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MODELAGEM MATEMÁTICA NA EDUCAÇÃO BÁSICA: uma experiência no
ensino médio – o uso racional da energia elétrica
Autora: Claudete Adria1
Orientador: Carlos Roberto Ferreira2
Resumo
Este artigo tem como objetivo principal relatar uma experiência de ensino que utilizou a Modelagem Matemática como metodologia de ensino, em uma turma de 4º ano de Formação de docentes. O tema escolhido e desenvolvido foi o consumo de energia elétrica de um chuveiro, o que oportunizou importantes discussões relativas à matemática, ao meio ambiente e a sustentabilidade. Isto ocorreu, pois sabe-se que os conteúdos matemáticos trabalhados durante o período escolar, na sua grande maioria são isolados e sem uma real compreensão dos conceitos envolvidos na construção dos conhecimentos matemáticos, porque para uma aprendizagem significativa, é preciso relacionar a matemática escolar com a vida e fazer a ligação com a necessidade do meio. O desenvolvimento de atividades interdisciplinares, a problematização de questões advindas de pesquisas realizadas, a análise e interpretação de dados reais foi o que norteou o trabalho com Modelagem Matemática. Em função do tema escolhido pelo interesse dos alunos, foram levantados diversos dados e fez-se um estudo de conteúdo de forma contextualizada, levando os educandos a um ambiente de investigação, aonde sob a orientação do professor, elaboraram as questões a serem respondidas, coletaram dados, resolveram as situações levantadas, desenvolveram os conteúdos matemáticos no contexto do tema e analisaram criticamente as respostas encontradas. Implementando esse projeto, foi possível perceber claramente como o trabalho contextualizado é importante para motivar os estudantes na execução das atividades e despertar o interesse pela matemática.
Palavras-chave: Modelagem Matemática; Ensino e Aprendizagem; Uso racional da
energia elétrica.
1 Especialista em Ensino de Matemática, Graduada em Matemática, Docente do Colégio Estadual
Visconde de Guarapuava – Guarapuava – PR. 2 Doutorando em Educação, Mestre em Educação, Especialista em Educação Matemática, Graduado
em Matemática, professor efetivo da Universidade Estadual do Centro Oeste – UNICENTRO.
1. Introdução
Os professores envolvidos com o ensino de matemática acabam discutindo
sobre a possibilidade de envolver o contexto escolar com as necessidades e
mudanças que a sociedade vem enfrentando, por meio de fenômenos e situações
existentes no contexto social, econômico e político. Um dos objetivos é fazer com
que o aluno aprenda a matemática, para ter um comportamento ativo e crítico no
meio em que vive. Entretanto, pelos indicadores atuais, percebe-se que está longe
de atingir este objetivo.
Diversas avaliações sobre o ensino e aprendizagem da matemática
apresentam dados pouco animadores para o Brasil. O relatório do PISA (Programme
for International Student Assessment) de 2009 mostra que ainda tem muito que
avançar para alterar a realidade, pois de uma escala de 0 a 800 pontos, a média dos
alunos de 15 anos que participaram da avaliação no Brasil, foi de 401 pontos,
colocando o país na desconfortável 53a posição num total de 65 países avaliados.
Desnecessário listar outras avaliações, pois todas vão à mesma direção.
Analisando estes dados percebe-se a necessidade do professor repensar o
ensino da matemática, revendo a sua prática. A forma tradicional de ensinar
matemática pode ser uma das responsáveis por este fracasso, pois fazer um resumo
do assunto, resolver alguns modelos para os alunos e depois trabalhar listas de
exercícios com o objetivo de memorização e cálculos mecânicos não estão trazendo
os resultados esperados (FERREIRA, 2010). Observa-se também que para cumprir
o currículo, professores vêm trabalhando de forma superficial o conteúdo
programado com quantidade e não com qualidade.
Para tentar reverter este quadro e dedicar maior atenção às questões do
ensino e da aprendizagem da matemática, surgiu o chamado Movimento Educação
Matemática no âmbito do qual contempla diversas propostas metodológicas para o
ensino, entre elas a Modelagem Matemática, o qual pressupõe que o ensino e a
aprendizagem da matemática podem ser potencializados a partir de situações do
cotidiano.
