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A tradiªo do bumba-meu-boi ainda estÆ viva no Piau. Na capital existem 22 grupos que anualmente saem s ruas e que reclamam do pouco incentivo que Ø dado pelo Estado para a continuidade da atividade Folclore O MEU BOI NˆO MORREU Domingo Theresina TERESINA, 15 de junho de 2008 uuB|3 meionorte Manter a brincadeira nªo Ø tarefa fÆcil. Os re- cursos financeiros que os r- gªos responsÆveis pelo gerenciamento da cultura no Estado disponiblizam aos grupos nªo atendem s ne- cessidades bÆsicas para se formar um boi. Os donos, na maioria, sªo pessoas de po- der aquisitivo muito baixo. PorØm a vaidade faz parte do imaginÆrio de cada brin- cante e cada participante, a- pesar das dificuldades, se encarrega de confeccionar suas vestimentas, tirando recursos do prprio bolso. O presidente da Asso- ciaªo Teresinense de Bum- ba-meu-boi, Ribamar Gomes da Costa, reclama da falta de incentivo s brincadeiras, por parte dos governos esta- dual e municipais. Segundo ele, o Maranhªo tomou conta da dana do Boi porque lÆ tem incentivo financeiro pa- ra sua formaªo. A tradiªo do boi folclrico piauiense surgiu em Oeiras, a primeira Capital. PorØm, foi em Teresina, que a manifesta- ªo ganhou maior dimensªo com o surgimento de vÆrios grupos. De norte a sul da cida- de, o teresinense brinca o boi. Na capital existem 22 grupos de boi, desses a maioria fica na zona Sul, mais precisamente no Bairro Cidade Nova, onde estÆ o mais famoso, o Touro da Ilha. No entanto, foi na zona Nor- te de Teresina que a brinca- deira de boi surgiu com mais intensidade, atravØs do Mestre Passarinho, um dos mais conhecidos do Piau. Ribamar da Costa, que Ø morador do Bairro Poty Ve- lho, brinca Boi desde os dez anos de idade. Em 1985, co- meou a comandar o seu prprio grupo, o Terror do Nordeste, um dos mais fa- mosos da cidade. CRISTIANE CARDOSO E WILMA ROCHA ESPECIAL PARA O MEIO NORTE Bumba-beu-boi, Boi-bumbÆ, Bumba- boi. Muitas sªo as denominaıes recebi- das pela mais conhecida manifestaªo folclrica do Piau. Se o Boi nasceu no Piau, ninguØm sa- be, mas, certamente, o Boi ainda nªo morreu no Estado. A dana do Bumba-meu-boi Ø uma das manifestaıes folclricas mais praticadas pelos piauienses. O gado foi um dos instru- mentos usados pelos portugue- ses para fazer a ocupaªo do ter- ritrio piauiense. Em meados de 1674, Domingos Afonso Mafren- se instalou as primeiras fazen- das na regiªo dos Rios Piau e CanindØ. Muitos historiadores creditam a histria do Bumba-Meu-Boi ao Piau. A letra da mœsica atØ refora esse pensamento. Na verdade, as manifestaıes folclri- cas no Brasil sªo heranas europØias. No Piau, alØm de criarem gado e dizimarem n- dios, impuseram seus costumes e tradiıes religiosas. Assim, o boi folclrico veio e- xatamente do boi do pasto. Conta a lenda que um vaqueiro, de nome Chico, matou o mais importante boi da fazenda onde traba- lhava, para satisfazer o desejo da esposa, Catirina, que estava esperando o primeiro filho. Ela queria comer a lngua do boi. O patrªo, querendo de volta o animal, contra- ta um mØdico e um feiticeiro para dar vida ao boi de estimaªo. Entªo, surge a brinca- deira como se conhece nos dias de hoje. Cada grupo de boi pode ter atØ 40 compo- nentes distribudos em perso- nagens, como: o Nego Chico, a Catirina, o Amo, o Guardiªo, os Caboclos e as Caboclas Gue- rreiras, o Primeiro e o Segundo Rapaz, o MØdico e o Feiticeiro, o Patrªo, alØm de dois vaqueiros e do Miolo do Boi. Com relaªo cor e ao brilho das vestimentas e adereos - calas, coletes, chapØus, calados -, em que an- tes predominava o vermelho, hoje depende mais da criativi- dade de cada grupo, do que da tradiªo. Outra observaªo Ø quanto participa- ªo de mulheres, que Ø recente. No surgimen- to da dana nªo era permitida a participaªo feminina. Da a tradiªo da personagem Cati- rina ser representado por um homem. O re- pertrio musical da dana Ø especial, o gŒne- ro musical Ø a toada, que muitos chamam de cantiga. na mœsica que a brincadeira ganha sua especificidade. A toada de boi Ø feita por compositor popular. Y Origem A tradiªo no Piau surgiu em Oeiras, a primeira capital. Po- rØm, foi em Teresina que a manifestaªo ga- nhou maior dimensªo VESTIDO A CAR`TER | A tradiªo de danar o boi Ø cultuada dentro do grupo familiar COMPONENTES | Cada grupo de boi pode ter atØ 40 personagens. No surgimento da dana, nªo era permitida a participaªo das mulheres Associaªo reclama mais incentivo da iniciativa pœblica Mestre Passarinho era funcionÆrio do mata- douro de gado e proprietÆrio do Boi Riso da Mocidade, que hÆ setenta anos faz his- tria. O Riso da Mocidade foi escola para muitos brin- cantes de hoje. O trabalho do mestre Passarinho foi tªo importante para a identida- de do boi no Piau, especial- mente o teresinense, que o matadouro de gado foi transformado em um teatro, o Teatro do Boi. O lugar vi- rou smbolo dessa manifes- taªo folclrica e abriga uma escola onde sªo repas- sados os fundamentos da brincadeira a crianas e a- dolescentes, para que a tra- diªo nªo desaparea. O responsÆvel pelos en- sinamentos Ø o mestre Cha- gas, que comeou a danar o boi com sete anos de ida- de, motivado pelo pai que tambØm praticava no grupo de mestre Passarinho. Na escola de mestre Chagas es- tªo matriculados 42 alunos com idade de 7 a 15 anos e, como em toda boa escola o aluno tem que ser aplicado. O resultado do trabalho Ø tªo bom que o grupo chega a fazer 48 apresentaıes por mŒs durante o ciclo do boi, que vai do dia 5 de maio ao final de agosto e incio de setembro, perodo da ressu- rreiªo, fuga e morte do boi. Mestre Passarinho e o surgimento do Teatro do Boi De acordo com Pedro Black, auxiliar do mestre Chagas, existem vÆrios tipos de boi. Tem o boi de Sutaque, de Orquestra e o de Barrica. Ns do Piau cultivamos o Boi Mirim para conservar a tradiªo. A histria do boi Ø contada de vÆrias formas, mas a fugida e a morte do boi sªo manti- das. A ressurreiªo do boi acontece no ano seguin- te, lembra Pedro Black. No mŒs de junho o desta- que para a brincadeira Ø maior por conta das festas juninas. No dia 24, dedica- do Festa de Sªo Joªo, a dana do Bumba-meu-boi acontece simulta- neamente em vÆrias par- tes do Estado. A tradiªo que passa de pai para filho deixa fe- liz nªo s o professor Cha- gas, mas os alunos tam- bØm. Wanderson Soares de Sousa freqüenta a esco- la do Teatro do Boi hÆ dois anos e se sente importn- cia em participar da brin- cadeira. Ele sabe todos os fundamentos da tradiªo e, inclusive, ajuda os pro- fessores de sua escola de Ensino Fundamental a contarem a histria para os colegas de sala de aula. JÆ Yasmin Feitosa de Sou- sa, que entrou na dana por influŒncia da irmª, rompe as barreiras contra a participaªo de meninas no Boi. Ela disse que uma das coisas que mais gosta Ø de brincar o boi. Eu gos- to de danar, me sinto ale- gre, cada apresentaªo Ø uma diversªo, comemora. Y Y Y Boi Mirim Ø o mais cultivado por grupos piauienses VERSˆO| Conta a lenda que o vaqueiro Nego Chico matou o boi para dar a lngua esposa Catirina FOTOS EDECLEO LEITE

