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  O INFERNO EXISTE Provas e Exemplos Pelo Servo de Deus Pe. André Beltrami, SDB IMPRIMATUR : Por comissão especial do Exmo. e Revmo. Sr. Bispo de Niterói D. José Pereira Alves.  Niterói , 1.º de janeiro de 1945. Pe. Francisco X. Lanna, SS.

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O INFERNO EXISTEProvas e Exemplos

Pelo Servo de Deus Pe. Andr Beltrami, SDB

IMPRIMATUR: Por comisso especial do Exmo. e Revmo. Sr. Bispo de Niteri D. Jos Pereira Alves. Niteri, 1. de janeiro de 1945. Pe. Francisco X. Lanna, SS.

PREFCIO DO AUTOR Nos nossos dias, mais que em outros tempos, necessrio lembrar aos cristos a existncia do inferno, j que muitos vivem como se as verdades da F no existissem. O pensamento do inferno foi sempre fecundo de generosas resolues. Quantos abandonaram o pecado e se entregaram de corpo e alma pratica da virtude, meditando naquelas chamas devoradoras, naqueles tormentos horrveis que a lngua humana no pode exprimir! O padre Mestre Avila converteu uma senhora tda entregue aos pecados e s vaidades do mundo pondo-lhe diante o terrvel sempre e o terrvel nunca, sempre sofrer, nunca um instante de alvio. Por isso, suplico ao bom leitor que, depois de ter lido ste opsculo, o faa ler aos seus parentes e amigos que vivem afastados de Deus, esquecidos da sorte infeliz reservada aos mpios na outra vida. Quem sabe se o pensamento das chamas eternas no suscite em seus coraes um temor salutar que os determine a mudar de vida! Pode bem ser que os exemplos narrados contribuam para avivar em seus coraes a f j extinta! E se unirem tambm s suas oraes para tal fim, estou certo de que Nosso Senhor lhes tocar o corao e les voltaro s prticas da religio que abandonaram. Na compilao dste livrinho, val-me especialmente dos trabalhos de Monsenhor Luiz Gasto, Sgur e do Padre Francisco Xavier Schouppe, que to egregiamente trataram dsse assunto. Deus, o qual protesta no querer a morte do pecador, mas que se converta e viva, abenoe meu pobre trabalhinho e faa de maneira que sirva para a converso de tantos transviados e os afaste do caminho da perdio. Jesus Cristo os estreitar cheio de alegria ao seu Sacratssimo Corao, como j fez um dia com o filho prdigo, e os Anjos faro festa e celebraro com cnticos de alegria o seu retrno casa paterna. Turim Valslice Seminrio das Misses junho de 1897

CAPTULO I A revelao divina demonstra a existncia do inferno No h verdade to inculcada na Sagrada Escritura como a da existncia do inferno. Escritores inspirados falam dle continuamente, para que os homens, horrorizados com as penas que a se sofrem abandonem o vcio e se dem prtica da virtude. Os protestantes, que de nossa santa religio negaram quase tdas as verdades mais difceis de crer e praticar no souberam desfazer-se do dogma do inferno, pelo fato de ser frequentemente recordado nas Sagradas Letras. Por ste motivo, uma senhora catlica, importunada por dois ministros protestantes a passar para a reforma, saiu-se com esta sensata resposta: Senhores, fizestes na verdade uma bela reforma, suprimistes o jejum, a confisso, o purgatrio; infelizmente, porm, conservastes os inferno. Tirai tambm ste e eu serei dos vossos. Para no multiplicarmos as citaes, deixaremos o Antigo Testamento e viremos logo ao Evangelho, para ouvir a palavra de Jesus Cristo, que por bem quinze vezes proclama ste lugar de tormentas. E para causar em ns um temor salutar e dar-nos uma idia justa do inferno, le o chama fogo inextinguvel, trevas exteriores, onde haver pranto e ranger de dentes, lugar de tormentos, fornalha de fogo, geena de fogo. A geena era um vale perto de Jerusalm, onde alguns maldosos hebreus apstatas de sua religio, sacrificavam a Moloc os tenros filhos, expondo-os antes ao fogo. O piedoso rei Josias, para abolir sse brbaro costume, fz aterrar o vale, ordenando que se lanasse a a imundcie da cidade e

os cadveres aos quais fosse negada a sepultura; e como medida profiltica, conservava-se sempre aceso o fogo. O nosso Divino Salvador, para tornar mais sensvel a idia do inferno, tomou a imagem dsse vale, que os hebreus abominavam, dando-lhe precisamente o nome de geena. Na parbola do rico epulo, to fecunda de ensinamentos e que to importuna aos ricos gozadores do mundo, Jesus nos ensinou que o mau uso das riquezas conduz inevitvelmente ao inferno, enquanto as dificuldades e as privaes suportadas por amor de Deus levam ao lugar de eterna felicidade. Havia um homem rico, que se vestia de prpura, e de linho e que todos os dias se banqueteava esplendidamente. Havia tambm um mendigo, chamado Lzaro, o qual coberto de chagas, estava deitado sua porta, desejando saciar-se com as migalhas que caam da mesa do rico, e ningum lhas dava; mas os ces vinham lamber-lhe as chagas. Ora, sucedeu morrer o mendigo, e foi levado pelos anjos ao seio de Abrao. Morreu tambm o rico, e foi sepultado no inferno. E, quando estava nos tormentos, levantando os olhos, viu ao longe Abrao, e Lzaro no seu seio; e, gritando disse: Pai Abrao, compadece-te de mim, e manda a Lzaro que molhe em gua a ponta do dedo, para refrescar a minha lngua, pois sou atormentado nesta chama. E Abrao disse-lhe: Filho, lembra-te que recebeste os bens em tua vida e Lzaro, ao contrrio, males por isso le agora consolado e tu s atormentado. E, alm disso, h entre ns e vs um grande abismo; de maneira que os que querem passar daqui para vs no podem, nem os de a passar para c. E disse: Rogo-te pois, pai, que mandes casa de meu pai. Pois tenho cinco irmos para que os advirta disto e no suceda virem tambm les para ste lugar de tormentos. E Abrao disse-lhe: Tm Moiss e os profetas; ouam-nos. Ele, porm disse-lhe: No, Pai Abrao, mas se algum dos mortos for ter com les, faro penitncia. E le disse-lhe: Se no ouvem a Moiss e aos profetas, to pouco acreditaro ainda que ressuscitaste algum dos mortos. (S. Lucas, XVI, 19-31). Eis a descrito com vivas cres aqule reino de dor, onde um fogo abrasador e horrvel atormentar sem um instante de trgua o msero condenado: uma gta, s uma gta de gua pedia o epulo para mitigar os ardores insuportveis da sde, e essa gta foi-lhe negada sem d! Ai! quem de vs, branda aos mpios o Profeta Isaas, cheio de espanto, quem de vs poder habitar nesse fogo devorador? nesses ardores sempiternos? Ao final da parbola, acena-se repugnante incredulidade de tantos infelizes que vivem engolfados nos vcios, no fazendo caso das verdades eternas, nas quais no creriam nem mesmo se aparecesse algum rprobo para lhes atestar a existncia do inferno. Qual no ser o seu desespero ao verem-se um dia sepultados naquele abismo de tormentos, sem a mnima esperana de sarem de l? Alhures, Jesus Cristo descreve o juzo universal que le far no fim do mundo, e a sentena de eterna condenao que pronunciar contra aqueles que no praticarem as obras de misericrdia para com os seus irmos, e que sero precipitados no fogo inextinguvel, preparado para o demnio e seus sequazes. Quanto temor no causa alma a considerao dste trecho do Evangelho! Ah! se os libertinos, que negam com tanto atrevimento a vida futura, refletissem um pouco, certamente mudariam de vida! Fruto desta meditao foi aquela poesia to sublime do Dies irae, que o gemido de uma alma tda compenetrada do terror do juzo divino e da sorte eterna que a espera depois. Quando vier o Filho do homem na sua majestade, e todos os anjos com Ele, ento se sentar sbre o trono da sua majestade, e sero tdas as gentes congregadas diante dle, e separar uns dos outros como o pastor separa as ovelhas dos cabritos. E por as ovelhas sua direita, e os cabritos esquerda. Ento o Rei dir aos que estiverem sua direita: Vinde benditos de meu Pai, possu o reino que vos est preparado desde o princpio do mundo; porque tive fome, e destes-me de comer; tive sde, e destes-me de beber; era peregrino e recolhestes-me; nu, e me vestistes; enfrmo, e me visitastes; estava no crcere e fostes visitar-me. Ento lhe respondero os justos, dizendo: Senhor, quando que ns te vimos faminto e te demos de comer; sequioso e te demos de beber? E quando te vimos peregrino, e te recolhemos; nu, e te vestimos? Ou quando te vimos enfrmo, ou no

crcere e fomos visitar-te? E, respondendo o Rei, lhes dir: Na verdade vos digo que tdas as vezes que vs fizestes isto a um dstes meus irmos mais pequeninos, a mim o fizestes. Ento dir tambm aos que estiverem esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno que foi preparado para o demnio e para os seus anjos; porque tive fome, e no me destes de comer; tive sde, e no me destes de beber; era peregrino, e no me recolhestes; nu, e no me vestistes; enfrmo e no crcere e no me visitastes. Ento les tambm lhe respondero, dizendo: Senhor, quando que ns te vimos faminto, ou sequioso, ou peregrino, ou nu, ou enfrmo, ou no crcere, e no te assistimos? Ento lhes responder, dizendo: Na verdade vos digo: tdas as vezes que o no fizestes a um destes mais pequeninos, a mim no o fizestes. E stes iro para o suplcio; e os justos para a vida eterna. (S. Mateus, XXV, 31-46). E para tornar entre o povo mais familiar, diria quase visvel o pensamento do inferno, usa a comparao dos rebentos e da videira. Eu sou a videira e vs os rebentos. O que permanece em mim e eu nle, sse d muito fruto, porque, sem mim, nada podeis fazer. Se algum no permanecer em mim, ser lanado fora como o rebento, e secar, e enfeix-lo-o, e o lanaro no fogo, e arder. (S. Joo, XV, 5-6). Falando depois, dos escndalos, o nosso bendito Salvador, de ordinrio cheio de doura e mansido toma um tom terrvel e os ameaa de condenao eterna. Ai do mundo por causa dos escndalos! Porque necessrio que sucedem escndalos; mas ai daquele homem pelo qual vem o escndalo! E, se a tua mo te escandalizar, corta-a; melhor te entrar na vida manco, do que, tendo duas mos, ir para o Inferno, para o fogo inextinguvel, onde o seu verme no morre, e o fogo no se apaga. E se o teu p te escandaliza, corta-o; melhor te entrar na vida eterna coxo, do que, tendo dois ps, ser lanado no inferno, num fogo inextinguvel, onde seu verme no morre, e o fogo no se apaga. E se o teu lho te escandaliza, lana-o fora; melhor te entrar no reino de Deus sem um lho, do que tendo dois, ser lanado no fogo do inferno, onde o seu verme no morre, e o fogo no se apaga. Porque todo o homem ser salgado pelo fogo, e tda vtima ser salgada com sal. (S. Marcos, IX, 42-48). Santo Tomaz explica que sse verme que no morre o remorso da conscincia, que para sempre h de atormentar o condenado no inferno; remorso pelo grande bem que perdeu, le que tinha tantos meios de se salvar. A expresso ser salgado pelo fogo significa que, assim, como o sal conserva as coisas, assim o fogo, no qual os condenados sero imersos, aos mesmo tempo que crucia atrozmente os conserva sempre em vida. A o fogo consome, diz S. Bernardo, para conservar sempre. Neste trecho faz-se aluso manifesta aos sacrifcios legais que os hebreus tinham sempre diante dos olhos, e onde estava prescrito que se aspergisse com sal a vtima que era oferecida a Deus: na verdade, os condenados so como vtimas da divina justia. Eis como Jesus Cristo, prevendo os assaltos que os incrdulos e libertinos dariam ao dogma do inferno, o proclama continuamente no Evangelho. Quanto a ns, permaneamos inabalveis em nossa crena, certos da existncia do inferno, como da existncia do sol, da lua e das outras coisas que nos rodeiam. Deus n-lo revelou e ensina por meio da Igreja, e a palavra de Deus no falha.

