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APRESENTAÇÃO Este módulo faz parte da coleção intitulada MATERIAL MODULAR, destinada às três séries do Ensino Médio e produzida para atender às necessidades das diferentes rea- lidades brasileiras. Por meio dessa coleção, o professor pode escolher a sequência que melhor se encaixa à organização curricular de sua escola. A metodologia de trabalho dos Modulares auxilia os alunos na construção de argumen- tações; possibilita o diálogo com outras áreas de conhecimento; desenvolve as capaci- dades de raciocínio, de resolução de problemas e de comunicação, bem como o espírito crítico e a criatividade. Trabalha, também, com diferentes gêneros textuais (poemas, histórias em quadrinhos, obras de arte, gráficos, tabelas, reportagens, etc.), a fim de dinamizar o processo educativo, assim como aborda temas contemporâneos com o ob- jetivo de subsidiar e ampliar a compreensão dos assuntos mais debatidos na atualidade. As atividades propostas priorizam a análise, a avaliação e o posicionamento perante situações sistematizadas, assim como aplicam conhecimentos relativos aos conteúdos privilegiados nas unidades de trabalho. Além disso, é apresentada uma diversidade de questões relacionadas ao ENEM e aos vestibulares das principais universidades de cada região brasileira. Desejamos a você, aluno, com a utilização deste material, a aquisição de autonomia intelectual e a você, professor, sucesso nas escolhas pedagógicas para possibilitar o aprofundamento do conhecimento de forma prazerosa e eficaz. Gerente Editorial Modernismo – Primeira Fase

Modernismo – Primeira Faseprepapp.positivoon.com.br › assets › Modular › LEITURA... · Vanguardas no Brasil 23 Semana de Arte Moderna 26 Modernismo em Portugal 29 Unidade

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APRESENTAÇÃO

Este módulo faz parte da coleção intitulada MATERIAL MODULAR, destinada às três

séries do Ensino Médio e produzida para atender às necessidades das diferentes rea-

lidades brasileiras. Por meio dessa coleção, o professor pode escolher a sequência que

melhor se encaixa à organização curricular de sua escola.

A metodologia de trabalho dos Modulares auxilia os alunos na construção de argumen-

tações; possibilita o diálogo com outras áreas de conhecimento; desenvolve as capaci-

dades de raciocínio, de resolução de problemas e de comunicação, bem como o espírito

crítico e a criatividade. Trabalha, também, com diferentes gêneros textuais (poemas,

histórias em quadrinhos, obras de arte, gráficos, tabelas, reportagens, etc.), a fim de

dinamizar o processo educativo, assim como aborda temas contemporâneos com o ob-

jetivo de subsidiar e ampliar a compreensão dos assuntos mais debatidos na atualidade.

As atividades propostas priorizam a análise, a avaliação e o posicionamento perante

situações sistematizadas, assim como aplicam conhecimentos relativos aos conteúdos

privilegiados nas unidades de trabalho. Além disso, é apresentada uma diversidade de

questões relacionadas ao ENEM e aos vestibulares das principais universidades de cada

região brasileira.

Desejamos a você, aluno, com a utilização deste material, a aquisição de autonomia

intelectual e a você, professor, sucesso nas escolhas pedagógicas para possibilitar o

aprofundamento do conhecimento de forma prazerosa e eficaz.

Gerente Editorial

Modernismo – Primeira Fase

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DIRETOR-SUPERINTENDENTE:

DIRETOR-GERAL:

DIRETOR EDITORIAL:

GERENTE EDITORIAL:

GERENTE DE ARTE E ICONOGRAFIA:AUTORIA:

ORGANIZAÇÃO:EDIÇÃO:

ANALISTA DE ARTE:PESQUISA ICONOGRÁFICA:

CARTOGRAFIA:ILUSTRAÇÕES:

PROJETO GRÁFICO:EDITORAÇÃO:

CRÉDITO DAS IMAGENS DE ABERTURA E CAPA:

PRODUÇÃO:

IMPRESSÃO E ACABAMENTO:

CONTATO:

Ruben Formighieri

Emerson Walter dos Santos

Joseph Razouk Junior

Maria Elenice Costa Dantas

Cláudio Espósito GodoyNathalia Saliba Dias / Sergio Augusto KalilSergio Augusto KalilJeferson FreitasTatiane Esmanhotto KaminskiSabrina FerreiraJulio Manoel França da SilvaJack Art / Maurício NegroO2 ComunicaçãoSinal Gráfico / Arowak© iStockphoto.com/kemie; © Thinkstock/Jupiterimages; © Shutterstock/iofoto; © Dreamstime.com/DmccaleEditora Positivo Ltda.Rua Major Heitor Guimarães, 17480440-120 Curitiba – PRTel.: (0xx41) 3312-3500 Fax: (0xx41) 3312-3599Gráfica Posigraf S.A.Rua Senador Accioly Filho, 50081300-000 Curitiba – PRFax: (0xx41) 3212-5452E-mail: [email protected]@positivo.com.br

© Editora Positivo Ltda., 2013Proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio, sem autorização da Editora.

Todos os direitos reservados à Editora Positivo Ltda.

Neste livro, você encontra ícones com códigos de acesso aos conteúdos digitais. Veja o exemplo:

Acesse o Portal e digite o código na Pesquisa Escolar.

@LIT030Autores e obras

da literatura

brasileira

@LIT030

Dados Internacionais para Catalogação na Publicação (CIP)(Maria Teresa A. Gonzati / CRB 9-1584 / Curitiba, PR, Brasil)

D541 Dias, Nathalia Saliba.Ensino médio : modular : literatura : modernismo, primeira fase / Nathalia Saliba

Dias, Sergio Augusto Kalil ; ilustrações Jack Art, Maurício Negro – Curitiba : Positivo, 2013.

: il.

ISBN 978-85-385-7079-0 (livro do aluno)

ISBN 978-85-385-7080-6 (livro do professor)

1. Literatura. Ensino médio – Currículos. I. Kalil, Sergio Augusto. II. Art, Jack. III. Negro, Maurício. IV. Título.

CDU 373.33

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SUMÁRIO

Unidade 1: Vanguardas europeias e Semana de Arte Moderna

Vanguardas europeias 12

Vanguardas no Brasil 23

Semana de Arte Moderna 26

Modernismo em Portugal 29

Unidade 2: Primeira Geração Modernista: poesia

Primeira Geração Modernista 36

Revistas e manifestos 36

Oswald de Andrade 40

Manuel Bandeira 44

Menotti del Picchia 48

Raul Bopp 51

Mário de Andrade 52

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Moderno [Do lat. modernu]. Adj. 1. Dos tempos atuais ou mais

próximos de nós; recente: filosofia moderna; autor moderno. 2. Atual,

presente, hodierno: a vida moderna. 3. Modernista (1 a 3): a poesia

moderna; autor moderno. 4. Que está na moda: vestido moderno.

5. Restr. Diz-se das manifestações artísticas e literárias do séc. XX.

6. Bras., BA Moço, jovem. [...]. S.m. 8. Aquilo que é moderno ou ao

gosto moderno: aperfeiçoar o moderno na arquitetura.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio da língua portuguesa.

5. ed. Curitiba: Positivo, 2010. p. 1410.

Vanguardas europeias e Semana de Arte Moderna

1

4 Modernismo – Primeira Fase

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O que estava acontecendo com este mundo?

DEBRET, Jean-Baptiste. Real Teatro de São João, no Largo do Rocio. 1834. 1 litogra-fia. Museu Castro Maya, Rio de Janeiro.

RENOIR, Pierre-Auguste. O baile no Moulin de La Galette. 1876. 1 óleo sobre tela, color., 131 cm x 175 cm. Museu d'Orsay, Paris.

Final do século XIX

Início do século XX

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Poltrona Wassily,

desenhada em 1925,

por Marcel Breuer

Moda do fim do século XIX

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Novos ritmos na dança. Em destaque, Josephine Baker

Rio de Janeiro do início do século XX

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Acessório típico do século XIX

Ensino Médio | Modular 5

LITERATURA BRASILEIRA

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Tanques, navios a vapor, dirigíveis e aviões atuantes na Primeira Guerra Mundial: tecnologia de ponta para a época

A expansão política e econômica de grandes potências do fim do século XIX, como Inglaterra, Alemanha, França, começou a entrar em colapso, o que desencadeou uma disputa cada vez mais acirrada pelos domínios dos mercados consumidores. Na verdade, esses países não tinham mais para onde expandir comercialmente, o que gerou no continente europeu um estado de incerteza quanto ao futuro.

O desenvolvimento tecnológico que acompanhava a industrialização foi mobilizado para a indústria bélica e a corrida armamentista se consolidou como meta a ser seguida por todos os países.

Havia um clima de guerra na Europa e a diplomacia não foi suficiente para conter e organizar os interesses das grandes potências europeias. Iniciava-se, assim, a Primeira Guerra Mundial, com novos armamentos, como tanques, aviões, armas químicas, etc.

Observe novamente as imagens. Percebe-se que houve um conjunto de mudanças tecnológicas, sociais e culturais ocorridas na transição entre os séculos XIX e XX. Quais foram as mudanças mais significativas entre um período e outro?

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6 Modernismo – Primeira Fase

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As grandes cidades passavam também a viven-ciar, em seu cotidiano, os efeitos dos tempos mo-

dernos. A difusão do automóvel e da eletrici-dade, por exemplo, somou-se ao aumento da

população nos grandes centros e impôs às cidades uma diferente organização urba-

na, capaz de suportar a velocidade, a aglomeração e a mecanização.

A Paris do início do século XX tornou-se um ícone da modernidade dos novos tempos

Ford 1928: um dos primeiros modelos de automóvel comercializados em larga escala no Brasil. Um símbolo de velocidade e sucesso para sua época. Seu idealiza-

dor, Henry Ford, fundador da Ford Motor Company, foi o primeiro empresário do ramo automobilístico a produzir

automóveis em série

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Esse é o momento em que o automóvel começa a surgir nas cidades. Ao mesmo tempo que essa nova forma de transporte vira sinônimo de status, sofisticação e beleza para seus usuários, ela se inseria perfeitamente na atmosfera de industrialização e de exaltação da vida moderna. O automóvel torna-se, portanto, um ícone dos novos e velozes tempos.

O dia 31 do mês de agosto de 1914Eu parti de Deauville um pouco antes da meia-noiteNo carrinho de Rouveyre

Junto com seu chofer nós éramos trêsNós demos adeus a toda uma épocaGigantes furiosos se erguiam por toda a EuropaAs águias deixavam seus ares aguardando pelo solOs peixes vorazes subiam dos abismosOs povos acorriam para se conhecer a fundoOs mortos estremeciam de medo nas suas moradas sombrias

[...]E quando depois de ter passado à tardePor FontainebleauNós chegamos a Paris No momento em que fixavam cartazes da mobilizaçãoNós compreendemos meu camarada e euQue o carrinho nos havia conduzido a uma época NovaE se bem que sendo já ambos dois homens maduros,Nós no entanto acabávamos de nascer.

Leia um trecho do poema “La petite auto”, de Guillaume Apollinaire:

La petite auto (O pequeno carro)

APOLLINAIRE, Guillaume. La petite auto. In: SEVCENKO, Nicolau. Orfeu extático na metrópole: São Paulo, sociedade e cultura nos frementes anos 20. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. p. 153.

Getty Images/Popperfoto

Ensino Médio | Modular 7

LITERATURA BRASILEIRA

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Agora, responda:

No poema, o “eu lírico” relata sua saída de uma cidade da França – Deauville – rumo à capital, Paris. Seu meio de transporte é um pequeno automóvel. Com base na leitura e em seus conhecimentos de história, por que o “eu lírico” afirma que esse meio de transporte o leva a uma época nova?

Na França, as cidades de Deauville e Paris

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Fonte: ATLAS geográfico escolar. Rio de Janeiro: IBGE, 2007. Adaptação.

Modernismo – Primeira Fase8

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Se no início do século XX o automóvel era uma novidade luxuosa, hoje ele já faz parte do cotidiano das pessoas. Nas maiores metrópoles do mundo, o uso de carros é, inclusive, um sério problema. Além de prejudicar extremamente o meio ambiente por ainda operar em boa parte dos países com combustíveis fósseis, a frota de automóveis no mundo hoje supera a capacidade de trânsito das cidades. Isso ocasiona engarrafamentos que, para serem leve e temporariamente controlados, aca-bam exigindo severas e constantes medidas de reurbanização. Essas medidas, não raro, afetam a dinâmica das cidades, fazendo com que espaços aproveitáveis, com lazer, circulação de pedestres, comércio, deem lugar a vias de tráfego.

Outro problema é o fato de as pessoas continuarem aderindo à compra desse bem como um ícone de status. Isso faz com que vários automóveis em condições adequadas de uso sejam des-cartados. E, à medida que a velocidade da reciclagem de materiais não acompanha a do descarte, a sucata acumula-se no ambiente, o que agrava a situação crítica do acúmulo do lixo.

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Agora, reflita:

Atualmente, o automóvel tem o mesmo status de modernidade, luxo, beleza e inovação que deti-nha no início do século XX? Por quê? O modo como se usam os automóveis é adequado à realidade contemporânea?Justifique.

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Diante de um cenário em que degradação e progresso, derrocada econômica e abertura de mercados convivem, novas ideias e filosofias, ora concordantes, ora discrepantes entre si emergem. A efervescência cultural do início do último século justifica-se, em grande parte, pela convivência de concepções antagônicas de mundo, em um mesmo cenário artístico. Haverá os que defenderão a tecnologia e a ciência como os novos amparos da civilização. Com eles, o abandono da tradição, da ancestralidade, do peculiar em cada cultura e a ascensão da ideia de uma nova cultura universal pautada pela velocidade e transitoriedade. E, ao mesmo tempo, surgirão facções da sociedade dedicadas a resgatar a identidade cultural de regiões e povos específicos, ou mesmo dispostas a buscar o original da civilização, resgatando elementos culturais de sociedades admitidas então como “primitivas” e, portanto, dotadas de uma espécie de energia pura e de beleza exótica.

LITERATURA BRASILEIRA

9Ensino Médio | Modular

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A moda encurtou as saias e os cabelos femininos e, com isso, novos e liberais modelos de comportamento começaram a surgir se comparados aos do século anterior.

Até praticamente o início do século XX, cabia à mulher o trabalho de cuidar de seus filhos e zelar pela casa. Ao homem, era destinado o trabalho de prover o sustento de sua família. Essa posição foi, aos poucos, modificando-se, pois a mulher começou a ter um novo papel social. A situação econômica exigiu que ela se inserisse no mercado de trabalho, principalmente depois da Grande Depressão nos Estados Unidos. Na década de 1910, por exemplo, a estilista Coco Chanel surge para o mundo da moda e começa a revolucionar o modo de vestir fe-minino, com seus chapéus e ternos clássicos. Seu nome vira sinônimo de beleza, elegância e sofisticação.

Esses novos tempos que buscavam se caracterizar como de rompimento com ideias obsoletas e antigos tabus permitem, por exemplo, o surgimento da primeira estrela negra das artes cênicas nos Estados Unidos e na Europa: Josephine Baker.

Em muitas de suas apresentações, Josephine se destacava pela sensualidade, exotismo e novos e ousados ritmos de dança, como o charleston. Isso a tornou um dos símbolos de talento e de elegância de seu tempo. Sua arte se inseria perfeitamente no contexto do Moder-nismo europeu, pois nela havia muito de ruptura, ousadia, exotismo e agitação para sua época.

Josephine Baker (1906-1975), nascida nos Estados Unidos e naturalizada francesa, ícone de exotismo e sensualidade, é considerada a primeira estrela negra da música e das artes cênicas

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Em sua opinião, o que seria hoje nas artes, ou mesmo no cotidiano, uma ousadia, uma ruptura com os costumes e padrões estabelecidos?Depois, produza, em seu caderno, um comentário a respeito dessa questão.

Agora, leia os dois trechos a seguir. Ambos definem encontros dançantes típicos de sua época.

TEXTO 1O sarau

Um sarau é o bocado mais delicioso que temos, de telhados abaixo. Em um sarau todo o mundo tem que fazer. O diplomata ajusta, com um copo de champanha na mão, os mais intrincados negócios; todos murmuram e não há quem deixe de ser murmurado. O velho lembra-se dos minuetes e das cantigas do seu tempo, e o moço goza todos os regalos da sua época; as moças são no sarau como as estrelas no céu; estão no seu elemento; aqui uma, cantando suave cavatina, eleva-se vaidosa nas asas dos aplausos, por entre os quais surde, às vezes, um bravíssimo inopinado, que solta de lá da sala do jogo o parceiro que acaba de ganhar sua partida do écarté mesmo na ocasião em que a moça se espicha completamente, desafinando um sustenido; daí a pouco vão outras pelo braço de seus pares, se deslizando pela sala e marchando em seu passeio, mais a compasso que qualquer de nossos batalhões da Guarda Nacional, ao mesmo tempo que conversam sempre sobre objetos inocentes que movem olhaduras e risadinhas apreciáveis. Outras criticam de uma gorducha vovó, que ensaca nos bolsos meia bandeja de doces que vieram para o chá, e que ela leva aos pequenos que, diz, lhe ficaram em casa. Ali vê-se um ataviado dândi que dirige mil finezas a uma senhora idosa, tendo os olhos pregados na

Mulheres do início do século XX e a estilista Coco Chanel, um dos ícones de elegância do século passado

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Com certeza, a sua geração também parti-cipa de “encontros dançantes”. Como são esses eventos para os jovens de hoje? Que nome recebem? Quais as práticas e costu-mes que mais se distinguem das narradas nas cenas? Que mudanças na sociedade essa alteração de comportamentos e ex-pectativas traduz?Em trios, pesquise a respeito desses “en-contros dançantes”. Depois, com os dados coletados, produzam um texto dissertativo e apresentem-no à turma.

sinhá, que senta-se ao lado. Finalmente, no sarau não é essencial ter cabeça nem boca, porque, para alguns é regra, durante ele, pensar pelos pés e falar pelos olhos.

