ‘mão’ e diēs ‘dia’. As particularidades da

declinação das palavras de gênero neutro serão exemplificadas pelas palavras bellum ‘guerra’,

mare ‘mar’, uēr  ‘primavera’ e cornū ‘chifre’. As especificidades da declinação de algumas pa-

lavras com tema em consoante serão exemplificadas pelas palavras consul   ‘cônsul’ e soror  

‘irmã’. Os exemplos serão decompostos em raiz-vogal temática-desinência número-casual ,

separados por um hífen. Quando for usado o sinal >, é porque houve mudanças fonéticas do

latim pré-literário (termo antes do sinal) para o latim literário (termo depois do sinal).

  Caso nominativo 

o  Singular: A desinência mais estendida era -s. Havia duas variações:

 

A desinência era -m nos substantivos neutros com tema em -o-;  a desinência era zero (ou seja, nada) nos substantivos com tema em

-a-, nos substantivos neutros com tema em -i-, em consoante e em

-u- e em alguns substantivos masculinos e femininos com tema em

consoante. Exemplos:

  -s: *domĭn-ŏ-s > domĭn-ŭ-s; host- ĭ -s; dūc-s (escrito dūx ); man-ŭ-s; di-

ē-s.

  -m: *bell-ŏ-m > bell-ŭ-m.

  Zero: aqu-ă; *mar- ĭ  > mar-ĕ; consul , soror , uēr ; corn-ū.

Plural: A desinência mais estendida era -s, a qual alongava a vogal temática.Havia duas variações:

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 75/153

 

73LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

  A desinência era - ī  nos substantivos com tema em -a- (nos quais se

escrevia -e, por formar o ditongo -ae, pronunciado /ai/) e nos subs-

tantivos masculinos com tema em -o-;

 

a desinência era -a nos substantivos neutros. Exemplos:  -s: *host- ī -s > host-ē-s; dūc-ē-s; man-ū-s; di-ē-s.

  - ī : *aqu-ă- ī  > aqu-a-e; *domĭn-ŏ- ī  > domĭn- ī .

  -a: *bell-ŏ-a > bell-a; mar- ĭ -a; uēr -a; corn-ŭ-a.

  Caso acusativo

o  Singular: A desinência era -m. Exemplos:  aqu-ă-m; *domĭn-ŏ-m > domĭn-ŭ-m; *host- ĭ -m > host-ĕ-m; dūc-ĕ-m; man-ŭ-

m; di-ĕ-m.

o  Plural: A desinência era -s, a qual alonga a vogal temática. Exemplos:  aqu-ā-s; domĭn-ō-s; *host- ī -s > host-ē-s; dūc-ē-s; man-ū-s; di-ē-s.

Tanto no singular como no plural, havia uma variação: era igual ao nomina-tivo nos substantivos neutros. Exemplos:

  Singular: bellum; mare; uēr ; cornū.

  Plural: bell a; marĭ a; uēr a; cornŭa.

  Caso dativo 

o  Singular: A desinência era - ī  (que se escrevia -e nos substantivos com tema

em -a-, por formar o ditongo -ae, pronunciado /ai/). Havia uma variação: a

desinência era o alongamento da vogal temática  nos substantivos com

tema em -o-. Exemplos:

 

 ī : *aqu-ă- ī  > aqu-a-e; *host- ĭ - ī  > host- ī ; dūc- ī ; man-ŭ- ī ; di-ē- ī .  Alongamento da vogal temática: domĭn-ō.

o  Plural: A desinência mais estendida era -bus. Havia uma variação: a desi-

nência era - īs nos substantivos com tema em -a- e em -o-. Exemplos:  -bus: host- ĭ -bus; dūc- ĭ -bus; man-ŭ-bus > man- ĭ -bus; di-ē-bus.

  - īs: *aqu-ă- īs > aqu- īs; *domĭn-ŏ- īs > domĭn- īs.

  Caso ablativo 

o  Singular: A desinência era o alongamento da vogal temática. Havia uma va-

riação: a desinência era -e nos substantivos com tema em consoante e nos

substantivos masculinos e femininos com tema em -i-. Exemplos:  Alongamento da vogal temática: aqu-ā; domĭn-ō; man-ū; di-ē.

  -e: *host- ĭ -e > host-e; dūc-e.

o  Plural: Igual ao dativo plural. Exemplos:  hostĭ bus; ducĭ bus; manĭ bus; diēbus; aqu īs; domĭn īs.

  Caso genitivo 

o  Singular: A desinência mais estendida era - ī  (que se escrevia -e nos subs-

tantivos com tema em -a-, por formar o ditongo -ae, pronunciado /ai/). Ha-

via uma variação: a desinência era -s nos substantivos com tema em -i-, em

consoante e em -u-.  - ī : *aqu-ă- ī  > aqu-a-e; *domĭn-ŏ- ī  > domĭn- ī ; di-ē- ī .

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 76/153

 

74LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

  -s: host- ĭ -s; dūc- ĭ -s; man-ū-s.

o  Plural: A desinência mais estendida era -rum, a qual alongava a vogal temá-

tica. Havia uma variação: a desinência era -um nos substantivos com tema

em -i-, em consoante e em -u-.  -rum: aqu-ā-rum; domin-ō-rum; di-ē-rum.

  -um: host- ĭ -um; dūc-um; man-ŭ-um.

  Caso vocativo: Diferia do nominativo tão somente nos substantivos masculinos e

femininos com tema em -o-, nos quais era marcado por uma alternância da vogal

temática de -o- para -e- se a raiz acabava em consoante ou por um zero se a raiz

acabava em /i/: domĭn-e, fīli  (raiz fīlĭ -, tema fīlĭo- ‘filho’).

Esta exposição pode ser resumida nos quadros sinóticos a seguir:

desinências número-casuais no singular

caso temasgênero -o- -a- -e- -u- -i- consoante

nominativomasc./fem. -s

∅ -s -s  ∅ 

neutro -m ∅ acusativo

masc./fem. -mdativo -ī  

ablativo alongamento da vogal temática -egenitivo -ī   -svocativo -e ∅  igual ao nominativo

desinências número-casuais no pluralcaso temasgênero -o- -a- -e- -u- -i- consoante

nominativomasc./fem. -ī   -s

neutro -a -a

acusativomasc./fem. -s

dativo-īs  -bus

ablativogenitivo -rum -umvocativo igual ao nominativo

Assim, o quadro de sessenta terminações reduz-se a cerca de vinte desinências nú-

mero-casuais, incluídas as suas variações. É uma boa poda, não é?

ExercícioVoltaremos ao texto de Cícero com um exercício semelhante ao do capítulo anterior, mas fazer este serámais fácil, tanto pela experiência do outro como porque a sua compreensão da declinação deve ter avan-çado. Identifique, pois, todos os substantivos do texto e diga em que caso e número está cadaum, mas desta vez não use o quadro da cinco declinações do capítulo anterior, mas sim a sistematiza-

ção que levamos a cabo ao longo deste capítulo. Não deixe de observar o verbo quando o caso suscitar

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 77/153

 

75LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

dúvida: rēbus está no dativo ou no ablativo? Os verbos fruĭmur  e ūtĭmur  respondem: não se trata deum objeto direto, mas de um complemento oblíquo, logo rēbus está no ablativo.

[Māterĭa]a madeira  magnōsgrandes  uērōverdadeiramente  ūsūsusos  adfert aporta  adpara  nāuigĭanavios  faciendafazer,

quōrumdas quais

 cursĭbuspor viagens

 subpeditantursão fornecidos

 omnēstodos

 undiquede toda a parte

 adpara

 uītama vida

 cōpĭaeos recursos. Quāsquecada  rēscoisas  uiolentissĭmāsmais bravias  nātūraa natureza  genŭit gerou, eārumdelas  mo-derātiōnemo comedimento  nōsnós  sōlīsós  habēmustemos, marisdo mar atquee  uentōrumdos ventos, proptergraças a nauticārumde náuticas rērumdas coisas scientĭamo conhecimento, plūrimīsquee de mais numerosas maritĭmīsde marítimas rēbusdas coisas  fruĭmurdesfrutamos  atquee  ūtĭmurusamos. Terrēnōrumdos terrenos  itemdo mesmo jeito  commo-dōrumdos proveitos omnistodo  est está  inem  homĭneo homem  dominātuso senhorio: nōsnós  campīsdos campos, nōsnós mōntĭbusdos montes  fruĭmurdesfrutamos, nostrīnossas  sunt são  amnēsas torrentes, nostrīnossos  lacūsos lagos, nōsnós frūgēsos grãos  serĭmusplantamos, nōsnós  arbŏrēsas árvores; nōsnós  aquārumdas águas  inductiōnĭbuspelas canalizações terrīsàs terras fēcunditātemfecundidade dāmusdamos, nōsnós  flūmĭnaos rios arcēmusretemos, dērigĭmusdirecionamos,āuertĭmusdesviamos; nostrīscom nossas dēniqueenfim manĭbuscom as mãos inem rērumdas coisas nātūrāa natureza qua-siquase altĕramoutra nātūramnatureza efficĕreperfazer cōnāmurtentamos.

Exemplo de resposta:māterĭa  – nominativo singular; ūsūs  – acusativo plural; nāuigĭ a  – acusativo plural; cursĭ bus  – ablativoplural; uītam  – acusativo singular; ... 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 78/153

 

76LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

A DECLINAÇÃO DOS ADJETIVOS

AquecimentoPesquise sobre o mōs māiōrum e em seguida assista a um filme ambientado na Roma antiga. Escrevaum texto contrastando a Roma do mōs māiōrum e a Roma do filme. Uma dica: convide alguns colegas aassistir ao filme junto com você.

Leia o texto a seguir:

Às vezes prestar-se aos mercadejos é buscar cabedal, se não fosse tão peri-goso, e do mesmo jeito usurar, se tão honesto. Os nossos antepassados assimcuidaram e como segue puseram nas leis: o ladrão era condenado ao dobro,

o usureiro ao quádruplo. Daí se pode considerar quão pior cidadão conside-rassem o usureiro que o ladrão. E quando louvavam um homem bom, louva-vam como segue: bom agricultor e bom lavrador; quem era louvado assim seconsiderava ser louvado da maneira mais alterosa. Mas considero o merca-dor atento e dedicado ao cabedal que deve ser buscado, porém, como disseacima, arriscado e desastroso. Em contrapartida, de agricultores são geradosos homens mais fortes e os soldados mais atentos, consegue-se o ganho maisjusto e mais estável e o menos invejoso, e aqueles que se ocuparam a essadedicação pensam menos mal.

O homem e o tempo

Este texto opõe-se diametralmente ao que estudamos

no capítulo anterior. Se aquele é uma pequena mostra do refi-

namento da literatura latina depois de um longo aprendizado

com a literatura grega, o autor deste passou à história de Roma

como o defensor mais ferrenho da latinidade mais genuína.

Trata-se de Marco Pórcio Catão, que nasceu em 234 a.C. em

Túsculo, no Lácio, e morreu em 149 a.C. em Roma. Catão foium desses homens que sobressaem tanto que se tornam meio

lendários. De origem plebeia, quando jovem lavrou a terra com as próprias mãos, como anti-

gamente o faziam até mesmo os patrícios. Serviu na Segunda Guerra Púnica (218-201 a.C.) e

percorreu todo o cursus honōrum, tendo alcançado o consulado em 195 a.C. Em 184 a.C.,

coroou a sua carreira exercendo a censura. Como vimos no segundo capítulo, o censor tinha

o dever não só de fazer o censo do povo, mas também vigiava os costumes, tarefa que Catão

cumpriu com uma severidade incomum, sobretudo em face da influência helênica, que, aos

seus olhos, desvirtuava a sociedade romana. Ele mesmo levou uma vida austera com uma

conduta irrepreensível.

Figura 20 - Estátuas de Catão e da sua es-posa Pórcia.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 79/153

 

77LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

O texto citado é o prefácio do tratado Dē agrī

cultūrā ‘Sobre o cultivo do campo’, a mais antiga obra

em prosa da literatura latina que nos chegou inteira.

Além dele, Catão compôs outras obras, como a enci-clopédia Ad Marcum fīlĭum ‘Ao meu filho Marco’, que

escreveu porque não queria entregar a educação do

seu filho a mestres gregos, e o tratado Orīgĕnēs  ‘Ori-

gens’, sobre a história das cidades itálicas. Catão tam-

bém foi um orador notável. Segundo várias fontes an-

tigas, depois de ter participado de uma embaixada a

Cartago em 157 a.C. e visto a prosperidade dos arqui-

inimigos dos romanos, acabava todas as suas orações

no Senado – não importa de que tratassem – dizendoalgo como Cētĕrum censĕō Carthāgĭnem esse dēlenda,

ou seja ‘De resto, penso que Cartago deve ser destru-

ída’. Cartago foi efetivamente destruída em 146 a.C.,

dois anos após a morte do Censor. Contudo, dessas de-

mais obras não remanesceram senão fragmentos.

O conteúdo do Dē agrī cultūrā é muito variado:

abarca tudo o que diz respeito à gestão de uma pro-

priedade: desde o tratamento dos escravos até recei-

tas de confeitaria. A exposição da matéria parece

mesmo caótica: no meio de recomendações relativas

ao cultivo da azeitona, o autor ensina a como evitar

que os figos caiam antes do tempo! E o livro é mesmo

isto: todo feito de preceitos, de modo que as mudan-

ças temáticas repentinas podem ser, na verdade, uma estratégia para amolecer um pouco a

dureza do texto.

No primeiro capítulo, estudamos que a composição da classe dirigente de Roma mu-

dou várias vezes até a queda do Império no ocidente. No entanto, ao longo de toda a históriade Roma, os membros dessa classe comungaram algo: a posse de grandes propriedades agrá-

rias. Convém lembrar que Roma surgiu da união de aldeias de lavradores e pastores, e como

um povo orgulhoso da sua história, os romanos mantinham, apesar de todas as mudanças por

que passavam, a ideia de que o sustento tirado da terra era o mais honesto, o mais honrado

e o mais seguro.

Além disso, os romanos sempre se apegaram a um pilar moral, por mais longe que

fosse ficando da realidade social: o mōs māiōrum, ou seja, o ‘costume dos antepassados’, o

fundamento mais antigo da cidadania romana, fonte do direito e contrapartida deste até adoutrina cristã o suplantar como base ética.

Em 458 a.C., eram cônsules GaioNáucio Rútilo e Lúcio Minúcio Esqui-lino Augurino. Enquanto o primeirolutava contra os sabinos, o segundo

viu-se cercado pelos équos dentro doseu próprio acampamento. Quando aRepública corria um perigo grave, osromanos escolhiam um ditador pararestaurar a ordem, o qual dispunhade um mandato de seis meses paratal. Esse pareceu, pois, um momentoem que era necessário entregar o co-mando da Cidade a alguém capaz dea salvar. O consenso de todos recaiusobre Lúcio Quíncio Cincinato, que

fora cônsul em 460 a.C. Alguns sena-dores dirigiram-se, então, à proprie-dade deste, além do Tibre, onde oacharam lavrando a terra com umarado nas mãos. Os senadores pedi-ram-lhe que vestisse a toga paraouvi-los. Quando lhe foi trazida atoga, Cincinato enxugou o suor, ves-tiu-a e os senadores ofereceram-lhea ditadura para vencer os équos. Cin-cinato aceitou o cargo, cumpriu o de-

ver e celebrou o seu triunfo apósapenas dezesseis dias. Depôs, então,a ditadura e retomou o arado. Assim,entrou para a história de Roma comoum cidadão romano exemplar.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 80/153

 

78LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Precisamente, com o texto citado, Catão almeja convencer  – evocando a autoridade

dos antepassados  – o leitor da justeza dessa ética, pela qual se considerava o lavrador o me-

lhor homem, o melhor cidadão e o melhor soldado. Perceba, entretanto, que o livro não se

destinava a um proprietário que lavrava a sua terra, como o fizera Catão quando jovem, masàquele que, como ele mesmo então, se valia do trabalho escravo e que confiava em grande

medida a gestão da propriedade a um capataz (uīlĭcus). Portanto, o homem bom de Catão não

era todo lavrador, mas o oligarca romano.

Gramática

E o que podemos aprender de gramática com o seu texto? Comecemos por retirar dele

os adjetivos: atento, bom, dedicado, desastroso, estável , forte, honesto, invejoso, justo, peri-goso, pior . Como adjetivo predica/classifica/localiza o substantivo, não adianta muito retirá-

lo da companhia deste.

1. 

Prestar-se aos mercadejos é perigoso. 2.

 

Usurar não é honesto. 3.

 

Consideravam o usureiro pior cidadão que o ladrão. 4.

 

Louvavam um homem bom. 5.

 

Louvavam um homem bom como bom agricultor e bom lavrador.  6.  Considero o mercador atento e dedicado, porém arriscado e desastroso.  7.  Os homens mais fortes e os soldados mais atentos. 

8. 

O ganho mais justo e mais estável e o menos invejoso. 

Você se lembra de que observamos que os substantivos em português acabam geral-

mente em /a/, em /o/ e em /e/ ou consoante? E que os que acabam em /a/ são tendentemente

femininos, os que acabam em /o/ são tendentemente masculinos e os que acabam em /e/ ou

consoante são masculinos ou femininos? Perceba agora que há igualmente adjetivos  que

apresentam uma forma masculina e outra forma feminina, como atento, e outros que têm a

mesma forma independentemente do gênero, como forte ou estável .

Também como o substantivo, o adjetivo tem flexão de número, por exemplo em 7,

mas, à diferença do substantivo, a predicação do adjetivo pode ser aumentada ou diminuída,como em 3, 7 e 8, propriedade chamada grau. Em 7 e em 8, o grau é expresso pelos advérbios

mais e menos, mas em 3, por um termo diferente do adjetivo no grau zero: pior , que equivale

a mais mau.

Examinemos agora como se dava tudo isso em latim. Eis o texto original:

Est interdum praestāre mercātūrīs rem quaerĕre, nisi tam perīculōsum sit ,et item foenerārī, sī tam honestum. Māiōrēs nostrī sīc habuērunt et ita in

lēgĭbus posīuērunt: fūrem duplī condemnārī, foenerātōrem quadrŭplī.

Quantō pēiōrem cīuem existimārint foenerātōrem quam fūrem, hinc licet

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 81/153

 

79LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

existimāre. Et uīrum bonum quom laudābant, ita laudābant: bonum agri-

cŏlam bonumque colōnum; amplissĭme laudārī existimābātur quī ita

laudābātur. Mercātōrem autem strēnŭum studiōsumque reī quaerendae

existĭmō, uērum, ut suprā dīxī, perīculōsum et calamitōsum. At ex agricŏlīs et

uīrī fortissĭmī et mīlĭtēs strēnuissĭmī gīgnuntur, maximēque pius quaestusstabilissimusque consequĭtur minimēque inuidiōsus, minimēque male cogi-

tantēs sunt quī in eō studĭō occupātī sunt. 

E as construções equivalentes às de 1 a 8:

9. 

Praestāre mercātūrīs perīculōsum est. 10.

 

Foenerārī honestum non est. 11.

 

Pēiōrem cīuem foenerātōrem quam fūrem existimābant. 12. Bonum uīrum laudābant. 13.

 

Bonum uīrum bonum agricŏlam bonumque colōnum laudābant. 

14. 

Strēnŭum studiōsumque mercātōrem existĭmō, uērum perīculōsum etcalamitōsum. 

15. 

Fortissĭmī uīrī et strēnuissĭmī mīlĭtēs. 16.

 

Maximē pius quaestus stabilissimusque minimēque inuidiōsus. 

Assim como em português o adjetivo tem os mesmos morfemas de gênero e número

que os substantivos, em latim o adjetivo declinava-se como os substantivos. Os adjetivos em

português que apresentam uma forma masculina e outra feminina continuam os adjetivos

latinos que tinham três formas, portanto triformes: uma masculina, uma feminina e uma neu-

tra. A forma masculina declinava-se exatamente como um substantivo masculino com tema

em -o-, a feminina exatamente como um substantivo feminino com tema em -a- e a neutra exatamente como um substantivo neutro com tema em -o-. 

declinação dos adjetivos triformes

casossingular plural

masculino neutro feminino masculino neutro femininonominativo bon-u- s 

bon-u-m bon-a  bon-ī  

bon-a bon-a-e 

acusativo bon-u-m  bon-a-m  bon-ō- s  bon-ā- s dativo

bon-ō bon-a-e 

bon-ī - s ablativo bon-ā genitivo bon-ī   bon-a-e  bon-ō-rum  bon-ā-rum vocativo bon-e  bon-u-m  bon-a  bon-ī   bon-a  bon-a-e 

Note, pois, que em 9 e 10, os adjetivos  per  īculōsum e honestum predicam os termos

 praestāre e foenerārī , que, como verbos no infinitivo, não são nem masculinos nem femininos,

portanto neutros. Se o perigoso e o desonesto tivessem sido o mercador e o usureiro, esses

adjetivos teriam tomado as formas perīculōsus e honestus, já que mercātor  e foenerātor  eram

substantivos masculinos. Igualmente, em 12, a palavra uīrum  é o objeto direto  do verbo

laudābant , portanto declinado no caso acusativo, no qual também fica o adjetivo que o pre-

dica: bonum. Se o homem bom fosse o sujeito, os termos teriam tomado a forma bonus u īr , e

se fosse uma mulher, bona mulĭer .

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 82/153

 

80LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Quanto aos adjetivos em português que não apresentam formas diferentes segundo o

gênero, continuam adjetivos latinos que tinham uma forma comum ao masculino e ao femi-

nino  e outra forma neutra, portanto biformes, e também adjetivos latinos que tinham a

mesma forma independentemente do gênero do substantivo predicado, portanto uniformes.Esses adjetivos latinos, como fortis ‘forte’ e cogĭtans ‘pensante’, também presentes no texto,

declinavam-se como um substantivo com tema em -i-:

declinação dos adjetivos biformes

casossingular plural

masculino/feminino neutro masculino/feminino neutronominativo  fort-i- s 

 fort-e  fort-ē- s  fort-ĭ -a acusativo  fort-e-m 

dativo  fort-ī   fort-ĭ -bus 

ablativo  fort-e genitivo  fort-i- s  fort-ĭ -um 

declinação dos adjetivos uniformes

casossingular plural

masculino/feminino/neutro masculino/feminino/neutronominativo cogĭtan- s 

cogitant-ē- s acusativo cogitant-e-m 

dativo cogitant-ī  cogitant-ĭ -bus 

ablativo cogitant-e genitivo cogitant-i- s  cogitant-ĭ -um 

Na gramática tradicional, os adjetivos triformes são chamados adjetivos de primeira

classe e os biformes e uniformes, adjetivos de segunda classe. Nos dicionários latinos, elesaparecem registrados da maneira seguintes:

bonus, a, um fortis, e cogĭtans 

As letras a e um depois da vírgula assinalam precisamente que esse adjetivo tem um

feminino que se declinava como um substantivo com tema em -a- e um neutro que se decli-

nava como um substantivo neutro com tema em -o-.

Não obstante, perceba, em 11, 15 e 16, que em latim se usavam mais flexões de grau 

que em português. Com efeito, em português aparece apenas a forma pior  por mais mau em

11, equivalente a pēiōrem (declinado no acusativo). Em contrapartida, em latim aparecem as

formas fortissĭmī , strēnuissĭmī  e stabilissĭmus onde em português a expressão do grau de su-

perioridade se dá por meio de um advérbio: os mais fortes, os mais atentos e o mais estável .

O grau de inferioridade é expresso, porém, por um advérbio tanto em português como em

latim: o menos invejoso e minĭmē  inuidiōsus. Observe, ainda, que a superioridade em 11 é

expressa em relação a outro termo: pēiōrem cīuem quam ...; pior cidadão que ...; em 15 e 16,

a superioridade é absoluta, sem outro termo que se compare a ela:  fortissĭmī , strēnuissĭmī ,

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 83/153

 

81LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

stabilissĭmus; os mais fortes, os mais atentos, o mais estável . Efetivamente, a flexão do grau

de superioridade dividia-se em duas categorias: o grau comparativo e o superlativo.

Para formar o comparativo, acrescentava-se à raiz do adjetivo o morfema -ior- (-ius 

nos adjetivos neutros no nominativo e no acusativo singulares), declinando-se como um adje-tivo biforme:

declinação do adjetivo no grau comparativo de superioridade

casossingular plural

masculino/feminino neutro masculino/feminino neutronominativo  fort-ĭ or  

 fort-ĭ us  fort-iōr -ē-s fort-iōr -aacusativo  fort-iōr -e-m

dativo  fort-iōr -ī   fort-iōr -ĭ -bus

ablativo  fort-iōr -egenitivo  fort-iōr -i-s fort-iōr -um

Para formar o superlativo, acrescentava-se à raiz do adjetivo o morfema -issĭm-, decli-nando-se como um adjetivo triforme:

declinação dos adjetivos no grau superlativo de superioridade

casossingular plural

masculino neutro feminino masculino neutro femininonominativo  fort-issĭm-u-s

 fort-issĭm-u-m fort-issĭm-a fort-issĭm-ī  

 fort-issĭm-a fort-issĭm-a-e

acusativo  fort-issĭm-u-m fort-issĭm-a-m fort-issĭm-ō-s fort-issĭm-ā-sdativo

 fort-issĭm-ō  fort-issĭm-a-e

 fort-issĭm-īs ablativo  fort-issĭm-ā genitivo  fort-issĭm-ī   fort-issĭm-a-e fort-issĭm-ō-rum fort-issĭm-ā-rumvocativo  fort-issĭm-e fort-issĭm-u-m fort-issĭm-a fort-issĭm-ī   fort-issĭm-a fort-issĭm-a-e

No entanto, quando a raiz do adjetivo acaba em /i/, essa vogal toparia com a mesmados morfemas -ior- e -issĭm-, de modo que nesse caso se empregavam respectivamente os

advérbios magis e maxĭmē, como em 16: magis pius, maxĭmē pius.

Por outro lado, é preciso esclarecer que o superlativo pode exprimir tanto uma supe-

rioridade absoluta, como na exemplificação, equivalente em português ao uso do advérbio

mais, como também uma superioridade relativa, equivalente em português ao uso do advér-

bio muito. Assim, ‘homens muito fortes e soldados muito atentos’ é uma tradução igualmente

aceitável de uīrī fortissĭmī et mīlĭtēs strēnuissĭmī .

