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MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA

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MANUAL DEJUSTIÇA

RESTAURATIVATRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

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2 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

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3 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

INTRODUÇÃO 4

1 DIMENSÕES IMPORTANTES DE JUSTIÇA RESTAURATIVA 71.1 Da vítima 71.1 Do Ofensor 81.3 Da Comunidade 8

2 MÉTODOS E PRÁTICAS RESTAURATIVAS 92.1 Mediação Vítima Ofensor 92.2 Conciliação Restaurativa 102.3 Círculo Restaurativo 10

3 CÍRCULO DE CONSTRUÇÃO DE PAZ 113.1 Estrutura e elementos do Círculo de construção de paz 12

3.1.1 Cerimônia de Abertura 133.1.2 Apresentação/ Check In 133.1.3 Construção de Valores e Diretrizes 133.1.4 Perguntas Norteadoras 143.1.5 Check Out 143.1.6 Cerimônia de Encerramento 143.1.7 Observações gerais 14

4 APLICABILIDADE DA JUSTIÇA RESTAURATIVA 154.1 Área Criminal 15

4.1.1 Violência Doméstica 164.1.2 Execução Penal 164.1.3 Infração de Trânsito 16

4.2 Área da Infância e Juventude 174.2.1 Ato Infracional 174.2.2 Medidas Protetivas - Cível 18

4.3 Área Cível, Família, e Juizado Especial Cível 184.4 Área do Juizado Especial Criminal 194.5 Outras Áreas de Atuação da Justiça Restaurativa 19

5 JUSTIÇA RESTAURATIVA EM GOIÁS 215.1 Papel da Equipe 215.2 Metodologia de Funcionamento 22

5.2.1 Acolhimento 225.2.2 Plano de Intervenção e Encaminhamento 22

5.3 Métodos e Práticas Restaurativas (Público Atendido) 235.3.1 Álcool e Drogas 235.3.2 Violência Doméstica 235.3.3 Jovens 245.3.4 Apoio as vítimas 245.3.5 Violência Familiar 245.3.6 Oficinas do Trânsito 24

5.4 Rede Externa de Atendimento 255.4.1 Assistência Social 255.4.2 Documentos sem custo (2ª via) 265.4.3 Educação 265.4.4 Saúde 265.4.5 Grupos de Mútua Ajuda 275.4.6 Trabalho 27

CONSIDERAÇÕES FINAIS 29

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 30

SUMÁRIO

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4 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

Segundo Howard Zehr (2014), no contexto da prática de crimes e de conflitos, a Justiça

Restaurativa “(…) é uma abordagem que visa promover a justiça e que envolve, tanto quanto

possível, todos aqueles que têm interesse numa ofensa ou dano específico, num processo

que coletivamente identifica e trata os danos, necessidades e obrigações decorrentes da

ofensa, a fim de restabelecer as pessoas e endireitar as coisas na medida do possível”.

A Justiça Restaurativa tem como proposta estabelecer uma nova forma de lidar com o cri-

me, o ato infracional ou dano, e as questões relacionadas à infância, juventude e à família,

desafiando as pessoas a refletirem sobre o seu modo de ser, estar e conviver em sociedade,

levando em consideração o fato de sermos seres humanos interligados e interdependentes.

A Justiça Restaurativa não pretende competir com as várias formas tradicionais de

aplicação do direito e há casos que não comportam práticas restaurativas e a solu-

ção tradicional deve ser aplicada.

A Justiça Restaurativa tenta resgatar, de algum modo, a importância de se dimensionar

o papel da vítima e do ofensor, de se fazer uma abordagem interpessoal, de envolver a

comunidade, quando possível, buscando atender às necessidades dos envolvidos (ofen-

sor e vítima), a responsabilização e conscientização (trazendo luz às consequências do

dano provocado) dos atos praticados ou ao menos ouvi-los.

Para as vítimas, a intenção é de ofertar a possibilidade de restauração, para que encon-

trem respostas para questões que as preocupam ou com que se sintam ouvidas (acolhi-

das). Exemplos de questões que podem afligir as vítimas: Por que eu? Essa pessoa tinha

alguma coisa pessoal contra mim? Essa pessoa vai voltar? Eu poderia ter feito alguma

coisa para não me tornar uma vítima? Estou segura? Muitas outras dúvidas podem e de-

vem ser esclarecidas.

Para além das exigências legais que implicam a participação da vítima (oitiva, intimação

da sentença, intimação de cumprimento da pena), é preciso proporcionar que ela (a víti-

ma) expresse e valide sua raiva, seu medo e dor para fazer do processo restaurativo uma

experiência de justiça (que não se deve confundir com vingança).

INTRODUÇÃO

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5 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

Essas respostas poderão dar início ao processo de restauração que pode ser longo, pode

até não ressarcir suas perdas materiais, nem aplacar seu luto pela dor física ou perda de

um ente querido (em casos mais graves), mas poderá transformar o medo em necessi-

dade de seguir como sobrevivente com alguma sensação de segurança.

De modo geral as vítimas levam consigo

uma mudança significativa em sua vida

após os fatos que tiveram que suportar,

como, por exemplo, vítimas de trânsi-

to ou assalto, que por vezes ficam com

sequelas graves, paralisias definitivas de

membros, de braços, problemas neuro-

lógicos devido ao impacto da ação de

outras pessoas; vítimas de violência do-

méstica; violência sexual etc.

A Justiça Restaurativa é um procedi-

mento que prioriza o diálogo entre os

envolvidos na relação conflituosa e ter-

ceiros atingidos, para que construam de forma conjunta as soluções mais adequadas

para a resolução dos conflitos. É também um convite a assunção do compromisso de

inserção de novas práticas que levem a reflexão de novos modos de ser, estar, agir e

conviver em sociedade, tendo a segurança como algo a ser construído coletivamente.

A Gerência de Cidadania do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de

Conflitos (NUPEMEC) do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás apresenta este manual

apenas como um passo para que se possa divulgar por meio de ações restaurativas, dan-

do início a um processo participativo, mais humano e justo de resolução de conflitos,

sem o intuito de eliminar ou afastar a solução tradicional.