A Modelagem Matemática também faz parte das tendências metodológicas
presentes nas Diretrizes Curriculares da Educação Básica de Matemática do Estado
do Paraná, elas indicam que:
Os conteúdos propostos devem ser abordados por meio de tendências metodológicas da Educação Matemática que fundamentam a prática docente, das quais destacamos: resolução de problemas; modelagem matemática; mídias tecnológicas; etnomatemática; história da Matemática e investigações matemáticas. (PARANA, 2008, p. 63).
Elas apresentam também como pressuposto a problematização de situações
do cotidiano. Ao mesmo tempo em que propõe a valorização do aluno no contexto
social, procura levantar problemas que sugerem questionamentos sobre situações
de vida. (PARANA, 2008, p. 64).
No contexto apresentado entende-se que a Modelagem Matemática pode
ser uma possibilidade, pois a contextualização é uma premissa dessa tendência,
que também considera importante a sistematização em termos de unidades de
conteúdo (KLÜBER e BURAK, 2007). Igualmente, é assumida como uma maneira
para a superação do atual quadro negativo do ensino e aprendizagem de
Matemática.
Outra questão importante analisada e que faz parte deste relato é a
formação matemática dos alunos de Formação de Docentes (antigo magistério) do
Colégio Estadual Visconde de Guarapuava, que depois de formados, estão
habilitados a lecionar em turmas de 1a a 4a séries/1º ao 5º ano do ensino
fundamental, em diversas disciplinas como: Português, Matemática, História,
Geografia e Ciências. Mas ao observar que a maioria dos novos professores (as)
acaba direcionando o seu trabalho, em sala de aula com menos ênfase à
matemática, causando um prejuízo à formação integral desejada do aluno e,
consequentemente, devido à dificuldade deste professor, determinados conteúdos
não são ensinados ou o faz de maneira inadequada, o prejuízo torna-se ainda maior.
Em virtude disso, este artigo tem como objetivo principal apresentar aos
alunos da turma de Formação de Docentes do Colégio Estadual Visconde de
Guarapuava, a Modelagem Matemática como uma alternativa metodológica viável
para reverter o atual quadro negativo de ensino e aprendizagem da Matemática, nas
turmas de 1a a 4a séries/1º ao 5º ano do ensino fundamental, com a possibilidade de
o aluno trabalhar com entusiasmo e perseverança, formando atitudes positivas em
relação à matéria, ou seja, o docente pode despertar nele o gosto pela disciplina em
questão e seus conteúdos.
2. A Modelagem Matemática
Existem diferentes metodologias de ensino que tornam a aprendizagem mais
significativa, ou seja, que tenha significado aos alunos e colabora para criar, em sala
de aula, um ambiente onde ele problematize e investigue diversas situações e utilize
os conhecimentos matemáticos como recurso para isso. É preciso valer-se de uma
metodologia de ensino que possibilite a aprendizagem, dentre elas está a
Modelagem Matemática, que pode ser aplicada em diferentes níveis de ensino e
diferentes contextos, pois relaciona os conteúdos matemáticos ao cotidiano do aluno
de forma agradável, visto que parte de um tema de interesse do aluno (Burak, 1992).
A Modelagem Matemática (MM) é uma tendência metodologia recente, cerca
de três décadas no Brasil, e vem tornando o ensino e aprendizagem da matemática
mais atrativa. A Modelagem Matemática foi escolhida por acreditar-se que ela
representa uma alternativa viável para uma melhora significativa no ensino e
aprendizagem. Porém, pelas especificidades da metodologia, é necessário que se
tenha uma mudança na postura do professor e dos alunos, os quais deixam de ser
passivos ao interagir com os problemas propostos por eles no decorrer do processo.
A MM pode favorecer a integração com outras áreas do conhecimento, a ruptura
com a linearidade do currículo e ainda a socialização entre educador e educando,
educando e educando, escola e educando, entre outras relações.
O trabalho pedagógico com esta vertente possibilita a intervenção do
estudante nos problemas reais do meio social e cultural em que vive, por isso,
contribui para sua formação crítica, sendo que o modelo matemático buscado
deverá ser compatível com o conhecimento do aluno, sem desconsiderar novas
oportunidades de aprendizagem, para que ele possa sofisticar a matemática
conhecida a priori.
Atualmente, a Modelagem Matemática apresenta concepções distintas.
Klüber (2007) desenvolveu um estudo onde aponta cinco concepções de
Modelagem Matemática que mantêm alguma intercessão ao que concerne à área e
às discussões sobre Modelagem Matemática, porém, alimentam algumas diferenças
apresentadas seguir.
