Manual Do Enc a Der Nador

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  • Manual de Encadernaomanual do formador

  • Manual de Encadernao

    Financiamento:

    POEFDS

    Medida 4.2 Desenvolvimento e Modernizao das Estruturas e Servios de Apoio ao Emprego e Formao

    Tipologia de Projecto 4.2.2. Desenvolvimento de Estudos e Recursos Didcticos

    Aco Tipo 4.2.2.2. Recursos Didcticos

  • ndiceManual de Encadernao

    Listagem de imagens 07 e 08

    Introduo 09

    PRIMEIRA PARTE

    1. Histria do Livro 11 a 48

    1.1. O que um livro? 12

    1.2. Formas ancestrais de livros 12

    1.3. O papiro como suporte de escrita 13

    1.4. O pergaminho e seu modo de preparao para a escrita 13

    1.5. Os volumina 16

    1.6. Os primeiros livros: cdices 17

    1.7. A importncia dos scriptoria monsticos 18

    1.8. Formas de ilustrao dos manuscritos: A miniatura e a Iluminura 20

    1.9. Instrumentos da escrita e tintas 22

    1.10. O papel como suporte de escrita 24

    1.11. A importncia das Universidades na produo de livros 30

    1.12. A Xilografia: primeiro processo de gravao aplicado ilustrao de livros 32

    1.13. A estampa: seu papel na difuso da obra de arte e na ilustrao de livros. 32

    1.14. O contributo da inveno da Tipografia 33

    1.15. O comrcio do livro nos sculos XVI a XVIII 37

    1.16. Principais inovaes do livro entre o sculo XV e o XVIII 41

    1.17. As transformaes do livro, no sculo XIX 43

    1.18. O livro no sculo XX 43

    1.19. O Livro hoje: breve sntese 45

  • 4Manual de Encadernaondice

    2. Histria da Encadernao 49 a 59

    2.1. A encadernao 49

    2.2. Origens da encadernao:

    antecedentes histricos 49

    2.3. Encadernaes Medievais 50

    2.3.1. Encadernao com pergaminho 52

    2.3.2. Encadernao de tipo bizantino 52

    2.3.3. Encadernao litrgica 53

    2.3.4. Encadernao mudjar 53

    2.3.5. Encadernao de manuscritos Islmicos 54

    2.4. O contributo da imprensa para a encadernao 54

    2.5. A encadernao renascentista 55

    2.6. A encadernao no sculo XVIII 56

    2.7. A encadernao no sculo XIX 58

    2.8. A encadernao no sculo XX 58

    2.9. Evoluo das tcnicas de encadernao/decora-

    o ao longo da histria 59

    SEgunda PaRTE

    1. Encadernao Manual de Livros 69 a 111

    1.1. A profisso de encadernador:

    enquadramento legal 70

    1.2. A oficina do encadernador 71

    1.3. Caracterizao do livro de acordo com o seu

    formato, dobragem e nomenclatura 77

    1.4. Cuidados a ter na preservao do livro 78

    1.5. Tarefas preparatrias da encadernao 79

    1.5.1. Preparao do livro para a costura 79

    1.5.2. Preparao do Corpo do livro 80

    1.5.3. Preparao da Cobertura 80

    1.6. Tipos de encadernao 81

    1.6.1. Encadernao de Luxo 81

    1.6.2. Encadernao Artstica 81

    1.6.3. Encadernao de livros

    oficiais ou de Registo 81

    1.6.4. Encadernao de Biblioteca 81

    1.6.5. Encadernao Comercial e Industrial 81

    1.6.6. Encadernao de Fascculos 81

    1.7. Tcnicas de costura do livro 83

    1.7.1. Costura sobre cordas 84

    1.7.2. Costura caderno a caderno 84

    1.7.3. Costura alternada 85

    1.7.4. Costura sobre fitas 86

    1.7.5. Costura ponto de luva 88

    1.7.6. Falsa costura 89

    1.8. Tcnicas de encaixe do livro 90

    1.8.1. Encaixe mo 90

    1.8.2. Encaixe com a dobradeira 91

    1.8.3. Encaixe inglesa 91

    1.9. Tcnicas de encadernao 91

    1.9.1. Quanto formao da capa 91

    1.9.2. Quanto cobertura da capa 92

    1.9.3. Meia-Encadernao 92

    1.9.4. Encadernao Meia Amador 92

  • 5Manual de Encadernaondice

    1.10. Tcnicas complementares de encadernao 96

    1.10.1. Espargir 96

    1.10.2. Execuo do estojo de proteco 96

    2. decorao de Livros 99 a 113

    2.1. A profisso de decorador/dourador:

    Enquadramento legal 100

    2.2. Oficina do decorador/dourador 100

    2.3. A tcnica de gravao com folha de ouro 102

    2.3.1. Utilizao das ferramentas 102

    2.3.2. Aplicao do mordente 103

    2.3.3. Marcao da encadernao 104

    2.3.3.1. Marcao da lombada 104

    2.3.3.2. Marcao das pastas 104

    2.3.4. Manuseamento da folha de ouro 105

    2.3.5. Aplicao do ouro 106

    2.3.6. Temperatura dos ferros 106

    2.4. A tcnica de gravao da encadernao 107

    2.4.1. Gravao da Lombada 107

    2.4.2. Gravao do Ttulo e Autor 107

    2.4.3. Gravao das Pastas 107

    2.4.4. Gravao das Seixas 107

    2.4.5. Gravao com Ferros Soltos 108

    2.4.6. Acabamento 108

    2.5. Tcnica de gravao com Safir 108

    2.6. Tcnicas complementares

    da decorao de livros 109

    2.6.1. Tcnica da gofragem manual 109

    2.6.2. Tcnica do corte dourado 110

    2.6.2.1. Preparao do mordente 110

    2.6.2.2. Preparao da cola de amido 110

    2.6.2.3. Preparao do corte dourado 111

    2.6.2.4. Preparao do suporte do livro 111

    2.6.2.5. Aplicao do amido 111

    2.6.2.6. Aplicao do bolo-armnio 111

    2.6.2.7. Aplicao do mordente 111

    2.6.2.8. Aplicao da folha de ouro 111

    2.6.2.9. Secagem 111

    2.6.2.10. Brunir 111

    2.6.3. Tcnica do papel marmoreado 111

    Referncias Bibliogrficas 115

    glossrio 119 a 130

  • 7IMAGEM 1. Placa de pedra, templo de Shamarzh, Sippar, IraqueIMAGEM 2. Tbua de madeira coberta de cera - romanos e gregosIMAGEM 3. Papiro do Livro dos Mortos - EgiptoIMAGEM 4. Foral Manuelino de Soure. Foto cedida pela Biblioteca Municipal de SoureIMAGEM 5. Diviso do pergaminho em quaternos IMAGEM 6. Biflios para formarem cadernosIMAGEM 7. Um biflio = 2 folhas = 1 cadernoIMAGEM 8. Dois cadernos: 2 conjuntos de biflios metidos uns dentro dos outros para depois serem

    cosidosIMAGEM 9. Diamond sutra impresso na china em 868, Imagem disponvel no site da British LibraryIMAGEM 10. Cdice denominado Theriaka e Alexipharmaca de Nicandro, um cdice do Renasci-

    mento bizantino do sculo X. Encontra-se na Bibliotheque Nationale de France. Encader-nao em pele castanha mrmore com lombada vermelha

    IMAGEM 11. Reclamo. Fonte Histria dos feitos praticados durante 8 anos no Brasil, Barlaeus Gaspar, Amesterdam, 1647

    IMAGEM 12. Reclamo. Fonte Histria dos feitos praticados durante 8 anos no Brasil, Barlaeus Gaspar, Amesterdam, 1647

    IMAGEM 13. grisaille com texto em cima e em baixo a representar o Cnego de Lille, Jean Milot a escrever

    IMAGEM 14. Letras iluminadasIMAGEM 15. Quase-original da Apocalipse Flamengo com 23 miniaturas de pgina inteira ilumina-

    das com ouro existente na Bibliothque Nationale de France, ParisIMAGEM 16. Penas e um clamoIMAGEM 17. Exemplo de uma oficina de um copista profissional. Fonte: Capa do livro Scribes and

    Illuminators, de Hamel, Christopher. IMAGEM 18. Oficina de impressoIMAGEM 19. Flio iluminado da Bblia, impressa por Guttenberg - exemplo de um incunbulo. IMAGEM 20. Exemplo de litografia a cores de Toulouse Lautrec. Fonte: www. Udenap.orgIMAGEM 21. O offsetIMAGEM 22. Exemplo de um e-bookIMAGEM 23. Capa em couro marrom do Bartolomeus, (final do sc. XV). Fonte: A Encadernao,

    Dorothe de BruchardIMAGEM 24. Exemplo de ornamentao austera: Evangelho de S. Joo (sc.VII), pertencente a S. Cuth-

    berth. Fonte: A Encadernao, Dorothe de BruchardIMAGEM 25. Encadernao com pergaminho, em forma de carteira (sculo XVI)IMAGEM 26. Encadernao em estilo plateresco, com adornos metlicos e cantoneiras.IMAGEM 27. Uta Cdice, do Imprio Otomano, Regensburg c1020, existente na Biblioteca de Muni-

    que ( Bayerische Staatsbibliothek)

    Manual de EncadernaoListagem de imagens

  • 8IMAGEM 28. Capa em marfim e pedras preciosas de um livro de Evangelhos de 894, do Mosteiro de St Gallen

    IMAGEM 29. Encadernao litrgica. Fonte: CAMBRAS, Josep, Encadernao, Editorial Estampa, Lda., Lisboa, 2004

    IMAGEM 30. Exemplo de uma Encadernao mudjarIMAGEM 31. Encadernao de Manuscritos Islmicos: recurso ao formato de envelope ou de carteira,

    isto , com uma badana que fechava a encadernao pelo corte para a proteger melhor. Fonte: CAMBRAS, Josep, Encadernao, Editorial Estampa, Lda., Lisboa, 2004

    IMAGEM 32. Exemplo de encadernao persa, em forma de carteira (Sculo XV)IMAGEM 33. As diferentes partes do livroIMAGEM 34. Encadernao de LuxoIMAGEM 35. Encadernao ArtsticaIMAGEM 36. Encadernao de Livros Oficiais ou de RegistoIMAGEM 37. Encadernao de BibliotecaIMAGEM 38. Encadernao Comercial ou IndustrialIMAGEM 39. Encadernao de FascculosIMAGEM 40. Costura sobre cordasIMAGEM 41. Costura alternadaIMAGEM 42. Costura sobre fitasIMAGEM 43. Costura ponto de luvaIMAGEM 44. Costura antiga IMAGEM 45. EncaixeIMAGEM 46. EmpasteIMAGEM 47. Encadernao Inteira de peleIMAGEM 48. Meia EncadernaoIMAGEM 49. Encadernao meia amadorIMAGEM 50. Aplicao do p de jaspe no coximIMAGEM 51. Colocao da folha de ouro no coximIMAGEM 52. Aplicao da folha de ouro no suporte a dourar (neste caso o marcador)IMAGEM 53. Aplicao da folha de ouro IMAGEM 54. Gravao com rodaIMAGEM 55. Corte do safir para posterior aplicaoIMAGEM 56. Gofragem manual IMAGEM 57. MosaicoIMAGEM 58. Mosaico em baixo-relevoIMAGEM 59. Corte douradoIMAGEM 60. Cortes cinzeladosIMAGEM 61. Papel marmoreado

    Manual de EncadernaoListagem de imagens

  • 9Introduo

    Este manual de Encadernao foi elaborado no mbito de uma candidatura ao POEFDS e pretende ser um Recurso Didctico para Formadores e Formandos. As suas pginas contm informao suficiente sobre encadernao e decorao de livros, bem como uma sistematizao das tcnicas e procedimentos da encadernao e seu enquadramento histrico.A Encadernao Manual, apesar do desenvolvimento das vrias tcnicas, no sofreu grandes modifica-es ao longo do tempo e uma tcnica procurada por profissionais da rea e pessoas que trabalham com os livros.O manual est dividido em duas partes. A parte terica engloba a histria do livro e da encadernao at aos nossos dias e a parte prtica engloba a encadernao propriamente dita e a decorao, ante-cedida do enquadramento legal e de tudo o que necessrio em termos de equipamentos, mquinas, ferramentas e utenslios nas oficinas de encadernadores e de decoradores. Termina com um glossrio e com uma lista de referncias bibliogrficas consultadas. Ao longo do manual existem imagens e tabelas de sistematizao da informao, criteriosamente escolhidas numa perspectiva didctica.Procurmos ser concisos, minimizar o risco de erros e tratar o assunto com o maior cuidado e perti-nnciaEsperamos que o manual, apesar das lacunas que possa ter, consiga cumprir os objectivos pretendidos, como recurso didctico.

