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Magna Daniela Coelho Azevedo Março de 2010 Mobilidade social, identidade e valores: o regresso de emigrantes no Minho Universidade do Minho Instituto de Ciências Sociais

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Magna Daniela Coelho Azevedo

Março de 2010

Mobilidade social, identidade e valores: o regresso de emigrantes no Minho

Universidade do MinhoInstituto de Ciências Sociais

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Mestrado em SociologiaÁrea de Especialização em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial

Trabalho efectuado sob a orientação da Professora Doutora Rita Ribeiro

Março de 2010

Universidade do MinhoInstituto de Ciências Sociais

Magna Daniela Coelho Azevedo

Mobilidade social, identidade e valores: o regresso de emigrantes no Minho

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial ii

Agradecimentos

Uma dissertação de Mestrado é sempre trabalho que demora entrega pessoal e que

obriga a silêncios e distanciamento dos outros. Mas ao mesmo tempo, no seu avançar

socorre-se de algumas ajudas que vão surgindo ao longo do caminhar. Portanto, por tudo

isto, queria agradecer aos que de uma maneira ou de outra me ajudaram a dar corpo a este

trabalho.

À Professora Doutora Rita Ribeiro, que aceitou de imediato ser minha orientadora e a

minha proposta de pesquisa, mesmo não sendo a sua área de investigação. Por toda a

disponibilidade e observações e conselhos ao longo da orientação dada, nem os seus

inúmeros afazeres esmoreceram o seu empenho como orientadora e sempre alentou os

meus passos no decorrer do trajecto. Fica a amizade!

Foi importante o contributo da Responsável pelo Gabinete de Apoio ao Emigrante de

Amares, que sempre se mostrou disponível para ceder qualquer informação, assim como, o

espaço para a realização de algumas entrevistas.

Aos emigrantes que se disponibilizaram desde o primeiro momento a serem

entrevistados.

Aos amigos que estiveram presentes ao longo do tempo, dando a sua palavra de

conforto e encorajamento e que me ajudaram, em certos casos, a encontrar emigrantes.

À Cândida, pela disponibilidade imediata e atenção para comigo.

À Ana e ao Zé António, pelas leituras atentas de revisão e, acima de tudo pela amizade.

À minha avó, pelo seu olhar atento, pelo seu sorriso meigo e palavras de ânimo no

momento certo.

Aos meus pais, pela sua presença amiga e todo o amor incondicional na orientação do

caminho que sempre julgaram como melhor para mim.

Ao meu irmão Saúl, meu parceiro nas brincadeiras, e nos momentos de mais seriedade.

Afeição que nos unirá ao longo das nossas vidas.

E não posso esquecer alguém muito especial, o Pedro, companheiro da minha vida, por

em todos os momentos me dar toda a sua atenção e ajuda. E, me envolver por afectos

essenciais para um caminhar audaz. Para ti, o meu reconhecimento!

A todos aqui referidos quero saudar com duas palavrinhas já gastas pelo tempo, mas

sempre actuais: Muito Obrigado! E, na esperança de um dia lhes expressar

convenientemente a extensão do meu reconhecimento.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial iii

Mobilidade Social, Identidade e Valores: o regresso de emigrantes no Minho.

Resumo

O trabalho aqui apresentado integra-se no Curso de Mestrado Interuniversitário e

Internacional em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial, do Departamento de

Sociologia do Instituto de Ciências Sociais e da Secção de Ciência Política e Relações

Internacionais da Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho. Esta

investigação vem no seguimento de um percurso iniciado com a minha participação, por

razões laborais, no Gabinete de Apoio ao Emigrante de Amares.

A dissertação que se apresenta constituiu uma abordagem à questão da emigração

portuguesa, desde os anos 60 do século XX, para a Europa, procurando compreender de

que forma a experiência migratória influencia as representações da mobilidade social, a

identidade e os valores dos emigrantes no momento em que regressam à sua terra de

origem, neste caso, o Minho.

A tese está organizada em duas partes distribuídas por três capítulos.

Na primeira parte deste trabalho esboçam-se enfoques teóricos, através de uma

revisão bibliográfica, de forma a construir um quadro conceptual em torno do objecto de

estudo, centrado na temática da emigração.

Na segunda parte integram-se os desenvolvimentos metodológicos e empíricos, em

que o estudo assumiu a sua centralidade.

No primeiro capítulo, são discutidos conceitos fundamentais como uma abordagem

histórica, económica e política acerca da emigração para a Europa, após os anos 60 do

século XX: mobilidade social; identidade cultural e identidade individual; valores;

família e emigração no Minho; comunidades portuguesas; nova língua, nova cultura,

novos desafios de cidadania e, o regresso dos emigrantes (no Minho). O segundo capítulo

consiste na explanação das coordenadas metodológicas a que se recorreu para a

materialização do estudo e a justificação da sua escolha. Finalmente o terceiro capítulo é

dedicado às perspectivas dos actores, partindo de uma análise da dialógica entre a

abordagem teórica e o contexto empírico do estudo.

Termino o trabalho com a apresentação das principais conclusões, em articulação

com os enfoques teóricos e empíricos, de maneira a sistematizar os padrões que emergem

dos discursos produzidos pelos entrevistados.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial iv

Social Mobility, Identity and Values: the return of emigrants in Minho.

Abstract

This thesis integrates the inter-universities and international Master course in

Communitarian Policies and Territorial Cooperation of the Sociology Department of the

Institute for Social Sciences and the Department of Political Science and International

Relations of the Economy and Management Faculty of the University of Minho. This

research was developed within my cooperation with the Emigration Office in Amares.

The thesis consisted of an approach to Portuguese emigration to Europe since the

1950‟s. It aims to understand up to which extent the emigrational experience influences

the representations of social mobility, identity and values of emigrants at the moment

they arrive in their homeland, in this case Minho.

The thesis is organized in two parts and divided into three chapters.

In the first part, theoretical perspectives of analysis are sketched through

bibliographic revision, in order to build a conceptual framework around the object of the

study, which is centred in emigration. The second part integrates the methodological and

empirical procedures around which the research was carried out.

The first chapter discusses fundamental concepts as an historical, economical and

political approach of emigration to Europe after de 1960‟s: social mobility, cultural

identity and individual identity; values; family and emigration in Minho; Portuguese

communities; new language, new culture, new citizenship challenges and the return of

emigrants (in Minho).

The second chapter explains the methodology which was used in the study and the

purpose of its choice. The third chapter focuses on the perspectives of the actors and is

based on a dialogical analysis of the theoretical framework as well as the empirical

context of the research.

Finally, the study presents its main conclusions, articulating the theoretical and

empirical focal points, in order to systematize the patterns that emerge from the

discourses of the interviewees.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial v

INDICE

Agradecimentos ............................................................................................................................... ii

Resumo ............................................................................................................................................ iii

Abstract ........................................................................................................................................... iv

Introdução ........................................................................................................................................ 1

PRIMEIRA PARTE

ENFOQUES TEÓRICOS

Capítulo I - Enquadramento Teórico Conceptual

1.Abordagem Histórica, Económica e Política: Emigração portuguesa para a Europa, após os

anos 60 do século XX .................................................................................................................. 6

2-Mobilidade Social e mudança de mentalidades ...................................................................... 11

3 - Família e Emigração no Minho ............................................................................................. 13

4-Núcleos migratórios vs Redes Sociais – As Comunidades Portuguesas ................................. 14

5- Nova língua, nova cultura, novos desafios de cidadania ....................................................... 18

6 -O Regresso dos emigrantes (no Minho) ................................................................................. 20

7-Identidade Cultural vs Identidade individual .......................................................................... 25

8-Valores e transformação social ............................................................................................... 30

SEGUNDA PARTE

ENFOQUES TEÓRICOS - ANÁLISE DE RESULTADOS

Capítulo II - Orientações e opções metodológicas

1 - Pertinência da escolha do estudo .......................................................................................... 36

2 – Opções metodológicas.......................................................................................................... 37

3 – Construção do dispositivo metodológico ................................................................................. 39

Pesquisa e análise documental; ................................................................................................. 40

Entrevistas aprofundadas; ......................................................................................................... 40

3.1 – Pesquisa e análise documental ...................................................................................... 40

3.2 – Entrevistas aprofundadas ............................................................................................... 41

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial vi

3.3 – Observação .................................................................................................................... 42

3.4 – Notas de campo ............................................................................................................. 43

4 – Balanço metodológico .......................................................................................................... 43

5- Caracterização da amostra ..................................................................................................... 44

5.1.- Género e localidades dos entrevistados ......................................................................... 45

5.2- Idade vs habilitações literárias dos emigrantes ............................................................... 45

5.3- Habilitações literárias dos filhos ..................................................................................... 46

5.4- Habilitações literárias e profissão dos pais ..................................................................... 47

5.5 – Data de emigração e regresso – Tempo total de emigração .......................................... 48

Capítulo III - Perspectivas dos actores acerca dos temas em estudo .............................................. 50

1 – Análise de conteúdos e discursos ......................................................................................... 51

1.1 - Percepções sobre mobilidade social ............................................................................... 51

1.2 - Valores e mudança cultural ............................................................................................ 57

1.3 - Os dilemas identitários ................................................................................................... 64

Conclusão ....................................................................................................................................... 67

Bibliografia .................................................................................................................................... 71

ANEXOS ....................................................................................................................................... 75

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial vii

ÍNDICE DE QUADROS

Quadro 1: Síntese quanto ao género e localidades dos entrevistados ............................. 45

Quadro 2: Síntese quanto à idade e habilitações literárias dos emigrantes ..................... 45

Quadro 3: Síntese quanto às habilitações literárias dos filhos ........................................ 46

Quadro 4: Síntese quanto às habilitações literárias e profissão dos pais dos emigrantes ...

………………………………………………………………………………………….47

Quadro 5: Síntese quanto ao país e tempo total de emigração ........................................ 48

Quadro 6 – Sistematização de toda a informação ........................................................... 50

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial viii

Tudo o que nós temos, damos e recebemos em troca dos outros e do Mundo, é que

nos assemelha e nos diferencia!

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 1

Introdução

“Nenhuma pessoa é estrangeira

numa sociedade que vive os

Direitos Humanos”

(Leandro, 1998: 48)

Este trabalho é o culminar do Mestrado Interuniversitário e Internacional em

Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial, do Departamento de Sociologia do

Instituto de Ciências Sociais e da Secção de Ciência Política e Relações Internacionais da

Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho.

O objectivo principal deste estudo é analisar e interpretar a emigração portuguesa

para países da Europa após os anos 1960 do século XX, visando compreender de que

forma a mobilidade social, a identidade e os valores se (re) estruturam e conciliam

aquando do regresso dos emigrantes ao país de origem, neste caso Portugal, mais

especificamente ao Minho, tendo em consideração os discursos de emigrantes que

regressaram e foram entrevistados. Dada a complexidade do tema, este estudo pretende

apenas abordar exploratoriamente uma realidade que tem de ser contextualizada, através

de uma investigação sistemática realizada com recurso a uma amostra de emigrantes que

foram entrevistados, não se podendo generalizar os resultados para outras realidades.

A questão de pesquisa, é averiguar de que modo a experiência migratória influencia

a percepção da mobilidade social, as identidades e os valores dos emigrantes quando

regressam ao país de origem, nomeadamente ao Minho.

A minha questão de pesquisa, insere-se nas Unidades Curriculares de

Multiculturalidade e Políticas Europeias e Políticas de Cidadania e Migrações na

Europa, do mestrado acima citado. Isto deve-se ao facto que os temas fundamentais da

questão serem a emigração para países da Europa, a mobilidade social, a identidade e os

valores, temas que debatemos ao longo das aulas.

O título da tese é: -Mobilidade Social, Identidade e Valores: o regresso de

emigrantes no Minho, que se enquadra nos conteúdos das unidades curriculares acima

descritas.

Proponho-me de imediato explanar o enredo que subentende esta tese.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 2

Apesar de alguns ímpetos pessoais deste trabalho de investigação, na realidade não

tenho pretensões que se façam aqui outras considerações sem ser de ordem científica.

O que me levou ao estudo desta temática é fruto da minha participação em termos

laborais no GAE (Gabinete de Apoio ao Emigrante) de Amares, há alguns anos atrás.

Além disso, advém do interesse pessoal por um fenómeno estrutural da sociedade

portuguesa. Trata-se simultaneamente de um fenómeno actual e histórico da sociedade

portuguesa. A emigração pode ser considerada um fenómeno social total, na medida em

que é um facto “daqueles que são afectados por todo o tecido social em que se integram

e que, por outro lado, envolve factores condicionantes de múltipla natureza:

demográfica, económica, social, política ou cultural” (Trindade, 1995: 22). Já Godinho

assinalou este facto, ao qual se refere como uma constante estrutural da sociedade

portuguesa dizendo que é um “fenómeno de carácter colectivo tão acentuado, ocorrido

durante vários séculos”, “é a miséria vício enraizado da economia social que sempre fez

emigrar os portugueses” (1978: 24).

Podemos dizer que há vários mitos e realidades acerca da emigração portuguesa e

“ao discutirmos a emigração revelamos aquilo que somos e a forma como interpretamos

a economia, a sociedade, e o mundo em que vivemos” (Leite, 2009: 16).

Há vários autores que dizem que Portugal é um país de emigrantes, devido à secular

saída de pessoas para outros países, nomeadamente, e de interesse para este estudo,

europeus, no sentido de refazer as suas vidas, quer seja por uma estadia temporária ou de

longa duração, realidade que não deixou de se verificar com a nossa entrada na União

Europeia na década de 80.

A Europa tentou travar as guerras, e implícitas a estas as lacerações sangrentas, e

ambicionou a paz e a prosperidade, levando a uma união dos estados e, a uma maior

circulação de bens e pessoas. Com isto, ficaram também facilitados os fluxos migratórios.

É reconhecido o impacto que a emigração para a Europa teve em Portugal após os

anos 1960, definindo um ciclo de forte intensidade, ainda que com flutuações.

Em 1962, a França surge como o principal país europeu para onde os portugueses

emigram, com números elevadíssimos. Entre 1985 e 1990 surgiu a Suíça como pólo

primordial de emigração em detrimento da França. O caso alemão também é de referir,

sendo que se constatou uma descida dos números de emigração entre 1981 e 1991.

Os temas que subjazem este estudo e que se relacionam com a emigração são a

mobilidade social, a identidade cultural e a identidade individual, assim como os valores.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 3

A mobilidade social pressupõe a mudança de indivíduos de uma classe social para

outra, quer seja superior, quando é ascendente, quer seja inferior, quando é descendente.

O facto de os portugueses emigrarem e adquirirem condições de vida favoráveis e bens

materiais, ou seja, melhor qualidade de vida levou a que os emigrantes conseguissem, na

maioria das vezes, uma mobilidade social ascendente. Outro aspecto a ter em atenção é o

investimento escolar nos filhos dos emigrantes, associado, também, à mobilidade social

ascendente.

Vários estudos vêm demonstrando que os emigrantes conseguiram conquistar um

espaço nas sociedades de acolhimento, no que concerne à sua identidade, embora não

raras vezes se sintam dos dois países. São, portanto, identidades adaptáveis, que deixam

passar algumas características de uma cultura para a outra. Daí, poder-se falar em dupla

pertença no que aos migrantes diz respeito. Estão aqui implícitas muitas ambiguidades

resultantes da relação do emigrante com a sua terra de origem e com a sociedade de

acolhimento onde se inseriu. O indivíduo e a sociedade entrelaçam-se, não são realidades

distintas.

Como sabemos, os emigrantes vivem entre duas culturas, e daí resultam

configurações compósitas ao nível das representações sociais e dos valores, que vão

influenciar na construção da sua identidade individual e cultural.

Após o regresso o emigrante nota que o país que deixou há alguns anos atrás não é

já o mesmo, ocorreram mudanças a vários níveis. Mesmo os portugueses emigrados nos

países da União Europeia, onde têm direito a uma cidadania europeia notam diferenças

entre os países. O retorno efectua-se, na maior parte das vezes, quando o projecto

emigratório atingiu o seu objectivo principal, e é uma forma de os indivíduos se sentirem

pertencentes a uma terra. Contudo, a reinserção dos emigrantes processa-se, em alguns

casos, de forma diferente à que eles julgavam antes do seu regresso.

A dissertação que apresento está organizada em duas partes que se distribuem por

três capítulos.

Na primeira parte deste trabalho esboçam-se enfoques teóricos, através de uma

revisão bibliográfica, de forma a construir um quadro conceptual. Esta parte procura

constituir uma plataforma de análise para construção do objecto de estudo.

É nesta parte que se enquadra o primeiro capítulo, onde se desenvolvem conceitos

fundamentais como os de uma abordagem histórica, económica e política acerca da

emigração para a Europa, após os anos 60 do século XX; mobilidade social; identidade

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 4

cultural e identidade individual; valores; família e emigração no Minho; comunidades

portuguesas; língua, cultura, novos desafios de cidadania e o regresso dos emigrantes (ao

Minho), procurando sustentar teoricamente a discussão que envolve a emigração

portuguesa para a Europa.

Na segunda parte integram-se os enfoques metodológicos e empíricos, que

constituem a centralidade deste estudo. Inicia-se com o segundo capítulo, onde se faz

uma apresentação do contexto do estudo, se explicam as opções metodológicas e se faz

uma construção do dispositivo metodológico, em que se valorizam a pesquisa

bibliográfica e a análise documental, a entrevista semi-estruturada, a observação e as

notas de campo. Após um balanço metodológico, com a explanação das coordenadas

metodológicas a que se recorreu para a materialização do estudo e que possibilitou

interpretar a relação entre os actores sociais e o contexto de acção, procede-se à

caracterização da amostra dos entrevistados.

Finalmente o terceiro capítulo é dedicado às perspectivas dos actores, perante a

análise da dialéctica entre o pensamento teórico e a abordagem empírica do contexto de

estudo. Aqui, diferentes tensões e constrangimentos se confrontam e tornam necessária a

clarificação dos seus impactos.

O trabalho termina com as conclusões fundamentadas, que se podem retirar do

trabalho em geral mas, mais especificamente, das entrevistas realizadas em articulação

com os enfoques teóricos e empíricos, de maneira a sistematizar as diferentes

perspectivas dos entrevistados. Tenta-se apresentar uma sistematização de todas as

informações recolhidas pelas entrevistas, de forma a perceber as principais

recomendações face aos pontos críticos.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 5

PRIMEIRA PARTE

ENFOQUES TEÓRICOS

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 6

Capítulo I - Enquadramento Teórico Conceptual

1.Abordagem Histórica, Económica e Política: Emigração portuguesa para a

Europa, após os anos 60 do século XX

Faz parte do conhecimento comum que Portugal é um país de emigrantes. Há neste

fenómeno “causas permanentes e causas cíclicas” (Anido, 1976: 180).

No que diz respeito às causas permanentes “são aquelas que existem quase

constantemente e que se traduzem por um verdadeiro desequilíbrio entre Portugal (país

de origem) e os outros países (países de destino), europeus ou não” (Anido, 1976: 180).

Constatamos que este desequilíbrio “que é múltiplo, pois existe em todos os aspectos da

vida do País (socioeconómico, cultura, ideológico, nível de vida, etc), cria no interior do

mesmo as condições necessárias para a aparição duma possível emigração” (Anido,

1976: 180). Estas predizem o país numa transformação em país emigratório.

Relativamente às causas cíclicas, podemos dizer que dependem das causas

permanentes. Isto porque “são capazes de agir sobre um fenómeno emigratório já

existente na realidade, ou, pelo menos, em potência” (Anido, 1976: 180). E, tanto podem

ser de ordem comportamental como de ordem económica. Tendo em conta que todos os

fenómenos económicos são cíclicos, também que “o fenómeno emigratório é em si

mesmo cíclico, o que quer dizer que as suas características internas, endógenas, lhe

imprimem, por sua vez, um comportamento cíclico patognomónico e autónomo” (Anido,

1976: 181).

No sentido de fazermos uma abordagem histórica acerca da emigração portuguesa,

não podemos esquecer que esta contempla dois movimentos em diferentes direcções – o

movimento transoceânico e o movimento intra-europeu. É importante dizer que são

movimentos com características distintas. Para a análise que nos propomos fazer o que

está no cerne do estudo é o movimento intra-europeu.

Após a Segunda Guerra Mundial a Europa começa a reconstrução do que foi

destruído pela passagem de armamento bélico. A reconstrução desencadeia um

movimento migratório e, como tal, há os países dadores de homens e os países receptores,

sendo estes últimos os industrializados. Os emigrantes portugueses dirigem-se aos países

industrializados da Europa, devido “às políticas de restrição à imigração pelo Brasil e o

sucesso do plano Marshall, que gerando um déficit de mão-de-obra obrigou…ao

recrutamento de trabalhadores estrangeiros” (Rovisco, 2001: 139). Assiste-se, portanto,

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 7

a “uma transferência de forças de trabalho dos países do Sul para o Norte da Europa

iniciado nos anos 50” (Marques, 2001: 146).

Como para o presente estudo o que está em causa é a emigração após a década de

sessenta, é sobre este período que vai incidir a nossa reflexão. É nesta época que a

emigração portuguesa sofre uma inversão quer de trajecto quer de tendência. Deixa de ser

transoceânica e passa a ser intra-europeia e com carácter de retorno por parte de quem

emigra.

É, então, nesta época que “surgem redes de engajadores, com promessas de

salários superiores e beneficiando da cumplicidade dos governos dos países receptores,

aliciam muitos portugueses para o trabalho nos sectores da construção civil, obras

públicas, serviços domésticos e agricultura, em especial na França e na Alemanha”

(Rovisco, 2001: 139).

Neste sentido, entre o ano de 1962 que surge “pela primeira vez um país Europeu

(a França) como o principal destino de emigração portuguesa, e 1973 saíram de

Portugal com destino aos outros países europeus cerca de um milhão de pessoas, a uma

média anual de 85.515 saídas” (Marques, 2001: 146). São, de facto, números

elevadíssimos de emigração portuguesa neste período. Além disso, podemos ainda dizer

que “os destinos destes emigrantes foram a França e a Alemanha, que absorveram,

respectivamente 80,9% e 16,6% dos portugueses que de forma legal ou clandestina, se

dirigiam durante este período para a Europa (cálculos com base em Baganha, 1992)”

(Marques, 2001: 146).

Com um destaque especial temos a França. A preferência dos portugueses por este

país deve-se “principalmente a três factores principais: a não exigência de qualquer tipo

de qualificação ou experiência anterior por parte dos empregadores franceses; a

aceitação pelas autoridades daquele país de entradas em situação de total

clandestinidade; a relativa facilidade de legalização de situações de estadia e de

trabalho por parte das autoridades francesas e subsequentemente, portuguesas ”

(Trindade, 1982:11). Além disso, “se juntarmos a estes factores a total abertura dum

mercado de trabalho em desenvolvimento explosivo” (Trindade, 1982:12) perceberemos

as dimensões deste movimento emigratório.

O fluxo de emigração na década de sessenta deveu-se, também, à guerra em África

e não apenas a motivações económicas, sendo entendido por muitos como um “motivo

suplementar em reforço da motivação económica” (Trindade, 1982:12). Mas, também,

podemos referir que “o crescimento económico rápido que então se verifica nos países do

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 8

Centro e Norte da Europa ocidental, especialmente na produção industrial” (Antunes,

1981: 19), causou uma forte atracção de mão-de-obra da sociedade portuguesa, daí ter

gerado um rápido e volumoso fluxo emigratório.

Não podemos deixar de referir, a crise económica ou petrolífera que surgiu nos

anos 70, que “levou a uma diminuição da procura de mão-de-obra pelos países

industrializados da Europa e à consequente implementação de políticas de imigração

restritivas”, cujo intuito era “quer diminuir a entrada de estrangeiros, quer a promover o

regresso daqueles que já residiam no interior das suas fronteiras” (Marques, 2001: 146).

Escusado será dizer que perante este quadro económico e político, como vimos

desfavorável, levou a uma diminuição da emigração portuguesa que, “entre final dos

anos 70 e meados dos anos 80, nunca deverá ter ultrapassado as 30.000 saídas anuais

(Baganha e Peixoto)” apud (Marques, 2001: 146).

Relativamente, a Portugal “as autoridades portuguesas enquadravam e

acompanhavam o processo de saída embora não assumindo o que ocorria e estavam a

aceitar” (Trindade, 2001:140). A posição do governo do Estado Novo no que concerne à

emigração foi, portanto, ambígua. No início dos anos 1960, aquando da percepção

evidente que “era impossível estancar ou limitar o fluxo de emigração clandestina para

os países europeus…nem por isso deixaram de se aplicar as... medidas restritivas à

emigração legal, o que se afigura como um claro contra-senso” (Trindade, 2001:140).

Isto porque se, por um lado havia a imposição de medidas administrativas que limitavam

a emigração, por outro coexistiam as medidas de controlo das situações de recrutamento

que se ofereciam aos que pretendiam emigrar, esta última era como que o zelar pelo bem-

estar dos cidadãos.

Aplicando a metáfora da autora Maria Beatriz Trindade, Portugal tinha “a posição

de neutralidade colaborante” (Trindade, 2001:140) no que diz respeito à emigração.

Há muitos autores que entendem que “a emigração portuguesa dos anos 1957 a

1974, que se direccionou para a Europa, em geral, e para a França, em

particular…como umas das principais causas (e consequências) da mudança social que

ocorreu nos anos 60 e 70 e como factor essencial da emergência da democracia em

Portugal” (Pereira, 2009: 471). Segundo outro autor, “a emigração foi o factor isolado

que mais terá contribuído para a democratização da sociedade portuguesa” (Telo, 1997:

161). E, ainda, a emigração “subverteu profunda e irreversivelmente os valores, as

aspirações, as atitudes e os comportamentos dos campos” (Cabral, 1987: 321).

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 9

Segundo Victor Pereira, “a mobilidade da população foi temida pela ditadura e

interpretada por uma parte dos agentes políticos e administrativos como um sinal de

descontentamento” (Pereira, 2009: 472). Ainda seguindo o pensamento do mesmo autor

“a principal resistência usada pelas classes populares portuguesas foi a emigração. Ir

trabalhar para outros países à procura de melhores salários constituía, segundo a

expressão de James Scott, uma „arma dos fracos‟” (Pereira, 2009: 478). Mediante a ideia

do autor citado, isto é o reflexo que os portugueses não se deixaram influenciar pelas

elites ditatoriais e os meios de propaganda do regime vigente, assim como “demonstrava

também o facto de os emigrantes terem – para eles e paras os filhos – ambição, vontade

de ascensão social e subversão das rígidas hierarquias sociais” (Pereira, 2009: 481).

Todavia, não deixa de ser importante dizer que para outros autores a emigração em

direcção à Europa em nada esteve relacionada com o desagrado para com o regime ou a

situação socioeconómica, mas sim com projectos individuais de angariação de bens

materiais e, consequentemente, de melhoria das suas condições de vida.

Após a revolução de Abril de 1974 houve também uma emigração de cariz político.

Quer por receio da própria segurança, quer por perda de privilégios. E, a alteração de

regime tornou-se num aclarar das ambiguidades vigentes. Isto porque “ao ser

reconhecido…o direito de partir e o de regressar, sem quaisquer restrições, tal equivalia

a assumir-se que, a partir desse momento, não mais existiria uma política de limitação à

emigração, uma vez que o fenómeno deixa de ser considerado como colectivo, sendo

remetido para o foro das livres opções individuais” (Trindade, 2001:140).

A partir de meados da década de 80 notou-se um renovamento do fenómeno

emigratório a partir do território português. O que se deve a dois factores: por um lado,

novas formas de emigração e, por outro lado, o emergir de novos destinos emigratórios.

É no final desta década que os movimentos emigratórios em abundância de mão-de-

obra de indivíduos não qualificados tendem a ser acompanhados por uma mobilidade de

indivíduos altamente qualificados, embora com carácter temporário.

