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INSTITUTO MATERNO-INFANTIL PROF. FERNANDO FIGUEIRA (IMIP) PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE MATERNO-INFANTIL MIELINIZAÇÃO DO ENCÉFALO EM CRIANÇAS COM DESNUTRIÇÃO GRAVE ADRIANO NASSRI HAZIN RECIFE-2006

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INSTITUTO MATERNO-INFANTIL PROF. FERNANDO FIGUEIRA (IMIP)

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE MATERNO-INFANTIL

MIELINIZAÇÃO DO ENCÉFALO EM CRIANÇAS COM DESNUTRIÇÃO GRAVE

ADRIANO NASSRI HAZIN

RECIFE-2006

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ADRIANO NASSRI HAZIN

MIELINIZAÇÃO DO ENCÉFALO EM CRIANÇAS COM DESNUTRIÇÃO GRAVE

DISSERTAÇÃO APRESENTADA AO COLEGIADO DO CURSO DE MESTRADO EM SAÚDE MATERNO-INFANTIL DO INSTITUTO MATERNO-INFANTIL PROF. FERNANDO FIGUEIRA COMO PARTE DOS REQUISITOS PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE EM SAÚDE MATERNO-INFANTIL

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: SAÚDE DA CRIANÇA LINHA DE PESQUISA: DESNUTRIÇÃO NA INFÂNCIA ORIENTADOR: JOÃO GUILHERME BEZERRA ALVES CO-ORIENTADORA: ANA RODRIGUES FALBO

RECIFE-2006

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SUMÁRIO Página

DEDICATÓRIA i

AGRADECIMENTOS ii

LISTA DE ABREVIATURAS iii

LISTA DE QUADROS E TABELAS iv

RESUMO v

ABSTRACT vii

1. INTRODUÇÃO 01

1.1. Conceituação e classificação da desnutrição 01

1.2. Epidemiologia da desnutrição 02

1.3. Desnutrição e desenvolvimento do encéfalo 04

1.4. Estrutura e funções da mielina 07

1.4.1. Estrutura 07

1.4.2. Funções 09

1.5. Princípios de ressonância magnética 11

1.6. Métodos de imagem na avaliação do processo de maturação do encéfalo 14

1.7. Métodos de imagem na avaliação dos efeitos da desnutrição sobre a

mielinização do SNC

16

2. OBJETIVOS 17

2.1. Objetivo geral 17

2.2 Objetivos específicos 17

3. MÉTODOS 18

3.1. Local do estudo 18

3.2. Desenho do estudo 18

3.3. População do estudo e amostragem 18

3.4. Seleção de sujeitos 19

3.4.1. Critérios de inclusão 19

3.4.2. Critérios de exclusão 19

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3.5. Definição de variáveis 20

3.5.1. Variáveis indicadoras das condições sociodemográficas 20

3.5.2. Variáveis indicadoras das características maternas 21

3.5.3. Variáveis indicadoras do perfil biológico e clínico 22

3.6. Fluxograma 24

3.7. Procedimentos, técnicas e exames 26

3.8. Procedimentos para acompanhamento dos sujeitos 27

3.9. Instrumento para coleta de dados 27

3.10. Coleta de dados 28

3.11. Processamento e análise de dados 28

3.12. Aspectos éticos 28

4. RESULTADOS 29

5. DISCUSSÃO 36

6. CONCLUSÕES 52

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 53

APÊNDICES

1.Termo de consentimento livre e esclarecido 60

2. Instrumento de coleta de dados 62

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1. INTRODUÇÃO

1.1. Conceituação e classificação da desnutrição

A desnutrição ocorre quando o organismo não recebe os nutrientes necessários

para a manutenção das suas funções metabólicas, em decorrência da ingestão

insuficiente de alimentos ou de problemas na utilização do que lhe é ofertado.1

Independente dos fatores que a determinam e do seu curso patogênico, a desnutrição em

crianças se caracteriza pelo crescimento deficiente, resultando em indivíduos com

menor altura e pesando menos que o esperado para a faixa etária.2

Utiliza-se a expressão desnutrição energético-protéica (DEP) para descrever um

espectro de quadros clínicos que incluem o kwashiorkor e o marasmo bem como as

formas mais leves e moderadas que são suas precursoras. O termo kwashiorkor pode ser

entendido de duas formas distintas: como sinônimo de desnutrição edematosa ou como

a síndrome clínica descrita por Williams que ocorre em crianças entre um e quatro anos

de idade e que inclui alterações na pele e mucosas, no cabelo e no humor, bem como

infiltração gordurosa do fígado. O marasmo ocorre principalmente em crianças com

menos que um ano de vida que deixam de receber o leite materno ou recebem de forma

insuficiente os seus substitutos. Estas crianças não apresentam edema, mostram-se

bastante emagrecidas, com pele fina e enrugada, com perda da elasticidade, porém sem

lesões cutâneas. Além disto são crianças inquietas com olhar vivo e choro constante por

fome.3

Como o crescimento deficiente em crianças desnutridas é função não só de um

desequilíbrio energético-protéico, mas também do consumo inadequado de minerais,

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vitaminas e também de ácidos graxos essenciais, tem havido uma tendência no sentido

de substituir o termo desnutrição energético-protéica por desnutrição de energia e

nutrientes, incluindo as proteínas entre estes.

Por recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) são utilizados os

índices altura/idade, peso/altura e peso/idade para a classificação do estado nutricional.

A desnutrição é considerada grave se o déficit de algum destes índices for menor que

menos 3 DP (escores de desvio-padrão ou escore Z), moderada se entre menos 2 e

menos 3 DP e leve se entre menos 1 e menos 2 DP,4 tomando-se como referência do

normal o padrão do National Center for Health Statistics (NCHS).5

1.2. Epidemiologia da desnutrição

Houve uma acentuada queda na prevalência da desnutrição infantil nos países

em desenvolvimento, de 47,0% em 1980 para 33,0% em 2000 (considerando um índice

altura/idade com menos que 2 DP em relação ao padrão do NCHS). Persistem porém

diferenças regionais importantes, com queda significativa dos índices em alguns países

como observado na América Latina enquanto que em outros, como na África Oriental,

houve na verdade um crescimento do número absoluto de crianças desnutridas.6

Na América Latina houve uma redução da taxa de desnutrição de cerca de 21,0%

em 1970 para aproximadamente 7,2% em 1997,7 enquanto que dados referentes ao

Brasil no período de 1974 a 1996, como citado por Batista Filho em 1999 em

publicação sobre a desnutrição e a situação no nosso país, demonstram um grande

declínio na sua prevalência em todas as regiões (utilizando o índice peso/idade menor

ou igual a 2 DP). Na região Norte houve uma queda de 24,5% para 7,7%; na região

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Nordeste, de 27,0% para 8,3%; na região Sudeste, de 13,0% para 4,7%; na região Sul,

de 11,7% para 2,0% e na região Centro-Oeste, de 13,3% para 5,6%.8

Apesar destes progressos a desnutrição continua sendo um problema de saúde

pública nos países em desenvolvimento, onde o número de crianças desnutridas em

2000 foi estimado em 149 milhões.9 Nestes, das cerca de 12 milhões de mortes de

menores de cinco anos registradas por ano, aproximadamente 7 milhões podem estar

relacionadas direta ou indiretamente à desnutrição.7

Em trabalho realizado em 1997, no qual foram estudadas 7.511 crianças menores

de cinco anos, utilizando dados da Pesquisa Nacional de Saúde e Nutrição, Rissin

encontrou para o Brasil 21,8% de crianças classificadas abaixo do percentil 10 para o

índice peso/idade, 9,1% abaixo do percentil 3 (desnutrição moderada e grave). Ao se

utilizar como ponto de corte o percentil 10, o Nordeste apareceu como a região de maior

prevalência da desnutrição (33,3%), seguido da região Norte com 27,9%. Já em relação

ao índice altura/idade, 31,6% das crianças de todas as regiões foram classificadas abaixo

do percentil 10 do padrão NCHS, 18,6% abaixo do percentil 3 (nanismo grave).

Novamente as regiões Nordeste e Norte apresentaram os maiores índices de prevalência

de déficit estatural, 30,0% e 24,1%, respectivamente. A avaliação do índice peso/altura

evidenciou 7,4% de crianças abaixo do percentil 10, para o total do país, 3,0% abaixo

do percentil 3.10

Em Pernambuco foram encontradas 4,9% de crianças com desnutrição moderada,

ao se utilizar o ponto de corte abaixo de menos 2 desvios-padrão para a relação

peso/idade, enquanto que de acordo com os índices altura/idade e peso/altura , esta

prevalência foi de 12,1% e 1,8%, respectivamente, segundo dados da II Pesquisa

Estadual de Saúde e Nutrição, realizada em 1997.11 Já segundo pesquisa realizada em

relação à saúde materno-infantil no estado de Pernambuco, publicada em 2000, de 385

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crianças estudadas 13,8% estavam abaixo do percentil 10, havendo uma maior

prevalência no interior do estado (17,1%) que na Região Metropolitana do Recife

(11,2%).12

1.3. Desnutrição e desenvolvimento do encéfalo

A desnutrição afeta os diversos sistemas e órgãos levando a alteração de suas

funções. O principal mecanismo de adaptação é a redução do trabalho corporal em

todos os níveis de organização: órgãos, tecidos, células, organelas e sistemas

enzimáticos. Ocorre uma redução das reservas de tecido e da capacidade funcional, para

fazer face à menor disponibilidade energética.13

Acredita-se que na vida intra-uterina os efeitos da desnutrição energético-proteica

sobre o sistema nervoso central do feto sejam minimizados pelo ambiente materno:

crianças nascidas de mães desnutridas apresentam baixo peso e altura reduzida, porém o

crescimento do encéfalo é poupado.14 Os efeitos da desnutrição precoce, aquela que

ocorre nos primeiros anos de vida (ou em período equivalente se nos referimos a outros

mamíferos), têm sido objeto de uma grande quantidade de estudos. Embora o

crescimento do encéfalo seja menos afetado pela desnutrição que o crescimento do resto

do corpo, a proteção não é absoluta.15,16,17 Estudos realizados em crianças que

morreram com desnutrição grave constataram que o encéfalo apresentava um menor

peso e um menor conteúdo de DNA que o esperado para crianças eutróficas da mesma

faixa etária.18

Estudos experimentais, que em grande parte utilizaram ratos como modelos,

demonstraram que dentre as alterações estruturais resultantes dos efeitos da desnutrição

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precoce sobre o sistema nervoso central (SNC), destaca-se a redução volumétrica do

córtex cerebral. Estes estudos deixam pouca dúvida de que não há uma redução

significativa do número total de neurônios em decorrência da desnutrição, mas que

outras estruturas corticais são significativamente alteradas por ela. Dentre as alterações

que podem ocorrer no córtex destacamos a interrupção do desenvolvimento de células

piramidais, a diminuição nas dimensões de células corticais, a redução da densidade das

espinhas dendríticas e a diminuição da complexidade da ramificação dendrítica do

córtex e do número total de células gliais. Embora a densidade das sinapses corticais

não pareça ser afetada, o número total de sinapses do córtex visual é claramente

reduzido pela desnutrição.19 Por outro lado, estudos de ressonância magnética,

realizados em crianças desnutridas, evidenciaram uma redução do volume da substância

branca, proporcional à verificada no córtex.20,21,22

Além de um menor número de células, outros mecanismos devem estar

envolvidos na redução do volume do encéfalo que é vista na desnutrição precoce. Sabe-

se que parte desta redução é reversível, como demonstram estudos de imagem que

avaliaram o cérebro durante e após um período de desnutrição.20, 23, 24 Em artigo de

revisão em que são abordadas as anormalidades estruturais do encéfalo de adolescentes

com anorexia nervosa, Katzman et al. relatam que estes pacientes apresentam aumento

dos espaços liquóricos e redução do volume das substâncias branca e cinzenta. Segundo

estes autores, muitos processos fisiológicos que atuam nesta doença, incluindo

desidratação, redistribuição líquida, catabolismo protéico e desequilíbrios hormonais,

podem contribuir para as alterações verificadas à ressonância magnética nestes

pacientes. Há evidências que indicam que mesmo com hidratação e nível de proteínas

séricas normais, pode ocorrer uma redução no volume do encéfalo. Eles acreditam que

há uma razoável possibilidade de que fatores endócrinos, destacando dentre eles a