Perceba também que o adjetivo mau em latim é malus, mas em 11 o seu superlativo

tem a forma  pēiōrem  (no caso acusativo). Com efeito, alguns comparativos e superlativos 

eram um pouco ou muito diferentes das formas no grau zero. Alguns adjetivos não apresen-

tavam mesmo, ao menos no latim clássico, a forma no grau zero. Ei-los:

alguns compartivos e superlativos bastante divergentes do grau zerograu zero comparativo superlativo

bonus ‘bom’  melĭor  ‘melhor’  optĭmus ‘o melhor’, ‘muito bom’ malus ‘mau’   pēior  ‘pior’   pessĭmus ‘o pior’, ‘muito mau’ 

magnus ‘grande’  māior  ‘maior’  maxĭmus ‘o maior’, ‘muito grande’  paruus ‘pequeno’  minor  ‘menor’  minĭmus ‘o menor’, ‘muito pequeno’ 

multī  ‘muitos’   plūrēs ‘mais numerosos’   plūrĭmī  ‘os mais numerosos’, ‘muito numerosos’ senex  ‘velho’  senĭor  ‘mais velho’ 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 84/153

 

82LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

iuuĕnis ‘jovem’  iunĭor  ‘mais jovem’ 

alguns comparativos e superlativos um pouco divergentes do grau zerograu zero comparativo superlativosupĕrus 

‘o que está acima’ superĭ or  

‘o que está mais acima’ summus ou suprēmus 

‘o que está mais/muito acima’ infĕrus 

‘o que está abaixo’ inferĭ or  

‘o que está mais abaixo’ īmus ou infĭmus 

‘o que está mais/muito abaixo’  postĕrus 

‘o que está atrás’  posterĭ or  

‘o que est á mais atrás’  postŭmus ou postrēmus 

‘o que está mais/muito atrás’ extĕrus 

‘o que está fora’ exterĭ or  

‘o que está mais para fora’ extrēmus 

‘o que está mais/muito para fora’ interĭor  

‘o que está mais para dentro’ intĭmus 

‘o que está mais/muito para dentro’  prior  

‘o que está mais adiante’  prīmus 

‘o que está mais/muito adiante’ 

ulterĭor  ‘o que está mais para lá’  ultĭmus ‘o que está mais/muito além’  propĭor  

‘o que está mais perto’  proxĭmus 

‘o que está mais/muito perto’ 

Note, ainda, que em português se mantiveram as formas melhor , pior , maior  e menor  

como comparativos e também superlativos dos adjetivos bom, mau, grande e pequeno. Igual-

mente, a maioria dos comparativos e superlativos contidos na segunda tabela passou à nossa

língua, mas estes estão lexicalizados, ou seja, não são mais percebidos como comparativos e

superlativos, mas como adjetivos no grau zero: superior , sumo, supremo; inferior , ínfimo; pos-

terior , póstumo; exterior , extremo; interior , íntimo; ulterior , último; próximo.

Para acabar, você pode estar argumentando contra mim: “mas em português também

há o morfema -íssim-”. É bem verdade que ‘homens fortíssimos e soldados atentíssimos’ é

outra tradução possível de uīrī fortissĭmī et mīlĭtēs strēnuissĭmī , mas leve em conta que a adap-

tação do morfema -issĭm- e formas como ótimo, péssimo, máximo e mínimo nas línguas româ-

nicas são latinismos, ou, em outras palavras, não são as formas genuínas herdadas do latim

vulgar, mas empréstimos ao latim literário.

ExercícioLembra-se do epigrama de Marcial? Ele contém alguns adjetivos. Identifique-os juntamente com ossubstantivos que predicam e diga em que caso e número está cada um.

Cumporquanto uocerseja chamado adpara cēnama ceia nonnão iamjá uēnālispor um preço ut como anteantes,cūrpor que mihia mim nonnão eădemmesma quaeque tibia ti cēnaa ceia dāturé dada?Ostrĕaostras tūtu sūmistomas stagnōno lago saturātaengordadas Lucrīnōem Lucrino,sūgĭturé chupado incīsōcom cortada mitŭlusum mexilhão ōrecom a boca mihipor mim;sunt há tibipara ti bōlētīboletos, fungōscogumelos egōeu sūmōtomo suīllōsde porcos;rēsuma coisa tibipara ti cumcom rhombōum rodovalho est há, at mas mihipara mim cumcom sparŭlōuma brema.Aurĕusdourada inmodĭcīscom desmesuradas turturuma rola tēte clūnĭbuscom ancas implet enche,

pōnĭturé posta

 inem

 cauĕāuma gaiola

 mortŭamorta

 pīcauma pega

 mihipara mim

.Cūrpor que sinesem tēti cēnōceio cumquando tēcumcontigo, PontĭcePôntico, cēnemceie?

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 85/153

 

83LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Sportŭlaa cestinha quodque nonnão est há prōsit seja proveitosa: edāmuscomamos idemo mesmo.

Exemplo de resposta:Substantivos com adjetivos: saturāt a ostrĕa  – acusativo plural, incisō ōr e  – ablativo singular, ...

Substantivos sós: cēnam  – acusativo singular, cēna  – nominativo singular, ...Adjetivos sós: Há apenas um e não direi qual é! 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 86/153

 

84LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

A DECLINAÇÃO DOS PRONOMES

Aquecimento“Estamos no ano 50 antes de Cristo. Toda a Gália foi ocupada pelos romanos ...Toda? Não! Uma aldeia povoada por irredutíveis gauleses ainda resiste ao in-vasor. E a vida não é nada fácil para as guarnições de legionários romanos noscampos fortificados de Babaorum, Aquarium, Laudanum e Petibonum”. Essas palavras lhe são familiares? De onde você as conhece? Não as co-nhece? Então pesquise e descubra. Em seguida, escreva um resumo da suapesquisa.

Leia o texto a seguir:

Toda a Gália está dividida em três partes, das quais uma habitam os belgas, aoutra os aquitanos, a terceira aqueles que na língua deles mesmos se chamamceltas, na nossa gauleses. Todos estes diferem entre si pela língua, pelos cos-tumes, pelas leis. O rio Garumna divide os gauleses dos aquitanos, o Mátronae o Séquana dividem-nos dos belgas. Destes todos os belgas são os mais for-tes, isto porque distam muito longe da cultura e da civilização da Província,e os mercadores andam o menos amiúde a eles levando coisas que tendem aafrouxar os brios, e são os mais próximos aos germanos, que habitam alémdo Reno, com quem seguidamente travam guerra. Por esta razão os helvéciostambém avantajam os outros gauleses pela força, pois lutam combates quasecotidianos com os germanos, ou os afastam das suas fronteiras ou eles mes-mos travam guerra nas fronteiras deles. A parte dessas que os gauleses ocu-pam, como se disse, começa do rio Ródano, é contida pelo rio Garumna, peloOceano, pelas fronteiras dos belgas, atinge, ainda, o rio Reno junto aos séqua-nos e helvécios, volta-se às regiões setentrionais. Os belgas levantam-se dasfronteiras extremas da Gália, estendem-se até a parte mais baixa do rio Reno,miram para o setentrião e para o sol nascente. A Aquitânia estende-se do rioGarumna aos montes Pireneus e à parte do Oceano que está perto da Hispâ-nia; mira para o pôr do sol e as regiões setentrionais.

O homem e o tempo

Este texto é o começo dos Commentārĭī dē Bellō Gallĭcō ‘Comentários sobre a Guerra

da Gália’, de César. Creio que o que eu disse sobre Gaio Júlio César no primeiro capítulo é

bastante para compreender quão relevante foi esse homem no seu tempo e na história de

Roma depois dele.

O Dē Bellō Gallĭcō, como o título sugere, é um relato do desenvolvimento da conquista

da Gália entre os anos 58 e 52 a.C., a qual o próprio César empreendeu. O primeiro livro tratada campanha contra os helvécios e da vitória sobre o chefe germânico Ariovisto; o segundo

Figura 21 - "Estamos no ano 50antes de Cristo..." 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 87/153

 

85LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

da revolta dos gauleses e da sujeição dos belgas; o terceiro, da conquista da costa e da Aqui-

tânia; o quarto, da vitória sobre os germanos que atravessaram o Reno e das incursões na

Germânia e na Britânia; o quinto, do retorno à Britânia e de novas revoltas na Gália; o sexto,

de outra incursão na Germânia e da derrota dos eburões; o sétimo, do combate à sublevaçãodo chefe gaulês Vercingétorix, concluindo a conquista.

Convém lembrar que antes de assumir o governo

das províncias das Gálias que já se achavam sob o domí-

nio romano (a Província que está referida no texto é a

Gália Narbonense; efetivamente, a palavra Prouincĭa 

deu origem ao nome da região da Provença), César já al-

cançara os cargos mais altos da República: o pontificado

máximo em 60 a.C. e o consulado em 59 a.C. Como polí-

tico, não precisava provar mais nada, mas faltavam-lhes

os triunfos que eram demandados dos grandes cabeças

da República romana. O Dē Bellō Gallĭcō, publicado em 51 a.C., cumpria precisamente o fim

de enaltecer a carreira militar de César para alavancar as suas ambições monárquicas ou quase

monárquicas. É um livro de história singular não só pelo seu propósito, mas também pela sua

forma, pois César empregou um estilo em que se valorizava maximamente a singeleza, em

contraposição à elaborada prosa de Cícero, por exemplo.

Gramática

Para estudar o conteúdo de gramática, observe as palavras em negrito nas sentenças

seguintes, colocadas na ordem não marcada:

1.  Toda a Gália está dividida em três partes. 2.

 

Os belgas habitam uma. 3.  Toda a Gália é dividida em três partes, das quais os belgas habitam uma. 4.

 

Os aquitanos habitam a outra. 5.

 

 Aqueles que na língua deles mesmos se chamam celtas, na nossa gau-

leses, habitam a terceira. 6.  Todos estes diferem entre si pela língua, pelos costumes, pelas leis. 7.

 

Os belgas são os mais próximos aos germanos, com quem travam segui-damente guerra. 

8.  Os helvécios afastam os germanos das suas fronteiras. 9.

 

A parte dessas que o gauleses ocupam começa do rio Ródano. 

Alguns desses termos, como deles mesmos em 5, suas em 8 e dessas em 9, apontam

para a enunciação, nos três casos à terceira pessoa, exprimindo também nos três uma relação

de posse. Outros, como uma em 2, das quais em 3, outra em 4, aqueles que, nossa e terceira 

em 5, estes e si  em 6 e com quem em 7, referem-se a conteúdos que aparecem antes  oudepois no texto: uma, das quais, outra e terceira a  partes, nossa a língua, estes a aquitanos ,

Figura 22 - Vercingétorix lança as suas armas aos pésde Júlio César , de Lionel Royer (1899).

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 88/153

 

86LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

belgas e gauleses, com quem a os germanos. Uns terceiros, como toda e três em 1 e todos em

6, quantificam o nome que predicam.

Os gramáticos tradicionais têm dado diferentes nomes a esses termos: pronomes pes-

soais (como si ), demonstrativos (como estes e aqueles), possessivos (como nossa e suas), in-

definidos (como toda e outra) e relativos (como as quais e quem) e também numerais (como

três e terceira). Seja como for, a propriedade de apontar para a enunciação  – chamada dêixis 

 – e a de referir a conteúdos anteriores ou posteriores   – chamada foricidade (anáfora se o

referente está antes, catáfora se está depois e exáfora se está no contexto) aproximam-nos

respectivamente aos adjetivos e aos substantivos, pelo que é natural carregarem os mesmos

traços morfológicos destes: flexões de gênero e número.

Como se davam essas coisas em latim? Leiamos o original de César:

Gallĭa est omnis dīuīsa in partēs trēs, quārum ūnam incŏlunt Belgae, alĭamAquītānī, tertĭam quī ipsōrum linguā Celtae, nostrā Gallī appellantur. Hī om-

nēs linguā, īnstitūtīs, lēgĭbus inter sē diffĕrunt. Gallōs ab Aquītānīs Garūmna

flūmen, ā Belgīs Matrŏna et Sēquăna dīuĭdit. Hōrum omnĭum fortissĭmī sunt

Belgae, propterĕā quod ā cultū atque hūmānitāte prouincĭae longissĭme ab-

sunt, minimēque ad eōs mercātōrēs saepe commĕant atque ea quae ad

effēminandōs anĭmōs pertĭnent important, proximīque sunt Germānīs, quī

trāns Rhēnum incŏlunt, quibuscum continenter bellum gerunt. Quā de causā

Heluētĭī quoque relĭquōs Gallōs uīrtūte praecēdunt, quod ferē cotīdiānīs pro-

elĭīs cum Germānīs contendunt, cum aut suīs fīnĭbus eōs prohĭbent aut ipsī in

eōrum fīnĭbus bellum gerunt. Eōrum ūna pars quam Gallōs obtinēre dīctumest, initĭum capit ā flūmĭne Rhodănō, continētur Garūmnā flūmĭne, Ōceănō,

fīnĭbus Belgārum, attingit etĭam ab Sēquănīs et Heluētĭīs flūmen Rhēnum, ue-

rgit ad septentriōnēs. Belgae ab extrēmīs Gallĭae fīnĭbus oriuntur, pertĭnent

ad inferiōrem partem flūmĭnis Rhēnī, spectant in septentriōnem et orientemsōlem. Aquītānĭa ā Garūmnā flūmne ad Pyrēnaeōs mōntēs et eam partem

Ōceănī quae est ad Hispānĭam pertĭnet; spectat inter occāsum sōlis et septen-

triōnēs. 

E agora destaquemos as sentenças correspondentes àquelas de 1 a 9, também na or-

dem não marcada:

10. Omnis Gallĭa in partēs trēs dīuīsa est. 11.

 

Belgae ūnam incŏlunt. 12. Omnis Gallĭa in trēs partēs dīuīsa est, quārum Belgae ūnam incŏlunt. 13. Aquītānī alĭam incŏlunt. 14.

 

Quī Celtae ipsōrum linguā, Gallī nostrā, appellantur tertĭam incŏlunt . 15.

 

Omnēs hī inter sē linguā, īnstitūtīs, lēgĭbus diffĕrunt. 16. Belgae proxĭmī Germānīs sunt, quibuscum bellum continenter gerunt. 17.

 

Heluētĭī Germānōs fīnĭbus suīs prohĭbent. 18. Pars eōrum quam Gallōs obtinēre initĭum ā flūmĭne Rhodănō capit.  

Em latim, aconteciam os mesmos fenômenos: ipsōrum em 14, suīs em 17 e eōrum em18 apontam para a enunciação, exprimindo uma relação de um possuído  – linguā, fīnĭbus e

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 89/153

 

87LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

 pars  – e de um possuidor  – quī , Heluētĭī , partēs trēs  –; ūnam em 11, quārum em 12, alĭam em

13, quī , nostrā e tertĭam em 14, hī  e sē em 15, quibuscum em 16, quam em 18 referem-se a

termos anteriores ou posteriores: ūnam, quārum, alĭam e tertĭam a partēs, quī  a Celtae, nos-

trā a linguā, hī  e sē a  Aquītānī , Belgae e Gallī , quibuscum a Germānīs, quam a pars; omnis etrēs em 10 e omnēs em 15 quantificam Gallĭa, partēs e hī .

Não obstante, cumpre lembrar que o nome (substantivo e adjetivo) latino tinha, além

das flexões de gênero e número, a de caso, de modo que os pronomes e os quantificadores

também a tinham. Com efeito, vê-se que omnis em 10, quantificador de Gallĭa, que é o sujeito 

do verbo est , leva o morfema -s do nominativo singular; que o indefinido ūnam, que é o ob-

 jeto direto de incŏlunt , leva o morfema -m do acusativo singular; que o relativo quārum, leva

o morfema -rum do genitivo plural.

A primeira lição sobre a declinação foi começada por considerações acerca da flexãode caso nos pronomes pessoais  – a única classe de palavras em que ela se manteve em por-

tuguês  –. Graças ao percurso palmilhado até agora, é possível voltar e, ao lado de formas

ímpares, como egō e mē ou tū e tē, reconhecer ao menos um morfema comum com a decli-

nação nominal, o do genitivo singular: - ī  em meī , tuī , nostrī  e uestrī , como em aquae, domĭnī  

e diēī . Da mesma maneira, a declinação dos demais pronomes apresentava formas comuns e

incomuns com relação à declinação do nome.

Pronomes possessivosOs possessivos  – meus ‘meu’, tuus ‘teu’, noster  ‘nosso’, uester   ‘vosso’ e suus ‘seu’  – 

declinavam-se exatamente como um adjetivo triforme. Portanto, não há nada de novo para

quem já aprendeu as desinências dos casos nos substantivos com temas em -a- e em -o-:

declinação dos pronomes possessivos no singular

pessoa número gênerocaso

nominativo acusativo dativo ablativo genitivo

1ª pessoa

singu

lar

masculino meusmeum meō  meī  

neutro meumfeminino mea meam meae meā  meae

2ª pessoamasculino tuus

tuum tuō  tuī  neutro tuum

feminino tua tuam tuae tuā  tuae

1ª pessoa

plural

masculino nosternostrum nostr ō  nostrī  

neutro nostrumfeminino nostra mostram nostrae nostrā  nostrae

2ª pessoamasculino uester

uestrum uestrō  uestrī  neutro uestrum

feminino uestra uestram uestrae uestrā  uestrae

3ª pessoa comummasculino suus

suum suō  suī  neutro suum

feminino sua suam suae suā  suae

declinação dos pronomes possessivos no plural

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 90/153

 

88LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

pessoa número gênerocaso

nominativo acusativo dativo ablativo genitivo

1ª pessoa

singular

masculino meī   meōs meīs 

meōrum neutro mea

feminino meae meās meārum 

2ª pessoamasculino tuī   tuōs 

tuīs tuōrum 

neutro tuafeminino tuae tuas tuārum 

1ª pessoa

plural

masculino nostrī   nostrōs nostrīs 

nostrōrum neutro mostra

feminino nostrae nostrās  nostrārum 

2ª pessoamasculino uestrī   uestrōs 

uestrīs uestrōrum 

neutro uestrafeminino uestrae uestrās  uestrārum 

3ª pessoa comummasculino suī   suōs 

suīs suōrum 

neutro suafeminino suae suas suārum 

A única forma do vocativo que era diferente do nominativo era a da primeira pessoa

do singular masculino: mī . É a única forma que deve ser aprendida à parte

Pronomes demonstrativos

Os demonstrativos  – hīc ‘este’, iste ‘esse’ e ille ‘aquele’  – combinavam uma declinação

com formas bastante particulares e outras que eram as próprias dos adjetivos triformes:

declinação dos pronomes demonstrativos hīc , iste e ille 

pessoa número gênerocaso

nominativo acusativo dativo ablativo genitivo

1ª pessoa

singular

masculino hīc  hunchuic

hōc huiusneutro hōc 

feminino haec hanc hāc 

2ª pessoamasculino iste istum

istī  istō 

istīus neutro istudfeminino ista istam istā 

3ª pessoamasculino ille illum

illī  illō 

illīus neutro illudfeminino illa illam illā 

1ª pessoa

plural

masculino hī   hōs  hīs  hōrum neutro haecfeminino hae hās  hārum

2ª pessoamasculino istī   istōs 

istīs istōrum 

neutro istafeminino istae istās  istārum

3ª pessoamasculino illī   illōs 

illīs illōrum 

neutro illafeminino illae illās  illārum

Veja que as únicas formas que devem ser aprendidas à parte são:

  as do singular de hīc;

  o nominativo e o acusativo plurais neutros haec;

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 91/153

 

89LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

  os nominativos singulares iste e istud , ille e illud ;

  os acusativos singulares neutros istud  e illud ;

  os dativos singulares istī  e illī  

 

e os genitivos singulares istīus e illīus, comuns aos três gêneros.

Além desses três demonstrativos, que estão ligados às três pessoas do discurso (isto 

é o que está perto de mim; isso o que está perto de ti ; aquilo o que está perto dele), havia em

latim outros três: is, que tinha uma indicação contextual, próxima à do artigo e do pronome

pessoal de terceira pessoa em português, amiúde traduzido por eles mesmos; ī dem, que sig-

nifica ‘o mesmo (já dito)’, e ipse, de significado próximo: ‘ele mesmo (e não outro)’. A sentença

seguinte contém exemplos do uso de is e ipse:

19. 

Heluētĭī cum Germānīs ferē cotīdiānīs proelĭīs contendunt, cum aut eōs 

fīnĭbus suīs prohĭbent aut ipsī bellum in fīnĭbus eōrum gerunt. Em português:

20. 

Os helvécios lutam combates quase cotidianos com os germanos, ou os afastam das suas fronteiras ou eles mesmos travam guerra nas frontei-ras deles. 

Perceba que eōs, que é o objeto direto do verbo prohĭbent  (portanto, no acusativo), é

traduzido pelo pronome pessoal da terceira pessoa, os [afastam], assim como eōrum, com-

plemento nominal de fīnĭbus (portanto, no genitivo), traduzido por [as fronteiras] deles. Note

também que ipsī  retoma Heluētĭī  excluindo cum Germānīs, isto é, ‘eles mesmos, os próprioshelvécios, e não os germanos, travam guerra nas fronteiras deles’. Há, ainda, uma distinção

entre fīnĭbus suīs, em que o possessivo remete ao sujeito da sentença, ou seja, ‘as fronteiras

dos helvécios’, e in  fīnĭbus eōrum, em que o demonstrativo no genitivo remete a outro termo 

da sentença, ou seja, ‘as fronteiras dos germanos’, o que procurei manter na tradução como

das suas fronteiras e nas fronteiras deles.

Quanto à declinação, is e ipse apresentavam uns paradigmas semelhantes:

declinação dos pronomes demonstrativos is e ipse número gênero

casonominativo acusativo dativo ablativo genitivo

singular

masculino is eumeī  

eō eiusneutro id

feminino ea eam eā masculino ipse

ipsī  ipsō 

ipsīus neutro ipsumfeminino ipsa ipsam ipsā 

plural

masculino eī , ii ou ī   eōs eīs, iis ou īs 

eōrum neutro ea

feminino eae eās  eārum masculino ipsī   ipsōs 

ipsīs  i psōrum neutro ipsafeminino ipsae ipsās  ipsārum 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 92/153

 

90LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Veja que esses dois demonstrativos comungavam o dativo e o genitivo singulares co-

muns aos três gêneros respectivamente em - ī  e -ius. Id  tem o mesmo -d  de istud  e illud .

O pronome  īdem declinava-se exatamente  como is, ficando invariável o elemento -

dem: īdem, eădem, idem; eumdem, eamdem, idem etc. A única exceção era o próprio nomi-nativo singular masculino, que tinha a forma īdem.

Pronome relativo

O relativo  – quī  ‘que, o qual, quem, cujo’  – apresentava a mesma semelhança de de-

clinação que têm configurado os demonstrativos:

declinação do pronome relativo quī  

número gênero casonominativo acusativo dativo ablativo genitivo

singularmasculino quī   quem

cuī  quō 

cuiusneutro quodfeminino quae quam quā 

pluralmasculino quī   quōs 

quibusquōrum 

neutro quaefeminino quae quās  quārum 

Mais uma vez, comparecem o -d  neutro no nominativo e no acusativo singulares, um

dativo e um genitivo singulares comuns em - ī  e -ius, mas, ao contrário dos demonstrativos, a

desinência do dativo e do ablativo plurais do relativo era aquela dos substantivos com temaem -i-, -u-, -e- e consoante: -bus.

Pronome interrogativo

O interrogativo  – quīs?  ‘quê? qual? quem?’  – era exatamente igual ao relativo. Diferia

dele apenas por variações do nominativo: o masculino podia ser quī  ou quī s, o feminino quae 

ou qua e o neutro quod  ou quid .

Pronomes indefinidos

O relativo-interrogativo dera lugar a vários pronomes indefinidos. Ele mesmo podia

servir de indefinido com o significado de ‘algum, algo, alguém (suposto)’. Derivados eram:

  alĭquī  ou alĭquis ‘algum, algo, alguém (posto)’;

  quīcumque ‘qualquer, qualquer um’;

  quīdam ‘certo, um certo’;

 

quisquam ‘algum, algo, alguém’ (em sentenças dubitativas, negativas e interro-gativas);

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 93/153

 

91LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

  quisque ‘cada, cada um’;

  quisquis ‘o que quer que seja, quem quer que seja’.

Todos declinavam-se como quī/quīs na parte que contém esse pronome, ficando inva-

riável o resto, como acontecia ao pronome īdem.

Outros pronomes indefinidos, como:

  alĭus ‘outro (de mais de dois)’;

  alter  ‘outro (de dois’);

  ūllus ‘algum, algo, alguém’ (em sentenças condicionais, negativas e interroga-

tivas);

  uter  ‘um dos dois’;

  nūllus ‘nenhum, nada, ninguém’;

  neuter  ‘nenhum dos dois’;

apresentavam as mesmas particularidades de declinação que já devem estar aprendidas: da-

tivo e genitivo singulares comuns aos três gêneros respectivamente em - ī  e - īus: alĭī  e alīus,

alterĭī  e alterīus, ūllī  e ūllīus, utrī  e utrīus, nūllī  e nūllīus, neutrī  e neutrīus.

O indefinido nēmō ‘ninguém’ tinha apenas o nominativo, que era esse mesmo, o acu-

sativo nēmĭnem e o dativo nēmĭnī . Igualmente, nihil   ‘nada’ tinha apenas o nominativo e o

acusativo, ambos nessa mesma forma. Nos demais casos, usava-se nūllus.

ExercícioO texto a seguir é o segundo parágrafo do Dē Bellō Gallĭcō. Além dos substantivos e adjetivos, juntos esós, identifique todos os pronomes e diga em que caso e número está cada um, bem como a quenome se refere.

Apudentre Heluētĭōsos helvécios longēde longe nōbilissĭmuso mais nobre fuit foi et e dītissĭmuso mais rico OrgētŏrixOr-

gétorix. Isele MarcōMarco MessālāMessala et e MarcōMarco PupĭōPúpio PīsōnePisão consulĭbuscônsules rēgnīdo reino cu-piditātecom cobiça  indūctuslevado  coniūrātiōnemuma conjuração  nōbilitātisda nobreza  fēcit fez  et e  cīuitātīa cidadania persuāsit persuadiu ut a dēde fīnĭbusas fronteiras suīssuas cumcom omnĭbustodos cōpĭīsos recursos exīrent saíssem: per-

facĭlemuito fácil esseser, cumcomo uīrtūtepela força omnĭbusa todos praestārent avantajassem, tōtĭusde todas GallĭaedasGálias  imperĭōpelo poder  potīrīapossar-se. Idisso  hōca isto  facilĭusmais facilmente  iīsa eles  persuāsit persuadiu, quodporque undĭquepor todas as partes locīdo lugar nātūrāpela natureza Heluētĭīos helvécios continentursão contidos: ūnāuma exde par-tepor parte flūmĭnepelo rio Rhēnōpor Reno lātissĭmōmuito largo atquee altissĭmōmuito fundo, quīque agrumo campo He-luētĭumhelvécio āde Germānīsos germanos dīuĭdit divide; altĕrāoutra exde parteparte mōntepelo monte Iūrāpor Jura altis-sĭmōmuito alto, quīque est está interentre Sēquănōsos séquanos et e Heluētĭōsos helvécios; tertĭāda terceira lacūpelo lago Le-mannōpor Lemano  et e  flūmĭnepelo rio  Rhodănōpor Ródano, quīque  prouincĭama província  nostramnossa  abde  He-luētĭīsos helvécios dīuĭdit divide. Hīspor estas rēbuspor coisas fiēbat seguia-se ut et que minusmenos lātēlargamente uagāren-turse espalhassem  et e  minusmenos  facĭlefacilmente  fīnītĭmīsaos vizinhos  belluma guerra  inferrelevar  possent pudessem;quāessa  exde  parteparte  homĭnēshomens  bellandīde guerrear  cupĭdīcobiçosos  magnōcom grande  dolōrecom dor  adfi-ciēbantureram acometidos. Prōpor multitūdĭnea multidão autemmas homĭnumde homens et e prōpor glōrĭāa glória bellīda

guerra atquee fortitūdĭnisda fortaleza angustōscurtos sē fīnēstermos habēreter arbitrābanturestimavam, quīque  inem 

longitūdĭnemcomprimento mīlĭamil passŭumde passos CCXL240, inem lātitūdĭnemlargura CLXXX180 patēbant abriam-se.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 94/153

 

92LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Entre os helvécios, Orgétorix foi de longe o mais nobre e o mais rico. Sendo cônsules Marco Messala eMarco Púpio Pisão, levado pela cobiça de reinar, fez uma conjuração da nobreza e persuadiu a cidada-nia a sair das suas fronteiras com todos os seus recursos: era muito fácil, como avantajavam a todospela força, apossar-se de todas as Gálias pelo poder. Isso os persuadiu mais facilmente a isto, porqueos helvécios são contidos por todas as partes pela natureza do lugar: de uma parte pelo rio Reno, muitolargo e fundo, o qual divide o campo helvécio daquele dos germanos; de outra parte pelo monte Jura,muito alto, que está entre os séquanos e os helvécios; da terceira pelo lago Lemano e pelo rio Ródano,o qual divide a nossa província dos helvécios. Por estas coisas, seguia-se que se espalhavam menoslargamente e podiam menos facilmente levar a guerra aos vizinhos, daí homens cobiçosos de guerrearserem acometidos por uma grande dor. Por causa da multidão de homens e da glória da guerra e dafortaleza, estimavam ter termos curtos, os quais eram de 240 mil passos de comprimento e se abriampor 180 de largura. 

