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MARIANA FURTADO GRANATO DE ALBUQUERQUE TRATAMENTO DO GLICEROL BRUTO PROVENIENTE DA PRODUÇÃO DE BIODIESEL VISANDO A GERAÇÃO DE METANO. Ouro Preto, MG 2014

mariana furtado granato de albuquerque tratamento do glicerol

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  • MARIANA FURTADO GRANATO DE ALBUQUERQUE

    TRATAMENTO DO GLICEROL BRUTO PROVENIENTE DA PRODUO DE

    BIODIESEL VISANDO A GERAO DE METANO.

    Ouro Preto, MG

    2014

  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO

    INSTITUTO DE CINCIAS EXATAS E BIOLGICAS

    DEPARTAMENTO DE CINCIAS BIOLGICAS

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM BIOTECNOLOGIA

    TRATAMENTO DO GLICEROL BRUTO PROVENIENTE DA PRODUO DE

    BIODIESEL VISANDO A GERAO DE METANO.

    AUTORA: Mariana Furtado Granato de Albuquerque

    ORIENTADORA: Profa. Dr

    a. Silvana de Queiroz Silva

    Dissertao apresentada ao Programa de

    Ps-Graduao em Biotecnologia, da

    Universidade Federal de Ouro Preto, como

    parte dos requisitos necessrios para a

    obteno do ttulo de Mestre em

    Biotecnologia.

    Ouro Preto, MG.

    2014

  • Catalogao: [email protected]

    A345t Albuquerque, Mariana Furtado Granato de.

    Tratamento do glicerol bruto proveniente da produo de biodiesel visando a gerao de metano [manuscrito] / Mariana Furtado Granato de Albuquerque - 2014.

    xi, 80f.: il.,;color.; graf.; tab. Orientadores: Profa. Dra. Silvana de Queiroz Silva Dissertao (Mestrado) - Universidade Federal de Ouro Preto. Instituto de Cincias Exatas e Biolgicas. Ncleo de Pesquisas em Cincias Biolgicas. Programa de Ps-Graduao em Biotecnologia. rea de concentrao: Biotecnologia aplicada a processos e ao tratamento de doenas.

    1. lcoois Teses. 2. Biodiesel Teses. 3. Metano - Teses. 4. Biogs - Teses. I. Silva, Silvana de Queiroz. II. Universidade Federal de Ouro Preto. III. Ttulo.

    CDU: 606:577.12

    mailto:[email protected]

  • i

    AGRADECIMENTOS

    Gostaria de agradecer aos meus pais, Ronaldo e Marcia, e ao meu irmo Tlio,

    por sempre me incentivarem a alcanar meus sonhos, por me apoiarem financeiramente

    a continuar estudando e a seguir o caminho que escolhi para a minha vida: a carreira

    acadmica.

    Ao meu namorado, companheiro e melhor amigo Felipe, por sempre escutar

    meus desabafos, por me aturar nos momentos de estresse e por ser responsvel pelo meu

    sorriso ao final de cada dia.

    minha orientadora Profa. Dr

    a. Silvana de Queiroz Silva pela confiana em mim

    depositada para exercer este projeto de pesquisa, pelos ensinamentos e contribuies

    para que este trabalho fosse concludo.

    Ao professor Dr. Srgio Francisco de Aquino, por me acompanhar de perto ao

    longo do mestrado, pela grande colaborao e pacincia ao me ajudar a interpretar os

    dados e por compartilhar seus conhecimentos.

    Ao Bruno Bata, Diego, Aline e todos os alunos de iniciao cientfica por me

    ajudarem a operar os reatores utilizados neste trabalho e a lidar com os imprevistos no

    laboratrio. Ao pessoal dos laboratrios de Biologia e Tecnologia de Microrganismos

    e de Controle Ambiental pelo convvio prazeroso e ensinamentos.

    s minhas amigas de Belo Horizonte por me mostrarem que amizade verdadeira

    vence tanto a distncia quanto a escolha de caminhos diferentes.

    s irms da Repblica Doce Mistura, pelo apoio, torcida e pelos momentos de

    diverso em Ouro Preto.

    Aos professores Gustavo, Evandro e Arlete pelo apoio para que eu ingressasse

    no mestrado e para que eu siga na carreira acadmica.

    Aos professores do NUPEB que contriburam para minha formao e a todos

    aqueles que, direta ou indiretamente, permitiram que eu chegasse at aqui.

    Finalmente, gostaria de agradecer aos rgos de fomento: CAPES pela bolsa

    de mestrado, ao CNPq por financiar este projeto e PROPP-UFOP pelo auxlio

    participao em eventos.

  • ii

    A tarefa no tanto ver aquilo que ningum viu,

    mas pensar o que ningum ainda pensou sobre

    aquilo que todo mundo v.

    Arthur Schopenhauer

  • iii

    RESUMO

    Tradicionalmente, o tratamento de efluentes com alto teor de matria orgnica

    realizado atravs da tcnica de digesto anaerbia, que por sua vez capaz de

    transformar a matria orgnica complexa em gases com alto poder calorfico, como o

    hidrognio e o metano. O objetivo deste estudo foi avaliar o desempenho de reatores

    UASB no tratamento do glicerol bruto derivado da produo de biodiesel em diferentes

    condies de concentrao de DQO inicial, temperatura e TDH, principalmente no que

    tange remoo de DQO, produo de metano e acmulo de AGV. Alm disso,

    comparou-se a degradao anaerbia do glicerol bruto com a da glicerina pura. Quatro

    reatores UASB foram operados em 2 fases: na primeira, foram testados dois substratos

    diferentes sob temperaturas diferentes, carga orgnica de 1 g DQO.L-1

    .d-1

    e TDH de 24

    horas. Na Fase 2, a carga orgnica foi dobrada e sua influncia na degradao do

    glicerol bruto em diferentes temperaturas foi avaliada. Os principais resultados do

    estudo podem ser resumidos como a seguir: i) O glicerol bruto demonstrou no ser

    txico biomassa anaerbia e possuir boa capacidade de produo a metano (AME =

    0,51 gDQOmetano/gSSV.d e PM = 0,96 gDQOCH4/gDQOincubada); ii) Elevadas eficincias

    medianas de degradao (77-84% de remoo de DQO) foram acompanhadas por

    pequeno acmulo de AGV( 112170 mg DQOAGV/L) na Fase 1 aps um longo perodo

    de adaptao dos microrganismos, sem diferena significativa entre os reatores

    alimentados com glicerina pura e queles alimentados com glicerol bruto; iii) Uma

    maior carga orgnica (2 g DQO.L-1

    .d-1

    ) prejudicou a remoo de matria orgnica (21-

    48% de eficincia) e aumentou o acmulo de AGV (272-563 mg DQOAGV/L); iv) A

    baixa produo de metano na Fase 1, em comparao com a Fase 2, indica que a

    quantificao deste gs foi subestimada. Portanto, pode-se inferir que o efluente da

    produo de biodiesel pode ser utilizado na produo de metano, mas a eficincia do

    processo fortemente dependente e sensvel carga orgnica. Dessa forma, este estudo

    contribui fortemente para o avano do conhecimento nas reas de degradao anaerbia

    do glicerol bruto e implantao desta tcnica nas indstrias de biodiesel.

    Palavras-chave: glicerol bruto, biodiesel, degradao anaerbia, metano, UASB,

    tratamento de efluente.

  • iv

    ABSTRACT

    Traditionally, treatment of effluents with a high content of organic matter is performed

    by anaerobic digestion technique, able to transform complex organic matter in gases

    with high calorific value such as hydrogen and methane. The purpose of this study was

    to evaluate the performance of UASB reactors to treat crude glycerol from biodiesel

    production in different conditions of initial DQO concentration, temperature and HRT,

    mainly regarding to the COD removal, methane production and accumulation of VFA.

    Moreover, a comparison between anaerobic degradation of crude glycerol and pure

    glycerol was taken. Four UASB reactors were operated in two phases: in the first two

    substrates, organic load of 1 g DQO.L-1

    .d-1

    and HRT of 24 hours were tested in different

    temperatures. In Phase 2, the organic load was increased and its influence in the crude

    glycerol degradation was investigated. The main results of the study can be summarized

    as follow: i) The crude glycerol was not toxic for anaerobic biomass and has good

    capacity for methane production (SMA = 0,51 gCODmethane/gSSV.d e MP = 0,96

    gCODCH4/gCODincubated); ii) High median degradation efficiencies (77-84% COD

    removal) were accompanied by small VFA accumulation (112-170 mg CODVFA / L) in

    Phase 1 after a long period of adaptation of microorganisms, without significant

    difference between the reactors fed with pure glycerin and those fed crude glycerol; iii)

    A bigger organic load (2 g COD.L-1

    .d-1

    ) decreased the organic material removal (21-

    48% of efficiency) and increased VFA accumulation (272-563 mg CODVFA/L; iv) The

    low methane production in Phase 1 indicates that gas quantification was

    underestimated. Therefore, it can be inferred that the biodiesel production effluent can

    be used to methane production but the process efficiency is strongly dependent and

    sensitive to organic loading. Thus, this study contributes strongly to the advancement of

    knowledge in the areas of crude glycerol anaerobic degradation and implementation of

    this technique in the biodiesel industry.

    Keywords: crude glycerol, biodiesel, anaerobic degradation, methane, UASB, effluent

    treatment.

  • v

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 2.1: Reao de transesterificao para produo de biodiesel ...........................06

    Figura 2.2: Evoluo da produo de biodiesel de 2005 2012 ...................................08

    Figura 2.3: Aplicaes do glicerol.................................................................................10

    Figura 2.4: Vias metablicas de assimilao do glicerol por microrganismos anaerbios

    e seus possveis produtos.................................................................................................13

    Figura 2.5: Esquema ilustrativo da configurao de um reator UASB..........................17

    Figura 2.6: Etapas da digesto anaerbia e seus principais microrganismos

    atuantes............................................................................................................................18

    Figura 4.1: Glicerol bruto obtido da indstria de biodiesel Biominas...........................27

    Figura 4.2: Respirmetro automatizado ANKOM RF

    GAS PRODUCTION

    SYSTEM.........................................................................................................................29

    Figura 4.3: Esquema ilustrativo dos dois tipos de reatores UASB................................33

    Figura 4.4: Reatores UASB utilizados no presente estudo ...........................................33

    Figura 4.5: Fluxograma para escolha do teste estatstico adequado............................. 41

    Figura 5.1: Variao temporal da eficincia de remoo de DQO............................... 49

    Figura 5.2: Box-plot da eficincia de remoo de DQO em todos os

    reatores.............................................................................................................................50

    Figura 5.3: Variao temporal da concentrao de DQOAGV presente no efluente dos

    reatores.............................................................................................................................53

    Figura 5.4: Box-plot da concentrao de DQOAGV presente no efluente dos

    reatores.............................................................................................................................54

    Figura 5.5: Estratificao da produo de AGV e relao entre os cidos actico e

    propinico (A:P) nos reatores UASB nas diferentes fases de

    monitoramento.................................................................................................................56

