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852 A MULHER ADULTA UNIVERSITARIA: perspectiva de uma nova profissão Mirian Paludetto 1 - Uni-FACEF Patrícia S.M.F. Espírito Santo 2 - Uni-FACEF Introdução Atualmente, em relação a um passado não muito distante, vivemos um considerável aumento de expectativa de vida do ser humano que, paralelamente às melhores condições físicas e materiais oferecidas, põe em relevo a necessidade de reflexões sobre o significado maior que este prolongamento de vida oferece para as pessoas e como vivê-lo. Neste contexto surge também um interesse referente à condição da mulher, que vivencia transformações profundas nas características de funções e papéis socialmente desempenhados: se joga como numa busca para viver um novo período de maneira mais profunda, mais plena, no preenchimento desse tempo a mais. Esse artigo, decorrente do trabalho de conclusão de curso intitulado - O aumento da longevidade e o significado de uma nova formação universitária para mulheres adultas - relata o trabalho feito sobre uma das alternativas da mulher adulta: ingressar na universidade após vivencias das mais diferentes percorridas até então. Revisão de literatura. O estudo, sob a ótica da Fenomenologia, constituiu-se de referenciais teóricos e pesquisas existentes a respeito de envelhecimento, longevidade, sentido de vida, conhecimento. Com respeito ao envelhecimento, longevidade e o sentido da vida foram levados em conta estudos e teorias sobre os ciclos da vida de Erickson, Levinson e Gold (revistos por BEE; MITCHELL,1986) com os períodos significativos que o ser humano passa ao longo de sua trajetória. Esses estudiosos, no entanto, embora pioneiros na consideração dos ciclos do desenvolvimento da vida adulta, apresentam poucas especificidades após os quarenta anos de vida das pessoas. 1 Mirian Paludetto Oliveira, psicóloga formada pelo Centro Universitário de Franca Uni-FACEF 2 Patrícia do Socorro Magalhães Franco do Espírito Santo, psicóloga clínica/docente do Uni-FACEF

Mirian Paludetto, Patrícia S.M.F

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A MULHER ADULTA UNIVERSITARIA: perspectiva de uma nova

profissão    

Mirian Paludetto1 - Uni-FACEF Patrícia S.M.F. Espírito Santo2 - Uni-FACEF 

    Introdução   Atualmente, em relação a um passado não muito distante, vivemos um

considerável aumento de expectativa de vida do ser humano que, paralelamente às

melhores condições físicas e materiais oferecidas, põe em relevo a necessidade de

reflexões sobre o significado maior que este prolongamento de vida oferece para as

pessoas e como vivê-lo.

Neste contexto surge também um interesse referente à condição da mulher, que

vivencia transformações profundas nas características de funções e papéis socialmente

desempenhados: se joga como numa busca para viver um novo período de maneira mais

profunda, mais plena, no preenchimento desse tempo a mais.

Esse artigo, decorrente do trabalho de conclusão de curso intitulado - O aumento

da longevidade e o significado de uma nova formação universitária para mulheres adultas

- relata o trabalho feito sobre uma das alternativas da mulher adulta: ingressar na

universidade após vivencias das mais diferentes percorridas até então.

Revisão de literatura.

O estudo, sob a ótica da Fenomenologia, constituiu-se de referenciais teóricos e

pesquisas existentes a respeito de envelhecimento, longevidade, sentido de vida,

conhecimento. Com respeito ao envelhecimento, longevidade e o sentido da vida foram

levados em conta estudos e teorias sobre os ciclos da vida de Erickson, Levinson e Gold

(revistos por BEE; MITCHELL,1986) com os períodos significativos que o ser humano

passa ao longo de sua trajetória. Esses estudiosos, no entanto, embora pioneiros na

consideração dos ciclos do desenvolvimento da vida adulta, apresentam poucas

especificidades após os quarenta anos de vida das pessoas.