Exemplo de resposta:Substantivos com adjetivos: lātissĭmō atque altissĭmō Rhēnō flūmĭne  – ablativo singular, altissĭmō Iūr ā 

mōnt e  – ablativo singular, ...Substantivos sós: Heluētĭōs  – acusativo plural, Orgētŏrix(c s )  – nominativo singular, Marc ō  – ablativosingular, ...Adjetivos sós: nōbilissĭmus  – nominativo singular, dītissĭmus  – nominativo singular, ...Pronomes: i s  – nominativo singular (Orgētŏrix ), suīs  – ablativo plural (fīnĭ bus), omnĭ bus  – ablativoplural (cōpĭ īs), ... 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 95/153

 

93LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

OS NUMERAIS

AquecimentoInfelizmente, no Brasil volta e meia somos acometidos por um sentimento de impunidade, ou seja, sen-timos que a Justiça não cumpre o seu dever de ser justa. Sabe por que isso acontece? Porque “é precisoprovar; não basta dizer” (“probāre oportet, non suffĭcit dīcĕre”), mas mesmo quando se aduzem provas,“na dúvida, o juiz deve absolver antes que condenar” (“absoluĕre dēbet iūdex potĭus in dubĭō quam con-demnāre”), a não ser que o réu confesse o crime, já que “a confissão é uma prova melhor que todas asoutras” (“confessĭō est probātĭō omnĭbus melĭor”). Mas mesmo sendo réu confesso, o criminoso podeacabar beneficiado, porque “a confissão espontânea diminui o delito e a pena”  (“confessĭō spontānĕaminŭit dēlictum et poenam”). As expressões citadas são máximas do direito romano.Pesquise uma expressão latina jurídica e acrescente-a ao glossário com o seu significado. Mas atenção!Não repita uma expressão que já tenha sido colocada no glossário.

Leia o texto a seguir: 

O mesmo escreve que como me fossem devidos dez, se o escravo dado empenhor for roubado, se eu tiver conseguido dez pela ação de furto, não mecompete uma ação de furto se for roubado de novo, posto que cessou o meuinteresse, por já ter conseguido uma vez. Isto assim se for roubado sem culpaminha, pois se por culpa minha, dado que há interesse pelo fato de que estousujeito à ação de penhor, poderei ajuizar uma ação. Pois se a culpa é ausente,

vê-se sem dúvida que a ação compete ao dono, a qual não compete ao credor,sentença que também aprova Pompônio no livro décimo a Sabino.

Os mesmos dizem que se dois escravos forem roubados ao mesmo tempo,compete ao credor a ação de furto a nome de um e do outro, mas não no todo,e sim pela parte que, dividido o que lhe é devido em cada um, é do seu inte-resse; mas roubados os dois separadamente, se conseguir a totalidade anome de um, não conseguirá nada do outro.

A obra e o tempoUm dos legados mais perenes da civilização romana é o direito. O direito romano teve

origem nos costumes (morēs) nos tempos mais antigos da Cidade e o primeiro código de leis

foram as chamadas Leis das Doze Tábuas (Duodĕcim Tabulārum Lēgēs), que remontam aos

anos de 451 e 450 a.C. Os romanos não produziram uma obra com a mesma oficialidade até

meados do século V d.C., quando Teodósio II, imperador no oriente, promulgou um código

em que se coligiam constituições imperiais desde o governo de Constantino. O Código Teodo-

siano, como é chamado, entrou em vigor em 438 no oriente e no ano seguinte no ocidente.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 96/153

 

94LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Já após a queda do Império Romano no ocidente, Alarico II, rei dos visigodos, fez com-

pilar o direito romano a partir do Código Teodosiano e outras fontes, compilação, conhecida

como Breviário de Alarico, promulgada em 506. Algo semelhante foi empreendido durante o

reinado de Justiniano  (527-565), imperador bizantino. Na verdade, algo semelhante, masmuito maior.

Voltando à península Ibérica, o rei Recesvinto revogou o Brevi-

ário de Alarico trocando-o por um código mais abrangente, o qual foi

promulgado em 654 e transmitido sob diversos títulos. A forma caste-

lhana de um desses títulos – Fuero Juzgo, de Forum Iūdĭcum  – nomeou

a tradução que o rei Fernando III de Castela e Leão mandou lavrar em

1241. O seu sucessor, Afonso X o Sábio, promoveu, entre 1256 e 1265,

a composição de duas grandes obras jurídicas: o Fuero Real  e as Siete

Partidas, estas com grande influência do direito romano justinianeu.

Ambas eram usadas como direito subsidiário em Portugal, se bem que

à medida que a universidade portuguesa foi consolidando-se, foi-se

preferindo o estudo direto do corpo justinianeu ou por meio de glosas

e comentários. A própria difusão do direito romano justinianeu dera-

se a partir da Universidade de Bolonha, na Itália, no século XII.

Com efeito, em Portugal, além do Código Visigótico, eram fon-

tes do direito as leis gerais que os reis promulgavam e o costume. Tal

variedade demandou, então, a compilação de um código próprio, oqual foi acabado em 1446, no reinado de Dom Afonso V, daí chamadas

Ordenações Afonsinas, as quais foram revistas e refundidas durante o

reinado de Dom Manuel I. A versão publicada em 1521 é conhecida,

pois, como Ordenações Manuelinas. Enfim, levou-se a cabo outra re-

forma no reinado de Filipe I (II de Castela e Leão), a qual saiu em 1603,

quando já reinava Filipe II (III de Castela e Leão), daí chamadas Orde-

nações Filipinas. O direito romano justinianeu permaneceu como

fonte subsidiária desde as Ordenações Afonsinas.

No Brasil, as Ordenações Filipinas vigoraram até 1916, quando se promulgou o nosso

primeiro Código Civil, que continuou fiel à tradição jurídica portuguesa, embora tenha rece-

bido influências dos códigos civis francês de 1804 e alemão de 1896, alicerçados, à sua vez,

em grande medida sobre o direito romano justinianeu.

Em outras palavras, seja através da lenta evolução do direito romano vulgar misturado

aos direitos germânico e canônico até as Ordenações Filipinas, seja através do uso subsidiário

do direito romano justinianeu, seja através das influências dos códigos civis francês e alemão 

sobre o nosso de 1916, o direito brasileiro é fundamentalmente romano! 

Figura 23 - Ordenações Filipi-nas.

Figura 24 – Edição de 1512 doCorpus Iūris Cīuīlis.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 97/153

 

95LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

O texto citado são dois parágrafos do título II do livro XLVII do Digesto, que é a segunda

parte do Corpus Iūris Cīuīlis ‘Corpo de Direito Civil’, como é conhecida a grande obra jurídica

de Justiniano desde o século XVI. A primeira parte é o Cōdex Iūstīniānus ‘Código Justiniano’,

composto de doze livros nos quais se compilaram constituições imperiais desde o governo deAdriano. O Digesto ou Pandectas compõe-se de cinquenta livros nos quais se coligiram opini-

ões de jurisconsultos desde os tempos da República. Seguem-se-lhe as Īnstitūtiōnēs ‘Institui-

ções’, quatro livros que conformam um manual para a aprendizagem do direito.

Gramática

Leiamos o texto original:

Īdem scrībit, sī, cum mihi decem dēbērentur, seruus pignōrī dātus subtractussit, sī actiōne furtī consecūtus fuĕrō decem, non competĕre mihi furtī ac-

tiōnem, sī itĕrum subripiātur, quia desĭit mea int eresse, cum semel sim con-secūtus. Hoc ita, sī sine culpā meā subripiātur: nam sī culpā meā, quia intĕrest

eō quod tenĕor pignerāticĭā actiōne, agĕre potĕrō. Quod sī culpa abest, sine

dubĭō domĭnō competĕre actĭō uidētur, quae crēditōrī non compĕtit. Quam

sent entĭam Pompōnĭus quoque lībrō decĭmō ad Sabīnum probat. 

Īdem dīcunt, et sī duō seruī subreptī sint simul, competĕre utrīusque nōmĭne

furtī actiōnem crēditōrī, sed non in tōtum, sed prō quā parte, in singŭlōs

dīuīsō eō quod eī dēbētur, eius intĕrest: sēparātim autem duōbus subreptīs,

sī ūnīus nōmĭne sōlĭdum consecūtus sit, alterīus nihil consequētur. 

Observe as sentenças seguintes:

1.  Cum semel consecūtus sim, mea interesse desĭit. 2.

 

Pompōnĭus quam sententĭam lībrō decĭmō ad Sabīnum quoque probat.3.

 

Sī duō seruī simul subreptī sint, actiōnem furtī crēditōrī nōmĭne utrīus-

que competĕre, sed non in tōtum, sed prō parte quā, in singŭlōs dīuīsō

eō quod eī dēbētur, eius intĕrest. 4.

 

Duōbus  autem sēparātim subreptīs, sī sōlĭdum nōmĭne ūnīus  con-secūtus sit, nihil alterīus consequētur. 

Em português:

1. 

Por já ter conseguido uma vez, cessou o meu interesse. 2.  Pompônio aprova também essa sentença no livro décimo a Sabino. 3.  Se dois servos forem roubados ao mesmo tempo, a ação de furto com-

pete ao credor a nome de um e do outro, mas não no todo, e sim pelaparte que, dividido em cada um o que lhe é devido, é do seu interesse.  

4.  Mas roubados os dois separadamente, se conseguir a totalidade a nomede um, não conseguirá nada do outro. 

Perceba que em latim não havia somente palavras que quantificavam com precisão

outras, como duō em 3, e que assinalavam o lugar de algo em uma série, como d ecĭmō em 2,

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 98/153

 

96LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

palavras que temos igualmente em português, as quais têm os nomes técnicos de numerais

cardinais e numerais ordinais, que respondiam respectivamente às perguntas Quot?  ‘Quan-

tos?’ e Quotus?  ‘Qual?’. Mas havia também palavras que assinalavam como algo se agrupava 

com outras coisas, como singŭlōs, em 3, e que assinalavam quantas vezes acontecia um pro-cesso, como semel , em 1, as quais têm os nomes técnicos de numerais distributivos e nume-

rais adverbiais, que respondiam respectivamente às perguntas Quotēnī?   ‘Quantos para

cada?’ e Quotĭēs?  ou Quotĭēns?  ‘Quantas vezes?’.

Eis o rol dos numerais em latim:

numeraisalgarismo

arábicoalgarismoromano

cardinais ordinais distributivos adverbiais

1 I ūnus   prīmus  singŭlī   semel2 II duō  secundus bīnī   bis3 III três tertius ternī   ter4 IIII ou IV quattŭor   quartus quaternī   quater5 V quīnque  quīntus  quīnī   quīnquĭēs 6 VI sex sextus sēnī   sexĭēs 7 VII septem septĭmus  septēnī   septĭēs 8 VIII octō  octāuus  octōnī   octĭēs 9 VIIII ou IX nouem nōnus  nouēnī   nouĭēs 10 X decem decĭmus  dēnī   decĭēs 11 XI undĕcim  undecĭmus  undēnī   undecĭēs 12 XII duodĕcim  duodecĭmus  duodēnī   duodecĭēs 13 XIII tredĕcim  tertius decĭmus  ternī dēnī   terdecĭēs 14 XIIII ou XIV quattuordĕcim  quartus decĭmus  quaternī dēnī   quaterdecĭēs 15 XV quīndĕcim  quīntus decĭmus  quīnī dēnī   quīndecĭēs  16 XVI sēdĕcim  sextus decĭmus  sēnī dēnī   sexĭēsdecĭēs 17 XVII septemdĕcim  septĭmus decĭmus  septēnī dēnī   septĭēsdecĭēs  18 XVIII duodēuīgintī   duodēuīcēsĭmus   duodēuī cēnī   duodēuīcĭēs  19 XVIIII ou XIX undēuīgintī   undēuīcēsĭmus   und ēuī cēnī   undēuīcĭēs 20 XX uīgintī   uīcēsĭmus  uīcēnī   uīcĭēs 30 XXX trīgintā  trīcēsĭmus  trīcēnī   trīcĭēs 40 XXXX ou XL quadrāgintā  quadrāgēsĭmus  quadrāgēnī   quadrāgĭēs 50 L quīnquāgintā  quīnquāgēsĭmus  quīnquāgēnī   quīnquāgĭēs 60 LX sexāgintā  sexāgēsĭmus  sexāgēnī   sexāgĭēs 70 LXX septuāgintā  septuāgēsĭmus  septuāgēnī   septuāgĭēs 80 LXXX octōgintā  octōgēsĭmus  octōgēnī   octōgĭēs 

90 LXXXX ou XC nōnāgintā  nōnāgēsĭmus  nōnāgēnī   nōnāgĭēs 100 C centum centēsĭmus  centēnī   centĭēs 200 CC ducentī   ducentēsĭmus   ducēnī   ducentĭēs 300 CCC trecentī   trecentēsĭmus   trīcēnī trecentĭēs 400 CCCC ou CD quadringentī   quadringentēsĭmus  quadringēnī   quadringentĭēs  500 D quī n gentī   quīngentēsĭmus   quīngēnī   quīngentĭēs 600 DC sescentī   sescentēsĭmus  sexcēnī   sexcentĭēs 700 DCC septingentī   septingentēsĭmus   septingēnī   septingentĭēs  800 DCCC octingentī   octingentēsĭmus   octingēnī   octingentĭēs  900 DCCCC ou CM nōngentī   nōngentēsĭmus   nōngēnī   nōngentĭēs 1.000 M mīll e mīllēsĭmus  singŭla mīlĭa  mīllĭēs 2.000 MM duo mīlĭa  bis mīllēsĭmus  bīna mīlĭa  bis mīllĭēs 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 99/153

 

97LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Veja que o sistema numérico romano era decimal. Os nomes dos números de 1 a 10

eram os primitivos e os dos demais eram derivados desses, com uma particularidade em re-

lação ao português: a antepenúltima e a penúltima unidades eram expressas por diminuição,

por exemplo duodēuīgintī   ‘dezoito’, undēuīgintī   ‘dezenove’; duodētrīgintā  ‘vinte e oito’,undētrīgintā ‘vinte e nove’.

É possível identificar alguns morfemas nos nomes derivados dos números:

  Nos cardinais,

o  a dezena  era expressa por -gintā  (tri gintā, quadragintā, quīn-

quāgintā...), e -gintī  no caso de uī gintī ,

o  e a centena, por -cent- (ducent  ī , trecent  ī , sescent  ī ), ou -gent- após con-

soante nasal (quadringent  ī , quīngent  ī , septingent  ī ...);

 

os ordinais,o  por -t- (quar t us, quīnt us, sex t us),

o  -o- (septĭmus, octāuus, nōnus, decĭmus)

o  ou -ēsĭm- (uicēsĭmus, trīcēsĭmus, quadrāgēsĭmus...);

  os distributivos, por -( ē )n- (bī n ī , trī n ī , uīcēn ī , trīcēn ī ...);

  os adverbiais por - ĭēs (quīnqu ĭēs, sex  ĭēs, sept  ĭēs...).

Enfim, observe na sentença 4 que os números duōbus e ūnīus têm terminações carac-

terísticas da declinação. Efetivamente, duōbus está no ablativo (desinência -bus dos temas

em -i-, -u-, -e- e consoante) e ūnīus, no genitivo (desinência - īus dos demonstrativos e indefi-

nidos). Dos cardinais até ducentī , apenas ūnus, duo e trēs declinavam-se:

declinação do numeral ūnus 

gênerocaso

nominativo acusativo dativo ablativo genitivomasculino ūnus  ūnum 

ūnī  ūnō 

ūnīus neutro ūnum feminino ūna  ūnam  ūnā 

declinação do numeral duo 

gênerocaso

nominativo acusativo dativo ablativo genitivomasculino duo duōs 

duōbus  duōrum neutro

feminino duae duās  duābus  duārum 

declinação do numeral trēs 

gênerocaso

nominativo acusativo dativo ablativo genitivomasculino

trēs tribus triumfeminino

neutro tria

Perceba que ūnus se declinava como um indefinido no singular, duo meio como umtema em -o- meio como um tema em -i- no plural e trēs como um tema em -i- no plural.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 100/153

 

98LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Os numerais cardinais de ducentī  a nōngentī , bem como os distributivos, declinavam-

se como adjetivos triformes no plural. Os ordinais também se declinavam como adjetivos tri-

formes, mas apresentavam as formas tanto do singular como do plural.

Enfim, quanto à função sintática, os numerais cardinais, ordinais e distributivos de-sempenhavam as funções do nome (substantivo e adjetivo), como se fossem pronomes de-

monstrativos ou indefinidos. Os adverbiais, como o nome sugere, funcionavam como adjunto

adverbial, se bem houvesse dois sufixos que formavam nomes correspondentes a eles: -pl-,

declinado como um adjetivo triforme, e - plĭc- , declinado como um adjetivo uniforme, por

exemplo sim pl us, du pl us, tri  pl us etc., que significam ‘que tem uma vez a medida de’, ‘quem

tem duas vezes a medida de’, ‘que tem três vezes a medida de’, e sim plex , du plex , tri  plex  etc.,

que significam ‘que tem uma parte’, ‘que tem duas partes’, ‘que tem três partes’.

Aprofundando a reflexãoComo os romanos ordenavam o tempo? Pesquise sobre como expressaram as horas do dia, os dias dasemana, os dias do mês e os meses do ano ao longo da sua história. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 101/153

 

99LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Resumo do estudo da declinaçãoComo vimos desde o início do estudo da declinação, ela não é nenhum fenômeno exó-

tico, mas um mecanismo que continua presente na gramática do português e de outras lín-

guas românicas: cada vez que dizemos eu te amo, declinamos o pronome pessoal de primeira

pessoa no caso reto e o de segunda pessoa, no caso oblíquo. A diferença do latim é que a

extensão desse mecanismo era mais ampla. Enquanto em português conservam-se apenas

dois casos (reto e oblíquo) nos pronomes, em latim havia seis (nominativo, acusativo, dativo,

ablativo, genitivo e vocativo), presentes nos substantivos, adjetivos e pronomes.

Como acontece em toda língua usada por um povo, os valores dos casos latinos esta-

vam grandemente sujeitos à contingência do uso. Não obstante, é possível discernir a função

fundamental de cada um. Relembremo-las:

  o nominativo é o caso do sujeito,

  o acusativo é o caso do objeto direto,

  o dativo é o caso do objeto indireto,

  o ablativo é o caso do complemento oblíquo,

  o genitivo é o caso de certos adjuntos e complementos nominais,

  o vocativo é o caso da interpelação ao interlocutor.

Cada um era expresso por certo morfema, que podia apresentar variações e ser com-

partilhado por outro(s) caso(s). Essas variações eram selecionadas pela vogal temática  do

substantivo. Havia cinco vogais temáticas: -a-, -o-, -i-, -u- e -e-, além de uma subclasse de subs-

tantivo atemáticos, semelhantes e misturados com os substantivos de tema em -i-.

A declinação dos adjetivos funcionava exatamente como a dos substantivos. Os adje-

tivos podiam ser triformes, biformes ou uniformes. Os primeiros tinham uma forma mascu-

lina, outra feminina e uma terceira neutra, e declinavam-se respectivamente como um subs-

tantivo masculino com tema em -o-, como um com tema em -a- e como um neutro com tema

em -o-. Os segundos tinham uma forma comum masculina e feminina e outra forma neutra,

e declinavam-se como um substantivo com tema em -i-. Os terceiros tinham uma forma co-

mum aos três gêneros e declinavam-se como um substantivo com tema em consoante. Aúnica particularidade do adjetivo é a flexão de grau, mais especificamente nos graus compa-

rativo e superlativo de superioridade.

Quanto à declinação dos pronomes, as formas dos pronomes pessoais são bem dife-

rentes dos morfemas casuais nominais, de modo que é preciso aprendê-las à parte. Já os pos-

sessivos, declinavam-se exatamente como um adjetivo triforme, enquanto os demonstrati-

vos tinham pequenas particularidades em alguns casos, particularidades que crescem um

pouco ao passarmos aos relativos.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 102/153

 

100LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Convém lembrar que a declinação, que é um mecanismo morfológico, repercutia sen-

sivelmente na sintaxe. O fato de que a função sintática da palavra estava marcada na sua

própria forma proporcionava uma liberdade considerável de colocação dos constituintes da

sentença. Talvez mais que a declinação em si, essa ordem bem mais livre seja o que há de maisdifícil na aprendizagem do latim, daí ser imprescindível não só compreender o funcionamento

da declinação, mas também prestar atenção ao mecanismo da concordância.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 103/153

 

101LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

INTRODUÇÃO À CONJUGAÇÃO

Acabei o resumo do capítulo anterior falando da necessidade de o aprendiz de latim

atentar para o mecanismo da concordância. Isto porque os constituintes da sentença latina

podiam ser colocados em uma ordem bem diferente das possibilidades com as quais estamos

acostumados em português. Assim, tendo compreendido o mecanismo da declinação, você já

sabe que o sujeito de um verbo era flexionado normalmente no caso nominativo, mas, além

disso, o verbo costumava concordar em número e pessoa com o seu sujeito. Na verdade, o

verbo não só aponta para o seu sujeito por meio da concordância, mas também para os seus

argumentos por meio da regência, isto é, se demanda um objeto direto (nome ou pronome

no caso acusativo), um objeto indireto (nome ou pronome no caso dativo) ou um comple-mento oblíquo (nome ou pronome no caso ablativo).

O conteúdo do presente capítulo é, precisamente, o verbo  latino, e o seu escopo é

compreender como ele se estruturava e como funcionava. Trata-se de uma matéria relativa-

mente mais singela para o luso-falante, porque enquanto a declinação é um mecanismo resi-

dual na gramática do português, o verbo português guarda muitos elementos do verbo latino,

de modo que o estudo deste causa menos estranheza. Não obstante, continuaremos a em-

pregar o método de partirmos do que já sabemos  – a nossa língua  –, e daí transitar para a

língua latina.

AquecimentoQuase toda a literatura latina é, de algum modo, uma imitação da literatura grega. Mais que isso, imitaré verdadeiramente um preceito do fazer literário entre os gregos e os romanos antigos. Não obstante,imitar não era nenhum demérito, pois o seu entendimento da imitação era diferente do que temos hoje.Pesquise, pois, sobre o conceito de imitação na literatura greco-latina e escreva um resumo sobre essapesquisa. As seguintes palavras-chave podem ajudá-lo: imitātĭō  (‘imitação’), aemulātĭō  (‘emulação’) eingenĭum (‘engenho’).

Leia o texto a seguir: 

[...]Calidoro – Dize-me, peço por Hércules, verdadeiramente o que te pergunto: não tens tu à venda a mi-nha amiga Fenício?Balião – Por Pólux, certamente não a tenho, pois já a vendi há algum tempo.Cal. – Como?Bal. – Sem enfeites, com todas as entranhas.Cal. – Vendeste tu a minha amiga?Bal. – Com certeza, por vinte minas.Cal. – Por vinte minas?

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 104/153

 

102LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Bal. – Ou, se queres, quatro vezes cinco minas, aum soldado macedônio, e já tenho quinze minas.Cal. – O que eu ouço de ti?Bal. – Que a tua amiga tornou-se de prata.

Cal. – Por que ousaste fazer isso?Bal. – Deu-me vontade, foi minha.Cal. – Ô, Pséudolo, ei, traze uma espada.Pséudolo – Qual é a necessidade de uma espada?Cal. – Para que eu mate este e a mim.Pséud. – Por que não matas tu antes a ti? Pois a este logo terá matado a fome.Cal. – O que dizes, mais perjuro dos homens? Não juraste que não te despunhas a vendê-la senão amim?Bal. – Confesso-o.Cal. – Com palavras juradas, naturalmente.Bal. – Costuradas também, certamente.Cal. – Perjuraste, trapaceiro.Bal. – Mas guardei a prata dentro da bolsa. Eu, trapaceiro, agora posso abastecer a minha casa de prata;tu, que és justo, que nasceste dessa raça, não tens dinheiro.Cal. – Pséudolo, fica de lado e carrega-o de xingamentos.Pséud. – É. Não correrei tão depressa ao pretor para me alforriar!Cal. – Lança muitas coisas más.Pséud. – Agora eu te difamarei com as minhas palavras, desavergonhado.Bal. – Assim seja.Cal. – Trapaceiro.Bal. – Dizes a verdade.

Pséud. – Vigarista.Bal. – Por que não?Cal. – Violador de túmulos.Bal. – Certamente.Pséud. – Patife.Bal. – Muito bom trabalho.Cal. – Espertalhão.Bal. – Minhas são essas coisas.Pséud. – Parricida.Bal. – Continua tu.Cal. – Sacrílego.Bal. – Confesso-o.Pséud. – Perjuro.Bal. – Prevedes coisas velhas.Cal. – Fora da lei.Bal. – Sem dúvida.Pséud. – Perdição dos jovens.Bal. – Muito vigorosamente.Cal. – Ladrão.Bal. – Bravo!Pséud. – Fujão.

Bal. – Viva!Cal. – Charlatão.

Figura 25 - Teatro de Emérita Augusta, província da Lusitânia, hoje Mé-rida, Espanha. 

Figura 26 - Mosaico figurando as máscaras que representama tragédia e a comédia (século II d.C.).  

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 105/153

 

103LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Bal. – Muito claramente.Pséud. – Pilantra.Cal. – Impuro.Pséud. – Rufião.

Cal. – Estrume.Bal. – Cantores francos.Cal. – Açoitaste o teu pai e a tua mãe.Bal. – E também os matei antes que lhes fornecer comida. Acaso errei?Pséud. – Lançamos palavras em uma vasilha furada, embromamos trabalho.Bal. – Por ventura ainda quereis dizer outra coisa?Cal. – Há algo que te envergonhe?Bal. – Não tu de vir ser um amador desprevenido como uma noz vazia? Mas apesar das muitas palavrasmás que me dissestes, se o soldado não me tiver trazido hoje as cinco minas que deve, assim como foicombinada, este dia, a soma para essa prata, se não o trouxer, acho que eu posso fazer o meu ofício.[...] 

O homem e o tempo

Este texto faz parte da comédia Pseudŏlus, de Plauto, a qual foi encenada pela primeira

vez em 191 a.C. O filólogo italiano Giacomo Devoto na sua Storia della lingua di Roma (1940)

chama idade de Cícero ao tempo em que floresceu a literatura latina clássica  e idade de

Plauto ao tempo anterior. Tito Máccio Plauto é, efetivamente, o maior escritor da literatura

latina antiga.