A Modelagem exposta por Rodney Carlos Bassanezi3 defende que “a arte de
transformar problemas da realidade em problemas matemáticos e resolvê-los
interpretando suas soluções na linguagem do mundo real.” (BASSANEZI, 2002,
p.16). Nesta perspectiva, o autor entende que sempre se faz necessária a
formulação de um Modelo Matemático. Sendo assim, “A modelagem eficiente
permite fazer previsões, tomar decisões, explicar, entender; enfim participar do
mundo real com capacidade de influenciar em suas mudanças.” (BASSANEZI, 2002,
p.16).
A professora Maria Salett Biembengut4 define Modelagem como “um
processo que envolve a obtenção de um modelo.” (BIEMBENGUT, 1999, p.20). E
nesse processo ela é uma forma de interligar Matemática e realidade, que, na visão
da autora, são disjuntas. Semelhante definição aparece em sua dissertação de
mestrado, considerando que a Modelagem é “[...] a estratégia usada para se chegar
ao modelo.” (BIEMBENGUT, 1990, p.3); e em sua tese de doutorado diz que a
“Modelagem Matemática é o processo envolvido na obtenção de um Modelo.”
(BIEMBENGUT, 1997, p.65). Assim, a autora acredita que a MM é o processo que
visa “traduzir a linguagem do mundo real para o mundo matemático”
(BIEMBENGUT, 1990, p.10).
Já Jonei Cerqueira Barbosa5 concebe a Modelagem Matemática como uma
oportunidade dos alunos indagarem situações por intermédio da Matemática, sem
procedimentos fixados previamente. Os conceitos e ideias matemáticas se
encaminham de acordo com o desenvolvimento das atividades, dando um caráter
aberto para esta prática. Não há a exigência de se criar um modelo matemático,
principalmente porque os alunos nem sempre têm conhecimento matemático
3Prof. Dr. Rodney Carlos Bassanezi, professor titular do Instituto de Matemática, Estatística e
Computação Científica (IMECC) da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP, Campinas –
SP. Coordenou inúmeros cursos sobre modelagem em diversas instituições no país. (BASSANEZI,
2002). 4Prof. Dr. Maria Salett Biembengut. Professora da Universidade Regional de Blumenau, FURB.
Possui mestrado em Educação Matemática pela UNESP – Rio Claro – SP, em 1990. Doutorado em
Engenharia de Produção e Sistemas, pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC – SC, em
1997, e pós-doutorado em Metodologia de Ensino e Pesquisa pela Universidade de São Paulo –
USP, em 2003. 5 Prof. Dr. Jonei Cerqueira Barbosa. Professor do Departamento de Ciências Exatas da Universidade
Estadual de Feira de Santana – UEFS - BA. Coordena o Núcleo de Pesquisas em Modelagem
Matemática (NUPEMM) e atua no Programa de Pós-Graduação em Ensino. Possui doutorado em
Educação Matemática pela Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho – UNESP – Rio
Claro, no ano de 2001.
suficiente para tal atividade. Sobre isso, Barbosa afirma: “À medida que não
compreendo as atividades de Modelagem contendo encaminhamentos e fins a priori,
sustendo que os alunos podem investigar matematicamente uma dada situação,
sem necessariamente construir um modelo matemático.” (BARBOSA, 2001a, p. 36).
Nesse sentido, assume que a “Modelagem é um ambiente de aprendizagem no qual
os alunos são convidados a indagar e/ou investigar, por meio da matemática,
situações oriundas de outras áreas da realidade.” (BARBOSA, 2001b, p. 6).
Outro autor, Ademir Donizeti Caldeira6 concebe a Modelagem pensando-a
como advinda de projetos, sem a preocupação de reproduzir os conteúdos
apresentados no currículo, enfatizando, contudo, que não se podem perder os
conceitos universais da Matemática. Ele acredita na eficácia da Modelagem, uma
vez que ela, enquanto concepção de Educação Matemática pode “oferecer aos
professores e alunos um sistema de aprendizagem como uma nova forma de
entendimento das questões educacionais da Matemática.” (CALDEIRA, 2005, p.3).
O trabalho com a Modelagem é sugerido em grupos: “Grupos de trabalhos se fazem
necessários para uma dinâmica mais participativa, onde o aluno passa da
passividade das aulas explicativas, onde ele é mero espectador e ‘depositário’ de
informações, para uma dinâmica integrativa e criativa.” (CALDEIRA, 2004b, p. 4).