A ter em conta que foi nesta década que Portugal aderiu à União Europeia, em

1986. E, isso “trouxe consigo o surgimento de novas condições de circulação para os

trabalhadores portugueses (e, acessoriamente, uma certa invisibilidade dos movimentos

emigratórios portugueses, dado que deixa de haver estatísticas oficiais desde 1988) ”

(Marques, 2001:146). O facto de Portugal aderir à União Europeia também “permitiu às

empresas portuguesas subcontratar a sua força de trabalho no espaço comunitário”

(Marques, 2001:146). Com a entrada de Portugal na União Europeia verifica-se uma

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 10

modificação da compreensão dos movimentos migratórios. Ou seja, “institucionaliza-se a

terminologia criada pela magia europeia e fala-se de cidadãos nacionais, cidadãos

comunitários e cidadãos de um Estado-terceiro ou não comunitários” (Lopes, 1997).

Esta posição implica, não só uma contestação aos movimentos migratórios, mas também

a abolição da identidade emigrante. Deixaram de ser contabilizadas as entradas e as

saídas dos emigrantes por parte do Estado.

No entanto, podemos constatar que ainda existe emigração tanto pelos dados do

Instituto Nacional de Estatística, como pela evolução da emigração portuguesa para a

Espanha e Suíça. Estes dois países surgiram, nesta altura, como novos destinos

emigratórios.

Entre 1985 e 1990 a França deixou de ser o principal pólo emigratório e passou a

ocupar o seu lugar a Suíça. Enquanto “a França acolheu 6% dos emigrantes portugueses

que se dirigiam para a Europa, a Suíça recebeu cerca de 59% desses emigrantes

(cálculos com base nos dados apresentados por Baganha e Peixoto, 1997) ” (Marques,

2001:146). Entretanto, a corrente emigratória para a Suíça entre 1993 e 1998 teve um

decréscimo “em virtude da crise económica helvética” (Marques, 2001:146). De facto,

não deixa de ser importante sublinhar que em “31 de Agosto de 1999 residiam na Suíça

135.377 portugueses portadores de uma autorização de residência anual ou permanente

e 15.958 trabalhadores sazonais” (Marques, 2001:146).

Outro facto a que não podemos deixar de dar a devida relevância são “as

características dos emigrantes que se dirigiam para a Confederação Helvética…trata-se,

sobretudo, de uma emigração de trabalho em que domina a proporção de activos jovens

do sexo masculino…que se dirige essencialmente para as profissões pouco ou nada

qualificadas do mercado de trabalho secundário, adoptando um padrão de inserção no

mercado de emprego análogo ao verificado em França” (Marques, 2001:147).

Um exemplo que é merecedor de alguma atenção, é o caso alemão, sendo que

“após uma forte redução entre 1981 e 1991, regista um intenso crescimento, apresentado

actualmente o maior quantitativo de portugueses residentes na Alemanha desde início da

emigração intra-europeia portuguesa” (Marques, 2001:147). Isto deve-se ao facto da

entrada de portugueses que permanecem na Alemanha temporariamente e das novas

facilidades de circulação de trabalhadores, aliado à queda do Muro de Berlim que marcou

o início de forte investimento público na reconstrução da Alemanha de Leste.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 11

2-Mobilidade Social e mudança de mentalidades

Explorando o termo de mobilidade social, poderemos dizer que “refere-se à

transição de indivíduos ou grupos de um estrato ou de uma classe social para outra”

(Maia, 2002: 243).

É importante referir que existem dois tipos de mobilidade social: a mobilidade

intrageracional e a mobilidade intergeracional. Enquanto a primeira diz respeito à posição

ocupada pelos indivíduos “no início e no fim das suas carreiras”, a segunda, trata de

averiguar “se os indivíduos pertencem à mesma classe social dos seus pais” (Maia, 2002:

243).

Podemos ainda indicar que a mobilidade social tanto intra como intergeracional

“pode ser ascendente, caso em que, por exemplo, determinados indivíduos ou grupos

passam de uma classe social mais baixa para uma classe social mais alta, ou

descendente, caso em que determinados indivíduos ou grupos passam de uma classe

social mais alta para uma classe social mais baixa” (Maia, 2002: 243).

A emigração é um factor que poderá possibilitar o alcance de condições de vida e

de trabalho mais favoráveis. Partilho da mesma opinião que Antunes Marinho, quando

diz que “a vontade de ultrapassar condições de vida muito limitadas e desfavoráveis,

aparecendo a emigração como a forma mais viável e rápida de atingir esse objectivo,

perante a ausência ou estreiteza de perspectivas de desenvolvimento do País que

permitisse melhorar o nível e a qualidade de vida de todos os portugueses a curto prazo”

(Antunes, 1981: 20), podendo este projecto emigratório proporcionar uma mobilidade

social ascendente.

Em pequenas comunidades das regiões rurais os emigrantes desempenham muitas

vezes papéis sociais importantes e obtêm um conjunto de características próprias de tal

forma evidentes na estrutura social que, por vezes, “se fala deles como um estrato social

ou até quase um grupo social homogéneo e estável na estrutura social” (Antunes, 1981:

20). Logo, os emigrantes propenderiam, nas pequenas comunidades rurais, a “constituir

uma camada social cuja posição se situaria no topo da escala de estratificação social, ou

em lugar próximo e em condições de disputar a primazia, conforme os casos” (Antunes,

1981: 20).

Salienta-se, portanto, que o projecto emigratório está profundamente ligado a um

processo de mobilidade social ascendente e que “ele mantém toda a sua justificação e

continuará a ser efectivado pelos emigrantes enquanto o objectivo da ascensão social for

atingível” (Antunes, 1981: 25). Por conseguinte, “na contabilidade das perdas e dos

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 12

ganhos de uma ou outra decisão e na avaliação das condições em que vivem e esperam

viver, os emigrantes concluírem que há hipóteses de atingirem os objectivos que os

levaram a emigrar, esses objectivos serão determinantes para ajustar os comportamentos

perante as diversas situações e para condicionar todo o esquema das suas relações com

as sociedades onde se fixaram e com aquelas de que são originários” (Antunes, 1981:

25). No sentido de prosseguir com o projecto emigratório, o emigrante continua a

aumentar o seu património, o que lhe dará um status social mais elevado mediante os

modelos culturais nas sociedades rurais.

Para a segunda geração das famílias de emigrantes com permanência nos locais

onde vivem, a finalidade da mobilidade social pode ter outro significado sendo que as

gerações mais jovens poderão ter outros padrões culturais de referência.

Um outro aspecto que se torna urgente desenvolver é o investimento escolar nos

filhos dos emigrantes nas sociedades de acolhimento.

Podemos dizer que a Escola teve um peso preponderante como motor do

desenvolvimento, do combate às desigualdades sociais e da ruptura da reprodução social.

Os emigrantes foram capazes de romper com múltiplas situações de desigualdade para

conseguir realizar os seus projectos de vida.

O sucesso escolar entre os filhos dos emigrantes aumentou e associado a ele está a

mobilidade social ascendente. A ostentação de um estatuto escolar e/ou profissional

parecido ao dos autóctones “constitui um trunfo importante em termos de identidade

social valorizada e não tão confinada ao estatuto de imigrante ou filho de imigrante”

(Leandro, 2007:121). Não se trata de um estatuto herdado, mas sim adquirido e

conquistado com muito esforço. Em virtude disso, as nossas comunidades de emigrantes,

conseguiram um maior reconhecimento social por parte dos países de acolhimento. Pode

mesmo dizer-se que os pais acederam a um estatuto social em efeito da ascensão dos seus

filhos.

Em jeito de resumo, relativamente a este tema, podemos concluir que a ascensão

social, vai ter consequências ao nível da mudança das mentalidades. Isto porque, “tendo

em conta a interrelação cultural, é fácil apercebemo-nos de quanto uma conjuntura

favorável – devido a fenómenos estruturais de ordem socioeconómica e outros ligados à

transformação das mentalidades -, poderá favorecer a emergência de várias inovações,

que de modos diferentes afectam os grupos de presença” (Leandro, 1987 - A: 35).

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 13

3 - Família e Emigração no Minho

É importante referir que “o emigrante é o personagem mais presente em toda a vida

portuguesa e em quase todas as famílias e terras: especialmente nas zonas rurais do

Centro e Norte de Portugal, o emigrante não só é conhecido, como ocupa um lugar

importante” (Antunes, 1981: 19).

Primeiramente temos de ter em conta que cada emigrante tem o seu projecto de

vida. Uns são mais voltados para o amealhar de dinheiro, outros o serão mais para a sua

família (como é o caso de todos os entrevistados da nossa amostra de estudo).

O local de onde partem tem, também, influência nas razões pelo qual o fazem. É

diferente se alguém sai do Minho, do Algarve ou de Trás-os-Montes: “as pessoas pensam

e sentem de maneira diversa conforme as terras onde nasceram e onde viveram; as

dificuldades ou os problemas do dia-a-dia também variam de lugar para lugar”

(Trindade, 1982:16).

Ao longo desta análise vamos incidir sobre os emigrantes do Minho, porque além

de ser a nossa zona habitacional, a emigração é um dos traços que singularizam sobretudo

o Alto Minho. No que diz respeito à emigração, “poucas regiões de Portugal e da

Europa, se assemelham ao Alto Minho” (Gonçalves, 1995: 31). Esta particularidade

deve-se a três características que se cruzam. Primeiramente, “são muito poucas as regiões

onde se emigrou tanto como no Alto Minho, nomeadamente nesta segunda metade de

século”. Segundo, porque “mais raras são as aquelas onde o movimento da emigração

foi tão precoce. Ainda as outras regiões nem sequer tinham esboçado esse movimento e

já no Alto Minho se emigrava em massa, desde há vários anos”. Em terceiro lugar, além

de as pessoas do Alto Minho, emigrarem em massa e muito precocemente “destacam-se

também pelo seu elevado apego à terra natal”. Tudo isto leva a que se sinta “uma

presença notável e sem paralelo da figura do emigrante nas sociedades do Alto Minho”

(Gonçalves, 1995: 31).

Pretendo revestir este estudo de uma dimensão humana e não tanto estatística, onde

se medem entradas e saídas de Homens e Mulheres. Isto porque, além de realidades

nacionais, considero acima de tudo, e mais profundas as realidades culturais e

individuais. Isto “porque o Homem não é somente uma realidade biológica, natural, mas

também uma realidade cultural” (Savater, 2005: 65). É através da cultura que nos

humanizamos. Cada um de nós é “herdeiro e portador de um conjunto de hábitos e de

regras de conduta que determinam a nossa maneira de ser, de pensar e de actuar à luz

dos valores comuns e aceites pelo grupo social a que pertence” (Trindade, 1982:17). E

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 14

isto pesa muito quer na saída da sociedade de origem, quer na adaptação à sociedade de

acolhimento.

O envolvimento da família no projecto de emigração vai influenciar na melhor

adaptação do emigrante à sociedade de acolhimento. Muitas vezes, até, provocando o

corte dos elos de ligação à sociedade de origem. Pelo contrário, a separação física dos

seus familiares mais próximos, leva a uma dificuldade de inserção social. Daí que se

encontram muitos estudos que exploram este tema e consideram o reagrupamento

familiar crucial para o bem-estar do emigrante.

No caso de haver reagrupamento familiar, pode ocorrer um facto relevante que é o

seguinte, “os filhos das famílias imigradas, sobretudo os jovens que tenham uma

inserção no sistema escolar e consigam estabelecer relações e criar grupos com os

outros jovens das sociedades onde vivem, podem fazer pontes entre as suas famílias e as

comunidades locais” (Antunes, 1981: 25).

4-Núcleos migratórios vs Redes Sociais – As Comunidades Portuguesas

A procura de elementos humanos portadores da mesma cultura pesam muito na

escolha do destino para onde os emigrantes se movimentam.

A decisão de emigrar depende muito das redes sociais de apoio. Estas redes de

apoio são os amigos, os familiares que por ventura já se encontram nestes países

receptores e, ainda, apoio institucional, ou seja, todo o tipo de regras que tenham sido

instituídas no país receptor no sentido de apoio aos imigrantes.

“É sobejamente conhecida a tendência para imigrar para locais onde se saiba

existirem já outros grupos familiares, amigos vizinhos ou simplesmente compatriotas,

que possam ajudar os segundos sobretudo nos primeiros contactos com o novo meio

social” (Trindade apud Leandro, 1992: 36).

O momento em que se é recebido pelo outro país é muito importante.

Nestes factores reside o sucesso ou insucesso de integração dos emigrantes nos

países de destino. Principalmente, se os países para onde vão não estão nem legalmente

nem institucionalmente bem equipados para lidar com o fenómeno.

Estas redes podem ser formais, que fazem parte dos apoios „benignos‟, onde se

enquadram as instituições, os organismos públicos ou privados com fins lucrativos ou

não. Ou, também redes informais, onde se encaixam os amigos, ou por outro lado as

redes mafiosas.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 15

Esta ideia de rede é consciente ou inconscientemente, importante para os

emigrantes aquando da escolha do país para onde decidem ir. Daí notamos grandes

comunidades de portugueses em determinados países, e mesmo localidades.

Onde existem maiores aglomerados de indivíduos oriundos do mesmo local nota-se

uma adaptação mais suave a novas línguas, hábitos e culturas.

Após a revolução de Abril de 1974 “as Comunidades Portuguesas residentes no

estrangeiro vieram tomar o lugar do Império entretanto desfeito” (Trindade, 2001: 140);

é, como que se Portugal estendesse os seus braços a todos os continentes pela presença

dos nossos emigrantes pelos variadíssimos países. Conquanto que, já antes da revolução

de 1974, o âmago das comunidades já se havia modificado. A reter, “ocorre em 1970 a

reforma da anterior Junta da Emigração (fundada em 1947 e dependendo desde então do

Ministério do Interior); transforma-se em Secretariado Nacional da Emigração, na

dependência do Conselho de Ministros e adquire novas competências de intervenção

junto das comunidades”. Por conseguinte, criam-se em 1972 “as primeiras Delegações

do Secretariado Nacional fora do país” (Trindade, 2001: 140).

A questão da emigração após 1974 começou a ser encarada como de relevo laboral.

Daí a criação de organismos e serviços a serem integrados na Secretaria de Estado da

Emigração, na dependência do Ministério do Trabalho, quer os anteriores existentes, quer

os posteriores. Este ministério “dissociava os assuntos ligados ao processo emigratório

dos que se encontravam relacionados com os emigrantes residentes no estrangeiro. O

tratamento dos primeiros cabia à Direcção-Geral da Emigração e o dos segundos, ao

Instituto da Emigração” (Trindade, 2001: 140). Depois, a mesma Secretaria passa a estar

sob tutela do Ministério dos Negócios Estrangeiros, decisão que até aos nossos dias

permanece. Esta transição acontece devido à “necessidade de actuação fora do território

nacional e da vantagem de se poder dispor da rede internacional de embaixadas e

consulados portugueses para a negociação internacional ” (Trindade, 2001: 140).

O que está aqui em causa é todo o esforço dedicado ao longo dos tempos de

estabelecer ligações entre Portugal, o país de origem dos emigrados e as comunidades de

portugueses nos países receptores. Portanto, “deve-se à Secretaria de Estado da

Emigração, bem como à sua sucessora, com a nova designação de Secretaria de Estado

da Emigração e das Comunidades Portuguesas…o reforço dos laços e das interacções

entre as comunidades e o país de origem” (Trindade, 2001: 140). Este fortalecimento de

laços nota-se através de vários encontros, seminários, cursos, festivais e concursos onde

está sempre patente a manifestação de união entre Portugal com os seus emigrantes

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dispersos pelos diversos países. Desde 1977 que o “10 de Junho passa a incluir, na

designação o nome das comunidades portuguesas (Dia de Portugal, de Camões e das

Comunidades Portuguesas) ” (Trindade, 2001: 140). No mesmo sentido, “em Novembro

de 1978 são criados os círculos eleitorais da Europa e do Resto do Mundo, com dois

deputados cada, a terem assento na Assembleia da República” (Trindade, 2001: 140). Já

em 1979 é criado “o Congresso das Comunidades Portuguesas, com delegados eleitos a

partir de associações constituídas nos países receptores” (Trindade, 2001: 140), embora

só se tivesse reunido uma vez em Lisboa no ano de 1981. Podemos dizer que com melhor

sucesso efectua-se a “criação do Conselho das Comunidades em 1980, órgão de audição

e de consulta do Governo em matérias ligadas à emigração e às comunidades radicadas

no estrangeiro” (Trindade, 2001: 140). O que permanece no presente são “as iniciativas

cujo carácter é de „visita de representação‟ em ocasiões especiais, de organização de

iniciativas culturais de alto nível e de implementação de acções de presença e

intervenção concreta em graves situações circunstanciais que ameacem a vida e a

segurança das pessoas” (Trindade, 2001: 141).

Actualmente, vivem em vários países espalhados pelo mundo inteiro um número

expressivo de portugueses que indica que temos uma Comunidade Portuguesa que

equivale em números a metade da população portuguesa, ou seja, cerca de 4 milhões e

meio.

É importante afirmar, que o emigrante “procura recriar à sua volta alguns

elementos do seu contexto sociocultural de origem, designadamente através do

reagrupamento familiar e de conterrâneos e vizinhos” (Antunes, 1981: 24). E, em muitos

casos, “consegue mesmo manter relações muito estreitas com a sua comunidade de

origem, fazendo que o afastamento físico não corte os laços que o ligam à sociedade e à

cultura de origem” (Antunes, 1981: 24).

Os emigrantes são sujeitos e actores da dinâmica cultural, porque articulam traços

da cultura de origem com os da sociedade de residência e os que eles próprios vão

construindo desta partilha intercultural. Daí dizer-se que “a cultura dos contextos sociais

de imigração é uma cultura mista, na medida em que ela integra traços da cultura de

origem, da cultura do contexto social de residência e da cultura internacional, que tenta

cada vez mais difundir padrões culturais uniformes através dos órgãos de comunicação

social” (Leandro, 1992: 30). Por isso, “os portugueses imigrados passaram, rapidamente,

de um contexto sociocultural mais ao menos homogéneo a um outro bastante

heterogéneo” (Leandro, 1992: 31).

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Na grande maioria dos casos, os emigrantes passam de meios rurais do seu país de

origem para meios muito urbanizados no seu país de residência, e como tal têm de

adoptar novos estilos de vida e a seguir outros modelos socioculturais, sem que no

entanto, tenham abandonado os anteriores.

Estudos realizados demonstram que os portugueses emigrados em França, mais

propriamente na região parisiense “criam…um processo de reinterpretação que consiste

em adoptar novos traços culturais nos termos da sua própria cultura” (Leandro, 1992:

31). Segundo S. Aboum (apud Leandro, 1992: 31) “trata-se de um processo de

aculturação material, isto é, ela afecta os conteúdos do grupo receptor e deixa intacta a

maneira de os viver, pensar e agir. Logo, os novos conteúdos são reinterpretados, em

função do sistema cultural de origem e dotados de significações antigas”. Desta forma,

que pode ser consciente ou inconsciente, evita-se o perigo da assimilação: “a recriação

permanente de novas configurações socioculturais contribuem para a formação de uma

nova identidade, sem que, no entanto as pessoas atingidas por este dinamismo se sintam

desaculturadas ou assimiladas” (Leandro, 1992: 43).

Grande parte destas comunidades organizam-se de forma a sobrevalorizar a Igreja e

as Associações. Inicialmente, em muitos casos, a Igreja antecipou-se às associações e,

além disso, estimulou a sua criação. Conforme o tempo passa, tendem a dissociar-se uma

da outra, e as associações obtêm um cariz mais autónomo e independente relativamente à

Igreja. Estudos realizados, em relação à região parisiense “grande maioria das

associações portuguesas têm sido para os portugueses…uma possibilidade de

reencontro, de tomada em mãos da sua própria organização cultural e afirmação social”

(Leandro, 1992: 42).

Com o decorrer do tempo o Homem tem necessidade de se organizar social e

culturalmente. Nesta perspectiva, o emigrante “não é tão somente um „homo

economicus‟, mas ele é também um „homo socius‟” (Leandro, 1992: 37). O Homem

necessita de manter uma teia de relações sociais exteriores ao seu mundo do trabalho.

Enquanto, “para uns predominava o impacto do religioso também em busca do social.

Para a associação era o sociocultural, por si mesmo, que mobilizava as suas energias e

dava força e coesão a esta acção” (Leandro, 1992: 37).

A partir da década de 1980 as acções são, sobretudo direccionadas para a camada

juvenil. Desta feita “as actividades de formação, sobretudo no que toca à socialização,

eram organizadas, particularmente, em favor dos jovens. Tal é o caso do ensino escolar

em língua portuguesa, ao nível do secundário, dos grupos folclóricos, do teatro, do

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 18

conjunto musical e de algumas festas e actividades desportivas… visavam sobretudo a

transmissão da cultura portuguesa na sua própria língua” (Leandro, 1992: 39).

Após o êxodo migratório deram-se grandes transformações na sociedade

portuguesa, tanto a nível social como cultural. Por isso, “não admira… que os mais

velhos tenham continuado a alimentar e a transmitir modelos e valores culturais

portugueses já fora da realidade concreta em Portugal” (Leandro, 1992: 40).

5- Nova língua, nova cultura, novos desafios de cidadania

Torna-se relevante dizer que uma das “qualidades características dos portugueses,

qualquer que seja o seu estatuto sócio-económico ou a sua origem regional, é a

capacidade de adaptação e, poderia dizer-se de inserção em quaisquer outros contextos

sociais e culturais” (Trindade, 1992:13). Se, por um lado, os portugueses são qualificados

como simpáticos e educados para com outras nacionalidades que encontrem no seu país,

do mesmo modo, quando se encontram noutros países procuram conhecer e respeitar as

outras culturas e, não raras vezes, adoptam hábitos, comportamentos e, até, estilos de

expressão. Têm tendência a misturar-se com a sociedade de acolhimento.

Contudo, não deixam de assumir as suas raízes culturais com o abraçar dos

costumes tradicionais, as suas crenças e as suas festas. Adoptam, portanto, a língua do

país de acolhimento, e falam-na sem complexos de errar e por isso, é que muitas vezes

surgem novos linguajares.

O mundo em que vivemos é um mundo linguístico, uma realidade feita de regras e

de símbolos pelos quais nos regemos e sem os quais não conseguiríamos comunicar entre

nós, assim como apreender os significados de tudo o que nos rodeia. A linguagem não é

uma função com a qual nascemos, não é natural e biológica, mas antes uma “criação

cultural que herdamos e aprendemos de outros homens” (Savater, 2005: 65). A língua é,

portanto, um dos elementos essenciais de uma cultura. Por isso, “a facilidade e rapidez

da sua aprendizagem criam condições propícias ao desenvolvimento da autoconfiança,

de uma boa implantação local e da sua subsequente integração do emigrante no país de

destino” (Trindade, 1982: 21).

A frequência escolar, por parte dos filhos dos emigrantes, teve um contributo

preponderante no desenvolvimento linguístico, “pois permite um verdadeiro banho na

sociedade e na cultura do país onde estão imigrados” (Trindade, 1982: 22).

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 19

Devemos ter em atenção que “o problema da língua e da cultura

distintas…reflectem a maior ou menor capacidade de integração dos migrantes” (Maia,

2002: 240).

Não devemos deixar de realçar a emergência de novas formas de cidadania, que,

por sua vez, levam à edificação de processos de integração social harmoniosos. Sendo

esta última possível se houver abertura das duas partes, tanto dos próprios emigrantes

como da sociedade onde se encontram.

É importante a “organização e gestão da „cité‟, isto é, a participação activa de

todos na vida da sociedade onde vivem” (Leandro, 2002 - A: 331), o que leva a uma

inter-actividade e comunicação entre os cidadãos “que implica autonomia,

responsabilidade, cooperação e criatividade” (Leandro, 2002 - A: 331). Nesse sentido, é

uma forma de desenvolver lugares de acção aos indivíduos que fazem parte da vida

económica, social e cultural da sociedade e “contribuem para o seu desenvolvimento,

numa atitude de reconhecimento onde até podem emergir as questões de identidade”

(Leandro, 2002 - A: 332). Então, é permissível aos cidadãos transitarem de cidadãos

passivos para cidadãos activos.

Convém fazer, aqui, um breve parêntesis para uma breve definição de cidadania.

Segundo o dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea (2001: 812), cidadania

é “condição ou qualidade de cidadão, membro de um estado, de uma nação…no pleno

gozo dos seus direitos políticos, cívicos e deveres para com esse estado ou essa nação”.

A cidadania é um conceito que se vai alterando conforme a época e os valores

subjacentes à sociedade em causa. Este é um conceito considerado por muitos autores em

mudança constante. Daí a dificuldade em encontrar-se uma definição para o termo. Na

verdade, e como podemos ver na citação seguinte “a cidadania é uma ideia tão velha

como a própria política, surge na polis grega e, neste sentido, encontramo-nos com um

modelo clássico de cidadania” (Dicionário de Filosofia Moral e Política, 18.03.2009).

Algo de importante está aqui patente: o facto de pelos caminhos da emigração

brotarem novas oportunidades quer de mudança, quer de escolhas, assim como, de

capacidade de os emigrantes reorganizarem um novo património que resulta da

experiência de vida, num contexto onde convivem várias culturas e, como tal,

pluricultural. E, também a descoberta de outras normas de comportamento e estratégias

para lidar com os problemas do quotidiano.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 20

Para os emigrantes “esta seria uma etapa da sua vida em que trabalhar, ganhar e

economizar o máximo permitiria angariar fundos para realizar as suas mais profundas

aspirações” (Leandro, 1992: 32).

6 -O Regresso dos emigrantes (no Minho)

A percepção da emigração tem subjacente uma ideia no imaginário do emigrante, o

retorno ao país de origem, em especial no que respeita aos emigrantes portugueses na

Europa. Todo o emigrante parte com a vontade de voltar um dia ao país que o viu partir.

Embora se constate que a maior parte não regressa.

Das várias “nacionalidades de cidadãos imigrados na Europa, os portugueses

registavam a mais elevada taxa de poupança remetida para o respectivo país de origem,

facto comprovativo de que a estratégia de emigração dos portugueses para a Europa foi

construída numa perspectiva de regresso” (Rato, 2001: 164).

Poderemos falar de um regresso real e de um regresso mítico ao país de origem

para o qual se quer voltar. Isto justifica-se do seguinte modo: “real porque efectivamente

o regresso se concretizou e mítico na medida em que o país que se deixou não é o mesmo

de há 30, 20, 15 ou 10 anos. Operou-se uma mudança em todos os sectores da vida

social da sociedade portuguesa. Por outro lado, também aqueles que agora regressam

não são os mesmos que eram antes da emigração” (Leandro, 1987 - A: 21).

A ideia de retorno tem um papel importante no sentido de que vai “delineando um

sentimento de ancoradoiro e de continuidade, numa comunidade, num país, numa

paisagem que domina o sentimento de estar de passagem e de ser estrangeiro em toda a

parte” (Leandro, 2002 - B: 42).

Há autores que falam na teoria política do ciclo fechado, mais adaptada aos

emigrantes na Europa e a teoria política do projecto de ida aos emigrantes transoceânicos.

Isto porque os emigrantes para países europeus teriam mais propensão a retornar à sua

terra de origem do que os emigrantes transoceânicos. As razões apontadas é que estão

mais ligados ao país de origem, visitam com mais frequência os seus familiares e amigos,

vêm mais vezes de férias. Tudo isto por causa da distância entre os locais de origem e os

de acolhimento, “com a proximidade dos países e as facilidades de deslocação nunca foi

totalmente cortado o cordão umbilical com o país de origem: para aí se mandavam as

poupanças, nele se construiu uma residência, por vezes aí ficaram os filhos para

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 21

continuar estudos” (Trindade, 1992: 10). A manutenção do contacto com as famílias e

amigos do país de origem era feito periodicamente.

Quando se consuma o regresso podemos notar também, neste caso, uma

adulteração da Língua Portuguesa, porque há termos que são adoptados da Língua do país

de acolhimento, são portanto, de origem estrangeira colados ao Português. Este é um

indicador de experiências migratórias.

Houve uma previsão por vários autores do elevado fluxo de retorno que se notaria

na década dos anos 1990. Chegando mesmo a pensar-se que metade dos portugueses que

estariam emigrados em países da Europa regressariam. Algo que não se verificou.

