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AS BATALHAS DO SISTEMA IMUNITÁRIO É como um exército pronto a defender o corpo humano contra vírus, bactérias e outras doenças m grupo de cientistas do Instituto de Inf eções e Imunidade Peter Do- herty.da Universidade de Melbour- ne. na Austrália, descobriu que a reação do sistema imunitário con- tra o novo coronavirus é semelhan- teà que se dá com a gripe- ou seja, que as células que surgem mesmo antes da recuperação são as mesmas que as que aparecem quando uma gripe se cura. E se essa descoberta é recente, o mesmo não se pode dizer da importância do sistema imunitá- rio, fundamental para a sobrevi- vência do ser humano. Sem ele, ex- plica o médico especialista em Me- dicina Interna, Nefrologia e Farma- cologia Clínica António Vaz Carnei- ro, "de cada vez que houvesse no mundo uma epidemia não sobrevi- veria nenhuma pessoa" para contar a história da doença. "O sistema imunitário normal é capaz de combater a grande maioria das infeções a que durante a nossa vida estamos sujeitos. E sem ele, mesmo com antibióticos, tínhamos tendência a não sobreviver . Por isso é que de cada vez que há grandes epidemias o ser humano é quase obrigado a não desaparecer. Mor- rem muitas pessoas, mas o sistema imunitário acaba por compensar e impedir que o microrganismo con- tinue a propagar-se, porque é ele o sistema de defesa que o corpo hu- mano tem contra agressões exter- nas", contextualiza o professor ca- tedrático da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, onde di- rige o Centro de Estudos de Medici- na Baseada na Evidência. Mas para melhor visualizarmos o sistema imunitário pensemos num exército pronto a defender o corpo humano, nesta metáfora converti- do em castelo, de todos os inimigos que o querem atacar e se prepara- Os glóbulos brancos lembram- se do invasor para atacá-lo de forma ainda mais eficaz ram para o fazer. "Foi concebido para defender o corpo contra inva- sores estranhos ou perigosos. Esses invasores podem ser microrganis- mos (como bactérias, vírus e fun- gos), parasitas, células canceríge- nas, órgãos e tecidos transplanta- dos. Para defender o organismo contra esses invasores, o sistema imunitário deve ter a capacidade de distinguir entre o que pertence ao organismo (o próprio corpo) do que não pertence (não próprio do corpo ou estranho) . A linha de defesa en- volve glóbulos brancos (leucócitos) , que se deslocam através da corren- te sanguínea e penetram nos tecidos para detetar e atacar microrganis- mos e outros invasores", explica a médica Marta Padilha, especialista em antienvelhecimento. Esta linha de defesa tem duas partes distintas. Umaéaimuni- dade inata (natural) e que não MARTA MARTINS SILVA TEXTO

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AS BATALHASDO SISTEMAIMUNITÁRIO

É como um exército pronto a defender o corpohumano contra vírus, bactérias e outras doenças

m grupo de cientistas do Institutode Inf eções e Imunidade Peter Do-herty.da Universidade de Melbour-ne. na Austrália, descobriu que a

reação do sistema imunitário con-tra o novo coronavirus é semelhan-teà que se dá com a gripe- ou seja,que as células que surgem mesmoantes da recuperação são as mesmas

que as que aparecem quando umagripe se cura. E se essa descoberta é

recente, o mesmo não se pode dizerda importância do sistema imunitá-rio, fundamental para a sobrevi-vência do ser humano. Sem ele, ex-plica o médico especialista em Me-dicina Interna, Nefrologia e Farma-cologia Clínica António Vaz Carnei-ro, "de cada vez que houvesse nomundo uma epidemia não sobrevi-veria nenhuma pessoa" para contara história da doença.

"O sistema imunitário normal é

capaz de combater a grande maioria

das infeções a que durante a nossavida estamos sujeitos. E sem ele,mesmo com antibióticos, tínhamostendência a não sobreviver

.Por isso

é que de cada vez que há grandesepidemias o ser humano é quaseobrigado a não desaparecer. Mor-rem muitas pessoas, mas o sistemaimunitário acaba por compensar e

impedir que o microrganismo con-tinue a propagar-se, porque é ele o

sistema de defesa que o corpo hu-mano tem contra agressões exter-nas", contextualiza o professor ca-tedrático da Faculdade de Medicinada Universidade de Lisboa, onde di-rige o Centro de Estudos de Medici-na Baseada na Evidência.