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MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

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As práticas de Justiça Restaurativa objetivam suprir os anseios que, muitas vezes, o

sistema atual de Justiça não consegue alcançar, como:

• Percepção coletiva de que, muitas vezes, o sistema pode dar mais importância as

necessidades dos envolvidos, abarcando questões interdisciplinares;

• Profissionais da área da Justiça expressam o desejo de que o crime não volte a

ocorrer ou que não se torne “um caminho”;

• Sentimento de que as decisões judiciais podem alcançar melhores resultados se

atingirem todos os envolvidos nos processos criminais.

A Justiça Restaurativa trabalha precipuamente em três dimensões:

1.1 DA VÍTIMA.

Na dimensão da vítima, a Justiça Restaurativa procura buscar o seu fortalecimento, na

medida em que o conflito compromete o sentido de autonomia e segurança.

A Justiça Restaurativa possibilita à vítima esta participação e o conhecimento das me-

didas que estão sendo adotadas para reparar o mal sofrido. Essa dimensão é essencial

no processo restaurativo, ainda que ocorra de maneira indireta ou simbólica (exemplo:

homicídio, em que a vítima é representada pela família – tenta-se a recuperação emo-

cional dos familiares; tráfico de drogas, em que a vítima é a sociedade, na prática de atos

infracionais, na alienação parental, na disputa de guarda de crianças e adolescentes, nos

conflitos de ordem social na rede pública de educação, saúde e segurança), além de

questões administrativas também.

1. DIMENSÕES IMPORTANTES DA JUSTIÇA RESTAURATIVA

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8 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

1.2 DO OFENSOR

Para o ofensor, busca-se propiciar a reflexão sobre o senso de responsabilização, para

que compreenda as consequências da sua conduta e do dano causado, que ele compre-

enda o impacto de sua ação na vida de outras pessoas, e contribua, conscientemente,

com a construção de mecanismos para a reparação dos danos e para que não volte a

ocorrer conduta semelhante.

Trabalha-se também o sentido de pertencimento para que o ofensor se identifique como

responsável pela resolução do conflito, que se perceba como parte da comunidade e

veja que é possível integrar-se.

Assim como a vítima, a presença do ofensor também pode ser indireta ou simbólica

(exemplo: falecimento no curso do processo).

1.3 DA COMUNIDADE

Na dimensão da comunidade, pretende resgatar e fortalecer o senso de coletividade e o

sentimento de corresponsabilidade.

Em grande parte das relações conflituosas, a comunidade à qual a vítima e o ofensor

pertencem é atingida pelo conflito e pode colaborar na restauração dos interessados.

A participação da comunidade como espaço de pertencimento promove segurança e a

possibilidade de se atender às necessidades dos envolvidos no conflito.

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MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

2. MÉTODOS E PRÁTICAS RESTAURATIVAS

De modo a atender aos diferentes tipos e graus de Justiça Restaurativa, os métodos e prá-

ticas são diversos. Existe uma infinidade de estratégias, mas essas precisam levar em conta

os princípios de Justiça Restaurativa, a saber: a voluntariedade, a corresponsabilidade, a

reparação dos danos, quando possível, o atendimento às necessidades de todos os envol-

vidos, a informalidade, a imparcialidade, a participação, a confidencialidade e a urbanidade.

O Decreto Judiciário n° 1.346/2017 do TJGO, que instituiu a Política de Justiça Restau-

rativa no âmbito do Poder Judiciário do Estado de Goiás, em seu Art. 4º, considera, além

de ações restaurativas já desenvolvidas, os seguintes métodos:

2.1 MEDIAÇÃO VÍTIMA OFENSOR (OU ENCONTRO VÍTIMA OFENSOR COMUNIDADE – EVOC)

Aconselhável para os delitos de maior potencial ofensivo consiste na aplicação de técni-

cas autocompositivas e consensuais de solução de conflitos, nos casos em que a figura

da vítima e do ofensor são bem definidas. Por exemplo: desentendimento entre vizinhos

por causa de som alto; ameaças no seio da família etc.

Exige para a sua aplicação curso específico, não podendo ser utilizada sem a capacitação prévia.

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MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

2.2 CONCILIAÇÃO RESTAURATIVA (OU AUDIÊNCIA RESTAURATIVA)

Aplicada nas infrações penais de menor potencial ofensivo, em litígios em cujas natu-

rezas não permitam distinguir com certeza a vítima e ofensor, quando, por exemplo, as

alegações são contraditórias: brigas de vizinhos (por questões relativas a animais do-

mésticos, árvores, som alto), brigas em campo de futebol etc.).

2.3 CÍRCULOS RESTAURATIVOS (OU CÍRCULOS DE CONSTRUÇÃO DE PAZ):

É o método escolhido pelo Tribunal de Justiça de Goiás para ser o mais utilizado, porque

abrange êxito nas mais diversas situações.

Nos círculos, devido à sua horizontalidade e possibilidade de desenvolvimento de um di-

álogo respeitoso, todos podem expor sua opinião. Assim, verifica-se a construção de um

espaço de diálogo e de escuta ativa, em que é possível a interação respeitosa, a discus-

são de diferenças, a exposição de opiniões, a obtenção de soluções, conseguindo- -se o

fortalecimento da autoestima e o restabelecimento das relações interpessoais, mediante

o auxílio do facilitador restaurativo.

O facilitador restaurativo necessita de capacitação específica.

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11 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

O Tribunal de Justiça do Estado de Goiás,

inspirado pelas experiências de outros Tri-

bunais de Justiça, optou por implementar

a Justiça Restaurativa no ano de 2017, utili-

zando a metodologia dos círculos de cons-

trução de paz, iniciando-se assim a capa-

citação de servidores e magistrados para

atuarem como facilitadores.

Os círculos de construção de paz são

uma prática restaurativa que podem ser

aplicados em diversas áreas do judiciário,

criminal, cível, infância e adolescência,

administrativa entre outras, como tam-

bém em diversas políticas públicas, tais

como, saúde, educação, segurança pú-

blica, etc. Essas últimas com o objetivo

de minimizar e solucionar os conflitos

para que não cheguem ao judiciário.

