LYOTARD, Jean-François. O pós-moderno

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JEAN-FRANOI

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JEAN-FRANCOIS LYOTARD

Contribuio discusso internacional sobre a questo da legitimidade: o que permite dizer, hoje, que uma lei justa, um enunciado verdadeiro? Existiram os grandes relatos, a emancipao do cidado, a realizao do esprito, a sociedade sem classes. A idade moderna recorreu a eles para legitimar ou criticar seus saberes e seus atos. O homem ps-moderno no acredita mais nisto. Os decisores lhe oferecem como per$pectiva o aumento do poder e a pacificao pela transparncia comunicacional. Mas ele sabe que o saber, . qu,ando se torna mercadoria informacional, uma ~: foMe de lucros e um meio de decidir e controlar. Onde reside a legitimidade, ap9s os relatos? Na melhor operatividade do sistema? Eum critrio tecnolgico, ele no permite julgar o verdadeiro e o justo. No consenso? Mas a inveno se faz no dissen- , timento. ~ Porque no neste ltimo? A sociedade que vem ergue-se menos de uma antropologia newtoniana (como. o estruturalismo ou a teoria dos sistemas) e mais de uma pragmtica das partculas de linguagem. . . . O saber ps-moderno no somente o instrumento dos poderes: ele nos refina 'a senSib;.i1idade para as diferenas e nos refora a capacid de de suportar o incomensurvel. Ele mesmo no ncontra sua razo na homologia dos experts, mas na pa- I ralogia dos inventores. ( f agora: uma legitimao do vnculo, sociaf, . uma sociedade justa, seria praticv:!fseQundo um paradoxo anlogo? Emque este co~istina?

JOS OlYMPIO

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EDITORA

Jean-Franois Lyotard pouco conhecido entre nos. Ativo, contestador, adversrio declarado dos modismos orquestrados pelos mass media, provavelmente um dos mais brilhantes filsofos da sua gerao. Nascido em 1924, seguiu um itinerrio intelectual bastante comum. Marxista durante os anos 50-60, fez parte do grupo "Socialismo e Barbrie" animado por Cornlius Castoriadis. Ativista durante a guerra da Arglia, foi um dos artes os daquela ruptura com as ideologias dominantes que na Frana d~terminaram a acelerao dos acontecimentos politicos de 1968. Com a publicao, em 1974, de Drive partir de Marx et Freud e Des dispositifs pulsionnels, Lyotard impsse como um dos mais importantes pensadores franceses da atualidade. Prximo de Gilles Deleuze pela constante referncia ao desejo e suas adjacncias, dele se distingue, no entanto, por ter uma postura poli-

tica radical: a abolio definitiva da idia de verdade que durante mui-tos sculos tem sido uma das principais ferramentas do poder. Para Lyotard, portanto, a tarefa principal do ~ filsofo contemporneo a de I,. "acelerar" a decadncia dessa idia, e nesse sentido defende um "Niilismo ativo". Nietzsche, por conseguinte, est no horizonte dessas reflexes. EmO ps-moderno,'importante livro publicado na Frana em 1979, Lyotard leva adiante o projeto de acelerar a decadncia da idia de verdade, pelo menos tal como ela entendida por algumas correntes da filosofia moderna. Com o termo "Ps-moderno", pretende antes de tudo designar o conjunto das transformaes ocorridas nas regras do jogo da produo cultural e que marcam o advento das sociedades ps-industriais. Sua preocupao bsica, como indica o subttulo do livro, no a de avaliar todo o conjunto das modificaes sofridas pela herana cultural deixada pelos modernos, mas sim a de avaliar "as condies do saber produzido nas sociedades mais avanadas", muito particularmente as condies do saber cientfico e seu suporte tradicional, a universidade.

Jean-Franois Lyotard

o ps-modernoTraduoRICARDO CORRA BARBOSA

JOS OLYMPIO

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EDITORA

RIO DE JANEIRO/1988

Ttulo do origina! francs: LA CONDITION POSTMODERNE

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2-7073-0276~~~~;~

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Paris)

BIBLIOTECA

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fljf!j}~_.... ___ .. ~CapaJAIR PINTO

TEMPOS PS-MODERNOS INTRODUO

(Wilmar do Valle Barbosa)

vii xv

Preparao de originaisHELOISA MENDES FORTES DE OLIVEIRA

DiagramaoHELIO LiNS

RevisoMARCOS ROMA SANTA

bo CorreiaI

CDD - 301.2 CDU -130.2

O saber nas sociedades informatizadas O problema: a legitimao O mtodo: os jogos de linguagem A natureza do vnculo social: a alternativa moderna .. A natureza do vnculo social: a perspectiva ps-moderna Pragmtica do saber narrativo Pragmtica do saber cientfico < A funo narrativa e a legitimao do saber Os relatos da legitimao do saber A deslegitimao A pesquisa e sua legitimao pelo desempenho O ensino e sua legitimao pelo desempenho A cincia ps-moderna como pesquisa de instabilidade ~timao pela paralogia

o campo:

3 11 15 20 27 35 44 51 58 69 77 88 99 111

"A verdade que a cincia favorecelI; a idia de uma fora intelectual rude e sbria que torna francamente insuportvel todas as velhas representaes metafsicas e morais da raa humana." (Robert Musil, O homem sem qualidades, 11

