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Marusa Helena da Graça Gonçalves - Portal IDEA · 2020. 10. 8. · 4 Marusa Helena das Graças Gonçalves Marusa Helena da Graça Gonçalves Psicóloga. Mestre em Administração

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  • Constelações familiares com bonecos e os elos que de amor que vinculam aos ancestrais 1

    Marusa Helena da Graça Gonçalves

    Psicóloga. Mestre em Administração e Recursos Humanos, pela UNEX,

    Espanha e pela UFRGN, Brasil. Especialista em Psicologia Clínica e Orga-

    nizacional. Especialista em Terapia Familiar Sistêmica, com formação em

    Homeopatia pelo IPHP, SP. Consteladora formada em Constelações Fami-

    liares pela Hellinger Sciencia®, México e em Constelações Empresarias

    pela Talent Manager, Portugal.

  • 2 Marusa Helena das Graças Gonçalves

    CONSTELAÇÕES FAMILIA-

    RES COM BONECOS

    e os elos de amor que vinculam aos ancestrais

    EDITORA AFILIADA

  • "Embora os fatos sejam reais, todos os nomes e situações apresentados foram altera-

    dos, contudo, sem modificação ou prejuízo do conteúdo e substância das pesquisas, a

    fim de preservar o sigilo e a identidade das fontes".

    Fotografias: Eduardo de Lima Ribeiro

    Ilustrações: Bruna Goveia da Rocha

    Editora da Juruá Psicologia: Ana Carolina Bittencourt

    ISBN: 978-85-362-4158-6

    Brasil - Av. Munhoz da Rocha, 143 - Juvevê - Fone: (41) 4009-3900 Fax: (41) 3252-1311 -

    CEP: 80.030-475 - Curitiba - Paraná - Brasil

    Europa - Escritório: Av. da República, 47 - 9o Dt° - 1050-188 - Lisboa - Portugal

    Loja: Rua General Torres, 1.220 - Lojas 15 e 16 - Centro Comercial D’Ouro — 4400-

    096 - Vila Nova de Gaia/Porto — Portugal

    Editor: José Ernani de Carvalho Pacheco

    Gonçalves, Marusa Helena da Graça.

    G635 Constelações familiares com bonecos e os elos de amor que vinculam aos ancestrais./

    Marusa Helena da Graça Gonçalves./ Curitiba: Juruá, 2013.

    356p.

    1. Psicoterapia familiar. I. Título.

    CDD 616.89156(22.ed.) CDU 615.851

    Visite nossos sites na internet: www.juruapsicologia.com.br e www.editorialjurua.com

    e-maiI psicologia@jurua. com.br

    http://www.juruapsicologia.com.br/http://www.editorialjurua.com/

  • 4 Marusa Helena das Graças Gonçalves

    Marusa Helena da Graça Gonçalves

    Psicóloga. Mestre em Administração e Recursos Humanos, pela UNEX, Espanha, e pela UFRGN, Brasil.

    Especialista em Psicologia Clinica e Organizacional. Especialista em Terapia Familiar Sistêmica, com for-

    mação em Homeopatia pelo IPHP, SP. Consteladora formada em Constelações Familiares pela Hellinger

    Sciencia®, México e em Constelações Empresariais pela Talent Manager, Portugal.

    CONSTELAÇÕES

    FAMILIARES

    COM BONECOS e os elos de amor que vinculam aos ancestrais

    Com a colaboração de:

    Joice Goveia da Rocha

    Carolina Francisco Batista

    Elaine Cristina Silveira

    Inoili Moretto Fortunati

    Juliane Cristina Cunico Bach

    Karla Cardoso Mialski

    Marilda Alves da Costa

    Marina Morotti Alves

    Natascha Bravo de Conto

    Yara Luiza Moreira Braguinia

    Curitiba

    Juruá Editora

    2013

    CONSELHO EDITORIAL

  • Constelações familiares com bonecos e os elos que de amor que vinculam aos ancestrais 5

    Adriano Furtado Holanda

    • Doutor em Psicologia pela PUC-Campinas (2002).

    • Mestre em Psicologia Clínica pela Universi-

    dade de Brasília (1993). • Graduado em Psicologia

    pelo Centro de Ensino Unificado de Brasília (1987).

    • Professor adjunto da UFPR. • Membro-fundador do

    Instituto de Gestalt-Terapia de Brasília. • Editor da

    Revista da Abordagem Gestáltica. • Membro do Cír-

    culo Latino-Americano de Fenomenologia. • Coor-

    denador do Núcleo de Desenvolvimento Humano

    (Nedhu), no Departamento de Psicologia da UFPR. •

    Tem experiência na área de Psicologia, com ênfase

    em Psicologia Clínica e Epistemologia da Psicologia,

    atuando principalmente nos seguintes temas: Feno-

    menologia, Gestalt-Terapia e Abordagem Centrada

    na Pessoa, Psicologia da Religião, História da Psico-

    logia e Pesquisa Fenomenológica.

    Benno Becker Junior

    • Doutorado em Psicologia - Universidad de Barcelo-

    na, U.B., Espanha. • Mestrado em Pedagogia - PU-

    CRS.

    • Especialização em Métodos e Técnicas de En-

    sino - PUCRS. • Graduação em Psicologia - PUCRS.

    • Graduação em Educação Física - UFRGS.

    > Cristina Maria Carvalho Delou

    • Doutorado em Educação: História, Política, Socieda-

    de - PUCSP. • Mestrado em Educação - UERJ. • Es-

    pecialização em Educação - UERJ. • Graduação em

    Psicologia - PUCRJ. • Graduação em Licenciatura

    em Psicologia - PUCRJ.

    Djalma Lobo Jr.

    • Psicólogo e Parapsicólogo. • Coordena grupos psi-

    co- terapêuticos focados na autoestima e no autoco-

    nhecimento. • Desenvolveu projetos com pacientes

    portadores do vírus HIV, com parceria do Ministério

    da Saúde, e trabalha na área de prevenção de DST e

    AIDS. • Desenvolve trabalhos de Cuidando do Cui-

    dador para Psicólogos, Assistentes Sociais, Agentes

    de Saúde, Enfermeiros, Médicos e Professores.

    • Atua na área de Saúde Mental com o trabalho

    de desenvolvimento do psicoeducacional para paci-

    entes com depressão e transtorno bipolar. • Colunista

    da revista FREEX, com a coluna comportamento e

    sexualidade. • Palestrante. • Atua em Curitiba, São

    Paulo, Campinas, Indaiatuba e Rio de Janeiro.

    Gabriel José Chittó Gauer

    • Graduado em Medicina (1984). • Especialização em

    Psiquiatria pela PUCRS (1988). • Doutorado em Me-

    dicina e Ciências da Saúde pela PUCRS (1995). •

    Pós-doutorado no Departamento de Psicologia da

    Universidade de Maryland (2001), na área de Cons-

    trução e Validade de Testes, Escalas e outras Medi-

    das Psicológicas e abordagem Cognitiva dos Trans-

    tornos de Ansiedade. • Professor titular da PUCRS.

    • Tem experiência na área de Avaliação e Inter-

    venção em Psicologia e Psiquiatria, Validação e

    Aplicação de Instrumentos e Psicologia da Saúde,

    atuando principalmente nos seguintes temas: violên-

    cia, psi- copatia, ansiedade social, depressão, adesão

    ao tratamento e psiconeuroimunologia.

    Gilberto Gaertner

    • Mestrado em Engenharia de Produção - UFSC.

    • Especialização em Formação em Psicologia

    Somática Biossíntese - Instituto Brasileiro de Bios-

    síntese,

    • Especialização em Formação em Integração

    Estrutural Método Rolf - Sociedade Brasileira de In-

    tegração Estrutural. • Especialização em Formação

    em Bioenergia Raízes - Centro de Estudos do Ho-

    mem.

    • Especialização em Psicologia Corporal - Or-

    gone Psicologia Clínica. • Especialização em Orien-

    tação em Terapia Sexual - Clínica do Sistema Nervo-

    so.

    • Especialização em Capacitação em Técnicas

    Corporais - Clínica do Sistema Nervoso. • Graduação

    em Psicologia - PUCPR.

    Luiz Antonio Penteado de Carvalho

    • Médico Especialista em Ortopedia e Traumatologia.

    • Membro titular da Sociedade Brasileira de Or-

    topedia e Traumatologia, SBOT. • Mestre pela

    UFPR.

    • Professor efetivo na Unicentro.

    Julimar Luiz Pereira

    • Mestrado em Educação Física - UFPR. • Especiali-

    zação em Treinamento Desportivo - UFPR. • Gradu-

    ação em Licenciatura em Educação Física - UFPR.

    • Professor da UFPR.

    Salvador Antonio Mireles Sandoval

    • Mestrado em Ciência Política - University of Texas

    at El Paso. • Mestrado e Doutorado em Ciência Po-

    lítica - The University of Michigan. • Atualmente é

    Professor titular da PUCSP, e Professor assistente

    Doutor-ms3 da Universidade Estadual de Campinas,

    Faculdade de Educação. • Pós-doutorado no Center

    for the Study of Social Change, New School for So-

    cial Research. • Pesquisador convidado no David

    Rockefeller Center for Latin American Studies, Har-

    vard University como J. P. Lemann Visiting Scholar.

    • Graduação em Latin American Studies - Uni-

    versity of Texas at El Paso. • Foi sócio-fundador e

    Presidente da Associação Brasileira de Psicologia

    Política - ABPP. • Fundador da Revista Psicologia

    Política sendo um dos primeiros coeditores dessa re-

    vista. • Professor visitante, Concordia University,

    Montreal Canadá em • 2008.

  • 6 Marusa Helena das Graças Gonçalves

    AGRADECIMENTOS

    Ao antes,

    ... meus ancestrais em mim

    Ao agora,

    ... meus pais em mim

    Ao posterior de mim

    ... eu em meus filhos Ao futuro

    ... minha continuidade em meu(s) neto(s)

    Honro e agradeço ao processo evolutivo do amor,

    A vida

    !

    A Psicologia e a todos os que passaram pela minha vida através dela, meus alunos e clientes, Aos meus amigos e cola-

    boradores,

    A todos, sou grata.

    A autora

  • Constelações familiares com bonecos e os elos que de amor que vinculam aos ancestrais 7

    PREFÁCIO

    Somente com o coração é que vemos com clareza.

    O essencial é invisível aos olhos.