E o mais é que nós estamos num sarau: inúmeros batéis conduziram da corte para a ilha de... senhoras e senhores, recomendáveis por caráter e qualidade: alegre, numerosa e escolhida sociedade enche a grande casa, que brilha e mostra em toda a parte borbulhar o prazer e o bom gosto.

[...]

MACEDO, Joaquim Manuel de. A moreninha. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bn000008.pdf>. Acesso em: 4 set. 2011.

TEXTO 2Na orquestra o negro de casaco vermelho afastava o saxofone da beiçorra para gritar:Dizem que Cristo nasceu em Belém...Porque os pais não a haviam acompanhado (abençoado furúnculo inflamou o pescoço do

Conselheiro José Bonifácio) ela estava achando um suco aquela vesperal do Paulistano. O namorado ainda mais.

Os pares dançarinos maxixavam colados. No meio do salão eram um bolo tremelicante. Dentro do círculo palerma de mamãs, moças feias e moços enjoados. A orquestra preta tonitroava. Alegria de vozes e sons. Palmas contentes prolongaram o maxixe. O banjo é que ritmava os passos.

MACHADO, Antônio de Alcântara. Brás, Bexiga e Barra Funda. Rio de Janeiro: Garnier, 2002. p. 71.

Um suco: uma beleza, uma conveniência.Vesperal: tipo de encontro dançante festivo.Maxixavam: dançavam o maxixe, ritmo de salão brasileiro cujas influências derivam da cultura afro.

Você observou que Joaquim Macedo e Alcântara Machado narraram eventos dan-çantes da juventude de sua época. Nessas narrativas, deixaram claros não só hábitos so-ciais, mas também a linguagem que caracte-rizava a literatura de cada um dos momentos.

E se hoje, você, como escritor, fosse transmitir às gerações futuras uma imagem literária das “baladas” de que participa, como seria? Escreva, no caderno, um pequeno re-trato literário dos “encontros dançantes” do seu tempo.

Agora, responda:

Um dos textos retrata um baile sob a perspectiva romântica. O outro é modernista. Que características de cada um deles nos levam a concluir isso?

Ensino Médio | Modular 11

LITERATURA BRASILEIRA

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Neste bimestre, você vai estudar o movimento modernis-ta. No Brasil, ele se instaurou, oficialmente, com a Semana de Arte Moderna, em 1922. O Modernismo, com a vasta série de concepções filosóficas, artísticas e culturais que o forma, foi extremamente representativo mundialmente. Suas influ-ências na nossa cultura ainda estão presentes, assim como grande parte das teorias artísticas e literárias do período continuam orientando os estudos nessas áreas. O conceito de moderno, como se pode perceber na frase de abertura, já estava presente no mundo latino clássico. E lá, como ao

longo de toda a história, evocou a imagem de um elemento que supera seus anteriores em novidade e frescor original. A cada período histórico, o ser humano concebe, então, novos elementos modernos. O início do século XX, porém, assistiu à formação de um grupo intelectual e de uma vertente cultural que decidiu propor essa busca, das mais diversas maneiras, mas seriamente a ponto de se denominar modernista.

Para conhecer o Modernismo na literatura e, consequen-temente, na arte nacional, é fundamental enquadrar o con-texto brasileiro no panorama internacional.

O escritor, jornalista e ativista político Filippo Tommaso Marinetti, autor

do Manifesto Futurista, um dos mais importantes movimentos artísticos do

início do século XX

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Vanguardas europeias

No início do século XX, enquanto o mundo assistia a mudanças sociais, econômicas e tecnológicas, a arte passava a buscar maneiras de expressar a modernidade, a instabilidade, a fugacidade de um novo presente. Nascem, assim, as primeiras reações ao modelo poético e estético do cenário artístico vigente no fim do século XIX. Reflexões e manifestações contrárias a esse modelo surgem das mais diversas maneiras, mas sempre colocando em destaque a necessidade de superar o antigo e instaurar, nas artes, paradigmas compatíveis com um mundo repleto de avanços tecnológicos, concepções e valores contrastantes com os dos séculos anteriores. Entram em cena, nesse momento, as vanguardas europeias, expressão que concentra as diversas correntes artísticas dos princípios do século XX. Essas vanguardas fazem parte de um movimento aglutinador dessas novas posturas poéticas, filosóficas e estéticas, o Modernismo.

FuturismoEm 1909, o poeta italiano Filippo Tommaso Marinetti (1876-1944) publica o Manifesto Futurista. Essa publicação marca o início de um dos movimentos mais significativos das vanguardas, o

Futurismo. Nesse texto, o autor aborda uma série de elementos que viriam a caracterizar a arte do período. A vontade de apontar a ruptura com as ideias e os valores correntes até então é levada ao extremo. A vanguarda deveria livrar-se de quaisquer laços com o passado. E, para isso, seria necessário optar por posições radicais.

Leia, a seguir, as novas regras de pensa-mento e de fazer poético que Marinetti propõe em seu manifesto:

Os movimentos

da Vanguarda

Europeia:

Expressionismo,

Cubismo,

Futurismo,

Dadaísmo e

Surrealismo

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Modernismo – Primeira Fase12

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Manifesto Futurista[...]

1. Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito da energia e da temeridade.

2. A coragem, a audácia, a rebelião serão elementos essenciais de nossa poesia.

3. A literatura exaltou até hoje a imobilidade pensativa, o êxtase, o sono. Nós queremos exaltar o movimento agressivo, a insônia febril, o passo de corrida, o salto mortal, o bofetão e o soco.

4. Nós afirmamos que a magnificência do mundo enriqueceu-se de uma beleza nova: a beleza da velocidade. Um automóvel de corrida com seu cofre enfeitado com tubos grossos, semelhantes a serpentes de hálito explosivo... um automóvel rugidor, que parece correr sobre a metralha, é mais bonito que a Vitória de Samotrácia.

5. Nós queremos entoar hinos ao homem que segura o volante, cuja haste ideal atravessa a Terra, lançada também numa corrida sobre o circuito da sua órbita.

6. É preciso que o poeta prodigalize com ardor, fausto e munificiência, para aumentar o entusiástico fervor dos elementos primordiais.

7. Não há mais beleza, a não ser na luta. Nenhuma obra que não tenha um caráter agressivo pode ser uma obra-prima. A poesia deve ser concebida como um violento assalto contra as forças desconhecidas, para obrigá-las a prostar-se diante do homem.

8. Nós estamos no promontório extremo dos séculos!... Por que haveríamos de olhar para trás, se queremos arrombar as misteriosas portas do Impossível? O Tempo e o Espaço morreram ontem. Nós já estamos vivendo no absoluto, pois já criamos a eterna velocidade onipresente.

9. Nós queremos glorificar a guerra – única higiene do mundo – o militarismo, o patriotismo, o gesto destruidor dos libertários, as belas ideias pelas quais se morre e o desprezo pela mulher.

10. Nós queremos destruir os museus, as bibliotecas, as academia de toda natureza, e combater o moralismo, o feminismo e toda vileza oportunista e utilitária.

11. Nós cantaremos as grandes multidões agitadas pelo trabalho, pelo prazer ou pela sublevação; cantaremos as marés multicores e polifônicas das revoluções nas capitais modernas; cantaremos o vibrante fervor noturno dos arsenais e dos estaleiros incendiados por violentas luas elétricas; as estações esganadas, devoradoras de serpentes que fumam; as oficinas penduradas às nuvens pelos fios contorcidos de suas fumaças; as pontes, semelhantes a ginastas gigantes que cavalgam os rios, faiscantes ao sol com um luzir de facas; os piróscafos aventurosos que farejam o horizonte, as locomotivas de largo peito, que pateiam sobre os trilhos, como enormes cavalos de aço enleados de carros; e o voo rasante dos aviões, cuja hélice freme ao vento, como uma

bandeira, e parece aplaudir como uma multidão entusiasta.É da Itália, que nós lançamos pelo mundo este nosso

manifesto de violência arrebatadora e incendiária, com o qual fundamos hoje o "Futurismo", porque queremos libertar este país de sua fétida gangrena de professores, de arqueólogos, de cicerones e de antiquários.

Já é tempo de a Itália deixar de ser um mercado de belchiores. Nós queremos libertá-la dos inúmeros museus que a cobrem toda de inúmeros cemitérios.

Museus: cemitérios!... Idênticos, na verdade, pela sinistra promiscuidade de tantos corpos que não se conhecem. Museus: dormitórios públicos em que se descansa para sempre junto a seres odiados ou desconhecidos! Museus: absurdos matadouros de pintores e escultores, que se vão trucidando ferozmente a golpes de cores e linhas, ao longo das paredes disputadas!

Que se vá lá em peregrinação, uma vez por ano, como se vai ao Cemitério no dia de finados... Passe. Que uma vez por ano se deponha uma homenagem de flores diante da Gioconda, concedo...

Mas não admito que se levem passear, diariamente pelos museus, nossas tristezas, nossa frágil coragem, nossa inquietude doentia, mórbida. Para que se envenenar? Para que apodrecer?

E o que mais se pode ver, num velho quadro, senão a fatigante contorção do artista que se esforçou para infrigir as insuperáveis barreiras opostas ao desejo de exprimir inteiramente seu sonho?... Admirar um quadro antigo equivale a despejar nossa sensibilidade numa urna funerária, no lugar de projetá-la longe, em violentos jatos de criação e de ação.

Vocês querem, pois, desperdiçar todas as suas melhores forças nesta eterna e inútil admiração do passado, da qual vocês só podem sair fatalmente exaustos, diminuídos e pisados?

Em verdade eu lhes declaro que a frequência diária aos museus, às bibliotecas e às academias (cemitérios de esforços vãos, calvários de sonhos crucificados, registro de arremessos truncados!...) é para os artistas tão prejudicial, quanto a tutela prolongada dos pais para certos jovens ébrios de engenho e de vontade ambiciosa. Para os moribundos, para os enfermos, para os prisioneiros, vá lá: – o admirável passado é, quiçá, um bálsamo para seus males, visto que para eles o porvir está trancado... Mas nós não queremos nada com o passado, nós, jovens e fortes futuristas!

E venham, pois, os alegres incendiários de dedos carbonizados! Ei-los! Ei-los!... Vamos! Ateiem fogo às estantes das bibliotecas!... Desviem o curso dos canais, para inundar os museus!... Oh! a alegria de ver booiar à deriva, laceradas e desbotadas sobre aquelas águas, as velhas telas gloriosas!... Empunhem as picaretas, os machados, os martelos e destruam sem piedade as cidades veneradas!

MARINETTI, Felippo Tommaso. Manifesto do Futurismo. In: TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda europeia e modernismo brasileiro. Petrópolis: Vozes, 1995. p. 91-92.

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LITERATURA BRASILEIRA

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Observe uma das mais importantes obras do Futurismo. Nela, ficam evidentes os esforços futuristas por demonstrar a velocidade, o movimento e o dinamismo das formas.

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Praticamente o mesmo ocorre nesta escultura de Umberto Boccioni, um dos mais ativos represen-tantes futuristas. Observe:

Agora, releia o seguinte trecho do Manifesto Futurista:

“Nós afirmamos que a magnificência do mundo enriqueceu-se de uma beleza nova: a beleza da velocidade. Um automóvel de corrida com seu cofre enfeitado com tubos grossos, semelhantes a serpentes de hálito explosivo... um automóvel rugidor, que parece correr sobre a metralha, é mais bonito que a Vitória de Samotrácia.”

1. Qual é a correlação entre essas duas obras ar-tísticas e as ideias do manifesto futurista?

2. Pode-se afirmar que a obra de Umberto Boccioni é futurista? Por quê?

3. Leia um trecho polêmico do manifesto:

“Nós queremos glorificar a guerra – única higiene do mundo – o militarismo, o patriotismo, o gesto destruidor dos libertários, as belas ideias pelas quais se morre e o desprezo pela mulher.”

Antes de ser lido apenas como uma exaltação do preconceito ou da violência gratuita, esse tópico se vincula a outras ideias do manifesto e, de maneira radical, dá ênfase a elas. Quais seriam essas ideias?

4. Sendo a ideia de futuro uma das características do movimento, explique o seguinte excerto do manifesto:

“Nós queremos destruir os museus, as bibliotecas, as academia de toda natureza [...]”

BALLA, Giacomo. Dinamismo de um cão na coleira. 1911. 1 óleo sobre tela, color., 91 cm x 100 cm. Coleção George Goodyear, Buffalo.

BOCCIONI, Umberto. Formas únicas de continuidade no espaço. 1913. 1 escultura em bronze. 110 cm. Museu de Arte Moderna, Nova Iorque.

Modernismo – Primeira Fase14

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O mundo moderno, a era da industrialização, a exaltação da máquina e da velocidade, associadas, e o elogio à tecno-logia e à ciência consolidam-se, então, como características da estética futurista.

Os participantes desse movimento, como Felippo Marinetti, Umberto Boccioni, Giacomo Balla, entre outros, defendiam que a vida estava em movimento constante e frenético. Portanto, a arte do passado, entendida por eles como essencialmente burguesa, não se conectava com as características mais marcantes de seu momento histórico e cultural. Era, pois, necessário inserir o dinamismo e a simultaneidade nas artes. Do mesmo modo, era importante fazer com que a perspectiva artística absorvesse os valores do momento. O que se via era a violência, a brutalidade da

máquina, nada delicado ou sutil. Esse espírito de época torna-se paradigmático na proposta futurista e determina a ênfase na ação e na pesquisa do movimento, como se pode notar no tópico 2 do manifesto.

Quanto à linguagem, os futuristas propunham a destrui-ção da sintaxe, com os substantivos dispostos ao acaso, as palavras devem ficar em liberdade; abolição do adjetivo e do advérbio; substituição dos sinais de pontuação por signos matemáticos, como (x – : + = > <); emprego do verbo no infinitivo; que cada substantivo venha imediatamente seguido de outro, analógico, como homem-torpedo, café- -concerto, etc.; liberdade absoluta no uso de imagens e ana-logias expressas por palavras soltas, sem os fios condutores da sintaxe, sem limites de pontuação, etc.

O autor paulista Antônio de Alcântara Machado publicou, em 1927, um livro de contos chamado Brás, Bexiga e Barra Funda.

Essa obra, uma das mais importantes da literatura modernista no Brasil, contém muitos elemen-tos que demonstram nítida influência do Futurismo. Leia um fragmento do conto Sociedade. Nele, é perceptível a tentativa do autor em expressar a simultaneidade de ações.

Sociedade[...]Na orquestra o negro de casaco vermelho afastava o saxofone da beiçorra para gritar:Dizem que Cristo nasceu em Belém...Porque os pais não a haviam acompanhado (abençoado furúnculo inflamou o pescoço do Conselheiro

José Bonifácio) ela estava achando um suco aquela vesperal do Paulistano. O namorado ainda mais.Os pares dançarinos maxixavam colados. No meio do salão eram um bolo tremelicante. Dentro

do círculo palerma de mamãs, moças feias e moços enjoados. A orquestra preta tonitroava. Alegria de vozes e sons. Palmas contentes prolongaram o maxixe. O banjo é que ritmava os passos.

– Sua mãe me fez ontem uma desfeita na cidade.– Não!– Como não? Sim senhora. Virou a cara quando me viu.... mas a história se enganou!As meninas de ancas salientes riam porque os rapazes contavam episódios de farra muito engraçados.

O professor da Faculdade de Direito citava Rui Barbosa para um sujeitinho de óculos. Sob a vaia do saxofone: turururu-turururum!

– Meu pai quer fazer um negócio com o seu.– Ah sim?Cristo nasceu na Bahia, meu bem...O sujeitinho de óculos começou a recitar Gustave Le Bon mas a destra espalmada do catedrático

o engasgou. Alegria de vozes e sons.... e o baiano criou! [...]

MACHADO, Antônio de Alcântara. Brás, Bexiga e Barra Funda. Rio de Janeiro: Garnier, 2002. p. 71-72.

1. Que acontecimentos simultâneos podemos destacar no trecho do conto?

2. Como a linguagem tenta expressar a simultaneidade em que todos esses aconteci-mentos transcorrem?

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LITERATURA BRASILEIRA

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Sua impressão: a rua é que andava, não ele. Passou entre o verdureiro de grandes bigodes e a mulher de cabelo despenteado.

– Vá roubar no inferno, Seu Corrado!Vá sofrer no inferno, Seu Nicolino! Foi o que ele ouviu

de si mesmo.– Pronto! Fica por quatrocentão.– Mas é tomate podre, Seu Corrado!Ia indo na manhã. A professora pública estranhou

aquele ar tão triste. As bananas na porta da QUITANDA TRIPOLI ITALIANA eram de ouro por causa do sol. O Ford derrapou, maxixou, continuou bamboleando. E as chaminés das fábricas apitavam na Rua Brigadeiro Machado.

Não adiantava nada que o céu estivesse azul porque a alma de Nicolino estava negra.

– Ei, Nicolino! NICOLINO!– Que é?– Você está ficando surdo, rapaz! A Grazia passou

agorinha mesmo.– Des-gra-ça-da!– Deixa de fita. Você joga amanhã contra o Esmeralda?– Não sei ainda.– Não sabe? Deixa de fita, rapaz! Você...– Ciao.– Veja lá, hein! Não vá tirar o corpo na hora. Você é a

garantia da defesa.A desgraçada já havia passado.

Ao Barbeiro Submarino. Barba: 300 réis.Cabelo: 600 Réis. Serviço Garantido.

– Bom dia!Nicolino Fior d'Amore nem deu resposta. Foi entrando,

tirando o paletó, enfiando outro branco, se sentando no fundo a espera dos fregueses. Sem dar confiança. Também Seu Salvador nem ligou.