COM

o incio) por volta dos anos 50) da chamada "era

ps-industrial))) assistimos a modificaes substantivas nos estatutos da cincia e da universidade. O mais importante nesse processo de modificao) cuja origem encontra-se na "crise da cincia)) (e da verdade) ocorrida nos ltimos de cnios do sc. XIX) no foi apenas a eventual substituio de uma "m)) concepo da cincia (a empirista) por exemplo) por outra qualquer. O que de fato vem desde ento ocorrendo uma modificao na natureza mesma da cincia (e da universidade) provocacla pelo impacto das transLOt'~aes tecnolgicas sobre o saber. A cot1JEincia mais imediata desse novo cenriO/oi tornar ineficaz;o quadro terico proporcionado pelo filsofo (leia-se: metafsico) moderno que) como sabemos) elegeu como s~a questo a problemtica do conhecimento) secundarizando as questes ontolgicas em face s gnoseolgicas. Mas) ao proceder dessa maneira) fez da filosofia um metadiscurso de lef.!,itimao da prpria cincia. A modernidade do quadro terico em questo encontra-se exatamente no fato de conter certos rcits aos quais a cincia moderna teve que recorrer para legitimar-se como saber: dialtica do esprito) emancipao do sujeito razovel. ou do trabalhador) cres-

cimento da riqueza e outros. Desde o momento em que se invalidou o enquadramento metafsico da cincia moderna, vem ocorrendo no apenas a crise de conceitos caros ao pensamento moderno) tais como "razo") "sujeito", "totalidade") "verdade", "progresso". o-J$.~tatamos ue ao q lado dessa crise opera-se sobretudo a(~ de novos..f1J:... quadra!!!EJl!211e6ri.f)s("aumento da potncia") "eficcia", "opilmizao das perf.ormances do sistema") legitimadores da produo cientfico-tecnolgica numa era que se (juer ps-industrial. JJ..Ql-mpderno,e.n~!!:!~CSJ'!ldo_4g.SJ.Il~.1l.eS1a ...era,c.ara.cteriza~se e~mente pela incredulidade perante o metadiscurso jilosfico-meta!sico, C01JL5.1J.4L ~e.s;temporajs e universalizantes. O cenQ_/2Q.J.-mQderno.essencialm en~f.-.jJzgn ti.co~ informtico e informacional. Nele, expancLem-se cada vez mais os estudos e as pesquisas sobre a ITiigUa~, com o objetivo de cO~-!f_mecnica dCLs..u.._P~ e de e.I' tabelecer ~jil2.i1idadJ ent~gJM2Lm~..JJJ-qyin_iJJ.~_ formtica. Incrementam-se tambm os estudos sobre a "inteligncia artificial)) e o esforo sistemtico no sentido de conhecer a estrutura e o funcionamento do crebro bem como o mecanismo da vida. Neste cenrio) predominam os esforos (cientficos, tecnolgicos e polticos) no senti" do de j1)fQJ1J1atiZJ-SQ.k.e.dade. por um lado, o avano Se, e a c~tidianizao da teenologia informtica j nos impem srias reflexes/ por outro lado, seu impacto sobre a cincia vem se revelando considervel.

I Reflexes sobre questes ticas (direito informao), questes deontolgicas (relativas privacidade. vida privada) questes jurdico-polticas (transmisso transfronteira de dados -'- transborder data flow) e a questo da soberania e da censura estatal; questes culturais (diversidade e identidade cultural e a possvel homogeneidade da mensagem telem tica transmitida por satlite); questes poltico-sociais (democratizao da informao, rediscusso da censura, pertinncia scio-cultural da infor

A clencia, para o filsofo moderno, herdeiro do !luminismo, era vista como algo auto-referente, ou seja, existia e se renovava incessantemente com base em si mesma. Em outras palavras, era vista como atividade "nobre", "desinteressada", sem finalidade preestabelecida, sendo que sua funo primordial era romper com o mundo das "trevas". , mundo do senso comum e das crenas tradicionais, contribuindo assim para o desenvolvimento moral e espiritual da nao. Nesse contexto, a cincia no era sequer vista como "valor de uso" e o idealismo alemo pde ento conceb-la como fundada em um metaprincpio filosfico (a "vida divina" , de Fichte , ou a "vida do esprito", de Hegel) que, por sua vez, permitiu conceb-la desvinculada do Estado, da sociedade e do capital, e. fundar sua legitimidade em si mesma. "Nao" e "cincia" caminharam juntas, por exemplo, na avaliao humboldtiana, de sab(jf' humanstico-liberal, e que esteve na base da criao da Universidade de Berlim (1807-10)) modelo para muitas organizaes universitrias nos meados do sc. XX. "" T ,. 'd '/'-'1-0 entanto) o cenarza -p1Js-mo erno, com sua {( vocao" inf.DnJJ.iJi.ca~~.in.fr.1Jl nal) (~JJ.J,2e51e" qsobre.3Jt a ai 5-0nceP.4--dsil~er ~~entf!co. Como muito bem notou Alfred N. W hitehead) o sc. XX vem sendo o palco de uma descoberta fundamental. Descobriu-se que a fonte de todas as fontes chama-se jnforma~ e que a cincia assim como qualquer moddtd(;' de conhecimento - nada mais do que 1f-1JJ.f;I..tQtl1JjdQ.d.f orgqn.izalJ.est~a~~~_", dJribu.ir C(4Js.jnjor.ma.,f.L Longe, portanto, de contInuar tratando a cincia como fundada na "vida do esprito" ou na "vida divina"; o cenrio ps-moderno_com~{j.. a. v-ja ..COlllQ ..tftJ1.fQ.n.-UPto e menslIg,ms possJl.f.LiJ:~~ser d trad uzid -~_':._q}}~e..(bi ts) de=oii1.tar.mao". ra) se O as mquinas informticas justamente operam traduzindo as mensagens em bits de informao, s ser "conhecimento

11l11l"io).