    Figura 5.6: Converso da DQO do afluente nos vrios subprodutos da degradao

    anaerbia nos quatro reatores durante a Fase 1...............................................................61

    Figura 5.7: Converso da DQO do afluente nos vrios subprodutos da degradao

    anaerbia em cada reator durante a Fase 2 ................................................................... 62

  • vi

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 2.1: Evoluo da utilizao de diferentes matrias-primas para a produo de

    biodiesel...........................................................................................................................07

    Tabela 2.2: Propriedades fsico-qumicas do glicerol....................................................09

    Tabela 2.3: Composio do glicerol bruto obtido durante a produo de biodiesel em

    funo de diferentes matrias-primas..............................................................................10

    Tabela 2.4: Tcnicas de purificao do glicerol bruto...................................................11

    Tabela 2.5: Produtos com valor agregado derivados da digesto anaerbia do

    glicerol.............................................................................................................................14

    Tabela 2.6: Entalpia de combusto padro de um mol de vrios

    combustveis....................................................................................................................15

    Tabela 2.7: Comparao energtica de algumas reaes comuns da digesto

    anaerbia..........................................................................................................................19

    Tabela 2.8: Interferentes fsico-qumicos da digesto anaerbia...................................21

    Tabela 2.9: Utilizao do glicerol bruto como substrato................................................22

    Tabela 2.10: Estudos de co-digesto do glicerol bruto com outros substratos...............23

    Tabela 4.1: Metodologias empregadas na caracterizao do glicerol bruto...................28

    Tabela 4.2: Condies de incubao dos frascos para determinao da AME e do

    efluente de biodiesel, glicerol e glicose...........................................................................30

    Tabela 4.3: Composio da soluo nutriente................................................................35

    Tabela 4.4: Condies de monitoramento para cada um dos quatro reatores em todas as

    fases do estudo.................................................................................................................36

    Tabela 5.1: Composio fsico-qumica do efluente da produo de

    biodiesel...........................................................................................................................43

    Tabela 5.2: Resultados dos testes em triplicata de AME do inculo e PM para os

    diferentes substratos........................................................................................................46

    Tabela 5.3: Resultados dos testes em triplicata de AME dos lodos presentes no interior

    dos reatores ao final da Fase 2.........................................................................................47

    Tabela 5.4: Produo de metano em cada fase operacional dos quatro

    reatores.............................................................................................................................57

  • vii

    Tabela 5.5: Percentual de recuperao de metano e produo de energia a partir da

    DQO degradada...............................................................................................................59

  • viii

    LISTA DE EQUAES

    Equao 2.1: Combusto completa do metano..............................................................15

    Equao 2.2: Combusto incompleta do metano (I) .....................................................15

    Equao 2.3: Combusto incompleta do metano (II) ....................................................15

    Equao 4.1: Converso da presso acumulada de metano produzido (psi) em volume

    deste gs Lei dos gases ideias.......................................................................................30

    Equao 4.2: Determinao do volume ocupado por 1 mol de gs nas condies do

    laboratrio........................................................................................................................31

    Equao 4.3: Converso do nmero de mols de metano em volume deste

    gs....................................................................................................................................31

    Equao 4.4: Clculo da AME.......................................................................................31

    Equao 4.5: Clculo do PM de um substrato...............................................................32

    Equao 4.6: Clculo da DQOAGV .................................................................................38

    Equao 4.7: Clculo do nmero de mols de gs metano pela rea dos picos obtidos

    por cromatografia gasosa.................................................................................................39

    Equao 4.8: Converso do nmero de mols de metano em volume deste

    gs....................................................................................................................................39

  • ix

    LISTA DE ABREVIATURAS

    3HPA: 3-hidroxipropionaldedo

    Acetil-CoA: Acetil Coenzima A

    AGCL: cidos Graxos de Cadeia Longa

    AGV: cidos Graxos Volteis

    AME: Atividade Metanognica Especfica

    ASBR: Anaerobic Sequencing Batch Reactor (Reator Anaerbio em Batelada

    Sequencial)

    ASTM: American Society for Testing and Materials

    ATP: Adenosina Trifosfato

    CERH-MG: Conselho Estadual de Recursos Hdricos do Estado de Minas Getais

    CNPE: Conselho Nacional de Poltica e Energtica

    CO: Carga Orgnica

    CONAMA: Conselho Nacional do Meio Ambiente

    COPAM: Conselho Estadual de Poltica Ambiental

    CSTR: Continuous Flow Stirred-Tank Reactor (Reator Contnuo de Tanque Agitado)

    DA: Digesto Anaerbia

    DBO: Demanda Biolgica de Oxignio

    DHA: Dihidroxiacetona

    DQO: Demanda Qumica de Oxignio

    GB: Glicerol Bruto

    GDHt: Glicerol Desidratase

    GHD: Glicerol Desidrogenase

    GP: Glicerina Pura

    PM: Potencial Metanognico

    PROBIODIESEL: Programa Brasileiro de Desenvolvimento Tecnolgico do Biodiesel

    SSV: Slidos Suspensos Volteis

    TAG: Triacilglicerol

    TDH: Tempo de Deteno Hidrulica

    UASB: Upflow Anaerobic Sludge Bed Reactor (Reator Anaerbio de Fluxo Ascendente

    e Manta de Lodo)

  • x

    SUMRIO

    1. INTRODUO ....................................................................................................... 2

    2. REVISO DE LITERATURA .............................................................................. 6

    2.1. A produo de biodiesel e a gerao de glicerol ................................................ 6

    2.2. Biodegradao do glicerol e gerao de produtos com valor agregado ........... 11

    2.3. O Tratamento Anaerbio .................................................................................. 15

    2.3.1. Microbiologia e Bioqumica da Digesto Anaerbia ............................... 17

    2.3.2. Fatores fsico-qumicos que interferem na digesto anaerbia ................. 20

    2.4. Produo de metano a partir da degradao anaerbia do glicerol .................. 21

    3. OBJETIVOS .......................................................................................................... 25

    3.1. Objetivo Geral .................................................................................................. 25

    3.2. Objetivos especficos ....................................................................................... 25

    4. MATERIAIS E MTODOS ................................................................................ 27

    4.1. O substrato e sua caracterizao fsico-qumica .............................................. 27

    4.2. Medio da Atividade Metanognica Especfica (AME) do inculo e Potencial

    Metanognico (PM) do substrato ................................................................................ 28

    4.3. Confeco e inoculao dos reatores UASB ....................................................... 32

    4.4. Preparo da soluo de alimentao e acrscimo de nutrientes ............................ 34

    4.4.1. Diluio do efluente da produo de biodiesel ............................................. 34

    4.4.2. Diluio da glicerina pura ............................................................................. 34

    4.4.3. Preparo da soluo de nutrientes .................................................................. 34

    4.4.4. Preparo da alimentao dos reatores ............................................................. 35

    4.5. Monitoramento e operao dos reatores .............................................................. 36

    4.5.1. Determinao do pH .................................................................................... 36

    4.5.2. Determinao da temperatura ...................................................................... 37

  • xi

    4.5.3. Monitoramento da vazo ............................................................................. 37

    4.5.4. Determinao de slidos suspensos volteis (SSV) .................................... 37

    4.5.5. Determinao da Demanda Qumica de Oxignio (DQO) .......................... 37

    4.5.6 Determinao dos cidos graxos volteis (AGV) .......................................... 38

    4.5.7. Anlise do biogs e quantificao do metano .............................................. 39

    4.6. Clculo da energia recuperada em forma de metano ........................................... 40

    4.7. Anlise estatstica ................................................................................................ 40

    5. RESULTADOS E DISCUSSO .......................................................................... 43

    5.1. Caracterizao fsico-qumica do glicerol bruto: ................................................. 43

    5.2. Atividade metanognica especfica (AME) do lodo anaerbio e potencial

    metanognico (PM) do efluente oriundo da produo de biodiesel ........................... 45

    5.3. Monitoramento dos reatores UASB ..................................................................... 48

    5.3.1. Remoo de matria orgnica residual ......................................................... 48

    5.3.2. Avaliao do acmulo de AGV .................................................................... 52

    5.3.3. Produo de biogs e metano ........................................................................ 57

    5.3.4. Balano de Massa ......................................................................................... 60

    6. CONCLUSES ..................................................................................................... 63

    7. PERSPECTIVAS FUTURAS .............................................................................. 65

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ........................................................................ 67

    ANEXOS ........................................................................................................................ 75

  • 1 Introduo

  • 2

    1. INTRODUO

    Em 1892, Rudolf Diesel criou um prottipo de motor capaz de funcionar a base

    de combustvel renovvel produzido a partir do leo de amendoim e outros leos

    vegetais. Entretanto, em 1900, os combustveis destilados a partir do petrleo

    apresentaram-se como alternativa mais barata e facilmente disponvel. Com isso, a

    indstria de combustvel baseada em petrleo firmou-se no mercado mundial at os

    anos 70, poca em que esse tipo de recurso no renovvel tornou-se escasso,

    reacendendo o interesse nos combustveis alternativos e renovveis (RUPPEL; HALL,

    2007).

    Nos dias de hoje, busca-se intensivamente por fontes alternativas de energia e

    processos sustentveis, visando reduo da poluio ambiental e superaquecimento

    global do planeta. Ao mesmo tempo, a economia global est em crescimento e a

    necessidade por energia limpa e recursos renovveis encontra-se em contnuo aumento

    (RIVALDI et al., 2007), o que juntamente com as altas dos preos do petrleo incentiva

    o mercado mundial de combustveis limpos (RUPPEL; HALL, 2007). Um bom

    exemplo de combustvel ecologicamente correto o biodiesel. (RUPPEL; HALL,

    2007).

    De acordo com a American Society for Testing and Materials (ASTM), o

    biodiesel um ster monoalquilado obtido atravs da reao de transesterificao de

    cidos graxos de cadeia longa (ZHANG et al., 2003), presentes em leos vegetais ou

    gorduras animais, com um monolcool, geralmente metanol, na presena de um

    catalisador.

    Este estudo tem como tema uma questo de relevncia mundial, principalmente

    no Brasil, o qual se refere ao excesso de glicerol, subproduto da reao de

    transesterificao empregada na produo de biodiesel. Segundo Xavier e colaboradores

    (2007), tanto os setores privados quanto os setores pblicos esto envolvidos no descaso

    com a problemtica do excesso de glicerol bruto, uma vez que a Poltica Nacional de

    Biodiesel no prope alternativas para o excedente. Dessa forma, o controle e descarte

  • 3

    deste resduo fica sob responsabilidade das Secretarias Estaduais do Meio Ambiente,

    que acabam por armazenar, despejar nos rios ou incinerar o mesmo (XAVIER et al.,

    2007).

    O tratamento deste resduo essencial devido ao seu potencial poluidor, pois,

    caso no seja dada uma destinao adequada, ele pode poluir o solo, contaminar guas e

    at mesmo gerar um impacto ecolgico ao ser lanado no ambiente. Em alguns casos, o

    meio aqutico demonstra ter condies de receber e decompor os contaminantes at um

    nvel que no cause alteraes acentuadas que prejudiquem o ecossistema. Entretanto,

    nos casos de sobrecarga orgnica, o lanamento pode levar a uma degradao do

    ambiente em decorrncia do consumo excessivo do oxignio dissolvido por

    microrganismos hetertrofos aerbios resultando em problemas em toda a cadeia trfica

    alimentar.