3. CÍRCULOS DE CONSTRUÇÃO DE PAZ

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12 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

O círculo é uma ferramenta que pretende promover a compreensão dos envolvidos em

um fato ou questão, de modo a entenderem quais foram os impactos causados, sua di-

mensão e amplitude, buscando identificar formas de minimizar os danos decorrentes do

ato ou conduta. Seus princípios são: liberdade, voluntariedade, horizontalidade, conec-

tividade e interdependência (Passos, 2018).

De acordo com Kay Pranis (2010), o formato circular utilizado nesta metodologia simbo-

liza liderança partilhada, igualdade, conexão e inclusão. Também promove foco, respon-

sabilidade e participação de todos.

Os círculos de construção de paz viabilizam o encontro entre pessoas, suscitam afinida-

des, criam ou fortalecem vínculos e promovem compreensões recíprocas.

Há círculos menos complexos (celebração, diálogo, aprendizado, construção de senso

comunitário, compreensão) e mais complexos (restabelecimento/apoio, conflito, toma-

da de decisão, reintegração).

O processo circular é fundado na crença de que cada um tem algo a oferecer e todos têm

igual valor e dignidade. No círculo, todos tem a chance de colocar suas ideias e opiniões, de

expressar sentimentos e de relatar experiências.

3.1 ESTRUTURA E ELEMENTOS DO CÍRCULO DE CONSTRUÇÃO DE PAZ

Nos círculos, estimula-se o relato de experiências pessoais, pois parte-se do pressu-

posto de que com a narrativa das histórias vividas, e não apenas daquela concernente à

relação conflituosa, muitos se identificam uns com os outros, percebem que possuem

os mesmos anelos, temores, crenças e esperanças.

De acordo com Kay Pranis (2010), “as histórias unem as pessoas pela sua humanidade

comum”. Permite-se ver a humanidade nos demais integrantes do círculo e, a partir daí,

redimensionar seus valores, redirecionar seus caminhos, abrir os horizontes.

Esta oportunidade de contar histórias sobre a vida e compartilhar experiências, dores,

sonhos, projetos, possibilita que os participantes mostrem quem são na realidade. Isso

favorece a conexão entre as pessoas e afasta os preconceitos e medos.

Para possibilitar os relatos das experiências, é necessário que a conversação entre os

participantes seja ordenada, permitindo a palavra a cada um, por vez, sem interrupções.

Elemento essencial para que isso ocorra é a utilização do “objeto da palavra”.

O “objeto da palavra” é um instrumento simbólico, objeto (por exemplo, um bichinho de

pelúcia ou outro a escolha do facilitador) utilizado durante a realização do círculo e que

passa por todos os participantes de forma sequencial. Concede ao seu detentor a prer-

rogativa de falar e de ser ouvido por certo tempo. Outorga aos participantes a certeza de

que poderão contar suas vivências sem serem interrompidos ou contestados.

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13 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

Favorece também o exercício da escuta ativa aos que não estão com o objeto, que é o

estímulo para que os participantes realmente ouçam uns aos outros.

A escuta ativa promove valorização e estímulo àquele que se sente ouvido, sente-se

valorizado, podendo se expressar com maior flexibilidade. O instrumento simbólico uti-

lizado como “objeto da palavra” será escolhido pelo facilitador e pode ter algum signifi-

cado pessoal para o grupo, exemplos: livro, boneco de pano, fita, dentre outros.

O facilitador é figura essencial para a realização do círculo. É ele quem apresenta o ob-

jeto da palavra, orienta os participantes, preza para que se mantenha o respeito, a tole-

rância e outros valores acordados feitos pelo grupo durante a realização do círculo e faz

as perguntas que direcionam a condução da prática.

As perguntas conduzirão todo o círculo e serão formuladas em todas as rodadas. Exem-

plos de perguntas:

Na rodada de apresentação/check in: Qual o seu nome? Há alguma informação pessoal

que queira compartilhar com o grupo? Como você está se sentindo no momento?

Na rodada da construção de valores e diretrizes: Qual valor você procura observar na

sua vida e quem lhe repassou esse valor? Qual a diretriz que você gostaria que fosse

observada neste encontro para que você de sinta em um espaço respeitoso e seguro?

Na rodada de check-out: Qual seu sentimento em relação à atividade realizada? Em uma palavra,

o que você está sentindo no momento? Participar desse círculo lhe trouxe alguma contribuição?

3.1.1 CERIMÔNIA DE ABERTURA

Marca o início das atividades e promove a aproximação entre os participantes e

a conexão com a atividade que se iniciará. Há várias formas de se realizar a ceri-

mônia de abertura, com dinâmicas ou atividades lúdicas, como a leitura de uma

poesia, audição de uma música, técnicas de respiração, dentre outras.

3.1.2 APRESENTAÇÃO/CHECK IN

Momento em que todos os participantes falam seu nome, profissão, ou outras in-

formações pessoais que entendam relevantes para o desenvolvimento do círculo,

e como estão se sentindo naquele momento.

3.1.3 CONSTRUÇÃO DE VALORES E DIRETRIZES

Ocasião em que todos os participantes elegem os valores e as diretrizes a serem

observados para o bom andamento do encontro, com o intuito de proporcionar

um espaço seguro. Normalmente, escrevem esses valores num papel fornecido

pelo facilitador e o colocam no centro do círculo.

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14 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

Recomenda-se que o centro do círculo seja preenchido com um tapete e objetos

que representam a natureza, de preferência com um vaso de flor, ou outro enfeite,

no qual os participantes poderão repousar os olhos durante o círculo. Evita-se ob-

jetos que possam provocar alguma forma de constrangimento, como por exem-

plo: incensos, velas, imagens de alguma religião específica, que podem intimidar

algum dos envolvidos, devido às diversas crenças com as quais convivemos.