CAPTULO II A razo humana confirma a existncia do inferno Quem so afinal, os que negam a existncia do inferno? Talvez pessoas honestas? Ao contrrio! So os libertinos que espezinham todo o ditame da conscincia para viverem solta, aqueles aos quais repugna crer em um Deus vingador, por bem saberem que merecem seus castigos.

Mas, conseguem les persuadir-se de que no h uma justia que vela sbre os homens, e que punir seus pecados? Jamais! Enquanto negam com os lbios a existncia do inferno, sentem no mago da conscincia o remorso e uma voz que lhes anuncia terrvel vingana. O prprio Voltaire, o corifeu da impiedade, no conseguiu convencer-se de que no h nada depois do tmulo; tanto assim que, quando adoecia gravemente, apressava-se para em chamar o padre para se retratar de suas mximas to mpias! Deus imprimiu em nosso corao noes imutveis de justia, e a idia de um prmio virtude, de um castigo ao vcio. Certo mpio se vangloriava, numa roda, de no acreditar no inferno; entre os que ouviam estava um homem de bom senso e modesto, mas que julgou seu dever tapar a bca ao estulto interlocutor, e o fez com ste simplicssimo argumento: Senhor, disse-lhe, os reis da terra tm crceres para punir rebeldes; o Deus, Rei do universo, no h de ter crceres para os que ultrajam a sua majestade? O mpio no soube que responder, pois o mesmo lume da razo lhe fazia ver que se os reis tm prises, Deus deve ter um inferno. Da negao do castigo e do prmio ia outra vida, seguir-se-ia que Deus no existe, ou se existe, no cuida dos homens; e no haveria nenhuma diferena entre virtude e vcio, entre justia e injustia. Morre um ladro, carregado de delitos, e morre um inocente que durante a vida praticou virtude e fez o bem ao prximo; quereis que tenham a mesma sorte? Deus, infinitamente justo, no h de punir os crimes do primeiro e recompensar as boas obras do segundo? Morre So Paulo no deserto, depois de ter vivido quase um sculo no jejum, na penitncia, louvando e servindo a Deus; e morre Nero, depois de ter cometido tda espcie de crueldade; quereis que tenham igual sorte? Portanto, a mesma razo, o bom senso nos fala de um lugar onde sero castigadas as transgresses da lei divina. Nem mesmo a eternidade das penas repugna aos ditames da reta razo. Um dia, uma alma santa meditava no inferno, e considerando a eternidade dos suplcios, aqule terrvel nunca e o terrvel sempre, ficou bastante impressionada, porque no compreendia como se pudesse conciliar esta severidade sem medida com a bondade e outras perfeies divinas. Senhor, dizia ela, eu me submeto aos vossos juzos, mas, permit-me, no sejais demasiado rigoroso. Compreendes, foi a resposta, o que seja o pecado? Pecar dizer a Deus: no Vos obedecerei; pouco se me d da vossa lei; rio-me das vossas ameaas! Vejo, Senhor, como o pecado um monstruoso ultraja vossa divina majestade. Pois bem, mede, se podes a grandeza dsse ultraje. Compreendo, Senhor, que sse ultraje infinito, porque vai contra a majestade infinita. No se exige ento um castigo infinito? quanto intensidade, sendo a criatura limitada, requer a justia que seja infinito ao menos quanto durao: portanto, a mesma justia divina que exige o terrvel sempre e o terrvel nunca. Os prprios condenados sero obrigados a prestar homenagens, mau grado seu, a esta justia e exclamar em meio aos tormentos: Vs sois justo, Senhor, e retos os vossos juzos. (1) Mas, replicam os incrdulos, Deus to misericordioso que no castigar eternamente um pecado mortal s, o qual s vezes dura um instante. Que proporo h entre a breve durao da culpa e a eternidade da pena? A isto responderemos, que a misericrdia no nada contrria justia, a qual exige seja eternamente castigado o pecado de uma pessoa que tenha morrido impenitente; visto que o pecado de tal pessoa de certo modo eterno, segundo a sua voluntria disposio presente, querendo morrer no pecado: o que merece uma pena eterna. At a justia humana, imagem da justia divina, castiga por vezes a falta passageira com a pena, a seu modo, eterna, como o exlio perptuo; de modo que, se o exilado vivesse sempre, para sempre seria banido da sua ptria. E por que a divina justia no poder banir eternamente da ptria celeste um pecador impenitente, que por si mesmo

se exclui dessa ptria, morrendo voluntriamente na impenitncia final? De resto, eterno o prmio que Deus prepara a quem o serve, e por isso eterno deve ser tambm o castigo para aqueles que se rebelam contra sua santa lei. Afinal, quem somos ns que ousamos levantar a fronte e pedir a Deus a razo de seus justos decretos? CAPTULO III Testemunhas de Alm-tmulo Em sua infinita misericrdia, Deus, depois de haver revelado o dogma do inferno, tem permitido, de onde em onde, que alguma alma venha da eternidade para confirmar-nos a existncia daquele lugar de penas. Tais aparies so mais frequentes do que comumente se cr; e quando so atestadas por pessoas idneas e fidedignas, tornam-se fatos inegveis, que se admitem como todos os outros fatos da histria. Apresso-me, porm, a declarar que no entendo trazer sses fatos como argumento principal e bsico com que se demonstre e se estabelea o dogma do inferno, porque ste nos demonstrado pela palavra infalvel de Deus; narro tais aparies smente para confirmar e elucidar essa verdade, e como argumento de salutar meditao. Monsenhor Sgur, no seu ureo opsculo sbre o inferno narra trs fatos, cada qual mais autntico, acontecidos no faz muito tempo. * * * O primeiro, diz ele, sucedeu quase em minha famlia, pouco antes da terrvel campanha de 1812, na Rssia. Meu av materno, o Conde Rostopkine, governador militar de Moscou, era intimamente relacionado com o general Conde Orloff, to valoroso quanto mpio. Um dia, aps a ceia, o conde Orloff e um seu amigo, o general V, volteriano como le, puseram-se a ridicularizar a religio e sobretudo o inferno: Mas, disse Orloff, e se houvesse alguma coisa alm do tmulo? Neste caso, diz o general V, o primeiro que morrer vir avisar o outro; de acrdo? Pois no, responde Orloff. E ambos prometeram seriamente no faltar palavra. Algumas semanas aps, desencadeou-se um daquelas guerras que Napoleo sabia suscitar; o exrcito russo foi chamado s armas, e o general V recebeu ordem de partir incontinenti para um psto de comando. Duas ou trs semanas depois da partida de Moscou, quando meu av se levantara, bem cedo, viu abrir-se bruscamente a porto do quarto e entrar o conde Orloff, com roupa de dormir, de chinelos, cabelo em desalinho, olhos esbugalhados, plido como cera. Oh! Orloff vs aqui a esta hora? Neste traje? Que aconteceu? Meu caro, responde Orloff, eu perco a cabea; vi o general V Oh! Ele j voltou? No, continua Orloff, atirando-se a um div, no, no voltou, e isto que me espanta. Meu av nada compreendia e procurava acalm-lo. Contai-me, ento, lhe disse, o que aconteceu e o que significa tudo isto. Fazendo grande esfro para se acalmar, o conde Orloff contou o seguinte:

Meu caro Rostopckine, no faz muito, o general V e eu, juramos que o primeiro que morresse, viria avisar o outro se h de fato alguma coisa alm do tmulo. Ora, pela madrugada, enquanto estava tranqilo na cama, acordado, sem pensar no amigo nem no juramento, abre-se de repente o cortinado do meu leito e vejo, a dois passos de mim, o general V de p, desfigurado, com a mo direita no peito, e me fala: Existe um inferno, e eu l estou e desapareceu. Na mesma hora corri at c; eu perco a cabea! Que coisa estranha! no sei o que pensar! Meu av tranqilizou-o como pde: falou-lhe de alucinao, fantasia que le talvez estivesse dormindo que s vzes do-se casos extraordinrios, inexplicveis E procurava persuad-lo com outros meios termos, que apesar de nada valerem, servem para consolar os cticos. Mandou preparar o coche e acompanhou o conde sua casa. Dez ou doze dias depois deste estranho acontecimento, um estafeta do exrcito comunicava ao meu av, entre outras coisas, a morte do general V Naquela madrugada em que o conde Orloff o tinha visto e ouvido, o infeliz general, saindo a estudar a posio do inimigo, foi varado por uma bala e caiu morto. Existe um inferno, e eu l estou Eis as palavras de um que veio do outro mundo! * * * O segundo fato referido pelo mesmo autor, que o tem por indubitvel, como o precedente, pois o ouviu da bca de um repeitabilssimo eclesistico, superior de importante comunidade, o qual por sua vez, soube os pormenores mediante um parente da senhora, com a qual se deu tal fato. Naquele tempo, isto , por ocasio do Natal de 1859, ela ainda vivia e contava pouco mais de quarenta anos. Achava-se essa dama em Londres no inverno de 1847 e 1848; enviuvara aos 29 anos, era muito rica e muito amiga dos divertimentos mundanos. Entre as pessoas elegantes que freqentavam a sua casa, notava-se especialmente um moo, cujas contnuas visitas a comprometiam no pouco e cuja vida estava longe de ser edificante. Uma noite, a senhora lia no sei que romance para conciliar o sono. Ouvindo bater o relgio, apagou a vela e dispunha-se para deitar, quando percebeu, com grande assombro, que uma luz estranha e plida vinha da porta do salo contiguo e espalhava-se a pouco e pouco no quarto, aumentando sempre. No sabendo o que era, do pasmo passou ao mdo; eis seno quando, viu abrir-se lentamente a porta do salo e entrar no quarto o jovem desregrado, o qual, antes que ela pudesse pronunciar palavra, aproximou-se, tomando-a pelo brao esquerdo, apertando-lhe fortemente o pulso, e com aceno desesperado, lhe falou em ingls: Existe o inferno! Foi to grande o susto que a senhora perdeu os sentidos. Voltando a si, tocou nervosamente a campainha para chamar a criada, que a tendeu; entrando no quarto, esta sentiu logo um cheiro de queimado e chegando-se ama, que com dificuldade articulava umas palavras pde ver que tinha ao redor do pulso uma queimadura to profunda que a carne desaparecera e ficava mostra o osso. Observou alm disso, que da porta do salo at o leito e do leito porta do salo estava impressa a pegada de um homem, que tinha queimado o pano de parte a parte. Por ordem da ama, abriu a porta do salo, e notou que l terminavam as pegadas no tapete. No dia seguinte, a desditosa senhora soube com aquele mdo que bem se compreende, que alta noite, o tal moo se embriagara com excesso, e transportado para casa, veio a morrer pouco depois. Ignoro, acrescenta o superior, se esta terrvel lio tenha convertido a infeliz dama; o que sei que ela ainda vive e para esconder aos olhares curiosos o sinal daquela sinistra queimadura, leva no pulso, guisa de bracelete, um largo enfeite de ouro, que no deixa nem de dia nem de noite. Repito que os particulares eu os tive da bca de um seu parente prximo, catlico sincero, a cuja