Cabe lembrar que a própria literatura latina começou com uma comédia. Os próprios

historiadores romanos dataram as primeiras manifestações teatrais em Roma dos anos de 365

e 364 a.C., quando se importaram uns lūdī scaenĭcī  ‘jogos cênicos’ da Etrúria para rogar a pāx

deōrum ‘paz dos deuses’, em razão de uma peste que assolava a Cidade. Esses jogos teriam

evolvido para a satŭra, que misturava música, dança e canto, mas foi em 240 a.C. que se en-

cenou a primeira fābŭla, ou seja, peça teatral com um argumento, obviamente de gosto grego,

e que foi, precisamente, uma comédia de Lívio Andronico.

Da vida de Plauto muito pouco se sabe. Talvez tenha nascido na Úmbria, provavel-

mente em 254 a.C., e parece ter morrido com setenta anos, ou seja, em 184 a.C. Certo é que

a obra de Plauto logrou tal sucesso que logo se difundiram dezenas de comédias espúrias. Já

Varrão (116-27 a.C.), o grande polígrafo da latinidade, procurou discernir quais desses textos

eram genuínos, do que estabeleceu um cânone de vinte e uma peças: Amphitrŭō ‘Anfitrião’,

 Asinārĭ a ‘A comédia dos asnos’, Aululārĭ a ‘A comédia da panelinha’, Bacchĭdēs ‘As báquides’,

Captīuī  ‘Os prisioneiros’, Casĭ na ‘Cásina’, Cistellārĭ a ‘A comédia da cestinha’, Curculĭō ‘O gor-

gulho’, Epidĭ cus ‘Epídico’, Menaechmī  ‘Os Menecmos’, Mercātor  ‘O mercador’, Mīlēs glōriōsus 

‘O soldado fanfarrão’, Mostellārĭ a ‘A comédia do fantasma’, Persa ‘O persa’, Poenŭlus ‘O car-

taginesinho’, Pseudŏlus  ‘Pséudolo’, Rudens  ‘A amarra’, Stichus  ‘Estico’, Trinummus  ‘As três

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 106/153

 

104LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

moedas’, Truculentus ‘Truculento’, Vīdulārĭ a ‘A comédia da mala’. Todas essas obras são co-

médias do tipo palliāta, isto é, de personagens e cenário gregos (a comédia de personagens e

cenário romanos era a togāta; um e o outro termos referem-se à vestimenta: o pallĭum grego

e a toga romana), e chegaram-nos em estado aceitável de conservação.Quanto ao Pseudŏlus, é considerado uma das melhores comédias de Plauto, senão a

melhor. O argumento da peça não contém nada de muito diferente do que se criava em outras

obras do gênero: um moço anseia o amor de uma prostituta, mas topa com a oposição do pai 

e o embaraço de um rufião; os dois são ajudados, então, por um jovem escravo, que burla o

rufião com a sua esperteza. O brilho de Plauto não está no quê, mas no como, na maneira

como desenvolve o argumento.

Se bem o trecho citado serve bem ao estudo do conteúdo gramatical deste capítulo,

talvez não deixe ver tão bem a verve cômica do autor. Para você ter uma ideia dela, a peçacomeça com um diálogo entre Pséudolo, o escravo astuto que dá título à obra, e Calidoro, o

rapaz apaixonado, que lhe mostra uma carta de Fenício, a escrava meretriz. Contrapondo-se

às falas de Calidoro, que são muito chorosas, quando Pséudolo pega a carta diz que as letras

almejam crias, porque uma trepa na outra (“quaerunt littĕrae hae sibi lībĕros: / alĭa alĭam

scandit”), ao que Calidoro responde perguntando-lhe por que fala impiedosamente de umas

letras lindas, riscadas em umas tabuinhas lindas com uma mão linda ( “Cūr inclēmenter dīcis

lepĭdīs littĕrīs / lepĭdīs tabell īs lepidā cōnscrīptīs manū?”), ao que Pséudolo retruca se as gali-

nhas têm tais mãos (“An, obsĕcrō hercle, habent quās gallīnae manūs?”). O texto inteiro está

cheio de chistes como este, que se ainda são engraçados depois de tantos séculos, deviamdivertir muitíssimo a plateia de então.

A carta de Fenício informara a Calidoro que o seu dono, Balião, a tinha vendido a um

soldado macedônio por vinte minas (a mina era uma moeda de prata, equivalente a cem drac-

mas), das quais faltavam cinco para fechar o negócio. Um servo do soldado, reconhecível por

portar uma carta com o selo dele, traria a quantia restante e levaria a moça. Calidoro e Pséu-

dolo vão, então, falar com Balião, que em meio a muitas queixas, ameaças e maus tratos,

encarregava a sua escravaria dos preparativos para celebrar o seu aniversário, mas como Ca-

lidoro já não podia pagar o preço de ficar com Fenício, Balião não quer falar com ele. É nessacena que ocorre a conversa citada acima, após a qual Pséudolo promete desfazer o revés.

Pensando, então, em como o faria, encontra Simão, seu dono e pai de Calidoro, a quem não

só confessa o caso do filho, mas com quem aposta o mesmo valor de vinte minas.

Pséudolo acha o meio de levar o seu intento a cabo quando topa com o servo do sol-

dado, de nome Hárpax, diante da casa de Balião. Finge ser um escravo deste, e com tal em-

buste convence Hárpax a entregar-lhe a carta selada para fechar o negócio sob a promessa de

ir chamá-lo na hospedaria para pagar as cinco minas quando Balião voltasse para casa.

Quando Pséudolo encontra Calidoro com um amigo, pede-lhes que arranjassem uma pessoa

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 107/153

 

105LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

esperta que não fosse conhecida na cidade, petrechos de soldado e também as cinco minas,

que são emprestadas a Calidoro pelo seu amigo.

Arranjado o sujeito, Pséudolo concerta com ele o ardil. Ele vai à casa de Balião, a quem

consegue enganar passando-se por Hárpax: leva Fenício e entrega-a a Calidoro. Balião vanglo-ria-se para Simão e chega a apostar com ele vinte minas que Pséudolo não o burlaria. En-

quanto isso, Hárpax, cansado de esperar, vem à casa de Balião, mas tanto este como Simão o

tomam como um impostor a serviço de Pséudolo. Depois de se dar conta de que fora mesmo

tapeado, o rufião teve de devolver as quinze minas do soldado e pagar as vinte que apostara

com Simão. A peça acaba quando Pséudolo volta bêbado para casa após festejar o seu sucesso

e recebe as vinte minas que lhe devia Simão.

Gramática

Avancemos agora para o conteúdo gramatical. Comecemos por retirar do texto todos

os verbos conjugados, ordenados pelo tempo em que estão:

Presentedo indicativo

Futuro imperfeitodo indicativo

Pretérito perfeitodo indicativo

Futuro perfeitodo indicativo

o confesso, ouço, peço, pergunto, posso, tenhoo dizes, és, matas, que-

res, tenso

 

deve, éo embromamos, lança-

moso 

 prevedes, quereiso são

correrei, difamarei

errei, guardei, matei,vendi

o açoitaste, juraste,

nasceste, ousaste, perju-raste, vendeste

o deu, foi, tornou-seo 

dissestes

terá matado

Presentedo subjuntivo

Futuro imperfeitodo subjuntivo

Futuro perfeitodo subjuntivo

Imperativoafirmativo

envergonhe, mate trouxer tiver trazidocarrega, continua, dize,

 fica, lança, traze

Veja nas formas contidas no quadro do presente do indicativo que para o sujeito de

cada pessoa do discurso acrescenta-se uma terminação diferente ao verbo:

  -o (confesso, ouço, peço, pergunt o, posso) se da primeira pessoa do singular;

  -s (dizes, és, matas, queres, tens) se da segunda pessoa do singular;

  zero (deve, é) se da terceira pessoa do singular;

  -mos (embromamos, lançamos) se da primeira pessoa do plural;

  -des ou -is ( prevedes, quereis) se da segunda pessoa do plural;

  um ditongo nasal (são) se da terceira pessoa do plural.

Essas terminações exprimem, pois, a pessoa (primeira, segunda ou terceira) e o nú-

mero (singular ou plural) do sujeito do verbo, daí o seu nome técnico: desinências número-

 pessoais.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 108/153

 

106LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

No entanto, quando trocamos no significado do verbo o processo não acabado pelo

processo acabado, usam-se outras desinências número-pessoais:

  -i  (errei , guardei , matei , vend i ) se na primeira pessoa do singular;

 

-ste (açoitaste, juraste, nasceste, ousaste, perjuraste, vendeste) se na segundapessoa do singular;

  -u (deu, tornou, mas foi , com -i ) na terceira pessoa do singular;

  -stes (dissestes) na segunda pessoa do plural.

Em outros casos, a diferença entre o processo não acabado e o acabado é estabelecida

por outra construção: o verbo ter  conjugado e o particípio do verbo que exprime o processo

que se quer: confronte correrei  e difamarei , processos não acabados, e terá matado, processo

acabado, assim como trouxer , processo não acabado, e tiver trazido, processo inacabado. A

diferença entre o processo não acabado e o acabado tem o nome técnico de aspecto.

Além da pessoa, número e aspecto, formas como dizes e dissestes opõem-se por o

processo que exprime a primeira acontecer no mesmo tempo da enunciação, enquanto a se-

gunda exprime um processo em um tempo anterior ao da enunciação, que pode ser também

posterior, como correrei  e difamarei . Essa outra distinção chama-se tempo, que não se con-

funde com o aspecto: nem todo processo não acabado é presente ou futuro nem todo aca-

bado é passado. Basta atentar para a forma terá matado, cujo aspecto é acabado, mas o

tempo é futuro.

Agora observe esta passagem da conversa:

Calidoro – Ô, Pséudolo, ei, traze uma espada.

Pséudolo – Qual é a necessidade de uma espada?Calidoro – Para que eu mate este e a mim.Pséudolo – Por que não matas tu antes a ti? Pois a este logo terá matado a fome.

Perceba que o falante não faz a mesma avaliação do que se diz nas sentenças nuclea-

das pelos verbos em negrito. Na primeira, nucleada por traze, ele avalia-o como necessário,

tanto que se trata de uma ordem. Na segunda, nucleada por mate, ele avalia-a como irreal,

possível, tanto que se trata de um desejo. Na terceira, nucleada por matas, ele avalia-a como

real, tanto que se trata de uma asserção. O nome técnico desse fenômeno é modo.

Veja, enfim, em formas como correrei  e difamarei , que o elemento que exprime o

tempo e modo são os mesmos: -re- assinala ao mesmo tempo que o verbo está no futuro e

no indicativo, daí chamar-se desinência modo-temporal .

Para acabar, é bastante frequente a desinência número-pessoal ou a modo-temporal 

não poderem agregar-se diretamente à raiz do verbo, por exemplo: *dizs ou *lançmos não

seriam vocábulos fonologicamente possíveis na língua portuguesa. Para evitar esse problema,

insere-se, então, uma vogal nesse espaço: dizes, lançamos. Três vogais são usadas com esseescopo: -a-, -e- e -i-, as quais sofrem, à sua vez, algumas variações.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 109/153

 

107LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Como estudamos nos capítulos dedicados à declinação, os gramáticos antigos não sa-

biam fazer uma análise em constituintes mínimos como a que acabamos de desenhar, mas

tomavam uma palavra como modelo para flexionar outras do mesmo tipo. Assim, do mesmo

modo que a vogal que se põe entre a raiz e a desinência número-casual dos nomes serviu decritério para criar cinco grupos denominados declinações, a vogal que se põe entre a raiz e a

desinência número-pessoal ou modo-temporal dos verbos serviu de critério para criar as con-

 jugações. E também nos verbos o conjunto da raiz mais essa vogal tem o nome de tema e à

própria vogal chama-se vogal temática. Como se sabe, em português há três conjugações: a

primeira é a dos verbos com tema em -a-, como pergunta-; a segunda é a daqueles com tema

em -e-, como dize-; a terceira é a daqueles com tema em -i-, como ouvi-.

Entendidas estas coisas, vamos agora ao latim. Eis o original de Plauto:

Calidōrus – Dīc mihi, obsĕcrō hercle, uērum sērĭō hoc quod tē rogō. Non habēs uēnālem amīcam tū meam Phoenīcĭum? Ballĭō – Non edĕpol habĕō profectō, nam iam prīdem uendĭdī.  Cal. – Quō modō? Bal. – Sine ōrnāmentīs, cum intestīnīs omnĭbus. Cal. – Meam tū amīcam uendidistī? Bal. – Valdē, uīgintī minīs. Cal. – Vīgintī minīs? Bal. – Vtrum uīs, uel quater quinīs minīs, mīlĭtī Macedonĭō, et iam quīndĕcim habĕō minās. Cal. – Quid egō ex tē audĭō? Bal. – Amīcam tuam esse factam argentĕam. Cal. – Cūr id ausu’s facĕre? Bal. – Libŭit, mea fuit. Cal. – Eho, Pseudŏle, ei, gladĭum adfer. Pseudŏlus – Quid opus gladĭō? Cal. – Quī hunc occīdam atque mē. Pseud. – Quīn tū tēd occīdis potĭus? Nam hunc famēs iam occīdĕrit. 

Cal. – Quid ais, quantum terra [...] tegit homĭnum periūrissŭme? Iūrāuistīn tē illam nūllī uenditūrum nisi mihi? Bal. – Fatĕor. Cal. – Nempe conceptīs uerbīs? Bal. – Etĭam cōnsūtīs quoque. Cal. – Periūrauīstī, sceleste. Bal. – At argentum intrō condĭdī. Egō scelestus nunc argentum promĕre possum domō: tū quī pius, istoc es genĕre gnātus, nummum non habēs. Cal. – Pseudŏle, adsiste altrim secus atque onĕra hunc maledīctīs. Pseud. – Licet.Numquam ad praetōrem aequē cursim curram, ut ēmittar manū.  Cal. – Ingĕre mala multa. Pseud. – Iam egō tē diffĕram dīctīs meīs. Impudīce. Bal. – Itast. Cal. – Sceleste. Bal. – Dīcis uēra. Pseud. – Verbĕrō. 

Bal. – Quīppĭnī? Cal. – Bustirăpe. Bal. – Certō. Pseud. – Furcĭfer. Bal. – Factum optŭme. Cal. – Sociofraude. Bal. – Sunt mea istaec. Pseud. – Parricīda. Bal. – Perge tū. Cal. – Sacrilĕge. Bal. – Fatĕor. Pseud. – Periūre. Bal. – Vetĕra uāticinamĭnī. Cal. – Lēgirŭpa. Bal. – Valĭdē. Pseud. – Permitĭēs adulēscentum. Bal. – Acerrŭme. Cal. – Fūr. Bal. – Babae. Pseud. – Fugitīue. Bal. – Bombax. Cal. – Fraus popŭlī. Bal. – Plānissŭme. Pseud. – Fraudulente. Cal. – Impūre. Pseud. – Lēnō. Cal. – Caenum. Bal. – Cantōrēs probōs. Cal. – Verberāuistī patrem atque mātrem. Bal. – Atque occīdī quoque, potĭus quam cibum praehibĕrem: num peccāuī quīppĭam? Ps. – In pertūsum ingerĭmus dīcta dōlĭum, opĕram lūdĭmus. Bal. – Numquid alĭud etĭam uoltis dīcĕre? Cal. – Ecquid tē pudet? Bal. Tēn, amātōrem esse inuentum inānem quasi cassam nucem?

Vērum quamquam multa malaque dīcta dīxistis mihi,nisi mihi hodĭē attulĕrit mīlēs quīnque quās dēbet minās, 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 110/153

 

108LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

sīcut haec est praestitūta summa eī argentō diēs, sī id non adfert, posse opĭnor facĕre mē officĭum meum. 

A disposição do texto original é diferente porque está escrito em versos, e um mesmo

verso podia estar composto de falas de personagens diferentes.

Repitamos o método de análise que aplicamos acima:

Presentedo indicativo

Futuroimperfeito do

indicativo

Pretérito per-feito

do indicativo

Futuroperfeito

do indicativo

Pretéritoimperfeito do

subjuntivo

Imperativoafirmativo

o audĭō, habĕō,obsĕcrō, pos-

sum, rogō o 

dīcis, es,habēs, occīdis,

uīs o

 

adfert, dēbet,est, licet, pudeto ingerĭmus,

lūdĭmus o uoltiso sunt

curram,diffĕram 

o condĭdī, oc-cīdī, peccāuī,

uendĭdī  o iūrāuistī, pe-

riūrāuistī, uen-didistī, uer -berāuistī  

o  fuit, libŭito dīxistis 

attulĕrit, oc-

cīdĕrit    praehibĕrem 

adfer, adsiste,

dīc , ingĕre ,onĕ ra, perge

Todos os fenômenos que observamos anteriormente em português são continuações 

dos mesmos elementos que apresentava o verbo latino, com a vantagem para o estudante

deste de que do latim para o português houve mudanças fonéticas que introduziram variações

na morfologia verbal.

Veja, pois, na coluna do presente do indicativo como as pessoas junto com o número 

se distinguiam:

  a primeira pessoa do singular por -ō ou -m (audĭ ō, habĕō, obsĕcr ō,  possum);

  a segunda pessoa do singular por -s (dīci s, es, habēs, occīdi s, uī s);

  a terceira pessoa do singular por -t  (adfer t , dēbet , est , licet , pudet );

  a primeira pessoa do plural por -mus (ingerĭ mus, lūdĭ mus);

  a segunda pessoa do plural por -tis (uol tis);

  a terceira pessoa do plural por -nt  (sunt ).

Para ficar ainda mais claro, ponhamos essas desinências em um quadro:

desinências número-pessoais

pessoanúmero

singular plural1ª -ō ou -m -mus2ª -s -tis3ª -t -nt

Para traduzir um texto em latim, esses morfemas são os primeiros que o tradutor deve

procurar, pois assinalarão o sujeito do verbo, e, decodificado o verbo, que argumentos esse

verbo selecionava.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 111/153

 

109LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Os aspectos acabado e não acabado que distinguimos no verbo português são igual-

mente herança do verbo latino. Infelizmente, assim como o ensino tradicional do latim se em-

perrou na decoração das declinações, o ensino tradicional do português fez o mesmo com

relação à conjugação: o aprendiz decora a conjugação sem entender como funciona esse me-canismo. Ora, os nossos tempos verbais recebem os nomes de perfeito e imperfeito não por-

que sejam bons e maus tempos... mas porque exprimem respectivamente um processo aca-

bado ou não acabado. Na gramática tradicional latina, o aspecto acabado é denominado, pre-

cisamente, perfectum e o não acabado, infectum. Na linguística moderna, diz-se aspecto per-

 fectivo e aspecto imperfectivo.

Diferentemente do que veio ocorrer em português, em latim a expressão do aspecto 

era sempre marcada morfologicamente, ainda que por meios um tanto diferentes a depender

de cada verbo. No texto citado aparecem quatro das mais comuns: pela desinência -ui-, em

que o -u- às vezes, quando se prendia à vogal temática, era consoante ( peccāuī  / peˈkːaːwiː/,

iūrāui stī  / juːraːˈwistiː/, uerberāui stī  /werberaːˈwistiː/), e às vezes, quando se prendia direta-

mente à raiz, era vogal (libŭi t  / li.bu.it/, f ui t  /f u.it/); pela desinência -si- (dīcsi stis, escrito dīxis-

tis); por um reduplicação de uma consoante da raiz (cond  ĭ d  ī , uend  ĭ d  ī ); por um zero (occīdī ).

Explanemos melhor isto em uma enumeração:

  Desinência -ui- ou -ue-:

o  -u-  consoante  (preso à vogal temática): amāui/e-  (tema ama- 

‘amar’), dēlēui/e- (tema dēl e- ‘destruir’), audī ui/e- (tema audi- ‘ou-

vir’);o  -u- vogal (preso à raiz): uet ŭi/e- (tema ueta- ‘vedar’), docŭi/e- (tema

doce-  ‘ensinar’), col ŭi/e-  (tema col-  ‘cultivar’), aper ŭi/e-  (tema

aperi- ‘abrir’).

  Desinência -si- ou -se-: *augsi/e- > aucsi/e-, escrito auxi/e- (tema aug- ‘au-

mentar’), carpsi/e- (tema carp- ‘colher’), *sent si/e- > sēnsi/e- (tema sent- 

‘sentir’).

  Reduplicação da primeira consoante da raiz: momord- (tema morde- ‘mor-

der’, c uc urr- (tema curr- ‘correr’).

 

Alternância da vogal da raiz: l āu- (tema l ăua- ‘lavar’), u ī d- (tema u ĭ de- ‘ver’),

ēg- (tema ag- ‘agir’), uēn- (tema uĕni- ‘vir’).

  Reduplicação e alternância: stet -  (tema sta-  ‘estar’), c ecī d-  (tema caed- 

‘matar’).

  Zero: feru- (tema ferue- ‘ferver’), uert- (tema uert- ‘verter’).

Além disso, algumas desinências número-pessoais no perfectum eram diferentes da-

quelas no infectum, como, de resto, acontece em português. Na coluna do pretérito perfeito

do indicativo  aparecem quatro: - ī  na primeira pessoa do singular  (condĭdī , occīdī ,  peccāuī ,

uendĭdī ); -stī  na segunda pessoa do singular (iūrāuistī , periūrāuistī , uendidistī , uerberāuistī ), -t  na terceira pessoa do singular (libŭit , fuit ); -stis na segunda pessoa do plural (dīxistis).

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 112/153

 

110LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

desinências número-pessoaisno pretérito perfeito do indicativo 

pessoanúmero

singular plural1ª -ī   -mus

2ª -stī   -stis3ª -t -runt

Quanto aos temas, em latim havia quatro. Em termos tradicionais, isso equivale a dizer

que em latim havia quatro conjugações:

  A primeira era a dos temas em -a-, como ama- ‘amar’;

  a segunda, a dos temas em -e-, como dēle- ‘destruir’;

  a terceira, a dos temas em consoante, como col- ‘cultivar’;

  a quarta, a dos temas em -i-, como audi- ‘ouvir’.

temas verbais ou “conjugações” tema -a- -e- consoante -i-

exemplo ama- dēl e- col- audi-

Os verbos com tema em consoante nem sempre podiam ligar-se diretamente às desi-

nências em um número pequeno de casos, de modo que nesses casos se interpunha uma vo-

gal para tornar possível essa ligação, geralmente um /i/ breve, mas também /e/, breve ou

longo: *cols > colis, *colbās > colēbās, *colrēs > colĕrēs.

Além disso, a desinência número-pessoal -ō sempre assimilava a vogal temática -a- e

a vogal da desinência número-pessoal a que se prendia: *amāō > amō, *amābĭō > amābō, ea vogal /i/ mudava normalmente para /u/ antes da desinência número-pessoal -nt : *colint  >

colunt , *audint  > audiunt .

Entre o tema e a desinência número-pessoal, quando o verbo estava no infectum, e o

desinência aspectual e a desinência número-pessoal, quando o verbo estava no perfectum,

punha-se a desinência que exprimia conjuntamente o tempo e o modo, ou, em outras pala-

vras, a desinência modo-temporal.

Como ainda ocorre em português, o verbo podia exprimir um processo anterior ao ato

de fala, ou pretérito, como em dīxistis; um processo simultâneo ao ato de falta, ou presente,como em dīcis; um processo posterior ao ato de fala, ou futuro, como em curram.

Com relação ao modo, o português não fez também senão manter as distinções que

havia em latim: avaliação real, ou modo indicativo, como em Quīn tū tēd occīdis potĭus? ; ava-

liação irreal, ou modo subjuntivo, como em Quī hunc occīdam atque mē; avaliação necessária,

ou modo imperativo, como em Eho, Pseudŏle, ei, gladĭum adfer .

Em resumo, o verbo latino – assim como o verbo português – era construído pela adi-

ção de morfemas que expressavam as categorias que carregava: aspecto, modo, tempo, nú-

mero e pessoa. Pode-se ilustrar isto pelas fórmulas seguintes:

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 113/153

 

111LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

  Verbo no Infectum: Raiz + Vogal Temática + Desinência Modo-Temporal +

Desinência Número-Pessoal 

  Verbo no Perfectum: Raiz + (Vogal Temática) + Desinência Aspectual + De-

sinência Modo-Temporal + Desinência Número-Pessoal Se o aprendiz fosse ensinado a compreender esse mecanismo, entenderia que o nome

de cada tempo verbal aponta três dessas categorias: quando se diz que um verbo está, por

exemplo, no pretérito perfeito do indicativo, informa-se em que aspecto (perfectivo), em que

modo (indicativo) e em que tempo (pretérito) está. Não se trata de um rótulo vazio.

ExercícioComo o primeiro exercício sobre a declinação, o primeiro exercício sobre a conjugação será com um

texto em português. Trata-se de uma tradução do poema 99 do primeiro livro dos epigramas de Marcial.Identifique todos os verbos conjugados e informe as categorias de cada um (aspecto, modo,tempo, número e pessoa).

Ainda há pouco não tinhas dois milhões inteiros, mas eras tão pródigo e liberal e tão lauto, Caleno, quetodos os amigos te desejavam dez milhões. Ouviu um deus os nossos votos e preces e dentro, acho, desete calendas quatro mortes te deram isto. Porém tu assim, como se os dez milhões não tivessem sidodeixados, mas roubados por ti, foste miserável para tal penúria que os banquetes mais suntuosos, quepreparas uma vez em todo o ano, arranjas com uma mesquinharia de moeda negra, e os teus sete ve-lhos companheiros custamos-te meia libra de chumbo. O que rogamos digno desses méritos? Deseja-mos-te cem milhões, Caleno. Se isto tiver acontecido, perecerás de fome.  

Exemplo de resposta: tinhas  – segunda pessoa do singular do pretérito imperfeito do indicativo, eras  – segunda pessoa do singular do pretérito imperfeito do indicativo, desejavam  – segunda pessoa do pluraldo pretérito imperfeito do indicativo, ... 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 114/153

 

112LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

AS DESINÊNCIAS VERBAIS

AquecimentoPara fazer esta tarefa, você necessitará a colaboração de duas outras pessoas, podem ser parentes,amigos ou colegas. Você e uma dessas duas pessoas descreverão sucintamente a outra pessoa, tantofísica como psicologicamente. Transcreva, então, as duas descrições e redija um texto respondendo àsperguntas seguintes:a) Que semelhanças e diferenças há entre a sua descrição e a do seu colaborador?b) Por que aconteceram diferenças, se as descrições tratam da mesma pessoa?

Leia o texto a seguir: 

Os conspiradores cercaram aquele que estava sentado com a desculpa deuma saudação, e logo Cimbro Tílio, que se encarregara das primeiras partes,achegou-se mais perto como se se dispusesse a pedir algo, mas dispensando-o e adiando-o com um gesto a outro momento, agarrou a sua toga por um dosombros, depois gritou César: “Isso certamente é uma violência!”. O outro dos

Cascas, voltado para o outro lado, fere-o pouco abaixo da garganta. César va-rou o braço arrebatado de Casca com o estilo e tentou escapar, mas foi retidopor outra ferida; como percebeu que era atingido por punhais estreitos detodas as partes, encobriu a cabeça com a toga, ao mesmo tempo desceu coma mão esquerda a prega até a parte mais baixa das pernas, para que caísse

mais honradamente e também com a parte mais baixa do corpo coberta. As-sim, foi furado por vinte e três pancadas, sem ruído, solto um gemido apenasao primeiro golpe, e no entanto alguns contaram que quando Marco Bruto seprecipitava disse: “Kaì s ỳ  téknon? ”. Tendo fugido todos espantados, jazeu por

algum tempo, até que posto dentro de uma liteira, com o braço pendente, trêsescravinhos devolveram-no à casa. E em tantas feridas que se descobriram,como achava o médico Antíscio, nenhuma era letal, a não ser a que receberapela segunda vez no peito. Fora vontade dos conjurados arrastar o corpo domorto até o Tibre, confiscar os seus bens, rescindir os seus atos, mas desisti-ram por medo do cônsul Marco Antônio e do mestre da cavalaria Lépido.