ix

certo tipo de informao traduzvel na linguaessas mquinas utilizam ou ento compatvel com c/ri, () que se impe com o tratamento informtico da "mensagem" cientfica na verdade uma concepo operacional da cincia. Nesse contexto) a pesquisa cientfica passa a ser condicionada pelas possibilidades tcnicas da mquina informtica) e o que escapa ou transcende tais possibilidades tende a no ser operacional) j que no pode ser traduzido em bits. Assim sendo) a atividade cientfica deix de ser aquela praxis que) segundo a avaliao humanstico-liberal) especulativa) investia' a formao do ((esprito") do "sujeito razovel") da ((pessoa humana" e at mesmo da "humanidade". Com ela) o que vem se impondo a concepo da cincia como tecnologia intelectual, ou seja) como valor de troca e) por isso mesmo) desvinculada do produtor (cientista) e do consumidor. Uma prtica submetida ao capital e ao Estado) atuando como essa particular mercadoria chamada fora de produo. Esse processo) fruto da corroso dos dispositivos modernos de explicao da cincia) muito apropriadamente designado por Lyotard pela expresso "deslegitimao". No entanto) ele no se d apenas em funo da corroso do ((dispositivo especulativo" (Idealismo alemo) Hegel) ou do ((dispositivo de emancipao" (Iluminismo) Kant) Marx). Essa corroso (que Nietzsche entendeu ser uma das ra zes do "Niilismo europeu")) muito bem captada em narrativas como Pais e filhos (Ivan Turgueniev)) O homem sem qualidades (Robert Musil) e Sonmbulos (Herman Broch)) fez surgir novas linguagens que escapam s deter. minaes tericas dos dispositiv.os modernos e aceleram sua prpria deslegitimao. Da segunda lei da termodinmicil teoria da catstrofe) de Ren Thom; do simbolismo qumico s lgicas no-denotativas; da teoria dos quanta fsica ps-quntica; do uso do paradigma.._cibemtico-il1jormtico no estudo do cdigo gentico ao ressurgimento da cosmologia de observa~o; da crise da Weltanschauung(C'lIljico" W'!II (Iue

newtoniana recuperao da noo de ((acontecimento") "acaso "I na fsica) na biologia) na histria) o que temos a crise de uma noo central nos dispositivos de legitimao e no imaginrio modernos: a noo de ordem. E com ela assistimos rediscusso da noco de "desordem"/ o qUf! por sua vez torna impossvel submeter todos os discursos (ou iogos de lingHqgm..s) Uu.toridLlde. de um -metadis.cur-s-o_quese-p~etendeaJl11.2e. do .llgJ1jJifl1te)J!g tg: ~o e da p.rJ2l!rjq!.~~o) )sto l.-li1Jjl!frsg1 ...~_ consistente. Por isso mesmo que as delimitaes clssicas dos campos cientficos entram em crise) se desordenam. Desaparecem disciplinas) outras surgem da fuso de antigas; as velhas faculdades do lugar aos institutos de ensino e/ou pesquisa jinanciadospela iniciativa privada) pelo poder pblico ou por ambos. A universidade) por sua vez) enquanto produtora de cincia) torna-se uma instituio sempre mais importante no clculo estratgico-poltico dos Estados atuais. Se a revoluo industrial nos mostrou que sem riqueza no se tem tecnologia ou mesmo cincia) a condio ps-moderna nos vem mostrando que sem saber cientfico e tcnico no se tem riqueza. Mais do que isto: mostra-nos) atravs da concentrao massiva) nos pases ditos ps-industriais) de bancos de dados sobre todos os saberes hoje disponveis) que a competio econmico-poltica entre as naes se dar daqui para frente no mais ,em funo primordial da tonelagem anual de matria-prima ou de manufaturados que possam eventualmente produzir. Dar-se-) sim) em funo da quantidade de informaoCf. Communications, n. 18, 1972 (nmero especial sobre a retomada da noo de acontecimento pelas cincias contemporneas). 2 Sobre a centralidade dessa rediscusso na atual fase da pesquisa cientfica, cf. Edgar Morin, La methode I: La nature de Ia nature; La methode 11: La vie de Ia vie e Le paradigme perdu: Ia nature humaine, todos pela Bditions du Seuil, Paris em 1977, 1980 e 1973, respectivamente.1

tol;ClH';entfica que suas universidades e centros '1/IiJa forem capazes de produzir} estocar e fazer como mercadoria,

de pescircular

qJg_~te.~!Q.Jjf!:-d esle gi~ima.f.4Q~,pQs od e1J1..)JQ" p"Qti } -m e evidentemente} passar se111U11!4~SJ2.0sitjv() de..kgJli1J1ao~ "A administrao da prova}}} escreve Lyotard} "que em princpio no seno uma parte da argumentao destinada a obter o consentimento dos destinatrios da mensagem cientfica} passa assim a serco~t;ol;dtl) por um outro # jogo de linguagem onde o que est em questo no a verdade mas o desempenho} ou seja} a melhor relao input/output" (p. 83). Como novo dispositivo de legitimao} o critrio do desempenho impe no apenas o abandono do discurso humanista-liberal por parte do Estado} do capital ou mesmo da universidade. Na medida em que seu objetivo aumentar a eficcia} d primazia questo do erro: oimportante agora no afirmar a verdade} / 'mas sim localizar' o-erro no sentido de aumentar a eficcia} \ Qu.melhor} a potncia. Nessas circunstncias} a universidade} o ensino e a pesquisa adquirem novas dimenses: formam-se pesquisadores ou profissionais} investe-se na pesquisa e na sua infra-estrutura no mais com o objetivo de preparar indivduos eventualmente aptos a levar a nao sua ({verdade}}) mas sim formar competncias capazes de saturar as junes necessrias ao bom desempenho da dinmica institucional. Aps essas consideraes} parece-nos razovel dizer que o texto de Lyotard contm, implcita} uma observao que reputamos fundamental: o contexto ps-moderno tende a eliminar as diferenas epistemolgicas significativas entre os procedimentos cientficos e os procedimentos polticos. A retomada ps-moderna dessa !Wstti,ra.kt1(Qniana nos coloca em uma via no-cartesiana, no-kantian~ -Jsde o momento em que, contrariamente ao pensado pelos dispositivos modernos de legitimao, parte do presJupasto de que "verdade}} e "poder" no podem ser separaxii