    Saint-Exupéry

    Nada fica no passado. Tudo atua! É sobre esta ideia ou evidência, que neste livro você vai entrar

    em contato, reconhecer, aprender, pensar... e muito mais, nos vários sistemas.

    O conhecimento é o que impulsiona o ser humano e mantém a capacidade para enfrentar o desa-

    fio de sobreviver e se desenvolver. É um fator que sempre esteve presente na história da humanidade. Os

    conhecimentos tácito e explícito conjugados com ideias, valores e emoções possibilitam a visualização de

    novas realidades e cenários que permitem a concepção de maneiras diferentes de se interpretar e de se fa-

    zer as coisas, gerando contradições e interrogações que conduzem a novas compreensões e saberes.

    Podemos comparar o processo de aquisição do saber à saga dos navegadores que se aventuraram

    por mares e oceanos desconhecidos. Ao longo das viagens, graças à disposição de enfrentar desafios, à co-

    ragem de enfrentar riscos e, principalmente, à ousadia de colocar em confronto seus intelectos e crenças, os

    navegadores expandiram as fronteiras e descobriram novos mundos. Assim como eles, agora, Marusa e Co-

    laboradores se dispuseram a enfrentar desafios, assumir riscos e confrontar nossos conhecimentos e cren-

    ças. Afinal, para se adquirir sabedoria, “navegar é preciso”!

    Existem outros cientistas que transitam e transitaram no campo fenomenológico.

    Nesta obra, você vai notar que não se trata de um livro teórico ou prático, pelo cuidado que a au-

    tora deixa transparecer, permanecendo em seu lugar de discípula atendo-se à tradução das suas compreen-

    sões integradas a outras ciências com objetivo de oferecer a você outros ângulos do fenômeno das Conste-

    lações Familiares.

    Em seus escritos a autora traz um relato das vicissitudes dessa viagem. É a riqueza da sua experi-

    ência somada da análise de várias disciplinas, pensamentos e pensadores, de encontros e conversas com os

    muitos e notáveis dos “mestres” mencionados. Traz no olhar científico/exploratório e fenomenológico veri-

    ficado no indivíduo uma verdadeira jornada intelectual. Uma caminhada nas trilhas da filosofia aplicada.

    O leitor dotado de observação sutil certamente vai perceber a capacidade magistral desta escrito-

    ra que através da sua prática clínica, possibilitou às colaboradoras transcreverem e analisarem seus casos

    com integração coerente a pensamentos e ciências diversas.

    Este é um livro que as pessoas interessadas nos comportamentos humanos, pelos seus incontáveis

    fatores influenciadores, dentro de uma visão sistêmica, mereciam receber.

    Então, eu convido o leitor a navegar neste oceano de conhecimentos, traduzido da longa excursão

    de experiências de uma psicóloga que ultimamente vem se dedicando a estudos das inter-relações e emara-

    nhamentos humanos e que, com a contribuição dos colaboradores nos casos clínicos, se dispuseram a em-

    prestar algo das suas histórias para esta obra, em nome da ciência.

    Por mim, recebi com alegria o honroso convite da colega de trabalho e amigos leais para dar

    uma olhada nos originais. Assim pude, antes do público leitor, maravilhar-me com o que aqui vai escrito.

    Nada fica no passado. Tudo atua!

    Psic. Ms. Vera Boeing

    CRP 08/1099

  • 8 Marusa Helena das Graças Gonçalves

    APRESENTAÇÃO

    Como segredos e situações traumáticas circulam na família geração após geração criando padrões repeti-

    tivos de histórias vividas? Os membros atuais de uma família podem estar emaranhados aos seus ancestrais? De que

    forma?

    No encontro da experiência psicoterapêutica e acadêmica da Psicóloga e Mestre Marusa Gonçalves com a

    Hellinger Sciencia®1, estas e outras questões relativas às conexões sistêmicas dos vínculos de pertencimento, são

    abordadas.

    Nesta conversa, a autora traçou paralelos entre as Ordens do Amor, das Constelações Familiares e suas

    afinidades com aportes da Psicologia Familiar Sistêmica e o Humanismo.

    Discorrendo sobre a Multigeracionalidade e sua transmissão de informações sem sinais entre gerações, a

    autora, confrontou-se com os fenômenos que transcendem nossa compreensão material ressaltando, em seu embasa-

    mento, contribuições de estudiosos da física, da biologia e da psicologia. Estudos que, reflexionam sobre campos ima-

    teriais que presentificam o invisível, campos de informação formando redes atemporais acessados na não-localidade.

    A obra também oferece a transcrição de dez casos clínicos reais e suas respectivas dinâmicas de emara-

    nhamentos vinculativos, todos embasados teoricamente nos aportes da Hellinger Sciencia®, a ciência universal dos

    relacionamentos humanos. Os casos clínicos descrevem a prática das Constelações Familiares com bonecos e suas

    soluções de harmonização para liberação.

    Com uma proposta inovadora nas resoluções das questões relacionais sistêmicas de grupos familiares e

    empresariais, encontramos nesta obra, reflexões norteadoras das Constelações Familiares e seus fenômenos.

    1 Hellinger Sciencia®, a Ciência Universal dos Relacionamentos Humanos, cujo autor é Bert Hellinger.

  • Constelações familiares com bonecos e os elos que de amor que vinculam aos ancestrais 9

    SUMÁRIO

    INTRODUÇÃO ...................................................................................... 10

    PARTE I

    ASPECTOS TEÓRICOS

    1 Hellinger Sciencia®: A ciência universal das ordens da convivência humana 15

    2 Constelações Familiares: uma Concepção Sistêmica das redes relacionais 24

    3 Campos da Multigeracionalidade ........................................................ 36

    4 Meus lugares ........................................................................................ 64

    5 Constelações Familiares com Figuras ............................................... 119

    6 Meus ancestrais em MIM: a complexidade das conexões multigeracionais 125

    PARTE II

    ASSIM EU PERTENÇO!

    1 Os Casos Clínicos .............................................................................. 143

    2 A Experiência .................................................................................... 337

    SOBRE OS COLABORADORES ....................................................... 347

    ÍNDICE ALFABÉTICO ....................................................................... 351

  • 10 Marusa Helena das Graças Gonçalves

    INTRODUÇÃO

    Os mortos fazem parte do nosso sistema, independente da vida. Assim é com nossos ancestrais,

    com nossos iguais e com os que continuam através

    de nós, nossos filhos. Todos juntos no amor, quando a consciência é maior.

    Marusa Helena da Graça Gonçalves

    As Constelações Familiares começaram a fazer parte da minha vida em um momento dificílimo.

    Há pouco tempo eu havia perdido meu filho amado em um horrível acidente fatal quando uma grande ami-

    ga, a quem agradeço e honro, me convidou para um curso dizendo-me que lá seria muito bom para mim!

    Na época eu estava completamente perdida em minha vida e buscava tudo o que me indicassem,

    tinha a obsessão de experimentar e buscar o outro lado da vida, em vida. Queria compreender a morte, me

    indagava qual seria a justificativa para nos ser imposto uma perda tão cruel.

    Era um vínculo amoroso tão profundo entre mãe e filho que a passagem de um estado a outro não

    poderia jamais perder-se. Era um amor tão grande que não poderia se encontrar limitado a uma mera passa-

    gem de vinte anos em vida. Me questionava: O que eu fiz? Como poderia eu ser “tão castigada", se eu não

    era uma pessoa ruim? O que eu poderia fazer com tudo aquilo que eu não entendia e que tinha que aceitar?

    Como poderia eu manter esse amor no amor e não na dor? De que formas eu poderia me comunicar com

    meu filho? E agora?

    Eu não poderia esquecê-lo e aceitar a morte como um final. Para mim era um novo começo, o co-

    meço de algo incompreensível e invisível, mas profundamente amoroso.

    Observava as mães brigando com seus filhos e nós, nestes vinte anos tivemos dois desentendimen-

    tos que não duraram mais de cinco minutos acompanhados de pedidos de desculpas. Como faria para estar

    novamente com meu filho amado? Como faria para não deixá-lo no esquecimento da morte? Eu não sabia

    de nenhuma saída!

    Fui educada na religião adventista que não crê na vida após a morte, mas mesmo assim, busquei

    saber sobre outras crenças e o que cada uma delas apregoava sobre a morte. Li muitos livros sobre este tema

    da morte e os mortos, mas nada nem ninguém saciava a minha busca. Para mim, meu filho vivia no meu co-

    ração e minha alma estava aflita procurando alguma coisa que estabelecesse uma ligação entre a vida e a

    morte.

    Nesta época, minha alma queria acompanhar meu filho, mas consegui decidir permanecer em vida

    por amor à minha filha, ela vivia e também precisava de mim perto dela. Desenvolvi a crença de que poderia

    estar com os dois de formas diferentes e de lá para cá, busco honrar estes dois maravilhosos filhos que me

    foram presenteados nesta vida.

    Nesta incessante busca, cheguei a duas situações que mudaram a minha vida profissional: o curso

    da Dra. Iria Zanoni Gomes sobre a Ciência da Complexidade e a formação em Constelações Familiares.

    A Ciência da Complexidade me trouxe aportes de cientistas que confirmam uma realidade além da

    nossa realidade material, uma explicação científica para a vida em morte. Era tudo o que eu precisava. Sair

    da fé e obter um conhecimento mais “científico”, dada ao fato de a minha vida toda estar ancorada em uma

    visão acadêmica. As coisas só eram verdadeiras se fossem comprovadas “cientificamente”.

    Assim, este conhecimento e as pesquisas desses cientistas, físicos, biólogos e outros, me aquieta-

    ram um pouco a alma. Procurei desenvolver uma consciência mais espiritualizada, uma consciência mais

    evoluída no amor para me manter mais merecedora de estar perto do meu filho e assim também ajudá-lo

    através dos meus conhecimentos.

    Foi com as Constelações Familiares que eu me senti confortada, sua filosofia de aceitação do espí-

    rito confirmada em sua prática, a aceitação da morte e dos mortos que continuam pertencendo à família, fa-

    zia me sentir um pouco aliviada e mais próxima ao meu filho. Era tudo que eu buscava, uma filosofia práti-

    ca, mundialmente aceita e comprovadamente eficaz que me mostrava que eu estava certa no meu desejo de

    dar continuidade no vínculo amoroso com meu filho. Ele não poderia deixar de pertencer! Eu não poderia

    deixar de tê-lo!