O facto da não ocorrência do retorno previsto associa-se à integração de Portugal na

CEE (Comunidade Económica Europeia), depois UE (União Europeia). Este factor

alterou a questão da emigração e, como consequência o plano de vida pessoal de todos os

emigrantes que estavam em países pertencentes à Europa.

Verifica-se que “num estudo recente sobre a comunidade portuguesa em França,

…o projecto de ida e volta foi substituído por um projecto de integração, com a

singularidade de o emigrante procurar afirmar a sua especificidade cultural de origem”

(Rato, 2001: 165). Além disso, notou-se que “muitos retornados se deslocam

frequentemente ao país de emigração, quer para visitar os parentes que aí ficaram ou

que para aí reemigraram, quer para aí receber cuidados de saúde” (Rato, 2001: 165). O

motor de todo este mecanismo é a facilidade de circulação de mercadorias, bens e, acima

de tudo, pessoas. Temos aqui presente uma nova estratégia de migração – circulação, que

se insere na mobilidade facilitada, e tem como pano de fundo a globalização, bem como

os direitos inerentes à cidadania europeia. Em suma, os portugueses emigrantes em países

da União Europeia beneficiam das vantagens da condição de cidadãos da União Europeia,

isto sendo independente do facto de poderem adquirir a nacionalidade do país onde

residem por naturalização.

Apenas devemos frisar que os fluxos mais significativos de emigrantes que

regressam são, em muitos casos, relativos à situação de emigrantes que vão atingindo a

idade da reforma. Ou, então, indivíduos ainda em idade activa, que apesar da alongada

estadia no estrangeiro, já conseguiram ganhos suficientes em dinheiro ou propriedades ou

têm o desejo de educar os seus filhos em território português. Estes emigrantes,

geralmente, regressam à sua terra/freguesia de origem, e, onde reside a família que se

encontra em Portugal. Uma outra razão, pela qual pode motivar o retorno é o aumento do

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 22

desemprego nos países do Centro e do Norte da Europa, assim como alguns sintomas de

intolerância xenófoba.

No entanto, a situação em que se encontram os emigrantes é algo ambígua. Isto no

que concerne à relação do emigrante com a sociedade de origem e, ao mesmo tempo, com

a sociedade em que vive. As formas encontradas por parte dos emigrantes, de modo a

atenuar esta ambiguidade, são “o retorno definitivo do emigrante a Portugal, ou a

integração plena no país onde trabalha, formalizada pela naturalização” (Antunes,

1981: 24).

Quando, realmente, se efectua o retorno, em muitos casos é porque o projecto

emigratório foi atingido, relativamente aos objectivos previstos. E, nesse caso, o

“emigrante reintegra-se na sociedade de origem na sua nova posição social, podendo

defrontar-se com alguns problemas de reintegração social e cultural, provenientes do

facto de, entretanto, ter efectuado, com êxito, um processo de mobilidade social

ascendente” (Antunes, 1981: 26). Em alguns casos, podem experimentar um sentimento

de frustração relativamente às expectativas de reintegração. Noutras situações os

emigrantes regressam por motivo de doença, acidentes, ou então quando os seus

objectivos ainda não foram atingidos, mas vêem no regresso um mal menor. Nesta

condição, o emigrante vai ocupar o mesmo lugar na escala de estratificação social. Em

muitos casos, retoma a sua profissão anterior. E, muito provavelmente, ocupa um status

social semelhante ao que tinha quando partiu.

À situação de retorno está associada uma alteração dos hábitos de consumo por

parte dos emigrantes, o estilo de vida e a própria concepção de família é modificada e,

além disso, fazem como que uma propagação das suas concepções ao meio que os

circunda.

É importante ter em consideração que o “fenómeno de reinserção social de

qualquer indivíduo ou grupo, pressupõe que os mesmos tenham vivido parte da sua vida

fora da sociedade onde eles pretendem vir de novo a reinstalar-se” (Leandro, 1987 - A:

21). No entanto, no que respeita à reinserção social dos emigrantes portugueses “esta

processa-se geralmente integrada no agrupamento familiar ao nível da família mais

restrita, embora coexistam outras formas de regresso e por conseguinte de reinserção”

(Leandro, 1987 - A: 21). Esta reinserção não é igual no caso dos pais e dos filhos. Para os

pais é realmente uma reinserção, contudo para os filhos é um processo de inserção “dado

que grande maioria destes nem sequer nasceram em Portugal” (Leandro, 1987 - A: 21).

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No que diz respeito aos pais, temos de ter em conta que se operam transformações

em dois sentidos, tanto neles próprios como indivíduos, uma vez que contactaram com

uma outra sociedade com outro desenvolvimento industrial e económico, pelo sistema de

valores aí vigentes, pelas formas de trabalho aí exercidas, o que lhes proporcionou outros

modos de vida que não se conciliam com os anteriormente vividos, dando-se neles

alterações como pessoas. E, num outro sentido, a própria sociedade portuguesa sofreu

alterações a nível social e cultural. Desta forma, “são exigidos às duas partes em

presença novos esforços de readaptação a outros valores socioculturais, sem que no

entanto, se possa pensar fazer e encontrar uma transposição de modelos de um lado para

o outro” (Leandro, 1987 - A: 22). Entre as duas culturas e sociedades tanto existem

afinidades como diferenças. Por conseguinte, “se verifiquem certas dificuldades, …e um

certo desencanto entre os projectos concebidos e a realidade vivida” (Leandro, 1987 - A:

22).

No caso dos filhos, o processo de socialização ocorreu na sociedade de residência;

chegados a Portugal vão ter de iniciar um fenómeno inverso dos pais, a aculturação, em

contacto directo com uma nova realidade. Ao longo do tempo, “a inserção tem tendência

a fazer-se mais harmoniosamente, ainda que os sistemas de valores adoptados reenviam

constantemente à sociedade onde se viveu” (Leandro, 1987 - A: 23). Prescrevem-se

“esforços de adaptação a novos modos de vida, novas mentalidades e costumes, mas

também estes em transformação” (Leandro, 1987 - A: 23). Digamos que “este processo

de reinserção reveste variadas formas, tendo cada uma o seu ritmo e modalidade e que

estas se interrelacionam com os indivíduos e grupos em presença” (Leandro, 1987 - A:

23).

Concordo com Leandro quando diz que o regresso é “também, uma outra forma de

migração. Um e outro movimento obrigam a várias passagens, deslocações, (re)

encontros, surpresas, (des) ilusões e novas perspectivas de vida” (Leandro, 2002 - B: 43).

Outro ponto a ter em atenção, é uma outra tendência, embora não se possa fazer

uma generalização. Parece que os emigrantes regressados têm uma maior participação e

envolvem-se mais em acções cívicas e, autárquicas. Poderemos dizer que esta população

poderá provocar alterações sociais e culturais no meio envolvente.

Quando partem é como se um membro do seu corpo ficasse no seu país de origem,

como que se este lhe tivesse sido amputado. Ficam com a impressão que o têm no corpo

mas não está, dizem muitos emigrantes. A estes homens e mulheres “fica-lhe a imagem, o

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 24

vazio, a falta” (Monteiro, 1994: 18). E, por isso mesmo, esta poderá ser uma das razões

pelas quais tentam reproduzir a sua cultura no país que os acolhe.

Há estudos que apontam esta ideia de retorno do emigrante e a ligação deste ao país

de origem porque os países de acolhimento o vêem pela diferença étnica. Será esta

hipótese verosímil ou será uma conveniência, dos que nunca emigraram, pensar desta

forma?

Julgo que as duas têm uma ponta de verdade. De certa forma estes emigrantes

quando pensam em voltar, ou quando colocam esta hipótese já estão suficientemente

endinheirados, salvo raras excepções já aqui focadas. E, portanto, fazem de certa forma

alguma sombra à elite local em Portugal. Têm dinheiro, podem aceder com tanta ou, às

vezes, até com mais facilidade a certos bens que esta elite. Algo que a esta classe custa a

compreender.

Por outro lado, os emigrados fazem uma junção de duas culturas, juntam duas

práticas culturais e como tal originam uma nova cultura. A sua “ … „raça própria‟,

híbrida […] e esta raça híbrida até já conta com os seus antepassados míticos distintos

dos antepassados portugueses” (Monteiro, 1994: 18).

Mas temos de ter consciência que não há identidades ou grupos puros, genuínos. A

Humanidade circulou sempre, nenhuma cultura ficou imune às vizinhas. Embora, na

actualidade, a influência seja muito mais determinante e os processos de hibridação sejam

mais intensos. A hibridação dá conta da ambivalência. O hibridismo implica dor, diálogo

convergência e aproximação.

Encontrámo-nos num mundo globalizado e, de modo geral, a globalização

caracteriza-se pelo derrubar de fronteiras. No entanto, erguem-se novas fronteiras, novas

identidades, novas pertenças. A globalização tem o efeito de diversificar, não é apenas o

efeito de homogeneizar ou normalizar.

Os emigrantes ao levarem a nossa cultura para os países de acolhimento,

protagonizaram uma forma de levar o local para o global1.

1 Tal como diz Wieviorka “No plano cultural, a globalização teria ao mesmo tempo suscitado dois fenómenos

paradoxalmente complementares: uma homogeneização, passando pela generalização do consumo e da comunicação

de massa sob a hegemonia americana, e uma fragmentação em que se crispam e reforçam particularismos identitários

de toda a espécie” (2002:59).

As diferenças sociais são consideradas quando associadas a um grupo ou comunidade, como é o caso da comunidade

portuguesa nos países de acolhimento. No entanto, tal como diz Kymlicka apud Wieviorka 2002: 89 “cada pessoa, e

prioritariamente cada criança, possa desenvolver-se num meio cultural estável que lhe permita mais tarde construir a

sua existência e fazer as suas próprias escolhas”.

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Não podemos esquecer que as nossas comunidades de emigrantes convivem com

outras comunidades. Vivemos em sociedades multiculturais em que se nota um

pluralismo cultural, e como tal estabelecem-se relações multiculturais.

7-Identidade Cultural vs Identidade individual

Na sua raiz mais essencialista a identidade é “a essência do ser, aquilo que

permanece” (Maia, 2002: 196). A identidade também pode ser “representação, porque a

identidade é uma realidade como distinta, que existe fundamentalmente pelo

reconhecimento dos outros. Vontade, porque acto de adesão pessoal permanente

reiterado a uma comunidade. Representação e vontade a identidade é deste modo uma

construção social” (Martins, 1996: 18).

Houve uma evolução do próprio termo e, hoje, podemos dizer que a identidade é “o

que assegura a continuidade do indivíduo, do grupo ou da própria sociedade, através de

um percurso existencial de permanente mudança, de ruptura, de crise, de adaptação, de

reinvenção e até de sobreposição de identidades” (Maia, 2002: 196).

As identidades culturais estão inerentes às diferenças culturais. Tendo como ponto

de partida que a cultura é a forma como os grupos produzem o sentido sobre o mundo,

como comunicam e partilham significados, o universo simbólico que serve como

referência na leitura da realidade natural e social e, que “pode ser popular” e não só como

se classificava inicialmente que “era sobretudo evocar a alta cultura, a das elites capazes

de apreciarem a literatura ou as belas artes” (Wierviorka, 2002: 199).

Não obstante os nossos emigrantes pertencerem a sociedades diferentes, no interior

dos países de acolhimento também se deparam com diferentes áreas culturais. E, muitas

vezes, os filhos de emigrantes são vítimas de preconceitos em virtude do meio a que

pertencem por parte de alguns professores. Como é o caso francês, em que os emigrantes

“por vezes têm a sensação de que a Escola nem sempre se mostra favorável ao

prosseguimento de percursos escolares mais prolongados dos seus filhos” (Leandro,

2007:114).

Isto deve-se, segundo a mesma autora, “quiçá estigmas de alguns professores”

(Leandro, 2007:114) que distinguem os alunos. Os pais têm de debater-se com este

problema, que, não raras as vezes não aceitam de ânimo leve.

Portanto, inserem-se em sociedades onde se notam as diferenças culturais. Podemos

dizer que a diferença cultural é o motor da construção de identidades sociais e étnicas.

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Como diz, Wieviorka “vivemos em sociedades de acolhimento, mas também de produção

individual e colectiva das diferenças” (2002: 229). Vivemos portanto em sociedades

multiculturais. E, estas diferenças requerem, por parte das sociedades de acolhimento,

mais democracia “de maneira a que seja assegurado caso a caso o exame político das

exigências que elas adiantam, e que são ainda mais complexas pelo facto de terem

geralmente fortes implicações sociais” (Wieviorka, 2002: 229).

Muitas vezes a integração processa-se de „forma negativa‟, isto porque se dá por

assimilação da outra cultura, o que “mesmo quando ela suscita por vezes o entusiasmo,

nunca se desenrolava sem uma certa amargura, sem um sentimento de humilhação e de

renúncia. Sem uma interrogação dolorosa sobre os perigos da assimilação. Sem uma

profunda crise de identidade” (Maalouf, 2002: 84).

O que está na base da identidade cultural “é aquilo que faz os homens

reconhecerem-se como um grupo com «origens» comuns: pela maneira de pensar, de

sentir e de agir” (Trindade, 1982:28).

Os emigrantes, embora tenham conseguido a conquista de um espaço nas

sociedades de acolhimento, relativamente à sua identidade, vários estudos revelam que se

sentem de dois países. Isto porque falam duas línguas e têm hábitos comuns a duas

culturas. Mas, refiro uma opinião de Maalouf com a qual me coaduno “a identidade não

se compartimenta, não se reparte em metades, nem em terços nem se limita em margens

fechadas. Não há várias identidades, temos de ter uma, feita de todos os elementos que a

moldaram, segundo uma «dosagem» particular que nunca é a mesma de pessoa para

pessoa” (2002:10). Temos de ter em atenção que as identidades são construções sociais e

não são algo de adquirido.

A nossa história de vida e toda a trajectória por nós percorrida, desde que

nascemos, as convicções que vamos adquirindo ao longo da nossa caminhada, a nossa

sensibilidade, as ligações e relações que estabelecemos no decorrer da nossa vida é que

vão definindo a nossa identidade como pessoa. É, com toda a certeza uma construção e

reconstrução que se opera no tempo e no espaço e, neste âmbito, “está na

interconfluência do herdado, do adquirido e do projectado” (Leandro, 2002 - A: 307).

Tudo isto fará parte integrante da trajectória existencial dos emigrantes. O que está aqui

em causa é a convergência do passado com o presente e a projecção no futuro. Ou seja,

“da posição originária que fornece os primeiros elementos identitários (identidade

herdada), da posição actual resultante da reelaboração dos elementos identitários do

passado e dos que, na nova situação, se lhes vêm juntando (identidade adquirida) e da

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posição esperada, em função das aspirações e projectos relacionados com o futuro

(identidade almejada) ” (Leandro, 2002 - A: 309). A identidade é relacional e não é

estática, ela muda, “participa…da dinâmica das próprias sociedades” (Leandro, 2002 -

A:307).

Tendo em conta Maalouf “A identidade não é algo que nos seja entregue na sua

forma inteira e definitiva, ela constrói-se e transforma-se ao longo da nossa existência”

(Maalouf, 2002:33). Podemos, então, dizer que os emigrantes têm uma identidade

„elástica‟ porque têm subjacentes interesses e aspirações de ordem económica e cultural.

São de certa forma adaptáveis e têm algo de porosidade, no sentido em que estão sujeitos

à convivência entre culturas diferentes e, como tal, há sempre algo de uma cultura que

passa para a outra. Daí que, muitas vezes, aos olhos da sociedade de origem não é

verdadeiramente português, e aos olhos da sociedade de acolhimento não é

verdadeiramente considerado cidadão daquele país. Avocando o autor atrás citado, “em

cada homem se reencontram pertenças múltiplas que por vezes se opõem entre si e o

obrigando a escolhas dolorosas” (Maalouf, 2002: 12).

Temos de ter em conta que o que nos define como indivíduos, com todas as nossas

particularidades, e nos distingue uns dos outros é precisamente o nosso local de

nascimento, a nossa residência, os lugares de convívio habituais, entre outros. Neste

sentido os emigrantes poderão sentir-se divididos entre os locais de Portugal e os locais

do país de acolhimento. Isto poderá desembocar num vazio identitário. Tal como me

diziam alguns utentes do Gabinete de Apoio ao Emigrante em forma de desabafo “Nós

não somos de lugar nenhum, quando estamos cá somos estrangeiros, quando estamos lá

somos portugueses”. Podemos dizer, neste caso, que a relação dos emigrantes com a sua

terra de origem e a sociedade onde está inserido está repleta de ambiguidades. Isto porque

“por um lado, o migrante está numa sociedade e não é dela, não se reconhece e não é

reconhecido como parte de pleno direito dela; por outro lado, pertence a uma sociedade

na qual não está efectivamente e plenamente presente e participante” (Antunes,

1981:22). Podemos, pois, falar em dupla pertença.

Alguns autores que abordem o emigrante na sociedade de origem a partir das

“linhas de clivagem (em geral «nós» / «eles», em confrontos «nós» / «vós») indícios de

discriminação (negativas) e conflitualidade com constituições efémeras ou

tendencialmente cristalizadoras do (s) exogrupo (s) «emigrantes» nomeado (s) («avecs»,

«çá vas», «vacanças», «francius», «franceses»…) e do (s) endogrupo (s) «não

emigrantes» desenhavam-se mais ou menos nitidamente, em particular, mas não só, nos

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meses de Verão correspondentes às férias dos emigrantes”(Gonçalves, 1987: 11). O

«nós» corresponde aos «não emigrantes», enquanto o «eles» designa os emigrantes. Isto

pode ser encarado de forma negativa. Sendo que, “a «di-visão» instituinte de identidades

«nós» e «eles» tão heterogéneas e vagas só pode ser levada a cabo mediante

confrontações estereotipadas e reduções sociocêntricas homogeneizantes” (Gonçalves,

1987: 11). Existe uma divisão e/ou visão do mundo social entre „Nós‟ e „Eles‟, e não

podemos esquecer que a identidade resulta da relação que mantemos com o „Outro‟,

muitas vezes por tentativas de posicionamento em relação ao „Outro‟. E isto depende não

só da forma como eu me afirmo ou quero afirmar, mas também da reacção do „Outro‟ à

minha tentativa de afirmação.

Estas duas posições ou visões podem dar origem, a “apelações, estigmatizações,

preconceitos, anedotas, burburinhos, rumores, relações proxémicas, posturas, gestos, as

posições entre o que se pode fazer «com eles» atestam demarcações e fricções, (mal)

escamoteadas pelos discursos de praxe e circunstância tendentes em manter o (ma)

logro” (Gonçalves, 1987: 11). Portanto, a par do reencontro, da partilha, da comunhão,

existem também tensões e divisões ao longo da convivência quotidiana.

Há um reconhecimento, mais a nível emocional do que social, por parte das

autoridades portuguesas “para uma dualidade de pertenças culturais, …conduziu à

aceitação do princípio da adopção de uma dupla nacionalidade, segundo o qual a

naturalização ou opção de direito por uma nacionalidade estrangeira não obriga à

renúncia à nacionalidade original (Diário da República, nº37, de 3 de Outubro de 1981,

Decreto-Lei nº 322/82, de 2 de Agosto) ” (Trindade, 1992: 13). Além de não obrigar à

renúncia da nacionalidade original também não permite a incisão nos direitos de

cidadania.

Como tal, “todos estes sintomas de dupla pertença sentimental às duas pátrias e de

adopção encontram prova em iniciativas que fazem sentir a solidariedade para lá das

fronteiras...é frequente que uma comunidade emigrada contribua pesadamente para

alguma obra de relevo em aldeia ou vila de origem” (Trindade, 1992: 14).

Esta ambiguidade provoca ou pode provocar, de certa maneira, “uma crise de

identidade cultural: saber quem, qual o seu lugar e papel, o que dá e recebe na

sociedade em que vive e na sociedade de origem” (Antunes, 1981:23). Diante das duas

sociedades o emigrante está numa situação transitória e desagradável.

Num mundo de mudança sociocultural em que estamos, os emigrantes, perante este

processo ambíguo em que se sentem, tentam aproximar-se e reforçar alguns traços

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 29

culturais e tradicionais, de modo que liguem a sua identidade cultural à sua sociedade de

origem, assim como tentam garantir os seus projectos de mobilidade social ascendente.

O que, de facto, não é fácil. Devido ao “seu contacto com outras sociedades e

culturas nos locais onde trabalham e o processo de aculturação a que ficam sujeitos….e

os processos de mudança sociocultural em curso na sociedade portuguesa, …o

emigrante vê-se envolvido numa complexa situação de crise de identidade cultural, num

permanente desgaste de confronto ou coerência entre comportamentos e valores que

herdou dos seus pais, e que vê, agora, em alteração rápida na sociedade portuguesa, e

aqueles que se lhe deparam nas sociedades onde vive” (Antunes, 1981:27). Como as

sociedades da nossa época se transformam muito rapidamente “toda a recomposição

identitária participa deste ritmo de mudança, o que, por vezes, torna as coisas deveras

complexas” (Leandro, 2002 - A: 308).

Em situação de emigração os indivíduos são constantemente e, desde sempre,

impelidos a modificações, adaptações e à aceitação de elementos quer sociais, quer

culturais, uma vez que estão em contacto com outras formas de natureza e dinâmica

social, outros sistemas de valores e, até, outras circunstâncias de emprego.

Um aspecto a ter em conta é que “a identidade individual assenta no pensamento e

na maneira de ser da identidade colectiva” (Tomé & Carreira, 2009: 1) e, neste sentido

“o enraizamento identitário numa comunidade…é o reflexo da mentalidade, dos vícios e

das virtudes próprias ao grupo” (Tomé & Carreira, 2009: 1).

Daí se poder afirmar que “indivíduo e sociedade não são duas coisas distintas, mas

antes inseparáveis e interactivas” (Leandro, 2002 - A:307).

Todos nós temos necessidade de pertencer a uma família, a um grupo, a uma

comunidade e, como tal, ser reconhecido como membro da comunidade de pertença. Este

conjunto de ideias culmina com um pensamento que é o seguinte, “a necessidade de

identificação e de diferenciação são opostas e complementares. É esta dialéctica

existencial que permite a qualquer pessoa afirmar-se como sujeito único, singular e, no

entanto, semelhante a todos os seus” (Leandro, 2002 - A:307).

É referido muitas vezes, e não é de todo errado, que o emigrante parte à busca de

bens materiais, embora associados a estes estejam também ambições de âmbito cultural e

social.

Relacionados com o emigrante surgem alguns sinais exteriores que o catapultam

para um novo status social. Como exemplo disso podemos referir a construção ou

reconstrução de uma casa. Outro exemplo, muito comum é a obtenção de propriedades,

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 30

no sentido de se tornar proprietário de maiores extensões de terreno. E, ainda, a

possibilidade e maior interesse em dar aos filhos oportunidades e prosseguimento dos

seus estudos, da sua formação escolar, como forma de acederem a melhores empregos, à

mobilidade social. O facto de se orientarem de acordo e com um fim num futuro, projecta

o emigrante na tal identidade almejada que se falou anteriormente, “o que, de resto, se

inscreve perfeitamente bem nos valores da „modernidade avançada‟” (D. Hervieu-Léger,

1999 apud Leandro, 2002 - A:310).

Frisemos, aqui, os comportamentos ambivalentes identitários. Por um lado, os

emigrantes que partem nutrem um sentimento de traição, isto porque se “sentem de algum

modo traídos pelos que ficaram, em virtude da atribuição de uma identidade negativa,

deteriorada, estigmatizada e desacreditável” (Leandro, 2002 - A: 312); em contrapartida

as “imagens que lhe são reenviadas pela sociedade onde residem, onde dizem ser tão

simplesmente designados de „portugueses‟ e considerados ordeiros, trabalhadores

honestos e responsáveis, de bom trato social, logo objecto de uma identidade positiva”

(Leandro, 2002 - A: 312). Em virtude disso, por vezes podem surgir conflitos que estão

na origem das lutas da afirmação, da busca de reconhecimento social e da recomposição

das identidades. Não deixa de ser pertinente, salientar que este tipo de posturas “podem

perturbar os sentimentos de pertença, de fidelidade a si mesmo, da continuidade do ser,

da estabilidade e da permanência, em suma da recomposição harmoniosa da própria

identidade” (Leandro, 2002 - A: 313). Ou seja, práticas desta essência podem levar a que

os que partiram modifiquem as suas crenças acerca da sua própria identidade.

A identidade almejada, a que os emigrantes pretendem alcançar, está na base da

reconstrução identitária. Há, portanto, espaço para uma existência em simultâneo entre as

duas parte conjuntamente, uma luta, pressão “entre a identidade que já define, a que se

reconhece ser e a que se deseja vir a ser” (Leandro, 2002 - A: 314).

Se, outrora, a identidade individual e social do indivíduo era definida pela família e

pelos grupos de pertença, hoje em dia, há a necessidade da conquista e da construção da

própria vida e, por este meio do alcance do reconhecimento.

8-Valores e transformação social

Os emigrantes vivem entre duas culturas e, como tal, entre várias representações

sociais; contudo, apesar disso, na sua grande maioria “os valores nacionais do país de

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 31

origem continuam enraizados e com laços estreitos a Portugal” (Tomé & Carreira, 2009:

11).

E como os valores têm algo de intemporal, impõem-se sempre, quer queiramos,

quer não. Como são imperativos de consciência, transcendem quaisquer

circunstancialismos. Podemos falar de “uma independência dos valores relativamente ao

tempo e ao espaço” (Abrunhosa & Leitão, 1993: 198). O facto de os emigrantes

conviverem com outros grupos, outros indivíduos, outras sociedades “os valores a que se

referem as suas crenças e que guiam os seus comportamentos” (Trindade, 1995: 221) é

que determinam a sua diferenciação. Tal como dizem Tomé & Carreira (2009:11), “o

património cultural de um povo é constituído por milhares de traços que constituem a

sua especificidade e que…mostram quais são os valores colectivos que o regem”.

O valor é o possível, é a norma, é o que vale, é o preferível é, no fundo, o que deve

ser. A sociologia “reconhece os valores como factos sociais” (Maia, 2002: 398). Os

valores, entre outras coisas que o indivíduo detém, vão influenciar na construção da sua

identidade individual e cultural, em sociedade. Segundo Maia (2002: 398) “o valor

exprime uma relação entre as necessidades do indivíduo e a capacidade dos objectos em

as satisfazer”.

É pelos valores que, nós Seres Humanos, norteamos a nossa conduta, a nossa

actividade de vida.

Os valores são estimados por nós, são algo que prezamos com todo o nosso afecto,

são algo de valioso. No entanto torna-se complicado, senão tarefa impossível definir o

que são valores. Quando muito podemos expressar algumas características mais

significantes. Segundo G. Rocher apud Maia valor é “uma maneira de ser ou de agir que

uma pessoa ou uma colectividade reconhecem como ideal e que faz com que os seres

humanos ou as condutas às quais é atribuído sejam desejáveis ou estimáveis” (2002:

398).

Podemos dizer que ao emigrante se atribuem determinados predicados que

valorizam, entre eles enumeramos, “a iniciativa pessoal, a capacidade de sacrifício e de

trabalho, a vontade de melhorar a vida, de «ser alguém», ou seja, se subir na escala

social” (Antunes, 1981:20). O emigrante é visto como alguém que, com o seu esforço e

sacrifício é capaz de vencer o peso da hereditariedade e do status social dos seus

progenitores e, desta forma aglomerar bens que lhe possibilitem “ser «mais» na sua

comunidade” (Antunes, 1981:20). Socialmente, outros valores estão associados à imagem

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 32

do emigrante “como a capacidade de enfrentar riscos e perigos, a coragem e a

disponibilidade para viver a aventura” (Antunes, 1981:20).

Através de estudos realizados constatou-se que tem ocorrido uma transformação ao

nível do sistema de valores das sociedades acidentais. Conforme refere Inglehart (1993:

81) “un processus de changement intergénérationnel des valeurs et en train de modifier

progressivement le système politique et les normes culturelles des sociétés industrielles

avancées”

Após a tónica ter estado sobre o bem-estar material e físico, começa-se a optar mais

por uma melhor qualidade de vida. As causas disto têm um grau complexo de mudança

mas, devemos reter que os indivíduos estão mais voltados para as necessidades ou

ameaças imediatas do que para as distantes (a longo prazo) e inofensivas aos seus olhos, à

sua maneira de ver o mundo.