palavra presto f. Os parentes no falam do ocorrido e por isso que tenho o cuidado de ocultar o nome da famlia. Apesar do vu, no qual esta apario foi e deveu ser envolvida, no me parece, acrescenta Monsenhor Sgur, que se possa pr em dvida a formidvel autenticidade. * * O terceiro fato aconteceu na Itlia. Em 1873, em Roma, alguns dias antes da Assuno, uma moa, bastante m, machucou uma das mos. Levaram-na para o Hospital da Consolao. Ou porque o sangue estivesse muito deteriorado ou porque sobreviesse grave complicao, a infeliz morreu naquela noite. No mesmo instante uma de suas companheiras, que no sabia o que acontecera no hospital, ps-se a gritar desesperadamente, a tal ponto que acordou tda a vizinhana e provocou a interveno da polcia. A companheira que morrera no hospital apareceu envolvida em chamas e lhe disse: Estou condenada, e se no queres condenar-te tambm, sai deste lugar infame e volta a Deus. Nada consegui acalmar a agitao da jovem, que bem cedo abandonou aquela casa, deixando a todos atnitos, especialmente depois de divulgada a notcia da morte da companheira, no hospital. Aconteceu que, logo depois, a proprietria da casa, uma garibaldina exaltada, caiu doente, mandou logo chamar um padre, dizendo que queria receber os sacramentos. A Autoridade Eclesistica delegou para sse fim um digno sacerdote, Monsenhor Piroli, proco de S. Salvador em Laura. Munido de especiais instrues, le se apresentou e exigiu, antes de tudo, que a doente fizesse, perante testemunhas, plena retratao de suas blasfmias e insultos contra o Sumo Pontfice e declarasse que afastaria as ocasies de pecado. Sem a menor hesitao, a infeliz promete e ento se confessa e recebe o Sagrado Vitico com grandes sentimentos de penitncia e humildade. Pressentindo o seu fim, a pobre mulher, com lgrimas nos olhos suplicou ao padre que no a abandonasse, amedrontada como estava por aquela apario. Assim, teve a grande graa de ser assistida nos ltimos momentos pelo ministro de Deus. Tda a Roma conheceu logo os particulares desta tragdia. Como sempre, os mpios e os libertinos fizeram dela objeto de chacota, abstendo-se, aposta, de obter oportunas informaes; mas, de sua parte, os bons aproveitaram para se tornarem melhores e mais exatos no cumprimento de seus deveres. CAPTULO IV Horrendos suplcios do inferno Nenhuma lngua humana capaz de exprimir os tormentos atrozes daquele lugar de desespro. Como descrever aqule fogo medonho aceso pela ira de Deus? os remorsos cruis que dilaceram o msero preceito? a eternidade sem fim, com o terrvel sempre e o terrvel nunca? Diz Santo Agostinho que o fogo da terra comparado com o do inferno, parece um fogo pintado; e S. Vicente Ferrer diz que em confronto com aqule, o nosso frio. Gastemos embora pginas e livros inteiros falando do inferno, acumulemos males sbre males, sofrimentos sbre sofrimentos, desgraas sbre desgraas, chamemos em nosso auxlio as fantasias fecundas dos poetas, para idear penas atrozes, peamos aos tiranos da Histria as torturas que inventaram para seviciar as suas vtimas e, apesar de tudo isso, chegaremos concluso de que infinitamente maiores so os suplcios do inferno. *

* * * Santa Tereza foi um dia arrebatada em xtase e levada ao inferno para ver o seu lugar, caso no se emendasse de certo defeito. Ela mesma conta em sua autobiografia: Estando um dia em orao, fui transportada, sem saber como, em corpo e alma, ao inferno. Compreendi que Deus queria mostrar-me o lugar que ocuparia, se no mudasse de vida. No tenho palavras que possam dar uma pequena idia desse tormento incompreensvel. Sentia em minha alma um fogo que me devorava e o corpo sofria dores insuportveis. Drante minha vida passei por duros sofrimentos, mas, nem se comparavam com os que tive naquela ocasio; e ainda sses subiam de ponto, ao pensar que seriam eternos e sem o menor alvio. Mas, apesar de as torturas do corpo serem atrozes, no tinham comparao com as agonias da alma. Ao mesmo tempo, sentia-me queimar e partir em pedaos, sofria tdas as angstias da morte e os horrores do desespro. Num raio de esperana e de consolao naquela moradia, a se respira um odor pestilencial, que sufoca; nem um raio de luz, mas tudo so trevas da mais densa escurido; contudo, oh! mistrio, mesmo naquele escuro se distingue o que de mais penoso h para a vista. Em suma, tudo o que ouvi dizer ou li sbre as penas do inferno insignificante em confronto com a realidade; entre aquelas penas e estas h a mesma diferena entre uma pessoa e o seu retrato. Ai! o fogo dste mundo por mais ardente que seja, como o fogo pintado, comparado com aqule que atormenta os rprobos no inferno. H dez anos que tive esta viso, mas estou ainda agora to espantada, que, enquanto escrevo, o mdo gela-me o sangue nas veias. Em meio s provocaes e dores que tenho, trago mente esta viso e de a tiro fra para tudo suportar. * * 1000. * Vicente de Beauvais, no livro 25 de sua Histria, refere o seguinte fato, acontecido pleno ano

Dois libertinos fizeram uma combinao: o primeiro a morrer viria terra participar ao companheiro em que estado se achava. Morreu um deles, e Deus permitiu aparecesse ao amigo: era horrendo, parecia sofrer duramente e suava em bicas. Enxugou a fronte com a mo e deixou cair uma gota de suor no brao do companheiro, dizendo-lhe: Eis qual o suor do inferno; dle ters um vestgio at morte. E assim foi, pois aqule suor infernal queimou-lhe o brao, penetrando na carne com dores inauditas. Bom para le que soube aproveitar-se de to terrvel lio e retirou-se para o convento. * * * Em 1873, Nova Iorque foi teatro de um incndio, cujas circunstncias apresentam a imagem do inferno. O Circo Baunum foi assaltado pelo fogo; tigres, ursos, lees e outras feras foram queimadas vivas nas suas jaulas. medida que o fogo se propagava, crescia o desespro das feras, sobretudo os tigres e ursos tornavam-se cada vez mais furiosos. Atiraram-se com supremo esfro contra as grades, j incandescentes, da priso, e eram rechaados quais massas inertes, para de novo se arrojarem contra o insuportvel obstculo que os aprisionava. Os rugidos dos lees, os urros dos tigres e o aulidos das outras feras se misturavam formando um som pavoroso, que parecia reproduzirem aqule que devem ouvir os condenados no inferno.

Mas as notas deste ttrico concrto aos poucos foram-se enfraquecendo, at que, quando o leo soltou o ltimo urro, ao medonho alarido sucedeu o silencio da morte. Imaginemos, agora, nestas jaulas de ferro candente, no as feras, mas homens; e homens que em vez de morrerem no fogo continuam a viver, e teremos uma idia do inferno, idia, alis, muito imperfeita. * * * A histria registrou, para perptua execrao, as truculncias de alguns tiranos, que mais do que homens pareciam monstros. Flaris, tirano de Siracusa, confeccionou um touro de bronze para prender dentro os rebeldes e faz-los morrer a fogo lento, aceso ao redor. Quem pode descrever os espasmos do supliciado? Gritava, debatia-se naquelas estreitas paredes, que se tornavam candentes e tormentos indescritveis! Todavia, essas penas terminavam; o condenado ter suplcios infinitamente maiores e por tda a eternidade. Nero mandava que se cobrissem os corpos dos cristos com pixe e outros combustveis, e depois, colocados nos postes, ao longo das alamedas, eram acendidos tarde, para iluminar, enquanto le passeava no coche, insultando-os brbaramente nos padecimentos. Maxncio amarrava as suas vtima a cadveres, rosto com rosto, tronco com tronco, membros com membros, e as deixava nesse horrvel estado at que o mau cheiro das carnes corrompidas lhes acabasse com a vida. Astiges, rei da Armnia, condenou S. Bartolomeu Apstolo a ser esfolado vivo. No menos horrvel o suplcio a que foi submetido o dicono S. Loureno. Estenderam-no sbre uma grelha e por baixo espalharam brasas, de maneira que aos poucos fosse sentindo os ardores e mais longa e vivamente durasse o tormento. Cozida uma parte do corpo, voltaram-no do outro lado, para que cada membro tivesse seu sofrimento; e assim neste lento e atroz martrio, rendeu a alma a Deus. So talvez sses os suplcios do inferno? Qual! apenas a sombra, uma plida idia. * * * Fala-nos o Padre Nierenberg de um jovem que levava uma vida aparentemente crist, mas odiava a um inimigo; e conquanto frequentasse os Sacramentos, nutria para com le sentimentos de vingana, que Jesus Cristo obrigava depor. Morrendo, apareceu ao pai, todo envolvido em chamas, e disse-lhe que se condenara por no ter perdoado ao seu inimigo, e chorando exclamou: Ah! se tdas as estrlas do cu fossem como lnguas de fogo, no traduziriam os tormentos que sofro. * * * Os dois fatos seguintes se referem prpriamente ao fogo do purgatrio, mas no vem fora de propsito, j que os telogos afirmam que o mesmo fogo que atormenta os condenados no inferno, purifica tambm as santas almas do purgatrio, e que o purgatrio um inferno temporrio. Na vida de Frei Estanislau Chosca, dominicano polons, l-se que um dia, quando estava rezando pelos finados, viu uma alma tda devorada pelas chamas. Compreendeu que se tratava de uma alma do purgatrio que implorava suflgios, e a interrogou se aqule fogo era mais penetrante que o nosso.

Ai de mim! respondeu a msera, todo o fogo da terra, comparado com o do purgatrio como um spro de ar fresqussimo. Mas, isto impossvel! exclamou o frade. Desejaria mesmo experimentar, com a condio de que isto aproveite para me fazer descontar aqui uma parte das penas que terei de sofrer, um dia, no purgatrio. Nenhum mortal, replicou ento aquela alma, poderia suportar-lhe a mnima parte, sem morrer no mesmo instante, se Deus no o sustentasse. Se queres converter-te, estende a tua mo. O dominicano, em vez de intimidar-se ofereceu a mo: e o defunto deixou cair sbre ela uma gota de suor. Estanislau desmaiou no mesmo instante, soltando gritos agudos. Acudiram logo os frades assustados e o encontraram desfalecido e com a mo chagada. Levado para cama e medicado, recobrou os sentidos; mas no se levantou mais, sempre atormentado por terrveis dores causadas pela chaga na mo; e morreu depois de um ano, durante o qual no cessou de exortar os irmos penitncia para evitarem os rigores da justia divina. * * * A apario que estou para referir narrada na vida de S. Domingos, escrita por Fernando de Castelha, e comprovada por um profundo sinal deixado numa mesa. Em Zamorra, cidade da provncia de Leo, na Espanha, vivia num convento de Dominicanos um bom religioso, ligado em santa amizade com um Franciscano, homem como le, de grande virtude. Um dia que se entretinha sbre coisas espirituais, prometeram recprocamente que o primeiro a morrer, se Deus lho permitisse, apareceria ao outro, para inform-lo da sorte alcanada no outro mundo. (*Julgo prudente observar que no convm fazer tais acordos; ou pelo menos preciso consultar o confessor.) Morreu o Franciscano e, fiel sua promessa, apareceu ao Dominicano, quando ste arrumava a mesa. Depois de t-lo cumprimentado com extraordinria benevolncia disse-lhe que estava salvo, mas, tinha, outrossim, ainda muito que sofrer por algumas pequenas faltas das quais no se tinha arrependido bastante em vida. Em seguida ajuntou: Nada existe sbre a terra, que possa dar uma idia das minhas penas. E para que o Dominicano tivesse disto uma prova, estendeu a mo sbre a mesa do refeitrio, deixando na madeira a queimadura como se a mo fra um ferro em brasa, tirado ento da forja. Imagine-se a comoo do Dominicano a este espetculo! A mesa guardou-se religiosamente em Zamora, at o fim do sculo XVIII, no qual as revolues polticas a fizeram desaparecer, como a outras muitas relquias piedosas de que era rica a Europa. * * * At agora temos falado das penas do sentido; e que dizer das penas do dano? Que dizer da privao de Deus? A privao da vista de Deus o que prpriamente constitui o inferno. No fazem o inferno as trevas, o mau cheiro, o alarido, o fogo; a pena que faz o inferno a pena de ter perdido a Deus. Se Deus mostrasse a face aos condenados, les no sentiriam mais nenhuma dr, e o inferno seria um paraso. Apenas a alma rompe os vnculos do corpo, sente imediatamente que foi criada para Deus e se atira a le como uma flecha va para sua meta, como a agulha imantada livre do empecilho volta-se para o solo; mas, estando manchada com o pecado, ser repelida e precipitada no inferno. Um caador fez uma vez esta experincia: amarrou o seu galgo com uma grande corrente, dentro do jardim murado, e depois soltou uma lebre. Apenas a viu, o co avanou para adent-la