Em se tratando de concepções, Dionísio Burak7 diz que a Modelagem
Matemática “é um conjunto de procedimentos cujo objetivo é construir um paralelo
para tentar explicar matematicamente os fenômenos do qual o homem vive o seu
cotidiano, ajudando-o a fazer predições e a tomar decisões.” BURAK, 1987, p.21).
Para o desenvolvimento da Modelagem Matemática, o autor enfatiza dois
pressupostos:
1) o interesse do grupo;
2) a obtenção de informações e dados do ambiente onde se encontra o
interesse do grupo.
6Prof. Dr. Ademir Donizeti Caldeira. Professor colaborador da Universidade de Uberaba, professor
adjunto ‘i’ da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, e colaborador da Universidade
Federal do Paraná - UFPR. Possui mestrado em Educação Matemática pela Universidade Estadual
de São Paulo – UNESP, em 1992. Doutor em Educação pela UNICAMP, no ano de 1998. 7Prof. Dr. Dionísio Burak. Professor titular na Universidade Estadual do Centro-Oeste – UNICENTRO
– PR. Primeira dissertação de mestrado na área de Educação Matemática, sobre Modelagem
Matemática, na UNESP – Rio Claro, 1987, e tese de doutorado na área de Educação, também sobre
Modelagem Matemática, no ano de 1992, na Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP - SP.
Esses pressupostos têm embasamento na experiência de cunho
antropológico e nas teorias construtivistas, interacionistas e de aprendizagem
significativa (BURAK, 1998). Por esses motivos existe a possibilidade de o aluno
trabalhar com entusiasmo e perseverança, formando atitudes positivas em relação à
Matemática, ou seja, pode despertar nele o gosto pela disciplina.
O desenvolvimento de uma atividade de Modelagem Matemática, na
perspectiva de BURAK (1998 e 2004), sugere cinco etapas:
a) A escolha do tema é a etapa em que o professor discute com os
estudantes alguns temas que possam gerar interesse ou deixa que eles sejam
escolhidos ou sugeridos pelos próprios alunos. Os temas podem ser dos mais
variados, uma vez que não é necessário que tenham nenhuma ligação imediata com
a Matemática ou com conteúdos matemáticos, e sim com o que os estudantes
manifestem interesse em desenvolver atividades de modelagem. Já nesta fase, é
fundamental que o professor assuma uma postura de mediador, facilitador da
aprendizagem, pois deverá dar o melhor encaminhamento para que a opção dos
alunos seja respeitada.
b) Na pesquisa exploratória, com o tema a ser pesquisado já escolhido,
orienta-se e discute-se com os alunos formas de conhecer mais e melhor sobre o
assunto. Aspectos teóricos, curiosidades, conteúdos técnicos, materiais dos mais
diversos, que contenham informações e noções prévias sobre o que se quer
desenvolver/pesquisar, favorecem a formação de atitudes de investigação. Os sites,
a pesquisa bibliográfica e as pesquisas de campo sobre o assunto são fontes ricas
de informações e estímulo, bem como se constituem como meios de se conhecer o
objeto de estudo.
c) No levantamento dos problemas, de posse dos materiais e informações
coletadas na pesquisa exploratória, os alunos são incentivados a conjeturar sobre
tudo que pode ter relação com o tema. Essas podem ensejar questões, sejam elas
matemáticas, econômicas, ambientais, entre outras, que decorrem do tema e
possibilitam elaborar problemas ou indagar sobre situações simples ou complexas
que os permitam vislumbrar a possibilidade de aplicar ou aprender conteúdos
matemáticos. Isso com a ajuda do professor, que não se isenta do processo, mas se
torna o ‘mediador’ das atividades.
d) Durante a resolução dos problemas e o desenvolvimento do conteúdo
matemático no contexto do tema proporciona-se a abertura para a busca de
respostas aos problemas levantados, que podem ser de naturezas distintas. No
trabalho com a Modelagem faz-se um caminho inverso do usual, em que os
conteúdos determinam os problemas. Na Modelagem, os problemas determinam os
conteúdos a serem usados para resolver as questões oriundas da etapa anterior.