3.1.4 PERGUNTAS NORTEADORAS

São aquelas que vão efetivamente conduzir o diálogo entre os participantes ou dire-

cionar o círculo, de acordo com a finalidade que se pretenda alcançar com a prática.

3.1.5 CHECK-OUT

Os interessados relatam como estão se sentindo após a participação no círculo.

3.1.6 CERIMÔNIA DE ENCERRAMENTO

Sinaliza o encerramento da prática e celebra o esforço pela realização das ativida-

des. Da mesma forma que a cerimônia de abertura, podem ser utilizadas dinâmicas

ou atividades lúdicas, como a leitura de uma poesia, audição de uma música, téc-

nicas de respiração, dentre outras.

3.1.7. OBSERVAÇÕES GERAIS

Caso o Círculo tenha o objetivo de se trabalhar diretamente o conflito ou o trau-

ma (vítima de acidente de trânsito, de violência doméstica, de agressão ou outras),

inicia-se com a construção de valores. Com o intuito de aproximar as pessoas, o

conciliador/mediador, por meio de perguntas empáticas, estimulando os interes-

sados a trazerem suas experiências pessoais para serem compartilhadas com o

grupo. Exemplo: no encontro com vítimas de acidentes de trânsito, elas poderão

expor sua dor, suas sequelas, as consequências para sua vida, após as rodadas ini-

ciais de check-in, de valores, quando estarão mais abertas e descontraídas.

Da mesma forma, no grupo de pessoas que cumprem pena, somente depois das

formalidades iniciais, check – in, valores, começa a ser abordada a questão de mu-

danças na vida com o ato praticado, de reflexão, de mudança, redirecionamentos

e superação (planos, sonhos etc).

É importante registrar que o planejamento, organização e realização do círculo

deverá ser feito somente por facilitadores devidamente capacitados, com forma-

ção em Justiça Restaurativa e antes de iniciado o círculo.

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15 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

A Justiça Restaurativa pode ser aplicada praticamente em todas as situações e áreas

processuais e extraprocessuais, porém a pertinência de sua aplicação deve ser analisada

no caso concreto.

Sua aplicação se dará com utilização de técnicas, processos e métodos adequados para

resolução de conflitos nos âmbitos criminal, cível, infância e juventude, execução penal

ou em quaisquer outras áreas do direito ou de políticas públicas quando vislumbrada a

existência de relações continuadas, de vários vínculos, comunitárias, interpessoais, inte-

rinstitucionais, dentre outras.

4.1 ÁREA CRIMINAL

É possível a aplicação nas diversas naturezas da ação penal (privada, pública condicio-

nada à representação, pública incondicionada).

No recebimento do flagrante, quando da audiência de custódia, pode-se encaminhar os

indiciados para os grupos em funcionamento, nos termos do artigo 282 do Código de

Processo Penal, pois o juiz poderá, de ofício, aplicar medidas cautelares substitutivas à

prisão cautelar.

Após o recebimento da denúncia, na ocasião do artigo 76 ou 89 da Lei 9099/95, pode

ser utilizada como uma das condições a serem impostas.

Da mesma forma, pode ser determinada na sentença condenatória a participação na

Justiça Restaurativa nos termos do artigo 44 ou 77 do mesmo Código Penal.

4. APLICABILIDADE DA JUSTIÇA RESTAURATIVA

Page 16: MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA

16 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

A aplicação da Justiça Restaurativa também é possível como condição do regime aberto,

já que o artigo 115 da Lei de Execução Penal prevê a possibilidade de estabelecimento de

condições especiais, além das específicas. Na fase de execução da pena, os reeducandos

podem participar dos grupos.

Na ação penal privada, a Justiça Restaurativa tem um campo mais amplo de aplicação, porque há

disponibilidade da ação. Após a sentença, aplicam-se as mesmas regras da ação penal pública.

4.1.1 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Nessa área, com base no artigo 129 do Código Penal e na Lei 11.340/06 (Lei Contra a

Violência Doméstica ou, como é mais conhecida, Lei Maria da Penha), o encaminha-

mento pode surgir a partir da audiência de custódia (prisão em flagrante), dos Juizados

de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e da Execução Penal (art. 152). O

feito pode ser remetido para a Justiça Restaurativa em qualquer fase do processo.

O atendimento pode ser realizado separadamente com o ofensor e com a vítima,

assim como com a família que é significativamente afetada nessa situação.

Enquanto estiver em vigor as medidas protetivas de urgência, o encontro entre

vítima e ofensor não é possível. A avaliação (ou triagem) é ainda mais relevante

nesses casos específicos de violência doméstica. Ademais pode ser aplicada Jus-

tiça Restaurativa nos casos de violência física contra os filhos e para filhos que

praticam violência física ou abandono dos pais idosos ou não.

4.1.2 EXECUÇÃO PENAL

A Lei de Execução Penal estabelece em seu artigo 1º o objetivo de “proporcio-

nar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”.

Portanto, na tentativa de promover a inclusão social e com o intuito de prevenir a

prática de novos delitos, a sentença pode consistir em uma pena restritiva de di-

reitos. Existe a possibilidade de encaminhamento para a Justiça Restaurativa nessa

situação e nos casos de Suspensão Condicional da Pena (Sursis Penal), em que o

juiz da execução preceitua as circunstâncias do benefício.

4.1.3 INFRAÇÕES DE TRÂNSITO

A Justiça Restaurativa é igualmente aplicada nas situações relacionadas ao trânsito,

nos casos do art. 303, § 1º, c/c inciso II, do artigo 302 e artigo 306 todos da lei 9.503/97

do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e no art. 28 da Lei de Drogas n 11.343.

Entende-se que é imprescindível fomentar a responsabilidade no contexto do trânsito.

Nesse caso a Justiça Restaurativa é um meio para desenvolver a reflexão, a consciência,

a empatia, intencionando a segurança para as partes envolvidas nessa circunstância.