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elevação dos níveis de cortisol, contribuam sensivelmente para o aparecimento destas

alterações.25

Em humanos a proliferação das células do encéfalo ocorre em dois períodos

distintos como explica Waterlow, citando Dobbing: uma fase de crescimento acelerado

entre a décima e a vigésima semana de gestação, onde acontece a multiplicação de

células neuronais, seguida por uma fase de crescimento mais lento, que se estende ao

longo do terceiro trimestre de gestação e dos seis primeiros meses de vida, na qual

ocorre a multiplicação de células gliais.15 Segundo o conceito de períodos vulneráveis

de Dobbing, seria durante as fases de crescimento rápido e de diferenciação que o

encéfalo seria mais vulnerável aos danos associados à desnutrição. De acordo com esta

hipótese a desnutrição pós-natal exerceria seu efeito máximo, durante a segunda fase de

crescimento.15 Alternativamente, Morgane et al. defenderam que o período de máxima

vulnerabilidade da desnutrição precoce não ocorreria na fase de crescimento rápido e

sim quando ocorre a organização de neurônios específicos durante a ontogênese. De

acordo com esta visão mais recente, em ratos, o período pré-natal seria mais sujeito aos

efeitos danosos da desnutrição que o pós-natal. Como em todas controvérsias, a verdade

deve se encontrar em algum lugar entre os dois extremos, pois existem evidências de

que a desnutrição limitada ao período pré-natal é não só suficiente para produzir

alterações permanentes na estrutura encefálica mas também causa mudanças no

comportamento pelo menos tão poderosas quanto aquelas produzidas pela desnutrição

pós-natal.19

O processo de mielinização é um dos principais eventos da fase de

desenvolvimento tardio do sistema nervoso e a maior parte da deposição da mielina

ocorre, tanto em humanos como em ratos, no período pós-natal. As evidências de

diversos estudos experimentais indicam que a proporção de fibras mielinizadas está

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bastante reduzida em animais desnutridos. O que ainda não está claro é se isto é devido

a uma falha dos oligodendrócitos em iniciar a formação da mielina ou se estaria

relacionado a ausência de algum fator ligado aos axônios.19,26

Acreditou-se inicialmente que as modificações estruturais vistas na desnutrição

determinavam alterações duradouras na função cognitiva. Evidências mais recentes têm

demonstrado porém, que muitas das alterações observadas não são irreversíveis. A

única aberração neural cortical que não se recupera com a reabilitação alimentar é a

redução nos dendritos corticais nas espinhas sinápticas. Já as alterações em estruturas

não neurais, como por exemplo a redução da mielina encefálica, têm se mostrado

resistentes à reabilitação.19

1.4. Estrutura e funções da mielina

1.4.1. Estrutura

A bainha de mielina é formada por múltiplas camadas dispostas em espiral, que

envolvem os axônios. A avaliação com microscopia polarizada e difração radiográfica

demonstrou que estas camadas apresentam uma estrutura característica: proteína-lipídio-

proteína-lipídio-proteína.

Os lipídios são encontrados principalmente na membrana celular, em uma

camada bimolecular composta por cadeias hidrocarbonadas, colesterol, fosfolipídios e

galactolipídios. A relação entre colesterol, fosfolipídios e galactolipídios é de

aproximadamente 4:3:2 na mielina do sistema nervoso central de um adulto humano. Os

galactolipídios (compostos principalmente de cerebrosídios e de sulfatídios) e o

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colesterol encontram-se na camada externa da membrana, expostos ao meio extracelular

e contêm grupos funcionais que interagem fortemente com a água. Já os fosfolipídios,

dos quais o plasmalogênio rico em etanolamina é o mais abundante, são hidrofóbicos e

são encontrados exclusivamente no lado interno da membrana. Entre estas duas

camadas encontram-se as cadeias hidrocarbonadas, compostas principalmente por

ácidos graxos de cadeia longa.

A proteína proteolípide (PPL) e a proteína básica da mielina (PBM) constituem

50% e 35% respectivamente, do total de proteínas encontradas na mielina. A primeira

delas é composta por quatro hélices que cruzam a membrana lipídica atingindo o meio

extracelular onde estabelecem interações homofílicas com cadeias de moléculas de PPL

pertencentes a membranas celulares adjacentes. Esta interação aproxima as membranas

externas das espirais de mielina adjacentes. O acúmulo destas proteínas no meio

extracelular é visto no microscópio eletrônico como uma linha de densidade

intermediária, a chamada linha intraperiódica (intraperiod line). A PPL apresenta uma

isoforma (DM 20) com a mesma função estrutural que é encontrada em proporção

relativamente maior em fases mais precoces do desenvolvimento do encéfalo, enquanto

que a PPL torna-se mais abundante durante a diferenciação dos oligodendrócitos e a

mielinização. Também há evidências de que a PPL desempenha algum papel na

homeostase dos axônios.

A PBM é constituída por um grupo de isoformas que se localizam na face

citoplasmática da membrana da mielina e que devem ser os principais componentes da

linha densa principal (major dense line) identificada na microscopia eletrônica.

Acredita-se que a PBM participa da estabilização da mielina através de sua interação

com os fosfolipídios na superfície citoplasmática da membrana.

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Dentre as outras proteínas que participam da constituição da mielina merecem

ser mencionadas a 2’3’-nucleotídeo-cíclico 3’-fosfodiesterase (NCF), a glicoproteína

associada a mielina (GAM) e a glicoproteína mielina/oligodendrócito (GMO). A

primeira delas corresponde a 4% do total de proteínas da mielina, apresenta um alto

peso molecular e pode ser encontrada no citoplasma dos processos oligodendrogliais

componentes da bainha de mielina. Embora sua exata função não seja conhecida, ela

pode participar da formação ou estabilização do citoesqueleto de mielina bem como

atuar como um regulador dos eventos que culminam com o processo de mielinização.

A GAM (1% do total de proteínas da mielina) é uma imunoglobulina que pode

ser encontrada nas membranas gliais periaxonais e que participa do desenvolvimento da

bainha de mielina mediando as interações entre oligodendrócitos e axônios, que devem

ocorrer para que tenha início o processo de mielinização, não sendo porém encontrada

na bainha de mielina compacta (madura). Ela funcionaria ainda como suporte para

manter os folhetos de mielina imatura separados enquanto ocorre a formação das

proteínas estruturais principais, e teria algum papel na repressão ao crescimento dos

neuritos (axônios e dendritos).

A GMO (0,1% do peso total das proteínas da bainha de mielina) é uma imunoglobulina

cuja função não é conhecida e que pode ser encontrada na superfície externa das bainhas

de mielina.27,28

1.4.2. Funções

A bainha de mielina é formada pela membrana plasmática modificada de

extensões dos oligodendrócitos, que formam um envoltório espiralado em torno dos

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axônios. Um único oligodendrócito pode contribuir com mielina para até 50 axônios.

Cada bainha é composta de vários segmentos de mielina, separados por pequenos

intervalos onde os axônios estão expostos diretamente ao meio intersticial, os chamados

nódulos de Ranvier. Como o impulso elétrico não se propaga através da mielina, em

razão de sua alta resistência, ele se exterioriza através do próximo nódulo, onde ocorre a

despolarização da membrana celular. Por conta da baixa capacitância da bainha, a

membrana axonal situada entre os nódulos despolariza com pequeno dispêndio de

energia e com grande velocidade. A vantagem deste envoltório de mielina na

propagação do impulso nervoso pode ser estimada quando se compara o desempenho do

axônio gigante da lula (Loligo vulgaris), que não é mielinizado, e o axônio mielinizado

da rã. Ambos conduzem o impulso nervoso a uma velocidade de 25 m/s, porém o

primeiro requer 5000 vezes mais energia e ocupa um espaço 1500 vezes maior que o

segundo.

A mielina também participa de algumas outras funções que não estão

diretamente ligadas a otimização da condução nervosa. Acredita-se que ela colabora

com a formação do axônio, de forma que na sua ausência o citoesqueleto axonal não se

desenvolve corretamente. Sabe-se também que ela contém um grande número de

enzimas, sugerindo um papel ativo na síntese e processamento de seus próprios

componentes. Além disto a mielina e seus componentes podem participar da

neutralização (buffering) dos níveis iônicos nas proximidades dos axônios e ter algum

papel no transporte de materiais através das membranas celulares destes últimos.27,28

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1.5. Princípios de ressonância magnética

O núcleo de hidrogênio é constituído de um único próton, que apresenta carga

positiva e gira em torno do seu próprio eixo, produzindo um campo magnético em torno

de si.29 Pode-se dizer que por conta de suas características, estes prótons se comportam

como minúsculos magnetos.30 Apesar de outros núcleos (e.g., carbono, fósforo, sódio)

também serem magneticamente ativos, o do hidrogênio é que tem importância para a

obtenção das imagens de ressonância magnética (RM) utilizadas na prática clínica, por

ser o mais abundante no corpo humano, onde existe essencialmente nas moléculas de

água e gordura, e por possuir um campo magnético relativamente alto.29

As imagens de RM são baseadas na magnetização que é induzida no corpo

humano quando este é exposto a um potente campo magnético externo, como o

existente nos equipamentos de ressonância magnética.31 A força do campo magnético

dos equipamentos de ressonância magnética, utilizados para fins diagnósticos nos dias

atuais, varia de 0,2 a 3 Tesla (T), porém, os mais difundidos são os aparelhos de 1,5 T

(ou 15.000 Gauss). A título de comparação, o campo magnético da terra é de cerca de

0,5 Gauss.32

Uma vez que o corpo é posicionado no interior do aparelho, os prótons de

hidrogênio contidos nos tecidos passam a se alinhar preferencialmente ao longo do eixo

do cilindro magnético, descrevendo um movimento de precessão em torno deste eixo.29

Este movimento é semelhante ao que é observado quando um pião, que inicialmente se

encontrava girando sobre o seu próprio eixo, passa a oscilar antes de cair ao chão, por

influência da força de gravidade.30

A combinação dos campos magnéticos dos prótons de hidrogênio presentes em

nosso corpo resulta num campo magnético líquido (ou médio). A magnetização líquida

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alinhada ao longo do eixo longitudinal pode ser chamada de magnetização longitudinal.

Quando aplicamos um pulso de radiofreqüência (RF), transmitido por uma antena (coil)

de RF posicionada próximo à área a ser examinada, ocorre um deslocamento da

magnetização longitudinal para o plano transverso, gerando uma magnetização

transversa. Logo após o pulso, a magnetização longitudinal passa a ser zero, voltando a

crescer pouco tempo após a sua cessação. Este é o chamado relaxamento longitudinal ou

relaxamento T1. A velocidade com que a magnetização longitudinal volta a crescer é

diferente para os prótons associados com os diversos tecidos e é a fonte fundamental

para o contraste em imagens ponderadas em T1. T1 é definido como o tempo que leva

para que a magnetização longitudinal alcance 63% do seu valor final, após um pulso de

RF de 90o. T1 é um parâmetro que é característico de cada tecido e que também

depende da força do campo magnético principal. A substância branca tem um T1 curto e

relaxa rapidamente, enquanto que o líquor apresenta um T1 longo e relaxa lentamente.