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A tradição do bumba-meu-boi ainda está viva no Piauí. Na capital existem 22 grupos que anualmente saemàs ruas e que reclamam do pouco incentivo que é dado pelo Estado para a continuidade da atividade

Folcloreç

O MEU BOI NÃO MORREU

Domingo TheresinaTERESINA, 15 de junho de 2008 uuB|3

ç meionorte

Manter a brincadeiranão é tarefa fácil. Os re-

cursos financeiros que os ór-gãos responsáveis pelogerenciamento da cultura noEstado disponiblizam aosgrupos não atendem às ne-cessidades básicas para seformar um boi. Os donos, namaioria, são pessoas de po-der aquisitivo muito baixo.Porém a vaidade faz partedo imaginário de cada brin-cante e cada participante, a-pesar das dificuldades, seencarrega de confeccionarsuas vestimentas, tirandorecursos do próprio bolso.

O presidente da Asso-

ciação Teresinense de Bum-ba-meu-boi, Ribamar Gomesda Costa, reclama da faltade incentivo às brincadeiras,por parte dos governos esta-dual e municipais. Segundoele, o Maranhão tomou contada dança do Boi porque látem incentivo financeiro pa-ra sua formação.

A tradição do boi folclóricopiauiense surgiu em Oeiras, aprimeira Capital. Porém, foiem Teresina, que a manifesta-ção ganhou maior dimensãocom o surgimento de váriosgrupos. De norte a sul da cida-de, o teresinense brinca o boi.

Na capital existem 22

grupos de boi, desses amaioria fica na zona Sul,mais precisamente no BairroCidade Nova, onde está omais famoso, o Touro da Ilha.No entanto, foi na zona Nor-te de Teresina que a brinca-deira de boi surgiu com maisintensidade, através doMestre Passarinho, um dosmais conhecidos do Piauí.

Ribamar da Costa, que émorador do Bairro Poty Ve-lho, brinca Boi desde os dezanos de idade. Em 1985, co-meçou a comandar o seupróprio grupo, o Terror doNordeste, um dos mais fa-mosos da cidade.

CRISTIANE CARDOSO EWILMA ROCHAESPECIAL PARA O MEIO NORTE

�Bumba-beu-boi�, �Boi-bumbá�, �Bumba-boi�. Muitas são as denominações recebi-

das pelamais conhecidamanifestação folclóricado Piauí. Se o Boi nasceu no Piauí, ninguém sa-be,mas, certamente, o Boi aindanão morreu no Estado. A dançado Bumba-meu-boi é uma dasmanifestações folclóricas maispraticadas pelos piauienses.

O gado foi um dos instru-mentos usados pelos portugue-ses para fazer a ocupação do ter-ritório piauiense. Emmeados de1674, Domingos Afonso Mafren-se instalou as primeiras fazen-das na região dos Rios Piauí eCanindé. Muitos historiadorescreditam a história do Bumba-Meu-Boi ao Piauí.A letra da música até reforça esse pensamento.

Na verdade, as manifestações folclóri-cas no Brasil são heranças européias. NoPiauí, além de criarem gado e dizimarem ín-dios, impuseram seus costumes e tradiçõesreligiosas. Assim, o �boi folclórico� veio e-xatamente do �boi do pasto�. Conta a lendaque um vaqueiro, de nome Chico, matou omais importante boi da fazenda onde traba-lhava, para satisfazer o desejo da esposa,

Catirina, que estava esperando o primeirofilho. Ela queria comer a língua do boi. Opatrão, querendo de volta o animal, contra-ta um médico e um feiticeiro para dar vidaao boi de estimação. Então, surge a brinca-deira como se conhece nos dias de hoje.