o poder parccc, Jem dvida} animar a construao'aodisposivo pJ-moderno de legitimao, No entanto} preciso notar 'lI/C} para Bacon} pensar dessa maneira constitua um modo de tentar abolir a oposio entre ((tcnica)} e ((emancipao}} sem ob'ahc19nQ . .d.esJa." O filsofo ingls era do parecer de que a construo de um ((novo mundo)} era objetivo fundamental e que s pela via de um conhecimento que deixasse de ser concebido como contemplao / designao de uma ((ordem eterna)}} perfeita} divina e transhistrica} poderamos construir uma comunidade livre de ((dolos)}. A problemtica do ((novo mundo}}) no entanto) parece no seduzir o filsofo ps-moderno} avesso s filosofias da subjetividade e aos metadiscursos de emancipao. Preocupado com o presente e com o reforo do critrio de desempenho critrio tecnolgico -" visando com isso o reforo da ((realidade)} e o aumento das chances de se ter ((razo}}) ele parece ter abandonado os caminhos da utopia) esse modo de encantar o mundo que anima as ies de Bacon e de outros modernos. Estas} por sinal} mostram o esforo do filsofo no sentido de superar o divrcio entre inteligncia e emoo. Para isso sem dvida necessrio que o conhecimento (inclusive a filosofia) esteja mais perto do concreto} do presente} coope"rando com as foras do acontecimento, de codificando e dando coerncia aos detalhes da cotidianidade. Mas tudo isso com o objetivo de resgatar o encantamento que as religies proporcionaram aos nossos ancestrais. Estar} sim} perto do cotidiano} do presente} mas visando a interpenetrao da emoo e da cincia} da paixo e da inteligncia} do sonho e da prtica} de forma que a poesia possa vir a ser a flor espontnea do mundo futuro.cios. Jl idha baconiana de que o conhecimentoRio de Janeiro, outubro de 1985 WILMAR DO V ALLE BARBOSAxiii

ESTE estudo tem por objeto a pOSlao do saber nassociedades mais desenvolvidas. Decidiu-se cham-Ia de "ps-moderna". A palavra usada, no continente ameriano, por socilogos e crticos. Designa o estado da cultura aps as t!.illlsf9J::maes_ que afetaram as regras dos jogos da cind, da literatura e das artes a partir do final do sculo XIX. Aqui, essas transformaes sero situadas em relao crise d-_}"~ltgs. Originalmente, a cincia entra em conflito com os relatos. Do ponto de vista de seus prprios critrios, a maior parte destes ltimos revelam-se como fbulas. Mas, na medida em que no se limite a enunciar regularidades teis e que busque o verdadeiro, deve legitimar suas regras de jogo. Assim, exerce sobre seu prprio estatuto um discurso de legitimao, chamado filosofia. Quando este metadiscurso recorre explicitamente a algum grande relato, como a dialtica do esprito, a hermenutica do sentido, a emancipao do sujeito racional ou trabalhador, o desenvolvimento da riqueza, decide-se chamar "moderna" a cincia que a isto se refere para se legitimar. E assim, por exemplo, que a regra do consenso entre o remetente e destinatrio de um enunciado com valor de verdade ser tida como aceitvel, se ela se inscreve na perspectiva de uma unanimidade possvel de mentalidades racionais: foi este o relato das Luzes, onde o heri do saber. trabalha por um bom fim tico-poltico, a paz uni-

Vl'l"saI.V-se neste caso que, legitimando o saber por um ll1l'tarrclato, que implica uma filosofia da histria, somos conduzidos a questionar a validade das instituie~ .que regem o vnculo social: elas tambm devem ser legltlmadas. A justia relaciona-se assim com o grande relato, no mesmo grau que a verdade. Simplificando ao extremo., considera-se "p~-moderna," a incredulidade em relao aos metarrelatos. E, sem duvida um efeito do progresso das cincias; mas este progres~o, por sua vez, a supe. Ao desuso do dispositivo metanarrativo de legitimao corresponde sobretudo a crise da filosofia metafsica e a da instituio universitria que dela dependia. A funo narrativa perde .seus atores (functeurs), os grandes heris, os grandes pengos, os grandes priplos e o grande objetivo. Ela s: dispersa em nuvens de e'1ementos de linguagem narrativos, mas tambm denotativos, prescritivos, descritivos etc., cada um veiculando consigo validades pragmticas sui generis. Cada um de ns vive em muitas destas encruzilhadas. No formamos combinaes de linguagem necessariamente estveis, e as propriedades destas por ns formadas no so necessariamente comunicveis. Assim, nasce uma sociedade que se baseia menos numa antropologia newtoniana (como o estruturalismo ou a teoria dos sistemas) e mais numa pragmtica das partculas de linguagem. Existem muitos jogos de linguagem diferentes' trata-se da heterogeneidade dos elementos. Somente da;o origem instituio atravs de placas; o determinismo local. No obstante, os decisores tentam gerir estas nuvens de socialidades sobre matrizes de input / output, segundo uma lgica que implica a comensurabilidade dos elemen, tos e a determinabilidade do todo. Para eles, nossa vida i fica reduzida ao aumento do poder. Sua legitimao em matria de justia social e de verdade" cientfica seria a de otimizar as performances do sistema, sua eficcia. A apli-