    Manual de Encadernao

  • 11

    Manual de Encadernao01 Histria do Livro

    primeira parte

  • 12

    1.1. O que um livro?

    Fisicamente, um conjunto de folhas de papel, papiro, pergaminho ou outro material, unidas entre si. Carac-teriza-se por conter textos, ilustraes; constituir uma unidade independente e ajudar a preservar e difundir o conhecimento.

    1.2. Suportes ancestrais de escrita

    A apario do livro est estreitamente ligada aos supor-tes da escrita.O suporte mais antigo da escrita foi a pedra, desde as pinturas rupestres at s inscries nas estelas1 e inscri-es do Antigo Oriente e Antiguidade Clssica.

    A argila foi outro suporte da escrita, utilizado na Mesopo-tmia, pelos sumrios e assrios assim como as tabuinhas cobertas de cera ou gesso. Estas tinham o formato de pequenas bandejas e mediam cerca de 20 por 25 cen-tmetros e as bordas eram altas, de modo a que a cera derretida, ao ser despejada sobre as tbuas no escorres--se para fora. A cera, depois de solidificada oferecia uma superfcie bem lisa, sobre a qual os escribas, respon-sveis pelo controle administrativo, gravavam as letras com stylus2 . As tabuinhas serviam essencialmente para anotar registos que pudessem ser contabilizados, embora posteriormente pudessem servir para outros registos. As tabuinhas, depois de escritas, eram secas ao sol.

    Materiais diversos foram igualmente usados como suportes de escrita, entre os quais destacamos: o osso, as carapaas, o bronze, as conchas, fragmentos de cermica, folhas de palmeira, a ardsia, o marfim e metais diversos. Por exemplo, na China, um dos prin-cipais suportes de escrita, alm da seda, era o bambu. Era cortado em cilindros, que depois eram partidos em tiras de pouco mais de 1 centmetro de largura por 20

    Placa de pedra, templo de Shamarzh, Sippar, Iraque

    Tbua de madeira coberta de cera - romanos e gregos

    1 Eram monumentos lticos (feitos de pedra) com representaes pictricas e inscries, usados por povos como fencios e maias 2 Era uma espcie de sovela ou puno de osso ou metal, do qual proveio a palavra estilo (maneira de escrever)

    Manual de Encadernao01 Histria do Livroprimeira parte

  • 13

    centmetros de comprimento. Estas tiras deviam ser serradas e a sua superfcie interna raspada, pois contm um suco que provoca deteriorao e atrai insectos. Esta operao era designada matar o verde. Em seguida, eram postas a secar sobre o fogo. Para formar um livro, elas eram furadas e as vrias peas eram reunidas por um fio de seda. No entanto, ao longo da histria os principais suportes da escrita foram o papiro, o pergaminho e o papel e, por isso, vo ter destaque neste manual

    1.3. O papiro como suporte de escrita

    O papiro surgiu no Egipto. uma planta aqutica (Cyperus papyrus) existente no delta do rio Nilo. O seu talo, em forma piramidal, chegava a ter 5 a 6 metros de comprimento. Esta planta era considerada sagrada, por-que a sua flor, formada por finas hastes verdes, lembra-va os raios do Sol, divindade mxima do povo egpcio. O processo de elaborao da folha do papiro consistia em cortar as pelculas da parte interior da haste da planta aqutica em tiras e col-las umas s outras, para formarem as folhas, que eram sobrepostas com as fibras cruzadas (como na madeira compensada), para aumentar a espes-sura e a resistncia do produto. Depois, o compensado de papiro era polido com leo e posto a secar.Apesar da sua fragilidade, milhares de documentos em papiro chegaram at ns.Sobre este material de escrita, escrevia-se com o clamo3

    1.4. O Pergaminho e o seu modo de preparao para a escrita

    Admite-se que o pergaminho tenha sido inventado no sculo II a.C., na cidade de Prgamo, ou, que a tenha sido introduzido um novo mtodo para o limpar, esticar e raspar, o que tornou possvel a utilizao dos dois lados de uma folha para escrever.

    Papiro do Livro dos mortos - Egipto

    Manual de Encadernao01 Histria do Livro

    3 Ver captulo 1.9

    primeira parte

  • 14

    Manual de Encadernao01 Histria do Livro

    Era muito mais resistente do que o papiro, pois era pro-duzido a partir de peles de animais novos, geralmente de ovelha, cabra ou vaca.Como o fabrico do pergaminho era demorado, o seu preo era tambm elevado.O pergaminho era empregue na forma de folhas. Para alm de ser um material mais slido e mais flexvel que o papiro, permitia que se raspasse para apagar registos. O pergaminho reutilizado aps raspagem denominava-se palimpsesto (palim, novo; psesto, raspado). s vezes, era possvel rasurar duas vezes o mesmo pergaminho. Recentemente conseguiu-se, em alguns casos, fazer reaparecer a escrita primitiva nesses palimpsestos, atra-vs da utilizao de certos cidos. Mas esses reagentes utilizados neste processo so to fortes que acabam por destruir por completo a folha escrita. Devido sua durabilidade, o pergaminho teve grande importncia como material de escrita desde a Antigui-dade.Sobre este material de escrita escrevia-se com a pena4.

    A preparao do pergaminho para fazer cadernos

    Para poder suportar a escrita, a pele do animal era sub-metida a um tratamento que lhe retirava a gordura e as matrias perecveis, a tornava resistente, manusevel e leve:1. Depois de se esfolar o animal, a pele era mergu-

    lhada em gua corrente, durante um dia, e lavada, para a limpar de impurezas;

    2. Era escorrida, polvilhada com cal viva no lado carne e deixada durante uma semana ou duas a absorver a cal;

    3. Era, depois, estendida para que os plos e as gor-duras fossem raspados cuidadosamente;

    4. A pele era, ento submetida a vrios banhos de cal viva, que demoravam dias;

    5. Depois, era esticada em armaes de madeira,

    Foral Manuelino de Soure. Foto cedida pela Biblioteca

    Municipal de Soure

    4 Ver captulo 1.9

    primeira parte

  • 15

    Diviso do pergaminho em quaternos

    primeira parte

    para secar na vertical e para lhe serem retiradas as ltimas partculas de gorduras, ao mesmo tempo que era polvilhada com p de cr, de modo a impedir que a tinta de escrita fosse absorvida pelo pergaminho;

    6. A pele depois de seca, era polida com pedra-po-mes, para ter um aspecto liso, uniforme e brilhan-te;

    7. Depois, a pele era talhada consoante o corte pre-tendido, para fazer folhas;

    8. Aps a sua preparao, as folhas de pergaminho, eram agrupadas em cadernos e aparadas com uma faca para obter formatos uniformes, que podiam variar consoante o pergaminho fosse dobrado uma, duas, trs ou mais vezes5.

    9. Para fazer um cdice, as folhas eram dobradas, costuradas e cortadas e, depois, eram preparadas as encadernaes.

    Biflios para formarem cadernos

    Um biflio = 2 folhas = 1 caderno

    Dois cadernos: 2 conjuntos de biflios metidos uns

    dentro dos outros para depois serem cosidos

    5 O pergaminho podia ser recortado em quatro pedaos (de onde vem a expresso in quarto), ou em oito (de onde vem a expresso in octavo). Esses pedaos podiam ser encader-nados em formatos pequenos, que continham um nmero maior de flios.

    Manual de Encadernao01 Histria do Livro

  • 16

    1.5. O volumen

    Volumen6 uma tira de papiro ou pergaminho (scap-sus), formada por vrias folhas, (normalmente umas 20), coladas umas s outras e enroladas em redor de uma haste de madeira ou de metal (umbilicus).Os volumina (plural de volumen) eram guardados numa capsa (estojos) e em bibliotecas (biblio + theka) = (cofre para livros): cilindros de madeira, pedra ou metal onde se arrumavam vrios rolos das obras mais valiosas.Identificava-se o texto pelo ttulo ou index, que consiste numa tira de pergaminho colocada na parte superior do rolo. Para ler cada um destes volumes, era necess-rio desenrolar a extenso do papiro ou pergaminho e percorrer as vrias colunas de escrita, com cerca de 30 linhas cada, e com a largura que no excederia a de um hexmetro (25 cm), ou as margens que eram a prpria altura do rolo (30/33 cm). Os volumina s podiam ser escritos de um lado e eram difceis de transportar e manusear. Liam-se de p, devido ao seu comprimento, de cerca de 5 a 8 metros, e manejavam-se com as duas mos, tornando-se impos-svel ler e fazer anotaes ao mesmo tempo.

    Manual de Encadernao01 Histria do Livro

    Diamond sutra impresso na china em 868, Imagem

    disponvel no site da British Library

    6 Tambm se chama rotulus. O nome volumen provm do latim volver, enrolar

    primeira parte

  • 17

    primeira parte

    1.6. Os primeiros livros: cdices

    A palavra cdice tem origem no vocbulo latino codex. Um cdice define-se como um conjunto de folhas dobradas em cadernos unidos, por argolas ou tiras de couro e protegidos por uma capa. A forma que os actuais livros apresentam deriva dos cdices que foram os primeiros livros manuscritos.Os cdices surgiram por volta dos sculos I / II d. c. devido necessidade de livros litrgicos e de cdigos de leis e vieram substituir os volumina. Eram escritos essencialmente sobre o pergaminho. A substituio do papiro pelo pergaminho, a partir do sculo IV, difundiu o cdice como forma de livro.

    Vantagens dos cdices em relao aos volumina:

    - So mais resistentes;- Permitem escrever nas 2 pginas da folha (epistgra-

    fos);- Permitem escrever maior quantidade de informao;- Possibilitam folhear e manusear as folhas com mais

    facilidade.

    Os reclamos

    Os reclamos designam as repeties de palavras no final de uma pgina e no incio da pgina seguinte dos cadernos.Na Idade Mdia, a partir do sculo VII, passou-se a assinalar o fim do caderno por meio de sinais conven-cionais, inscritos na parte inferior da ltima pgina e re-petidos no incio da pgina seguinte. No sculo XI, era prtica comum marcar a continuidade dos cadernos, escrevendo, no fim da ltima pgina, a primeira palavra do caderno seguinte. No sculo XIII, quase todos os cdices eram assinalados dessa forma e no sculo XVI, a prtica generalizou-se.