    Devido ao alto teor de matria orgnica presente no glicerol bruto, o tratamento

    biolgico seria uma boa alternativa para evitar o seu descarte indevido, uma vez que

    grande parte deste resduo biodegradvel e a digesto anaerbia seria uma das opes

    de tratamento.

    A biodegradao anaerbia da glicerina pura (GP) relativamente bem

    conhecida por se tratar de um produto intermedirio da degradao anaerbia de

    gorduras (NOVAK; CARLSON, 1970; WENG; JERIS, 1976). Da reviso de literatura

    feita, percebe-se que poucos estudos foram conduzidos para investigar a degradao do

    glicerol bruto (GB) sob condies anaerbias. Apesar da degradao da GP ser modelo

    para compreenso da degradao anaerbia do GB oriundo da produo de biodiesel, h

    de se considerar que este contm quantidades variveis de sabo, lcool (metanol ou

    etanol), monoacilgliceris, diacilgliceris, oligmeros de glicerol, polmeros e gua

    (OOI et al., 2004). Assim, considera-se que a gerao de biogs a partir do resduo em

    questo seja devido, no apenas ao glicerol, mas tambm aos demais compostos

    presentes no rejeito.

    Acredita-se que esta tecnologia tem potencialidade de ser aplicada no Brasil

    para tratamento do resduo da produo de biodiesel, porm h necessidade de estudos

    que forneam informaes acerca das melhores condies nutricionais e operacionais

    do sistema biolgico de tratamento. Alm disso, no h muitas informaes sobre o

  • 4

    tratamento de resduo de glicerol em reatores anaerbios de fluxo ascendente e manta

    de lodo (UASB) operados em condies mesoflicas (prximas temperatura

    ambiente) com quantificao de metano no biogs visando seu aproveitamento

    energtico.

    Particularmente, a formao de biocombustveis, tais como etanol de segunda

    gerao e biodiesel, tem sido incentivada nacional e internacionalmente nos ltimos

    anos (MASIERO; LOPES, 2008). Apesar da falta de incentivo, os processos

    biolgicos envolvidos na produo de metano a partir de glicerol tm sido alvo de

    pesquisas no mbito da biotecnologia industrial, cuja relevncia situa-se no mbito

    econmico (gerao de gases combustveis e sustentabilidade de processos

    industriais), e no mbito da biotecnologia ambiental (reduo de poluentes de rejeitos

    industriais).

  • 2 - Reviso de literatura

  • 6

    2. REVISO DE LITERATURA

    2.1. A produo de biodiesel e a gerao de glicerol

    Biodiesel uma alternativa ecolgica de combustvel para veculos, produzido

    pela transesterificao de cidos graxos de cadeia longa (AGCL), presentes em gorduras

    vegetais e animais ou at mesmo em resduos gordurosos.

    A transesterificao feita com um monolcool, geralmente metanol ou etanol, na

    presena de um catalisador, cido ou bsico (FUKUDA et al., 2001; ZHANG et al.,

    2003; GONALVES et al., 2009), sendo a transesterificao etanlica a mais utilizada

    no Brasil (Figura 2.1). Os catalisadores alcalinos so mais comumente utilizados, dentre

    eles esto o hidrxido de sdio e hidrxido de potssio (GONALVES et al., 2009).

    Figura 2.1: Reao de transesterificao para produo de biodiesel

    (Adaptada de LEONETI et al., 2012).

    Ao final da etapa de transesterificao, o glicerol e steres formam uma massa

    lquida de duas fases que podem ser facilmente separveis por decantao,

    centrifugao, dentre outras tcnicas, sendo que, dependendo do processo de purificao

    do biodiesel, resduos com diferentes composies so gerados. A fase superior, a mais

    leve ou menos densa, contm os steres metlicos ou etlicos constituintes do biodiesel.

  • 7

    A fase inferior ou pesada, tambm denominada fase g, composta por GB e impurezas,

    resultantes tanto da transesterificao (gua, sais, steres, lcool e leo residual) quanto

    da formao de sabo devido reao dos cidos graxos livres com excesso de

    catalisador (RIVALDI et al., 2007).

    O biodiesel feito a partir de leo vegetal ou gordura animal funciona como se

    fosse diesel de petrleo, porm, lanando emisses muito menos txicas na atmosfera.

    A combusto do biodiesel procedente de leos vegetais no acrescenta nenhum dixido

    de carbono atmosfera (RUPPEL; HALL, 2007).

    O Brasil tem grande destaque no panorama mundial do biodiesel, devido a sua

    grande diversidade em gros de onde extrado o leo vegetal, e sua extensa criao de

    animais bovinos que fornecem gordura animal ou sebo (GONALVES et al., 2009). A

    Tabela 2.1 ilustra a evoluo da utilizao das principais matrias-primas utilizadas na

    produo de biodiesel.

    Tabela 2.1: Evoluo da utilizao de diferentes matrias-primas para produo de biodiesel

    (ANP, 2013).

    Matrias-

    primas

    Produo de biodiesel (B100*) (m3)

    2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

    Total 736 69.012 408.005 1.177.638 1.614.834 2.387.639 2.672.771 2.719.897

    leo de soja 226 65.764 353.233 967.326 1.250.590 1.980.346 2.171.113 2.105.334

    leo de

    algodo - - 1.904 24.109 70.616 57.054 98.230 116.736

    Gordura

    animal1

    - 816 34.445 154.548 255.766 302.459 358.686 458.022

    Outros

    materiais

    graxos2

    510 2.431 18.423 31.655 37.863 47.781 44.742 39.805

    *B100 = Biodiesel 100% puro

    Frente a esse grande potencial de produo, ao final do sculo XX, o Governo

    Federal intensificou as discusses sobre a produo e uso do biodiesel, sendo efetuados

    vrios estudos por comisses interministeriais em parceria com universidades e centros

    de pesquisa, e muitas estratgias foram traadas pelo ministrio brasileiro, dentre elas

    foi criado o Programa Brasileiro de Desenvolvimento Tecnolgico do Biodiesel

    1 Inclui gordura de porco, gordura de frango e gordura bovina.

    2 Inclui leo de palma, leo de amendoim, leo de nabo forrageiro, leo de girassol, leo de mamona,

    leo de ssamo, leo de fritura usado e outros materiais graxos.

  • 8

    (PROBIODIESEL), programa que visa gradual substituio do diesel proveniente do

    petrleo pelo biodiesel (GONALVES et al., 2009).

    A produo nacional de biodiesel foi significativamente acelerada quando o

    governo brasileiro estabeleceu a obrigatoriedade da adio de, no mnimo, 4% de

    biodiesel ao combustvel de petrleo at 2013 mediante a Lei 11097/2005 (ANP, 2010).

    Entretanto, o Conselho Nacional de Poltica Energtica (CNPE), por meio da Resoluo

    n 6/2009, reduziu este prazo e, desde o incio de 2010, o leo diesel comercializado em

    todo o Brasil contm 5% de biodiesel. Esta contnua e rpida elevao do percentual de

    biodiesel ao diesel demonstra o sucesso do Programa Nacional de Produo e Uso do

    Biodiesel e da experincia acumulada pelo Brasil na produo e no uso em larga escala

    de biocombustveis (ANP, 2012).

    A Figura 2.2, ilustra a falta de incentivo produo de biodiesel no ano 2005,

    ano em que a lei acima citada foi criada e aprovada. Nota-se tambm forte aumento no

    volume total de biodiesel produzido a partir de 2008, ano em que a mistura de biodiesel

    ao diesel tornou-se obrigatria. Porm, em 2010 j se encontrava 5% de biodiesel

    associado ao diesel de petrleo no Brasil (ANP, 2010). Devido a este estmulo,

    atualmente o Brasil est entre os maiores produtores e consumidores de biodiesel do

    mundo, com uma produo anual, em 2012, de 2,7 bilhes de litros e uma capacidade

    instalada, at este mesmo ano, para cerca de 20,5 bilhes de litros por dia (ANP, 2013).

    Figura 2.2: Evoluo da produo de biodiesel de 2005 2012 (ANP, 2013).

    0,0

    0,5

    1,0

    1,5

    2,0

    2,5

    3,0

    2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

    milh

    es m

  • 9

    A inusitada e alta valorizao do biodiesel acarretou uma pequena visibilidade

    para o GB, muitas vezes tratado como um subproduto sem valor econmico, mesmo

    sendo equivalente cerca de 10% de toda a produo de biodiesel (DASARI et al.,

    2005; RIVALDI et al., 2007; ZHOU et al., 2008). Este cenrio culminou em um notvel

    crescimento da produo do biodiesel e, por consequncia, numa elevada quantidade de

    GB formado, contudo sem uma destinao definida pelas plantas produtoras. Dessa

    forma, h uma maior disponibilidade deste resduo do que a demanda nas suas atuais

    aplicaes (Figura 2.3), reduzindo o seu valor e abrindo um novo leque de pesquisas

    devido necessidade de novas utilizaes deste subproduto (ZHOU et al., 2008). Esse

    quadro ocasionou uma queda nos preos internacionais (50% desde 1995), de US$ 1,55

    o quilograma para US$ 0,75, em mdia (ANP, 2010).

    Apesar de o biodiesel ser o produto principal do processo de produo, o resduo

    de glicerol tambm pode ser comercializado. Devido s suas caractersticas fsicas e

    qumicas (Tabela 2.2), e ao fato de ser incuo, o glicerol possui inmeras aplicaes

    industriais, principalmente nas indstrias de cosmticos, farmacutica, de detergentes;

    podendo ainda ser usado na fabricao de resinas e aditivos e na indstria de alimentos

    (Figura 2.3). Contudo, as impurezas presentes no glicerol da fase g reduzem seu custo, o

    que compromete sua comercializao (OOI et al., 2004).

    Tabela 2.2: Propriedades fsico-qumicas do glicerol (ARRUDA et al., 2007).

    Peso molecular 92,09

    Densidade (glicerol 100%) 25C 1,262 Kg/mG

    Viscosidade 20 C 939 cps

    Ponto de ebulio (101,3KPa) 290C

    Ponto de fuso 18C

    Ponto de inflamao 177C

    Tenso superficial 20C 63,4 mN/m

    Calor especfico (glicerol 99,94%) 26C 2,435 J/g

    Calor de evaporao 55C 88,12 J/mol

    As caractersticas fsicas, qumicas e nutricionais do GB dependem do tipo de

    matria-prima, como pode ser observado na Tabela 2.3, e do tipo de catlise empregada

    na produo de biodiesel (RIVALDI et al., 2007).

  • 10

    Figura 2.3: Aplicaes do glicerol (LOPES et al., 2011).

    Tabela 2.3: Composio do glicerol bruto obtido durante a produo de biodiesel em funo de

    diferentes matrias-primas (RIVALDI et al., 2007).