1 Mirian Paludetto Oliveira, psicóloga formada pelo Centro Universitário de Franca Uni-FACEF 2 Patrícia do Socorro Magalhães Franco do Espírito Santo, psicóloga clínica/docente do Uni-FACEF

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Sabemos que o tempo de vida do ser humano é indeterminado e a realidade de

hoje apresenta um homem com mais anos de vida, inserido das mais diferentes formas na

nossa sociedade. Maffioletti (2005) postula um “envelhecimento sem velhice”, e que o

saber envelhecer repousa em parâmetros diferentes: o social e o cultural. Novais (1995,

apud VITOLA, 2004) salienta que o entender o envelhecimento exige uma capacidade de

sentir e de se envolver no prazer com seus interesses pessoais e dos outros.

A sociedade foi se transformando, a tecnologia surgindo e se aperfeiçoando e,

paralelamente, as expectativas de vida acompanhando seus movimentos, oferecendo

mais possibilidades a esse “jovem velho”.

A mulher adulta ainda tem a seu favor uma longevidade maior do que a do homem.

E a sociedade, por outro lado, inicia um "abrir portas", mesmo com dificuldade e

diferenciação, para a entrada da mulher no domínio publico, sem deixar de querer a

atuação no domínio privado.

Canoas (1997) mostra muita força, rapidez e perspicácia da mulher como centro da

família e das exigências de hoje pela sociedade e por ela mesma. O mundo mudou, a

família contemporânea mudou. Cada elemento dessa constituição procura seus objetivos,

seus interesses, seus caminhos. É Novaes (1995, apud VITOLA, 2004, p.180) quem diz

“que é preciso viver o aqui e agora projetado num futuro, quando um presente é bem

vivido, há experiência de um futuro valioso”.

A mulher se insere nesse projeto... Projeto atual de vida contemporânea, vindo de

um caminho trilhado de avanços e conquistas gradativas.

O desenvolvimento tecnológico e cientifico vem trazendo cada vez mais

complexidade ao mundo do trabalho, da relação e da competitividade, onde há uma

exigência cada vez maior de conhecimento, encontrado no ensino sistematizado que é

ministrado nas universidades.

E a mulher adulta contemporânea, que para lá que se dirige, procura

conhecimentos... mas conhecimento como busca de sentido ligado a uma nova profissão.

No que diz respeito às concepções do sujeito sobre si mesmo, é preciso saber que

o conhecimento é construído a partir da relação do sujeito com os objetos, das relações

interindividuais e das relações mais amplas do sujeito com o mundo.Todo individuo tem

sua identidade própria, mas também é produto do desenvolvimento da vida na Terra. A

sociedade atual esta se constituindo em uma sociedade da informação, em uma

sociedade do conhecimento, uma sociedade da aprendizagem que requer uma nova

leitura do mundo.

É nesse contexto de mundo que a mulher adulta universitária se coloca e pode

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vivenciar o aprender como processo contínuo “onde o ser humano deve ser o sujeito ativo

na construção do conhecimento” (BELLUZZO, 2004, p.150).

Balbinotti (2003) afirma que o adulto maduro que se propõe a novas escolhas

profissionais e que necessita novamente exercitar o auto-conhecimento, a informação, o

aprimoramento das habilidades deixadas muitas vezes adormecidas. É a oportunidade de

novas escolhas... de novas possibilidades...

Canoas (1997) diz que fazer cursos, voltar às universidades, deixou de ser

extensão e vê um maior número de mulheres da meia idade nas universidades no futuro.

E continua, afirmando que ser estudante na vida adulta é renascer para a juventude

intelectual, para a independência, para a realização e confirma o estudo como qualidade

de vida.

 

 Metodologia   Durante a pesquisa, a questão principal do trabalho foi: qual é o significado pessoal

desse estudo universitário para as mulheres adultas nele inseridas? Esta questão

principal nos levou a uma “atitude processual de investigação diante do desconhecido e

dos limites que a natureza e a sociedade impõem.” (DEMO, 2001, p.160).

O trabalho caracterizou-se por uma pesquisa de natureza qualitativa,

proeminentemente exploratória, com alguns aspectos descritivos. O desenvolvimento do

método foi norteado pelas perspectivas da Fenomenologia, buscando compreender o

sentido das atividades de estudo universitário para mulheres adultas que a elas se

dedicam.