Mas para melhor visualizarmos o

sistema imunitário pensemos numexército pronto a defender o corpohumano, nesta metáfora converti-do em castelo, de todos os inimigosque o querem atacar e se prepara-

Os glóbulos brancoslembram- se do invasorpara atacá-lo de formaainda mais eficaz

ram para o fazer. "Foi concebidopara defender o corpo contra inva-sores estranhos ou perigosos. Esses

invasores podem ser microrganis-mos (como bactérias, vírus e fun-gos), parasitas, células canceríge-nas, órgãos e tecidos transplanta-dos. Para defender o organismocontra esses invasores, o sistemaimunitário deve ter a capacidade de

distinguir entre o que pertence ao

organismo (o próprio corpo) do quenão pertence (não próprio do corpoou estranho) . A linha de defesa en-volve glóbulos brancos (leucócitos) ,

que se deslocam através da corren-te sanguínea e penetram nos tecidos

para detetar e atacar microrganis-mos e outros invasores", explica amédica Marta Padilha, especialistaem antienvelhecimento.

Esta linha de defesa tem duaspartes distintas. Umaéaimuni-dade inata (natural) e que não

MARTA MARTINS SILVA TEXTO

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Deve-se levarum estilo devida saudávelo ano inteiroMARTA PADILHA, MÉDICA

requer encontros anteriores comum microrganismo ou outros invasores para funcionar com eficiência

responde imediatamente aos invasores, sem precisar de aprender a

reconhece los. "Outraéaimunidade adquirida (adaptativa ou especifica), em que os glóbulos brancos,chamados linfócitos, após o primeiro contacto com um invasor apren-demaatacá Io e lembram se do in-vasor específico, de modo a quepossam ataca Io de forma aindamais eficaz no próximo encontro" ,

explic a a especialis ta , sublinhando

Maispormenores

SISTEMA IMUNITÁRIO VSREDE DE COMPUTADORESPelas suas características e modo

de atuar na defesa do corpo humano,

o sistema imunitário tem suscitado um

interessecrescentena comunidade

científica, nomeadamente da área

das ciências da computação. Isto

acontece devido às semelhanças que

podem ser encontradas entre o corpohumano e uma rede de computadores.Ora vejamos: ambos são distribuídos

e suscetíveis de serem invadidos

por um agente estranho, tornando

possível compararo funcionamento

do sistema imunitário humano (SI H)

e de um sistema de deteção de

intrusões numa rede. De uma forma

geral, ambos funcionam num

ambiente distribuído e tem como

objetivo principal implementar

mecanismos de deteção de intrusos,

correspondentes a entidades não

conhecidas do sistema.

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que as pessoas devem sempre preo-cupar-se com o seu sistema imuni-tário em vez de esperarem por umaameaça externa para o fazer - comouma epidemia - ou por uma épocado ano especifica (como o inverno) .

"Deve-se, sim, ter a preocupaçãode implementar um estilo de vidasaudável o ano inteiro" , em vez decorrer atrás do prejuízo, até porque"não existem receitas milagrosas e

super-rápidas de reforçar o nossometabolismo".

Mas como é que se cuida bem dosistema imunitário? "É importanteviver num ambiente o mais puro e

menos stressante possível, ter bonshábitos de sono, umaboa quantida-de de vitamina D

,evitar o sedenta-

rismo, ter uma alimentação saudá-

vel e o mais natural possível. "Poralimentação natural, Marta Padilharefere-se a eliminar o consumo dealimentos processados industrial-mente, o açúcar e os refrigerantes,porque o consumo destes alimen-tos, assim como o stress, aumentama produção de cortisol (hormona do

stress) deprimindo o sistema imu-nitário .Para que isso não aconteça,continua a mesma médica, a ali-mentação "deveria ser reforçadacom alimentos ricos em vitamina812 -porque esta tem um papel fun-damental na produção de anticor-pos ajudando a imunidade -

, comoatum, sardinha, truta, salmão e

ovos, por exemplo, e frutos secos,nomeadamente a castanha do Bra-sil, rica em selénio, que também es-timula o sistema imunitário; vita-mina C, que tem efeito antioxidantee que se encontra nas laranjas, to-ranjas, kiwi ou morangos". A vita-mina E, "que em parceria comavi-tamina D também fortalece o siste-ma imunitário ", encontra- se em le-gumes como espinafres ou brócolos;

O sistema imunitário normalé capaz de combater a grandemaioria das infeções a queestamos sujeitos durante a vidaANTÓNIO VAZ CARNEIRO, PROF. FMUL

em frutos como tomate, manga ekiwi e nos frutos secos como as ave-lãs e amêndoas. Jáo zinco "está pre-sente nas carnes vermelhas ", con-clui quem também aconselha a su-plementação de acordo com o casoindividual de cada organismo.