O homem e o tempo

Este texto faz parte da obra Dē uītā Caesărum ‘Sobre a vida dos césares’, de Suetônio.

Nascido provavelmente na província da África em 70 d.C., Gaio Suetônio Tranquilo  é um

grande autor da idade de prata da literatura latina e o seu maior biógrafo, apesar de ter sido

um polígrafo, isto é, um erudito que estudou e escreveu sobre muitos e vários assuntos: sobre

história natural, sobre as relações de parentesco, sobre as vestimentas, jogos e costumes ro-

manos, sobre jogos gregos, sobre xingamentos, sobre cortesãs ilustres, sobre reis. Infeliz-mente, além do Dē uītā Caesărum, que remanesceu quase íntegro, chegou-nos apenas o Dē 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 115/153

 

113LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

uīrīs illūstrĭbus ‘Sobre homens ilustres’, que também é uma coletânea de biografias, estas de

homens de letras, da qual possuímos somente a parte dedicada aos gramáticos e rétores.

Pouco se sabe da vida de Suetônio. A sua família pertencia à ordem equestre e fez uma

boa carreira pública na corte do imperador Adriano sob a proteção do prefeito do pretórioSeptício Claro: primeiro diretor do arquivo imperial, logo das bibliotecas imperiais e depois

da correspondência do imperador em língua latina.

O Dē uītā Caesărum, mais conhecido

como As vidas dos doze césares, contém as

biografias de César e dos onze imperadores

que reinaram depois dele: Augusto, Tibério,

Calígula, Cláudio, Nero, Galba, Oto, Vitélio,

Vespasiano, Tito e Domiciano. Em cada bio-grafia, Suetônio procurou cumprir um es-

quema em que trata seguidamente das ori-

gens familiares, do nascimento, da carreira

política e militar, dos presságios sobre a as-

censão ao poder, do feitio, dos prodígios que prenunciaram a morte, da morte, do testamento

e das homenagens póstumas. Note que o poder é o eixo da biografia.

À diferença do historiador, que põe a atenção sobre os feitos e as façanhas dos grandes

líderes e generais, Suetônio buscou ressaltar o homem: a sua compleição, as suas virtudes e

os vícios, os seus hábitos, a sua vida privada. Daí o gosto de Suetônio pela anedota, muito

bem ilustrado no texto citado pela informação acerca das últimas palavras de César: é o único

testemunho que nos chegou de que o ditador disse  – em grego  – “Καὶ σὺ, τέκνον;”, isto é,

“Até tu, criança?”, frase que incluímos no nosso uso sob a forma Até tu, Brútus? . Marco Júnio

Bruto era filho de Servília, que fora amante de César, daí o carinho deste por esse.

Em Suetônio há, portanto, um esforço por obter a informação inédita, quase como um

 jornalista de hoje, e assim como um texto jornalístico contemporâneo contém muitos dados

sobre o nosso cotidiano, a obra de Suetônio é uma fonte preciosa para conhecer vários as-

pectos da vida na Roma do primeiro século do Império. Ele pintou um verdadeiro retrato decada imperador, habilmente o retrato que quer que nós vejamos.

Gramática

Quanto ao conteúdo gramatical, o texto está cheio de verbos que são bons exemplos

do mecanismo que procuramos destrinçar no capítulo anterior:

Figura 27 - O assassinato de César , de Karl von Piloty (1865).

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 116/153

 

114LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

1.   fere =  fer- (raiz) + -e-  (vogal temática) + ∅ (desinência modo-temporal: pre-

sente do indicativo) + ∅ (desinência número-pessoal: terceira pessoa do singu-

lar);

2. 

achava = ach- (raiz) + -a- (vogal temática) + -va- (desinência modo-temporal:pretérito perfeito do indicativo) + ∅ (desinência número-pessoal: terceira pes-

soa do singular);

3.  varou = var- (raiz) + -o- (variação da vogal temática -a-) + -u (desinência nú-

mero-pessoal distintiva do pretérito perfeito do indicativo: terceira pessoa do

singular);

4.  desceu = desc-  (raiz) + -e-  (vogal temática) + -u  (desinência número-pessoal

distintiva do pretérito perfeito do indicativo: terceira pessoa do singular);

5.  contaram = cont- (raiz) + -a- (vogal temática) + -ram (desinência número-pes-

soal distintiva do pretérito perfeito do indicativo: terceira pessoa do plural)6.  recebera = receb- (raiz) + -e- (vogal temática) + -ra- (desinência modo-tempo-

ral: pretérito mais-que-perfeito do indicativo) + ∅ (desinência número-pessoal:

terceira pessoa do singular)

7.  caísse = ca- (raiz) + -i- (vogal temática) + -sse- (desinência modo-temporal: pre-

térito imperfeito do subjuntivo) + ∅ (desinência número-pessoal: terceira pes-

soa do singular)

Vejamos isto em latim, começando por ler o texto original:

Assidentem cōnspīrātī specĭe officĭī circumstetērunt, ilicōque Cimber Tillĭus,quī prīmās partēs suscēpĕrat, quasi alĭquid rogātūrus propĭus accessit re-

nuentīque et gestum in alĭud tempus differentī ab utrōque umĕrō togam ad-

prehēndit: deinde clāmantem: “Ista quidem uīs est!”. Alter ē Cascīs āuersum

uulnĕrat paulum infrā iugŭlum. Caesar Cascae brachĭum arrēptum graphĭō

traiēcit cōnātusque prōsilīre alĭō uulnĕre tardātus est; utque animaduērtit

undĭque sē strictīs pūgiōnĭbus petī, togā caput obuolŭit, simul sinistrā manū

sinum ad īma crūra dēdūxit, quō honestĭus cadĕret etĭam inferiōre corpŏris

parte uēlātā. Atque ita tribus et uīgintī plagīs confossus est ūnō modō ad

prīmum ictum gemĭtū sine uōce ēdĭtō, etsī trādidērunt quīdam Marcō Brūtō

irruentī dīxisse: “Kaì sù téknon? ”. Exanĭmīs diffugientĭbus cunctīs aliquamdĭū

iacŭit, dōnec lectīcae imposĭtum, dēpendente brachĭō, trēs seruŏlī domum

rettulērunt. Nec in tot uulnerĭbus, ut Antistĭus medĭcus existimābat, lētāle

ūllum repertum est, nisi quod secundō locō in pectŏre accēpĕrat. Fuĕrat

anĭmus coniūrātīs corpus occīsī in Tibĕrim trahĕre, bona pūblicāre, acta res-cindĕre, sed metū Marcī Antōnī consŭlis et magistrī equĭtum Lepĭdī des-

titĕrunt. 

Eis os mesmos verbos:

8.  uulnĕrat  = uulner- (raiz) + -a- (vogal temática) + ∅ (desinência modo-tempo-

ral: presente do indicativo) + -t  (desinência número-pessoal: terceira pessoa

do singular);

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 117/153

 

115LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

9.  existimābat  = existim-  (raiz) + -a- (vogal temática) + -ba- (desinência modo-

temporal: pretérito imperfeito do indicativo) + -t  (desinência número-pessoal:

terceira pessoa do singular);

10. 

traiēcit  = traiic- (raiz) + alternância da vogal da raiz (desinência aspectual: per-fectivo) = traiēc- + -i- (vogal de ligação) + zero (desinência modo-temporal:

pretérito perfeito do indicativo) + -t  (desinência número-pessoal: terceira pes-

soa do singular);

11. dēdūxit  = dēdūc- (raiz) + -s- (desinência aspectual: perfectivo) + -i- (vogal de

ligação) + zero (desinência modo-temporal: pretérito perfeito do indicativo) +

-t  (desinência número-pessoal: terceira pessoa do singular); 

12. trādidērunt  = trād - (raiz) + reduplicação da consoante da raiz (desinência as-

pectual: perfectivo) = trādid - + -ē- (vogal de ligação) + zero (desinência modo-

temporal: pretérito perfeito do indicativo) + -runt   (desinência número-pes-soal: terceira pessoa do plural);

13. accēpĕrat  = accip- (raiz) + alternância da vogal da raiz (desinência aspectual:

perfectivo) = accēp + -e- (vogal de ligação) + -ra- (desinência modo-temporal:

pretérito mais-que-perfeito do indicativo) + -t   (desinência número-pessoal:

terceira pessoa do singular);

14. cadĕret  = cad- (raiz) + -e- (vogal de ligação) + -re- (desinência modo-temporal:

pretérito imperfeito do subjuntivo) + -t  (desinência número-pessoal: terceira

pessoa do singular).

Compreendido o mecanismo da conjugação, tracemos agora o rol dos tempos verbais

em latim, expondo um a um com as suas desinências.

Primeiro os tempos imperfeitos, ou do infectum, isto é, que exprimem um processo

não acabado:

  Modo indicativo:

o  Presente: A sua desinência era zero. Equivalia em português à forma amo.

presente do indicativo

número pessoa temastema em -a-  tema em -e-  tema em cons. tema em -i- 

singular1ª am-ō  dēl -ĕ -ō  col-ō  aud-ĭ -ō 2ª am-ā-s dēl -ē-s col-i-s aud-i-s3ª am-a-t dēl -e-t col-i-t aud-i-t

plural1ª am-ā-mus dēl -ē-mus col-ĭ -mus aud-ī -mus2ª am-ā-tis dēl -ē-tis col-ĭ -tis aud-ī -tis3ª am-a-nt dēl -e-nt col-u-nt aud-i-u-nt

o  Pretérito: A sua desinência era -ba-, se bem nos verbos com tema em -i- se

punha um /eː/ longo entre a vogal temática e a desinência modo-temporal.

Equivale em português à forma amava.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 118/153

 

116LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

pretérito imperfeito do indicativo

número pessoatemas

tema em -a-  tema em -e-  tema em cons. tema em -i- 

singular1ª am-ā-ba-m dēl -ē-ba-m col-ē-ba-m aud-ĭ -ē-ba-m2ª am-ā-bā-s dēl -ē-bā-s col-ē-bā-s aud-i-ē-bā-s3ª am-ā-ba-t dēl -ē-ba-t col-ē-ba-t aud-i-ē-ba-t

plural1ª am-ā-bā-mus dēl -ē-bā-mus col-ē-bā-mus aud-i-ē-bā-mus2ª am-ā-bā-tis dēl -ē-bā-tis col-ē-bā-tis aud-i-ē-bā-tis3ª am-ā-ba-nt dēl -ē-ba-nt col-ē-ba-nt aud-i-ē-ba-nt

o  Futuro: A sua desinência era -bi- nos verbos com temas em -a- e -e- e era -

e- ( -a- na primeira pessoa do singular) nos verbos com temas em consoante

e em -i-. Equivale em português à forma amarei .

futuro imperfeito do indicativo

número pessoatemas

tema em -a-  tema em -e-  tema em cons. tema em -i- 

singular1ª am-ā-b-ō  dēl -ē-b-ō  col-a-m aud-ĭ -a-m2ª am-ā-bi -s dēl -ē-bi -s col-ē-s aud-ĭ -ē-s3ª am-ā-bi -t dēl -ē-bi -t col-e-t aud-ĭ -e-t

plural1ª am-ā-bĭ -mus dēl -ē-bĭ -mus col-ē-mus aud-i-ē-mus2ª am-ā-bĭ -tis dēl -ē-bĭ -tis col-ē-tis aud-i-ē-tis3ª am-ā-bu-nt dēl -ē-bu-nt col-e-nt aud-ĭ -e-nt

  Modo subjuntivo:

o  Presente: A sua desinência era -e- nos verbos com tema em -a- e era -a- nos

verbos com os demais temas. Equivale em português à forma ame.

presente do subjuntivonúmero pessoa

temastema em -a-  tema em -e-  tema em cons. tema em -i- 

singular1ª am-e-m dēl -ĕ -a-m col-a-m aud-ĭ -a-m2ª am-ē-s dēl -ĕ -ā-s col-ā-s aud-ĭ -ā-s3ª am-e-t dēl -ĕ -a-t col-a-t aud-ĭ -a-t

plural1ª am-ē-mus dēl -e-ā-mus col-ā-mus aud-i-ā-mus2ª am-ē-tis dēl -e-ā-tis col-ā-tis aud-i-ā-tis3ª am-e-nt dēl -ĕ -a-nt col-a-nt aud-ĭ -a-nt

o  Pretérito: A sua desinência era -re-. Equivale em português à forma amasse.

pretérito imperfeito do subjuntivonúmero pessoa

temastema em -a-  tema em -e-  tema em cons. tema em -i- 

singular1ª am-ā-re-m dēl -ē-re-m col-ĕ -re-m aud-ī -re-m2ª am-ā-rē-s dēl -ē-rē-s col-ĕ -rē-s aud-ī -rē-s3ª am-ā-re-t dēl -ē-re-t col-ĕ -re-t aud-ī -re-t

plural1ª am-ā-rē-mus dēl -ē-rē-mus col-e-rē-mus aud-ī -rē-mus2ª am-ā-rē-tis dēl -ē-rē-tis col-e-rē-tis aud-ī -rē-tis3ª am-ā-re-nt dēl -ē-re-nt col-ĕ -re-nt aud-ī -re-nt

  Modo imperativo:

o  Presente: Esse tempo conjugava-se apenas nas segundas pessoas. A sua de-

sinência era zero, mas se distinguia do presente do indicativo porque as

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 119/153

 

117LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

desinências número-pessoais eram diferentes: zero no singular e -te no plu-

ral. Equivale em português à forma ama (tu).

presente do imperativo

número pessoa temastema em -a-  tema em -e-  tema em cons. tema em -i- singular 2ª am-a dēl -ē  col-e aud-ī  

plural 2ª am-ā-te  dēl -ē-te  col-ĭ -te  aud-ī -te 

o  Futuro: Esse tempo conjugava-se nas segundas e terceiras pessoas. A sua

desinência também era zero, mas se distinguia igualmente dos presentes

do indicativo e do subjuntivo porque as desinências número-pessoais eram

diferentes: -tō no singular, tanto na segunda como na terceira pessoa; -tōte 

na segunda pessoa do plural e -nto na terceira pessoa do plural. Não há

equivalência direta em português; tratava-se de uma ordem a ser cumprida

no tempo posterior da enunciação.

presente do imperativo

número pessoatemas

tema em -a-  tema em -e-  tema em cons. tema em -i- 

singular2ª am-ā-tō  dēl -ē-tō  col-ĭ -tō  aud-ī -tō 3ª am-ā-tō  dēl -ē-tō  col-ĭ -tō  aud-ī -tō 

plural2ª am-ā-tōte  dēl -ē-tōte  col-i-tōte  aud-ī -tōte 3ª am-a-ntō  dēl -e-ntō  col-u-ntō  aud-i-u-ntō 

Agora os tempos perfeitos, ou do  perfectum, isto é, que exprimem um processo aca-bado. Cabe lembrar que nesses tempos se acrescentava a desinência aspectual, que era bas-

tante variável. Nesta exemplificação, os quatro verbos tinham a forma -ui-/-ue- dessa desi-

nência. Atenção: eventualmente, a desinência -ui-/-ue- podia ser elidida, de modo que uma

forma como audīuit  ‘ouviu’ ficava audīt , com acento na última sílaba.

  Modo indicativo:

o  Pretérito: A sua desinência era zero, mas quase nunca se confundia com o pre-

sente do indicativo, por conta do acréscimo da desinência aspectual, e também

em alguma pessoas pela desinência número-pessoal ser diferente. Equivale emportuguês à forma amei .

pretérito perfeito do indicativo

número pessoatemas

tema em -a-  tema em -e-  tema em cons. tema em -i- 

singular1ª am-ā-u-ī   dēl -ē-u-ī   col-ŭ-ī   aud-ī -u-ī  2ª am-ā-ui-stī   dēl -ē-ui-stī   col-ui-stī   aud-ī -ui-stī  3ª am-ā-ui-t dēl -ē-ui-t col-ŭi-t aud-ī -ui-t

plural1ª am-ā-uĭ -mus dēl -ē-uĭ -mus col-uĭ -mus aud-ī -uĭ -mus2ª am-ā-ui-stis dēl -ē-ui-stis col-ui-stis aud-ī -uĭ -tis3ª am-ā-uē-runt dēl -ē-uē-runt col-uē-runt aud-ī -uē-runt

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 120/153

 

118LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

o  Pretérito mais-que-perfeito: A sua desinência era -ra-. Equivale em português

à forma amara ou tinha amado.

pretérito mais-que-perfeito do indicativo

número pessoa temastema em -a-  tema em -e-  tema em cons. tema em -i- 

singular1ª am-ā-uĕ -ra-m dēl -ē-uĕ -ra-m col-uĕ -ra-m aud-ī -uĕ -ra-m2ª am-ā-uĕ -rā-s dēl -ē-uĕ -rā-s col-uĕ -rā-s aud-ī -uĕ -rā-s3ª am-ā-uĕ -ra-t dēl -ē-uĕ -ra-t col-uĕ -ra-t aud-ī -uĕ -ra-t

plural1ª am-ā-ue-rā-mus dēl -ē-ue-rā-mus col-ue-rā-mus aud-ī -ue-rā-mus2ª am-ā-ue-rā-tis dēl -ē-ue-rā-tis col-ue-rā-tis aud-ī -ue-rā-tis3ª am-ā-uĕ -ra-nt dēl -ē-uĕ -ra-nt col-uĕ -ra-nt aud-ī -uĕ -ra-nt

o  Futuro: A sua desinência é -ri-. Equivale em português à forma terei amado.

futuro perfeito do indicativo

número pessoatemas

tema em -a-  tema em -e-  tema em cons. tema em -i- 

singular1ª am-ā-uĕ -r -ō  dēl -ē-uĕ -r -ō  col-uĕ -r -ō  aud-ī -uĕ -r -ō 2ª am-ā-uĕ -ri -s dēl -ē-uĕ -ri -s col-uĕ -ri -s aud-ī -uĕ -ri -s3ª am-ā-uĕ -ri -t dēl -ē-uĕ -ri -t col-uĕ -ri -t aud-ī -uĕ -ri -t

plural1ª am-ā-ue-rĭ -mus dēl -ē-ue-rĭ -mus col-ue-rĭ -mus aud-ī -ue-rĭ -mus2ª am-ā-ue-rĭ -tis dēl -ē-ue-rĭ -tis col-ue-rĭ -tis aud-ī -ue-rĭ -tis3ª am-ā-uĕ -ri -nt dēl -ē-uĕ -ri -nt col-uĕ -ri -nt aud-ī -uĕ -ri -nt

  Modo subjuntivo:

o  Pretérito: A sua desinência era -ri-: diferia do futuro perfeito do subjuntivo ape-

nas na primeira pessoa do singular, cuja desinência era -m. Equivale em portu-

guês à forma tenha amado.

pretérito perfeito do subjuntivo

número pessoatemas

tema em -a-  tema em -e-  tema em cons. tema em -i- 

singular1ª am-ā-uĕ -ri -m dēl -ē-uĕ -ri -m col-uĕ -ri -m aud-ī -uĕ -ri -m2ª am-ā-uĕ -ri -s dēl -ē-uĕ -ri -s col-uĕ -ri -s aud-ī -uĕ -ri -s3ª am-ā-uĕ -ri -t dēl -ē-uĕ -ri -t col-uĕ -ri -t aud-ī -uĕ -ri -t

plural1ª am-ā-ue-rĭ -mus dēl -ē-ue-rĭ -mus col-ue-rĭ -mus aud-ī -ue-rĭ -mus2ª am-ā-ue-rĭ -tis dēl -ē-ue-rĭ -tis col-ue-rĭ -tis aud-ī -ue-rĭ -tis3ª am-ā-uĕ -ri -nt dēl -ē-uĕ -ri -nt col-uĕ -ri -nt aud-ī -uĕ -ri -nt

Pretérito mais-que-perfeito: A sua desinência era -sse-. Equivale em portuguêsà forma tivesse amado.

pretérito mais-que-perfeito do subjuntivo

número pessoatemas

tema em -a-  tema em -e-  tema em cons. tema em -i- 

singular1ª am-ā-ui- sse-m dēl -ē-ui- sse-m col-ui- sse-m aud-ī -ui- sse-m2ª am-ā-ui- ssē-s dēl -ē-ui- ssē-s col-ui- ssē-s aud-ī -ui- ssē-s3ª am-ā-ui- sse-t dēl -ē-ui- sse-t col-ui- sse-t aud-ī -ui- sse-t

plural1ª am-ā-ui- ssē-mus dēl -ē-ui- ssē-mus col-ui- ssē-mus aud-ī -ui- ssē-mus2ª am-ā-ui- ssē-tis dēl -ē-ui- ssē-tis col-ui- ssē-tis aud-ī -ui- ssē-tis3ª am-ā-ui- sse-nt dēl -ē-ui- sse-nt col-ui- sse-nt aud-ī -ui- sse-nt

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 121/153

 

119LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Tudo isto pode ser resumido em um pequeno quadro como o que segue:

tempos imperfeitos

tempotema

-a- -e- cons. -i- presente do indicativo  zero

pretérito imperfeito do indicativo -ba-futuro imperfeito do indicativo -bi- -e-

presente do subjuntivo -e- -a-pretérito imperfeito do subjuntivo -re-

presente do imperativo  zero com desinências número-pessoais própriasfuturo do imperativo  zero com desinências número-pessoais próprias

tempos perfeitos

tempotema

-a- -e- cons. -i- 

pretérito perfeito do indicativo  zero com desinências número-pessoais própriaspretérito mais-que-perfeito do indicativo -ra-

futuro perfeito do indicativo -ri-pretérito perfeito do subjuntivo -ri-

pretérito mais-que-perfeito do subjuntivo -sse-

ExercícioContinuemos a trabalhar com o poema 99 do primeiro livro dos epigramas de Marcial. Identifique todosos verbos conjugados e informe as categorias de cada um (aspecto, modo, tempo, número e pes-soa), agora em latim. Mas também não deixe de identificar os nomes (substantivos e adjetivos), prono-

mes e numerais, juntos e sós, com a informação do caso e do número em que estão. Como às vezes épreciso saber o tema do verbo para identificar corretamente as suas categorias, ei-los:

Temas verbais: habe-, opta-, puta-, audi-, da-, abi-, appara-, explica-, cōnsta-, conting-, pere- 

Nonnão plēnuminteiro modōainda há pouco uīcĭēsdois milhões habēbāstinhas,sedmas tamtão prōdĭguspródigo atquee līberālisliberal et e tamtão lautuslauto erāseras, CalēneCaleno, ut que omnēstodos optārent desejassem tibite centĭēsdez milhões amīcīos amigos.Audīt ouviu uōtaos votos deusum deus precēsquee as preces nostrāsnossas atquee intrādentro de, putōacho, septĭmāssétimas Kalendāscalendas mortēsmortes hocisto tibite quattŭorquatro dedērunt deram.At mas tūtu sīcassim quasicomo se nonnão fōret tivesse sido relictumdeixado,sede sim raptumroubado tibipor ti centĭēsos dez milhões, abistīfoste inpara tantamtão misermiserável ēsurītiōnempenúria,ut que conuīuĭaos banquetes sumptūsiōramais suntuosos,tōtōtodo quaeque semeluma vez appărāspreparas inem annōo ano,nigraede negra sordĭbuscom uma mesquinharia explĭcēsarranjes monētaede moeda,et e septemsete uetĕrēsvelhos tuīteus sodālēsos companheiros cōnstēmuscustemos tibite plumbĕāde chumbo sēlībrāmeia libra.Quido que dignumdigno merĭtīsde méritos precēmurroguemos istīsdestes?

Optāmusdesejamos tibite mīlĭēscem milhões, CalēneCaleno.Hocisto sīse contigĕrit tenha acontecido, famede fome perĭbisperecerás. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 122/153

 

120LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Modelo de resposta:Combinações de substantivos, adjetivos, pronomes e/ou numerais:  plēnum uīcĭēs  – acusativo sin-gular, sumptūsiōr a conuīuĭ a  – acusativo plural, quid dignum  – acusativo singular, ...

Substantivos sós: Calēne  – vocativo singular, uōt a  – acusativo plural, ...Adjetivos sós:  prōdĭgus  – nominativo singular, līberāli s  – nominativo singular, ...Pronomes sós: tibi   – dativo singular, hoc   – acusativo singular, ...Numerais sós: cent ĭēs  – adverbial, ...Verbos: habēbās  – segunda pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo, optārent   –  terceirapessoa do plural do pretérito imperfeito do subjuntivo, aud īt   –  terceira pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo, ... 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 123/153

 

121LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

A VOZ PASSIVA

AquecimentoObserve as imagens abaixo:

Perceba que transcorreu um longo tempo entre a edificação de um prédio e outro, mas há uma seme-lhança inegável entre todos, que deve ser entendida como uma permanência da estética do mais antigo.Pesquise, pois, sobre os traços, os estilos e os tipos de edificação mais relevantes da arquitetura romana. 

Leia o texto a seguir: 

Em uma vasta e nobre cidade dos gregos, em Éfeso, uma lei antiga, édito pelos antepassados, foi constituída com uma condição dura,mas não com um direito injusto, pois quando um arquiteto recebeuma obra pública para cuidar, propõe quanto gasto haja de haver.Entregue a estimação, os seus bens são empenhados ao magistradoaté que a obra esteja acabada. Quando a despesa responde perfeita-mente ao dito, é distinguido com decretos e honras. Igualmente sese deve ajuntar não mais que um quarto à estimação: empresta-sedo dinheiro público e não é sujeitado a pena alguma. Quando é con-sumida verdadeiramente mais que a quarta parte na obra, o dinheiropara acabá-la é cobrado dos seus bens.

O homem e o tempo

Este texto faz parte da obra Dē architectūrā ‘Sobre a arquitetura’, de Vitrúvio. Do autor

não se sabe sequer o cognōmen, mas apenas que foi um arquiteto que trabalhou na edificação

de prédios públicos, em obras hidráulicas e de artilharia no fim do governo de César e no

começo do de Augusto. Quanto à obra, escrita entre os anos de 35 e 25 a.C., é um tratado

enciclopédico de dez livros que abrangem mais que ensinamentos sobre a arte de edificar,

mecânica e hidráulica, como o próprio trecho citado demonstra, o qual é o começo do prefácio

do décimo livro.

Figura 32 - O homem vitru-viano, de Leonardo daVinci (1485-1490). Porque “vitruviano”? PorqueDa Vinci se fundamentouna descrição das propor-ções do corpo humano

que Vitrúvio fez no Dēarchitectūrā.

Figura 31 – Partenão, Atenas

(432 a.C.). 

Figura 30 – Panteão, Roma

(125 d.C.). 

Figura 29 – Basílica de São Pedro,

Vaticano (1626) 

Figura 28 – Capitólio dos Estados

Unidos, Washington (1800). 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 124/153

 

122LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Com efeito, o Dē architectūrā é uma obra relevante da literatura técnica em latim por

duas razões: primeiro, por ser o único tratado antigo sobre essa matéria que chegou até nós;

segundo, porque em uma sociedade que dava um valor secundário ao labor do artífice, Vitrú-

vio procurou compor uma obra que não se reduzisse a preceitos sobre técnicas, mas que dig-nificasse o seu ofício.

Gramática

Passemos ao conteúdo gramatical. Observe as sentenças seguintes:

1. 

Uma lei antiga foi constituída com uma condição dura. 2.  Isto é dito pelos antepassados. 

3. 