A navalha ia e vinha no couro esticado.– São Paulo corre hoje! É o cem contos!O Temístocles da Prefeitura entrou sem colarinho.– Vamos ver essa barba muito bem feita! Ai, ai! Calor

pra burro. Você leu no Estado o crime de ontem, Salvador? Banditismo indecente.

– Mas parece que o moço tinha razão de matar a moça.– Qual tinha razão nada, seu! Bandido! Drama de amor

cousa nenhuma. E amanhã está solto.

Agora, leia outro conto de Alcântara Machado:

Amor e sanguePrivações de sentidos. Júri indecente, meu Deus do

Céu! Salvador, Salvador... – cuidado aí que tem uma espinha – ... este país está perdido!

– Todos dizem.Nicolino fingia que não estava escutando. E assobiava

a Scugnizza.As fábricas apitavam.Quando Grazia deu com ele na calçada abaixou a

cabeça e atravessou a rua.– Espera aí, sua fingida.– Não quero mais falar com você.– Não faça mais assim pra mim, Grazia. Deixa que eu

vá com você. Estou ficando louco, Grazia. Escuta. Olha, Grazia! Grazia! Se você não falar mais comigo eu me mato mesmo. Escuta. Fala alguma cousa por favor.

– Me deixa! Pensa que eu sou aquela fedida da Rua Cruz Branca?

– O quê?– É isso mesmo.E foi almoçar correndo.Nicolino apertou o fura-bolos entre os dentes.As fábricas apitavam.Grazia ria com a Rosa.– Meu irmão foi e deu uma bruta surra na cara dele.– Bem feito! Você é uma danada, Rosa. Xi!...Nicolino deu um pulo monstro.– Você não quer mesmo mais falar comigo, sua

desgraçada?– Desista!– Mas você me paga, sua desgraçada!– Nã-ã-o!A punhalada derrubou-a.– Pega! Pega! Pega!– Eu matei ela porque estava louco, Seu Delegado!Todos os jornais registraram essa frase que foi dita

chorando.

Eu estava louco Seu Delegado! BisMatei por isso! Sou um desgraçado!

O estribilho do Assassino por amor (Canção da atualidade para ser cantada com a música do “FUBÁ”, letra de Spartaco Novais Panini) causou furor na zona.

MACHADO, Antônio de Alcântara. Brás, Bexiga e Barra Funda. Rio de Janeiro: Garnier, 2002. p. 61-66.

Modernismo – Primeira Fase16

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1. Nesse conto, também é possível encontrar características que o vinculam ao Futurismo. Quais são elas?

2. Outro elemento que chama atenção no con-to é a linguagem. Alcântara Machado privile-gia elementos orais e populares ou formais e mais característicos da escrita documental, por exemplo? Justifique sua resposta.

Antônio de Alcântara Machado (1901-1935) é um contista brasileiro da primeira fase do Modernismo. Em sua obra Brás, Bexiga e Barra Funda, de 1927, os contos se revelam como flashes do cotidiano paulista nos anos 20. Ao utilizar as técnicas modernistas da simulta-neidade, do estilo telegráfico, Alcântara Machado compõe um dos mais importantes textos dessa fase da literatura brasileira. Sua linguagem, além de ser inovadora por suas caracterís-ticas, o é, sobretudo, por incorporar estrangeirismos e corruptelas do sotaque dos imigrantes italianos instalados nos bairros paulistas.

CubismoO quadro Les Demoiselles d'Avignon, de Pablo Picasso (1881-1973), é uma espécie de marco inicial

do Cubismo, movimento artístico oficialmente iniciado em 1907.

A estética cubista nasce, pois, aplicada à pintura. Seus preceitos, no entanto, estendem--se às demais manifestações artísticas ao longo do século XX. Georges Braque, um dos ideali-zadores desse movimento, costumava admitir que “não se imita aquilo que se quer criar”. Tal preceito foi uma das bases do Cubismo. Os ar-tistas que a ele aderiam não se esforçavam em imitar a natureza, ou mesmo a perspectiva mais comum, sob a qual o olhar humano usualmente percebe um ambiente ou objeto. Aos cubistas, não importava explorar um só ponto de vista em suas obras, mas antes tentar fornecer vários deles, todas as perspectivas possíveis do olhar sobre um elemento – e ao mesmo tempo. Isso os levou a segmentar e fragmentar imagens. Para tanto, frequentemente eram emprega-das nas artes visuais formas geometrizadas, volumes marcados por arestas, vários planos estilhaçados e/ou mostrados simultaneamente, à ideia de sólidos geométricos, cubos. Por isso a designação cubista.

PICASSO, Pablo. Les Demoiselles d'Avignon. 1907. 1 óleo sobre tela, color., 2,44 m x 2,34 m. The Museum of Modern Art, Nova Iorque.

LITERATURA BRASILEIRA

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No Cubismo, a colagem representou a liberda-de do artista do jugo da superfície. Ao expor no espaço do quadro elementos retirados da realidade, como pedaços de jornal e papéis de todo tipo, tecido, madeira, objeto, etc.

Observe esta obra do artista plástico cubista Georges Braque. Preste atenção à fragmentação da figura da mulher e da guitarra e ao modo como esses elementos surgem de ângulos distintos.

O Cubismo também desenvolveu e valorizou a técnica da colagem nas artes plásticas. Con-sistia no aproveitamento de elementos visuais do cotidiano, fragmentados, extraídos de seu contexto original e reagrupados. Essa técnica foi bastante valorizada no Modernismo como um todo, em todas as manifestações artísticas: o rea-proveitamento de elementos da cultura ocidental, segmentados e reorganizados em novas obras.

Na literatura do Modernismo, é também possível verificar um procedimento que remete à ideia de colagem: muitos foram os autores que aplicaram a suas obras literárias trechos de outras obras e compuseram, com isso, um novo conjunto.

BRAQUE, Georges. Mulher com guitarra. 1913. 1 lápis e óleo sobre tela, 73 cm x 130 cm. Centre Pompidou, Paris.

PICASSO, Pablo. Copo e garrafa de suze. 1912. Papéis colados, guache e carvão. 65 cm x 450,2 cm. Washington University Gallery of Art, St. Louis, EUA.

Modernismo – Primeira Fase18

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Leia este poema de Manuel Bandeira, expoente do Modernismo brasileiro.

Nesse poema, Bandeira se vale de um elemento textual fragmentado e extraído de seu contexto origi-nal. O último verso de seu poema é um resgate de uma frase bíblica (Gênesis 1, 2). Com essa “colagem” de um trecho de outro texto consagrado, Bandeira consegue trazer o impacto da leitura do elemento da Bíblia, um texto essencial da cultura ocidental, para sua obra, ao mesmo tempo que dá nova semântica ao trecho bíblico: o “eu lírico” se apaixona por Teresa com a mesma força mítica com que os tempos começam no Gênesis, quando “o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas”.

DadaísmoO Dadaísmo foi um movimento cuja característica central era a contestação radical dos valores e

convenções culturais, morais e estéticos vigentes no início do século XX. Os grupos dadá pautavam suas manifestações artísticas pelo desejo da ruptura e, não raro, do choque e do escândalo. Uma

postura nada incomum ao espírito geral das vanguardas, como se viu até aqui. Mas no caso dadaísta, isso era levado ao extremo. A começar pelo próprio nome do movimento. O termo

“dadá”, que o origina, foi encontrado “por acaso”, e não alude, exatamente, a nenhum ele-mento específico. É, antes de tudo, uma expressão que remete ao balbucio dos bebês, um som vocal que não remete a nada. Ou seja, o termo perfeito para designar um grupo cujos ideais artísticos passavam por provocar e trabalhar o nonsense, literalmente, o sem sentido.

A expressão não possui nenhuma correlação lógica com o programa do grupo, daí a primeira subversão, o aleatório como essência do Dadá. O poeta Tristan Tzara (1896-1963), autor do Manifesto Dadá, afirma, nesse documento, que instaura as premissas do movimento:

Dadá não significa nada. [...]. O primeiro pensamento que volta a essas cabeças é o de ordem bacteriológica: encontrar sua origem etimológica, histórica ou psicológica, pelo menos. Sabe-se pelos jornais que os negros Krou denominam a cauda de uma vaca santa: DADÁ. O cubo é a mãe em certa região da Itália: DADÁ. Um cavalo de madeira, a ama de leite, dupla afirmação em russo e em romeno: DADÁ.

TZARA, Tristan. Manifesto Dadá de 1918. In: TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda europeia e modernismo brasileiro. Petrópolis: Vozes, 1995. p. 132.

Nesse trecho, Tristan Tzara afirma que dadá é uma palavra sem sentido, algo bem ao gosto do seu grupo artístico. Por que, então, passaria, na sequência, a explorar os sentidos dessa palavra em diversas línguas?

TeresaA primeira vez que vi TeresaAchei que ela tinha pernas estúpidasAchei também que a cara parecia uma perna Quando vi Teresa de novoAchei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse) Da terceira vez não vi mais nadaOs céus se misturaram com a terraE o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas.

BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1993. p. 214.Latin

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Tristan Tzara, um dos idealizadores do Dadaísmo, movimento que nega-va o passado, o presente e o futuro

Ensino Médio | Modular 19

LITERATURA BRASILEIRA

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1. Execute essa “receita” e faça, de acordo com ela, “um poema dadaísta”.

2. Agora, transcreva-o no caderno.

3. Passe então para a análise do sentido do tex-to que você produziu, usando o método dadá. Ele obedece a algum sentido prévio, expressa alguma ideia que, de antemão, você quisesse expressar?

O paradoxo, que transgride as expectativas convencionais de significação, é algo bem ao gosto dadaísta. Do mesmo modo, a ironia. Leia, a seguir, a sugestão de Tristan Tzara para compor um poema dadá. Ela envolve ambos os aspectos.

Para fazer um poema dadaístaPegue um jornal. Pegue uma tesoura. Escolha no jornal um artigo do tamanho que você deseja dar a seu poema. Recorte o artigo. Recorte em seguida com atenção algumas palavras que formam esse artigo e meta-as num saco. Agite suavemente. Tire em seguida cada pedaço um após o outro. Copie conscienciosamente na ordem em que elas são tiradas do saco. O poema se parecerá com você. E ei-lo um escritor infinitamente original e de uma sensibilidade graciosa, ainda que incompreendido do público.

TZARA, Tristan. In: TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda europeia e modernismo brasileiro. Petrópolis: Vozes, 1995. p. 126.

4. Em que sentidos, então, de acordo com o que você estudou até aqui, essa prática é dadaísta? Explique.

5. Esse trabalho com palavras sugerido por Tristan Tzara pode ser visto como irônico e paradoxal. Por quê?

A estética dadaísta se consagrou como técnica de elaboração de produtos artísticos o ready-made. Marcel Duchamp (1887-1968), ao transformar qualquer objeto, selecionado ao acaso, em obra de arte, promoveu uma reflexão crítica sobre o sistema de criação e valoração da arte de seu período.

Para Duchamp, objetos utilitários, produtos seriais, sem qualquer peculiari-dade, frutos da industrialização e supostamente sem nenhum valor estético, são retirados de seus contextos originais e elevados à condição de obra de arte. Para tanto, basta que sejam alocados a um espaço institucional reconhecido como artístico, ou, simplesmente, assinados pelo artista. Essa é, a um só tempo, a receita e a definição do ready-made. Exemplo clássico desse processo poético é A fonte, de 1917.

Trata-se de um mictório comum, que Duchamp posiciona invertido, nomina, assina e expõe entre outras obras de arte, realizadas por meio de processos, então, “mais convencionais”.

Em pouco tempo, a técnica dadaísta de Duchamp seduziu outros artistas do Modernismo. Entre eles, estava Pablo Picasso. Ao unir o selim e o guidão de uma bicicleta, ele compôs uma das obras emblemáticas do século XX, a Cabeça de touro, de 1943.

PICASSO, Pablo. Cabeça de touro. Selim acoplado a guidão de bicicleta. 1943.

DUCHAMP, Marcel. A fonte. 1917. Ready-made a partir de mictório em louça assinado. Obra original desaparecida.

Modernismo – Primeira Fase20

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Também na literatura modernista essa técnica encontrou seguidores. Veja um exemplo brasileiro.

Escrito no início do século XX, esse poema, assinado por Oswald de Andrade, integra o capítulo Pero Vaz de Caminha, de seu livro Pau Brasil. No entanto, esses versos nada mais são do que um recorte da carta do próprio Pero Vaz enviada a Portugal por ocasião do Descobrimento do Brasil.

Quais são as semelhanças e diferenças mais significativas entre o processo de elaboração de A fonte, de Marcel Duchamp, e o poema “Os selvagens”, de Oswald de Andrade? Pode-se perceber no poema alguma ligação com o Dadaísmo?

Os selvagens

Mostraram-lhes uma galinhaQuase haviam medo delaE não queriam por a mãoE depois a tomaram como espantados.

ANDRADE, Oswald de. Poesias reunidas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. p. 18.

Surrealismo

“Belo como o encontro casual entre uma máquina de costura e um guarda-chuva numa mesa de dissecção.”

LAUTRÉAMONT, Conde de (DUCASSE, Isidore Lucien). In: Surrealismo. Disponível em: < http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=3650>. Acesso em: 20 set. 2011.

O movimento surrealista procura, como afirma André Breton (1896-1966), em seu Movimento do Surrealismo, de 1924, “resolver a contradição até agora vigente entre sonho e realidade pela criação de uma realidade absoluta, uma suprarrealidade”. Essa busca é uma contrapartida à racionalidade extrema privilegiada pelo conhecimento e pela arte nos fins do século XIX. O século XX se abre para a sondagem psicológica, ao mundo onírico, ao irracional, ao inconsciente e passa a valorizar essa esfera irracional. A psicanálise e a obra de Sigmund Freud (1856-1939) passam a ser amplamente abordadas por artistas.

A Primeira Grande Guerra era o estandarte da destruição humana por meio da técnica, para alguns. Notavelmente, o era aos olhos dos surrealistas. Fazia-se, então, necessário voltar o ser humano a suas raízes sonhadoras, negando processos criativos regrados e racionais.

Na literatura, aparece a técnica da escrita automática. O automatismo dita que o autor, ao elaborar uma obra, não precisa e não deve usar a razão. A boa composição, de acordo com essa perspectiva poética e estética, advém do fluxo de imagens e palavras que brotam do inconsciente do artista. O primeiro livro com essa característica foi Os campos magnéticos, de André Breton, produzido em 1921.

Nas artes visuais, Salvador Dalí estabeleceu relações aparentemente sem nenhum nexo lógico entre objetos e seres. É essa justaposição de objetos desconexos e as associações à primeira vista imprevisíveis que se destacam nas artes surrealistas.

LITERATURA BRASILEIRA

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Expressionismo

Observe esta tela de Salvador Dalí:

Essa tela de Edvard Munch transformou-se, em pouco tempo, em um verdadeiro marco para as artes plásticas e, principalmente, para o processo de ruptura artística do início do século XX

Essa obra de Salvador Dalí sintetiza bem a

concepção surrealista de arte. Ele nomeou

essa tela de A persis-tência da memória pelo fato de ela dificilmente

ser esquecida. Para Dalí, suas cores ficarão

gravadas na memória para aqueles que a

observarem mais de uma vez e os relógios são a relatividade do

tempo e espaço

DALÍ, Salvador. A persistência da memória. 1931. 1 óleo sobre tela, color., 21,3 cm x 33 cm. Museu de Arte Moderna, Nova Iorque.

MUNCH, Edvard. O grito. 1893. 1 óleo sobre tela, color., 91 cm x 73 cm. Museu Nacional de Oslo, Oslo.

O Expressionismo nasceu na Alemanha, contrapondo--se ao Impressionismo francês.

Os impressionistas viam as artes visuais como uma manifestação que deveria se valer da captação de imagens sensoriais imediatas. Os expressionistas, em contrapartida, afirmavam que a arte, seja visual, seja literária ou cinematográfica, deveria emanar do artista para a realidade, ser basicamente fruto de sua expressão, sem filtros. Desse modo, o movimento expressionista caracterizou-se pelo uso de cores fortes, pinceladas vigorosas e formas distorcidas.

Edvard Munch (1863-1944), pintor norueguês, é uma das maiores referências do movimento expressionista. Seu quadro, O grito (1893), consagrou-se por conseguir expressar um novo e contundente modo de observar a realidade, as sensações de angústia, dor e desespero vivenciadas por boa parte dos indivíduos que viviam a transição do século XIX para o XX.

Modernismo – Primeira Fase22

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Vanguardas no Brasil

Várias transformações foram responsáveis pela criação do ambiente pro-pício à instalação das novas ideias estéticas na cultura brasileira. Entre elas se destacam o Centenário da Independência e a Primeira Guerra Mundial (1914-1918).

Isso favoreceu a expansão da indústria brasileira e promoveu o questio-namento do sistema político vigente, até então comandado pela oligarquia ligada à economia cafeeira rural. Soma-se a isso o deslocamento de artistas e intelectuais que saem da Europa na condição de refugiados.

No início do século passado, o contexto artístico brasileiro ainda apresentava forte vínculo com o academicismo tradicionalista e, sobretudo, com a influência da Belle Époque francesa. Porém, em São Paulo, assim como no Rio de Janeiro, já se manifestavam grupos de artistas e pensadores destinados a alterar esse quadro.

A pintora Anita Malfatti retorna ao Brasil em 1917 após finalizar uma temporada de estudos em Berlim e outra em Nova Iorque.

Anita Malfatti, amplamente integrada às novas perspectivas da arte na Europa e na América do Norte, traz para o país algo diferente. Realiza uma exposição de telas no salão de chá da casa Mappin, local frequentado pela elite paulista. Marcadas por elementos do Expressionismo alemão, as obras de Anita fogem à expectativa do público brasileiro de então, o que causa admiração e repulsa, a um só tempo.

Sua temática também era ousada e pouco convencional para o momento. Numa sociedade acostumada com a arte que retrata a beleza convencional e a saúde padrão, Anita propôs, por exemplo, a pintura de uma mulher com problemas mentais.