Já a substância cinzenta tem um T1 intermediário e relaxa com uma velocidade

intermediária. As imagens obtidas com base neste tipo de contraste são ditas como

sendo ponderadas em T1. Nestas imagens a substância branca deve aparecer em tons

claros ou brilhantes (sinal hiperintenso ou com hipersinal), o líquor aparecerá em tons

mais escuros (sinal hipointenso ou hipossinal) e a substância cinzenta terá tons

intermediários de cinza (sinal intermediário).30

Durante o pulso de RF de 90º, quando acontece o deslocamento da

magnetização líquida para o plano transverso, ocorre uma sincronização no movimento

de precessão dos prótons, que passam a precessar juntos. Diz-se que os prótons estão

“em fase” durante este movimento de precessão sincrônico. Pouco tempo após o pulso,

porém, eles começam a sair de fase, o que resulta na perda da magnetização transversa

.30 O tempo de relaxamento T2 se refere à perda da magnetização transversa, resultante

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da saída de fase dos prótons. O mecanismo primário para esta perda é a troca de energia

entre os núcleos de hidrogênio.33

Nós podemos medir o montante de magnetização transversa com uma antena

(coil) de recepção. A medida da magnetização transversa, que é o sinal de ressonância

magnética, é máxima quando esta se encontra completamente “em fase”.30 Nas

aquisições de imagens o sinal é medido repetidamente (com um tempo de repetição

[TR]) em um determinado momento após a aplicação do pulso de RF (o chamado tempo

para o eco [TE]).32

Quando a magnetização transversa começa a sair de fase, o sinal medido começa

a cair até que a magnetização esteja completamente fora de fase, quando então o sinal é

zero. T2 é definido como o tempo que leva para que a magnetização transversa caia

para 37% do seu valor original. Os diversos tecidos têm diferentes valores de T2, pois

seus prótons saem de fase com velocidades diferentes. A substância branca tem um T2

curto e sai de fase rapidamente, o líquor tem um T2 longo e sai de fase lentamente,

enquanto que a substância cinzenta tem um T2 intermediário e sai de fase com uma

velocidade intermediária. As imagens obtidas com base neste tipo de contraste são ditas

como sendo ponderadas em T2. Nelas, o líquor apresenta-se brilhante (ou claro), a

substância branca se apresenta em tons escuros e a substância cinzenta em tons de cinza

intermediários.30

Os tempos de relaxamento T1 e T2 ocorrem simultaneamente. Após um pulso de

RF de 90º ocorre a perda de fase da magnetização transversa, ao mesmo tempo em que

a magnetização longitudinal volta a crescer paralela ao campo magnético principal.

Após alguns segundos, houve perda da maior parte da magnetização transversa e

recuperação da maior parte da magnetização longitudinal.30

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14

1.6. Métodos de imagem na avaliação do processo de maturação do

encéfalo

O encéfalo amadurece seguindo um padrão pré-determinado que se correlaciona

com as funções que o recém-nascido ou lactente adquire ao longo do processo de

desenvolvimento. Os métodos de imagem modernos permitem uma avaliação “in vivo”

de diversos aspectos da maturação do sistema nervoso central, incluindo o

desenvolvimento dos sulcos encefálicos e a mielinização, dentre outros.34

Embora através da ultra-sonografia (US) transfontanela, da tomografia

computadorizada (TC) e da ressonância magnética (RM) seja possível acompanhar as

alterações morfológicas grosseiras pelas quais passa o encéfalo em desenvolvimento, é

este último método, tendo em vista sua maior resolução de contraste, que permite uma

melhor avaliação das mudanças pelas quais passam as substâncias branca e cinzenta,

incluindo aquelas decorrentes do processo de mielinização.34,35

A mielinização do encéfalo começa durante o quinto mês de desenvolvimento

fetal, através dos nervos cranianos, e continua ao longo da vida.35Ela não é um

fenômeno do tipo tudo ou nada. Ao se iniciar a mielinização de uma estrutura, esta

contém apenas umas poucas e delgadas bainhas de mielina que vão aumentando em

número e espessura com a continuação do processo.36

É de amplo conhecimento que a ressonância magnética permite uma avaliação

do estágio de maturação do encéfalo da criança. Diversos de seus parâmetros sofrem

alteração à medida que o encéfalo se desenvolve de forma acelerada durante os dois

primeiros anos de vida, destacando dentre eles o encurtamento dos tempos de

relaxamento T1 e T2. Estas alterações são devidas em grande parte à mielinização e à

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diminuição do conteúdo hídrico. Logo após o nascimento, o encéfalo da criança

apresenta um padrão de intensidade de sinal que é o oposto do identificado em adultos,

ou seja as imagens ponderadas em T2 do recém-nascido parecem com as imagens

ponderadas em T1 dos adultos e vice-versa para as imagens ponderadas em T1, sendo

este aspecto identificado abaixo dos seis primeiros meses de vida. Entre os oito e doze

meses há uma má diferenciação entre substância branca e cinzenta. À medida que a

substância branca se mieliniza, passa de hipointensa a hiperintensa em relação a

substância cinzenta, nas imagens ponderadas em T1, e de hiperintensa a hipointensa em

relação a substância cinzenta, nas imagens ponderadas em T2,27 de tal forma que ao

final do primeiro ano existe uma clara diferenciação entre ambas, que apresentam

intensidade de sinal semelhante ao observado em adultos, destacando que a seqüência

temporal destas transformações reflete o curso da mielinização.28 O momento exato da

mudança do padrão infantil para o adulto varia de acordo com as diferentes regiões do

encéfalo e com a seqüência de ressonância utilizada. As imagens ponderadas em T1

adquirem o padrão adulto antes das ponderadas em T2 e são mais úteis na avaliação da

maturação da substância branca durante os seis primeiros meses. Já as imagens

ponderadas em T2 são mais sensíveis para acompanhar estas alterações entre os seis e

os 18 meses.

De uma forma geral pode-se dizer que o processo de mielinização se estende do

centro para a periferia, a substância branca profunda se mieliniza antes da subcortical;

de inferior para superior, o tronco se mieliniza antes dos hemisférios cerebrais e de

posterior para anterior, a substância branca occipital se mieliniza antes da frontal.35

Embora com variações entre os diversos estudos realizados, em função de diferentes

parâmetros utilizados, a mielinização se efetua de acordo com a seguinte seqüência

temporal: inicia-se na ponte e pedúnculos cerebelares (nascimento), prossegue no braço

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posterior da cápsula interna, radiações ópticas e esplênio do corpo caloso (1-3 meses),

então no braço anterior da cápsula interna e joelho do corpo caloso (6 meses) e por fim

na substância branca dos lobos frontal, parietal e occipital.32

1.7. Métodos de imagem na avaliação dos efeitos da desnutrição sobre

a mielinização do SNC

A literatura existente sobre este tema é reduzida. De acordo com o levantamento

bibliográfico realizado, poucos trabalhos utilizaram métodos de imagem para verificar

as alterações no encéfalo de crianças, associadas à desnutrição energético-

proteica.20,21,22,23,24 Nos estudos que utilizaram imagens de ressonância magnética não

foi constatado retardo significativo no processo de mielinização, ao contrário do que se

poderia esperar,20,21,24 embora nestes trabalhos não estejam bem especificados os

critérios utilizados para esta avaliação.

Dessa forma, como as situações de carência energético-protéica grave na

infância ainda são observadas com freqüência elevada entre nós, e a escassez de

publicações sobre o processo de mielinização nessas crianças, deixam dúvidas sobre a

existência ou não de retardo nesse processo, decidimos contribuir para um melhor

esclarecimento do tema, estudando as alterações da mielinização através do exame de

RM em crianças portadoras de formas graves de subnutrição.

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2. OBJETIVOS

2.1. Objetivo geral

Avaliar a mielinização do encéfalo através da ressonância magnética em crianças

com desnutrição grave.

2.2. Objetivos Específicos

Em crianças com desnutrição grave:

1) Descrever o padrão de mielinização encefálica através do exame de

ressonância magnética.

2) Descrever a ocorrência de alterações não relacionadas à mielinização nos

exames de ressonância magnética do encéfalo.

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3. MÉTODOS

3.1. Local do estudo

O estudo foi realizado no Instituto Materno-Infantil Prof. Fernando Figueira

(IMIP), situado na região metropolitana central do Recife, no estado de Pernambuco.

Como centro de referência do Sistema Único de Saúde (SUS) de PE, o número de

consultas no ambulatório de pediatria é de 22.380 pacientes/mês, o setor de Emergência

Pediátrica assiste uma média de 6.000 crianças/mês. A Unidade Hospitalar admite uma

média de 2.574 pacientes/mês, desses, 1.692 são pacientes pediátricos. O Serviço de

Imagem do IMIP realizou 5.957 estudos radiográficos convencionais, 1.791 ultra-sons e

434 tomografias computadorizadas a cada mês (nos 11 primeiros meses de 2005).

3.2. Desenho do estudo

Foi realizado um estudo de série de casos com o intuito de se descrever

alterações pouco estudadas na literatura.

3.3. População do estudo e amostragem

A população do estudo foi composta por crianças com idade de dois a 24 meses,

hospitalizadas no Hospital Geral de Pediatria do IMIP (HGP/IMIP), no período de

agosto de 2004 a abril de 2005, com desnutrição grave.

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Obteve-se uma amostra de conveniência, selecionando-se as crianças que

procuraram o HGP/IMIP e que preencheram os critérios de seleção. Embasado nos

dados da literatura pesquisada, estudamos o maior número da casuística encontrada, 20

pacientes.

3.4. Seleção de sujeitos

3.4.1. Critérios de inclusão

- Crianças com idade de um a 24 meses

- Desnutrição grave, segundo os critérios da OMS:37

-- Índice peso/altura < - 3 DP (< 70% mediana NCHS) = emagrecimento grave.

-- Índice altura/idade < - 3 DP (< 85% mediana NCHS) = nanismo nutricional.

-- Presença de edema simétrico envolvendo no mínimo os pés = desnutrição

edematosa.

- Hospitalizadas no IMIP depois de atendimento no serviço de emergência desta

instituição.

- Após o consentimento livre e esclarecido dos responsáveis (apêndice 1).

3.4.2. Critérios de exclusão

-Crianças que, embora tenham as características de ingresso na pesquisa, no

momento da admissão apresentem quadro clínico de doença em fase terminal

(doença em alto grau de gravidade cujo óbito é evento iminente: sepse com

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esclerema e sangramento digestivo alto, fibrose cística com insuficiência

respiratória, outras).

-Crianças com história de asfixia no nascimento (Apgar < 7), convulsões neonatais,

neoplasia, quimioterapia, retardo no desenvolvimento neuropsicomotor secundário a

outro agravo que não o carencial, paralisia cerebral ou qualquer anomalia congênita.

3.5. Definição de variáveis

3.5.1. Variáveis indicadoras das condições sociodemográficas:

Sexo = definida por duas categorias: masculino e feminino = Variável qualitativa

categórica nominal dicotômica

Idade = medida em meses completos = Variável quantitativa numérica contínua

Local de residência = referente ao local de origem (moradia) da criança estudada,

categorizadas como Zona da Mata, Agreste, Sertão e Região Metropolitana do Recife =

Variável qualitativa nominal policotômica

Tipo de habitação = categoria especificada pelo material de construção da residência,

como taipa/madeira, alvenaria e outros = Variável qualitativa nominal policotômica

Água encanada = correspondente a existência de sistema de encanação no domicilio,

categorizada como sim e não = Variável qualitativa nominal dicotômica

Recolhimento adequado de dejetos humanos = correspondente a existência de fossa

ou esgoto sanitário, categorizada como sim e não = Variável qualitativa nominal

dicotômica

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Lixo = especificada quanto ao recolhimento de lixo, categorizada como sim e não =

Variável qualitativa nominal dicotômica.