  • Constelações familiares com bonecos e os elos que de amor que vinculam aos ancestrais 11

    Busquei muitas outras filosofias e teorias que me situassem nesta circunstância tão nova e desespe-

    radora. A morte a gente só conhece quando ela nos invade a alma de tal forma que nos põe à prova. Li mais

    de trinta livros com os mais diversos conteúdos e a cada livro que eu terminava, mais ficava com a sensação

    de que tudo eram crenças, não tinha nada concreto sobre a morte, só teoria e crença.

    Os livros de Psicologia que eu lia sobre a morte diziam friamente que o luto deveria “ser elabora-

    do”. Eu me perguntava, luto se elabora? Como posso eu tratar uma dor da alma com a razão?

    Através das Constelações Familiares eu tive a permissão de continuar em meu ‘‘‘'luto amoroso”,

    absorvendo o fato de que a vida e a morte eram somente dois lados contínuos de uma existência maior, me-

    ras passagens de um todo ininterrupto.

    Além do aspecto pessoal, no aspecto profissional a compreensão das leis dos relacionamentos hu-

    manos, chamadas por Bert Hellinger de as Ordens do Amor, enriqueceu muito o meu conhecimento profis-

    sional transformando a minha postura e ação terapêutica. Os resultados do meu trabalho se tomaram tão po-

    sitivos que resolvi ser uma agente propagadora desta prática terapêutica na minha vida acadêmica.

    Desde então, as Constelações Familiares da Hellinger Sciencia® permeiam minha vida pessoal e

    profissional nos cursos e práticas clínicas que ofereço. Apresentei para três Universidades projetos de Espe-

    cialização em Constelações Familiares, mas não obtive sucesso até que, aceitei que talvez essa prática ainda

    não devesse ser institucionalizada neste momento. Apesar disso, acreditava que esta fosse a minha incum-

    bência, de abrir as portas do meio acadêmico para divulgação desta prática nas diferentes áreas, empresarial,

    educacional e de saúde. A sensação de que eu deveria fazer alguma coisa na ampliação desse conhecimento

    adquirido através das Constelações Familiares permanecia presente dentro de mim, como uma missão.

    Atualmente, me percebo integrada em um campo de energia em vida mais sincrônico com os fe-

    nômenos que se apresentam e me dirigiram ao aproveitamento da minha trajetória de mais de três décadas

    no trabalho clínico e docente em Psicologia. Habito o universo da prática revolucionária das Constelações

    Familiares há quase uma década, sempre buscando me aprimorar e compreendê-la sob a ótica da minha ex-

    periência.

    Nesta década, venho observando os efeitos eficazes deste trabalho nos meus clientes e também

    pessoalmente, me sinto evoluindo para um caminho além daquele que a psicoterapia em si me oferecia.

    Transcendi em meu luto e em minha prática clínica e aqui estou eu, trabalhando com uma terapia

    que entrou na minha vida pelo pessoal, pela minha alma em um movimento arrebatador, “de dentro para fo-

    ra". O interesse pelas Constelações me puxava e eu ia, num crescente, buscando compreensão e conheci-

    mento até conseguir a entrega.

    Percebi que sem esta experiência de “entrega”, não conseguimos nada, pensamos que podemos

    controlar nossos caminhos e que vamos conseguir algo, no entanto, somos só um veículo de uma inteligên-

    cia criadora maior onde tudo já está!

    Muitas foram e são as vezes que eu estabeleço um contato tão íntimo com meu cliente que após o

    atendimento não sei mais sobre o que falamos e me convenço cada vez mais, de que o que foi dito pertence a

    ele, não a mim, e por isso, vai com ele.

    Apoiada nos estudos aqui citados, hoje sei que me permito nesses momentos, entrar em um contato

    profundo com o “campo sistêmico de informações” do cliente, um fenômeno constituinte das interações pes-

    soais, minhas intervenções, no trabalho clínico, passaram a se dirigir à essência e passaram a ser interven-

    ções simples, eficazes e essenciais, pois estão em sintonia com o sistema e com a alma do cliente.

    No caminho da liberação e aceitação sem resistências, aprendi que quanto mais sincronizados es-

    tamos com os movimentos da nossa vida, mais podemos nos entregar ao fenômeno que se mostra. Em con-

    trapartida, nessa nossa entrega sem resistência, mais os fenômenos se integram e se comunicam com o nosso

    viver, mais os fenômenos nos “falam” e neste estado, entramos em sincronia com um movimento maior.

    É como se nos encontrássemos dentro de algo maior, dentro de um lugar que contém um “alto-

    falante” sutil ao fundo, que nos envia “ondas de vibrações informativas” e mostra, em algumas situações, a

    sutileza do que é, o que é, é.

    Quando entramos em uma Constelação como facilitadores, o conhecimento obtido passa a um se-

    gundo plano, o conhecimento preparou o Ego para a entrega e no mais, é no fenômeno da transcendência,

    uma capacidade que transcende o Ego e se mostra na postura do terapeuta, uma forma de disponibilização

    para o outro e para as coisas como são, que conta.

    Estas e outras questões que permeavam a minha prática terapêutica me levaram a escrever sobre as

  • 12 Marusa Helena das Graças Gonçalves

    tantas contribuições das quais eu me beneficiei e que agora gostaria de compartilhar, pois, talvez elas pos-

    sam beneficiar outras pessoas com o trabalho das Constelações Familiares. Pensei que através deste livro

    pudesse retribuir, compensando tantos ganhos.

    Penso que, no fundo, viemos para cá para trabalhar algo que não é daqui, viemos para cá, esta vi-

    da, oferecer a nossa contribuição a esse Universo todo de amor. Penso que, o que fazemos em vida, ecoa na

    eternidade e aqui, recebemos o amor quando recebemos a vida e dependerá de nós como usamos e como

    passamos o que recebemos.

    E eu, particularmente, gostaria muito de passar adiante o que recebi. Recebi muito dos meus pais e

    da Psicologia, e agora, aproveitando a sedimentação de muitas experiências profissionais, desenvolvi o pro-

    jeto deste livro.

    Inicialmente, tinha só a pretensão de expor, através de casos clínicos atendidos em consultório, o

    alcance do trabalho terapêutico com Constelações Familiares. Porém, a estrutura inicial me parecia incom-

    pleta e na sequência, senti necessidade de escrever sobre algumas reflexões contributivas à compreensão do

    fenômeno das Constelações Familiares.

    Na história da minha relação com as Constelações Familiares encontrei muita resistência no meio

    acadêmico quando desejava implantar este conhecimento. Mesmo sabendo que tudo que era novo criava re-

    sistência, não poderia abandonar essa minha missão e essas barreiras me levaram a argumentar e justificar

    junto ao Conselho Regional de Psicologia do Paraná (CRP), os aportes teóricos/práticos das Constelações

    Familiares correlacionando-os aos autores clássicos da Terapia Familiar Sistêmica. Vale ressaltar aqui que

    implantei e coordeno um curso de pós-graduação em Psicologia em uma das mais renomadas Universidades

    de Curitiba. Esse curso, Concepção Sistêmica, foi extremamente inovador para a época e por meia década,

    foi o único curso do sul do Brasil a oferecer aportes da Ciência da Complexidade e do Pensamento Sistêmi-

    co. Agreguei à minha justificativa outras contribuições, outras abordagens fenomenológicas já reconhecidas

    no meio acadêmico, e que faziam da Psicologia uma ciência terapêutica.

    Lutava pelo aceite dessa prática no fazer psicológico e a partir da minha argumentação e do respei-

    to que conquistei nestas décadas de trabalho ético profissional, consegui que o Conselho Regional de Psico-

    logia (CRP-08) divulgasse naquele órgão, os meus cursos e implantei no curso de especialização em Terapia

    Familiar, um módulo de Constelações Familiares.

    Imbuída neste movimento de divulgação e utilização das Constelações Familiares no fazer psico-

    lógico, fui buscar mais subsídios, reforços que embasassem os fenômenos “inexplicáveis” provocados pelas

    Constelações Familiares. Em prol de uma compreensão mais “científica”, os aportes da Ciência da Comple-

    xidade resolveram este lapso agregando os conhecimentos necessários para a apreensão e aceitação destes

    fenômenos. Saliento que não é de nossa presunção aprofundar ou esgotar o tema, mas somente oferecer ao

    leitor outras possibilidades de observação do fenômeno da comunicação sem sinais.

    Até aqui já tínhamos dois temas a serem pesquisados e desenvolvidos, contribuições que não pode-

    riam ser desconsideradas no desenvolvimento do livro: os aportes de autores sistêmicos e o pensamento sis-

    têmico da Ciência da Complexidade. Esses dois aportes eram imprescindíveis para a proposta objetivada

    neste livro, de oferecer algum suporte contributivo na compreensão dos fenômenos que ocorrem na prática

    das Constelações Familiares visto que essa prática acrescenta uma significativa mudança no fazer terapêuti-

    co.

    Porém, mais questões se fizeram emergentes ao constatar que o alicerce das Constelações Familia-

    res se encontrava calcado na interconexão de tudo e de todos atemporalmente. A todo momento o fenômeno

    das transmissões entre as gerações e a ancestralidade eram questões includentes no embasamento do nosso

    olhar. Aceitamos então, o próximo passo para as nossas pesquisas, os estudos das transmissões entre múlti-

    plas gerações, um caminho que se dirigia aos aportes da psicanálise, conteúdo que fundamentou o capítulo

    da multigeracionalidade.

    Como em qualquer situação, o óbvio sempre está presente, mas dificilmente é reconhecido. Como

    poderíamos escrever um livro sobre Constelações Familiares sem discorrermos sobre seus aportes e filoso-

    fia?

    Escrever sobre Bert Hellinger e a Hellinger Sciencia® me solicitou um cuidado rigoroso, pois não

    queria me aprofundar ou distorcer os aportes filosóficos maravilhosamente expostos pelo autor, porém era

    indispensável abordar alguns aspectos básicos das Constelações Familiares.

    Neste processo de descobertas, este livro foi tomando conta da minha vida nos últimos anos e a

    cada revisão, das infinitas realizadas, muitas alterações aconteceram, todas visando a melhoria dos conteú-

  • Constelações familiares com bonecos e os elos que de amor que vinculam aos ancestrais 13

    dos aqui expostos. Cada capítulo poderia ter sido mais aprofundado, cada assunto é surpreendentemente in-

    teressante, cada contribuição nos leva a muitas reflexões, mas, esta foi a minha medida neste projeto, uma

    mínima partícula do nosso Universo informativo sem fim.