Cada grupo de boi pode ter até 40 compo-nentes distribuídos em perso-nagens, como: o Nego Chico, aCatirina, o Amo, o Guardião, osCaboclos e as Caboclas Gue-rreiras, o Primeiro e o SegundoRapaz, o Médico e o Feiticeiro, oPatrão, além de dois vaqueiros edo Miolo do Boi. Com relação àcor e ao brilho das vestimentase adereços - calças, coletes,chapéus, calçados -, em que an-tes predominava o vermelho,hoje depende mais da criativi-

dade de cada grupo, do que da tradição.Outra observação é quanto à participa-

ção de mulheres, que é recente. No surgimen-to da dança não era permitida a participaçãofeminina. Daí a tradição da personagem Cati-rina ser representado por um homem. O re-pertório musical da dança é especial, o gêne-ro musical é a �toada�, que muitos chamamde �cantiga�. É na música que a brincadeiraganha sua especificidade. A toada de boi éfeita por compositor popular.

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Origemç

A tradição noPiauísurgiu emOeiras, aprimeira capital. Po-rém, foi emTeresinaque amanifestação ga-nhoumaior dimensão

VESTIDO A CARÁTER | A tradição de dançar o boi é cultuada dentro do grupo familiar

COMPONENTES | Cada grupo de boi pode ter até 40 personagens.No surgimento da dança, não era permitida a participação das mulheres

Associação reclama maisincentivo da iniciativa pública

Mestre Passarinho erafuncionário do mata-

douro de gado e proprietáriodo Boi Riso da Mocidade,que há setenta anos faz his-tória. O Riso da Mocidadefoi escola para muitos brin-cantes de hoje. O trabalhodo mestre Passarinho foi tãoimportante para a identida-de do boi no Piauí, especial-mente o teresinense, que omatadouro de gado foitransformado em um teatro,

o Teatro do Boi. O lugar vi-rou símbolo dessa manifes-tação folclórica e abrigauma escola onde são repas-sados os fundamentos dabrincadeira a crianças e a-dolescentes, para que a tra-dição não desapareça.

O responsável pelos en-sinamentos é o mestre Cha-gas, que começou a dançaro boi com sete anos de ida-de, motivado pelo pai quetambém praticava no grupo

de mestre Passarinho. Naescola de mestre Chagas es-tão matriculados 42 alunoscom idade de 7 a 15 anos e,como em toda boa escola oaluno tem que ser aplicado.O resultado do trabalho étão bom que o grupo chegaa fazer 48 apresentações pormês durante o ciclo do boi,que vai do dia 5 de maio aofinal de agosto e início desetembro, período da ressu-rreição, fuga e morte do boi.

Mestre Passarinho e osurgimento do Teatro do Boi

De acordo com PedroBlack, auxiliar do

mestre Chagas, existemvários tipos de boi. Tem oboi de Sutaque, deOrquestra e o de Barrica.�Nós do Piauí cultivamos oBoi Mirim para conservara tradição. A história doboi é contada de váriasformas, mas a fugida e amorte do boi são manti-das. A ressurreição do boiacontece no ano seguin-te�, lembra Pedro Black.No mês de junho o desta-que para a brincadeira é

maior por conta das festasjuninas. No dia 24, dedica-do à Festa de São João, adança do Bumba-meu-boiacontece simulta-neamente em várias par-tes do Estado.

A tradição que passade pai para filho deixa fe-liz não só o professor Cha-gas, mas os alunos tam-bém. Wanderson Soaresde Sousa freqüenta a esco-la do Teatro do Boi há doisanos e se sente importân-cia em participar da brin-cadeira. Ele sabe todos os

fundamentos da tradiçãoe, inclusive, ajuda os pro-fessores de sua escola deEnsino Fundamental acontarem a história paraos colegas de sala de aula.Já Yasmin Feitosa de Sou-sa, que entrou na dançapor influência da irmã,rompe as barreiras contraa participação de meninasno Boi. Ela disse que umadas coisas que mais gostaé de brincar o boi. �Eu gos-to de dançar, me sinto ale-gre, cada apresentação éuma diversão�, comemora.

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Boi Mirim é o mais cultivadopor grupos piauienses

VERSÃO| Contaa lenda que ovaqueiro Nego

Chico matou o boipara dar a línguaà esposa Catirina

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