Nesta etapa, os conteúdos matemáticos passam a ter significado e no decorrer do
processo podem surgir os modelos matemáticos, porém, isso não é a finalidade
dessa concepção de Modelagem.
e) Na análise crítica das soluções deve-se ter criticidade, não apenas em
relação à Matemática, mas em relação a outros aspectos, como a viabilidade das
resoluções apresentadas, que muitas vezes são resolvíveis matematicamente, mas
inviáveis para a situação estudada e para situações reais. Não se trata,
necessariamente, da análise de um modelo, mas dos conteúdos, dos seus
significados e no que os alunos podem contribuir para a melhoria das ações e
decisões enquanto pessoas integrantes da sociedade e da comunidade em que
participam. A análise crítica das soluções pode passar por discussões de problemas
não matemáticos, mas sociais, humanos, culturais e econômicos ou ambientais.
Vale ressaltar que essa criticidade deve permear todo o processo de Modelagem e
pensar a Educação em um contexto mais amplo.
3. Relato da Experiência
Esse trabalho foi desenvolvido no Colégio Estadual Visconde de
Guarapuava Ensino Fundamental, Médio e Curso Normal, com uma turma de 31
alunos, do 4º ano de Formação de Docentes de 1º ao 5º ano das séries iniciais. A
ideia não era desenvolver um curso de Modelagem Matemática, mas sim que os
alunos vivenciassem todas as etapas do trabalho com a Modelagem, que
estivessem na posição de alunos e não de futuros professores.
O trabalho foi iniciado com a escolha do tema, que é a primeira etapa no
desenvolvimento de uma atividade que utiliza a Modelagem Matemática. Depois de
algumas discussões e esclarecimentos de dúvidas, começaram a surgir vários temas
interessantes como, construção de uma casa, plantação de tomates, o cultivo de
erva mate e o consumo de energia elétrica. Todos os temas eram bons, mas a
escolha seria de apenas um. Um aluno sugeriu que a turma se dividisse em grupos
e cada um pegaria um tema diferente, mas foi explicado que, apesar de possível
nesse momento, para este projeto as dificuldades seriam grandes devido ao tempo
exíguo em concluir os trabalhos.
Após algumas rodadas de negociações, a turma optou pelo estudo do
consumo de energia elétrica, mais especificamente em relação a chuveiro elétrico.
Definido o tema, passou-se para segunda etapa da Modelagem Matemática, a coleta
de dados ou pesquisa exploratória. Divididos em grupos, os alunos iniciaram uma
investigação colhendo informações sobre energia elétrica e sobre o funcionamento
do chuveiro elétrico. Durante esta fase surgiu a ideia de se medir o consumo de
energia durante os banhos de todos os componentes da família e se existiria
margem para economizar.
Para isso ser possível, concordou-se que todos os alunos deveriam durante
uma semana, anotar o tempo que cada membro da família gastava para tomar seu
banho com o chuveiro ligado. De posse desses dados, iniciou-se a terceira etapa da
Modelagem, elaboração dos problemas, que nem sempre são matemáticos. Nesta
etapa os estudantes são incentivados a levantar questões relacionadas ao tema, os
problemas devem ser abertos, contextualizados e que possam desenvolver no aluno
a capacidade de tomar decisões, formular hipóteses e levantar várias possibilidades
de resolver um problema, propondo assim situações desafiadoras.
Problemas elaborados (pelos alunos e professor)
1. Qual o tempo médio semanal de banho de cada membro da família?
2. Determine o tempo total em horas.
3. Qual o dia da semana que mais se gasta energia?
4. Com o kWh custando R$ 0,31 reais, quanto representou em reais e em
porcentagem o gasto com banho na conta de energia elétrica?
5. Qual membro da família que mais gastou energia? Quantos por cento do total?
6. Se todos da família reduzissem o tempo de banho em 1/3, quanto isso
significaria de economia no final de um mês?
7. Se eu aplicar o dinheiro economizado todos os meses em um papel que
remunera o dinheiro em 2% am, quanto terei poupando em média ao final de 5
anos?
Com base nos problemas elaborados foi possível trabalhar os seguintes
conteúdos: as 4 operações básicas inteiras e decimais, regra de três, média
aritmética, porcentagem, frações, medida de tempo, juros compostos e progressão
aritmética e geométrica, além do caráter interdisciplinar, pois foi necessário trabalhar
o conceito de energia e suas unidades de medidas para resolver os problemas
apresentados.
Durante a resolução dos problemas também foi possível desenvolver a
quinta etapa da Modelagem Matemática, a análise crítica das soluções encontradas.
Uma delas foi a conscientização da necessidade de se economizar no tempo do
banho, o qual poderá trazer benefícios tanto para o “bolso” quanto para o meio
ambiente.