Com base em seus estudos, quais as possíveis razões para o desespero do personagem retratado por Munch? Elas estariam vinculadas ao momento histórico e cultural vivido pelo pintor? Como?

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MALFATTI, Anita. A boba. 1915-1916. 1 óleo sobre tela, color., 61 cm x 50,6 cm. MAC-USP, São Paulo.

Anita, ao comentar a exposição, falou que “quando viram (o público) minhas telas todas, acharam-nas feias, dantescas, e todos ficaram tristes, não eram os santinhos do colégio”.

Disponível em: <http://www.mac.usp.br/mac/templates/projetos/seculoxx/modulo2/modernismo/artistas/malfa/index.htm>. Acesso em: 11 ago. 2011.

Ensino Médio | Modular 23

LITERATURA BRASILEIRA

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Essa opinião, conservadora ao extremo e pouco aberta aos novos paradigmas da arte, encontrou vários seguidores durante a instauração do movimento modernista no Brasil. No caso de Malfatti, a exemplo, logo após a exposição de 1917, alguns intelectuais tentaram se contrapor à tal corrente conservadora e fazer críticas favoráveis, sem grande repercussão, no entanto.

Apesar do tradicionalismo da crítica local – e do gosto público também –, os ventos modernistas começaram a soprar por aqui. Em 1919, o escritor Manuel Bandeira publicou o livro Carnaval. Nele, encontra-se o poema Os sapos, uma crítica aberta à estética literária vigente no período e reconhecida pelo gosto tradicional: a dos poetas parnasianos.

ENFUNANDO os papos, Saem da penumbra,Aos pulos, os sapos.A luz os deslumbra.

Em ronco que aterra,Berra o sapo-boi:– “Meu pai foi à guerra!”– “Não foi!” – “Foi!” – “Não foi!”.

O sapo-tanoeiro,Parnasiano aguado,Diz: – “Meu cancioneiroÉ bem martelado.

Vede como primoEm comer os hiatos!Que arte! E nunca rimoOs termos cognatos,

O meu verso é bomFrumento sem joio.Faço rimas com Consoantes de apoio.

Vai por cinquenta anosQue lhes dei a norma:Reduzi sem danos A formas a forma.

Clame a sapariaEm críticas céticas:Não há mais poesia, Mas há artes poéticas ...”

Urra o sapo-boi:– “Meu pai foi rei” – “Foi!”– “Não foi!” – “Foi!” – “Não foi!”.

Brada em um assomoO sapo-tanoeiro:– “A grande arte é comoLavor de Joalheiro.

Ou bem de estatuário.Tudo quanto é belo,Tudo quanto é vário,Canta no martelo.”

Os sapos

BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1963. p. 158-159.

Outros, sapos-pipas(Um mal em si cabe),Falam pelas tripas:– “Sei!” – “Não sabe!” – “Sabe!”.

Longe dessa grita, Lá onde mais densa A noite infinitaVerte a sombra imensa;

Lá, fugido ao mundo,Sem glória, sem fé,No perau profundoE solitário, é

Que soluças tu,Transido de frio,Sapo cururuDa beira do rio...

O escritor Monteiro Lobato, que então atuava também como crítico de arte, após visitar a exposição, escreveu o artigo “Paranoia ou mistificação?”, que seria, à sua época e às demais, a base para as discussões sobre as artes de vanguarda no Brasil. Nesse texto, Lobato afirma:

Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que veem normalmente as cousas e em consequência fazem a arte pura (...) adotando para a concretização das emoções estéticas os processos clássicos dos grandes mestres. (...) A outra espécie é formada dos que interpretam à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica excessiva. São produtos do cansaço e do sadismo de todos os períodos de decadência; são frutos de fim de estação, bichados ao nascedouro.

LOBATO, Monteiro. Paranoia ou mistificação? Disponível em: <http://www.mac.usp.br/mac/templates/projetos/educativo/paranoia.html>. Acesso em: 24 set. 2011.

24 Modernismo – Primeira Fase

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Antecedentes da Semana de Arte

ModernaNo ano de 1920, um grupo de jovens paulistas que, então, já se de-

nominavam “futuristas” – entre os quais, Oswald de Andrade e Mário de Andrade – conhece o artista plástico Victor Brecheret. O escultor

passara uma temporada na Itália e, recém-chegado ao Brasil, trouxera consigo uma técnica expressiva e um ideário moderno que provo-caram grande admiração entre os membros desse grupo. A partir daí, o incipiente Modernismo paulista começa sua consolidação, em torno da figura inspiradora desse escultor.

Como esse grupo de intelectuais percebia a necessidade de renovação, pois já havia convivido com o Modernismo europeu,

decide organizar um evento, a fim de chamar a atenção do circuito cultural e do público em geral para as novas questões da arte. Ocorre

então a Semana de Arte Moderna de 1922, cujo intuito era apresentar as manifestações artísticas e consolidá-las e romper com a tradição da época.

1. Quem seriam os sapos no poema?

2. Qual é a admirável arte desses sapos menciona-da no poema?

3. O poema acima apresenta algum tipo de iro-nia? Qual?

4. Grife os trechos do poema em que fica mais evi-dente a alusão ao parnasianismo e à sua poética:

5. O poema cita outros textos. Aponte ao menos duas citações:

6. Se os sapos do início do poema remetem aos parnasianos, quem é o referente do solitário e humilde cururu?

Victor Brecheret

Acervo Iconographia

BRECHERET, Victor. Tocadora de guitarra. 1934. 1 escultura em mármore. Coleção particular, São Paulo.

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LITERATURA BRASILEIRA

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Cartaz de promoção da Semana de Arte Moderna de 1922

Semana de Arte Moderna

Durante três dias, 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922, o nobre espaço do Teatro Municipal de São Paulo abrigou a nova estética modernista.

Alguns dos participantes da Semana de Arte Moderna de 1922, entre eles Oswald de Andrade, Manuel Bandeira e Mário de Andrade

Pelo Theatro Municipal de São Paulo, construído em 1911, passaram nomes como os da cantora lírica Maria Callas, do bailarino Mikhail Baryshnikov, dos cantores Duke Ellington e Ella Fitzgerald, entre muitos outros artistas, além de ter sido, em 1922, cenário da Semana de Arte Moderna

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Jornalismo Cultural

No campo da comunicação social, o Jornalismo Cultural ganha, a cada ano, mais status entre os jovens que pretendem seguir a profissão. Praticá-lo, no entanto, é muito mais do que emitir opiniões, em jornais, revistas, sites, blogs, sobre filmes, livros, peças de teatro, novelas, exposições de arte, etc. É, antes de tudo, um exercício constante de aprimoramento e busca pela informação. Muitos cursos de Jornalismo, por exemplo, já têm em sua grade curricular disciplinas voltadas à formação do jornalista cultural. Mas é possível também fazê-lo depois de graduado. Estudantes não só de Jornalismo podem cursá-lo, mas ele se direciona àqueles que se graduaram em Letras, Publicidade e Propaganda, Marketing, Relações Públicas, etc.

Em um curso de Jornalismo Cultural, o candidato estudará sobre cultura, comunicação, arte, mídia, marketing, etc. Já há inclusive pós-graduação em Jornalismo Cultural, como na PUC de São Paulo.

Modernismo – Primeira Fase26

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Catálogo da exposição da semana de 1922, elaborado por Di Cavalcanti

Seu auditório foi tomado por sessões literárias – leitura de poemas – e musicais, en-quanto o saguão acolhia palestras sobre as artes de vanguarda e uma exposição de artes plásticas com obras de Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Victor Brecheret e Vicente do Rego Monteiro. Na música, destaca-se a participação de Heitor Villa-Lobos.

Por seu propósito de romper com a aura de conservadorismo que orbitava o contexto cultural brasileiro, as manifestações da semana causaram significativo impacto – na maioria das vezes, negativo. No entanto, repercutiram a ponto de fixar os preceitos de renovação artística do moderno no cenário cultural do país.

Características gerais do ModernismoAs diversas vertentes artísticas que formam o Modernismo têm como característica comum a

vontade de liberdade de criação e expressão. A renúncia aos programas formais de composição apresentados pelas escolas anteriores é, pois, para os escritores modernistas, uma premissa. Os ideais altaneiros, a forma rígida, artificial do Parnasianismo é, então, rechaçada e substituída pela coloquia-lidade e pela forma solta, sem regras previamente estabelecidas. O poeta Manuel Bandeira explicitou esse desejo no poema “Poética” ao escrever “Não quero mais saber do lirismo que não é libertação”.

A aversão à forma fixa viabiliza o emprego de uma linguagem mais flexível, muitas vezes mais próxima da realidade imediata da fala. Os escritores começam a valorizar sobremaneira a linguagem coloquial e sua capacidade de expressão simples e direta de sentimentos, observações, ideias. Com isso, um novo vocabulário e uma nova sintaxe passam a ser característicos das composições modernas.

Os temas perpassam tanto a esfera de progresso vivenciada na época, abordando, por exemplo, a cidade, o automóvel, o telefone, o cinema, como elementos do cotidiano mais banal, comum aos diversos indivíduos, desprovido de qualquer aura, ou mesmo pertencente a indivíduos então margina-lizados – imigrantes, pobres, mulheres.

Com a intenção de colocar por terra os temas e a linguagem consagrados pela tradição, os autores modernistas vão recorrer frequentemente à paródia e às ironias em seus textos.

1. Leia a charge nesse cartaz. Você conhece algum dos no-mes citados nas plaquetas? Que correntes estéticas esses nomes representavam?

2. A charge faz uma crítica irônica à Semana de Arte Moderna. Como se dá essa crítica?

3. Por que o nome “D. Quixote” em S. Paulo?

Cartaz do ilustrador Belmonte, promovendo e ao mesmo tempo antecipando ironicamente as

críticas que a Semana de Arte Moderna sofreria

Paródia: imitação

cômica de uma composição

literária. Imita-ção burlesca.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda.

Dicionário Aurélio da língua portuguesa. 5. ed.

Curitiba: Positivo, 2010. p. 1568.

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Modernismo:

contexto

histórico e

suas gerações

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Observe, a seguir, duas paródias modernas.Essa obra de Marcel Duchamp parodia o famoso quadro

de Leonardo da Vinci, Mona Lisa (Gioconda). Trata-se de um ready-made elaborado a partir do acréscimo, sobre um cartão com a representação fotográfica da obra de Da Vinci, de bigode, cavanhaque e do “título” L.H.O.O.Q. Essa sequência de letras traz uma ironia notavelmente picante à paródia. Se lida em voz alta, L.H.O.O.Q. soa, em francês, como: Elle a chaud au cul. Algo que numa tradução livre, e menos maliciosa que o original, vale dizer, seria próximo a “Ela é uma moça ‘quente’”. Sem dúvida, um comentário irônico e debochado, sobretudo se acoplado à tradicional e respeitável imagem da Gioconda, que surge numa reinterpretação bigoduda.

Mesmo quando não brinca com o lado jocoso e irônico da paródia, o Modernismo se apropria desse recurso para dialogar com a cultura de períodos anteriores. Leia o poema de Oswald de Andrade, poeta do Modernismo brasileiro.

Canto de regresso à pátriaMinha terra tem palmares Onde gorjeia o mar Os passarinhos aqui Não cantam como os de lá Minha terra tem mais rosas E quase que mais amores Minha terra tem mais ouro Minha terra tem mais terra

Ouro terra amor e rosas Eu quero tudo de lá Não permita Deus que eu morra Sem que volte para lá Não permita Deus que eu morra Sem que volte pra São Paulo Sem que veja a Rua 15 E o progresso de São Paulo

ANDRADE, Oswald de. Disponível em: <http://www.ufrgs.br/proin/versao_1/exilio/index06.html>. Acesso em: 30 set. 2011.

Relembre o texto romântico de Gonçalves Dias, base dessa paródia:

Canção do exílio Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá; As aves que aqui gorjeiam, Não gorjeiam como lá. Nosso céu tem mais estrelas, Nossas várzeas têm mais flores, Nossas flores têm mais vida, Nossa vida mais amores. Em cismar, sozinho, à noite, Mais prazer encontro eu lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá

Minha terra tem primores, Que tais não encontro eu cá; Em cismar – sozinho, à noite – Mais prazer encontro eu lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá. Não permita Deus que eu morra Sem que eu volte para lá; Sem que desfrute os primores Que não encontro por cá; Sem qu'inda aviste as palmeiras, Onde canta o Sabiá.

DIAS, Gonçalves. Disponível em: <http://www.ufrgs.br/proin/versao_1/exilio/index01.html>. Acesso em: 30 set. 2011.

DUCHAMP, Marcel. L.H.O.O.Q. 1 desenho sobre cartão com impressão fotográfica.

1919. Musée National d'Art Moderne, Centre Georges Pompidou, Paris.

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À parte os temas universais do momento histórico, como a efervescência da vida urbana, os mo-dernistas realizam um grande resgate dos temas nacionais. Devido à guerra de proporções mundiais que marcou as primeiras décadas do século XX, ao longo de todo o globo, povos buscaram revalorizar seus elementos identitários, em uma vertente nacionalista. Com o Brasil, então, não foi diferente. Vale, inclusive, notar que o caso brasileiro se faz, nesse sentido, ainda mais específico. O centenário de nossa independência, que se dava no período, também voltou os interesses à temática nacional. O Modernismo, no entanto, não busca elementos ufanos e altaneiros para caracterizar uma ideia mítica de país. Opera, antes, com a língua efetivamente falada, com o resgate das formas poéticas e musicais populares, folclóricas. É sobretudo ao se valer da etnografia, do folclore, da música popular tanto em estudos quanto na ficção, que os modernistas resgatam o que concebem como a autêntica brasilidade.

NEGREIROS, Jose de Almada. Retrato de Fernando Pessoa. 1964. 1 óleo sobre tela, color., 64 cm x 66 cm. Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

O modernista Oswald de Andrade parodia o texto de Gonçalves Dias. E, embora não traga em sua paródia um tom jocoso geral, confronta-se com a tradição romântica ao se apropriar da ”Canção do exílio” como base de seu novo poema parodístico. Como isso ocorre?

Modernismo em Portugal

Os artistas portugueses também foram influenciados pelas vanguardas europeias.Os poetas Fernando Pessoa, Mário de Sá Carneiro e Almada Negreiros deflagraram o Moder-

nismo em Portugal com a publicação da revista Orpheu, em 1915, que foi o primeiro veículo de divulgação das ideias modernistas.

Fernando Pessoa é considerado um dos mais impor-tantes escritores do século XX

Fernando Pessoa:

biografia, obras,

cronologia e estilo

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LITERATURA BRASILEIRA

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A revista Orpheu teve vida curta, somente dois números, mas foi o suficiente para esta-belecer a ruptura com as correntes artísticas do século XIX e apresentar os novos padrões estéticos que marcariam a produção de todos os participantes.

Fernando Pessoa é sem dúvida o maior nome do Modernismo português. Nascido em 1888, perdeu o pai aos 5 anos. Posteriormente, viajou com a mãe e o padrasto para a África do Sul e lá viveu parte de sua adolescência. Retornou a Portugal onde cursou Letras sem concluir o curso. Em vida, o poeta publicou apenas dois livros: 35 sonnets (livro de poemas, em inglês) e Mensagem.

A intensa atividade intelectual de Fernando Pessoa foi publicada nas diversas revistas modernistas, como Orpheu e Athena.

A poesia de Pessoa é objeto de intensa pesquisa não só devido à sua força inventiva, mas também aos diversos heterônimos criados.

Os heterônimos, diferentemente dos pseudônimos, são personalidades poéticas completas, ou seja, identidades que, em princípio falsas, se tornam verdadeiras por meio de sua manifes-tação artística própria e diversa do autor verdadeiro. Os heterônimos possuem uma biografia própria, que foi criada pelo próprio poeta, e, além disso, são dotados de um estilo e linguagens particulares que os diferenciam. Assim, Fernando Pessoa criou outros poetas, como Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis.

O principal livro de poemas de Fernando Pessoa é Mensagem. Nessa obra, o poeta exalta o passado heroico de Portugal desde a sua formação mítica até a era dos grandes descobrimentos.

Leia este poema e, depois, responda à questão:

Observa-se que, no Modernismo brasileiro, há um retorno ao nacionalismo. É possível afirmar, a partir do poema de Fernando Pessoa, que o Modernismo português também vivenciou este nacionalismo? Justifique sua resposta:

Na vastíssima produção de Fernando Pessoa, o heterônimo Álvaro de Campos merece destaque. Segundo a biografia criada pelo próprio Fernando Pessoa, Álvaro de Campos “nasceu em Tavira, teve uma educação vulgar de Liceu, depois foi para a Escócia estudar engenharia, primeiro mecânica e depois naval. Numas férias fez a viagem ao Oriente de onde resultou o Opiário”.

A poesia de Álvaro de Campos reflete o homem vanguardista e cosmopolita. Seus poemas exaltam, em tom futurista, a civilização moderna e os valores do progresso.

Mar português

Ó mar salgado, quanto do teu salSão lágrimas de Portugal!Por te cruzarmos, quantas mães choraram,Quantos filhos em vão rezaram!Quantas noivas ficaram por casarPara que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a penaSe a alma não é pequena.Quem quere passar além do BojadorTem que passar além da dor.Deus ao mar o perigo e o abismo deu,Mas nele é que espelhou o céu.

PESSOA, Fernando. Obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992. p. 82.

Modernismo – Primeira Fase30

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Leia este poema e aponte dois elementos que o caracterizam como moderno:

Ode triunfal

À dolorosa luz das grandes lâmpadas elétricas da fábricaTenho febre e escrevo.Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos.

Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno!Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!Em fúria fora e dentro de mim,Por todos os meus nervos dissecados fora,Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,De vos ouvir demasiadamente de perto,E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excessoDe expressão de todas as minhas sensações,Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas![...]Ah, poder exprimir-me todo como um motor se exprime!Ser completo como uma máquina!Poder ir na vida triunfante como um automóvel último-modelo!Poder ao menos penetrar-me fisicamente de tudo isto,Rasgar-me todo, abrir-me completamente, tornar-me passentoA todos os perfumes de óleos e calores e carvõesDesta flora estupenda, negra, artificial e insaciável!