    Manual de Encadernao01 Histria do Livro

    Cdice denominado Theriaka e Alexipharmaca de

    Nicandro, um cdice do Renascimento bizantino do

    sculo X. Encontra-se na Bibliotheque Nationale de

    France. Encadernao em pele castanha mrmore

    com lombada vermelha

    Reclamo. Fonte Histria dos feitos praticados durante

    8 anos no Brasil, Barlaeus Gaspar, Amesterdam, 1647

  • 18

    A funo dos reclamos era indicar a sequncia dos flios, tendo em conta que os cdices e os livros eram bastante grandes, o que levava a que o leitor perdesse um certo tempo para virar a pgina e adiantar sua leitu-ra. Assim evitavam-se interrupes.Havia ainda outras maneiras de indicar a sequncias dos flios:a) o sistema de assinaturas: de tradio romana, apare-ce quase sempre no incio dos cadernos, apesar de, em alguns casos, aparecer na ltima pgina;b) a prpria numerao, como conhecemos actualmente;c) assinaturas e reclamos simultaneamente.Havia tambm reclamos horizontais, verticais e obl-quos.Por vezes, no havia qualquer sistema de ordenao entre as pginas de um texto, o que estaria relacionado com os costumes dos copistas, que podiam utilizar o texto com certa independncia.A paginao, indicada por uma abreviao colocada, quase sempre, ao fundo da pgina, comeou a ser feita apenas no sculo XIV.

    1.7. A importncia dos scriptoria monsticos

    Os scriptoria eram oficinas dos mosteiros e abadias onde os copistas se dedicavam cpia de livros, ilu-minura e encadernao de livros. Tinham importncia e dimenses variveis. Tambm desempenhavam a fun-o de secretariado, pois era l que se redigiam cartas, documentos jurdicos, correspondncia, etc.Os scriptoria monsticos detiveram o monoplio do fa-brico e da cpia de livros at ao sculo XII. A atribuio da realizao de manuscritos a determinado scriptorium baseia-se em dados de minuciosa apreciao e compa-rao, relativas. Isto porque os livros manuscritos no traziam endereo da oficina.Dentro do scriptorium havia divises para as diferentes tarefas, pois cada trabalhador tinha a sua funo espe-

    Reclamo. Fonte Histria dos feitos praticados durante

    8 anos no Brasil, Barlaeus Gaspar, Amesterdam, 1647

    Manual de Encadernao01 Histria do Livroprimeira parte

  • 19

    primeira parte

    cficas na composio do cdice: um preparava o per-gaminho e as tintas, outro cortava o pergaminho, outro definia os limites dos flios e sua justificao (margens), outro trabalhava as letras capitulares e outro tratava da iluminura. Tambm havia alguns que escreviam o texto (os monges copistas). Todos os intervenientes teriam que se entender na manufactura do livro, desde perga-minheiros7, copistas, iluminadores e encadernadores.

    O armarius, tambm conhecido como notarius, ou ainda, como bibliothecarius8 ou precantor, era respon-svel pela ordem e funcionamento do scriptorium. Este funcionrio estava incumbido de distribuir trabalho e coordenar todas as tarefas do processo de execuo das cpias e iluminuras. Dele exigia-se dedicao, pacin-cia e grande sabedoria. Era ele que confrontava, palavra por palavra, linha por linha o modelo e a sua cpia; era tambm o responsvel pela correco das falhas e do preenchimento do texto, caso se apercebesse de faltas cometidas por aqueles que copiavam. A ele tambm competia verificar se a oficina estava provida de mate-riais. Por sua vez, os monges copistas, que podiam pertencer quela comunidade monstica, ou estarem apenas de passagem exerciam a sua funo de transcrio e cpia do texto, como tarefa asctica, trabalhando muitas horas com disciplina e ateno. O seu trabalho tinha um carcter religioso, e a execuo de um livro era tida como uma boa obra, pois permitia que aqueles que estavam ao servio de Deus se edificassem pela leitura.O trabalho de cpia ou transcrio de um texto come-ava por as obras originais serem primeiro ditadas a um notrio que as transcrevia em placas de cera. Depois os copistas do scriptorium passavam-nas a limpo, em pergaminho. Este texto servia de borro e permitia que se fizessem correces. A execuo de um manuscrito podia ser feita por um s copista ou podia resultar de um trabalho de vrios

    grisaille com texto em cima e a representar em

    baixo o Cnego de Lille, Jean Milot a escrever

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    7 Eram os negociantes de pergaminhos.8 Este nome deve-se ao facto de ser vulgar acumular, com este trabalho, o cargo de bibliotecrio, com o que assegurava a guarda dos livros e controlava a sua circulao.

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    copistas, no caso de necessidade de um manuscrito ser rapidamente acabado. Nes--se caso os cadernos eram distribudos por vrios copistas. O tempo que demorava a cpia de um manuscrito variava conforme a rapidez dos copistas, o seu nmero e a qualidade final prendida. Por fim, o chefe da oficina ou outro monge experiente fazia a reviso para eliminar os erros bvios.Os manuscritos a copiar podiam ser em-prestados a outro mosteiro ou pertencer prpria biblioteca do mosteiro. Tambm trabalhavam por encomenda de prnci-pes ou pessoas importantes. Nesse caso copiavam os livros e vendiam-nos a troco de produtos que precisavam, como por exemplo de ovelhas e trigo.

    1.8. Formas de ilustrao dos manuscritos: A miniatura e a iluminura

    A iluminao de livros, impulsionada pelos scriptoria monsticos, foi uma das formas artsticas mais importantes at ao sculo XVI. Os iluminadores eram maioritariamen-te monges, que trabalhavam nos scriptoria dos mosteiros ao lado de copistas. Em alguns casos os copistas e os iluminadores podiam ser a mesma pessoa. As diferentes fases de trabalho de uma mi-niatura ou iluminura eram feitas por vrios membros de um mesmo scriptorium ou atelier. O mestre era responsvel pela parte mais complicada e determinante do traba-lho, a composio; os aprendizes ficavam incumbidos com o trabalho mais mecni-co que demorava mais tempo e requeria

    menos experincia, como a preparao das tintas e o reforo do contorno inicial. As diferentes tarefas eram distribudas pelas vrias pessoas: havia quem unia as folhas dos cadernos, quem misturava as cores, quem se encarregava da composio do desenho e distribuio das figuras, quem pintava as figuras com cores, quem fazia a filigrana e o ornamento decorativo, quem dava por acabadas as miniaturas, etc. Os copistas deixavam os espaos a decorar e, nas margens do livro, anotavam as cenas que deveriam ser pintadas. Assim, davam-se instrues ao iluminador, inclusivamen-te sobre que cores deveria empregar na miniatura.Por vezes, eram diferentes iluminadores que pintavam as vrias miniaturas de um cdice dividido em cadernos. Depois de completada a escrita do manuscrito, comeava-se a pintura com a aplicao das cores bsicas e com o delinear do desenho. Seguidamente, aplicavam-se as sombras e os tons mais escuros e a seguir os tons brancos, que criavam efeitos luminosos. As cores eram essencialmente feitas com pig-mentos vegetais ou minerais modos, que se misturavam com gema de ovo.Os motivos pintados nos manuscritos poderiam ser cenas bblicas ou temas profa-nos, como figuras de animais, monstros ou simplesmente caracteres humanos. O objectivo de ilustrar os manuscritos era tornar a superfcie do flio agradvel e apelativa ao olhar. Por outro lado, dava ao texto uma estrutura clara e uma disposio coerente, uma vez que, pelo ordenamento

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    eficaz das subdivises do texto, a decorao e a ilustra-o serviam frequentemente de pontos de referncia nos manuscritos medievais que no tinham paginao, nem foliao.Inicialmente, no perodo romnico, os livros com miniaturas ou iluminuras eram feitos para as comunida-des religiosas. Posteriormente, foram difundidos entre a realeza e a burguesia. A expanso do mecenato9, no sculo XIV, favoreceu o enriquecimento da decorao do livro. Os livros de horas, que trazem oraes, so exemplos da bibliofilia10 cultivada entre estas classes sociais. Decoravam tambm as Bblias. Algumas das de-coraes eram executadas por oficinas de miniaturistas especializadas nesta modalidade artstica.

    Iluminuras

    Um manuscrito iluminado era decorado com ouro ou prata, se bem que estudiosos modernos usam o termo iluminura para qualquer decorao num texto escrito.As iluminuras tiveram grande importncia no contex-to da arte medieval, pois ilustravam muitos dos livros produzidos durante a Idade Mdia.

    Miniaturas

    Tcnica mais restrita, em que determinadas letras, como as iniciais capitais grandes letras iniciais de captulo ou seco eram decoradas por ornamentos simples e letras de fantasia. Inicialmente, eram dese-nhados com tinta vermelha, que paulatinamente foi substituda pelo azul claro e por tonalidades prateadas e douradas. As decoraes mais ambiciosas cobriam um quarto, metade ou at a totalidade da pgina.Os iluminadores copiavam os desenhos por outras miniaturas ou recorriam a manuais sobre decorao de livros.

    9 e 10 Ver Glossrio

    Letras iluminadas

    Quase-original da Apocalipse flamengo com 23

    miniaturas de pgina inteira iluminadas com ouro

    existente na Biblioteca Nacional de Frana, Paris

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    1.9. Instrumentos da escrita e tintas

    no papiro e pergaminho: Nos primeiros tempos, utilizou-se o estilo stilus ou graphium , que era uma haste de ferro ou mrmore com ponta que servia para traar os caracteres nas tabuletas.Com o tempo, passou-se a utilizar, at o sculo XIII, o clamo calamus que era um pedao de junco corta-do em forma de pena com o extremo afiado ou bisela-do para escrever com tinta e foi utilizado. At ao sculo XIII a pena, geralmente de ganso ou de cisne, tambm foi bastante usada. Esta era afilada e talhada, isto , passava por um processo de endurecimento, para que atendesse, de forma mais adequada, finalidade de servir como instrumento de escrita. A puno era tambm um instrumento de escrita de madeira dura que era utilizado para imprimir ou gravar um trao (sem cor) sobre um suporte.

    Penas e um clamo

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    Tintas e pigmentos:

    as tintas ferroglicasTintas usadas desde a Idade Mdia at ao sculo XIX. O seu principal constituinte um complexo ferroglico obtido por reaco de taninos e sulfato de ferro, apesar de pode tambm ser utilizado algum sulfato de cobre, introduzido deliberadamente ou no. Os taninos utili-zados nas tintas ferroglicas so obtidos das nozes de galha. A cor da tinta est relacionada com a concentra-o de taninos. As tintas ferroglicas provocam corroso do papel, observando-se isso em muitos manuscritos at ao incio do sculo XX.

    Con stituintes da tinta: - Pigmentos: so o que confere a cor propriamente dita

    tinta. Toda e qualquer tinta possui pigmento, e ele que vai determinar se a cor vai ser vermelha, violeta, azul ou outra qualquer. Os pigmentos so ps ou par-tculas bem reduzidas dispersados nas tintas. H duas categorias bsicas:

    - Pigmentos bsicos: so os pigmentos que pro-porcionam a brancura e as cores. So tambm a principal fonte do poder de cobertura.