    Este foi o movimento que acompanhou a melodia da minha alma, uma melodia que nasceu, cres-

    ceu e foi liberada na ação da escrita deste livro. Um movimento na direção e no desígnio de dar continuidade

    e seguir adiante na vida, fazê-la valer a pena através da construção contributiva de conhecimento. Entrei nes-

    ta dança cósmica da sinfonia dos elos de amor que vinculam aos ancestrais e, assim, Eu pertenço! Pertenço

    honrando a vida que recebi dos meus pais e honrando meus filhos em vida, passando a eles um melhor lega-

    do na busca da harmonização das conexões do nosso sistema através das Constelações Familiares.

    Ofereço este livro aos meus pais e aos meus filhos com gratidão a todos e a tudo. Agradeço a Bert

    Hellinger e a Carlos Filipe Leal Gonçalves, ambos me fizeram buscar superação.

    Psic. Msc. Marusa Helena da Graça Gonçalves

  • 14 Marusa Helena das Graças Gonçalves

    PARTE I

    ASPECTOS TEÓRICOS...

  • Constelações familiares com bonecos e os elos que de amor que vinculam aos ancestrais 15

    1

    HELLINGER SCIENCIA®: A CIÊNCIA UNIVERSAL DAS

    ORDENS DA

    CONVIVÊNCIA HUMANA

    Marusa Helena da Graça Gonçalves

    O destino próprio

    Se olharmos para nossa família e os nossos ancestrais, vemos que por trás de cada um está o seu

    destino de forma imponente. Voltamo-nos para cada uma dessas pessoas e olhamos para além dela,

    diretamente para o seu destino. Curvamo-nos diante desses destinos e retiramo-nos de maneira que

    cada um permaneça com o seu. Depois viramo-nos de costas para as pessoas e vemos o nosso des-

    tino diante de nós. Curvamo-nos diante dele, entramos em sintonia com o mesmo e concordamos

    com ele da maneira como ele é. Quando o aceitamos, experimentamo-nos vinculados e livres ao

    mesmo tempo2. (Bert Hellinger)

    Bert Hellinger nasceu na Alemanha em 1925, ex-seminarista católico, estudou filosofia, teologia e pedago-

    gia. Conhecedor de vários modelos de terapia, incluindo psicoterapia de grupo, psicanálise, hipnoterapia, te-

    rapia primai, análise transacional e PNL, desenvolveu a abordagem das Constelações Familiares e a concep-

    ção das Ordens do Amor ou Leis dos Relacionamentos Humanos.

    O termo original desta abordagem é “Familienaufstellung", cujo sentido literal seria “colocar a família na

    posição”. Este termo retratava a ideia inicial de posicionar as pessoas em lugares específicos nos espaços,

    caracterizando as intervenções iniciais que datam da década de 1980. A Constelação Familiar consiste no

    posicionamento físico/emocional de representantes dos elementos importantes do tema do cliente. Com a

    ajuda de um grupo terapêutico ou com bonecos, objetos ou âncoras de solo, mostram através dos movi-

    mentos, as conexões estabelecidas inconscientemente entre o tema (sintoma) e sua implicação sistêmica no

    grupo. Este processo terapêutico é altamente experiencial e fenomenológico, utilizando múltiplas modalida-

    des sensoriais2. A obra de Hellinger foi antes traduzida para o inglês, idioma no qual foi cunhado o termo

    “Family Constellations”, utilizando a metáfora das constelações estelares para a colocação espacial de re-

    presentantes. Em português, tornou-se conhecida como Constelações Familiares ou Constelações Sistêmi-

    cas, além de outras variantes.

    Hellinger oferece uma prática pública, em workshops internacionais, por mais de trinta anos, con-

    tagiando multidões através da sua filosofia e prática terapêutica. Após muitos anos de estudo e aplicação

    prática das Constelações Familiares em seminários e treinamentos no mundo todo, Hellinger cunhou e re-

    gistrou o termo Hellinger Sciencia®. Seu objetivo foi o de formalizar que a sua ciência de Constelações

    Familiares, incluía o movimento do espírito e sua prática se encontrava em grau de desenvolvimento dife-

    renciado de muitos outros seguidores da abordagem. Hellinger contempla em sua prática na Hellinger Scien-

    cia® aportes filosóficos que não percebia estarem sendo usados por todos que se utilizavam da “técnica” de

    Constelações.

    Ao integrar a dimensão espiritual ao trabalho de Constelações Familiares, Hellinger elevou a

    compreensão dos relacionamentos e das ordens da convivência humana para âmbitos universais. A compre-

    ensão dessas ordens torna-se perceptível dentre as áreas social, familiar, escolar e empresarial. A Hellinger

    Sciencia®, uma scientia universalis, é a ciência universal das ordens da convivência humana.

    A Hellinger Sciencia® obteve reconhecimento e validação da comunidade internacional e foi

    apresentada no Brasil em 2007, num seminário3 de Bert Hellinger em Brasília. Para o autor, a Hellinger Sci-

    encia® permanece em movimento e “aberta em seu desenvolvimento”4.

    Para a Hellinger Sciencia® o movimento de harmonização das conexões estabelecidas nas rela-

    ções, quaisquer que sejam, tem como meta o amor. Nesta ciência, julgamentos e diferenciação entre “o bem

    2 Derks, 2010. 3 “V Seminário na Abordagem Sistêmico-Fenomenológica” com Bert Hellinger e Maria Sophie Hellinger, promovido pelo Instituto

    Bert Hellinger Brasil Central, de 06 a 09.09.2007, em Brasí- lia-DF. 4 Palavras do autor no seminário de Brasília, 2007.

  • 16 Marusa Helena das Graças Gonçalves

    ou o mal”, assim como ideias de “certo ou errado”, “inclusão ou rejeição”, “melhor ou pior”, ou ainda a dife-

    rença entre “vida e morte”, deixaram de ter separação. A

    Hellinger Sciencia® abdica de qualquer separação quando se apropria de uma consciência maior, em uma

    dimensão espiritual. Esta consciência maior é uma consciência criativa que cria tudo e está sempre em mo-

    vimento, chamada pelo autor de Consciência Universal ou Consciência Espiritual.

    Tudo que existe não se movimenta por si mesmo, mas é movimentado por algo externo. Tudo que

    vive, mesmo quando se movimenta como se estivesse se movimentando por conta própria, tem um

    movimento que não pode partir dele mesmo. Portanto, todo movimento, incluindo o movimento de

    tudo aquilo que vive, resulta de um movimento que vem de fora, e isto não se aplica apenas ao iní-

    cio do movimento, mas, continuamente, por todo o tempo que dura essa vida. (...) Todo movimen-

    to, principalmente todo movimento de algo vivo, é consciente, pressupõe uma consciência naquela

    força que tudo movimenta. Em outras palavras: todo movimento é um movimento pensado. Ele

    começa porque é pensado por esta força e entra em movimento da maneira como é pensado. O

    que, então, encontra-se no início de cada movimento? Um pensar que pensa tudo da maneira como

    é5.

    Na Consciência Universal, no amor do espírito, o movimento leva à união e à aceitação. “Bom e

    mau”, “agressor e vítima”, quaisquer interpretações separatistas por conceitos de valores perdem qualquer

    significado junto ao amor do espírito. Julgamentos deixam de existir em prol de uma aceitação maior, in-

    condicional, baseada no amor.

    Para Bert Hellinger, o amor do espírito é uma atitude. Aceita tudo tal como é, simplesmente por-

    que existe. Esse amor desconhece o julgamento que decide se algo deve existir ou não, pois só o fato de que

    algo existe significa que foi pensado por um espírito criador, tal como é, e assim é amado.

    A Consciência Universal, espiritual, é eterna, a tudo cria e está em tudo, como podemos constatar

    nas palavras do autor:

    (...) nada termina para este espírito. Tudo que foi é: o espírito ainda pensa da mesma maneira como

    se pensa no que passou, no que acontece e como pensa, ao mesmo tempo, em tudo que ainda estar

    por vir. Porque pensa naquilo que está por vir, ao mesmo tempo, em que pensa no que se passou, o

    que se passou se refere totalmente àquilo que ainda está por vir. Aquilo que já passou, movimenta-

    se em direção àquilo que está por vir e lá é concluído. (...) É inconcebível que este pensar que tudo

    movimenta termine. Da mesma forma como não pode existir nada que não seja pensado por ele,

    pois, quem ou o quê quem ou o que poderia pensar depois dele?6

    1.1 AS CONSCIÊNCIAS

    Bert Hellinger aponta para três campos espirituais de consciência, a Consciência Pessoal, a Cons-

    ciência do Grupo e a Consciência Universal. Cada qual com seu alcance, funcionamento e ordens. Todas as

    consciências se completam na consciência maior, a Consciência Universal, do amor do espírito.

    Nestes campos espirituais de consciência, as consciências servem a três condições ou necessidades

    preestabelecidas para os relacionamentos humanos, que dão força ou fraqueza à alma. As Ordens do Amor

    se referem ao vínculo, com a força do pertencimento, ao equilíbrio, com a força da compensação, e a or-

    dem, com a força da ordem de chegada e o lugar de cada um no sistema. Estas condições se complementam

    atuando juntas e são experimentadas como nossa consciência.

    Cada uma dessas condições tenta impor seus objetivos através de um sentimento de “culpa” e

    “inocência”, em conformidade com o fim e a necessidade a que servem. No vínculo, a culpa é experimenta-

    da como exclusão e distância, e a inocência como conforto e proximidade.

    No equilíbrio entre o dar e o tomar das relações, a culpa é sentida como obrigação e a inocência

    como liberdade ou reivindicação. Na ordem, a culpa é vivida como transgressão e medo de punição e a ino-

    cência como retidão e lealdade.

    Assim, “culpa e inocência” são dois lados da mesma moeda que se encontram a serviço das Or-

    dens do Amor, em suas diferentes instâncias de consciências: pessoal, coletiva e universal. Estas condições

    acompanham o movimento contínuo no amor do espírito da Hellinger Sciencia®.

    O padrão da consciência é determinado pelo grupo e pelas pessoas com quem nos relacionamos.

    5 Hellinger, 2009, p. 11. 6 Hellinger, 2009, p. 11-12.

  • Constelações familiares com bonecos e os elos que de amor que vinculam aos ancestrais 17

    Pertencemos a diferentes grupos, desde o familiar, ao grupo profissional ou de estudos, grupos religiosos e

    sociais. Desenvolvemos um padrão de consciência diferenciado com cada grupo e com cada pessoa do gru-

    po. Portanto, desenvolvemos consciências distintas com as diferentes pessoas.