PESSOA, Fernando. Obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992. p. 306.

Cenas do filme Tempos modernos, de 1936, dirigido e estrelado por Charlie Chaplin. Essa obra é uma crítica ao mundo moderno e industrializado que começava a se configurar no século XX

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“E vivemos uns oito anos, até perto de 1930, na maior orgia intelectual que a história artística do país registra.”

ANDRADE, Mário de. Aspectos da literatura brasileira. 5. ed. São Paulo: Martins, 1974. p. 238.

ANDRADE, Oswald de. Primeiro caderno do aluno de poesia Oswald de Andrade. São Paulo: Globo, 1994. p. 21.

Primeira Geração Modernista: poesia2

32 Modernismo – Primeira Fase

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1. O escritor Mário de Andrade está se referindo a qual período?

2. O poema de Oswald de Andrade possui paralelo com alguma teoria das vanguardas europeias? Qual? Justifique.

3. O que Mário de Andrade quer dizer com “orgia intelectual”?

4. O poema de Oswald de Andrade se organiza em torno de um jogo de palavras. Que ideias elas sugerem?

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LITERATURA BRASILEIRA

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Ainda sob os ecos da Semana de Arte Moderna, dá-se início à Primeira Geração Modernista. Nesse período, vários acontecimentos sociais prenunciam as mudanças que o Brasil iria sofrer de 1922 até 1930, quando termina essa primeira fase. A grande efervescência intelectual é apenas uma das facetas de um país que se prepara para alterações significativas em várias áreas, em especial no que diz respeito ao fim dos sistemas antigos de poder e a ascensão de novos ideais. A burguesia se tornava cada vez mais intolerante e procurava novas formas de manifestação.

No campo político, essa busca aparece apenas um mês após a Semana de Arte Moderna: as eleições para presidente acirram a disputa entre as oligarquias locais. De um lado Artur Bernardes, defendendo os interesses de São Paulo e Minas Gerais, de outro Nilo Peçanha, representante de Pernambuco, Rio de Janeiro, Bahia e Rio Grande do Sul.

A agitação da campanha eleitoral mostra o desconten-tamento da classe média e culmina na Revolta do Forte de Copabacana, quando 17 tenentes e um civil se manifestam contra a vitória de Artur Bernardes e a manutenção das oligarquias no sistema da República Velha. Eles foram massacrados por 3 mil soldados, que agiam em nome da defesa do governo.

Os primeiros anos de Artur Bernardes no poder são marcados por um constante estado de sítio, censura à im-prensa e intervenções nos estados. Com a constante série

de manifestações, de 1925 a 1927, formou-se a Coluna Prestes, grupo de tenentes que percorria o país denunciando a situação dos miseráveis, exigindo o voto secreto e a obrigatoriedade do ensino primário.

Nesse período, delineia-se também a crise econômica, que culmina com a queda da bolsa de valores de Nova Iorque, em 1929. Os Estados Unidos, que haviam enriquecido enormemente com a exportação de produtos para a Europa, vivem um período de declínio financeiro, chamado de Grande Depressão.

A Revolta dos 18 do Forte de Copacabana ocorreu em 1922 na cidade do Rio de Janeiro. Essa revolta reivindicava o fim das oligarquias no poder

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Essa crise ficou conhecida como o pior período de recessão econômica do século XX

Terminada a guerra, os países europeus começaram a se reerguer, diminuindo drasticamente o número de importações. As empresas que dependiam desse mercado ficaram com um estoque muito grande de produtos sem ter quem os absorvesse. Havia mais mercadorias que consumidores, consequentemente os preços caíram, a produção diminuiu e logo o desemprego aumentou. A queda dos lucros, a retração geral da produção industrial e a paralisação do comércio resultou na queda das ações da bolsa de valores e, mais tarde, na sua quebra.

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O Brasil, que tinha nos Estados Unidos o seu maior consumidor de café, se vê em dificuldades financeiras. Para manter o preço do principal produto local, queimam-se toneladas de café. Como saída, o país investe na industrialização, tema muito caro aos poetas da época, que elo-giavam a velocidade e o poder do maquinário. São os sinais dos novos tempos!

Depois de toda essa movimentação política, cultural e social, ocorre a Revolução de 1930, movimento armado que depôs o então presi-dente da República Washington Luís, impediu a posse do presidente eleito Júlio Prestes e pôs fim à República Velha. Getúlio Vargas assume o poder e, com ele, inicia-se um novo período na história nacional, inclusive no campo literário e artístico, que levará ao fim da primeira fase modernista e ao início da segunda geração.

Como o preço da saca de café caiu drasticamente, a única solução encontrada pelo então governo de Getúlio Vargas foi a queima de sacas, o que forçou a elevação dos preços

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Carlitos, o personagem mais lendário de Charles Chaplin, come os sapatos em cena do filme Em busca do ouro, de 1925

O cinema na Grande Depressão

Charles Chaplin (1889-1977) ficou conhecido como um dos mais importantes comediantes do ci-nema. Atuava em filmes mudos e ficou famoso pelo papel de Carlitos, um vagabundo que se envolvia em várias situações cômicas e dramáticas. Vários de seus filmes fizeram muito sucesso durante o período de guerra e da Grande Depressão, pois incitavam ao riso e à alegria em um momento de muitas dificuldades financeiras.

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LITERATURA BRASILEIRA

35Ensino Médio | Modular

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Modernismo é o nome dado à escola literária que se inicia no ano de 1922, depois da Semana de Arte Moderna e se estende até 1978. É dividido didaticamente em três fases ou gerações e cada uma delas desenvolve temas, gêneros e autores diversos:

Primeira Geração (1922-1930)É a mais radical, preocupada em romper com as regras do passado e

produzir uma arte que fosse mais condizente com a realidade nacional.

Segunda Geração (1930-1945)Caracteriza-se pela produção majoritária de romances e pela denúncia

social. Volta-se para a Região Nordeste.

Terceira Geração (1945-1978)Do ponto de vista formal, desenvolve uma investigação linguística,

porém tematicamente volta-se para o regionalismo e à denúncia social.

Ainda que muito diferentes, o termo “Modernismo” abarca as manifestações artísticas que foram fortemente influenciadas pelas vanguardas europeias e se valem da liberdade formal e temática alcançada no começo no século XX.

Primeira Geração Modernista

A primeira fase modernista foi a mais radical, pois tinha a intenção de romper completamente com o cenário artístico que predominava no Brasil, em especial com a estética parnasianista.

O movimento parnasianista era influenciado pelos modelos clássicos greco-romanos de representação ar-tística, o que significa dizer que estavam preocupados com uma composição rígida de fazer poético, organizado em versos metrificados e rimas ricas (entre palavras de classes diferentes), cujos temas eram a retomada de deuses gregos e objetos da época.

Os mesmos artistas que organizaram a Semana de Arte Moderna deram continuidade às propostas do evento, suge-rindo uma nova produção nacional, que fosse mais condizente

Capa da revista Klaxon, idealizada pelo poeta Guilherme de Almeida, tendo como inspiração a concepção estéti-

ca futurista, com o “A” ganhando destaque e substi-tuindo os demais “aa”, além do número “1” deitado,

disposto de forma pouco usual na época

com a realidade local. Tratava-se de um grupo em busca de definição, de uma identidade e, por isso, defendiam o desliga-mento com qualquer manifestação que se ligasse ao passado.

Nessa fase, o projeto inicial de ruptura com os modelos tradicionais é posto em evidência. A tradição nesse momento pode ser sintetizada na estética do Parnasianismo. A lingua-gem e as formas cultuadas como verdades absolutas são violentamente questionadas. Há também a necessidade de chocar o público, daí o radicalismo que permeia o movimento.

Do ponto de vista formal, propunham o antiacademicismo, o uso da oralidade e do verso livre, a instantaneidade, a pa-ródia. Desenvolvia-se um nacionalismo crítico e ufanista, que se voltava para o passado, procurando rever os nossos pontos de vista, denunciando diversas situações e que, ao mesmo tempo, exaltavam o local e a produção dos artistas locais.

Revistas e manifestos

Revista KlaxonA revista Klaxon foi publicada nos anos de 1922 e 1923, surgindo como extensão da

Semana de Arte Moderna em São Paulo.

Revistas e manifestos

modernistas: Klaxon, Pau

Brasil, Verde-Amarelismo e

Antropofagia

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Modernismo – Primeira Fase36

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Fac-similar da ilustração de Tarsila do Amaral e o texto de abertura do livro Pau Brasil

Nesta página da revista Klaxon, vê-se a disposição gráfica totalmente inovadora

Manifesto Pau-Brasil

O nome do periódico faz referência às buzinas de carros, exaltando os tempos mo-dernos e a tecnologia. Nesse sentido, organizava-se de maneira inovadora, publicavam inéditos de artistas nacionais e estrangeiros que estivessem de acordo com os ideais modernistas e possuíam um projeto gráfico diferente, com fontes inusitadas e cuja disposição das páginas era fora do padrão visto no Brasil até então.

Até os anúncios publicados nesse semanário deviam seguir a estética modernista. Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Oswald de Andrade, Menotti del Picchia,

Di Cavalcanti, Anita Malfatti, Sérgio Buarque de Holanda, Tarsila do Amaral e Graça Aranha, entre outros, colaboraram nesse periódico.

Capa da primeira edição do livro Pau Brasil, de Oswald de Andrade, ilustrado por Tarsila do Amaral

Como o próprio título sugere, trata-se de um artigo em defesa de uma arte es-sencialmente nacional, que se volta para a realidade local, funcionando como um redescobrimento da terra brasileira. O autor, Oswald de Andrade, acreditava que a poesia deveria se renovar, recriar o local, valendo-se de uma escrita cheia de oralidade e de temas nacionais, desde o descobrimento até a vida cotidiana de hoje.

O manifesto foi publicado, primeiramente, no Correio da Manhã, jornal de grande cir-culação no Rio de Janeiro, e somente depois Oswald de Andrade lança o livro homônimo, em 1925, que continha a síntese das ideias defendidas.

A pequena publicação tem capa e ilustrações de Tarsila do Amaral, esposa de Oswald de Andrade e grande representante do Modernismo nas artes plásticas. Além disso, apresenta um prefácio de Paulo Prado, que serve de referência até hoje para os estudos modernistas.

Manifesto é a uma declaração pública que tem por objetivo defender uma ideia ou ponto de vista. Pode ser veiculado em jornal, livro ou simplesmente como fala proferida a uma plateia. Retrata os ideais de uma pessoa ou grupo e foi amplamente utilizado na primeira fase modernista porque se tratava de um meio barato e pouco institucional de se expressar. Nesse momento, os artistas não chegavam a se organizar em prol de uma causa, mas procuravam uma identidade, divergindo em muitas questões específicas. O manifesto servia, então, como meio de expressão eficaz das muitas vozes existentes.

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LITERATURA BRASILEIRA

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Tela Abaporu foi finalizada em

1928 por Tarsila do Amaral. Essa

obra inspirou o movimento

antropofágico

Verde-AmarelismoComo reação ao nacionalismo “afrancesado” de Oswald de Andrade e da Poesia Pau-Brasil, Cassiano

Ricardo, Menotti del Picchia, Plínio Salgado, entre outros artistas da época, decidiram lançar o movimento Verde-Amarelista (1926), no qual se defende uma produção de caráter ainda mais ufanista e primitivista. O nome faz referência às cores da bandeira, como maneira de ressaltar os elementos patrióticos na sua forma mais ideal.

Eles entendiam que as ideias de Oswald de Andrade ainda estavam muito contaminadas por um ponto de vista estrangeiro. Nesse momento, observa-se uma cisão do movimento modernista. De um lado, os artistas de esquerda, ligados à burguesia e às mudanças sociais de caráter mais democrá-tico, como Oswald de Andrade; de outro lado, os artistas de direita, em especial Plínio Salgado, que radicalizam o ponto de vista com propostas de caráter fascista.

Depois de algumas manifestações de Oswald, ironizando a postura do grupo, surge, em 1927, o Grupo Anta, cujo nome é uma referência ao animal venerado pela tribo tupi. Na verdade, trata-se de uma facção do próprio movimento Verde-Amarelista, composta por Plínio Salgado e Raul Bopp. Esses novos ideais culminam no integralismo, doutrina ultraconservadora que prega a ordem e a paz.

Revista de AntropofagiaEm 1928, Oswald de Andrade reage aos ataques do Grupo Anta e publica o Manifesto Antropófago,

na primeira edição da Revista de Antropofagia, organizada pelo próprio Oswald, Alcântara Machado e Raul Bopp.

O nome surge por conta de uma tela pintada por Tarsila do Amaral, para presentear Oswald de Andrade: Abaporu, que em tupi significa “homem que come”.

AMARAL, Tarsila do. Abaporu. 1928. 1 óleo sobre tela, color., 85 cm x 73 cm. Coleção Eduardo Costantini, Buenos Aires.

Do ponto de vista teórico, trata-se de uma continuação do movimento Pau-Brasil. Propunha uma revisão da dependência cultural do país diante das produções estrangeiras, em especial europeias. Assim, nasce a ideia de “deglutinação” dos elementos estrangeiros, isto é, acreditavam que a cultura brasileira poderia se valer dos repertórios de fora, mas deveriam adaptar, transformar, ingerir essas informações de tal forma que elas se tornassem locais.

Modernismo – Primeira Fase38

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Manifesto Antropófago Só a Antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente.

Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivis-mos. De todas as religiões. De todos os tratados de paz.

Tupy, or not tupy that is the question.

[...]A luta entre o que se chamaria Incriado e a Criatura-ilustrada pela contradição permanente

do homem e o seu Tabu. O amor quotidiano e o modus vivendi capitalista. Antropofagia. Absorção do inimigo sacro. Para transformá-lo em totem. A humana aventura. A terrena finalidade. Po-rém, só as puras elites conseguiram realizar a antropofagia carnal, que traz em si o mais alto sentido da vida e evita todos os males identificados por Freud, males catequistas. O que se dá não é uma sublimação do instinto sexual. É a escala termométrica do instinto antropofágico. De carnal, ele se torna eletivo e cria a amizade. Afetivo, o amor. Especulativo, a ciência. Desvia--se e transfere-se. Chegamos ao aviltamento. A baixa antropofagia aglomerada nos pecados de catecismo – a inveja, a usura, a calúnia, o assassinato. Peste dos chamados povos cultos e cristianizados, é contra ela que estamos agindo. Antropófagos.

TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda europeia e modernismo brasileiro: apresentação e crítica dos principais mani-festos vanguardistas. Petrópolis: Vozes, 1976, p. 293-299.

O movimento de “deglutinação”, proposto pelos antropófagos, pode ser percebido nos próprios periódicos e manifestos. Na capa da Revista de Antropofagia, por exemplo, Oswald de Andrade se vale de uma ilustração de Hans Staden, alemão que esteve no Brasil no período do descobrimento.

Esse aventureiro naufragou na costa do Brasil e foi capturado pela tribo indígena tupinambá, que tinha a intenção de devorá-lo em uma cerimônia canibal. Staden é salvo por um navio francês e o resultado dessa experiência foi relatado no livro História verdadeira e descrição de uma terra de selva-gens, nus e cruéis comedores de seres humanos, situada no novo mundo da América, desconhecida antes e depois de Jesus Cristo nas terras de Hessen até os dois últimos anos, visto que Hans Staden, de Homberg, em Hessen, a conheceu por ex-periência própria e agora a traz a público com essa impressão.

Capa da edição fac-similar com os 16 números da

Revista de Antropofagia

Desafio

Qual era a intenção da revista ao “deglutir” esse referente original?

Ensino Médio | Modular 39

LITERATURA BRASILEIRA

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O trecho “Tupi or no tupi, thats is the question” faz referência à fala de Hamlet, na peça homônima de Shakespeare “To be or not to be, thats is the question”. Faça uma pesquisa para descobrir qual o sentido da fala original e depois explique de que ma-neira Oswald de Andrade se apropria dela, ressignificando-a.

Latin

Stoc

k/In

terf

oto

Oswald de Andrade

José Oswald de Sousa Andrade (1890-1954) nasceu em São Paulo, vindo de uma família de ricos comerciantes de imóveis. Por conta de suas facilidades financeiras, ainda jovem lançou O pirralho, jornal humorístico de grande repercussão.

Em 1912, fez a sua primeira viagem à Europa, onde entrou em conta-to com várias teorias vanguardistas, sendo fortemente influenciado pelo

caráter anarquista dessas ideias, em especial o Futurismo, cuja proposta introduziu no Brasil.

Concluiu a faculdade de Direito e engajou-se na Semana de Arte Mo-derna, sendo um de seus principais responsáveis. Depois, desenvolveu as ideias modernistas por meio de revistas e periódicos já estudados nesta unidade, entre eles Manifesto Pau-Brasil e revista Antropofagia.

No âmbito político, Oswald foi um dos raros escritores modernistas da primeira fase que assumiu posição esquerdista. Ele inclusive filiou-se ao Partido Comunista.

Oswald foi casado com a pintora Tarsila do Amaral, uma das fundadoras do Modernismo brasileiro. E, mais tarde, com outra personalidade da cultura brasileira, Patrícia Galvão,

a Pagu.De todos os artistas modernistas, ficou conhecido por sua instabilidade

e pelo espírito irreverente, polêmico, irônico e combativo. No final da vida, sofreu muito com a falta de reconhecimento, as doenças e as dificuldades financeiras que assolaram a sua família depois da Crise de 1929.