cao deste critrio a todos os nossos jogos no se realiza sem algum terror, forte ou suave: sede operatrios, isto , comensurveis, ou desaparecei. Esta lgica do melhor desempenho , sem dvida, inconsistente sob muitos aspectos, sobretudo no que se refere contradio no campo scio-econmico: ela quer, simultaneamente, menos trabalho (para baixar os custos da produo) e mais trabalho (para aliviar a carga social da populao inativa). Mas a incredulidade resultante tal que no se espera destas contradies uma sada salvadora, como pensava Marx. A condio ps-moderna , todavia, to estranha ao desencanto como positividade cega da deslegitimao. Aps os metarrelatos, onde se poder encontrar a legitimidade? O critrio de o~eratividade te.cnolgico.; ele no pertinente para se Julgar o verdadeIro e o Justo'_J Seria pelo consenso, obtido por discusso, como pensa Habermas? Isto violentaria a heterogeneidade dos jogos de linguagem. E a inveno se faz sempre no dissentimento.' O saber ps-moderno no somente o instrumento dos poderes. Ele agua nossa sensibilidade para as diferenas e refora nossa capacidade de suportar o incomensurvel. Ele mesmo no encontra sua razo de ser na homologia dos experts, mas na paralogia dos inventores. A questo aberta a seguinte: uma legitimao do vnculo social, uma sociedade justa, ser praticvel segundo um paradoxo anlogo. ao da atividade cientfica? Em que consistiria este paradoxo?

li

o

TEXTO que se segue um escrito de circunstncia.

uma exposio sobre o saber nas sociedades mais de-

senvolvidas, proposto ao Conselho das Universidades junto ao governo de Quebec, a pedido do seu presidente. Este ltimo autorizou amavelmente sua publicao na Frana, e aqui lhe agradeo.

Resta dizer que o_~pQsitQr ... Ufl1_JiJ~f, e___YIll ~ n expert. Este sabe o qu~..bee o que no sabe,aql.lel:no. Um conclui, o outro interroga; so dois jogos de linguagem. Aqui eles se encontram misturados, de modo que nenhum dos dois prevalece. O filsofo ao menos pode se consolar dizendo que a anlise formal e pragmtica de certOs discursos de legitimao, filosficos e tico-polticos, que sustenta nossa Exposio, ver a luz depois desta. Ela a ter introduzido, por um atalho um pouco sociologizante, que, embora a reduzindo, a situa. Tal como est, ns a dedicamos ao Instituto Politcnico de Filosofia da Universidade de Paris VIII (Vincennes), neste momento muito ps-moderno em que esta universidade corre o risco de desaparecer e o instituto de nascer.

o ps-moderno

o

CAMPO: O SABER NAS SOCIEDADES INFORMATIZADAS

hiptese de trabalho a de que o saber, muda de estatuto ao mesmo tempo que as sociedades entram na idade dita ps-industrialeas. lJJturas na idade dita psl moderna. Esta passagem comeou desde pelo menos o final dos anos 50, marcando para a Europa o fim de sua reconstruo. Foi mais ou menos rpida conforme os pases e, nos pases, conforme os setores de atividade: donde uma discronia geral, que no torna fcil o quadro de conjunto.2 Uma parte das descries no pode deixar de ser conjectural. E sabe-se que imprudente conceder um crdito excessivo futurologia.3 Em lugar de organizar um quadro que no poder ser completo, partiremos de uma caracterstica que determina imediatamente nosso objeto. O saber cientfico uma espcie de discurso. Ora, pode-se dizer que h quarenta anos as cincias e as tcnicas ditas de vanguarda versam sobre a linguagem: a fonologia e as teorias lingsticas,4 os problemas da comunicao e a ciberntica,5 as matemticas modernas e a informtica,6 os computadores e suas linguagens,? os problemas de traduo das linguagens e a busca de compatibilidades entre linguagensmquinas,8 os problemas de memorizao e os bancos de dados,9 a telemtica e a instalao de terminais "inteli , . gentes, "10 a para dI' ogIa: 11 eIS aI a1 oxo gumas provas eVIdentes, e a lista no exaustiva.

NaSSA

Parece que a incidncia destas informaes tecnolgicas sobre o ..aber deva ser considervel. Ele ou ser afetado em suas duas principais funes: a pesquisa e a transmisso de conhecimentos. Quanto primeira, um exemplo acessvel ao leigo dado pela"g~fl~tica, que deve seu paradigma terico ciberntica; H uma infinidade de outros exemplos. Quanto segunda, hoje em dia j se sabe como, normaJizando, miniaturizando e comercializando os aparelhos~ modificam-se as operaes de aquisio, classificao, aCesso e explorao dos conhecimentos.12 razovel pensar que a multiplicao de mquinas informacionais afeta e afetar a circulao dos conhecimentos, do mesmo modo que o desenvolvimento dos meios de cir: culao dos homens (transportes), dos sons e, em seguida, das imagens (media)13 o fez. Nesta transformao geral, a natureza do saber no permanece intacta. Ele no pode se submeter aos novos canais, e tornar-se operacional, a no ser que o conhecimento possa ser traduzido em quantidades de informao.14Pode-se' ento prever que tudo o que no saber constitudo no traduzvel ser abandonado, e que a orien tao das .novas pesquisas se subordinar condio de tradutibilidade dos resultados eventuais em linguagem de mquina. Tanto os "produtores" de saber como seus utilizadores devem e devero ter os meios de traduzir nestas linguagens o que alguns buscam inventar e outros aprender. As pesquisas versando sobre estas mquinas-intrpretes j esto adiantadas.15 Com a hegemonia da informtica, impe-se uma certa lgica e, por conseguinte, um coni junto de prescries que versam sobre os enunciados aceitos como "de saber". Pode-se ento esperar uma explosiva exteriorizao do saber em relao ao sujeito que sabe (sachant), em _ qualquer ponto que este se encoiltre no processo de conher cimento. O antigo princpio segundo o qual a aquisio do saber indissocivel da formao (Bildung) do esprito, e mesmo da pessoa, cai e cair cada vez mais em4