    Cada conexão relacionai se encontra configurada por uma consciência. Temos uma consciência

    com nossa família e outra especifica, na relação com o pai, na relação com a mãe, na relação com os irmãos.

    Temos distintas consciências com as pessoas do nosso trabalho e com o nosso trabalho e profissão.

    Nossa consciência nos chama a atenção quando colocamos em risco quaisquer dos nossos relacio-

    namentos e nos desviamos do sucesso, pois desviarmo-nos do sucesso é uma das principais dinâmicas nas

    quais nos encontramos submetidos de maneira inconsciente, como uma forma de equilibrarmos nossa sensa-

    ção de “culpa” ou “inocência”.

    A Consciência Pessoal é regida pela dinâmica de culpa e inocência, uma contabilidade particular

    que permeia as leis do Alcorão7. Sendo assim, o sujeito se baseia em uma consciência moral, baseada em

    “certo e errado”, a qual está diretamente ligada a valores familiares e à educação recebida. Esta consciência

    também está ligada à Consciência do Clã.

    Na Consciência do Grupo ou Consciência do Clã, a consciência deixa de ser pessoal e passa a es-

    tar ligada ao grupo. Nesta consciência se faz presente um poder de atuação inconsciente, o poder da alma do

    grupo. Este poder cobra qualquer desrespeito para com o grupo, em relação às forças de vínculo, compen-

    sação e ordem.

    O poder da Consciência do Clã é maior que o poder da Consciência Pessoal, tem a abrangência de

    consciência de grupo, não observando as consequências individuais ou as questões de justiça. É um poder

    que atua conforme ordens próprias e com justiça própria.

    Nessa Consciência, o princípio da ordem é determinante e os membros que chegam por último aos

    sistemas são os escolhidos pelos emaranhamentos sistêmicos dos vínculos de destino. Este destino já está

    presente na família quando um novo membro chega. Assim, o membro familiar posterior que vive agora

    responde pelos membros anteriores, que já morreram. Na justiça da Consciência do Clã, quem veio depois,

    o inocente, permanece a serviço das forças anímicas da vinculação, está a serviço das forças do vínculo e do

    pertencimento, independente da vontade e compreensão.

    A consciência que sentimos em nossas emoções como culpa e como inocência pertence a nossa

    alma. Temos medo de arriscar nosso direito de pertencimento. Essa consciência nos acompanha em

    cada passo. Nos provoca diretamente um sentimento de culpa, antes de refletirmos. Nos permite

    reagir de maneira imediata e modificar nossa conduta de forma pertinente. É um instinto que nos

    permite distinguir se pertencemos ou não8.

    Na Consciência do Clã, Hellinger observou que a lealdade também é regida pela hierarquia e é

    mais forte nas pessoas que ocupam posição inferior nos grupos, como os filhos em uma família e funcioná-

    rios em nível inferior de uma empresa.

    Em consonância com a postura de Hellinger, podemos citar o biólogo chileno Humberto Matura-

    na9, que afirma que somos constituídos no amor. Para o autor, o amor é “a emoção central na história evolu-

    tiva humana desde o início, (...) na aceitação do outro como legítimo outro”, reconhecendo a igualdade entre

    todos no respeito às diferenças e similitudes, como sujeitos do mesmo nível de pertencimento. Para Matura-

    na, “na vida humana a maior parte do sofrimento vem da negação do amor: os seres humanos somos filhos

    do amor11".

    Bert Hellinger estrutura sua filosofia sobre este viés. A aceitação incondicional do outro e das coi-

    sas tal como são, se baseando no amor que tudo une, sem preconceitos, julgamentos ou controle. “O amor do

    espírito, quando nos abarca, se alegra de tudo o que existe e de como existe. Está a favor de tudo, tal como é,

    tudo e todos formam parte da totalidade. Incluindo nós, tal como somos10”. Um amor universal que une to-

    dos de igual forma, com respeito e aceitação de tudo tal como é. Aceita a todos e a tudo, no seu tempo, na

    sua forma e no seu movimento.

    Para o amor do espírito não existe mais ou menos pertencimento, nenhum direito maior ou menor

    7 O Alcorão descreve as origens do Universo, o Homem e as suas relações entre si e o Criador. Define leis para a sociedade, morali-

    dade, economia, entre outros assuntos. Foi escrito com o intuito de ser recitado e memorizado. Os muçulmanos consideram o

    Alcorão sagrado e inviolável. 8 Hellinger, 2011, pp. 18-19. 9 Maturana, 2002, p. 25. 10 Hellinger, 2011, p. 50.

  • 18 Marusa Helena das Graças Gonçalves

    de pertencer, para ele, nada vai mais além do existir presente. O amor do espírito sempre se mantém em mo-

    vimento, um movimento criador, presente em tudo. Percebemos nossa sintonia com este amor quando esta-

    mos em sincronia com a Consciência Espiritual.

    O movimento do espírito é um movimento diferente do movimento da Consciência Pessoal, na

    qual culpa e inocência encontram-se presentes. Nossa sintonia com a Consciência Espiritual é reconhecida

    quando nos encontramos na calma, sentida quando nos sentimos em paz. A sintonia com a Consciência Es-

    piritual é geradora de leveza.

    Quando nos encontramos na inquietude não estamos em sincronia com este amor da Consciência

    Espiritual. Na inquietude queremos controlar, não estamos aceitando tudo tal como é. De alguma forma,

    queremos fazer algo e nos desviamos do caminho.

    O amor do espírito

    Experimentamos o amor no corpo e na alma, e o experimentamos no espírito. Em cada um desses

    níveis ele é vivenciado de uma forma diferente. Nenhum desses níveis pode ser vivenciado separa-

    damente, pois os três atuam juntos. Não obstante, vivenciamos o peso deles e o sentimento do

    amor de diferentes maneiras no amor físico, no amor anímico e no amor espiritual. O amor físico,

    sobretudo o amor entre o homem e a mulher, é vivido na intimidade. O amor anímico transcende a

    proximidade... Ele precisa de um oponente e geralmente é recíproco... confere profundidade ao

    amor físico. O amor espiritual vai além do amor físico e do amor anímico. Ele acompanha o mo-

    vimento do espírito. Pelo amor espiritual eu me dedico igualmente a todos e a tudo... O amor espi-

    ritual está simplesmente presente, sem desejar coisa alguma, sem dar ou tomar, pois ele é espiritu-

    al13.

    1.2 AS ORDENS DO AMOR

    Para Bert Hellinger11, todos os vínculos se encontram baseados no amor. Para dar certo, o amor se

    submete a uma ordem e assim, na ordem certa, o amor alcança seu objetivo. Os vínculos do amor são viven-

    ciados em relações entre iguais (homem e mulher) e em relações de hierarquia (pais e filhos, chefes e funcio-

    nários, professor e alunos etc.).

    Para que amor de um casal, o amor entre iguais, possa fluir é necessário que ambos se reconheçam

    como iguais, reconhecendo um ao outro como alguém de mesmo valor. É um amor humilde que toma e dá na

    mesma medida: nem dá mais do que toma, nem toma mais do que dá e com isso, não se coloca acima ou

    abaixo do outro, não é maior, melhor ou mais amoroso que o outro. Numa relação entre iguais, ambos po-

    dem e querem dar algo e, ao mesmo tempo, precisam e querem receber algo. Ambos podem dar e receber.

    O vínculo de amor de um casal se mantém forte na medida do equilíbrio entre o dar e tomar. Para

    um amor especial, o outro deve ser reconhecido no seu amor, exatamente na maneira do seu amor, como um

    “legítimo outro” existente na relação. O amor em um casal não pressiona com seu próprio amor e toma o que

    ele dá. Na medida em que tomamos, aprendemos o que é o amor, uma medida equilibrada entre o dar e rece-

    ber no amor.

    Entre as Ordens do Amor pode-se considerar como primeira ordem entre um casal, a equivalência,

    ou seja, que homem e mulher - mesmo sendo diferentes - são equivalentes. Com o reconhecimento da equi-

    valência, o amor tem grandes chances de dar certo.

    Como segunda ordem, o casal precisa do equilíbrio na troca entre dar e receber. Quando um dá

    mais ao relacionamento do que o outro, o relacionamento fica conturbado. Quando ocorre este desequilíbrio,

    surge uma necessidade de compensação, ou seja, o parceiro que recebeu mais sente a necessidade de - em

    troca - dar ao outro um pouco mais para compensar. Essa compensação fortalece o vínculo no amor.

    O desejo de compensação também existe em aspectos negativos. Se um parceiro causa algum mal

    ao outro, este também terá o desejo de compensar com um ato negativo em troca, confirmando o desejo hu-

    mano da Lei do “olho por olho, dente por dente”, fortalecendo o vínculo negativamente.

    Se numa relação não existe essa necessidade ou cumprimento de compensação, um parceiro dá,

    mas o outro não compensa dando um pouquinho mais, o vínculo se enfraquece e pode ocorrer o rompimen-

    to. Quando um parceiro dá muito à relação e o outro não compensa, esse que recebeu muito sem compensar

    se sente indigno e tende a ir embora para manter sua dignidade. Existem alguns casos em que um dos parcei-

    ros quer dar, mas o outro não quer receber, o vínculo também não consegue suportar tal desequilíbrio e ten-

    11 Buscando maior fidelidade à proposta de Bert Hellinger, nos referimos quase que literalmente aos textos do autor para desenvol-

    vermos esta parte do capítulo.

  • Constelações familiares com bonecos e os elos que de amor que vinculam aos ancestrais 19

    de a se romper.

    Este equilíbrio entre dar e receber se refere a quaisquer trocas que um casal estabeleça em sua re-

    lação, podendo ser trocas de manifestações afetivas, cuidados com a relação, questões materiais, enfim, in-

    vestimentos na relação em si.

    A terceira lei dos relacionamentos de iguais nas Ordens do Amor advêm do lugar, da ordem nos

    sistemas familiares. Se um dos parceiros não está em seu lugar na sua família de origem, não poderá ter seu

    lugar no sistema de iguais porque está preso antes em “lugares” errados em seu sistema de origem.