Os bens do arquiteto são empenhados ao magistrado. 4. 

O arquiteto é distinguido com decretos e honras. 5.  Empresta-se o dinheiro para acabar a obra do dinheiro público.  6.

 

O dinheiro para acabar a obra é cobrado dos bens do arquiteto. 

Estas sentenças contêm ao menos três fatos curiosos. Primeiro, do ponto de vista da

forma, os verbos não apresentam formas singelas, mas formas compostas  – que têm o nome

técnico de perífrase  – pelo verbo ser  conjugado com as categorias verbais (aspecto, modo,

tempo, número e pessoa) e do particípio do verbo cujo processo se quer exprimir, o qual

concorda em gênero e número com o sujeito. Excetua-se o verbo da sentença 5, que está

conjugado acompanhado do pronome reflexivo. Segundo, do ponto de vista do sentido, ossujeitos desses verbos são, na verdade, os seus objetos diretos, o que se comprova trocando

a perífrase pela forma simples:

1.a. Constituiu uma lei antiga. 2.a. Os antepassados dizem isto. 3.a. Empenham os bens do arquiteto. 4.a. Distingue o arquiteto. 5.a. Empresta o dinheiro. 6.a. Cobra o dinheiro. 

Constata-se, assim, que, apesar do uso do reflexivo, na sentença 5 não se quer dizerque o dinheiro empresta a si mesmo, tanto que essa sentença foi transformada em 5.a sem

nenhuma diferença com relação às demais. Terceiro, o sujeito em 2.a., o único que está explí-

cito, é em 2 um sintagma preposicional nucleado pela preposição por .

Com efeito, à propriedade de transformar o objeto direto em sujeito chama-se voz.

Quando um verbo sofre essa transformação, diz-se que está na voz passiva. Se não se opera

essa transformação, então está na voz ativa. Os termos ativo  e  passivo  referem, precisa-

mente, aos papéis semânticos fundamentais do sujeito e do objeto direto, respectivamente

/agente/ e /paciente/. Que um verbo está na voz passiva quer dizer exatamente que o paci-

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 125/153

 

123LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

ente tomou o lugar do agente, daí o sujeito semântico  – expresso por um sintagma preposi-

cional nucleado pela preposição por   – receber o nome técnico de agente da passiva:  pelos

antepassados é o agente da passiva de é dito em 2.

Leia agora o texto original de Vitrúvio:

Nōbĭlī Graecōrum et amplā cīuitāte Ephĕsī  lēx uetusta dīcĭtur ā māiōrĭbus

dūrā condiciōne sed iūre esse non inīquō cōnstitūta. Nam architectus , cumpūblĭcum opus cūrandum recĭpit, pollicētur, quantō sumptū  id sit fūtūrum.

Trādĭta aestimātiōne magistrātŭī bona eius obligantur, dōnec opus sit per-

fectum. Absolūtō autem, cum ad dīctum impēnsa respondit, dēcrētīs et

honōrĭbus ōrnātur. Item sī non amplĭus quam quarta ad aestimātiōnem est

adicienda, dē  pūblĭcō praestātur, neque ūlla poena tenētur. Cum uērō am-

plĭus  quam quarta in opĕre cōnsūmĭtur, ex eius bonīs ad perficiendum

pecūnĭa exigĭtur. 

E observe as sentenças equivalentes àquelas de 1 a 6:

7.  Vetusta lēx dūrā condiciōne cōnstitūta est . 8.

 

Hoc ā māiōrĭbus dīcĭtur. 9.

 

Bona architectī magistrātŭī obligantur. 10.

 

Architectus dēcrētīs et honōrĭbus ōrnātur. 11.

 

Pecūnĭa ad opus perficiendum dē pūblĭcō praestātur. 12.

 

Pecūnĭa ad opus perficiendum ex bonīs architectī exigĭtur. 

E as equivalentes às de 1.a a 6.a:

7.a. Vetustam lēgem cōnstitŭit . 8.a. Māiōrēs hoc dīcunt . 9.a. Bona architectī oblĭgant . 10.a. Architectum ōrnat . 11.a. Pecūnĭam praestat . 12.a. Pecūnĭam exĭgit . 

Perceba que há uma diferença notável entre as sentenças de 7 a 12, em latim, e as de

1 a 6, em português, tanto umas como as outras na voz passiva. Vimos que em português 

estão construídas com uma perífrase  – verbo ser  conjugado e particípio do verbo que se quer

empregar – ou com o pronome reflexivo, mas em latim também se usavam formas conjuga-das singelas, como as da voz ativa. Não obstante, pelo estudo que já fizemos, sabemos que a

desinência da terceira pessoa do singular era -t  e da terceira pessoa do plural era -nt , porém

as desinências que aparecem nos verbos de 8 a 12 são -tur  pela terceira pessoa do singular e

-ntur  pela terceira pessoa do plural, do que podemos concluir que em latim havia desinências

número-pessoais próprias para exprimir a voz passiva. Efetivamente, a desinência funda-

mental da voz passiva em latim era -r , mas como a consoante /r / não podia ligar-se facilmente

às desinências número-pessoais  –  *-sr , *-tr , *-musr , *-ntr   – acabou acomodando-se como

pôde: em -ō como -or , em -s como -ris, em -t  como -tur , em -mus como -mur  e em -nt  como -

ntur . A desinência da segunda pessoa do plural é bem diferente: -mĭnī .

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 126/153

 

124LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

desinências número-pessoais na voz passiva

pessoanúmero

singular plural1ª -or -mur2ª -ris ou -re -mĭnī  3ª -tur -ntur

Contudo, o verbo da sentença 7 deixa ver que a construção perifrástica não é uma

novidade que apareceu na mudança do latim para o português, mas já estava presente em

latim. Perceba que o que diferencia o verbo em 7 dos outros em 8, 9, 10, 11 e 12 são o aspecto 

e o tempo: em 7 o verbo está no pretérito perfeito do indicativo e nos demais exemplos, no

presente do indicativo. O aspecto era mesmo a categoria do verbo que selecionava a escolha

de construir a voz passiva pela conjugação, com desinências número-pessoais próprias, ou

perifrasticamente, com o verbo esse ‘ser’ conjugado e o particípio passado do verbo que sequeria, concordando em gênero, número e caso com o sujeito: os tempos do infectum, ou

imperfeitos, escolhiam a primeira opção; os tempos do perfectum, ou perfeitos, escolhiam a

segunda opção. No entanto, o verbo esse não era conjugado no tempo que se queria exprimir

se era o passado, mas em um tempo anterior a ele: se o tempo era o pretérito, o verbo esse 

ficava no presente; se era o mais-que-perfeito, ficava no imperfeito.

Em resumo, para conjugar um verbo em um tempo do infectum na voz passiva, bas-

tava usar as desinências número-pessoais apropriadas. Em um tempo do perfectum, usava-

se a perífrase esse mais o particípio passado do processo que se queria exprimir, concordandoambas as formas verbais com o sujeito, como acontece em português. Restringirei a exempli-

ficação a seguir à terceira pessoa do singular com um verbo com tema em -a-.

voz passiva nos tempos imperfeitospresente do indicativo am-ā-tur  ‘é amado’ 

pretérito imperfeito do indicativo am-ā-bā-tur  ‘era amado’ futuro imperfeito do indicativo am-ā-bĭ -tur  ‘serei amado’ 

presente do subjuntivo am-ē-tur  ‘seja amado’ pretérito imperfeito do subjuntivo am-ā-rē-tur  ‘fosse amado’ 

presente do imperativo am-ā-re ‘ama’ futuro do imperativo am-ā-tor  ‘serás amado (ordem)’ 

voz passiva nos tempos perfeitospretérito perfeito do indicativo amātus est ‘fui amado’ 

pretérito mais-que-perfeito do indicativo amātus erat ‘fora amado’ futuro perfeito do indicativo amātus erit ‘terei sido amado’ 

pretérito perfeito do subjuntivo amātus sit ‘tenha sido amado’ pretérito mais-que-perfeito do subjuntivo amātus esset  ‘tivesse sido amado’ 

Independentemente da construção, o agente da passiva era expresso pelo caso abla-

tivo, quando humano preposicionado por ab/ā, como em 2: ā māiōrĭbus ‘pelos antepassados’.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 127/153

 

125LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Enfim, observe esta sentença:

13. Architectus quantō sumptū id fūtūrum sit pollicētur. 

Em português:

14. O arquiteto propõe quanto gasto haja de haver. 

Perceba que o verbo pollicētur  está na voz passiva, já que leva a desinência número-

pessoal -tur , da terceira pessoa do singular nessa voz, mas a tradução para o português mostra

que do ponto de vista do sentido o verbo está na voz ativa. Isso não é um caso isolado, mas

há todo um grupo de verbos latinos que apresentam essa mistura – forma passiva e sentido

ativo  –, os quais são chamados verbos depoentes. E como ficava a voz passiva desses verbos?

É fácil: eles não a tinham!

Para acabar, é bom aproveitar este estudo sobre a voz passiva para expor a conjugaçãodo verbo esse, que é um dos poucos verbos irregulares em latim, mesmo assim bem mais

regular que o verbo ser  em português:

tempos imperfeitos 

número pessoaindicativo subjuntivo imperativo

presente pretérito futuro presente pretérito presente futuro

singular1ª su-m er-a-m er-ō  si-m es- se-m -- --2ª e-s er-ā-s er-i -s sī -s es- sē-s es es-tō 3ª es-t er-a-t er-i -t si-t es- se-t -- es-tō 

plural1ª su-mus er-ā-mus er-ĭ -mus sī -mus es- sē-mus -- --2ª es-tis er-ā-tis er-ĭ -tis sī -tis es- sē-tis es-te  es-tōte 3ª su-nt er-a-nt er-u-nt si-nt es- se-nt -- su-ntō 

tempos perfeitos 

número pessoaindicativo subjuntivo

pretérito mais-que-perfeito futuro pretérito mais-que-perfeito

singular1ª  fu-ī   fu-ĕ -ra-m fu-ĕ -r -ō  fu-ĕ -ri -m fu-i- sse-m2ª  fu-i-stī   fu-ĕ -rā-s fu-ĕ -ri -s fu-ĕ -ri -s fu-i- ssē-s3ª  fu-i-t fu-ĕ -ra-t fu-ĕ -ri -t fu-ĕ -ri -t fu-i- sse-t

plural1ª  fu-ĭ -mus fu-e-rā-mus fu-e-rĭ -mus fu-e-rĭ -mus fu-i- ssē-mus2ª  fu-i-stis fu-e-rā-tis fu-e-rĭ -tis fu-e-rĭ -tis fu-i- ssē-tis3ª  fu-ē-runt fu-ĕ -ra-nt fu-ĕ -ru-nt fu-ĕ -ru-nt fu-i- sse-nt

A irregularidade desse verbo é fundamentalmente o fato de que a sua raiz no infectum 

é es- e no perfectum é  fu-. A raiz es- sofreu algumas mudanças do latim pré-literário para o

literário: *esum, *esŭmus, *esunt  > sum, sumus, sunt ; *esim, *esīs... > sim, sīs; *esam, *esō...

> eram, erō...

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 128/153

 

126LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

ExercícioVoltamos ao texto do Corpus Iūris Cīuīlis. Identifique os verbos conjugados na voz passiva e informeas categorias de cada um. Não se esqueça dos nomes (substantivos e adjetivos), pronomes e nume-rais, juntos e sós, com o caso e o número em que cada um está declinado, bem como os verbos na voz

ativa com as categorias de cada um.

Temas verbais: scrīb-, desĭn-, intĕres-, potes-, abes-, compĕt-, proba-, dīc -, dēbe-, subtrah-, subrip-, tene-, uide-, consequ-. 

Īdemo mesmo  scrībit escreve, sīse, cumcomo mihime  decemdez  dēbērenturfossem devidos, seruuso escravo  pignōrīem

penhor dātusdado subtractusroubado sit tenha sido, sīse actiōnepela ação furt īde furto consecūtus fuĕrōterei conseguido de-cemdez, nonnão competĕrecompetir mihime furtīde furto actiōnema ação, sīse itĕrumde novo subripiāturseja roubado,quiaporque desĭit cessou meao meu interesseinteressar, cumcomo semeluma vez sim consecūtustenha conseguido. Hocisto itaassim, sīse sinesem culpāculpa meāminha subripiāturseja roubado: nampois sīse culpāpor culpa meāpor minha, quiapor-

que intĕrest interessa eōpelo quodque tenĕorsou sujeito pignerāticĭāpor de penhor actiōnepela ação, agĕreagir potĕrōpode-

rei

. Quodpois

 sīse

 culpaa culpa

 abest é ausente

, sinesem

 dubĭōdúvida

 domĭnōao dono

 competĕrecompetir

 actĭōa ação

 ui-dēturvê-se, quaeque crēditōrīao credor nonnão compĕtit compete. Quamque sententĭamsentença PompōnĭusPompônio quoquetambém lībrōno livro decĭmōem décimo ada SabīnumSabino probat aprova.Īdemos mesmos  dīcunt dizem, et que  sīse  duōdois  seruīescravos  subreptīroubados  sint sejam simulao mesmo tempo, com-petĕrecompetir utrīusquede um e do outro nōmĭnea nome furtīde furto actiōnema ação crēditōrīao credor, sedmas nonnão inem tōtumo todo, sedmas prōpor quāa parteparte, inem singŭlōscada um dīuīsōdividido eōo quodque eīlhe dēbēturé

devido, eiusdele intĕrest interessa: sēparātimseparadamente autemmas duōbusos dois subreptīsroubados, sīse ūnīusde um nōmĭnea nome sōlĭ duma totalidade consecūtus sit tenha consiguido, alterīusdo outro nihilnada consequēturconsiguirá. 

Exemplo de resposta:Combinação de substantivos, adjetivos, pronomes e numerais: pignerāticĭ ā actiōne  – ablativo sin-gular, meā culpā  – ablativo singular, ...Substantivos sós: seruus  – nominativo singular, pignōr ī   – dativo singular, ...Pronomes sós: īdem  – nominativo singular, mihi   – dativo singular, ...Numerais sós: decem  – cardinal, semel   – adverbial, ...Verbos na voz ativa: scrībi t   –  terceira pessoa do singular do presente do indicativo, desĭ i t   –  terceirapessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo, ...Verbos na voz passiva: dēberentur   – terceira pessoa do plural do pretérito imperfeito do subjuntivo,subtractus sit   – terceira pessoa do singular do pretérito perfeito do subjuntivo, ...Verbos depoentes: Há apenas um, o qual aparece conjugado em quatro formas diferentes. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 129/153

 

127LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

AS FORMAS VERBAIS IMPESSOAIS

AquecimentoProcure ler o comecinho da Ilíada ou da Odisseia, de Homero, ou da Eneida, de Virgílio, ou ainda d’Oslusíadas, de Luís de Camões, ou mesmo de Caramuru, de frei José de Santa Rita Durão. É possívelcompreender esses textos sem o conhecimento do contexto histórico-geográfico em que agem as per-sonagens?Em seguida, procure ler um poema lírico. Pode ser aquele de que você sempre gostou, ou aquele quechamar a sua atenção nessa busca, não importa em que língua esteja. E agora? O poema lírico demandao mesmo nível de conhecimento do contexto histórico-geográfico que o poema épico? Por quê?

Leia o texto a seguir: 

Se há algum prazer para o homem que lembra os bons feitos mais antigos,quando considera que é justo, e que não violou a confiança sagrada, e que nãoabusou de um deus com alguma aliança para enganar os homens com a suavontade, restam, Catulo, muitas alegrias preparadas para ti deste amor in-grato. Pois qualquer coisa que os homens podem ou fazer ou dizer bem a al-guém, estas coisas foram ditas e feitas por ti, se bem todas pereceram confi-adas a um coração ingrato. Por que razão agora te torturas mais? Por que nãofortaleces o ânimo e daí reduzes a ti, e com os deuses contrariados deixas deser coitado? É difícil abandonar de repente um longo amor, mas faças o que

podes: esta é a única salvação, isto deves acabar de vencer, isto faças, ou sepossível ou se não possível. Ó deuses, se apiedar-se é de vós, ou se algumavez já levastes um último auxílio a alguém na sua morte, olhai para mim, coi-tado, e, se levei uma vida piamente, arrancai-me esta peste e perdição, quecomo uma fraqueza que se esgueira nas juntas mais fundas me tirou as ale-grias de todo o peito. Já não busco aquilo, que ela estime a mim, ou, o que nãoé possível, que queira ser decente: desejo estar bem por mim mesmo e aban-donar esta doença nojenta. Ó deuses, pela minha justeza devolvei-me isto.

O homem e o tempoEste texto é o poema de número 76 do Līber  ‘Livro’ de Catulo. Gaio Valério Catulo é

mais um desses autores latinos de quem se sabe pouco. Nasceu provavelmente em 84 a.C. em

Verona, na Gália Cisalpina, foi jovem para Roma e morreu em 54 a.C. De família abastada,

compôs vários poemas, dentre os quais o citado, sobre o seu amor por Clódia, umas das irmãs

do tribuno Públio Clódio, a quem chamava Lésbia, em homenagem à grande poetisa grega

Safo (viveu entre os séculos VII e VI a.C.), natural da ilha de Lesbos, no mar Egeu.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 130/153

 

128LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Catulo participou de um círculo literário cujos mem-

bros Cícero qualificou depreciativamente νεώτεροι, ou seja,

‘[poetas] mais novos’ ou ‘modernos’, que comungavam a

dedicação à literatura como um otĭum, um ‘lazer’, e encara-vam a poesia como nūgae, ‘frivolidades’, o que não implica

em não terem levado a sério o fazer literário; antes o con-

trário: zelavam muito pela perfeição formal. Mas por que

Cícero os referiu pejorativamente? Porque o gênero de po-

esia que gozava de prestígio então era aquele que estivesse

a serviço do Estado, como a poesia épica. Cabe lembrar que o próprio Cícero se preocupou

com justificar o cultivo da filosofia por si como um trabalho de utilidade pública. Em contra-

partida, os neotéricos  desinteressaram-se da poesia grave, por terem preferido, precisa-

mente, versar sobre “frivolidades”. Em tudo isso foram seguidores do poeta helenístico Ca-límaco, que viveu na primeira metade do século III a.C.

O Līber  de Catulo – quase tudo o que remanesceu da poesia neotérica e o mais antigo

livro de poesia pessoal da literatura latina que chegou até nós  – contém 116 composições,

que, da forma como a obra nos foi transmitida, estão ordenadas em três partes. A primeira

compreende sessenta poemas, conhecidos como polimétricos, devido à variedade de metros

que apresentam. A segunda, quatro poemas longos em metro elegíaco. A terceira, 44 epigra-

mas. Se bem a tradução do poema 76 que você leu acima está em prosa, o texto original é um

epigrama, portanto em versos, chamados dísticos elegíacos.

A obra de Catulo deixa ver um poeta que era perfeitamente consciente de que a lite-

ratura é uma recriação da realidade, com a qual não tem de coincidir com exatidão, mas tam-

pouco distar a ponto de a vivência ficar irreconhecível. Com efeito, no poema citado há um

 jogo muito engenhoso entre eu e tu: até “Ó deuses, se apiedar-se é de vós...” manifesta-se a

voz de um eu que é diferente da pessoa de Catulo, cuja voz aparece daí em diante. Em outras

palavras, o poema não é um espelhamento da desventura em que está inspirado, mas uma

recriação.

Na verdade, esse jogo de vozes leva ao plano da expressão a perturbação do poeta,que ama uma mulher que não merece mais ser amada por ele. De fato, o poeta da primeira

parte do livro é um jovem arrebatado pelo deleite do amor, o que está bem ilustrado pelo

famosíssimo poema 5, que começa assim: “Vivamos, minha Lésbia, e amemos, e os rumores

dos velhos severos estimemos todos em um vintém!” (“Vīuāmus, mea Lesbĭa, atque amēmus,

/ rūmōrēsque senum seuēriōrum / omnēs ūnīus aestimēmus assis!”). Já o poeta da terceira

parte, é um homem mais comedido, que, amargando a decepção, se apega mais aos valores

tradicionais, como no poema citado: a fidēs ‘confiança’, a piĕtās ‘justeza’, embora o destem-

pero que o atravessa contrarie o valor da grauĭtās ‘temperança’. Seja como for, contradições 

não são raras na poesia de Catulo, que procurou criar um sentido de amor tão fora do padrãoque ele mesmo parece não ter acabado de entendê-lo.

Figura 33 - Catulo a Lésbia, de Laurence Alma-Tadema (1865).

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 131/153

 

129LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Gramática

Observe agora as sentenças seguintes:

1. 

O homem não abusou de um deus com alguma aliança para enganar os homens. 2.

 

Muitas alegrias preparadas para ti restam. 3.

 

Todas pereceram confiadas a um coração ingrato. 4.  Por que tu não deixas de ser coitado? 5.

 

 Abandonar de repente um longo amor é difícil. 6.

 

Desejo estar bem por mim mesmo. 

As palavras em negrito funcionam como nomes: enganar , em 1, é o complementador

do sintagma preposicional nucleado por para, posição própria do substantivo, e o sintagma é

adjunto adverbial do verbo abusou, assim como ser  em 5, em que o sintagma preposicional

funciona como complemento oblíquo de deixas; preparadas, em 2, é predicativo do sujeito,função própria do adjetivo; estar , em 7, é o objeto direto do verbo desejo, função também

própria do substantivo; confiadas, em 5, é adjunto adverbial de pereceram, outra função que

pode desempenhar o adjetivo; abandonar , em 6, é o sujeito do verbo é, função igualmente

própria do substantivo.

Não obstante, essas palavras também são verbos. Selecionam argumentos da mesma

maneira que um verbo conjugado, tanto que cada uma pode ser substituída por uma oração

com o verbo correspondente conjugado:

1.a. O homem não abusou de um deus com alguma aliança para que engane os homens. 2.a. Muitas alegrias que foram preparadas para ti restam. 3.a. Todas pereceram porque foram confiadas a um coração ingrato. 4.a. Por que tu não deixas que és coitado? 5.a. Que alguém abandone de repente um longo amor é difícil. 6.a. Desejo que eu esteja bem por mim mesmo. 

O substantivo verbal, expresso pelo morfema -r , tem o nome de infinitivo. O adjetivo

verbal, expresso pelo morfema -d-, tem o nome de particípio. Há também um advérbio ver-

bal, não exemplificado no texto citado, o qual é expresso pelo morfema -ndo; como o sin-

tagma  para enganar , em 1, funciona como adjunto adverbial do verbo abusou, o infinitivo

pode ser substituído por ele, que tem o nome de gerúndio:

1.b. O homem não abusou de um deus com alguma aliança enganando os homens.

Enfim, observe a sentença seguinte:

7. Qualquer coisa que os homens podem ou fazer ou dizer bem a alguém foifeita e dita por ti. 

Note que os infinitivos  fazer  e dizer  e os particípios  feita e dita não são percebidos

como tais nessa sentença. Efetivamente, não podem ser trocados por verbos conjugados:

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 132/153

 

130LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

7.a *Qualquer coisa que os homens podem que fazem ou que dizem bem aalguém foi que foi feita e que foi dita por ti. 

Isso acontece porque o infinitivo e o particípio estão gramaticalizados aí, ou, trocando

em miúdos, passaram a fazer parte de uma construção gramatical: o infinitivo, de uma perí-frase com o verbo poder , que aproxima o modo indicativo ao subjuntivo; o particípio, de uma

perífrase com o verbo ser , que exprime a voz passiva.

Vejamos agora como se davam essas coisas em latim. Apreciemos a elegia de Catulo:

Sīqua recordantī benefacta priōra uoluptās est homĭnī, cum sē cogĭtat esse pium, 

nec sanctam uiolasse fidem, nec foedĕre nūllō dīuum ad fallendōs nūmĭne abūsum homĭnēs, 

multa parāta manent in longā aetāte, Catulle, 

ex hoc ingrātō gaudĭa amōre tibi.Nam quaecumque homĭnēs bene cuīquam aut dīcĕre possunt  

aut facĕre, haec ā tē dīctaque factaque sunt. Omnĭa quae ingrātae periērunt crēdĭta mentī. 

Quāre iam tē cūr amplĭus excrucĭēs?  Quīn tū anĭmō offirmās atque istinc tēque redūcis, 

et dīs inuītīs desĭnis esse miser? Difficĭle est longum subĭtō dēpōnĕre amōrem, 

difficĭle est, uērum hoc qua lubet efficĭās: ūna salūs haec est. Hoc est tibi peruincendum, 

hoc facĭās, sīue id non pote sīue pote.  O dī, sī uestrum est miserērī, aut  sī quibus umquam extrēmam iam ipsā in morte tulistis opem,

mē misĕrum aspicĭte et, sī uītam pūrĭter ēgī, ēripĭte hanc pestem perniciemque mihi,

quae mihi subrēpēns īmōs ut torpor in artūs expŭlit ex omnī pectŏre laetitĭās. 

Non iam illud quaerō, contrā mē ut dīlĭgat illa, aut, quod non potis est, esse pudīca uelit: 

ipse ualēre optō et taetrum hunc dēpōnĕre morbum. O dī, reddĭte mī hoc prō pietāte meā.  

O décimo terceiro verso, “Difficĭle est longum subĭtō dēpōnĕre amōrem”  (“É difícil 

abandonar de repente um longo amor”) tornou-se um verdadeiro aforismo. Leiamos as sen-

tenças correspondentes às de 1 a 6:

7.  Homō dīuum foedĕre nūllō ad fallendōs homĭnēs non abūsum. 8.  Multa gaudĭa tibi parāta manent. 9.

 

Omnĭa ingrātae mentī crēdĭta periērunt. 10.

 

Quīn tū miser esse desĭnis? 11. Longum amōrem subĭtō dēpōnĕre difficĭlem est. 12.

 

Ipse ualēre optō. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 133/153

 

131LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Para começar, perceba, em 8, que até a sentença que em português está nucleada por

um verbo conjugado, abusou, em latim está reduzida ao particípio passado: abūsum. É que

em latim era mais comum reduzir uma sentença às formas impessoais do verbo:

13. 

Qua uoluptās priōra benefacta recordantī homĭnī est. 14. Homō sē pium esse cogĭtat. 15.

 

Homō sē sanctam fidem non uiolasse cogĭtat. 16.

 

Hoc tibi peruincendum est. 17.

 

Pestis in īmōs artūs subrēpēns laetitĭās mihi ex omnī pectŏre expŭlit. 

Na minha tradução para o português:

18. 

Há algum prazer para o homem que lembra os bons feitos mais antigos. 19.

 

O homem considera que é justo. 20. O homem considera que não violou a confiança sagrada. 

21. 

Deves acabar de vencer isto. 22.

 

Uma peste que se esgueira pelas juntas mais baixas tira-me as alegriasde todo o peito. 

Depois, veja que se, por um lado, as formas  parāta (9), crēdĭta (10) , dēpōnĕre (12) e

ualēre (14), com os seus morfemas -t- e -re, se assemelham ao particípio e ao infinitivo em

português, por outro lado, as formas ad fallendōs (8) e [tibi] peruincendum [est] (16), traduzi-

das como para enganar  (1) e deves acabar de vencer  (21), lembram mais o gerúndio em por-

tuguês que o infinitivo empregado na tradução, embora apresentem terminações ligeira-

mente diferentes; além disso, as formas recordantī , em 13, e subrēpēns, em 17, não parecem

associar-se a nenhuma forma impessoal do verbo em português. Isso quer dizer que não só seusavam mais tais formas em latim, mas também que nessa língua as havia em maior número.