mas impedido pela corrente. Que raiva, v-la correr pelo jardim e no poder apanh-la! Ladra, gane, dana-se, morde a corrente para despeda-la, atira-se contra o animalejo que foge dum lado para outro. Fez tanto esfro que pouco depois caiu morto. A alma tentar contnuamente lanar-se para Deus, para o qual foi criada, mas o pecado aquela corrente que no a deixar sair das chamas cruis. * * * Um virtuoso sacerdote, enquanto estava exorcizando um energmeno, perguntou ao demnio que penas sofria no inferno. A resposta foi esta: Um fogo eterno, uma maldio eterna, uma raiva eterna e um desespro cruel por no poder mais ver Aquele que me criou. Que farias para que te fosse concedido ver a Deus? Para v-lo, mesmo por um instante, estaria pronto a sofrer num minuto tdas as penas que devo sofrer em dez mil anos Mas, vos desejos, hei de sofrer sempre e no O tornarei mais a ver. E foi tal o tormento e o desespro com que pronunciou estas palavras, que deixou funda impresso naquelas que assistiam aos exorcismos. CAPTULO V Eu no creio em nada Eu no creio em nada, dizia-me duma feita um dsses doutores da impiedade, com empfia. Como? Vs no credes em nada? repliquei. Ento no credes na existncia da Amrica, da Oceania Oh! Certamente que sim; queria dizer, no creio em nenhuma coisa sobrenatural. Mas, porque credes na existncia da Amrica e da Oceania, que nunca vistes? Tem graa! Creio porque o afirmam os gegrafos e muitas pessoas que perlustraram essas regies. E se credes na existncia de coisas que nunca vistes, s porque o dizem os homens, porque no credes na existncia do inferno, do juzo, revelada pela palavra infalvel de Deus, confirmada pela razo e proclamada pela voz de todos os povos? O livre pensador deu de ombros e no soube responder; mas, nem por isso se converteu. Custava-lhe tanto deixar sua vida desregrada e praticar a virtude! Como so dignos de compaixo sses libertinos! Pretendem destruir o inferno, negando-lhe a existncia; mas, quem nega uma coisa no consegue elimin-la. Se eu negasse a existncia da Amrica ou da frica, no conseguiria risc-las da face do globo, mas subsistiriam, no obstante minha negao. Negai, negai quanto quiserdes a existncia do inferno, que apesar disso o inferno continuar a existir e a queimar as suas vtimas, e um dia se abrir para vs e vos sepultar naquelas chamas, se vos no corrigirdes de vossas desordens. A vossa fanfarrice e a vossa negao estulta no apagaro certamente aqueles ardores sempiternos, ao contrrio, serviro para os aumentar e fazer-vos afundar mais naquele abismo. Quanto mais vos obstinardes na infidelidade e na negao do inferno, tanto mais acumulareis pecados e culpas para expiar na eterna priso. * * *

Uma ocasio, um infeliz, a quem se meteu na cabea que no havia mais crcere, nem tribunal, comeou a roubar e praticar iniquidades. Avisado vrias vezes pelos parentes e amigos, e ameaado de priso, replicava sempre que no havia mais crcere nem tribunal. Sabeis o que aconteceu? o que j se esperava: dois policiais o prendem; processado e condenado s gals por tda a vida. Eis a a histria de todos os mpios; abandonam-se aos vcios, acariciam as paixes, cometem pecados e mais pecados, dizendo que tudo acaba com a morte e, no entanto, caem no eterno abismo. E Santa Tereza viu que caam em grande nmero, como flcos de neve em dias de inverno! * * * Monsenhor Sgur conta um fato bastante curioso, acontecido na escola militar de S. Ciro, nos ltimos anos da Restaurao. O Padre Rigolot, capelo do estabelecimento, prgava um retiro espiritual aos alunos, que se reuniam por isso tdas as tardes na capela, antes de subir ao dormitrio. Uma das tardes, em que o bom do padre falara do inferno, terminada a funo, tomou a lanterna e se retirou para o seu aposento; e quando abria a porta do quarto, percebeu que o chamava algum que o seguia pela escada. Era um velho capito de bigode grisalho e de maneiras pouco gentis. Desculpe, sr. Padre, lhe falou com ar de zombaria; V. R. fez-nos agora pouco um magnfico discurso sbre o inferno. Mas se esqueceu de nos dizer se l ns seremos cozidos, assados ou fritos. Poderia dizer-me? O capelo, percebendo que se tratava de um zoilo, fitou-o sriamente, e depois enfiando-lhe sob o nariz a lanterna que trazia, respondeu com tda a calma: Haveis de ver, sr. capito. Dito isto, fechou a porta; sem poder refrear o riso pela figura ridcula daquele estrina. No pensou mais nisso, mas da por diante notou que o capito fugia dle. Entretanto, veio a revoluo de julho e extintas as capelanias militares, o Arcebispo de Pars nomeou o Padre Rigolot para outro cargo, no menos importante. Passados quase vinte anos, o venerando sacerdote entretinha-se com os amigos numa tertlia, quando um velho de bigode, branco, fazendo-se encontradio, cumprimentou-o e perguntou se era o Padre Rigolot, ex-capelo da escola de S. Ciro. Obtida resposta afirmativa: Oh! senhor padre, diz-lhe comovido o velho militar, permita-me que lhe aperte a mo e que exprima o meu reconhecimento; o senhor me salvou. Eu?! de que modo? Oh! no me conhece mais? No se lembra do ocorrido naquela noite, que um capito, instrutor da escola, a propsito de seu discurso sbre o inferno, lhe fez uma pergunta estpida e V. R., pondo-lhe a lanterna sob o nariz respondeu: Haveis de ver, capito? Aquele capito sou eu; sabia que desde aquela ocasio suas palavras no me saram mais da mente, como no me abandonou mais o pensamento que eu devia ir para o inferno. Lutei contra mim mesmo por dez anos; ao cabo dos quais, rendi-me a Deus, confessei-me e agora tornei-me cristo e cristo militar, isto , franco, sem respeito humano. A V. R. sou devedor de tanta ventura e folgo muito de poder encontr-lo para manifestar-lhe o meu reconhecimento. * * * O Padre Bach, na vida de S. Francisco de Jernimo, narra a triste sorte duma mulher incrdula que zombava do inferno e dos novssimos. O fato no deixa nenhuma dvida, pois foi

juridicamente provado no processo de canonizao do santo, e atestado com juramento por muitas testemunhas oculares. No ano de 1707, S. Francisco de Jernimo prgava, como de costume, nos arrabaldes de Npoles, falando sbre o inferno e os terrveis castigos reservados aos pecadores obstinados. Uma mulher insolente, morava na redondeza, aborrecida com aqueles sermes, que lhe acordavam no corao amargos remorsos, procurou molest-lo com chascos e gritos, desde a janela de sua casa; uma vez, o santo lhe disse: Ai de ti, filha, se resistes graa! no passaro oito dias, sem que Deus te castigue. A desaforada mulher no se perturbou por aquela ameaa e continuou a com suas ms intenes. Passaram-se oito dias, e o santo foi prgar de novo perto daquela casa, mas desta vez as janelas estavam fachadas e ningum o importunava. Os vizinhos que ouviam consternados lhe disseram que Catarina (tal era o nome daquela pssima mulher) tinha morrido de improviso, pouco antes. Morreu? disse o servo de Deus; pois bem, agora nos diga de que valeu zombar do inferno; vamos perguntar-lhe. Os ouvintes sentiram que essas palavras o santo as pronunciara com inspirao, e por isso todos esperaram um milagre. Acompanhado da multido subiu sala, convertida em cmara ardente, e aps breve orao, descobriu o rosto da morta e: Catarina, gritou, diz-nos onde ests! A esta ordem, a defunta ergue a cabea, abre os olhos, toma cr o seu rosto, e em atitude de horrvel desespro, profere com voz lgubre estas palavras: No inferno! eu estou no inferno! Imediatamente cai e volta ao estado de frio cadver. Eu estava presente ao fato, afirma uma das testemunhas que depuseram no tribunal apostlico, mas no saberia explicar a impresso que causou em mim e nos circunstantes; ainda hoje, passando perto daquela casa e olhando a tal janela, fico muito impressionado. Quando vejo aquela funesta moradia, parece-me ouvir a lgubre voz: No inferno! eu estou no inferno! CAPTULO VI No voltou ningum do outro mundo para nos dizer que existe a eternidade No h tal. Se consultardes a Histria, vereis como frequentes vezes Deus permitiu, em todos os tempos viesse algum dizer-nos da existncia das verdades que Ele revelou. Muito de indstria sses doutores da impiedade omitem o estudo dos fatos; e depois sentenciam do alto de suas ctedras que nunca ningum levantou a cabea da sepultura para nos dizer que existe algo depois da morte. A histria da Igreja na Polnia registra um fato importantssimo, sucedido em 1070, com Santo Estanislau, bispo de Cracvia. Trata-se duma prodigiosa ressurreio, perante muita gente, numeroso clero e magistrados. Boleslau, rei mpio e cruel, movera contra o santo bispo Estanislau uma feroz perseguio; entre outras coisas, acirrou de dio contra o Bispo os herdeiros de um Pedro Miles, que tinha morrido trs anos antes, deixando para a Igreja uma de suas terras. Os herdeiros, certos do apoio do rei, processaram o santo, e tendo subornado ou intimidado as testemunhas, conseguiram que Estanislau fosse condenado restituio do terreno. O santo, vendo que falhava a justia dos homens, apelou confiantemente para a de Deus e conseguiu suspender a condenao, prometeu chamaria como testemunha o prprio testador que jazia havia trs anos na sepultura. Com efeito, depois de trs dias de jejum e oraes, o santo Bispo se dirige com todo o clero sepultura de Pedro Miles.