Número de habitantes por domicílio = especificada pelo número de habitantes que

moram no domicílio da criança estudada, categorizada pelo número total de habitantes

na residência = Variável quantitativa numérica discreta.

Renda per capita familiar = divisão da renda familiar total pelo número de habitantes

por domicílio, categorizada para análise de acordo com o salário mínimo vigente como

< 1/4 SM e > 1/4 SM = Variável quantitativa numérica contínua.

3.5.2. Variáveis indicadoras das características maternas:

Idade = medida em anos completos, categorizada pela idade em anos completos da mãe

da criança = Variável quantitativa numérica contínua.

Paridade = referente ao número de filhos paridos, categorizada como 1 a 2 filhos, 2 a 4

filhos, 4 a 6 filhos e > 6 filhos = Variável quantitativa numérica discreta

Escolaridade = correspondente à série máxima estudada, na qual obteve aprovação. As

categorias são: Ensino fundamental, médio e superior (completo ou incompleto) =

Variável qualitativa categórica ordinal.

Ocupação da genitora = referente ao tipo de trabalho da genitora do sujeito do estudo,

categorizada como: trabalha no lar e trabalha fora de casa (citar a atividade) = Variável

qualitativa categórica nominal.

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22

3.5.3. Variáveis indicadoras do perfil biológico e clínico:

Aleitamento materno: período que a criança recebeu leite materno sendo este

exclusivo ou não, categorizada para análise como nunca mamou, < 03 meses e > 03

meses = Variável numérica contínua.

Peso ao nascer: avaliado em gramas. Informação baseada no resumo da alta da

maternidade ou na informação da mãe ou responsável, categorizada para análise como <

2500 g e > 2500 g = Variável numérica contínua.

Mielinização do encéfalo: Foram utilizados os critérios sugeridos por Barkovich et al.

para avaliar o desenvolvimento normal da mielinização em crianças nos 2 primeiros

anos de vida. Estes autores relacionaram as idades em que devem ocorrer as alterações

de sinal associadas à mielinização de 12 regiões anatômicas do encéfalo, em imagens de

ressonância magnética ponderadas em T1 e em T2 (quadro 1).35 A partir da verificação

das estruturas que apresentam sinais de mielinização, podemos estimar uma idade de

mielinização equivalente. Barkovich destaca que estes marcos (milestones) se aplicam a

crianças nascidas a termo (40 semanas gestacionais), e que ajustes têm que ser feitos

para a avaliação de crianças prematuras. O ajuste (correção) é feito através da subtração

da idade cronológica do número de meses que restavam para o termo. Por exemplo, uma

criança nascida com 28 semanas de idade gestacional (3 meses antes da data prevista) e

examinada aos 9 meses de idade deve ter alcançado os marcos correspondentes aos de

uma criança de 6 meses de idade (idade cronológica menos o número de meses que

faltavam para o termo).28

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Quadro 1. Alterações na mielinização por faixa etária *

Região anatômica Imagens ponderadas em T1

Imagens ponderadas em T2

Pedúnculo cerebelar médio Nascimento Nascimento-2 meses Subs.branca cerebelar Nascimento-4 meses 3-5 meses Braço posterior da cápsula interna Porção anterior

Primeiro mês

4-7 meses

Braço posterior da cápsula interna Porção posterior

Nascimento

Nascimento-2 meses

Braço anterior da cápsula interna

2-3 meses

7-11 meses

Joelho do corpo caloso 4-6 meses 5-8 meses Esplênio do corpo caloso 3-4 meses 4-6 meses Substância branca occipital Central

3-5 meses

9-14 meses

Substância branca occipital Periférica

4-7 meses

11-15 meses

Substância branca frontal Central

3-6 meses

11-16 meses

Substância branca frontal Periférica

7-11 meses

14-18 meses

Centro semioval 2-4 meses 7-11 meses

*Reproduzido de Barkovich AJ, Kjos BO, Jackson DE Jr, Norman D. Normal maturation of the neonatal brain: MR imaging at 1.5T. Radiology. 1988; 166: 173-180.

Quanto menor o intervalo de idade que pudermos definir com os nossos

critérios, maior a sensibilidade do método para a detecção de eventuais alterações no

processo de mielinização. Por esta razão adicionamos aos critérios descritos por

Barkovich et al., que delimitam alguns intervalos bastante amplos, um parâmetro

definido por van der Knaap e Valk, que sem entrar em contradição com os marcos

expostos no quadro 1, permite identificar com praticidade o estágio de mielinização

compatível com o intervalo de 7 a 9 meses de idade. Van der Knaap e Valk sugeriram

um método de avaliação da mielinização durante o primeiro ano de vida, utilizando

imagens ponderadas em T1, densidade de prótons e T2. Baseados nas alterações,

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associadas com o processo de mielinização, que podem ser identificadas na intensidade

de sinal relativa das substâncias branca e cinzenta eles definiram 5 estágios de

desenvolvimento. Segundo estes autores, entre os 7 e 9 meses de idade (estágio IV), a

análise de imagens ponderadas em T2 evidencia as substâncias branca e cinzenta da

região occipital com uma intensidade de sinal intermediária e indistinta, que não

permite a sua individualização. Aproximadamente aos 9 meses começa a emergir o

contraste encontrado nos cérebros adultos, no qual a substância branca apresenta-se

hipointensa em relação à cinzenta.36,38

Utilizando os critérios descritos acima, foi avaliada a idade de mielinização

equivalente das crianças, que após comparação com a sua idade cronológica (corrigida

em caso de prematuridade) foi categorizada como: adequada, idade de mielinização =

idade cronológica (corrigida); retardada, idade de mielinização < idade cronológica

(corrigida) e acelerada, idade de mielinização > idade cronológica (corrigida) = variável

qualitativa categórica ordinal.

Diminuição volumétrica do encéfalo, presumível atrofia: de acordo com a avaliação

visual da proeminência dos espaços subaracnóides e da dilatação do sistema

ventricular, em exame de ressonância magnética, categorizada para análise como:

ausente, leve, moderada e acentuada = variável qualitativa categórica ordinal.

3.6. Fluxograma

Foi realizada uma amostragem por conveniência, com seleção dos pacientes por

auxiliar de pesquisa à medida que estes foram admitidos na enfermaria “E” do 4o andar

do HGP, que abriga os pacientes acompanhados no protocolo de atendimento à criança

com desnutrição grave.

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As crianças foram transportadas em veículo automotor, em companhia da mãe

(ou responsável), de um auxiliar de enfermagem e do médico responsável pela pesquisa,

para um Hospital situado a cerca de 2 km do IMIP (Hospital Memorial São José) onde

foram submetidas a uma avaliação por Ressonância Magnética do encéfalo.

Após a realização do exame as imagens obtidas foram avaliadas pelo médico

pesquisador.

FLUXOGRAMA

Realização da RM no serviço de imagem do Hospital Memorial

São José

ENFERMARIA ‘’E’’ 4o HGP Identificação da criança com os critérios de entrada pelo pesquisador ou auxiliar de pesquisa e obtido o Consentimento livre e esclarecido

Imagens de RM avaliadas pelo pesquisador

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26

3.7. Procedimentos, técnicas e exames:

As crianças foram pesadas em balança, específica para uso da pesquisa, da

marca Filizola, modelo BP-baby, número 6767/100, com capacidade máxima de 15 kg e

capacidade mínima de 125g e com sensibilidade de 5g,

O comprimento foi aferido através de um antropômetro de 130 cm, com a

criança relaxada, sem sapatos, deitada em posição supina paralela ao eixo axial do

antropômetro, com a cabeça posicionada na linha média e tocando a borda superior da

régua. Os pés em flexão de 90º com a perna e tocando o limite inferior da régua,

anotando-se os valores fracionários com aproximação de 0,1cm.

A presença de edema foi avaliada pelo exame físico na inspeção e pela formação

do cacifo à palpação, pelo menos no dorso dos pés.

Para avaliação da mielinização encefálica foi realizado um estudo de ressonância

magnética sendo os pacientes previamente sedados com hidrato de cloral administrado

por via oral numa dose de 50 mg/kg. Esta, por sua eficácia e segurança, é considerada a

droga de escolha para sedação de lactentes com até 18 meses de idade, podendo ser

usada com sucesso em crianças de até quatro anos.39,40 Além disto há grande

experiência no IMIP com a sua utilização, inclusive em pacientes desnutridos, nos quais

é administrada rotineiramente para a realização de ecocardiograma e

eletroencefalograma.

O exame de Ressonância magnética foi realizado em um aparelho de 1,5 T

(Intera; Philips Medical Systems, Best, The Netherlands) com uma freqüência de

ressonância de 63,8 mHz, utilizando uma antena (coil) apenas de recepção, apropriada

para a cabeça, do tipo quadratura, com 25 cm de diâmetro. Utilizamos os parâmetros de

aquisição indicados por Barkovich et al.: as imagens foram adquiridas com o uso de

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matrizes 192x256 com um campo de visão (field of view) de até 20 cm, com uma

excitação. Foram realizados cortes com 5 mm de espessura com um intervalo (gap) de 1

mm em seqüências spin-echo (SE) com um tempo de repetição (TR) de 600 msec e um

tempo de eco (TE) de 20-25 msec para as seqüências com ponderação em T1 e um TR

de 2500 msec e um TE de 70 msec para as seqüências com ponderação em T2.34 O

exame constou de três seqüências: axial T1, axial T2 e sagital T1, cada uma delas com

duração aproximada de cinco minutos.

As imagens obtidas foram avaliadas pelo médico pesquisador que, utilizando os

parâmetros descritos anteriormente, estimou a idade de mielinização equivalente das

crianças (em meses), de acordo com o padrão de mielinização observado.

3.8. Procedimentos para acompanhamento dos sujeitos

O acompanhamento dos sujeitos seguiu as normas preconizadas pela Instituição,

não havendo interferência sobre o seu tratamento ou outras condutas necessárias para a

sua recuperação.

3.9. Instrumento para coleta de dados

Para coleta dos dados foi elaborado um formulário padronizado (apêndice 2),

construído a partir das variáveis do estudo a fim de possibilitar atingir os objetivos

propostos.

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28

3.10. Coleta de dados

O formulário foi aplicado pelo pesquisador após analisar a inclusão da criança

no estudo e a assinatura do consentimento livre e esclarecido pelo responsável legal.

A realização da RM no local previamente estabelecido foi agendada com

antecedência. O exame foi realizado num período de até 16 dias desde a admissão.

Todos os formulários foram revisados pelo pesquisador.

3.11. Processamento e análise de dados

A partir do levantamento das informações nos formulários pré-codificados, foi

construído um banco de dados com dupla entrada, no software EPI-INFO versão 6.0.

Foi verificada a distribuição de freqüência das variáveis estudadas,

apresentando-as em forma de tabelas.

3.12. Aspectos éticos

Esta pesquisa foi aprovada previamente pelo Comitê de Ética e Pesquisa em

Seres Humanos do Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira, de acordo com as

Normas da Resolução 196/96 CONEP/CNS.

As crianças foram incluídas no estudo após o consentimento livre e esclarecido

dos pais ou responsáveis legais pela criança.