Tarsila do Amaral

Patrícia Galvão, a Pagu

Acervo Iconographia

Acervo Iconographia

Oswald de Andrade

Oswald de

Andrade:

biografia,

obras,

cronologia e

estilo

@LIT1013

40 Modernismo – Primeira Fase

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PoemasA produção poética de Oswald de Andrade não é muito homogênea, isso significa que dificilmente

encontraremos uma temática predominante ou abordagem filosófica. Sua preocupação se confunde com os próprios ideais modernistas, muito bem apresentados na Semana de Arte Moderna e nos manifestos e revistas.

De modo geral, pode-se dizer que o radicalismo e o empenho em atualizar as letras brasileiras foram as suas maiores pesquisas literárias. Do ponto de vista formal, seus poemas se caracterizam pela busca de uma linguagem cada vez mais próxima do linguajar cotidiano, marcado por expressões informais; pela síntese, os textos são quase “poemas-pílulas”; pela linguaguem telegráfica; a sintaxe quebrada, fragmentada e subliminar. Do ponto de vista temático, havia uma investigação do passado nacional, a revisão de fatos consagrados pela história, o humor e dessacralização.

Erro de português

Quando o português chegouDebaixo duma bruta chuvaVestiu o índioQue pena!Fosse uma manhã de solO índio tinha despido O português

ANDRADE, Oswald de. Biografias brasileiras. São Paulo: Callis, 2000. p. 45.

Os poemas e versos curtos são a marca registrada da poética de Oswald de Andrade.

Há o objetivo de revisar um fato histórico, ainda que de forma jo-cosa, o poeta sugere uma nova forma de interpretar os fatos.

O título é ambíguo e irônico, uma vez que pode ser entendido como erro no uso do português vernáculo e como um erro cometido por um português, pessoa nascida em Portugal.

A expressão é própria da linguagem informal e até, então, muito incomum na linguagem poética.

O termo “vestir” pode ser entendido literal-mente como colocar vestimentas, ou no sentido metafórico de se impor culturalmente.

1. Leia o poema “Erro de português” e procure fazer uma inversão de papéis: imagine que o indígena chegou à Europa. Como você acha que seria essa recepção? Os índios iriam despir o europeu? Le-vante hipóteses.

2. O reaproveitamento de temas e textos do nosso repertório cultural foi uma maneira que Oswald de Andrade encontrou para reconstruir a nossa própria identidade. Pensando nisso, compare o texto original de Pero Vaz de Caminha e o poema, analisando os efeitos de sentido que decorrem dessa manipulação.

Os selvagensMostraram-lhes uma gallinhaQuasi haviam medo dellaE não queriam pôr a mãoE depois a tomaram como espantados

ANDRADE, Oswald de. Poesia Pau Brasil. Paris: Sans Pareil, 1925. p. 25.

Carta de Caminha [...] Mostraram-lhes um papagaio pardo que o Capitão traz

consigo; tomaram-no logo na mão e acenaram para a terra, como se os houvesse ali.

Mostraram-lhes um carneiro; não fizeram caso dele.Mostraram-lhes uma galinha; quase tiveram medo dela, e não

lhe queriam pôr a mão. Depois lhe pegaram, mas como espantados.Deram-lhes ali de comer: pão e peixe cozido, confeitos, fartéis,

mel, figos passados. Não quiseram comer daquilo quase nada; e se provavam alguma coisa, logo a lançavam fora.[...]

CAMINHA, Pero Vaz de. A carta. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/ua000283.pdf>. Acesso em: 22 ago. 2011.

Ensino Médio | Modular 41

LITERATURA BRASILEIRA

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3. Analise o seguinte poema de Oswald de Andrade e assinale a opção incorreta sobre ele.

Vicio na falaPara dizerem milho dizem mioPara melhor dizem mióPara peor pióPara telha dizem têiaPara telhado dizem teadoE vão fazendo telhados

ANDRADE, Oswald. Poesia Pau Brasil. Paris: Sans Pareil, 1925. p. 33.

a) O “eu lírico” faz uma crítica ao modo de falar típico de algumas camadas sociais.

b) O poema tem a intenção de levantar diferen-tes registros, a fim de mostrar a variedade que compõe a língua portuguesa.

c) Ao trazer para o poema a linguagem popu-lar, o autor subverte a produção poética do período.

d) Há um elogio à variação linguística, uma vez que, independentemente da forma como se expressa, a camada popular dá continuidade a sua rotina.

e) O autor se vale de elipses, como meio de tor-nar o poema mais sintético, assemelhando-o à fala oral e cotidiana.

4. Analise o poema e faça o que se pede.

O capoeira– Qué apanhá sordado?– O quê?– Qué apanhá?Pernas e cabeças na calçada

ANDRADE, Oswald de. Poesia Pau Brasil. Paris: Sans Pareil, 1925. p. 39.

a) Identifique no texto três características do movimento modernista:

b) O poema sugere uma subversão da ordem estabelecida, tanto do ponto de vista formal quanto temático. Aponte esse questiona-mento:

Memórias sentimentais de João MiramarO romance mais conhecido de Oswald de Andrade é na verdade uma autobiografia construída

em 163 flashes, remontando ao sistema cinematográfico. Cada uma dessas partes é composta de diferentes gêneros: cartas, anúncios, diálogos, citações, etc. e contam de forma não linear a história de um brasileiro rico, suas viagens, casamento, produções, dificuldades financeiras, etc.

O texto é organizado de forma pouco tradicional. A miscelânea de diferentes elementos que apa-recem explicitamente na tessitura da obra é própria do romance moderno, inaugurado no Brasil com o Memórias sentimentais de João Miramar.

Em capítulos extremamente curtos, o personagem-narrador Miramar conta a história de sua vida desde a infância. Fazendo uso do estilo cinematográfico, Oswald, por meio de verdadeiros flashes, apresenta episódios da vida de seu personagem Miramar como a viagem à Europa e os amores por ele vividos e a sua derrocada econômica.

Ao fim da narrativa, Miramar conta a morte da esposa e a sua vontade de manter o silêncio após essa fatalidade.

O romance em questão faz uso de uma linguagem concisa, de impacto, humorística, explorando a técnica cubista de montagem, a simultaneidade, neologismos, o estilo telegráfico e a quebra da ordem sintática, como podemos observar nos seguintes trechos:

Modernismo – Primeira Fase42

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62. ComprometimentoO Forde levou-nos para a igreja e notário entre matos derrubados e vasta promessa das primeiras

culturas.Jogaram-nos flores como bênçãos e sinos tilintaram.A lua substituiu o sol da guitarra do mundo mas o dia continuou tendo havido entre nós apenas

uma separação precavida de bens. [...]

131. Mais que perfeitoEu tinha saído do laboratório da Itacolomi Film onde Rolah tinha dado uma hora preguiçosa de

pose para observações contratuais. Ela tinha me confessado pela manhã que seus amores anteriores com pastores não tinham passado

de pequenos flertes de criança.Agora quando tínhamos descido a escada longa eu me tinha baixado até os orquestrais cabelos louros. E tínhamo-nos juntado no grande doce e carnoso grude dum beijo mudo como um surdo.

ANDRADE, Oswald de. Memórias sentimentais de João Miramar. São Paulo: Globo, 2004. p. 100-139.

1. Analisando os fragmentos do romance, pode- -se dizer que a sua composição segue o mesmo modelo de qual outra expressão artística:

a) fotografia;

b) escultura;

c) artes plásticas;

d) música;

e) design.

2. Analisando a linguagem utilizada, quais evi-dências demonstram que ele continua desen-volvendo as mesmas propostas presentes nos manifestos e poesias?

3. A relação entre o título do excerto e a cena apresentada sugerem um certo humor. Expli-que essa relação para o capítulo 62.

4. O título do capítulo 131 pode ser interpretado de várias maneiras. Explique quais são os senti-dos envolvidos na construção do trecho.

Um dos sentidos de “mais que perfeito” aparece nas escolhas formais do poema. Identifique-a.

5. (PUC-Campinas – SP)

O alpinista

de alpenstock

desceu

nos Alpes

O texto acima, capítulo do romance Memória sentimentais de João Miramar, exemplifica uma tendência do autor de:

a) procurar as barreiras entre poesia e prosa, utilizando estilo alusivo e elíptico;

b) explorar o poema em forma de prosa, sati-rizando as manifestações literárias do Pré- -Modernismo;

c) buscar uma interpretação lírica de seu país, explorando a força sugestiva das palavras;

d) utilizar o poema-piada, para satirizar tudo o que não fosse nacional;

e) procurar “ser regional e puro em sua época”, negando influências das vanguardas euro-peias.

Ensino Médio | Modular 43

LITERATURA BRASILEIRA

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Manuel Bandeira

Manuel Carneiro de Souza Bandeira (1886-1968) nasceu em Recife, mas ainda jovem mudou-se para o Rio de Janeiro, onde cursou o Ensino Médio no prestigiado colégio Dom Pedro II.

Em 1903, matriculou-se na Escola Politécnica de São Paulo, mudando-se para a cidade, a fim de estudar Arquitetura. Porém, descobriu que era acometido por uma doença muito comum no pe-

ríodo, a tuberculose. Desde então, transferiu-se para diversos locais com o intuito de cuidar da saúde. Primeiro, para Campos do Jordão, pois se acreditava que os lugares com clima

mais ameno fizessem bem à saúde daqueles que convalesciam dessa doença. Depois, com a ajuda da família, passa um período na Suíça, no sanatório Clavadel, tratando-se.

Por conta da Primeira Guerra Mundial, voltou ao Brasil com o seu primeiro livro fina-lizado, A cinza das horas (1917). Trata-se de uma publicação com poemas de composição rígida: sonetos, rimas ricas e métricas perfeitas, fortemente influenciadas pela estética

parnasiana e simbolista. Contribuiu com a Semana de Arte Moderna, com a leitura do poema “Os sapos”, grande

libelo contra a literatura parnasiana. Essa participação marca o início de uma produção de caráter modernista, que terá como auge a publicação dos livros Libertinagem (1930) e Estrela

da manhã (1936). Manuel Bandeira morreu aos 82 anos, no dia 13 de outubro de 1968, por causa de uma hemorragia

gástrica. Para compreender melhor a figura do poeta, conheça um dos seus poemas mais famosos, em que

ele apresenta a si mesmo.

Autorretrato PROVINCIANO que nunca soubeEscolher bem uma gravata;Pernambucano a quem repugnaA faca do pernambucano;Poeta ruim que na arte da prosaEnvelheceu na infância da arte,E até mesmo escrevendo crônicasFicou cronista de província;Arquiteto falhado, músicoFalhado (engoliu um diaUm piano, mas o tecladoFicou de fora); sem família,Religião ou filosofia;Mal tendo a inquietação de espíritoQue vem do sobrenatural,E em matéria de profissãoUm tísico profissional.

BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1996. p. 394.

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Manuel

Bandeira:

biografia, obras,

cronologia e

estilo

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Modernismo – Primeira Fase44

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A vida e a obra de Manuel Bandeira ficaram profundamente marcadas pela doença e pela iminência da morte. De maneira geral, os seus textos possuem um tom pessimista e melancólico, ainda que revestidos de um estilo simples e direto.

Nos seus primeiros livros, mais do que no restante, impera uma poesia impregnada de tristeza e desolação, falando principalmente da sua experiência pessoal com a doença.

Depois, tende cada vez mais ao riso, ao cotidiano, ao chiste, retomando temas caros à sua poética, que esteve sempre inspirada em sua própria vida: aparecem assim a família, a infância, as prostitutas, as relações amorosas, os pobres, etc. Trata-se de um poeta que canta as ruas, o povo e a si próprio, num lirismo confidencial, singelo, mas contundente.

Leia os textos a seguir e entenda mais sobre essa passagem – mudança poética – na produção de Manuel Bandeira:

Desencanto

Eu faço versos como quem choraDe desalento... de desencanto...Fecha o meu livro, se por agoraNão tens motivo algum de pranto

Meu verso é sangue. Volúpia ardente...Tristeza esparsa... remorso vão...Dói-me nas veias. Amargo e quente,Cai, gota a gota, do coração.

E nesses versos de angústia roucaAssim dos lábios a vida corre,Deixando um acre sabor na boca.– Eu faço versos como quem morre.

BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1996. p. 119.

Esse exemplo faz parte do primeiro livro de Manuel Bandeira, A cinza das horas, de viés mais carre-gado e mais formalista. Observe que o tema e o vocabulário pendem quase para o dramático: “Eu faço versos como quem chora”, “Meu verso é sangue”, “Cai, gota a gota, do coração”. Porém, o conjunto das imagens evocadas e a habilidade formal, como o uso de rimas ricas (chora – pranto, desencanto – agora), a pontuação expressiva, a métrica fixa (decassílabos) e a melodia, transparecem a sua qua-lidade poética. Trata-se de um autor em fase de descobrimento, mas que já dá sinais de brilhantismo.

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Ensino Médio | Modular 45

LITERATURA BRASILEIRA

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Depois, seu lirismo desenvolve-se de forma mais bem-humorada, ainda que o poeta não tenha se desvencilhado totalmente do peso da morte:

Pneumotórax FEBRE, HEMOPTISE, dispneia e suores noturnos. A vida inteira que podia ter sido e que não foi. Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico: – Diga trinta e três. – Trinta e três... trinta e três... trinta e três... – Respire.

– O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado. – Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax? – Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1996. p. 206.

Já nesse caso, trata-se de um poema publicado no livro Libertinagem, de caráter modernista, como se pode notar no próprio título, que faz alusão à doença que se constitui no acúmulo de ar entre o pulmão e a membrana torácica. O uso incomum de um termo técnico já demonstra o grau de ruptura sugerido. Além disso, observamos que ele mistura diferentes gêneros, fazendo uso do discurso direto, da repetição e enumeração de termos, além de estar organizado em versos livres. Tais elementos conferem humor e leveza ao tratamento do assunto.

Para finalizar, o último verso funciona como uma piada, mostrando que não há solução para o doente, somente tocar um tango argentino, gênero musical conhecido pelo seu tom dramático.

Manuel Bandeira desenvolveu uma poesia voltada para o cotidiano, porém, em alguns momen-tos, notamos que existem exemplos de textos que se voltam ao idealismo. Pensando nisso, leia o seguinte poema:

Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra PasárgadaLá sou amigo do reiLá tenho a mulher que eu queroNa cama que escolhereiVou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra PasárgadaAqui eu não sou felizLá a existência é uma aventuraDe tal modo inconsequenteQue Joana a Louca de EspanhaRainha e falsa dementeVem a ser contraparenteDa nora que nunca tive

E como farei ginásticaAndarei de bicicletaMontarei em burro braboSubirei no pau de seboTomarei banhos de mar!E quando estiver cansadoDeito na beira do rioMando chamar a mãe-d'águaPra me contar as históriasQue no tempo de eu meninoRosa vinha me contarVou-me embora pra Pasárgada

Modernismo – Primeira Fase46

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Em Pasárgada tem tudoÉ outra civilizaçãoTem um processo seguroDe impedir a concepçãoTem telefone automáticoTem alcaloide à vontadeTem prostitutas bonitasPara a gente namorar

E quando eu estiver mais tristeMas triste de não ter jeitoQuando de noite me derVontade de me matar– Lá sou amigo do rei –Terei a mulher que eu queroNa cama que escolhereiVou-me embora pra Pasárgada.

BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1996. p. 222.

1. O local descrito pelo “eu lírico” existe de ver-dade? Justifique:

2. O poema utiliza um recurso muito comum, amplamente utilizado pelos românticos e simbolistas. Assinale a afirmação que o des-creve corretamente:

( ) A utopia, ideia de civilização ideal, fan-tástica, serve como meio de fuga da realidade. É uma forma de evasão do eu lírico que almeja uma outra situação para fugir de seus problemas reais.

( ) A distopia, pensamento ou filosofia que descreve uma situação contrária à utopia, serve como meio de criticar a sociedade em que se vive, apontando os seus defeitos comparativamente.

( ) A paródia, apropriação ou citação de ou-tro texto original, tem a intenção de ridi-cularizar a idealização dos românticos e apresentar o mundo como ele se oferece.

3. Se você fosse embora para Pasárgada, o que gostaria de encontrar?

4. (CEFET – CE)

Texto

Misael, funcionário da fazenda, com 63 anos de idade.

Conheceu Maria Elvira na Lapa – prostituída, com sífilis, dermite nos dedos, uma aliança empenhada e os dentes em petição de miséria.

Misael tirou Maria Elvira da vida, instalou-a num sobrado no Estácio, pagou médico, dentista, manicura ... Dava tudo quanto ela queria.

Quando Maria Elvira se apanhou de boca bonita, arranjou logo um namorado.

Misael não queria escândalo. Podia dar uma surra, um tiro, uma facada. Não fez nada disso: mudou de casa.

Viveram três anos assim. Toda vez que Maria Elvira arranjava namorado,

Misael mudava de casa. Os amantes moraram no Estácio, Rocha,

Catete, Rua General Pedra, Olaria, Ramos, Bonsucesso, Vila Isabel, Rua Marquês de Sapucaí, Niterói, Encantado, Rua Clapp, outra vez no Estácio, Todos os Santos, Catumbi, Lavradio, Boca do Mato, Inválidos...

Por fim na Rua da Constituição, onde Misael, privado de sentidos e de inteligência, matou-a com seis tiros, e a polícia foi encontrá-la caída em decúbito dorsal, vestida de organdi azul.

1933, Manuel Bandeira

A partir das características do Modernismo e tendo como referência o texto de Manuel Bandeira, pode-se afirmar que:

a) apesar de pertencer a um livro de poe-sias, o texto apresenta uma narração solta;

b) o ritmo das frases nos leva a concluir que esse texto é característico da prosa;

c) o texto impede que classifiquemos como poesia em prosa;

d) a presença de personagens nos garante que o texto não é uma prosa poética;

e) por representar uma sequência natural de começo, meio e fim, o texto jamais poderia ser classificado como poesia em prosa.