    Composio Matria-prima

    Mostarda* Mostarda** Canola Soja ROV

    ppm

    Ca 11,7 23,0 19,7 11,0 ND

    K ND ND ND ND ND

    Mg 3,9 6,6 5,4 6,8 0,4

    P 25,3 48,0 58,7 53,0 12,0

    S 21,0 16,0 14,0 ND 19,0

    Na 1,17 1,23 1,07 1,2 1,4

    % (p/p) C 24,0 24,3 26,3 26,0 37,7

    N 0,04 0,04 0,05 0,04 0,12

    *Ida Gold, **Pac Gold, ROV: resduos de leo vegetal (leo usado), ND: no detectado

    Uma anlise detalhada da fase g realizada por Siles et al. (2010), revela que o

    glicerol bruto contm elementos nutricionais, como, fsforo, enxofre, magnsio, clcio,

    nitrognio e sdio, e que so factveis de serem utilizados por microrganismos para o

    seu crescimento durante processos fermentativos (THOMPSON; HE, 2006 apud

    RIVALDI et al., 2007).

  • 11

    Segundo Rivaldi et al. (2007), o excesso de glicerol proveniente da produo de

    biodiesel, associado baixa demanda mundial (0,5 bilhes toneladas/ano) e ao baixo

    custo, projetam um desequilbrio econmico nas indstrias oleoqumicas e de refino de

    glicerol, ao tempo de colocar em risco a sustentabilidade econmica de usinas de

    biodiesel no mundo. Alm disso, o acmulo crescente de glicerol proveniente da

    expanso da indstria de biodiesel corresponde tambm a um problema ambiental, no

    que se refere disposio e lanamento deste resduo.

    O glicerol obtido resultante da transesterificao de triglicerdeos com lcool

    apresenta impurezas como gua, sais, steres, lcool e leo residual, que lhe conferem

    um baixo custo (OOI et al., 2004 apud RIVALDI et al., 2007). Existe um grande

    interesse na purificao do glicerol (Tabela 2.4) ou no seu reaproveitamento direto, sem

    tratamento, o que proporcionar a viabilizao do processo de produo de biodiesel,

    permitindo que este se torne competitivo no crescente mercado de biocombustveis.

    Tratamentos de purificao so de custo excessivamente elevados para pequenos e

    mdios produtores nacionais de biodiesel. Devido a este fato, uma maior quantidade de

    efluentes contendo glicerol poder ser descartada no meio ambiente sem nenhum

    tratamento, aumentando consequentemente os problemas e riscos ambientais (RIVALDI

    et al., 2007).

    Tabela 2.4: Tcnicas de purificao do glicerol bruto.

    Tcnica Objetivos

    Troca inica Remover ons K+ e Na

    + utilizados como catalisadores

    Destilao vcuo Remoo e recuperao de lcoois (etanol ou metanol)

    Precipitao cida

    (HCl, H2SO4, H3PO4)

    Separar o glicerol e cidos graxos do sabo formado pelo

    excesso de catalisador (precipitao de sais)

    2.2. Biodegradao do glicerol e gerao de produtos com valor agregado

    O glicerol considerado uma fonte de carbono altamente reduzida e assimilvel

    por bactrias e leveduras sob condies aerbicas e anaerbicas para a obteno de

    energia metablica, como regulador do potencial redox e para a reciclagem de fosfato

    inorgnico dentro da clula (DILLS et al., 1980 apud RIVALDI et al., 2007). A

    converso microbiana de glicerol por processos biotecnolgicos em produtos de maior

    valor agregado como biomassa e biomolculas uma alternativa relevante para a maior

    valorizao da produo de biodiesel (ITO et al., 2005).

  • 12

    O glicerol entra na clula por difuso, sem a dependncia de bactrias

    hidrolticas. Estas sim teriam papel importante na etapa inicial da degradao de outros

    compostos presentes no resduo, tais como leos e graxas. Esses microrganismos

    hidrolticos fermentativos so capazes de hidrolisar lipdeos e formar glicerol e cidos

    graxos de cadeia longa pela ao de lipases extracelulares. Dentro das clulas

    microbianas, os cidos so incorporados a complexos lipdicos, tais como a membrana

    plasmtica, ou catabolizados para a formao de compostos de baixa massa molar

    (MENDES et al., 2005). J o glicerol pode ser metabolizado por diferentes rotas

    metablicas independentes representadas na Figura 2.4.

    A primeira rota a oxidao do glicerol pela desidrogenase (GDH)

    dihidroxiacetona (DHA) com a gerao de equivalentes redutores (NADH2), a qual

    ento fosforilada pela dihidroxiacetona quinase, dependente de ATP, e direcionada para

    o metabolismo central.

    A dihidroxiacetona fosfato considerada uma importante molcula

    intermediria para a gliconeognese (sntese de hexoses), assim como para a obteno

    de numerosos compostos atravs das vias oxidativas incluindo: cido ctrico, cido

    succnico, cido actico, cido frmico, cido ltico, etanol e outros compostos de

    interesse comercial (MOAT et al., 2002 apud RIVALDI et al., 2007).

    Para tanto, a dihidroxiacetona fosfato convertida a fosfoenolpiruvato, que pode

    dar origem aos cidos succnico e propinico ou ser convertido a piruvato. Este

    composto, por sua vez, pode originar acetilcoenzima A (Acetil-CoA), cido ltico,

    butanodiol e cido frmico que posteriormente pode ser transformado em hidrognio e

    dixido de carbono. O Acetil-CoA ento convertido a cido actico, cido butrico,

    etanol ou cido ctrico dependendo das condies de cultivo e dos microrganismos

    envolvidos. O NADH2 pode ser utilizado tanto na formao de cido butrico quanto de

    etanol e o NADH2 residual pode ser oxidado e produzir hidrognio. O hidrognio e

    cido actico produzidos na via oxidativa podem ser convertidos a metano atravs da

    ao de arqueas metanognicas.

  • 13

    Figura 2.4: Vias metablicas de assimilao do glicerol por microrganismos anaerbios e seus possveis

    produtos (Adaptada de RIVALDI et al., 2007; CHATZIFRAGKOU; PAPANIKOLAOU, 2012; VIANA

    et al., 2012).

    BIOMASSA

    C. PROPINICO

    Acetona 2,3-BUTANODIOL

    C. FRMICO CO2 e H2

    Acetil-CoA

    Malonil-CoA

    TAG

    METANO

    Acetoacetil-CoA Butiril-CoA

    3-hidroxibutiril-CoA

    PHB

    Butirilfosfato

    C. BUTRICO

    Butirilaldedo

    n - BUTANOL

  • 14

    A segunda rota a desidratao do glicerol a 3-hidroxipropionaldeido (3HPA)

    pela glicerol desidratase (GDHt), o qual convertido a 1,3-propanodiol pela enzima

    1,3-propanodiol oxidoredutase (PDOR) com a oxidao do NADH2.

    De acordo com Viana et al. (2012), atualmente, o glicerol bruto tem sido

    utilizado como substrato orgnico para sntese biolgica de vrios compostos com

    valor agregado (Tabela 2.5).

    Tabela 2.5: Produtos com valor agregado derivados da digesto anaerbia do glicerol.

    Produtos Emprego Microrganismos

    produtores Fontes

    1,3-propanodiol

    Produo de

    polisteres,

    poliuretanos, tintas,

    lubrificantes, resinas,

    anticongelantes e

    cosmticos.

    Klebsiella,

    Citrobacter,

    Enterobacter,

    Clostridium,

    Propionibacterium,

    Anaerobiospirillum

    Rivaldi et al. (2007)

    Etanol

    Produo de bebidas

    alcolicas, de

    combustveis e de

    biodiesel.

    Kluyvera

    cryocrescens,

    Enterobacter

    aerogenes

    Ito et al. (2005),

    Choi et al. (2011),

    Chatzifragkou;

    Papanikolaou (2012)

    Hidrognio

    Gerao de energia.

    Enterobacter

    Clostridium,

    Rhodopseudomonas

    Syntrophomonas

    Ito et al. (2005),

    Leoneti et al. (2012)

    cidos orgnicos

    Indstria de

    alimentos, indstria

    qumica e na

    produo de

    polmeros.

    Yarrowia lypolitica,

    Anaerobiospirillum

    succiniciproducens,

    Propionibacteria

    Papanikolaou et al.

    (2002),

    Bories et al. (2004),

    Rymowicz et al.

    (2006),

    Rivaldi et al. (2007)

    Polihidroxi-

    alcanoatos

    Produo de

    embalagens, na rea

    mdica, indstria

    farmacutica e na

    agricultura.

    Pseudomonas

    Rivaldi et al. (2007),

    Chatzifragkou;

    Papanikolaou (2012)

    Metano Produo de energia.

    Methanoplanus,

    Methanosaeta,

    Methanosarcina,

    Methanobacterium

    Thompson; He (2006)

    O gs metano uma importante fonte de energia, conforme pode ser observado

    nas Equaes 2.1 a 2.3:

  • 15

    Combusto completa do metano:

    CH4(g) + 2O2(g) CO2(g) + 2H2O (l) H = - 802 kJ/mol (Eq. 2.1)

    Combusto incompleta do metano:

    CH4(g) + 3/2 O2(g) CO(g) + 2H2O(l) H = - 520 kJ/mol (Eq. 2.2)

    CH4(g) + O2(g) C(s) + 2H2O(l) H = - 408,5 kJ/mol (Eq. 2.3)

    muito importante saber a quantidade de calor liberada pelos combustveis

    para que seja possvel comparar o valor energtico de cada um deles. Na Tabela 2.6,

    so mostradas as entalpias de combusto (Ho) para alguns combustveis, isto , a

    energia liberada na queima completa de um mol de cada um.

    Tabela 2.6: Entalpia de combusto padro de um mol de vrios combustveis (USP).

    COMBUSTVEL FRMULA

    MOLECULAR H(kJ/mol)

    Carbono (carvo) C(s) - 393,5

    Metano (gs natural) CH4 (g) - 802

    Propano (componente do gs de cozinha) C3H8 (g) - 2.220

    Butano (componente do gs de cozinha) C4H10 (g) - 2.878

    Octano (componente da gasolina) C8H18 (l) - 5.471

    Etino (acetileno, usado em maarico) C2H2 (g) - 1.300

    Etanol (lcool) C2H5OH (l) - 1.368

    Hidrognio H2 (g) - 286

    O contedo energtico do glicerol presente no resduo de biodiesel situa-se em

    torno de 16,3 MJ/Kg de glicerol bruto, o que sugere uma alta capacidade de produo

    de biogs (THOMPSON; HE, 2006).