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29

4. RESULTADOS:

Foram estudadas 20 crianças com idade entre 2 e 24 meses, sendo 10 meninos, todos

com desnutrição grave, dos quais 4 apresentavam nanismo nutricional, 5 tinham

desnutrição edematosa e 11 emagrecimento severo. Cinco destas crianças apresentaram

baixo peso ao nascer, enquanto que duas delas nunca foram amamentadas e 9 mamaram

apenas até os 3 meses de idade.

Na tabela 1 estão apresentadas as principais características sócio-demográficas

das crianças estudadas. Nela pode se verificar que quase 2/3 das crianças (65%)

residiam no interior do Estado de Pernambuco, com 60,0% das residências sem

abastecimento de água e 45% sem saneamento básico, enquanto que 70,0% pertenciam

a famílias com renda per capita mensal inferior a um quarto do salário mínimo.

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Tabela 1. Distribuição de freqüência de crianças com desnutrição grave de 2 a 24 meses

hospitalizadas no IMIP e submetidas a avaliação da mielinização do encéfalo através de

ressonância magnética, de acordo com as características sócio-demográficas. Recife,

2004 -2005.

Condições sociodemográficas n %

Local da residência

RMR 7 35

Zona Mata 7 35

Agreste 4 20

Sertão 2 10

Outros

Tipo de habitação

Taipa 5 25

Alvenaria 15 75

Outros

Água encanada

Sim 8 40

Não 12 60

Fossa ou esgoto

Sim 11 55

Não 9 45

Recolhimento de lixo

Sim 10 50

Não 10 50

Renda per capita

< ¼ SM 14 70

≥ ¼ SM 6 30

Fonte: Pesquisa IMIP

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31

Na tabela 2, onde estão apresentadas as características maternas dos pacientes avaliados,

podemos observar que a maior parte das mães eram multíparas e apresentavam baixa

escolaridade, não tendo finalizado o Ensino Fundamental.

Tabela 2. Distribuição de freqüência de crianças com desnutrição grave de 2 a 24 meses

hospitalizadas no IMIP e submetidas a avaliação da mielinização do encéfalo através de

ressonância magnética, de acordo com as características maternas. Recife, 2004 -2005.

Características maternas n %

Idade (anos)

< 19

19 a 30

≥ 30

2

10

8

10

50

40

Paridade

1 a 4 filhos

≥ 4 filhos

9

11

45

55

Escolaridade*

< 8 anos

≥ 8 anos

16

2

80

10

Ocupação

Do lar

Trabalho fora de casa

17

3

85

15

Fonte: Pesquisa IMIP *A diferença em relação ao número total de crianças estudadas corresponde a ausência de informação.

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32

Os exames de ressonância magnética foram realizados entre 3 e 16 dias após a

internação dos pacientes. Em relação à avaliação da mielinização pode se verificar que

onze crianças apresentavam achados compatíveis com o esperado para as suas faixas

etárias, duas apresentavam sinais de retardo e as demais (7) exibiam sinais de

mielinização em algumas estruturas nas quais o processo só deveria ter início em idades

mais avançadas, ou seja evidenciavam uma aceleração do processo.

As duas crianças em que se constatou retardo do processo de mielinização eram

do sexo masculino e apresentavam nanismo nutricional. Uma delas, nascida a termo,

tinha 6 meses à época do exame, que foi realizado 16 dias após a sua internação. Em sua

avaliação, utilizando imagens ponderadas em T1, encontramos aumento da intensidade

de sinal no esplênio do corpo caloso e na substância branca occipital central, o que deve

ocorrer a partir dos 3 meses de idade, porém não detectamos sinais de mielinização no

joelho do corpo caloso nem na substância branca frontal central, onde a mielina deve ser

encontrada até os 6 meses de idade, e tampouco encontramos hipossinal em T2 no

esplênio do corpo caloso, o que já deveria ocorrer nesta idade.

A outra criança foi prematura e segundo informações colhidas com a genitora

apresentava entre 32 e 36 semanas no momento do parto, por conta disto corrigimos a

sua idade, que era de aproximadamente 14 meses na ocasião do exame, e passamos a

considerá-lo como tendo pelo menos 12 meses. Seu exame, realizado cerca de 3 dias

após sua admissão, evidenciou, nas imagens ponderadas em T2, sinais de mielina na

substância branca occipital central, onde a mesma pode ser identificada normalmente a

partir dos 9 meses, porém não na substância branca occipital periférica, onde deve ser

identificada entre 11 e 15 meses. Além disso, ainda utilizando imagens ponderadas em

T2, observamos que a substância branca periférica e a substância cinzenta da região

occipital apresentavam intensidade de sinal intermediária, dificultando a sua distinção,

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33

aspecto normalmente encontrado aos 7-9 meses. Diante do descrito, estimamos a sua

mielinização como semelhante à esperada para uma criança normal com 9 meses de

idade, atrasada portanto cerca de 3 meses em relação a sua idade cronológica corrigida.

Em quatro das crianças nas quais foram identificadas estruturas mielinizadas

antes do esperado, a diferença entre a idade estimada e a idade cronológica foi de

apenas 1 mês. Duas delas apresentavam 13 meses de idade e já exibiam sinais de

mielinização na substância branca frontal periférica, em imagens ponderadas em T2, o

que só é esperado a partir dos 14 meses. Ainda utilizando imagens com TR longo,

identificamos hipossinal no braço anterior da cápsula interna (7-11 meses) em uma

criança de 6 meses, bem como nas substâncias branca occipital periférica e frontal

central (11-15 e 11-16 meses, respectivamente) em um paciente com 10 meses de idade.

Nos três restantes a diferença entre a idade estimada através da avaliação da

mielinização pela ressonância magnética e a idade cronológica foi de cerca de 2 meses.

Todos eles tinham coincidentemente 5 meses de idade e já exibiam tênues sinais de

mielinização tanto no braço anterior da cápsula interna quanto no centro branco semi-

oval (eventos esperados aos 7-11 meses em imagens obtidas na ponderação T2).

Além da avaliação da mielinização os exames realizados evidenciaram

diminuição volumétrica difusa do encéfalo de grau variável, presumível atrofia, em 17

das 20 crianças. Em dois pacientes esta alteração era bastante acentuada, destacando que

um deles correspondia a uma das duas crianças onde foram observados sinais de retardo

no processo de mielinização.

Entre as outras alterações observadas identificamos um caso de trombose de

seios durais (sagital superior e transverso direito), um de hematoma subdural crônico

bilateral e outro em que foi identificada uma pequena lesão expansiva comprometendo o

couro cabeludo, na região parietal direita. Os dois primeiros destes pacientes

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34

apresentavam sinais de aceleração da mielinização, enquanto que no terceiro esta nos

pareceu adequada à idade cronológica. Todos eles apresentavam diminuição

volumétrica do encéfalo, que era acentuada no paciente em que foram identificados os

hematomas subdurais.

A tabela 3 resume os achados da avaliação por ressonância magnética do

encéfalo dos pacientes estudados.

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35

Tabela 3. Distribuição dos achados de Ressonância Magnética na avaliação do encéfalo

de crianças com desnutrição grave de 1 a 24 meses hospitalizadas no IMIP. Recife,

2004 – 2005.

Caso Idade Corrigida (meses)

Sexo Forma de Desnutrição

Grave

Mielinização Diminuição Volumétrica

Difusa‡

Outros Achados

1 5* F N N Acelerada Moderada S O A S

2 8* F D E Adequada Moderada S O A S

3 5* M E S Acelerada Leve S O A S

4 6* M N N Retardada Leve S O A S

5 6* F E S Acelerada Moderada S O A S

6 15* F E S Adequada Leve Tumoração de Partes

Moles 7 11* M E S Adequada Ausente S O A S

8 2* F E S Adequada Ausente S O A S

9 13* M E S Acelerada Leve S O A S

10 15* M E S Adequada Leve S O A S

11 10** M D E Acelerada Acentuada Hematoma Subdural

12 9* F E S Adequada Leve S O A S

13 5* M D E Acelerada Moderada Trombose de Seios Durais

14 24* F E S Adequada Leve S O A S

15 13* F D E Acelerada Ausente S O A S

16 13** F E S Adequada Leve S O A S

17 17*** M E S Adequada Leve S O A S

18 3** M D E Adequada Leve S O A S

19 9** F N N Adequada Moderada S O A S

20 12*** M N N Retardada Acentuada S O A S

Fonte: Pesquisa IMIP

‡ Presumível atrofia. * Pacientes nascidos a termo: idade corrigida = idade cronológica. ** Pacientes sem informação confiável sobre a idade gestacional no momento do parto: consideramos a idade cronológica em lugar da idade corrigida. *** Pacientes com história de prematuridade referida pela mãe, com parto ocorrido entre 32 e 36 semanas de gestação: a idade corrigida é dois meses menor que a cronológica. NN:

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36

nanismo nutricional. D E: desnutrição edematosa. E S: emagrecimento severo. S O A S: sem outras alterações significativas. 5. DISCUSSÃO:

A desnutrição DEP permanece como uma das principais causas de morbidade e

mortalidade nas crianças dos países em desenvolvimento. No Brasil, apesar de sua

prevalência ter diminuído nas últimas décadas, o percentual de desnutrição grave a nível

hospitalar, especialmente nas regiões Norte e Nordeste, permanece elevado e ainda com

índices de mortalidade muito acima dos valores recomendados pela OMS.41 A DEP é

uma afecção de natureza social, pois as suas raízes encontram-se na pobreza, e clínica,

devido a atingir indiferentemente, todos os órgãos da criança, o que a torna mais

vulnerável aos agravos psíquicos e biológicos, especialmente os infecciosos. Estes

agravos, por sua vez, contribuem para a manutenção e deterioração da situação

nutricional, ocasionando a morte ou levando a um estado carencial crônico com

seqüelas que perduram por toda a vida, muitas delas irreparáveis.42

A casuística estudada apresentava características sócio-econômicas que

permitiam classificar a sua grave situação nutricional como de origem primária, ou seja,

a fome em primeira instância. Nenhuma das crianças apresentava doenças identificáveis

nas avaliações clínicas ou laboratoriais que fossem causas de desnutrição secundária.

Setenta por cento das famílias sobreviviam com uma renda “per capita” diária inferior a

um dólar americano, condição catalogada pelo Banco Mundial como de miséria. No

estado de Pernambuco, os indicadores econômicos apontam que 53,86% da população

vivem em situação econômica semelhante.43 Em torno da metade das crianças

estudadas habitavam residências sem água encanada, fossa ou esgoto e coleta de lixo.

Todas essas variáveis estão associadas com baixas condições de saúde.44

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37

Quanto às características biológicas observamos que o estudo incluiu crianças

dentro do grupo etário em que ocorre uma maior velocidade de crescimento do sistema

nervoso central (SNC), portanto, portadoras de maior vulnerabilidade aos agravos bio-

psico-sociais. Verificamos ainda que 25% da casuística apresentavam sinais de

desnutrição intra-útero, isto é, baixo peso ao nascer. Uma nutrição adequada durante a

gestação e nos primeiros 3 anos de vida é essencial para o desenvolvimento cerebral,

uma vez que praticamente todo o seu processo de crescimento se realiza nessa faixa

etária.

Observamos ainda, baixa escolaridade em 80% das mães e um grande número de

multíparas, condições de risco para a saúde na infância.45 O analfabetismo é um

problema crítico para a saúde e a economia das populações. As pessoas analfabetas

reportam maiores problemas de saúde, apresentam uma menor compreensão sobre o seu

estado de saúde e apresentam maior risco de hospitalização.46

O exame não invasivo de RM abriu novas perspectivas para o estudo do

desenvolvimento do cérebro humano. Até então muito do conhecimento era obtido de

estudos experimentais e de achados de necrópsias. Nas últimas décadas ocorreram

progressos significativos no delineamento morfológico do cérebro do nascimento à

adolescência. Entretanto, vários aspectos dos efeitos da nutrição sobre o cérebro em

desenvolvimento, como a mielinização, são pouco conhecidos. Possivelmente, uma das

principais razões para esse desconhecimento é o baixo impacto que representa o

problema da subnutrição para os países desenvolvidos, habitualmente, detentores de

melhores condições para a realização de pesquisas nessas áreas, geralmente de custos

elevados pelo envolvimento de recursos tecnológicos complexos, como no caso dos

equipamentos usados nos exames de RM, que representam limitações cruciais para o

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38

andamento de pesquisas nos países em desenvolvimento, onde a subnutrição é

endêmica.