    Um homem só pode ocupar plenamente o lugar de parceiro de uma mulher, quando ocupou seu lu-

    gar de filho em sua família de origem, e não o lugar de “companheiro” de sua mãe. Quando um menino se

    acha melhor que seu pai, toma o lugar deste ao lado da mãe. Se acha melhor para sua mãe do que seu pai e

    se toma um “menino homem”, não tem respeito pelas mulheres. Então, não estabelece uma relação de igual

    com uma mulher, pois já tem este lugar ocupado por sua mãe e não precisa de outra. Este homem poderá

    procurar em muitas mulheres a sua mãe. Acaba tendo muitas parceiras, mas não respeita nenhuma como

    igual e como mulher.

    Para se tomar capaz de ser um homem e respeitar sua mulher, precisa se colocar ao lado de seu pai

    como menor, como pequeno. Para ser homem, tem que ser menino, a criança de seu pai.

    Para a mulher, a menina toma-se capaz de ser uma mulher, ter e respeitar outro homem quando se

    coloca ao lado de sua mãe como menor. Se ela se achar melhor que sua mãe, não terá respeito pelos homens,

    não os entende e, em princípio, não precisa deles. Se ela se achar melhor que sua mãe, significa que acha

    que é uma mulher melhor para o seu pai que a sua mãe. Então, ela já tem o seu homem, não precisa de ne-

    nhum outro. Nunca vai conseguir tomar outro homem que não seu papai.

    Assim, o homem aprende a respeitar uma mulher com seu pai e a mulher aprende a respeitar um

    homem com sua mãe. Nas Ordens do Amor é exigida a renúncia que foi iniciada na infância, o filho para ser

    homem precisa renunciar a primeira mulher de sua vida, sua mãe, e a filha para tornar-se mulher precisa re-

    nunciar ao seu primeiro homem, seu pai. Caso contrário, ambos permanecerão adolescentes em suas buscas

    e se tomarão “o(a) filhinho(a)” do papai e da mamãe no parceiro.

    Como podemos perceber, a ordem nas famílias de origem tem grande implicação para o amor dar

    certo na formação do casal, pois, somente quando o homem respeita seu pai e a mulher, a sua mãe, ambos

    poderão tomar o amor no masculino e no feminino.

    O homem precisa da mulher para ser homem e a mulher precisa do homem para ser mulher... só

    quando o homem faz de uma mulher a sua mulher e a tem como tal, e a mulher faz de um homem

    o seu homem e o tem como tal é que eles são marido e mulher e formam um casal12.

    Quando um dos parceiros escolhe o outro por outros motivos que não o amor, tais como a busca de

    sustento ou proteção, poder social, o casal em seu amor e vínculo tende ao fracasso no relacionamento.

    Também, dificilmente um casal terá sucesso se a união foi contrária às bênçãos dos pais.

    Para Hellinger, o primeiro sim não é um sim ao outro, senão um sim a si mesmo, depositado no

    outro. Somente um segundo sim seria o sim verdadeiro, não mais a ilusão projetiva do seu amor próprio, ou

    seja, o segundo sim é a aceitação do outro como legítimo outro.

    O casal se forma e se constrói nas Ordens do Amor e isso acontece quando o homem quer a mulher

    como mulher, e por sua vez, a mulher o quer como homem, quando o masculino se completa no feminino e

    vice-versa. Hellinger reconhece a grande importância da união do masculino e do feminino através da sexua-

    lidade, em função da continuidade da vida. É através dos filhos e da grandiosidade do amor que o futuro

    aponta. “O homem deixa seu pai e sua mãe e se une à sua mulher, e ambos se tomam uma só carne, assim já

    não serão dois, mas uma só carne”13.

    A consumação do amor

    (...) nenhum outro ato humano está mais sintonizado com a ordem e a plenitude da vida, nem nos

    toma mais amplamente a serviço do mundo em sua totalidade. Nenhum outro ato humano nos traz

    um prazer tão inebriante nem proporciona, em seu seguimento, um tal sofrimento amoroso. Ne-

    nhum outro ato humano é mais pesado de consequências, mais cheio de riscos, nem exige de nós

    tais extremos ou nos faz tão conhecedores, sábios, humanos e grandes do que aquele em que um

    12 Hellinger, 2009, p. 42. 13 Bíblia Sagrada, Genesis 2:24 - Efésios 5:31.

  • 20 Marusa Helena das Graças Gonçalves

    homem e uma mulher reciprocamente se tomam e se reconhecem com amor14.

    O vínculo especial do casal se concretiza na consumação do amor e, neste sentido, faz parte das

    Ordens do Amor que homem e mulher se encontrem orientados a um terceiro, completando o seu amor em

    um filho e mantendo-se na esfera do amor no casal. Assim, o amor entre o casal tem precedência à paterni-

    dade e à maternidade, ou seja, para ser “pai e mãe”, antes o casal é “homem e mulher”. Nesta questão, o es-

    morecimento do amor no casal, esmorecerá o amor no filho.

    O amor e desamor do casal são passados aos filhos. Em um casal, o que amam e o que não amam

    em si e no outro, também amam e não amam em seus filhos. Para que o amor dê certo entre um casal sua ba-

    se se encontra no amor da criança pelos pais e dos pais pela criança. “Quando existem dificuldades no rela-

    cionamento a dois, isto frequentemente está ligado ao fato de que aquilo que antecede o amor entre um casal,

    ainda precisa de uma solução15”, ou seja, os parceiros ainda se encontram emaranhados em pendências às

    suas famílias de origem.

    Na família de origem, aprendemos os modelos de casal e das relações afetivas entre homem e mu-

    lher. O que cada parceiro traz para o casamento é baseado no que foi vivido anteriormente em sua família.

    Atualmente se apresentam muitas configurações de casais: casais em recasamentos, famílias mo-

    noparentais19, novas configurações parentais20 etc.

    Nestas novas possibilidades parentais as Ordens do Amor baseiam-se no mesmo princípio da ordem de che-

    gada aos sistemas.

    Nas separações, por exemplo, os parceiros anteriores devem ser honrados e respeitados. Nos casos

    em que isso não acontece, os filhos da nova constituição familiar representam o parceiro anterior, conflitan-

    do a relação atual com seus pais numa espécie de compensação pelo desrespeito. O que se observa nas

    Constelações Familiares é que parceiros anteriores não respeitados são posteriormente representados por

    um dos filhos do novo casal. Esta criança mostrará os sentimentos do parceiro anterior e se comportará co-

    mo ele(a). Pode-se dizer que este filho ou filha estaria emaranhado por uma compensação da Consciência do

    Clã.

    Um parceiro do segundo casamento, por exemplo, deverá reconhecer seu lugar frente ao sistema

    todo, seu lugar é o de segundo. Deverá principalmente reconhecer que seu lugar existe porque o parceiro an-

    terior cedeu este lugar. Quando parceiros posteriores não respeitam e honram a “perda” do parceiro anterior,

    a relação permanece conflituosa até que este parceiro seja honrado.

    Se existem filhos de um casamento anterior, estes têm prioridade junto a seus pais sobre os novos

    parceiros. Entretanto, o sistema atual terá prioridade sobre o sistema familiar anterior ao nascerem filhos

    desta nova união. A nova família entra na contabilidade total do sistema, sendo o lugar desta como de se-

    gundo casamento - e o lugar de cada filho também deve obedecer à ordem total de filiação de cada parceiro.

    O primogênito da nova relação pode ser o segundo ou terceiro filho do pai, por exemplo.

    Hellinger é bem incisivo quando afirma que qualquer transgressão da ordem original tenderá ao

    fracasso. Para o autor, a maioria dos motivos das separações encontra-se oculto nos emaranhamentos famili-

    ares das famílias de origem.

    Para que o amor dê certo, a hierarquia nos relacionamentos deve ser respeitada, ou seja, respeitar a

    ordem original nos relacionamentos que atribui aos membros mais antigos a precedência em relação àqueles

    que vieram depois. Neste sentido, tanto como casal, quanto como pais, os parceiros encontram-se no mesmo

    nível, pois iniciam a relação ao mesmo tempo, não existe uma preferência. Quando nascem os filhos, a or-

    dem de precedência hierárquica a ser seguida é dos pais em relação aos filhos, e então do primeiro filho em

    relação ao segundo, e o segundo em relação ao terceiro e assim por diante.

    Nas Ordens do Amor entre pais e filhos, os pais dão a vida e dão-se a si mesmos sem acréscimos

    ou eliminações. Os filhos tomam sua vida total, tal como os pais a dão. Tomam dos pais, como eles são. Os

    filhos são seus pais, tomam a vida sem recusa ou medo.

    O ato de tomar dos pais em concordância a tudo tal como foi dado é um ato de humildade, uma

    aceitação total do destino, dos limites e das possibilidades. Uma anuência completa ao adquirido, tanto com

    o leve quanto com o pesado da família. Os filhos tomam tudo de seus pais, sem reivindicações ou recusa, as-

    sentindo ao destino do pertencimento. Aceitando tudo, os filhos honram seus pais. Qualquer recusa ou rejei-

    ção dos filhos para com seus pais levará a irrealização na vida e a sensação de vazio.

    14 Hellinger, 2009, p. 43. 15 Hellinger, 2008, p. 104.

  • Constelações familiares com bonecos e os elos que de amor que vinculam aos ancestrais 21

    Os pais dão aos filhos o que tomaram de seus pais. Os filhos tomam seus pais como pais. Posteri-

    ormente, também tomam o que os pais dão por acréscimo e darão aos seus filhos o que receberam, passam

    adiante no processo evolutivo.

    Esta ordem também é aplicada aos irmãos, os filhos que vieram antes dão aos que vierem depois.

    O filho mais velho dá mais e o mais novo recebe mais, em compensação, cuida mais dos pais na velhice.

    Na família, observam-se fortemente as consequências à lei da ordem. Os filhos jamais podem ocu-

    par o lugar de seus pais e irmãos mais velhos, mesmo que seja por amor ou proteção. O preço de quando al-

    guém sai do lugar é caramente cobrado, em forma de compensações de insucesso na vida, sintomas físicos e

    emocionais etc.

    Na perspectiva das Ordens do Amor, os que recebem devem honrar as dádivas recebidas e a pessoa

    de quem recebeu.

    O que é especial

    Cada indivíduo possui também algo de único que não pode derivar de seus pais. Precisamos con-

    cordar com isso também. Pode ser algo leve ou pesado, algo bom ou algo ruim, isso não podemos

    discriminar. Seja o que for que alguém faça ou omita, apoie ou combata, ele foi tomado a serviço,

    querendo ou não21.