    2.3. O Tratamento Anaerbio

    O tratamento de resduos industriais essencial devido ao seu potencial

    poluidor. Caso no seja dada uma destinao adequada, estes acabam poluindo o solo,

    contaminando guas superficiais e subterrneas. Alm disso, existe o risco do impacto

    ecolgico ao serem lanados no ambiente. O meio aqutico demonstra ter condies

  • 16

    de receber e decompor os contaminantes at um certo nvel que no cause problemas

    ou alteraes acentuadas que prejudiquem o ecossistema. Entretanto, nos casos de

    sobrecarga orgnica, o lanamento pode levar a uma degradao do ambiente em

    decorrncia do consumo excessivo do oxignio dissolvido no corpo dgua por

    microrganismos heterotrficos aerbios, levando a problemas em toda a cadeia trfica

    alimentar. Um estudo conduzido por Fausto e colaboradores (2008) mostrou que uma

    gua residuria tpica do processo de produo de biodiesel apresenta diversos

    parmetros qumicos acima dos limites estabelecidos pela legislao CONAMA

    357/2005 e CONAMA 430/2011, principalmente no que se refere s concentraes de

    leos e graxas.

    Apesar do CONAMA no estipular nenhum limite para Demanda Qumica de

    Oxignio (DQO) e Demanda Biolgica de Oxignio (DBO) no que se refere ao

    lanamento de efluentes e apenas exigir uma eficincia mnima de tratamento (60%), o

    Conselho Estadual de Poltica Ambiental (COPAM) em conjunto com o Conselho

    Estadual de Recursos Hdricos do Estado de Minas Gerais CERH-MG) estabeleceram,

    em 2008, o limite de 60 mg DBO/L para lanamento de efluentes, concentrao bem

    abaixo da encontrada em guas residurias da produo de biodiesel.

    Uma alternativa para o tratamento do resduo de glicerol gerado na indstria de

    biodiesel se refere aplicao do processo de digesto anaerbia. Neste processo

    possvel reduzir a carga poluente presente no resduo por meio da converso biolgica

    dos compostos orgnicos carbonceos a gases combustveis, o hidrognio (H2) e

    metano (CH4).

    As vantagens associadas aplicao do processo anaerbio ao tratamento do

    glicerol inclui: i) a adoo de um sistema de tratamento de efluente de baixo consumo

    energtico e baixa produo de lodo, ii) elevada eficincia de degradao dos

    poluentes orgnicos presentes na gua residuria e iii) gerao de biogs, o qual pode

    ser usado como fonte energtica in situ para gerao de calor e eletricidade

    (CHERNICHARO et al., 2007; MENDES et al., 2005; FERNANDO et al., 2007;

    SILES et al., 2010).

    Atualmente, os reatores UASB compreendem a tecnologia anaerbia mais

    empregada no mundo e muito utilizada no tratamento de esgotos domsticos,

  • 17

    especialmente em regies de clima quente e em muitos pases em desenvolvimento,

    como o Brasil (CHERNICHARO, 2007). Segundo Aisse et al. (2000), tais reatores

    consistem basicamente de um tanque Imhoff de fluxo vertical, com cmaras de

    sedimentao e digesto anaerbia, sobrepostas. O esgoto a ser tratado distribudo

    uniformemente no fundo do reator e passa atravs de uma camada de lodo biolgico, o

    qual transforma a matria orgnica em biogs. Existe um perfil de slidos, com grande

    concentrao na parte inferior (leito de lodo), e mistura completa entre lodo, lquido e

    gs nas camadas acima do leito. Na parte superior do digestor existe um separador de

    gases (decantador), no qual o lodo retorna cmara de digesto provocando, em contra

    corrente com o fluxo ascendente, uma mistura bem uniforme (Figura 2.5).

    Figura 2.5: Esquema ilustrativo da configurao de um reator UASB.

    2.3.1. Microbiologia e Bioqumica da Digesto Anaerbia

    A digesto anaerbia pode ser definida como a degradao da matria orgnica

    complexa em compostos mais simples; como metano, dixido de carbono, gua,

    dentre outros; atravs da atividade conjunta de diversos tipos de microrganismos.

    Estes atuam de forma simbitica e cada grande grupo exerce um papel essencial e

    especfico, de forma que, se algum dos grupos for inibido ou prejudicado, a digesto

    anaerbia no se completa.

  • 18

    A digesto anaerbia pode ser dividida em 4 etapas, de acordo com a Figura

    2.6. Entretanto, vale ressaltar que a eficincia global de converso da matria orgnica

    em produtos estabilizados depende da eficincia de cada reao e do equilbrio entre as

    diversas espcies e entre os grupos de bactrias presentes no sistema anaerbio

    (LEMA et al., 1991 apud MENDES et al., 2005).

    Primeiramente, as bactrias fermentativas hidrolticas ou acidognicas hidrolisam

    polmeros complexos, tais como carboidratos, protenas e lipdeos, transformando-os em

    compostos dissolvidos de menor peso molecular por meio de exoenzimas. As protenas so

    degradadas em aminocidos, os carboidratos em acares solveis (mono e dissacardeos) e

    os lipdeos, em cidos graxos de cadeia longa (C15 a C17) e glicerol. Em certas situaes, a

    alta complexidade do material orgnico pode resultar em uma baixa velocidade de hidrlise,

    tornando-a a etapa limitante de todo o processo de digesto.

    Na segunda etapa, esse mesmo grupo de bactrias transformam essas

    molculas menores em produtos intermedirios como cidos orgnicos (actico,

    propinico, butrico, dentre outros), lcoois (etanol), cetonas (acetona), dixido de

    carbono e hidrognio.

    Figura 2.6: Etapas da digesto anaerbia e seus principais microrganismos atuantes.

    Clostridium Micrococcus Staphylococcus

    Clostridium Micrococcus Streptococcus Pseudomonas Escherichia Staphylococcus

    Clostridium Syntrophomonas wolfei Syntrophomonas wolinii

    Methanosaeta Methanosarcina Methanobacterium Methanoplanus

  • 19

    Os microrganismos fermentativos acidognicos so os que mais se beneficiam

    energeticamente do processo, conforme demonstrado na Tabela 2.7, sendo um grupo

    que possui baixo tempo mnimo de gerao e as maiores taxas de crescimento do

    consrcio (AQUINO; CHERNICHARO, 2005).

    Tabela 2.7: Comparao energtica de algumas reaes comuns da digesto anaerbia (Adaptado de

    AQUINO; CHERNICHARO, 2005).

    Etapa Reao G0

    Acidognese

    C6H12O6+2 H2O 2 CH3COO-+2 CO2+2H

    ++4H2

    Glicose Acetato - 206 kJ

    C6H12O6+2H2 2 CH3CH2COO-+2 H2O+2H

    +

    Glicose Propionato - 358 kJ

    C6H12O6 CH3CH2CH2COO-+2 CO2+H

    ++2H2

    Glicose Butirato - 255 kJ

    Acetognese

    CH3CH2COO-+3 H2O CH3COO

    -+HCO3

    -+H

    ++3 H2

    Propionato Acetato + 76,1 kJ

    CH3CH2COO-+ 2 HCO3

    - CH3COO

    -+H

    ++3 HCOO

    -

    Propionato Acetato + Formiato + 72,2 kJ

    CH3CH2CH2COO-+ 2 H2O 2 CH3COO

    -+H

    ++2H2

    Butirato Acetato + 48,1 kJ

    Metanognese

    CH3COO-+ H2O CH4+ HCO3

    -

    Acetato Metano

    - 31 kJ

    H2+1/4 HCO3

    -+

    1/4 H

    +

    1/4 CH4 +

    3/4 H2O

    Hidrognio Metano - 33,9 kJ

    HCOO-+

    1/4 H2O+

    1/4 H

    +

    1/4 CH4 +

    3/4 HCO3

    -

    Formiato Metano - 32,6 kJ

    Na terceira etapa, as bactrias sintrficas fermentativas acetognicas atuam sob

    os produtos da acidognese, oxidando-os e transformando-os em acetato, hidrognio e

    dixido de carbono. Na quarta e ltima etapa, as arqueias metanognicas convertem,

    principalmente, o acetato e hidrognio metano e dixido de carbono.

    O metano produzido pelas arqueias metanognicas por duas vias metablicas

    principais: hidrogenotrfica e acetotrfica (ou acetoclstica). As arqueias

    hidrogenotrficas so auttrofas, reduzindo CO2 a metano e usando H2 como doador de

    eltrons, liberando H2O. As arqueias acetoclsticas so hetertrofas, produzindo o

    metano e CO2 a partir da reduo do acetato produzido diretamente pelas bactrias

    acidognicas ou pela ao sintrfica das bactrias acetognicas. A metanognese

    acetoclstica tm grande importncia em reatores anaerbios, j que cerca de 70% do

  • 20

    metano produzido nestes sistemas resultante da degradao de acetato

    (CHERNICHARO, 2007; JETTEN et al., 1992; YU et al., 2005).

    Os microrganismos metanognicos so os mais sensveis e facilmente inibidos

    do consrcio. Dentre eles, os acetoclticos so os mais importantes, uma vez que a

    remoo de DQO da fase lquida depende da converso de acetato, composto no qual

    so canalizados cerca de 70% dos eltrons do substrato original (MCCARTY, 1971

    apud AQUINO; CHERNICHARO, 2005). J os hidrogenotrficos so de rpido

    crescimento, com tempo de gerao mnimo de 6 horas (MOSEY, 1983 apud

    AQUINO;CHERNICHARO, 2005) e, alm de contribuir para cerca de 30% do

    metano formado, a presena deles ajuda a manter baixas concentraes de hidrognio

    dissolvido em reatores anaerbios, favorecendo a degradao de propionato e butirato

    (MOSEY, 1983; HARPER; POHLAND, 1986 apud AQUINO; CHERNICHARO,

    2005).

    Os microrganismos produtores de metano so de difcil isolamento e

    identificao, e vrios processos e mtodos tm sido propostos para medir a sua

    atividade. Uma importante forma de monitoramento da eficincia do lodo anaerbio

    atravs da mensurao da atividade metanognica especifica (AME), que pode ser

    definida como a capacidade mxima de produo de metano (Ex. gDQO/gSSV.d) por

    consrcio de microrganismos anaerbios, realizada em condies controladas de

    laboratrio, para viabilizar a atividade bioqumica mxima de converso de substratos

    a biogs. A determinao da capacidade do lodo anaerbio em produzir metano

    importante ainda para determinar o potencial metanognico (PM) de um determinado

    efluente ou resduo a ser tratado. O PM indica a quantidade do gs combustvel

    metano que pode ser produzido a partir de uma determinada quantidade de efluente

    tratado (Ex. Nm3 CH4/Kg substrato inoculado) e importante para avaliar o contedo

    energeticamente aproveitvel de um efluente ou resduo.

    2.3.2. Fatores fsico-qumicos que interferem na digesto anaerbia

    Para que a degradao total da matria orgnica na ausncia de oxignio ocorra

    de forma eficiente, necessrio, alm de uma boa interao do consrcio microbiano,

    otimizar condies especficas de operao como temperatura, pH, carga orgnica,

  • 21

    tipo de substrato, dentre outros (CAMPOS et al., 2004), pois cada um desses

    parmetros capaz de interferir significativamente no desempenho do reator, como

    demonstrado na Tabela 2.8.

    Tabela 2.8: Interferentes fsico-qumicos da digesto anaerbia.

    Parmetro Efeitos Fonte

    Temperatura

    Afeta a velocidade do metabolismo dos

    microrganismos, o equilbrio inico e a

    solubilidade dos substratos.