Aberto o tmulo, encontraram, como se previa, poucos ossos num monte de p, e j os adversrios se alegravam, certos da vitria. Mas o santo com voz majestosa ordena ao cadver que ressuscite, em nome dAquele que ressurreio e vida; e num pronto aqules ossos se aproximam, cobrem-se de carne, na presena de uma imensa multido possuda de grande terror. O Bispo tomou-o pela mo e o levou diante de Boleslau para certificar a verdade da doao feita, confundindo destarte o rei e os herdeiros. Perguntou-lhe depois se preferia voltar sepultura ou viver ainda alguns anos na terra; le respondeu que, conquanto pelos seus inmeros pecados estivesse no purgatrio, onde sofria muito, preferia tornar a morrer do que ficar nesta terra to miservel em que poderia sempre ocorrer o perigo de se condenar eternamente. Suplicando as oraes do santo bispo para se libertar logo do purgatrio, foi levado processionalmente ao seu sepulcro, a entrou e ficou no estado de antes. * * * Na vida de S. Bruno, fundador dos Cartuxos, l-se a ressurreio momentnea de uma personagem respeitvel para atestar diante de muita gente a prpria condenao. Pars e tda a Frana ficaram horrorizados com sse acontecimento; foi, ento, que Bruno temendo os juzos divinos retirou-se para a Cartuxa a fim de lavar vida austerrssima. Morreu Raimundo Diocres, doutor de Sorbona, homem conceituadssimo pela sua vasta cincia, no menos por uma aparncia de virtude. Depois de trs dias, o seu corpo, revestido das insgnias doutorais, foi transportado solenemente para ser sepultado; acompanhavam-no o colgio dos professores, grande nmero de estudantes e teoria de clero. As exquias celebraram-se na catedral, revestida de luto, entre luzes e muitas inscries que lembravam a insgne cincia e as virtudes do ilustre extinto. Mas quando o coro dos cantores chegou quele trecho do ofcio: Responde mihi: quantas habeo iniquitates et peccata; sclera mea et delicta ostende mihi; onde o santo Job roga a Deus lhe faa conhecer as suas culpas, o cadver levantou a cabea e fretro e com voz lastimosa exclamou: Por justo juzo de Deus sou acusado: dito isto, tornou a repousar a cabea, como dantes. Apoderou-se dos assistentes um terror geral, e resolveram deixar para o outro dia os funerais. Neste dia foi muito maior a concorrncia; recomeou-se o ofcio, e ao chegar s mesmas palavras, tornou o cadver a erguer a cabaa e a exclamar com voz esforada e mais lastimosa: Por justo juzo de Deus estou julgado. Subiu de ponto o pasmo e o espanto. Resolveram diferir a inumao para o terceiro dia. Nesta foi imenso o concurso; deu-se princpio ao ofcio, como nos precedentes; quando se cantavam as mesmas palavras, levantou o defunto a cabea, e em voz horrvel e espantosa exclamou: No careo de oraes; por justo juzo de Deus estou condenado ao fogo eterno. fcil compreender a impresso que faria nos nimos um acontecimento to extraordinrio. Achava-se Bruno presente a ste espetculo; to fortemente se emocionou com le que, retirandose horrorizado, resolveu deixar quanto tinha e enterrar-se em algum espantoso deserto para ali passar a vida entregue unicamente aos rigores da mortificao e da penitncia. Parecia necessrio um sucesso to trgico para uma resoluo to generosa. * * * O nosso sculo foi tambm fecundo de aparies de alm-tmulo e j narramos algumas. A que vamos agora narrar com as palavras de Monsenhor Sgur, foi confirmada por um sinal deixado numa porta, sinal sse que at ora se conserva religiosamente. Quem no cr, pode ir ao lugar onde o fato se deu e interrogar as testemunhas oculares que ainda vivem. (*Aqui e em outros lugares o Autor fala de testemunhas ainda vivas, as quais podem ser consultadas: bom notar que o Servo de

Deus Andr Beltrami viveu no sculo XIX e o presente opsculo foi escrito em 1897). Parece que Deus na sua bondade, como crescer da incredulidade e da libertinagem, aumenta os testemunhos das verdades terrveis do juzo e do inferno, para confirmar na f os cristos e preserv-los da impiedade. A 4 de novembro de 1859, morreu de apoplexia fulminante no convento da Franciscanas de Foligno uma boa irm, camada Teresa Gestas, que por muitos anos fra mestra das novias e ao mesmo tempo encarregada de superintender pobre rouparia do convento. Nascera na Crsega em 1797 e entrara na Ordem em fevereiro de 1826; fra suprfulo dizer que estava convenientemente preparada para a morte. Doze dias depois, precisamente aos 16 de novembro, uma irm, de nome Ana Felicidade, que a substituiria no cargo, subiu rouparia e estava para entrar quando ouviu gemidos que pareciam vir do interior do quarto. Um tanto assustada, abriu a porta, ningum! mas, ouviu novos gemidos e to distintos que apesar de sua coragem comum, a irm ficou com mdo. Jesus! Maria! Gritou ela, que isso? No acabou de falar quando ouviu uma voz que dizia: meu Deus, quanto sofro! A irm, atnita, reconheceu a vos da irm Teresa. Ento o quarto se encheu de fumaa densa, e a sombra da irm Teresa apareceu em ato de se dirigir para a porta arrastando-se ao logo da parede; e chagando porta disse: Eis um sinal da misericrdia de Deus; e assim falando, tocou com a palma da mo a porta e a deixou impressa em trao carbonizado; e desapareceu. Irm Ana Felicidade, toda nervosa, morrendo de mdo, comeou a gritar e pedir socorro. Correu uma de suas irms de hbito, outra, depois tda a comunidade; fizeram-lhe roda, incomodadas, com os gritos e com o tresandar de madeira queimada. Irm Ana contou o que tinha sucedido e mostrou a forma da mo da irm Teresa, que era bem pequena; ento aterrorizadas, mais que depressa foram a igreja para rezarem pela defunta, e pela mesma inteno passaram a noite na orao e na penitncia, e na manh seguinte receberam a Comunho. A notcia espalhou-se fora de casa e diversas comunidades religiosas daquela cidade uniram suas oraes s das Franciscanas. No dia seguinte, 18 de novembro, irm Ana Felicidade, entrando na cela para o repouso, ouviu que a chamavam pelo nome e reconheceu a voz de irm Teresa; viu ento aparecer um globo de luz, iluminando o quarto como se fra meio-dia, e ouviu distintamente a voz de irm Teresa, que jubilosa lhe falou: Morri numa sexta-feira, dia dedicado paixo e numa sexta-feira vou para a glria: sde forte no levar a vossa cruz, sde corajosa no suport-la; amai a pobreza; e com muito afeto ajuntou: adeus! adeus! adeus! Dito isto, transfigura-se em uma nuvem leve, branca, deslumbrante, alteia-se para o cu e desaparece. O bispo de Foligno e os magistrados da cidade procederam a um inqurito cannico para averiguar o fato, e no dia 23 de novembro, na presena de muitas testemunhas, aberto o tmulo de irm Teresa reconheceram que o sinal gravado com o fogo na porta era plenamente conforme a mo da defunta. O resultado dsse inqurito foi uma declarao oficial, a qual atestava a certeza e a autenticidade do que referimos. A porta com o sinal se conserva com venerao no convento para testemunhar a apario. CAPTULO VII A vida futura um programa insolvel, um programa talvez invencvel So as frmulas estereotipadas que a impiedade pe na bca dos que seguem a estrada do vcio. No entanto, como se enganam! O problema da vida futura foi plenamente resolvido pela revelao divina e no nos deixa a menor dvida. No um homem sujeito a erros, mas o mesmo

Deus nos deu a conhecer o que nos espera depois da morte, Deus, a verdade por essncia, que no pode enganar-se, nem enganar. Mas suponhamos por um instante que haja alguma dvida, e que a existncia dos eternos suplcios seja to smente provvel; eu pergunto a quem tem um pouquinho de juzo, se algum apoiando-se num talvez, pode expr-se ao perigo de cair naquele fogo terrvel. No verdadeira loucura arriscar a salvao eterna? No conviria at neste caso fazer penitncia para evitar o perigo provvel de ser infeliz para sempre? No seria prudente o caminho mais seguro? Dois incrus entraram um dia na cela dum anacoreta e vendo uns instrumentos de penitncia, perguntaram-lhe porque vivia assim to austeramente. Para merecer o paraso, respondeu o anacoreta. Bom Padre, lhe disseram les sorrindo, V. R. sair logrado se depois da morte no houver mais nada. E o santo homem olhando-os com ar de compaixo: Maior o logro de vossas senhorias, se depois da morte houver alguma coisa! * * * Narra o Padre Schouppe, que um jovem, pertencente a uma famlia catlica da Holanda, por causa de leituras perigosas, teve a desgraa de perder o tesouro da f e cair em completa indiferena; pelo que seus pais, e especialmente sua me, mulher de grande piedade, estavam tristssimos. Debalde lhe repetia, qual nova Mnica, as mais graves verdades da nossa F, em vo o exortava com as lgrimas nos olhos a volta a Deus; le se torna surdo e insensvel a tudo. Mas, s para agradar a me, resolveu passar uns dias numa casa religiosa para fazer retiro espiritual, ou, como le mesmo dizia, retirar-se um pouco para fumar mais sossegado. Ouvia muito distraidamente os sermes que se faziam aos retirantes; logo depois ia fumar, pouco se importando de meditar no que ouvira. Veio a meditao sbre o inferno, que parecia ter le ouvido como as outras, mas voltando para a cela, enquanto fumava como de costume, surgiu-lhe na mente, mau grado seu, essa reflexo: Se de fato existe evidentemente ser para mim e afinal de contas, como sei que no existe? Devo confessar que no tenho nenhuma certeza a sse respeito, que para estribar as minhas idias no tenho seno um talvez. Isso de expr-se por um talvez ao perigo de sofrer por tda a eternidade mesmo uma extravagncia sem limites; se h tais nscios, no quero imitar. Dessas reflexes passa orao; a graa penetra na sua alma, dissipam-se-lhe as dvidas e levanta-se convertido. CAPTULO VIII Se eu for para o inferno no estarei s No h dvidas se tivesse a desgraa de cair no inferno (que Deus tal no permita!), no ficars sozinho. Ters a companhia de milhares e milhes de outras almas desventuradas que trilharam o caminho do vcio, ters a companhia dos perseguidores da Igreja, dos hereges, dos apstatas, ters a companhia de Lcifer e de uma turba imensa de demnios. Mas esta miservel sociedade diminuir talvez o sofrimento, ou ao menos dar-te- algum conforto? Como te enganas! Na terra, quando somos golpeados pela infelicidade ou pela doena, um alvio saber que outros so visitados pela mesma desgraa: o seu exemplo nos d fra para tolerar com pacincia os nossos males, e dizemos: Coragem! h outros mais infelizes do que eu: a cruz a companheira inseparvel da nossa peregrinao.

Mas ste alvio no o tero os condenados: uns sero de tormentos aos outros, como os espinhos amontoados num grande feixe se ferem mtuamente, como os ties numa enorme fornalha se acendem e se queimam uns aos outros. Diz S. Boaventura que os homens morreriam de medo se vissem a um condenado com tda a sua hediondez. O que no ser, ento, encontrarem-se juntos tantos rprobos que serviro de algozes uns aos outros! L se encontraro misturadas a impureza, a intemperana, a blasfmia, a soberba, a injustia e todos os pecados que so a corrupo das almas; a tda essas imundcies morais, acrescentam-se o mau cheiro e os miasmas dos corpos que sero como cadveres em decomposio. E se tiveres tido a desgraa de dar escndalo com o teu mau exemplo, ah! ento essas almas te rodearo como frias para te atormentar, exprobrando-te por tda a eternidade a sua condenao, da qual tu foste a causa. Pai desnaturado, dir o filho, tu me deste a vida, mas em vez de me educares na virtude, me ensinaste o vcio e a irreligio: s maldito para sempre. Por tua causa sofro nestas chamas. Filho desgraado, dir o pai, para te enriquecer e legar muito, tra a justia; o amor desordenado para contigo foi a causa de minha condenao. Companheiro traidor, dir o amigo, tu me roubaste a inocncia, ensinando-me a malcia. Se te no tivesse conhecido, no estaria condenado. E assim dizendo se atiraro uns sobre os outros para se vingarem e desabafarem a raiva que os devora. E os demnios tomaro formas horrveis para os atormentar e no lhes daro um instante de trgua. Eis a pra que servir a companhia de muitos! Se eu for para o inferno, no estarei s! dizes. Ento, tu crs no inferno, crs naquele fogo eterno, nos sofrimentos indizveis, nos remorsos cruis, naquele sempre e naquele nunca terrveis, e queres ir para l s porque outros vo? Pode haver maior estultcia, demncia mais extravagante? Irias para a cadeia, s porque outros esto encarcerados? Queres adoecer, porque h muitos doentes? Quem fala dsse modo, certamente no reflete no que diz. Condenar-se porque outros se condenam! E ento, porque no ir para o paraso para gozar aquelas delcias inefveis que nenhum homem jamais experimentou, para contemplar aquelas belezas que nenhum mortal jamais viu, para ouvir aquelas harmonias que nenhuma criatura jamais ouviu? Tambm no paraso no estaremos szinhos. Teremos a companhia de Deus e dos Anjos, de Maria SS. E dos Santos. Se no inferno se sofrem todos os tormentos que a justia de Deus irritada soube inventar, no paraso gozam-se tdas as delcias que a sua misericrdia pde encontrar, ou melhor, o mesmo Deus que se manifesta aos eleitos para arrebat-los num xtase de louvor e admirao eterna. Mas, para ir para o cu, preciso deixar o pecado, praticar a virtude e frequentar os santos sacramentos. CAPTULO IX Lembrana salutar do inferno O pensamento do inferno fecundo de magnnimas resolues. Quantos se santificaram meditando naquele terrvel sempre e naquele terrvel nunca! Quantos deixaram o pecado e se entregaram virtude ouvindo um sermo sbre o inferno! A lembrana daquelas chamas eternas dava fra aos mrtires para suportarem os mais cruis tormentos e caminharem alegres para a morte. Quem pensa no inferno suportar com pacincia os males dste mundo, reputando-os insignificantes em comparao com os da eternidade. O Padre Joo Eusbio Nierenberg, glria da Igreja de Espanha pela doutrina, pela santidade, pela direo esclarecida de muitas almas, teve dez anos antes de morrer tantos sofrimentos e to excessivos que passava por certo envenenado da Babilnia! Ele trilha a passos agigantados a caminho da perdio; e como difcil deter-se e voltar atrs!