Uma fracção cada vez maior da população começa a interessar-se pelas decisões

políticas, tanto a nível nacional, como internacional. Segundo Inglehart (1993:81) “le

passage dês valeurs matérialistes aux valeurs postmatérialistes a engendré de nouveaux

enjeux politiques sur la scène mondiale”. O que, segundo o mesmo autor fez com que

“donné une grande impulsion aux nouveux mouvements politiques, fait éclater les partis

existants et en généré dáutres” (Inglehart, 1993:81).

As mudanças ao nível do sistema provocam mudanças ao nível individual, no que

diz respeito aos valores, e estas por sua vez, provocam consequências ao nível do sistema.

As mudanças ao nível do sistema têm por base o desenvolvimento económico e

tecnológico; a satisfação de necessidades de subsistência para uma porção cada vez maior

da população, assim como a elevação do nível de instrução e, também, as experiências

vividas por cada um e a ausência de guerra. Estas vão influenciar os valores ao nível

individual, que se consagram pelo interesse crescente de obter respeito e realização de si

mesmo. Isto vai ter impactos ou consequências novamente ao nível do sistema, ou seja,

provocam mudanças que afectam as questões políticas do momento e são postas em

destaque as questões sobre os estilos de vida. Afectam também as bases sociais do

conflito político e o declínio do conflito de classe social. Perturbam o suporte das

instituições nacionais, a decadência da legitimidade dos Estados-nação e o surgimento de

fidelidades supra-nacionais. As mudanças afectam igualmente os tipos de participação

política, ou seja, a queda da mobilização política dirigida às elites e o aparecimento de

grupos desafiadores da elite e orientados para as questões políticas.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 33

A teoria da mudança de valores pressupõe duas hipóteses: uma relacionada com a

escassez e outra relacionada com a socialização. Na primeira as prioridades do indivíduo

são um reflexo do ambiente sócio económico, e valoriza-se subjectivamente aquilo que é

relativamente raro. Por sua vez, na segunda, a relação entre o ambiente sócio - económico

e os valores prioritários não têm implícito um ajuste imediato, existe um desajuste no

tempo bastante importante, porque os valores fundamentais de um indivíduo reflectem o

que marcou tanto a sua infância, como a sua adolescência.

Estas duas hipóteses dão origem a uma série de prognósticos lógicos relativamente

à alteração de valores. Invocando o autor atrás citado “l´‟hypothèse de la pénurie

implique que la prospérité favorise la diffusion des valeurs postmaterialistes, l‟hypothèse

de la socialisation implique que ni le système de valeurs d‟un individu ni celui d‟une

société, dans son ensemble, ne sont susceptibles de changer du jour au lendemain”

(Inglehart, 1993:85). Prosseguindo com o pensamento de Inglehart, “au contraire, le

changement des valeurs fondamentales est progressif, presque invisible et survient, dans

une large mesure, lorsqu‟une génération plus jeune remplace ses aînés, dans la

population adulte d‟une société” (Inglehart, 1993:85).

Portanto, temos de evidenciar que após um período de crescente segurança

económica e física podem encontrar-se diferenças notáveis na hierarquia de valores entre

os indivíduos mais velhos e os mais jovens. E, como tal, esta hierarquia depende das

experiências vividas durante os anos de formação. A juventude mais facilmente vai de

encontro aos interesses dos objectivos pós-materialistas do que para as pessoas mais

velhas. A ter em conta que “la sécurité physique e matérielle, sans precedent, de l‟après-

guerre est à l‟origine du glissement des valeurs matérialiste vers les valeurs

postmatérialistes” (Inglehart, 1993:127).

Algo muito relevante a focar é que “ne signifie pas que l‟échelle des valeurs d‟un

adulte est totalement immuable, mais seulement qu‟il est relativement difficile de la

modifier” (Inglehart, 1993:86).

Os valores e o bem-estar têm uma relação estreita mas complexa. Os seres humanos

passam por um período de insatisfação até que tenham atingido o seu objectivo. Desta

forma, os valores desencadeiam um sentimento de insatisfação que faz com que o

indivíduo procure a satisfação. Daí que “lorsque les gens obtiennent l'object de leur

convoitise, ils éprouvent un sentiment de bonheur et de satisfaction” (Inglehart,

1993:263).

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 34

Contudo, as prioridades de uma sociedade podem modificar-se. E, como tal, “le

processus de changement culturel est-il lié aux conséquences, à long terme, de la

poursuite et de l‟obtention du bien-être subjectif” (Inglehart, 1993:263).

Inglehart faz referência a dois paradoxos do bem-estar subjectivo. O primeiro

designa-se de variações mínimas intergrupais, enquanto que o segundo se denomina de

grandes variações internacionais. Discriminando temos acerca do primeiro paradoxo que

“certains groupes sont objectivement bien plus favorisés que d‟autres et l‟on pourrait

normalement s‟attendre à ce que les premiers soient plus heureux et plus satisfaits de

leur existence que les autres” (Inglehart, 1993:264). Embora através de dados empíricos

se verifique que as diferenças reais são surpreendemente baixas. Por sua vez, no que

concerne ao segundo podemos constatar que “le bonheur et la satisfation globale à

l‟égard de la vie varient étonnamment peu entre les groupes stables d‟un même pays, …

ils varient beaucoup d‟un pays à l‟autre” (Inglehart, 1993:264).

A registar que a felicidade e a satisfação são fenómenos complexos. E não

reflectem somente uma combinação de processos a curto, médio e longo prazo, mais a

nível individual, mas também uma interacção entre influências culturais e pessoais.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 35

SEGUNDA PARTE

ENFOQUES EMPÍRICOS – ANÁLISE DE

RESULTADOS

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 36

Capítulo II - Orientações e opções metodológicas

1 - Pertinência da escolha do estudo

A explicitação dos pressupostos que justificam a escolha pelo tema da Emigração

centraliza-se, em grande parte, num trabalho realizado anteriormente ao nível do GAE

(Gabinete de Apoio ao Emigrante) de Amares.

Há relativamente poucos anos atrás, trabalhei no GAE, onde desempenhava funções

de atendimento e apoio ao cidadão emigrante no regresso e reinserção no país de origem,

Portugal. Dava o meu contributo para esta população que se dirigia ao GAE, no sentido

de resolução dos seus mais prementes problemas, como o preenchimento de formulários

para obtenção da pensão/reforma de velhice e/ viuvez; equivalências e/ou

reconhecimento das habilitações literárias; subsídio de desemprego; subsídio por morte;

acidentes de trabalho e doenças profissionais; vistos de entrada em Portugal; declarações

de troca de carta de condução; ingresso no ensino superior; processos bancários;

actualização da carta de condução; legalização de veículos automóveis e isenção do

imposto automóvel; poupança emigrante; nacionalidade, entre outros assuntos que

poderiam surgir e necessitar de resolução. Para superar algumas das dificuldades que

surgiam, o GAE, estava em constante contacto com a Direcção-Geral dos Assuntos

Consulares e Comunidades Portuguesas, sob tutela do Ministério dos Negócios

Estrangeiros e Comunidades Portuguesas.

Esta, sempre foi uma população que despertou o meu interesse pessoal. Tanto pela

sua riqueza de experiências pessoais como pelas suas características, como já foi

referenciado no enquadramento teórico conceptual.

Além disso, sempre tive vontade de aprofundar este tema, para desta forma me

sentir mais informada e, também, para desconstruir algum preconceito existente da minha

parte. Acredito que qualquer ideia que tenhamos, mal construída, deve-se ao facto da

falta de informação. Portanto, este trabalho de aprofundamento do tema da emigração

serviu-me além de outras coisas para eu evoluir como Ser Humano.

É através de códigos e lugares que nos ligamos aos outros, que nos interligamos

como cidadãos. Trata-se de um exercício de despojamento irredutível das ideias pré-

concebidas que acumulamos ao longo dos anos, através de análises camufladas dos

comportamentos alheios. Este despojamento leva a que o nosso Eu vá necessariamente de

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 37

encontro ao Outro, é através deste exercício que nós nos humanizamos. É desta forma

que ressurge um laço social entre todos os cidadãos, renaturalizando-o.

Reflectir acerca de um determinado tema, leva a procedimentos de questionamento

acerca de discursos e de práticas e contribui para desconstruir o simbólico e derrubar

resistências já inculcadas.

Ainda nesta linha, é de reconhecer a riqueza dos dados empíricos obtidos através de

um trabalho de campo e de análise. Além da perspectiva dos dados obtidos que motivam

o seu aproveitamento, pretendi que este trabalho tivesse uma tónica inovadora, através da

introdução de ópticas complementares que permitem uma melhor e mais profunda

compreensão das dinâmicas da emigração.

2 – Opções metodológicas

Podemos definir como método, referindo Trujillo, 1974:24 (apud Lakatos & Marconi,

1989: 40), “a forma de proceder ao longo de um caminho. Na ciência os métodos

constituem instrumentos básicos que ordenam de início o pensamento em sistemas,

traçam de modo ordenado a forma de proceder do cientista ao longo de um percurso para

alcançar um objectivo”.

A metodologia indica as normas e os critérios utilizados que funcionam como quadros de

referência para validar a investigação. Podemos defini-la, segundo Almeida & Pinto

(1990: 52), como “a organização das práticas de investigação”, ou seja, é a maneira como

o investigador organiza, define e justifica a sua pesquisa, como são abordados os

problemas e as respostas que advêm do processo de investigação. A metodologia é de

acordo com Silva (2003: 359-360), um processo “de leitura fundamentada do real na base

de dados recolhidos e acumulados (…) com os quais é possível descobrir a essência

oculta das coisas e revelar a verdade dos factos”. O trabalho de projecto teve como base

principal a metodologia qualitativa.

A investigação qualitativa assume-se como orientação metodológica deste estudo, pelos

objectivos propostos, de forma a congregar as diferentes e complexas dimensões que se

articulam acerca da emigração para países da Europa, assim como as diferentes

representações e expectativas dos actores sociais em causa (os emigrantes entrevistados)

com as dinâmicas e processos de mudança ao nível de conceitos, de ideias pré-concebidas

e políticas acerca do tema em estudo.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 38

Neste trabalho, as discussões dos actores sociais assumem-se como principal fonte de

dados (Bogdan & Biklen, 1994: 47-51), isto para compreender as dimensões desejadas

em que o investigador, recorrendo a diferentes instrumentos de apoio, procura

compreender e descrever os processos e dinâmicas sociais.

Tendo em conta Bogdan & Biklen (1994: 72-74), esta metodologia é hermenêutica

(interpretativa) e flexível, busca a interpretação e compreensão da realidade.

Situa-se mais no pólo construtivista, segundo Denzin e Lincoln (apud Guba & Lincoln

(1994: 105-107), na medida em que apela a um envolvimento com os actores em estudo e

uma tentativa de compreensão de uma cultura. O presente estudo deu particular

importância à compreensão das necessidades, interesses, expectativas, motivos implícitos

e explícitos que sustentaram a emigração para os países da Europa e a(s) razão(ões)

pela(s) qual(ais) emigraram. Assim como, durante o tempo de emigração, quais as

alterações operadas ao nível das suas identidades, quais as influências no que respeita à

mobilidade social e aos valores.

A metodologia é um campo que abrange toda a investigação e reorganiza-se em torno de

quatro grandes pólos segundo (Lessard-Herbert et al., 1994:27). Primeiramente, o pólo

epistemológico, que nos dirige para a problemática do estudo em progresso.

Já o pólo teórico, assume como principal centralidade o contexto da descoberta, a

interpretação e análise dos dados, (idem: 95). No pólo morfológico o que está em causa é

a organização e apresentação dos resultados.

Podemos dizer que estes dois últimos pólos encaminham-nos para os conceitos que

orientam a selecção e interpretação de todas as informações recolhidas, tal como a

estruturação da finalidade do estudo, e a explicitação de todos os dados que possibilitam a

sua construção.

Como último do quarteto temos o pólo técnico, que permite estabelecer a relação entre a

problemática e o nível empírico, isto é, construir o objecto de estudo e o contexto em

análise, através da dinâmica permitida pela utilização de diferenciadas técnicas de recolha

de dados. Este pólo está voltado para a lógica dual entre a teoria e os dados empíricos.

De forma abrangente, a dialéctica entre a teoria e os dados empíricos ambiciona-se como

uma constante descoberta e criatividade por parte do investigador, o que permite toda a

compreensão complexidade dos fenómenos em estudo.

A metodologia qualitativa contempla um conjunto de estratégias e métodos. Constitui um

modo de investigação que permite captar a dimensão subjectiva dos fenómenos sociais,

ou seja, a realidade dá-se a conhecer da forma como é percebida.

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Segundo Lessar-Herber et al (1994: 95) devemos ter em conta o “contexto da

descoberta”, pois orienta as estratégias de pesquisa e recolha de dados adoptadas, em que

a “desocultação” dos processos permite a descoberta de renovadas questões. Portando, a

investigação não se assume como um plano estático, mas sim, como uma dinâmica em

que novas visões dos sujeitos em contexto se podem enquadrar.

Da quantidade de procedimentos metodológicos adoptados, resultou um valorizado

conjunto de informação que só pode tornar-se proveitoso, inserindo-se nas abordagens

interpretativa e compreensiva. Estas duas abordagens possibilita, uma visão dinâmica do

contexto e compreensão com elevado grau de profundidade, riqueza e complexidade da

realidade através dos significados, na perspectiva dos sujeitos implicados. Situando este

estudo no paradigma interpretativo “o investigador toma por objecto os significados

atribuídos pelos sujeitos observados às acções ou acontecimentos que constituem a

trama da sua vida quotidiana” (Lessard-Herbert et al., 1994: 75), o que por sua vez,

valoriza o sentido e significado dos processos.

Pretende-se com esta pesquisa retratar o mais fiel possível a realidade estudada. Neste

caso, ver e analisar as possíveis transformações das identidades, das representações

acerca da mobilidade social e dos valores dos actores em questão, que foram os

emigrantes. E, também, abordar e questionar acerca do regresso à sua terra natal, o

Minho.

3 – Construção do dispositivo metodológico

Seguindo um caminho, vamos percorrendo diferentes fontes, consequentemente vamo-

nos apoiando em diferentes procedimentos e compilando materiais distintos. E, a riqueza

da compreensão da totalidade dos fenómenos que estavam em estudo, manifesta-se num

incessante questionamento no sentido de perceber o que os sujeitos afectados pela

investigação “experimentam, o modo como eles interpretam as suas experiências e o

modo como eles próprios estruturam o mundo social em que vivem” (Psathas, 1973 apud

Bogdan & Biklen, 1994:51). Para tal, a investigação careceu deslocações ao Gabinete de

Apoio ao Emigrante, assim como, às casas dos entrevistados.

A estratégia metodológica qualitativa, seguida ao longo deste estudo, teve como suporte

alguns métodos que permitiram recolher a informação fundamental para o estudo em

causa. Foi primordial privilegiar alguma variedade de técnicas e instrumentos na recolha

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 40

de dados, pois só desta forma se pode encontrar uma complementaridade entre eles e

chegar a uma estratégia para análise das diferentes dinâmicas.

Vamos enunciá-los e, posteriormente, explicar em que consistem e ainda como estes

foram convocados e usados ao longo do trabalho de campo.

Assim, foram privilegiados os seguintes instrumentos de recolha de informação:

Pesquisa e análise documental;

Entrevistas aprofundadas;

Observação;

Notas de Campo.

De seguida, procede-se à explicitação das várias técnicas e instrumentos utilizados

no estudo em causa.

3.1 – Pesquisa e análise documental

A pesquisa bibliográfica é fundamental em qualquer estudo. É através da pesquisa

bibliográfica que o quadro teórico de qualquer investigação é construído. Este método

permite ao investigador, segundo Albarello (1997: 16), “alargar o seu quadro teórico,

situar comparativamente a sua problemática, conhecer resultados interessantes, tomar

consciência do seu ponto de vista, em suma, clarificar as suas ideias”, isto para que o

enquadramento do objecto de estudo seja feito de maneira correcta e saia mais

enriquecido.

A análise documental apresenta-se, de acordo com Albarello (1997: 30), como “um

método de recolha e de verificação de dados”. É imprescindível uma vez que, segundo o

mesmo autor, (1997: 15) “não existe investigação sem documentação”.

Tanto a pesquisa bibliográfica como a análise documental efectuaram-se não só como

meios em si mesmos, mas também para permitirem o acesso a outras matrizes de

informação importantes. Portanto, estes instrumentos de recolha de dados funcionaram

como que um complemento com as restantes técnicas utilizadas, designadamente para

definir os actores a entrevistar. Podemos dizer que esta técnica serviu de orientação no

decorrer da investigação. Nomeadamente, e de forma geral, foram consultados e

analisados documentos disponíveis no site do Observatório da Emigração, assim como

muita bibliografia consultada ao longo de todo o percurso sobre o tema da identidade,

mobilidade social, valores, família e regresso de emigrantes. Contudo, a pesquisa

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bibliográfica não é suficiente numa investigação. Portanto, o trabalho de campo apoiou-se

noutros métodos na recolha de informação.

3.2 – Entrevistas aprofundadas

A entrevista, segundo Quivy & Campenhoudt (1998: 70 e 193), é um processo de

comunicação e interacção humana que permite ao investigador retirar informações e

elementos de reflexão muito ricos, que não se encontrarão noutras fontes ou documentos

escritos. Independentemente do seu grau de estruturação ou profundidade, permite

adquirir informação muito rica pela interacção com os entrevistados.

Este trabalho baseou-se na entrevista aprofundada a dez emigrantes que

regressaram a Portugal, mais propriamente a localidades da região do Minho. As

entrevistas duraram entre 50 a 100 minutos. Foi seguido um guião semi-estruturado, que

permitiu cobrir todas as áreas de interesse para a investigação, evitando, deste modo,

repetições e garantindo um fio condutor da conversa, seguindo o curso do pensamento

dos entrevistados.

A informação produzidas nas entrevistas foi registada através de gravador áudio.

Estas entrevistas permitiram aprofundar e complementar informação, assim como

obter uma melhor compreensão da dinâmica dos conceitos em estudo. O seu objectivo é o

de encaminhar a conversa de maneira a obter informações relevantes. Os entrevistados

tiveram a oportunidade de falar de forma natural quanto possível.

Recolheu-se informação das perspectivas dos entrevistados em relação aos três

conceitos em estudo, que são a mobilidade social, a identidade e os valores.

Relativamente à mobilidade social abordou-se a razão pela qual emigraram, a

estabilidade económica após a emigração, o trajecto e a sua realização profissional e, a

sua formação escolar e dos seus filhos. No que concerne à identidade focou-se o

sentimento de pertença, e a integração em cada uma das sociedades por que passaram no

seu trajecto migratório. No que respeita aos valores, falamos acerca da abertura de

horizontes da experiência emigratória, as diferenças entre a sociedade portuguesa e a de

acolhimento e a valorização da família.

Algumas destas entrevistas foram realizadas no GAE, outras nas casas dos próprios

actores e uma realizou-se no estabelecimento comercial do qual a entrevistada é a

proprietária.

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A escolha dos entrevistados, num universo tão abrangente e diversificado, foi

norteada por vários critérios. Na procura, na medida do possível, de atingir um grande

número de informação acerca da temática em estudo, foram seleccionados dez emigrantes

de modo a garantir diversidade relativamente ao género, às habilitações literárias, aos

países de emigração e aos locais de onde são oriundos após o regresso e as suas idades.

Todas as entrevistas serviram para o cruzamento e comparação de pontos de vista

acerca dos temas em estudo, tendo em conta as dinâmicas que lhe subjazem e, de toda a

avaliação feita por cada um dos entrevistados relativamente aos mesmos temas. Assim, os

guiões das entrevistas aprofundadas com aqueles actores (ver Anexos) foram elaborados

de forma a obter o máximo de informação possível.

O efeito da triangulação é uma probabilidade que se tem em consideração na

análise e exposição dos resultados que se obtiveram, isto no que diz respeito à visão

holística quanto à investigação de cariz qualitativo. Deste modo, esta triangulação é uma

forma de analisar os dados por diferentes ângulos enriquecendo a pesquisa pela

combinação de diferentes técnicas e instrumentos de recolha de dados, e ainda pela

diversidade de fontes de informação.

A análise de entrevistas permitiu o tratamento e a análise de informações dadas ao

longo das mesmas pelos entrevistados. Baseou-se na elaboração de quadros - síntese com

as categorias (ver em Anexo) essenciais ao processo analítico e, posteriormente, a

redacção em texto das “conclusões”.

3.3 – Observação

Não menos importante na metodologia de trabalho foi a observação directa, em que

se pôde compreender a cultura subjacente dos actores em estudo, neste caso os

emigrantes que regressam a Portugal, ao Minho.

No decorrer das entrevistas teve-se a oportunidade de observar (e registar-se num

diário de campo) toda a linguagem corporal, facial e gestual, ou seja, a linguagem não

verbal, que muitas vezes diz mais do que propriamente a falada.

Pode-se dizer que, como enuncia Quivy & Campnhoudt, (1998:196), “os métodos

de observação directa constituem os únicos métodos de investigação social que captam

os comportamentos no momento em que eles se produzem e em si mesmos, sem a

medição de um documento ou de um testemunho”. Segundo Lessard- Hérbert (1990:

147), a observação pode ser vista, por um lado, como utensílio de recolha de dados e, por

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 43

outro, como processo de tomada de decisão. Neste método o investigador é o principal

instrumento na recolha de informação, apontando o mais fielmente possível os dados

observados.

3.4 – Notas de campo

As notas de campo foram uma técnica a que se recorreu ao longo de toda a

investigação, desde o primeiro momento, e foram registadas num diário de campo. Isto

porque há muita informação de extrema importância e muito relevante para a

investigação qualitativa que deve ser anotada para posterior análise e aprofundamento da

informação. Realizou-se ao longo das entrevistas, aquando de algumas mensagens não

verbalizadas mas que não deixam de ter a sua importância e elevado grau de

profundidade. Estas notas de campo revelaram que, muitas vezes, ouvir apenas a voz

directa das pessoas não é suficientes para captar toda a informação pretendida.

Senti que, para o meu trabalho, em particular, o uso desta técnica traria vantagens

acrescidas no sentido de colmatar alguma falha na transmissão de ideias e na superação

de todo o material empírico, na medida em que se acrescentam à própria dinâmica de

conversação criada, à confrontação de diferentes posições, mudanças de opinião e

posições singulares.

4 – Balanço metodológico

Segundo o grau de liberdade, podemos classificar as entrevistas realizadas como

semidirectivas, isto porque “se situam num nível intermédio, ao respondermos a duas

exigências que podem parecer contraditórias” (Albarello et al, 1997:87). Portanto,

segundo o autor citado “trata-se de permitirmos que o próprio entrevistado estruture o

seu pensamento em torno do objecto perspectivado” (idem:87). Já por outro lado, “a

definição do objecto de estudo elimina do campo de interesse diversas considerações

para as quais o entrevistado se deixa naturalmente arrastar, ao sabor do seu

pensamento, e exige o aprofundamento de pontos que ele próprio não teria explicitado”

(idem:87). Seguindo este raciocínio, a papel do entrevistador numa óptica semidirectiva,

poderá ser delineado nos seguintes trâmites, “segue a linha de pensamento do seu

interlocutor, ao mesmo tempo que zela pela pertinência das afirmações relativamente ao

objecto de pesquisa, pela instauração de um clima de confiança e pelo controle do

impacte das condições sociais de interacção sobre a entrevista” (idem:95).

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 44

Isto reflectiu-se numa grande riqueza da informação conseguida, mas também deu

resultado a entrevistas longas, e neste sentido é de realçar o trabalho moroso de

transcrição dos discursos, complementados com as observações e notas de campo, nos

contextos da acção concreta.

De maneira a elaborar e, de certa forma, organizar o trabalho de análise de

conteúdo, para cada entrevista, foram elaborados quadros - síntese segundo os tópicos e

as questões definidos no guião de entrevista e, além destes, tudo o que foi emergindo da

situação de interacção entrevistador - entrevistado. Ao longo do processo de análise do

conteúdo foi-se o mais fiel possível às expressões proferidas pelos entrevistados.

Assim, além do registo das respostas dos entrevistados foram, também, recolhidas

percepções e representações acerca da mobilidade social, identidade e valores dos

emigrantes aquando do seu regresso. Foi dada particular atenção às semelhanças e às

diferenças de opinião. Esta triangulação de conceitos foi sustentada com recurso a outras

fontes de informação disponíveis, sobretudo documentais.

Pelo grande volume de entrevistas realizadas, apresentam-se (em Anexo) quadros

síntese que permitem uma visualização geral do conteúdo das entrevistas.

Após explicitação das orientações e opções metodológicas, assim como, dos

principais instrumentos e técnicas de recolha de toda a informação, segue-se a

caracterização da amostra.

5- Caracterização da amostra

Procederemos de seguida a uma caracterização da amostra escolhida para as nossas

entrevistas, em função do género, idade, habilitações literárias dos emigrantes

entrevistados, habilitações literárias dos seus filhos, profissão dos pais, países de

emigração, data de emigração e tempo total de estadia em outro país.

Para isso apresentaremos quadros, onde constam todas as informações e, de seguida

explicaremos com mais pormenor todos os dados.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 45

5.1.- Género e localidades dos entrevistados

Quadro 1: Síntese quanto ao género e localidades dos entrevistados

O quadro 1 permite verificar que foram realizadas cinco entrevistas ao género

feminino e cinco entrevistas ao género masculino. Além disso, outro factor está aqui

evidenciado, que é o seguinte: sete dos entrevistados, 4 do género masculino e 3 do

género feminino, são provenientes de Amares, 1 do género feminino é natural de Vieira

do Minho, outro do género feminino é originário de Famalicão e, outro do género

masculino é oriundo de Braga. Tudo localidades pertencentes à região do Minho, embora

de diferentes concelhos, no sentido de enriquecer a amostra.

5.2- Idade vs habilitações literárias dos emigrantes

Quadro 2: Síntese quanto à idade e habilitações literárias dos emigrantes

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 46

Pelo quadro 2, constatamos que 4 dos indivíduos entrevistados do género masculino

possuem o 1º Ciclo do Ensino básico (4ª Classe), um outro do mesmo género o 6º ano do

2º ciclo, ao passo que as mulheres apresentam habilitações escolares mais elevadas.

Apenas uma tem o 1º Ciclo do Ensino básico (4ª Classe), quanto às restantes, uma possui

uma licenciatura, mais especificamente, é professora do 1ºCiclo, outra tem o curso geral

do comércio e, por último uma tem o curso de secretariado.

No que concerne às idades, oscilam entre os 37 e os 62 anos que é outro indivíduo

do mesmo género. Todos os outros se situam entre estes dois patamares como podemos

verificar na tabela (2).