    Campos et al. (2004)

    pH

    Valores baixos3 podem inibir determinados

    microrganismos, como as arqueias

    metanognicas, que so mais sensveis.

    Campos et al. (1998)

    Carga orgnica

    Quando muito elevada, pode comprometer

    degradao do acetato e levar ao acmulo de

    AGV.

    Aquino; Chernicharo

    (2005)

    Tempo de deteno

    hidrulica (TDH)

    Se muito reduzido, pode levar ao washout4

    da biomassa do reator.

    Aquino; Chernicharo

    (2005)

    Disponibilidade de

    nutrientes5

    Quando presentes na medida certa

    estimulam a degradao anaerbia. Do

    contrrio, o processo torna-se instvel.

    Schmitt et al. (2006)

    Atividade

    Metanognica

    Especfica (AME) do

    lodo

    Cada lodo possui uma AME especfica e

    quanto maior ela , maior a eficincia na

    produo de metano.

    Aquino; Chernicharo

    (2007)

    Potencial

    Metanognico (PM)

    do efluente

    Cada resduo tem um PM especfico, e

    quanto maior ele for maior ser a quantidade

    de metano formada a partir de determinada

    massa de resduo degradada.

    Aquino; Chernicharo

    (2007)

    2.4. Produo de metano a partir da degradao anaerbia do glicerol

    Da reviso de literatura feita, percebe-se que poucos estudos foram conduzidos

    para investigar a degradao do glicerol em condies anaerbias (Tabela 2.9).

    3 Valores na escala de pH que so menores que 6,5.

    4 Sada da biomassa do interior do reator devido alta velocidade de fluxo do efluente a ser tratado.

    5 Principais nutrientes so: nitrognio, fsforo, cobalto, zinco, nquel e ferro.

  • 22

    Tabela 2.9: Utilizao do glicerol bruto como substrato.

    Trabalho Reator Condies Remoo de

    matria orgnica Produo de CH4

    Yang et al.

    (2008)

    Leito fixo

    imobilizado

    com

    poliuretano

    CO = 1Kg

    DQO/ m3.d

    55C

    87% 0,450 m

    3 CH4/g

    DQO

    Hutnan et al.

    (2009)

    UASB

    6,5 Kg

    DQO/m3.d

    61%

    0,513 m3 CH4/Kg

    glicerol

    ASBR 5,6 Kg

    DQO/m3.d

    90% 0,526 m

    3 CH4/Kg

    glicerol

    Leito et al.

    (2011)

    UASB 10 Kg

    DQO/m3.d

    Mais de 90% 61,5 L de biogs/d

    com 60% de CH4

    Viana (2011) UASB

    2 10 Kg

    DQO/m3.d

    30C

    97,5% 0,380 m

    3 CH4/Kg

    glicerol

    Kolesrov et al.

    ( 2011) CSTR

    2,2 Kg DQO/

    m3.d

    99% 0,415 m

    3 CH4/Kg

    glicerol

    Em um reator estvel, operado sob condies timas de crescimento microbiano,

    e na ausncia de fatores de estresse, as etapas acidognica, acetognica e metanognica

    ocorrero em passos similares, de forma a haver uma equalizao nas taxas de produo

    e consumo dos compostos intermedirios. Nesses casos no haver acmulo

    significativo de cidos graxos volteis (AGV) e o processo deveria operar prximo s

    condies de equilbrio dinmico. Entretanto, essa condio raramente observada em

    estaes de tratamento de esgoto, devido s variaes na concentrao, composio e

    vazo do afluente, e s mudanas de condies ambientais (temperatura, ausncia

    temporria de nutrientes, presena temporria de compostos txicos) (AQUINO;

    CHERNICHARO, 2005).

    O conhecimento sobre a degradao anaerbia do glicerol baseia-se, em sua

    maioria, por resultados referentes degradabilidade do glicerol puro, e somente

    recentemente ateno tem sido dada investigao da sua degradabilidade na forma de

    resduo de glicerol bruto (SILES et al., 2010).

  • 23

    De acordo com Bolzonella et al. (2006), a co-digesto de diferentes resduos

    orgnicos levam a melhorias na eficincia dos sistemas de tratamento anaerbios. Por

    esta razo, alguns estudos foram conduzidos para investigar a co-digesto do glicerol

    com outros resduos presentes em efluentes lquidos, os quais mostraram a

    aplicabilidade do glicerol como co-substrato (Tabela 2.10).

    Tabela 2.10: Estudos de co-digesto do glicerol bruto com outros substratos.

    Trabalho Substrato Teor de glicerol Resultados

    Amon et al.

    (2006)

    Resduo de suinocultura

    e processamento de

    milho

    6%

    Aumento na produo de

    metano de 569 para 679 NL/Kg

    SSV.

    Fountoulakis;

    Manios

    (2009)

    Mistura de guas

    residurias de um

    matadouro e de

    processamento de oliva

    1%

    Aumento na produo de

    metano de 0,479 para 1,210 L/d.

    Siles et al.

    (2010)

    gua de lavagem durante

    purificao do biodiesel 25 100%

    100% de remoo de DQO e

    produo de metano de 310 mL

    CH4/g DQO removida (1 atm,

    25 C).

    Fountoulakis

    et al. (2010)

    gua residuria de

    estao de tratamento de

    esgoto

    1%

    Aumento na produo de 1106

    mL CH4/dia para 2353 mL

    CH4/dia.

    Nuchdang;

    Phalakornkule

    (2012)

    Dejetos sunos

    80%

    Produo de 0,24 L de biogs/g

    DQO removida com 62%

    metano.

    Larsen et al.

    (2013) Resduo de fecularia 2% 1,97 L de biogs/L .d

    Assim de acordo com informaes da literatura especializada, o tratamento

    anaerbio do glicerol presente na fase g residual da produo de biodiesel

    tecnicamente vivel tanto pelo alcance de boas eficincias de tratamento quanto pela

    gerao de elevadas concentraes de metano. Desta forma, esta tecnologia tem

    potencialidade de ser aplicada no Brasil para tratamento do glicerol bruto, porm h

    necessidade de estudos que forneam informaes acerca das melhores condies

    nutricionais e operacionais.

  • 3 Objetivos

  • 25

    3. OBJETIVOS

    3.1. Objetivo Geral

    O objetivo geral do presente estudo avaliar, em diferentes condies

    experimentais, o tratamento do resduo da produo de biodiesel e a gerao de metano

    a partir do mesmo em reatores UASB.

    3.2. Objetivos especficos

    Caracterizar, por meio de anlises fsico-qumicas, o glicerol bruto obtido de

    uma indstria produtora de biodiesel;

    Determinar o potencial metanognico (PM) do glicerol bruto e compar-lo com

    o de substratos puros, tais como glicerina e glicose;

    Avaliar a degradao anaerbia do glicerol bruto em comparao glicerina

    pura, em reatores UASB, em relao remoo de DQO, acmulo de subprodutos e

    produo de metano;

    Avaliar o efeito do controle da temperatura na biodegradao do glicerol bruto e

    glicerina pura em reatores UASB operados temperatura ambiente e 35C;

    Avaliar o efeito da carga orgnica aplicada na degradao anaerbia do glicerol

    bruto.

  • 4- Materiais e Mtodos

  • 27

    4. MATERIAIS E MTODOS

    4.1. O substrato e sua caracterizao fsico-qumica

    O glicerol bruto utilizado neste estudo (Figura 4.1) proveniente da indstria de

    biodiesel Biominas, localizada no municpio de Itana, Minas Gerais.

    No processo de produo de biodiesel e consequente gerao do glicerol bruto

    nesta indstria, o leo de cozinha residual, utilizado como matria-prima, reage com o

    metanol, monolcool de escolha, atravs da catlise bsica obtida pelo emprego do

    metilato de sdio. Ao final deste processo produtivo, o glicerol bruto separado do

    biodiesel por decantao e no submetido a nenhum tipo de pr-tratamento como

    neutralizao cida, por exemplo.

    Figura 4.1: Glicerol bruto obtido da indstria de biodiesel Biominas.

  • 28

    Foi feita uma caracterizao fsico-qumica do efluente da produo de biodiesel

    (Tabela 4.1) antes de iniciar a operao dos reatores UASB, a fim de verificar sua

    composio em termos de concentrao de alguns nutrientes como nitrognio e fsforo,

    contedo de alguns contaminantes, como leos e graxas, teor de matria orgnica e

    relao DQO/DBO5, por exemplo.

    Tabela 4.1: Metodologias empregadas na caracterizao do glicerol bruto.

    Componente Mtodo Fonte

    Protenas Espectrofotomtrico Gornall et al. (1949)

    Carboidratos Colorimtrico Dubois et al. (1956)

    Lipdeos Colorimtrico Postma e Stroes (1968)

    Fsforo Colorimtrico APHA/WER/WEF (2005)

    Cloreto Argentomtrico APHA/WER/WEF (2005)

    Glicerol Espectrofotomtrico Benassi et al. (1989)

    Slidos Totais Gravimtrico APHA/WER/WEF (2005)

    leos e Graxas Gravimtrico APHA/WER/WEF (2005)

    DQO Colorimtrico APHA/WER/WEF (2005)

    DBO5 Eletroqumico APHA/WER/WEF (2005)

    4.2. Medio da Atividade Metanognica Especfica (AME) do inculo e Potencial

    Metanognico (PM) do substrato

    Os testes em batelada para determinao da AME foram realizados em

    equipamento ANKOMRF

    GS PRODUCTION SYSTEM (Figura 4.2) que, de forma

    automatizada, faz o monitoramento da variao de presso de gs dentro de vrios

    mdulos e, remotamente, faz o registro dos dados em planilhas eletrnicas. Este

    mecanismo permite determinar a variao de gs produzido em tempo real de

    incubao. No equipamento ANKOMRF

    , a absoro de gs carbnico feita por

    pastilhas de NaOH inseridas nos cabeotes, atravs do qual os gases so obrigados a

    passar antes de atingirem o transdutor de presso. Cada mdulo acoplado a um frasco

    com volume total de 590 mL.

    Durante o teste da AME, para que houvesse suficiente contato da biomassa com

    o substrato e para que no houvesse limitaes de transferncia de massa do substrato e

    nutrientes, os frascos foram inseridos em incubadora de bancada (Shaker Solab) com

    agitao orbital que, alm de garantir a agitao constante, permitiu o controle da

    temperatura do teste.

  • 29

    Figura 4.2: Respirmetro automatizado ANKOMRF

    GS PRODUCTION SYSTEM.

    Realizaram-se trs testes em triplicata, com trs fontes de carbono distintas, de

    modo que a relao alimento/microrganismo (A/M) fosse de 0,2 g DQO/g SSV, que

    segundo Aquino et al. (2007) est dentro da faixa de valores que maximiza a atividade

    metanognica.

    A Tabela 4.2 apresenta os volumes e as concentraes de lodo, soluo nutriente

    e substrato contidos em cada frasco teste. Nas primeiras 24 horas de experimento, os

    frascos foram incubados a uma temperatura de 35 C e com agitao constante de 120

    rpm contendo apenas o lodo anaerbio e a soluo de nutrientes. Para purga do

    oxignio contido no headspace dos frascos, injetou-se nitrognio gasoso. De acordo

    com Aquino et al. (2007), esta etapa de aclimatao importante para minimizar a

    produo de metano de origem endgena.