LITERATURA BRASILEIRA

47Ensino Médio | Modular

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Menotti del Picchia

Paulo Menotti del Picchia (1892-1988) nasceu em São Paulo e se formou em Direito pela Faculdade do Largo São Francisco em 1913. Nesse mesmo ano, publicou seu primeiro livro Poemas do vício e da virtude. Colaborou para vários jornais, mas ficou conhecido pelos poemas “Moisés” e “Juca Mulato” (1917), em que procura fixar o gênio triste da raça.

Engajou-se na Semana de Arte Moderna e, depois, continuou a contribuir para o movimento quando se alia ao Verde-Amarelismo em 1924. Depois, deu continuação às suas propostas participando do Grupo Anta, como resposta às manifestações de Oswald de Andrade com o Manifesto Pau-Brasil e o Manifesto Antropofágico.

Escreveu ensaios, romances, poemas, novelas, peças de teatro e textos infantis. Fez grandes contribuições para o jornal Correio Paulistano, publicando, de 1920 a 1930, crônicas que registravam a repercussão do movimento modernista no cenário nacional.

Sobre seu estilo, Alfredo Bosi caracteriza-o pelo seu tom prosaico de cronista, que dava a seus textos uma animação jornalística. Diria ele:

“Tenaz divulgador de novas tendências estéticas, Menotti del Picchia construiu uma obra singular no contexto modernista, no sentido de uma descida de tom (um maldoso diria: de nível) que lhe permitiu aproximar-se do leitor médio e roçar pela cultura de massa que hoje ocupa mais de um ideólogo perplexo.

Antes de 22, Menotti escrevera um poemeto sertanista muito brilhante, “Juca Mulato”, que logo caiu no gosto de toda casta de leitores. Era sinal de uma comunicabilidade fácil e vigorosa, não desmentida em “Moisés”, poema bíblico, e em “Máscaras”, ambos de 1917.”

BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 1994. p. 367.

5. Leia o seguinte texto e faça o mesmo exercício de Manuel Bandeira. Encontre uma notícia de jornal e tente transformá-la em um texto, em um poema.

Poema Tirado de uma Notícia de Jornal

João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro

da Babilônia num barracão sem número

Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro

Bebeu

Cantou

Dançou

Depois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.

BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1996. p. 214.

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Modernismo – Primeira Fase48

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Juca MulatoTrata-se de um livro composto de vários poemas que relatam a história de Juca Mulato, um caipira

que se apaixona pela filha da patroa e sofre com esse amor impossível.

Juca Mulato sofre... Esse olhar calmo e docefugiu-lhe como a luz, como a luz apagou-se.

Feliz até então, tinha a alma adormecida...Esse olhar que o fitou o acordou para vida!A luz que nele viu deu-lhe a dor que ora assombra, como o sol que traz a luz e, depois deixa a sombra... [...]

“Sofre, Juca Mulato, é tua sina, sofre...Fechar ao mal de amor nossa alma adormecidaé dormir sem sonhar, é viver sem ter vida...Ter a um sonho de amor o coração sujeitoé o mesmo que cravar uma faca no peito. Esta vida é um punhal com dois gumes fatais:não amar, é sofrer; amar, é sofrer mais ainda!”

PICCHIA, Menotti del. Juca Mulato. São Paulo: Círculo do livro, 1982. p. 13-14.

Para acabar com a sua tristeza, Juca Mulato consulta um feiticeiro e decide ir embora de sua terra. Nesse momento, a natureza faz um grande apelo ao caboclo para que fique:

Juca olhou para a terra e a terra muda e fria pela voz do silêncio ela também dizia: “Juca Mulato, és meu! Não fujas que eu te sigo...Onde estejam teus pés, eu estarei contigo.Tudo é nada, ilusão! Por toda a esferahá uma cova que se abre, há meu ventre que espera..Nesse ventre, a uma noite escura e ilimitada, e nela o mesmo sono e nele o mesmo nada. Por isso o que vale ir, fugitivo e a esmo, busca a mesma dor que trazes em ti mesmo?Tu queres esquecer, não fuja ao tormento...Só por meio da dor se atinge o esquecimento. Não vás. Aqui serão teus dias mais serenos, que, na terra natal, a própria dor dói menos...E fica que é melhor morrer (ai, bem sei eu!) no pedaço de chão e que a gente nasceu!”

PICCHIA, Menotti del. Juca Mulato. São Paulo: Círculo do livro, 1982. p. 49.

LITERATURA BRASILEIRA

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Ao recobrar seu alento, o personagem decide, então, que seu lugar é aquele e fica em sua terra natal:

[...] Vai! Esquece a emoção que na alma tumultua, Juca Mulato! Volta outra vez para a terra, procura o teu amor numa alma irmã da tua,

Esquece calmo e forte. O destino impera, um recíproco amor às almas todas deu.Em vez de desejar o que te exaspera, procura esse outro olhar que te espreita e te espera, que há por certo, um olhar que espera o teu...

PICCHIA, Menotti del. Juca Mulato. São Paulo: Círculo do livro, 1982. p. 54.

1. Analisando os trechos do poema, quais são os elementos que caracterizam o apego ao nacio-nalismo que Menotti del Picchia defendia em suas propostas modernistas:

2. Do ponto de vista formal, pode-se dizer que o poema também foge à tradição como era co-mum à poesia modernista? Justifique.

Desafio

3. Na sua opinião, trata-se de um poema moder-nista ou não? Justifique:

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Raul Bopp

Raul Bopp (1898-1984) nasceu no Rio Grande do Sul, na cidade de Vila Pinhal. Em 1918, matriculou-se na Faculdade de Direito e iniciou uma série de viagens pelo Brasil, cursando um ano da faculdade em cada cidade: Porto Alegre, Recife, Belém e Rio de Janeiro. Por volta de 1920, iniciou outra viagem, detendo-se,

especialmente, na Amazônia, região de onde tira o tema para a sua grande obra-prima, Cobra Norato. Tornou-se poeta e diplomata, participando da Semana de Arte Moderna e, depois, do

grupo Verde-Amarelo e Antropofagia. Sua participação no movimento antropofágico foi especialmente relevante por causa de Cobra Norato, compilação de poemas de caráter épico e mitológico, em que o autor, valendo-se de muitas histórias folclóricas, conta em versos livres a história do herói que mata a Cobra Norato.

Cobra NoratoO livro, publicado em 1931, conta a história do herói que, depois de matar a cobra,

decide usá-la como disfarce para salvar a filha da rainha Luzia de Cobra Grande, atraves-sando, assim, o caminho amazônico com mais facilidade.

No entremeio, faz um belo levantamento etnográfico da região, descrevendo as paisa-gens amazônicas de forma excepcional. Na composição, vale-se de várias fábulas da região e

do linguajar típico do povo, com um intuito quase primitivista de reconstrução de narrativas locais.

XXIX– Escuta compadreO que se vê não é navio É a Cobra Grande

– Mas o casco de prata? As velas embojadas de vento?

Aquilo é a Cobra GrandeQuando começa a lua cheia ela apareceVem buscar moça que ainda não conheceu homem

A visagem vai se sumindo pras bandas de Macapá

Neste silêncio de águas assustadasparece que ainda ouço um soluço quebrando-se na noite

– Coitadinha da moçaComo será o nome dela?Se eu pudesse ia assistir o casamento

– Casamento de Cobra Grande chama desgraça, compadre Só se a gente arranjar mandinga de defunto

Ué! Então vamosLobisomem está de festa no cemitério

BOPP, Raul. Cobra Norato e outros poemas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. p. 75-76.

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LITERATURA BRASILEIRA

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1. O trecho narra qual momento da história?

2. Quais elementos pertencem ao folclore local?

3. Qual dos exemplos a seguir não é típico do re-gistro informal e/ou regional?

a) “Compadre”.

b) “pras bandas”.

c) “Mandinga”.

d) “Ué! Então vamos”.

e) “Águas assustadas”.

Mário de Andrade

Mário de Andrade viveu de 1893 a 1945. Artista e estudioso bastante plural, iniciou sua carreira pela dedicação à música, mas logo aderiu a outras modalidades artísticas. Em 1917, publicou, sob o pseudônimo de Mário Sobral, seu primeiro livro: Há uma gota de sangue em cada poema.

Participante extremamente versátil da Semana de Arte Moderna, Mário atuou frontalmente tanto na estruturação teórica do movimento quanto na produção artística. Destacou-se como músico, poeta,

prosador, folclorista, jornalista. No ano de eclosão do Modernismo brasileiro, 1922, publicou o livro de poemas Pauliceia desvairada, cujo tema central era a vida da urbe paulista.

Ao longo de sua vida, exerceu inúmeros e variados cargos, sempre vinculados à esfera cultural. Faleceu em 1945, não resistindo a um ataque cardíaco.

A obra de Mário de Andrade é de fundamental importância na composição do cenário de todo o movimento modernista brasileiro. Mário de Andrade adere completamente aos ideais modernistas da Semana de 22. Em livros como Pauliceia desvairada (1922) e Losango cáqui (1926), seus poemas surgem compostos em versos livres, empregando linguagem coloquial e exaltando paixões contemporâneas ao seu momento histórico, como fica claro na

exaltação da metrópole de São Paulo. Tudo isso, contudo, mesclado com o espírito combativo e crítico do Modernismo da primeira fase. Outras obras, entre as quais o Clã do jabuti (1927), já

denotarão maior nacionalismo por parte do escritor. Procurando alcançar uma identidade nacional, distinta da imagem ufana da pátria, difundida durante o Romantismo, o poeta faz uso do folclore

brasileiro: resgata e concilia em suas obras ficcionais as tradições africanas, indígenas e sertanejas.Em sua prosa, merecem especial destaque duas obras: Amar, verbo intransitivo e Macunaíma.

Amar, verbo intransitivoEsse romance conta a história de Carlos, jovem de família abastada, e sua relação com a professora

e governanta de origem alemã “Fräulein” Elza. Aos olhos das irmãs menores e da mãe, em princípio Elza estava na casa apenas para ensinar lições, de piano, por exemplo, e coordenar os estudos de Carlos. Porém, o romance, ao se desenrolar, revela sua verdadeira função: a imigrante de 35 anos havia sido contratada pelo pai de Carlos para ser a educadora sentimental – leia-se sexual – do moço.

Quanto à linguagem, o romance é repleto de ousadias. Entre usos de estrangeirismos, por exemplo, surgem jogos metalinguísticos e tentativas de trazer para a prosa a linguagem coloquial, falada pelo povo da época. É como se o texto escrito imitasse a maneira de falar do povo. Já o título constitui-se

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Mário de

Andrade:

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numa provocação linguística. “Amar é verbo transitivo direto”. Como e por que estaria sendo então chamado de intransitivo? Segue-se na capa ainda a denominação de “Idílio”, o que nos remete a um sonho de amor recíproco, romântico. Não é preciso, ou ao menos objetivamente, o modelo de amor tratado no livro.

O livro aborda fatos sociais de sua época e hábitos do paulistano. Porém, não sem uma clara nota crítica que, vez por outra, ganha o tom de “nosso povo não tem jeito: é assim mesmo”.

Leia um trecho de Amar, verbo intransitivo:

[...] Os olhos dela pouco a pouco se fecharam, cega duma vez. A razão pouco a pouco escampou. [...] Se misturavam animalidades e invenções geniais. E o orgasmo. Adquirira enfim uma alma vegetal. E assim perdida, assim vibrando, as narinas se alastraram, os lábios se partiram, contrações, rugas, esgar, numa expressão dolorosa de gozo, ficou feia. [...][...] Abriu os braços. Enervada, ainda pretendeu sorrir. Não pôde mais. O corpo arrebentou. Fräulein deu um grito.

ANDRADE, Mário de. Amar, verbo intransitivo. Belo Horizonte: Villa Rica, 1995. p. 120-121.

1. No trecho apresentado, tem-se a descrição de uma cena sensual. No entanto, pode-se afirmar que a descrição de Elza é erótica ou romântica? Por quê?

2. Agora, retorne algumas páginas em seu livro e observe novamente o quadro O grito (página 22), de Edvard Munch, que você analisou ao es-tudar o Expressionismo. Compare agora a cena do grito de Elza com a da tela de Munch:

Macunaíma

Cena do filme Macunaíma, dirigido por Joaquim Pedro de

Andrade em 1969, com Grande Otelo, Paulo José, Dina Sfat e Jardel Filho. Esse filme é uma espécie de alegoria do Brasil

e de seu desenvolvimento social, já que o país passava

por transformações na época, como a construção de Brasília, que havia sido inaugurada em

1960

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LITERATURA BRASILEIRA

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Muiraquitã: conhecida desde os tempos do descobrimento, conforme comprovam narrativas e achados arqueológicos, essa pedra verde, geralmente esculpida com a forma de batráquio, trazia proteção e boa sorte, segundo a crença dos indígenas da Região Norte

Macunaíma, de 1928, pode, por seu caráter de inovação no uso da linguagem e por sua mescla de elementos textuais e culturais “colados” como uma grande narrativa, ser analisada como a obra em prosa mais significativa do Modernismo brasileiro. Nesse romance, que o próprio Mário chamaria de rapsódia, aparecem um nacionalismo crítico e um resgate cultural por meio da operação com diversas lendas indígenas.

O romance conta a história de Macunaíma, herói cujo nome provém do tupi “o grande mal”. Ou melhor: um anti-herói ou um “herói sem nenhum caráter”, como diz o subtítulo da obra, que já de saída se contrapõe a todo o ideário heroico sagrado pela literatura até então.

Macunaíma é um membro da tribo índígena tapanhuma. Filho caçula de sua família, vivia com a mãe e os irmãos Maanape e Jiguê às margens do rio Uraricoera, na Amazônia. Trata-se de um pro-tagonista preguiçoso, mentiroso e que tem por hábito provocar rusgas e encrencas com os irmãos, principalmente com Jiguê.

Com a morte da mãe, os irmãos e Macunaíma são levados a partir “por esse mundo”. Durante a viagem, eles se encontram com diversos seres da mitologia indígena nacional.

Macunaíma se depara com a personagem lendária Ci, a mãe do mato, e, depois de “brincar” com ela, torna-se “imperador do Mato Virgem”. O casal, então, passa a viver feliz na floresta. Porém, certo dia, o filho deles mama leite envenenado e morre. Ci, envolta em profundo desgosto, vem também a falecer. Então, como pregam várias lendas indígenas, a falecida transforma-se em uma estrela. Não sem antes, porém, dar ao esposo, Macunaíma, a muiraquitã, uma pedra verde que serve de poderoso amuleto.

Certa feita, numa situação de luta com o monstro chamado Boiuna Capei, Macunaíma perde esse amuleto. Um pássaro, contudo, lhe informa que a tal pedra verde havia sido sorvida por uma tartaruga na praia do rio e que um homem, tendo pegado o animal, achara o amuleto. A ave arremata contando que a pedra fora vendida a Venceslau Pietro Pietra, um peruano que morava em São Paulo.

Em missão de resgate do precioso amuleto, os três irmãos seguem rumo a São Paulo. Lá, descobrem que o comerciante peruano, longe de ser inofensivo, era o gigante Piaimã, conhecido por comer gente.

Muitas são, então, as tentativas do grupo para reaver o amuleto. Sem sucesso, no entanto. Sabendo de uma sessão de macumba que transcorria no Rio de Janeiro, Macunaíma vai até

lá tentar encomendar um trabalho para se vingar do gigante Piaimã. Dessa vez, também não é simples obter seu propósito, e Macunaíma terá ainda de viver uma série infin-dável de aventuras mirabolantes até, por fim, conseguir travar o derradeiro confronto com Venceslau Pietro Pietra. Macunaíma vence essa batalha ardilosamente: engana o gigante, e este cai em uma grande panela de macarronada fervendo. Após recuperar o amuleto, o herói sem nenhum caráter volta para a Amazônia com os irmãos. Esses, contudo, acabam falecendo. Macunaíma, então, solitário e desiludido, decide recorrer ao feiticeiro Piauí-Pódole, que, para aliviar sua dor nesta terra, transforma o anti-herói na Constelação de Ursa Maior.

O romance Macunaíma é uma grande colagem de lendas indígenas, dispostas numa espécie de grande mosaico textual. Valendo-se também da técnica do ready-made, Mário se apropria de textos de várias origens e lhes dá nova significância. Esse pout-pourri

de trechos, falas e lendas é o que caracteriza o romance como uma grande e inovadora rapsódia textual.

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1. Leia um trecho do romance Macunaíma:

Nascimento de Macunaíma: o herói sem nenhum caráter

No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a índia tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de Macunaíma.

Já na meninice fez coisas de sarapantar. De primeiro passou mais de seis anos não falando. Si o incitavam a falar exclamava:

– Ai! Que preguiça!...

ANDRADE, Mário de. Macunaíma: o herói sem nenhum caráter. Belo Horizonte: Itatiaia, 1987. p. 9.

Tapanhumas: negros filhos da África que moravam no Brasil. Note que Macunaíma é índio e negro.Macunaíma: o nome significa “Grande Mal”, em tupi.Sarapantar: espantar.Ai: brincadeira linguística que alude ao nome do bicho- -preguiça em tupi: ai.

a) Há várias peculiaridades linguísticas no texto de Macunaíma. Leia no trecho, por exemplo, o “si”, em lugar do “se”. Pense e responda: a que isso se deve e que característica da obra reflete?

b) Há ironia no texto? Explique.

2. O personagem Macunaíma tem como mote a frase “Ai, que preguiça”. Qual é a relação entre essa fala e o conhecido “jeito brasileiro”?

3. (MACKENZIE) “Chamado de rapsódia por Mário de Andrade, o livro é construído a partir de uma série de lendas a que se misturam superstições, provérbios e anedotas. O tempo e o espaço não obedecem a regras de verossimilhança, e o fan-tástico se confunde com o real durante toda a narrativa.”

A afirmação faz referência à obra:

a) O rei da vela. b) Calunga. c) Macunaíma.

d) Memórias sentimentais de João Miramar. e) Martim Cererê.