Conforme Martins e Bicudo (2005, p.94), na perspectiva fenomenológica, “todas as

formas de objetividade implicam um relacionamento entre pesquisador e sujeito, portanto

foi possível exercer exigências objetivas sobre os significados. O sujeito é tido como um

atribuidor de significados e não um repetidor de idéias mecanicamente adquiridas.” E

ainda assinalam que, quanto ao método, a “forma mais adequada para tratar-se com

significados é procurar descobrir a realidade investigada tal como experienciada pelo

sujeito, a qual é exposta nas suas descrições”.

Para este trabalho, as colaboradoras foram cinco mulheres adultas com idade a

partir de quarenta anos, universitárias do Centro Universitário de Franca, SP (Uni-

FACEF), alunas distribuídas entre o 1.° e 9.° semestres do curso de Graduação em

Psicologia. As entrevistas foram semi-estruturadas, com inspiração fenomenológica, onde

o alvo da investigação foi chegar aos significados atribuídos pelas colaboradoras à

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situação pesquisada. Foram questões abertas, com flexibilidade para a abrangência de

seu conteúdo, para a ordem de sua apresentação e para as respostas das entrevistadas.

As questões foram delineadas procurando obter informações sobre o contexto de

vida dessas mulheres (aspectos da história e do mundo familiar e profissional); sobre as

percepções que elas têm dos conhecimentos e vivências proporcionados pelo curso que

estão fazendo e sobre suas expectativas de atuação social a partir desses estudos. Foi

possível entrever, nas falas das entrevistadas, o contexto social em que vivem, as

reflexões que são elaboradas no dia a dia da universidade, o relacionamento com jovens,

a inserção no ensino atual e aspectos da condição feminina atual.

 

Resultados A análise das respostas obtidas nos levou a estabelecer os seguintes aspectos ou

categorias de interpretação:

 

O curso universitário tem efeitos transformadores nas pessoas.

As entrevistadas deixaram bem claro em suas falas que o conhecimento

estruturado e a participação concreta com jovens são fonte de reflexões interiores, de

compreensão mutua e de aberturas para interpretações novas e de ações presentes.

Também, que o conhecimento se processa de uma forma contínua e que a velhice não é

um empecilho para se adquirir conhecimentos; o conhecimento, na idade madura,

acontece!!! O envelhecimento é mais um ciclo e cada vez com maior duração, onde estão

os conflitos, os anseios, os sonhos, as possibilidades e a capacidade de aprender

também. O ritmo é outro apenas porque não há como desprezar tantos anos vividos

anteriores a esta atual vivência, que é freqüentar uma universidade.

Um momento de escolhas: a opção por si própria.

As entrevistadas fizeram escolhas, durante toda a vida, em favor da família ou

porque culturalmente não haviam aprendido a pensar em si, em seus anseios, seus

sonhos. Seguem determinadas no curso, permitindo-se uma escolha na hora certa, para

entrarem num mundo do trabalho com uma nova profissão.

 

O ensino universitário: um resgatar de sonhos.

O significado de estar na universidade para as entrevistadas é, sobretudo, fruto de

sonhos. Sonhos realizados num resgatar de ilusões, num despertar de coisas

adormecidas, que ficaram a espera. Vivê-las num contexto novo, escolhido por desejo,

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com segurança e serenidade, é de uma satisfação imensurável. Seus valores pessoais,

sua teoria de vida, da vida que levou até agora traz na bagagem, suas vivências, suas

oportunidades, suas amizades, seus amores bem ou mal resolvidos, enfim o sentido que

as fazem viver expressos até nos silêncios da entrevistas.

 

O exercício profissional: uma realidade possível

Todas as entrevistadas pretendem continuar especializando-se para o mercado de

trabalho, frente a esta nova profissão, mesmo cientes da idade cronológica que têm, pois

sabem das possibilidades de hoje, de se viver mais, com qualidade de vida e com novos

planos.