    Nesta lei do dar e tomar entre pais e filhos ocorrem muitas dinâmicas e a obediência ou desobedi-

    ência a estas leis levam ao sucesso ou ao fracasso na vida. Reivindicações e exigências levam ao fracasso,

    aceitação incondicional e amor aos pais levam ao sucesso.

    Ao honrarmos e tomarmos nossos pais pertencermos a eles e ao nosso grupo familiar. Juntamente

    com os nossos pais, pertencemos às linhagens de ambos.

    O grupo familiar é unido por uma força que vincula e que une todos os membros da mesma forma

    por um sentido de ordem e equilíbrio22. Para Hellinger, fazem parte deste grupo: o filho e seus irmãos (inclu-

    sive os mortos e natimortos, abortos provocados e espontâneos), os pais e seus irmãos (inclusive os mortos e

    natimortos, abortos provocados e espontâneos, bem como os nascidos fora do casamento e os meios-

    irmãos), os avós e algumas vezes seus irmãos, eventualmente um ou outro dos bisavós, inclui-se também

    pessoas sem laços de parentesco que tenham cedido lugar a outros no grupo familiar (como os parceiros an-

    teriores dos pais ou dos avós e todos cuja desgraça ou morte tenha resultado em vantagem para outras pesso-

    as do grupo familiar).

    Os membros do grupo familiar pertencem a uma comunidade comum, os laços que os unem for-

    mam a comunidade de destino que tem como objetivo manter a completude do grupo familiar. Vigilante-

    mente todos pertencem a esta comunidade, vivos e mortos até muitas gerações. Nesta comunidade, através

    da Consciência do Clã, todos se encontram a serviço de um amor cego, dos laços inconscientes que não são

    compreendidos pelos seus membros, mas que se revelam nas Constelações Familiares como os laços do

    destino. São os elos de amor que vinculam aos ancestrais. Esse amor cego dos laços de pertencimento pode

    através das Ordens do Amor seguir um movimento positivo e consciente.

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  • 22 Marusa Helena das Graças Gonçalves

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  • Constelações familiares com bonecos e os elos que de amor que vinculam aos ancestrais 23

    2

    CONSTELAÇÕES FAMILIARES: UMA CONCEPÇÃO

    SISTÊMICA DAS REDES RELACIONAIS Joice Goveia da Rocha Marusa Helena da Graça Gonçalves

    As Constelações Familiares da Hellinger Sciencia®, a ciência dos relacionamentos humanos, con-

    têm em sua filosofia e prática aspectos que consideramos correlatos aos fundamentos e premissas da Ciência

    da Complexidade e empregam bases e princípios da Concepção Sistêmica da Vida.

    A Concepção Sistêmica da Vida apresentou-se como um novo modelo de pensamento científico

    desde que Ludwig Von Bertalanffy, biólogo de Viena, publicou, em 1937, a Teoria Geral dos Sistemas, bus-

    cando nas leis dos sistemas naturais as regras de funcionamento para os demais sistemas, inclusive os soci-

    ais. Nesta época, a maneira de perceber os fenômenos consistia essencialmente em “resolver o organismo

    vivo em partes e processos parciais”, essa forma de percepção, ficou caracterizada como visão mecanicista,

    baseada em um modelo reducionista1. No pensamento mecanicista, a essência da realidade era percebida por

    meio de um mundo material e o objeto científico era percebido apenas na realidade material, os fenômenos

    que não fossem materiais eram considerados sobrenaturais. O conhecimento deveria ser construído a partir

    de leis e princípios determinados pelas leis de “causa-efeito” e o sujeito, observador do fenômeno, deveria

    estar em posição neutra, separada do objeto para confirmação da cientificidade.

    A visão sistêmica dos organismos vivos teve dificuldades de ser apreendida a partir da perspectiva

    da Ciência Clássica porque requeria modificações significativas de muitos conceitos e ideias clássicos. A

    preocupação com a fragmentação do saber e a ênfase nas partes, evoluíram para a busca da compreensão do

    todo e das relações entre as partes que compõem o todo sendo que as propriedades das partes podem ser en-

    tendidas apenas a partir da organização do todo. Esta nova compreensão mostra que os sistemas só podem

    ser percebidos a partir de relações e integração.

    No pensamento sistêmico, o sistema passou a significar um todo integrado cujas propriedades es-

    senciais surgem das relações entre as suas partes. Os objetos que antes eram vistos isoladamente passaram a

    ser compreendidos em seu contexto formando redes de relações embutidas em redes maiores.

    O termo sistema refere-se a um todo e como um organismo biológico ou social, existe dentro de

    uma totalidade integrada, cujas propriedades decorrem das relações de suas partes.

    Para a ciência sistêmica, qualquer organismo é uma totalidade integrada; portanto, um sistema vi-

    vo é uma totalidade, cujas estruturas específicas resultam das interações e interdependência de suas partes.

    Os sistemas só podem ser compreendidos dentro de um contexto do todo maior, são totalidades integradas

    cujas propriedades não podem ser reduzidas a unidades menores, enfatizando-se os princípios básicos de or-

    ganização. Para a Concepção Sistêmica da Vida, só podemos entender os fenômenos dentro de um contexto

    relacionai e dentro de um todo maior.

    A Concepção Sistêmica da vida acompanha a premissa da Biologia moderna, na qual a vida é

    apreendida como resultado de um processo de organização e autopoiese2. Nesta concepção, os seres vivos

    são auto- organizadores em seu processo de vida e tudo pode ser definido em termos de relações. Esta rede

    de relações expressa um determinado padrão, considerado o padrão da vida, um padrão autopoiético que,

    por sua vez, determinará uma estrutura que é configurada na rede de relações.

    Cada sistema tem um padrão de organização e uma configuração de relações que se organiza

    dentro de uma determinada estrutura. A relação entre esta estrutura e o padrão caracteriza o processo, um

    movimento contínuo no qual todos os membros ou elementos estão conectados e tem igual importância den-

    tro de uma ordem.

    A Concepção Sistêmica com sua ênfase nas relações, se baseia nos pressupostos de: auto-

    organizacão, autorrenovação e transcendência, estes pressupostos que mantêm a integridade da estrutura

    global16. Na auto-organização encontramos outros dois fenômenos dinâmicos, a autorrenovação17 e a auto-

    transcendência18. São tendências complementares dos sistemas auto-organizadores que se encontram em

    16 Capra, 1982 (In Gonçalves, 2002, p. 19). 17 Autorrenovação: capacidade dos sistemas vivos de renovar e reciclar continuamente seus componentes, sem que o padrão geral

    do organismo seja alterado. (Gonçalves, 2002, p. 20) 18 Autotranscendência: capacidade de se dirigir criativamente para além das fronteiras físicas

    e mentais nos processos de aprendizagem, desenvolvimento e evolução. (Gonçalves, 2002,

  • 24 Marusa Helena das Graças Gonçalves

    contínua interação dinâmica, ambas contribuem para o fenômeno da evolução. Esta evolução se opera em

    um estado afastado do equilíbrio, numa coexistência entre estrutura e mudança, entre ordem e dissipação e

    desenrola-se a partir de uma interação de adaptação e criação, o estado da vida. Uma vez atingido um ponto

    crítico, o sistema é forçado a evoluir para uma nova estrutura19.

    Outro critério chave do pensamento sistêmico é a sua capacidade de deslocar a própria atenção de

    um lado para outro entre níveis sistêmicos, os quais representam diferentes níveis de complexidade. Em cada

    nível, os fenômenos observados exibem propriedades que não existem em níveis inferiores, ao que alguns

    autores denominam de hierarquia dos sistemas7. São diferentes níveis suprassistêmicos e intrassistêmicos,

    em diferentes níveis de complexidade, sendo todos igualmente importantes para a manutenção da coerência.

    Nas palavras de Werner Heisenberg, um dos fundadores da teoria quântica: “o mundo aparece assim como

    um complicado tecido de eventos, no qual conexões de diferentes tipos se alternam, se sobrepõem ou se

    combinam e, por meio disso, determinam a textura do todo”8.

    Todos os elementos sistêmicos fazem parte de uma complexa teia de relações interativas, auto-

    organizadoras, interdependentes e em constante movimento. Uma rede que se estende em todas as direções

    com sua capacidade de autorregulação. São redes de comunicação geradoras de realimentação que adqui-

    rem a capacidade de se autorregular.

    Assim, na Concepção Sistêmica da Vida, todo sistema vivo é um sistema aberto que funciona atra-

    vés de um fluxo de informações em constante retroalimentação para a continuidade do seu processo evoluti-

    vo. No processo evolutivo, ocorrem dois movimentos; a continuidade e o retomo a si mesmo de forma modi-

    ficada, um processo de “repetição com diferença”, um processo criativo evolutivo.

    Na Concepção Sistêmica da vida, os sistemas se auto-organizam, autorreproduzem e se autocons-

    troem20, nas suas trocas relacionais com o meio físico, biológico e social.

    Paradigmas que embasam essa Concepção se mostram atuantes na prática e teoria das Constela-

    ções Familiares. Os sistemas familiares constroem um padrão de interação que geração após geração se re-

    petem até que seja restaurada uma nova ordem que pode ser conseguida através das Constelações Familia-

    res. São sistemas interligados geracionalmente e que se auto- -organizam, se autorreproduzem e se autocons-

    troem, repetindo o padrão atemporalmente formando a sua própria diferença evolutiva, funcionando em dife-

    rentes níveis de complexidade entrelaçada.

    Fundamentada nos princípios da Concepção Sistêmica da Vida, as Constelações Familiares, em

    contraste a alguns modelos contemporâneos de terapia familiar, se baseia no processamento imediato da ex-

    periência não verbal, vivencial e utiliza, na sua prática, o método fenomenológico desenvolvido nas raízes

    da Fenomenologia.

    A Fenomenologia (do grego phainesthai aquilo que se apresenta ou que se mostra) é o estudo das

    experiências sensoriais diretas e se apoia na percepção do participante, na compreensão vivida de suas expe-

    riências subjetivas. Esta visão dá importância aos fenômenos da consciência, os quais devem ser estudados

    em si mesmos, já que um fenômeno não é guiado pela lógica, raciocínio ou vontade. A fenomenologia pede

    por uma experiência sen- sorial imediata, vivenciar o fenômeno representa a sua essência, a sua “signi-

    ficação”21.