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17 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

4.2 ÁREA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE

Na área da infância e juventude, a aplicabilidade da Justiça Restaurativa é ainda mais

ampla, tendo em vista o caráter pedagógico das medidas socioeducativas. Pode ser uti-

lizado tanto no ato infracional (adolescentes), como nas medidas protetivas (art. 101 do

Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA):

4.2.1 ATO INFRACIONAL

Na fase pré-processual: compreendida entre o ato infracional e a oitiva informal

realizada pelo Ministério Público. O Promotor de Justiça, verificando o cabimento,

poderá inserir na remissão ministerial a aplicação da Justiça Restaurativa (artigo

126 do Estatuto da Criança e do Adolescente).

Após o recebimento da representação: o juiz poderá utilizar a remissão judicial,

suspendendo o feito para que a Justiça Restaurativa seja aplicada (artigo 126, pa-

rágrafo único, do Estatuto da Criança e do Adolescente).

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18 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

Na fase de execução: o juiz pode vincular a homologação do PIA (Plano Individual

de Atendimento) do adolescente, à Justiça Restaurativa. O adolescente e sua fa-

mília são chamados a comparecer. Podem também ser convidados servidores da

rede de atendimento à criança e ao adolescente, conselheiros tutelares, represen-

tantes de escola e demais envolvidos com a execução do plano, para um contato

consciente, estabelecendo-se conexões uns com os outros e fazendo-se um pac-

to capaz de considerar todas as demandas do adolescente.

Pode ser aplicada, inclusive, dentro dos Centros de Internação para cumprimento

das medidas socioeducativas, bem como disseminar os círculos de construção de

paz na rede de proteção (saúde, escola, segurança pública, entre outros) por meio

de programas.

4.2.2 MEDIDAS PROTETIVAS - CÍVEL

Nesta área, o campo é vasto, pois o princípio da proteção integral faz com que

o juiz possa buscar todas as intervenções possíveis para garantir o bem-estar da

criança. Assim a Justiça Restaurativa pode ser aplicada tanto para fortalecimento

de vínculos, como em situações em que a criança já está em acolhimento ins-

titucional, bem como em quaisquer processos de adoção, guarda, inclusive nos

cursos preparatórios para adoção, etc.

Também é possível a aplicação da Justiça Restaurativa dentro das entidades de

acolhimento, como forma de trabalhar os sentimentos dos acolhidos, suas neces-

sidades e suas perdas e o equilíbrio emocional dos servidores que ali atuam.

4.3 ÁREA CÍVEL, FAMÍLIA E JUIZADO ESPECIAL CÍVEL

O feito pode ser remetido para a Justiça Restaurativa em qualquer fase do processo e

independentemente do procedimento previsto (comum ou especial), tendo em vista a

disponibilidade das ações desta natureza pelas partes.

Durante a fase de conhecimento, o caso pode ser remetido antes ou após a audiência

de conciliação (mesmo que esta tenha sido infrutífera). Anota-se que o fato pode ser

encaminhado após instrução do feito e antes da prolação da sentença.

A Justiça Restaurativa, entretanto, não fica limitada à fase de conhecimento, podendo

ser aplicada mesmo após a prolação de sentença, caso a lide sociológica (interesse) não

tenha sido solucionada por meio da decisão judicial, inclusive em sede recursal.

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19 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

4.4 ÁREA DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL

A Justiça Restaurativa pode ser aplicada nas ações relativas a crimes de menor potencial

ofensivo no momento da composição civil dos danos, artigo 72 da Lei n.º 9.099/95, ou

como condição da transação penal, a teor do artigo 76, da mesma lei.

A Lei dos Juizados Especiais também favorece a aplicação da Justiça Restaurativa quan-

do do oferecimento da denúncia e da proposta de suspensão condicional do processo.

O artigo 89, que trata da suspensão condicional do processo, em seu § 2º, faculta ao

juiz o estabelecimento de outras condições a que ficará subordinada a suspensão, desde

que adequadas ao fato e a situação pessoal do acusado.

Após a sentença, aplicam-se as mesmas regras já mencionadas relativamente a aplica-

ção da Justiça Restaurativa, inclusive nas Turmas Recursais.

4.5 OUTRAS ÁREAS DE ATUAÇÃO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA

A aplicabilidade da Justiça Restaurativa não se resume ao Poder Judiciário. Ela se estende

a outras áreas, tais como, a de políticas públicas (educação, saúde, segurança, assistência

social, outras), administrativa e de recursos humanos, dentre outros possíveis campos.

Cabe destacar que, no âmbito da educação, por meio da Secretaria Interprofissional

Forense da Corregedoria-Geral da Justiça, as ações do Projeto Pilares têm disseminado

a cultura de paz no ambiente escolar, com foco na prevenção e resolução de conflitos,

utilizando os Círculos de Justiça Restaurativa e de Construção de Paz.

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20 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

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21 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

No Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, a Justiça Restaurativa tem sido utilizada como

prática em diferentes áreas. Experiências na infância e juventude, violência doméstica e

familiar contra a mulher, uso de substâncias psicoativas e contexto administrativo têm

sido exitosas na construção de uma Política de Justiça Restaurativa consistente em todo

o Estado. É no âmbito criminal que os métodos e práticas restaurativas têm sido aplica-

das de forma sistemática e organizada.

Considerando as demandas do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás e a disponibilida-

de de recursos materiais e humanos, tem–se trabalhado na implantação dos serviços na

Comarca de Goiânia no âmbito criminal e outros contextos como Infância e Juventude e

Direito de Família, de modo a estruturá-los em fluxos viáveis de expansão para comarcas

do interior.

Novos projetos e ações com enfoque restaurativo podem surgir de acordo com a de-

manda de cada comarca.

5.1 O PAPEL DA EQUIPE

Considerando que o procedimento de Justiça Restaurativa deve ser de adesão voluntá-

ria, a equipe tem o papel primeiro de construir um vínculo de acolhimento e confiança

com os participantes dos serviços, de forma a favorecer a adesão ativa e participativa às

práticas e métodos restaurativos.

Podem ser necessários atendimentos individuais para preparar os possíveis participantes

para os círculos, além de um trabalho motivacional para a adesão e intervenção eficaz.