O cérebro humano sofre um processo de crescimento e maturação rápidos

durante os 2 primeiros anos de vida. O amadurecimento do encéfalo está associado a

uma diminuição dos tempos de relaxamento T1 e T2, que se acredita que seja devida em

grande parte à ocorrência da mielinização.27 Antes dos 6 meses de idade o cérebro

apresenta um padrão de intensidade de sinal à ressonância magnética (padrão infantil),

que é o reverso do que é visto nos adultos, ou seja: nas imagens ponderadas em T1 a

substância branca se apresenta hipointensa em relação à substância cinzenta, enquanto

que o oposto é observado nas imagens ponderadas em T2. Entre os 8 e os 12 meses de

idade temos o padrão isointenso, no qual não há uma boa diferenciação entre as

substâncias branca e cinzenta, que é seguido por sua vez pelo padrão adulto jovem, que

é visto após os 12 meses, e no qual a substância branca é hiperintensa em relação à

cinzenta nas imagens ponderadas em T1 e hipointensa nas imagens ponderadas em T2.32

A mielinização cerebral surge no pedúnculo cerebral por volta da 24a semana

gestacional. Esse processo progride da 25a a 28a semana gestacional dentro da linha do

lemnisco medial alcançando o mesencéfalo. A mielinização aparece no pedúnculo

cerebelar superior na 32a semana de gestação. No final da gravidez, a mielinização se

torna evidente dentro da parte dorsal do pedúnculo cerebral e se inicia nas olivas e no

pedúnculo cerebelar. A mielina aparece ao redor do núcleo denteado, dentro da

substância branca dos hemisférios cerebelares e no vérmix por volta da 38a semana

gestacional.

Através de estudos por RM em crianças normais, sabe-se hoje que o processo de

mielinização encontra-se estabelecido no recém-nascido a termo na ponte e pedúnculos

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39

cerebrais. Entre 1 e 3 meses, a mielinização encontra-se definida no braço posterior da

cápsula interna, na radiação óptica e no esplênio do corpo caloso. Aos 6 meses atinge o

braço anterior da cápsula interna e o joelho do corpo caloso e, entre 8 a 12 meses pode

ser vista na substância branca dos lobos frontais, parietais e occipitais.32

Na pesquisa bibliográfica realizada através da LILACS, MEDLINE e SCIELO,

encontramos apenas três (3) referências à utilização de exames de ressonância

magnética para a avaliação do encéfalo de crianças com desnutrição protéico-calórica.

Nenhum destes trabalhos teve como objetivo principal o estudo da mielinização,

embora esta seja avaliada de alguma forma por todos eles. Em artigo de revisão Udani

menciona a presença de mielinização deficiente da substância branca periventricular e

subcortical,22 embora não mencione com que metodologia a mielinização foi avaliada.

Gunston et al. estudaram 12 crianças com kwashiorkor, apresentando idades variando

entre 6 e 37 meses, tendo como objetivo documentar e definir as anormalidades

anatômicas no encéfalo destes pacientes através do uso da RM. Estes autores, embora

sem detalhar a metodologia utilizada, aparentemente utilizando os critérios apontados

por Bird, uma vez que este é citado nas referências bibliográficas, relataram que a

mielinização se encontrava adequada para a faixa etária.20 Por fim Odabas et al.

estudaram 20 crianças com idade variando entre 3 e 36 meses (13 com desnutrição

grave e 7 com desnutrição moderada). Em apenas uma das crianças estudadas, que

apresentava 3 meses de idade e desnutrição grave, foi identificado retardo na

mielinização, porém não foram indicados os critérios adotados para esta avaliação.21

Em nosso estudo avaliamos 20 crianças com idade variando entre 2 e 24 meses.

Propositadamente limitamos a idade máxima a 2 anos pois é quando praticamente toda a

substância branca apresenta sinais de mielinização à ressonância magnética anatômica,

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40

tanto nas imagens ponderadas em T1 quanto em T2, embora saibamos que o processo

prossiga de forma menos acelerada por praticamente toda a vida.28

Utilizamos, como já mencionado anteriormente, os critérios descritos por

Barkovich et al. e van der Knaap e Valk, baseados no uso de marcos (milestones) em

que o progresso da mielinização é determinado pela alteração da intensidade de sinal,

que permite inferir o aparecimento da mielina, em determinadas estruturas do encéfalo.

35,36,38 Também realizamos os exames em um aparelho com a mesma potência de campo

(1,5 T) que o utilizado por Barkovich e colaboradores e utilizamos os parâmetros

prescritos por eles para a obtenção das imagens. Van der Knaap e Valk alertam que a

avaliação da mielinização é realizada de forma indireta através de sinais que permitem

inferir a presença da mielina nas imagens ponderadas em T1 e em T2, sendo dependente

das seqüências de pulso e da potência de campo utilizadas.38

Os critérios adotados são possivelmente os mais utilizados em nosso meio,

embora não tenhamos dados objetivos para confirmar esta suposição. Contribuem para

isto a razoável disponibilidade de equipamentos de ressonância magnética e de

programas de computador (softwares) que permitem a obtenção das imagens necessárias

para realizar a avaliação, bem como a boa difusão dos trabalhos destes autores, que são

reconhecidos como grandes estudiosos do tema.

Diversos outros autores, no entanto, defendem métodos alternativos para estudar

a mielinização do encéfalo de lactentes, utilizando a ressonância magnética. Alguns

dentre estes, tais como Bird et al. e Staudt et al., propuseram outras abordagens para a

avaliação qualitativa deste processo, ainda que fazendo uso de imagens convencionais

ponderadas em T1 e em T2.47,48,49 Outros trabalhos têm sido publicados demonstrando a

eficiência de outras técnicas, tais como a transferência de magnetização e as imagens

dos tensores de difusão (diffusion tensor imaging), na avaliação da mielinização.28,50,51

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41

Apesar de serem bastante promissoras e de permitirem inclusive uma avaliação

quantitativa da mielinização, ainda há muito que desenvolver antes que as mesmas

sejam incorporadas à prática clínica com esta finalidade, em especial em nosso meio,

onde o acesso a elas ainda é limitado a poucos centros de diagnóstico por imagem.

Portanto, mesmo admitindo que existam métodos mais sensíveis e mais

fidedignos para avaliar a mielinização do encéfalo, decidimos pelos critérios adotados

em função de não termos nenhuma dificuldade de ordem técnica que pudesse limitar ou

impossibilitar o seu uso e por já estarmos habituados a utilizá-los em nossa prática

diária pois, como afirma o próprio Barkovich “é provável que o uso consistente de um

sistema de avaliação seja mais importante que o sistema em si”.28

Devemos alertar para a possibilidade de um viés nos resultados obtidos, pelo

fato das imagens de ressonância magnética terem sido avaliadas pelo próprio médico

pesquisador , que tinha conhecimento prévio da idade dos sujeitos do estudo. Embora

destacando que tenhamos procurado realizar as avaliações com isenção, não é possível

excluir esta possibilidade.

Também devemos ressaltar que a interpretação dos resultados, de acordo com os

critérios adotados, não é isenta de algum grau de subjetividade. Por vezes tivemos

dificuldade em determinar se havia uma tênue alteração de sinal que nos permitisse

considerar a presença de mielina em uma determinada estrutura. Isso é de importância,

pois um erro de avaliação deste tipo pode implicar em diferenças na avaliação da “idade

de mielinização” equivalente. Nos casos em que tivemos dúvidas, comparamos nossos

exames com as imagens fornecidas por Barkovich a título de exemplo do aspecto

normal do encéfalo em diversas idades durante os dois primeiros anos de vida.34

Acreditamos que isso nos permitiu definir a idade de mielinização com maior

segurança.

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42

O conteúdo de mielina do SNC sofre variações normais entre os diversos

indivíduos. Royland et al. admitem variações individuais no conteúdo de mielina

encefálica, tanto em ratos como em humanos; verificaram que em ratos moderadamente

desnutridos, o desenvolvimento da mielina era próximo a um nível máximo em certos

animais, enquanto que alguns ratos adequadamente nutridos, apresentavam

relativamente pouca mielina. Além disso, também ocorre importante variação na

velocidade em que o processo de mielinização progride.52 Van der Knaap e Valk

alertam para a importância de se observar que os tempos mencionados para

mielinização dos diferentes tratos e estruturas do encéfalo, são apenas generalizações e

aproximações.38 Em primeiro lugar existe um grau considerável de variação individual.

Além disso, é difícil conceituar com exatidão o que corresponde ao início da

mielinização. A princípio, pode ser definido como o primeiro tubo de mielina

encontrado ao exame de microscopia óptica. Também pode ser definido como o

aparecimento da primeira lamela de mielina pelo exame ultra-estrutural ou como a

primeira evidência da presença dos constituintes da mielina em investigações

imunológicas. Em função do exposto, o período em que se pode detectar o início da

mielinização de uma determinada estrutura pode ser bastante amplo, o que diminui a

sensibilidade do método adotado para a detecção de eventuais atrasos na mielinização.

Exemplificando, a substâncias brancas frontais, central e a periférica, podem apresentar

as primeiras evidências da presença de mielina, em imagens ponderadas em T2, entre 11

e 16 meses de idade e entre 14 e 18 meses, respectivamente. Se uma criança demonstra

sinais de mielina na substância branca central, mas não na periférica, podemos apenas

estimar que ela apresenta uma idade mínima de mielinização de 11 meses e que ainda

não completou 18 meses de idade.

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43

A heterogeneidade da amostra utilizada no que se refere ao tempo de exposição

ao déficit nutricional certamente tem influência sobre os resultados obtidos. Não é

difícil de imaginar que se a carência alimentar tem algum efeito negativo sobre a síntese

e deposição da mielina no encéfalo, esta deve ser proporcional ao tempo de exposição a

este agravo. Esta variável, entretanto, é de difícil controle em estudos com humanos,

pois a história nutricional do paciente, antes da hospitalização, não pode ser tão

detalhada, tanto em termos quantitativos como qualitativos, como em estudos

experimentais.53 Em nossa amostra, encontramos crianças com quadros de desnutrição

de instalação mais crônica, nanismo nutricional, mas também pacientes cujo insulto

nutricional foi mais agudo, emagrecimento grave. Infelizmente, o número de nossa

casuística não permitiu uma comparação dos achados de imagem com o tipo de

desnutrição. Na literatura consultada, também não encontramos estudos que tivessem

realizado essa análise. Como é nossa pretensão darmos continuidade ao presente

estudo, acreditamos que brevemente teremos condições de responder a esse

questionamento.

Outra possível fonte de confusão pode advir da análise qualitativa da dieta dos

pacientes estudados. Deficiências específicas de determinados nutrientes podem exercer

influência sobre a progressão da deposição da mielina no SNC. Em animais de

laboratório, a deficiência de alguns ácidos graxos de origem exógena, durante a fase

rápida de desenvolvimento do SNC, leva a redução na quantidade e concentração da

mielina. Diminuição da vitamina B6 no encéfalo acarreta redução nas concentrações de

mielina, assim como a deficiência de pantotenato.26 SegundoLovblad et al. existe uma

associação entre deficiência de vitamina B12 no homem e desmielinização, usualmente

na medula espinhal. Estes autores relatam o caso de uma criança com deficiência deste

nutriente, em cuja avaliação por ressonância magnética identificou-se retardo no

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44

processo de mielinização.54 Deficiência de folato produz uma redução no peso corpóreo

e massa encefálica, semelhante à decorrente da desnutrição. Também a recuperação da

mielina em ratos com deficiência de folato, é comparável a de ratos desnutridos.

