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Reportagem "Moda em marcha lenta" de Luísa Dal Mas, produzida para a cadeira de Redação e Produção em Jornal da Famecos/PUCRS
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Moda em marcha lenta
Vivemos em um mundo extremamente dinâmico. Tudo é criado,
utilizado e descartado em um piscar de olhos, principalmente quando se fala
em indústria têxtil. O mundo da moda vive um período frenético. Coleções
são lançadas constantemente e com a popularização das redes de fast
fashion, que trazem produtos novos toda semana a preços muito baixos,
esse padrão tem tomado proporções ainda maiores. Em meio a esse
turbilhão de informações, surge uma ideologia que espera diminuir esse ritmo
apressado.
O slow fashion é uma contra-tendência derivada do movimento slow
food, que propõe a valorização dos alimentos, degustando e aproveitando o
momento da refeição. A premissa slow é fazer as coisas com menos pressa.
Na produção de roupas, isso significa criar produtos de qualidade e que
promovam o consumo consciente, que façam o consumidos pensar naquilo
que está comprando. Nesse sentido, o slow fashion se apoia muito nos
pilares da sustentabilidade.
A professora da Faculdade de Moda da Unisinos, Paula Visoná,
explica que esse movimento “tem a ver com não consumir tanto, consumir de
modo mais coerente, entendendo que aquela peça não precisa ser
descartada na próxima coleção ou no próximo mês”. Segundo Paula, a ideia
de dedicar mais tempo e cuidado à produção de uma peça mostra ao cliente
que ele terá aquele produto por muito mais tempo, sem a necessidade de
seguir a ideia central da moda de renovação constante, quase frenética.
Dessa maneira, evita-se o desperdício e o descarte de itens que poderiam ter
uma longa vida útil.
Essa garantia de qualidade diferenciada é atingida através da
característica artesanal que está presente na essência do slow fashion,
buscando técnicas de produção nas pioneiras da moda: as costureiras. Os
designers que seguem essa filosofia slow procuram valorizar a mão de obra
local. “Ao invés de mandar fazer uma peça fora, buscamos as competências
no lugar onde estamos, tentando constituir uma forma de produção que
valorize essas competências”, explica Paula.
O slow fashion ainda tem um longo caminho a percorrer até se
estabelecer como um método de produção relevante na indústria da moda.
Entretanto, a professora acredita que o futuro é promissor, visto que o
consumidor, principalmente o público jovem, está se mostrando cada vez
mais preocupado com a origem das suas roupas.
Ao lado de todos esses valores está a questão ecológica. O slow
fashion promove o desenvolvimento sustentável como um todo, não só no
âmbito social e econômico, mas também no ambiental. Mariana Duda,
fundadora da Envido, marca sustentável voltada para a pesquisa e
desenvolvimento têxtil, revela que a indústria da moda é a segunda mais
poluente do mundo. O desperdício de recursos e de matéria prima é
imensurável. Na produção de uma calça jeans, por exemplo, são usamos 11
mil litros de água.
“O descarte irregular de resíduos, a falta de tratamento de efluentes
nas indústrias têxteis e curtumes, junto com o uso cada vez maior de tecidos
sintéticos derivados do petróleo, faz com que o caminho para o futuro seja a
moda sustentável”, afirma a empresária e designer.
Mariana conta que quando entrou para o mercado, pensava em abrir
sua própria fast fashion, mas mudou de ideia quando passou a entender o
impacto ambiental que um negócio na área pode causar. “Eu levei um susto
com o desperdício de materiais, tratamento dado aos funcionários e o uso de
tecidos muitas vezes tóxicos. Desiludida precisei partir para um novo
caminho, assim eu criei a Envido”, revela.
A equipe da Envido pesquisa possibilidades de reaproveitamento de
diversos materiais. Desde pedras preciosas descartadas pela indústria, lixo
eletrônico e resíduos automotivos, até tecidos e couro orgânico ou reciclado.
Ideologia na prática Nem só de ideologias se faz o slow fashion. Cada vez mais designers
têm aplicado as teorias do movimento na sua produção diária. A estilista
Alessandra Giordani é filha de costureira e cresceu fazendo suas roupas em
casa. Quando decidiu começar sua própria confecção três anos atrás,
procurou um atelier onde pudesse oferecer um atendimento diferenciado para
suas clientes, algo que não pudesse ser encontrado em lojas convencionais.
“Na época não se falava em slow fashion, mas quando descobri o movimento
percebi que tinha tudo a ver com o meu trabalho”, conta.
As peças de Alessandra não seguem as tendências e mudanças
constantes do mercado tradicional. Todas as blusas, saias e vestidos são
inspirados na década de 60, desde a modelagem até a estamparia.
Segundo ela, a ideia é fazer uma moda atemporal e clássica, que
possa ser passada de mãe para filha, e não descartada no próximo mês.
“Que moda os nossos filhos vão ter? Não temos história da moda no século
21, as roupas estão virando pano de chão”.
O conceito de personalização e exclusividade é bastante trabalhado
no atelier de Alessandra. As clientes, cujos nomes a estilista sabe de cor,
podem escolher o modelo da peça e o tecido que será usado na confecção.
“Elas gostam dessa ideia de roupa personalizada, feita pra elas, é algo que
mexe com o ego da mulher”, reflete Alessandra.
Seguindo a essência sustentável de slow fashion, Alessandra utiliza
retalhos nas produções das roupas e acessórios. “Retalho é dinheiro”,
ressalta Alessandra, “as grandes confecções têm preguiça de pensar nas
sobras, é muito mais fácil jogar no lixo do que pensar o que fazer com elas”.
Também preocupada com o desperdício de tecidos do mercado da
moda, a doutora em Design de Superfície Sustentável, Evelise Anicet, decidiu
abrir junto com a sua filha o Ateliê Contextura. A confecção é baseada na
técnica do upcycle, que reutiliza resíduos de fios para produção de novas
roupas ou transforma peças de coleções passadas que não foram vendidas
para criar um novo produto.
“Pegamos um vestido que tinha um modelo bem justo e não teve tanta
saída, acrescentamos um drapeado para deixar a peça mais fluida e
confortável”, exemplifica Evelise. Ela destaca que o reaproveitamento de
peças desatualizadas é uma tendência adotada por grandes marcas
internacionais, como Prada, Gucci e Hermès.
Evelise também trouxe seu histórico acadêmico para o atelier,
transformando a Contextura em um espaço de investigação têxtil e de
pesquisa em moda e sustentabilidade, realizando estudos em parceria com
pesquisadores de todo o Brasil. Ela explica que a equipe do ateliê procura
sempre trabalhar o lado científico paralelo com a prática, provando que a
teoria dá certo.