    Aps 24 horas de adaptao, foram adicionados em cada frasco os volumes de

    glicose, glicerol e efluente de biodiesel indicados na Tabela 4.2. Os frascos passaram

    ento por nova purga com nitrognio gasoso e, posteriormente, foram incubados a 35 C

    e 120 rpm durante mais 4 dias, dando inicio ao teste que determina a AME do lodo e o

    PM do efluente de biodiesel.

  • 30

    Tabela 4.2: Condies de incubao dos frascos para determinao da AME do efluente de biodiesel,

    glicerol e glicose.

    Frascos Substrato Lodo

    (gSSV/L)

    Volumes (mL) Concentrao Final

    Lodo Substrato Sol.

    nutriente

    Lodo

    (gSSV/L)

    Substrato

    (gDQO/L)

    1, 2 e 3 Glicose 20 75 75 150 5 1

    4, 5 e 6 Glicerina 20 75 75 150 5 1

    7, 8 e 9 Glicerol

    Bruto 20 75 75 150 5 1

    O programa fornece a presso (psi) exercida pelo metano produzido. Esta

    presso mensurada durante o teste pode ser convertida em nmero de mols de gs

    produzido atravs da utilizao da Lei dos Gases Ideais, expressa pela Equao 4.1:

    Lei dos Gases Ideais

    n = p (V/ RT) (Eq. 4.1)

    Onde:

    n = nmero de moles de gs produzido

    p = presso em kilopascal (kPa)6

    V = volume do headspace do frasco (L)

    T = temperatura em Kelvin (K)

    R = constante dos gases (8.314472 LkPaK-1

    mol-1

    )

    Posteriormente, o nmero de mols de gs produzido foi convertido a volume, em

    mL, de metano atravs da Lei de Avogadro (Eq. 4.3).

    6 1 psi = 6.894757293 kilopascal

  • 31

    Lei de Avogadro

    Pela utilizao desta lei, 1 mol de gs vai ocupar 22,4 L nas condies normais

    de temperatura e presso (CNTP 0C ou 273 K e 1 atm ou 101,325 kPa). Como o teste

    no foi realizado nas CNTP, foi necessrio adequar os clculos em relao s condies

    do laboratrio atravs da Equao 4.2. Dessa forma, 1 mol de gs passou a ocupar 28,71

    L.

    (Eq. 4.2)

    Volume de gs produzido (mL) = n x 28,71 x 1000 (Eq. 4.3)

    A AME do lodo foi calculada dividindo-se a quantidade de metano produzido

    (expresso em g DQO) pela massa de biomassa inoculada (expressa em g SSV) e pelo

    tempo de incubao (expresso em dias), de acordo com a seguinte expresso:

    AME = Gp/SSV.t (Eq. 4.4)

    Onde:

    Gp = gs produzido (gDQO)

    SSV= slidos suspensos volteis (g)

    t = tempo de incubao (por dia)

    Desta forma, preciso converter a produo volumtrica de metano, obtida

    normalmente em mL, em demanda qumica de oxignio (DQO). Isso pode ser feito

    sabendo-se o coeficiente estequiomtrico de oxidao do metano.

    CH4 + 2 O2 CO2 + 2H2O

    A reao qumica acima mostra que 1 mol de metano equivale a 2 mols de

    oxignio ou 64 g de DQO. Como 1 mol de qualquer gs, na CNTP (O oC e 1 atm),

    ocupa um volume de 22,4 L, pode-se dizer que 1 g de DQO destruda equivale, na

    CNTP, a 0,35 L de metano formado. Nas condies em que a produo de metano foi

    determinada, 1 mol de metano ocupa um volume de 28,71 L. Desta forma, possvel

  • 32

    dizer que a 35 oC e 0,88 atm (presso atmosfrica em Ouro Preto), 450 ml de metano

    produzido equivalem a 1 g de DQO destruda.

    Ao final do teste de AME (aps 4 dias), o potencial metanognico do efluente de

    biodiesel foi calculado relacionando-se a produo acumulada de metano pela massa de

    DQO utilizada no teste, de acordo com a seguinte expresso:

    PM = Gp / DQO0 (Eq. 4.5)

    Onde:

    Gp = total de gs produzido (em Nm3)

    DQO = DQO incubada (em Kg)

    A degradabilidade anaerbia do resduo foi calculada atravs da relao entre a

    massa de DQO metano produzida e a massa de DQO total incubada.

    4.3. Confeco e inoculao dos reatores UASB

    Quatro biorreatores UASB em escala de bancada foram construdos usando

    juntas e conexes de cloreto de polivinila (PVC), e cada um destes reatores apresentava

    um volume de trabalho de 3,4 L. Em cada reator foram colocadas trs torneiras em

    diferentes alturas, para possibilitar amostragem do lodo anaerbio ao longo do

    experimento; e um saco, na parte superior, para coletar o biogs produzido. As Figuras

    4.3 e 4.4 ilustram os reatores.

    Para dar incio ao ensaio contnuo, cada reator UASB foi inoculado um lodo

    anaerbio proveniente de um reator UASB que trata esgoto sanitrio na Estao de

    Tratamento de Esgoto (ETE) Arrudas, localizada em Belo Horizonte, Minas Gerais.

    Foram utilizados 1,5 L de inculo, com cerca de 16 g SSV.L-1

    , em cada reator.

    Ao final da Fase 1 e para dar incio Fase 2, os quatro reatores foram

    reinoculados com o mesmo volume de lodo que inicialmente.

  • 33

    Figura 4.3: Esquema ilustrativo dos dois tipos de reatores UASB (A aquecido, B no aquecido e T1,

    T2 e T3 - torneiras para amostragem de lodo de dentro dos reatores).

    Figura 4.4: Reatores UASB utilizados no presente estudo.

    Biogs

    Termostato

    Substrato + gua e nutrientes

    Substrato + gua e

    nutrientes

    UASB UASB

    Efluente tratado

    Efluente tratado

    Biogs

  • 34

    4.4. Preparo da soluo de alimentao e acrscimo de nutrientes

    Em cada fase deste estudo, a alimentao dos reatores foi feita de uma maneira

    diferente para atender os valores necessrios de DQO inicial e de nutrientes de acordo

    com o objetivo.

    4.4.1. Diluio do efluente da produo de biodiesel

    Na Fase 1, 20 mL do efluente da produo de biodiesel foram adicionados a 20

    litros de gua destilada a fim de diluir 1000 vezes o efluente e atingir a DQO inicial

    desejada para teste (1 g DQO/L). A soluo era homogeneizada manualmente e

    estocada em geladeira.

    Na Fase 2, quando se tratava dos reatores UASB1 e 2, o glicerol bruto continuou

    sendo diludo da mesma forma que na Fase 1 por operarem com uma concentrao

    inicial de DQO igual a 1 g.L-1

    . J para os reatores UASB 3 e 4, operados com DQO

    inicial de 2 g.L-1

    , 40 mL de glicerol bruto eram diludos em 20 L de gua destilada. A

    homogeneizao da soluo era feita manualmente e a soluo era estocada em

    geladeira.

    4.4.2. Diluio da glicerina pura

    Na Fase 1, nico perodo em que a glicerina pura foi utilizada, 23,75 g deste

    substrato eram pesados e diludos em 20 L de gua destilada de forma a igualar a

    concentrao de DQO inicial desta soluo com a soluo de glicerol bruto diludo. A

    homogeneizao da soluo era feita manualmente e, quando pronta, era estocada em

    geladeira.

    4.4.3. Preparo da soluo de nutrientes

    A Tabela 4.3 mostra, detalhadamente, os reagentes e as concentraes utilizadas

    para o preparo da soluo nutriente para uma DQO de 1000 mg.L-1, baseada no

    trabalho de Chernicharo (2007), que definiu as concentraes dos micro e macro

    nutrientes a fim de manter uma proporo de DQO: N: P prximo da relao ideal de

    350: 5: 1. Vale ressaltar que, como esta soluo era diluda 20 vezes quando adicionada

  • 35

    soluo substrato, o fator de diluio foi considerado no clculo da massa de reagentes

    para preparo de 20 L de soluo nutriente. A soluo tambm era estocada em geladeira.

    Tabela 4.3: Composio da soluo nutriente (Adaptada de CHERNICHARO, 2007).

    Macro nutrientes

    Concentrao

    (mg/L) para

    tratar 1000 mg/L

    Massa (g) para

    preparo de 20 L

    de soluo

    NH4Cl 2224,00 88,96

    (NH4)H2PO4 306,25 12,25

    (NH4)2HPO4 89,00 3,56

    MgCl2.6H2O 1066,50 42,66

    CaCl2.2H2O 500,50 20,02

    NaHCO3 5000,00 200,00

    Micronutrientes

    Concentrao

    (mg/L) para

    tratar 1000 mg/L

    Massa (g) para

    preparo de 20 L

    de soluo

    FeCl3.6H2O 10,00 0,40

    ZnCl2 0,25 0,01

    MnCl2.4H2O 2,50 0,10

    (NH4)6Mo7O24.4H2O 3,25 0,13

    AlCl3.6H2O 2,50 0,10

    CoCl2.6H2O 10,00 0,40

    NiCl2.6H20 25,00 1,00

    H3BO3 6,00 0,24

    CuCl2.2H2O 16,00 0,64

    HCl 0,2 % (v/v) 80(ml)

    4.4.4. Preparo da alimentao dos reatores

    Na Fase 1, pesava-se 0,20 g de extrato de levedura e este era solubilizado em

    400 mL de soluo nutriente e 1,6 L de gua destilada. Aps homogeneizao em

    agitador magntico, esta soluo era misturada com 6 L de substrato diludo (glicerol

    bruto ou glicerina pura, dependendo do reator) e, nova soluo, eram adicionados

    cerca de 22 g de bicarbonato de sdio para correo do pH. Aps nova

    homogeneizao, a soluo era bombeada para o interior dos reatores.

  • 36

    Na Fase 2, a alimentao continuou sendo preparada da mesma forma que na

    Fase 1 quando se tratava dos reatores UASB 1 e 2. J em relao aos reatores UASB 3

    e 4, pesava-se 0,40 g de extrato de levedura e este era solubilizado em 800 mL de

    soluo nutriente e 1,2 L de gua destilada. Aps homogeneizao em agitador

    magntico, esta soluo era misturada com 6 L de glicerol diludo uma concentrao

    de 2 mg DQO.L-1e nova soluo, eram adicionados cerca de 22 g de bicarbonato de

    sdio para correo do pH. Aps nova homogeneizao, a soluo era bombeada para o

    interior dos reatores.

    4.5. Monitoramento e operao dos reatores

    Ao longo de todo o experimento, foram testados, de maneira geral, diferentes

    substratos, cargas orgnicas, TDH, concentraes de DQO inicial e tambm diferentes

    temperaturas como resumido na Tabela 4.4.

    Tabela 4.4: Condies de monitoramento para cada um dos quatro reatores em todas as fases do estudo.