    - Pigmentos extendedores (ou carga): proporcio-nam volume a um custo relativamente pequeno. Oferecem um poder de cobertura muito menor do que TiO2 e interferem em diversas caractersticas, incluindo brilho, resistncia abraso e reteno exterior de cor, entre outras.

    Na sua maioria so de origem inorgnica e constituem-se num p, mais barato ou mais caro, dependendo de sua origem. Existem tambm pigmentos em p de origem sinttica, de to boa qualidade quanto os tradicionais e quase sempre mais baratos.

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    Os tipos de tinta so dois: as tintas caligr-ficas e as de impresso. As primeiras so constitudas pelos seguintes tipos de tintas: da China; ferroglica ou metalocida; Tinteiro ou pena; Hidrocor; Nanquim e Grafite. Por sua vez as tintas de impresso so constitudas pelas tintas tipogrficas; carimbos; xerox; jacto de tinta; cera; laser; offset e artstica (gravuras).

    1.10. O Papel como suporte de escrita

    O papel constitudo por fibras de origem vegetal unidas e que previamente so trata-das e refinadas e em que lhes so adiciona-dos outros materiais, como colas, cargas e pigmentos.As fibras de papel so formadas, na maior parte, por celulose, bem como por hemice-lulose, pectina e protenas.

    Inveno do papel A inveno do papel11 foi um processo de-senvolvido simultaneamente por diferentes povos em diferentes regies geogrficas ao longo do tempo. Os egpcios em 2400 a.c, comearam por empregar como suporte de escrita medula dos caules de planta mas os chineses foram os primeiros a fabricar o papel com roupas velhas, cascas de rvores e fios de cnha-mo. Inicialmente, a produo de papel comeou a partir de fibras de bambu e da seda. A inveno do papel, feito de fibras vegetais atribuda aos chineses, tendo sido obra do ministro chins da agricultura, Tsai-Lun, no ano de 123 a.c.

    O uso do papel estendeu-se at aos confins do Imprio Chins, acompanhando as rotas comerciais das grandes caravanasOs segredos da sua produo teriam sido revelados aos rabes, aquando da sua ex-panso pelo Oriente.

    Introduo do papel na EuropaS no incio do sculo XII que o fabrico do papel artesanal, feito com linho, cnha-mo e algodo, foi introduzido na Europa pelos rabes, via frica. A entrada do papel fez-se lentamente porque o prestgio do pergaminho na sociedade era muito grande, sendo usado especialmente nos manuscritos de apurado requinte artstico. A princpio, no era acei-te nos actos notariais pblicos, devido s suas caractersticas tangveis. A fragilidade que o caracterizava, no incio no con-seguia competir com o pergaminho, que era mais durvel e resistente, pelo que, de incio, o papel ficou restringido a documen-tos de menor importncia. Mesmo quan-do escasseava o pergaminho, os copistas preferiam raspar os antigos pergaminhos e reutiliz-los em cpias novas palimpsestos do que recorrerem ao papel. Esta situao alterou-se com o surgimen-to da Imprensa, altura em que o papel assumiu uma importncia vital no circuito bsico da produo dos instrumentos de cultura e de transmisso de conhecimentos. Este progresso fez com que o comrcio de manuscritos produzidos em papel aumen-tasse.

    11 A palavra papel originria do latim papyrus, nome dado a um vegetal da famlia Cepareas (Cyperua papyrus)

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    Fabrico de papelO fabrico de papel pode ser artesanal ou industrial.O sistema de produo artesanal foi utiliza-do at finais do sculo XVIII, quando apare-ceram as primeiras mquinas. Actualmente apenas utilizado para fabricar papis e objectos especiais ou artsticos, nomeada-mente em pases como o Japo, Tailndia, Equador, Nepal e China.A matria-prima utilizada o algodo, o linho e o cnhamo.Neste sistema de produo, as folhas so elaboradas uma a uma. O molde submer-so dentro de uma tina onde a fibra (previa-mente tratada e refinada) est em suspen-so aquosa; depois, levanta-se o molde cheio desse material em suspenso (pasta) e drena-se a gua. Em seguida, extrai-se a folha, deposita-se sobre um burel (ou feltro) e cobre-se com outro burel. Assim se forma um conjunto de folhas que depois se pren-sam para eliminar a gua excedente. No fim retira-se folha a folha e deixa-se secar.Este papel artesanal, que era fabricado at finais do sculo XVIII apresenta uma grande percentagem de celulose, tem boa estabi-lidade e mantm-se branco e sem cido, como por exemplo o papel do Japo.

    Inventos para a produo de papel artesanal- Mquina que permitia desfazer trapos,

    desintegrando-os at ao estado de fibra: fim do sculo XVI (holandeses).

    - Uso da madeira, em vez dos trapos, devido concorrncia entre as fbricas de

    papel e a indstria txtil, o que dificultava a obteno e encarecia a principal mat-ria-prima usada na poca: o algodo e o linho12: 1719 (francs Reamur).

    - Desenvolvimento de uma mquina para moer madeira e transform-la em fibras, em 1850. As fibras eram separadas e transformadas no que passou a ser conhe-cido como pasta mecnica de celulose.

    - Descoberta de um processo de produo de pasta celulsica atravs de tratamento com produtos qumicos, que viria a dar origem primeira pasta qumica em In-glaterra, em 1854. A partir daqui, a inds-tria do papel ganhou um grande impulso com a inveno das mquinas de produo contnua e do uso de pastas de madeira.

    O sistema de produo industrial foi inven-tado no incio do sculo XIX para fazer face crescente procura de papel. Actualmente o sistema utilizado para fabricar a maior parte dos papis.A partir dos incios do sculo XIX, a princi-pal matria-prima para fabricao de papel passou a ser a polpa de madeira de rvores, principalmente de pinheiros e eucaliptos. O papel fabricado numa mquina de laborao contnua, que funciona com uma cinta transportadora que abarca as diversas fases de fabrico. Por sua vez, a formao da folha, a sua prensagem, secagem e acabamento final so obtidos atravs de um sistema de cilindros que o submetem a determinadas condies de presso, calor, vapor, etc, conforme a fase de produo e o papel que se esteja a fabricar. O resultado

    12 Ao observar que as vespas mastigavam madeira podre e empregavam a pasta resultante para produzir uma substncia semelhante ao papel na construo dos seus ninhos, Rea-mur percebeu que a madeira seria uma matria-prima alternativa.

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    so grandes bobines de papel contnuo.Este papel industrial menos resistente, tende a degradar-se e a tornar-se amarelo e cido e, por isso requer uma conservao mais adequada.

    Principais caractersticas do papel neutro: tcnicas de fabrico e elementos constituti-vos.

    - Gramagem: o peso em gramas medi-do por metro quadrado de uma folha de papel, por isso sempre especifica-se: g/m. o seu peso que, influncia fortemente os seus custos.

    - Direco da fibra: a fibra o componente principal para a fabricao do papel.

    - Ph: a medida de acidez ou alcalinida-de de uma soluo. Que varia de 0 a 14, sendo ph=7: neutro. Na maioria os papis de uso so cidos, o que acelera seu ama-relecimento e decomposio. Para papis artsticos, o pH neutro fundamental para prolongar a durabilidade da obra de arte.

    - Espessura: a distncia medida entre uma face e outra de uma folha de papel. Cada tipo de papel tem uma espessura que lhe inerente

    as vergaturas e as barbas: - Colorao: a cor do papel. O papel pode ser pintado na superfcie ou colorido na massa. Os primeiros so produzidos brancos e, depois de prontos, recebem

    uma camada de tinta, perdendo a cor com maior facilidade. Os segundos recebem pigmentos durante as misturas de todos os componentes qumicos com a gua e as fibras, o que leva a que tenham maior resistncia.

    - Textura: so os desenhos em alto ou baixo relevo no papel

    - Humidade: a quantidade de gua conti-da no papel, o que est relacionado com o facto de sofrer interferncias da humidade relativa do ambiente em que est exposto, tendendo a se igualar a este.

    - Marcas de gua:Denominadas igualmente filigranas, so os desenhos (ocasionalmente acompanhados de letras) que se observam no papel em contraluz. Ao observar o papel em contraluz, nota-se uma espessura ligeiramente inferior no desenho, o que provoca linhas mais luminosas que no resto do papel. A filigrama feita com um arame cozido sobre o molde com que se fabrica o papel; no local onde se encontra o arame deposita-se uma menor quantidade de fibras quando se forma a folha, razo pela qual tem menor espessura. As marcas de gua so caractersticas dos pa-pis artesanais, mas, hoje em dia, h papis industriais com imitaes de marcas de gua.

    As marcas de gua apresentam desenhos muito variados: escudos, emblemas herldi-cos, castelos, figuras mitolgicas, instrumen-tos musicais, monogramas, objectos diversos.

    Manual de Encadernao01 Histria do Livroprimeira parte

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    Tipos de papis

    - Papel artesanalEste tipo de papel, tambm chamado de fabrico manual, feito segundo o sistema tradicional de produo, ou seja, as folhas so fabricadas uma a uma. Em geral, tem uma gramagem superior dos papis indus-triais e uma tnue textura superficial, pode apresentar barbas, vergaturas e marcas de gua. Actualmente, so fabricados muitos tipos de papis artesanais, entre os quais o papel do Japo.

    - Papel do JapoChamado erradamente papel de arroz, o washi ou papel do Japo um papel de fibra larga, forte, resistente e flexvel. fabricado principalmente a partir de fibras de trs espcies de arbustos (Kozo, Mitsu-mata e Gampi). No processo de fabrico respeitado e conservado o comprimento da fibra, o que origina papis muito resistentes, embora muito finos e transparentes. Entre eles, o que apresenta maior robustez o papel fabricado a partir das fibras de Kozo (as mais largas, espessas e fortes).

    - Papel semiartesanal elaborado atravs de um processo similar ao tradicional, mas parcialmente mecani-zados. A refinao da fibra e o fabrico da folha so feitos mecanicamente. As folhas so formadas numa mquina contnua ou semicontnua: um tambor giratrio recolhe uma determinada quantidade de fibras e deposita-as sobre uma passadeira con-

    tnua de feltro, na qual retirada a gua excedente por meio de cilindros. Depois, segue-se a secagem e a manipulao segun-do o mtodo tradicional. utilizado para o fabrico de papis especiais, destinados a servirem de suporte para obras de arte (desenho, gravura, aguarela).

    - Papel industrialEste tipo de papel, de fabrico mecanizado o mais usado na actualidade para a produ-o e criao de objectos, elementos, livros ou como suporte de obras documentais. o produzido directamente a partir de fibras procedentes da madeira (convenientemente tratadas e refinadas), embora existam ou-tros, entre os quais se destacam os indica-dos para conservao.Em geral feito a partir das pastas qumicas branqueadas com uma mistura em propor-es variveis de resinosas e de folhosas e por vezes de palha. Pode receber tratamen-tos de superfcie, tais como a acetinao, isto , um alisamento de superfcie ou a estampagem, que origina desenhos em relevo numa das faces, ou a estucagem, que consiste em cobrir a superfcie do papel de uma mistura de cargas minerais e de agluti-nantes e a polir o papel. Este tipo de papel de boa qualidade.

    - Papel permanenteO papel permanente possui caractersticas fsicas e qumicas que garantem maior dura-bilidade que os papis habituais. Obtm-se atravs da manuteno em baixas concen-traes ou total eliminao de alguns pro-

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    dutos (lignina) e aditivos (branqueadores, colas). Este papel alcalino, resistente oxidao e ao rasgamento, o que o torna particularmente adequado para arquivar documentos. identificado na embalagem pelo sinal matemtico de infinito (), ins-crito num crculo com, referncia norma internacional de qualidade.