5.3- Habilitações literárias dos filhos

Quadro 3: Síntese quanto às habilitações literárias dos filhos Habilitações

Literárias dos

emigrantes

Pessoas entrevistadas Idade Nº de filhos/Género Habilitações Literárias dos

filhos Género

Feminino

Género

Masculino

Curso Geral do

Comércio – Freq.

do último ano de

Secretariado

X 60 Rapaz (37anos)

Rapariga (33 anos)

- 12ºano

- 12ºano

Professora do

1ºCiclo

X 59 Rapariga (35anos)

Rapariga (33 anos)

- Lic. Português-Francês

- Lic. Recursos Humanos

10º ano de

escolaridade

X 51 Rapariga (23 anos)

Rapaz (20 anos)

Rapaz (18 anos)

- 12ºano

- 12ºano

- 10ºano

1º Ciclo do Ensino

Básico (4ªClasse)

X 57 Rapariga (35anos)

Rapaz (33anos)

- Bacharelato

- Bacharelato

1º Ciclo do Ensino

Básico (4ªClasse)

X 48 Rapariga (23anos)

Rapaz (18anos)

Rapaz (16anos)

Freq. Ensino Universitário

Freq. Ensino Universitário

- 11ºano

1º Ciclo do Ensino

Básico (4ªClasse)

X 57 Rapaz (26 anos)

Rapaz (19 anos)

- Freq. Ens. Universitário

- Freq Ens. Universitário

2º Ciclo do Ensino

Básico (6ºAno)

X 37 Rapaz (11anos)

Rapariga (6anos)

- 7ºano

- 1ºano do ensino básico

1º Ciclo do Ensino

Básico (4ªClasse)

X 62 Rapariga

Rapaz

Rapaz

- 9º ano

- 12ºano

- 12ºano

1º Ciclo do Ensino

Básico (4ªClasse)

X 60 Rapaz (34 anos)

Rapariga (30 anos)

- 9ºano

-Lic. Contabilidade

Curso de

Secretariado

X 50 Rapariga (26anos)

Rapaz (22anos)

Rapariga (17anos)

- Mestrado Psicologia da

Educação

- Curso de Turismo

- 12ºano

10 Pessoas entrevistadas

Tendo em consideração o quadro 3, podemos verificar que as habilitações literárias

dos filhos dos emigrantes são geralmente mais elevadas do que as dos seus pais. No caso

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 47

da emigrante licenciada e da emigrante detentora do curso geral do comércio, os filhos

têm habilitações literárias similares.

5.4- Habilitações literárias e profissão dos pais

Quadro 4: Síntese quanto às habilitações literárias e profissão dos pais dos

emigrantes Habilitações Literárias Pessoas entrevistadas Profissão (habilitações literárias) dos pais

dos emigrantes Género

Feminino

Género

Masculino

Curso Geral do Comércio –

Frequência do último ano de

Secretariado

X - Encarregado Geral de montagens de chassis

(6º ano)

- Doméstica (S/ habilitações)

Professora do 1ºCiclo X - Agente funerário (4ªclasse)

- Doméstica (4ªclasse)

10º ano de escolaridade X - Trabalhador da construção civil (4ªclasse)

- Doméstica (S/ habilitações)

1º Ciclo do Ensino Básico

(4ªClasse)

X -Alfaiate (4ªclasse)

- Doméstica (4ªclasse)

1º Ciclo do Ensino Básico

(4ªClasse)

X - Pedreiro (S/ habilitações)

- Doméstica (3ªclasse)

1º Ciclo do Ensino Básico

(4ªClasse)

X -Agricultor (S/ habilitações)

- Doméstica (S/ habilitações)

2º Ciclo do Ensino Básico

(6ºAno)

X -Restaurador de Telhados (S/ habilitações)

- Doméstica (S/ habilitações)

1º Ciclo do Ensino Básico

(4ªClasse)

X Agricultor/construção civil (S/ habilitações)

- Doméstica (S/ habilitações)

1º Ciclo do Ensino Básico

(4ªClasse)

X - Operário (4ªclasse)

-Doméstica (4ªclasse)

Curso de Secretariado X - Cantoneiro (4ªclasse)

- Doméstica (sabia ler mas não escrever)

10 Pessoas entrevistadas

Observando com atenção o quadro 4, deparamo-nos com habilitações literárias dos

pais dos emigrantes inferiores ou similares às dos seus filhos (nossos entrevistados).

Mostramos até um pormenor, que retrata o desinteresse ou falta de condições para

frequentar o ensino escolar em Portugal à algumas décadas atrás. Grande maioria das

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 48

mães dos nossos entrevistados são analfabetas, e todas elas são domésticas. No que

concerne aos homens, quatro deles também são analfabetos, e os restantes têm o 6º ano

ou a 4ª classe. As profissões variam entre agricultor, cantoneiro, trabalhador da

construção civil, agente funerário, operário, restaurador de telhados, pedreiro, alfaiate e

encarregado geral de montagem de chassis.

5.5 – Data de emigração e regresso – Tempo total de emigração

Quadro 5: Síntese quanto ao país e tempo total de emigração

Países de

emigração

Pessoas entrevistadas Data de

emigração

Data de

regresso

Tempo

Total de

emigração

Género

Feminino

Género

Masculino

França X 1972 2006 34 anos

França X 1964 2000 36 anos

França X 1966 2006 40 anos

França X 1967 1988 21 anos

França X 1972 1986 14 anos

Suécia X 1970 1986 16 anos

Luxemburgo X 1985 1999 14 anos

Espanha X 1993 2009 16 anos

Suíça X 1987 2008 21 anos

Suíça X 1994 2000 6 anos

10 Pessoas entrevistadas

Relativamente ao quadro 5, notamos que o tempo total de emigração oscila desde

os 6 até aos 40 anos (em média 21,8 anos). As datas de emigração vão desde 1964 até

1994; em relação às datas de regresso vão desde 1986 até 2009. No que toca aos países de

emigração é a França que aparece com maior representação, facto que se explica pela

grande parte da emigração portuguesa para a Europa ser para este país. A Suíça surge

também com alguma representação que se explica pelo mesmo facto, a partir dos anos

1980, este ter sido um país de eleição da emigração portuguesa. Os restantes países são o

Luxemburgo, a Espanha e a Suécia.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 49

Após explicitação das opções e orientações metodológicas, bem como das técnicas

e instrumentos fundamentais na recolha de toda a informação e a caracterização da

amostra do nosso estudo empírico, segue-se um capítulo que é constituído pela tentativa

de estabelecer relações entre os dados empíricos e as perspectivas teóricas, tendo como

base a revisão bibliográfica apresentada no capítulo do enquadramento teórico -

conceptual.

Para dar corpo ao próximo capítulo, serão utilizadas as fontes de informação já

referenciadas, ao nível das técnicas e instrumentos de recolha de todos os dados, de forma

a compreender as diversas tensões, por vezes contraditórias, que estão no cerne da

emigração, da mobilidade social, valores e identidade.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 50

Capítulo III - Perspectivas dos actores acerca dos temas em estudo

Ao longo deste capítulo vamos, então, abordar as perspectivas dos actores acerca

dos temas em estudo. Os temas fulcrais do estudo em questão são: a mobilidade social, os

valores e a identidade. É, portanto, acerca destes que nos vamos pronunciar de seguida,

dividindo este capítulo em três partes de maneira a abordar cada um deles por sua vez e

de forma mais pormenorizada.

Passo a apresentar um quadro com um panorama geral das pessoas que foram

entrevistadas. Esta é uma forma de sistematizar e apresentar toda a informação

organizada para o leitor.

Quadro 6 – Sistematização de toda a informação

Países de

emigração

Nomes Pessoas entrevistadas Tempo Total

de emigração Género

Feminino

Género

Masculino

França Armanda X 34 anos

França Beatriz X 36 anos

França Carlota X 40 anos

França Dinis X 21 anos

França Ernesto X 14 anos

Suécia Francisca X 16 anos

Luxemburgo Guilhermina X 14 anos

Espanha Hélder X 16 anos

Suíça Ivo X 21 anos

Suíça João X 6 anos

10 Pessoas entrevistadas

Apenas tenho a referir que todos estes nomes são fictícios, para não cometer

qualquer indiscrição para com as pessoas que se dispuseram gentilmente a serem

entrevistadas.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 51

1 – Análise de conteúdos e discursos

1.1 - Percepções sobre mobilidade social

No que concerne à mobilidade social, começaremos por abordar a razão pela qual

os entrevistados emigraram e que nos remete para a primeira pergunta do guião de

entrevista.

Para grande parte dos inquiridos o motivo pelo qual emigraram foi a tentativa de

melhorarem as condições económicas de vida que tinham em Portugal, como o

comprovam alguns dos testemunhos:

“Fomos à procura de melhores condições de vida. Aqui não tínhamos nenhumas

perspectivas de vida. Nós cá éramos muito pobres, não tínhamos meios quase nenhuns”

(Beatriz, França, 51anos).

“Emigrei com a intenção de renovar a minha vida. Para ter uma vida melhor.

Estava a sentir dificuldades aqui em Portugal e, por isso decidi emigrar quando me

fizeram uma proposta de trabalho. Lá compensa em termos de ordenado, de estadia, em

termos de condições…enfim, de tudo” (Hélder, Espanha, 37 anos).

“Emigrei para ter melhoras na minha vida. Emigrei para equilibrar a nossa vida.

Porque se não fosse para equilibrar a minha vida não saía do meu país” (Ernesto,

França, 62 anos).

A ambição de adquirir bens essenciais ao bem-estar, mais propriedades, ou um

terreno para a construção de uma casa e amealhar dinheiro, no fundo, aumentar o seu

património, é transversal a todos estes testemunhos. Com a expressão enfática

percebemos claramente que estão dispostos e pretendem ascender a outro status na

sociedade. É de crer que sendo proprietários de mais terras, de casa ou outros bens

materiais, poderiam aceder a um estatuto social mais valorizado e assegurar um futuro

mais seguro. O que é coerente com a ideia que permanece no nosso inconsciente

relativamente à emigração desta época (segunda metade do século XX).

Outros, ainda, apontam diferentes razões para justificar a emigração. Como por

exemplo, dar um melhor futuro aos filhos.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 52

“Emigrei no intuito de dar um futuro melhor aos meus filhos e, também para

conseguir um melhor nível de vida. Naquela altura era muito complicado conseguir ter

um empréstimo e, então tentei a emigração” (João, Suíça, 48 anos).

E, ainda, há quem aponte outras razões, por exemplo, por amor ou para conhecer

outros costumes e culturas, conforme nos relatam:

“Eu não emigrei por motivos económicos mas por amor. O meu marido resolveu ir

para a Suécia à aventura. Conhecemo-nos cá e casamos por procuração, nem demos

tempo que ele cá viesse e eu fui lá ter. Foi uma paixão „assolapada‟” (Francisca, Suécia,

60 anos)

“Emigrei porque casei e o meu marido já estava na França a trabalhar. Posso

dizer que foi por amor, para construir um casamento, uma família, uma vida a dois”

(Armanda, França, 59 anos).

“Emigrei, não foi por falta de trabalho, foi a vontade de conhecer outro país,

outras culturas e costumes. E, principalmente a construção de uma casa. O que era

impossível construir em Portugal na altura. Ganhar dinheiro e construir uma casa”

(Guilhermina, Luxemburgo, 50 anos).

Em suma, o projecto emigratório pode ser encarado como um passo para lhes

proporcionar uma mobilidade social ascendente. Isto porque é uma forma de ultrapassar

as condições de vida desfavoráveis e limitadas que se lhes apresentavam na altura e é um

processo mais rápido e exequível de conseguir o fim de melhorar o nível e qualidade de

vida. E, como tal, o facto de terem um emprego real e sólido, confere-lhes também um

estatuto definido e susceptível de criar outras aspirações.

Ter tomado esta decisão de emigrar, permitiu-lhes sonhar e acalentar aspirações

relacionadas com um melhor viver. Para a maioria dos nossos entrevistados foi um

período de intenso trabalho, desgaste, poupanças e de tornar os seus projectos de

emigração realidade: construção de casa, compra de carro, melhoria da condição

económica familiar e melhores perspectivas de futuro para os filhos, como nos indicam

alguns dados das entrevistas.

Outro ponto a ser esmiuçado, neste momento, é o do trajecto e realização

profissionais dos nossos entrevistados.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 53

Todos eles se consideram pessoas realizadas profissionalmente e valorizam o seu

trajecto profissional, quer tenham desempenhado funções inferiores aos seus diplomas

nos países de emigração ou funções de ordem similar às que desempenhavam em

Portugal. Todos dizem que foram experiências gratificantes e enriquecedoras no seu

percurso profissional, como nos revelam os depoimentos dos nossos interlocutores.

“Sempre me senti realizada profissionalmente. Quando fui para o Luxemburgo fui

para um trabalho inferior ao meu em termos de estudos, não inferior em termos de

dignidade. Eu sabia para o que ia, portanto, adaptei-me e sempre me senti realizada.

Tentei aproveitar os meus conhecimentos e aplicá-los no que estava a fazer lá. Eu sabia

que o meu ordenado no Luxemburgo era muito melhor, e tinha um pensamento que era

„eu tenho de vencer na vida‟” (Guilhermina, Luxemburgo, 50 anos).

“Sempre me senti realizada porque fiz o que gostava, dava aulas de Língua e

Cultura Portuguesa. Infelizmente a nossa Língua no mercado não tinha grande valor. É

muito triste ver que a nossa Língua não está muito implementada. Mas eu atribuo isso à

falta de estruturas portuguesas, à falta de apoio do nosso governo. Os nossos jovens

chegavam a uma certa altura, no sistema de ensino, que não tinham o seguimento da

língua portuguesa. Depois só encontravam a Língua Portuguesa na Universidade (…).

Os meninos iam às aulas do português, e eram muito assíduos, não faltavam. Portanto, a

comunidade fazia a sua parte o governo é que não apoiava. Não foi pela comunidade

portuguesa, porque não são ouvidos. Os deputados pela emigração não devem ter grande

força, nem interesse, porque não fazem nada para isso. O governo Português não

investiu, não souberam aproveitar a riqueza que tiveram em França, dos portugueses que

estiveram lá. Acho que estão agora a dar os primeiros passos nesse sentido” (Armanda,

França, 59 anos).

“Enquanto estava na França tinha uma boa vida e sentia-me realizado.

Depois, vim para cá e montei o meu negócio, onde me sinto plenamente realizado.

Tudo correu bem mas, com muito trabalho. O meu trabalho é ligado à noite, é muito

diferente de muitos trabalhos, é de muita responsabilidade” (Dinis, França, 60 anos).

“Na Suécia tornei-me a mulher dos sete ofícios. Aqui trabalhava em seguros, uma

menina que estava habituada a estar num escritório, que não fazia mais nada do que

estar numa secretária (…). A minha experiência profissional na Suécia foi o mais

enriquecedor possível. Preparou-me para outro tipo de coisas. A nível profissional foi

muito enriquecedor. Aqui em Portugal, tenho uma casa de molduras, e que me realiza

totalmente, porque posso dar asas à minha imaginação” (Francisca, Suécia, 60 anos).

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 54

“Após ter emigrado sinto-me muito realizado a nível profissional porque fiz

sempre o que gostei de fazer. Trabalhei na pedra. Depois de voltar a Portugal dediquei-

me à Viticultura, que é outra das minhas paixões. E, a mim realiza-me muito.” (João,

Suíça, 48 anos).

“Sinto-me uma pessoa mais realizada profissionalmente, lá os moldes de trabalho

são os melhores, usam-se técnicas mais evoluídas. Eu sou estucador, profissão que já

exercia cá em Portugal” (Hélder, Espanha, 37 anos).

Podemos salientar que todo o esforço é justificado enquanto o objecto de ascensão

social for, de certa forma, atingível. Enquanto houver hipóteses de atingir os objectivos

para os quais se propuseram, aquando da decisão de emigrar, mesmo que haja perdas ou

ganhos. Se os emigrantes considerarem que ainda podem atingir esses objectivos, esses

serão determinantes nos seus comportamentos para se ajustarem às diversas situações.

Embora, em alguns casos, desempenhem funções de menor prestígio social,

certamente tiveram um reconhecimento social por parte da sociedade de acolhimento. Há

no geral um sentimento de ganho e de enriquecimento a nível pessoal com o desempenho

das suas funções. Mesmo os nossos entrevistados que regressaram ainda em idade activa

se sentem realizados na profissão que desempenham após a emigração.

Aludindo agora à formação escolar dos emigrantes e, principalmente dos seus

filhos, todos valorizam a formação escolar dos filhos em detrimento do amealhar de

dinheiro ao longo da vida:

“Eu estudei até ao troisiéme em França, que corresponde ao 10º ano de escolaridade. Em

Portugal nunca tirei formação nenhuma, porque não tive qualquer interesse. Em França tiraria

uma formação, aqui em Portugal não me dá vontade (…).

Empreendi mais ao longo da minha vida na formação escolar dos meus filhos porque é

mais importante do que o amealhar de dinheiro. O dinheiro gasta-se (o dinheiro vai e vai) e a

formação escolar fica sempre com as pessoas. Se existir algum azar na vida o dinheiro é o

primeiro a desaparecer e a formação pode ajudar-nos a erguer novamente. Eles continuam a

estudar e darei sempre o que eles precisarem e quiserem nesse sentido” (Beatriz, França, 51

anos).

“Sim, em Espanha frequentei uma formação de 90 dias. Tenho o diploma de Gessista de

Espanha. Se formos a ver empreendi nas duas coisas. Mas, mais na minha família. Aos meus

filhos, o que eles me pedirem, em termos de formação escolar, eu dou-lhe. Já me pediram para

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 55

entrar no Karaté, para tirar cursos de inglês, e mais coisas, … já andaram na piscina e na

ginástica.” (Hélder, Espanha, 37 anos).

“Eu empreendi mais na formação escolar dos meus filhos mas, também, estava a tentar

amealhar dinheiro. Tanto empreendi na formação escolar dos meus filhos que os levava para a

escola de ensino da Língua Portuguesa, que decorria ao sábado. Isto além de frequentarem o

sistema de ensino francês (…). E, cá continuei a investir na formação escolar deles. E, não

continuaram a estudar porque não quiseram” (Ernesto, França, 62 anos).

“Na Suíça não tirei nenhuma formação porque o patrão atribuiu-me logo o escalão

máximo, devido à minha experiência (…). Depois fiz uma formação de Poda, a seguir uma

formação de Fitofármacos (…). Já tirei, também, um curso de Horticultura. E, também tirei o

curso de Protecção Integrada. Inscrevi-me nos avisos agrários, que nos avisa de todas as

alterações, de todos os males que existem, e outras coisas interessantes. Já tentei tirar o 9ºano

de escolaridade no Centro de Novas Oportunidades, mas não gostei, nem concordo com o

sistema de funcionamento. Por isso, desisti (…). A formação escolar dos meus filhos foi sempre

muito mais importante ao longo da minha vida. Sempre me esforcei para lhes dar o que eles

precisavam” (João, Suíça, 48 anos).

“Na Suécia pensei seguir Direito, não segui porque quando podia não tinha bases

suficientes da Língua Suéca para ir para uma Faculdade de Direito, porque aí teria de dominar

perfeitamente a língua. Depois mais tarde quando já dominava a língua (…). Eu ainda

frequentei um curso para Intérprete Social e, era à noite. Mas tive de desistir porque o meu

marido trabalhava por turnos (…). Acabei por desistir. Tive pena mas fiquei por aí. Após ter

vindo não tirei curso nenhum cá. Eu empreendi mais na educação dos meus filhos, em relação à

formação escolar, infelizmente, não foi aquela que eu lhes quis dar porque eles não quiseram

aceitar. Era aquilo que eu mais lhes queria dar, mas eles não quiseram. O juntar de dinheiro

nunca foi uma prioridade nossa, é evidente que não esbanjamos, fizemos o que podemos para ter

a vida que temos hoje! Foi na educação dos filhos, não propriamente na formação escolar

porque eles não quiseram prosseguir os estudos universitários, com muita pena minha”

(Francisca, Suécia, 60 anos).

“Vim para Portugal por causa da formação escolar dos meus filhos para aproveitarem a

escolaridade portuguesa, para não atrasarem ano nenhum.. Portanto, valorizei mais a formação

escolar dos meus filhos do que o amealhar de dinheiro (…). Orientamos a nossa vida em função

da formação escolar dos nossos filhos” (Dinis, França, 60 anos).

“Eu quando fui para França tinha a frequência do Magistério. Depois lá, tirei a

licenciatura na Universidade Aberta. Para atingir o 10º escalão e conseguir subir um bocadinho

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 56

o meu ordenado. Agora, aqui em Portugal, ainda não tirei formação nenhuma. Gostaria era de

fazer alguma coisa porque me sinto ainda muito capaz, penso que podia dar muito de mim.

Empreendi mais, ao longo da minha vida, na formação escolar dos meus filhos, no bem-

estar deles e, no dia – a - dia deles para que eles estivessem bem (…). A prioridade sempre foi

os meus filhos, a formação escolar deles, e por isso os deixei em Portugal, pensando eu que não

os ia prejudicar, caso eu viesse para Portugal, enviada pelo governo Português” (Armanda,

França, 59 anos).

Há, nos discursos em análise, uma orientação especial para a valorização escolar

dos filhos. Esta valorização escolar é, muitas vezes, com o intuito de eles acederem a

melhores empregos e, como tal, a uma mobilidade social ascendente. Importa salientar

que os projectos familiares migratórios são, frequentes vezes, orientados em função do

grupo familiar com particular incidência para o futuro dos filhos.

Podemos referenciar que associado ao sucesso escolar dos filhos dos emigrantes

está a mobilidade social ascendente. Os pais podem aceder a um estatuto social por efeito

da ascensão social dos seus filhos, por isso, empreenderam tanto na formação escolar dos

filhos ao longo das suas vidas. Embora em alguns casos não lhes foi possível porque os

filhos não quiseram prosseguir os estudos.

Abordando, agora, a estabilidade económica dos emigrantes, verificamos que todos

eles se dizem com uma maior estabilidade económica após ter terminado o projecto

emigratório:

“Após ter emigrado para a Suíça sinto que tenho uma maior estabilidade económica. Se

calhar não a teria se não tivesse ido. Sinto-me mais tranquilo. Tenho casa própria que consegui

com o dinheiro que adquiri pela emigração” (Ivo, Suíça, 57 anos).

“Nós apenas regressamos porque tínhamos estabilidade económica. E essa estabilidade

permanece. E foi a emigração para o Luxemburgo que nos deu essa estabilidade económica.

Tenho casa própria e que a obtive através da emigração” (Guilhermina, Luxemburgo, 50 anos).

“Tenho uma estabilidade económica graças à França, senão não tinha o que tenho hoje,

e tudo o que consegui empreender. Tenho casa própria que adquiri por ter estado 20 anos em

França” (Dinis, França, 60 anos).

“Após ter emigrado sinto que tenho uma maior estabilidade económica. Foi a emigração

para a França que me deu a estabilidade económica que tenho neste momento. Tenho casa

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 57

própria que comprei por ter emigrado, porque se não emigrasse não a compraria de certeza”

(Beatriz, França, 51 anos).

O facto de as pessoas terem conseguido uma maior estabilidade económica, terem

casa própria (que é uma das marcas do emigrante) significa que a emigração teve um

aspecto positivo. Em situação migratória, o alcance de uma casa e de uma estabilidade

económica constitui um elemento que ajuda a manter vivo o projecto do regresso e é, por

vezes, o principal elo de ligação e de porto seguro com o país de origem.

Desta forma conseguiram alcançar uma ascensão social ascendente, de que não

tinham perspectivas antes de terem iniciado o seu projecto de emigração, salvo um caso,

porque já tinha origens na classe média alta.

Podemos dizer que relativamente a todos os nossos entrevistados que, sob o ponto

de vista económico, tudo lhes correu de feição: têm todos estabilidade económica. Todos

consideram que a situação económica do presente se deve ao facto de ter emigrado, como

tal, ao ganho obtido aquando da estadia num outro país.

Resumindo, é invocada a independência, a autonomia e a liberdade económica

conquistada por todos eles.

1.2 - Valores e mudança cultural

Vamos de imediato, aportar no tema dos valores, acerca do qual abordaremos

alguns pormenores interessantes.

Iniciaremos por falar acerca de como os nossos entrevistados se sentem após terem

emigrado: o que alterou na sua vida e modo de ver a vida, qual a mudança ao nível dos

seus valores. Vejamos os seguintes depoimentos:

“Se calhar se tivesse ficado em Portugal não seria uma pessoa tão atenta às

necessidades dos outros. O facto de poder ajudar, consegui pôr em prática os valores que eu já

tinha comigo porque acredito que esses valores nascem connosco (…). Penso que nesse sentido

me sinto uma pessoa diferente após a emigração. Sinto-me mais rica, sinto que cresci como ser

humano. Além da língua que aperfeiçoei e a cultura diferente com que convivi(…). E, outro

pormenor a ter em conta, na minha opinião, quem emigra um dia fica com uma mentalidade

mais aberta, tornam-se pessoas mais pró activas. Desde que estejamos abertos à outra cultura

com que convivemos podemos interiorizar em nós coisas diferentes e mais ricas. A mentalidade

de quem fica sempre em Portugal é muito diferente da mentalidade de quem emigra um dia.

Penso que expandi os meus valores” (Guilhermina, Luxemburgo, 50 anos).

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 58

“Sinto que mudei em todos os sentidos. Francamente, foi muito enriquecedor para mim.

Se tivesse continuado em Portugal hoje em dia seria uma pequena burguesa. Teria que ter

„mulher-a-dias‟, iria ao cabeleireiro todas as semanas, era, talvez, menos humana, mais

superficial e mais materialista. E, o facto de ter vivido noutro país, levou-me muitas vezes a

pensar: “Porque é que eles reagem assim?”. Eu hoje, se calhar, entendo a situação das outras

pessoas, não faço um juízo logo à primeira impressão da outra pessoa, tem é de haver motivo

para que a pessoa seja julgada dessa forma (…).

Sou muito melhor Pessoa hoje do que se tivesse vivido toda a vida em Portugal. Eu teria

ficado dentro da minha „concha‟ (…). Acredito que qualquer pessoa depois de emigrar se torne

uma pessoa diferente. (…) Eu tentei assimilar o que mais me interessava da cultura sueca. (…)

Assistia aos debates parlamentares na televisão, com o Olof Palme, e adorava aquilo e aprendi

muito naquilo.” (Francisca, Suécia, 60 anos).

“Eu aprendi muito! Tenho outros horizontes que não teria se tivesse ficado em Portugal.

Aliás, eu vejo o mundo de outra maneira do que as pessoas daqui vêem. Porque em França é um

mundo aberto, é outra cultura, realmente é outro mundo, são pessoas muito mais abertas, são

pessoas desinibidas, não há títulos, somos todos iguais. Sinto-me uma pessoa diferente após a

emigração. Eu não me consigo integrar com esta mentalidade daqui da aldeia.

No sentido de eu ser uma pessoa que acha que a liberdade é importante para todos os

seres humanos. E aqui na aldeia as pessoas sufocam-me, querem saber tudo, seguem os nossos

passos. Eu sou uma pessoa muito frontal, e aqui não aceitam a frontalidade. Sempre me habituei

a dizer aquilo que sentia, aquilo que penso, e aqui não se pode. Aqui não aceitam. Não sei lidar

com esta gente. Quando dizemos alguma coisa de verdade, as pessoas não aceitam. Mesmo a

nível político, não se pode dizer o que se pensa, às vezes penso que até estamos numa ditadura.

Eu sinto que onde eu estava, eu podia dizer o que sentia e pensava.

Sempre dizia, eu não quero ser francesa, não quero ser como os franceses, mas, no

fundo, à força de lá vivermos começamos a ganhar hábitos como eles. Há coisas que adquirimos

aquando da convivência com outras culturas, com outras pessoas.

Foi uma convivência mesmo pluricultural, isto foi muito enriquecedor. Há hábitos que

adquirimos aquando da convivência com outras culturas” (Armanda, França, 59 anos).

“Como fui para um país onde a forma de encarar a vida é diferente daqui, fui de certa

forma influenciado. Sinto que mudei depois de ter emigrado. Sinto que adquiri outros valores,

que não tinha até ter emigrado.

Sinto que há um “desembocar de ideias”, o facto de ter saído de Portugal. Sinto que me

abri um pouco ao mundo (…)” (João, Suíça, 48 anos).

“Tornei-me uma pessoa diferente. Tornei-me mais atento às pessoas. O facto de sair de

um país e entrar noutro temos de aprender uma nova língua e nesse sentido fiquei mais rico.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 59

Tornei-me uma pessoa diferente em muitos aspectos. Acho que adquiri outros valores, outros

hábitos, outra postura na vida” (Ernesto, França, 62 anos).

Quando no decurso da nossa entrevista é abordada esta questão, as intervenções dos

entrevistados vão todas no sentido de alteração de valores, de abertura de horizontes,

abertura de mentalidades, de enriquecimento pessoal e cultural aquando da estadia noutro

país. Daqui se conclui que, convivendo com outras culturas, outras sociedades, outros

grupos, os valores que servem de matriz aos comportamentos levam a uma nova

percepção sobre a diferença, que vai influenciar a identidade individual e cultural. Com

uma ampliação de valores, os emigrantes adquirem outros hábitos e adoptam novas

práticas sociais e culturais.