4. (UFC) Macunaíma – obra-prima de Mário de Andrade – é um dos livros que melhor repre-sentam a produção literária brasileira do pre-sente século. Sua principal característica é

a) traçar, como no Romantismo, o perfil do ín-dio brasileiro como protótipo das virtudes nacionais.

b) ser um livro em que se encontram representa-dos os princípios que orientam o movimento modernista de 22, dentre os quais o funda-mental é a aproximação da literatura à música.

c) analisar, de modo sistemático, as inúmeras variações sociais e regionais da língua por-tuguesa no Brasil, destacando em especial o tupi-guarani.

d) ser um texto em que o autor subverte, na linguagem literária, os padrões vigentes, ao fazer conviver, sem respeitar limites geográ-ficos, formas linguísticas oriundas das mais diversas partes do Brasil.

e) exaltar, de forma especial, a cultura popular regional, particularmente a representativa do Norte e Nordeste brasileiro.

Ensino Médio | Modular 55

LITERATURA BRASILEIRA

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8. (UNIJUÍ) A afirmação dos elementos locais, do Brasil, estão presentes em Macunaíma, de Mário de Andrade.

Sobre o livro é incorreto afirmar que:

a) Macunaíma é um “anti-herói”, com caracte-rísticas como o individualismo e a malandra-gem;

b) o livro aproveita as tradições míticas dos ín-dios; seus irmãos são Maanape e Jiguê;

c) aproveita também ditados populares, obsce-nidades, frases feitas, com fatores traços de oralidades;

d) o livro foi chamado de rapsódia e é uma obra central do movimento modernista;

e) o livro não satiriza certos padrões de escrita acadêmica e não trabalha elementos de um “caráter” brasileiro.

9. (PUCPR) Mário de Andrade é considerado o mestre dos escritores modernistas por sua atu-ação crítica e pela variedade de gêneros textu-ais que escreveu e que se transformaram em exemplos da escrita literária desse período es-tético. Assinale a alternativa que contém a afir-mação correta sobre sua obra:

a) Macunaíma é uma colagem de mitos amazô-nicos e narrativas urbanas, e estilos narrati-vos diversificados;

b) Amar, verbo intransitivo é o mais completo exemplo da prosa sentimental modernista, exaltada e idealizadora;

c) Pauliceia desvairada é obra patriótica, de forte cunho nacionalista e uma concepção irracionalista da existência;

d) Contos novos é uma coletânea de narrativas que combinam a narrativa enraizadamente colonial e a vanguarda europeia e experi-mental;

e) Sua obra de crítica literária, representada por O empalhador de passarinho, tem forte origem teórica europeia, sobretudo a ita-liana.

5. (UFC) Macunaíma é um “herói sem nenhum ca-ráter”, porque

a) vive sonhando com riqueza fácil e, para ob-tê-la, lança mão de qualquer recurso.

b) não é um ser confiável.

c) ainda não encontrou sua própria definição, sua identidade.

d) não tem firmeza de personalidade, nem se-gurança em suas decisões.

e) n.d.a.

6. (UFC) Macunaíma é uma obra plural, compos-ta, na medida em que:

a) obedece às características circulares e fecha-das do romance psicológico;

b) como toda obra tradicional, observa a line-aridade da narrativa onde cada personagem age em separado;

c) aproxima técnicas românticas das modernas na estruturação do romance como um todo;

d) no corpo da narrativa, dá um tratamento único para cada personagem apresentada;

e) tal como numa rapsódia, trata de vários temas ao mesmo tempo, entrelaçando-os numa rede múltipla de cores e sons os mais diversos.

7. (UFC) A respeito do livro Macunaíma, é correto afirmar que:

a) a história se passa predominantemente na ca-pital paulista, daí porque o livro pode ser con-siderado uma crônica do cotidiano paulistano;

b) o episódio de base da narrativa consiste na perda e reconquista da muiraquitã;

c) o livro é uma sátira ao Brasil através da re-constituição fiel de fatos históricos retidos na memória do autor;

d) a obra faz uma leitura do Brasil sob a ótica do colonizador;

e) o processo de criação do livro não mantém nenhum vínculo com qualquer obra ante-riormente escrita.

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Na década de 1960, surgiu no Brasil um movimento musical chamado Tropicalismo, que era organizado por Caetano Veloso e Gilberto Gil e do qual também participavam Gal Costa, Tom Zé, Rogério Duprat, Nara Leão, José Carlos Capinan e Torquato Neto.

Sua proposta baseava-se diretamente da fonte dos antropófagos: eles queriam atualizar a música brasileira e a cultura de um modo geral, im-portando elementos estrangeiros, como o rock, a psicodélica e a guitarra elétrica, mas mantendo uma originalidade nacional.

Esse grupo baiano conseguiu unir a música erudita à cultura popular, seguiu a tradição da bossa nova, incutindo-lhe novos elementos, mais modernos. Destaca-vam-se também pelas letras, consideradas até como poemas da literatura nacional.

Eles se assemelhavam aos antropófagos não só quanto às propostas de abertura da cultura nacional e reinvenção de uma cultura nacional, mas também pela irreverência. Transformaram os gostos vigentes quanto ao vestuário, política, sexo e com-portamento, difundindo o uso dos cabelos compridos e das roupas coloridas.

Caetano Veloso e Gilberto Gil, representan-tes do movimento Tropicália, que surgiu na década de 1960, principalmente na música

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Capa do disco Tropicália ou Panis et circenses, de 1968. Obra musical revolucionária para a época, em que se destacam Gilberto Gil, Gal Costa, Caetano Veloso, Torquato Neto, entre outros artistas. Nesse disco, há músicas famosas como “Baby”, “Geleia geral”, “Panis et circenses”, “Bat macumba”

TropicáliaSobre a cabeça os aviõesSob os meus pés os caminhõesAponta contra os chapadõesMeu narizEu organizo o movimentoEu oriento o carnavalEu inauguro o monumentoNo Planalto Central do paísViva a bossa - sa - saViva a palhoça - ça - ça - ça - çaO monumento é de papel crepom e prataOs olhos verdes da mulataA cabeleira esconde atrás da verde mataO luar do sertãoO monumento não tem portaA entrada de uma rua antiga estreita e tortaE no joelho uma criança sorridente feia e mortaEstende a mãoViva a mata - ta - taViva a mulata - ta - ta - ta - taNo pátio interno há uma piscinaCom água azul de AmaralinaCoqueiro, brisa e fala nordestinaE faróisNa mão direita tem uma roseiraAutenticando eterna primavera

E nos jardins os urubus passeiam a tarde inteira Entre os girassóisViva Maria - ia - ia Viva a Bahia - ia - ia - ia - iaNo pulso esquerdo bang-bangEm suas veias corre muito pouco sangueMas seu coração balança a um samba de tamborimEmite acordes dissonantesPelos cinco mil alto-falantesSenhoras e senhores ele põe os olhos grandesSobre mimViva Iracema - ma - maViva Ipanema - ma - ma - ma - maDomingo é o fino da bossaSegunda-feira está na fossaTerça-feira vai à roçaPorémO monumento é bem modernoNão disse nada do modelo do meu ternoQue tudo mais vá pro infernoMeu bemQue tudo mais vá pro infernoMeu bemViva a banda - da - daCarmem Miranda - da - da - da - da

VELOSO, Caetano. Tropicália. In: Caetano Veloso. São Paulo: Universal Music, 2006. 1 CD, digital, estéreo.

Informações sobre

o movimento

Tropicália

@LIT1030

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LITERATURA BRASILEIRA

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1. (ACAFE – SC) As proposições abaixo se referem ao Modernismo e aos seus manifestos. Assinale a alternativa incorreta.

a) O Manifesto Verde-Amarelo, formado por um grupo de escritores jovens, surgiu logo depois do Movimento Pau-Brasil e tinha como objetivo dar continuidade ao Romantismo, que focava o homem português como herói nacional.

b) Na “Grande Noite” da Semana da Arte Moder-na, Menotti del Picchia fora vaiado ao apre-sentar o seu discurso, ilustrado com alguns poemas e excertos.

c) O Manifesto Pau-Brasil (1924) propunha uma literatura autenticamente nacionalista com base nas características do povo brasileiro e combatia a influência estrangeira na literatura.

d) A ideia do Manifesto Antropofágico surgiu quando Tarsila do Amaral presenteou seu ma-rido, Oswald de Andrade, com a sua obra – a tela Abaporu.

e) O Movimento da Escola da Anta, que fazia parte do Manifesto Verde-Amarelo, represen-tava a proposta do nacionalismo primitivo, elegendo como símbolo nacional a anta, além de valorizar a língua indígena “tupi”.

2. (PUCRS) _________, em Memórias sentimentais de João Miramar, obra de renovação da prosa _________, constrói uma narrativa em primeira pessoa cujo narrador, relatando criticamente o seu passado, com estilo semelhante a anotações de diário, subverte a tradicional narrativa ficcional de memórias e faz uma sátira da classe _________.

As palavras que preenchem correta e respectiva-mente as lacunas estão reunidas em:

a) Mário de Andrade – modernista – proletária

b) Lima Barreto – pré-modernista – média

c) Aluísio de Azevedo – naturalista – operária

d) Monteiro Lobato – pré-modernista – média

e) Oswald de Andrade – modernista – burguesa

3. (FMN) Enumerar a segunda coluna de acordo com a primeira, relacionando as ideias, expres-sões, autores e obras ao que convencionou de-nominar de Pré-Modernismo e Geração de 22.

1. Pré-Modernismo 2. Geração de 22

( ) Oswald de Andrade

( ) Lima Barreto

( ) Mário de Andrade

( ) Os sertões

( ) fragmentação da narrativa

( ) ruptura com a tradição

( ) ecletismo

( ) irreverência

A sequência correta, de cima para baixo, é a da alternativa:

a) 2 – 2 – 2 – 1 – 1 – 1 – 1 – 2

b) 2 – 1 – 2 – 1 – 2 – 2 – 1 – 2

c) 2 – 1 – 2 – 2 – 1 – 2 – 2 – 2

d) 1 – 1 – 1 – 1 – 2 – 2 – 1 – 2

e) 1 – 1 – 2 – 1 – 2 – 2 – 1 – 1

4. (UFPE) A paródia foi cultivada por vários poetas e romancistas do modernismo brasileiro. Foi por meio da paródia que os modernistas puderam firmar suas inovações no campo da linguagem e construir um discurso distinto das escolas literá-rias que os antecederam. Considere os poemas abaixo e analise as proposições a seguir.

A vez primeira que eu fitei Teresa,

Como as plantas que arrasta a correnteza,

A valsa nos levou nos giros seus

E amamos juntos

E depois na sala “Adeus” eu disse-lhe a tremerco'a fala

E ela, corando, murmurou-me: “adeus.”

Uma noite entreabriu-se um reposteiro...

E da alcova saía um cavaleiro

Inda beijando uma mulher sem véus

Era eu Era a pálida Teresa!

“Adeus” lhe disse conservando-a presa

E ela entre beijos murmurou-me: “adeus!”

Passaram tempos sec'los de delírio

Prazeres divinais gozos do Empíreo ...

Mas um dia volvi aos lares meus.

Partindo eu disse - “Voltarei! descansa!...”

Ela, chorando mais que uma criança,

Ela em soluços murmurou-me: “adeus!”

Modernismo – Primeira Fase58

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Quando voltei era o palácio em festa!

E a voz d'Ela e de um homem lá na orquestra

Preenchiam de amor o azul dos céus.

Entrei! Ela me olhou branca surpresa!

Foi a última vez que eu vi Teresa!

E ela arquejando murmurou-me: “adeus!”

O “adeus” de Teresa, Castro Alves

A primeira vez que vi Teresa

Achei que ela tinha pernas estúpidas

Achei também que a cara parecia uma perna

Quando vi Teresa de novo

Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo

(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperan-do que o resto do corpo nascesse)

Da terceira vez não vi mais nada

Os céus se misturaram com a terra

E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a

face das águas.

Teresa, Manuel Bandeira

(0-0) Castro Alves se vale de uma linguagem for-mal, pouco corrente, para cantar o amor que perdera.

(1-1) Bandeira usa palavras coloquiais para falar das suas impressões sobre Teresa.

(2-2) Bandeira, na última estrofe do poema, com-para seu alumbramento com a imagem bí-blica da criação.

(3-3) O último “adeus” de Teresa provoca conso-lo e alegria no poeta, além de uma certa sensação de ele e sua amada envelhecerem.

(4-4) A ambiência de sonho e de fantasia revela, no poema de Castro Alves, as relações amo-rosas do poeta com a sua amada.

5. (UESPI)

Caracterizando-se como um “código novo”, di-verso dos “códigos” parnasianos e simbolistas, o Modernismo se firma na cena artística brasileira por suas inovações formais e por novos ideais es-téticos. Dentre essas inovações, podemos citar:

1) cultivo do verso livre;

2) defesa de uma estética revolucionária;

3) resgate do decassílabo heroico como modelo ideal de verso;

4) busca pelas inovações fônicas, léxicas e sintá-ticas do verso;

5) cultivo exclusivo dos ideais estéticos do Futu-rismo.

Estão corretas apenas:

a) 1, 2 e 3 b) 1, 4 e 5

c) 2, 3 e 5 d) 1, 2 e 4

e) 2, 3 e 4

6. (UFL – MG) O ser humano inquieto, dividido en-tre os contrastes de um mundo novo, revelado pelos avanços de novas técnicas e o subdesen-volvimento das nações pobres, exprime o seu instante social e existencial no seguinte estilo li-terário:

a) Realismo. b) Romantismo.

c) Modernismo. d) Barroco.

7. (FURG) Leia o texto seguinte, de autoria de Manuel Bandeira, e assinale a afirmativa correta.

Pneumotórax

Febre, hemoptise, dispneia e suores noturnos.

A vida inteira que podia ter sido e que não foi.

Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico:

– Diga trinta e três.

– Trinta e três... trinta e três... trinta e três...

– Respire.

– O senhor tem uma escavação no pulmão es-querdo e o pulmão direito infiltrado.

– Então, doutor, não é possível tentar o pneu-motórax?

– Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

a) O poema tem como marcas o coloquialismo e a ironia, elementos característicos da produ-ção poética de Manuel Bandeira.

b) O poema apresenta uma métrica e um ritmo regulares que revelam a influência que Manuel Bandeira sofreu do Parnasianismo.

c) O texto de Manuel Bandeira apresenta uma linguagem rara, característica de sua poesia.

d) O poema reveste-se de um caráter musical, re-velando a vinculação que a poesia de Manuel Bandeira mantém com o Simbolismo.

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LITERATURA BRASILEIRA

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e) O poema apresenta versos de estrutura sintá-tica complexa, denunciando a influência que o poeta sofreu da experiência concretista.

8. (UFV) A respeito de Libertinagem, de Manuel Bandeira, Mário de Andrade escreveu o seguinte comentário:

Libertinagem é um livro de cristalizações. Não da poesia de Manuel Bandeira, pois que este confir-ma a grandeza dum dos nossos maiores poetas, mas da psicologia dele. É o livro mais indivíduo Manuel Bandeira de quantos que o poeta já pu-blicou. Aliás, também ele nunca atingiu com tan-ta nitidez os seus ideais estéticos...

ANDRADE, Mário. Nota preliminar. In: BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1986. p. 199.

Dentre os versos abaixo, extraídos da obra de Manuel Bandeira, assinale aqueles que traduzem, de modo explícito os ideais estéticos do poeta:

a) – Então, doutor, não é possível tentar o pneu-motórax? – Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino. (Pneumotórax)

b) Lá longe o sertãozinho de CaxangáBanheiros de palhaUm dia eu vi uma moça nuinha no banhoFiquei parado o coração batendoEla se riuFoi o meu primeiro alumbramento (Evocação do Recife)

c) Estou farto do lirismo comedido Do lirismo bem comportado...[...]Não quero mais saber do lirismo que não é libertação. (Poética)

d) Vou-me embora pra Pasárgada Lá sou amigo do reiLá tenho a mulher que eu queroNa cama que escolhereiVou-me embora pra Pasárgada (Vou me em-bora pra Pasárgada)

e) Andorinha lá fora está dizendo:– “Passei o dia à toa, à toa!”

Andorinha, andorinha, minha cantiga é mais triste!

Passei a vida à toa, à toa ... (Andorinha)

9. (UFPR) Sobre este poema de Manuel Bandeira, considere as afirmações abaixo:

Pensão familiar

Jardim da pensãozinha burguesa.

Gatos espapaçados ao sol.

A tiririca sitia os canteiros chatos.

O sol acaba de crestar as boninas que murcharam.

Os girassóis

amarelo!

resistem.

E as dálias, rechonchudas, plebeias, dominicais.

Um gatinho faz pipi.

Com gestos de garçom de restaurant-Palace

Encobre cuidadosamente a mijadinha.

Sai vibrando com elegância a patinha direita:

– É a única criatura fina na pensãozinha burguesa.

1. Descrição do gatinho e a sua comparação com os outros habitantes da pensão ridicularizam as pretensões e os modos da burguesia.

2. Por suas características simbolistas, o uso os-tensivo de recursos formais e uma temática que busca relações sinestésicas com o assunto de que trata, o poema citado é característico da primeira produção de Manuel Bandeira.

3. A presença de diminutivos no poema exem-plifica a intenção modernista de aproximar a linguagem literária da linguagem cotidiana.

Assinale a alternativa correta.

a) Apenas as afirmativas 1 e 3 são verdadeiras.

b) Apenas as afirmativas 1 e 2 são verdadeiras.

c) Apenas as afirmativas 2 e 3 são verdadeiras.

d) As afirmativas 1, 2 e 3 são verdadeiras.

e) Apenas a afirmativa 2 é verdadeira.

10. (UFRJ)

Amor

humor

ANDRADE, Oswald de. Poesias reunidas (Org. Haroldo de Campos). 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1971.

O texto constitui forte expressão da estética mo-dernista.

Explore essa afirmativa com base em elementos textuais relativos (i) à forma e (ii) ao conteúdo.

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