    - Papel reciclado um papel obtido a partir de vrios papis e cartes (jornais, revistas, caixas, folhas). A transformao destes elementos em papel reutilizvel requer tratamentos para a elimi-nao de cores e de tintas e um processo de limpeza que podem ocasionar uma acentuada degradao da celulose, sendo frequente acrescentar-lhes fibra nova.O papel reutilizado difere do reciclado porque obtido a partir de excedentes e resduos de papel branco, sem qualquer tipo de colorao ou tinta.

    - Papel ecolgicoPor papel ecolgico entende-se qualquer papel (normal ou reciclado), em cujo fabri-co no se empregaram produtos ou pro-cessos contaminantes do meio ambiente e que no envolveram a destruio directa de bosques naturais ou florestas. identificado na embalagem por um smbolo referente ao meio ambiente (na Europa referenciado por uma flor).

    - Papel vegetalTrata-se de um papel modificado atravs da aco do cido sulfrico, translcido, muito

    liso, denso, de textura contnua, com ligeira dureza superficial e algo resistente humi-dade, apesar de o excesso de humidade o afectar grave e irreversivelmente. usado sobretudo para desenho.

    - Papel cristal composto de pasta qumica muito refina-da e calandrada (passada em rolos muito pesados e muito lisos) o que lhe d a sua transparncia. A refinao em alto grau da pasta, degrada em parte a celulose e a con-servao deste papel no ser muito boa. O papel calco, papel transparente que permi-te o decalque, utilizado em desenho, feito a partir do papel cristal, por imerso em leos ou em essncias de origem vegetal.

    - Papel revestidoEste papel recebe, durante o processo de fabrico, uma camada exterior de revesti-mento. O revestimento pode ser de vrios tipos: de cor, brilhante, mate, acetinado, metalizado

    - Papel couchTambm chamado de estucado um papel muito branco com revestimento brilhante ou mate, utilizado na produo de livros de qualidade e profusamente ilustrados, pois permite impresses de alta qualidade.

    - Papel jornal o papel destinado impresso de jornais. A sua composio base de madeira desfibrada mecanicamente e branqueada de imediato, razo pela qual apresenta

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    uma grande quantidade de lignina. Com o tempo tende a tornar-se cido, amarelece e torna-se quebradio. Tem tambm alguns problemas de conservao. Contm pelo menos 80% de pasta mec-nica crua e 20% de pasta qumica crua. Caracteriza-se pelo seu baixo preo, e pela sua ptima absoro das tintas de impres-so, mas tambm pela sua m conservao no tempo.

    - Papel revistaA sua composio muito prxima da do papel jornal, mas contm um pouco menos de pasta mecnica.

    - Papel kraftTambm conhecido por papel de em-brulho, composto por madeira macia desfibrada por meios qumicos (processo chamado Kraft) que dissolvem a lignina da madeira. Pode ser branqueado ou no e muito resistente, sendo, por isso, usado em embalagens e revestimentos. Envelhece mal por causa do seu elevado grau de acidez. constitudo por 100% de pasta qumica crua muito refinada. Tem uma notvel resistncia mecnica, mas a presena de linhina na pasta torna-o sensvel luz e temperatura: pode, portanto, degradar-se, escurecer, tornar-se quebradio e talvez libertar produtos nocivos para os outros documentos.

    - Papel translcido fabricado com as mesmas pastas que os papis de edio corrente, mas muito

    mais fino. utilizado para duplicados de mquina de escrever ou como suporte de carbonos.

    - Papel bbliaAs qualidades clssicas so feitas a partir de linho ou de cnhamo e servem para imprimir os textos religiosos e outros textos particularmente densos (por exemplo, as obras da coleco La Pliade).

    - Papel de edio de luxo e fiducirio (notas de banco)Contem pastas de trapo em propores considerveis podendo ir at aos 100%. um papel encolado em meio neutro, que resiste melhor aco do tempo e que tem maior durao.

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    1.11. A importncia das Universidades na produo de livros

    O aparecimento e o desenvolvimento das Universidades, nos finais do sculo XII e incio do sculo XIII, a par com o desenvolvimento das cidades, fez surgir um outro tipo de leitores que no se restringia aos clrigos. As cidades capitais da nobreza e, principalmente as cidades universi-trias acolhiam profissionais dos livros: livreiros, copistas, escritores; que poderiam ser clrigos ou leigos.

    Estes profissionais gozavam de certo prestgio, estavam isentos de alguns impostos, apesar de estarem sujeitos regulamentao de seus ofcios. Eles dependiam das autoridades universitrias e no trabalhavam em provei-to prprio, executavam trabalho, para as universidades que precisavam de textos. Era uma espcie de servio pblico sujeito taxao das cpias e ao controlo da circulao dos exemplares ou do que se passou a chamar de pecia.

    A pecia era feita com uma pele inteira de carneiro ou de bezerro, que se dobrava duas vezes resultando num caderno de oito pginas e que servia, tambm, como unidade de trabalho, a partir do qual se estipulava o preo. A adopo do sistema de pecia, em que vrios copistas trabalhavam no mesmo livro separado por cadernos (pecioe) no ligados, permitia produzir simul-taneamente muitas cpias do mesmo livro, o que ace-lerava a produo de exemplares e permitia tambm melhorar a produtividade dos copistas, sempre preser-vando a qualidade dos textos postos em circulao. Apesar das tcnicas usadas no sculo XII no diferirem das antigas, os novos artesos do livro, agora reunidos em grmios, rivalizavam entre si na excelncia de seus trabalhos e formavam escolas ligadas a alguma universi-dade ou pas.

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    Exemplo de uma oficina de um copista profissional.

    Fonte: Capa do livro Scribes and Illuminators, de

    Christopher Hamel.

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    Nestas cidades universitrias, onde mestres e estudan-tes, que dispunham de limitados recursos financeiros, tinham necessidade de muitos livros, procurou-se reduzir ao mximo o preo de revenda dos livros. Para isso, os copistas faziam pequenos formatos, linhas apertadas, escrita mais cursiva, multiplicavam as abre-viaturas, o que permitia economizar o pergaminho ou o papel e ganhar um pouco de tempo de cpia. Nestes casos o livro era considerado como uma mercadoria.

    As universidades exerciam um rgido controlo intelec-tual e econmico sobre a circulao dos livros. Como no permitiam a circulao de cpias de m qualida-de, esforavam-se por proteger a pureza e a exactido dos textos. Para isso, recorriam aos stationarii, isto , a profissionais responsveis pela reviso e inspeco das cpias, que actuavam sobre a qualidade da reprodu-o feita para que no se desvirtuasse ou se perdesse o sentido da obra. Estes profissionais eram tambm responsveis pelo emprstimo do exemplar a ser repro-duzido e tinham exemplares ou cpias mestras auto-rizadas, das quais no se podiam desfazer, para poder alug-las a todos aqueles que o desejassem, com preos determinados pela Universidade. Era a eles que, antes da inveno da Imprensa, os leitores podiam comprar directamente os livros. Tambm podiam encomend-los a um scriptor ou copista. As Universidades tambm podiam inspeccionar os livros que estavam em poder dos livreiros.

    Alm desses livros de texto, que tiveram uma certa difuso, no fim da Idade Mdia, as Igrejas e os grandes magnatas costumavam encomendar a produo de luxuosos cdices de grande valor artstico. Esses livros j no eram realizados por copistas, mas sim por calgrafos e ilustradores muito especializados.

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    1.12. A Xilografia: primeiro processo de gravao aplicado ilustrao de livros

    A Xilografia era o processo de gravao aplicado ilustrao de livros na fase da Imprensa anterior inveno dos caracteres mveis.

    A tcnica da Xilografia consiste na utilizao de uma matriz em alto-relevo que rece-be a tinta e, depois, por meio de presso exercida (por prensa ou colher), transfere-se a imagem para outra superfcie. A imagem gravada na matriz atravs de goivas, for-mes e pontas cortantes. Assim a reprodu-o de gravuras e textos fazia-se atravs de pranchas de madeira gravadas.

    Quando a Tipografia apareceu, no sculo XV, as xilografias tornaram-se mais frequen-tes e passaram a surgir os livrinhos xilgra-fados (conhecidos pelos chineses desde o sculo III a.c.) formados por cadernos, como os livros, correspondendo, geralmen-te, ao nosso pequeno in-4. Continham ilustraes e breves textos. Eram impressos com blocos de madeira e mo.13 Foram produzidos em grande nmero na Europa, principalmente, na Alemanha e na Holan-da, durante os anos que precederam o livro tipogrfico. O mais antigo livro xilogrfico que se conhece no Ocidente, a Bblia Pauperum.

    A tcnica recebe os nomes de xilogravura (madeira), linoleogravura (linleo) e zinco-

    gravura (zinco ou outro metal), conforme o material utilizado como suporte da matriz. A xilogravura merece um local de destaque na histria da gravura por ser a mais antiga. Mas h, tambm, outras tcnicas utilizadas nas gravuras, como a tcnica de talhe-doce.A tcnica de talhe-doce a designao genrica de todos os processos de gravura sobre chapa metlica, incluindo o da gravu-ra a gua-forte.

    1.13. A estampa: seu papel na difuso da obra de arte e na ilustrao de livros

    A gravura, como tcnica de reproduo de imagens, desenvolve-se a partir da xilogra-vura.

    O sculo XIV viu desenvolver-se extraor-dinariamente a tcnica da estampa, tanto no plano civil como no religioso. No plano civil, as estampas foram usadas nas cartas de jogar e no plano religioso, fabricaram-se imagens piedosas que eram distribudas em lugares de peregrinao, ao longo das estradas e nas casas das pessoas. Numa poca em que a maioria da populao era analfabeta e a religio era o centro da vida, este procedimento permitia multiplicar as imagens religiosas num grande nmero de exemplares. Assim, as ilustraes feitas mo pelos iluminadores na Idade Mdia foram substitudas por xilogravuras de muito mais fcil reproduo.

    Este fabrico de imagens, inicialmente apare-ce-nos sobre duas formas opostas, segundo

    13 O primeiro livro impresso em xilogravura foi o Livro Sutra Diamante, impresso na China, em 868, por Wang-Chieh. Ver a imagem do captulo 1.5.

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    14 Os chineses passaram a talhar pequenos blocos com caracteres individuais, criando assim os primeiros tipos mveis para reproduo. Depois os tipos passaram a ser esculpidos em liga metlica e depois numa liga metlica base de chumbo, antimnio e estanho, muito idntica usada hoje em dia.15 Caixa onde esto as letras do alfabeto e todos os outros caracteres usados, isolada ou conjuntamente, para criar palavras, sentenas, blocos de texto, etc.

    o mtodo utilizado para gravar no suporte:a) a gravura em madeira na qual o desenho

    deixado em relevo e escavado volta;

    b) gravura em talhe-doce, que praticada sobre metal, com um buril que realiza a impresso atravs da escavao dos sulcos cheios de tinta.

    A utilizao deste tipo de matrizes au-mentou e assim, os livros eram executados com maior rapidez do que os que eram escritos mo. Esta tcnica ajudou muito a incrementar o comrcio de textos por toda Europa.