Podemos, igualmente, verificar que a estadia no país de emigração que os recebeu

lhes deu a possibilidade de melhorarem não só a sua situação a nível material, mas,

também a possibilidade de entrarem em contacto e aderirem a outros modos de vida, a

outro tipo de relações pessoais e a valores mais congruentes com a cultura urbana e a

modernidade.

Outro ponto a ser debatido são as diferenças, sentidas pelos nossos entrevistados,

entre a sociedade de origem (a portuguesa) e a sociedade de acolhimento. Dando a

palavra aos nossos interlocutores:

“Em termos económicos lá é melhor, os ordenados são melhores.

Na parte cultural é um bocado complicado, não é bem fácil. Enquanto nós portugueses

falamos todos a mesma língua, embora com os nossos regionalismos, lá em Espanha uns

entendem-se bem outros não, uns falam catalão, outros falam castelhano, lá há muita mais

rivalidade, há mais diversidade de linguagens” (Hélder, Espanha, 37 anos).

“As pessoas em França são muito mais simples. Não fazem tanta distinção, nem

diferenciação entre as profissões. Aqui temos de tratar as pessoas todas por Doutores, quando

têm licenciatura. Lá há mais civismo do que cá, as pessoas são mais humanas. Na França

cumprem-se horários, há mais pontualidade do que cá. Há um melhor acolhimento por parte

das pessoas. Aqui há mais burocracia quando se quer tratar de algum assunto. Na França há

mais ajudas para com as pessoas” (Carlota, França, 57 anos).

“Penso que a França é um país muito superior ao nosso em muitos aspectos. Os

franceses são muito acolhedores, simpáticos, tratam muito bem os portugueses. Vê-se pelo

ordenado mínimo que há em França e o ordenado mínimo que vigora em Portugal.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 60

Em França era outra gente. Pessoas muito boas. Os patrões eram mais sensatos, havia

um relacionamento mais aberto. Na minha opinião, até o sistema político é mais limpo, é tudo

mais às claras. Não existem tantas cunhas, pelo menos que nos apercebêssemos” (Dinis, França,

60 anos).

“Na Suíça as regras são mais rígidas, há mais civismo. Uma autoridade se vê alguém a

deitar lixo para o chão ou qualquer coisa estão logo em cima.

Lá há mais igualdade entre as pessoas, não há cunhas. Sejam amigos ou não as regras

são para cumprir” (Ivo, Suíça, 57 anos).

“Não posso dizer quais são as diferenças todas…são tantas que nunca mais acabava. A

nível cultural não há qualquer comparação possível. Na Suécia o nível cultural em geral é muito

mais elevado. A forma de estar das pessoas na Suécia é outra, o civismo é outro. Esta

impunidade de certos grupos e classes de pessoas não existe na Suécia” (Francisca, Suécia, 60

anos).

Ao lermos os diversos depoimentos reparamos que há um aspecto comum: o de que

há nas diferenças apontadas, um claro sentido de superioridade do país de emigração, a

nível cultural, cívico, normas sociais, monetário, sistemas de valores, burocracia, modos

de vida, organização dos sistemas de saúde e serviços sociais. Trata-se de comparar o que

viveram anteriormente no país de acolhimento e aquilo com o que se deparam em

Portugal quando regressam. Neste sentido, constatamos o que “não se deve perder de

vista que, em geral, o emigrante português reconhece uma posição de superioridade aos

países da Europa onde trabalha, em relação a Portugal, em termos de desenvolvimento

económico e social” (Antunes, 1981: 22). Nota-se que muitas das atitudes e normas

interiorizadas, durante o período de estadia no país de acolhimento em termos de

referência têm tendência a manter-se e a sobressair.

Embora Portugal tenha sofrido bastantes alterações nos últimos tempos, em termos

evolutivos, estas não são suficientes comparadas com as dos países que os acolheram.

Isto leva-nos a perceber que se trata da confrontação de certos valores interiorizados em

contexto migratório e a própria realidade com que agora se encontram na sua terra de

origem. Verificamos, desta forma, que tentam adaptar-se ao novo meio social, mas

continuam a valorizar e a adoptar certas práticas relacionadas com outras culturas e

outros modos de vida que ainda lhes são familiares, pelo menos a nível simbólico.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 61

Como vimos nos testemunhos, atitudes desta natureza podem verificar-se também

na avaliação de mentalidades e também no sentido da relação com os outros indivíduos

na sociedade, independentemente da sua condição social.

Há mesmo quem se pronuncie em relação a um fechamento da sociedade de origem

por oposição à abertura da sociedade de acolhimento:

“Aqui em Portugal as pessoas são mais fechadas, as pessoas que estão cá são diferentes

e é muito difícil puxá-los para actividades na comunidade, são mais reservados” (Guilhermina,

Luxemburgo, 50 anos).

“Eu dou-me bem com todos, mas a corrente não passa bem. Estou desfasada com a

maneira de ser das pessoas daqui da aldeia. As pessoas não evoluíram desde a altura em que eu

emigrei. Conforme eram na altura em que eu era jovem, assim continuam. Sempre pensei que

fosse tudo mudar com o passar dos anos, mas as mentalidades não alteraram. Acho que ainda

está pior. É difícil lidar com as pessoas.

Em França recebíamos muitos amigos em casa, mas aqui não se pode.

Lá está, nós temos uma outra abertura do mundo, uma outra visão, outra mentalidade,

outro comportamento, que aqui não existe. Porque sofremos enquanto estivemos fora do país, e

isso faz com que sejamos muito mais dados, mais amigos, e as pessoas não entendem isso”

(Armanda, França, 59 anos).

Podemos dizer que estão em confronto processos civilizacionais distintos, quando

nos referimos a uma ou a outra sociedade, ou a qualquer meio e condição social. Ao

longo dos testemunhos, podemos reparar que em situação de regresso se notam processos

de (re) adaptação e isto faz com que surjam uma quantidade de confrontações. Trata-se,

por isso, de colocar em questão as práticas e os valores interiorizados anteriormente e

todos aqueles com que de momento têm de se confrontar.

Mas é de referir um facto importante: tendendo a conviver num universo de duplas

referências o que acaba mais por sobressair são as contradições e não tanto os elementos

de inter-relação. Deixar um país e vir para outro, mesmo que este segundo seja o país de

origem, não significa esquecer o de acolhimento, mas antes assumir a partida e suportar

as consequências daí resultantes. Alguns testemunhos revelam alguma dificuldade em

fazer uma certa continuidade entre o que viveram antes de emigrar, durante a emigração,

e depois de regressar. Isto é particularmente verdade quando apontam diferenças de

mentalidades e aberturas ao mundo diferentes. Subentende-se que regressaram para um

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 62

país que não conheciam suficientemente, apenas conheciam pelo contacto nos períodos

de férias e pelos comentários dos vizinhos, amigos e familiares que cá estavam.

Todos os testemunhos que recolhemos, permitem-nos dizer que as relações de

convivência entre os que emigraram e os que ficaram são de boa convivência social,

mesmo que grande parte dos nossos interlocutores considerem que nas sociedades de

acolhimento as relações pessoais são mais saudáveis, mais intensas e mais abertas. Isto,

pode dever-se ao facto de tentarem preservar alguns predicados que representam como

mais apropriados das sociedades para onde emigraram e são entendidos como situando-se

num nível de desenvolvimento social e cultural mais elevado.

Não menos importante de referir, é que os nossos entrevistados mostraram-se

desiludidos, tristes e, até revoltados perante as situações da realidade com que se

depararam e, com que se tiveram de defrontar com o passar do tempo, aquando do

regresso.

Vamos então, no passo seguinte, falar acerca da importância que os nossos

entrevistados dão à sua família.

Todos eles, sem excepção colocam a família acima de tudo, que tem para eles um

valor inestimável. Como podemos comprovar com os testemunhos que se seguem:

“Valorizo mais a minha família porque a minha família é o meu pilar (risos de emoção).

É com eles que recarrego as minhas baterias, e que desabafo. São os meus amigos, porque hoje

em dia há uma falta enorme dos valores da amizade (…). A família é um apoio muito

importante. Eu com os meus filhos é uma loucura e agora com os netos ainda pior. A família é

um refúgio muito grande. E quando estamos fora de Portugal a ligação com a família ainda se

torna muito mais importante. Porque temos uma nostalgia, uma saudade…a saudade é terrível.

Lembro-me que quando vinha cá de férias, e depois voltava a França, quando entrava no avião

ficava triste…mas quando o avião levantava era do pior, eu soluçava de tanta dor…são

momentos que nem quero recordar (emocionou-se). É uma dor terrível, que sufocava. Eu posso-

lhe dizer que tinha as pernas em França e todo o resto do corpo em Portugal, porque eu tinha

cá os meus filhos a estudar, também é preciso dizer isso” (Armanda, França, 59 anos).

“Eu gostava muito do meu trabalho, da minha arte. Mas o que eu valorizo mais na minha

vida e sempre valorizei é a família. Até porque foi pela minha família que eu emigrei. Foi para

lhes dar o melhor que eu emigrei. Porque a minha família é tudo para mim. É a minha vida. É o

mais importante das nossas vidas. Tudo acaba e a família permanece sempre. É o que nos

mantém vivos ao longo da vida” (João, Suíça, 48 anos).

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“Valorizo muito mais a minha família porque, é o meu sangue é a minha vida. Estava

sempre em contacto com a família por telefone” (Ivo, Suíça, 57 anos).

“Valorizo tudo, mas mais a família. Afinal de contas é com a família que eu vivo, a minha

família representa tudo para mim” (Ernesto, França, 62 anos).

O que ressalta é a extrema importância dada à vida familiar. São valorizados os

comportamentos intrafamiliares e as redes de relações familiares.

Após o período emigratório há uma sobrevalorização da família, em alguns casos

até antes. Depois do esforço realizado aquando da estadia em outro país, usufruindo da

estabilidade económica daí resultante, nota-se uma dedicação exclusiva ou quase

exclusiva à família. A família é vista como o projecto mais determinante da própria vida.

O facto de muitos terem regressado após a reforma dá-lhes a possibilidade de terem

uma vida mais tranquila, não tão sujeita a horários a cumprir, como os do

emprego/trabalho nos países de emigração e, desta forma, dedicar mais tempo às suas

famílias.

Ainda a nível familiar, podemos questionar-nos acerca de quem são os verdadeiros

protagonistas, a nível familiar quando se coloca a questão do regresso. Isto porque alguns

dos nossos entrevistados disseram que vieram para Portugal por causa do prosseguimento

dos estudos dos filhos, para estes não se atrasarem a nível escolar. Conclui-se, então, que

as decisões são tomadas a nível global, o bem-estar dos filhos são englobados nas

decisões dos pais.

Daí que as adaptações necessárias e cedências relacionadas com o regresso, passem

além do plano individual, por estratégias familiares, propendendo a privilegiar a família

como um todo. De facto, a família é uma noção nunca fragmentada, na medida em que se

noutros casos os pais estão cá definitivamente, como é o exemplo da nossa entrevistada

Carlota, e os filhos estão no país de emigração, mesmo a distância que se interpõe entre

eles não leva à danificação da família porque passam o tempo entre Portugal e o país de

emigração com o intuito de visitarem os filhos e os netos.

Deparamo-nos com dois comportamentos. Nuns casos, os pais vêm para Portugal

pensando no percurso escolar dos seus filhos e em proporcionar-lhes uma situação mais

confortável no que respeita ao investimento nos estudos a nível do sistema escolar

português. Noutros casos, estando os filhos no país de emigração, os pais procuram

intensificar os contactos entre os seus filhos, através de visitas regulares.

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Podemos, por conseguinte, dizer que a solidariedade familiar inter-geracional é

muito consistente em contexto de emigração. A relação de pais e filhos tendem a

intensificar-se porque, com frequência, os projectos familiares empreendidos pelos pais

são a pensar na preparação do futuro dos filhos. Mesmo os que não vieram para Portugal

para continuação dos estudos portugueses dos seus filhos, têm a compensação de verem a

família reunida.

1.3 - Os dilemas identitários

Neste ponto do capítulo vamo-nos debruçar sobre a identidade dos emigrantes.

Encontramos, pelos diversos testemunhos, uma condição de ambivalência na identidade e

dupla pertença. Há uma existência identitária em transformação e recomposição. Como

veremos nos vários testemunhos:

“Eu acho que uma pessoa desde que emigra nunca mais é uma coisa nem outra. Às vezes,

as minhas colegas falavam dos estrangeiros e, afinal, eu era a única estrangeira no Infantário.

Então elas diziam: “Oh, tu és 90% sueca e 10% portuguesa”. E, eu respondia: “Eu sou 90%

portuguesa e 10% sueca”. Quando cheguei cá a Portugal, cheguei à conclusão que elas tinham

razão.

Uma pessoa que emigre, um dia, nunca mais é feliz, nunca mais deixa de comparar.

(Francisca, Suécia, 60 anos).

“Além de saber que sou Português sinto-me as duas coisas. Se me dessem a optar não

sei… sinto-me Português e Espanhol. Embora um pouco mais Português” (Hélder, Espanha, 37

anos).

“Sinto-me português, não desisto de Portugal. Mas não me esqueço da Suíça” (João,

Suíça, 48 anos).

“Sinto-me mais francesa que portuguesa. Portugal é sempre Portugal, é o meu país. Mas,

no meu íntimo sinto-me francesa” (Carlota, França, 57 anos).

“Sinto-me português desde que nasci. Mesmo gostando muito da França e ter-me custado

imenso ter deixado esse país, sempre me senti português” (Ernesto, França, 62 anos).

“Sinto-me só Francesa. É esquisito porque quando estamos em França somos vistos

como imigrantes e quando vimos para cá, para Portugal, somos os emigrantes. Não somos de

lado nenhum” (Beatriz, França, 51 anos).

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Como podemos constatar há todo o tipo de respostas. Daí se depreende a

ambivalência das identidades. Em alguns casos, emerge a manifestação da ideia de que há

uma relação com a identificação nacional. Noutros casos, nota-se que há uma valorização

do país de emigração, já nem se identificam como portugueses. Outros ainda, não se

sentem de parte nenhuma. Situam-se num vazio identitário.

Estas ambiguidades podem provocar crises identitárias. Como estes indivíduos, por

nós entrevistados, estiveram em contexto de emigração, vão fazendo adaptações,

modificações, vão aceitando elementos quer sociais, quer culturais de uma e de outra

cultura e, por isso, é natural sentirem estes sentimentos ambivalentes.

Em situação migratória, há sempre abertura para novos possíveis, para M. Eliade

(1965, 104 apud Leandro, 2002-B: 43) “o passado não é mais que a prefiguração do

futuro, Nenhum acontecimento é irreversível, nenhuma transformação é definitiva”. É na

dinâmica das mudanças inerentes que dá renovados sentidos, isto tanto para aqueles que

ficam como para aqueles que emigram e um dia regressam. Mesmo que os ritmos de

mudanças sejam diferentes no caso de uns e de outros. As mudanças sociais são resultado

das rupturas provocadas pelo reencontro de duas sociedades. Tendo isto em conta, a

identidade adquirida em contexto migratório não é análoga ou comparável ao passado. E

esta identidade adquirida ou dita, em recomposição permanente, torna-se complexa. Isto

porque os que cá ficaram olham para os emigrantes e dizem que não são os mesmos, e

também não são quem pensam ser. Mas a experiência emigratória serve mesmo para isso,

para não se permanecer os mesmos. Contudo, convém que esta nova identidade não

embarace ou provoque interrogações. Com certeza que a identidade ambicionada é

componente essencial para esta reconstrução identitária.

É, portanto, sob a égide desta procura de identidades que se dá uma reunião de

conveniências, de perspectivas, de objectivos entre os que ficaram e os que emigraram,

sob o apoio de uma afirmação social. É possível esta convivência, todavia geram muitas

ambiguidades entre as identidades que já se reconhecem e, pretendem adquirir.

O facto de regressarem a Portugal, tratou-se nuns casos de vir encontrar «raízes»,

mesmo que estas sejam, também, objecto de transformação, uma vez que o solo que as

sustenta está também ele sujeito a várias modificações. Noutros casos, trata-se de as (re)

descobrir e dominá-las como suas, o que nem sempre se mostrou fácil.

Parece que a vinda para Portugal acentuou a vivência quotidiana da multiplicidade

de pertenças. Sendo que, é importante dizer isto, quando se é emigrante traz-se consigo a

imagem do país de origem, já quando se regressa transporta-se nada menos do que a

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 66

imagem do país de emigração. Daí, as identidades procederem a novas reconstruções

individuais, e por vezes, até em família. Estas reconstruções podem ocorrer em

detrimento de alienações e resignações.

Alguns dos nossos entrevistados tiveram dificuldades em readaptar-se e reinstalar-

se, por isso se consideram como cidadãos do país de emigração embora estejam cá em

Portugal. Poderá dizer-se que o que parecia claro e bem definido nem por isso o é.

Integra, portanto, uma indefinição e a realização do sonho (voltar à sua terra de origem)

não parece ter reunido as condições necessárias para uma harmónica relação entre o que

viveram antes e o que estão neste momento a viver. Daí que a ambivalência surja sempre

entre o cá e o lá, entre o antes e o agora. Ao longo do processo de reinstalação

rapidamente se apercebem das diferenças entre os dois países e isso vai-se reflectir na

edificação da sua identidade.

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Conclusão

“Se os meus olhos estão perfeitos, como diz, então

por que estou eu cego? Por enquanto não lhe sei dizer,

vamos ter de fazer exames mais minuciosos, análises,

ecografia, encefalograma”

José Saramago, Ensaio sobre a Cegueira (1995)

Gostaria de iniciar esta curta explanação com a frase de Pierre Bourdieu (apud

Gonçalves, 1996: 19): “Não há nada que classifique mais alguém do que as suas

classificações”. Ora, é com esta expressão sociológica em mente que irei proceder, como

o último passo deste trabalho, a algumas classificações ou como queiramos dizer, umas

conclusões gerais acerca dos temas em debate: emigração para a Europa a partir dos anos

1960 do século XX, mobilidade social, identidade e valores.

O principal objectivo desta investigação foi procurar apreender as singularidades

dos processos de reintegração social de um reduzido número de emigrantes, aos quais

realizamos entrevistas, num contexto social muito concreto, em concelhos da região do

Minho, como os concelhos de Amares, Vieira do Minho, Famalicão e Braga advindos de

países da Europa, que passo a citar: França, Suíça, Luxemburgo, Espanha e Suécia.

Será importante dizer que as razões do regresso destes emigrantes e certos

membros do elenco familiar foram diversificadas. Foi em alguns dos casos por causa dos

percursos escolares dos filhos, para que continuassem os seus estudos em Portugal;

noutros por terem atingido a idade da reforma; noutros por motivo de doença ou

invalidez; e ainda por terem atingido o objectivo a que se propuseram inicialmente,

amealhar o dinheiro que consideravam suficiente e, a construção de uma casa. Um dos

casos apontou conjuntamente com os percursos escolares dos filhos o início do

surgimento de alguns movimentos nacionalistas no país de emigração.

Verificamos que ao longo das suas trajectórias migratórias, sobressaem três

elementos que são cruciais na compreensão do trajecto emigratório e do regresso e as

várias implicações sociais que o envolvem. Para as definir, procurámos ter, sobretudo, em

conta os factores da mobilidade social, identidade e valores.

Constatamos, pois, através da análise dos modos de discurso dos emigrantes

entrevistados, haver características particulares ao longo destes processos migratórios que

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 68

passamos a apontar. A ter em conta que algumas destas características são de carácter

mais geral, outras referem-se a aspectos mais peculiares.

Embora haja diversidade de espaços de emigração, diferentes países, há aspectos

que são comuns aos nossos entrevistados. Estes prendem-se essencialmente com aspectos

relacionados com a mobilidade social, com o motivo pelo qual emigraram. Neste último

caso, as dificuldades económicas, tentativa de melhoria de vida, construção de uma casa e

a falta de perspectivas no país de origem são particularmente evocadas, embora haja

algumas excepções, como por exemplo, tentativa de dar melhor futuro aos filhos, por

amor (sendo que, neste caso, um dos cônjuges se encontrava no país de emigração) e,

para conhecimento de outras culturas e costumes. Este pensamento, de melhoria do nível

de vida, tem subjacente uma ideia de mobilidade social ascendente, porque permitiu-lhes

idealizar aspirações para um nível de vida superior.

Relativamente à sua realização profissional, todos sem excepção se dizem pessoas

realizadas, mesmo que tivessem ido para o país de emigração desempenhar funções de

inferior prestígio social. Associado a esta questão está a „vontade de vencer‟, e para isso

todo o esforço é compensado desde que se consiga atingir os objectivos a que se haviam

proposto.

Uma das características que ressalta, logo que se aborda a valorização ou não da

formação escolar dos seus filhos é o facto de todos lhe atribuírem uma valorização

primordial. Isto está associado, também, a uma forma de acederem à mobilidade social,

sendo que os filhos poderão ter melhores empregos e como tal uma subida de estatuto

social.

Relativamente à estabilidade económica, todos se dizem mais estáveis a nível

económico aquando do projecto migratório e, atribuem ao facto da sua estadia num país

de acolhimento. Mais uma vez, está aqui patente a ascensão social ascendente.

Acerca da percepção sobre os valores, são de referir as mudanças operadas nos

nossos entrevistados após o projecto migratório. Todos apontam uma alteração dos seus

valores, uma abertura de horizontes, um enriquecimento pessoal e cultural, resultado da

permanência num país diferente. O facto da convivência com outras culturas, outras

sociedades e a adesão a outros modos de viver, levou a uma alteração das suas crenças e

como tal de alguns comportamentos.

Simultaneamente, sob o ponto de vista das diferenças entre o país de origem e o

país de emigração sentidas pelos nossos entrevistados, todos apontam que há várias

diferenças, embora no sentido de superioridade do país de emigração. Estas diferenças

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 69

dizem respeito ao nível cultural, monetário, cívico, sistemas de valores, burocracia,

normas sociais, modos de vida e organização dos sistemas quer de saúde quer de serviços

sociais. Estão aqui patentes a confrontação de valores, ou seja, os valorizados

anteriormente e interiorizados, e aqueles com que neste instante têm de se confrontar.

Passamos agora, para a importância que os nossos entrevistados atribuem à

família. Todos, sem excepção, dão importância máxima à família. Os comportamentos

intrafamiliares e as relações familiares são muito valorizados pelos nossos interlocutores.

A solidariedade entre os membros familiares é muito forte em contexto de emigração. A

relação entre pais e filhos tem tendência a ser muito sólida e, isto tem em conta a

programação do futuro familiar que tem em consideração a prosperidade dos filhos.

Finalmente, como último dos três factores a ser, aqui, debatido quanto às formas

como os emigrantes se posicionam perante o regresso, temos a identidade. À questão

colocada se se sentiam portugueses ou do país de emigração, obtivemos uma

multiplicidade de respostas. Enquanto, uns se sentem portugueses, outros não se sentem

de lado nenhum, outros sentem-se como que se fossem do país de emigração, portanto

isto está relacionado com as referências espaciais, culturais e simbólicas que tendem a

multiplicar-se. Geram duplas pertenças e uma ambiguidade que pode provocar crises de

identidade. No regresso ao país de origem tentam encontrar-se a si próprios mas acabam

por perder-se no emaranhado de alterações e modificações que entretanto surgiram no

país de origem. A vinda para o país de origem não deixa de ser outra migração, porque

trazem consigo a imagem do país para onde emigraram. Há, portanto, uma nova

adaptação, uma nova instalação no país de origem. Daí que se constatem as ambiguidades

de identidade e a dupla pertença.

Com este conjunto de perspectivas, poder-se-á dizer que mediante os discursos

dos emigrantes, aqui analisados, trata-se de sujeitos que adquirem traços singulares e até,

em alguns casos, comuns, relacionados com a trajectória migratória em contexto europeu

que obriga a várias mobilidades, rupturas, reencontros, e transformações espaciais,

sociais e culturais. Isto tanto na sociedade para onde emigraram como na sociedade de

origem para onde regressaram.

Nestes emigrantes, aqui analisados, estão incrustados traços culturais e sociais

diferenciados que ao longo do seu percurso de vida foram dominando as suas

características. No caso dos emigrantes que entrevistamos, são pessoas que parecem

pautar-se por valores e aspirações que vão no sentido de uma maior influência de aspecto

urbano e modernidade que lhe está associada.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 70

Algo de muito importante a referir, é que se notou ao longo das entrevistas que o

grupo feminino entrevistado tem uma mentalidade mais aberta às mudanças a nível social

do que o grupo masculino, revelando mais sede de conhecer novas culturas, de adquirir

outras competências e de incorporar na sua relação com a família e a comunidade os

valores a que aderiu pelo percurso migratório.

Terminaremos este trabalho com uma breve reflexão sobre as potencialidades e as

limitações da investigação realizada. De entre as potencialidades que podem ser

apontadas, não se pode deixar de fazer referência ao facto de a investigação estar ligada a

um estudo acerca de um tema genérico que pode ser explorado sob várias vertentes. Um

trabalho académico como o que aqui se apresenta tem uma natureza essencialmente

individual, mas neste caso teve subjacente um contributo colectivo, que são os

testemunhos dos emigrantes entrevistados, que em muito enriqueceram a reflexão.

As conclusões a que se chegou neste estudo não pretendem enunciar

generalizações, mas essencialmente enriquecer os resultados obtidos.

Uma outra potencialidade que se pode assinalar está relacionada com a opção

metodológica. Pretendeu-se evidenciar como a metodologia qualitativa, assim como o

recurso a diferentes técnicas de recolha de dados, possibilitaram a apreensão e análise de

informação muito rica acerca das percepções dos actores sociais em estudo.

Por último, uma das potencialidades prende-se com a conversação aberta e

espontânea com que decorreram as entrevistas aos emigrantes envolvidos neste estudo.

Para nós isto funcionou como um estímulo de onde poderão resultar novos pontos para

outras investigações e portanto, deixa-se aqui uma janela aberta para esta temática.

Não menos importante, é reconhecer as limitações deste trabalho. As principais

limitações estão relacionadas com a situação de iniciação na função de investigação, em

que todas as dificuldades parecem insuperáveis, mas que na maioria das vezes podem ser

superadas e, acima de tudo, apresentam-se como uma mais-valia, sendo que geram novas

aprendizagens. Além disso, a conciliação do trabalho de investigação com a actividade

profissional nem sempre é simples de se conseguir. Contudo, é um trampolim para outras

aprendizagens em termos de organização de tempo e da gestão das múltiplas tarefas.

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Mestrado em Políticas Comunitárias e Cooperação Territorial 75

ANEXOS

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1

Guião de Entrevista aos Emigrantes que regressaram ao Minho

O Departamento de Sociologia do Instituto de Ciências Sociais da Universidade do

Minho (ICS-UM) em parceria com a Universidade de Vigo encontra-se a desenvolver o

Mestrado Internacional e Interuniversitário em Políticas Comunitárias e Cooperação

Territorial. O presente guião de entrevista destina-se ao desenvolvimento de um estudo

acerca da Mobilidade Social, Identidade e Valores: o regresso de Emigrantes no Minho.

Trata-se de um estudo que pretende recolher informações complementares

indispensáveis ao aprofundamento deste tema, em particular junto de emigrantes que

regressaram ao Minho.

É um estudo que pretende analisar tendências de transformação das mentalidades,

identidades e valores dos emigrantes, visa realizar um diagnóstico e um balanço

prospectivo que permitam, por um lado, conhecer o mais exaustivamente a situação

presente dos emigrantes que regressaram ao Minho e, por outro lado, suscitar uma

reflexão sobre os impactos das transformações/alterações no curso das suas vidas.

Visto que a sua opinião é essencial para a realização deste estudo, pedimos a sua

colaboração para aceitar realizar esta entrevista. A informação recolhida será utilizada

apenas para fins desta investigação. Asseguramos a confidencialidade das suas

respostas, já que os resultados serão apresentados de modo a se excluir a identificação

individual.

Agradecemos a sua colaboração!