E ste pecado traz muita vez consigo o sacrilgio, mormente nos jovens. Confessam-se sem dificuldade das culpas cometidas contra a obedincia, a caridade as outras virtudes; mas tm vergonha de revelar ao confessor as faltas cometidas contra a bela virtude. O demnio tira-lhes a vergonha no ato de cometer o pecado e depois lhes restitue no momento da confisso. E ento comentem um sacrilgio, depois outro e mais outro, at que a justia divina cansada, abre para sses infelizes a porta do inferno. Sirvam os seguintes exemplos para causar salutar temor e preservar-nos de impureza e de sacrilgio. * * * Santo Antnio de Florena refere nos seus escritos um fato terrvel, que pela metade do sculo XV encheu de pavor todo o norte da Itlia. Um rapaz de boa famlia, que na idade de 16 para 17 anos tivera a desgraa de calar na confisso um pecado mortal e de comungar nesse estado, ia adiando, de semana em semana, de um ms para outro, a confisso para le to penosa dos seus sacrilgios. O santo arcebispo no menciona qual fsse o pecado oculto, mas parece que tenha sido uma culpa grave contra a bela virtude. Atormentado pelos remorsos, em vez de descobrir com sinceridade a sua miservel condio, procurava a paz fazendo grandes penitncias; mas inutilmente. No agentando mais os contnuos assaltos da conscincia entrou num convento, pensando: L, ao menos, confessar-me-ei bem e farei penitncia dos meus pecados: Por sua desgraa foi recebido como um moo de vida exemplar, pois os superiores sabiam da boa reputao de que gozava; e por isso, tambm aqui a voz da conscincia para outra ocasio, e dois, trs anos passou-se em tal deplorvel estado, sem ter a coragem de se confessar. Afinal uma doena parecia-lhe trouxesse oportunidade: Desta vez, dizia consigo o infeliz, manifesto tudo e fao uma confisso geral antes de morrer. Mas, tambm desta vez no foi sincero na acusao; fez tantos rodeios que o confessor no compreendeu nada; esperava confessar-se melhor no dia seguinte, mas surpreendido por uma crise, expirou miservelmente nesse estado. Na comunidade, ignorando todos o seu triste fim, cercaram de venerao o defunto; o corpo foi transportado para a igreja do convento, onde ficou exposto no cro at as matinas do dia seguinte, quando se fariam as exquias. Uns minutos antes da hora marcada para a cerimnia, a um dos frades que fora tocar o sino aparece o morto amarrado de correntes afogueadas com no sei que de incandescente que lhe transparecia em tda a pessoa. O frade cau de mdo, mas cravou o olhar naquela terrvel apario; ento o rprobo lhe falou: No rezeis por mim, que estou no inferno para sempre. E contoulhe a lamentvel histria de sua maldita vergonha e dos seus sacrilgios. Depois desapareceu, deixando na igreja um odor pestfero que se espalhou por todo o convento, como para atestar a verdade do que o frade tinha visto e ouvido. Advertidos os superiores fizeram remover de a o cadver, julgando-o indigno de sepultura eclesistica. * * * Narram as crnicas de S. Bento de um solitrio de nome Pelgio, que encarregado pelo pai da guarda do rebanho, levava vida exemplar, tanto assim que todos lhe chamavam santo. Assim viveu muitos anos. Mortos os pais, vendeu as poucas coisas que lhe deixaram, e se retirou para o ermo. Uma ocasio teve a desgraa de consentir num pensamento desonesto. Cometido o pecado, caiu em profunda melancolia porque no queria confess-lo, para no perder a fama em que era tido. Resolveu fazer penitncia, sem confessar o pecado, iludindo-se a si mesmo que Deus talvez

lhe perdoasse sem confisso. Entrou num convento, onde foi recebido pela sua boa fama, e a viveu vida austera. Chegou a hora da morte e le se confessou pela ltima vez; mas como por vergonha ocultara o pecado durante a vida, assim deixou de o contar na hora da morte. Depois de receber o vitico morreu e foi sepultado como o mesmo conceito de santo. Na noite seguinte o sacristo encontrou o corpo de Pelgio em cima da sepultura e o enterrou outra vez; como, porm, o encontrasse desenterrado trs noites consecutivas, avisou o abade, o qual foi ao sepulcro com outros frades, e: Pelgio, disse, tu foste sempre obediente durante a vida, obedece-me tambm agora depois de morto; dize-me: talvez vontade divina que o teu corpo tenha lugar reservado? O infeliz defunto dando um formidvel grito respondeu: corpo. Ai! eu estou condenado por um pecado que no confessei; olhe, snr. abade, para meu

E o seu corpo, nsse instante, apareceu como um ferro em brasa, que mandava chispas. Todos fugiam espavoridos; mas Pelgio chamou o abade para que lhe tirasse da bca a partcula consagrada que ainda se achava a. Depois disto, Pelgio disse que o tirassem da igreja e o lanassem no monturo, e a ordem foi executada. * * * Conta o Padre Joo Batista Manni, jesuita, que houve uma pessoa que por muitos anos calou na confisso um pecado de desonestidade. Passaram por aqule lugar dois frades dominicanos; ela, que sempre esperava um confessor estranho, pediu a um dles que a ouvisse em confisso. Saindo da igreja, o companheiro contou ao confessor, que observara que, enquanto aquela senhora se confessava, saiam de sua bca muitas serpentes; mas, que uma enorme serpente apenas ps para fora a cabea e entrou de novo; e ento voltaram tdas as outras. O confessor, suspeitando o que isso pudesse ser, correu casa daquela senhora; na porta lhe disseram que ela ao chegar sala caira morta. Depois disto, apareceu-lhe, durante a orao, a pobre mulher vestida de fogo e disse: Eu sou aquela mulher que me confessei contigo, cometendo um sacrilgio; eu tinha um pecado que no queria confessar aos sacerdotes da cidade; Deus mandou um confessor de fora, e foste tu, mas tambm nessa ocasio deixei-me vencer pela vergonha e logo a justia divina me castigou, tirandome a vida apenas cheguei casa, e justamente me condenou ao inferno. Tendo assim falado, abriu-se a terra onde se precipitou e desapareceu para sempre. * * * O Padre Martinengo, no seu livro da Primeira Comunho, conta tambm um fato que aqui reproduzo com as prprias palavras. Numa parquia de Frana celebrava-se a festa de Primeira Comunho das crianas. Estava j o celebrante distribuindo a comunho, quando, de repente, um menino, apenas recebeu a sagrada Partcula, cau no cho. O socorro no se fez esperar. O menino estava frio como cadver, sem conhecimento e sem fala. Levado nos braos para uma casa prxima e deitado numa cama, procuram reanim-lo. Vem o mdico, que tudo faz para que o menino volta a si. Debalde! Entretanto, terminada a funo, chega o padre que tanto o amava, senta-se cabeceira, chama-o pelo nome, sacode-o at. Nenhum sinal de vida. Ah! coitadinho! Que teria acontecido? Estar mesmo morto? eram as perguntas que ento se faziam.

No; no tinha morrido, mas era moribundo. Depois de convenientemente medicado, o menino se mexeu, abriu os olhos e olhou estonteado os circunstantes. Momentnea alegria se difundiu no semblante de todos. O bom padre deu um grande suspiro de esperana e consolao, e comeou a acariciar o menino e a confort-lo com santas e afetuosas palavras. Filho, te sentes mal, no ? Coragem! sofre com pacincia. Jesus a quem recebeste te ajudar com certeza. Ouvindo sse nome, o menino torna-se lvido, olha assustado para o padre e prorrompe nestas palavras de desespro: Ai de mim! cometi um sacrilgio! Assim dizendo, vira sinistramente os olhos, cerra os dentes, range-os, e fazendo esgares volta-se para o lado da parede e expira. * * * Conta o Padre Francisco Rodrigues, e o traz tambm Santo Afonso, um fato acontecido na Inglaterra, quando a dominava a religio catlica. O rei Anguberto tinha uma filha que por sua airosidade fra pedida em casamento por muitos prncipes. Mas a princesa recusou terminantemente, pois fizera voto de castidade. O pai pediu para ela dispensa de Roma, mas a filha ficou firme no propsito de no se casar dizendo que no queria outro esposo seno Jesus Cristo; e ao mesmo tempo pedia ao pai permisso de viver afastada do mundo; o pai, que a estimava muito, condescendeu dando-lhe uma casa e crte convenientes. Comeou ento uma vida santa de orao, jejum e penitncias; frequentava os sacramentos e muitas vezes ia prestar servios aos doentes dum hospital vizinho. Nsse teor de vida morreu, apesar dos seus verdes anos. Certa vez uma senhora, que tinha sido sua criada, ouviu, durante a orao da noite, um rumor estranho e depois viu aparecer subitamente uma alma em figura de mulher, no meio do fogo e acorrentada entre muitos demnios, que se apresentou assim: Eu sou a infeliz filha de Anguberto. Como? perguntou assustada a aia; vs, condenada aps uma vida to santa? Replicou a alma; Fui justamente condenada por minha culpa. Sendo ainda criana tive a desgraa de cair num pecado desonesto. Fui confessar-me, mas a vergonha fechou-me a bca e em vez de revelar candidamente o meu pecado, eu o cobri de jeito que o confessor nada compreendeu, e cometi um sacrilgio. Depois comecei a fazer penitncias, a das esmolas, para que Deus me perdoasse, mas sem confisso. Em artigo de morte disse ao confessor que tu tinha sido uma grande pecadora. O padre ignorando o meu estado respondeu-me que devia repelir sse pensamento como uma tentao; logo depois expirei e fui condenada para sempre, s chamas do inferno. E, dizendo isto, desapareceu, mas com tanto estrpito que parecia derrubar a casa, deixando no quarto um mau cheiro insuportvel, que durou por muitos dias. * * * O terceiro pecado que arruna tantos cristos a blasfmia. E como se tornou comum no dia de hoje! Se um carroceiro no consegue fazer o seu animal andar vomita blasfmia contra Deus e contra os santos. Se um comerciante vai mal nos seus negcios dirige imprecaes contra os cus. Um jogador perde e ento se ira fortemente contra Nosso Senhor e sua Me Santssima. No se pode sair de casa, sem que os ouvidos e o corao se firam por blasfmias. Mas, que mal nos fez Nosso Senhor para o maldizermos? No Ele o nosso Criador, o nosso Redentor que morreu na cruz para nos salvar, e que est pronto a derramar sbre ns as suas bnos celestes, se o amamos?