desuso. Esta relao entre fornecedores e usurios do CO-! nhecimento e o prprio conhecimento tende ~ tender a assumir a forma que os produtores: e os consumidores de _ mercadorias tm com estas ltimas, ou seja, a forma valor. Ql;~L~.~e~j_PE~.4~id~ ..p_a!a.~~.Lv~!l_dido, e ele ei ser consumido para ser valorizado numa .nova produo: 1 nos dois casos, para ser trocado. Ele deixa de ser para si! mesmo seu prprio fim; perde o seu "valor de uso" .16 ~ Sabe-se que o saber tornou-se nos ltimos decnios a principal fora de produo,17 que j modificou sensivelmente a composio das populaes ativas nos pases mais desenvolvidos18 e constitui o principal ponto de estrangulamento para os pases em vias de desenvolvimento. Na idade ps-industrial e ps-moderna, a cincia conservar e' sem dvida reforar ainda mais sua importncia na disputa das capacidades produtivas dos Estados-naes. Esta situao constitui mesmo uma das razes que faz pensar que o afastamento em relao aos pases em vias de desenvolvimento no cessar de alargar-se no futuro.J9 Mas este aspecto no' deve fazer esquecer outro que lhe complementar. Sob a forma de mercadoria infor- I macional indispensvel ao poderio produtivo, o saber j e ser um desafio maior, talvez o mais importante, na competio mundial pelo poder. Do mesmo modo que os Estados-naes se bateram para dominar territrios, e com isto dominar o acesso e a explorao das matrias-primas e da mo-de-obra barata, concebvel que eles se batam no futuro para dominar as informaes. Assim encontra-se aberto um novo campo para as estratgias industriais e ,comerciais e para as estratgias militares e polticas.20 Contudo, a perspectiva assim aberta.no to simples como se diz. Pois a mercantilizao do saber no poder deixar intacto o privilgio que os -Estados-naes modern0s detinham e 'detm ainda no que concerne produo e difuso dos conhecimentos. A idia de que estes dependem do "crebro" ou do "esprito" da sociedade quei

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ser suplantada medida que seja reforado o inverso, segundo o qual a sociedade no existe l' no progride a no ser que as meflsagens que nela circulem sejam ricas em informao e fceis. de decodificll~' O Estado comear a aparecer como um fator de opaCIdade e de "rudo" para uma ideologia da "transparncia" comunicacional, que se relaciona estritamente com a comercializao dos saberes. sob este ngulo que se arrisca a apresentar-se com uma nova acuidade o problema das relaes entre as instncias econmicas e as instncias estatais. J nos decnios anteriores, aquelas puderam pr em perigo a estabilidade destas graas s novas formas de circulao de capitais, s quais deu-se o nome genrico de empresas multinacionais. Estas formas implicam qu~ as decises relativas ao investimento escapam, pelo menos em parte, ao controle dos Estados-naes.ll Com ~ tecnologia informacional e telemtica, a questo corre o rISCOde tornar-se ainda mais espinhosa. Admitamos, por exemplo, que uma firma como a IEM seja autorizada a ocupar uma faixa do campo orbital da Terra para implantar satlites de comunicao e/ou de banco de dados. Quem ter acesso a isto? Quem definir os canais ou os dados proibidos? O Estado? Ou ele ser um usurio como os outros? Novamente, surgem problemas de direito, e atravs deles a questo: querp saber? A transformao da natureza do saber pode assim ter sobre os poderes pblicos estabelecidos um efeito de retorno tal que os obrigue a reconsiderar suas relaes de direito e de fato com as grandes empresas e mais genericamente com a sociedade civil. A reabertura do mercado mundial, a retomada de uma competio econmica ativa, o desaparecimento da hegemonia exclusiva do capitalismo americano, o declnio da alternativa socialista, a abertura provvel do mercado chins s trocas, e muitos outros fatores, vm preparar os Estados, neste final dos anos 70,(: () I'~slIdo :

p"incpio

para uma reVIsao serIa do papel que se habituaram a desempenhar desde os anos 30, que era de proteo e guia, e at de planificao dos investimentos.22 Neste contexto, as novas tecnologias, pelo fato de tornarem os dados teis s decises (portanto, os meios de controle) ainda mais instveis e sujeitas pirataria, no podem seno exigir urgncia deste reexam~. Em vez de serem difundidos em virtude do seu valo.r "formativo" ou de sua importncia poltica (administrativa, diplomtica, militar), pode-se imaginar que os conhecimentos sejam postos em circulao segundo as mesmas redes da moeda, e que a clivagem pertinente a seu respei to deixa de ser saber/ignorncia para se tornar como no caso da moeda, "conhecimentos de pagamento/conhecimentos de investimento", ou seja: conhecimentos trocados no quadro da manuteno da vida cotidiana (reconstituio da fora de trabalho, "sobrevivncia") versus crditos de conhecimentos com vistas a otimizar as performances de um programa. Neste caso, tratar-se-ia tanto da transparncia como do liberalismo. Este no impede que nos fluxos de dinheiro uns sirvam para decidir, enquanto outros no sejam bons seno para pagar. Imaginam-se paralelamente fluxos de conhecimentos passando pelos mesmos canais e de mesma natureza, mas dos quais alguns sero reservados aos "decisores", enquanto outros serviro para pagar a dvida perptua de cada um relativa ao vnculo social.