Intestino saudável é fundamentalSobre o reforço do sistema imuni-tário, Manuel Pinto Coelho, autorde livros como 'Chegar Novo aVelho' (Ed. Prime Books) e o maisrecente '+ Vida + Saúde + Tempo'(Ed. Oficina do Livro), sugere vá-rias medidas. Em primeiro lugar,que as pessoas eliminem os ali-mentos que transportem consigoglúten (que está no trigo, na cevadae no centeio), alimentos que trans-portem consigo caseína (presentenos laticínios como o leite, a man-teiga, os iogurtes e o queijo) e os

alimentos que contenham açúcar.E porquê? "Porque partindo do

pressuposto de que o sistema imu-nitário está entre 70 a 85 por centoinstalado na parede do intestino, as

pessoas devem ter um intestino o

mais saudável possível, o que pres-supõe eliminar os alimentos que

Coronavírusé motivo extrapara deixardefumarM. PINTO COELHO, MÉDICO

inflamem a parede do intestino" e

que foram os anteriormente cita-dos. Depois, continua o médicoespecialista em antienvelheci-mento, "é fundamental tomar umbom probiótico, na medida emque ajuda a treinar o sistema imu-nitário e a desinflamar a parede dointestino".

Aconselha também Pinto Coelho a

procurar tomar 8 mil unidades devitamina D

3,um grama de vitamina

C, numa base diária (1,5 gramas pordia de seis em seis horas durantedois dias se fizer uma viagem paraum sítio onde haja mais problemasde saúde) ,

200 miligramas de vita-mina BI por dia e 400 unidades in-ternacionais por dia de vitamina E -e não esquecer o zinco . "Além dissoe de ter a cabeça bem tratada, um

sono reparador, é importante re-mover as toxinas como o flúor (pre-sente nas pastas de dentes) , o alumí-nio (presente em alguns desodori-zantes) ou o mercúrio (presente emamálgamas dentárias), porque li-vrar o corpo de toxinas também é

importante quando se quer ter umsistema imunitário capaz." PintoCoelho aproveita para deixar outranota: "Para quem ainda fuma, o

novo coronavírus é um motivo ex-tra para deixar de fumar. Lembro

que na China, onde começou a epi-demia, a partir dos 15 anos mais demetade das pessoas fuma. "

O médico António Vaz Carneiroconcorda que os bons hábitos aju-dam a uma melhor saúde, mas dizdesconhecer "que haja evidênciascientificas que recomendem dife-

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©O médico Manuel Pinto Coelho é especialista em antienvelhecimento e diz que é

fundamental manter um intestino saudável

O António Vaz Carneiro é professor catedrático da Faculdade de Medicina da

Universidadede Lisboa e diretor do Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência

rentes dietas. Aspessoas devem ali-mentar-se bem todo o ano, tal comodevem andar na rua todo o ano e su-jeitas aos mais variados estímulos.Nesta fase temos de ficar em casa,mas quando não existirem proble-mas de saúde pública e pudermosvoltar à nossa vida normal, deve-mos deixar os miúdos contactarcom diversos ambientes que têmsanidades diferentes e que fazemcom que o seu sistema imunitárioaprenda. Não temos nenhuma van-tagem em sobre proteger os miúdos.A razão porque os médicos nãomorrem como tordos é precisa-mente por estarmos rodeados de in-f eções - e por esse motivo desenvol-vemos uma série de anticorpos. Te-mos sempre a história do jovem in-terno de pediatria que nos primeiros

'bancos' (no hospital) que faz no in-verno chega a casa num estado mi-serável e está infetado com tudo o

que os miúdos lhe pegaram, mas

que à medida que o tempo vai pas-sando se vai tornando muito maisresistente."

Paraterminar, uma nota dapsicó-loga Bárbara Ramos Dias, tão im-portante nos tempos que se vivemcomo um frigorífico recheado dealimentos saudáveis: "O medo é o

nosso pior inimigo, aumenta o cor-tisoleporisso, causa 'distress' (an-gústia), bloqueia, impede -nos de

aglr,baixaaimunidade, aumentaosintoma e amplifica o mal-estaremocional. " Por isso, manter a cal-ma também ajuda o exército, que é

como quem diz o sistema imunitá-rio

, a defender - nos dos ataques .

O medo é o nosso pior inimigo,impede-nos de agir, baixaa imunidade e amplificao mal-estar emocional