    Fases Parmetros Reatores

    UASB1 UASB2 UASB3 UASB4

    1

    Carga orgnica 1 g DQO.L-1

    .d-1

    TDH 24 horas

    DQO inicial 1000 mg.L-1

    Temperatura 35C 35C Ambiente Ambiente

    Substrato Glicerol bruto Glicerina pura Glicerol bruto Glicerina pura

    2

    Carga orgnica 2 g DQO.L-1

    .d-1

    TDH 12 horas 24 horas

    DQO inicial 1000 mg.L-1

    2000 mg.L-1

    Temperatura Ambiente 35C Ambiente 35C

    Substrato Glicerol bruto

    4.5.1. Determinao do pH

    O pH dos reatores foi medido diariamente usando pHmetro da marca Analion,

    modelo PM 608, calibrado ao uso, com exatido de 0,2. Esta medida era realizada

    com intuito de verificar a diferena do pH antes e aps o tratamento anaerbio e para

    certificar que os valores deste parmetro estavam dentro da faixa considerada ideal (6,8

    a 7,2) para uma boa atividade do consrcio microbiano.

  • 37

    4.5.2. Determinao da temperatura

    Para a verificao da temperatura dos reatores, utilizou-se um termostato em

    conjunto com um termmetro de mercrio, graduado de 0C a 110C, que era inserido

    diariamente nos reatores.

    4.5.3. Monitoramento da vazo

    A verificao da vazo foi feita diariamente, 2 vezes por dia, para certificar que

    o fluxo da soluo de alimentao estava na velocidade desejada para teste. Para tanto,

    o volume de lquido que era bombeado para o interior dos reatores era medido durante 1

    minuto e, quando a vazo no se encontrava dentro do intervalo de interesse, a bomba

    peristltica era regulada para correo.

    4.5.4. Determinao de slidos suspensos volteis (SSV)

    A anlise de SSV foi realizada quinzenalmente atravs das orientaes presentes

    no Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater

    (APHA/WER/WEF, 2005), a fim de estimar a concentrao de biomassa e o

    crescimento e morte da mesma no interior dos reatores. Para executar esta anlise,

    amostras de dentro dos reatores eram coletadas manualmente pelas torneiras localizadas

    em diferentes locais dos mesmos. Posteriormente, as amostras eram centrifugadas,

    sendo o pellet (frao slida) obtido na centrifugao ressuspendido em gua destilada e

    encaminhado para anlise gravimtrica.

    4.5.5. Determinao da Demanda Qumica de Oxignio (DQO)

    Esta anlise foi realizada trs vezes por semana e tem o objetivo de estimar a

    concentrao de matria orgnica presente na fase lquida antes e depois do tratamento

    anaerbio, possibilitando estimar a eficincia do tratamento atravs da diferena das

    concentraes final e inicial. Para tanto, as amostras foram previamente centrifugadas

    3.600 rpm por 20 minutos (Fanem Centrifuga Excelsa II 206 BL) para a remoo de

    slidos suspensos.

  • 38

    As medidas de DQO foram realizadas de acordo com o mtodo colorimtrico de

    refluxo fechado, como descrito no Standard Methods for the Examination of Water and

    Wastewater (AWWA/APHA/WEF, 2005).

    4.5.6 Determinao dos cidos graxos volteis (AGV)

    As anlises dos AGV (frmico-C1, actico-C2, propinico-C3, butrico e

    isobutrico-C4 e valrico e isovalrico-C5) foram determinadas pela utilizao de um

    cromatgrafo lquido de alta eficincia (CLAE) Shimadzu, com detector DAD, sendo a

    anlise realizada no = 210 nm. A separao cromatogrfica foi realizada em coluna de

    troca inica Aminex HPX-874 (Bio-Rad), mantida a 55C e utilizou-se como fase

    mvel uma soluo de cido sulfrico 0,01 M com fluxo isocrtico de 0,6 mL/min. As

    amostras foram previamente centrifugadas 3.600 rpm por 20 minutos (Fanem

    Centrifuga Excelsa II 206 BL) e filtradas com filtro de 0,45 m de poro para remoo

    de partculas slidas. O volume injetado foi de 10 L. O mtodo foi devidamente

    validado segundo Mesquita et al. (2013). As concentraes de AGV foram usadas para

    estimar a frao de DQO gerada por compostos intermedirios da digesto anaerbia, de

    acordo com a Equao 4.6:

    DQOAGV = (0,35.[AF]) + (1,07.[AA]) + (1,50.[AP]) + (1,82.[AB+AIB) + (2,04.[AV+AIV]) (Eq. 4.6)

    Sendo:

    AF = cido Frmico

    AA = cido Actico

    AP = cido Propinico

    AB+AIB = cido Butrico + cido Isobutrico

    AV+AIV = cido Valrico + cido Isovalrico

  • 39

    4.5.7. Anlise do biogs e quantificao do metano

    O biogs foi coletado em sacos de 6 e 10 L (SUTEL TN, Supelco Analytica) e

    analisado semanalmente. Para tanto, foram necessrios trs frascos mbar de 250 mL

    para cada saco, uma vez que a anlise foi feita em triplicata. Os frascos foram tampados

    com tampas de borracha e hermeticamente lacrados. Em seguida, a purga dos mesmos

    foi feita com gs nitrognio e a presso do interior do frasco igualada presso

    atmosfrica. Posteriormente, foram retiradas 3 alquotas de 1,5 mL de biogs de cada

    saco, e injetou-se cada uma em um frasco mbar para diluio da amostra antes de ser

    injetada no cromatgrafo gasoso para evitar saturao do detector.

    Aps a diluio da amostra, uma alquota de 1mL era retirada do frasco e

    injetada no CG-FID (marca Varian, modelo CP 3380, coluna DB Wax (J8W) 30m x

    0.25mm x 0,5 m, hidrognio foi utilizado como gs de arraste, temperatura do detector

    igual a 280C, temperatura da coluna e do injetor igual a 50C), dando inicio corrida.

    Por fim, foram obtidos valores de reas que foram convertidos em mols de metano

    atravs da equao da reta obtida a partir da construo de uma curva padro de gs

    metano 99,9998 % (Equao 4.7):

    rea = 7x1011

    X +1811,6 ; (Eq. 4.7)

    Sendo X = nmero de moles de metano.

    A converso do nmero de mols de metano em volume de metano foi feita

    atravs da Equao 4.8.

    PV = nRT (Eq. 4.8)

    Sendo:

    P = Presso (atm)

    V = Volume do gs (L)

    n = nmero de moles

    R = constante dos gases

    T = temperatura (K)

  • 40

    Uma vez analisado o metano, o volume total de biogs em cada saco foi medido

    atravs do deslocamento de gua contida em uma proveta, sendo o volume de gua

    deslocado igual ao volume de biogs contido no saco. Sabendo-se o volume total de

    biogs e o volume de metano contido em 1 mL de biogs, por regra de trs foi obtido o

    volume total de metano produzido.

    4.6. Clculo da energia recuperada em forma de metano

    Para a determinao da quantidade de energia equivalente ao metano, utilizou-se

    a mdia da massa de DQO removida por dia (gDQO/d) e calculou-se a produo

    mxima terica (mol CH4 por dia) considerando que 1 mol de CH4 equivale a 64 g de

    DQO. Atravs deste valor e, assumindo que o poder calorfico do metano de 191,5

    Kcal/mol, foi possvel calcular a quantidade mxima de energia gerada por dia (Kcal/d).

    Dividindo-se este valor pela quantidade de DQO que entra no reator por dia

    (DQOafluente/d) obteve-se a quantidade de energia especfica potencialmente gerada

    (Kcal/KgDQOafluente).

    4.7. Anlise estatstica

    A fim de verificar diferenas significativas entre os parmetros analisados em

    cada reator durante cada fase operacional, o software BioStat foi utilizado. Atravs do

    teste de normalidade de DAgostino-Pearson foi possvel observar qual o tipo de

    distribuio dos dados analisados e escolher o teste estatstico mais adequado, conforme

    Figura 4.5.

    Quando os testes preliminares apontavam uma distribuio normal dos dados,

    era feita a anlise de varincia com o teste paramtrico ANOVA. Quando era observada

    distribuio anormal, os dados eram submetidos aos testes no paramtricos de Kruskal-

    Wallis ANOVA, de Student-Newman e de Mann-Whitney. As comparaes dos dados

    foram feitas avaliando-se os valores de p-valor. Quando o p-valor era < 0,05 a hiptese

    de igualdade entre as amostras podia ser rejeitada com 95 % de confiana.

  • 41

    * Ho a hiptese de igualdade (M1 = M2);

    ** a hiptese de desigualdade (M1 M2) em que os dados se

    diferem em pelo menos 1 ponto; ***

    a hiptese de desigualdade em que os dados so diferentes entre si.

    Figura 4.5: Fluxograma para escolha do teste estatstico adequado.

    Dois ou mais blocos de dados

    Teste de Normalidade DAgostino-Pearson

    Distribuio Normal

    (Paramtrica)

    Distribuio Anormal

    (No-paramtrica)

    p > 0,05 p < 0,05

    ANOVA Kruskal-Wallis

    ANOVA

    Aceita Ho*

    Rejeita Ho**

    Aceita Ho*

    Rejeita Ho**

    p > 0,05

    p 0,05 p > 0,05

    p 0,05

    Tuckes

    Student-Newman

    Rejeita Ho***

    p 0,05

    Rejeita Ho***

    p 0,05

  • 5 Resultados e Discusso

  • 43

    5. RESULTADOS E DISCUSSO

    5.1. Caracterizao fsico-qumica do glicerol bruto:

    Sabe-se que a composio fsico-qumica do resduo da produo de biodiesel

    varia em funo da natureza dos leos vegetais e gorduras animais que podem ser

    utilizados como matria-prima e tambm da rota de transesterificao empregada na

    produo de biodiesel (MA; HANNA, 1999; THOMPSON; HE, 2006; VIANA et al.,

    2012). As anlises fsico-qumicas s quais o glicerol bruto utilizado neste estudo foi

    submetido apontaram a seguinte composio para o mesmo:

    Tabela 5.1: Composio fsico-qumica do efluente da produo de biodiesel.

    Componente Concentrao (g/L)

    Protenas 23,20

    Carboidratos 11,40

    Lipdeos 612,10

    Fsforo 2,02

    Cloreto 5,01

    Glicerol 634,86

    Slidos Totais 828,10

    leos e graxas 89,90

    DQO 1122,80

    DBO5 975,20

    De acordo com a Tabela 5.1, observa-se que o glicerol oriundo da produo de

    biodiesel possui 1122,80 g DQO/L, valor que se encontra dentro do esperado uma vez

    que, segundo Ma et al. (2008); Siles Lpez et al. (2009), Hutnan et al. (2009) e Viana et

    al. (2012), a DQO do glicerol bruto varia de 925 e 1600 g/L. Entretanto, Viana et al.

    (2012) no recomenda a utilizao direta de substratos com este contedo elevado de

    DQO, pois poderia causar sobrecarga orgnica, o que afetaria negativa