    Os primeiros livros impressos em pranchas de madeira ou de metal denominavam-se Livros Tabulrios. O que mais ressalta nesses livros no so os textos, escritos qua-se sempre em latim, mas as imagens, que serviam, de modo especial, para auxiliar no servio religioso. A chamada Bblia dos Pobres um exemplo tpico de livro tabulrio.

    Com o aparecimento da imprensa, as imagens gravadas tornaram-se mais abun-dantes, sobretudo aps o estabelecimento de vendedores de estampas por toda a Europa ocidental e passaram a ser usadas juntamente com os caracteres mveis e sua semelhana.

    A propaganda protestante tambm explo-rou a imagem impressa, como se comprova pelos inmeros desenhos e caricaturas que existem da poca.

    1.14. O contributo da inveno da Tipografia

    A inveno da tipografia transformou completamente, tanto em rapidez quanto em quantidade, a circulao da informao escrita no seio das sociedades.Os tipos mveis14 , ou isolados, foram usa-dos pela primeira vez no Oriente, tanto na China como na Coreia. No sculo XV, foram redescobertos, por Johann Gutenberg, com a inveno da prensa mecnica. A diferena entre os tipos chineses e os de Gutenberg deve-se ao facto de os primei-ros no serem reutilizveis. Gutenberg desenvolveu a tcnica de impresso por caracteres mveis gravados e inventou a caixa de tipos15 para segurar os tipos juntos para compor uma pgina. A reutilizao dos mesmos tipos para compor diferentes textos mostrou-se eficaz e utilizada ainda nos dias de hoje, tendo constitudo a base da imprensa durante muitos sculos. Um outro mrito de Gutenberg foi a criao de um prelo, baseado numa prensa usada para espremer uva.

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    O processo tipogrfico

    Para fabricar mecanicamente livros, Johannes Guten-berg (que tinha aprendido o ofcio de ourives) com-binou vrias das suas invenes revolucionrias. A combinao conduziu ao resultado final: o processo tipogrfico, utilizando tipos mveis, fundidos em metal. Primeiro foi necessrio fabricar punes - patrizes. Estes carimbos, tambm chamados patriz (molde macho) eram gravados em ao duro.Como estes punes eram gravados numa matriz de metal mais macio, em cobre, resultavam glifos de forma negativa.

    As matrizes eram integradas no fundidor manual ou-tra importante inveno de Gutenberg. A cavidade do fundidor era preenchida com uma liga, a 300C. Esta liga de metais - chumbo e antimnio - tinha que esfriar depressa, para possibilitar uma produo rpida. No es-tado frio e slido tinha que ser dura, para que os tipos fundidos durassem vrias impresses.

    Os tipos eram guardados em caixas tipogrficas bem or-denadas. Na elaborao dos tipos de metal, Gutenberg regeu-se pelos padres de letras manuscritas comuns na poca e na sua zona. Quando era o momento de fazer um livro, o arteso compositor retirava-os da caixa, para junt-los no componedor16, formando as palavras de uma linha de texto.

    Fabricou ainda tintas de impresso para papel e perga-minho e escovas para no tornar o papel permevel, pois o verso da folha tambm era impresso. A tinta de-via de secar rapidamente, para no demorar o processo de produo do livro.17

    A forma tinta (composio de tipos com a tinta apli-cada) era colocada no carrinho da prensa. O papel ou

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    Oficina de impresso

    16 Ver Glossrio.17 Para produzir a tinta de impresso, Gutenberg misturou fuligem, resina e leo de linhaa. A tinta era aplicada com duas almofadas, forradas de couro de co e com crina de cava-lo dentro. A pele de co no tem poros os ces transpiram pelo focinho e pela lngua o que faz com que a tinta no seja absorvida pela almofada e permanea na sua superfcie.

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    o pergaminho eram inseridos na tampa. Estes eram colocados, ento, sobre os caracteres tintos e o carrinho completo era colocado sob a placa da prensa.

    Com ajuda do torniquete da prensa, imprimia-se a placa com o papel sobre os caracteres. Enquanto um arteso imprimia, o outro aplicava tinta nos caracteres, sempre de forma alternada. A prensa fornecia uma face de texto muito mais homognea do que a que os melhores escribas da poca eram capazes de fazer manualmente.

    Outra das inovaes de Gutenberg foi tomar como molde as prensas de vinho que eram utilizadas para a obteno do vinho na sua zona, transformando-as em impressoras. Para isso, conseguiu que a placa ficasse suspensa para no girar

    O contributo da inveno da tipografia:- Os livros multiplicaram-se e passaram a ser objectos

    de uso corrente; - Os particulares comearam a formar as suas bibliote-

    cas;- Os livros tornaram-se menos imponentes, tendncia

    que j vinha de trs, devido ao aparecimento das universidades, ao desenvolvimento das cidades e ao aumento da populao com acesso leitura;

    - A reproduo dos textos era mais fiel;- T eve uma grande repercusso na Igreja Catlica, pois

    assim podia, por exemplo, mandar imprimir cartas de indulgncia em grandes quantidades. Com o paga-mento de uma soma em dinheiro, qualquer catlico podia livrar-se de cumprir as suas penitncias e at mesmo do purgatrio.

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    Os incunbulos

    Os incunbulos (do latim incunabulum, bero, origem, princpio) so os livros que foram impressos desde a inveno da imprensa at ao ano de 1501. Os primeiros livros impressos, dos quais foram conser-vados alguns exemplares como a Bblia de 42 linhas, dita de Gutenberg e o Saltrio de Mogncia, datam dos anos 1450.

    Principais caractersticas:- So semelhantes aos manuscritos;- Tm grande formato;- Raramente tm folha de rosto e numerao, mas (por

    vezes) referem num clofon ou pargrafo final, o lugar de impresso e o nome do impressor ou editor.

    - A maioria escrita em latim, como por exemplo: Livros de Horas, Brevirios, Missais, Livros de Piedade e Bblias.

    A Bblia de Gutenberg o incunbulo mais importante:- a primeira obra, com forma de volume, a ser im-

    pressa por Johann Gutenberg em Mogncia, Alema-nha;

    - o 1 livro impresso com caracteres mveis na Euro-pa;

    - o livro que inaugura, oficialmente, a fundao da tipografia no Ocidente;

    - Tem caracteres gticos e duas colunas. O texto divi-dido em duas colunas, contendo 42 linhas cada, com os ttulos correntes e epgrafes impressos a vermelho e iniciais capitulares manuscritas.

    de referir que, em 1457, com a impresso de um Sal-trio, longo de 143 folhas, ocorreu o primeiro colofo18 (datado e assinado) numa obra impressa, complemento do explicit19 , e que constituiu inovao como individua-

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    Flio iluminado da Bblia, impressa por Guttenberg

    - exemplo de um incunbulo.

    18 Dizeres com que os primeiros tipgrafos indicavam, no final das obras, a data e o lugar da impresso. Nos manuscritos medievais aparecia informao no final relativo ao autor ou escriba, ao lugar onde se escreveu a obra e data dela.19 Termo latino (na expresso completa: explicit liber, o livro acaba aqui) para designar a informao de carcter bibliogrfico com que alguns textos medievais terminam e que constituem, em regra, uma despedida formal do autor ou do copista.

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    lizao do trabalho do artfice, o que rara-mente sucedia com as oficinas dos copistas e iluminadores, que mantinham o anonimato.As pginas com o ttulo apareceram por volta de 1470, tornando-se habituais poucos anos depois. Os colofes e os frontispcios eram, por vezes, decorados com a marca ou emble-ma do impressor e posteriormente do editor.

    a Tipografia em Portugal

    A tipografia foi introduzida na Europa ou no Ocidente por volta de 1450, numa poca em que o papel, pelo seu baixo custo e textura, passou a desempenhar uma funo relevante como suporte, substituindo o pergaminho. O papel permitiu a grande difuso dos textos e das gravuras. A imagem, alm do texto, encontrou a a sua grande possibilidade de divulgao. Em Portugal, o primeiro incunbulo de que se tem conhecimento o Pentateuco impres-so na oficina tipogrfica do judeu Samuel Gacon, em Faro, data de 1487. escrito em hebraico.O primeiro incunbulo que se conhece impresso em portugus o Tratado de Confissom, impresso em Chaves, em 1489, surgindo posteriormente trabalhos de outros impressores, como o alemo Gherlinc, a quem se deve o Breviarium Bracharense e Valentim Fernandes e Nicolau da Saxnia, que, em 1495, imprimiram a Vita Christi, por encomenda da rainha D. Leonor. Foi tambm da oficina de Valentim Fernandes que saiu a primeira obra laica impressa em Portugal, a Histria de Vespasiano, em 1496.

    Houve outros impressores hebraicos, como Elieser Toledano e Samuel e Abrao d Ortas. Da Alemanha veio Joo Gherlinc, ti-pgrafo ambulante. Quanto a portugueses, destaca-se Rodrigo lvares, que imprimiu no Porto, em 1497, as Constituioes que fez ho Senhor dom Diogo de Sousa bispo do Porto. E Evangelhos e epistolas com suas exposies en romce.

    1.15. O comrcio do livro nos sculos XVI a XVIII

    O comrcio do livro est relacionado com a indstria tipogrfica, desde o incio da imprensa at meados do sculo XIX. Inicialmente, o sistema de trocas entre os comerciantes de livros teve grande impor-tncia, apesar de, progressivamente, ter sido abandonado devido, abundncia de ttulos que foram surgindo ao longo do sculo XVI.

    LojasAs lojas abertas por livreiros (cartolai) foram importantes. Multiplicaram-se para responder crescente procura de cadernos, folhas preparadas para escrever e outros produtos. Dedicavam-se venda de artigos para a escrita e encadernao, bem como de livros escolares e de servios de encadernao. Dispunham de obras feitas por encomenda e de outras para venderem nas suas lojas. Era a que alguns mercadores procuravam obras preciosas para os seus patronos biblifilos20.

    20 Consultar no glossrio biblifilos

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    FeirasEram um ponto de encontro de livreiros e impressores, onde eram concedidos privil-gios aos mercadores.Esses livreiros e impressores reuniam-se em tais ocasies no s para fazerem contas das suas trocas, mas tambm para anunciarem a publicao de um novo livro e garantirem que nenhum outro editor o fosse imprimir e, ainda, fixarem com os livreiros de outras cidade as bases de trocas regulares. Nesta perspectiva, foram parti-cularmente importantes as feiras de Lyon, Leipzig, Frankfurt e, sobretudo para os portugueses, a de Medina del Campo. Em 1564 comearam a ser impressos catlogos de livros que eram vendidos nas feiras.

    EncomendasEram feitas pelas classes dirigentes, laicas e religiosas. Interessavam-se, sobretudo, pelos livros iluminados que tinham cenas bblicas e moralizantes, j divulgadas pelas obras xi-logrficas. Exemplo disto o Livro de Horas de D. Manuel.21 A partir da segunda metade do sculo XVI, pelo aumento progressivo do nmero de livreiros, e tambm de impressores, verifi-ca-se que o livro tinha deixado de ser um produto s acessvel aos clrigos e aos ricos amadores, mas ainda no era um produto de baixo preo.

    Leiles A partir do incio do sculo XVII apareceu uma nova forma de comrcio de livros: os leiles. Foi na Holanda que pela primeira vez se organizou um leilo.

    L vendiam-se os livros a quem oferecia mais. Este tipo de transaco beneficiava no s o vendedor, mas tambm o compra-dor. O primeiro obtinha mais dinheiro e o segundo tinha a oportunidade de conseguir adquirir a coleces completa de alguns livros, embora, com o tempo, os livreiros comearam a incluir nestas vendas livros de menor valor para se desembaraarem deles.