O ideal é que os círculos trabalhem diversos temas, e que a cada encontro seja debatido um

assunto, que abranja aspectos da vida pessoal, profissional, familiar, social, entre outros.

Os temas podem promover reflexão, fortalecimento, responsabilização, inclusão, senti-

mento de pertencimento, fortalecimento de vínculos familiares, ressignificação da his-

tória de vida, perdão, superação e outros.

O objetivo final da equipe é oferecer a oportunidade, muitas vezes a primeira, para que

o participante reflita sobre seu contexto e suas possibilidades, sobre a ampliação de sua

visão de mundo, construção de outros projetos, tendo assim a possibilidade de fazer

escolhas mais apropriadas para a vida.

5. JUSTIÇA RESTAURATIVA EM GOIÁS

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22 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

Uma equipe bem preparada permite a construção de vínculo e adesão ao procedimento

restaurativo, criando um ambiente que contribua para a promoção da contextualização

do fato e de medidas necessárias para evitar novos contextos de violência e a reincidên-

cia criminal, bem como a escolha e indicação do tipo de intervenção ou procedimento

restaurativo a ser proposto.

5.2 METODOLOGIA DE FUNCIONAMENTO

5.2.1 ACOLHIMENTO

Acolher em um ambiente seguro e formar um vínculo com a equipe do setor é o

primeiro objetivo da Justiça Restaurativa. A avaliação inicial é o meio pelo qual o

indivíduo ingressa no setor e se torna um participante.

Na avaliação (ou triagem), será investigado o contexto e o histórico psicossocial do

participante, avaliação das (possíveis) situações de vulnerabilidade, preenchimento

dos conteúdos para a efetivação do procedimento restaurativo (compromisso, restau-

ração, consequências etc) que servirá de conteúdo para a formação do vínculo com a

equipe e para sua sensibilização e motivação para mudanças no estilo de vida e na res-

tauração do dano e consequente busca de resolução do conflito pelos participantes.

O acolhimento envolve a utilização das seguintes ferramentas para alcançar os

objetivos propostos: Entrevista Psicossocial (fundamentada na entrevista motiva-

cional), encontro individual entre o participante e o facilitador de Justiça Res-

taurativa (com ênfase nas necessidades, responsabilização e reparação), Roda de

Conversa (diálogo com comunicação dinâmica e possibilidade de aproximação

entre as pessoas), dentre outras.

5.2.2 PLANO DE INTERVENÇÃO E ENCAMINHAMENTO

Ao final do acolhimento, a equipe após a análise do caso, efetuará o encaminha-

mento dos participantes para o serviço que atenderá às demandas apresentadas,

de acordo as suas necessidades.

O encaminhamento poderá ser feito para o eixo de Métodos e Práticas Restaura-

tivas ou para o eixo da Rede Externa, quando necessário.

No caso de encaminhamento para a Rede Externa, são realizados círculos men-

sais no setor com esses participantes, para acompanhamento e redirecionamento,

caso necessário.

Depois de realizado o encaminhamento inicial, novos encaminhamentos poderão

ser feitos para complementar ou substituir o serviço oferecido naquele momento,

de forma a aumentar a efetividade da intervenção.

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23 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

5.3 MÉTODOS E PRÁTICAS RESTAURATIVAS (PÚBLICO ATENDIDO)

Há inúmeras ferramentas que podem ser utilizadas como método alternativo de resolu-

ção de conflitos, tais como conciliação, mediação, comunicação não violenta, roda de

diálogo ou conversa, constelação sistêmica, dentre outras. No entanto a mais utilizada

no Brasil tem sido os Círculos de Construção de Paz, por ser reconhecido como uma

das ferramentas de Justiça Restaurativa que observam os seus princípios, promovem

reflexões, apresentam conteúdos que objetivam trabalhar o participante sobre a respon-

sabilização de seus atos, o desenvolvimento de sua autonomia, ferramentas de comu-

nicação entre outras, e como consequência podem ainda promover a restauração dos

interessados, a atenuação do dano à vítima e a inclusão social do ofensor.

Ferramenta básica na Justiça Restaurativa do TJGO, com número médio de 10 a 15 par-

ticipantes, os círculos acontecem quinzenalmente no próprio setor.

Em média cada participante passa por 12 círculos, em que são abordados vários temas com

diversos objetivos, incluindo um círculo de acolhimento, em que o participante é apresen-

tado à técnica do círculo e um de finalização para avaliar como a Justiça Restaurativa o

auxiliou, seus planos futuros e como ele está e se sente ao concluir seu acompanhamento.

Os círculos realizados no Setor são divididos por público atendido, sendo eles:

5.3.1 ÁLCOOL E DROGAS

Os círculos atuam em uma perspectiva de autorresponsabilidade e resgate de autono-

mia do participante, em busca de escolhas mais saudáveis para sua vida, sempre que

possível, reconstruindo seus laços com a família e a sociedade e construindo estraté-

gias de não violência, através do diálogo e reflexões proporcionadas pelos Círculos.

Os casos que são necessitam de acompanhamento para tratamento de saúde po-

dem também ser encaminhados para a rede parceira (CAPS A/D, Grupos de Mútua

Ajuda e CEAT A/D). Esses participantes ficam vinculados ao setor através de círcu-

los mensais, para o acompanhamento da participação nesse tipo de serviço.

5.3.2 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Realizados de forma separada, só com homens ou só com mulheres, são círculos

voltados para participantes envolvidos em contexto de violência doméstica. Não

necessariamente vítima e ofensor precisam participar da Justiça Restaurativa, sen-

do que um pode estar engajado nos círculos e o outro não.

Os círculos intencionam à construção de estratégias de solução de conflitos e

cultura de paz nas relações mantidas ou nas futuras. Em momento algum dos cír-

culos consideram a reconciliação de casais como estratégia ou objetivo

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24 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

Os temas abordados em geral poderão ser voltados para resolução de conflitos;

comunicação não violenta; autonomia; famílias e suas diferentes realidades; justi-

ça x vingança; autoestima e autocuidado; etc.