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2

Identidade

1 - Em primeiro lugar pedia-lhe que me falasse um pouco da razão pela qual emigrou.

Quais as perspectivas de vida que tinha para ter tomado essa decisão?

2 - - Houve alguma situação, nos diferentes momentos da sua vida de emigrante, que se

arrependeu de ter tomado essa decisão? Qual e porquê?

3 - No seu entender, quais os impactos que provocaram em si a estadia noutro país?

4 - Face a tudo o que disse sente-se Português ou _____________?

______________________________________________________________________

Valores

1- Neste momento, o que é que valoriza mais na sua vida? A parte profissional ou a

parte pessoal/família? Explique, por favor, o porquê da sua resposta.

2 - Pressupondo que existe uma Associação de Emigrantes Portugueses no país para

onde emigrou. Qual a importância das comunidades/associações de emigrantes no seu

percurso de emigrante?

3 - Em termos gerais, onde empreendeu mais ao longo da sua vida? No amealhar de

dinheiro ou na formação escolar dos seus filhos?

4 --Sente-se uma pessoa diferente após a emigração? Porquê? Em que sentido? O que

mudou?

______________________________________________________________________

Mobilidade Social

1 – Diga-me, por favor, como se sente, após ter emigrado, relativamente a 3 aspectos

que passo a mencionar: - realização profissional;

- estabilidade económica;

- formação escolar

2 – Na actualidade tem casa própria?

3 – Como se sente, neste momento, aquando do seu regresso, na sua

aldeia/comunidade?

4 – Sente-se mais reconhecido pelos seus conterrâneos? De que forma isso se nota?

5 – Que contributo acha que dá hoje na sua aldeia?

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3

______________________________________________________________________

Diferenças culturais

1 - Na sua opinião, qual (ais) a (s) diferença (s) que nota entre Portugal e o país de

emigração?

Regresso

1 - Qual (ais) a (s) razão (ões) que o fizeram voltar a Portugal, à sua terra, ao Minho?

______________________________________________________________________

Finalização

1 - Em relação a tudo o que falamos tem algo a acrescentar que considere relevante?

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4

Caracterização do respondente

Género

Feminino

Masculino

Idade _______ anos

Estado Civil

Solteiro (a)

Casado (a) /Em União de facto

Divorciado (a)/ Separado (a)/ Viúvo (a)

Outro. Qual? ______________________

Habilitações Escolares próprias

Sem habilitações (analfabeto)

1º Ciclo do Ensino Básico (4ªclasse)

2º Ciclo do Ensino Básico (6ºano)

3º Ciclo do Ensino Básico (9ºano)

Ensino Secundário (12ºano)

Ensino Superior (Licenciatura/Bacharelato). Área de Formação?_________________

Ensino Pós-graduado (Mestrado/Doutoramento)

Outra. Qual? ______________

Habilitações Escolares dos pais

(Pai)

Sem habilitações (analfabeto)

1º Ciclo do Ensino Básico (4ªclasse)

2º Ciclo do Ensino Básico (6ºano)

3º Ciclo do Ensino Básico (9ºano)

Ensino Secundário (12ºano)

Ensino Superior (Licenciatura/Bacharelato). Área de Formação?_________________

Ensino Pós-graduado (Mestrado/Doutoramento)

Outra. Qual? ______________

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5

Profissão: ______________________________________

(Mãe)

Sem habilitações (analfabeto)

1º Ciclo do Ensino Básico (4ªclasse)

2º Ciclo do Ensino Básico (6ºano)

3º Ciclo do Ensino Básico (9ºano)

Ensino Secundário (12ºano)

Ensino Superior (Licenciatura/Bacharelato). Área de Formação?_________________

Ensino Pós-graduado (Mestrado/Doutoramento)

Outra. Qual? ______________

Profissão: ______________________________________

Habilitações Escolares dos filhos

Habilitações

Nº de filhos

Analfabeto 4ªclasse 6ºano 9ºano 12ºano Ensino Sup.

(Lic. Bacha.)

Pós-

graduado

Outra.

Filho 1

Filho 2

Filho 3

Filho 4

País de Emigração

Qual (ais) o (s) país (es) para onde emigrou? _______________________________

Ano de Emigração

______________________________________________________________________

Ano de Regresso a Portugal

______________________________________________________________________

Tempo Total de Emigração

______________________________________________________________________

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Entrevista Espanha – Hélder (37 anos)

Tópicos Conteúdo (Resumo da Entrevista)

Razão pela qual emigrou

Emigrei com a intenção de renovar a

minha vida. Para ter uma vida melhor.

Houve algum momento que se

arrependeu de ter emigrado

Nunca me arrependi.

Quais os impactos que provocaram

em si a estadia noutro país

Alterou muita coisa. Sinto que mudei a

minha maneira de ver as coisas, de ver a

vida. Consegui dar à minha família o

que precisavam e isso tornou-me um

outro homem, um homem mais

realizado.

Sente-se Português ou Espanhol

Além de saber que sou português, sinto-

me as duas coisas. Se me dessem a

optar, não sei…sinto-me Português e

Espanhol. Embora um pouco mais

português.

O que valoriza mais na sua vida, a

parte profissional ou a

pessoal/família

Ponho acima de tudo a minha família.

Além de ter emigrado e ter deixado a

minha família. Tive de lutar pela vida,

tive de ir ganhar dinheiro para melhorar

tudo.

Associações de emigrantes

portugueses, qual a importância no

seu percurso de emigrante

Estive em vários sítios da Espanha e não

havia nenhuma associação de

emigrantes portugueses. Só tive

conhecimento que existia em Madrid

um consulado. E, não senti falta das

associações. Sempre me senti bem

integrado.

Onde empreendeu mais ao longo da

sua vida, no amealhar de dinheiro ou

na formação escolar dos seus filhos

Se formos a ver empreendi nas duas.

Mas, mais na minha família. Dou tudo

aos meus filhos, em termos de formação

escolar, mediante as minhas

possibilidades.

Sente-se uma pessoa diferente após a

emigração, em que sentido

Penso que pelo facto de ter emigrado

me tornei uma pessoa diferente. Levou-

me a ver a vida de outra maneira, de

forma mais clara.

Como se sente em relação à sua

Realização Profissional

Sinto-me uma pessoa mais realizada

profissionalmente.

Como se sente em relação à sua

Estabilidade Económica

Sinto-me mais estável economicamente.

Como se sente em relação à sua

Formação escolar

Em Espanha fiquei com o diploma de

Gessista. Tirei uma formação de 90

dias. Gostava de ter tirado mais

formações em Espanha mas, tinha de ser

através da empresa. Em Portugal já

pensei tirar uma formação, mas ainda

não vi nada que me agradasse.

Na actualidade tem casa própria Tenho casa própria. Se não tivesse ido

para Espanha, se calhar, não teria.

Como se sente neste momento

aquando do regresso, na sua

comunidade

Sinto-me bem (franzir da testa).

Sente-se mais reconhecido pelos seus

conterrâneos

Sinto que por uns sim, outros não. Uns

começaram a perguntar porque é que eu

estava cá. Com alguma desconfiança.

Outros até me convidam para ir para a

França, ou para a Suíça.

Que contributo acha que dá hoje na

sua aldeia

Dou o meu contributo nas festas e

romarias na minha aldeia, com dinheiro.

Quais as diferenças entre Portugal e

Espanha

Em termos económicos lá é melhor, os

ordenados são melhores. Na parte

cultural, nós portugueses falamos todos

a mesma língua embora com

regionalismos, lá há mais rivalidade,

mais diversidade de linguagens.

Razão do regresso a Portugal Regressei a Portugal, apenas, porque

não tinha trabalho. Embora houvesse

saudades da família, eu sentisse que não

acompanhava o crescimento dos meus

filhos dava gosto chegar ao final do mês

e ver o ordenado.

Algo a acrescentar que considere

relevante

Não tenho nada a acrescentar.

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Entrevista Suécia – Francisca (60 anos)

Tópicos Conteúdo (Resumo da Entrevista)

Razão pela qual emigrou

Emigrei por amor. Porque o meu marido tinha ido para lá à aventura.

Houve algum momento

que se arrependeu de ter

emigrado

No princípio sim…houve muitos. Tive de me adaptar a tudo. Não sabia cozinhar,

não sabia engomar, não sabia fazer nada. Foi uma adaptação a um país

desconhecido, com uma língua diferente, embora eu dominasse o francês e o

inglês. Saí de casa dos meus pais, não tinha ninguém de família, não tinha

ninguém conhecido. De repente, vejo-me num país estranho, com uma pessoa que

me era praticamente estranha, sendo que nós tínhamos convivido pessoalmente

apenas uma mês e meio.

Quais os impactos que

provocaram em si a

estadia noutro país

Foi muito enriquecedor para mim. Se tivesse continuado em Portugal hoje em dia

seria uma pequena burguesa. Talvez, menos humana, mais superficial e mais

materialista.

Sou muito melhor pessoa hoje do que se tivesse vivido toda a vida em Portugal.

Tenho qualidades que não as teria, caso não tivesse ido para outro país.

Sente-se Portuguesa ou

Suéca

Uma pessoa desde que emigra nunca mais é uma coisa nem outra. Eu, quando

estava na Suécia, não me naturalizei sueca porque achei que se nasci portuguesa

haveria de morrer portuguesa. Hoje estou arrependida, porque ao ver o país como

está, preferia ser sueca.

O que valoriza mais na

sua vida, a parte

profissional ou a

pessoal/família

Valorizo as duas partes. A parte profissional porque sou muito profissional

naquilo que faço. A família é, para mim, muito importante, o mais importante,

porque é a minha vida. O que hoje valorizo mais é o relacionamento interpessoal.

Associações de

emigrantes portugueses,

qual a importância no seu

percurso de emigrante

Existia. Pequena, mas existia. Aquilo não apoiava ninguém de forma activa, a

nível de sociedade não apoiava ninguém. Para nós não era uma forma de nos

sentirmos em Portugal, embora para algumas pessoas acredite que sim, que

tivessem necessidade daquilo nesse aspecto. Realizavam-se aquelas festinhas,

sessões de fados, peças de teatro em português, as pessoas reuniam-se…nós

éramos sócios, fazíamos parte das direcções normalmente, mas eu também

prescindia daquilo! Realmente existiam, e era bom que existissem. Mas, se não

existissem não me fazia diferença.

Onde empreendeu mais

ao longo da sua vida, no

amealhar de dinheiro ou

na formação escolar dos

seus filhos

Eu empreendi mais na educação dos meus filhos. Em relação à formação escolar,

infelizmente, não foi aquela que eu lhes quis dar porque eles não quiseram aceitar,

porque não quiseram prosseguir os estudos.

Sente-se uma pessoa

diferente após a

emigração, em que

sentido

Sim, sem dúvida. Em todos os sentidos. Eu acredito que uma pessoa depois de

emigrar se torna uma pessoa diferente. As pessoas podem apreender mais ou

menos, tudo depende da sensibilidade de cada um. E podem tirar mais ou menos

proveito do que vivem noutro país, tudo tem um pouco a ver com a instrução,

com a cultura da pessoa, com a educação que a pessoa teve. Eu tentei assimilar o

que mais me interessava da cultura sueca. Se tivesse menos instrução haveria

muita coisa que me passava ao lado. Como acredito, por exemplo, que as pessoas

que não dominassem o sueco lhe passasse muita coisa ao lado. A mim não me

passavam porque eu dominava o sueco, tinha a preocupação de saber os porquês.

Como se sente em relação

à sua Realização

Profissional

A minha experiência profissional na Suécia foi do mais enriquecedor possível.

Preparou-me para outro tipo de coisas. A nível profissional foi muito

enriquecedor. Há uma coisa a salientar, eu fazia qualquer coisa com o mesmo

prazer. Hoje em dia, aqui em Portugal, tenho uma casa de molduras que me

realiza totalmente, porque posso dar asas à minha imaginação.

Como se sente em relação

à sua Estabilidade

Económica

A Suécia deu-nos muita estabilidade económica. Se não

estivéssemos estado na Suécia não tínhamos a estabilidade

que temos hoje. Não tínhamos aquilo que temos.

Como se sente em relação

à sua Formação escolar

Na Suécia pensei seguir o curso de Direito, não segui

porque quando podia não tinha bases suficientes da Língua

Sueca para ir para a faculdade. Depois, quando já

dominava a Língua, ainda frequentei um curso de

Interprete Social Oficial à noite. Mas, tive de desistir

porque o meu marido trabalhava por turnos. Tive de

desistir. Tive pena mas fiquei por aí.

Após ter vindo não tirei nenhum curso cá.

Na actualidade tem casa

própria

Sim, tenho casa própria. Que construímos pela emigração.

Como se sente neste

momento aquando do

regresso, na sua

comunidade

Sinto-me bem. Gosto muito de morar aqui.

Sente-se mais reconhecido

pelos seus conterrâneos

Sinto-me reconhecida. Sempre notei isso palas atitudes que

tinham para comigo. Uma senhora que era nossa cliente foi

connosco visitar a Suécia quando fomos lá em 2003.

Portanto, a partir desse momento vi que estava

perfeitamente integrada.

Que contributo acha que

dá hoje na sua aldeia

Contribuo. Quando abri esta casa de molduras muitas

pessoas que se tinham reformado vieram ter comigo para

eu lhes ensinar a fazer Arraiolos, Ponto de Cruz e Técnicas

de Pintura. Levava-lhes uma quantia irrisória por esses

cursos. A minha segunda-feira, que é o meu dia de folga,

dou cursos gratuitos aqui em casa.

Quais as diferenças entre

Portugal e a Suécia

Não posso dizer quais são as diferenças…são tantas que

nunca mais acabava. A nível cultural não há qualquer

comparação. Os portugueses são mais semelhantes na

maneira de falar, agir e de estar com os suecos do que os

restantes povos do Sul da Europa. Não existe na Suécia,

esta impunidade de certos grupos e pessoas, de certas

classes. O civismo é outro, e a forma de estar das pessoas

suecas é completamente diferente.

Razão do regresso a

Portugal

Naquela altura o meu filho tinha 13 anos e a minha filha 9

anos. Se eu não voltasse naquela altura nunca mais os

trazia, e eu não queria estar cá e lá. Depois, começou a

existir na Suécia um Movimento Nacionalista Sueco – “a

Suécia para os Suecos”. E, eu e o meu marido começamos

a pensar que nós éramos emigrantes por opção, mas os

nossos filhos não. Eles nasceram lá por nossa culpa, aquela

era a terra deles. Então, começamos a pensar se eles

sofressem qualquer tipo de represálias por qualquer atitude

que nós tomamos estava errado. E, viemos naquela altura.

Algo a acrescentar que

considere relevante

Apenas tenho a dizer que quem emigrou um dia, nunca

mais é completamente feliz em lado nenhum. Isto porque

nunca deixamos de comparar.

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Entrevista França – Carlota (57 anos)

Tópicos Conteúdo (Resumo da Entrevista)

Razão pela qual emigrou

Cá em Portugal não tinha grandes

perspectivas. Fui para cuidar de um

bebé.

Houve algum momento que se

arrependeu de ter emigrado

Nunca me arrependi.

Quais os impactos que provocaram

em si a estadia noutro país

Penso que provocou em mim formas de

estar na vida diferentes do que se tivesse

ficado em Portugal. Convivi com uma

cultura diferente e, com pessoas que

tinham outras formas de encarar a vida,

Convivi em meios diferentes dos de cá.

Sente-se Portuguesa ou Francesa

Sinto-me mais francesa do que

portuguesa. Portugal é Portugal, é o meu

país. Mas, no meu intimo sinto-me

francesa.

O que valoriza mais na sua vida, a

parte profissional ou a

pessoal/família

Valorizo mais a minha família. Os meus

filhos e os meus netos são a razão da

minha vida, são a razão do meu viver.

Associações de emigrantes

portugueses, qual a importância no

seu percurso de emigrante

Existem Associações de portugueses.

Essas Associações são extremamente

importantes para os portugueses.

Inicialmente não frequentava depois

comecei a ir e gostava muito. Embora

estejam longe de Portugal os

portugueses sentem-se em casa. Se não

existissem essas Associações os

portugueses podiam sentir-se

“despaisados” e sozinhos.

Onde empreendeu mais ao longo da

sua vida, no amealhar de dinheiro

ou na formação escolar dos seus

filhos

Sempre valorizei mais a minha família,

os estudos dos meus filhos. Primeiro o

bem estar dos meus filhos. O que

valorizei ao longo da minha vida foi a

formação escolar dos meus filhos.

Sente-se uma pessoa diferente após a

emigração, em que sentido

Não, sinto-me uma pessoa igual. Acho

que não modifiquei em nada.

Como se sente em relação à sua

Realização Profissional

Sinto-me realizada a nível profissional.

Gostava do que fazia. Portanto, depois

de ter regressado sinto-me realizada.

Como se sente em relação à sua

Estabilidade Económica

Tenho uma vida tranquila

economicamente e, sem dúvida, que

devo isso a ter estado em França.

Como se sente em relação à sua

Formação escolar

Gostava de ter tirado um curso de

cabeleireira. Mas, nunca tirei.

Na actualidade tem casa própria Tenho casa própria que adquiri pela

emigração.

Como se sente neste momento

aquando do regresso, na sua

comunidade

Sinto que me acolheram bem. Grande

maioria das pessoas da nossa rua são

emigrantes.

Sente-se mais reconhecido pelos

seus conterrâneos

Reconhecem-me como Pessoa. Não

esquecem que sou emigrante e

respeitam-me muito.

Que contributo acha que dá hoje na

sua aldeia

Contribuo com dinheiro para o salão

paroquial, para os bombeiros, para a

Cruz Vermelha, para a Páscoa e para

uma Associação de Apoio aos Idosos.

Quais as diferenças entre Portugal e

França

Na França as pessoas são muito mais

simples, mais humanas. Há um melhor

acolhimento por parte das pessoas. Não

fazem tanta distinção nem diferenciação

entre as profissões. Cumpre-se mais os

horários, há mais pontualidade. Aqui há

mais burocracia. Na França há mais

ajudas sociais.

Razão do regresso a Portugal

Regressei por causa do clima, este sol é

muito bom, e pelo sossego. Para terminar

o fim da minha vida. Aqui existe menos

poluição.

Algo a acrescentar que considere

relevante

O que faz falta em França são escolas de

ensino da Língua Portuguesa. O Estado

Português devia fazer mais força para

que haja ensino de português em França.

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Entrevista França – Beatriz (51 anos)

Tópicos Conteúdo (Resumo da Entrevista)

Razão pela qual emigrou

Os meus pais foram trabalhar para França e eu fui com

eles. Foram à procura de melhores condições de vida.

Aqui não tínhamos nenhumas perspectivas de vida.

Houve algum momento que se

arrependeu de ter emigrado

Nunca me arrependi de ter ido para a França. Sempre

gostei muito daquele país.

Quais os impactos que provocaram em

si a estadia noutro país

A nível de educação teve um impacto positivo muito

forte. Cá em Portugal não teria frequentado o nível

escolar que frequentei em França, e isso provoca

alterações na forma de ser da pessoa. Acredito que seria

uma pessoa menos culta. Contactei com outra cultura,

adquiri hábitos que me tornaram uma pessoa diferente,

com novos horizontes e, na forma de estar na vida.

Sente-se Portuguesa ou Francesa

Sinto-me só francesa. É uma sensação esquisita porque

quando estamos em França somos vistos como

imigrantes e, cá somos os emigrantes. Não somos de

lado nenhum.

O que valoriza mais na sua vida, a parte

profissional ou a pessoal/família

O que valorizo mais na minha vida é a minha família. A

família fica sempre e o resto acaba tudo. A família é o

meu “porto de abrigo”. O projecto família nunca

termina, só com a nossa morte.

Associações de emigrantes portugueses,

qual a importância no seu percurso de

emigrante

Sabia da existência das Associações de Portugueses mas

nunca me identifiquei com essas associações, nem com

os convívios que faziam. Nunca fui lá. Acho que não

influenciou nada na minha adaptação.

Onde empreendeu mais ao longo da sua

vida, no amealhar de dinheiro ou na

formação escolar dos seus filhos

Empreendi mais na formação escolar dos meus filhos. O

dinheiro gasta-se e a formação escolar fica sempre com

as pessoas.

Sente-se uma pessoa diferente após a

emigração, em que sentido

Sinto-me uma pessoa completamente diferente após a

emigração. A minha maneira de ser e de estar na vida é

diferente após a emigração. Acredito que vejo o mundo

de forma diferente, que tenho a mente mais aberta.

Como se sente em relação à sua

Realização Profissional

Sinto que em França estava mais realizada

profissionalmente. Tinha melhor emprego, ganhava

mais dinheiro.

Como se sente em relação à sua

Estabilidade Económica

Tenho uma maior estabilidade económica. A emigração

para a França deu-me a estabilidade económica que

tenho neste momento.

Como se sente em relação à sua

Formação escolar

Em França estudei até ao troisiéme, que corresponde ao

10ºano. Em Portugal nunca tirei nenhuma formação,

porque não tive qualquer interesse.

Na actualidade tem casa própria Tenho casa própria que comprei por ter emigrado.

Como se sente neste momento aquando

do regresso, na sua comunidade

Não me sinto bem, porque aos olhos das pessoas eu

sou emigrante. Não me sinto integrada.

Sente-se mais reconhecido pelos seus

conterrâneos

Não, não me sinto reconhecido pelos meus

conterrâneos. Sinto que não me aceitam. Noto isso

pelas atitudes que têm para comigo e com a minha

família. Arranjam problemas com tudo.

Que contributo acha que dá hoje na sua

aldeia

Dou contributo, em dinheiro, se me vierem pedir à

porta de casa. Por, vezes fazem lotarias e sorteios

de âmbito social e participo sempre.

Quais as diferenças entre Portugal e

França

Em França existem mais serviços sociais onde nos

podemos dirigir para solicitar ajuda. Há um nível

cultural mais elevado do que cá, as pessoas são

mais educadas, há mais civismo. Em França há

mais igualdade a nível profissional. Todas as

profissões têm o seu devido valor. Somos todos

iguais, embora cada um desempenhe a sua função.

Razão do regresso a Portugal

Vim para Portugal por vontade do meu marido e

não minha. Viemos para investir em Portugal.

Algo a acrescentar que considere

relevante

Não quero acrescentar nada. Apenas que gosto

muito da França e que um dia irei novamente para

lá.

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Entrevista França – Armanda (59 anos)

Tópicos Conteúdo (Resumo da Entrevista)

Razão pela qual emigrou

Emigrei porque casei, e o meu marido já estava em França a trabalhar.

Posso dizer que foi por amor, para construir um casamento, uma

família, uma vida a dois.

Houve algum momento que se

arrependeu de ter emigrado

Nunca me arrependi porque era privilegiada, de certo modo, mediante a

profissão que desempenhava. Por vezes, custava suportar determinadas

situações. Há sempre o estigma de sermos estrangeiros. Em Paris havia

outra mentalidade diferente da de Cambrais, porque as condições

sociais dos nossos portugueses não eram as melhores e os franceses

avaliavam tudo por igual. Embora isso fosse um pouco difícil de

suportar nunca me arrependi de ter ido para lá.

Quais os impactos que

provocaram em si a estadia

noutro país

Aprendi muito. Tenho outros horizontes que não teria se tivesse ficado

em Portugal. Vejo o mundo de outra maneira das pessoas daqui, tenho

outra maneira de agir. Desenvolveu a minha facilidade de

comunicação, facilidade de tudo. França é outra cultura, é outro mundo.

Sente-se Portuguesa ou

Francesa

Eu sempre me senti portuguesa. Sempre lutei pelo meu país que é

Portugal. Era portuguesa, acima de tudo.

O que valoriza mais na sua

vida, a parte profissional ou a

pessoal/família

Valorizo mais a minha família, mas também valorizo a minha parte

profissional, que é fundamental. Mas, a minha família é o meu pilar. É

com eles que recarrego as minhas baterias, é com eles que desabafo.

São eles os meus amigos. A família é um apoio muito importante. A

família é um refúgio muito grande. E, quando estamos fora de Portugal

a família ainda se torna muito, muito, mais importante. Posso dizer-lhe

que tinha as pernas em França e o resto do corpo aqui em Portugal,

porque tinha os meus filhos aqui em Portugal a estudar.

Associações de emigrantes

portugueses, qual a

importância no seu percurso

de emigrante

Por todo o lado existem associações portuguesas. Limitavam-se a umas

tasquinhas, a um lugar muito reservado aos homens onde iam jogar

cartas, beber uns copos e, havia sempre uma equipa de futebol. Embora

houvesse festas de Magusto e de Natal, onde as mulheres participavam.

Era um mundo muito machista. Entrei numa associação uma vez e não

me senti nada à vontade, acho que não existia ali cultura quase

nenhuma. Mas, para essas pessoas, acredito que fosse importante

porque ali era Portugal para eles.

Onde empreendeu mais ao

longo da sua vida, no amealhar

de dinheiro ou na formação

escolar dos seus filhos

Empreendi mais na formação escolar dos meus filhos, no bem-estar

deles e, para que estivessem bem. A prioridade sempre fora os meus

filhos.

Sente-se uma pessoa diferente

após a emigração, em que

sentido

Sinto-me uma pessoa diferente após a emigração. No sentido de achar

que a liberdade é importante para todos os seres humanos. As pessoas

daqui da aldeia sufocam-me, querem saber tudo da vida dos outros.

Convivemos com outras culturas. E, há hábitos que adquirimos

aquando da convivência com outras culturas. Sou uma pessoa muito

frontal e aqui não aceitam a frontalidade.

Como se sente em relação à sua

Realização Profissional

Sempre me senti realizada, porque sempre fiz o que gostei, dava aulas

de Língua e Cultura Portuguesa. Infelizmente, a nossa Língua no

mercado francês não tem muito valor, não está muito implementada. A

comunidade portuguesa reclamava muito isto, mas o governo português

é que não apoiava. O governo português não investiu, não souberam

aproveitar a riqueza que tiveram em França, dos portugueses que lá

estiveram.

Como se sente em

relação à sua

Estabilidade

Económica

Sempre fui remunerada pelo governo português e, como tal,

nunca beneficiei nesse sentido, por estar fora do país. Mas, claro

que tenho outra visão da vida, e o estar fora abriu-me outros

horizontes, a viver de outra maneira. Não vivemos mal. Temos

estabilidade económica.

Como se sente em

relação à sua

Formação escolar

Quando fui para França tinha o Magistério. Depois lá tirei a

licenciatura, na Universidade Aberta. Em Portugal, não tirei

formação nenhuma. Tenho necessidade de fazer alguma coisa

para me sentir útil.

Na actualidade tem

casa própria

Tenho casa própria que construímos enquanto estávamos

emigrados.

Como se sente neste

momento aquando do

regresso, na sua

comunidade

Dou-me bem com todos mas a corrente não passa bem. Estou

desfasada com a maneira de ser das pessoas daqui da aldeia. As

pessoas não evoluíram desde a altura que eu emigrei. As

mentalidades não alteraram. É difícil lidar com as pessoas

daqui. O relacionamento superficial e conversas banais está

óptimo, mas nada de aprofundar relacionamentos.

Sente-se mais

reconhecido pelos

seus conterrâneos

Não, não me sinto reconhecido pelos meus conterrâneos. Sou

apenas mais um peão que veio para aqui. As minhas colegas do

Agrupamento de escolas de Amares sim, reconhecem-me como

profissional, como Pessoa.

Que contributo acha

que dá hoje na sua

aldeia

Não dou nenhum contributo para a minha aldeia.

Quais as diferenças

entre Portugal e

França

Sempre fui muito portuguesa, mas em relação aos serviços

públicos e sociais portugueses relativamente aos franceses sinto

que “desci aos infernos”. Aqui são processos mais morosos. Na

França não há diferenças sociais, não há a distância entre o Sr.

Dr e as outras pessoas, são mais práticos, são mais acessíveis.

Na França há mais civismo por parte das pessoas e as

mentalidades são mais abertas.