A busca incessante de significados de todo ser humano, a realização de sonhos, o

sentido novo que se dá a vida é muito difícil de avaliar e, nas respostas das entrevistadas,

cada uma têm seus sonhos próprios, seus valores e suas necessidades a preencher

neste ciclo de vida vigente. As metas, no caso, a nova profissão, é um caminho viável e

real, visto no entusiasmo de cada fala.

 Conclusão  

O aumento de expectativa de vida do ser humano traz a necessidade de reflexão

sobre o tempo e o seu uso e seus significados.

Surge também um interesse referente à condição da mulher, sobretudo em razão

de sua trajetória histórica de transformações profundas nas características de suas

funções e papéis sociais.

O estudo na universidade surge como uma das alternativas para qualificar esse

tempo com o qual se depara a mulher madura, com a percepção que ela tem de uma

nova formação profissional, buscando detectar significados dessa vivência universitária.

O trabalho dedicou-se a essa questão e seus dados mostraram:

-o conhecimento implica movimentos internos que favorecem as atividades

individuais, a realização de sonhos, a possibilidade de independência econômica e o

prazer de aprender.

-o estudo universitário oferece condição de se estar atualizado quanto ao mercado

de trabalho, a realidade social e a imediata informação que possibilita atividades úteis à

comunidade.

-o ensino universitário na idade adulta, torna o conhecimento adquirido uma

oportunidade para se re-conhecer, se re-avaliar, considerando a idade madura um ciclo

ativo e de significados, pois, estar frequentando uma universidade pode permitir:

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- re-colocar-se na família como um elemento, ao mesmo tempo, individual e

coletivo, estabelecendo as prioridades do momento, equilibrando as outras funções que a

mulher exerce na rotina familiar e procurando a compreensão e colaboração dos demais.

- compreender e vivenciar uma rotina universitária, convivendo com jovens,

aceitando as diferenças individuais como um estágio para atuação profissional.

- sentir-se como modelo para outras pessoas que têm vontade de voltar à

universidade

- ajudar a esclarecer a respeito da vida da mulher adulta atual, no equilíbrio das

jornadas que se propõe a fazer.

- esclarecer-se sobre a continuidade de sonhos, desejos, objetivos e metas que na

idade adulta se fazem presentes.

- e, por fim, procurar lugar em ambiente mais jovem, para conceituar a velhice de

maneira produtiva, capaz, ativa e sonhadora.

O estudo teórico e os dados obtidos permitiram identificar motivos, apreender o

significado do ensino universitário para mulheres adultas e compreender a percepção das

transformações na vida delas.

Cabe salientar que a generalização desses dados só será cabível se somados a

muitos outros estudos, porém os resultados atingiram os objetivos propostos quanto ao

âmbito das entrevistadas, ao local e à situação investigada.

 

Referências  

BALBINOTTI, Helena B. F. Adulto maduro: o pulsar da vida. Porto Alegre: W.S. Editor, 2003. BEE, Helen L.; MICHELL, Sandra K.A. A pessoa em desenvolvimento. São Paulo: Harbra, 1986. BELLUZO, Regina C.B. A aprendizagem ao longo da vida: um desafio para a educação na sociedade do conhecimento. In RIVERO, Cléia.M.L.; GALLO, Silvio. (orgs) A formação de professores na sociedade do conhecimento. Bauru, SP: Edusc, 2004. CANOAS, Cilene S. O olhar feminino sobre 2010. São Paulo: Texto Novo, 1997. DEMO, Pedro. Pesquisa: principio cientifico e educativo. 2 ed. São Paulo: Cortez,1991. MAFFIOLETTI, Virginia L R. Velhice e família: reflexões clinicas. Revista Psicologia e Profissão, n.3, v.25, 2005. MARTINS, Joel; BICUDO, Maria A V. A pesquisa qualitativa em psicologia. 5 ed. São Paulo: Centauro, 2005. VITOLA, Janice O. C. Sentido da vida e realização pessoal de pessoas de terceira idade. in SAMIERA, Jorge C. (org). Psicologia comunitária: estudos atuais. 2 ed. Porto Alegre: Sulina, 2004.