1.

A. Touraine. La Socit postindustrie/le, Denoel, 1969; D. Bell, The Coming of Post-Industria/ Society, New York, 1973; Iha~ Hassan. The Dismemberment of Orpheus: Toward a Postmodern Llterature, New York, Oxford U. P.,.1971; M. Benamou & Ch. Caramello ed., Performance in Postmodern Cu/ture, Wisconsin. Center for XXth Century Studies & Coda Press. 1977; M. K01er. "Postrriodernismus: einbegriffgeschichtlicher Ueberblick". Amerikastudien 22,1 (1977). Uma expresso literria doravante clssica dada por M. Butor, Mobile. Etude pour une' reprsentation des Etats-Unis, Gallimard, 1962.

2.

6

7

lif Fowlcs ed., Handbook of Futures Research, Westport, Conn .. Grecnwood Press, 1978. N. S; Troubetzkoy, Grundzge der Phonologie, Praga, T.C.L.P .. VII. 1939; t.f. Cantineau, Principes de phonologie, Paris, Klincksiel.k, 1949. N. Wiener, CYberneti~s and Society. The Human Use of Human Bengs, Boston, Hougton Mifflin, 1949; t.f. Cyberntique et Socit, Dwx ~ives, 1949, 10/1.8, 1960. W. R. Ashby, An Introduction to Cybernetlcs, Londres, Chapman and Hal1, 1956. Ver a obra de Johannes von Neumann (1903-1957). S. Bellert, "La formalisation des systemes cyberntiques", in Le concept d'information dansla science contemporaine, Minuit, 1965. G. Mounin, Les problemes thoriques de Ia traduction, Gallimard, 1963. Data-se de 1965 a revoluo dos computadores com a nova gerao dos computadores 360 IBM: R. Moch,. "Le tournant informatique", Documents contributifs, annexe IV, L'informatisation de Ia socit, La Documentation franaise, 1978. R. M. Ashby, "La seconde gnration de Ia micro-letronique", La Recherce 2 (juin 1970), 127 sq. C. L. Gaudfernan & A. Talb, "Glossaire", in P. Nora & A. Mine. L'informatisation de Ia socit, La Documentatin franaise, 1978. R. Beca, "Les banques de donnes", Nouvelle informatique et noul'elle croissence, annexe 1, L'informatisation ... , loc. cito L. Joyeux, "Les applications avances de l'informatique", Doculllcnts contributifs, loc. cito Os terminais domsticos (Integrated Vidco Terminais) sero comercializados antes de 1984 por aproximadamente 1.400 dlares, segundo um informe do Internatiortal Resource Development, The Home Terminal, Conn., I.R.D. Press, 1979. P. Watzlawick. J. Helmick-Beavin, D. lackson, Praglllatics of HUlIlan Cummunication. A Study of Interactional Patterns. Pathologies, and Paradoxes, N.Y., Northorn, 1967; t.f. I. Mosche, Une logique de Ia communication, Seuil, 1972. I. M. Treille, do Grupo de anlise e de prospectiva dos sistemas econmicos e tecnolgicos (G.A.P.S.E.T.), declara: "No se fala o bastante das novas possibilidades de disseminao da memria, em par~ ticular graas aos semicondutores e aos lasers ( ... ). Cada um podera em breve estocar a baixo preo a informao onde ele quiser, e dispor alm disso de capacidades de tratamento autnomas" (La selllaine media 16. 15 fvrier 1979). Segundo uma enquete da National Scientific Foundation, mais de um em dois alunos de high schuul utiliza correntemente os servios de um computador; os estabelecimentos escolares possuiro os seus desde o incio dos anos 1980 (La selllaine media 13,25 janvier 1979). L. Brunel. Des machines et des hommes, Montreal. Ouebec Seience. 1978. J. L. Missika & D. Wolton, Les rseaux pensants, Librairie tecnique et doe., 1978. O uso da videoconferncia entre Ouebec e Paris est em vias de se tornar um hbito: em novembro e dezembro de 1978 realizou-se o quarto ciclo de videoeonferncias en direct (pelo satlite Symphonie) entre Ouebec e Montreal. de um lado, e Pa.ris (Universit Paris Nord e Centre Beaubourg) de outro (La selllwne media 5, 30 novembre 1978). Outro exemplo. o jornalismo e1etrnieo.

Os trs grandes canais americanos A.B.C., N.B.C. e C.B.S. de tal modo multiplicaram seus estdios de produo atravs do mundo, que quase todos os eventos que ocorrem podem agora ser tratados eletronicamente e transmitidos aos Estados Unidos por satlite. Apenas os escritrios de Moscou continuam a trabalhar com filmes, que eles expedem de Frankfurt para difuso por satlite. Londres tornou-se o grande packing point (La semaine media 20, 15 mars 1979). A unidade de informao o bit. Para suas definies, ver Gaudfernan & Talb, "Glossaire", loc. cito Discusso em R. Thom, "Un prote de Ia smantique: l'information" (1973), in Modeles mathmatiques dela morphogenese, 10/18, 1974. A transmisso das mensagens em cdigo digital permite notadamente eliminar as ambivalncias: ver Watzlawick et ai. op. cit., 98. As firmas Craig e Lexicon anunciam a colocao no mercado de tradutores de bolso: quatro mdulos em lnguas diferentes aceitos simultaneamente, cada um com 1.500 palavras e memria. A Weidner Communication Systems Inc. produz um Multilingual Word Processing que permite ampliar a capacidade de um tradutor mdio de 600 para 2.400 palavras por hora. Possui uma trplice memria: dicionrio bilnge, dicionrio de sinnimos, ndice gramatical (La semaine media, 6, 6 dcembre 197.8, 5).