Razão do regresso a

Portugal

Apenas o fim de carreira. Quando atingi o fim de carreira pedi a

minha reforma e depois tive de regressar a Portugal. Mas, hoje

em dia as pessoas não regressam a Portugal. Portugal é

madrasta para essas pessoas, não é mãe é madrasta. Esta nova

geração de emigrantes já não quer vir para Portugal. Já há

jovens que nem querem vir a Portugal passar férias. E, depois as

pessoas chegam cá e sofrem um choque emocional muito

grande.

Algo a acrescentar

que considere

relevante

Os emigrantes trabalharam e lutaram muito, alguns construíram

aqui as suas casas e, nem vêm para cá. Vêm cá de férias e,

Portugal é madrasta para eles. A França é um país de liberdade

humana muito grande e, foi uma riqueza muito grande para

mim. A emigração esconde muita tristeza e amargura. Neste

momento, temos uma geração diferente de emigrantes. Já não

agem assim. Em qualquer tipo de emprego encontramos jovens

bilingues. Maioritariamente com formação. Todos muito bem

integrados.

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Entrevista Luxemburgo – Guilhermina (50 anos)

Tópicos Conteúdo (Resumo da Entrevista)

Razão pela qual emigrou

Não foi a falta de trabalho, foi a vontade de conhecer outro país,

outros costumes e, principalmente a construção de uma casa.

Houve algum momento que se

arrependeu de ter emigrado

Eu nunca me arrependi, mas o meu marido sim. Custou-lhe

bastante a adaptação. Como estudei sete anos de francês

compreendia bastante e adaptei-me bem.

Quais os impactos que provocaram

em si a estadia noutro país

Tive de deixar o meu emprego, de administrativa no Hospital do

Monte da Virgem no Porto e ir para um país diferente, fui

arrumar quartos de hotel. Não era o trabalho que me impedia

porque todos os trabalhos são honestos. A minha forma de ver o

mundo alterou totalmente, ficou diferente.

Sente-se Portuguesa ou

Luxemburguesa

Sempre me senti portuguesa, em todo o lado. Nunca senti

racismo por parte de ninguém. Contudo, a minha filha e o meu

marido sentiram por parte dos colegas.

O que valoriza mais na sua vida, a

parte profissional ou a

pessoal/família

Valorizei sempre a minha família. Porque a família é a base da

nossa vida. Fizemos tudo para estar com a família e pela

família.

Associações de emigrantes

portugueses, qual a importância no

seu percurso de emigrante

Existia no Luxemburgo uma Associação de portugueses. Muito

boa, muito agradável e que nos sentíamos integrados. Fazíamos

parte do grupo de folclore, era uma comunidade muito

importante para nós. Ajudou-nos muito a integrarmo-nos e foi

lá que fizemos amigos. O meu marido era o tesoureiro da

Associação, daí se pode ver o apoio que tínhamos na

Associação. A Associação ajudava a integrar os portugueses,

assim como a sociedade Luxemburguesa ajudava imenso.

Onde empreendeu mais ao longo da

sua vida, no amealhar de dinheiro

ou na formação escolar dos seus

filhos

Empreendi mais na minha família. Tentamos ajudar os nossos

filhos em tudo o que eles precisam. A família foi e será sempre

a nossa prioridade.

Sente-se uma pessoa diferente após

a emigração, em que sentido

Se tivesse ficado em Portugal, se calhar, não seria tão atenta às

necessidades dos outros. Sinto-me uma pessoa diferente, após a

emigração, nesse sentido. Sinto-me mais rica, sinto que cresci

como ser humano. Quem emigra um dia fica com a mentalidade

mais aberta, tornam-se pessoas mais pró-activas. Expandi os

meus valores.

Como se sente em relação à sua

Realização Profissional

Sempre me senti realizada profissionalmente. Fui para um

trabalho inferior ao meu em Portugal, sabia para o que ia. Tinha

de construir uma família, então o trabalho esqueci. Tentei

aproveitar os meus conhecimentos e aplicá-los no que estava a

fazer lá.

Como se sente em relação à sua

Estabilidade Económica

Foi a emigração para o Luxemburgo que nos deu a estabilidade

económica que temos.

Como se sente em relação à sua

Formação escolar

No Luxemburgo não tirei qualquer formação, porque me

dediquei exclusivamente à família. Aqui já pensei tirar uma

formação em informática, mas é complicado encontrar um

formação onde me encaixe.

Na actualidade tem casa

própria

Tenho casa própria e que a obtive através da

emigração.

Como se sente neste

momento aquando do

regresso, na sua

comunidade

Fui bem acolhida mas, toda a nossa família fez por

isso. Tentamos integrarmo-nos nas actividades da

comunidade. Embora sinta que certas pessoas

pensam: “então emigraram e têm uma casa

pequena?”. Há ideias pré-concebidas dos emigrantes.

Sente-se mais

reconhecido pelos seus

conterrâneos

Sinto-me reconhecida. Noto isso porque nos

contactam sempre que faz falta alguma coisa na

comunidade. Sinto que os nossos conterrâneos

reconhecem que podemos dar algum contributo para a

sociedade.

Que contributo acha

que dá hoje na sua

aldeia

Contribuo sendo catequista. Contribuo para uma

Associação de Apoio aos Jovens Necessitados. E,

sempre que nos vêm solicitar contribuímos com bens

ou com dinheiro.

Quais as diferenças

entre Portugal e o

Luxemburgo

Há diferenças a nível de mentalidades. Em Portugal

as pessoas são mais fechadas. Ao nível do sistema de

saúde no Luxemburgo tem uma organização superior

ao português. Há mais organização ao nível dos

serviços, no Luxemburgo.

Razão do regresso a

Portugal

Atingimos a estabilidade económica pretendida. Já

tínhamos casa em Portugal como tínhamos planeado

inicialmente.

Algo a acrescentar que

considere relevante

Não, não tenho nada a acrescentar. Penso que

tocamos nos aspectos mais relevantes.

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Entrevista França – Ernesto (62 anos)

Tópicos Conteúdo (Resumo da Entrevista)

Razão pela qual emigrou

Emigrei para ter melhoras na minha vida.

Se não fosse para equilibrar a minha vida

não saía do meu país.

Houve algum momento que se

arrependeu de ter emigrado

Nunca me arrependi de ter emigrado.

Quais os impactos que provocaram

em si a estadia noutro país

Tornei-me uma pessoa diferente. Mais

atenta às pessoas. O facto de aprender uma

nova língua sinto que fiquei mais rico.

Sente-se Portuguesa ou Francesa Sinto-me português desde que nasci.

O que valoriza mais na sua vida, a

parte profissional ou a

pessoal/família

Valorizo tudo, mas mais a minha família. É

com a família que eu vivo. A família

representa tudo para mim.

Associações de emigrantes

portugueses, qual a importância no

seu percurso de emigrante

Que eu tenha conhecimento não existia

nenhuma Associação de Portugueses na

zona onde morava, que era em Nantes.

Apenas tenho conhecimento de uma escola

de ensino da Língua de Portuguesa.

Onde empreendeu mais ao longo da

sua vida, no amealhar de dinheiro

ou na formação escolar dos seus

filhos

Eu empreendi mais na formação escolar dos

meus filhos. Além de frequentarem o

sistema de ensino francês, iam às aulas de

português, que decorria ao sábado.

Sente-se uma pessoa

diferente após a emigração,

em que sentido

Tornei-me uma pessoa diferente em muitos aspectos.

Adquiri outros hábitos, outros valores, outra postura na

vida.

Como se sente em relação à

sua Realização Profissional

Na França trabalhava na construção civil e gostava do

que fazia. Em Portugal trabalhei como pintor, que era a

minha profissão preferida.

Como se sente em relação à

sua Estabilidade Económica

Estou mais estável a nível económico após ter

emigrado.

Como se sente em relação à

sua Formação escolar

Não investi na minha formação escolar.

Na actualidade tem casa

própria

Não, vivo na casa dos meus sogros, que só fica a ser

minha após a morte deles.

Como se sente neste

momento aquando do

regresso, na sua

comunidade

Sinto-me bem, embora não tenha muitos amigos. No

início chamavam-me o francês e olhavam para mim

como o emigrante.

Sente-se mais reconhecido

pelos seus conterrâneos

Acho que me reconhecem. Noto pelas conversas que

temos e pela amizade que mantemos.

Que contributo acha que dá

hoje na sua aldeia

Dou contribuo com dinheiro, quando me vêm pedir à

porta de casa e para Associações de pessoas

necessitadas.

Quais as diferenças entre

Portugal e França

Em França o sistema de saúde é muito mais organizado

e dá mais apoio aos cidadãos. A sociedade francesa é

mais aberta do que a portuguesa. Mas, também, existia

racismo para com os estrangeiros.

Razão do regresso a

Portugal

Regressei por causa dos meus filhos. Para que não

atingissem uma idade que eu não os conseguisse trazer

para Portugal.

Algo a acrescentar que

considere relevante

Apenas tenho a dizer que quem está bem no seu país

não deve emigrar. Porque o nosso cantinho é o nosso

cantinho. Existe muito racismo.

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Como se sente em relação à sua Formação

escolar

Não tirei nenhum curso lá em França. Nem

depois de ter vindo me interessei por tirar

um curso cá.

Na actualidade tem casa própria Tenho casa própria que adquiri por ter

estado 20 anos em França. Tudo o que

tenho hoje deve-se ao facto de ter estado em

França emigrado.

Como se sente neste momento aquando do

regresso, na sua comunidade

Sinto-me muito bem. Tenho muitos amigos.

Depois de me adaptar aqui criei outras

raízes.

Sente-se mais reconhecido pelos seus

conterrâneos

Os amigos receberam-me bem e

reconhecem-me. Noto isso pela forma como

me acolhem, pela festa que me fazem

quando entro num Banco. Convidam-me

para festas e convívios.

Que contributo acha que dá hoje na sua

aldeia

Contribuo para a minha freguesia, para as

festas e romarias com dinheiro.

Quais as diferenças entre Portugal e França Penso que a França é um país superior ao

nosso. Os franceses são muito acolhedores,

simpáticos e tratam bem os portugueses.

Em França é outra gente. Os patrões eram

mais sensatos, havia um relacionamento

mais aberto. O sistema político francês é

mais limpo, é tudo mais às claras, não

existem tantas cunhas.

Razão do regresso a Portugal

Regressei a Portugal em nome da família.

Queríamos que os nossos filhos

frequentassem o sistema escolar português.

Algo a acrescentar que considere relevante Apenas tenho a dizer que a França é um

grande país. Que deu muitas oportunidades

a alguns portugueses.

Entrevista França – Dinis (60 anos)

Tópicos Conteúdo (Resumo da Entrevista)

Razão pela qual emigrou

Emigrei, porque naquela altura aqui era

uma ditadura. Não havia nenhumas

perspectivas de vida em Portugal. Tentei

lutar pela vida.

Houve algum momento que se

arrependeu de ter emigrado

Nunca me arrependi.

Quais os impactos que provocaram em si

a estadia noutro país

Mudei bastante porque contactei com outra

cultura. Tornei-me uma pessoa diferente, a

maneira de ver o mundo alterou, fiquei uma

pessoa mais rica.

Sente-se Portuguesa ou Francesa

Sinto-me português embora goste muito de

França. Foi um país que me marcou muito.

Ainda hoje faço comparações entre

Portugal e França.

O que valoriza mais na sua vida, a parte

profissional ou a pessoal/família

O que valorizo mais na minha vida é a

minha família. A minha família é a parte

mais importante da minha vida. Tenho uma

família boa e sinto-me feliz.

Associações de emigrantes portugueses,

qual a importância no seu percurso de

emigrante

Íamos aos Domingos até à Associação

assistir aos bailes e convivermos todos. Era

importante para a minha família e para

todos. Era uma forma de nos integrarmos e

matarmos saudades de Portugal.

Onde empreendeu mais ao longo da sua

vida, no amealhar de dinheiro ou na

formação escolar dos seus filhos

Orientamos a nossa vida em função da

formação escolar dos nossos filhos.

Valorizei mais a formação escolar dos meus

filhos do que o amealhar de dinheiro.

Sente-se uma pessoa diferente após a

emigração, em que sentido

Sinto-me uma pessoa diferente. A vida de

emigrante faz-nos crescer muito. Faz-nos

aprender muito, muito. Tornamo-nos mais

humanos, mais humildes, menos racistas e

crescemos como Pessoas.

Como se sente em relação à sua

Realização Profissional

Em França trabalhava muito e sentia-me

realizado. Vim para Portugal e montei o

meu negócio, onde me sinto plenamente

realizado.

Como se sente em relação à sua

Estabilidade Económica

Tenho uma estabilidade económica graças à

França.

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Entrevista Suíça – Ivo (57 anos)

Tópicos Conteúdo (Resumo da Entrevista)

Razão pela qual emigrou

Emigrei para ter uma situação económica

melhor do que a que tinha cá. Cá tinha

uma sociedade numa pedreira com um

irmão meu, já ganhava umas “coroas

boas”. Mas, um colega convidou-me para

ir para lá.

Houve algum momento que se

arrependeu de ter emigrado

Até à data nunca me arrependi. Claro que

pensava sempre na família…Mas, nunca

me arrependi de ter ido para a Suíça.

Quais os impactos que provocaram

em si a estadia noutro país

Mudou um bocado o quadro da família,

de início. Teve impacto na minha forma

de encarar a vida.

Sente-se Portuguesa ou Francesa

Sinto-me português sempre, embora

tivesse os direitos que tinha um cidadão

suíço.

O que valoriza mais na sua vida, a

parte profissional ou a

pessoal/família

Valorizo muito mais a minha família. É o

meu sangue, é a minha vida. Estava

sempre em contacto com a família por

telefone.

Associações de emigrantes

portugueses, qual a importância no

seu percurso de emigrante

Havia uma Associação de emigrantes

portugueses na Suíça. Qualquer coisa que

precisássemos o presidente da Associação

ajudava. Era muito importante para mim,

porque haviam torneios de futebol.

Ajudava a passar o tempo.

Onde empreendeu mais ao longo da

sua vida, no amealhar de dinheiro

ou na formação escolar dos seus

filhos

Sempre fui um pouco amarrado ao

dinheiro. Mas, onde empreendi mais ao

longo da minha vida foi na formação

escolar dos meus filhos. Tudo o que

precisavam sempre os ajudei e lhes dei o

que pude.

Sente-se uma pessoa diferente

após a emigração, em que sentido

Continuo igual como Pessoa, embora mais rico em

conhecimentos. Sei falar outra Língua, tenho

conhecimento de outras coisas que não teria se não

tivesse saído daqui. Nesse sentido, sinto-me

diferente.

Como se sente em relação à sua

Realização Profissional

Sinto-me uma pessoa realizada profissionalmente.

Fui para a Suíça trabalhar no mesmo ramo que

trabalhava em Portugal. Era o que gostava de

fazer.

Como se sente em relação à sua

Estabilidade Económica

Após ter emigrado sinto que tenho uma maior

estabilidade económica. Sinto-me mais tranquilo.

Como se sente em relação à sua

Formação escolar

Na Suíça não tirei formação nenhuma porque não

precisei. Aqui também não quero porque não

quero cansar a cabeça, por causa do sistema

nervoso.

Na actualidade tem casa própria Tenho casa própria que consegui com o dinheiro

que adquiri pela emigração.

Como se sente neste momento

aquando do regresso, na sua

comunidade

Sinto-me muito bem na minha comunidade.

Convivo com os meus vizinhos, somos todos

amigos, vamos ao café juntos para conviver.

Sente-se mais reconhecido pelos

seus conterrâneos

Sinto-me reconhecido pelos meus conterrâneos.

Programamos saídas juntos. Divertimo-nos todos

juntos ao fim de semana. Os meus amigos sempre

me acolheram bem, fazem-me sempre uma festa

quando me vêem.

Que contributo acha que dá hoje

na sua aldeia

Contribuo, paras a igreja e para as festas com

dinheiro.

Quais as diferenças entre Portugal

e França

Na Suíça as regras são mais rígidas, há mais

civismo. Há mais igualdade entre as pessoas, não

há cunhas. Nós, portugueses somos mais

populares, os suíços não exteriorizam tanto as

emoções.

Razão do regresso a Portugal

Regressei por motivos de invalidez. Para estar

parado mais vale estar perto da família onde está a

minha força de vida.

Algo a acrescentar que considere

relevante

Não tenho nada a acrescentar.

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Entrevista Suíça – João (48 anos)

Tópicos Conteúdo (Resumo da Entrevista)

Razão pela qual emigrou

Emigrei com o intuito de dar um futuro

melhor aos meus filhos e, conseguir ter um

melhor nível de vida.

Houve algum momento que se

arrependeu de ter emigrado

Arrependia-me sempre que me lembrava da

família, por isso, sentia-me instável a nível

emocional. De resto, é um bom país em

termos de oportunidades, trabalho e serviços

prestados.

Quais os impactos que provocaram

em si a estadia noutro país

Como fui para um país onde a forma de

encarar a vida é diferente daqui, fui de certa

forma influenciado.

Sente-se Portuguesa ou Francesa

Sinto-me português, não desisto de Portugal.

Mas, não me esqueço da Suíça

O que valoriza mais na sua vida, a

parte profissional ou a

pessoal/família

Gostava muito do meu trabalho, da minha

arte, que é linda. Mas o que eu valorizo mais

na minha vida e sempre valorizei é a família.

Porque a família é tudo para mim. É a minha

vida. É o que nos mantém vivos ao longo da

vida.

Associações de emigrantes

portugueses, qual a importância no

seu percurso de emigrante

Existia uma Associação de emigrantes

portugueses na Suíça, onde havia futebol e

um bar para conviver. Tinham um sistema de

dar apoio burocrático. Era um apoio

emocional que tínhamos.

Onde empreendeu mais ao longo da

sua vida, no amealhar de dinheiro

ou na formação escolar dos seus

filhos

Quando casei a partir daí o mais importante

para mim passou a ser a família. A formação

escolar dos meus filhos sempre foi muito

mais importante ao longo da minha vida.

Sente-se uma pessoa diferente após

a emigração, em que sentido

Sinto que mudei, que adquiri outros valores,

que não tinha até ter emigrado. Sinto que há

um “desembocar de ideias”, o facto de sair

de Portugal. Sinto que me abri um pouco ao

mundo, sinto-me mais livre. Contactei com

outras culturas.

Como se sente em relação à sua

Realização Profissional

Sinto-me realizado profissionalmente porque

fiz sempre o que gostei. Depois de voltar a

Portugal dediquei-me à Viticultura, que é outra

das minhas paixões, que me realiza.

Como se sente em relação à sua

Estabilidade Económica

Sinto que estou mais estável a nível económico

pelo facto de ter emigrado.

Como se sente em relação à sua

Formação escolar

Na Suíça não tirei nenhuma formação. Aqui já

tirei uma formação de Poda, em Fitofármacos,

Horticultura, Protecção Integrada e, inscrevi-

me nos avisos agrários. Já tentei tirar o 9º ano

no Centro das Novas Oportunidades mas, não

concordo com o sistema de funcionamento.

Na actualidade tem casa própria Tenho casa própria que adquiri com a minha

ida para a Suíça.

Como se sente neste momento

aquando do regresso, na sua

comunidade

Sinto-me bem.

Sente-se mais reconhecido pelos seus

conterrâneos

Todos me acolheram bem. Vejo isso pela forma

como as pessoas me acolhem, como falam

comigo, como me tratam. Na altura das

vindimas todos se oferecem para vir lá para

casa vindimar, é sinal que me reconhecem

como membro da comunidade.

Que contributo acha que dá hoje na

sua aldeia

Contribuo em prol da comunidade. Com

dinheiro, cogumelos e despendo de tempo.

Quais as diferenças entre Portugal e

França

Na Suíça há mais igualdade em termos de

empregos. Na Suíça as pessoas investem mais

na formação. Há mais civismo, mais limpeza

nas ruas.

Razão do regresso a Portugal Regressei por causa da doença que me surgiu.

Algo a acrescentar que considere

relevante

Não tenho mais nada a dizer. Apenas que o

mundo é nosso e, que não deveríamos ser

racistas em relação a ninguém.

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Quadro Síntese - Tendências nas várias entrevistas

Tópicos Conteúdo (Resumo das Entrevistas)

Razão pela qual

emigrou

-Melhorar as condições económicas de vida; -Dar um melhor futuro aos filhos;

-Ir à aventura, para conhecer outras culturas e costumes; -Por amor, para

construção de um casamento e de uma família; -Construção de uma casa; -

Porque em Portugal na altura era uma ditadura.

Houve algum

momento que se

arrependeu de ter

emigrado

-Nunca houve sentimento de arrependimento; -Apenas o marido da

entrevistada sentiu por falta de adaptação à Língua; -Por vezes custava sentir o

estigma de serem estrangeiros; -Apenas quando a família vinha à lembrança; -

Apenas no início porque foi uma adaptação a tudo: marido, país, Língua e aos

afazeres da vida diária.

Quais os impactos

que provocaram em

si a estadia noutro

país

- Mudança de emprego; -A forma de ver o mundo tornou-se diferente, com

novos horizontes e, forma de estar na vida; -Enriquecimento como pessoa

através do contacto com outras culturas e adquirir outros hábitos; -A nível do

sistema educativo; -Desenvolvimento da facilidade de comunicação; -

Aumento de qualidades humanas.

Sente-se Portuguesa

ou da nacionalidade

para o país onde

emigrou

- Sentimento de ser português acima de tudo; - Sentimento das duas

nacionalidades; - No íntimo, sentimento da nacionalidade do país para o qual

emigrou; - Sentimento de que não pertencem a lado nenhum.

O que valoriza mais

na sua vida, a parte

profissional ou a

pessoal/família

-Embora a parte profissional seja importante o mais valorizado por todos é a

família, porque é encarada como a própria vida, o “porto de abrigo”, a

representação de tudo na vida das pessoas, é a base da vida, o projecto família

nunca termina, é o pilar da vida, é o recarregar de baterias, é o que nos mantém

vivos.

Associações de

emigrantes

portugueses, qual a

importância no seu

percurso de

emigrante

-Enquanto para uns são uma forma de se sentirem em Portugal, de convívio

entre todos, de matar saudades da cultura portuguesa, de ajuda na integração -

Para outros não apoiava ninguém de forma activa, se não existissem não

faziam falta, não se identificavam com estas associações, havia falta de cultura

nestes locais, era predominantemente um mundo machista. Embora todos

reconheçam que era bom que existissem. -Dois entrevistados não tinham

conhecimento da existência de associações, contudo um deles tinhas os filhos

numa escola de ensino da Língua Portuguesa.

Onde empreendeu

mais ao longo da sua

vida, no amealhar

de dinheiro ou na

formação escolar

dos seus filhos

-Todos os entrevistados apontaram a formação escolar e o bem-estar dos filhos

onde empreenderam mais ao longo das suas vidas. Embora, frisassem que o

amealhar de dinheiro era também importante porque sem ele não faziam nada.

Os que emigraram para a França tinham os filhos a frequentar o ensino da

Língua Portuguesa.

-Um dos entrevistados, demonstrou tristeza por os filhos não quererem

prosseguir estudos universitários.

Sente-se uma pessoa

diferente após a

emigração, em que

sentido

-A grande maioria dos entrevistados sentem que a emigração os tornou pessoas

diferentes, por terem convivido com outras culturas, expandiram e adquiriram

outros valores, começaram achar que a liberdade é importante para todos os

seres humanos e sentem-se mais livres, adquiriram novos hábitos, outra postura

na vida, clarificação de ideias e mentalidade aberta, dependendo da

sensibilidade de cada um apreendem o que mais lhe interessa da cultura que

estão em contacto, crescimento como ser humano, pessoas mais pró-activas,

aumento de conhecimentos. – Embora um entrevistado não se sinta diferente.

Como se sente em

relação à sua

Realização

Profissional

-A maioria dos entrevistados sentem-se realizados profissionalmente, quer no

país de emigração, quer após o regresso. – Um entrevistado menciona que sinta

que no país de emigração, neste caso, França, se sentisse mais realizado. –

Outro entrevistado refere que foi para um emprego inferior ao que tinha cá,

mas isso não era importante, a prioridade era a construção da família

Como se sente em

relação à sua

Estabilidade

Económica

- Para todos a emigração trouxe maior estabilidade económica; - Embora um dos

entrevistados referiu que mesmo que emigrado num outro país, fosse sempre

remunerado por Portugal mas, mesmo assim, tem outra visão da vida e tem

estabilidade económica.

Como se sente em

relação à sua

Formação escolar

- Quase todos os entrevistados referem que após ter regressado não investiram na

sua formação escolar. Uns por desinteresse, outros porque ainda não encontraram

algo que lhe agrade. – Um entrevistado referiu que tirou várias formações após ter

regressado.

Na actualidade tem

casa própria

- Todos têm casa própria na actualidade, salvo um entrevistado que vive na casa

dos sogros, a emigração serviu para angariar propriedades.

Como se sente neste

momento aquando

do regresso, na sua

comunidade

- Maioritariamente sentem-se bem, que foram bem acolhidos, gostam de morar no

sítio onde moram, que têm muitos amigos. Contudo, mesmo se sentindo bem -

Um refere que não têm muitos amigos e que no início era visto como o emigrante.

-Um diz que não se sente bem porque aos olhos das pessoas é emigrante, não se

sente integrado. -Outro entrevistado, apesar de se sentir integrado, diz que há

ideias pré-concebidas acerca dos emigrantes. -Outro diz que se dá bem com todos

mas a corrente não passa, sente-se desfasada das pessoas, só existe o

relacionamento superficial.

Sente-se mais

reconhecido pelos

seus conterrâneos

-A maioria sentem-se reconhecidos pelos conterrâneos e notam isso pela forma

como são acolhidos, pelas conversas, pelas amizades, pelo trato agradável, pelo

respeito, pelos convites que recebem para festas e convívios, e, pela solicitação

quando faz falta algo na comunidade. -Um entrevistado mencionou que alguns

perguntam com desconfiança porque voltou. -Outras duas entrevistadas referem

que não se sentem reconhecidos pelos conterrâneos: uma diz que é apenas um

peão que veio para aqui; a outra diz não a aceitam e nota isso pelas atitudes que

têm para com ela e com a restante família.

Que contributo dá

hoje na sua aldeia

-Maioritariamente dão contributo, para festas, romarias, lotarias e sorteios de

âmbito social, associações de apoio a necessitados (jovens e idosos), cursos de

formação (ponto de cruz, Arraiolos, pintura) gratuitos e, catequese. Uma grande

fasquia com dinheiro; outros com bens alimentares, outros com saberes e, com

disponibilidade de tempo. -Uma entrevistada refere que não dá contributo.

Quais as diferenças

entre Portugal e o

país de emigração

- Todos referem que há diferenças, passo a enumerar as características apontadas

para com os países de emigração: ao nível de mentalidades são mais abertas, há

mais civismo, há mais organização a nível do sistema de saúde e serviços sociais,

o sistema político é mais “limpo”, não há tantas “cunhas”, os ordenados são mais

elevados, o nível cultural é superior, não há impunidade para certos grupos e

pessoas, as regras são mais rígidas e cumpridas, há mais igualdade entre as

pessoas e entre as profissões, as pessoas são mais humanas, há um melhor

acolhimento, há mais pontualidade e, mais ajudas sociais, as pessoas são mais

acessíveis e mais práticas. -Dois entrevistados falam no racismo para com os

estrangeiros.

Razão do regresso a

Portugal

- Reforma e final de carreira; - Por vontade do meu marido, para investir em

Portugal; - Não ter trabalho; -Por causa dos filhos, para que não atingissem a

maioridade e, frequentassem o sistema de ensino português; -Por doença e

invalidez; -Por causa do clima de Portugal, do Sol e por ser menos poluído; -

Aparecimento de movimentos nacionalistas no país de emigração, -Alcance da

estabilidade económica pretendida.

Algo a acrescentar

que considere

relevante

-Quem emigra um dia nunca mais é completamente feliz em lado nenhum, porque

não deixa de comparar; - A emigração deu oportunidades a alguns portugueses; -

Não deveríamos ser racistas em relação a ninguém, -Quem está bem no seu país

não deve emigrar, -Neste momento temos uma geração diferente de emigrantes,

maioritariamente com formação, bem integrados; -O que faz falta em França são

escolas de ensino da Língua Portuguesa.