    Bibliofilia O desejo de coleccionar determinados livros por circunstncias especiais ligadas sua publicao, como a sua raridade incentivou tambm o comrcio de livros. Assim era distribudo um catlogo dos livros postos venda, geralmente classificados por formato. Esta modalidade foi introduzida por um eclesistico ingls Joseph Hill, que tinha passado pelo leilo da Holanda e introduziu este tipo de venda em Londres, por volta de 1676, vendendo deste modo a biblioteca de um dos seus colegas que tinha morrido anteriormente. Assim a moda espalhou-se pela Europa e em 1713 aproxi-madamente atingiu a Amrica.

    ColeccionismoEste tipo de comrcio, desde o incio, que se ligou ideia de posse que, por sua vez, gerou o conceito de propriedade. Possuir objectos, como por exemplo livros tornou-se manifestao de poder. medida que o poder real crescia, espalhava-se o luxo na corte e volta do soberano e dos colec-cionadores da famlia real, os senhores e damas da nobreza tentavam imit-los e co-leccionar livros, alimentando este comrcio.

    Manual de Encadernao01 Histria do Livro

    21 Livro de Horas um manuscrito com um conjunto de oraes dirias, que teve grande difuso entre os leigos, na Idade Mdia.

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    Em Portugal, o movimento de expanso do mercado livreiro dependeu da instala-o dos impressores; das relaes com a Flandres (Bruges e Anturpia); da presen-a de mercadores portugueses nas feiras europeias, nomeadamente Lyon e Medina deI Campo e da aco das ordens religiosas como dos Franciscanos, Dominicanos e Jernimos.

    Portugal estava integrado no comrcio europeu do livro, a julgar pelo nmero de livreiros existentes no sculo XVI, que era muito superior ao de impressores. De facto, no Sumario em que breuemente se contem alguas causas que ha na cidade de Lisboa de 1551, Cristvo Rodrigues de Oliveira refere a existncia de 54 livreiros e apenas cinco impressores, cuja actividade era re-cente e, como tal, o seu regulamento ainda no se inclua no Regimento dos Oficiais Mecnicos, de 1572.

    Profisses ligadas ao livro Por toda a Europa, os profissionais da imprensa organizaram-se corporativamente com os seus estatutos, definindo de forma clara as regras e a vida profissional de cada um. Aprovaram-se estatutos da profisso de livreiro, que era um encadernador e que depois passou a ser vendedor

    Em Portugal, as profisses ligadas ao livro eram: impressor, encadernador (ou livreiro), editor e mercador.22

    ImpressorEra o produtor de livros por excelncia. Foi muito protegido e acarinhado pelos reis. Por exemplo, em 1508, D. Manuel I concedeu ao alemo Jacobo Cromberger o privilgio de imprimir no pas, vindo a imprimir, em 1521, uma verso revista das Ordenaes Manuelinas.

    LivreiroEra um mesteiral, integrado na Casa dos Vinte e Quatro, criada por D. Joo I, em Lisboa.23 Competia-lhe no s encadernar os livros que recebia do impressor ou de um mercador, mas tambm vend-los a retalho na sua loja. Os Livreiros eram a maioria dos agentes. Tinham o seu estatuto aprovado pela corporao do ofcio, segun-do os ditames do regimento, com represen-tao na Casa dos Vinte e Quatro; At ao sculo XVIII o ofcio de livreiro era exclusivo de quem ficasse habilitado no exame de aptido tcnica, efectuado pelos oficiais da corporao dos livreiros.

    MercadorImportava ou comprava exemplares ao impressor que depois vendia por grosso.

    EditorSurgiu em Portugal na primeira metade do sculo XVII (1630). Foi quando um Mateus Pinheiro, referindo-se a uma determinada obra, declarou que a imprimira sua custa e a fizera emendar de muitos erros, no que tivera muito trabalho e gasto24

    22 A extino das corporaes dos ofcios mecnicos ocorreu em 1834.23 A Casa dos Vinte e Quatro foi criada por D. Joo I, para agradecer o apoio das corporaes sua causa, durante a crise de 1383-85. Concedeu, por carta rgia de 1384, que dois representantes dos mesteres tivessem assento na Cmara de Lisboa, com direito de interveno nas deliberaes municipais. Assim, tiveram representao em todos os actos do reinado de D. Joo I, em que o povo devia manifestar-se. Acompanharam os acontecimentos do reino at 7 de Maio de 1834, altura em que D. Pedro suprimiu Casa dos Vinte e Quatro.24 Enciclopdia Verbo Luso-Brasileira de Cultura - Edio Sculo XXI, Verbo 2001, ISBN: 9722220551, p. 118.

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    Exemplos de outros agentes no negcio do livro:

    autores Por exemplo, os conventos, muitas vezes, vendiam nas portarias os livros escritos pelos frades.Pessoas ligadas ao comrcio do livro Bibliotecrios, tradutores e editores ocasio-nais.

    Livreiros estrangeiros Durante a primeira metade do sculo XVIII, livreiros estrangeiros vieram para as princi-pais cidades portuguesas e estabeleceram-se sombra dos privilgios concedidos a sbditos das naes estrangeiras.25 A sua vinda estaria relacionada com o facto de a produo editorial de Portugal e dos res-tantes pases da Europa do sul (Catlica) ser deficitria ao contrrio da Europa central e setentrional (Protestante) onde a produo impressa era maior, mais barata e a sua circulao mais rpida e intensiva. Como houve muita procura de livros estrangeiros, principalmente em lngua francesa, fixaram-se, em Portugal, particularmente livreiros franceses. Importavam grandes remessas de obras de autores populares e rapidamente tomaram conta do mercado e dos circui-tos de distribuio nas principais cidades portuguesas.26

    Vendedores em geralEram pessoas que frequentemente recor-riam venda ilegal e em regime de com-plementaridade sua actividade principal, como, por exemplo, ladres e traficantes de livros clandestinos, sem tenda nem lugar fixo, que vendiam de porta em porta, no vo das escadas, nas escadarias da igrejas e nos largos pblicos.27

    O mbito de cada profisso estava teorica-mente definido, mas na prtica a realidade era diferente, pois havia uma certa con-fuso e atropelos, especialmente entre mercadores tendo as autoridades e o rei que intervir.

    nos outros pases da Europa tambm existiam regulamentaes equivalentes s de Portugal, mas funcionou um comrcio paralelo: o Colportage, que no estava su-jeito s regulamentaes. Trata-se da venda ambulante de impressos em papel, no encadernados, que continham normalmen-te textos de literatura popular ou de circula-o clandestina. Os colporteurs comearam por ser, no sculo XV, agentes dos primeiros impressores, encarregados de difundir as novas publicaes pelas feiras da Europa. Levavam consigo panfletos que publicita-vam ttulos e casas impressoras. Posterior-mente, quando os livreiros estabelecidos

    25 Eram mercadores que importavam grandes quantidades de livros e a sua actividade era reconhecida pelas autoridades.26 Tinham algumas limitaes relativamente aos livreiros nacionais. Estavam condicionados pela norma do regimento de 1572 e de 1733, que impunha aos livreiros estrangeiros a venda de livros por grosso e no unidade. Esta regulamentao foi perdendo a eficcia devido lei de D. Joo V (1735) que permitia aos livreiros estrangeiros residentes na Corte venderem em lojas. Uma outra restrio que lhes foi imposta foi a lei de 1771 que explicitava que s os livros no encadernados estavam autorizados a serem vendidos nas lojas dos livreiros estrangeiros. ANSELMO, Artur Aspectos do mercado livreiro em Portugal nos sculos XVI e XVII in Revista Portuguesa de Histria do Livro e da Edio, Lisboa: Edies Tvola Redonda, A. 1, n 2 (1997), p. 52.27 GUEDES, Fernando Os livreiros em Portugal e as suas associaes desde do sculo XV at aos nossos dias. Lisboa: Verbo, 1993, p. 33.

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    passaram a assumir a venda de impressos, a literatura de colportage tornou-se exclusi-vamente um produto econmico, vendida por cegos e mendigos, como, por exemplo, os membros da Irmandade do Menino Jesus dos Homens cegos. Esta literatura consta-va de cartilhas, almanaques, calendrios, estampas, oraes, hagiografias, autos, novelas, relaes, gazetas, etc.Com o movimento ideolgico da Reforma, os colporteurs tiveram um papel importante na Alemanha, sobretudo, ao divulgarem literatura panfletria protestante. Em Frana, durante todo o Antigo Regime, estiveram associados venda de textos herticos ou contrrios ao poder real. Em Portugal, vrios foram chamados a testemunhar junto da Inquisio por estarem a vender textos no autorizados pela censura. Quando a litera-tura popular se incorporou totalmente no mercado livreiro, os colporteurs tornaram-se apenas gazeteiros; hoje, so cauteleiros.28

    1.16. Principais inovaes do livro entre o sculo XV e o XVIII

    Durante muitos sculos, os livros foram produzidos sem grandes alteraes no seu processo produtivo. Ateliers de tipografia faziam a impresso e o restante processo - o que hoje se denomina sector de acabamen-

    to na indstria grfica - era realizado em oficinas de encadernao, onde, normal-mente, eles tambm eram comercializados. A mecanizao e a mudana das diversas fontes de energia motriz no causaram grandes mudanas no aspecto fsico do livro durante os sculos XV, XVI, XVII e XVIII; apenas aceleraram a sua produo, possibi-litando um maior volume de edies, quer sob o aspecto das quantidades editadas, quer pela diversidade dos ttulos publica-dos.

    - Utilizao da cor na impresso tipogr-fica: em 1457, o Saltrio foi o 1 livro a usar cor (vermelho e azul) na impresso das suas letras iniciais.29 o primeiro livro impresso datado e assinado;

    - Primeiro livro tipogrfico ilustrado: Der Edelstein, em 1461;

    - I ntroduo da gravura em talhe-doce30, em 1477. O 1 livro com esta inovao, que possibilitou uma impresso mais rpida e fcil, foi a Cosmographia de Pto-lomeu, que foi estampado por Domenico de Lapi;

    - I ntroduo do processo mezzotinto em 1642: permitiu a impresso de tons gra-duados;31

    28 FEBVRE, Lucien; MARTIN, Henri-Jean O aparecimento do livro. Lisboa : Fundao Calouste Gulbenkian, 2000. ISBN 972-31-0899-2.29 Foi em Mogncia por Johann Fust e Peter Schoffer, antigos scios de Gutenberg.30 um processo de gravura em relevo sobre chapa de metal (cobre ou ao ) executada manualmente. A imagem gravada com buril e depois espalha-se a tinta sobre a superfcie da chapa, a qual fica depositada nas reas cavadas. A chapa depois comprimida sobre papel macio, o qual recebe a tinta armazenada nos entalhes, formando assim a imagem.31 O processo mezzotinto, mais conhecido por processo de gravura maneira negra. Foi o primeiro processo de gravura que permitiu a impresso de tons graduados. A imagem gravada numa chapa de cobre ou ao, previamente granida com ber (instrumento usado pelo gravador ) de modo a reter a tinta. Antes de a tinta ser aplicada, o gravador alisa selectivamente com o brunidor as reas da superfcie que na imagem tero tons cinzentos ou brancos. Devido ao facto de apresentar variaes suaves de tons, sem a utilizao de traos ou linhas negras como na gravura em madeira, a sua aplicao generalizou-se reproduo de obras de arte.