Façamos a sua enumeração:

  Infinitivo: Era um substantivo verbal que se usava nos casos nominativo e acusa-

tivo. Como funcionava como um substantivo de gênero neutro, as suas desinências

eram as mesmas em ambos os casos.

o  Presente: A sua desinência é -re na voz ativa e -rī  (- ī  nos verbos com tema

em consoante) na voz passiva. Em português equivale respectivamente às

formas amar  e ser amado.

infinitivo presente

voztema

-a-  -e-  cons. -i- ativa am-ā-re  dēl -ē-re  col-ĕ -re  aud-ī -re 

passiva am-ā-rī   dēl -ē-rī   col-ī   aud-ī -r ī  

o  Passado: A sua desinência é -sse na voz ativa. Tinha aspecto perfectivo, por-

tanto se acrescentava também a desinência aspectual. Na voz passiva,

como acontecia nos tempos do perfectum, usava-se a perífrase particípio +

esse. Em português equivale respectivamente às formas ter amado e tersido amado.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 134/153

 

132LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

infinitivo passado

voztema

-a-  -e-  cons. -i- ativa am-ā-ui- sse  dēl -ē-ui- sse  col-i- sse  aud-ī -ui- sse 

passiva amātum esse dēlētum esse cultum esse aud ī tum esse

O infinitivo presente do verbo ser  era esse e o passado, fuisse.

  Gerúndio: A sua desinência era -nd-.

o   Ativo: Era a contraparte do infinitivo na declinação, ou seja, o infinitivo era

um substantivo verbal no nominativo ou no acusativo e o gerúndio era um

substantivo verbal nos demais casos, como se fosse um substantivo com

tema em -o-. Examinemo-lo mais detidamente com uma exemplificação ti-

rada das sentenças de Publílio Siro e um dístico de Marcial:

   Acusativo: Como o infinitivo era usado como um objeto direto, o

gerúndio no acusativo sobrava nessa função, de modo que tomou ade adjunto adverbial, normalmente encabeçado pela preposição

ad , exprimindo fim:23.a.  Ad paenitendum propĕrat citō quī iūdĭcat. 23.b. Quem julga depressa se apressa a arrepender-se. 

  Dativo: O seu uso era raríssimo. Tinha a função de um adjunto cor-

respondente ao objeto indireto de um verbo conjugado:24.a. Prīma tibi dābĭtur uentrī lactūca mouendō 

ūtĭlis, et porrīs fīla resēcta suīs. 24.b. Ser-te-á dado primeiro uma alface boa para avivar o ventre,

depois fios de porco cortados com alhos-porós. 

   Ablativo: Funcionava como um adjunto adverbial. O gerúndio em

português  – que não é mais que um advérbio verbal  –  continua,

precisamente, o gerúndio latino no caso ablativo:

25.a.  Audendō uīrtūs crēscit tardandō timor. 25.b. A coragem cresce ousando e o temor, adiando. 

  Genitivo: Era um complemento ou adjunto adnominal, como qual-

quer nome declinado no genitivo:26.a. Cauendī nūlla est dimittenda occāsĭō. 

27.b. Não deve ser dispensada nenhuma oportunidade de tomarcuidado. 

gerúndio

casotema

-a-  -e-  cons. -i- acusativo am-a-nd -u-m  dēl -e-nd -u-m  col-e-nd -u-m  aud-i-e-nd -u-m 

dativo am-a-nd -ō  dēl -e-nd -ō  col-e-nd -ō  aud-i-e-nd -ō ablativo am-a-nd -ō  dēl -e-nd -ō  col-e-nd -ō  aud-i-e-nd -ō genitivo am-a-nd -ī   dēl -e-nd -ī   col-e-nd -ī   aud-i-e-nd -ī  

o  Passivo: Também chamado gerundivo. Equivalia a um adjetivo, e, de fato,

declinava-se exatamente como um adjetivo triforme: am-a-nd -u-s, am-a-nd -a, am-a-nd -u-m. Era acompanhado amiúde do verbo esse. Apresentava

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 135/153

 

133LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

um matiz de significado que o aproximava ao modo imperativo, de modo

que costumava ser traduzido para o português pela perífrase deve(m) + voz

 passiva. As sentenças 16 e 26 contêm um exemplo dele:16. Hoc tibi peruincendum est.21. Deves acabar de vencer isto. 26.a. Cauendī nūlla est dimittenda occāsĭō. 27.b. Não deve ser dispensada nenhuma oportunidade de tomar cuidado. 

  Particípio: Era um adjetivo verbal.

o  Presente: A sua desinência era -nt-. Declinava-se como um adjetivo uni-

forme: am-ā-n(t)-s. Equivale em português a uma construção com o pro-

nome relativo e o verbo no presente:

13. Qua uoluptās priōra benefacta recordantī homĭnī est. 17. Pestis in īmōs artūs subrēpēns laetitĭās mihi ex omnī pectŏre expŭlit. 

Em português:18. Há algum prazer para o homem que lembra os bons feitos mais antigos. 22. Uma peste que se esgueira pelas juntas mais baixas tirou-me as alegriasde todo o peito. 

o  Passado: A sua desinência era -t-. Declinava-se como um adjetivo triforme:

am-ā-t -u-s, am-ā-t -a, am-ā-t -u-m. O particípio em português é continua-

dor seu:9. Multa gaud ĭ a tibi parāta manent. 2. Muitas alegrias preparadas para ti restam.10. Omnĭa ingrātae mentī crēdĭta periērunt. 

3. Todas pereceram confiadas a um coração ingrato.o  Futuro: A sua desinência era -tūr -. Declinava-se como um adjetivo triforme:

am-ā-tūr -u-s, am-ā-tūr -a, am-ā-tūr -u-m. Equivale em português a uma

construção com o pronome relativo e o verbo no futuro. Uma sentença que,

segundo Suetônio no De uītā Caesărum, os gladiadores endereçavam ao

imperador antes de começar a lutar, é um bom exemplo desse particípio:

28.a. Hauē, Imperātor, moritūrī tē salūdant! 28.b. Ave, Imperador, aqueles que morrerão te saúdam! 

A própria palavra fūtūrum, donde futuro, era o particípio futuro do verbo

esse, ou seja, ‘o que será’.  Supino:  Era um substantivo verbal  bem pouco usado. A sua desinência era a

mesma do particípio passado, -t-, mas apresentava dois casos como se fosse um

substantivo com tema em -u-: um acusativo -tum e um ablativo -tū.

o  O primeiro equivalia ao gerúndio no acusativo, ou seja, tinha a função de

um adjunto adnominal que exprimia fim (equivalente em português ao uso

da preposição para mais o infinitivo):29.a. Nunc hīnc parasītum in Cārĭam mīsī meum 

petītum argentum ā meō sodālī mūtŭum. 

29.b. Agora enviei daqui o parasita à Cária para pedir a prata emprestadaao meu companheiro. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 136/153

 

134LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

o  O segundo equivalia ao gerúndio no genitivo, ou seja, tinha a função de um

complemento nominal (equivalente em português ao uso da preposição de 

mais o infinitivo):30.a. Heus tū, sī uolēs uerbum hoc cogitāre, 

simul flāre sorbereque haud factū facĭ lest.30.b. Ei tu, se quiseres pensar nesta palavra, soprar e sorver ao mesmo

tempo não é fácil de fazer. 

Ambos os exemplos foram tirados de Plauto, do Curculĭō e o da Mostellārĭa.

Observe-se, enfim, que, assim como ocorria à desinência do  perfectum, havia verbos

em que a desinência do particípio passado e do supino se ligava à vogal temática e outros em

que ela se ligava diretamente à raiz, o que pôde ter desencadeado alguma mudança fonética 

do latim pré-literário para o literário, já que neste nem todo som podia combinar-se com a

consoante /t/, o que tinha de ser acomodado de algum jeito. Além disso, também com o per- fectum, a desinência do particípio passado e do supino apresentava igualmente a variante -s-

. Exemplos: sect - (tema seca- ‘cortar’), laut - (tema laua- ‘lavar’), doct - (tema doce- ‘ensinar’),

tent - (tema tene- ‘sustentar’), *scrībt - > scrīpt - (tema scrīb- ‘escrever’), fact - (tem fac- ‘fazer’),

aper t -  (tema aperi-  ‘abrir’); *uid s-  > uī s-  (tema uide-  ‘ver’), *mord s-  > mor s-  (tema morde- 

‘morder’), *met s- > mess- (tema met- ‘colher’), *curr s- > cur s- (tema curr-  ‘correr’), sent s- >

sēns- (tema sent-  ‘sentir’). Perceba que um ou outro caso permaneceu em português, seja

como particípio irregular seja como substantivo ou adjetivo: lauto, douto, tento, escrito, feito 

e fato, aberto, curso, senso.

Apesar de o gerundivo e o particípio presente não terem continuado em português, o

léxico da nossa língua está recheado de vocábulos que ou são empréstimos a gerundivos e

particípios presentes latinos, como venerand o (< uenerand us ‘que deve ser venerado’), divi-

dend o (< dīuidend us ‘que deve ser dividido’), horrend o (< horrend us ‘que deve ser muito te-

mido’), pudend o (< pudend us ‘de que se deve ter vergonha’), reverend o (reuerend us ‘que deve

reverenciado’) e adolescent e (< adolēscēns ‘que cresce’; o particípio passado é, precisamente,

adul t us ‘crescido’, daí adulto), cient e (< sciēns ‘que sabe’), diligent e (< dīlĭgēns ‘que cuida’),

recipient e (< recipĭēns ‘que recebe’), salient e (< salĭēns ‘que salta’), ou são criações novas com

os sufixos -nd- e -nt-, como doutorand o (‘que há de ser doutorado’), educand o (‘que há de sereducado’), formand o (‘que há de ser formado’), graduand o (‘há de ser graduado’), orientand o 

(‘que há de ser orientado’) e absorvent e  (‘que absorve’), adoçant e (‘que adoça’), alvejant e 

(‘que alveja’), amant e (‘que ama’), assaltant e (‘que assalta’), crent e (‘que crê’), diferent e (‘que

difere’), falant e (‘que fala’), ouvi nt e (‘que ouve’), segui nt e  (‘que segue’). Você pode, então,

estar-se perguntando: não se pode dizer que em português haja, pelo menos, particípio pre-

sente, já que o sufixo -nt- é tão produtivo? Efetivamente, a sentença 17 poderia também ter

sido traduzida como

29. Uma peste rastejante nas juntas mais baixas tirou-me as alegrias de todo o peito,  

mas dizer em português algo como

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 137/153

 

135LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

30. *Há algum prazer para o homem lembrante os bons feitos mais antigos 

parece ser agramatical, o que implica em rejeitar haver particípio presente na nossa

língua. Por mais produtivo que seja, -nt- não é uma desinência gramatical, mas um sufixo de-

rivativo.

ExercícioVoltamos ao texto de Vitrúvio. Você já sabe o que fazer: identifique os nomes (substantivos e adjeti-vos) e pronomes, juntos e sós, informando em que caso e número está cada um, bem como osverbos com as suas categorias, e agora também as formas impessoais verbais.

Temas verbais: dīc -, recĭp-, pollice-, oblĭga-, es-, respond-, orna-, praesta-, tene-, cōnsūm-, exĭg -, cōns-titŭ-, cūra-, trād -, perfic-, adiic-.

Nōbĭlīem nobre Graecōrumdos gregos et e amplāem vasta cīuitāteem uma cidade Ephĕsīem Éfeso  lēxuma lei uetustaantiga dīcĭturé dito āpor māiōrĭbusos antepassados dūrācom dura condiciōnecom uma condição sedmas iūrecom um direito esseser nonnão inīquōcom injusto cōnstitūtaconstituída. Nampois architectuso arquiteto, cumquando pūblĭcumpública opusuma

obra cūrandumpara cuidar recĭpit recebe, pollicēturpropõe, quantōquanto sumptūgasto idisso sit fūtūrumhaja de haver.Trādĭtāentregue  aestimātiōnea estimação  magistrātŭīao magistrado  bonaos bens  eiusdele  obligantursão empenhados,dōnecaté que opusa obra sit esteja perfectumacabada. Absolūtōperfeitamente autemmas, cumquando ada dīctumo dito im-pēnsaa despesa respondit responde, dēcrētīscom decretos et e honōrĭbuscom honras ōrnāturé distinguido. Itemigualmente sīse nonnão amplĭusmais quamque quartaa quarta [parte] ada aestimātiōnema estimação est adiciendadeve ser ajuntada, dēde pūblĭcōo [dinheiro] público  praestāturé emprestado, nequee não  ūllaalguma  poenapena  tenēturé sujeitado. Cumquando uērōverdadeiramente amplĭusmais quamque quartaa quarta [parte] inem opĕrea obra cōnsūmĭturé consumida, exde eiusdele bonīsos bens ad perficiendumpara acabar pecūnĭao dinheiro exigĭturé cobrado.

Exemplo de resposta:Combinação de substantivos, adjetivos e pronomes: nōbĭl ī  et  ampl ā cīuitāt e  – ablativo singular, ue-tusta lēx(c s )  – nominativo singular, ... Substantivos sós: Graecōrum  – genitivo plural, Ephĕsī   – locativo singular, ...Adjetivos sós: Há apenas um.Pronomes sós: Há apenas um.Numerais sós: Há apenas um.Verbos: dīcĭ tur   – terceira pessoa do singular do presente do indicativo na voz passiva, recĭpi t   – terceirapessoa do singular do presente do indicativo na voz ativa, ...Formas verbais impessoais: esse  – infinitivo presente, cōnstitūt a  – particípio passado no nominativosingular, ...

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 138/153

 

136LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Resumo do estudo do verbo

Aspecto, modo, tempo, pessoa, número  e voz, categorias próprias que possuía o

verbo latino e que continua a ter o verbo português, expressas em ambas as línguas por desi-

nências (modo-temporais e número-pessoais) que se ligam ao tema, isto é, ao conjunto da

raiz verbal mais uma vogal temática. Na morfologia verbal da nossa língua continua a distin-

guir-se dois aspectos (perfeito e imperfeito), três tempos (pretérito, presente e futuro), três

pessoas (primeira, segunda e terceira) e dois números (singular e plural). Talvez o que mais

estranhe o aprendiz luso-falante do latim seja o fato de que a voz passiva nos tempos imper-

feitos era expressa por flexão, e não por uma perífrase, como ocorre universalmente em por-

tuguês. Na verdade, a oposição entre flexão em latim e perífrase em português acontece tam-

bém em alguns tempos: futuro perfeito do indicativo, pretérito perfeito do subjuntivo, pre-

térito mais-que-perfeito do subjuntivo e opcionalmente o pretérito mais-que-perfeito do in-dicativo.

O sistema verbal latino surpreende, ainda, o aprendiz luso-falante por apresentar for-

mas flexionadas que deixaram de existir em português. Com efeito, além de haver um impe-

rativo futuro, as formas impessoais, que têm uma só forma em português, possuíam outras

flexões: o infinitivo podia ser pretérito ou presente, o particípio podia ser pretérito, passado 

ou futuro, o gerúndio declinava-se, além de haver uma forma impessoal chamada supino.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 139/153

 

137LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

VOCÁBULOS INFLEXIONÁVEIS

Neste capítulo alcançamos o fim da nossa caminhada pela gramática latina. A estas

alturas não há mais nem declinação nem conjugação, mas resta apenas estudar três classes

de vocábulos que nem se declinavam nem se conjugavam: o advérbio, a preposição e a con-

 junção, sendo estas duas agrupáveis em uma superclasse à qual poderíamos chamar nexos.

O nosso objetivo no presente capítulo é aparentemente contraditório, porque é ao

mesmo tempo modesto e arrojado. É modesto porque não trata de nenhum mecanismo

gramatical relativamente complexo, mas se destina muito mais a você conhecer os advérbios

e os nexos latinos. É arrojado porque aqui está a culminância de uma aprendizagem pela qual

 já se acumularam os conhecimentos fundamentais de um estudo introdutório à língua latina.

Estamos, pois, prestes a executar o grand finale da nossa disciplina!

Aquecimento“Quem desdenha quer comprar”. Quem nunca disse ou escutou esse ditado? Sabe de onde veio? Não?Pesquise!

Leia o texto a seguir:  A vaca, a cabrita, a ovelha e o leão

Nunca é fiel a aliança com o poderoso: esta fábula atesta o meu intuito. A vaca,a cabrita e a ovelha sofredora de injúria foram aliadas com o leão nos bos-ques. Como estes tivessem pegado um cervo de vasto corpo, feitas as partes,assim falou o leão: “Eu tomo a primeira, pois me chamo leão; a segunda con-cedereis a mim, porque sou forte; seguir-me-á, então, a terceira, porque valhomais; se alguém tiver tocado a quarta, será acometido pelo mal”. Assim, a de-

sonestidade sozinha levou toda a presa.

O homem e o tempo

Este texto é a quinta fábula do primeiro livro de Fedro. Fedro nasceu na Trácia no fim

da segunda década do século I d.C. e jovenzinho foi levado como escravo para Roma, onde

fez parte da escravaria de Augusto. Quando começou a dedicar-se à literatura, já reinava Ti-

bério e era liberto. Escreveu cinco livros de fábulas, das quais nos chegaram 101 autênticas,

e deveu viver até meados do século.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 140/153

 

138LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Fedro é um poeta de segunda grandeza e que compôs uma obra modesta. Não chegou

nem mesmo a desfrutar do sucesso que merecia durante a sua vida e as gerações seguintes.

Mesmo assim, o seu legado à literatura latina é, singelamente, ímpar.

Partindo da obra de Esopo, fabulista grego que viveu no século VIa.C., Fedro foi o primeiro autor antigo que escreveu fábulas em verso, o

que queria dizer que requeria uma dignidade para o gênero que até então

não tinha. Não que almejasse alçar a fábula aos gêneros literários mais

prestigiosos, tanto que usou o verso senário, tido como menos elevado,

mas as suas fábulas podiam ser lidas como poemas independentes.

Também foi o primeiro que, a partir da sua própria posição desfa-

vorável, percebeu que a literatura pode ser um meio de burlar as barreiras

sociais e se fazer ouvir. A fábula citada é um bom exemplo disso: por trásda divertida historieta de uma vaca, uma cabrita e uma ovelha que saem

com um leão a caçar soa uma voz que se levanta contra a opressão. Não

que Fedro fosse um revolucionário, o que seria um juízo tremendamente anacrônico. O seu

texto não deixa ver nenhum fito de mudança social; antes, preza a esperteza como meio de

lograr o opressor. A própria literatura de Fedro é toda astúcia!

Isso os próprios leitores contemporâneos entenderam, tanto que Lúcio Élio Sejano,

prefeito do Pretório, sentindo-se retratado e ofendido, perseguiu Fedro, que desde então de-

pendeu de libertos ricos para viver. O próprio Fedro diria depois, prologando o seu terceiro

livro, que não admoestava essa ou aquela pessoa, mas os costumes das pessoas.

É certo que a mordacidade que late em Fedro o aproxima da sátira, mas a escolha da

fábula lhe deu uma leveza que deleita o leitor moderno mais que os textos satíricos mais cáus-

ticos. Por outro lado, é preciso reconhecer que a brevidade própria do gênero comprometeu

o realismo e por vezes mesmo a verossimilhança: vacas, cabritas e ovelhas não caçam...

Gramática

Vamos ao conteúdo gramatical. Observe as sentenças seguintes:

1. 

A aliança com o poderoso nunca é fiel. 2.  A vaca, a cabrita e a ovelha sofredora de injúria foram aliadas com o leão nos bosques. 3.

 

Como estes tivessem pegado um cervo de vasto corpo, falou assim o leão. 4.

 

Eu tomo a primeira, pois me chamo leão. 5.  Concedereis a segunda a mim, porque sou forte. 6.  A terceira seguir-me-á então. 7.

 

Se alguém tiver tocado a quarta, será acometido pelo mal. 8.   Assim, a desonestidade sozinha levou toda a presa.  

Figura 34 - “Nondummātūra est; nōlō acerbamsūmĕre” (“Ainda não estámadura; não quero pegá-la azeda”).

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 141/153

 

139LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Palavras como com em 1 e 2, em (na forma n) em 2, como em 3, pois em 4, porque em

6, se em 7, desempenham a função de ligar uns termos a outros:

1.a. A aliançacom o poderoso nunca é fiel. 

2.a. A vaca, a cabrita e a ovelha sofredora de injúria foram aliadascom oleãonos bosques. 3.a. Falou assim o leãocomo estes tivessem pegado um cervo de vasto corpo. 4.a. Eu tomo a primeirapois me chamo leão. 5.a. Concedereis a segunda a mim porque sou forte. 6.a. Será acometido pelo malse alguém tiver tocado a quarta. 

Veja que em 1.a e 2.a o nexo liga sintagmas, respectivamente a aliança e o poderoso,

aliadas e o leão, aliadas com o leão e os bosques, mas em 3.a, 4.a, 5.a e 6.a, liga sentenças,

alguma com mudanças desencadeadas pelo próprio nexo: falou assim o leão e estes pegaram

um cervo de vasto corpo, eu tomo a primeira e chamo-me leão, concedereis a segunda a mim e sou forte, será acometido pelo mal  e quem tiver tocado a quarta. O nexo que liga vocábulos

e sintagmas tem o nome de  preposição e o que liga não só vocábulos e sintagmas, mas tam-

bém sentenças, o de conjunção. Cada um tem o seu próprio significado: com, companhia; em,

situação; como, causa; pois e porque, explicação; se, condição.

As outras palavras, nunca em 1, assim em 3 e 8, então em 6, funcionam como adjuntos

adverbiais. Na verdade, assim em 8 toma por escopo toda a sentença, de modo que é mais

apropriado chamar-lhe adjunto adsentencial. Seja como for, já sabemos que os adjuntos não

são argumentos do verbo, tanto que podem ser suprimidos sem haver prejuízo sintático:

1.b. A aliança com o poderoso é fiel. 3.b. Como estes tivessem pegado um cervo de vasto corpo, falou o leão.  6.b. A terceira seguir-me-á.8.b. A desonestidade sozinha levou toda a presa. 

Diferente seria retirar um termo como toda a presa em 8, que é o objeto direto do

verbo levou:

8.b. *A desonestidade sozinha levou. 

Levou o quê?

A supressão do adjunto adverbial ou adsentencial não acarreta prejuízo sintático, mas

é claro que comporta uma mudança semântica, pois desse ponto de vista a sua função é,

precisamente, predicar, verificar ou situar o seu escopo, que comumente é um verbo, mas

também pode ser um adjetivo ou uma sentença. As palavras que exercem precipuamente

essa função são chamadas advérbios.

Independentemente da função que têm, os advérbios, as preposições e as conjunções

comungam algo: não possuem aquelas categorias  – gênero, número, caso, aspecto, modo,

tempo, pessoa – que são expressas em outras classes mediante flexões. Apenas alguns advér-bios compartilham a categoria do grau com o adjetivo.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 142/153

 

140LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Vamos, então, ao latim. Eis o texto original de Fedro:

Vacca et capella, ouis et leō Numquam est fidēlis cum potente sociĕtās: 

Testātur haec fābella prōposĭtum meum. Vacca et capella et patĭēns ouis iniūrĭae Socĭī fuēre cum leōne in saltĭbus. Hī cum cēpissent ceruum uastī corpŏris, Sīc est locūtus, partĭbus factīs, leō: “Egō prīmam tollō, nōmĭnor quonĭam leō; Secundam, quia sum fortis, tribuētis mihi;Tum, quia plūs ualĕō, mē sequētur tertĭa; Malō afficiētur, sī quīs quartam tetigĕrit”.Sīc tōtam praedam sōla improbĭtās abstŭlit. 

A segunda sentença do sétimo verso, “Nōmĭnor quonĭam leō” (“Pois me chamo leão”),tornou-se um aforismo, o qual denuncia o abuso de poder mais descarado.

Eis as sentenças correspondentes às de 1 a 8:

9. 

Sociĕtās cum potente fidēlis numquam est. 10.

 

Vacca et capella et patĭēns ouis iniūrĭae socĭī cum leōne in saltĭbus fuēre. 11.

 

Cum hī ceruum uastī corpŏris cēpissent, leō sīc locūtus est. 12.

 

Egō prīmam tollō, quonĭam leō nōmĭnor. 13. Secundam mihi tribuētis, quia fortis sum. 14. Tertĭa mihi tum sequētur. 

15. 

Sī quīs quartam tetigĕrit, malō afficiētur. 16.

 

Sōla improbĭtās tōtam praedam sīc abstŭlit. 

Nos capítulos dedicados à declinação, aprendemos que os casos dativo, ablativo e ge-

nitivo correspondem geralmente a sintagmas preposicionais em português, nucleados res-

pectivamente pelas preposições a ou  para, com ou por  e de. Em outras palavras, onde em

português nos valemos de preposições, o falante do latim servia-se de flexões. Não obstante,

as palavras cum em 1 e 2 e in em 2 mostram que em latim também se usavam preposições.

Em línguas em que há mais de uma dezena de casos, como o basco (doze casos), o finlandês 

(quinze casos), o húngaro (dezoito casos) ou o quíchua (dezenove casos), mal se precisa de

preposições ou posposições, mas em latim, com os seus seis casos, eram necessárias para

exprimir muitas relações, como companhia, por cum, em 1 e 2, e situação, por in, em 2.

É claro que mesmo usando uma preposição, o nome que ela tomava por escopo tinha

de estar declinado em algum caso, já que não havia uma forma não casual. Atente para as

palavras potente, leōne e saltĭbus: estão no ablativo. Com efeito, umas preposições latinas

ligavam-se ao nome no caso acusativo, outras no ablativo e umas terceiras em ambos os ca-

sos com significados diferentes em cada um. Façamos, pois, a enumeração das preposições

latinas com o seu significado básico:

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 143/153

 

141LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

  Preposições primitivas (herdadas do protoindo-europeu): ā/ab /abs  ‘a partir

de’, ad  ‘a, para’, cum ‘com’, dē ‘do alto de’, ē/ex  ‘de dentro de’, in ‘em’, inter  

‘entre’, ob/obs ‘diante de’, per  ‘por’, prae ‘pela frente de’, prō ‘na frente de, a

favor de’, sine ‘sem’, sub ‘sob’, super  ‘sobre’.  Preposições derivadas (geralmente de adjetivos, alguns dos quais não estão

atestados no latim literário): ante ‘diante de, antes de’, apud  ‘junto a’, circā/cir-

cum ‘ao redor de’, cis ‘aquém de’, citrā ‘aquém de’, contrā ‘contra’, cōram ‘na

presença de’, ergā  ‘para com’, extrā ‘fora de’, infrā ‘abaixo de’, intrā ‘dentro

de’, iuxtā ‘ao lado de’, penēs ‘na posse de’, post  ‘detrás de, depois de’, praeter  

‘em frente de’, prope ‘perto de’, propter  ‘perto de’, secundum ‘depois de’, sub-

ter  ‘debaixo de’, suprā ‘acima de, para cima de’, t rāns ‘além de’, tenus ‘até’,

ultrā ‘além de’.

As preposições ā/ab /abs, cum, dē, ē/ex , prae, prō, sine e tenus selecionavam o caso

ablativo. As demais preposições selecionavam o acusativo. As preposições in, sub e super  se-

lecionavam ambos os casos, sendo que com o acusativo significavam respectivamente ‘para

dentro de’, ‘para baixo’ e ‘a respeito de’.

As preposições latinas também eram usadas como prefixos, que concediam a palavra

à qual se prendiam o seu significado. Você deve ter notado isso não porque já saiba o latim,

mas porque sabe o português, língua em que isso continua a ocorrer.