Acredita-se que a deficiência de vitamina A também afete a mielinização.26 A

deficiência de ferro nas fases iniciais da vida está associada com hipomielinização,

embora o papel desempenhado pelo ferro na mielinogênese ainda não esteja bem

estabelecido.55

Em alguns dos casos avaliados obtivemos dados contraditórios no que se refere à

avaliação da mielinização. Em um deles havia áreas com hipossinal em T2, indicativo

da presença de mielina, na substância branca occipital periférica e na substância branca

frontal central, aspecto esperado aos 11-15 e 11-16 meses de idade respectivamente.

Entretanto, este hipossinal não era bem evidente nos braços anteriores das cápsulas

internas, alteração esperada para os 7-11 meses de idade. Uma possível explicação para

este achado pode ser decorrente de uma maior carência nutricional em alguma fase do

processo relacionado à deposição da mielina nestas últimas regiões. Em casos como este

optamos sempre por realizar a estimativa pelo parâmetro que fornecesse a idade mais

avançada.

Em 7 dos pacientes de nossa série, detectamos sinais de aparente aceleração do

processo de mielinização. É possível que algumas condições estejam associadas a uma

aceleração da mielinogênese. Blaker et al. sugerem que em ratos a desnutrição de leve

intensidade, estimula a síntese de mielina.53 Entretanto, Royland et al. não detectaram

sinais de hipermielinização em estudos experimentais com ratos submetidos a diversos

graus de desnutrição, e sim de retardo do processo de mielinização.52 Van der Knaap e

Valk mencionam a associação entre a síndrome de Sturge-Weber e hipermielinização,38

mas nenhum dos pacientes do nosso estudo apresentava sinais desta doença. Tendo em

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45

vista que a variação máxima encontrada entre a idade estimada e a idade cronológica

nestes pacientes foi de apenas 2 meses, sendo apenas de 1 mês em 4 deles, não podemos

afastar a possibilidade de que esta diferença seja decorrente de um erro de avaliação ou

de uma variação da normalidade.

Em nosso estudo identificamos atraso da mielinização em apenas dois dos 20

pacientes da série. Estes resultados são semelhantes aos apontados por Gunston et al. 20

e Odabas et al.,21 e parecem indicar que a desnutrição não promove uma desaceleração

importante no processo de mielinização em humanos, detectável pela ressonância

magnética. Esta conclusão, porém, está em desacordo com o que até hoje tem sido

estabelecido na literatura com base em estudos realizados com animais, bem como em

alguns estudos indiretos sobre os efeitos da desnutrição precoce em humanos, que

indicariam uma redução relativa na síntese e acúmulo da bainha de mielina.26

Caso a ressonância magnética não fosse um método adequado para a avaliação

da mielinização do SNC, teríamos uma possível explicação para este aparente paradoxo.

No entanto, diversos trabalhos demonstraram que a RM se presta para esse fim,

havendo uma boa correlação entre os estudos de ressonância magnética e os estudos

histológicos, com a ressalva de que no primeiro a mielinização é detectada algumas

semanas após a sua real ocorrência, pois é necessário uma concentração mínima de

mielina para que haja uma alteração na intensidade de sinal do parênquima encefálico.38

Por outro lado, poderia se questionar se o nível de desnutrição dos pacientes de

nossa série teria sido suficiente para determinar um atraso detectável na mielinização.

Entretanto, todos os pacientes de nossa casuística apresentavam quadros de desnutrição

grave. Além disso, em estudo no qual avaliaram a mielinização de ratos submetidos a

diferentes graus de desnutrição, ou seja, no qual a desnutrição foi utilizada como uma

variável, Royland et al. chegaram à conclusão de que em relação a mielinização do

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46

encéfalo, o único efeito demonstrável da desnutrição em qualquer intensidade é o de

retardar este processo.52

Outras hipóteses podem ser formuladas na tentativa de justificar os nossos

resultados. Podemos supor que o método utilizado seja sensível apenas para a detecção

de grandes retardos no processo de mielinização, tendo portanto um valor limitado para

as finalidades do estudo. Alternativamente pode-se especular que a desnutrição não seja

capaz de determinar alteração no processo de mielinização dos humanos, a não ser em

casos extremos. Esta última hipótese nos parece menos provável tendo em vista os

resultados encontrados em estudos prévios que sugerem a redução da concentração da

mielina, tanto no sistema nervoso central quanto no periférico, em crianças

desnutridas.53

Porém, independente da sensibilidade da RM para a detecção de atrasos na

mielinização e da resistência do encéfalo humano aos efeitos da desnutrição, uma das

principais razões para os nossos resultados, e de outros autores que utilizando a

ressonância magnética não encontraram retardo significativo no processo de

mielinização de crianças desnutridas, talvez seja decorrente da forma como

interpretamos o que vem a ser retardo. O nosso critério para determinar retardo na

mielinização foi a constatação de sinais que sugerissem a presença de mielina em

determinadas estruturas do encéfalo, dentro de uma faixa etária estipulada como normal

para o seu aparecimento. Sendo assim, simplesmente apontamos a presença ou não da

mielina nos locais previamente estabelecidos, sem efetuar nenhuma avaliação

quantitativa. Por outro lado sabemos que ao se iniciar a mielinização de uma estrutura,

esta contém apenas umas poucas e delgadas bainhas de mielina que vão aumentando em

número e espessura com a continuação do processo.36 Logo, o fato de haver mielina em

uma estrutura não significa que este processo esteja finalizado. Exemplificando: se

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utilizando imagens de ressonância magnética, identificamos a presença de mielina no

joelho do corpo caloso em uma criança subnutrida de 6 meses de idade, não podemos

afirmar com total segurança que não haja um retardo no processo de mielinização;

apesar da mielina se encontrar presente nesta região, não significa que ela esteja

presente em quantidade e concentração adequadas.

A maior parte dos trabalhos realizados com a finalidade de avaliar os efeitos da

desnutrição sobre o processo de mielinização, tanto em animais como em humanos, não

estimou se o processo de mielinização estava transcorrendo de forma adequada pela

identificação da presença de mielina em determinadas regiões do cérebro, de acordo

com a faixa etária. Nos estudos em animais, a mielinização foi avaliada através da

recuperação da mielina do encéfalo, pela estimativa da sua síntese a partir das taxas de

utilização de isótopos durante a produção de proteínas e lipídeos componentes da

mielina, e através de análises histológicas. Em humanos, antes da utilização da RM,

foram realizados estudos que demonstraram uma redução da recuperação e

concentração de componentes da mielina no encéfalo de crianças desnutridas. Outros

estudos atribuíram a redução na velocidade de condução de nervos periféricos a um

processo de mielinização anormal. Estudos realizados em animais, ratos em sua grande

maioria, indicam uma redução na relação entre fibras mielinizadas e não mielinizadas,

tanto no corpo caloso como no trato piramidal, uma leve redução no número de lamelas

de mielina por axônio, uma acentuada diminuição na recuperação da mielina do

encéfalo e na incorporação de precursores em lipídeos e proteínas mielínicas

purificadas.26 Peeling e Smart citam diversos autores cujos estudos sugerem que a

composição e a distribuição (deployment) da mielina presente no SNC de animais

desnutridos é normal em boa parte dos casos, porém há um déficit acentuado na

proporção de axônios onde o processo de mielinização teve início. Ou seja, muitos

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axônios não adquirem a bainha de mielina na idade adequada, porém não há evidência

de um baixo ritmo de deposição de mielina naqueles em que este processo foi

iniciado.16

O que nossos resultados, assim como os de Gunston et al.20 e Odabas et al.21,

parecem indicar é que não há evidências suficientemente claras para sugerir que a

desnutrição retarde o processo de mielinização, desde que se entenda retardo apenas

como o aparecimento da mielina em uma determinada região do encéfalo após a idade

em que este é observado na maior parte das crianças normais. Portanto, mesmo

admitindo que a RM seja capaz de detectar satisfatoriamente a presença da mielina no

encéfalo, o critério utilizado pode não ter sido o mais apropriado ou o mais sensível para

avaliar a presença de retardo em um sentido mais amplo. Isto porque, se admitirmos que

a proporção de fibras mielinizadas em uma determinada região do encéfalo, apesar de

reduzida em relação ao normal, permite a detecção desta substância pela RM,

poderemos ter classificado como sendo adequada uma mielinização que tenha se

processado de forma deficiente.

Apesar do exposto, acreditamos que a ressonância magnética, por ser um método

seguro, não invasivo e sensível às mudanças que ocorrem no SNC em decorrência da

deposição da mielina, pode ter um papel importante na avaliação dos efeitos da

desnutrição sobre o processo de mielinização em humanos. O que precisa ser mais bem

definido é a técnica ou método mais apropriado a serem empregados. Acreditamos que a

técnica que utilizamos, que permite apenas indicar a presença ou não de mielina em

determinadas regiões do encéfalo, pode ser melhorada através da realização de trabalhos

com uma casuística maior e que incluam crianças normais da mesma faixa etária, de

forma a possibilitar uma análise visual comparativa mais confiável. Também seria

interessante tentar minimizar, na medida do possível, os efeitos de variáveis que podem

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introduzir alguma confusão na análise dos resultados, tais como a presença de carências

nutricionais específicas ou o tempo de exposição à desnutrição.

Nossos resultados, entretanto, podem simplesmente indicar uma capacidade

limitada da RM na detecção das alterações produzidas pela desnutrição sobre o processo

de mielinização encefálica. Sendo assim, novas abordagens técnicas devem ser testadas

na tentativa de se obter maiores informações. Uma alternativa poderia ser a utilização de

métodos em que o progresso da mielinização é avaliado através do cálculo da relação

entre a intensidade de sinal médio de uma determinada região de interesse e a

intensidade de sinal médio de uma região plenamente mielinizada, como o braço

posterior da cápsula interna, região que apresenta mielinização completa com 44

semanas de idade gestacional.38 Entretanto, tais métodos também não nos parecem os

mais apropriados para a avaliação de crianças desnutridas, uma vez que em tais casos

não teríamos como determinar se a estrutura escolhida para servir como parâmetro de

mielinização completa, também não teria sido afetada pela desnutrição.

Métodos que permitam quantificar a mielina, em todo o encéfalo ou em regiões

específicas, podem ser mais promissores, pois talvez sejam capazes de demonstrar uma

redução no volume ou concentração da mielina onde a avaliação qualitativa não foi

capaz de detectar anormalidades. Esta quantificação pode ser feita utilizando diferentes

técnicas como, por exemplo, através de medidas do T1 e do T2, do coeficiente de

difusão aparente, da anisotropia relativa das estruturas encefálicas (anisotropia

fracional) ou através da estimativa da proporção de transferência de magnetização.28,38

O que precisa ser demonstrado é se estas técnicas podem ser efetivamente úteis na

medida do déficit de mielina no encéfalo de crianças desnutridas e qual delas seria a

mais adequada para este fim.