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    - Introduo da cor total na impresso em 1719;32 - Reproduo mltipla de uma pgina de tipos mveis

    atravs da execuo prvia de um molde: estereoti-pia33

    - No final do sculo XVIII, surge a Fourdrinier: a pode-rosa mquina de produo contnua que permitiu o fabrico de papel em grande escala;

    - Inveno da litografia em 1796, por Alois Senefelder, em Munique. Trata-se de um sistema de impresso em que o motivo a reproduzir desenhado sobre a matriz, tradicionalmente de pedra34 e actualmente metlica, com uma matria gordurosa, a lpis ou pincel. Depois do desenho estar terminado, a matriz banhada em gua e tingida.

    Vantagens da litografia: - Possibilitou a impresso em larga escala de trabalhos

    com imagens dotadas de tons entre o preto e o bran-co;

    - Permitiu que a impresso menos morosa e com custos mais baixos.

    - Abriu novos caminhos para a produo artstica- Significou um enorme passo na evoluo da impres-

    so de carcter comercial ao permitir que a indstria editorial beneficiar dos seus recursos, passando a ter ilustraes internas, a incluir cadernos integralmente impressos neste sistema e as capas das publicaes a serem ilustradas;

    32 Processo patenteado em 1719 por Jakob Christof Le Blon, miniaturista e gravador, nascido em Frankfurt, Alemanha, em 1667. Inspirou-se na descoberta de Isaac Newton e usou inicialmente chapas com as sete cores resultantes da decomposio do espectro solar. Mais tarde , limitou o nmero de chapas s trs cores fundamentais: o vermelho o amarelo e o azul, e, por vezes, outra para o preto. Hoje, com os progressos da fsica da luz, os impressores utilizam as cores magenta , amarela e cyan.33 tcnica inventada por William Ged em 1727.34 Em grego, pedra litos.

    Exemplo de litografia a cores de Toulouse Lautrec.

    Fonte: www. Udenap.org

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    1.17. As transformaes do sculo XIX

    Este sculo caracterizou-se por inovaes ligadas revoluo industrial, que assegura-ram produo do livro um extraordinrio crescimento. Para isso contribuiu a interaco de factores favorveis, como por exemplo: a abundncia de papel, graas a inventos que proporcionaram um melhor fabrico deste; a mecanizao e automatizao da imprensa e das grficas, graas fora do vapor; novos processos de impresso e de ilustrao. No campo da ilustrao, destacam-se os tra-balhos de Thomas Bewick que revolucionou a tcnica da xilogravura, criando a xilogravura de topo. At ento, usava-se a gravura em metal, mas por ser um processo caro e pro-duzir um nmero bastante limitado de cpias foi substitudo pela xilogravura. Bewick teve a ideia de usar uma madeira mais dura como matriz e marcar os desenhos com o buril, ins-trumento usado para gravura em metal e que dava uma maior definio ao trao. Dessa maneira Bewick diminuiu os custos de produ-o de livros ilustrados e abriu caminho para a produo em massa de imagens pictricasA introduo dos processos fotogrficos no sculo XIX tambm veio revolucionar a inds-tria do livro at aos nossos dias. de referir o Colotipo, processo de impresso fotome-cnico, patenteado por Poitevin em 1855 e aperfeioado e comercializado por Joseph Albert em 1868, que tem a vantagem de re-produzir detalhes e pormenores com grande definio e que foi usado durante o sculo XIX na ilustrao de livros e na impresso de postais ilustrados.

    O livro a partir dos meados / fins do sculo XIX ganhou seu aspecto tcnico actual, com-posto por capa, lombada e miolo.Comearam a ser estabelecidos os direitos e propriedades sobre o texto e sobre as obras publicadas e os ganhos de cada rea profissio-nal passaram a ser determinados.Estabeleceram-se as mais diversas funes e especialidades produtivas: autores; editores; calgrafos; tipgrafos; encadernadores; diagra-madores; ilustradores; capistas, desenvolven-do suas tcnicas e evoluindo em funo dos avanos tecnolgicos que se sucederam.Este sculo caracteriza-se tambm pela demo-cratizao do livro e pelo desenvolvimento da imprensa peridica.

    1.18. O livro no sculo XX

    Durante todo o sculo XX, verificou-se uma evoluo dos suportes do livro; houve o aprimoramento das tcnicas convencionais de impresso e surgiram as impresses digitais, o que melhorou a qualidade do aspecto do livro, possibilitando grandes tiragens, consti-tuindo deste modo, novas perspectivas para o livro impresso.Surgiu, um novo processo de impresso j totalmente mecanizado: o offset que foi inventado por Ira Rubel, em 1904. um processo impresso chamado planogrfico cuja essncia consiste na repulso entre gua e gordura (tinta gordurosa). O nome offset advm do facto da impresso ser indirecta, pois a tinta transferida da matriz para um cilindro de borracha intermedirio e depois desse cilindro, para o papel.

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    Na matriz de offset, a imagem a ser impressa feita repe-lente gua e receptiva tinta, enquanto que as reas em branco so, ao contrrio, receptivas gua e repelentes tinta. Essa matriz ento montada num rolo especial da impressora que, ao rodar, a coloca em contacto sucessivo com rolos humedecidos com gua e rolos humedecidos com tinta. A gua adere s reas que so receptivas ela, ou seja, s reas em branco e previne que a tinta se fixe nessas reas. A tinta, por sua vez, faz o mesmo nas reas a serem impressas (e que so receptivas a ela). A imagem, j entintada, transferida para um cilindro de borracha intermedirio que a transfere para o papel, por presso.35

    Entre as maiores vantagens da tcnica de offset, pode-mos destacar a durabilidade da matriz, que no faz atrito directamente com o papel e a possibilidade de poder imprimir numa grande variedade de superfcies absorven-tes de tinta, tanto lisas como rugosas, com um mnimo de presso, o que minora os problemas impresso com bordas irregulares e manchadas da tipografia e rotogra-vura comuns. Permite tambm um melhor controlo da impresso em frente e verso, inclusive com equipamentos que imprimem as duas faces do papel simultaneamente. Essas caractersticas do ptima relao custo/benefcio s impresses offset. Permite tambm melhorar a qualidade das imagens reproduzidas e torna possvel a reproduo de todo e qualquer tipo de imagem.Tendo em conta que a tcnica de impresso mais difundida actualmente, existem equipamentos de todos os tamanhos e velocidades disposio, apesar de ter um custo mais elevado que muitos dos outros tipos. Pratica-mente quase todo o material impresso pode ser feito por este processo: livros, catlogos, panfletos, embalagens, etc. Tendo em conta que a tcnica de impresso mais difundida actualmente, existem equipamentos de todos os tamanhos e velocidades disposio, apesar de terem um custo mais elevado que muitos dos outros tipos. Praticamente quase todo o material impresso pode ser

    Manual de Encadernao01 Histria do Livro

    O offset

    35 As chapas de impresso do offset adquirem o texto ou imagens a serem impressas aps terem sidas sensibilizadas pelo fotolito. Este acetato colocado sobre a chapa a ser sensibi-lizada e, atravs de um processo de incidncia de luz, a chapa que ir para a mquina de offset passa a conter o texto e/ou as imagens a serem reproduzidas.

    primeira parte

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    primeira parte

    Manual de Encadernao01 Histria do Livro

    feito por este processo: livros, catlogos, panfletos, embalagens, etc. Porm convm que a tiragem mnima a fazer no seja muito reduzida (abaixo dos 500 exemplares), para ser economicamente vivel, devido ao custo da matriz (fotolitos e chapas) e s perdas iniciais para afinao do trabalho, especial-mente quando este envolve as quatro cores (cyan, magenta, yellow e preto). Abaixo dessa tiragem, convm usar outra tcnica: a digital. Em suma, o offset o principal meio de impresso de grandes tiragens (a partir de 1.000 exemplares).

    Aps a Segunda Guerra Mundial, a execuo e desenho dos livros sofreu as consequn-cias da falta de papel. O conflito tambm provocou a destruio de diversos tipos de prensas, o que acabou por levar uniformi-dade tipogrfica. Deste modo, os livros de qualidade alcanaram preos muito elevados para o leitor mdio. Mas como o gosto pela leitura foi aumentando, houve que encon-trar uma resposta com edies baratas, com um papel mais grosseiro. Foi graas a estas edies populares que pessoas de todas as idades tiveram acesso a livros como roman-ces, assim como aos grandes mestres da literatura, histria, crtica ou ensaio. Com a mecanizao total do trabalho e a enorme procura de livros, esse tipo de livros, especialmente os chamados livros de bolso atingiram grandes tiragens. Assim, o livro deixou de ser objecto de diferenciao, de cultura e de estatuto e perdeu o seu valor de referncia cultural, passando a ser um objec-to de consumo para servir as massas. Entretanto, as artes grficas foram evoluindo

    e comeou a dispor-se de novas telas, tintas e papis de qualidade, tornando possvel voltar a realizar-se edies artsticas. Assim, o livro passou a ser entendido como objecto e suporte de uma obra plstica e com valores prprios que nada tm a ver com o conte-do, passando a haver edies cuidadas e livros de qualidade. Esses livros, pela qualida-de, ainda tm um preo elevado. No entanto, torna-se evidente que o livro, hoje em dia, s pode cumprir a sua funo de veculo de cultura, atravs de edies mais baratas, que tm vindo a melhorar

    1.19. O livro hoje: breve sntese

    Ao longo deste trabalho, observmos a evo-luo do livro, no s no material com que era feito, como na tcnica. Comeou por ser feito de papiro, depois de pergaminho, que era escasso e de elevado custo e finalmente de papel, mais barato, abundante e de fcil fabricao. Com esses suportes de escrita, cada exemplar era copiado e ilustrado mo com grande riqueza. Depois com o papel e inveno e difuso da Imprensa, passou a ser possvel a reproduo de muitos exemplares de uma s vez. Ao longo do tempo, foram surgindo inventos que contriburam para o desenvolvimento do livro que deixou de ser uma jia, um tesouro, como era considerado na Idade Mdia, para passar a ser um utens-lio, na Idade Contempornea, que as massas manuseiam.Em finais do sculo XX surgiram os livros electrnicos, os ebooks. Trata-se de livros em formato digital que podem ser lidos em equipamentos electrnicos, tais como

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    computadores, desktops, laptops ou palm pilots, PDAs ou at mesmo telemveis que suportem esse recurso. Em geral, dispem de um menu de leitura que, entre outras funes, faz a passagem de folhas, a busca de palavras, a anotao margem ou a impresso em papel. Podem recarregar-se com novos textos a partir de um computador pessoal, da rede Internet ou de uma memria magntica ou ptica (disquete, disco compacto, etc).Como no passam pelos processos tradicionais de edio e venda, possibilitam, que as editoras cortem custos de impresso e comercializao, o que reduz o seu preo em relao ao das publicaes em papel. Actualmente, os modelos mais conhecidos no mercado so: Rocket e-book (Nuvomedia) e Softbook (Softbook Press). Ambos permitem ao usurio fazer anotaes, mar-car trechos, pesquisar palavras ou regular a luminosidade da tela.Existem livros electrnicos disponveis tanto para compu-tadores de mesa, como para computadores de mo, os palmtops. Uma dificuldade que o livro electrnico encontra que a leitura em suporte electrnico cerca de uma,duas vezes mais lenta do que em suporte papel. Contudo, tm sido feitas pesquisas no sentido de melhorar a