Por que usamos mal dessa lngua que nos foi dada para cantar os seus louvores, profanando o seu santo nome? A blasfmia a linguagem do inferno. Os santos padres justamente indignados pelos gravssimos excessos que ela encerra chamam os blasfemos demnios em carne. Ai de quem se habitua a blasfemar! Ele se encaminha a largos passos para o inferno, pois multiplica pecados sbre pecados, escndalos sbre escndalos. Em alguns pases catlicos fundaram-se pias unies que tm por escopo impedir as blasfmias, ou, pelo menos, fazer a reparao, bendizendo o santo nome de Deus. Quando encontram algum infeliz que no sabe observar o segundo mandamento da lei de Deus, o advertem caridosamente por si ou por meio de seus conhecidos, mostram o mal que faz prpria alma, o escndalo que d ao prximo e o castigo que o espera, se no se corrige. So admirveis os resultados que conseguem tais pias unies ou ligas e muito fra para desejar que florescessem em todos os pases, em tdas as cidades. * * * Reuniram-se alguns soldados numa taberna de Voviano, na Lorena, e depois de terem bebido demais, comearam a jogar. Um dles tendo perdido muito levantou-se raivoso da mesa e vendo por acaso uma imagem de Maria SS., ps-se a desabafar a sua raiva vomitando as mais nefandas blasfmias contra a Me de Deus. Mas no mesmo instante, caiu no cho, com um horrvel tremor em todos os membros e com to violentos espasmos nas vsceras que se contorcia e bramia como um leo ferido. Trs dias le passou nesse estado, sem poder engolir nem alimentos, nem remdio para acalmar um tanto aquelas dores horrveis, at que no quarto dia, espumando de raiva e mordendo nervosamente a poeira morreu na presena de seus companheiros, estarrecidos por sse lutuoso espetculo. * * * Sabendo S. Leonardo de Porto Maurcio que em Suzze, onde pregava as santas misses, estava enraizado o vcio da blasfmia comeou a falar com veemncia contra sse enorme pecado. Um jovem devasso e grande blasfemo, riu-se das ameaas que Deus fazia por meio de seu ministro; aconteceu que no dia seguinte, precisamente na hora do sermo, le passeava a cavalo pelas ruas da cidade; num dado momento levou uma forte quda e teve morte instantnea, ficando com a lngua fora da boca. Todos conheceram o fato como castigo manifesto de Deus, o que serviu para incutir no povo um grande horror blasfmia. * * * L-se na Sagrada Escritura, que o soberbo e perverso Nicanor foi ferido de morte numa batalha. Judas Macabeu, vendo-o tombar, mandou que o degolassem e arrancassem a lngua sacrlega que tantas blasfmias proferira, atirou-a s aves, para incutir temor nos blasfemos. CAPTULO X Trs amplos caminhos que conduzem ao inferno: a desonestidade, o sacrilgio e a blasfmia Todos os pecados mortais so caminhos que vo dar no abismo eterno; h, porm, alguns que fazem mais estragos e causa a morte a um maior nmero de almas. O pecado de desonestidade talvez o que mais povoa o inferno, porque um pecado muito grave, fcil de cometer, pela corrupo de nossa natureza, e depois difcil de abandonar.

Santo Agostinho diz que a soberba povoou o inferno de anjos e a desonestidade o enche de homens. E Santo Afonso no receia afirmar que todos os cristos que se condenam, se condenam pela impureza, ou, pelo menos, no sem ela. Ai do jovem que chega os seus lbio a ste clice que le os pedira a Deus para fazer com merecimento o purgatrio nesta vida. No auge da dor, todo encolhido pela contrao dos nervos, dizia; Di muito, mas no fogo, no fogo. Crescia a tortura e aumentava a dor, mas no era fogo; contrao dos nervos juntava-se a gota, mas ainda no era fogo. Por estar de cama dez anos seguidos, dolorosas chagas cobriam-lhe o corpo aumentando o seu sofrimento, contudo le repetia sempre: no fogo, no fogo, e acabar. E assim se animava a suportar tudo com pacincia por amor de Deus. * * * Um santo solitrio, assaltado por violenta tentao, temendo ser vencido, acendeu o lume e para se compenetrar vivamente do pensamento do inferno, ps os dedos na chama e os deixou queimar, dizendo de si para consigo: Uma vez que tu queres pecar e merecer o inferno que ser o castigo de teu pecado, experimenta antes se s capaz de suportar o tormento de um fogo eterno. * * * Um rico dissoluto, ainda que pelos seus inmeros pecados vivesse em contnuo temor do inferno, todavia no tinha coragem de romper com os seus maus hbitos e de penitenciar-se. Recorreu, pois, a Santa Ludovina que ento edificava o mundo com a sua pacincia e lhe pediu que fizesse penitncia por le. De boa mente, respondeu a santa, oferecerei por vs os meus sofrimentos, com a condio, porm, que uma noite inteira vs conserveis na cama a mesa posio, sem vos moverdes de nenhum modo. Aceitou fcilmente a condio, mas passada apenas meia hora, sentiu enfado e j queria mover-se. Todavia no o fez; aumentando, porm, o mal-estar daquela posio que lhe ia parecendo insuportvel, cedeu. Ento uma impresso salutar se despertou no seu corao: Se to molesto ficar imvel num leito cmodo por uma noite, oh! o que no ser ficar deitado num leito de fogo pelo espao de uma eternidade? E terei ainda dvida de me livrar dsse suplcio com um pouco de penitncia? * * * No ano 285, duas matronas crists, Donvina e Teonila, foram levadas ao prefeito Lisias que as intimou a renegarem a f e abraarem o culto dos dolos. Elas recusaram terminantemente. Ento o prefeito mandou acender o fogo e erguer um altar dos dolos. Escolhei, disse; ou queimar incenso aos nossos deuses, ou ser vs mesmas queimadas nesta fogueira. As duas mrtires responderam sem hesitar: Ns no tememos ste fogo que daqui a pouco se apaga; tememos, sim, o fogo do inferno que no se apaga nunca. Para no cair no inferno que detestamos os vossos dolos e adoramos a Jesus Cristo. E assim sofreram o martrio. * * * Tomaz Moor, o grande chanceler da Inglaterra, foi perseguido e ameaado de morte por ter recusado um juramento inquo exigido pelo mpio rei Henrique VIII. Empregaram todos os meios para o seduzir, e, no valendo as promessas, recorreu-se violncia. Foi atirado priso para que

definhasse. Os amigos o importunavam para ceder; a espsa o conjurava a dobrar-se vontade do rei, e conservar assim a vida para o bem dles e dos filhos. Quantos anos, lhe disse le, te parece que poderia ainda viver? Mais de vinte, respondeu ela. Tornou o preso, mostrando-lhe severo semblante: Pois, por vinte anos e tanto queres que venda uma eternidade? Ele foi, por isso condenado morte. Este homem generoso, assim como tinha sabido viver entre as grandezas da crte sem fausto, soube tambm morrer no patbulo sem fraqueza. Antes de ser executado rezou o Miserre, e morrendo como forte ensinou a todos que preciso salvar a alma, a todo custo, porque perdida a alma, tudo est perdido. * * * Apresentou-se uma ocasio ao Papa Bento XI o embaixador de um grande soberano, pedindo em nome do rei um favor, mas de tal natureza que no se podia conceder lcitamente. Deus sabe, respondeu o Pontfice, como desejo ardentemente contentar o vosso imperador. E to vivo sse desejo, que se tivesse duas almas, sacrificaria de boamente uma para lhe conceder o favor que pede. Mas, dizei ao vosso soberano que tanto s uma alma, e absolutamente no posso, no devo, no quero perd-la para agradar a le. Belas palavras, que todo cristo deveria ter sempre presentes memria e pronta na bca para semelhantes circunstncias! * * * clebre a inveno usada por um rei pissimo para fazer pensar mais retamente a um cavalheiro de m vida. Convidou-o para uma soberba caada. Imediatamente depois da caa um jgo de muitas horas. Acabando o jgo, convite para assistir a uma representao. O corteso estava cansado; mas era convite do rei e precisava aceitar. Depois do teatro que durou quatro horas, uma embaixada anunciava uma sesso de msicos estrangeiros, e pedia ao cavalheiro quisesse honr-la com a sua presena. O pobre homem murmurou: Parece que o rei quer matar-me com tanta diverso; se vier mais um convite morro de verdade. E o quinto convite veio mesmo; no salo da crte havia um baile e a tambm o rei o esperava. Pobre de mim! ainda um baile? no posso mais ficar em p! E excusou-se com o rei: A bondade de Vossa Majestade me confunde. Mas, por amor de Deus, um pouco de descanso; dezoito horas ininterruptas de diverso E vos parece muito? replicou ou rei. No podeis ento, aguentar dezoito horas de divertimento e aguentareis a longa eternidade de contnuos sofrimentos no variados, para os quais vos leva vossa vida? * * * O Padre Cattaneo narra um fato para nos fazer compreender o mdo que devemos ter de nossa sorte futura. E todavia de ns depende a escolha! Maom II, senhor dos turcos, aqule que anexou mais de duzentas cidades ao grande imprio de Constantinopla e invadiria a Itlia se a morte lhe no frustrasse a realizao dos planos, foi homem crudelssimo e sanguinrio; de uma feita, achando falta de um fruto no seu jardim,

mandou reunir os criados para saber qual tinha sido o delinquente, e porque nenhum dles ousou confessar aqule pequeno furto, mandou abrir o ventre de todos para saber onde estava o corpo de delito; e foi providncia de Deus ter-se encontrado o fruto depois de mortos trs servos; seno, todos o outros seriam sacrificados. Ora, ste brbaro rei fez um parque de caa reservado para si, num lugar onde havia abundncia de animais e aves; decretou pena de morte a quem ousasse caar nesse parque. Para suceder no reino basta um; portanto, um se sacrifique para escarnamento de todos e o outro se conserve para segurana da cora. Mas qual dos dois merece graa? O mais velho? No! O menor? No! Tirem a sorte. Tirou-se a sorte fatal com um majestoso e tremendo aparato. Na grande sala da crte, achava-se o rei, sentado no trono, rodeado pelos vizires, ags e pachs; diante do trono duas mesinhas, uma fnebre com o barao, a outra coberta com uma rica toalha, onde se viam o turbante, o colar e a espada. Um taboeiro com os dados; a foram conduzidos os prncipes para tirarem a sorte: quem obtivesse o menor ponto cingiria a espada e colar; quem obtivesse maior, daria o pescoo ao barao. Diante daquele aparato os dois jovens desmaiaram; depois, com o fritilo na mo, dirigiam tristes olhares para a corda e para a coroa; o corao de ambos batia to forte que levantava as vestes sbre o peito, com afanosos e profundos suspiros, com nsias de moribundos, por causa da escolha fatdica a corda ou a coroa que dependia de um ponto de jgo e do lanar de um dado. Quem sente compaixo pela situao crtica em que se acharam sses pobres prncipes, dirija a compaixo sbre si mesmo, e diga: Na hora da morte, na mesma ou em pior situao me acharei eu. Duas infinitas eternidades terei diante de mim; numa verei cetros, coroas, riquezas, alegrias, prosperidades, tudo para sempre; noutra verei grilhes, infmias, morte, e no passageiros, mas que duram sempre. E o que caber em sorte? De ns depende inteiramente a escolha: se vivermos bem teremos eternidade feliz, se ao contrrio, levamos vida m, caber-nos- o fogo eterno, e desespro eterno e tdas as outras penas de que j falamos. CAPTULO XI Outras provas da existncia do demnio e do inferno O espiritismo, em suas vrias manifestaes, tambm uma prova evidente da existncia do crcere eterno. Se existe o esprito maligno e se le se manifesta por meio de mesas que falam ou giram e por meio de outros mdiuns, deve tambm existir o lugar de sua morada, isto , o inferno com suas penas atrozes. Estranha contradio! Os mpios no prestam f a Deus e sua Igreja e crem nas imposturas do demnio, pai da mentira, que os engana nas sesses espritas; zombam do inferno e dos novssimos e tm medo do nmero treze, ou do sal derramado na mesa, como de um mau agouro; desprezam a Sagrada Escritura e veneram os livrecos eu tratam de magia ou de sortilgio, no querem saber dos santos ensinamentos da Igreja e dos seus ministros e vo consultar uma cartomante ou um cigano para lhes revelar o futuro ou para cur-los. Assim : quando o homem fecha voluntariamente os olhos verdade, abre-os ao rro e mentira; enquanto espezinha a religio e ao seu Criador, nega o culto devido, torna-se supersticioso e presta homenagem ao diabo e s coisas insensatas. * * * Outra prova evidente da existncia da priso eterna e dos demnios, so as obsesses.