Com efeito, as preposições-prefixos derivadas ainda são bem perceptíveis como cons-

tituintes do vocábulo: antever  (‘ver algo antes de acontecer’), circunscrever  (‘escrever um cír-

culo ao redor de algo’), Cis jordânia (‘aquém do rio Jordão’), contradizer   (‘dizer algo contra 

alguém’), extraconjugal  (‘fora da relação dos cônjuges’), infraestrutura (‘estrutura abaixo de 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 144/153

 

142LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

outra’), intraocular  (‘dentro do olho’), justa por  (‘pôr algo junto de outra coisa’), pós-gradua-

ção (‘graduação depois de outra’), supracitado (‘citado acima daqui’), transbordar  (‘derramar

algo além das bordas’), ultra passar  (‘passar algo além de outra coisa’). Também algumas pri-

mitivas: inter nacional  (‘entre nações’), per correr  (‘correr por algum lugar’), prematuro (‘ma-duro antes do tempo’), super visão (‘visão em cima de algo’).

As preposições-prefixos primitivas são menos reconhecíveis. A raiz verbal iac- (que po-

dia alternar para iec-) ‘lançar’ é especialmente produtiva com eles. Por mudanças do latim

vulgar para o português, essa raiz deu apenas duas palavras à nossa língua: dēiectāre ‘lançar

de cima a baixo’ deu deitar  e subiectus ‘lançado para baixo de algo’ deu sujeito. As demais

palavras são empréstimos ao latim literário: abjeto, originariamente ‘lançado a partir de algo’;

adjetivo, origte. ‘lançado para algo’; conjectura, origte. ‘lançamento de uma coisa com outra’;

dejeto, origte. ‘lançado de cima a baixo’; ejetar , origte. ‘lançar algo de dentro para fora’; inje-

tar , origte. ‘lançar algo para dentro de outra coisa’; objeto, origte. ‘lançado diante de algo’;

 projeto ‘lançado na frente de algo’.

Não era à toa que várias preposições latinas tinham origem em adjetivos: estas duas

classes e mais a dos advérbios têm ainda uma relação um tanto promíscua. Os adjetivos de-

ram origem a boa parte das preposições, a maioria das preposições podia funcionar como

advérbios (também em português) e alguns advérbios derivavam de adjetivos. Como? Sim-

plesmente declinando o adjetivo no ablativo singular (exemplos tirados de Publílio Siro):

17.a. Obsequĭum nuptae citō fit odĭum pēlĭcis. 

17.b. O recato da casada torna-se rapidamente o ódio da manceba. 18.a. Quemcumque quaerit calamĭtās facĭle inuĕnit. 18.b. A desgraça acha facilmente todo aquele que ela busca. 

Os advérbios citō e facĭle são as formas do ablativo singular dos adjetivos citus ‘rápido’ 

e facĭlis ‘fácil’. Perceba que o advérbio cedo é continuação de citō.

Também se podia acrescentar a desinência -ē à raiz de um adjetivo triforme ou -ter  ao

tema de um adjetivo biforme ou uniforme, como nas sentenças seguintes:

19.a. Perdidisse honestē māllem quam accēpisse turpĭter. 

19.b. Quisesse eu antes ter perdido honestamente que ter ganhado torpemente. 20.a. Nusquam melĭus morīmur homĭnēs quam ubī libenter uīxĭmus. 20.b. Em nenhum lugar é melhor os homens morrermos que onde vivemos prazerosa-mente. 

Os advérbios honestē, turpĭter  e libenter  derivam dos adjetivos honestus, turpis e li-

bēns.

Perceba, ainda, que melĭus em 20 também é um advérbio, mais precisamente o com-

parativo do advérbio bene. Como eu disse antes, a única flexão que possuem alguns advér-

bios, justamente os que derivam de adjetivos, é a flexão de grau: melĭus é o comparativo debene ‘bem’ assim como melĭor  o é de bonus ‘bom’. Igualmente, pēius é o comparativo de male 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 145/153

 

143LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

‘mal’, como pēior  o é de malus ‘mau’. Tanto melĭor  e pēior  como melĭus e pēius correspondem

a umas únicas formas em português: melhor  e pior .

Para formar o superlativo, basta seguir a regra de derivação dos advérbios a partir de

adjetivos triformes: de optĭmus ‘muito bom’, optĭmē ‘muito bem’, e  pessĭmus  ‘muito mau’, pessĭmē ‘muito mal’.

Esclarecido o mecanismo de derivação de alguns advérbios a partir de adjetivos, tra-

cemos o rol dos principais membros dessa classe com o significado básico de cada um:

  Advérbios de modo: Respondiam à pergunta Quōmŏdō?  ‘Como?’.

o  etĭam e quoque ‘também’, ferē, prope e paene ‘quase’, ita e sīc ‘assim’,

modō e sōlum ‘apenas’, frustrā e nēquīquam ‘em vão’, quasi  ‘como se’,

sponte ‘à vontade’ etc.

 

Advérbios de quantidade: Respondiam à pergunta Quantum?  ‘Quanto?’.

o   parum ou paulum ‘pouco’, satis ‘bastante’, multum ‘muito’, nimis ‘de-

mais’;

o  minus ‘menos’, magis ‘mais’;

o  tantum ‘tanto’, quantum ‘quanto’.

  Advérbios de lugar: 

o  Derivados de pronomes demonstrativos e relativos:  Respondiam às

perguntas Vbī?  ‘Onde?’, Vnde?  ‘De onde?’, Quō?  ‘Aonde?’ e Quā?  ‘Por

onde?’.

  Vbī? : hīc ‘aqui’, istīc ‘aí’, illīc ‘ali’, ibī  ‘aí’, ibīdem ‘aí mesmo’, alĭbī  

‘em outro lugar’, alicŭbī   ‘em algum lugar’, ubīque  ‘em toda

parte’ etc.

  Vnde? : hinc ‘daqui’, istinc ‘daí’, illinc ‘dali’, inde ‘daí’ indĭdem ‘daí

mesmo’, aliunde  ‘de outro lugar’, alicunde  ‘de algum lugar’,

undĭque ‘de todas as partes’ etc.

  Quō? : hūc  ‘para cá’, istūc  ‘para aí’, illūc  ‘para lá’, eō  ‘para aí’,

eōdem ‘para aí mesmo’, alĭō ‘para outro lugar’, alĭquō ‘para al-

gum lugar’ etc.  Quā? : hāc  ‘por aqui’, istāc  ‘por aí’, illāc  ‘por ali’, eā  ‘por aí’,

eādem ‘por aí mesmo’, alĭā ‘por outro lugar’ etc.

o  Derivados de vocábulos de outras classes: dextrā ‘à direita’, laeuā ou

sinistrā ‘à esquerda’; intus ‘dentro’, forīs ‘fora’; intrō ‘para dentro’, forās 

‘para fora’; prope ‘perto’, procul  ‘longe’; retrō ‘para trás’.

  Advérbios de tempo: Respondiam à pergunta Quandō?  ‘Quando?’.

o  ōlim  ou quondam  ‘outrora’, dūdum  ou  prīdem  ‘há muito’, nūper   ‘há

pouco’, iam ‘já, agora’, nunc ‘agora’, dein ou deinde ‘em seguida’, mox  

‘logo’, aliquandō ‘algum dia’;

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 146/153

 

144LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

o  numquam ou nunquam ‘nunca’, quondam ‘uma vez’, umquam ou un-

quam  ‘algumas vezes’, interdum  ‘às vezes’, saepe  ‘amiúde’, cottīdĭē,

cotīdĭē ou quotīdĭē ‘todo dia’, quotannīs ‘todos os anos’, semper  ‘sem-

pre’;o  antĕā  ‘antes’, intĕrim  ou interĕā  ‘enquanto isso’, simul   ‘ao mesmo

tempo’, postĕā ‘depois’;

o  nondum ‘ainda não’, adhūc ‘ainda’, tum ou tunc ‘então’, illĭcō ou  īlĭcō 

‘logo’, stātim ‘imediatamente’, dēmum, denĭque ou tandem ‘enfim’;

o  herī  ‘ontem’, hodĭē ‘hoje’, crās ‘amanhã’;

o   prīdĭē ‘na véspera’, postrīdĭē ‘no outro dia’;

o  diū ‘de dia’, noctū ‘de noite’;

o  māne ‘de manhã’, uespĕre ou uespĕrī  ‘de tarde’, nocte ‘de noite’;

 

Outros advérbios interrogativos:  cūr?   ou quāre?   ‘por quê?’, quīn?   ‘por quenão?’.

o  Marcadores interrogativos: 

  Quando não se sabia que resposta esperar: -ne.

  Quando se esperava uma resposta afirmativa: nonne.

  Quando se esperava uma resposta negativa: num.

  Advérbios de afirmação, dúvida e negação: 

o   Afirmação: equĭdem ou quidem ‘com certeza’, etĭam ou ita ‘sim’.

o  Dúvida:  fortasse, forsan ou forsĭtan ‘talvez’, forte ‘por acaso’.

Negação: hau, haud  ou haut , nē ou non ‘não’.

Para acabar, tratemos das conjunções. Observe as sentenças seguintes:

12. Egō prīmam tollō, quonĭam leō nōmĭnor. 4. Eu tomo a primeira, pois me chamo leão. 13. Secundam mihi tribuētis, quia fortis sum. 5. Concedereis a segunda a mim, porque sou forte. 

Perceba que as sentenças sublinhadas, graças aos termos em negrito  – que são con-

 junções – desempenham a função de adjunto adverbial do verbo da outra sentença. Agora

observe esse dístico de Catão:

21.a. Quod iūstum est petĭtō uel quod uideātur honestum,nam stultum est petĕre quod possit iūre negārī.  21.b. Pede o que é justo ou o que vejas ser honesto,pois é tolo pedir o que possa ser negado pelo direito.

Que função sintática exerce a oração sublinhada com relação a quod iūstum est  / o que

é justo? Nenhuma, pois estão em pé de igualdade, de modo que a preposição uel  / ou estabe-

lece apenas uma relação de alternância entre ambas. Cada uma, isto sim, funciona como o

objeto direto do verbo petĭtō /  pede. Observe, enfim, a última sentença de Publílio Siro:

20.a. Nusquam melĭus morīmur homĭnēs quam ubī libenter uīxĭmus. 

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 147/153

 

145LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

20.b. Em nenhum lugar é melhor os homens morrermos que onde vivemos prazerosa-mente. 

Que função sintática tem a oração sublinhada com relação à outra? Nenhuma, mas

também não está tão livre como a sublinhada em 21, pois se suprimida, fica faltando o termoda comparação que pede o advérbio melĭus / melhor :

20.c. *Nusquam melĭus morīmur homĭnēs. 20.d. *Em nenhum lugar é melhor os homens morrermos. 

Onde é melhor os homens morrermos?

Quando a conjunção liga sentenças mantendo a independência sintática de cada uma,

diz-se que a conjunção é coordenativa. Quando uma sentença é encaixada em outra, assu-

mindo uma função sintática como se fosse um termo dessa outra, diz-se que a conjunção é

subordinativa. Quando uma sentença é dependente mesmo sem fazer parte de outra, diz-seque a conjunção é correlativa. Os respectivos mecanismos têm os nomes de coordenação,

subordinação e correlação.

Vejamos, pois, quais eram as principais conjunções latinas:

  Coordenativas:

o   Aditivas: ac, atque, et  e -que ‘e’, nec e neque ‘nem, e não’.

o   Adversativas: ast , at , autem, sed , tamen ‘mas, porém, todavia, con-

tudo, entretanto, no entanto’.

 Alternativas: aut , -ue e uel  ‘ou’, seu ou siue ‘ou se’.o  Causais: enim e etĕnim, ergō, igĭtur , ităque, nam e namque  ‘logo,

pois, portanto, por conseguinte, de fato, com efeito, efetivamente’.

  Subordinativas:

o  Condicionais: nī , nisi  ‘se não’, sī  ‘se’, sī n ‘mas se’.

o  Concessivas: etsi , quamquam, quamuis, licet  ‘embora, ainda que, se

bem que’.

o  Causais:  cum  ‘como’, quia, quod , quonĭam  ‘porque, já que, dado

que, posto que, visto que’.

o  Finais: nē ‘para que não’, quō, ut  ou utī  ‘para que’.

o  Temporais: cum  ‘quando’, dōnec, dum  ‘enquanto’, ut  ou utī   ‘logo

que’.

o  Integrantes: quīn, quod , ut  ou utī  ‘que’, nē ‘que, que não’.

  Correlativas:

o  quasi  ‘como se’, quam ‘do que’, sī cut  ‘assim como’, ut  ou utī  ‘como’.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 148/153

 

146LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

ExercícioEnfim, alcançamos o momento de você olhar o texto latino e enxergar nele todos os elementos que ocompõem. O texto a seguir é outra fábula de Fedro. Em vez de identificar as palavras por classe juntocom as suas categorias gramaticais, tentemos identificar as sentenças inteiras que compõem esse texto.

Identifique-as, pois, e transcreva-as na ordem não marcada. Lembre-se de que em latim essa ordem é:

sujeito (caso nominativo) – objeto direto (caso acusativo) – objeto indireto (caso dativo) – complementooblíquo (caso ablativo ou preposição + ablativo ou acusativo) – adjunto adverbial – verbo

É claro que nem todas as sentenças apresentam todos esses elementos. Além disso, antes de cadasujeito, objeto direto, objeto indireto e complemento oblíquo pode haver um adjunto ou complementonominal, expresso por um substantivo em um caso oblíquo (mais comumente no genitivo), um adjetivo,um pronome ou um numeral.Pode desconsiderar as sentenças inquit  e ait , que inserem o discurso indireto no direto.

Lupuso lobo et e agnuso cordeiro Ada rīuumum rio eundemcorrente lupusum lobo et e agnusum cordeiro uēnĕrant tinham vindo sitīpela sede compulsīforçados; superĭormais acima stābat estava lupuso lobo longēquee longe inferĭormais abaixo agnuso cordeiro. Tuncentão faucecom a garganta imprŏbāperversa latrōo ladrão incitātusincitado iurgĭīà arenga causamuma desculpa intŭlit arranjou.“Cūr” por que inquit disse “turbulentamturva fēcistīfizeste mihime aquama água bibentīde beber?” Lānĭgero lãzudo contrāem oposição timēnstemoroso:“Quīcomo possumposso, quaesōpor favor, facĕrefazer quodo que querĕriste queixas, lupelobo?Āde tēti decurrit corre adpara meōsmeus haustūsos goles liquoro líquido”. Repulsusafastado illeaquele uēritātisda verdade uirĭbuspelas forças:“Anteatrás hōsestes sexseis mēnsēsmeses malemal” ait disse “dīxistīdisseste mihide mim”. Respondit responde agnuso cordeiro: “Equĭdemcertamente nātus non eramnão tinha nascido”. “Patero pai, hercle!por Hércules, tuusteu” illeaquele inquit disse “malemal dīxit disse mihide mim”. Atquee itaassim correptumo roubado lacĕrat rasga iniūstācom injusta nececom morte.Haecesta propterpara illōsaqueles scrīptaescrita est foi homĭnēshomens fābŭlafábula,quīque fictīscom fingidas causīscom razões innocentēsos inocentes opprĭmunt oprimem.

O lobo e o cordeiroUm lobo e um cordeiro tinham vindo a um rio corrente forçados pela sede; o lobo estava mais acima eo cordeiro mais longe abaixo. Então com a garganta perversa o ladrão incitado arranjou uma desculpade arenga. “Por que” disse “tornaste turva a água a mim, o bebedor?”. O lãzudo temeroso em oposição:“Como posso, por favor, fazer aquilo de que te queixas, lobo? De ti o líquido corre para os meus goles”.Afastado aquele pelas forças da verdade: “Seis meses atrás” disse “falaste mal de mim”. Respondeu ocordeiro: “Certamente não tinha nascido”. “O teu pai, por Hércules!” disse aquele “falou mal de mim”.E assim rasga o roubado com injusta morte. Esta fábula foi escrita para aqueles homens que com razõesfingidas oprimem os inocentes.

Exemplo de resposta:Lupus et agnus sitī  compulsī ad eundem rīuum uēnĕrant. Lupus superĭor stābat agnusque inferĭor longē. ...

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 149/153

 

147LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

Resumo do estudo dos vocábulos inflexionáveis

Perceba que este capítulo, diferentemente dos demais que compõem o presente livro-

texto, não foi partido em seções. Mas, dado que estudamos nele três classes diferentes de

vocábulos, não se poderia tê-lo ordenado em três partes? Sim, mas o fato é que essas classes

 – o advérbio, a preposição e a conjunção  – estavam consideravelmente imiscuídas. O que

definia certos termos como advérbio ou preposição, ou certos outros como preposição ou

conjunção? O uso. Convém lembrar que o advérbio, como o nome mesmo sugere, desempe-

nha a função de adjunto adverbial, às vezes também de adjunto adnominal; a preposição liga

vocábulos ou sentenças e conjunção liga exclusivamente sentenças.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 150/153

 

148LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

BIBLIOGRAFIA

AGNOLON, Alexandre. Poesia e agudeza: Algumas considerações acerca do epigrama entreos antigos. In: Encontro Memorial do ICHS-UFOP, II, Mariana. Anais... Mariana: ICHS/UFOP,2009. 

AGUIAR, Miguel. História de Roma: Breve percurso pelos momentos decisivos para a afirma-ção da civilização romana. Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2012.

ALFÖDY, Géza. A história social de Roma. Lisboa: Presença, 1989.

ALFONSI, Luigi. La latinidad en la formación de Europa. Revista de Estudios Políticos, Madrid,n. 215, p. 251-258, 1977.

ALMEIDA, Napoleão Mendes de. Gramática latina: curso único e completo. 30 ed. São Paulo:Saraiva, 2009.

ALMENDRA, Maria Ana; FIGUEIREDO, José Nunes de. Compêndio de gramática latina. Porto:Porto, 2003.

ANTIQUEIRA, Moisés. Moderatio tuendae libertatis: moderação, exempla e poder na históriade Tito Lívio (livro III). 2008. 177 p. Dissertação (Mestrado em História) - Programa de Pós-Graduação em História Social, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universi-dade de São Paulo, São Paulo.

Bibliotheca Augustana. Disponível em: http://www.hs-augsburg.de/~harsch/augustana.html Acesso em: out.-dez. 2012.

BRUNO, Haroldo. Equívocos nos estudos latinos. Classica, Belo Horizonte, v. 5/6, supl. 1, p.156-170, 1992.

BUSTAMANTE, Regina Maria da Cunha. Rômulo e Remo: Escritos e ritos. História Revista, Goi-ânia, v. 6, n. 2, p. 87-116, 2001.

CAETANO, Marcelo. História do direito português. Lisboa: Ernesto Fernandes, Aníbal Rêgo,1941.

CASTILHO, Ataliba Teixeira de. Gramática do português brasileiro. São Paulo: Contexto, 2010.

CEFET-RN – CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DO RIO GRANDE DO NORTE. Pro- jeto pedagógico da licenciatura em Espanhol. Natal: CEFET-RN, 2005.

CODOÑER, Carmen (ed.). Historia de la literatura latina. 2. ed. Madrid: Cátedra, 2007.

CORVO SÁNCHEZ, María José. Gramáticos y gramáticas humanistas en el contexto internacio-nal. In: RIO-TORTO, Graça Maria; FIGUEIREDO, Olívia Maria; SILVA, Fátima (coord.). Estudosem homenagem ao Professor Doutor Mário Vilela. Porto: Faculdade de Letras da Universi-dade do Porto, 2005, p. 685-694.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 151/153

 

149LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

COSERIU, Eugenio. Sincronia, diacronia e história: o problema da mudança linguística. Rio deJaneiro: Presença, 1979.

DEVOTO, Giacomo. Storia della lingua di Roma. Bologna: Licinio Cappelli, 1940.

FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília: UnB, 2001.

FARIA, Ernesto. Fonética histórica do latim. 2. ed. Rio de Janeiro: Acadêmica, 1957.

 _____. Introdução à didática do latim. Rio de Janeiro: Acadêmica, 1959.

 _____. Gramática da língua latina. 2. ed. Rio de Janeiro: FAE, 1995.

 _____. Dicionário latino-português. Belo Horizonte: Garnier, 2003.

FERNANDES, Thaís. A tradução e o ensino de latim. 2010. 228 p. Dissertação (Mestrado emTradução) - Programa de Pós-Graduação em Tradução, Universidade Federal de Santa Cata-

rina, Florianópolis. _____. Alguns problemas teóricos da tradução de línguas antigas: Reflexões acerca das difi-culdades do tradutor do latim. Scientia Traductionis, n. 10, p. 80-89, 2011.

FIORIN, José Luiz. Letras clássicas no 2º grau: competência textual e intertextual. In: CongressoNacional de Estudos Clássicos, 2, 1989, São Paulo. Atas... São Paulo: FFLCH/USP, 1991, p. 514-519.

FORTES, Fábio da Silva. A “língua” e os textos: gramática e tradição no ensino de latim. Instru-mento, Juiz de Fora, v. 12, n. 1, p. 63-70, 2010.

FUNARI, Pedro Paulo. Grécia e Roma. 5. ed. São Paulo: Contexto, 2011.

GAFFIOT, Félix. Dictionnaire latin-français. Paris: Hachette, 1934.

GRANDAZZI, Alexandre. As origens de Roma. São Paulo: UNESP, 2010.

GRIMAL, Pierre. História de Roma. São Paulo: UNESP, 2011.

 _____. Mitologia clássica: mitos, deuses e heróis. Lisboa: Texto & Grafia, 2009.

IFRN  –  INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO RIO GRANDE DONORTE. Projeto pedagógico do curso superior de licenciatura em Espanhol  – modalidadepresencial. Natal: IFRN, 2012.

IFRN  –  INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO RIO GRANDE DONORTE. Projeto pedagógico do curso superior de licenciatura em Letras  – Espanhol na mo-dalidade presencial. Natal: IFRN, 2014.

LEITE, Francisco de Freitas. O latim em cartas do Cariri cearense: final do século XIX e iníciodo século XX. 2009. 150 p. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Centro de Ciências Huma-nas, Letras e Artes, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa.

LEITE, Leni Ribeiro. O patronato em Marcial. 2003. 83 p. Dissertação (Mestrado em LetrasClássicas) – Faculdade de Letras, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 152/153

 

150LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

LIMA, Alceu Dias. Uma estranha língua? Questões de linguagem e de método. São Paulo:Unesp, 1995.

 _____. Possíveis correspondências expressivas entre latim e português: Reflexões na área da

tradução. Itinerários, Araraquara, número especial, p. 13-22, 2003. _____. O enunciado latino e a iniciação científica. Calíope, Rio de Janeiro, n. 15, p. 13-22, 2006.

LIMA, Sidney Calheiros de. Cícero e a obra filosófica em latim como munus rei publicae. Nun-tius Antiquus, Belo Horizonte, n. 5, p. 92-110, 2010.

LÍVIO, Tito. História de Roma: Livro I – A monarquia. Tradução de Mônica Costa Vitorino. BeloHorizonte: Crisálida, 2008.

LONGO, Giovanna. Da fala à língua: Proposta de encaminhamento para o estudo do enunciadolatino. In: Semana de Estudos Clássicos, XXIII, 2008, Araraquara. Anais... Araraquara:

FCL/UNESP, 2008, p. 150-157. _____. Ensino de latim: problemas lingüísticos e uso de dicionário. 2006. 105 p. Dissertação(Mestrado em Linguística e Língua Portuguesa) - Faculdade de Ciências e Letras, UniversidadeEstadual Paulista, Araraquara.

MARANHÃO, Samantha de Moura. Reflexões sobre o ensino de língua latina em cursos supe-riores de letras modernas. Instrumento, Juiz de Fora, v. 11, n. 1, p. 27-36, 2009.

MARTINS, Paulo. Literatura latina. Curitiba: IESDE Brasil, 2009.

MIOTTI, Charlene Martins. O ensino do latim nas universidades públicas do estado de São

Paulo e o método inglês Reading Latin: um estudo de caso. 2006. 145 p. Dissertação (Mes-trado em Linguística) - Programa de Pós-Graduação em Linguística, Instituto de Estudos daLinguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas.

 _____. Universidades estaduais paulistas: o latim na berlinda. In: Encontro do Círculo de Estu-dos Linguísticos do Sul, 6, 2004, Florianópolis. Anais... Florianópolis: CELSUL, 2004.

NAVARRO, Eduardo de Almeida. O século XVI e sua problemática lingüística. Soletras, SãoGonçalo, ano V, n. 10, p. 62-68, 2005.

NORBERG, Dag. Manual prático de latim medieval: breve história do latim medieval. Rio deJaneiro: CiFEFiL, 2007.

NOVILLO LÓPEZ, Miguel Ángel. Breve historia de Roma. Madrid: Nowtilus, 2012.

NÚÑEZ GONZÁLEZ, Juan María. Ciceronianismo y latín renacentista. Revista de Filología Clá-sica, Valladolid, n. 5, p. 229-258, 1991.

OLIVEIRA, Alzir. Considerações sobre a prática didática das línguas clássicas. In: Congresso Na-cional de Estudos Clássicos, 4, 2001, Ouro Preto. Anais... Ouro Preto: UFOP, 2001.

OLIVEIRA, Rita de Cássia de. Percorrendo os caminhos do direito civil brasileiro. Mosaico, Goi-ânia, v. 4, n. 1, p. 134-149, 2011.

PASTOR, Bárbara. Breve historia de la antigua Roma: Monarquía y República. Madrid: Nowti-lus, 2008.

7/18/2019 LIVRO-TEXTO DE LÍNGUA LATINA - IFRN (1).pdf

http://slidepdf.com/reader/full/livro-texto-de-lingua-latina-ifrn-1pdf 153/153

 

151LIVRO-TEXTO DE L ATIM I – IFRN/C ÂMPUS N ATAL - CENTRAL 

 _____. Breve historia de la antigua Roma: Imperio. Madrid: Nowtilus, 2008.

PERIS, Ernesto Martín (dir.). Diccionario de términos clave de ELE. Madrid: SGEL, 2008.

PINTO, Neiva Ferreira; BRANDÃO, Jacyntho Lins (org.). Cultura clássica em debate: Estudos de

Arqueologia, História, Filosofia, Literatura e Lingüística greco-romana. Belo Horizonte: UFMG,1987.

POUSADA, Estevan Lo Ré. Preservação da tradição jurídica luso-brasileira: Teixeira de Freitase a Introdução à Consolidação das Leis Civis. Dissertação (Mestrado em Direito)  – Faculdadede Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo.

PRADO, João Batista Toledo. Latim, moinhos e cavaleiros andantes. Classica, Belo Horizonte,v. 5/6, supl. 1, p. 150-156, 1992.

RAMOS, Ricardo Tupiniquim. Per saecula saeculorum: considerações sobre o cristianismo e o

latim. In: Congresso Nacional de Linguística e Filologia, 14, 2010, Rio de Janeiro. Cadernos... Rio de Janeiro: CiFEFiL, 2010, n. 4, t. 4, p. 3333-3346.

ROBINS, Robert Henry. Pequena história da lingüística. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1979.

SILVA, Paulo Roberto Souza da. A figura de César, autor e personagem, nos Commentarii de

Bello Gallico. 2006. 178 p. Dissertação (Mestrado em Letras Clássicas) – Faculdade de Letras,Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

SOARES, Willy Paredes. Abordagem retórico-filosófica in De natura deorum, Liber primus deCícero. 2008. 131 p. Dissertação (Mestrado em Letras) - Programa de Pós-Graduação em Le-tras, Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal da Paraíba, João Pes-