5.3.3 JOVENS

Realizados com jovens de 18 a 24 anos, neste caso os círculos tem como objetivos

expandir a visão de mundo, trabalhar o resgate da autonomia, a responsabilização

e a reparação dos danos sempre que possível. Junto a esse processo, encaminha-

mentos para a rede de assistência e desenvolvimento social para atenção aos eixos

de empregabilidade, cultura e autocuidado podem ser realizados.

O objetivo específico deste círculo é evitar a reincidência de jovens que, muitas

vezes, estão iniciando seu envolvimento com a criminalidade e violência.

5.3.4 APOIO ÀS VÍTIMAS

O objetivo é oferecer atendimento às vítimas dos diferentes tipos de delitos, para

que se sintam ouvidas e apoiadas pelo grupo, a fim de que possam tentar superar

possíveis traumas, inclusive para conviverem com sequelas físicas e emocionais

dos crimes dos quais foram vítimas e se fortalecerem.

Outro ponto abordado é a possibilidade de encontrar novas estratégias para que

diminua a possibilidade de futuras situações semelhantes.

5.3.5 VIOLÊNCIA FAMILIAR

Realização de círculos voltados para pais que praticam violência física contra os fi-

lhos e para filhos que praticam violência física ou abandono dos pais idosos ou não.

Também são trabalhados temas como a comunicação não violenta, o desenvolvi-

mento da autonomia, resolução de conflitos, responsabilização entre outros.

5.3.6 OFICINAS DO TRÂNSITO

A Oficina é realizada em forma de roda de conversa e pretende provocar nos en-

volvidos um processo de reflexão e responsabilização.

As oficinas abrangem temas vinculados ao trânsito, uso de álcool e drogas, res-

ponsabilização além de outros, ocorrem a cada 03 semanas, a participação é úni-

ca, em média, grupos de 40 pessoas são atendidos a cada edição.

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25 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

5.4 REDE EXTERNA DE ATENDIMENTO

A Justiça Restaurativa acredita na importância do trabalho em rede e procura entender

o indivíduo em seu contexto biopsicossocial, considerando os processos de tomada de

decisão como fomento de uma autopercepção do participante enquanto cidadão de

direitos e obrigações, e que na sociedade em que ele convive seja um ator social produ-

tivo. A partir desta tomada de consciência, equipamentos sociais disponíveis são apre-

sentados como forma de acesso às políticas públicas, em atenção às suas necessidades

básicas e promoção de sua autonomia.

5.4.1 ASSISTÊNCIA SOCIAL:

• Centro de Referência de Assistência Social – CRAS

Unidade responsável pela oferta de serviços de proteção básica do Sistema Úni-

co de Assistência Social - SUAS, nas áreas de vulnerabilidade e risco social. É a

principal porta de entrada para os serviços do SUAS, possibilitando o acesso a um

grande número de famílias à política pública de assistência social.

• Centro de Referência Especializado de Assistência Social (proteção social

média complexidade)

Oferece serviços especializados e continuados a famílias e indivíduos em situação

de ameaça ou violação de direitos (violência física, psicológica, sexual, tráfico de

pessoas, cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto, etc.).

• Proteção Social Especial (PSE) de Alta Complexidade

Oferecem atendimento às famílias e indivíduos que se encontram em situação de

abandono, ameaça ou violação de direitos, necessitando de acolhimento provisó-

rio, fora de seu núcleo familiar de origem.

• A Casa Acolhida Cidadã (CAC)

Tem como objetivo abrigar temporariamente famílias e adultos em situação de

rua; aqueles que estão em trânsito: migrantes e imigrantes, e pessoas que não

possuem vínculo familiar identificado no Município de Goiânia.

• O Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua

(Centro Pop)

O serviço é ofertado para pessoas que utilizam as ruas como espaço de mora-

dia e/ ou sobrevivência. Conta com recepção, cozinha, refeitório, banheiros com

chuveiro, vestiários, lavanderia, salas de atendimento coletivo e individualizado. As

pessoas acolhidas receberão kit de higiene pessoal e alimentação.

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26 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

5.4.2 DOCUMENTOS SEM CUSTO (2ª VIA)

• Patronato Metropolitano

Certidão de Nascimento e Identidade

• Instituto de Identificação

Identidade - isenção concedida para 10 pessoas por dia.

5.4.3 EDUCAÇÃO

• Centros de educação e colégios da rede estadual

Nas ocasiões em que demonstram interesse em retomar os estudos.

• Institutos Tecnológicos de Goiás

Formação inicial e qualificação profissional. A rede ITEGO é a responsável pela

execução da política de educação profissional tecnológica e de inovação no Es-

tado de Goiás, tem como principal demandante o setor empresarial. Dessa forma,

consegue dar suporte a cada região e seus potenciais empreendedores de acordo

com a vocação de cada município determinada pelos arranjos produtivos locais.

5.4.4 SAÚDE

• Centro de Atenção Psicossocial – CAPS

São unidades específicas para atendimento diário a pacientes psiquiátricos gra-

ves e pessoas com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas.

Funciona com porta aberta e de forma substitutiva aos hospitais psiquiátricos e

tratamento via internação.

• Unidades de Saúde (CAIS, UPAs, CENTROS DE SAÚDE, etc)

Atendimento odontológico, saúde em geral, e pessoas que possuem problemas

psiquiátricos em nível leve e moderado.

• Pronto Socorro Psiquiátrico Wassily Chuc

Para casos de urgência em que o paciente está em crise ou surto. A unidade fun-

ciona 24 horas. Lá, o paciente vai passar pela análise da equipe médica e, se ne-

cessário, ficará em observação.

• Centro Estadual de Avaliação Terapêutica Álcool e outras Drogas (CEAT-AD)

Vinculado ao Grupo Executivo de Enfrentamento às Drogas (GEED) é um setor de

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27 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

portas abertas com acolhimento e atendimento gratuito, para usuários de drogas

e familiares que estão na busca por tratamento.