Satanaz, em nossos dias, se incarna nos livros mpios que ridicularizam a nossa santa religio e difamam as religies, os padres e os bispos; nos romances que ensinam descaradamente o vcio e espezinham a virtude; nas esttuas, nos monumentos e nos quadros obscenos trabalhados sob o ridculo pretexto da arte, como se arte no devesse respeitar a honestidade dos costumes e no fsse feita para civilizar e nobilitar o homem. As tipografias e as livrarias que publicam maus livros, a oficina dum artista que reproduz nudez na tela, no mrmore, ou no papel, as reunies tenebrosas da maonaria, so querenas de Lcifer. Certos escritores e certos propagadores de doutrinas anrquicas ou socialistas ou ateus, parecem possudos do esprito da mentira, tanta a constncia, a imprudncia, a ousadia com que espalham a baba dos seus erros. A sua pena molhada em veneno violento e torna-se na sua mo o punhal do assassino que mata a alma e o corpo dos leitores. Mas, alm dessas incarnaes de Satanaz nos homens mpios que servem a sua causa e agem sob sua influncia, houve, mesmo ltimamente, verdadeiras obsesses. Cito um fato, do qual foi testemunha uma cidade inteira, fato extrado dum opsculo do advogado Feliz Sonelli; (*Teresa Strigini ou A famosa endemoninhada de Briga Novarense, publicada em Milo, em 1877.) quem no cr pode ir interrogar as testemunhas oculares. Teresa Strigni nasceu em Briga, vilrio de Novara, Itlia, aos 20 de maio de 1832, e a certa idade comeou apresentar sinais de obsesso diablica. Fechada em casa, desaparecia e depois de muito tempo voltava e entrava sem abrir a porta. Passava dias sem tomar alimento ou bebia e via o que acontecia em lugares distantes; seu rosto tomava formas horrveis a ponto de amedrontar os mais corajosos. Rumores misteriosos se ouviam em seu quarto; e muita vez tda a casa era sacudida como por um terremoto, derrubando as moblias como se fssem palhas. A coitadinha ora parecia agonizante e prestes a exalar o ltimo respiro; ora, tinha tanta fora que ningum a dominava e at punha em fuga homens robustos que acorriam para refrear-lhe a veneta, ou socorr-la nas frequentes convulses de que era toada. Apesar de analfabeta, e sem nenhuma instruo, compreendia lnguas desconhecidas e demonstrava saber extraordinrio. Os exorcismos produziam nela grande efeito e via-se claramente que o demnio sentia o poder que Deus concedeu sua Igreja. Quando os parentes e os vizinhos no sabiam o que inventar para acalm-la, chamavam o proco para que ordenasse a Satanaz com as frmulas do Ritual que deixasse em paz a infeliz moa. Sentia tambm a influncia e, s vezes terror das coisas benzidas, teros, imagens, medalhas, gua benta, como se fsse tocada por um ferro em brasa. Um dia o sacerdote a interrogou: Quem s tu? s um demnio? No, respondeu a voz terrvel. Em nome de Deus, quem s? Um demnio. s um daqueles soberbos precipitados do cu? Sim. No verdade, que apesar de tua arrogncia sofres tambm aqui as penas do inferno? Sim. Outras vezes respondia que era uma legio. E na verdade, os fenmenos extraordinrios que sucediam em sua pessoa, no quarto, na casa, mostravam que devia haver mesmo uma multido de demnios.

Alguns libertinos que zombavam do inferno e dos demnios foram examinar o fato e o sarcasmo morreu-lhes nos lbios. Alguns at foram horrvelmente maltratados e outros ficaram gelados de medo quando viram pintado naquele rosto o desespro dos rprobos. Repito: Quem no quiser acreditar, consulte as testemunhas oculares. Mas, vde a estultcia: os mpios no querem averiguar os fatos e continuam a escarnecer dos dogmas da f, at que, vindo a morte, as chamas devoradoras do inferno os convenam da existncia de um Deus que castiga o pecado e a iniquidade. * * * Na vida de S. Joo Maria Vianney, mais conhecido pela expressiva alcunha de Santo Cura dArs, l-se a luta terrvel que deveu sustentar contra satanaz, furioso por causa das inmeras almas que o santo sacerdote arrancava da eterna perdio. A povoao de Ars foi testemunha do ocorrido e vivem ainda muitas pessoas que poderiam confirmar o que relatamos. O demnio lhe aparecia sob formas horrveis para perturbar-lhe o breve repouso que tomava num pobre catre. s vezes a casa parecia invadida por uma turba de lees, tigres e serpentes e pelos quartos e corredores ressoavam rugidos, assobios e urros; outras vezes aparecia no meio das chamas; corriam os paroquianos para salvar do incndio o seu querido pastor, mas o fogo de sbito se apagava. Os mais robustos e os mais corajosos experimentaram dormir na casa paroquial, mas de noite fugiam de mdo, enquanto o santo sacerdote, bem sabendo que o demnio no pode fazer nenhum mal sem a permisso do cu, descansava tranqilo sob as asas da proteo divina. Quando operava uma converso prodigiosa, a raiva da antiga serpente no tinha limites e redobrava os esforos para vingar-se da presa perdida. Uma noite o demnio ateou fogo no seu pobre leito, outra vez o atirou no cho com violncia, sem porm o machucar, e muitas vezes o chamava com voz rouca, reprovando a guerra que lhe movia. * * * Na vida de S. Jos Cottolengo se encontra tambm a apario do nosso eterno inimigo e vivem ainda muitas testemunhas. Geralmente todos os santos tiveram lutas corporais e visveis contra o prncipe das trevas, pelo zlo que mostraram na salvao do prximo e pelas vitrias que alcanaram do prximo e pelas vitrias que alcanaram contra o mundo, a carne e o inferno. Portanto, veio algum do outro mundo a provar-nos a existncia das verdades eternas: veio at o chefe dos anjos rebeldes. * * * Na histria de S. Joo Batista de La Salle, benemrito fundador dsses anjos da juventude que se chamam Irmos das Escolas Crists, narra-se que um cavalheiro de nobre famlia levava vida mundana, pouco se lhe dando da salvao da alma. Alistou-se no exrcito, onde subiu fcilmente de psto e obteve condecoraes pelo seu valor. Duma feita, foi ferido num combate; curaram-no remdios secretos, com auxlio diablico. Entrando uma vez numa igreja no momento preciso em que se exorcizava um possesso, por curiosidade e para zombar da credulidade das pessoas presentes, inesperadamente o demnio lhe dirigiu a palavra e disse: Tu no crs no inferno e no demnio! Infeliz! sentirs um dia o seu poder. Assustado por essas ameaas e por ver que o esprito infernal tinha penetrado seus ntimos pensamentos, que le no revelara, cau em si, voltou crente e decidido a abandonar o mundo para ingressar no Instituto de So Joo de La Salle e fazer penitncia. Naquele santo retiro o esperava Sat. Abriram-se-lhe denovo as feridas, foi tomado de dores atrozes e misteriosas, de frenes e convulses horrveis, de jeito que nenhuma fra humana podia

cont-lo. A comunidade vivia em sobressaltos. O Santo notou no infeliz os sinais da obsesso; e exorcizando-o, intimou ao esprito das trevas que saisse daquele corpo. O demnio ouviu a voz potente do ministro de Deus e escabujando e urrando, abandonou o infeliz cavalheiro. Na vida do mesmo Santo se encontra o seguinte fato. Vivia em Ruo uma senhora de nome Maillefer, tda entregue s vaidades e aos prazeres do mundo, sem mesmo pensar nos seus deveres de crist. Gastava suas grandes riquezas em vestidos, banquetes e teatros, caminhando a passos ligeiros pela estrada da perdio. Aprouve, porm, bondade divina det-la beira do abismo e faz-la instrumento das suas misericrdias. Um dia, bateu porte do palcio um pobre, doente e faminto. Os criados, embora conhecessem o corao duro da ama, deixaram-no entrar; julgando que o seu msero estado movesse compaixo. Assim no foi, porm! A cruel senhora o expulsou de sua casa, com asco, atirando-lhe em rosto estas palavras: Poltro, vai trabalhar. O mendigo abaixou a cabea e saiu cambaleando de fome e de fraqueza. porta, deu com o cocheiro, que sentiu doer-lhe o corao vista de seus padecimentos e levando-o estrebaria, o socorreu como pde. Mas o novo Lzaro morreu durante a noite, e na manh seguinte os criados encontraram o frio cadver, em cujo semblante se percebiam as angstias e as dores que padecera nos ltimos momentos. A ama tendo notcia do acontecido exasperou-se, despediu logo o compreensivo cocheiro e atirou aos criados o primeiro lenol encontrado para que amortalhassem o defunto e sem mais o sepultassem. Passou o resto do dia debaixo duma triste impresso, humilhada pela sua crueldade e pelo que correria a seu respeito na cidade. Qual no foi a sua admirao quando, pondo-se mesa, encontrou dobrado em sua cadeira o lenol que tinha dado pela manh. Julgou, de princpio, que no fra obedecida e ameaou despedir os criados; mas stes asseguraram que tinham executado a ordem recebida e que les mesmos depuseram na sepultura o cadver amortalhado com aqule lenol. Que mo misteriosa teria colocado a o vu fnebre? claro: o defunto recusou depois da morte uma esmola daquela que lhe negou barbaramente em vida um auxlio, e Deus tal permitiu para comover a infeliz pecadora. Realmente, ela compreendeu a lio, mudou de vida, penitenciouse e expirou placidamente no sculo do Senhor, cheia de confiana na misericrdia divina que acolhe um corao contrito e humilhado. * * * S. Felipe Nri ressuscitou momentaneamente um menino para dar-lhe azo de se confessar. Ele amava ternamente Paulo Mximo, filho do prncipe romano Fabrcio Mximo. O menino tinha 14 anos quando adoeceu gravemente; o santo tendo revelao de sua morte prxima, pediu famlia que o chamasse cabeceira do menino quando estivesse no extremo da vida, porque desejava confort-lo e prepar-lo para a luta suprema. A doena se agravou e o pai mandou chamar a S. Felipe para que corresse a abenoar o seu filho espiritual. Como, porm, estivesse celebrando a Santa Missa, a criada deu o recado a um dos Padres do Oratrio. Nesse nterim o menino morreu e o santo, quando chegou ao palcio, encontrou-o cadver. Ajoelhou-se ao p da cama e rogou com devoo por um quarto de hora, depois aspergiu o rosto do menino com gua benta, deitando-lhe umas gotas na boca. Soprou-lhe o rosto, colocou-lhe a mo na fronte, chamado duas vezes em voz alta e sonora: Paulo! Paulo! O morto acorda como de um profundo sono, abre os olhos es exclama: Padre, Padre, tenho um pecado e quero confess-lo.

S. Felipe pede aos presentes que se retirem, d ao menino um crucifixo e ouve a sua confisso; terminada a qual, chama os parentes e pe-se a falar sbre o paraso e a felicidade dos eleitos; o menino se entretem em santa conversao, como quando gozava perfeita sade; aps meia hora