J.

Habermas, Erkenntnis und Interesse, Frankfurt, 1968; t.f. Brohm & Clmenon, Connaissance et intrt, Gallimard, 1976.

"A base (Grundpfeiler) da produo e da riqueza ( ... ) torna-se a inteligncia e a dominao da natureza na existncia do homem enquanto corpo social", de modo que "o saber social geral, o knowledge, tornou-se fora de produo imediata", escreve Marx nos Grundrisse der Kritik der politischen Oekonomie (1857-1858), Berlin, Dietz Verlag, 1953, 594; t.f. Dangeville, Fondements de l'conomie politique, Anthropos, 1968, I, 223. Todavia, Marx concede que no "na forma do saber, mas como rgo imediato da prxis social", que o conhecimento torna-se fora, isto , como mquinas: estas so "rgos do crebro humano forjados pela mo do homem, da fora de saber objetivada". Ver P. Mattick, Marx and Keynes, The Limits of the Mixed Economy, Boston, Sargent, 1969; t.f. Bricianier, Marx et Keynes, Les limites de l'conomie mixte, Gallimard, 1972. Discusso em J. F. Lyotard, "La place de l'alination dans le retournement marxiste" (1969), in Drive partir de Marx et Freud, 10/18, 1973. A composio da categoria de trabalhadores (labor force) nos Estados Unidos modificou-se, em vinte anos (1950-1971), como se segue: 1950, 'I

1971 51.4% 14,2% 34I

Trabalhadores de fbricas, servios ou agrcolas Profissionais Empregados (Statstica! Abstracts, 1971)

de 62,5% 7.5% 30

liberais e tcnicos

i

I

9

1'1

1':111 I'az.lo da dUl'ao do tempo dB "fabricao" de um tcnico superior ou de um cientista mdio relativamente ao tempo de extraco de matrias-primas e de transferncia de capital moeda. Ao final dos allos 60, Mattick avaliava a taxa de investimento lquido nos pases subdesenvolvidos entre 3 e 5% do P.N.B., nos pases desenvolvidos entre 10 e 15% (op. cit., t.f. 287).

20.

Nora & Mine, L'informatisation de Ia socit, loc. cit., notadamente a primeira parte: "Les dfis", Y. Stourdz, "Les tats-Unis et Ia guerre des communications", Le Monde, 13-15 d"cembre 1978. Valor de mercado mundial dos instrumentos de telecomunicao em 1979: 30 bilhes de dlares; estima-se que em dez anos ela atingir 68 bilhes (La semaine media, 19, 8 mars 1979, 9). F. de Combret, "Le redploiement industriel", Le Monde, avril 1978; H. Lepage, Demain le capitalisme, Paris, 1978; Alain Cotta, La France et l'impratif mondial, P.U.F., 1978. Trata-se de "enfraquecer a administrao", de chegar ao "Estado mnimo". o declnio do Welfare State, concomitantemente "crise" que se iniciou em 1974.

21.

22.

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I

~l'!1

ESTA ento a hiptese de trabalho que determina o campo no q"!lalpretendemos apresentar a questo do estatuto do saber. Este cenrio, similar ao de "informatizao da sociedade", ainda que proposto de maneira totalmente diversa, no tem a pretenso de ser original, nem mesmo de ser verdadeiro. O que se reivindica a uma hiptese de trabalho uma grande capacidade discriminante. O cenrio da informatizao das sociedades mais desenvolvidas permite iluminar, com o risco mesmo de exager-Ios excessivamente, certos aspectos da formao do saber e dos seus efeitos sobre o poder pblico e as instituies civis, efeitos que permaneceriam pouco perceptveis noutras perspectivas. No se deve pois dar-lhe um valor de previso em relao realidade, mas estratgico em relao questo apresentada. Contudo, grande sua credibilidade, e neste sentido a escolha desta hiptese ho arbitrria. Sua descrio j foi ampla~ente elaborada pelos expertsB e j guia certas decises das administraes pblicas e das empresas mais diretamente afins, como as que gerenciam as telecomunicaes. Portanto, pertence, j, em parte, categoria das realidades observveis. Enfim, excluindo-se o caso de uma estagnao ou de uma recesso geral devida, por exemplo, a uma ausncia persistente de soluo relativa ao problema mundial da energia, este cenrio tem boas chances de prevalecer: pois no se v que outra orientao as teno1t

BiBLIOTECA

CENTRAL

UfES

logias contemporneas poderiam tomar que fosse uma altcmativa informatizao da socied~de. Isto significa que a hiptese banal. Mas ela o somente na medida em que no coloca em causa o paradigma geral do progresso das cincias e das tcnicas, ao qual parecem evidentemente orresponder o crescimento econmico e o desenvolvimento do. poder sociopoltico. Admite se como ponto pacfico que saber cit;ntfico e tcnico se acumula I' discute-se quando muito forma desta acumulao, que alguns imaginam regular., contnua e unnime, e outros como sendo peridica, descontnua e conflitual.24 Estas evidncias so falaciosas. Para comear,