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Concluímos que o processo de mielinização do encéfalo nos dois primeiros anos

de vida em crianças com desnutrição grave, quando avaliado através de análise

qualitativa de imagens de RM, não parece ter a sua evolução retardada de forma

importante pelos agravos nutricionais. Como o tema, apesar de sua relevância, em

especial para os países em desenvolvimento, ainda é pouco explorado como bem

demonstra a escassez de estudos sobre a mielinização do encéfalo de crianças

subnutridas, principalmente através de exames de imagem, novos estudos, com técnicas

mais apropriadas e casuísticas maiores, devem ser realizados com a finalidade de

comprovar esses resultados.

Além da avaliação da mielinização o exame de ressonância magnética permitiu

detectar a presença de redução global do volume do encéfalo em 85% dos pacientes

avaliados. Esta redução, variando de leve a acentuada, caracterizava-se pela dilatação do

sistema ventricular e pela proeminência dos espaços subaracnóides, afetando

igualmente as substâncias branca e cinzenta.. Isto não constituiu surpresa, pois diversos

estudos prévios, que utilizaram ressonância magnética e tomografia computadorizada,

têm relatado a associação entre desnutrição em crianças e uma diminuição do volume

do encéfalo.

Gunston et al relataram redução do volume do encéfalo, com diminuição

proporcional das substâncias branca e cinzenta, em 12 crianças com idades entre 6 e 37

meses que foram admitidas no hospital para tratamento de kwashiorkor.20 Mais

recentemente Odabas et al encontraram sinais de atrofia em avaliações de RM em 15 de

20 (75%) crianças com desnutrição energético-proteica moderada a grave.21

Akinynka et al usando tomografia computadorizada relataram diminuição do

volume do encéfalo em 10 de 14 (71.4%) casos de kwashiorkor, em 11 de 12 (91.7%)

casos de kwashiorkor-marasmático e em 6 de 14 (42.9%) casos de marasmo. Ainda

segundo estes autores, dilatação ventricular foi demonstrada em 57,1% dos casos de

marasmo, 71,4% dos casos de kwashiorkor e em 91,7% dos pacientes com kwashiorkor-

marasmático.24 Também utilizando tomografia computadorizada, Househam encontrou

atrofia cerebral em 12 crianças com kwashiorkor, com idades variando entre 1 e 4 anos.

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Embora não tenhamos realizado exames de controle após o tratamento da

desnutrição,o que representa uma limitação deste estudo, trabalhos de outros autores

têm demonstrado que a diminuição do volume do encéfalo, associada à desnutrição em

crianças, é em grande parte reversível. Gunston et al relataram que as alterações

encefálicas desapareceram ou diminuíram substancialmente, 90 dias após o início do

tratamento de crianças com kwashiorkor.20 Househam também demonstrou que a atrofia

cerebral vista na TC de crianças com Kwashiorkor, desapareceu após a reabilitação

nutricional.23 Apenas 10 dos pacientes avaliados por Akynynka et al retornaram para

controle, dois meses após a reabilitaçãonutricional. Em nenhum destes foram

identificadas alterações morfológicas residuais na avaliação por tomografia

computadorizada.24

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5. CONCLUSÕES:

A análise qualitativa de imagens de ressonância magnética do encéfalo de

lactentes com desnutrição grave revelou retardo no processo de mielinização em apenas

10% dos casos. Por outro lado, foi identificada diminuição difusa do volume encefálico,

presumível atrofia, em 85% dos exames realizados. Estes achados são semelhantes aos

de outros estudos que utilizaram este método diagnóstico para avaliação dos efeitos da

desnutrição sobre o encéfalo de crianças nos primeiros anos de vida.

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APÊNDICE 1

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO I. Dados de identificação do sujeito da pesquisa ou responsável legal Nome do paciente: Sexo:

Data de nascimento: Endereço: Telefone:

Responsável legal: Natureza (grau de parentesco, tutor, curador, etc.): Documento de identidade: Sexo: Data do nascimento: Endereço: Telefone:

II. Informações sobre a pesquisa Título da pesquisa: “Mielinização do encéfalo e desenvolvimento neuropsicomotor em crianças desnutridas hospitalizadas no IMIP: série de casos” Pesquisador: Médico Radiologista Adriano Nassri Hazin

Cargo/função: Radiologista do Serviço de Imagem do IMIP, aluna do Mestrado Materno Infantil do IMIP Inscrição conselho regional: 14.248 Endereço: Av. Bernardo Vieira de Melo, 1400, ap. 701, Piedade, Jaboatão dos Guararapes Telefones: 34686739 / 91223300

Pesquisa a ser realizada no Instituto Materno Infantil de Pernambuco – IMIP, sobre “Mielinização do encéfalo e desenvolvimento neuropsicomotor em crianças desnutridas”. Este estudo trata de investigar o desenvolvimento do cérebro em crianças com desnutrição grave hospitalizadas no IMIP. É importante um melhor conhecimento do problema pela sua gravidade e pelo pouco conhecimento que se tem sobre o desenvolvimento cerebral nestas crianças. O período da pesquisa se dará entre setembro de 2004 e maio de 2005, durante o qual será realizada a avaliação do desenvolvimento neuropsicomotor, que deve ocorrer no próprio IMIP e que consiste de avaliação clínica por médico neurologista.

Após esta avaliação, não necessariamente no mesmo dia, será realizada a ressonância magnética do encéfalo, na qual será investigado o desenvolvimento do cérebro. Este exame é praticamente inofensivo, não se conhecendo danos importantes que o mesmo possa trazer aos pacientes que a ele são submetidos. O estudo será realizado em outro hospital localizado a cerca de dois km do IMIP, sendo o transporte até lá feito em ambulância, permanecendo a criança todo o tempo na companhia de auxiliar de enfermagem.

Para permitir que o exame seja realizado com sucesso o paciente deve permanecer em repouso durante toda duração do mesmo, estimada entre 15 a 30 minutos. Para alcançar este objetivo utilizaremos um sedativo administrado “pela boca”: o hidrato de cloral. Esta medicação tem um risco mínimo para o paciente, não tendo efeitos colaterais significativos, sendo usado de rotina no IMIP em crianças que não tem idade suficiente para colaborar e que são submetidas a outros exames em que se

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necessita que as mesmas permaneçam tranqüilas e sem se movimentar durante a sua realização, tais como ecocardiograma e tomografia computadorizada.

Após o exame a criança será conduzida de volta ao IMIP, novamente em ambulância e com acompanhamento de auxiliar de enfermagem.

III. Consentimento da participação do investigado: Eu _________________________________________________, responsável legal pelo menor _______________________________________________, paciente matriculado no IMIP, registro ___________________________, declaro que fui devidamente informado pela pesquisadora _____________________________________, sobre a finalidade da pesquisa “Mielinização do encéfalo e desenvolvimento neuropsicomotor em crianças desnutridas hospitalizadas no IMIP: série de casos” e estou perfeitamente consciente de que: 1. Concordei em participar sem que recebesse nenhuma pressão; 2. Continuarei sendo atendida no IMIP e dispondo de toda a atenção devida na

pediatria do IMIP, independente da minha participação na pesquisa; 3. Tenho a garantia de receber resposta a qualquer pergunta ou esclarecimento a

qualquer dúvida acerca dos procedimentos, riscos, benefícios e outros relacionados com a pesquisa;

4. Estou ciente que estou participando de um estudo de observação, não havendo qualquer interferência na conduta médica adotada;

5. Estou segura de que não serei identificada e que será mantido caráter confidencial da informação relacionada com a minha privacidade;

6. Poderei retirar o meu consentimento a qualquer momento e deixar de participar do estudo sem que isso traga prejuízo à continuação do tratamento da criança.

Recife, ____________ de ________________ de 2004 ________________________________________________ Assinatura dos pais ou responsável legal ________________________________________________ Assinatura do pesquisador _______________________________________________ Testemunha

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APÊNDICE 2 FORMULÁRIO PARA COLETA DE DADOS

MIELINIZAÇÃO DO ENCÉFALO EM CRIANÇAS COM DESNUTRIÇÃO GRAVE Pesquisador_________________________ Nome da criança______________________________________________________ Data da coleta _____/_____/_____ Enfermaria: 1) Formulário No. 2) Registro: 3) Data do nascimento: ____/_____/_____ 4)Idade gestacional no momento do parto (se prematuro especificar idade em semanas)

1. A termo 2. Prematuro ___________ 5) Data da admissão: ____/_____/_____ 6) Data do início do protocolo: ____/_____/_____ 7) Sexo:

1. Masculino 2. Feminino

8) Idade: (meses) 9) Peso ao nascer (colocar o valor ao lado de cada resposta):

1. < 1000 g 2. 1000 g a 1500 g 3. 1500 g a 3000 g 4. > 3000 g 9. Sem informação

10) Peso: (kg) , 11) Comprimento/Altura: (cm) 12) Indicador nutricional: ________ 14) Idade da mãe: (anos) 15)Escolaridade da mãe: (colocar os anos de escolaridade ao lado de cada resposta)

1. Ensino fundamental completo 2. Ensino fundamental incompleto 3. Ensino médio completo 4. Ensino médio incompleto 5. Ensino superior completo 6. Ensino superior incompleto 7. Nenhuma 9. Sem informação

16) Paridade da mãe: (colocar o número de filhos ao lado de cada resposta) 1. 1 a 2 filhos 2. 2 a 4 filhos 3. 4 a 6 filhos 4. ≥ 6 filhos 9. Sem informação

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17) Ocupação da mãe: 1. Trabalha no lar 2. Trabalha fora de casa:________________________(citar a atividade) 9. Sem informação

18) Local da residência: 1. Zona da Mata 2. Agreste 3. Sertão 4. Região Metropolitana do Recife 9. Sem informação Nome da cidade:_____________________

19) Tipo de habitação: 1. Taipa/madeira 2. Alvenaria 3. Outros: ______________________ 9. Sem informação

20) Água encanada no domicílio: 1. Sim 2. Não 9. Sem informação

21) Recolhimento adequado de dejetos humanos (fossa séptica/esgotamento sanitário): 1. Sim 2. Não 9. Sem informação

22)Recolhimento do lixo: 1. Sim 2. Não 9. Sem informação

23) Número de habitantes por domicílio: 24) Renda per capita familiar: (colocar o valor ao lado de cada resposta)

1. < 1 SM 2. 1 a 2 SM 3. 2 a 3 SM 4. > 3 SM 9. Sem informação

25) Aleitamento materno 1. < 01 mês 2. > 01 a 03 meses 3. > 03 a 06 meses 4. > 06 meses 5. Nunca mamou 9. Sem informação

Achados da RM: presença de mielina 26) Pedúnculo cerebelar médio

1. T1 2. T2

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27) Substância branca cerebelar 1. T1 2. T2

28) Braço posterior da cápsula interna – Porção anterior 1. T1 2. T2

29) Braço posterior da cápsula interna – Porção posterior 1. T1 2. T2

30) Braço anterior da cápsula interna 1. T1 2. T2

31) Joelho do corpo caloso 1. T1 2. T2

32) Esplênio do corpo caloso 1. T1 2. T2

33) Substância branca occipital central 1. T1 2. T2

34) Substância branca occipital periférica 1. T1 2. T2

35) Substância branca frontal central 1. T1 2. T2

36) Substância branca frontal periférica 1. T1 2. T2

37) Centro semioval 1. T1 2. T2

38) Substância branca occipital em T2 1. Hipointensa em relação ao córtex 2. Isointensa em relação ao córtex 3. Hiperintensa em relação ao cortex

39) Estimativa da idade segundo o padrão de mielinização (meses): ___________ 40) Mielinização global do encéfalo

1. Mielinização adequada para a idade cronológica 2. Mielinização retardada em relação à idade cronológica

3. Mielinização adiantada em relação à idade cronológica 41) Atrofia 1. Ausente 2. Leve 3. Moderada 4. Acentuada

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42) Outras alterações 1. Ausentes 2. Presentes: _______________