Ao final, os discentes apresentaram os resultados da pesquisa aos demais
colegas da sala, o primeiro grupo apresentou sua pesquisa com o consumo de uma
semana e depois, fazendo uma economia de 10 minutos por semana para ver
quanto iriam economizar no final do mês e assim por diante. O segundo grupo
apresentou seu resultado fazendo a conta de quanto se economizaria com 20
minutos. O terceiro grupo mostrou como seria apresentada a Modelagem
Matemática aos alunos de primeiro ao quinto ano.
4. Conclusões
Verifica-se que a Modelagem Matemática proporciona ao aluno, estudar os
conteúdos de forma contextualizada, dando sentido ao que ele está aprendendo e
que isso sim, faz o estudante desenvolver atitudes positivas em relação a
matemática. Também foi possível a observação que os conteúdos surgiram
naturalmente, de acordo com a necessidade de resolver os problemas, esses
aplicados em situações reais levando o educando a trabalhar com mais interesse e
participação desde o levantamento de dados até as suas resoluções.
Outro fato que merece destaque foi à experiência do trabalho em grupo do
4º ano de Formação de Docentes, ficou evidente a mudança da turma, pois a MM foi
um instrumento pedagógico que levou o aluno a participar ativamente de todas as
etapas, essas se tornam ricas em experiências e colaboração, os alunos declararam
se sentirem mais motivados para aprender.
Porém, por não estarem familiarizados com a metodologia, muitos
demonstraram dificuldades no desenvolvimento das etapas, principalmente na
elaboração de problemas mais complexos e na resolução dos problemas
elaborados, mas isso é considerado normal pelo curto tempo para desenvolver o
projeto. Com mais tempo e mais atividades essas dificuldades tendem a reduzir.
No mais, acredita-se que esta estratégia proporciona ao estudante participar
da construção do seu conhecimento, com atitude participativa e não passiva, onde
apenas recebe informações para realizar uma avaliação, não possibilitando torná-lo
um cidadão crítico e ativo na sociedade, sabendo relacionar a matemática com
situações práticas e vice versa.
Desenvolvendo este trabalho foi possível concluir que a oportunidade de
pesquisar, estudar e aplicar um projeto na escola onde o trabalho permitiu a
contribuição para o enriquecimento do processo ensino aprendizado e que o tema
proposto tornou possível um estudo interdisciplinar, pois se entende que a utilização
da Modelagem Matemática como uma metodologia de ensino pode servir como um
instrumento importante a fim de romper com a forma tradicional de ensinar e
aprender matemática.
É preciso destacar a grande mudança no comportamento da turma, os
alunos que não participavam das aulas, que diziam não gostar de matemática,
acabaram por participar ativamente de todas as etapas do processo, demonstrando
muito interesse, dedicação e entusiasmo. Isso foi bastante significativo. Já com as
“tarefas de casa”, que sempre foram um problema, pois a maioria não fazia,
observou-se que durante a aplicação desta metodologia todas as tarefas foram
cumpridas integralmente.
Essa mudança no comportamento dos alunos atribui-se a vários fatores, um
dos principais é que estavam tratando de temas de interesse deles, motivados e
estimulados por estarem participando ativamente do processo de aprendizagem,
ocorreram várias atividades fora do ambiente da sala de aula, isso proporcionou
uma relação deferente entre professor e aluno, de atenção, respeito, confiança,
onde muitas vezes, em sala de aula não é desenvolvido. Alunos desmotivados e
com dificuldade de aprendizagem, se sentiram muito bem ao desenvolver outros
tipos de atividades e verificarem que foram valorizados pela sua participação,
despertando um interesse muito grande pela matemática.
Por fim, ao se trabalhar com a Modelagem Matemática o aluno apresenta
criatividade, interesse e motivação nas aulas. O modo de agir dos alunos durante a
execução bem como seus depoimentos leva a crer que, além do aprendizado de
alguns conteúdos matemáticos, desenvolve-se a capacidade comunicativa, de
decisão e a capacidade crítica sobre diversos fenômenos, em que a temática
ambiental integrada a diversas disciplinas, no aspecto social, cultural e econômico
os leva a serem cidadãos participativos, atuantes e conscientes dos problemas da
sociedade e do meio.
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KLÜBER, T. E.. Modelagem Matemática e Etnomatemática no Contexto da Educação Matemática: aspectos filosóficos e epistemológicos. Ponta Grossa,
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