5.4.5 GRUPOS DE MÚTUO AJUDA

• Alcoólicos Anônimos – A.A

Uma comunidade com caráter voluntário e gratuito para homens e mulheres que

se reúnem para compartilhar suas experiências e esperanças, para alcançar e man-

ter a sobriedade, por meio da abstinência de ingestão de bebidas alcoólicas.

• Amor Exigente

A ONG Amor-Exigente atua como apoio a dependentes químicos e seus familiares,

sensibilizando as pessoas e levando-as a perceber a necessidade de mudar o rumo de

sua vida a partir de si mesmas, proporcionando equilíbrio e melhor qualidade de vida.

• Centro de Recuperação de Alcoólatras – CEREA

Trabalha com medidas preventivas de conscientização e recuperação às pessoas

dependentes de álcool.

• Narcóticos Anônimos – N.A.

Sociedade sem fins lucrativos baseada em um programa de abstinência de todas

as drogas. Adictos em recuperação se reúnem regularmente para ajudar uns aos

outros.

• Ajudantes Anônimos no Combate à Dependência Química – AJA

Serviço oferecido a famílias e dependentes químicos que vivenciam a problemá-

tica das drogas (lícitas e ilícitas) possibilitando o emergir de soluções a partir da

conscientização de cada indivíduo.

5.4.6 TRABALHO

• Sistema Nacional de Emprego (SINE)

As principais ações disponibilizadas por essa rede de atendimento são: a interme-

diação de mão de obra; a habilitação ao seguro-desemprego; e a requisição da

Carteira de Trabalho e Previdência Social.

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28 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

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29 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

As práticas da Justiça Restaurativa estão sendo difundidas em todo o país, a partir, espe-

cialmente, da recomendação estabelecida pela Meta 8 do Conselho Nacional de Justiça

(CNJ) no ano de 2016, pela Resolução nº 225/2016 e a Resolução 300/2019 do CNJ.

O importante é que sempre haja a responsabilidade e o respeito no desenvolvimento dos

trabalhos e que se compreenda que a Justiça Restaurativa não é abolicionista. É uma visão

multidisciplinar que possibilita que tanto vítima como ofensor possam ser atendidos nos seus

aspectos sociais, familiares, emocionais, encontrando maneiras de superar os fatos sofridos

e/ou cometidos, ampliando sua visão de mundo e melhorando sua perspectiva de vida.

A Justiça Restaurativa é a busca por uma justiça voltada para as pessoas e as relações,

dando lugar central às vítimas, atendendo às necessidades decorrentes do dano sofrido,

possibilitando a construção de soluções promotoras de reparação e reconciliação. São

práticas que objetivam através do diálogo e da escuta fazer emergir soluções que mini-

mizem os riscos de novos incidentes de violência, em consequência disso à segurança

de todos e assim cultivar o ideal de uma cultura de paz.

Para além deste contexto inicial de quando foi criada, atualmente a Justiça Restaurativa

está sendo considerada por teóricos e apoiadores, não apenas como uma abordagem de

crimes ou solução de conflitos, mas como uma filosofia de vida sobre relacionamentos

e convivência social. Uma filosofia que trata a justiça, não como uma instituição e sim

como função e principalmente como valor.

Enfim a Justiça Restaurativa é esse novo olhar para o ser humano, para as relações e

para nós mesmos, que vê a justiça como valor central o eixo que nos conecta a vida, a

harmonia, ao equilíbrio e a paz.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

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30 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

• CNJ, Resolução 225. Dispõe sobre a política Nacional de Justiça Restaurativa.

• CNJ, Justiça restaurativa: horizontes a partir da Resolução CNJ 225/Coordena-

ção: Fabrício Bittencourt da Cruz - Brasília: 2016.

• PASSOS, Célia. Justiça Restaurativa: Um convite ao diálogo, compromisso e re-

paração. Unipaz-GO, 2018.

• PRANIS, Kay. Processos Circulares - Teoria e Prática - Série da Reflexão À Ação.

São Paulo: Palas Athena, 2010.

• ROSENBERG, Marshall B. Comunicação Não Violenta - Técnicas para Aprimorar

Relacionamentos Pessoais e Profissionais. São Paulo: Ágora, 2006.

• TJGO. Decreto 1346 de 06 de junho de 2017 Implementa no Âmbito do Poder

Judiciário do Estado de Goiás a Política de Justiça Restaurativa.

• TJGO. Instrução Normativa de 17 de outubro de 2018 que Dispõe sobre as re-

gras e diretrizes de implantação e desenvolvimento das práticas de Justiça Res-

taurativa no âmbito do Poder Judiciário do Estado de Goiás.

• TJPR. Manual de Justiça Restaurativa. Disponível em: https://www.tjpr.jus.br/

documents/14797/7836487/Manual+JR+-+NUPEMEC+TJPR.pdf/2dee4c67-f-

c1a-40ae-a896-9b86a7d631a1. 2005.

• ZEHR, Howard. Trocando as Lentes - Um novo foco sobre o crime e a Justiça.

Justiça Restaurativa. São Paulo: Palas Athena, 2008, 3ª. Edição.

• ZEHR, Howard. Justiça Restaurativa. São Paulo: Palas Athena, 2012.

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31 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

MANUAL DE JUSTIÇA RESTAURATIVA - TJGO

NUPEMEC Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de solução de Conflitos.

Presidente

Desembargador Walter Carlos Lemes

Vice-Presidente

Desembargador Nicomedes Domingos Borges

Corregedor-Geral da Justiça

Desembargador Kisleu Dias Maciel Filho

Coordenador do NUPEMEC

Juiz Romério do Carmo Cordeiro

Gerência de Cidadania do NUPEMEC

Juíza Maria Socorro de Sousa Afonso da Silva

Coordenadora de Equipe

Mônica Vieira da Silva Borges – assistente social

Equipe Técnica

Érica Fernanda Teixeira Santos – musicoterapeuta

Kátia Abdala Tuma Mendonça – psicóloga

Laiane Carolina Carvalho de Matos – assistente social

Lucília de Lima – psicóloga

Rachel Moreira de Menezes – psicóloga

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