    As Constelações Familiares não são e não podem ser definidas como um método, pois se utilizam

    do método fenomenológico, um método que considera comunicante o que acontece a cada segundo com to-

    da a sua subjetividade. Todas as informações observáveis pelo observador que se mostram num campo de

    inúmeras possibilidades são consideradas. O método fenome- nológico se apraz de tudo o que pode ser mos-

    trado pelo sistema do cliente e tudo o que pode ser percebido e utilizado naquele momento pelo observador;

    comportamentos, sensações, sentimentos, pensamentos, estímulos internos e externos, tudo aquilo que se faz

    presente através da consciência do observador naquele fenômeno.

    Nas Constelações Familiares, os fenômenos se comunicam através do corpo, nos movimentos dos

    participantes, representantes que se colocam “a disposição” do sistema do cliente em seu tema. Estes fenô-

    p. 20)

    19 Teoria das Estruturas Dissipativas de Ilya Prigogine: combinação de “dissipativa” e “estrutura” para expressar duas tendências

    aparentemente contraditórias que coexistem em todos os sistemas vivos, incluindo a ideia de pontos de instabilidade, nos quais

    novas estruturas e novas formas podem emergir (Capra, 1996, p. 149). 20 Capra, 1996. 21 A fenomenologia se encontra baseada no trabalho de Brentano, Husserl e Merleau-Ponty, entre outros e apresenta um afastamento

    radical das ciências “objetivas”. (Fabri, 2007)

  • Constelações familiares com bonecos e os elos que de amor que vinculam aos ancestrais 25

    menos ocorrem porque somos unidades “corpo-espírito” conectadas em diferentes níveis a todo inconsciente

    coletivo da humanidade, são informações que atravessam tempo e espaço nas gerações.

    Para Hellinger,

    (...) na base da fenomenologia existe um outro conceito de verdade, uma outra experiência da ver-

    dade (...) frequentemente, queremos compreender a verdade e a tratamos como algo incontestável

    e eterno, sendo muitas vezes apenas pensada (...) a verdade fenomenológica emerge, às vezes bre-

    vemente e vem a luz um brilho, e você não deve querer alcançá-lo (...) simplesmente está lá e de-

    saparece11.

    Na Hellinger Sciencia®, as Constelações Familiares não se caracterizam como um método em si,

    sua prática terapêutica foi desenvolvida e é guiada por sua concepção e postura filosófico-fenomenológica e,

    através das Ordens do Amor, oferecem uma ampla visão do “funcionamento das relações'” nos diferentes

    grupos.

    Assim, em nossa reflexão, as Constelações Familiares se apoiam nas estruturas teóricas dos apor-

    tes da Abordagem Sistêmica22 e incorporam os princípios da Concepção Sistêmica nos conceitos de interco-

    nectividade e inter-relacionamento das partes com o todo formando uma intricada e complexa rede de rela-

    ções comunicantes. As Constelações Familiares mostram o processo evolutivo sistêmico nos movimentos

    de “repetição com diferença” apoiados na multigeracionalidade e nas lealdades vincula- res, quando da bási-

    ca e vital, busca de pertencimento do indivíduo a seu grupo familiar.

    2.1 CONSTELAÇÕES FAMILIARES E TERAPIA FAMILIAR

    SISTÊMICA: SIMILITUDES E AFINIDADES

    As Ordens do Amor da Hellinger Sciencia® oferecem uma ampla visão do funcionamento das re-

    lações nas esferas pessoal, familiar, social e empresarial. As Ordens do Amor instituem as leis para os rela-

    cionamentos humanos e se baseiam nos princípios de ordem, vínculo e equilíbrio, princípios norteadores pa-

    ra o funcionamento relacionai de qualquer grupo e também, incorporam os princípios da Concepção Sistê-

    mica da Vida, da Multigeracionalidade e das lealdades em sua configuração.

    Embora a prática das Constelações Familiares aporte diferenças quanto aos modelos psicoterapêu-

    ticos clássicos da Psicologia, observamos aportes importantes em comum com a Terapia Familiar Sistêmi-

    ca. Acreditamos que estes aportes, ou pontos em comum, possam enriquecer a compreensão das Constela-

    ções Familiares e, na mesma medida, a abordagem da Hellinger Sciencia® pode fortalecer o arcabouço teó-

    rico-prático da Terapia Familiar Sistêmica.

    Embasados nesta premissa apresentaremos similitudes e afinidades teóricas entre algumas aborda-

    gens de terapias sistêmicas e humanistas traçando alguns paralelos com as Constelações Familiares. Nas

    similitudes, podemos citar algumas questões da teoria psicanalítica, da gestalt-terapia, da terapia familiar

    sistêmica, da teoria do apego, do psicodrama e da análise de script, entre outras23 e, de modo geral, podemos

    afirmar que a terapia das Constelações Familiares agrega uma nova prática sobre os relacionamentos huma-

    nos junto às diversas teorias fenomenológicas.

    Do arcabouço teórico-prático clássico da Terapia Familiar Sistêmica apontamos a teoria das Leal-

    dades Invisíveis, estabelecidas nos grupos multipessoais, uma contribuição de Boszormenyi-Nagy e os con-

    ceitos de Salvador Minuchin sobre a Estrutura, Hierarquia Familiar e o Filho Parental que também se mos-

    tram presentes nas similitudes dos aportes das Constelações Familiares. Observamos que a visão relacionai

    sistêmica de Maurizio Andolfi sobre Mitos, Rituais e Regras, contribui pra a compreensão da intergeraciona-

    lidade e por último, porém não menos importante, os conceitos de Multigeracionalidade, Diferenciação do

    selfi Parentificação e Triangulação de Murray Bowen se mostram estruturantes nesta reflexão.

    Além dos autores citados, buscamos outras afinidades teóricas compatíveis com os aportes filosó-

    ficos da Hellinger Sciencia® tais como a Gestalt-terapia de Fritz Pearls e a Teoria do Apego de John Bowl-

    by.

    Iniciaremos explorando os conceitos desenvolvidos por Boszormenyi-Nagy e Spark, estudiosos de

    base psicanalítica24 que investigaram as conexões multigeracionais nas relações humanas. Seus trabalhos

    versam sobre a importância dos direitos e responsabilidades nos relacionamentos interpessoais, o equilíbrio

    22 A Abordagem Sistêmica é baseada nos conceitos da Teoria Geral dos Sistemas, tem princípios fundamentados no Humanismo,

    tomou-se uma abordagem da Psicologia especialmente na Terapia Familiar. 23 Schneider, 2007; Franke, 2006; Hellinger & Ten Hövel, 2006 e Hellinger 2004a e 2004c. 24 Considerados pertencentes à Escola Psicanalítica Familiar Sistêmica.

  • 26 Marusa Helena das Graças Gonçalves

    entre o que se faz e o que se recebe num grupo multipessoal (seja um sistema familiar, organizacional ou so-

    cial). A estas conexões invisíveis da Multigeracionalidade, os autores denominaram de Lealdades Invisí-

    veis15. Se referem a um senso ético que une todos os membros de um grupo, como uma família, grupo de

    trabalho ou mesmo a sociedade25 e este senso de lealdade ética enreda os participantes do grupo em dinâmi-

    cas conscientes e inconscientes de obrigação e comprometimento aos objetivos, expectativas e valores gru-

    pais, apresentando assim uma função integradora ao sistema. Infringir a lealdade gera nos membros de um

    grupo sentimentos de culpa e a ameaça de exclusão, portanto as lealdades funcionam também como forma

    de coerção e controle sobre as atitudes e comportamentos.

    Boszormenyi-Nagy e Hellinger apregoam que nos grupos humanos existe uma “contabilidade to-

    tal” geradora e mantenedora de equilíbrio ou desequilíbrio nos relacionamentos. Na visão dos autores, entre

    as gerações são passadas as obrigações, compromissos, expectativas, traumas, lutos, identificações e transfe-

    rências tanto saudáveis quanto patológicos. Esta transmissão pode ser consciente ou não, falada ou não dita;

    nela percorrem segredos, desejos e situações não resolvidas. Os pais delegam aos filhos seus fardos, suas de-

    cepções, suas carências e frustrações, procurando satisfazer nos filhos algo que não puderam cumprir26.

    As lealdades invisíveis podem ser sistemicamente observadas nos sintomas de uma família, nas

    disfunções individuais de seus componentes ou mesmo, na disfunção de todo o grupo familiar. Para

    Boszormenyi-Nagy & Spark, muitas questões não representadas em uma geração podem permanecer habi-

    tando na família como um “presente ausente” pois, assim como Hellinger, Boszormenyi-Nagy & Spark

    apontam a importância vital da família no desenvolvimento humano.

    Salvador Minuchin, outro autor clássico da Terapia Familiar Sistêmica, concebe a família como o

    grupo fundamental à vida. Minuchin criou a Escola de Terapia Estrutural, na qual a organização e o contex-

    to social da família estruturam e garantem o desenvolvimento, proteção e a aprendizagem de padrões de inte-

    ração humana27, validando as experiências individuais in- trapsíquicas a todos os seus membros.

    Uma similitude apontada entre as abordagens da Terapia Estrutural e Constelações Familiares é

    que ambas convergem em sua visão sobre a família como sendo um sistema governado por regras estruturais

    e hierárquicas. Entretanto, são claramente observáveis as diferenças nas posturas terapêuticas interventivas e

    métodos entre Minuchin e Hellinger. Enquanto Hellinger se baseia numa postura e método fenomenológi-

    co28, Minuchin é diretivo e propõe um cuidadoso planejamento de ação terapêutica29.

    Para Minuchin, a hierarquia confere e estabelece a ordem, papéis e funções que atuam nas frontei-

    ras relacionais, comportamentos e tarefas essenciais que definem o pertencimento do indivíduo no grupo30.

    Para Hellinger, a hierarquia se mostra em dois movimentos importantes, no princípio de ordem e de equilí-

    brio entre dar e receber.

    Na ordem, a primazia é estabelecida pela ordem de chegada dos membros ao sistema, como os pais

    entram no sistema familiar antes dos filhos, com funções definidas, eles têm primazia nesta relação. Em con-

    sonância a esta ordem de entrada, os pais têm um lugar hierarquicamente preferencial aos seus filhos, porém,

    não de maior importância22. Nesta hierarquia, os pais detêm mais autoridade sobre os filhos.

    No princípio de equilíbrio, observa-se o que se faz e o que se recebe no grupo, em especial, os pais